Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
263/06.8TTCSC.L1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: SAMPAIO GOMES
Descritores: ARGUIÇÃO DE NULIDADES
JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO
DESPEDIMENTO ILÍCITO
HORÁRIO DE TRABALHO
DEVER DE OBEDIÊNCIA
MATERNIDADE
Data do Acordão: 05/08/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática: DIREITO DO TRABALHO - PRESTAÇÃO DE TRABALHO - CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
Doutrina: - Baptista Machado, R.L.J. 118.º, 330 e segs..
- Catarina Carvalho, A protecção da Paternidade e da Maternidade no novo Código do Trabalho, RDES, 2004, ano XLV, pág. 41 e sgs..
- Júlio Vieira Gomes, Direito do Trabalho, Vol. I, pág. 447.
- Lobo Xavier, “Curso de Direito do Trabalho”, páginas 490 e segs..
- Monteiro Fernandes, “Direito do Trabalho”, 12.ª edição, páginas 557 e segs..
Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 342.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 668.º, N.º1, 716.º, N.º1.
CÓDIGO DE PROCESSO DE TRABALHO (CPT): - ARTIGOS 77.º, N.º1.
CÓDIGO DO TRABALHO (CT/2003): - ARTIGOS 33.º, N.º1, 39.º, N.º2, 170.º, 173.º, N.º1, 396.º.
LEI N.º 35/2004, DE 29-7 (RCT): - ARTIGO 73.º, N.ºS 2 E 3.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 01/02/2001, PROCESSO N.º 124/00;
-DE 20/01/2010, PROCESSO Nº 228/09.8YFLSB, EM WWW.DGSI.PT;
-DE 22/09/2010, PROCESSO N.º 217/2002.L1.S1.

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
-DE 27/9/2000, PROCESSO N.º 403/2000.
Sumário :
I - O art. 77.º, n.º 1 do CPT impõe que a arguição de nulidades das decisões judiciais recorridas seja feita, de forma expressa, concreta e separada no requerimento de interposição de recurso, e não em sede de alegações dirigidas ao Tribunal de recurso, mesmo que estas se sigam logo àquele, sob pena de extemporaneidade e consequente não conhecimento por este Supremo Tribunal de Justiça.

II - No âmbito da apreciação da justa causa de despedimento, na ponderação sobre a gravidade da culpa e das suas consequências, importará considerar o entendimento de um “bonus pater familias”, de um “empregador razoável”, segundo critérios de objectividade, em função das circunstâncias de cada caso em concreto, sendo que, o apuramento da “justa causa” SE corporiza, essencialmente, na impossibilidade prática e imediata da subsistência da relação de trabalho.

III - O horário de trabalho estabelecido pelo empregador à trabalhadora tem de ser por aquele ajustado – no regresso ao trabalho da trabalhadora após o período de licença de maternidade e após informação, por esta, de que estava a amamentar a sua filha –, de forma a respeitar as necessidades de amamentação do lactante, sofrendo, assim, as compressões que se imponham, de acordo com o regime fixado no art.º 73.º, n.º 2 da Lei n.º 35/2004.

IV - Não tendo sido possível acertar os interesse de ambas as partes, os interesses do lactante devem sobrepor-se aos interesses da entidade patronal da mãe, pelo que a ordem dada, no sentido de aquela cumprir um horário totalmente incompatível com a amamentação da recém--nascida, se mostra ilegítima e, enquanto tal, a A. não estava obrigada a cumpri-la, sendo o seu despedimento, fundamentado nesse incumprimento, ilícito.
Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I )

1.

AA instaurou contra BB – Infantário, Jardim de Infância e Atl, Lda. acção sob a forma de processo comum pedindo que:

- se declare ilícito o seu despedimento;

- se condene a Ré a reintegrar a Autora no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;

- se condene a Ré a pagar-lhe: a quantia de € 1.553,50, acrescida de todas as retribuições que deixou de auferir desde de 1 de Junho corrente até ao trânsito em julgado da sentença, deduzindo a quantia de € 2.060,73 já paga; a quantia de € 7.500,00, a título de danos morais; a quantia de € 16.319,10, a título de retribuição de trabalho suplementar; a quantia correspondente aos juros de mora, à taxa legal.

Para tanto alegou, em síntese, que foi admitida ao serviço da Ré em 1.9.02, como terapeuta ocupacional.

Só estava obrigada a trabalhar 30 horas semanais, mas efectuou um horário de 37 horas semanais (1 hora e trinta minutos por dia), num total de 997 horas e 30 minutos.

Não gozou as férias vencidas em 1.1.06, nem recebeu o respectivo subsídio.

O último salário pago foi o respeitante ao mês de Março de 2006, tendo a Ré pago € 2.060,73, devendo o mês de Maio e o complemento de € 164,00.

A Ré também não lhe pagou o subsídio de refeição desde Abril de 2006, devendo-lhe € 326,50.

Foi despedida a 17.6.06, na sequência de um processo disciplinar que lhe foi instaurado, onde lhe é imputado o incumprimento do horário de trabalho definido pela Ré e ainda o dever de obediência que a Autora nega ter violado.

Sustenta a ilicitude do despedimento por inexistência da decisão final proferida pela Ré e também por não ter cometido qualquer infracção laboral, inexistindo justa causa para a cessação do contrato de trabalho promovido pela entidade patronal.

A Ré tornou público o diferendo que tinha com a Autora, em que se alicerçou a decisão de despedir, o que a envergonhou e humilhou perante os funcionários, alunos e encarregados de educação.

A A. optou pela indemnização em substituição da reintegração.

A Ré apresentou contestação onde conclui pela improcedência da acção.

Sustentou que o trabalho prestado pela Autora como terapeuta ocupacional era desempenhado no horário de trabalho acordado com a Ré.

Foi por iniciativa e com o acordo da Autora que esta passou a acumular as funções de auxiliar de educação, as quais eram prestadas no período de trabalho que a Autora configura como suplementar, mas que de facto não o era. Acresce que, para o exercício de tais funções, Autora e Ré acordaram uma retribuição adicional de € 254,00, que lhe foi paga.

A Autora deixou de cumprir o horário de trabalho determinado pela Ré, incorrendo em faltas injustificadas e violando o dever de obediência que sobre aquela recaía, o que determinou a instauração de um processo disciplinar, que culminou com o seu despedimento.

A Ré assinou a comunicação de despedimento, não padecendo o processo disciplinar de qualquer vício, sendo que o comportamento assumido pela trabalhadora consubstancia justa causa de despedimento.

Não perseguiu a Autora, pelo que não tem que suportar qualquer indemnização.

Não era devido o subsídio de refeição, uma vez que este respeita ao período de suspensão do exercício de funções, determinado no decurso do processo disciplinar, em que a Autora não tomava as refeições fora de casa.

Procedeu-se a julgamento, tendo sido proferida sentença, na qual foi exarada a seguinte decisão:

Declara-se ilícito o despedimento da Autora;

Condena-se a Ré a pagar à Autora:

- a título de indemnização pela ilicitude do despedimento, a quantia correspondente ao produto de quarenta e cinco (45) de retribuição de base pelo número de anos completos ou fracção decorridos desde 01/09/2002 até ao trânsito em julgado da decisão;

- a importância das retribuições (incluindo férias, subsídio de férias e subsídio de natal) que deixou de auferir desde 17/05/2006 até à data do trânsito em julgado da decisão, acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos desde  a data dos respectivos vencimentos até integral pagamento, à taxa legal supletiva em vigor e que é actualmente de 4% ao ano;

- A tal valor deve ser deduzido o montante das importâncias comprovadamente obtidas com a cessação do contrato não fosse o despedimento, e ainda o montante do subsídio de desemprego;

- a quantia de € 765,83 (setecentos e sessenta e cinco euros e oitenta e três cêntimos);

- a quantia de € 100,00 (cem euros), acrescida de juros vencidos e dos vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento, à taxa legal supletiva que em cada momento se encontre em vigor e que é actualmente de 4% ao ano.”

2. Inconformada, a Ré interpôs recurso de apelação, sendo que o Tribunal da Relação decidiu nos seguintes termos:

- “julgar parcialmente procedente a apelação, pelo que se revoga a decisão recorrida na parte em que condena a Ré a pagar à Autora “a quantia de € 100,00 (euros), acrescida de juros vencidos e dos vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento, à taxa legal supletiva que em cada momento de encontre em vigor e que é actualmente de 4% ao ano”, mantendo-se, no mais, o restante dispositivo”.

