Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
19368/21.9T8SNT.L1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: ISABEL SALGADO
Descritores: RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
ACIDENTE DE VIAÇÃO
ACIDENTE DE TRABALHO
CONCORRÊNCIA DE CULPAS
CULPA DO LESADO
ÓNUS DA PROVA
ILICITUDE
INFRAÇÃO ESTRADAL
CIRCULAÇÃO AUTOMÓVEL
VEÍCULO AUTOMÓVEL
MOTOCICLO
CAUSALIDADE CUMULATIVA
NEXO DE CAUSALIDADE
TEORIA DA CAUSALIDADE ADEQUADA
Data do Acordão: 11/06/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE
Sumário :
I. A jurisprudência tem atenuado o ónus de prova da culpa com suporte em prova de primeira aparência, fundada em presunções judiciais simples que habilitam a inferir que, quem incumpre a regra de trânsito e, provoca danos a terceiros, o faz por razões que lhe são imputáveis, salvo se demonstrar que tal violação foi alheia à sua vontade.

II. Constituiu jurisprudência sólida deste Supremo Tribunal na interpretação do artigo 563ºdo Código Civil, que a recepção da doutrina da causalidade adequada na sua formulação negativa, implica que: i. não pressupõe a exclusividade do facto condicionante do dano; ii: não obriga a que a causalidade seja direta e imediata, aceitando a ocorrência de outros factos condicionantes, contemporâneos ou não; iii. aceita a causalidade indireta, sendo suficiente que o facto condicionante desencadeie outro que diretamente provoque o dano.

III. funcionamento do artigo 570º, n.º 1,do Código Civil exige que a conduta culposa do lesado tenha concorrido (ou agravado) a produção do dano, à luz da teoria da causalidade.

IV. A intervenção do Supremo Tribunal em juízos formulados pelas instâncias com recurso à equidade, na ponderação das particularidades e especificidades do caso concreto, deverá averiguar se, o juízo equitativo é conforme com os princípios da igualdade e da proporcionalidade — e que conduza a uma decisão razoável.

V. O dano reparável em sede de responsabilidade por acidente de trabalho é limitado à perda da capacidade de trabalho ou de rendimento salarial, enquanto o escopo do dano biólogo visa compensar um conjunto alargado de limitações com impacto patrimonial para o lesado, como sejam a frustração de oportunidades laborais ou tarefas de cariz económico de maior rentabilidade.

VI. As intervenientes que efetuaram o pagamento prévio ao lesado trabalhador, sub-rogadas se - e na medida - em que for estabelecida a responsabilidade extracontratual de terceiro pela ocorrência, beneficiam do acórdão que lhes foi favorável.

Decisão Texto Integral:

I. Relatório

A acção

AA demandou Generali Seguros, S.A. Companhia de Seguros, S.A. na presente ação declarativa de condenação com processo comum, pedindo que a sua condenação no pagamento da indemnização no valor global de 411.125,90€ (quatrocentos e onze mil cento e vinte e cinco euros e noventa cêntimos), acrescida de juros de mora.

Alegou, em síntese, que no dia 20 de julho de 2019, em ..., Sintra, ocorreu um acidente de viação que envolveu o seu motociclo que conduzia e, o veículo ligeiro conduzido por BB, único culpado do sinistro e que transferira a responsabilidade civil inerente à circulação para a ré.

Mais alegou que, em consequência do acidente sofreu traumatismos diversos, sujeito a intervenção cirúrgica e a diversos tratamentos e após internado no Centro de Medicina e de Reabilitação de Alcoitão; que tinha então 38 anos e era saudável; exercia a atividade de empregado de manutenção e nadador-salvador, e que o acidente ocorreu quando se deslocava do local de trabalho para a sua residência, estando relativamente às perdas salariais a correr termos o processo no Tribunal de Trabalho.

Mais alegou, que ficou fisicamente impedido de realizar o trabalho; não controla os esfíncteres e passou a sofrer de disfunção erétil; é ainda possível que as sequelas se venham a agravar no futuro; o motociclo ficou inutilizado e impossibilitado de circular, bem como o capacete e vestuário que utilizava. Despendeu ainda quantias em consultas médicas. Sofreu igualmente danos não patrimoniais.

A Ré contestou, impugnando a imputada culpa do seu segurado, e mesmo que se considere que contribuiu para a produção do sinistro, nunca o autor poderá deixar de concorrer em sede de responsabilidade e culpa , reduzindo pelo menos, para metade da indemnização que eventualmente se repute devida por efeito dos danos que se julguem provados.

Impugnou ainda os valores peticionados a título de dano biológico, sob pena de duplicação na indemnização , uma vez que o autor já se encontra ressarcido em sede de acidente de trabalho, pelos mesmos danos.

Lusitânia - Companhia de Seguros, S.A. veio requerer a intervenção principal espontânea nos autos, na qualidade de seguradora da entidade patronal do autor.

Requer que a Ré, seguradora do condutor do veículo ligeiro e único culpado pelo acidente, seja condenada a ressarcir a interveniente dos montantes que pagou, no montante de € 68.715,45 acrescida dos juros de mora ;bem como no pagamento das prestações suplementares que venham a ser liquidadas por conta do autor, a liquidar em execução de sentença.

Conjunto Turístico das Arribas, S.A. veio requerer a intervenção principal espontânea nos autos, na qualidade de entidade patronal do autor, pedindo a condenação da ré. a pagar-lhe a quantia de € 3.617,57 acrescida de juros de mora legais até ao integral pagamento, bem como no pagamento da quantia de € 850,64 ao A. a título de pensão anual vitalícia, sujeito às atualizações legais, com respeito aos anos de 2023 e seguintes; que caso assim não se entenda deve a ré ser condenada a compensá-la dos montantes eventualmente pagos ao autor, a título de pensão anual vitalícia, para os anos de 2023 e seguintes.

A Ré em resposta aos articulados de intervenção principal espontânea apresentados ( oportunamente admitidos ), pugnou pela respetiva improcedência.

A sentença

Seguidos os demais termos da instância, realizada a audiência final, proferiu-se sentença que julgou improcedente a acção e absolveu a Ré de todos os pedidos.

A apelação

Inconformado, o Autor apelou , defendendo a revogação integral do julgado de primeira instância por erro no julgamento de facto e de direito, e a condenação da Ré nos termos peticionados.

O Tribunal da Relação de Lisboa lavrou o douto acórdão precedente, que culmina no seguinte dispositivo:

“ Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente o presente recurso e, em consequência:

a) Revogam a sentença proferida;

b) Condenam a ré a pagar ao autor a quantia total de 327.692,95 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal aplicável aos juros civis, a contar desde a data da citação até integral pagamento, sendo: 2.692.95 €, a título de danos patrimoniais; 195.000,00 €, a título de dano biológico; 130.000,00 €, a título de danos não patrimoniais.

c) Condenam a ré a pagar às intervenientes as seguintes quantias, acrescida de juros de mora, à taxa legal aplicável aos juros civis, a contar desde a data do trânsito desta decisão até integral pagamento: À interveniente Lusitânia - Companhia de Seguros, S.A, o valor de 44.663,11 €; À interveniente Conjunto Turístico Arribas, S.A., o valor de 2.315.59 €;

Às intervenientes, 65% das prestações em que estas foram condenadas no âmbito do processo laboral, que venham a ser por estas liquidadas ao autor, por força daquela decisão, incluindo as quantias de € 6.898,57 (seis mil, oitocentos e noventa e oito euros e cinquenta e sete cêntimos), a cargo da interveniente Lusitânia - Companhia de Seguros, S.A. e a quantia de € 850,64 (oitocentos e cinquenta euros e sessenta e quatro cêntimos), a cargo da Conjunto Turístico Arribas, S.A., a título de pensão anual e vitalícia.

Custas por apelante e apelada na proporção de 35% para o primeiro e 65% para a segunda.”

A(s) Revista(s)

Irresignada, agora a Ré, reclama na revista pela sua absolvição dos pedidos e, a título subsidiário, pela redução da medida da sua responsabilidade e dos valores indemnizatórios a fixar, conforme desenvolve no instrumento de recurso.

As alegações terminam com as conclusões de extensão inapropriada, que em transcrição parcial e no relevante afirmam:

« [..]Foi, pois, no decurso da manobra de ultrapassagem e por causa desta que o motociclo do Autor/Recorrido embateu no veículo seguro na aqui Ré Recorrente, numa altura em que este estava em plena realização da manobra de mudança de direção à esquerda…. é igualmente factual que o condutor do veículo seguro na Recorrente sinalizou a sua intenção de mudar de direcção à esquerda.

VIII. Isto posto, e acrescido ainda do já constatado facto confesso quanto ao “à vontade” e perfeito conhecimento pelo condutor Recorrido das características daquela via [porquanto era o caminho que fazia há 15 anos, sendo inclusivamente o seu trajeto típico… era igualmente dever do Autor/Recorrido abrandar a marcha porquanto se provou que na Estrada Nacional nº 247, a cerca de 80 metros do entroncamento com esta da Rua Visconde de Monserrate, existe uma placa indicativa da localidade de Galamares e a cerca

de 50 metros do mesmo entroncamento um sinal de trânsito de aproximação de passagem

de peões no sentido Colares-Sintra, ….

X. Deveria igualmente ter abrandado a marcha perante a manifestação de intenção do veículo que o antecedia de mudar de direção à esquerda pois resultou provado que o condutor do veículo seguro na Recorrente após entrar na faixa [da direita] colocou o sinal de pisca do lado esquerdo para entrar na Rua Verde Pinho, após o que iniciou a manobra de mudança de direção à esquerda para entrar nessa via….

XII. Atente-se ainda que não foi julgado por provado que o motociclo circulasse a 50Km/h. …

XIV. Mais: 50/60/70 metros de distância representam, quer em abstrato quer em concreto, uma distância de segurança suficiente, isto é, um espaço livre e visível suficiente, para se ser capaz de, em segurança, manter a sua marcha (dentro dos limites de velocidade, naturalmente) ou no mínimo, abrandá-la. Ou seja, a esta distância está claro que se não impõe o dever de cedência de passagem!...

XVI. Isto posto, está claro que não logrou o Autor / Recorrido provar, como é seu ónus (cfr. artigos 342.º e 487.º n.º 1 do Código Civil e 414.º do CPC), que o acidente em apreço ocorreu, como alega, por culpa do condutor do veículo seguro na Recorrente….

XVII. Com efeito, não poderia o condutor do veículo seguro na Recorrente prever que o motociclo à sua retaguarda iria iniciar (repentina e inadvertidamente) uma manobra de ultrapassagem em local proibido e perigoso.

XVIII. Concomitantemente, não violou o condutor do veículo seguro na Recorrente do disposto no artigo 21.º do Código da Estrada …

XXI. E, na senda do exposto, não se verifica qualquer comportamento do condutor do veículo seguro na recorrente violador de norma destinada a proteger interesses de terceiros, não se verifica qualquer comportamento culposo e nem tão pouco (e ainda que se considerasse a ausência de dever de cuidado mencionada pelo Tribunal a quo aquando da entrada do veículo seguro na EN247) qualquer nexo causal com o evento danoso.

XXII. Assim, sempre devendo a seguradora aqui Recorrente ser integralmente absolvida do(s) pedido(s) contra si formulado(s) nos presentes autos.

XXIII. Sem prescindir, ainda abono da verdade, há que ter em consideração que, atento o comportamento julgado por provado e supra descrito perpetrado pelo condutor do motociclo, provada se acha a culpa do lesado.

XXIV. Desde logo, quanto à posição e marcha do motociclo, foram por este incumprido o disposto nos artigos 11.º n.º 2, 24.º n.º 1, 25.º n.º 1 alíneas a), c) e H), 13.º n.º 1 e 41.º n.º 1 alíneas c) e d), todos do Código da Estrada. …

XXVI. Caso o aqui Autor/Recorrido circulasse com as necessárias e exigíveis cautela e atenção, teria vislumbrado a sinalização de mudança de direção à esquerda pelo condutor do veículo seguro e teria respeitado, nomeadamente, o disposto no art.º 41.º do Código da Estrada...

XXX. Esta dinâmica do acidente rodoviário em apreço deverá ser valorada, na justa medida, enquanto elemento demonstrativo de acto ilícito e culposo, bem como causal do evento em apreço nos autos. Foi, assim, o Autor ora recorrido quem contribuiu unicamente para a verificação da colisão entre veículos e dos danos dele decorrentes, consubstanciando razão idónea para afastar a responsabilidade imputada ao condutor do veículo seguro na aqui Ré Seguradora….

XXXV. Acresce que, ainda que por absurdo se considerasse que apenas sobre o veículo seguro na aqui Ré/Recorrente recairia a presunção de culpa pelo risco inerente à circulação de veículo terrestre (cfr. art.º 503.º do Código Civil), o que se não concebe nem concede e por mero dever de cautela se cogita, certo é que tal presunção não resulta apenas ilidida, mas também refutada.

XXXVI. Como afirma Menezes Leitão (in “Direito das Obrigações”, vol. I, Almedina, 5.ª edição, pág. 370) refere que a responsabilidade pelo risco é excluída sempre que o acidente seja imputável ao próprio lesado, sendo que a expressão “imputável” não significará que seja exigível a culpa do lesado, sendo, porém, necessário que a sua conduta tenha sido a única causa do dano.

