Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 7ª SECÇÃO | ||
Relator: | HELDER ALMEIDA | ||
Descritores: | RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL ACIDENTE DE VIAÇÃO MUDANÇA DE DIRECÇÃO MUDANÇA DE DIREÇÃO RESPONSABILIDADE PELO RISCO CONCORRENCIA VELOCÍPEDE VEÍCULO AUTOMÓVEL DANO MORTE DANOS PATRIMONIAIS CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO EQUIDADE PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA ALCOOLEMIA CONSUMO DE ESTUPEFACIENTES DIREITO À INDEMNIZAÇÃO ALIMENTOS PRINCÍPIO DA NECESSIDADE CRÉDITO DA SEGURANÇA SOCIAL NULIDADE DE ACÓRDÃO EXCESSO DE PRONÚNCIA | ||
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Data do Acordão: | 12/06/2018 | ||
Nº Único do Processo: | |||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | CONCEDIDO PROVIMENTO À REVISTA | ||
Área Temática: | DIREITO CIVIL – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / RESPONSABILIDADE CIVIL / RESPONSABILIDADE POR FACTOS ILÍCITOS / RESPONSABILIDADE PELO RISCO. | ||
Doutrina: | - Ana Prata, Código Civil Anotado, p. 662; - Antunes Varela. R.L.J., Ano 101.º, p. 281 ; Código Civil Anotado, Volume I, 3.ª Edição, p. 474; - Francisco Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, Curso de Direito da Família, 2001, Volume I, 2.ª Edição, p. 359; - Meneses Cordeiro, Direito dos Seguros, 1.ª Edição, 2013, p. 847; - Oliveira Matos, C. Estrada Anotado, 5.ª Edição, 1988, p. 467/468. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 495.º, N.º 3 E 506.º. BASES GERAIS DO SISTEMA DE SEGURANÇA SOCIAL, APROVADO PELA LEI N.º 4/2007, DE 16-01: - ARTIGO 70.º. INTERVENÇÃO DA SEGURANÇA SOCIAL NO REEMBOLSO DE PRESTAÇÕES EM PROCESSOS JUDICIAIS, APROVADA PELO DL N.º 59/89, 22-02: - ARTIGO 4.º, N.º 1. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: - DE 02-12-2003, CJSTJ, TOMO V, P. 25; - DE 26-10-2004, PROCESSO N.º 1707/04; - DE 02-11-2004, PROCESSO N.º 2958/04; - DE 29-03-2007, PROCESSO N.º 482/07; - DE 14-07-2009, PROCESSO N.º1541/06.1TBSTS, IN WWW.DGSI.PT; - DE 20-10-2009, PROCESSO N.º 85/07.9TCGMR, IN WWW.DGSI.PT; - DE 05-11-2009, PROCESSO N.º 381/02, IN WWW.DGSI.PT; - DE 04-05-2010, PROCESSO N.º 111/04.3TBMUR; IN WWW.DGSI.PT; - DE 07-10-2010, PROCESSO N.º 839/07.6TBPFR, IN WWW.DGSI.PT; - DE 14-10-2010, PROCESSO N.º 1600/06; - DE 27-10-2010, PROCESSO N.º 488/07.9GBLSA; - DE 28-10-2010, PROCESSO N.º 272/06, IN WWW.DGSI.PT; - DE 23-02-2011, PROCESSO N.º 395/03.4GTSTB; - DE 11-04-2011, PROCESSO N.º 212/04, IN SUMÁRIOS, 2011, P. 311; - DE 08-09-2011, PROCESSO N.º 2336/04.2TVLSB; - DE 19-04-2012, PROCESSO N.º 569/10.1TBVNG; - DE 31-05-2012, PROCESSO N.º 14143/07; - DE 10-11-2012, PROCESSO N.º 4524/06, IN SUMÁRIOS, 2012, P. 2; - DE 16-12-2012, PROCESSO N.º 1043/03; - DE 11-04-2013, PROCESSO N.º 546/06, IN SUMÁRIOS, 2013, P. 249; - DE 12-09-2013, PROCESSO N.º 1/12.6TBTMR; - DE 28-11-2013, PROCESSO N.º 177/11.0TBPC; - DE 10-04-2014, PROCESSO N.º 443/12, IN SUMÁRIOS 2015, P. 244; - DE 26-11-2015, PROCESSO N.º 598/04, IN WWW.DGSI.PT; - DE 17-12-2015, PROCESSO N.º 3558/04, IN WWW.DGSI.PT; - DE 27-09-2016, PROCESSO N.º2206/11.8TBPBL, IN WWW.DGSI.PT; - DE 19-10-2016, PROCESSO N.º 1893/14.0TBVNG, IN WWW.DGSI.PT; - DE 03-11-2016, PROCESSO N.º 6/15.5T8VFR, IN WWW.DGSI.PT; - DE 15-11-2017, PROCESSO N.º 549/08; - DE 17-05-2018, PROFERIDO N.º 952/12, IN WWW.DGSI.PT. | ||
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Sumário : | I - Não se tendo apurado que qualquer um dos intervenientes em acidente agiu com culpa, importa atender à proporção em que cada um dos riscos contribuiu para a produção dos danos (art. 506.º do CC), o que requer uma ponderação dos elementos circunstanciais de cada caso concreto, em lugar de uma simples comparação entre as características técnicas dos veículos envolvidos. II - O facto de o condutor de velocípede ter interceptado uma via prioritária e dado início a uma manobra de mudança de direcção, num entroncamento de má visibilidade, a uma velocidade compreendida entre 10 e 13 Km/h não representa um acréscimo do risco. O maior risco de lesão que a condução de velocípedes representa para os seus tripulantes é contrabalançado pela menor apetência que estes veículos apresentam para produzir lesões graves noutros utilizadores da via, as condições de visibilidade são equipolentes para ambos os condutores e um veículo automóvel é dotado de maior capacidade lesiva activa; nessa medida, é de confirmar a repartição de responsabilidades na proporção de 70% para o condutor do veículo automóvel e de 30% para o condutor do velocípede. III - A fixação da indemnização devida pela perda do direito à vida e pelos danos não patrimoniais sofridos pela autora assenta no recurso à equidade, pelo que a intervenção do STJ neste domínio se cinge à verificação dos limites e pressupostos do juízo equitativo. IV - O facto de o falecido condutor do velocípede seguir com uma taxa de álcool no sangue de 0,44 g/l e de ter canabinóides na sua corrente sanguínea não aponta no sentido de que o mesmo descuidava a sua integridade física, não justificando que se modifique o montante de € 65 000, fixado pela Relação para ressarcir o dano morte. Não se revela, por seu turno, dissonante com os critérios jurisprudenciais usualmente adoptados a fixação da indemnização devida por danos não patrimoniais em € 30 000. V - Na medida em que o direito à indemnização consagrado no n.º 3 do art. 495.º do CC assenta nos danos futuros derivados da privação das contribuições para a vida em comum a que o falecido estava obrigado em virtude do casamento, é dispensável averiguar se o cônjuge sobrevivo tem efectiva necessidade de alimentos. VI - Independentemente do I.S.S., I.P. não ter interposto recurso da sentença no segmento em que decidiu o pedido de reembolso por si formulado, decorre do art. 70.º da Lei n.º 4/2007 e do n.º 1 do art. 4.º do DL n.º 59/89 que, no pressuposto de terem sido pagos os montantes reclamados, o quantum do reembolso é fixado em função da decisão que definitivamente aprecie as pretensões do lesado. Daí que, tendo a Relação, por via da modificação da proporção sinistral, melhorado a posição da recorrida, justifica-se que tal se repercuta no montante do reembolso devido àquela entidade, não se tendo, pois, incorrido em excesso de pronúncia. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça[1] I – RELATÓRIO[2]
1. AA, residente em …, demandou na presente acção declarativa BB - Companhia de Seguros, S.A., com sede em …, pedindo a condenação desta a pagar-lhe o quantitativo de 335.165,32 €, por morte do seu marido, sendo: - a título de danos da própria vítima, o valor de 5.000 €; danos não patrimoniais próprios no valor de 40.000 €; - danos patrimoniais directos: despesas de funeral no valor de 2.385,32 €, despesas de campa de 2.470 €, licença, 40 €, vestuário, calçado e óculos perdidos que aquele usava no dia acidente, 145 €, e o valor de 125 € correspondente à perda da bicicleta; - perda de rendimentos futuros/dano futuro de 220.000 €; por lesão do direito à vida/dano morte, o valor de 65.000 €. Para tanto, alegou – em suma -, a existência de um acidente de viação, ocorrido entre um velocípede e um automóvel ligeiro, e que o condutor deste veículo, seguro na Ré, foi o único causador, agindo culposamente, bem como a qualidade de única herdeira do sinistrado, seu marido e condutor do velocípede, de nome CC, falecido em consequência do sinistro, sem ascendentes nem descendentes, sendo certo ainda que resultaram diversos danos de cariz patrimonial e moral. A Ré contestou, dizendo que foi o próprio falecido o único e exclusivo responsável pela ocorrência do acidente, motivo pelo qual o processo-crime, que correu termos na … secção do DIAP de …, sob o nº 104/13.0PTCBR, instaurado na sequência do falecimento do indicado CC, veio a ser arquivado, por decisão de não pronúncia proferida pelo TIC de …, já transitada em julgado. Ademais, impugnou a generalidade dos danos invocados e as quantias peticionadas. Ainda, que a A. não invocou necessidade de alimentos, não sendo possível concluir que a mesma carece deles. No que concerne a despesas de funeral, a A. recebeu já da Segurança Social o devido subsídio, pelo que não sofreu a mesma qualquer prejuízo a esse título, invocando, ainda, que a A. está a receber uma pensão de sobrevivência, que lhe vem sendo paga pela Segurança Social, não podendo a mesma cumular tal pensão com a indemnização reclamada por perda de rendimentos. 2. O ISS, IP, na sequência de pertinente citação, veio deduzir o pedido de reembolso de prestações da Segurança Social, alegando que, com base no falecimento do beneficiário, em consequência do acidente ajuizado, pagou à A./viúva subsídio por morte, no valor de 1.257,66 €, pensões de sobrevivência, relativas ao período de Agosto de 2013 a Junho de 2015, no valor de 4.369,08 €, quantia acrescida do montante das pensões que vier a pagar, por força da sub-rogação legal prevista na Lei 4/2007, 16.1 e nos termos do DL n.º 59/89, de 22.2, acrescido dos juros de mora desde a citação. A Ré contestou este pedido de reembolso, reiterando o exposto em sede de contestação. O ISS, IP actualizou o valor da quantia reclamada, em sede de audiência prévia, para 6.863,27 €. Também no início da audiência de discussão e julgamento, solicitou a ampliação do pedido dos valores pagos, que nessa data totalizariam 7.939,20 €. 3. Após julgamento, foi proferida sentença – 2.º vol., fls. 453 e ss. ‑, que julgou a acção parcialmente procedente, atenta a responsabilidade objectiva de ambos os intervenientes e o contributo do risco da vítima na proporção de 60%, e condenou a Ré a pagar: A) Ao ISS, IP, a título de reembolso de prestações sociais de subsídio por morte e pensões de sobrevivência, relativas ao período de 8-2013 a 6-2016, respectivamente 503,064 € e 2.667,41 €, quantia esta acrescida do montante das pensões que entretanto despendeu, na referida proporção de 40% do seu valor. B) à A. a título de indemnização por danos patrimoniais e morais: – a quantia, já líquida e actualizada à presente data de 26.000 €, a título de dano não patrimonial da perda do direito à vida; – a quantia, já líquida e actualizada à presente data de 800 €, a título de dano não patrimonial próprio da vítima; – a quantia, já líquida e actualizada à presente data de 14.000 €, a título de dano não patrimonial próprio da autora; - a quantia de 45.000 €, a título de dano patrimonial emergente de obrigação alimentar, e que será deduzida do valor que a ré nesta decisão for condenada a pagar ao ISS, IP, a titulo de reembolso de pensão de sobrevivência, e na referida proporção decorrente do concurso de riscos; - a quantia subtotal de 1.563,06 € [resultante de 1958,128 € a título de dano patrimonial emergente de despesas de funeral e bens perdidos (=40% dos valores parcelares de despesas de funeral totais de 2.385,32 €, despesas de campa, no valor de 2.470 €, e licença, no valor de 40 €, a que se deduz aquela que a ré pagará ao ISS, IP, de subsidio por morte, já liquidada, de 503,064 €; e acrescendo o valor de 108 € dos bens perdidos por força do acidente [40% de 145 € + 125 € correspondente à perda da bicicleta);] - os juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, ou outra taxa que no futuro legalmente vier a vigorar em sua substituição, contados desde a citação e até integral pagamento, no que concerne ao montante fixado a título de indemnização por danos patrimoniais; - e bem assim, os juros à dita taxa legal de 4% ao ano, ou outra taxa que no futuro legalmente vier a vigorar em sua substituição, contados desde a data da sentença e até integral pagamento – visto tratar-se de quantia já devidamente actualizada – no que concerne aos montantes fixados a título de indemnização por danos não patrimoniais. 3. Inconformados, A e Ré interpuseram competentes recursos de apelação para a Relação de …, a qual, por Acórdão de fls. 592 e ss., decidiu nos termos que seguem: ‑ “Pelo exposto, julga-se o recurso da A. e R. parcialmente procedentes, assim se revogando parcialmente a decisão recorrida, e, em consequência, atenta a responsabilidade objectiva de ambos os intervenientes e o contributo do risco da vítima na proporção de 30%, vai a R. condenada a pagar: A) ao ISS, IP, a título de reembolso de prestações sociais de subsídio por morte e pensões de sobrevivência, relativas ao período de 8-2013 a 6-2016, respectivamente 880,36 € e 4.677,08 €, quantia esta que é acrescida do montante das pensões que entretanto despendeu, na referida proporção de 70% do seu valor; B) à A. a título de indemnização por danos patrimoniais e morais: – a quantia de 45.500 €, a título de dano não patrimonial da perda do direito à vida; – a quantia de 21.000 €, a título de dano não patrimonial próprio da autora; - a quantia de que se liquidar em sentença a título de dano patrimonial emergente de obrigação alimentar; - a quantia resultante da aplicação da referida proporção de 70% relativamente a despesas de funeral e outras identificadas e bens perdidos apurados; C) no demais se mantendo o decidido na sentença recorrida. Custas da acção e pedido de reembolso por A. e R., e por interveniente e R. na proporção do respectivo decaimento.” 4. Uma vez mais irresignada, a Ré interpôs o vertente recurso de revista – fls. 628 e ss. deste volume ‑, cuja alegação encerra com as seguintes conclusões: 1. Salvo o devido respeito por opinião diversa, crê a aqui recorrente que, face ao concreto circunstancialismo que rodeou o acidente dos autos, não poderá manter-se a decisão do Tribunal a quo que fixou o grau de contribuição para os danos produzidos em resultado do presente sinistro, na proporção de 70% para o veículo ligeiro e de apenas 30% para o velocípede. 2. Da leitura do Acórdão recorrido é possível inferir-se que, ao estabelecer a proporção acima referida, o Tribunal a quo considerou, como factor decisivo, as características dos veículos intervenientes no acidente e, em particular, a sua capacidade para infligir danos mais, ou menos relevantes. 3. No caso em apreço entende a ora recorrente que a fixação da contribuição de risco para o acidente deve ser estabelecida em função de todas as concretas circunstâncias que rodearam o acidente, nas quais se incluem não apenas as características dos veículos, mas também os riscos inerentes aos seus condutores, a forma como estes os tripulavam, as manobras que levavam a cabo, as possibilidades que teriam de evitar o acidente e as condições/características da via. 4. Ora, resulta da factualidade que vem dada como demonstrada, no caso concreto, que vários factores associados ao condutor do velocípede contribuíram para propiciar e potenciar o risco da verificação do acidente e o agravamento do respectivo dano. 5. Com efeito, a circunstância de o falecido CC ter interceptado uma via prioritária, dando início a uma manobra de mudança de direcção, num entroncamento de má visibilidade, onde o mesmo não gozava de prioridade de passagem, fazendo-o a uma velocidade compreendida entre os 10 e os 13 km/h, criou um importante risco e potenciou de forma relevante o embate que acabou por eclodir no sobredito entroncamento. 