Novamente inconformada com esta decisão do Tribunal da Relação de Lisboa é contra ela que agora se insurge a Ré, mediante recurso de revista, em que alinha as seguintes conclusões:

Do erro material da sentença - Da nulidade do acórdão.

a)        Estatui o n.° 2 do art.° 667.° do CPC que "Em caso de recurso, a rectificação só pode ter lugar antes de ele subir, podendo as partes alegar perante o Tribunal superior o que entendam de seu direito no tocante à rectificação.

b)        Diz a alínea e) do art.° 668.° do CPC que "É nula a sentença quando: e) o juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido".

c)        A condenação a que se refere a douta sentença da 1.ª Instância deverá ser calculada a partir da data do despedimento da Autora/Recorrida que é de 16 de Maio de 2006 e não 01 de Setembro de 2002, sendo esta a data do início do contrato de trabalho celebrado entre Autora/Recorrida e Ré/Recorrente.

d)        Trata-se de um lapso grosseiro de escAA, com implicações de natureza substantiva, mormente do quantum indemnizatório.

e)        A ser de aceitar, a posição do Tribunal de 1.ª Instância, o que não se admite, a Ré/Recorrente seria condenada a pagar à Autora/Recorrida o correspondente a mais quatro meses de retribuição base, se tal indemnização for calculada com base na data do contrato de trabalho celebrado entre as partes, (01 de Setembro de 2002), data essa na qual se baseia a sentença de 1.ª instância para o cálculo indemnizatório, e não com base na data do despedimento efectivo da Autora/Recorrida, que ocorreu com a decisão de despedimento comunicada em 16 de Maio de 2006.

f)        Dispõe o n.° 1 do art.° 661.° do CPC que "A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir".

g)        Na petição inicial apresentada no Tribunal de 1.ª instância em 28 de Junho de 2006, a A./Recorrida pede ao Tribunal a condenação da Ré a pagar "a quantia de € 1553,50 acrescida de todas as retribuições que deixar de auferir desde 01 de Junho do corrente, até ao trânsito em julgado da sentença...".

h)       Quando   a  Autora/Recorrida  se   refere   a   "...01   do   Junho   do corrente...", está-se a referir ao ano de 2006 que é o ano da instauração da acção (28 de Junho de 2006).

i)        A sentença  da  1.ª  instância ao  condenar a  Ré/Recorrente  no pagamento em quantidade superior ao devido e ao pedido, está ferida de nulidade.

j)        Devendo em consequência ser declarado nulo o acórdão recorrido nos  termos  sobreditos,   e   por  considerar  improcedente  a   invocada rectificação e por conseguinte, violar o disposto no n.° 1 do art.° 661.° do CPC conjugado com o disposto na alínea e) do n.° 1 do art.° 668.° e alínea c) do n.° 1 do disposto no art.° 722.° todos do CPC.

k) A decisão da 1.ª instância deve ser anulada na parte em que é desfavorável à Ré/Recorrente, por os fundamentos dela constantes estarem em clara oposição com a decisão, nos termos do disposto na alínea c) do n.° 1 do art.° 668.° n.° 1 alínea c) e alínea c) do n.° 1 do art.,° 722.° do CPC, devendo em consequência ser declarado nulo o acórdão recorrido.

Da nulidade da sentença por os fundamentos estarem em contradição com a decisão

I) Ao contrário do que afirma a decisão recorrida a Ré/Recorrente arguiu a nulidade nos termos do disposto no n.° 1 do art.° 77.° do Código do Trabalho.

m) A nulidade foi arguida dentro do prazo de interposição do recurso, no requerimento de interposição do recurso da decisão da 1.ª instância, apresentado no respectivo Tribunal no dia 21 de Setembro de 2009, juntamente com as respectivas alegações.

n) O Tribunal Constitucional julgou inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade (artigo 18.°, n°s 2 e 3), com referência aos n°s 1 e 4 do artigo 20.° da Constituição, a norma do n.° 1 do art. 77.° do Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo DL n.° 480/99, de 9 de Novembro, na interpretação segundo a qual o tribunal superior não pode conhecer das nulidades da sentença que o recorrente invocou numa peça única, contendo a declaração de interposição do recurso com referência a que se apresenta arguição de nulidades da sentença e alegações e, expressa e separadamente, a concretização das nulidades e as alegações, apenas porque o recorrente inseriu tal concretização após o endereço ao tribunal superior - Acórdão n.° 304/2005 do Tribunal Constitucional de 2005.06.08, DR. II Série, n.° 150, de 2005-08-05, págs. 11.182 a 11.186.

o) Não sendo de admitir as conclusões (ilações) que não correspondam ao desenvolvimento lógico da matéria de facto dada como provada, sendo que, no caso concreto, a ilação extraída pelo Tribunal de 1.ª instância não corresponde realmente ao desenvolvimento lógico da matéria de facto dada como provada.

p) Estamos assim, perante clara contradição entre os fundamentos e a decisão proferida em primeira instância nos termos do disposto na alínea c) do n.° 1 do art.° 668.° do C.P.C, e por violação da lei substantiva, a qual consiste no erro de interpretação da norma jurídica aplicável, devendo ser anulado o acórdão recorrido.

Da justa causa de despedimento - Da ilegalidade do acórdão recorrido:

q) Dispõe o n.° 1 do art.° 396.° do Código do Trabalho de 2003, vigente à data dos factos, que "constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho".

r) Acrescentando o n.° 2 do citado preceito legal que "para apreciação da justa causa deve atender-se, ao quadro da gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes".

s) Baptista Machado, in RLJ, 118.°-330 e segs. refere que "...o núcleo mais importante de violações do contrato capazes de fornecer "justa causa" à resolução é constituído por violações do "princípio da leal colaboração" imposto pelo ditame da boa fé. Em termos gerais diz-se que se trata de uma quebra de lides ou da "base de confiança do contrato".

t) Mais acrescenta este autor na referida obra que "Pode dizer-se que nos contratos duradoiros os deveres de fidelidade ou de leal colaboração surgem reforçados. É que, nestes contratos, como que se opera uma transformação de pura troca em relações de cooperação, no contexto das quais as expectativas recíprocas das partes não são apenas determinadas pelo interesse nas prestações singulares, mas por um desígnio   ou   projecto   (elemento   organizativo)    de   cooperação   no implemento daqueles fins práticos a que o negócio se subordina".

u)       Para finalizar,  Baptista Machado afirma ainda que  "A  violação patente e culposa destes deveres de leal cooperação legítima, em regra, um direito de resolução por justa causa".

v)       Ao contrário do que afirma o aliás douto acórdão recorrido, não estão   aqui   em   causa   apenas   as   faltas   ao   trabalho   dadas   pela trabalhadora, ora Recorrida, por não ter cumprido o horário imposto pela Entidade Patronal, ora Recorrente, mas outrossim a violação desse tal dever de leal cooperação e do dever de obediência, como adiante se demonstrará.

w)      É ao empregador que incumbe a determinação dos períodos em que o trabalhador deve desempenhar a sua actividade, podendo proceder à sua alteração, dentro dos condicionalismos legais - art.° 170.° do Código de Trabalho.

x)       A Recorrente estabeleceu  à  Recorrida  um  horário de trabalho reduzido, das 12:15 às 13:00 horas e das 14:30 às 18:45 horas, por forma a que fosse respeitado o período de amamentação a que a Recorrida tinha direito ou seja a fixação do horário de trabalho foi feita dentro dos condicionalismos legais.

y)       Em face do horário fixado pela Recorrente, a Recorrida teria assim a oportunidade acrescida de ficar na companhia da sua filha durante toda a manhã, o que nos dias que correm é um verdadeiro privilégio laboral, se não mesmo um luxo.

z)       O contrato de trabalho previa a possibilidade de ocorrer alteração do horário de trabalho da A./Recorrida, sempre que a Primeira Outorgante aqui Ré/Recorrente visse necessidade para o melhor funcionamento do colégio.

aa)     A prova carreada para o processo, conduz a um entendimento diverso do constante da decisão recorrida.

bb)     A A./Recorrida sempre soube e teve o perfeito conhecimento que o seu horário de trabalho poderia ser alterado de acordo com os interesses do  colégio,   pois  assim  ficou  estipulado  no  respectivo  contrato  de trabalho.