XXXVII. Além disso, à imagem do que sucede na situação dos presentes autos, o Autor/Recorrido atua em contravenção com as regras estradais configurando tal conduta causa do acidente ocorrido, não podendo qualificar-se o sucedido como risco do veículo…

XXXIX. Em virtude disso, também a eventual obrigação de indemnizar resultante de responsabilidade objetiva ou pelo risco por acidentes devidos a veículos de circulação terrestre resulta prejudicada na medida do previsto pelos art. 483.º, nº2, 499.º e 503.º a 508.º, todos do Código Civil, pois apesar de esta formulação da responsabilidade civil ser independente de culpa apurada, sendo o acidente imputável ao lesado, o nexo de causalidade entre o risco e o dano é interrompido e não dá lugar a responsabilidade objetiva do detentor do veículo (cfr. art.º 505.º do Código Civil)….

XLIII. Destarte, ainda que da douta análise Meritíssimo Tribunal ad quem resulte o entendimento de que dos factos constantes dos autos não é possível concluir pela exclusão da responsabilidade da Ré Seguradora ora Recorrente - o que se não concebe nem concede e por mero dever de cautela se cogita -, a atuação culposa do Autor ora Recorrido projetada no acidente e pelo Meritíssimo Tribunal a quo evidenciada, permite afirmar que o comportamento daquele foi fundamental e contribuiu de forma decisiva e preponderante para a ocorrência do acidente….

XLV. Neste mesmo contexto, entendeu o douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17.06.2024 (Proc. n.º 107/21.0T8ETR.P1) …” a violação pelo lesado da proibição de ultrapassagem é causal do acidente não podendo o mesmo ser imputado exclusivamente ao outro condutor, sendo justificado concluir pela concorrência da culpa do lesado para a ocorrência dos danos.”

E também assim, a 2.ª Secção Cível do douto acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 28.05.2024 (Proc. n.º 1203/22.2T8GRD.C1.S1…” Conclui-se, assim, não merecer censura o entendimento do tribunal a quo que fixou a medida das responsabilidades dos condutores na proporção da culpa respectiva: 70% para o condutor do motociclo e 30% para o condutor do veículo NU.”.

Pelo que, ad cautelam, deverá a decisão recorrida ser alterada na parte em que conclui que a conduta do lesado corresponde a uma culpa menos grave que o condutor do veículo seguro quantificável em apenas 35%, qualificando tal comportamento de gravoso e quantificando a responsabilidade do lesado em, pelo menos 70%, e consequentemente, julgando a acção parcialmente procedente, absolvendo a Ré e aqui Recorrente do(s) pedido(s) nessa mesma proporção (de 30%).

XLIX. Ainda, a respeito dos valores indemnizatórios pelo Tribunal a quo arbitrados, antes demais, cumpre recordar o quadro factual apurado para a quantificação do dano biológico na vertente patrimonial, e com relevo para a decisão da causa,

L. Ora, o acidente dos autos configura um acidente simultaneamente de viação e de trabalho, encontrando-se o Autor/Recorrido a receber, na sequência da sentença proferida no processo de acidente de trabalho. uma pensão anual e vitalícia por uma elevada incapacidade permanente parcial (IPP) que lhe foi reconhecida em 59,325%, a partir de 13 de março de 2020, com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH). Pelo que, considera-se que tal indemnização já abarca o ressarcimento pelo dano biológico, na sua vertente patrimonial, correspondente à perda da capacidade de ganho. Com efeito, é consabido que num acidente de viação que constitua simultaneamente um acidente de trabalho, o sinistrado terá de optar entre a indemnização a auferir num ou noutro âmbito (laboral ou de responsabilidade civil extracontratual), sob pena de enriquecimento sem causa justificativa por ressarcimento indevido e duplicado pelo mesmo dano (cfr. art 473.º e seguintes do Código Civil).

LII. E, no caso concreto, não se pode considerar sequer a existência de um qualquer direito indemnizatório compensatório adicional na medida em inexiste qualquer dano patrimonial adveniente do défice funcional de integridade físico-psíquica a ressarcir, porquanto para além do lesado já beneficiar da protecção indemnizatória em sede de acidente de trabalho, não ocorreu uma efectiva perda da capacidade de ganho, com perda de rendimento do trabalho, na medida em que o mesmo beneficiou da adaptação do posto de trabalho.

LIII. A este respeito, é a jurisprudência portuguesa consensual, desde logo, a do Supremo Tribunal de Justiça, cujo sumário do douto acórdão proferido em 14.12.2016, no âmbito do processo n.º 1255/07.5TTCBR-A.C1.S1 (disponível em www.dgsi.pt),”. Quando o sinistro for, simultaneamente, de viação e de trabalho, as indemnizações consequentes não são cumuláveis, mas antes complementares, assumindo a responsabilidade infortunística laboral caráter subsidiário, pelo que os responsáveis pela reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho ficam desonerados do pagamento de indemnização destinada a ressarcir os mesmos danos já reparados pelos responsáveis dos danos atinentes ao acidente de viação….

LVI. Nesta senda, sempre deverá a decisão recorrida ser revogada na parte em que conclui pela atribuição de indemnização por efeito do dano biológico na sua vertente patrimonial (os €300.000,00 e respectiva proporção).

LVII. Ainda que assim se não entenda, o que nem por absurdo se admite e por mero dever de cautela se cogita, caso se considere que existem danos enquadráveis no conceito mais vasto de dano biológico, que não estão contemplados na indemnização por acidente de trabalho, sempre, necessariamente, se terá de selecionar com muito maior critério os factos que o permitem quantificar. A indemnização deverá, assim, obedecer ao disposto nos art. 562.º e seguintes do Código Civil e princípio da equidade.

LVIII. Assim, sempre se dirá que o valor de €195.000,00 arbitrado pelo Tribunal a quo, como indemnização pelo dano biológico enquanto dano patrimonial, se mostra francamente excessivo e afasta-se, de modo significativo, dos padrões que vêm sendo seguidos em casos equiparáveis.

LIX. Atente-se, assim, que a nossa Jurisprudência pronunciado em situações semelhantes atribuindo indemnizações que não excedem o valor médio de €85.000,00. Vide, a título de exemplo, o acórdão do STJ de 12.07.2018 proferido no proc. n.º 1842/15.8T8STR.E1.S1(disponível em www.dgsi.pt)....

LXI. Acresce que, volvendo ao caso em apreço e coligida a factualidade que resultou provada nos presentes autos, e sempre com o máximo respeito por opinião diversa, o que se verifica é que o Meritíssimo Tribunal a quo calculou a ressarcibilidade do dano biológico com base, para além das implicações de alcance económico, as implicações respeitantes a outras incidências no espetro da qualidade de vida do lesado, entre outros, as implicações na sua vida sexual, o quantum doloris, as limitações de índole pessoal (actividades físicas e de lazer).

LXII. Sendo de esclarecer que, o dano biológico, na sua vertente patrimonial, abrange um espectro alargado de prejuízos incidentes na esfera patrimonial do acidente, incluindo a frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer atividades ou tarefas de cariz económico, mesmo fora da atividade profissional habitual. No entanto e no que aqui se revela, no campo do dano biológico patrimonial, importa apenas e tão só as implicações de alcance económico, e já não de cariz não patrimonial - vide, neste sentido, os Acs. do STJ de 12.07.2018, Proc. n.º 1842/15.8T8STR.E1.S1; de 11.12.2012, Proc. n.º 40/08.1TBMMV.C1.S1; de 10.10.2012, Proc. n.º 632/2001.G1.S1; e de 13.07.2017, Proc. n.º 3214/11.4TBVIS.C1.S1….

LXIV. E, nesse cálculo, conforme resulta do entendimento jurisprudencial maioritário, se não mesmo unânime, há ainda que atender ao facto de se estar a antecipar um pagamento e, por via disso, ao enriquecimento antecipado do indemnizado de rendimentos que, por efeito do mesmo, este passa a estar apto a obter. A este respeito a jurisprudência tem oscilado na consideração de uma redução entre os 10% e os 33%. …L

LXV. Nesta senda, sempre deverá a decisão recorrida ser alterada e drasticamente reduzido o montante arbitrado €300.000,00 e respectiva proporção, na parte em que conclui pela atribuição de indemnização por efeito do dano biológico, seja na sua vertente patrimonial.

LXVI. Em abono da verdade e da justiça, a par desta, deve a decisão recorrida ser alterada e drasticamente reduzido o montante arbitrado de €200.000,00 e respectiva proporção, na parte em que conclui pela atribuição de indemnização por efeito de danos não patrimoniais.

LXVII. Porquanto verifica-se que o Meritíssimo Tribunal a quo atribui uma compensação por danos patrimoniais tendente a ressarcir o lesado pelo dano corporal sofrido, no seu todo –portanto, nas suas vertentes patrimonial e não patrimonial -, e, concomitantemente, fixou uma compensação por danos não patrimoniais que inclui também essas mesmas lesões….

LXX. Sem prescindir, em caso de condenação da Ré/Recorrente no pagamento de qualquer dos danos em apreço – o que se não concebe, nem concede, e por mero dever de cautela se cogita -, acresce que a situação em apreço não é subsumível à previsão do normativo do artigo 634.º, nº 2, alínea a), do Código de Processo Civil, uma vez que, na sequência do recurso de apelação interposto pelo Autor, não vieram as Intervenientes Conjunto Turístico das Arribas, S.A. e Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A., aderir ao dito recurso….

LXXI. Por seu turno, não se encontram igualmente preenchidos os pressupostos das demais alíneas do citado artigo 634.º do CPC, e, designadamente, a da sua alínea b), uma vez inexistir no caso uma hierarquia de interesses entre um interesse principal, o do recorrente, e um interesse dito subordinado, o do não recorrente, verificando-se sim uma situação autónoma e sem nexo de prejudicialidade entre os interesses do Autor e o das Intervenientes (cfr. acórdão do STJ de 24.03. 2021, Proc. n.º 488/12.7TTTMR.E3-A.S1).

LXXII. Posto o que, não tendo as Intervenientes Conjunto Turístico das Arribas, S.A. e Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A., recorrido da douta decisão de 1.ª Instância ou aderido ao recurso de apelação interposto pelo Autor, transitou definitivamente em julgado a decisão absolutória da Ré aqui Recorrente quanto aos pedidos formulados por aquelas e em que o Acórdão recorrido agora, erroneamente, a condena…

LXXIV. Ainda sem prescindir, a Seguradora aqui Ré e Recorrente apenas poderia ser condenada a ressarcir as Intervenientes nestes autos no limite do quantum indemnizatório nestes autos fixado e até ao limite máximo por estas efectivamente liquidado.

LXXV. Por todo o exposto, violou o acórdão ora em crise o disposto nos art.os 342.º, 483.º, 487.º, 499.º e 503.º a 508.º, 562.º, 473.º e ss., todos do Código Civil, nos art.os 11.º n.º 2, 24.º n.º 1, 25.º n.º 1 alíneas a), c) e h), 13.º n.º 1, 27.º, 41.º n.º 1 alíneas c) e d), e 47.º do Código da Estrada, no art.º 17.º, n.os 2 e 3 do Regime de Reparação de Acidentes de Trabalho e de Doenças Profissionais, no art.º 26.º, n.º 1, do SORCA e nos art.os 414.º, 605.º e 607.º n.os 4 e 5 e 634.º, n.º 2, alíneas a) e b), todos do CPC…»

*

Em contra-alegações, o autor refutou a argumentação da Ré e pugnou pela improcedência do recurso.

*

O autor interpôs ainda recurso subordinado, pedindo a alteração do julgado no sentido da condenação da ré seguradora conforme peticionou, assente na imputação exclusiva da culpa do condutor do veículo segurado pela ocorrência do sinistro.