6. Considerando a factualidade vertida nos Pontos VII, VIII, IX e XXI dos Factos Provados, afigura-se-nos incontornável que o factor da reduzida visibilidade gera indiscutivelmente mais risco por banda do velocípede, impondo ao seu condutor cuidados acrescidos na abordagem do entroncamento, tanto mais que não gozava de prioridade de passagem. 7. Por outro lado, está provado que o veículo ligeiro, da marca Citroen, modelo C3, circulava a uma velocidade compreendida entre os 42 e os 48 km/hora, sendo certo que, de acordo com as regras da experiência comum, os veículos com as características do … fazem barulho quando estão em circulação, quer por força da massa de ar que deslocam, quer em virtude do ressoar dos pneus no asfalto. 8. Deste modo, tripulando o falecido CC um velocípede resulta claro que também por força desta circunstância lhe seria mais fácil aperceber-se da aproximação do veículo ligeiro, do que o condutor deste último ter a percepção de que um velocípede se aproximava do entroncamento. 9. Por outro lado, contrariamente ao que vem defendido pelo Tribunal a quo crê a aqui recorrente que, na análise da presente questão, não poderá igualmente deixar de atender-se ao facto de os velocípedes, para além de proporcionarem uma menor estabilidade na execução das manobras, representarem, em caso de acidente, um risco de lesão para o seu condutor - atenta a sua exposição muito superior ao de um veículo ligeiro. 10. Para além disso e, ressalvando sempre o devido respeito por opinião diversa, crê a aqui recorrente que a obesidade do falecido CC - cujo peso ascendia a cerca de 102 kg - deverá igualmente ser um elemento a atender, no momento da definição da contribuição do risco para a ocorrência do acidente. 11. Na verdade, resulta da normalidade das coisas e das regras da experiência comum que a obesidade de um condutor de um velocípede, necessariamente lhe reduz a agilidade e dificulta a execução das manobras no menor espaço de tempo possível, o que, compreensivelmente representa um risco acrescido para a segurança rodoviária. 12. Fechar os olhos a todas estas circunstâncias que vêm dadas como demonstradas, como sustenta o Acórdão recorrido, é, salvo o devido respeito, pretender impor um sentido de justiça que se alheia da experiência de vida que todos nós temos e que vai num sentido que não é habitual ver nos nossos Tribunais superiores. 13. A acrescer a tudo quanto supra se deixou já exposto, não poderá também deixar de considerar-se a circunstância de ter resultado demonstrado que o falecido CC circulava com uma taxa de álcool no sangue de 0,44 g/l e ainda o facto de ter sido detectada neste a presença de substâncias ilícitas, o que constitui um risco acrescido, comparativamente com o risco gerado pela condução de alguém que não apresenta qualquer taxa de álcool, ou substâncias canabinóides no sangue. 14. Assim, face à factualidade que vem dada como provada, forçoso é concluir que os riscos de circulação gerados pelo velocípede tripulado pelo falecido CC, conduzido nas concretas circunstâncias que rodearam o presente sinistro, são substancialmente superiores aos riscos gerados pelo …. 15. Deste modo, deve o Acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro que estabeleça que o grau de contribuição do velocípede em termos de risco para o acidente é superior ao gerado pelo veículo ligeiro, devendo o mesmo ser fixado na proporção de 60% para o primeiro (velocípede) e de 40% para o segundo (VD), reduzindo-se proporcionalmente as indemnizações fixadas à recorrida e ao Instituto de Segurança Social, tudo com as necessárias consequências legais. 16. Ainda que assim se não entenda e venha a considerar-se que alguns dos factores levados em consideração pela primeira instância não devem ser atendidos - o que apenas se equaciona para efeitos do presente raciocínio - sempre se dirá que, atentas as concretas circunstâncias que rodearam o presente sinistro, deverá ser declarado que os riscos gerados por ambas as viaturas eram, pelo menos, iguais, tudo com as necessárias consequências legais. 17. No que tange o montante indemnizatório arbitrado à recorrida pela perda de direito à vida do falecido CC, crê a aqui recorrente que o Tribunal a quo não atendeu a toda a factualidade que com relevo vem dada como provada. 18. Quando se trata de indemnizar o bem "vida", não pode naturalmente deixar de se atender a todos os sinais existentes nos autos que possam indiciar os cuidados, ou a ausência deles, que as vítimas emprestavam à sua própria vida. 19. Ora, no caso dos autos ficou demonstrado que o falecido CC circulava, na altura do acidente, com uma taxa de álcool no sangue de 0,44 g/l, já que, antes de iniciar a condução do seu velocípede, havia ingerido bebidas alcoólicas, para além de que também apresentava substâncias canabinóides no sangue (Delta-9-tetrahidrocanabinol -taxa no sangue de 5 ng/ml) e 11-nor-9-carboxi delta-9-tetracanabinol -uma taxa no sangue de 12 ng/ml), colocando-se, assim, voluntariamente em situação de maior risco de sofrer um acidente. 20. Revelando o resultado da decisão que o falecido tomou, no mínimo, uma falta de cuidado em relação à sua própria integridade física, crê a aqui recorrente que se afigura mais justa e adequada a fixação do montante indemnizatório pela perda do direito à vida do marido da recorrida no valor de 50.000,00€, o que se requer, devendo a indemnização correspondente a arbitrar à autora ser reduzida proporcionalmente em função da percentagem de contributo de risco do velocípede para o acidente. 21. A recorrente não se conforma também com a decisão recorrida, na parte em que fixou em 30.000,00€ o montante indemnizatório pelos danos não patrimoniais sofridos pela autora em virtude do decesso do seu marido, mercê do sinistro dos autos. 22. Não deixando de ter presente a grande dificuldade que existe em indemnizar danos desta natureza, entende a ora recorrente que tal atribuição pecuniária se revela desajustada, quando cotejada com atribuições de idêntica natureza e em situações semelhantes ou aproximadas. 23. A partir dos Acórdãos citados no corpo das presentes alegações de recurso, parcialmente, exemplificativos do sentido e orientação da profusa Jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores nesta matéria, podemos constatar que têm vindo a ser arbitradas indemnizações próximas dos 25.000,00€ para ressarcir os danos não patrimoniais de cônjuges em consequência de acidentes de viação. 24. Por outro lado, cumpre sublinhar que a indemnização arbitrada pelo Tribunal recorrido é muito superior àquela que o legislador entendeu que seria, no caso, ajustada. 25. Um dos contributos preponderantes do legislador nacional para a prossecução da harmonização de valores indemnizatórios deste dano foi a criação da "proposta razoável", que as seguradoras devem apresentar ao lesado em cumprimento do disposto nos artigos 38° e 39° do DL 291/2007 (e, anteriormente, nos termos previstos no DL 83/2006). 26. Ora, recorrendo às regras da aludida portaria, a compensação da autora por danos não patrimoniais decorrentes do decesso do seu marido seria na ordem dos 20.520,00€, posto que a recorria apenas estava casada com o falecido há pouco mais de 1 ano. 27. Atendendo a tudo quanto supra se deixou exposto, entende a ora recorrente que a indemnização a fixar à recorrida a título de danos morais sofridos pela própria não deverá ultrapassar o montante de 25.000,00€, o qual deverá ser posteriormente reduzido por via do contributo do risco do velocípede para a ocorrência do acidente. 28. Ressalvando sempre o devido respeito por opinião diversa, não pode a ora recorrente igualmente conformar-se com a decisão do Tribunal a quo, na parte em que esta a condenou a pagar à recorrida a quantia que vier a liquidar-se posteriormente "...a título de dano patrimonial emergente de obrigação alimentar." 29. Como é sabido, o direito a alimentos consubstancia uma verdadeira excepção à regra estabelecida na nossa legislação de que só os danos ligados à relação jurídica ilicitamente violada contam para a obrigação de indemnizar imposta ao lesante. 30. Porque tal direito assenta numa norma de carácter excepcional (o n.° 3 do artigo 495.° do C.C.), a qual, nos termos da lei é, em princípio, insusceptível de aplicação analógica, não bastava à autora a simples invocação da qualidades de cônjuge sobrevivo do infeliz CC para, de pronto e de modo automático, lhe fosse conferido o direito a uma indemnização a título de alimentos. 31. Neste sentido, veja-se o decidido, entre vários outros Acórdão do S.TJ. citados no corpo destas alegações, o douto Acórdão do S.TJ. datado de 03-11-2016 e proferido no âmbito do processo n. 6/15.5T8VFR.P1.S1, no qual se refere que "...esse direito não é de atribuição directa e automática às pessoas indicadas nesse normativo. Só existirá se (e na medida em que) for demonstrada a facticidade em que necessariamente terá que assentar." 32. No caso dos autos provou-se que o falecido CC, casado com a autora, há cerca de um ano antes do acidente, vivia com a recorrida numa casa pertencente a esta última, contribuindo para os encargos com a luz, água, alimentação e lazer (férias) do agregado familiar, composto por si e pela recorrida. 33. Nada nos autos nos indica, ou leva a supor, que o sobredito contributo prestado pelo falecido CC fosse entregue à recorrida, com vista a fazer face a despesas próprias desta última, sendo certo que se provou, pelo contrário, que a autora trabalhava e continua a trabalhar, auferindo um vencimento substancialmente superior ao do seu falecido marido. 34. Da factualidade dada como demonstrada resulta antes que a contribuição do falecido CC para a economia familiar se destinava a compensar os custos que a sua permanência na habitação da autora acarretava, face ao seu peso económico na economia doméstica. 35. A recorrida não só não logrou demonstrar que recebesse alimentos em vida do seu marido, ou que não dispusesse de outra fonte de rendimentos distinta da que decorria do trabalho do falecido CC, para viver condignamente, como tão pouco provou quaisquer despesas que levassem a supor que a mesma necessitasse de alimentos. 36. Ora o pretenso direito a alimentos da autora assume um carácter restritivo, pois acha-se circunscrito ao que assuma carácter indispensável (artigo 2003.° do C.C.), de acordo com as necessidades (artigo 2004.° do CC) dos lesados - É uma decorrência óbvia do carácter excepcional da regra inscrita no artigo 495.° do C.C. 37. A concreta necessidade da autora da prestação de alimentos e a indispensabilidade da quantia a arbitrar a este título traduziam-se na alegação e prova de factos, não sendo os mesmos de presumir para efeitos da concessão de uma indemnização desta natureza. 38. De resto, está demonstrado nos autos que a recorrida, para além dos rendimentos do seu trabalho, se encontra ainda a receber uma pensão vitalícia de sobrevivência, por morte do seu marido CC, que lhe vem sendo paga pelo Instituto de Segurança Social, I.P., circunstância que igualmente põe em causa o pressuposto da necessidade de alimentos da autora. 39. Por outro lado, há que considerar que, atenta a idade da autora à data do falecimento do seu marido CC - 45 anos - é de supor que a mesma reconstrua a sua vida num futuro mais ou menos próximo, voltando a casar e assim constituindo uma nova família. 40. Como tal, atenta a factualidade provada constante dos autos, não é possível afirmar que a autora careça de alimentos, nem tão pouco que deles vá necessitar no futuro, sendo até de presumir o contrário. 41. Por esse motivo, não sendo previsível que a recorrida necessite ou venha a necessitar no futuro de alimentos, estava vedado ao Tribunal a quo conferir à autora o direito a alimentos. 42. Deve, pois, o Acórdão recorrido ser revogado neste segmento e substituído por outra decisão que absolva recorrente da condenação no pagamento à recorrida de uma indemnização a título de alimentos a liquidar em momento posterior. 43. Quando assim não se entenda e se considere que resulta dos autos a factualidade que permite concluir pela existência deste dano da autora - o que não se aceita, nem se concede - deve então estabelecer-se como limite/tecto desse direito o valor fixado pelo Tribunal de primeira instância - com o qual a recorrida se conformou -atendendo-se oportunamente à contribuição do velocípede para a responsabilidade para o risco que vier a ser fixada. 44. Nesse caso deverá ser deduzido a esse montante os valores recebidos pela recorrida do interveniente Instituto de Segurança Social, I.P., a título de pensões de sobrevivência, que a aqui recorrente venha a ter de pagar àquele Instituto por força da decisão que vier a ser proferida. 45. Finalmente e com todo o respeito, discorda ainda a aqui recorrida da decisão do Tribunal a quo na parte em que este a condenou a pagar ao Instituto de Segurança Social 70% dos montantes que este havia liquidado à recorrida a título de subsídio por morte e pensões de sobrevivência, relativas ao período de 8-2013 a 6-2016, ou seja "...respectivamente 880,36€ e 4.677,08€, quantia esta acrescida do montante das pensões que entretanto despendeu, na referida proporção de 70% do seu valor." 46. Resulta dos autos que o Instituto de Segurança Social não interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância, apesar de o mesmo ter visto, em parte, negado o direito que exerceu contra a aqui recorrente. 47.Ora, não tendo o titular do referido direito de indemnização reagido contra a decisão da primeira instância, na parte que esta lhe era desfavorável - como lhe era permitido, pois decaiu nessa parte da decisão - forçoso é concluir que o mesmo se conformou com aquela decisão. 48. Assim, salvo melhor opinião, estava vedado Tribunal a quo condenar a ora recorrente no pagamento ao Instituto de Segurança Social de uma quantia superior àquela que foi estabelecida pela primeira instância, por força do trânsito em julgado desta decisão relativamente ao Instituto. 49. Ao agravar a condenação da recorrente no pedido deduzido pelo Instituto de Segurança Social, o Tribunal a quo violou o princípio da proibição da reformatio in pejus. 50. Por outro lado, não tendo o Instituto de Segurança Social interposto recurso da decisão da primeira instância, sempre o Tribunal Relação estava impedido de conhecer de questão que não lhe foi colocada, enfermando esse segmento da decisão recorrida da nulidade prevista na alínea d) do artigo 615.° do C.P.C, que aqui se deixa invocada. 