cc)      Recorrente concedeu à  Recorrida,  conforme era o seu dever, percute-se, os períodos legais a que esta tinha direito para efeitos de amamentação respeitando os condicionalismos legais.

dd)    A   Recorrida   nem   sequer   havia   apresentado   à   sua   Entidade Patronal,    aqui    Recorrente,    qualquer    documento,    nomeadamente declaração médica comprovativa de que se encontrava a amamentar, o que apenas veio a suceder com a apresentação da resposta à nota de culpa, (vide facto provado sob o n.° 25).

ee)     A declaração médica veio apenas a ser emitida em 04 de Abril de 2006, (vide doe. n.° 5 junto à p.i da A./Recorrida) sendo assim muito posterior à carta de 13 de Março de 2006.

ff)       Competia  à  A./Recorrida   provar  a  situação   de   amamentação, através   de   declaração   sob   compromisso   de   honra   que   devia   ter apresentado à Ré/Recorrente com 10 dias de antecedência relativamente ao início da dispensa, acompanhada do respectivo atestado médico.

gg)     O que não sucedeu no caso vertente.

hh)    A Recorrente teve a diligência de informar com antecedência à Recorrida o horário de trabalho que lhe havia sido fixado para o ano lectivo 2005/2006. (vide facto sob o n.° 17).

ii)       Resulta  provado  que  "a  Ré  estipulava  os   horários  das  suas trabalhadoras, que atribuía a cada uma delas, no início de cada ano lectivo, ajustável às necessidades do colégio e consoante o número de alunos (facto provado sob o n.° 40); "A turma que a Autora acompanhava da parte da manhã, no horário fixado pela Ré a partir de 16 de Março de 2006, continha apenas dois alunos, e a da parte da tarde era composta por   vinte   e   quatro   alunos   (facto   provado   sob   o   n.°   41);    "O acompanhamento desses alunos dependia apenas da Autora, por esta prescindir da  presença  de  uma  auxiliar  de  educação,  funções  que acumulava", (facto provado sob o n.° 42).

JJ)       A Autora/Recorrida tinha o perfeito conhecimento desses factos pois era trabalhadora da Recorrente desde o ano de 2002, pelo que não podia ignorar o modus operandi do colégio, tendo aliás sempre aceite a alteração anual do seu horário de trabalho, sem qualquer reclamação.

kk)     Na dinâmica de funcionamento de um colégio, o horário de um trabalhador faz, efectivamente, toda a diferença, podendo ser decisivo ao seu normal funcionamento.

II)       A ausência reiterada da pessoa responsável pelas crianças, às horas de maior afluência dos pais, que neste caso seria da parte da tarde, altura em que a A./Recorrida tinha um maior número de crianças, pode criar desconforto e desconfianças.

mm)   Ainda mais na valência de ATL (Actividades de Tempos Livres) da qual a Recorrida era responsável, em que as crianças já frequentam o ensino básico, e os pais querem saber se fizeram os trabalhos de casa, se têm dúvidas em determinadas disciplinas, etc.

nn)     Segundo o Ac. RE, de 20 de Novembro de 1979, Rec. N.° 35: Acórd. Doutrin., 220.°-542 "A justa causa de despedimento define-se segundo duas lnhas  vectoriais marcantes: de  um lado,  a  existência  de  um comportamento culposo do trabalhador, traduzido na violação grave dos seus    deveres    pessoais    e    profissionais;    de    outro,    a    imediata impossibilidade prática de subsistência do vínculo laboral com a entidade patronal".

oo)     Resulta,   de   forma   clara   e   evidente,   que   a   Autora/Recorrida desrespeitou, reiteradamente, as ordens da sua Entidade Patronal, aqui Recorrente, ao praticar um horário de trabalho que melhor lhe convinha.

pp)     E, ao impor à Recorrente, o horário de trabalho, da forma que o fez, a Recorrida pôs em causa, inclusive, o normal funcionamento do colégio.

qq)     O acórdão recorrido, salvo o devido respeito, ignorou por completo todas as implicações que tal desrespeito por parte da trabalhadora Recorrida tem num universo laboral como é o de um colégio. rr) A verdade é que, "a desobediência reiterada do trabalhador a ordens expressas da administração relacionadas com o horário de trabalho constitui justa causa de despedimento. (Ac. RL de 23.07.1979, Rec. N.° 1067: Col. Jur., 1979, 4.°-1229).

ss)     Dispõe o n.° 1 do art.° 121° do Código do Trabalho que "Sem prejuízo de outras obrigações, o trabalhador deve: a) Respeitar e tratar com urbanidade e probidade o empregador, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as demais pessoas que estejam ou entrem em relação com a empresa; b) Cumprir as ordens e instruções do empregador em tudo o que respeite à execução e disciplina do trabalho, salvo na medida em que se mostrem contrárias aos seus direitos e garantias;

tt) Acrescenta o n.° 2 do referido preceito legal que " O dever de obediência a que se refere a alínea d) do número anterior, respeita tanto às ordens e instruções dadas directamente pelo empregador como às emanadas dos superiores hierárquicos do trabalhador, dentro dos poderes que por aquele lhe forem atribuídos".

uu)   Atenta a gravidade da conduta da Recorrida e a intensidade da sua culpa, verifica-se a impossibilidade da subsistência do vínculo laboral, com a verificação da justa causa de despedimento, e consequente improcedência da acção.

vv)    É entendido na doutrina (Veja-se, a esse propósito, Maria do Rosário Palma Ramalho, in Manual do Direito do Trabalho., p. 349 e 350) que o dever de obediência constitui pedra angular do contrato de trabalho, por traduzir a manifestação, por excelência, da subordinação jurídica que caracteriza esta figura contratual, o que em princípio transporta a ideia de gravidade da conduta do trabalhador, gravidade essa devidamente consubstanciada na factualidade dada como provada pelo Tribunal a quo.

ww)   Comportamento esse da trabalhadora, ora Recorrida, revelador de um grau elevado de ilicitude e de culpa intensa, sendo manifesta a falta de      respeito      pela      Recorrente,      enquanto      sua      Empregadora, consubstanciando ainda violação do dever de leal colaboração a que referimos inicialmente e que no caso vertente tem plena aplicação.

xx)    Tem sido orientação firme da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça, que a conclusão pela gravidade da infracção disciplinar não depende,   necessariamente,   da   comprovação   de   elevados   prejuízos materiais para o empregador, nem sequer da existência de prejuízos (Nesse sentido, e em conjugação com a violação do dever de obediência aqui em causa, vejam-se, a título de exemplo, os acórdãos do STJ, 4ª Secção, de 01.04.1998, na Revista n.° 30/98, de 10.02.1999, na Revista n.° 289/98, de 31.10.2000, na Revista n.° 20/2000, de 20.12.2000, na Revista n.° 60/00, de 12.12.2001, na Revista n.° 4017/00, de 05.06.2002, na Revista n.° 4422/01, de 18.04.2007, no Rec. n.° 4278/06, de 18.04.2007, no Rec. n.° 2842/06, de 09.01.2008, no Rec. n.° 2882/07, e de 10.12.2008, no Rec. n.° 1036/08).

yy)     Em face do quadro factual apurado, somos de concluir que se revela razoável e justificada a perda objectiva de confiança da Recorrente no comportamento futuro da Recorrida, o que tornou inexigível que a Recorrente a mantivesse ao seu serviço.

zz)      Deveria o acórdão recorrido ter dado como existente a justa causa de despedimento da Autora/Recorrida.

aaa)   Não o fazendo violou normas de direito substantivo, devendo em consequência ser revogado.

Termina, protestando a revogação do Acórdão recorrido.                                                          

Em contra-alegações a recorrida defende a manutenção do julgado.

No seu douto Parecer, que não foi objecto de resposta, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal pronunciou-se no sentido de dever improceder o recurso.

Corridos os «vistos», há que decidir.

Sabido que o objecto do recurso é delimitado pelas respectivas conclusões, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso (arts.684º, nº3 e 690º nº1 do Código de Processo Civil), daí resulta ser a seguinte a questão suscitada e a apreciar:

- da nulidade do acórdão recorrido;

- da justa causa de despedimento.