As conclusões que extraiu são as seguintes:

« a) O douto acórdão do TRL foi desfavorável para ambas as partes, ficando portanto as duas parcialmente vencidas, sendo assim aplicável o disposto no artigo 633.º do CPC., porquanto, é pacifico o entendimento de que se por um lado, se uma das partes parcialmente vencida não toma a iniciativa de recorrer, conformando-se com o concreto vencimento que lhe foi desfavorável (o que não quer dizer que tenha concordo com o mesmo), é justo que, caso a parte contrária recorra, ela possa então vir também pretender uma solução mais favorável, já que corre o risco de ver a sua situação agravada.

b) Pretende-se sindicar a decisão do TRL quanto à decisão de atribuir culpas pela ocorrência do acidente ao A., na proporção de 35%, e ao veículo segurado na R./Recorrida, na proporção de 65%, porquanto, a referida decisão fundamenta-se, designadamente, no facto do A./Recorrente ter efetuado uma manobra de ultrapassagem junto a um entroncamento, pelo que, “…com a sua conduta violou os artigos 35º, nº1, 38º, nº1 do Código da Estrada (deveres de cuidado na realização de manobras) e 41.º, n.º 1, al. c) (proíbe a ultrapassagem imediatamente antes e nos cruzamentos e entroncamentos).” cfr. ponto 81 do douto acórdão recorrido.

c) Quanto ao condutor do veículo segurado na R./Recorrida considerou que “… ao efetuar a manobra de entrada na Estrada Nacional 247, a partir de uma rua com um sinal STOP que o obrigava a ceder a prioridade violou os artigos 21.º, do Regulamento dos sinais de trânsito, ex. vi artigo 6.º, do Código da Estrada – que determina a paragem obrigatória em cruzamentos ou entroncamentos e cedência de passagem - e ainda os artigos 11º, nº 2, 35.º, e 44.º, n.º 1, do Código da Estrada (deveres de cuidado na realização de manobras). (…)“Ora, neste caso, afigura-se-nos que o condutor do V1 segurado na ré, violou uma norma que o obrigava a ceder absolutamente a passagem a todos os veículos que se encontravam na via para a qual pretendia circular. Não o tendo feito, importa considerar que a sua conduta contribuiu de forma mais acentuada para a produção do acidente do que a do autor que, pese embora em manobra de ultrapassagem ilegal, a iniciou perante a entrada do V1 na via pela qual circulava. Desta forma, concluímos ser mais grave a conduta do V1 pela violação das normas que contribuíram para a produção do acidente, devendo a responsabilidade do autor fixar-se em 35% e a da em 65%.” Cfr. pontos 80, 87 e 88 e factos dados por provados nas alíneas h) e sss) do douto acórdão) – o negrito e o sublinhado são nossos.

d) A ultrapassagem do A./Recorrente apenas se deveu à entrada do veículo segurado na R./Recorrida na faixa de rodagem pela qual aquele seguia (cfr. alínea h) dos factos julgados provados). Sendo as referidas faixas de rodagem separadas por linha divisória descontínua – cfr. facto julgado provado na alínea l) parte final.

e) Deste modo, salvo o devido respeito, o douto acórdão recorrido não ponderou tal situação, porquanto, a ultrapassagem do A./Recorrente deu-se em local cujas marcas no pavimento são descontínuas, permitindo a ultrapassagem de veículos apesar de se estar na presença de entroncamento, como decorre das alegações de recurso de apelação apresentadas pelo A., pelo que, o douto acórdão do TRL errou na aplicação das normas jurídicas ao caso em apreço, porquanto, mesmo que o motociclo do A./Recorrente estivesse a efetuar uma manobra de ultrapassagem do veículo RG, certo é que apesar de se estar próximo de um entroncamento as marcas longitudinais descontínuas existentes na EN 247 permitem tal manobra, pois como resulta do disposto no artº 7º nº 1 do Código da Estrada, as prescrições resultantes dos sinais prevalecem sobre as regras de trânsito.

f) As marcas rodoviárias são consideradas sinalização de trânsito. Elas fazem parte da hierarquia de sinalização rodoviária, sendo classificadas como sinalização horizontal, sendo geralmente constituídas por linhas, símbolos e inscrições no pavimento com funções específicas e importantes no sistema de trânsito (regulam a circulação, advertem os utentes das vias públicas e orientam os condutores e peões), podendo ser utilizadas isoladamente ou em conjunto com outros tipos de sinalização para reforçar ou clarificar seu significado.

g) Na hierarquia da sinalização de trânsito, as marcas rodoviárias ocupam o quinto e último nível, após a sinalização temporária, luminosa e vertical (cfr. artº 7º nº 2 do Código da Estrada). Daí que, o A./Recorrente não tenha efetuado qualquer manobra ilegal, não devendo ser coresponsabilizado pela produção do acidente, violando o acórdão do TRL o disposto no aludido normativo legal, não tendo feito a mais correta interpretação e aplicação do mesmo.

h) Como decorre do exposto, quando o condutor do veículo seguro na R./Recorrida decidiu mudar de direção para a esquerda, já o A./Recorrente se encontrava a efetuar a manobra de ultrapassagem, pois iniciou tal manobra quando aquele entrou na mesma faixa de rodagem em que este circulava.

i) O sinal B2 (stop) obrigava o condutor do veículo seguro na R./Recorrida a parar e a ceder passagem a todos os veículos que transitassem na via em que ia entrar, o que este não fez, pois, apesar de ter avistado a mota do A./Recorrente a cerca de 50/60 metros, decidiu não esperar que a mesma passasse, entrando na sua faixa de rodagem para virar à esquerda apenas 10 metros depois, sem que o condutor da mota soubesse desta sua intenção de virar à esquerda, dado o curto espaço de tempo que medeia as referidas manobras.

j) De tudo isto resulta que, o acidente não se deveu a qualquer culpa do A./Recorrente, pois encontrando-se a efetuar manobra de ultrapassagem desde que o veículo seguro na R. entrou na sua faixa de rodagem, era este quem devia ter esperado para entrar na sua faixa de rodagem e para mudar de direção à esquerda, já que, ao contrário do que a R./Recorrida pretende fazer crer, ao invocar que o veículo segurado se encontrava já na entrada da estrada para onde pretendia mudar de direção, bem sabe que, a mota do A./Recorrente já havia iniciado a manobra de ultrapassagem, pelo que não poderia ter efetuado a mudança de direção sem se assegurar de que o podia fazer em segurança, evitando o acidente.

k) Nesta conformidade, sendo o acidente causado por culpa única e exclusiva do condutor do veículo seguro na R./Recorrida deve a mesma ser condenada a pagar ao A./Recorrente a totalidade dos valores referidos no douto acórdão do TRL e não apenas a proporção de 65% de tais valores.

l) Porém, caso assim se não entenda, deve manter-se a douta decisão proferida no acórdão do TRL nos seus precisos termos, não merecendo a mesma a censura que a R. lhe pretende dar, quer quanto à matéria de facto, quer quanto à matéria de direito.»


*


Em resposta, a ré voltou a defender que o acidente se ficou a dever à imprudência da condução do autor em contravenção com as normas estradais.

II. Admissibilidade e objecto da revista

1. Estão verificados os requisitos gerais de recorribilidade e da espécie do recurso de revista interposto pela Ré, tendo o Tribunal da 1.ª instância absolvido a ré do pedido e Relação revogado essa decisão, condenando a ré no pagamento de indemnização - cfr. artigos 629º, nº1, 671º, nº1, 674º, nº1, al)do CPC.

Do recurso subordinado do Autor.

Atento o valor da acção e a sucumbência do autor em elevada medida quanto a todos os segmentos do seu pedido, não ocorre obstáculo à admissão do recurso subordinado1.

2. Encontrando-se o objecto dos recursos delimitado pelas conclusões dos recorrentes - o recurso principal e o recurso subordinado - têm por escopo comum a questão da imputação da responsabilidade pelo acidente de viação que no acórdão recorrido se atribuiu à culpa de ambos os intervenientes, repartida em 35 % para o autor lesado que conduzia o motociclo, e 65% para o condutor do veículo ligeiro, segurado na ré.

A ré seguradora defende, em primeira linha, que a responsabilidade seja atribuída à culpa exclusiva do autor, ou pelo menos, quanto ao condutor do veículo fixada em medida residual; para a hipótese de subsistir a responsabilidade do condutor segurado, os valores de indemnização devem ser reduzidos, maxime o relativo ao dano biológico na vertente patrimonial e pela antecipação do capital; e revogada a condenação da Ré no pagamento de qualquer quantia às intervenientes que não apelaram da sentença absolutória.

O autor, em adverso, sustenta que não contribuiu para o sinistro, que se ficou a dever em exclusivo ao condutor da viatura segurada na Ré, e a vingar a conclusão, reclama que os valores monetários para o ressarcimento dos danos sofridos ascendam aos montantes peticionados.

O tema decisório traz a debate as seguintes questões:

i. Da verificação dos pressupostos da ilicitude, da culpa e do nexo de causalidade entre facto e dano constitutivos da obrigação de indemnização por parte da ré seguradora ;

ii. Da verificação de uma situação de concorrência de culpas dos dois condutores na produção do acidente e respetiva graduação;

iii. Da indemnização atribuída a título de dano biológico: sua compatibilização com a indemnização arbitrada no âmbito do processo de acidente de trabalho ;

iv. Da quantificação da indemnização atribuída a título de dano biológico ;

v. Da quantificação da compensação atribuída a título de danos não patrimoniais;

vi. Da ofensa do caso julgado material, formado na sentença absolutória, pela decisão da Relação de condenação das intervenientes Lusitânia - Companhia de Seguros, S.A. e Conjunto Turístico Arribas, S.A.

II. Fundamentação

A. Os Factos

Vem provado 2:

Do acidente

« a) No dia 20 de julho de 2019, cerca das 19:30horas, na Estrada Nacional n° 247, ao Km 76,800, em Galamares, área desta Comarca, ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes o motociclo marca Honda, modelo CBR, com a matrícula V2, propriedade do A. e conduzido pelo mesmo, e o veículo marca Renault, modelo Clio com a matrícula V1, conduzido por BB.

b) O acidente foi objeto de participação pela GNR de Colares, que chegou ao local momentos após a ocorrência, tendo sido registado com o número G.....64/..........52.

c) O motociclo do A. circulava na Estrada Nacional n° 247, no sentido Colares/Sintra.

d) À data do acidente, o estado do tempo era bom.

e) O veículo de marca e modelo Renault Clio e matrícula V1, conduzido por BB, circulava na Rua Visconde Monserrate, perpendicular à Estrada Nacional n° 247, existindo um sinal STOP, no entroncamento entre a Rua Visconde Monserrate e a Estrada Nacional n° 247.

f) Ao chegar ao entroncamento da Rua Visconde Monserrate com a Estrada Nacional n° 247, o condutor do V1 parou, viu o motociclo V2 conduzido pelo A., que circulava na Estrada Nacional a cerca de 50/60 metros de distância, no sentido de trânsito Colares-Sintra, e entrou na Estrada Nacional no mesmo sentido de trânsito que o motociclo.

g) Após entrar na faixa da direita da Estrada Nacional n° 247, o condutor do V1 colocou o sinal de pisca do lado esquerdo para entrar na Rua Verde Pinho, após o que iniciou a manobra de mudança de direção à esquerda para entrar nessa via.

h) O A., perante a entrada do veículo V1 na sua faixa de rodagem, iniciou uma ultrapassagem ao mesmo, entrando na faixa contrária.

i) O embate deu-se na faixa esquerda da Estrada Nacional 247 – sentido Colares-Sintra – em frente ao entroncamento com a Rua Verde Pinho, entre o motociclo e a lateral esquerda do veículo.

j) No troço da Estrada Nacional n° 247, no sentido Colares - Sintra, em que seguia o motociclo V2 conduzido pelo A., existe um entroncamento à direita com a Rua Visconde de Monserrate e, cerca de 10 metros à frente, aquela mesma Estrada Nacional n° 247 entronca com a Rua Verde Pinho à esquerda, no mesmo sentido de trânsito.

k) O veículo V1 entrou na Estrada Nacional n° 247 vindo da Rua Visconde de Monserrate, percorreu nessa estrada no mesmo sentido em que seguia o motociclo V2 conduzido pelo A. cerca de 10 metros e depois de já estar a entrar na Rua Verde Pinho, em posição perpendicular à Estrada Nacional n° 247 e na via de trânsito em sentido oposto, Sintra -Colares, deu-se o embate entre o motociclo e o veículo.

l) Mais se provou que na Estrada Nacional n° 247, a cerca de 80 metros do entroncamento com esta da Rua Visconde de Monserrate, existe uma placa indicativa da localidade de Galamares e a cerca de 50 metros do mesmo entroncamento um sinal de trânsito de aproximação de passagem de peões no sentido Colares-Sintra, no qual circulava o motociclo V2 conduzido pelo A.; sendo as faixas de rodagem separadas por linha divisória descontínua.

m) O A. circula diariamente na estrada onde ocorreu o acidente, quer de casa para o trabalho, quer do trabalho para casa, há mais de 15 anos, conhecendo bem a referida via.

“sss”) O condutor do veículo V1 não verificou que podia fazer as manobras de entrar na EN 247 e mudar de direção para a esquerda para entrar na Rua Verde Pinho em segurança3.

n) À data do acidente, o veículo V1 era conduzido pelo seu proprietário, circulando o mesmo por sua conta e no seu exclusivo interesse, tendo a sua direção efetiva.

o) O condutor e proprietário do veículo V1, transferiu a sua responsabilidade civil inerente à circulação do referido veículo e aos acidentes causados pelo mesmo, até ao montante do respetivo seguro, para a R. através do contrato de seguro válido e eficaz, à data dos factos, titulado pela apólice n° ........48.