51. Assim, deve ser revogado o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra e substituído por outro que reponha a decisão proferida pela primeira instância no que se refere ao pedido deduzido pelo Instituto de Segurança Social, condenando-a apenas a pagar a este instituto as quantias de 503,064€ e 2.667,41 €, respectivamente, a título de subsídio por morte e de pensões de sobrevivência, acrescidas do montante das pensões que entretanto despendeu até ao trânsito em julgado da decisão, na proporção de 40% do seu valor. 52. O Acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 342.°, 483.°, 495.°, 506.°, 562.°, 563.°, 564.° n. 2 e 566.° todos do Código Civil e ainda o disposto nos artigos 615.° n. 1 d) e 635.° do C.P.C. . 5. A A., por sua vez, apresentou contra-alegações, pugnando pelo improvimento do recurso e consequente confirmação do Acórdão recorrido. Nada a tal opondo, cumpre decidir. II – FACTOS ‑ No Acórdão foram inscritos como provados os seguintes: 1- No dia 16-07-2013, cerca das 19h50m, na Rua …, …, freguesia de .., comarca de …, ocorreu embate sendo intervenientes: - o ligeiro de passageiros 81-38-..., marca Citroen, modelo C3, conduzido por DD, seu proprietário, que conduzia a viatura no sentido Coimbra/ S. Silvestre, sul-norte; – Velocípede de cor branca, sem motor e sem matricula, marca Rochride, “pedalado” pelo falecido, CC, seu proprietário; 2 - A responsabilidade civil emergente da circulação do ligeiro estava validamente transferida para a ré, por contrato de seguro titulado pela apólice nº 01…0. 3 - O referido CC faleceu na sequência das lesões decorrentes do acidente, deixando a suceder-lhe a autora, sua cônjuge sobreviva- na medida em que faleceu sem ascendentes nem descendentes. 4 - A autora e o CC haviam casado em primeiras e únicas núpcias de ambos, no dia 5 de Maio de 2012, mantendo-se o casamento até à data do óbito do cônjuge marido. 5 - O malogrado CC deixou como único herdeiro, sua mulher AA tendo como família para além da esposa apenas e só a sua irmã. 6 - À data do acidente, a vítima tinha 44 anos de idade, pois havia nascido em 29 de Setembro de 1968. * I - À data dos factos a referida rua …, apesar de não se encontrar demarcada, possuía dois sentidos de marcha – um destinado ao sentido E.N. 111/1 – Adémia e outro ao sentido inverso – sendo que, junto ao local onde ocorreu o acidente, a mesma configurava um entroncamento, posto que nela confluía arruamento que dá acesso ao Lugar do L…, o qual fica situado do seu lado direito, atento o sentido de marcha do …. II - Assim, a rua …, no local em concreto, além de entroncada à direita pelo arruamento de acesso ao L… [arruamento de onde provinha o ciclista, residente na Urbanização do L…], atento o sentido de circulação do veículo conduzido pelo segurado, era em patamar, não existindo ali qualquer sinalização a regular o trânsito, III - tendo o piso constituído por aglomerado asfáltico em razoável estado de conservação, e no momento do acidente estava seco e limpo. IV - Trata-se- a Rua … - de estrada sem separadores, com duas vias, com cerca de 5 metros de largura (2,5+2,5 m), sem berma, e dois sentidos de trânsito, tendo como limite de velocidade permitida para o local de 50 Km/h (limite local/limite geral). V - Inexistia sinalização vertical assim como marcas rodoviárias, quer numa quer noutra das vias que entroncam. VI - No momento, fazia bom tempo. VII - No local onde se deu o presente sinistro, a Rua … desenvolve-se em recta – com mais de 100 metros de extensão – sendo ladeada, do lado direito, atento o indicado sentido de marcha, por vegetação – nomeadamente silvas, ervas e todo o tipo de vegetação espontânea – que, à data dos factos, apresentava uma altura não inferior a 2 metros. VIII - Essa vegetação era de tal forma densa e alta, que impedia os condutores que circulassem na Rua …, no sentido de marcha em que seguia o ligeiro, de avistarem o trânsito que se processava no arruamento que dá acesso ao Lugar do L… - na sua aproximação ao entroncamento; IX - também qualquer condutor que, à data dos factos, circulasse no arruamento que dá acesso ao Lugar do L… em direcção à Rua …, tinha idênticas dificuldades de visibilidade, estando impedido, pela aludida vegetação, de avistar o trânsito que se processava na Rua …, nomeadamente no sentido de marcha E.N. 111/1 – Adémia. X - No entroncamento para ambos os sentidos, existia vegetação abundante e alta, dificultando a visibilidade para ambos os veículos. XI - O local onde ocorreu o acidente situava-se no interior da localidade, mas sem habitações nas imediações - sendo o trânsito escasso, apesar de ser dia de trabalho (terça feira). XII - A largura da via de onde provinha a bicicleta é de 4 a 4,20 metros, sendo que no entroncamento com a … se abre em leque, com a largura máxima de 15,50 m. XIII - O DD conduzia a viatura ligeira de passageiros matrícula 81-38-... na rua …, sentido Coimbra/ S. Silvestre, sul-norte, no sentido Estrada Nacional nº 111/1– …, em estrada municipal do concelho de …, a uma velocidade não concretamente apurada - mas que se cifra entre 42 e 48 Km/ hora; XIV - Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar a vítima CC, provindo do arruamento de acesso ao L…, conduzindo a bicicleta a uma velocidade de cerca de 10 a 13 Km hora, e entrou na Rua …, atravessando a faixa de rodagem, pretendendo seguir no sentido norte – Sul, e assim virar à esquerda. XV - O condutor do veículo 81-38-... veio a embater com a parte frontal esquerda do veículo por si conduzido na parte lateral esquerda, a meio, do velocípede conduzido pelo sinistrado CC, tendo igualmente o vidro da frente do lado do condutor ficado estilhaçado na sequência do embate. XVI - O veículo 81-38-... imobilizou-se, ficando a ocupar a via de tráfego do sentido oposto, com o eixo da roda anterior esquerda nas coordenadas (X: 16,90 m Y: 1,00), a um metro dos rails, e o seu eixo da roda posterior esquerda, nas coordenadas (X: 19.45m Y: 1,35 m) ponto 1 do croquis de fols. 184 verso (assim, enviesado para a esquerda, atento o seu sentido de marcha). XVII - E o velocípede, com o embate foi cuspido para fora da faixa de rodagem, imobilizando-se, na vegetação, nas coordenadas: (X:16:90; Y: - 2,00 m) - ponto 2 do croquis. XVIII - O falecido veio a imobilizar-se na posição decúbito supino (costas para baixo) entre o veículo e os rails de protecção lateral (0,95 m), tendo embatido nos rails de protecção lateral, junto ao local onde se imobilizou, considerando as manchas de sangue existentes. XIX - Do embate, projecção, embate contra os rails e queda final que se lhe seguiu, o sinistrado CC veio a falecer cerca de uma hora após, tendo recebido manobras de suporte avançado de vida pelo menos durante 45 minutos. XX - Relativamente a ambos os condutores, o posicionamento solar - a W-NW- à hora do acidente reunia condições de encadeamento a ambos os condutores- facto que poderá ter interferido na visibilidade; XXI - Era possível aos condutores ciclistas provindos do arruamento que dá acesso ao Lugar do L… que pretendessem entrar na Rua …, avistar esta última rua, para o lado da E.N. 111/1 (de onde provinha o ligeiro), numa extensão de pelo menos 50 metros, mais concretamente de 66 metros, apenas e conquanto parassem à entrada do mencionado entroncamento e olhassem para o seu lado esquerdo); do mesmo modo, a quem circulasse na Rua …, no sentido em que seguia o ligeiro, era possível avistar a 66 metros um ciclista parado à entrada do mencionado entroncamento. XXII - Tendo em conta as posições dos veículos, o velocípede foi projectado a cerca de 6 metros da zona onde se encontravam vestígios de sangue e óculos (assinalada como sendo de embate no croquis policial) e a 2 metros para lá do limite da faixa de rodagem. (fora da estrada). XXIII - O veiculo ligeiro imobilizou-se a 3 metros desse ponto de projecção de sangue e óculos (indicado no croquis policial como sendo de embate). XXIV - Na sequência do embate, o falecido CC, que padecia de obesidade, pesando cerca de 102,70 kg, tombou sobre o capot e o vidro pára-brisas do … – o qual com o impacto e o seu peso, de imediato, estilhaçou – numa altura em que o veículo seguro se encontrava em movimento para a sua esquerda, XXV - acabando, posteriormente, por rolar e ser projectado para o lado esquerdo da via, atento o sentido de marcha do …, à medida que o veículo foi perdendo a velocidade, XXVI - tendo nessa trajectória embatido com a cabeça nos rails de protecção em metal, que ladeiam a Rua … pelo lado esquerdo, considerando o mencionado sentido de marcha. XXVII - O … acabou por imobilizar-se ainda no enfiamento do aludido entroncamento, do lado esquerdo da via atento o seu sentido de marcha, a cerca de 3/4 metros do local assinalado no croquis como de presença de vestígios de sangue e óculos caídos, ficando o falecido CC caído também desse mesmo lado esquerdo da faixa de rodagem, entre a lateral esquerda do … e os supra indicados rails de protecção metálicos. XXVIII - O embate ocorreu em ponto não concretamente não determinado, mas entre aquele indicado em croquis policial (ou seja, na faixa oposta aquela onde circulava o ligeiro, a um metro do rails do lado esquerdo, sendo este ultimo o ponto de início dos vestígios de sangue e óculos caídos no pavimento pertencentes ao ciclista] e outro situado cerca de 3 metros atras, e ainda na faixa de circulação do ligeiro, muito próximo ao eixo da via (a cerca de 10/20 cm do eixo) ) - ; o ponto de vestígios de sangue e óculos, situa-se na via de trânsito do sentido oposto ao que circulava o veículo de matrícula 81-38-..., nas coordenadas X=23.00m; Y 01,00m). (ponto 5 do croquis). XXIX - O falecido CC circulava apresentando substâncias canabinóides – Delta-9-tetrahidrocanabinol (taxa no sangue de 5 ng/ml) e 11-nor-9-carboxi delta-9-tetracanabinol (uma taxa no sangue de 12 ng/ml), indicando, respectivamente exposição num período variável entre 3 a 30 dias e uma concentração vestigial muito abaixo daquelas consideradas terapêuticas e não tóxicas, e muito inferior aquelas que podem também ser detectadas em caso de inalação passiva de marijuana- não sendo tal concentração de substancias compatível com a produção de qualquer tipo de alterações psicoactivas. XXX - Apresentava ainda uma taxa de álcool no sangue de 0,44 g/l- . XXXI - Antes de iniciar a condução do seu velocípede, o falecido CC havia ingerido bebidas alcoólicas. XXXII - O falecido era portador de capacete de protecção. XXXIII - CC faleceu no próprio dia do acidente, tais eram as lesões traumáticas sofridas. XXXIV - Com o embate/impacto violento que se verificou com a frente do veículo contra o corpo, projecção e embate nos “rails” de protecção, o CC sofreu as lesões traumáticas examinadas no auto e relatório de autópsia, concluindo aquele que a causa da morte se deveu às inúmeras lesões traumáticas crânio-meningo-encefálicas ali descritas. XXXV - Era ainda um homem saudável, com 44 anos de idade com esperança de vida à sua frente, que vivia em perfeita harmonia com a aqui A. XXXVI - Era uma pessoa com muitos amigos, líder, sócio 736 de coração e alma da “EE, tendo pertencido à FF, com Lugar Anual. XXXVII - Com o desaparecimento da vítima, a A. sofreu um profundo abalo psíquico e grande angústia vivencial, acrescido pelo facto no referido fatídico dia ter sido confrontada com o evento violentíssimo e absolutamente inesperado, em vésperas de irem de férias, tendo recebido a notícia directamente pelo agente da polícia cerca das 22h:05 com a consequente deslocação ao Instituto de Medicina Legal para proceder ao reconhecimento do corpo e confirmação do facto- como resulta das informações complementares da participação do acidente. XXXVIII - O traumatismo que a autora sofreu ao ser confrontada com a realidade da morte do CC, seu marido, deixará sequelas duras de apagar, agudizado na igual medida da violência do acidente que constituiu no dia seguinte ao encarar os jornais e noticias locais, em primeira página com a referência que estavam casados há um ano. XXXIX - A autora e o falecido CC eram casados havia um ano e dois meses tendo-se conhecido em Agosto de 2009, e vivendo juntos desde Setembro de 2009. XL - Sendo autora falecido um casal rara e absolutamente feliz, unido, encontrando-se numa fase – à data da morte – na aventura de tudo fazerem para ser pais. XLI - A autora sofreu efectivamente e ainda hoje ao recordar o acidente, a vida conjunta com o seu marido se emociona, não conseguindo apagar da memória e do seu dia-a-dia a sua presença. XLII - Cuidando e visitando com muita assiduidade a campa do malogrado CC, conversando com ele e partilhando a sua vida. XLIII - Ambos haviam passado por processo com vista a terem um filho biológico, tendo a autora se submetido a um processo de tratamentos para que fosse possível engravidar, com submissão a tratamentos médicos, hormonais- sem êxito, causando à autora uma dor adicional à sentida com a morte do seu marido por ter de optar por lutar num processo de adopção singular, - candidatando-se para o efeito. XLIV - É difícil para a autora partilhar o vazio da casa, o vazio do carinho e o vazio da cama e do amor que efectivamente nutria pelo marido, igualmente passando a A. a ficar com a obrigação de apoio e suporte familiar para qualquer eventualidade e ajuda da única família viva do CC, a irmã GG, - porquanto o CC tinha pela irmã mais nova, desde a morte da mãe (filho de pai desconhecido) em acidente de viação, a constante preocupação e suporte pelo apoio, por vezes económico, então em inicio de vida profissional e que com a morte do CC fica a autora com essa obrigação em cumprimento da vontade do marido sempre manifestada nas conversas com a autora. XLV - Em consequência da morte do marido, foram suportadas pela A. as despesas de funeral e preparativos das exéquias, no montante de 2.385,32 euros (conforme doc.21 (fatura) e doc. 22 (recibo) e o valor de 2.470,00 euros referentes à campa em granito, lanterna e foto cerâmica tudo conforme doc. 23 da p.i. e ainda Licença para colocação de campa mausoléu do Cemitério de … no valor de 40,00 euros. XLVI - No dia do acidente, as roupas, óculos e calçado que o malogrado CC usava no momento da ocorrência ficaram destruídos- como a seguir se discrimina e constam do relatório de autópsia e participação do acidente-óculos de ciclismos partidos (vide participação de acidente – vestígios no local); sapatilhas vermelhas, brancas e pretas Newfeel de ciclismo; Calções pretos de lycra (de ciclismo); t-shirt de ciclista, em valor não concretamente apurado. XLVII - E a bicicleta que o CC utilizava, marca Rochride, modelo montanha, ficou inutilizada- perda total. XLVIII - No caso vertente, o sinistrado CC era casado com A., vivendo na casa da A. contribuindo para encargos, luz, água, alimentação, lazer (férias), constituindo a sua morte uma perda do contributo para a economia doméstica. XLIX - A A. terá de se substituir ao seu falecido marido na posição que tinha perante a irmã- única pessoa de família, e assim assumir o lugar e papel do CC. L - O CC exercia a profissão de delegado comercial no sector da distribuição de uma empresa de distribuidora grossista de gelados, congelados, ultracongelados, refrigerados e outros produtos alimentares auferindo à data do seu falecimento um valor mensal médio de 700,00 euros, conforme resulta de recibos de vencimento que se juntam. (docs. 28 a 31). LI - CC recebia para além daquele valor, uma quantia mensal a título de prémio em valor médio não concretamente apurado. LII - Gozava de boa saúde e seria espectável que vivesse pelo menos até aos 78 anos, considerando ser essa a esperança média dos homens portugueses. LIII - Nos anos de 2012 e 2013, a autora adquiriu os seguintes rendimentos: € 22.786,33 brutos (€ 16.113,82 líquidos) e € 23914,82 brutos (€ 15.551,97 líquidos) pagos pela entidade CH…- onde continuou a trabalhar, auferindo rendimento mensal líquido não inferior a € 1110,86. LIV - Nos meses de Outubro - Dezembro de 2015 o seu vencimento líquido variou entre 1200 e 1300 euros. LV - O Instituto da Segurança Social, IP, através do Centro Nacional de Pensões, pagou à autora, viúva, subsídio por morte relativamente ao beneficiário falecido no valor de € 1257,66; LVI - E foram por tal organismo pagas pensões de sobrevivência à viúva relativas ao período de 2013-08 a 2016-6, no total de € 6.6681,54, sendo o valor mensal actual de € 165,53. - E como não provados os seguintes: 1. O teor de álcool no sangue de que o falecido CC era portador associado às substâncias canabinóides indubitavelmente influenciavam a forma como o mesmo tripulava o velocípede, sendo determinantes da ocorrência do sinistro, 2. e foram determinantes da sua perda de vigilância em relação ao meio envolvente, encontrando-se as suas capacidades de atenção e de concentração, na altura do acidente, fortemente diminuídas. 