I I )

Vem dada como provada a seguinte matéria de facto:

1.Com data de 01 de Junho de 2002, A. e Ré celebraram entre si o seguinte:

“CONTRATO DE TRABALHO A TERMO CERTO”, sendo outorgantes

           - 1ª-BB-Infantário e Jardim de Infância,Ldª sociedade comercial, e AA, solteira, residente na Rua ... n.o … ….0 …. De onde consta:

Cláusula 4ª:

“-A Segunda Outorgante fica sujeita a um horário de trabalho de 38 horas

semanais distribuídas da seguinte forma:

- De Segunda-Feira a Sexta-Feira - 9.30 - 13.00

- 14.30 - 18.30

- Este horário poderá ser modificado sempre que a Primeira Outorgante veja necessidade para o melhor funcionamento do colégio;

Cláusula 5ª:

n. º 1 - O presente contrato terá início em 01 de Setembro de 2002 e caduca em 01 de Junho de 2003, desde que qualquer das partes não o denuncie, por escrito com a antecedência mínima de oito dias no termo do período.

n.° 2. - A Primeira Outorgante declara que o período experimental será de 90 dias, podendo durante este tempo, qualquer uma das partes rescindir o contrato de trabalho.

n.° 3. – O presente contrato será renovável até ao máximo de duas vezes, se não for comunicada por uma das partes a vontade de o não renovar com a antecedência legal.

O motivo justificativo do presente contrato a termo, é o previsto na alínea b) do n.º 1 do artº 41 do Decreto - Lei n.o 64 - A/89 de 27 de Fevereiro, em conformidade com o  disposto no arto. 3.º da Lei n.º 38/96 de 31 de Agosto, baseado num aumento do número de alunos aceites pela primeira Outorgante para este ano lectivo e na falta da disponibilidade do seu pessoal para dar cumprimento efectivo ao trabalho a realizar".

2. - Não obstante o horário estabelecido na cláusula 4.a do referido contrato, a Autora exerceu, por ordens da Ré, horário diferente a saber: das 10 horas às 13 horas e das 14 horas e 30 minutos às 19 horas.

3. - A Autora manteve-se ao serviço da Ré ininterruptamente ate ao mês de Maio de 2006, passando tal contrato, a contrato de trabalho sem termo.

4. - A autora à data do despedimento auferia de vencimento base mensal a quantia de € 899,00, a que acrescia a quantia de € 122,00 por mês, a título de subsídio de alimentação.

5. - Além das quantias mencionadas no ponto anterior, a Ré pagava à Autora, mensalmente, a quantia de € 164,00, sem que viesse declarado nos recibos do seu vencimento, a título de pagamento do trabalho prestado para além do seu horário normal, no exercício das funções de auxiliar de educação, que, por acordo das partes, acumulava com as funções de terapeuta ocupacional.

6. - As terapeutas ocupacionais ao serviço da Ré são acompanhadas por auxiliares de educação. No caso da Autora, esta insistiu junto da Ré para que não contratasse qualquer auxiliar, que ela própria poderia acumular ambas as funções mediante o pagamento acordado.

7. - À data da celebração do referido contrato, a Autora era licenciada em psicopedagogia Curativa.

8. - No dia 02 de Março de 2006, e porque iria retomar a sua actividade no imediato dia 16, após licença de parto e gozo de ferias, a Autora deslocou-se ao seu local de trabalho e falou com a Directora da Ré a quem comunicou que estava a amamentar a filha, que iria continuar a amamentá-la e que pretendia dispensa para o efeito, em dois períodos distintos, um da parte da manhã e outro da parte da tarde, cada um com a duração de uma hora.

9. - Esclareceu que amamentava a filha com intervalos de 4 horas entre cada amamentação e que, portanto, os períodos de dispensa teriam que ser compatíveis com tal realidade.

10. - E, expressamente, referiu que as necessidades de alimentação da filha não permitiam intervalos superiores a 4 horas entre cada acto de amamentação.

11. - Sabia a referida Directora, e foi-lhe então expressamente referido pela Autora, que na deslocação de sua casa para o local de trabalho, e deste para aquela, gastaria cerca de quinze minutos para cada lado, pelo que nenhum dos seus períodos de laboração deveria ter duração superior a três horas e trinta minutos.

12. - A Directora disse-lhe, então, para escrever uma carta onde esclarecesse quais os períodos concretamente pretendidos.

13. - Logo a Autora fez saber que lhe conviria atrasar em uma hora o horário de entrada, passando a entrar às 11 horas em vez de entrar às 10 horas, e antecipar a saída, saindo às 18 horas e 10 minutos em vez de sair às 19 horas, mantendo o intervalo para o almoço entre as 13 horas e as 14 horas e 30 minutos.

14. - No seguimento do que verbalmente comunicou, a Autora com data de 13 de Março de 2006, enviou ao Director da Ré a seguinte informação escAA:

“Eu, AA, venho por este meio informar que devido ao facto de ainda estar a amamentar o meu horário de trabalho será:

Entrada às 11 : 00

Saída para almoço 13 : 00

Entrada de Almoço 14:30

Saída 18:10

Este horário foi elaborado segundo o meu horário de trabalho retirando a uma hora e cinquenta e dois minutos a que tenho direito.

Este era o horário que eu queria quando me desloquei ao colégio no dia 2 de Março de 2006 para informar que estava a amamentar e não me foi possível falar com a direcção do colégio".

15. - A Ré estabeleceu à Autora o horário de trabalho seguinte: - das 12:15 às 13:00 horas e das 14:30 às 18:45 horas.

16. - A Autora contestou o horário e a partir da sua apresentação ao trabalho cumpriu unicamente o horário por si proposto:

Das 11:00 às 13:00 horas e das 14:30 às 18:10 horas.

17. - A Ré elaborou o auto de noticia de fls. 85, do qual consta que:

"A 09 de Março de 2006 a funcionária AA foi informada do horário a praticar no ano lectivo 2005/2006. A 16 de Março, quando retomou as suas actividades laborais, a trabalhadora arguida não respeitou o horário que lhe foi dado.

Na presente data a trabalhadora arguida continua a não cumprir o seu horário laboral. Não obstante ter sido avisada para cumprir o horário, a trabalhadora arguida continua a ter um comportamento incorrecto e passível de sanção disciplinar, pelo que, ordeno que se instaure o competente processo disciplinar, para o que nomeio instrutoras as Sr.as. Dr.as. CCe DD, ambas com escritório na Av. da …, n.º …, …. … Lisboa, onde poderá ser consultado o processo disciplinar".

18. - Com data de 24 de Março de 2006, a gerência da Ré remeteu à Autora a seguinte carta registada c/AR:

"Exma. Senhora,

Após se ter verificado que o horário registado no livro de ponto não corresponde à verdade dos períodos de trabalho efectivamente prestados, vimos por este meio informar que a partir da presente data os seus períodos de trabalho serão assentes no livro de ponto na Secretaria do Colégio por um Funcionário Administrativo ou Direcção.

O referido registo terá que ser feito mediante a comparência pessoal da Funcionária na secretaria do colégio nas suas horas de entrada e saída.

Fica assim a Funcionária inibida de preencher o referido livro ou inscrever qualquer comentário.

Mais informamos que os períodos assentes desde o dia 16 de Março, não correspondem à verdade pelo que serão processadas as referidas ausências com as consequências legais que daí advêm".

19. - Em 27 de Março de 2006 a instrutora nomeada Sr.a Dr.a CC procedeu à autuação do competente processo disciplinar.

20. - Com data de 29 de Março de 2006 a Ré entregou P.M.P. à Autora a seguinte comunicação:

"ASS. - Processo Disciplinar

 Envio de nota de culpa.

Exma Senhora,

Junto envio a nota de culpa elaborada no âmbito do processo disciplinar que a sociedade BB LIMITADA, instaurou contra V. Ex.a, advertindo-lhe expressamente de que lhe é concedido o prazo de dez dias úteis para responder, querendo, arrolar testemunhas, juntar documentos ou requerer quaisquer outros meios de prova que entender por conveniente.

Mais informo V. Ex.a que é intenção, face ao comportamento descrito na nota de culpa, proceder ao seu despedimento com justa causa.

Constituindo o seu comportamento justa causa de despedimento e face à gravidade dos factos que lhe são imputados, fica V. Ex.a notificada, nos termos do art. 417.°, n.º 2 do Código do Trabalho, da suspensão imediata da sua prestação de trabalho nesta sociedade, sem perda de retribuição, até conclusão do processo em curso, porquanto se considera que a sua presença na empresa é inconveniente".

21. - Em anexo à referida carta, foi junta a NOTA DE CULPA que culmina com a manifestação da intenção da Ré de proceder ao despedimento da A. com justa causa.