Dos danos do autor

p) À data do acidente, o A. tinha 38 anos de idade, tendo nascido no dia D de M de 1980.

q) À data do acidente o A. era física e psicologicamente saudável, sofrendo apenas de Hepatite B, doença controlada com medicação.

r) O A. à data do acidente exercia a sua atividade laboral como empregado de manutenção e nadador-salvador no empreendimento hoteleiro, designado por “Conjunto Turístico das Arribas, S.A., sito na Av. Alfredo Coelho, 29, Praia Grande, 2705-329 Rodízio- Colares.

s) Auferindo um vencimento mensal base de 796,50€ X 14 meses, o que perfaz a quantia anual ilíquida de 11.151,00€ (onze mil centos e cinquenta e um euros), acrescido do valor de 125,00€ X 11 meses a título de subsídio de alimentação.

t) Antes deste acidente, o A. era uma pessoa alegre e bem-disposta, ágil, forte, ativa, dinâmica e robusta.

u) O acidente ocorreu quando o A. se deslocava do seu local de trabalho, sito na Praia Grande, para a sua residência, sita nas Mercês.

v) Na sequência do acidente foi instaurado o Processo n° 4723/20.0T8SNT, junto do Juízo do Trabalho de Sintra-Juiz 1, desta Comarca.

w) Em consequência do acidente o A. ficou gravemente ferido, tendo sido de imediato transportado ao Serviço de Urgência do Hospital de Santa Maria.

x) À entrada no Serviço de Urgência do Hospital de Santa Maria o A. foi diagnosticado, com lesão cervical com tetraplegia: fratura das apófises espinhosas C5-C6 e lesão discal C6-C7.

y) Enquanto esteve internado no Hospital de Santa Maria, o A. foi sujeito a diversos exames e tratamentos médicos, tendo sido submetido a intervenção cirúrgica, sob anestesia geral, no dia 29 de julho de 2019, pelo serviço de Ortopedia, a discectomia e artrodese anterior C6-C7 com autoenxerto tricortical da crista ilíaca direita e placa vectra.

z) Teve alta hospitalar mantendo quadro de tetraplegia, em 20 de agosto de 2019.

aa) Após alta do Hospital de Santa Maria, o A. foi internado no Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, onde permaneceu de 30 de agosto de 2019 até 13 de novembro de 2019, sendo sujeito diariamente a sessões de terapia e fisioterapia.

bb) No Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, o A. fez reabilitação com melhoria da autonomia, evoluindo para tetraparésia, realizando marcha com bastões, com micção autónoma por sensação, e com defeção autónoma sob estimulação farmacológica, com supositório.

cc) Após a alta do no Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, o A. realizou 20 sessões de fisioterapia em ambulatório.

dd) Como consequência direta do acidente o A. apresenta as seguintes queixas:

A nível funcional:

- limitação da mobilidade cervical, com dor ocasional, sem terapêutica analgésica associada; diminuição da força e destreza de ambas as mãos, mais à esquerda (refere ser dextro);

- hipostesia/parestesias na região tóraco-abdominal direita, e face externa de todo o membro inferior direito;

- diminuição da força no membro inferior direito e limitação da destreza no membro inferior esquerdo.

- micção autónoma, com tenesmo; defecação autónoma sob estimulação local farmacológica; desconforto/mal-estar geral por apenas conseguir realizar defecação com intervalos de cerca de 5 dias, devido à habituação farmacológica que tem vindo a decorrer.

- impossibilidade de ereção sem estimulação farmacológica, ereção conseguida com estimulação farmacológica; atividade sexual condicionada à programação antecipada, visto que tem de tomar o fármaco cerca de 3 horas antes; ausência de prazer com autoestimulação, e diminuição do prazer com atividade sexual com parceira.

A nível situacional:

- Atos da vida diária: dificuldade na defecação, com condicionamento do bem-estar no dia a dia; abandono da condução de mota pela limitação da mobilidade/força de todos os membros, o que fazia ocasionalmente nas viagens para o trabalho.

- Vida afetiva, social e familiar: abandono da prática de corrida (antes quase todos os dias 1h), da natação (antes todos os verões, todos os dias na piscina do hotel) e de andar de bicicleta (antes 1x/semana, dia todo);

- Vida profissional: incapacidade de realizar a maioria das tarefas do núcleo essencial da sua profissão habitual - empregado de manutenção de hotel - por incapacidade de subir escadotes, de estar ajoelhado ou debruçado ou agachado, limitação da mobilidade/força de todos os membros; capacidade de realizar tarefas como arranjos de máquinas, quando se consegue manter sentado; passou a supervisionar o hotel, a denunciar as necessidades, e a apoiar os colegas em alguns gestos; abandono da atividade de nadador-salvador durante o verão na piscina do hotel, pela limitação da mobilidade/força de todos os membros.

ee) Como consequência direta do acidente o A. apresenta as seguintes sequelas:

- Face:c, aproximadamente horizontal, com 1cm de comprimento; cicatriz na região cutânea do lábio superior direito, abaixo do nariz, aproximadamente horizontal, com 1cm de comprimento;

- Coluna cervical: cicatriz nacarada, ténue, na face anterior do pescoço do lado direito, com 5cm de comprimento; limitação da mobilidade de toda a coluna cervical dentro do arco útil;

- Membros superiores: limitação da força/destreza de ambos os membros 4/5, com mãos em garra, sobretudo a esquerda.

- Membros inferiores: cicatriz linear, nacarada cirúrgica sobre a crista ilíaca ântero-superior direita, com 5cm de comprimento; limitação da força/destreza de ambos os membros 4/5.

- Marcha espástica, com ajuda de um bastão.

ff) Em consequência das lesões resultante do acidente de viação o A. toma, atualmente, medicação para estimulação da defecação, supositórios e fármacos para estimular a ereção.

gg) Antes do acidente o A. era muito ativo e executava diferentes tarefas no âmbito da sua atividade laboral.

hh) As sequelas resultantes do acidente são impeditivas do exercício da atividade profissional habitual do A., sendo compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico profissional.

ii) Com as limitações que tem, o A. não pode exercer a tarefa de nadador-salvador, nem as tarefas de manutenção do empreendimento hoteleiro, por diminuição da força muscular e dificuldade de locomoção.

jj) O A. teve alta médica no dia 12 de março de 2020, sendo fixável nessa data a consolidação médico-legal das lesões.

kk) O A. sofreu um período de défice funcional temporário total fixável em 117 dias, entre 20 de julho de 2019 e 13 de novembro de 2019 e um período de défice funcional temporário parcial fixável em 120 dias, entre 14 de novembro de 2019 e 12 de março de 2020.

ll) O acidente teve uma repercussão temporária na atividade profissional total do A. fixável em 237 dias, entre 20 de julho de 2019 e 12 de março de 2020.

mm) Na sequência das sequelas resultantes do acidente de viação, ao A. foi atribuído um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 55 pontos por referência à Tabela Nacional das Incapacidades em Direito Civil.

nn) Após o acidente, o A. nunca mais foi a mesma pessoa, estando fisicamente impedido de realizar o trabalho que realizava anteriormente, pois tem grande limitação de movimentos, com falta de força maior na mão esquerda, não tendo força física e flexibilidade para agarrar e manipular objetos mais pesados, e de mobilidade, necessitando do auxílio de bastão/canadianas/bengala para caminhar em pisos irregulares e em longas distâncias, não conseguindo permanecer de pé durante muito tempo, nem permanecer agachado ou de joelhos, nem subir escadotes, nem correr.

oo) As sequelas resultantes do acidente têm uma repercussão permanente na atividade sexual do A. fixável no grau 5/7, com base em impossibilidade de ter ereção e diminuição do prazer obtido na atividade sexual.

pp) As sequelas permanentes na atividade sexual do A., condicionam a sua vida amorosa e afetiva e causam-lhe sofrimento, pondo em causa a sua virilidade masculina.

qq) Como consequência do acidente o motociclo do A., marca Honda, modelo CBR, com 998 cm3 de cilindrada, do ano de 2006, que se encontrava em boas condições de circulação e em bom estado geral, ficou totalmente inutilizado e impossibilitado de circular, não sendo suscetível de reparação.

rr) O capacete HJC RPHA11 DEROKA MC1SF S que o A. utilizava também ficou inutilizado, em consequência do acidente, tendo o A. pago pela sua aquisição o valor de 395,91€ (trezentos e noventa e cinco euros e noventa e um cêntimos).

ss) As calças e os ténis que o A. usava no dia do acidente, também ficaram inutilizadas, em consequência do mesmo.

tt) O A. sofreu dores intensas quer durante o acidente, quer após o mesmo, o que ainda hoje se verifica, em virtude da gravidade das lesões sofridas e das sequelas de que padece.

uu) O quantum doloris é fixável no grau 6/7.

vv) Em consequência do acidente, o A. sentiu, e ainda hoje sente, enormes incómodos, tristeza, desgosto, frustração e imensas preocupações com o evoluir do seu estado de saúde, das lesões que sofreu e das sequelas com que ficou.

ww) À data do acidente o A. era alegre e bem-disposto, ágil, forte, dinâmico e robusto.

xx) As sequelas resultantes das lesões que lhe advieram do acidente irão acompanhá-lo ao longo da sua vida, o que lhe causa sofrimento.

yy) O dano estético permanente é fixável no grau 4/7.

zz) As sequelas resultantes do acidente de viação têm repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer do A. fixável no grau 4/7.

aaa) Em consequência das sequelas resultantes do acidente o A. necessitou de ajudas medicamentosas; ajudas técnicas e adaptação do veículo.

bbb) As limitações físicas de que ficou a padecer deixam o A. triste.

ccc) A vida sexual do A., após o acidente, passou a ser praticamente nula, face à disfunção eréctil de que passou a padecer.

ddd) O A., para além de caminhar com grande dificuldade, nunca mais conseguiu correr.

eee) Após o acidente e em consequência das lesões e sequelas resultantes do mesmo, o A. nunca mais tendo conseguido conduzir e/ou andar de mota.

fff) Por efeito do contrato de seguro titulado pela apólice n.° .....67, do ramo de “Responsabilidade Civil Automóvel”, a R. aceitou ver para si transferida a responsabilidade inerente aos riscos próprios da circulação do motociclo do A., de marca e modelo Honda CBR e matrícula V2.

ggg) O A. é acompanhado clinicamente em sede de acidente de trabalho, pela Seguradora Lusitânia, no âmbito do processo de sinistro n.° ....01...19/...98 e apólice n.° ....19, a qual assegura, inclusivamente, as despesas médicas inerentes.

hhh) Após realização de peritagem ao veículo V2, conclui-se que o valor estimado para a reparação era de 10.443,02€ (dez mil quatrocentos e quarenta e três euros e dois cêntimos), a melhor proposta de aquisição do veículo com danos foi de 1.857,00€ (mil oitocentos e cinquenta e sete euros), o seu valor de mercado antes do acidente era de 6.000,00€ (seis mil euros).

iii) Na sequência da peritagem ao veículo V2 a R., sem assumir uma posição quanto a responsabilidades, propôs condicionalmente a quantia de 4.143,00€ (quatro mil cento e quarenta e três euros) a título de indemnização pela perda total do mesmo.

Das intervenientes

jjj) A Interveniente, Conjunto Turístico das Arribas, S.A., é uma sociedade anónima que se dedica à construção e exploração de empreendimentos turísticos, hoteleiros, similares de hotelaria, direitos reais de habitação periódica e gestão de imóveis, incluindo a construção e compra e venda para revenda ou arrendamento e a prestação de serviços conexos com estas atividades.

kkk) O A., AA, desempenhou ao longo dos anos várias funções ao serviço da Interveniente Conjunto Turístico das Arribas, S.A., designadamente, todo o tipo de serviços relacionados com a manutenção de equipamentos e de vigilante na zona da piscina.

lll)A Interveniente Conjunto Turístico das Arribas, S.A., transferiu a responsabilidade por Acidentes de Trabalho para a Lusitânia - Companhia de Seguros, S.A., através da apólice n.° ............. 01, até ao limite de salário anual de € 11.151,00 (€ 795,00 X 14).

mmm) No âmbito do processo n.° 4723/20.0T8SNT do Juízo do Trabalho de Sintra - Juiz 1, foi proferida sentença transitada em julgado em 22 de fevereiro de 2022, com o seguinte dispositivo: “V. Decisão: Pelo exposto e decidindo:Fixa-se a incapacidade permanente parcial (I.P.P.) de que padece o Sinistrado AA, em consequência do acidente dos autos, em 59,325%, a partir de 13 de Março de 2020, com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (I.P.A.T.H.);

Condenam-se a Lusitânia — Companhia de Seguros, S.A. e a Conjunto Turístico Arribas, S.A. a pagar ao Sinistrado uma pensão anual e vitalícia de € 7.749,21 (sete mil, setecentos e quarenta e nove euros e vinte e um cêntimos), devida desde 13 de Março de 2020, adiantada e mensalmente, até ao 3° dia de cada mês, correspondendo cada prestação 1/14 da pensão anual, sendo que nos meses de Junho e Novembro deverão acrescer mais 1/14, a título respetivamente, subsídio de férias e de Natal, acrescida de juros de mora à taxa legal desde data vencimento até integral pagamento, sendo:

€ 6.898,57 (seis mil, oitocentos e noventa e oito euros e cinquenta e sete cêntimos), a cargo da Lusitânia — Companhia de Seguros, S.A. ;

€ 850,64 (oitocentos e cinquenta euros e sessenta e quatro cêntimos), a cargo da Conjunto Turístico Arribas, S.A.

Condenam-se a Lusitânia — Companhia de Seguros, S.A. e a Conjunto Turístico Arribas, S.A. a pagar ao Sinistrado a quantia de € 5.050,18 (cinco mil e cinquenta euros e dezoito cêntimos) a título de subsídio por elevada incapacidade previsto no artigo 67°, n.°s 3 e 5 da Lei n. ° 98/2009, de 04 de Setembro, acrescido de juros de mora à taxa legal desde 13 de Março de 2020 até integral pagamento, sendo:

€ 4.495,81 (quatro mil, quatrocentos e noventa e cinco euros e oitenta e um cêntimos), a cargo da Lusitânia - Companhia de Seguros, S.A. ;

€ 554,37 (quinhentos e cinquenta e quatro euros e trinta e sete cêntimos), a cargo da Conjunto Turístico Arribas, S.A.