3. Tal quantidade de álcool e de psicotrópicos no sangue reduziu significativamente a acuidade visual do falecido CC, quer para objectos em movimento, quer para objectos estáticos. 4. A presença das referidas quantidades de álcool e de substâncias canabinóides no sangue prejudicou-lhe a sua visão estereoscópica, razão pela qual o falecido CC se achava, na altura, incapaz de avaliar correctamente a velocidade que praticava, bem como as distâncias que o separavam dos outros veículos. 5. Só à luz de um menor domínio das suas capacidades físicas e motoras se compreende a desatenta e fatal manobra levada a cabo pelo condutor do velocípede e a consequente causa do acidente. 6. O condutor seguro seguia desatento ao trânsito e à condução, imprimindo à viatura por si conduzida um movimento superior à velocidade permitida para o local (50Km/H). 7. A vítima CC seguia já na via no sentido norte – sul, junto aos rails, na sua faixa de rodagem, quando foi embatido violentamente pelo veículo automóvel 81-38-.... 8. O condutor do veículo 81-38-..., por seguir distraído, desatento, com descuido, de forma negligente e imponderada, alheio aos riscos e perigos estradais, imprimia à sua viatura um movimento superior ao adequado ao local, só se apercebeu da presença do velocípede quando este já estava na Rua … e, assustou-se, tendo realizado uma manobra evasiva errada guinando o veículo por si conduzido para a faixa de rodagem contrária à sua. 9. O acidente acabado de descrever só ocorreu por o condutor DD, não dispensar à condução que fazia, os cuidados, que não só a lei, como também a mais elementar prudência lhe impunham, imprimindo uma velocidade inadequada, ao seu veículo e inadequada ao trânsito de veículos e pessoas para um condutor médio e prudente está obrigado, tendo em conta as circunstâncias do momento, o local e as características da via. 10. DD podia e devia ter tido outro comportamento que não determinasse o embate, suas consequências e gravidade. 11. O condutor do veiculo 81-38-... ao chegar ao entroncamento ao deparar-se com o ciclista que provinha do entroncamento e já estava na fase final da sua entrada na via, optou de modo errado por manobra evasiva errada que se traduziu em desviar a sua trajectória do veículo para a esquerda, em relação ao seu sentido de marcha ocupando a via de trânsito do sentido oposto, indo embater com a sua parte anterior esquerda, na parte central esquerda do velocípede, fez com que este tenha sido projectado, juntamente com o seu condutor para o seu lado esquerdo, a uma distância considerável. 12. O falecido seguia precisamente já na sua faixa de rodagem, quando foi abalroado violentamente pelo condutor do veículo 81-38-..., não tendo tido o condutor do velocípede tempo de reagir ou de efectuar qualquer manobra evasiva para evitar o acidente. 13. O condutor do velocípede mudou de direcção para a esquerda e efectuou a manobra e, quando foi embatido já estava na via que pretendia tomar e no lado destinado ao seu sentido de circulação. 14. No dia e hora referidos, seguia o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula 81-38-... pela hemifaixa de rodagem direita da Rua …, nesta Comarca, atento o sentido de marcha E.N. 111/1 – …, a uma velocidade de, aproximadamente, 30/40 km/hora, sendo certo que o seu condutor seguia atento à condução que efectuava, bem como ao resto do trânsito que se processava naquela via. 15. Neste circunstancialismo, quando assim circulava, no momento em que se preparava para passar pelo arruamento que dá acesso ao Lugar do L…, foi o condutor … surpreendido pelo aparecimento súbito e inesperado de um velocípede sem motor, conduzido pelo falecido CC, qu 16. O falecido CC tripulava o indicado velocípede a uma velocidade de aproximadamente 15/20 km/h, pelo lado esquerdo do arruamento que dá acesso ao Lugar do …, atento o sentido de marcha Lugar do … – Rua …, não obstante aquela via possuir também dois sentidos de marcha, ou seja, circulando fora da sua mão de trânsito e de forma totalmente desatenta e negligente, 17. pelo que, ao chegar ao ponto onde o aludido arruamento entronca na Rua …, a vítima iniciou uma manobra de mudança de direcção para a sua esquerda, em direcção à E.N. 111/1, sem para tanto reduzir a velocidade a que seguia, sem parar à entrada do entroncamento, 18. e sem tão pouco ter olhado previamente para ambos os lados da Rua …, na qual pretendia entrar, não se tendo, assim, certificado se aí circulava algum veículo e se de referida manobra não resultava perigo ou embaraço para si e para o restante tráfego que, na altura, ali se processava. 19. Deste modo, a vítima avançou temerariamente através do referido entroncamento e, num acto contínuo, percorreu uma trajectória na diagonal, atravessando-se inopinadamente na frente do …, no momento em que este passava, cortando-lhe a respectiva linha de marcha. 20. O falecido CC Delgado não deu a esquerda ao centro de intersecção das duas vias e consequentemente, também não entrou na via que pretendia tomar pelo lado destinado ao seu sentido de circulação, ignorando, inclusivamente, o barulho que o motor e os rodados do … faziam ao circular, a escassos metros do entroncamento. 21. Se o condutor do velocípede tivesse abordado a entrada na Rua …, circulando pela direita, como devia, e se tivesse parado, ou abrandado à entrada do aludido entroncamento, como se lhe impunha, ter-se-ia apercebido de que o … circulava no sentido E.N. 111/1 – … daquela via, estando já muito próximo do entroncamento. 22. O condutor do .., ao ser subitamente confrontado com o velocípede sem motor, a surgir-lhe pela sua direita, ainda se desviou para o seu lado esquerdo, numa manobra de recurso e travou, com vista a evitar o acidente. 23. Contudo, apesar de circular a uma velocidade muito reduzida, não lhe foi possível evitar que o falecido CC, que prosseguiu a sua marcha, embatesse com a lateral esquerda central do seu velocípede no canto esquerdo da frente do … – cf. fotografias sob os docs. 4 a 7 e ainda o doc. 8. 24. O embate ocorreu dentro da hemifaixa de rodagem direita da já referida Rua …, considerando o sentido de marcha do …, próximo do eixo da via. 25. Atentas as circunstâncias em que o falecido surgiu ao condutor do …, era impossível a este último evitar o embate. 26. O embate ocorreu na faixa sentido norte – sul da Rua …, faixa esta onde a vitima já seguia contrária ao condutor do veículo 81-38-..., tendo o condutor do veículo 81-38-... invadido a faixa de rodagem por onde circulava o velocípede, abalroando-o. 27. Tratou-se de uma situação de cruzamento de veículos situado no interior de localidade. 28. No período que mediou entre a produção do acidente e o decesso do infeliz CC, e durante pelo menos 45 minutos, o CC teve a percepção da morte, sentindo e sofrendo. 29. O CC contribuía anualmente para o erário familiar, com a quantia de 13.300,00 euros, com margem de progressão, e contribuía para a despesa do empréstimo da casa. 30. Após a morte do seu marido, a autora teve necessidade de fazer mais horas de serviço, assim como trabalhar na privada de modo a poder fazer face às despesas que eram suportadas pelos dois rendimentos. 31. O CC auferia à data do seu falecimento um valor mensal médio de 750,00 euros. 32. A autora anda com a carteira do CC na sua carteira com todos os seus documentos, agindo como se o CC ainda fosse vivo na sua vida, lutando assim contra a imensa dor que é evidente perante todos os amigos íntimos e chegados que foram de ambos. 33. Que as roupas, óculos e calçado que o CC usava no momento da ocorrência destruídos apresentavam os seguintes valores - óculos de ciclismos partidos no valor de 35,00 euros; sapatilhas vermelhas, brancas e pretas Newfeel de ciclismo no valor de 45,00 euros; Calções pretos de lycra (de ciclismo) no valor de 30,00 euros; t-shirt de ciclista no valor de 35,00 euros. - tudo no valor de 145,00 euros. 34. A morte do CC veio “matar” em definitivo o sonho de concretizar o desejo de ambos de terem um filho biológico, e que passa pela aprendizagem de abdicar ter filho de forma natural, sem o seu companheiro, pela idade. 35. A bicicleta que o CC utilizava, marca Rochride, modelo montanha, que ficou inutilizada tinha o valor de 125,00 euros. III – DIREITO 1. Como inequivocamente flui do disposto nos arts. nos arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do Cód. Proc. Civil, o âmbito do recurso é fixado em função das conclusões da alegação do recorrente, circunscrevendo-se, exceptuadas as de conhecimento oficioso, às questões aí equacionadas, sendo certo que o conhecimento e solução deferidos a uma[s] poderá tornar prejudicada a apreciação de outra[s]. De tal sorte, e tendo em mente esse conjunto de finais proposições com que a Ré ultima as respectivas alegações, cuidemos das questões em tal contexto suscitadas. 2. Preliminarmente, começa a Ré por se insurgir contra o Acórdão recorrido, na medida em que fixou o grau de contribuição para os danos em resultado do acidente, na proporção de 70% para o veículo ligeiro e 30% para o velocípede. Com efeito – diz a Ré - esse grau da contribuição de risco para o acidente deve ser estabelecido em função de todas as concretas circunstâncias que rodearam tal sinistro, nas quais se incluem não apenas as características dos veículos, mas também os riscos inerentes aos seus condutores, a forma como estes os tripulavam, as manobras que levaram a cabo, as possibilidades que teriam de evitar o acidente e as condições/características da via. Ora – mais refere - resulta da factualidade provada que vários factores associados ao falecido condutor do velocípede contribuíram para propiciar e potenciar o risco da verificação do acidente e o agravamento do respectivo dano: 1 - Desde logo, a circunstância de o Falecido ter interceptado uma via prioritária, dando início a uma manobra de mudança de direcção, num entroncamento de má visibilidade, onde o mesmo não gozava de prioridade de passagem, fazendo-o a uma velocidade compreendida entre os 10 e os 13 km/h, criou um importante risco e potenciou de forma relevante o embate que acabou por eclodir no sobredito entroncamento. 2 - Depois, tendo em conta a factualidade vertida nos Pontos VII, VIII, IX e XXI dos Factos Provados, também o factor da reduzida visibilidade gera indiscutivelmente mais risco por banda do velocípede, impondo ao seu condutor cuidados acrescidos na abordagem do entroncamento, tanto mais que não gozava de prioridade de passagem. 3 - Por outro lado, o veículo ligeiro circulava a uma velocidade compreendida entre os 42 e os 48 km/hora, sendo certo que, de acordo com as regras da experiência comum, os veículos com as características daquele fazem barulho quando estão em circulação, quer por força da massa de ar que deslocam, quer em virtude do ressoar dos pneus no asfalto. Como assim, e tripulando o Falecido um velocípede, ser-lhe-ia mais fácil aperceber-se da aproximação do veículo ligeiro, do que o condutor deste último ter a percepção de que um velocípede se aproximava do entroncamento. 4 - Também, e contrariamente ao que vem defendido no Acórdão, tem de atender-se ao facto de os velocípedes, para além de proporcionarem uma menor estabilidade na execução das manobras, representarem, em caso de acidente, um risco de lesão para o seu condutor, atenta a sua exposição muito superior à de um veículo ligeiro. 5 - Para além disso, a obesidade do falecido CC - cujo peso ascendia a cerca de 102 kg -, deverá igualmente ser um elemento a atender, pois resulta da normalidade das coisas e das regras da experiência comum que a obesidade de um condutor de um velocípede necessariamente lhe reduz a agilidade e dificulta a execução das manobras no menor espaço de tempo possível, o que, representa um risco acrescido para a segurança rodoviária. 6 - A acrescer a tudo isto, terá de se considerar-se a circunstância de o Falecido circular com uma taxa de álcool no sangue de 0,44 g/l e ainda o facto de lhe ter sido detectada a presença de substâncias ilícitas ‑ substâncias canabinóides - no sangue. Nestes termos – mais diz a Ré - forçoso é concluir que os riscos de circulação gerados pelo velocípede, conduzido nas concretas circunstâncias que rodearam o sinistro, são substancialmente superiores àqueles gerados pelo veículo ligeiro, pelo que deve o grau de contribuição do risco para esse mesmo sinistro ser fixado na proporção de 60% para o primeiro (velocípede) e de 40% para o segundo (ligeiro), em consequência se reduzindo proporcionalmente as indemnizações fixadas à A. e ao ISS, IP. Ainda que assim se não entenda – aduz ainda e por fim - e venha a considerar-se que alguns dos factores levados em consideração pela 1.ª Instância – ao fim e ao resto, acima expendidos - não devem ser atendidos, deverá ser declarado que os riscos gerados por ambas as viaturas eram, pelo menos, iguais, tudo com as necessárias consequências legais. 2.1. No douto Acórdão ora em crise, versando a questão ora em foco, e começando por se reportar à sentença recorrida, é dado ler: - “No respeitante à questão do grau de contribuição de cada veículo para a responsabilidade pelo risco, disse-se na sentença apelada que: “A regra, na matéria da responsabilidade pelo risco, é que “a responsabilidade é repartida na proporção em que cada um dos veículos houver contribuído para os danos” cf. art. 506.