22. A A. apresentou resposta à nota de culpa, nos termos de fls.124/134, e que acompanhou a missiva de fls.123, datada de 07.04.2006.

23. Com data de 16.05.2006 a gerência da Ré remeteu à A., que a recebeu no dia imediato, carta registada onde lhe é comunicado que na sequência do processo disciplinar foi decidido proceder ao despedimento com justa causa.

24. Com a referida carta a gerência da Ré remeteu à A. a decisão final de onde resulta a decisão de despedimento com justa causa, com o fundamento de a A. não cumprir as suas obrigações, nomeadamente os deveres impostos nas als. a),b),c) e d) do  nº1 do artº 121º do CT.; e nos termos do artº396º, nº3, als.a),b),c),d),e),f) e i) do CT,  se ter tornado impossível a manutenção da relação laboral;

25.Com a resposta à nota de culpa a A. remeteu declaração médica, emitida em 06.04.04, conforme fls.135;

26. Em data não concretamente apurada mas entre os dias 16 e 29 de Março de 2006, a Ré fez circular pelo colégio, pais e alunos, a informação de ter sido instaurado processo disciplinar à A., que irá correr os seus trâmites normais, e os pais serão avisados das suas consequências.

27. - Ao tomar conhecimento da referida informação, a Autora sentiu-se envergonhada e humilhada perante os colegas, alunos e encarregados de educação.

28. - A partir do dia 16 de Março de 2006 e até ter sido suspensa, a Autora apresentou-se no seu local de trabalho pelas 11 horas, interrompendo a sua prestação de trabalho entre as 13 e as 14 horas e 30 minutos e saía do seu local de trabalho pelas 18 horas e 10 minutos.

29. - A Ré não autorizou a Autora a iniciar o seu trabalho antes das 12 horas e 15 minutos, nem a permanecer na sala de aula, chegando mesmo a dizer-lhe, por mais de uma vez que permanecesse fora das instalações do colégio até à hora do início do seu horário.

30. - A não autorização por parte da Ré, para que a Autora permanecesse na sala de aula ate à hora do início do horário estabelecido por aquela, e a afirmação de que deveria permanecer fora das instalações do colégio até ao início do seu horário, fez com que a Autora se sentisse ferida na sua dignidade, honra e consideração.

31. - A Autora sempre preencheu o livro de ponto em conformidade com o horário que a si própria impôs.

32. - A Ré, à data do despedimento da Autora empregava 19 trabalhadores.

33. - Em 2002, a Autora não gozou férias.

34. - Em 2003, teve férias entre 21/04 e 24/04, 09/05 e 12/05 e 11/08 a 29/08.

35. - Em 2004, gozou férias nos dias 9 e 27/01, 26/03, 29 e 30/04, 03/05, 11/06 e entre 26/07 e 06/08, e teve licença de casamento entre 12/01 e 26/01.

36. - Em 2005, teve férias entre 20/02 e 15/03 (não gozadas em 2004), 13/06, 11/07 a 15/07 e esteve de baixa entre 05/08 e 21/09 e de licença de maternidade entre 22/09 e 31/12.

37. - Em 2006, a Autora esteve de licença de maternidade entre 01/01 e 19/02 e gozou ferias (relativas a 2005) entre 20/02 e 15/03 e foi suspensa de funções a partir de 30/03.

38. - A Autora todos os dias de 2a feira a 6a feira, excepto nos feriados, nos dias em que esteve de baixa e de licença de maternidade, nos dias em que esteve de férias, nos dias 24 e 31 de Dezembro, nos dias em que esteve suspensa no âmbito do processo disciplinar e no dia 27 de Março de 2006 por ter estado doente, trabalhou 1 hora e 30 minutos, para além do seu horário normal, no exercício das funções de auxiliar de educação que acordou com a Ré.

39. - A Autora, para além do cumprimento do seu horário normal prestava serviços particulares de terapeuta ocupacional às crianças do colégio da Ré, de acordo com a solicitação dos respectivos pais, utilizando para o efeito as instalações da Ré, que esta lhe cedia.

40. - A Ré estipulava os horários das suas trabalhadoras, que atribuía a cada uma delas, no início de cada ano lectivo, ajustável às necessidades do colégio e consoante o número de alunos.

41. - A turma que a Autora acompanhava da parte da manhã, no horário fixado pela Ré a partir de 16 de Março de 2006, continha apenas dois alunos, e a da parte da tarde era composta por vinte e quatro alunos.

42. - 0 acompanhamento desses alunos dependia, apenas, da Autora, por esta prescindir da presença de uma auxiliar de educação, funções que acumulava.

43. - A Autora foi vista, antes de retomar as suas funções em 16 de Março de 2006, a alimentar a sua filha com alimentos sólidos.

44. - O último vencimento completo que lhe foi pago na vigência do contrato foi o relativo ao mês de Março de 2006.

45. - A Ré, relativo ao mês de Abril de 2006, não pagou à Autora o valor acordado de € 164,00, nem o correspondente ao subsídio de alimentação, bem como, o subsídio de alimentação que posteriormente se venceu até à data do despedimento

46. - A Ré não pagou à Autora a retribuição referente aos dias em que esta esteve ao seu serviço, no mês de Maio de 2006.

47. - Com data de 22/05/2006, a gerência da Ré enviou à Autora a seguinte carta:

"Exma. Sra. AA

O Colégio BB vem par este meio enviar o cheque correspondente ao seu fecho de contas no valor de € 2.060,73  (dois mil e sessenta euros e setenta e três cêntimos). Agradecemos que o recibo de vencimento seja assinado e devolvido para a morada do colégio".

48. - A Autora recebeu a quantia de € 2.060,73, titulada pelo referido cheque.

49. - A Ré com data de 05 de Junho de 2006 remeteu à Autora o cheque que se acha a fls. 81, emitido à ardem desta no valor de € 595,59, que se dá aqui por reproduzido, para pagamento do subsídio de férias e férias não gozadas, nos termos do recibo de vencimento emitido pela Ré em Maio de 2006, conforme reprodução do mesmo junta a fls. 82, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

50. - Com data de 15 de Junho de 2006, a Autora remeteu à Ré a seguinte carta:

"Exmos. Senhores

Recebi com uma carta vossa datada de 5 do corrente mês um cheque no montante de € 595,59 (quinhentos e noventa e cinco euros e cinquenta e nove cêntimos), acompanhado de um recibo em que se referem que essa quantia se destina ao fecho de contas.

Supõe V. Exa. por certo, que eu aceitei o despedimento: tal não é verdade e impugnarei em tribunal.

Consequentemente o que V. Exas. deverão fazer é pagar-me tudo o quanto é devido como se não tivesse sido despedida.

Para que não restem dúvidas devolvo-lhes, inutilizado, o cheque que me enviaram.

I I I )

Conhecendo da 1ª questão:

Nas conclusões do recurso a recorrente vem invocar a nulidade do Acórdão recorrido, tal como resulta das conclusões j) e k), por considerar que “houve violação do disposto no n.° 1 do art.° 661.° do CPC conjugado com o disposto na alínea e) do n.° 1 do art.° 668.° e alínea c) do n.° 1 do disposto no art.° 722.° todos do Código de Processo Civil, e nos termos do disposto na alínea c) do n.° 1 do art.° 668.° n.° 1 alínea c) e alínea c) do n.° 1 do art.,° 722.° do Código de Processo Civil”.

Contudo, a recorrente alude, nas suas conclusões à rectificação da sentença da 1ª instância na parte que condenou a Ré a pagar à Autora, a título de indemnização pela ilicitude do despedimento, a quantia correspondente ao produto de quarenta e cinco (45) dias de retribuição base pelo número de anos completos ou fracção decorridos desde 01/09/2002 até ao trânsito em julgado da decisão.

Defende a Ré que aquela condenação, deverá ser calculada a partir da data do despedimento da Autora/Recorrida que é de 16 de Maio de 2006 e não de 01/09/2002, já que esta data, corresponde àquela em teve início o contrato que vigorou entre as partes.

Segundo a Ré, trata-se de um lapso grosseiro de escAA, com implicações de natureza substantiva, mormente do quantum indemnizatório.

No Acórdão recorrido decidiu-se que, «se a Recorrente entendia que a sentença enfermava de qualquer vício, nomeadamente o propalado erro de escAA, devia ter requerido a respectiva rectificação perante o Sr. Juiz que proferiu a decisão, nos termos do n.º 1 do art.º 667.º do CPC, sendo que, como decorre do n.º 2 da mesma norma, “ Em caso de recurso, a rectificação só pode ter lugar antes de ele subir (…) “.