Condena-se, ainda, a Conjunto Turístico Arribas, S.A. a pagar ao Sinistrado:

- € 622,33 (seiscentos e vinte e dois euros e trinta e três cêntimos) título de indemnização em dívida por incapacidade temporária, acrescida de juros, à taxa legal de 4%, desde a data do vencimento de cada uma das prestações até efectivo pagamento;

- a quantia de € 5,00 (cinco euros), a título de despesas de transporte;

Condena-se, ainda, a Lusitânia — Companhia de Seguros, S.A. a pagar aos Sinistrado a quantia de €15,00 (quinze euros), a título de despesas de transporte.”

nnn) No estrito cumprimento da Sentença supra referida, a Interveniente Conjunto Turístico Arribas, S.A. liquidou ao A. os seguintes montantes:

€ 2.383,23 a título de pensão anual vitalícia, respeitantes aos anos de 2020,2021 e 2022;€ 559,31 com respeito ao subsídio por elevada incapacidade e despesas de transporte no valor de € 5,00; € 614,91 referente à indemnização por incapacidade temporária, com os devidos juros de mora.”

ooo)A Interveniente Lusitânia - Companhia de Seguros, S.A. é uma sociedade que se dedica à atividade seguradora.

ppp)Nos termos do contrato referido em mmm), a Interveniente Lusitânia - Companhia de Seguros, S.A. assegurou a cobertura do risco completo dos danos traumatológicos causados aos trabalhadores da Interveniente Conjunto Turístico das Arribas, S.A. indicados nas respetivas folhas de férias.

qqq)Em cumprimento da sentença referida em nnn), a Interveniente Lusitânia - Companhia de Seguros, S.A. procedeu ao pagamento das pensões vencidas entre 13 de março de 2020 e 31 de julho de 2022, no valor de € 16.602,03.

rrr) Com fundamento no acidente em apreço nos autos, a Interveniente Lusitânia - Companhia de Seguros, S.A. procedeu ao pagamento, até 11 de julho de 2022, da quantia global de € 52.110,45, correspondente às seguintes importâncias parcelares:

€ 651,78, a título de despesas com ambulatório;€ 448,80, a título de despesas judiciais;€ 5.650,81, a título de despesas com SNS;€ 12,00, a título de despesas com EAD-RX;€ 380,00, a título de despesas com EAD - TAC;€4.495,81, a título de despesas com subsídio de elevada incapacidade;€ 30.600,00, a título de despesas com internamentos;€ 4.325,88, a título de indemnização pela Incapacidade Temporária Absoluta;€ 490,00, a título de despesas com juntas médicas;€ 382,80, a título de despesas com juros;€ 3.038,60, a título de despesas com medicamentos;€ 562,50, a título de despesas com medicina física e de reabilitação;€ 719,80, a título de despesas com subsídios;€ 60,00, a título de despesas com transporte de ambulância;€ 15,00, a título de despesas com transporte coletivo;€ 40,32, a título de despesas com transporte próprio; e € 236,35, a título de despesas com transporte de táxi.

sss)Desde julho de 2020, com a assistência prestada ao A., em consequência do acidente em apreço nos autos, a Interveniente Lusitânia - Companhia de Seguros, S.A. procedeu até 13 de novembro de 2023, ao pagamento da quantia de € 11.934,74, correspondente às seguintes importâncias parcelares:€ 9.999,45, a título de pensões vencidas entre 01 de agosto de 2022 e 30 de novembro de 2023;€ 21,45, a título de despesas de ambulatório;€ 612,00, a título de despesas judiciais;€ 1.301,84, a título de despesas com medicamentos.

E, não provado:

Não se provou que o motociclo do A. circulava na Estrada Nacional n° 247, ao Km 76,800, na localidade de Galamares, no sentido Colares/Sintra, quando inadvertida e inesperadamente a sua faixa de rodagem foi cortada pelo veículo matrícula V1 que se atravessou à sua frente vindo da Rua Visconde Monserrate, perpendicular àquela, não respeitando o sinal vertical de Stop aí existente.

• Não se provou que de imediato e em ato contínuo, o veículo V1 efetuou outra manobra de mudança de direção à esquerda, a fim de virar para a Rua Verde Pinho, sem qualquer sinalização que demonstrasse tal intenção.

• Não se provou que o A. viu a sua faixa de rodagem repentina e inadvertidamente invadida e cortada pelo V1, nem que este se atravessou à sua frente.

• Não se provou que o A. para evitar o embate inevitável com o V1 desviou o seu motociclo para a faixa de rodagem da esquerda, atento o seu sentido de marcha, onde não vinha nenhum veículo em sentido contrário.

• Não se provou que o A. não conseguiu evitar ser embatido pelo veículo V1, uma vez que este, simultaneamente e em ato contínuo, mudou de direção para esquerda, sem que nada o justificasse ou fizesse prever, pois não sinalizou a referida manobra, nem verificou que a podia fazer em segurança.

• Não se provou que o V1 invadiu a faixa de rodagem da esquerda, onde circulava o A.

• Não se provou que o V1 embateu com a parte lateral frente do lado esquerdo no motociclo do A., projetando-o para o chão.

• Não se provou que o condutor do veículo V1 por desatenção e imperícia, se tivesse atravessado, inesperada e inadvertidamente, à frente do motociclo do A., nem que tenha acabado por súbita e inesperadamente, embater com a parte lateral frente esquerda, no motociclo.

• Não se provou que à data do acidente o A. circulava a uma velocidade reduzida, inferior a 50Km/h.

• Não se provou se até à data do acidente dos autos o A. nunca tinha sido interveniente em qualquer acidente de viação, nem que é um condutor habitualmente prudente, diligente e cuidadoso, respeitando as regras e sinais de trânsito, bem como os outros condutores que aí circulam.

• Não se provou que a R. declinou a responsabilidade pelo acidente, depois de, numa primeira fase, a ter assumido, tendo contactado o A. para lhe pagar o valor do seu motociclo que ficou inutilizado em consequência do acidente.

• Não se provou que na sequência do acidente ao A. foi diagnosticado com traumatismo crânio-encefálico com perda do conhecimento.

• Não se provou que na sequência do acidente o A. toma regularmente a seguinte medicação: Amitriptilina 25 mg; Baclofeno 10 mg; Bromazepan 1.5 mg; Gabapentina 300 mg; Macrogol-composto CRT 13125 mg; Omeprazol 20 mg; Tenofovir 245 mg; Tioconazol SOL 280 mg; Tizanidina 2 mg e 6 mg.

• Não se provou que o A. sofra de incontinência urinária.

• Não se provou a possibilidade das sequelas sofridas pelo A. em consequência do acidente, virem a agravar-se de futuro.

• Não se provou que o custo de aquisição de um motociclo idêntico ao danificado no acidente de viação dos autos era de cerca de 10.000,00€ (dez mil euros).

• Não se provou que o A. usava um blusão de cabedal à dará do acidente.

Não se provou qual o valor dos bens referidos em ss).

• Não se provou que como consequência do acidente, o A. despendeu, em consultas de ortopedia, ocorridas em 27 de julho de 2020 e 16 de novembro de 2020, a quantia de 125,00€ (cento e vinte e cinco euros), nem que este valor não lhe foi reembolsado.

• Não se provou que o A. se sinta deprimido, revoltado, angustiado e embaraçado, nem que se sinta socialmente diminuído ao ver-se limitado no desempenho das suas tarefas profissionais e pessoais.

• Não se provou que o A. tenha um elevado sofrimento psíquico.

• Não se provou que o A. passou a sofrer de insónias, sentindo grande dificuldade em adormecer e tendo pesadelos durante a noite.

• Não se provaram os motivos pelos quais o A. decidiu ultrapassar o V1, nem se se apercebeu ou não que o condutor deste havia sinalizado a sua mudança de direção à esquerda.

• Não se provou que as árvores existentes na Rua Verde Pinho impediam o embate entre os veículos.

• Não se provou que não distam mais de cerca de 7 metros do entroncamento da Rua Visconde de Monserrate com a Estrada Nacional n° 247, até ao entroncamento dessa mesma estrada com a Rua Verde Pinho.

B. Do Mérito dos recursos

1. Enunciação do problema

Nesta demanda alicerçada na responsabilidade civil extracontratual, em consequência do acidente de viação que envolveu o autor, que conduzia o seu motociclo de regresso do trabalho para casa e, o segurado da ré que conduzia a viatura ligeira, as partes mantêm total discordância no ponto crucial - a imputação da culpa na produção do sinistro.

A 1ª instância perante a dinâmica do acidente apurada, concluiu pela exclusão da culpa do condutor do veículo segurado no embate ocorrido, enquanto a Relação, em resultado da alteração parcial da decisão da matéria de facto, veio a concluir pela repartição de culpas entre os intervenientes.

Em segundo campo análise, a subsistir a repartição de culpas ou na alternativa da imputação exclusiva, os litigantes estão ainda dissonantes quanto a grande parte dos valores indemnizatórios arbitrados pelo tribunal a quo.

2. O recurso da ré seguradora

Através do contrato de seguro documentado, a ré assumiu por transferência a responsabilidade adveniente de circulação do veículo com a matrícula V1, interveniente no embate com o motociclo conduzido pelo autor, que sofreu os danos cujo ressarcimento reclama nos autos.

Sustenta a ré, em eixo principal da sua alegação, que a Relação errou ao considerar ilícita a entrada do condutor do veículo segurado na EN 247, que partiu de uma rua com sinal STOP, não cedendo a devida prioridade.

Ao Supremo não cabe, na verdade, sindicar a substância dos juízos probatórios da Relação, mas apenas atestar, se moveu de harmonia com os pressupostos que os condicionam.

Na situação litigiosa , a reconstrução do juízo consistente do nexo de causalidade adequada foi fundamentalmente motivada pela alteração parcial da matéria de facto vinda da primeira instância - “ …as als. f) a k) dos factos provados cuja redação foi alterada conforme consta em III e aditou o facto sss) de direção para a esquerda para entrar na Rua Verde Pinho em segurança “

Da factualidade que ficou assim demonstrada, sobressai:

(…)

c) O motociclo do A. circulava na Estrada Nacional n° 247, no sentido Colares/Sintra.

e) O veículo de marca e modelo Renault Clio e matrícula V1, conduzido por BB, circulava na Rua Visconde Monserrate, perpendicular à Estrada Nacional n° 247, existindo um sinal STOP, no entroncamento entre a Rua Visconde Monserrate e a Estrada Nacional n° 247.

f) Ao chegar ao entroncamento da Rua Visconde Monserrate com a Estrada Nacional n° 247, o condutor do V1 parou, viu o motociclo V2 conduzido pelo A., que circulava na Estrada Nacional a cerca de 50/60 metros de distância, no sentido de trânsito Colares-Sintra, e entrou na Estrada Nacional no mesmo sentido de trânsito que o motociclo.

g) Após entrar na faixa da direita da Estrada Nacional n° 247, o condutor do V1 colocou o sinal de pisca do lado esquerdo para entrar na Rua Verde Pinho, após o que iniciou a manobra de mudança de direção à esquerda para entrar nessa via.

h) O A., perante a entrada do veículo V1 na sua faixa de rodagem, iniciou uma ultrapassagem ao mesmo, entrando na faixa contrária.

i) O embate deu-se na faixa esquerda da Estrada Nacional 247 – sentido Colares-Sintra – em frente ao entroncamento com a Rua Verde Pinho, entre o motociclo e a lateral esquerda do veículo.

j) No troço da Estrada Nacional n° 247, no sentido Colares - Sintra, em que seguia o motociclo V2 conduzido pelo A., existe um entroncamento à direita com a Rua Visconde de Monserrate e, cerca de 10 metros à frente, aquela mesma Estrada Nacional n° 247 entronca com a Rua Verde Pinho à esquerda, no mesmo sentido de trânsito.

k) O veículo V1 entrou na Estrada Nacional n° 247 vindo da Rua Visconde de Monserrate, percorreu nessa estrada no mesmo sentido em que seguia o motociclo V2 conduzido pelo A. cerca de 10 metros e depois de já estar a entrar na Rua Verde Pinho, em posição perpendicular à Estrada Nacional n° 247 e na via de trânsito em sentido oposto, Sintra -Colares, deu-se o embate entre o motociclo e o veículo.

(…)

sss) O condutor do veículo V1 não verificou que podia fazer as manobras de entrar na EN 247 e mudar de direção para a esquerda para entrar na Rua Verde Pinho em segurança.

Apreciando.

Um dano não é reconduzível, em regra, ao resultado direto de uma única causa imediata, mas sim o produto de um encadeamento de causas4.

Constituiu jurisprudência sólida deste Supremo Tribunal na interpretação do artigo 563ºdo Código Civil, que a recepção da doutrina da causalidade adequada na sua formulação negativa, implica : i. não pressupõe a exclusividade do facto condicionante do dano; ii: não obriga a que a causalidade seja direta e imediata, aceitando a ocorrência de outros factos condicionantes, contemporâneos ou não; iii. aceita a causalidade indireta, sendo suficiente que o facto condicionante desencadeie outro que diretamente provoque o dano5.

Integram as situações de causalidade indireta, caracterizadas na doutrina, em que uma causa anterior favorece ou eleva o risco de surgimento de uma causa posterior; o responsável pela causa indireta terá de suportar os danos secundários provocados pela causa direta, tenha ela a ver com os atos do lesado, de terceiros ou com circunstâncias fortuitas6.