º, n.º 1, do CCivil e impõe ela que se apure em que medida os danos produzidos podem ser atribuídos ao risco gerado por cada um dos veículos intervenientes, o que implica a formulação, perante a concreta situação, de um juízo “da idoneidade de cada veículo para, nas condições ocorridas, provocar danos”. E, em nosso entender, surpreendemos, no caso concreto – vários factores que contribuíram para propiciar/potenciar o risco da verificação do acidente/agravamento do dano: considerando o entroncamento em referência (e o tipo de manobra que o velocípede realiza, interceptando via prioritária, sendo que o velocípede perderia prioridade), as circunstâncias apuradas quanto a características (dimensões, peso e potência) dos veículos envolvidos, a menor estabilidade do veículo de duas rodas e exposição do respectivo tripulante, a corpulência do ciclista, alcoolemia deste ultimo e contacto com substancias ilícitas (embora não contra-ordenacional ou penalmente relevantes e não confirmado que em concreto fossem causante ou concausante, relevarão nesta plano do risco) - levam-nos a assacar ao velocípede maior contribuição em termos de risco, sendo adequado fixar a contribuição do risco do ligeiro para a produção dos danos verificados em 40% e a do velocípede em 60%. E se em abstracto as potencialidades do risco causado por uma bicicleta não sejam comparáveis às que decorrem da utilização de um veículo automóvel, a perda de prioridade, corpulência do falecido, as substancias referidas, a reduzida visibilidade levam-nos a apontar um maior contributo do risco de circulação da bicicleta para a eclosão do evento lesivo. Na ausência de culpas atribuíveis aos intervenientes no acidente, resta assim a responsabilidade objectiva de cada uma das partes em presença, nos termos dos arts. 503.º, 489.º, 505.º e 506.º, todos do CCivil.”. E prosseguindo: “Discorda-se do decidido nesta parte, tendo por mais correcta outra visão desta questão ora em apreço, mais perto da posição defendida pela A./recorrente. A sentença recorrida baseou-se em quatro factores para estabelecer a proporção que fixou para a responsabilidade pelo risco (perda de prioridade, corpulência do falecido, álcool e sustâncias ilícitas e reduzida visibilidade). Quanto à perda de prioridade é um factor que não pode ser tido em conta, uma vez que não se apuraram as causas do acidente e se excluiu a culpa de ambos os condutores. Aliás, a perda de prioridade para o velocípede tem valor equivalente à aproximação de um entroncamento, com a obrigatória redução de velocidade para o condutor do veículo ligeiro. A corpulência de qualquer ciclista, desde que não implique redução da sua agilidade e dificulte a execução de manobras no menor espaço de tempo possível – o que no caso não se apurou, nem se divisa que assim fosse quanto ao falecido (homem com 44 anos, com 1,80m de altura por cerca de 103 kg de peso) -, não tem qualquer influência na sua responsabilidade pelo risco em caso de acidente. Relativamente às substâncias referidas, está provado, sob XXIX, que a canábis que revelava não era compatível com a produção de qualquer tipo de alterações psicoactivas. Já no respeitante ao álcool apresentado no facto provado XXX, de 0,44 g/l, também se provou, sob facto XXXI, que antes de iniciar a condução o falecido havia ingerido bebidas alcoólicas. Ora, como justamente salienta a R., ainda que os valores apurados não sejam contra-ordenacional ou penalmente relevantes, o certo é que é um dado científico que a condução de um velocípede por um condutor nas circunstâncias acima descritas constitui um risco acrescido, comparativamente com o risco gerado pela condução de alguém que não apresenta qualquer taxa de álcool, no sangue. Como é sabido o risco causado pela circulação de um veículo conduzido por um condutor que apresenta uma taxa de álcool de 0,44 g/l é substancialmente superior ao risco do outro veículo, cujo condutor não tenha ingerido bebidas alcoólicas, devido às consequências do álcool sobre as faculdades dos tripulantes, designadamente no que tange a rapidez de reflexos e a capacidade de discernimento. De resto, assim se explica que o legislador tenha previsto um limite máximo de álcool no sangue de 0,2 g/l para determinado tipo de condutores, pelas específicas condições e funções que desempenham no exercício da condução (condutores em regime probatório, condutores de pesados de mercadorias, de veículos urgentes, de transportes de jovens e menores, etc). Embora em maior ou menor intensidade, conforme a constituição física e o metabolismo variáveis de pessoa para pessoa, como é compreensível e é do senso comum, é certo que a ingestão de álcool pode produzir graus de alcoolémia diferentes. Mas o que é também certo cientificamente seguro é que o álcool é um factor que influencia a condução de alguém. Finalmente, relativamente ao factor da reduzida visibilidade, esta era uma realidade presente para os dois intervenientes no sinistro, pois provou-se que a vegetação era alta e influenciava a visibilidade (cfr. factos provados VII a X), pelo que o falecido ciclista e o condutor do ligeiro estavam em igualdade de circunstâncias. Igualmente é de rejeitar, como determinante, a contra-argumentação da R. de que os velocípedes representam, em caso de acidente, um risco de lesão para o seu condutor, atenta a sua exposição, muito superior ao de um veículo ligeiro, porque a aceitar tal argumento invertia-se aquilo que é um dado de imediata e instintiva compreensibilidade, o de que um veículo ligeiro atenta a sua maior massa de embate (peso x velocidade) causará, em regra, salvo casos muito excepcionais, um muito maior dano do que um velocípede. Assim como se rejeita outro argumento da mesma R., o de o ciclista poder aperceber-se mais facilmente da aproximação do veículo automóvel, do que o inverso, atento o barulho que o respectivo motor e os rodados provocavam, estando, assim, em melhor posição para poder evitar o acidente do que o condutor do …. Cabe então perguntar: Mas qual barulho ? Que barulho é que se apurou que foi produzido ? E será que o ligeiro produzia barulho ? Onde foi a R. buscar tal conclusão ?” E ainda: “Deste modo, nos casos em que a dinâmica do acidente permaneça indeterminada, deve inferir-se essa percentagem dos riscos típicos de circulação, para além das condições da via e tempo e da destreza da condução, das características estruturais de cada um dos veículos intervenientes – e, desde logo, da sua dimensão relativa e peso. Assim é, se se tiver em conta que a medida do risco causado com a circulação rodoviária de certa viatura se deve fixar em função da sua vocação ou apetência para, em caso de colisão, provocar danos acrescidos no outro ou outros intervenientes no sinistro: note-se que a maior fragilidade e menor grau de segurança de um dos veículos intervenientes numa colisão, enquanto determina efectivamente uma maior apetência para provocar danos relevantes ao seu próprio utilizador, implica uma típica redução do risco de lesão grave nos outros utilizadores da via pública que conduzam viaturas mais sólidas, pesadas ou estáveis. Ora, sendo este segundo o factor decisivo, é evidente que é substancialmente maior a capacidade de um veículo automóvel infligir danos relevantes ao utilizador de um motociclo, ciclomotor ou velocípede, com o qual colida em circunstâncias indeterminadas do que a apetência para o ciclista lesar gravemente o condutor do automóvel envolvido na colisão (como é notório e resulta, de forma paradigmática, da gravidade extrema das lesões sofridas no acidente dos autos pelo ciclista – a morte - envolvido na colisão com a viatura segurada) - vide neste sentido os Acds. do STJ, correspondentes a jurisprudência pacífica, de 7.10.2010, Proc.839/07.6TBPFR, em www.dgsi.pt, e 10.4.2014, Proc.443/12, Sumários 2015, pág. 244, e Oliveira Matos, C. Estrada Anotado, 5ª Ed., 1988, págs. 467/468. Nesta conformidade, considerando que os 4 factores a que a 1ª instância atribuiu relevo diferenciador, tais como a perda de prioridade, corpulência do falecido, substância ilícita e reduzida visibilidade, não podem ser subscritos, e a matéria apurada, designadamente as velocidades de circulação 42 a 48 km para o veículo ligeiro e 10 a 13 km para o velocípede, a diferença objectiva de dimensão e peso de cada um, com as consequentes diferentes massas de embate, muito mais grave da parte do ligeiro, o pouco relevo derivado de o ciclista ser portador de um capacete de protecção de ciclista (como se vê das fotografias nos autos) em casos de projecção contra o solo ou rails metálicos da estrada, o facto de o mesmo circular com uma taxa de álcool, por antes de iniciar a condução ter ingerido tal substância, embora em grau diminuto, e o facto de circular num velocípede, veículo de características instáveis, entende-se que a contribuição do risco de cada um para os danos produzidos deve ser repartida na proporção de 70% para o ligeiro e 30 % para o velocípede.” Assim se concluindo: “Por isso, procedendo, parcialmente, o recurso da A. nesta parte.” Que dizer sobre estes desencontrados entendimentos? Vejamos. 2.2. Havendo que assentar – por isso que se apresenta pacífico - , não se ter feito a prova da culpa de qualquer dos intervenientes no acidente em presença, força é concluir como tendo estado na génese desse mesmo acidente, residualmente, o risco próprio dos veículos nele envolvidos, o veículo automóvel ligeiro seguro na Ré e o velocípede conduzido pelo Falecido Assim sendo, como é, para apurar das responsabilidades objectivas de tais intervenientes –“maxime” condutor do veículo ligeiro, vemo-nos sem mais remetidos – como também não suscita controvérsia ‑ para o estatuído no já referenciado art. 506º. Dispõe este preceito, no seu nº 1, que “[s]e da colisão entre dois veículos resultarem danos em relação aos dois ou em relação a um deles, e nenhum dos condutores tiver culpa no acidente, a responsabilidade é repartida na proporção em que o risco de cada um dos veículos houver contribuído para os danos; se os danos forem causados somente por um dos veículos, sem culpa de nenhum dos condutores, só a pessoa por eles responsável é obrigada a indemnizar.” Por sua vez, o subsequente nº 2 prescreve que “[e]m caso de dúvida, considera-se igual a medida da contribuição de cada um dos veículos para os danos, bem como a contribuição da culpa de cada um dos condutores.” Tendo em mente, justamente, o ora reproduzido preceito legal, a ora recorrida Relação de …, por douto e impressivo Acórdão de 2.12.2003[3] decidiu – com o que não podemos estar mais de acordo ‑ , que “[a] questão da repartição do risco é matéria delicada, sendo certo que não são considerações abstractas que interessam à aplicação prática do art. 506º, mas a proporção em que o risco tenha contribuído no caso concreto para a produção dos danos registados.” Nestes termos, pois, sendo só em face dos elementos circunstanciais do caso concreto que se quadra possível devidamente aferir e graduar da responsabilidade pelo risco, logo se conclui que não é a simples, redutora, consideração/comparação das características dos veículos envolvidos – peso, potência motriz, envergadura, dificuldade de manobra, instabilidade, etc.‑, que constitui base válida, decisiva, em que fazer assentar esses judicatórios procedimentos. Consoante escreve o Prof. Antunes Varela[4] “[e]m tese geral, pode com efeito dizer-se que os veículos ligeiros, como as bicicletas motorizadas, os motociclos, são especialmente perigosos, pelas velocidades excessivas que atingem, pela pouca estabilidade que oferecem, etc., ou que o risco das viaturas pesadas se torna particularmente grave, devido à largura, à altura, ao peso e, em certo aspecto, à pouca velocidade do veículo.” E prosseguindo: “O que interessa, porém, à aplicação prática do artigo 506º não são essas considerações abstractas, mas a proporção em que o risco de cada um dos veículos haja contribuído, em cada caso concreto, para a produção dos danos registados.” Para concluir: “É, por consequência, na análise das condições em que a colisão se verificou, e no exame das circunstâncias em que os danos se produziram, que o julgador encontrará os principais elementos capazes de o auxiliarem a fixar conscienciosamente a tal proporção a que a lei se refere.” No mesmo pendor, anota Ana Prata[5] que na expressão “riscos próprios do veículo” “[…] se compreendem tanto os riscos da máquina como, numa interpretação extensiva fundada teleologicamente na necessidade que a norma visa de proteger, tão amplamente quanto possível, os lesados por acidentes desta natureza, os riscos do meio em que ela circula e os do respectivo condutor. “ E seguindo: “Esta interpretação não parece justificativa de dúvidas, porquanto um veículo de circulação terrestre não pode ser utilizado sem um piso em que se mova e um condutor que dirija o seu movimento; mesmo que não se encontre em circulação, em algum local está parado e alguém o parou onde se encontra. Tudo quanto é indispensável à utilização do veículo integra os seus “riscos próprios.” Para findar: “Daí que um piso escorregadio constitua um risco de um veículo em circulação rodoviária como um acidente vascular ou cardíaco do condutor o seja também. Este mesmo douto entendimento, tem sido também o perfilhado por este Tribunal Supremo, podendo citar-se, entre outros, o Ac. de 10.04.2014[6] – no sumário do qual consta que “[n]a apreciação da repartição do risco haverá que atender às condições intrínsecas dos veículos intervenientes – designadamente, massa física, dinâmica do veículo, características de funcionamento e composição mecânica –, por outro lado, às condições próprias do tempo e da via em que o concreto veículo circulava e, finalmente, à aptidão, perícia e destreza de condução do próprio tripulante do veículo:” Também o Ac. de 11.04.2013[7] – em cujo sumário, começando por se ler: “O capacete constitui um equipamento necessário à condução, que tem como objectivo evitar danos graves em caso de acidente, sendo – por isso mesmo – um meio atinente à condução.”; mais de refere: ”Por essa mesma razão deve integrar o conceito de veículo para efeitos do n.º 1 do art. 506.º do CC, ou seja, para efeitos dos riscos que cada um dos veículos trouxe para a produção dos danos.” Por fim, ainda o Ac. de11.04.2011[8] – de cuja síntese conclusiva consta que “[n]ão merece censura o acórdão da Relação que, perante o não apuramento da culpa de qualquer dos condutores, graduou a responsabilidade pelo risco na proporção de 75% para o condutor do veículo automóvel ligeiro de passageiros e de 25% para o condutor do motociclo, depois de ter ponderado que a incidência espacial do local do sinistro – designadamente a largura da faixa de rodagem (que se mostrava reduzida em face a situações de normalidade) e o traçado da mesma (em curva) –, sendo propiciadora da colisão (do ligeiro no motociclo) e conjugada com a desproporção física dos veículos, sustentava um factor agravador dos danos por parte do ligeiro face ao motociclo. 