Mostra-se, pois, intempestiva a pretensão formulada pela Apelante, o que impede a sua apreciação, não se tomando conhecimento do objecto do recurso, nesta parte.»

Ora, quando a recorrente vem invocar a nulidade do Acórdão recorrido, tal como resulta das conclusões j) e k), e acima explicitado, o que a recorrente pretende é a apreciação da eventual nulidade do Acórdão da Relação com fundamento na al.e) do artº 668º do Código de Processo Civil.

E a ser assim, desde já se adianta que o requerimento de interposição do recurso não acompanha as exigências a que se refere o artº 77º do CPT, como adiante se demonstrará.

Mas atendendo à forma como vem arguida a nulidade do Acórdão recorrido, e apreciando, importa dizer que constitui jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal de Justiça, que o art.º 77.º n.º 1 do Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo D.L. nº 480/99, de 9 de Novembro, impõe que a arguição de nulidades das decisões judiciais recorridas seja feita, de forma expressa, concreta e separada no requerimento de interposição de recurso, e não em sede de alegações dirigidas ao Tribunal de recurso, mesmo que estas se sigam logo àquele.

Com efeito, como se escreveu já em acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça[1], quanto à nulidade da decisão, no requerimento de interposição do recurso “(...) tem de ser invocada e especificada por forma explícita e concreta, ainda que sucintamente, considerando que o requerimento de interposição, constitui uma peça processual diferente das alegações (sem prejuízo do mesmo ser logo seguido das segundas), até porque enquanto o primeiro é dirigido ao tribunal recorrido, que poderá eventualmente proceder ao seu conhecimento, aquelas últimas são dirigidas ao tribunal que há-de apreciar o recurso, sem prejuízo de a lei fazer apelo a uma "peça" única, pois o legislador deixou bem claro que a arguição de nulidades deve preceder a alegação, destacando-se dela explicitamente.

(…)

Assim, a arguição efectuada fora deste enquadramento, nomeadamente em sede de alegações, tem de ser considerada extemporânea, importando o seu não conhecimento".

Na verdade, segundo o artigo 77.º n.º 1 do Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo D.L. nº 480/99, de 9 de Novembro, “a arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso”.

Tal disposição é inequívoca acerca da forma que a arguição das nulidades da sentença deve assumir, em caso de recurso: essa arguição tem de ser feita expressa e separadamente no requerimento de interposição do recurso.

Como se refere em Acórdão deste Supremo, de 20.01.2010, in www.dgsi.pt, Processo nº 228/09.8YFLSB:

“II - Tal exigência, ditada por razões de celeridade e economia processual, destina-se a permitir que o tribunal recorrido detecte, rápida e claramente, os vícios arguidos e proceda ao seu eventual suprimento, sendo que exigência é, igualmente, aplicável à arguição de nulidades assacadas aos acórdãos da Relação, atento o disposto no art. 716.º, nº 1, do CPC.

III - Deste modo, está vedado às partes reservar a sobredita arguição para as alegações de recurso, pois se o fizerem o tribunal ad quem não poderá tomar dela conhecimento, por extemporaneidade invocatória”.

E por via do disposto no artigo 716.º n.º 1 do C.P.C. – tal regime é igualmente aplicável à arguição de nulidades assacadas aos acórdãos da Relação.

É que havendo uma clara separação formal e temporal entre o requerimento e as alegações, impõe-se que aquele contenha a adequada motivação da nulidade, a par, bem entendido, do seu prévio anúncio – por forma a que o órgão recorrido possa, desde logo, pronunciar-se sobre o vício aduzido.

Reside a sua razão de ser na vantagem para a economia e celeridade processuais, pois dá-se oportunidade de o tribunal recorrido sanar a nulidade arguida – por fundamentação, afastamento da posição ou dando sem efeito o excesso de pronúncia – o que é de particular valor no foro laboral.

Aguardando o recorrente a apresentação das alegações para o fazer, podem estas ficar parcialmente inúteis, já que o eventual reconhecimento e consequente reparação do vício podem modificar o objecto do recurso.

Tal como afirma o Tribunal Constitucional (Acórdão n.º 403/2000, de 27 de Setembro de 2000), “[t]rata-se de formalidade que, sobretudo quando o requerimento de interposição do recurso e as alegações constam da mesma peça processual, pode parecer excessiva e inútil, mas que ainda se justifica por razões de celeridade e economia processual” e que “não implica a constituição, para o recorrente, de um pesado ónus que pudesse dificultar de modo especialmente oneroso o exercício do direito ao recurso”, sendo que “não pode considerar-se incluído, dentro do direito ao acesso dos tribunais, o direito à obtenção de um despacho de aperfeiçoamento, quando se verifiquem obstáculos ao conhecimento do objecto do recurso”.

               No caso sub judice, no requerimento de interposição de recurso –fls. 405 - a Recorrente omitiu toda e qualquer alusão a pretensas nulidades da sentença, reservando a sua adução para as subsequentes alegações e respectivas conclusões já em sede de recurso.

           

  A invocação que o recorrente faz nas conclusões (concl.12ª) relativamente à inconstitucionalidade da norma do artº 77º nº1 citado, e Ac. do TC que cita, diz respeito “ [à] interpretação segundo a qual o tribunal superior não pode conhecer das nulidades da sentença que o recorrente invocou numa peça única, contendo a declaração de interposição do recurso com referência a que se apresenta arguição de nulidades da sentença e alegações e, expressa e separadamente, a concretização das nulidades e as alegações apenas porque o recorrente  inseriu tal concretização  após o endereço ao tribunal superior”.

Ora, no caso em apreço, lendo o requerimento de fls. 405, apresentado pela recorrente, constata-se que esta se limita a dizer o seguinte:

”BB – Infantário, Jardim de Infância e ATL., LDA/Recorrente nos autos do processo à margem melhor identificados, em que é Recorrida AA, não se conformando com o douto acórdão proferido em 14 de Setembro de 2011, e por estar em tempo, vem, muito respeitosamente, nos termos e ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 685.°,721.°,722.° e 723.°, todos do Código Processo Civil ex vi do artigo 81.º, n.º 5 do Código do Processo do Trabalho, à data em vigor, interpor recurso de Revista para o Venerando Supremo Tribunal de Justiça, o qual, salvo melhor opinião, é de subida imediata e efeito devolutivo, seguindo os seus ulteriores termos até final.”

Só após tal requerimento, e posteriormente a ter sido proferido despacho de admissão do recurso, e em sede de alegações, enuncia as questões sobre as quais versará o recurso, entre as quais a invocação da nulidade do acórdão. 

Não é, pois, a situação a que se refere o Ac. do TC que a recorrente invoca, uma vez que no requerimento apresentado pela mesma, esta se limita a declarar que vai interpor recurso da decisão proferida, mas sem que seja feita qualquer referência a arguição de nulidades da sentença, impedindo destarte a maior celeridade e economia processual, que o legislador quis imprimir, no domínio das normas que regulamentam as questões laborais.

Assim, a arguição das nulidades invocadas, nomeadamente com a invocação do art° 668°, n° 1, do Código de Processo Civil, apresenta-se extemporânea, porque feita em sede de alegações.

E, assim sendo, este Supremo não conhece da arguida nulidade.

Improcedem, pois, as conclusões a) a p) do recurso.

2ª Questão: da justa causa de despedimento.

Como foi entendido nas instâncias, sem discordância das partes, ao caso dos autos, é aplicável o regime constante do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27.08, atentas as datas das infracções disciplinares imputadas à A., ulteriores à entrada em vigor desse Código.

A 1ª instância entendeu, em síntese, que não ocorre justa causa para a resolução do contrato de trabalho da Autora, promovida pela Ré, fundamentando-se em que embora não assistisse à A. o direito de, unilateralmente, impor um horário de trabalho por si determinado, o facto de violar o horário de trabalho, saindo cerca de 35 minutos mais cedo do que o estipulado pela Ré, não assume uma gravidade impossibilitante da manutenção do vínculo laboral.

O acórdão recorrido confirmou a decisão da 1ª instância.

A recorrente, por sua vez, acentua que o comportamento da A. consubstancia também a violação do dever de obediência, tornando justificada a perda objectiva de confiança da recorrente no comportamento futuro da Recorrida, o que torna inexigível que aquela se mantivesse ao seu serviço.