O veículo segurado provinha de artéria que entroncava na EN e tinha o sinal STOP – que corresponde à indicação de que o condutor é obrigado a parar antes de entrar no cruzamento ou entroncamento e a ceder a passagem a todos os veículos que transitem na via em que vai entrar .

A obrigação de ceder a passagem confirma-se - o condutor do veículo segurado que avistou o motociclo do autor a circular na EN, a não mais de 50/60 m de distância ( não dispondo de espaço de segurança) optou ainda assim por ingressar naquela, em desrespeito frontal com o dever legal de ceder passagem.

Mais resulta, que o condutor do veículo segurado que sinalizou a manobra de mudança de direção à esquerda para entrar na Rua Verde Pinho, desconsiderou as condições aptas a realizar essa manobra e que o embate ocorreu na faixa esquerda , em violação dos artigos 11.º, nº2 e 35º, nº1, do Código da Estrada.

Em suma, confirma-se o nexo de causalidade entre as descritas condutas ilícitas do condutor do veículo segurado e o acidente que desencadeou os danos sofridos pelo autor- é seguro concluir que foram condição do dano .

A ré seguradora coloca ainda em crise o preenchimento do requisito atinente à culpa do condutor do automóvel, embora a argumentação se dirija, sem distinção, à ilicitude, à culpa e ao nexo de causalidade.

No quadro normativo da responsabilidade civil extracontratual, a apreciação da culpa segue os parâmetros traçados no artigo 487.º, n.º 2, do Código Civil – sendo a culpa um conceito abstracto, afere-se, nas circunstâncias do caso, pela diligência de uma pessoa cuidadosa, atenta e prudente, que, na circulação rodoviária, cumpre as regras de trânsito, bem como os deveres gerais de cuidado, evitando condutas que possam pôr em perigo a integridade ou a vida dos demais.

É de utilidade convocar, para a melhor compreensão do caso ajuizado, as regras da chamada prova de primeira aparência.

Conforme vem sendo salientado e decidido pelo Supremo Tribunal, na aferição da culpa em matéria de acidentes rodoviários e do ónus de prova da culpa do lesado -artigo 487º, nº1, do Código Civil:

“o ónus da prova da culpa, que impende sobre o lesado, tem sido jurisprudencialmente atenuado pela intervenção de uma prova de primeira aparência baseada em presunções judiciais simples (artigos 349.º e 351.º, do Código Civil), que permitem inferir que quem viola objectivamente uma regra de trânsito e, por causa disso, provoca danos a terceiros, o faz por razões que lhe são imputáveis, a menos que demonstre que tal violação se mostra alheia à sua vontade.7

Efetivamente, como discorria Vaz Serra - “…a jurisprudência tem facilitado a prova da culpa: basta para provar a culpa que o prejudicado possa estabelecer factos que, segundo os princípios da experiência geral, tornem muito verosímil a culpa. Mas o autor do prejuízo pode afastar a prova “prima facie”, demonstrando, por seu lado, outros factos que tornem verosímil ter-se produzido o dano sem culpa sua. Com isto destrói a aparência a ele contrária e força o prejudicado a demonstrar completamente a culpa, já que ao admitir-se a prova “prima facie”, só se dá uma facilidade para produção do encargo da prova.”8

No caso dos autos, comprovada a inobservância das normas estradais previstas nos artigos 6.º, nº1, 11.º, nº2, e 35.º, nº1, do Código da Estrada pelo condutor do veículo seguro na ré, à luz das considerações expostas, de acordo com as regras da experiência comum, têm se por verificadas a ilicitude, a culpa daquele condutor e o nexo de causalidade entre facto e dano, enquanto pressupostos necessários da obrigação de indemnizar.

3. Da concorrência de culpas – artigo 570º do Código Civil

O acórdão recorrido considerou que “ambos os condutores praticaram ações que, no consenso da generalidade das pessoas medianamente prudentes colocadas nas circunstâncias do caso, segundo um juízo de prognose póstumo e de acordo com as regras da experiência comum ou conhecida do agente” foram aptas a produzir o acidente.

Em substanciação do seu juízo discorreu :

“ …neste caso, afigura-se-nos que o condutor do V1 segurado na ré, violou uma norma que o obrigava a ceder absolutamente a passagem a todos os veículos que se encontravam na via para a qual pretendia circular. Não o tendo feito, importa considerar que a sua conduta contribuiu de forma mais acentuada para a produção do acidente do que a do autor que, pese embora em manobra de ultrapassagem ilegal, a iniciou perante a entrada do V1 na via pela qual circulava. Desta forma, concluímos ser mais grave a conduta do V1 pela violação das normas que contribuíram para a produção do acidente, devendo a responsabilidade do autor fixar-se em 35% e a da ré em 65%.”

A ré seguradora defende que a colisão entre os veículos se deveu em exclusivo à manobra de ultrapassagem perigosa e desnecessária, em pleno duplo entroncamento levada a cabo pelo autor.

O autor rejeita qualquer culpa e afirma que “ .. efetuar manobra de ultrapassagem desde que o veículo seguro na R. entrou na sua faixa de rodagem, era este quem devia ter esperado para entrar na sua faixa de rodagem e para mudar de direção à esquerda e ...em local cujas marcas no pavimento são descontínuas, permitindo a ultrapassagem de veículos apesar de se estar na presença de entroncamento.”

Neste domínio estipula o artigo 570º do Código Civil que : “1. Quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída. 2. Se a responsabilidade se basear numa simples presunção de culpa, a culpa do lesado, na falta de disposição em contrário, exclui o dever de indemnizar.”

Pires de Lima/Antunes Varela salientam, em anotação ao preceito, que “para que o tribunal goze da faculdade conferida no n.º 1, é necessário que o acto do lesado tenha sido umas das causas do dano, consoante os mesmos princípios de causalidade aplicáveis ao agente (cfr. art. 563.º). Deve, além disso, o lesado ter contribuído com a sua culpa para o dano9.”

Como frisa Brandão Proença, para o exame ponderativo previsto no n.º 1 do artigo 570.º do Código Civil, “a norma exige não só a presença de duas condutas culposas, mas que tenham sido causalmente concorrentes para o evento lesivo ou para o agravamento dos danos10.”

Na mesma linha, fez notar o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-04-201811 : « …para efeitos de repartição da responsabilidade entre o agente e o lesado, a conduta ilícita e culposa imputada a este se mostre causal da produção do acidente, à luz da consabida teoria da causalidade adequada, ou seja, que se revele como causa típica desse resultado. Para tanto (…) importa, desde logo, ter presente a norma estradal violada e o respetivo âmbito de proteção e, nessa base, averiguar se o risco abstratamente ali prevenido se concretizou no resultado ocorrido.»

Como já se deixou expresso, a conduta do condutor do veículo seguro na ré preenche os requisitos da responsabilidade civil subjetiva. Idêntica conclusão vale para a conduta do autor que conduzia o motociclo.

Da factualidade provada resulta que o autor ultrapassou pela esquerda o veículo segurado e, o embate ocorre quando o mesmo mudava de direcção à esquerda que sinalizara (ponto h).

Dela decorre também, que o veículo segurado percorreu ainda na Estrada Nacional n.º 247 a distância de 10 metros, e o embate só veio a ocorrer depois de estar a entrar na Rua Verde Pinho, em posição perpendicular àquela Estrada (ponto k) comportamento que concorreu para o embate.

Significando que o condutor do veículo seguro na ré deveria ter cedido a passagem ao autor e verificado que podia fazer as manobras de mudança de direção para a esquerda, antes de entrar na Rua Verde Pinho – comportamentos que lhe eram exigíveis, de acordo com as circunstâncias atmosféricas e geográficas ; todavia, também o autor se deveria ter abstido de ultrapassar o veículo seguro na ré quando este, após sinalização, já se encontrava a mudar de direção, no local de um entroncamento, num contexto em que tal ultrapassagem não poderá ser considerada uma manobra de recurso para evitar um embate, posto que o automóvel já havia percorrido 10 metros daquela via.

A circunstância factual da colisão ter ocorrido já na via de sentido oposto (ponto k) permite inferir, que o autor deveria ter permanecido a circular pela via da direita, desimpedida, se assim fosse, teria tempo de abrandar ao avistar o automóvel segurado a entrar na via de trânsito, no mesmo sentido em que circulava.

Em contrário, tendo o autor procedido à manobra de ultrapassagem, o risco de vir a colidir com o veículo segurado que transitava no mesmo sentido e já havia sinalizado a manobra de virar à esquerda, concretizou-se no resultado danoso - (pontos g) a k) da matéria de facto provada).

Não oferece dúvida que o autor não observou os deveres de cuidado na manobra de ultrapassagem – cfr. artigos 35.º, nº1, (“O condutor só pode efetuar as manobras de ultrapassagem, mudança de direção ou de via de trânsito, inversão do sentido de marcha e marcha atrás em local e por forma que da sua realização não resulte perigo ou embaraço para o trânsito”), 38.º, nº1, 1 (“O condutor de veículo não deve iniciar a ultrapassagem sem se certificar de que a pode realizar sem perigo de colidir com veículo que transite no mesmo sentido ou em sentido contrário”) e 44.º, nº1, al) c 1/c) do Código da Estrada (“É proibida a ultrapassagem (…) c) Imediatamente antes e nos cruzamentos e entroncamentos”).

A marca longitudinal aposta na faixa de rodagem para separar vias de trânsito, de acordo com o n.º 1 do artigo 60.º do Regulamento de Sinalização do Trânsito, “significa para o condutor o dever de se manter na via de trânsito que ela delimita, só podendo ser pisada ou transposta para efetuar manobras”, por oposição à linha contínua que “significa para o condutor proibição de a pisar ou transpor”.

Essa linha no pavimento admite a sua transposição ao condutor para realizar manobras, não tendo caracter impositivo, mas tal circunstância não prescinde do cumprimento das regras de trânsito e, o autor não observou os deveres de cuidado na realização de manobras e de proibição de ultrapassagem imediatamente antes e nos entroncamentos.

Ou seja, não ocorre , como parece defender o recorrente, qualquer situação de prevalência entre normas incompatíveis, outrossim na aplicação conjugada de prescrições reguladoras da circulação12.

A inobservância pelo autor das sobreditas normas estradais, constitui, pois, prova de prima facie da culpa concorrente na eclosão do embate.

Mostra-se assim afastado o quadro pretendido por ambos os recorrentes, ainda que em sentido simétrico - de atribuição a um dos condutores, a título exclusivo, da culpa pela ocorrência do acidente, nesta medida improcedendo os respetivos recursos.

Acompanha-se, em consequência, o Tribunal da Relação ao concluir pelas condutas causalmente concorrentes dos intervenientes no acidente para a ocorrência do evento lesivo, verificando-se o preenchimento dos pressupostos da responsabilidade civil subjetiva, por culpa efetiva, quanto a ambos os condutores13.

A título subsidiário, pugna a ré seguradora pela alteração da graduação de culpas efetuada pelo Tribunal “a quo”, sustentando que a culpa do autor pelo grau de ilicitude da conduta é superior, por força da lesão dos interesses diretamente tutelados pelo art.º 41.º, n.º 1, alínea c) do Código da Estrada),

Para alicerçar a graduação de culpas de cada um dos condutores, o Tribunal a quo ajuizou :

“…neste caso, afigura-se-nos que o condutor do V1 segurado na ré, violou uma norma que o obrigava a ceder absolutamente a passagem a todos os veículos que se encontravam na via para a qual pretendia circular. Não o tendo feito, importa considerar que a sua conduta contribuiu de forma mais acentuada para a produção do acidente do que a do autor que, pese embora em manobra de ultrapassagem ilegal, a iniciou perante a entrada do V1 na via pela qual circulava. Desta forma, concluímos ser mais grave a conduta do V1 pela violação das normas que contribuíram para a produção do acidente, devendo a responsabilidade do autor fixar-se em 35% e a da ré em 65%.”

Perante a avaliação da intensidade da contribuição causal da manobra de cada um dos condutores na produção do embate, afigura-se-nos ajustada à quota -parte da culpa atribuída a cada um dos intervenientes – 35% quanto ao autor e 65% ao condutor do veículo segurado na ré.

A conclusão é reforçada pela análise comparativa de alguns arestos que versam casuísticas próximas do caso em juízo, como é exemplo, o recente acórdão do STJ de 26-11-202414 no qual se considerou: “tem responsabilidade na eclosão do acidente, que se entende corresponder a 20%, o condutor de um motociclo que, ao seguir atrás de um veículo que em determinado momento se encostou à berma para não colidir com um outro, o qual, circulando em sentido contrário, o fazia ocupando parte da sua hemifaixa de rodagem, apenas se apercebeu da presença deste veículo em momento já subsequente ao início da ultrapassagem daquele primeiro.

No caso vertente, o autor lesado levou a cabo a manobra de ultrapassagem indevida no local de um entroncamento, enquanto o condutor do veículo segurado, não cedeu a exigida prioridade ao motociclo, e também não verificou que podia fazer as manobras de mudança de direção em segurança, pelo que sob o ponto de vista da causalidade e atentas as características de cada veículo, foi superior o grau de intensidade da sua contribuição causal para o embate.