2.3. De posse de todo este contigente de autorizados considerandos, e por ele iluminados, revertendo ao caso ora ajuizado, diremos, antes de mais – e no sentido de infirmar, sempre ressalvando o muito respeito, o constante da objecção que supra referenciámos sob o n.º 1: intercepção pelo Falecido de via prioritária ‑, que subscrevemos tudo o exarado a tal respeito no Acórdão ora em apreciação. Podendo ainda acrescentar-se que – tal como acontece [felizmente] na esmagadora maioria das situações ‑, observados os cuidados e precauções indispensáveis, e designadamente aqueles especificamente decorrentes das regras estradais[9], a sempre divisável possibilidade de acidente ínsita a um entrocamento de vias rodoviárias surge à partida excluído, não sendo assim justificado, se bem cuidamos, considerar em diferente situação, quanto a possível geração de perigo, um qualquer dos condutores de tais vias intercepcionadas. E, desse modo, o mesmo se nos enseja de dizer quanto ao vertido na douta objecção retro referenciada com o n.º 2 – reduzida visibilidade ‑, surgindo-nos para nós decisivo, a confortar o modesto entendimento que ora advogamos, o teor do Facto n.º XXI. Tendo em mente esta materialidade, bem assim como aquela constante dos demais Factos convocados pela Ré, sem dúvida que – tal como proclamado no dito aresto -, as adversas condições de visibilidade constituíam – e de modo equipolente - realidade penalizadora, e geradora de risco, para um e outro dos condutores. No que tange à douta objecção elencada sob o n.º 3 – barulho da circulação do automóvel - também não vemos como dissentir do Acórdão - e, portanto, do seu pendor infirmativo da aludida objecção - , tanto mais que se ignora de todo o ambiente em termos acústicos existente no local, sendo como é pensável, p. ex., a concorrência de um outro ruído, ou conjunto de ruídos – e não só resultante do trânsito de veículos outros – “abafar” por completo o barulho – e que barulho?[10] - da marcha do veículo seguro, relativamente à pessoa do Falecido. Fazendo incidir agora a nossa atenção sobre a douta objecção reportada, supra, sob o n.º 4 – menor estabilidade e mais ampla desprotecção do respectivo condutor por parte dos velocípedes - , diremos que a nosso ver, e sempre salvaguardando o muito respeito, uma vez mais as considerações a esse respeito vertidas no Acórdão se nos afiguram de sobraçar. Com efeito, ponderando as características dos veículos, a sua estrutura objectiva e orgânica, se é certo que o velocípede enferma de uma maior potencialidade lesiva, em termos passivos – digamos, assim -, ao automóvel assiste, por sua vez, e contrapostamente, essa superior potencialidade em termos activos, sendo habitualmente, até, esta última considerada de maoir peso e relevância quando posta em confronto a perigosidade da circulação de ambos esse veículos. Neste sentido, quadra-se-nos referenciar, entre muitos outros, os Acs. deste Supremo[11] de 15.11.2017 [Proc. n.º 549/08] - 70% para automóvel, 30% para ciclomotor - , de 14.04.2011 [já referenciado] – 75% para automóvel e 25% para motociclo - , de 26.10.2004 [Proc. n.º 1707/04] e de 14.10.2010 [Proc. n.º 1600/06] – 2/3 para automóvel e 1/3 para motociclo - , de 16.12.2012 [Proc. n.º 1043/03] – 80% para automóvel e 20 % para velocípede sem motor -, e de 2.11.2004 [Proc. n.º 2958/04] – 65% para automóvel e 35% para ciclomotor. Deste modo, pois, a “parificada” perigosidade dos veículos intervenientes, ponderadas as respectivas características, levada a efeito no Acórdão ora sob censura, apresenta-se-nos, no mínimo, e como dito, de subscrever. E outro tanto haverá que referir no tocante a essa outra objecção por parte da Ré – acima referenciada sob o n.º 5: obesidade do Falecido ‑, sendo certo que, a exemplo do observado no Acórdão em exame, não se vê que, sem mais, tal condição do infeliz velocipedista relevasse em modo tal a implicar expressão de agravamento no concernente à perigosidade da circulação do respectivo veículo
Por fim, e relativamente à restante objecção formulada pela Ré – circulação do Falecido com positiva taxa de álcool no sangue, e vestígios de consumo de substâncias ilícitas - , somos também, incontornavelmente, levados a aderir à exposição e correspondente veredicto a esse propósito plasmados no aresto recorrido, designadamente desvalorizando em absoluto esses vestígios a título de factor para a eclosão do sinistro, vista a demonstrada – como salientado nessa douta peça - , completa inocuidade ou inoperância da respectiva substância, ao tempo, em termos de alterações psicoactivas do seu portador, o dito Falecido. 2.4. Aqui chegados, nenhuma alteração se nos impondo, pois, efectivar no quadro dos elementos tidos em equação no Acórdão em foco, visando aferir da medida da responsabilidade pelo risco da circulação de um e outro dos veículos intervenientes, e também nenhuns elementos complementares se nos oferecendo de aditar, temos que a repartição ali operada se nos evidencia ajustada e conforme. Portanto, confirma-se esse estabelecido parcelamento – 70% para o automóvel e 30% para o velocípede.
3. Prosseguindo, adversa também a Ré o Acórdão em apreço, tendo em conta o montante indemnizatório atribuído à A – 65.000,00 € - pela perda do direito à vida do seu falecido marido. Com efeito – aduz - quando se trata de indemnizar o bem "vida", não pode deixar de se atender a todos os sinais que possam indiciar os cuidados, ou a ausência deles, que as vítimas emprestavam à sua própria vida. Ora, no caso dos autos, ficou demonstrado que o Falecido circulava com uma taxa de álcool no sangue de 0,44 g/l, para além de que também apresentava substâncias canabinóides no sangue, colocando-se por isso, voluntariamente, em situação de maior risco de sofrer um acidente. Revelando, assim, o resultado da decisão que o Falecido tomou, no mínimo, uma falta de cuidado em relação à sua própria integridade física, afigura-se mais justa e adequada – diz por fim a Ré - a fixação do montante indemnizatório ora em consideração no valor de 50.000,00€, devendo a indemnização correspondente a arbitrar à A. ser reduzida proporcionalmente em função da percentagem de contributo de risco do velocípede para o acidente.
3.1. No Acórdão ora “sub judicio”, após se transcrever o explanado na sentença a respeito da questão ora em atinência, mais se consignou: - “A R. pretende que o valor fixado seja antes de 50.000 €, invocando a seu favor diversos arestos do STJ e a Portaria 377/2008, de 26.5. . Não aceitamos tal intento, acompanhando-se, ao invés, as considerações jurídicas produzidas na decisão apelada, assim como a tendência jurisprudencial nela citada. Efectivamente parece-nos evidente que em termos de busca e fixação do valor dos danos advenientes da responsabilidade civil extracontratual (morais/patrimoniais) os princípios da igualdade e da unidade do direito e o valor da previsibilidade da decisão judicial devem vincular à padronização e à normalização do valor da indemnização. Quando for caso semelhante ou aproximado, pois que a casuística das situações da vida é infindável (tal e qual este mesmo colectivo defendeu no Ac. de 27.9.2016, Proc.2206/11.8TBPBL, em www.dgsi.pt). Ora, ainda recentemente, em 12.12.2017, o actual relator e 1º adjunto, subscreveram acórdão (como 1º e 2º adjunto respectivamente), no Proc. 370/12.8TBOFR, em que se teve em consideração que o valor de 65.000 € pela perda da vida, para um homem de 44 anos (idade igual ao falecido), era de conceder, pois que ele está conforme à jurisprudência fixada pelo STJ, o qual tem fixado este valor entre 60 e 100 mil euros. Assim, e a título muito exemplificativo, citaram-se: o Ac. do STJ de 23.2.2011, Proc.395/03.4GTSTB, que fixou em 80.000 € para fenecido de 23 anos, académico; o Ac. do STJ de 8.9.2011, Proc.2336/04.2TVLSB, arbitrou-se 100.000 € para uma infortunada jovem de 14 anos; o Ac. do STJ de 19.4.2012, Proc.569/10.1TBVNG, fixou-se 60.000 €; e no Ac. de 31.05.2012, Proc. 14143/07.6TBVNG, arbitrou-se a quantia de 80.000 € para um jovem de 19 anos. Por outro lado, não se podendo esquecer, como salientado por Meneses Cordeiro, Direito dos Seguros, 1ª Ed., 2013, pág. 847 (que começa por ridiculizar, por manifestamente baixos, os valores, e justificação para os mesmos, atribuídos em algumas indemnizações arbitradas nos nossos tribunais superiores), que a defesa do sistema segurador se faz combatendo os acidentes e não as indemnizações, não valendo a pena dispormos de uma Constituição generosa, de uma rica e cuidada jurisprudência constitucional e de largos desenvolvimentos sobre os direitos de personalidade quando, no terreno, direitos fundamentais como a vida valham menos de 60.000 €. Pelo que tendo em conta os factos provados que mais atrás destacámos, designadamente que o fenecido tinha 44 anos, era saudável, vivia em harmonia com a mulher A., com projecto de serem pais, tinha muitos amigos, trabalhando como delegado comercial, a jurisprudência referida e as considerações tecidas - não devendo, por seu turno, considerar-se o grau de alcoolémia, como a R. defende, pois tal elemento serviu apenas para influenciar a contribuição para a responsabilidade pelo risco por parte do falecido -, o valor impetrado para o dano morte, porque ajustado, é de deferir, mantendo-se o valor de 65.000 € decidido na decisão recorrida.”
Rematando-se: “Face ao grau de contribuição para a responsabilidade pelo risco, que anteriormente se fixou, em 70% para o ligeiro, a indemnização a arbitrar à A., nesta parte, ascende a 45.500 €.” 3.2 Ora, e como se escreveu no Acórdão proferido por esta Conferência a 30 do pretérito mês de Outubro[12], “[n]a esteira do decidido no Ac. deste Alto Tribunal de 24.10.2013[13], é também nosso modesto entendimento que “[s]e o STJ é chamado a pronunciar-se sobre o cálculo de uma indemnização assente em juízos de equidade, não lhe compete a determinação exacta do valor pecuniário a arbitrar, mas tão somente a verificação exacta acerca dos limites e pressupostos dentro dos quais se situou o referido juízo equitativo.”[14] Este mesmo douto entendimento vê-se replicado em diversos arestos do mesmo Tribunal, ensejando-se-nos convocar ainda o Ac. de 17.12.2015[15] [citando o congénere Acórdão 28.10.2010[16], este, por sua vez, em parte fazendo-se eco do acórdão do mesmo Tribunal de 5.11.2009[17] ‑ nele se lendo que “a aplicação de puros juízos de equidade não traduz, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito”; [pelo que o STJ ] se é chamado a pronunciar-se sobre “o cálculo da indemnização” que “haja assentado decisivamente em juízos de equidade”, não lhe “compete a determinação exacta do valor pecuniário a arbitrar […], mas tão somente a verificação acerca dos limites e pressupostos dentro dos quais se situou o referido juízo equitativo, formulado pelas instâncias face à ponderação casuística da individualidade do caso concreto «sub iudicio»[18]”. 3.3. Pois bem. Como logo se alcança, tendo em conta a supra transcrita exposição constante do douto Acórdão ora em exame, as considerações acabadas de plasmar, datadas desse nosso convocado e precedente labor, induzem-nos necessariamente, aqui e agora, a confirmar a valoração do dano em presença efectuada naquele aresto da Relação. Efectivamente, e como em tal exposição se elucida, essa estipulada valoração compagina-se ou inscreve-se perfeitamente no leque de cifras que, para compensação desse dano – perda de vida - , vem sendo por este Supremo tido como equitativamente estimado, à luz – como imperativamente se impõe - , das regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida. E assim sendo, acresce que, quanto a nós, tanto a quantidade de álcool, como os vestígios de substâncias canabinóides, detectados no Falecido, desde logo pela sua quase irrelevante expressão – notadamente quanto a essas substâncias - , de todo indutora de um curso de vida desregrado por parte do Falecido, de modo algum apontam para que – conforme pretendido pela Ré - o mesmo fosse uma pessoa descuidada consigo e com a sua integridade física, protagonizando uma vivência de falha de vulto e apreço. Tanto que – como também demonstrado: ut Facto n.º XXXV - , tendo 44 anos de idade, era um homem saudável, com esperança de vida à sua frente, vivendo em perfeita harmonia com a A.. 3.4. Deste modo, pois, mantém-se o valor do dano morte protagonizado pelo Falecido nessa estabelecida verba de 65.000,00 €, e, portanto, por igual em 45.000, 00 € a correspondente indemnização à A.. 4. Dissente também a Ré do Acórdão em referência, no segmento em que fixou em 30.000,00€ o montante indemnizatório pelos danos não patrimoniais sofridos pela própria A., mercê do decesso do seu aqui sinistrado marido. Obtempera que essa atribuição pecuniária se revela desajustada, quando cotejada com atribuições de idêntica natureza e em situações semelhantes ou aproximadas, invocando jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores donde resultaria que têm vindo a ser arbitradas indemnizações próximas dos 25.000,00€ para ressarcir os danos não patrimoniais de cônjuges, em consequência de acidentes estradais. Por outro lado – diz outrossim -, sucede que essa indemnização no Acórdão arbitrada é muito superior àquela que o legislador entendeu que seria, no caso, ajustada, mais precisamente em função do regime instituidor da criação da "proposta razoável" que as seguradoras devem apresentar ao lesado, em cumprimento do disposto nos arts. 38.° e 39.° do DL 291/2007 (e, anteriormente, nos termos previstos no DL 83/2006). Sendo que – acrescenta para findar -, recorrendo às regras das Portarias emergentes desses Diplomas, a compensação da A, pelos danos em apreço, seria na ordem dos 20.520,00€, posto que a mesma apenas estava casada com o Falecido há pouco mais de 1 ano, e, por isso, atento tudo o exposto, a indemnização a fixar-lhe não deverá ultrapassar o montante de 25.000,00€, a ser posteriormente reduzido por via do contributo do risco do velocípede para a ocorrência do sinistro. Vejamos. 4.1. Visando a quantitativa indemnizabilidade do dano agora em presença, no Acórdão recorrido, após, uma vez mais, se reproduzir o expresso a tal propósito na sentença apelada, mais se consignou: - “ A R. pretende que o valor fixado seja antes de 25.000 €, invocando a seu favor diversos arestos do STJ de 2012/2013 e de novo a Portaria 377/2008, de 26.5. Mutatis mutandis mantemos as considerações tecidas supra no ponto 4.1.