               O acórdão recorrido fez adequadas considerações sobre a figura da “justa causa de despedimento”, sua noção e requisitos e respectivos critérios de apreciação e valoração, para as quais remetemos

              Relembremos, contudo, em síntese, os seguintes aspectos:

Segundo o disposto no art. 396º, nº 1, do Código do Trabalho, “o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral constitui justa causa de despedimento”.

              Por seu turno, pode ler-se, na parte que aqui interessa, no n.º 3 desse art.º 396 que indica, exemplificativamente, algumas infracções com virtualidade para integrarem justa causa de despedimento:

“Constituem, nomeadamente, justa causa de despedimento os seguintes comportamentos do trabalhador:

a) Desobediência ilegítima às ordens dadas por responsáveis hierarquicamente superiores;
(...)        g) Faltas não justificadas ao trabalho que determinem directamente prejuízos ou riscos graves para a empresa ou, independentemente de qualquer prejuízo ou risco, quando o número de faltas injustificadas atingir, em cada ano civil, 5 seguidas ou 10 interpoladas;”.

Sendo que, como tem sido uniformemente defendido nesta Secção Social, os requisitos gerais previstos no n.º 1 do art.º 396º valem também quanto aos comportamentos tipificados no n.º 3.

Na ponderação sobre a gravidade da culpa e das suas consequências, importará considerar o entendimento de um “bonus pater familias”, de um “empregador razoável”, segundo critérios de objectividade, em função das circunstâncias de cada caso em concreto.

Por outro lado, o apuramento da “justa causa” corporiza-se, essencialmente, no segundo elemento acima referido: impossibilidade prática e imediata da subsistência da relação de trabalho.

Relativamente à interpretação desta componente objectiva da “justa causa”, têm a doutrina e a jurisprudência vindo a coligir as seguintes vertentes:

- a impossibilidade de subsistência de vínculo laboral deve ser reconduzida à ideia de “inexigibilidade” da manutenção vinculística;

- exige-se uma “impossibilidade prática”, com necessária referência ao vínculo laboral em concreto;

- e “imediata”, no sentido de comprometer, desde logo e sem mais, o futuro do contrato.

Para integrar este elemento, torna-se necessário fazer um prognóstico sobre a viabilidade da relação contratual, no sentido de saber se ela mantém, ou não, a aptidão e idoneidade para prosseguir a função típica que lhe está cometida (cfr. Lobo Xavier in “Curso de Direito do Trabalho”, páginas 490 e segs.).

Segundo Monteiro Fernandes (in “Direito do Trabalho”, 12.ª edição, páginas 557 e segs.), a “inexigibilidade” determina-se mediante um balanço, em concreto, dos interesses em presença – fundamentalmente, o da urgência na desvinculação e o da conservação do vínculo – havendo “impossibilidade prática de subsistência da relação laboral” sempre que a continuidade do contrato represente (objectivamente) uma insuportável e injusta imposição ao empregador, isto é, sempre que a subsistência do vínculo e das relações que ele supõe sejam “... de molde a ferir, de modo desmesurado e violento, a sensibilidade e a liberdade de uma pessoa normal, colocada na posição do empregador”.[2]

Isto é, torna-se necessário que nenhum outro procedimento se revele adequado a sanar a crise contratual.

                                         

À indagação da “justa causa” de despedimento presidem, necessariamente, juízos valorativos que devem ter em conta as regras do ónus da prova a que se reporta a lei civil substantiva (artº342º do Cód. Civil).

Isto é, cabe à entidade empregadora, a prova dos factos constantes da decisão de despedimento, integradores da respectiva justa causa.

E no âmbito daqueles juízos valorativos assumem especial relevância “o papel da confiança nas relações de trabalho, salientando-se a sua forte componente fiduciária para se concluir que a confiança contratual é particularmente afectada quando se belisca o dever de leal colaboração, cuja observância é fundamental para o correcto implemento dos fins prático-económicos a que o contrato se subordina”.

Neste contexto, salienta Baptista Machado que “... o núcleo mais importante de violações do contrato, capazes de fornecer justa causa à resolução, é constituído por violações do princípio da leal colaboração, imposto pelo ditame da boa fé. Em termos gerais, diga-se que se trata de uma quebra da “fides” ou da “base de confiança” do contrato ...” (in R.L.J. 118.º, 330 e segs.).

Importa, por outro lado – tal como bem se refere no acórdão recorrido -, não esquecer que, sendo o despedimento imediato a sanção disciplinar mais gravosa para o trabalhador, a mesma só deve ser aplicada relativamente a casos de real gravidade, isto é, quando o comportamento culposo do trabalhador for de tal forma grave em si e pelas suas consequências que se revele inadequada para o caso a adopção de uma qualquer outra sanção correctiva mas conservatória da relação laboral. Isso verificar-se-á apenas quando a conduta violadora assumida, culposamente, pelo trabalhador ponha, definitivamente, em causa a relação de confiança em que assenta o referido vínculo laboral.

Importa ainda considerar que nos termos do disposto no n.º 2 do citado art. 396º, “Para a apreciação da justa causa deve atender-se, no quadro da gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes (…) e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes”.

Expostos os princípios gerais de enquadramento, vejamos se, no caso, se verifica ou não a justa causa de despedimento.

No que aqui interessa, o Acórdão recorrido fundamentou assim o entendimento de que não houve justa causa de despedimento:

« […] No dia 02 de Março de 2006, e porque iria retomar a sua actividade no imediato dia 16, após licença de parto e gozo de férias, a Autora deslocou-se ao seu local de trabalho e falou com a Directora da Ré a quem comunicou que estava a amamentar a filha, que iria continuar a amamentá-la e que pretendia dispensa para o efeito, em dois períodos distintos, um da parte da manhã e outro da parte da tarde, cada um com a duração de 1 hora.

Esclareceu que amamentava a filha com intervalos de 4 horas entre cada amamentação e que, portanto, os períodos de dispensa teriam que ser compatíveis com tal realidade.

E, expressamente, referiu que as necessidades de alimentação da filha não permitiam intervalos superiores a 4 horas entre cada amamentação.

Sabia a referida Directora, e foi-lhe então expressamente referido pela Autora, que na deslocação de sua casa para o local de trabalho, e deste para aquela, gastaria cerca de quinze minutos para cada lado, pelo que nenhum dos seus períodos de laboração deveria ter duração superior a três horas e trinta minutos.

A Directora disse-lhe, então, para escrever uma carta onde esclarecesse quais os períodos concretamente pretendidos.

Logo a Autora fez saber que lhe conviria atrasar em uma hora o horário de entrada, passando a entrar às 11 horas em vez de entrar às 10 horas, e antecipar a saída, saindo às 18 horas e 10 minutos em vez de sair às 19 horas, mantendo o intervalo para o almoço entre as 13 horas e as 14 horas e 30 minutos.

No seguimento do que verbalmente comunicou, a Autora com data de 13 de Março de 2006 enviou ao Director da Ré a seguinte informação escAA:

“ Exm.º Sr.

Director do Colégio BB

Eu, AA (…) …, venho por este meio informar que devido ao facto de ainda estar a amamentar o meu horário de trabalho será:

           Entrada às               11:00

           Saída para almoço   13:00

           Entrada de almoço  14:30

           Saída                        18:10

Este horário foi elaborado segundo o meu horário de trabalho retirando a uma hora e cinquenta e dois minutos a que tenho direito.

Este era o horário que eu queria quando me desloquei ao colégio no dia 2 de Março de 2006 para informar que estava a amamentar e não me foi possível falar com a direcção do colégio”.

A Ré estabeleceu à Autora o horário de trabalho seguinte:

-          Das 12:15 às 13:00 horas e das 14:30 às 18:45.

16.      A Autora contestou o horário e a partir da sua apresentação ao trabalho cumpriu unicamente o horário por si proposto: das 11:00 às 13:00 horas e das 14:30 às 18:10 horas.

18.      Com data de 24 de Março de 2006, a gerência da Ré remeteu á Autora a seguinte carta com A/R:

“Exm.ª Senhora

(…) Vimos por este meio informar que a partir da presente data os seus períodos de trabalho serão assentes no livro de ponto na secretaria do colégio por um funcionário administrativo ou Direcção.

O referido registo terá que ser feito mediante a comparência pessoal da funcionária na secretaria do colégio nas suas horas de entrada e saída.