4. O dano biológico e a indemnização em acidente de trabalho

O acidente de viação do qual resultaram danos para o autor, foi, simultaneamente, um acidente de trabalho(acidentes in itinere) e motivou o processo judicial documentado no qual foram atribuídos ao autor valores indemnizatórios.

Por assim ser, argumenta a ré que a indemnização que respeita ao dano biológico fixada no acórdão recorrido, sobrepõe e duplica quantias já atribuídas ao autor naquela sede, uma vez que não se verificou perda da capacidade de ganho, que beneficiou da adaptação do posto de trabalho, traduzindo, no seu entender, enriquecimento sem causa.

Sendo legítimo o objectivo de assegurar que o trabalhador e lesado não beneficie de uma dupla reparação do mesmo dano, importa , contudo, saber se está em causa o mesmo dano.

Desde logo, como salientou o acórdão recorrido, o alcance da indemnização pelo dano biológico na sua componente patrimonial ultrapassa a compensação pela perda de capacidade de ganho, e visa ainda compensar o lesado pelas limitações funcionais que se refletem na maior penosidade e esforço no exercício da atividade diária e na privação de futuras oportunidades profissionais.

Como explicitou na avaliação e enquadramento do dano biológico, afirma-se no acórdão: “…a compensação por dano biológico tem dimensões que extravasam a da perda de capacidade para o exercício da atividade profissional habitual do lesado, especificamente acautelada no âmbito da indemnização pelo acidente de trabalho, ainda que possam igualmente considerar, a par de outros efeitos aqueles que se traduzem em prejuízos para a capacidade profissional e funcional em geral do lesado, que não fora o evento lesivo, o lesado não sofreria”.

O Tribunal da Relação procedeu, com recurso à equidade, à quantificação do dano biológico.

Tomando como referência o tratamento jurisprudencial de casos análogos, fixou a indemnização por dano biológico no montante de 300.000,00€, atribuindo ao autor, em decorrência da repartição da responsabilidade fixada, uma indemnização a liquidar pela ré recorrente no valor de 195.000,00 €.

E, justificou em conformidade : “… mostra-se justificado arbitrar ao autor montante suficiente digno para, no decurso do resto da sua vida o compensar da ofensa da sua saúde e de todas as repercussões que essa ofensa lhe trará, como as limitações de mobilidade que sofrerá durante o resto da vida; o prejuízo para a sua vida sexual; o facto de que dependerá de medicação para o resto da sua vida para as suas necessidades mais básicas, com tendência a agravar; o facto de ao longo da sua vida, o uso intensivo de medicação terá consequências negativas acrescidas para a sua saúde; o facto de que a dependência de medicação para o resto da vida terá repercussão financeira relevante; o facto de que a dependência de medicamentos se agravará com o envelhecimento, por causa da ofensa que sofreu.”

Convocou o conceito de dano biológico numa dupla vertente15.

Na vertente patrimonial integrou os condicionamentos (como a perda de mobilidade ou o uso intensivo de medicação) a que o autor ficou sujeito e que o penalizarão se quiser desempenhar as atividades compatíveis com a sua formação técnico profissional; na vertente não patrimonial, para compensar as consequências do défice funcional sofrido determinativo de uma maior penosidade na realização de algumas tarefas por parte do lesado, sem a inerente perda de rendimentos 16.

Neste domínio, observa JÚLIO GOMES :

«..Como é sabido, o dano reparável em sede de responsabilidade por acidente de trabalho é muito limitado, abrangendo apenas a perda da capacidade de trabalho ou de ganho (de rendimento salarial), sendo questionável se se poderão ter em conta outros danos mesmos profissionais (como o dano da perda de chance de uma progressão salarial ou o esforço acrescido para o exercício das mesmas funções ), ao que se poderá acrescentar a equiparação de certas despesas a danos e um núcleo muito restrito de outros danos patrimoniais (danos a ajudas técnicas e outros dispositivos técnicos de compensação de limitações funcionais de que o sinistrado já era portador, por exemplo, por força do artigo 43.º da LAT). Não são abrangidos muitos outros danos; desde logo, os danos não patrimoniais, o sofrimento, o prejuízo estético (que não se traduz em perda da capacidade de ganho), o dano na vida de relação, para mencionar apenas alguns exemplos[…].17»

Ao contrário do que se compreende da alegação da ré, o Tribunal a quo perspetivou o dano biológico na sua vertente não patrimonial, podendo, pois, no cálculo desta componente, ponderar as repercussões da lesão nas potencialidades e qualidade de vida do autor lesado nos domínios sociais, sentimentais, sexuais e recreativos, enquanto tarefas do quotidiano.

De outro ângulo e não menos relevante, actualmente não é controverso que as indemnizações devidas pelo responsável civil e pelo responsável laboral em consequência de acidente, simultaneamente de viação e de trabalho, apresentam funcionalidades próprias, não sendo cumuláveis, mas complementares até ao ressarcimento total do prejuízo causado ao lesado18.

Talqualmente refere JÚLIO GOMES:

«[..] a jurisprudência sobre a articulação entre as pretensões emergentes do acidente de viação e as que decorrem do acidente de trabalho acha-se hoje no essencial consolidada, mormente nos tribunais superiores, de modo a atribuir ao lesado a opção pelo meio que considere mais cómodo e adequado a conseguir a reparação do seu dano, mas também de molde a evitar o seu enriquecimento injustificado e a garantir que a responsabilidade do empregador ou do segurador de acidentes de trabalho será subsidiária.[…]19»

No domínio específico da valoração do dano biológico, entendido como diminuição somático-psíquica e funcional do lesado, com substancial e notória repercussão na sua vida pessoal e profissional, a jurisprudência do Supremo Tribunal vem reiterando que a indemnização devida ao lesado a título de perda da sua capacidade de ganho, ainda que o autor opte pela indemnização arbitrada em sede de acidente de trabalho, não contempla a compensação do dano biológico,

Conforme elucida, inter alia, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.03.2019:

«[..] IV.A indemnização fixada em sede de acidente de trabalho tem por objeto o dano decorrente da perda total ou parcial da capacidade do lesado para o exercício da sua atividade profissional habitual, durante o período previsível dessa atividade e, consequentemente, dos rendimentos que dela poderia auferir. V. A compensação do dano biológico abrange um espectro alargado de prejuízos incidentes na esfera patrimonial do lesado, que vão desde a perda total ou parcial da capacidade do lesado para o exercício da sua atividade profissional habitual ou específica, durante o período previsível dessa atividade, e consequentemente dos rendimentos que dela poderia auferir, à perda ou diminuição de capacidades funcionais que, mesmo não importando perda ou redução da capacidade para o exercício profissional da atividade habitual do lesado, impliquem um maior esforço no exercício dessa atividade e/ou a supressão ou restrição de outras oportunidades profissionais ou de índole pessoal, no decurso do tempo de vida expetável, mesmo fora do quadro da sua profissão habitual, até à frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer outras atividades ou tarefas de cariz económico, passando ainda pela necessidade de uma reconversão profissional, cujos custos e demora provável têm também de ser incluídos no montante indemnizatório a arbitrar por danos patrimoniais futuros.20»

Na mesma linha, expressa fielmente o sumário do Acórdão do STJ de 21.06.202221:

«… VI - Nessa sua dimensão/vertente patrimonial (que decorre, em regra, de uma limitação ou défice funcional), esse dano abrange ou inclui em si um espetro/leque alargado de prejuízos que se refletem na esfera patrimonial do lesado, e que vão desde a perda do rendimento total ou parcial auferido no exercício da sua atividade profissional habitual até à frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer outras atividades ou tarefas de cariz económico (traduzidas em perdas de chance ou oportunidades profissionais), passando ainda pelos custos de limitações ou de maior onerosidade/esforço no exercício ou no incremento de quaisquer dessas atividades ou tarefas, com a consequente repercussão de maiores despesas daí advenientes ou no malogro do nível de rendimentos normalmente expectáveis, assumindo neste último a caso a indemnização como uma adição ou complemento compensatórios. Dano esse que tanto pode ser ressarcido enquanto dano patrimonial futuro, como compensado a título de dano não patrimonial, o que resultará de uma a avaliação casuística, e que normalmente resultará da verificação/conclusão se a lesão originou no futuro, e só por si, uma perda da capacidade de ganho do lesado ou se traduz, apenas, numa afetação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, para além do agravamento natural resultante da idade.».

A argumentação da seguradora recorrente assenta, pois, num pressuposto inexato: a indemnização arbitrada a título de dano biológico não visou ressarcir os danos patrimoniais futuros, na modalidade de lucros cessantes, sofridos pelo lesado e decorrentes da perda de rendimentos salariais por impedimento do exercício da sua atividade profissional habitual de empregado de manutenção e nadador-salvador em empreendimento hoteleiro.

Esses danos foram tidos em conta no âmbito do processo de acidente de trabalho e fixada uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual e atribuída ao lesado uma pensão anual e vitalícia de €7.749,21, acrescida da quantia de €5.050,18, a título de subsídio por elevada incapacidade (ponto mmm da factualidade assente).

Já a indemnização arbitrada pelo Tribunal “a quo” na componente patrimonial do dano biológico, tem por base a perda da capacidade geral efetivamente comprovada, na medida em que, como bem considerou, essa perda, ainda que desprovida de repercussão direta no exercício da profissão habitual do lesado, se reveste necessariamente de valor económico.

É oportuno frisar que os índices de Incapacidade Geral Permanente não se confundem com os índices de Incapacidade Profissional Permanente, correspondendo a duas tabelas distintas, aprovadas pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de outubro, sendo a primeira definida, no preâmbulo do diploma, como “a incapacidade para os atos e gestos correntes do dia-a-dia.”

Neste ponto observou de forma incisiva o Acórdão do STJ de 29.10.202022:

«...V. Sublinhe-se a relevância teórica e prática do reconhecimento legal da incapacidade geral permanente, assim como da orientação consolidada da jurisprudência do STJ de lhe atribuir, à luz do princípio geral do ressarcimento de danos, efeitos indemnizatórios. É através da reparabilidade das consequências patrimoniais da afectação da capacidade geral que se contribui para um tratamento mais igualitário das vítimas, não serão indemnizadas com base na remuneração laboral, mais ou menos elevada, percebida à data da lesão.»


*


O recurso da ré soçobra também quanto a este fundamento.

5. O quantum da indemnização - dano biológico

A ré alega que a indemnização atribuída a título de dano biológico se mostra excessiva, por se afastar, de modo significativo, dos padrões que vêm sendo seguidos em casos equiparáveis e por ter indevidamente incorporado no seu cálculo, para além de implicações de alcance económico, fatores relativos à vida sexual do lesado, ao quantum doloris e às limitações de índole pessoal (atividades físicas e de lazer), devendo ser reduzida para montante não superior a €85.000,00.

Já se disse que a Relação valorou o dano biológico agregando danos patrimoniais e não patrimoniais advenientes do acidente para o autor lesado.

O dano-evento denominado como dano biológico ou dano na saúde pode ter como consequência danos de natureza patrimonial e danos de natureza não patrimonial (danos-consequência).

Dano corporal na saúde que afeta a integridade físico-psíquica do sujeito lesado e que exige de si maiores sacrifícios, maior penosidade no desempenho da sua atividade profissional habitual e, ainda, na sua vida pessoal, no desenvolvimento das tarefas e atividades quotidianas; as suas consequências ou sequelas projetam-se no futuro – e previsível – por corresponder à “evolução lógica, habitual e normal do quadro clínico constitutivo da sequela”; é um dano que subsiste independentemente da eventual perda ou redução de rendimentos.

Trata-se da proteção do bem jurídico saúde, entendida como estado de completo bem-estar físico, mental e social23.

Sobre o cálculo do dano biológico, a jurisprudência do STJ tem convergido que deverá assentar num critério de equidade - artigo 566º, nº3, do Código Civil- orientado por um método comparativo que apresenta como referencial as decisões em casos análogos- artigo 8.º, nº3, do Código Civil, e na componente patrimonial com o auxílio de fórmulas matemáticas24 .

A intervenção do Supremo em juízos formulados com recurso à equidade, alcançado na ponderação das particularidades e especificidades do caso concreto, deverá averiguar se, o juízo equitativo é conforme com os princípios da igualdade e da proporcionalidade — e que conduza a uma decisão razoável.

Da análise da matéria de facto nos autos quanto à vertente patrimonial do dano biológico importa ponderar:

i) a idade do autor à data do sinistro (38 anos), ii) a esperança média de vida dos nascidos à data do nascimento do lesado (que, para os homens nascidos em 1980, se situará, no ano de 2019 – ano do acidente –, nos 78,1 anos), iii) a percentagem de incapacidade geral permanente (55%), iv) assim como a conexão entre as lesões físicas sofridas e as exigências próprias de atividades profissionais ou económicas alternativas, compatíveis com a formação/preparação técnico-profissional do lesado25.

O autor ficou incapacitado de realizar a maioria das tarefas do núcleo essencial da sua profissão habitual (empregado de manutenção de hotel) por incapacidade de subir escadotes, de estar ajoelhado ou debruçado ou agachado, tendo passado a supervisionar o hotel, a denunciar as necessidades e a apoiar os colegas em alguns gestos, mas tendo abandonado a atividade de nadador-salvador durante o verão na piscina do hotel, pela limitação da mobilidade e da força de todos os membros.