[19], acrescentando as seguintes. Como este colectivo propugnou no aludido Ac. de 27.9.2016, o montante pecuniário da compensação deve fixar-se equitativamente, tendo em atenção as circunstâncias a que se reporta o artigo 494º do Código Civil (art. 496º, nº 4, 1ª parte, do CC). Na determinação da mencionada compensação deve, por isso, atender-se ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e à do lesado e às demais circunstâncias do caso, nomeadamente à gravidade do dano, sob o critério da equidade envolvente da justa medida das coisas (art. 494º do CC). A apreciação da gravidade do referido dano, embora tenha de assentar, como é natural, no circunstancialismo concreto envolvente, deve operar sob um critério objectivo, num quadro de exclusão, tanto quanto possível, da subjectividade inerente a alguma particular sensibilidade humana (vide Ac. do STJ, de 17.11.2005, em C.J., T. 3, pág. 127). Quer dizer, a reparação dos danos morais deve ser proporcionada à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, da justa medida das coisas, e da criteriosa ponderação das realidades da vida. Finalmente importando perspectivar as diversas decisões prolatadas em casos parecidos/similares para se tentar operar a fixação de valores semelhantes, pois que tal contribui não só para a certeza e segurança do direito como, também, para a consecução da justiça material, quer na sua vertente absoluta, quer na vertente relativa ou comparativa e para a imagem e o prestígio dos tribunais. Assim e neste particular atente-se em algumas deliberações do STJ: no Ac. de 27.10.2010, Proc.488/07.9GBLSA, arbitrou-se à viúva de um falecido de 40 anos, por danos não patrimoniais pela perda do marido, a quantia de 25 000€; no Ac. de 23.2.2011, Proc.395/03.4GTSTB, fixou-se a pai de vítima de 23 anos, académico, a quantia de 50.000 €; no Ac. de 12.9.2013, Proc. 1/12.6TBTMR, arbitrou-se, a cada uma dos progenitores de um jovem filho de 19 anos, a quantia de 35.000 €, no Ac. de 28.11.2013, Proc. 177/11.0TBPCR, arbitrou-se a uma filha de 58 anos pela morte de sua mãe com 78 anos, a quantia de 20.000 €. No caso sub judice apurou-se a factualidade que acima salientámos, designadamente que entre a A. e o falecido havia uma grande harmonia, sendo um casal feliz, com projectos para ter filhos, que a A. sofreu profundo desgosto e abalo psicológico, passando por fase de tristeza, angústia, e sentimento de perda, sendo casada com o falecido há cerca de 1 ano e 2 meses em relação á data fatídica do falecimento do marido, mas vivendo com ele já há cerca de 4 anos. Os factos apurados são prototípicos ou inseridos dentro de um padrão social e normal de relacionamento que se supõe existir entre marido e mulher, e que é, aliás, exigível ético/moralmente. Ou seja, e dito de outro modo, sem querer melindrar a A., não se apurou uma excepcional relação de afecto, cooperação e perene sentimento de perda, que o tempo inevitavelmente não poderá mitigar. A recorrente tem capacidade económica para pagar a indemnização que se fixar. Deve atender-se, igualmente, que a indemnização destinada a ressarcir os danos não patrimoniais sofridos por um qualquer lesado não deve revestir carácter miserabilista, nem deve cair em excessos. Nesta conformidade, e tendo em linha de consideração todo o quadro descritivo acima mencionado, e a jurisprudência dos tribunais superiores, entende-se - fazendo apego a um juízo de ponderação e equidade, e em respeito pelas regras da boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas (cfr. A. Varela, CC Anotado, Vol. I, 3ª Ed., nota 6. ao artigo 496º, pág. 474), sem esquecer os aumentos dos seguros obrigatórios estradais e seus valores actuais de cobertura, e aumento dos respectivos prémios, justificantes do aumento das indemnizações - ser equilibrado fixar a indemnização por dano moral a favor da A. em 30.000 €, a meio caminho entre o fixado na decisão recorrida e o pretendido pela R./apelante, que se tem por apropriado, adequado e proporcional.“ Na conformidade do que se encerrou, estatuindo: “Face ao grau de contribuição para a responsabilidade pelo risco, que anteriormente se fixou, em 70% para o ligeiro, a indemnização a arbitrar à A., nesta parte, ascende a 21.000 €. “ 4.2. Consoante, uma vez mais, de pronto se conclui, temos de novo à consideração um dano não patrimonial insusceptível de avaliação pecuniária e, portanto, a respectiva valoração ora em escrutínio resulta – a exemplo dessoutro dano imediatamente antes versado, e como no enfocado Acórdão expressamente se refere – de um juízo de equidade alicerçado – conforme as palavras do Ac. deste Supremo de 7.10.2010 – “numa ponderação prudencial e casuística das circunstâncias do caso – e não na aplicação de critérios normativos.” E assim sendo, como é, essa valoração, tendo em conta os fundamentos aduzidos a suportá-la – em especial, a descrita panorâmica jurisprudencial que, centrada neste STJ, se regista a respeito dessa mesma valoração, enquanto visando o dano moral sofrido por familiares próximos de vítima falecida - surge-nos também – e consoante o estipulado nesse douto aresto de 7.10.2010 – de manter, por isso que – e parafraseando de novo o mesmo - , “situando-se o julgador na margem de discricionariedade que lhe é[ra] consentida, se não revela colidente com os critérios jurisprudenciais que generalizadamente vêm sendo adoptados[20], em termos de pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade.” Preocupação esta que – como também “expressis verbis” dimana do Acórdão – na quantificação do dano em apreço se teve bem presente, e, daí, o recurso e explicitação de toda essa mencionada – e qualificada - panorâmica forense. 4.3. Como assim, e em suma, também a douta objecção recursória ora analisada soçobra, confirmando-se o “quantum” – 30.000,00€ - atribuído ao dano moral próprio da A. e, em consequência, também a correspectiva indemnização fixada, em função dessa estabelecida parcela causal do acidente, em 21.000,00€. 5. Ataca também a Ré o Acórdão a que nos vimos atendo, na parte em que a condenou a pagar à A. a quantia que vier a liquidar-se posteriormente "...a título de dano patrimonial emergente de obrigação alimentar." Refere, nesse “conspectu”, que o direito a alimentos consubstancia uma verdadeira excepção à regra estabelecida na nossa legislação de que só os danos ligados à relação jurídica ilicitamente violada contam para a obrigação de indemnizar imposta ao lesante. E porque tal direito assenta numa norma de carácter excepcional - o n.° 3, do art. 495.° do C.C. -, não bastava à A. a simples invocação da qualidades de cônjuge sobrevivo do Falecido para que, de modo automático, lhe fosse conferido o direito a uma indemnização a título de alimentos. Ora – prossegue -, provou-se que o Falecido, casado com a A. há cerca de um ano antes do acidente, vivia com ela numa casa pertencente à mesma, contribuindo para os encargos com a luz, água, alimentação e lazer (férias) do agregado familiar, composto por si e por aquela. Nada nos autos inculca, pois, que o sobredito contributo prestado pelo Falecido fosse entregue à A. com vista a fazer face a despesas próprias desta última, sendo certo que se provou, pelo contrário, que a mesma trabalhava e continua a trabalhar, auferindo um vencimento substancialmente superior ao do dito Falecido. Ora, o pretenso direito a alimentos da A. assume um carácter restritivo, pois acha-se circunscrito ao que assuma carácter indispensável –art. 2003.° do C.C. - , de acordo com as necessidades –“ idem”, art. 2004.° - dos lesados, sendo decorrência óbvia do carácter excepcional da regra inscrita no artigo 495.° do mesmo Diploma. Além disso, sucede que concreta necessidade da A. da prestação de alimentos e essa indispensabilidade da quantia a arbitrar traduziam-se na alegação e prova de factos, não sendo os mesmos de presumir para efeitos da concessão de atinente indemnização. De resto, está demonstrado nos autos que a A., para além dos rendimentos do seu trabalho, se encontra ainda a receber uma pensão vitalícia de sobrevivência, por morte do Falecido, que lhe vem sendo paga pelo Instituto de Segurança Social, I.P., circunstância que igualmente põe em causa o pressuposto da necessidade de alimentos por parte da mesma. Por outro lado, há que considerar que, atenta a idade da A. à data do falecimento do seu marido - 45 anos - é de supor que a mesma reconstrua a sua vida num futuro mais ou menos próximo, voltando a casar e assim constituindo uma nova família. Como tal, atenta a factualidade provada constante dos autos, não é possível afirmar que a A. careça de alimentos, nem tão pouco que deles vá necessitar no futuro, sendo até de presumir o contrário, pelo que – em suma - estava vedado ao Tribunal “a quo” conferir-lhe o direito a alimentos, devendo, por isso, nesta parte ser o respectivo Acórdão revogado. Quando assim não se entenda – diz ainda e por fim -, e se considere que resulta dos autos factualidade que permite concluir pela existência deste dano da A., deve então estabelecer-se como limite/tecto desse direito o valor fixado pelo Tribunal de 1.ª Instância - com o qual a mesma se conformou -, atendendo-se oportunamente à contribuição do velocípede para a responsabilidade pelo risco que vier a ser fixada. Nesse caso – remata - deverá, então, ser deduzido a esse montante os valores recebidos pela A. do interveniente Instituto de Segurança Social, I.P., a título de pensões de sobrevivência, que a aqui Ré/ Recorrente venha a ter de pagar àquele Instituto por força da decisão que vier a ser proferida. Vejamos, uma vez mais. 5.1. Do Acórdão recorrido, e visando a prolação do veredicto com que no mesmo se conclui, e que ora a Ré controverte, quadra-se ora reproduzir as seguintes passagens: - “No que respeita ao dano patrimonial assente na obrigação alimentar, grosso modo, a R. defende que não pode ser concedida a indemnização arbitrada a título de alimentos, pois não basta à A. a simples invocação da qualidade de cônjuge sobrevivo para que lhe seja atribuída, havendo que demonstrar a concreta necessidade deles, o que não ocorreu, pois o processo, pelo contrário, revela que a autora trabalhava e continua a trabalhar, auferindo um vencimento substancialmente superior ao do seu falecido marido, pelo que não reunidos os pressupostos legais da indispensabilidade (art. 2003º do CC) e da necessidade (art. 2004º do CC). Neste sentido, aponta dois Acds. do STJ consultáveis em www.dgsi.pt, o de 14.7.2009, Proc.1541/06.1TBSTS e de 3.11.2016, Proc.6/15.5T8VFR, O primeiramente indicado apresenta particularidades (contribuição de filho, que faleceu, para os seus pais com quem habitava) que não pode ser importado directamente para o nosso caso (um casal em que um dos cônjuges faleceu), e o segundo, com o devido respeito, não é convincente. Ambos se inserindo, ao que pensamos, numa corrente minoritária. De qualquer maneira, adiantamos já, que sufragamos a outra corrente jurisprudencial, ao que julgamos maioritária, que dispensa a prova da referida necessidade para atribuição em abstracto de alimentos ao cônjuge sobrevivo (outra questão, mas já posterior, sendo a medida dos mesmos), abaixo indicada. […] Explicou-se na sentença apelada que: “O direito a indemnização pela perda futura de rendimentos decorrentes da morte de alguém, cuja personalidade cessou com esta, não é reconhecido por lei, nem à vítima, e, consequentemente, aos seus herdeiros, nem directamente a estes. Constitui o nº 3 do art. 495.º do CC uma excepção ao princípio segundo o qual só o titular do direito violado ou do interesse imediatamente lesado, tem direito a indemnização. Mas na situação de casamento, é indiscutível que o dano sofrido pelo cônjuge sobrevivo, em consequência da perda da contribuição que o cônjuge falecido dava para os encargos da vida familiar, é ressarcível por força do disposto no transcrito artigo 495°, n° 3, do CCivil. Na verdade, dispõe o artigo 495°, n° 3, do CCivil, que, no caso de lesão de que proveio a morte (ou em todos os casos de lesão corporal), “têm igualmente direito a indemnização os que podiam exigir alimentos ao lesado ou aqueles a que o lesado os prestava no cumprimento de uma obrigação natural”. Assim, assiste direito a indemnização pela perda do rendimento do trabalho da vítima, à cônjuge sobreviva autora - conforme expressa consagração na nossa lei positiva - designadamente do disposto no artigo 2009º do Código Civil. Traduz-se num direito a indemnização de danos patrimoniais futuros, jure proprio, por perda de alimentos, estando em causa o ressarcimento pelos danos patrimoniais futuros e previsíveis, decorrentes da privação de alimentos, cuja prestação incumbia à vítima, ao lesado directo da lesão corporal. O dever de assistência entre os cônjuges compreende a obrigação de prestar alimentos e a de contribuir para os encargos da vida familiar (art. 1675.º do CCivil), estes traduzem a expressão do dever de alimentos que os cônjuges se devem quando vivem juntos. Por isso, quando o cônjuge reclama indemnização por danos futuros referenciados à perda para sempre da contribuição do outro cônjuge, falecido em acidente de viação, mais não está a fazer do que a reclamar junto de terceiro, nos termos do art. 495.º, n.º 3, do CCivil, os alimentos, expressão da contribuição para os encargos da vida familiar, que podia exigir ao falecido marido e a que este estava vinculado. No caso vertente, a autora vivia em comunhão de vida com o marido e, por isso, estavam os cônjuges reciprocamente vinculados pelo dever de assistência que compreende a obrigação de prestar alimentos e de contribuir para os encargos da vida familiar (artigo 1672.º e 1675.º nº 1 do CCivil). O dever de contribuição para os encargos da vida familiar não é mais do que a forma tomada pelo dever de prestação de alimentos quando os cônjuges não vivem separados (Francisco Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, Curso de Direito da Família, 2001, Vol I, 2ªedição, pág. 359). Esse dever de contribuição, se não for prestado, pode ser exigido por qualquer dos cônjuges a fim de lhe ser directamente entregue a parte dos rendimentos ou proventos do outro que o tribunal fixar (artigo 1676.º nº 3 do Código Civil). Esta indemnização não tem por objecto a prestação de alimentos assente num vínculo de natureza familiar entre o credor da indemnização e a vítima tal como está perspectivado para o direito a alimentos consagrado nos arts. 2003.º e ss. do CC. Radica no casamento e, por isso, os critérios da sua atribuição divergem dos consignados nos normativos que regem a matéria dos alimentos, não sendo esta interpretação normativa violadora do princípio da igualdade, previsto no art. 13.º da CRP. Para alcançar a indemnização pela privação de alimentos em causa não é exigível a alegação e prova por parte do cônjuge sobrevivo (lesado) de que, na data do acidente de viação (evento danoso) recebia alimentos do falecido ou estava em condições de os receber, designadamente, do requisito da necessidade de alimentos. Entende-se (cf. por todos o AC STJ de 4-5-2010) que uma tal indemnização é sempre devida independentemente da efectiva necessidade do cônjuge, pois os cônjuges, no seio da vida familiar, não podem deixar de contribuir para os encargos da vida familiar na proporção das respectivas possibilidades (art. 1676.