Fica assim a funcionária inibida de preencher o referido livro ou inscrever qualquer comentário. (…)”.

A partir do dia 16 de Março de 2006 e até ter sido suspensa, a Autora apresentou-se no seu local de trabalho pelas 11 horas, interrompendo a sua prestação de trabalho entre as 13 h e as 14 h e 30 m e saía do seu local de trabalho pelas 18 horas e 10 minutos.

A Autora sempre preencheu o livro de ponto em conformidade com o horário que a si própria impôs.

Como decorre do art.º 170.º do CT de 2003 é ao empregador que compete definir o horário de trabalho dos trabalhadores ao seu serviço dentro dos condicionalismos legais.

A faculdade atribuída ao empregador de, no uso do poder de direcção, estabelecer o horário de trabalho do pessoal ao seu serviço, abrange a fixação de um novo horário, sem necessidade de acordo do trabalhador, salvo nas situações em que o próprio horário conste das estipulações contratuais (art.º 173.º, n.º 1 do mesmo diploma).

No caso concreto, o próprio contrato de trabalho previa a possibilidade de ocorrer alteração do horário de trabalho “Sempre que a firma outorgante (aqui Ré) veja necessidade para o melhor funcionamento do colégio (cl. 4.ª).

No ano lectivo de 2005/2006, após a Autora se ter apresentado ao serviço, decorrido o período de licença de maternidade e férias, a Ré estipulou-lhe o seguinte horário: de 2.ª a 6.º feira das 12:15 às 13 h e das 14.30 às 18:45.

A Autora não aceitou esse horário, invocando que o mesmo não respeitava o direito que lhe assistia à amamentação do seu filho, de acordo com o previsto no art.º 73.º, n.º 2 do R.C.T..

Vejamos.

A Subsecção 4.ª da Secção 2.ª do capítulo 1.º do título 2.º do C.T. de 2003 (art.ºs 33.º a 52.º) dedica-se à protecção da maternidade e da paternidade, definindo-os como “valores sociais eminentes” (art.º 33.º, n.º 1).

De acordo com o art.º 39.º, n.º 2, “a mãe que, comprovadamente, amamente o filho tem direito a dispensa de trabalho para o efeito, durante todo o tempo que durar a amamentação”.

Este preceito é regulamentado pelo art.º 73.º do Reg. do C.T. (Lei n.º 35/2004, de 29.7) que consagra, no seu n.º 3, o direito da trabalhadora a uma dispensa diária para amamentação gozada em dois períodos distintos com a duração máxima de uma hora, salvo se outro for o regime acordado com o empregador”.

Como refere Catarina Carvalho (A protecção da Paternidade e da Maternidade no novo Código do Trabalho, RDES, 2004, ano XLV, pág. 41 e sgs.), na falta de acordo entre entidade patronal e trabalhadora parece que não poderá, de modo algum, ser o empregador a fixar estes períodos de acordo com as conveniências da empresa.

Como refere nesse estudo, citado também por Júlio Vieira Gomes (Dt.º do Trabalho, Vol. I, pág. 447) “(…) a alimentação da criança não pode secundarizar-se em função dos interesses empresariais”.

Daqui decorre que o horário de trabalho estabelecido pelo empregador há-de respeitar as necessidades de amamentação do lactante, sofrendo as compressões que se imponham, de acordo com o regime fixado no art.º 73.º, n.º 2 supra referido.

Na ausência de acordo entre as partes, a Autora tinha direito à dispensa diária de dois períodos distintos, cada um deles com a duração máxima de 1 hora.

E esses períodos terão que respeitar as necessidades de amamentação da criança, sob pena de se frustrar a finalidade para que essas dispensas são concedidas.

Ora, no caso vertente, verifica-se que o horário estabelecido pela entidade empregadora não acolhe aquelas regras e este desiderato.

Sendo que anteriormente a 16.3.2006 a Autora cumpria o horário das 10 h às 13 h e das 14,30 às 19 h, verifica-se que, no período da manhã, a Ré reduziu o horário em 2 h 15 m e, no período da tarde em 15 m, não concordando com a pretensão da primeira que desejava a redução de 1 hora na parte da manhã e de 50 minutos no período da tarde.

A discordância da Apelante radica nos seus próprios interesses já que, no período da manhã, a Autora tinha apenas dois alunos a seu cargo, enquanto da parte da tarde estavam-lhe afectos 24 alunos.

Porém, como acima referimos, embora desejavelmente o horário de trabalho devesse compatibilizar os interesses de ambas as partes, certo é que, como referimos, em caso de conflito, os interesses da criança – que contemplam o direito de ser amamentada pela mãe/trabalhadora durante todo o período em que esta o considere conveniente – devem ter prioridade.

Assim, e porque o horário fixado pela Ré era lesivo desses interesses, na medida em que não permitia respeitar, no período da tarde, o intervalo máximo de 4 horas de amamentação, do qual a Ré tinha, desde o início, conhecimento, deve ter-se por ilegal.

Destarte, a ordem dada pela entidade patronal para que a Autora a cumprisse, há-de ter-se por ilegítima, não lhe devendo esta obediência.

Porque a Autora praticou um horário que estava compreendido no que anteriormente lhe havia sido fixado pela Ré, com as reduções a que tinha direito, contempladas no art.º 73.º, n.º 3 do R.C.T., também não se pode dizer que a Autora tivesse incorrido em faltas injustificadas. Aliás, o horário que a Autora pretendeu cumprir e de acordo com o qual se apresentou ao serviço era até, na sua duração total, mais alargado que o estabelecido pela Ré.

Por outro lado, também não ficou demonstrado que a Ré tivesse “rasurado” ou “falsificado” o livro de ponto, limitando-se esta a nele exarar o horário que pretendeu cumprir a partir de 16.03.06.

O facto de não ter respeitado as instruções da Ré, transmitidas pelo escrito de 24.3.2006, no sentido de não dever ser aquela a preencher o livro de ponto, mas antes o pessoal da secretaria, também não reveste, por si só, embora represente violação do dever de obediência, gravidade suficiente que comprometa irremediavelmente a subsistência da relação laboral.

Por todo o exposto concluímos, como o fez a 1.ª instância, que inexiste justa causa para o despedimento da Autora.»

Sufraga-se, in totum, este entendimento.

Das normas citadas no Acórdão da Relação, nomeadamente dos arts.170.º, 39.º, n.º 2, art.º 33.º, n.º 1, do CT de 2003,  e art.º 73.º, n.º 2 da Lei nº 35/2004 de 29/07, como foi entendido e é sublinhado no douto parecer do Ex.mo Procurador-Geral Adjunto neste Supremo, “advém, recair sobre o empregador, ao estabelecer o horário de trabalho de uma mãe que amamenta, a obrigatoriedade de o mesmo ser fixado, tendo em conta as necessidades de amamentação do lactente, relegando assim, para segundo plano, eventuais interesses da empresa no cumprimento de horários por si fixados.

Assim, em situações como a presente, em que não foi possível acertar os interesse de ambas as partes, os interesses do lactente devem sobrepor-se aos interesses da entidade patronal da mãe, pelo que a ordem dada, no sentido de aquela cumprir um horário totalmente incompatível com a amamentação da recém-nascida, se mostra ilegítima e, enquanto tal, a Autora não estava obrigada a cumpri-la”.

Na verdade, a ordem dada pela Ré, no sentido de a A. dever cumprir um horário de trabalho incompatível com a necessidade de amamentar a sua filha, viola as normas dos citados artºs 39º do CT/2003 e 73.º, n.º 2 da Lei nº 35/2004 de 29/07, pelo que não lhe deve a A. obediência.

Não é por acaso que na secção do CT referente à protecção da parentalidade (maxime artº 33º nº1), se definem a maternidade e a paternidade, como “valores sociais eminentes”.

Tal como se decidiu no Acórdão posto em crise, não configura, assim, o comportamento da Autora uma situação de justa causa de despedimento, sendo o mesmo ilícito.

Improcedem, também nesta parte, as conclusões do recurso.

I V )

            Em face do exposto, nega-se a revista.

   Custas pela recorrente

Lisboa, 8 de Maio de 2012

Sampaio Gomes (Relator)

Pinto Hespanhol

Fernandes da Silva

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[1] Ac. do STJ de 01-02.2001 (Revista n.º 124/00).
[2] Cfr. Ac. do STJ de 22-09-2010, Rec. Nº217/2002.L1.S1 (4ª secção).