º, n.º 1, do CCivil). [cf. AC STJ de 4-05-2010, relatado por Salazar Casanova e AC. STJ de 19-10-2016, relatado por Fernanda Isabel Pereira] “. Concordamos tranquilamente com este discurso jurídico. Realmente, no nosso caso deparamo-nos com uma situação em que a A. vivia em comunhão de vida com o marido falecido e, por isso, estavam ambos reciprocamente vinculados pelo dever de assistência que expressamente compreende a obrigação de prestar alimentos e de contribuir para os encargos da vida familiar, nos termos do art. 1672º e 1675º, nº 1, e 2015º do CC. Por seu turno, o dever de contribuição para os encargos da vida familiar (regulado no art. 1676º, nº 1, do CC) não é mais do que uma parcela legal decorrente do aludido dever de prestação de alimentos quando os cônjuges não vivem separados. Dever este que pode, aliás, ser exigido coercivamente (art. 1676º nº 4, do CC). Esta contribuição radica, assim, no próprio casamento. Ora, enfileirando na corrente jurisprudencial citada na decisão recorrida, entendemos que para alcançar a indemnização pela privação de alimentos em causa não é exigível a alegação e prova por parte do cônjuge sobrevivo de que, na data do acidente de viação, recebia alimentos do falecido ou estava em condições de os receber, por necessidade deles. Acompanhamos a jurisprudência que professa que tal indemnização é sempre devida independentemente da efectiva necessidade do cônjuge, pois os cônjuges, no seio da vida familiar, não podem deixar de prestar mutuamente alimentos e contribuir para os encargos da vida familiar na proporção das respectivas possibilidades (vide os Acds. do STJ, de 20.10.2009, Proc.85/07.9TCGMR, de 4.5.2010, Proc.111/04.3TBMUR, e de 19.10.2016, Proc.1893/14.0TBVNG, disponíveis em www.dgsi.pt). Pela visão que julgamos absolutamente correcta desta problemática pode ver-se o aludido Ac. de 4.5.2010, de que respigámos os passos mais importantes: […] No nosso caso sabemos, inclusive, que o falecido contribuía para os encargos da vida conjugal (cfr. o facto provado XLVIII). “ E daqui esse “veredictum” final: “Concluindo, e tendo em conta o exposto a A. tem direito a indemnização por perda de alimentos, […]. Improcede, pois, o recurso da R. nesta parte. “ 5.2. Vertida toda esta douta exposição, de novo não podemos deixar de concordar com a mesma, tendo sobremaneira em conta os fundamentos doutrinários e jurisprudenciais nela convocados – sem olvido para os constantes da sentença da 1.ª Instância ali reproduzidos. Na verdade, e como explanado em ambas essas doutas sucessivas decisões, a tese nelas eleita – e por nós identicamente ‑, é a que vem sendo, praticamente “una você sine discrepanti“, acolhida pela nossa jurisprudência – mormente deste STJ ‑, podendo ainda aditar-se a esse já referenciado acervo, o antes mencionado Ac. de 29.03.2007, também o Ac. de 26.11.2015[21], bem assim como o Ac. de 10.11.2012[22], na síntese conclusiva deste terminantemente se afirmando: - “I - Quando o cônjuge (sobrevivo) reclama indemnização por danos futuros reportados à perda para sempre da contribuição material do outro cônjuge, falecido em acidente de viação, tal significa que está a reclamar junto de terceiro, nos termos do art. 495.º, n.º 3, do CC, os alimentos, expressão da contribuição para os encargos da vida familiar que podia exigir ao falecido marido e a que este estava vinculado (cf. arts. 1672.º, 1675.º e 2003.º, todos do CC). II - Uma tal indemnização é sempre devida, independentemente da efectiva necessidade do outro cônjuge, pois os cônjuges, no seio da comunhão conjugal, não podem deixar de contribuir para os encargos da vida familiar, na proporção das respectivas possibilidades. Destarte, pois, a douta objecção em apreço, enquanto endereçada a obter a revogação do Acórdão, na parte em que condenou a Ré no pagamento à A. de indemnização a título de alimentos, também ela, claudica. Sendo ainda de referir que bem se decidiu também, e por outro lado, ao relegar a liquidação dessa indemnização para momento posterior, na medida em que – como também explicitado no douto aresto -, em face da alteração do teor do Facto LI, operada pelo mesmo em sede de impugnação da decisão fáctica, o montante total de proventos auferidos pelo Falecido quedou-se inapurado e, logo, inviável a fixação, desde logo, de atribuição patrimonial em função desses mesmos proventos. 5.3. Como retro mencionado, a Ré, hipotizando a possibilidade de vir a concluir –se – consoante acabamos de ver - pela existência do dano da privação de alimentos por parte da A., sustenta, outrossim, que se deverá então estabelecer como limite/tecto desse direito o valor fixado pelo Tribunal de1.ª Instância - com o qual a mesma A. se conformou - , atendendo-se oportunamente à contribuição do velocípede para a responsabilidade para o risco que vier a ser fixada. Nesse caso – mais defende - deverão ser deduzidos a esse montante os valores recebidos pela A. do interveniente Instituto de Segurança Social, I.P., a título de pensões de sobrevivência, que a aqui Ré/ Recorrente venha a ter de pagar àquele organismo por força da decisão que vier a ser proferida. Vejamos, de novo. 5.4. Na douta sentença, e no tocante à precisa quantificação monetária do referido dano, nela – e diferentemente do Acórdão em foco‑, escreveu-se, a dado passo[23], o que segue: - “Procurando adequar esse valor, de forma a reduzir e mitigar a supra mencionada presunção do legislador excessiva de que cerda de 75% seria gasto exclusivamente com o próprio, apontando antes para um valor de cerca de 60%, entendemos mais adequada e ajustada a fixação de valor que perfaz, já considerado o contributo de risco (40%), a quantia de € 45 000,00.” Após o que se concluiu: “Com recurso à equidade (artigo 566.º, n.º 3, do CCivil), entendemos que o valor a atribuir à autora pela perda de rendimentos futuros derivados da morte do marido, decorrentes da privação de alimentos que aquele, não fora a ocorrência do evento, não poderia deixar de lhe prestar (artigos 495.º/3 e 564.º do Código Civil), já reduzido por força do concurso de riscos, na mencionada quantia de € 45 000,00.” 5.5. Tendo a A. interposto recurso de apelação dessa sentença, nas conclusões da respectiva alegação fez constar, entre o mais, o seguinte[24]: - “XVII) Entende-se, assim, que se impõe a revogação da sentença e substituição por outra que determine a contribuição do risco de 90% para o ligeiro e 10% para o velocípede, nos termos do artigo 506.º Código Civil. XVIII) Contudo, sem prescindir, mesmo que assim não se entendesse e salvo melhor opinião, atendendo às características dos veículos envolvidos, aos contornos do sinistro e às suas consequências, não será adequada, nem justa, a distribuição feita na douta sentença recorrida, pelo que se entende que deveria a contribuição do risco ser repartida, no mínimo, na proporção de 70% para o ligeiro e 30% para o velocípede.” 5.6. Frente a estas asserções, temos que a A., em recta visão das coisas, apenas se conformou, tendo em conta a apontada quantificação efectuada, nesses respectivos termos, pela sentença, com o limite ou tecto máximo para o dano em presença no valor –não de 45.000,00 €, como parece pretender incutir a A./Recorrente, mas de 101.250,00 €, que é o resultado obtido em função desses termos ou parâmetros de cálculo seguidos na dita sentença, e a proporção do risco ‑ 90%‑ atribuída, em primeira linha, pela A. à circulação do automóvel seguro. 5.7. Segue-se daqui que é esse montante ‑relembre-se: 101.250,00 € – o patamar máximo da indemnização que acha diferida para ulterior momento. A esta cifra – e como defendido pela Ré – haverá que naturalmente deduzir os quantitativos recebidos pela A. do ISS, I.P., a título de pensões de sobrevivência, dos quais a aqui Ré/ Recorrente terá de reembolsar aquela entidade por força da vertente decisão, ou seja, mercê e em função dessa percentagem de 70% de responsabilidade atribuída ao veículo seguro. 6. Por fim, arremete a Ré contra o vertente Acórdão no capítulo em que este a condenou a pagar ao I.S.S., I.P. 70% dos montantes que este havia liquidado à A. a título de subsídio por morte e pensões de sobrevivência, relativas ao período de 8-2013 a 6-2016, ou seja "...respectivamente 880,36€ e 4.677,08€, quantia esta acrescida do montante das pensões que entretanto despendeu, na referida proporção de 70% do seu valor." Com efeito – alega -, resulta dos autos que o dito Instituto não interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, apesar de ali lhe ter sido negado, em parte, o direito por ele exercido contra a Ré. Estava, pois, vedado à Relação condenar a Ré no pagamento ao Instituto de uma quantia superior àquela que foi estabelecida em tal sentença, por força do trânsito em julgado desta. Ao agravar, desse modo, a condenação da Ré, a Relação violou o princípio da proibição da “reformatio in pejus”, do mesmo passo que, conhecendo de questão que não lhe foi colocada, incorreu da nulidade prevista na al. d), do art. 615.° do C.P.C. Deve por isso – diz ainda e por último - ser o Acórdão revogado e substituído por outro que reponha a decisão proferida pela 1.ª Instância, ou seja, condenando a Ré a pagar ao dito instituto apenas as quantias de 503,064€ e 2.667,41 €, respectivamente, a título de subsídio por morte e de pensões de sobrevivência, acrescidas do montante das pensões que entretanto despendeu até ao trânsito em julgado da decisão, na proporção de 40% do seu valor. Vejamos, ainda uma vez mais. 6.1. Conforme supra narrado, o ISS, IP, havendo sido citado nos termos e para os efeitos do n.º 2, do art. 1.º, do DL n.º 59/89, de 22 de Fevereiro, veio deduzir o pedido de reembolso de prestações que pagou à A./viúva, sendo subsídio por morte, no valor de 1.257,66 €, e pensões de sobrevivência, relativas ao período de Agosto de 2013 a Junho de 2015, no valor de 4.369,08 €, perfazendo assim o quantitativo global de 5.626,74 €, acrescido do montante das pensões que viesse a pagar, por força da sub-rogação legal prevista no art. 70.º, da Lei 4/2007, de 16 de Janeiro, tudo com juros de mora desde a citação. Em sede de audiência prévia, tal entidade actualizou o valor da quantia reclamada para 6.863,27 €., sendo ainda que, no início da audiência de discussão e julgamento, solicitou a ampliação do pedido dos valores pagos, que nessa data totalizariam 7.939,20 €. 6.2. Ora, começando o predito art. 1.º do DL n.º 59/89, por estatuir no respectivo n.º 1 que “[e]m todas as acções cíveis em que seja formulado pedido de indemnização de perdas e danos por acidente de trabalho ou acto de terceiro que tenha determinado incapacidade temporária ou definitiva para o exercício da actividade profissional, ou morte, o autor deve identificar na petição a sua qualidade de beneficiário da Segurança Social ou a do ofendido e a instituição ou instituições pelas quais se encontra abrangido”, no imediato n.º 2, dispõe que “[a]s instituições de segurança social competentes para a concessão das prestações são citadas para, no prazo da contestação, deduzirem pedido de reembolso de montantes que tenham pago em consequência dos eventos referidos no número anterior. Por sua vez, no art. 3.º, estabelece que “[n]o caso de morte, ou se a incapacidade para o trabalho revestir a forma de invalidez, é ainda citado ou informado, conforme os casos, o Centro Nacional de Pensões”, estipulando no art. 4., n.º 1, que “[o]s devedores da indemnização são solidariamente responsáveis, até ao limite do valor daquela, pelo reembolso dos montantes que tenham sido pagos pelas instituições[25]. “ O também mencionado art. 70.º, da Lei n.º 4/2007, textua, por seu turno, que “[n]o caso de concorrência pelo mesmo facto do direito a prestações pecuniárias dos regimes de segurança social com o de indemnização a suportar por terceiros, as instituições de segurança social ficam sub-rogadas nos direitos do lesado[26] até ao limite do valor das prestações que lhes cabe conceder., 6.3. Analisando atentamente toda esta normação e, designadamente, nos respectivos preceitos, esses segmentos sublinhados, somos levados a concluir que são os direitos do lesado, a expressão final dos mesmos – e, portanto, a decisão com trânsito em julgado definidora desses direitos -, que dita, na sua verificação e no seu “quantum”, os da segurança social - no pressuposto, é bom de ver, de comprovado[s] e reconhecido[s] o[s] por si alegado[s] montante[s] prestacional[ais] pago[s]. Ou seja, independentemente de a segurança social deduzir ou não impugnação da decisão que estatua sobre pedido de reembolso por si deduzido, [verificado o aludido pressuposto], é o veredicto final, aquele devidamente transitado, proferido no tocante às pretensões feitas valer pelo lesado, que efectivamente define o se e o “quantum” de tal pedido de reembolso. E assim sendo, como modestamente se nos afigura, pese a decisão da 1.ª Instância, em parte “desfavorável” – como dito pela Ré -, ao ISS, e a não impugnação recursória de banda deste, nada impedia, bem ao invés, que, “melhorando” o Acórdão o seu veredicto quanto aos fundamentos da pretensão da A./lesada – reduzindo a proporção da responsabilidade sinistral do Falecido de 60% para 30% -, essa mesma melhoria fizesse repercutir no pedido de reembolso formulado pelo dito Instituto. 6.4. Segue-se do exposto, pois, que não só o enfocado Acórdão não infringiu a proibição manante do aludido princípio da “reformatio in pejus”, como também não incorreu nessa também assacada nulidade vulgarmente designada de excesso de pronúncia. A douta objecção em exame improcede pois também, e com ela, o presente recurso na sua totalidade. Tudo visto, resta, pois, findar com a seguinte IV – DECISÃO Termos em que, concedendo parcialmente a revista, decide-se: 1 - Revogar nessa medida o Acórdão ora recorrido e, assim, alterar o respectivo segmento decisório quanto à alínea B), 3.º “item” condenatório da aqui Ré, em termos de ao seu actual teor – “a quantia que se liquidar em sentença a título de dano patrimonial emergente de obrigação alimentar“ - acrescentar que essa quantia a liquidar [tendo em conta o mencionado contributo de 30% do risco da vítima] terá como limite máximo o valor de 101.250,00 €, e a ela deverão ser deduzidos os valores que a dita Ré venha a reembolsar o Instituto de Segurança Social, I.P., de quantias por este pagas à A., a título de pensões de sobrevivência. 2 – No mais, manter o referido Acórdão inalterado. Custas da revista por A. e Ré, na proporção de 1/8 e 7/8. * * Lisboa e Supremo Tribunal de Justiça, 06 de dezembro de 2018 Helder Almeida (Relator) Oliveira Abreu Ilídio Sacarrão Martins __________ [1] Rel.: Helder Almeida |