Evidencia-se, pois, o significativo comprometimento dos vetores destreza, mobilidade e força muscular – e, portanto, da possibilidade de exercer, de forma plena, a sua atividade profissional ou qualquer outra atividade profissional análoga, ainda que a adaptação do posto de trabalho tenha sido alcançada.

Procurando entre as situações com caraterísticas aproximadas ou análogas e recentemente apreciadas pelo STJ neste domínio do valor da indemnização pelo dano biológico:

- no acórdão de 01/03/201826 ( referido na decisão recorrida) a indemnização na vertente patrimonial do dano biológico (perda de capacidade de ganho) foi fixada no valor de €400.00,00, numa situação em que o lesado tinha à data do sinistro 39 anos, uma esperança média de vida entre 64 e 75 anos, uma percentagem de incapacidade geral permanente (53%), tendo ficado impossibilitado para o exercício da profissão habitual de eletricista em postes de alta, média e baixa tensão, ainda que com possibilidade de exercer de outras profissões compatíveis com a sua preparação técnico-profissional;

- no acórdão de 19/05/2020 ( também tido em conta no acórdão recorrido), considerou-se equitativa a atribuição de uma indemnização a título de dano biológico, na vertente patrimonial e não patrimonial, no valor de € 450.000,00, numa situação em que o lesado tinha 21 anos à data do acidente (ascendendo a esperança média de vida aos 78 anos), era distribuidor de pizza, tendo o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica sido fixado em 55 pontos, num contexto em que as sequelas foram impeditivas do exercício da atividade profissional habitual, ainda que compatíveis com outras profissões da área de preparação técnico profissional do lesado;

- no acórdão de 17/11/202127 considerou-se equitativa a atribuição de uma indemnização a título de dano biológico, na sua vertente patrimonial, de €240.000,00, numa situação em que o lesado tinha 41 anos à data do acidente, trabalhava para um empreendimento turístico, em manutenção de vilas e motorista, tendo padecido de um défice funcional permanente de 63 pontos, sendo as sequelas incompatíveis com o exercício da sua profissão habitual.


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Para concluirmos que na fixação da montante indemnização no valor de €300.000,00, competindo à seguradora o pagamento de €195.000,00, correspondente a 65% na graduação de culpas, o acórdão recorrido adoptou critérios que se harmonizam com os padrões observados em situações análogas ou equiparáveis, em cumprimento do princípio da igualdade, convergente no juízos jurisprudenciais em caso que envolveram considerável perda da capacidade geral com repercussões significativas ao nível profissional e do desempenho de atividades quotidianas, nas vertentes sociais, sentimentais, sexuais e recreativas como a situação julgada.

Por último, a ré insurge-se contra a circunstância de o tribunal a quo não ter procedido à dedução no valor da indemnização em razão do recebimento antecipado de valores pelo autor que receberia ao longo da vida.

A desconsideração da circunstância não nos merece censura, uma vez que é congruente com o facto de o valor da indemnização ser fixado segundo a equidade, e não de acordo com a teoria da diferença28 .

Improcede, também nesta parte, o recurso interposto pela ré seguradora.

6. Da compensação a título de danos não patrimoniais

A ré seguradora argumenta que na compensação a título de danos não patrimoniais, o tribunal a quo considerou danos que foram ressarcidos por via do dano biológico, na sua vertente não patrimonial, e defende por isso a sua redução.

Será assim?

Para fixar a compensação por danos não patrimoniais, o Tribunal “a quo” considerou os seguintes vetores:

- repercussão permanente das sequelas de que o autor ficou a padecer em consequência do acidente, designadamente na sua mobilidade;

-abandono de práticas desportivas regulares, com repercussão fixada em 4/7;

- défice funcional permanente da sua integridade psíquico-física de 55 pontos percentuais;

-necessidade permanente de recurso a medicação para suportar dores e para ultrapassar as dificuldades geradas pelas sequelas, como defecar e alcançar ereção;

-cicatrizes e outras sequelas que levaram à fixação do dano estético fixado em 4/7;

-prejuízo permanente e com tendência a agravar na vida sexual e amorosa do autor;

-sofrimento físico e psicológico que lhe causaram e causam dores, quantificado em 6/7;

- incómodos, tristeza, desgosto, frustração e preocupações com o evoluir do seu estado de saúde, das lesões que sofreu e das sequelas com que ficou.

Na compensação de danos não patrimoniais em situações tipologicamente próximas à que constitui o objeto do presente recurso, constatamos que:

- no acórdão do STJ de 17/11/202129, já mencionado “supra”, considerou-se equitativa a atribuição de uma indemnização de €90.000,00 a título de danos não patrimoniais, numa situação em que o lesado tinha 41 anos à data do acidente, realizou várias sessões de fisioterapia, deixou de praticar atividade desportiva, apresentou perturbações da líbido com perturbação na ereção e na ejaculação e dificuldade orgástica com natural desenvolvimento de quadro de ansiedade; apresentou um quantum doloris fixado no grau 5/7, um dano estético permanente fixado no grau 3/7 e repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer fixada no grau 2/7;

- no acórdão do STJ de 17/02/202230 considerou-se equitativa a compensação, atribuída a título de danos não patrimoniais, no valor de €75.000,0 no caso de um lesado que, à data do acidente tinha 37 anos, necessitou de um longo período de recuperação; teve uma incapacidade permanente geral fixada em 34 pontos; sentiu dores de grau 5 numa escala de 7; ficou com um dano estético de grau 2 numa escala de 7; viu a sua vida sexual afetada com diminuição de líbido; viu a sua atividade desportiva afetada, com repercussão de grau 3 numa escala de 7;

- no acórdão do STJ de 11/05/202231 considerou-se adequada a atribuição de uma indemnização de €60.000,00 para compensar os danos não patrimoniais sofridos por um jovem de 17 anos, que esteve 48 dias internado, sofreu quatro cirurgias, das quais três na zona da cabeça, padeceu de um quantum doloris de 6/7, um dano estético de 4/7, um índice de repercussão permanente nas atividades desportivas de 4/7 e DFTP (Défice Funcional Temporário Parcial) de 1984 dias.

Os acórdãos do STJ referidos pelo Tribunal “a quo” como referenciais decisórios não se afiguram decisivos para realizar o exame ponderativo em crise, considerando as diversas realidades subjacentes: no acórdão de 05-07-201732, a indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 140.000,00 não foi, ao contrário do que sucedeu no presente caso, fixada uma indemnização pelo dano biológico na sua vertente não patrimonial, mas tão-só pela perda da capacidade de ganho; também no caso objeto de análise pelo acórdão de 20/06/202333, que considerou ajustada a fixação de um “quantum” indemnizatório de €150.000,00, o dano biológico apenas foi ponderado na vertente de patrimonial futuro; o acórdão de 12/10/202334 deteve-se sobre a operação de fixação do dano patrimonial futuro decorrente da incapacidade funcional permanente, não se debruçando sobre o montante de compensação atribuída a título de danos não patrimoniais.

Olhando aos fundamentos daquelas decisões que contemplaram em autonomia a compensação do dano biológico na vertente não patrimonial e também fixaram indemnização por danos não patrimoniais, não podemos deixar de concluir que o Tribunal a quo sobrepôs alguns dos danos – como sejam o dano estético, o prejuízo na vida sexual, e o “quantum doloris”, que entraram duplamente em linha de conta na avaliação do quadro lesivo.

Justifica-se , pois, s.d.r., a redução da compensação arbitrada neste eixo que impeça o locupletamento indesejado do lesado.

Atendendo à natureza e extensão das lesões sofridas pelo autor, a sua condição económica, a culpa efetiva do lesante, a análise jurisprudencial comparativa atualista e dinâmica, visto o preceituado nos artigos 494.º ex vi n.º 4 do artigo 496.º do Código Civil, fixa-se a compensação arbitrada a título de danos não patrimoniais no valor €100.000,00 (valor pedido pelo autor a este título), sendo ré seguradora responsabilizada na proporção de 65%, i.e, no pagamento da quantia de €65.000,00.

Procede neste segmento o recurso da ré.

7. As intervenientes e o caso julgado material

A ré declina a sua condenação no pagamento de quaisquer quantias às intervenientes Lusitânia - Companhia de Seguros, S.A. e Conjunto Turístico Arribas, S.A.

Alega que, a sentença absolutória da qual não apelaram formou caso julgado material e a apelação do autor não lhes aproveita e não se integra situação nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 634.º do CPC.

Como estatui o n.º 5 do artigo 635.º do CPC, “os efeitos do julgado, na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo.

As intervenientes - a sociedade empregadora do lesado e sua seguradora - deduziram pedidos de condenação da ré seguradora, pelas indemnizações pagas ao lesado pelo acidente de trabalho, no exercício do direito de sub-rogação, previsto no artigo 17.º, nº4 da LAT(Lei n.º 98/2009, de 04-09).

Nos termos do artigo 634.º do CPC:

1 - O recurso interposto por uma das partes aproveita aos seus compartes no caso de litisconsórcio necessário. 2 - Fora do caso de litisconsórcio necessário, o recurso interposto aproveita ainda aos outros: a) Se estes, na parte em que o interesse seja comum, derem a sua adesão ao recurso; b) Se tiverem um interesse que dependa essencialmente do interesse do recorrente; c) Se tiverem sido condenados como devedores solidários, a não ser que o recurso, pelos seus fundamentos, respeite unicamente à pessoa do recorrente (…).”

O regime ajusta-se aos casos de litisconsórcio necessário ( causa única com pluralidade de sujeitos-artigo 33.º do CPC.

Na situação litisconsórcio voluntário (art. 32.º do CPC) e de coligação (art. 36.º do CPC), em que se verifica uma simples acumulação de acções, mantendo cada litigante uma posição de independência em relação aos seus compartes, a regra é a de que o recurso só aproveita a quem o interpõe35.

A regra, no entanto, comporta as exceções previstas nas alíneas a), b) e c) do n.º 2 do citado artigo 634º do CPC.

No preenchimento da alínea b) do n.º 2 do art. 634.º do CPC, em função de tal nexo de prejudicialidade, Abrantes Geraldes refere que «…a lei determina que a interposição de recurso pelo comparte que pretende a tutela do interesse preponderante se repercute, independentemente da sua vontade, na esfera jurídica daquele cujo interesse dele depende.36»

A situação dos autos subsume-se nesta previsão legal, ou seja, das partes que pretendem exercer o direito de sub-rogação legal , contra o terceiro responsável civil pelo acidente.

Esta responsabilidade corresponde a uma sub-rogação legal, nos termos do artigo 592.º do Código Civil, em que o empregador e a respetiva seguradora não são responsáveis solidários com o terceiro – em virtude dos distintos fundamentos subjacentes às duas responsabilidades, a que já se fez alusão -, mas sucedem na titularidade do crédito do lesado37.

O direito de sub-rogação legal apenas se constituirá na esfera jurídica das entidades sub-rogadas que efetuaram um pagamento prévio ao trabalhador se - e na medida - em for estabelecida a responsabilidade de terceiro pela ocorrência do acidente.

Encontra-se assim verificado o nexo de prejudicialidade entre o direito de indemnização, com fundamento em responsabilidade extracontratual, reclamado pelo sinistrado recorrente contra a ré, e o interesse das intervenientes que, sendo partes na causa, não chegaram a ser partes no recurso, mas que, por virtude da extensão subjetiva do caso julgado, poderão beneficiar, segundo um princípio de realidade, extraível da alínea b) do n.º 2 do art. 634.º do CPC, do acórdão recorrido revogatório que lhes foi favorável.

Estamos perante um caso de coligação (art. 36.º do CPC), em que os pedidos formulados pelo autor e pelas intervenientes, apesar de diferentes, se encontram numa relação de prejudicialidade, numa situação que, não atingindo o nível de comunhão de interesses característico do litisconsórcio necessário, denota a existência de um interesse parcialmente comum38. A circunstância de a sub-rogação legal constituir uma transmissão do crédito é também um vetor desta relação de prejudicialidade, uma vez que o direito reclamado pelas intervenientes corresponde ao direito originariamente titulado pelo autor, que mantém a sua identidade e os seus acessórios apesar da modificação subjetiva operada39.

A ampliação do âmbito subjetivo do recurso de apelação interposto pelo autor, decorrente do artigo 634.º, nº2, al) b) do CPC, impede que a decisão absolutória dos pedidos quanto às intervenientes se haja consolidado.

Em suma, as circunstâncias processuais consentem a condenação da ré seguradora no pagamento às intervenientes, das quantias por estas liquidadas no âmbito do processo de acidente de trabalho, não violou qualquer caso julgado material formado pela sentença apelada.

Pela mesma razão, justifica-se a condenação da ré no pagamento às intervenientes de 65% das prestações em que estas foram condenadas, no âmbito do processo laboral, que venham a ser liquidadas ao autor por força daquela decisão, considerando que estão reunidos os pressupostos para a prolação de uma condenação genérica, em montante a liquidar ulteriormente por estarem em causa danos patrimoniais futuros, de caráter previsível (artigo 609.º, nº2, do CPC e artigo 564.º, nº2, do CC).

IV. Decisão.

Pelo exposto, julga-se procedente parcialmente o recurso da ré e, em consequência, fixa-se em €65.000,00 (sessenta e cinco mil euros), a compensação devida pelos danos não patrimoniais, condenando a ré a pagar ao autor a quantia total de € 262.692,95,revogando nessa medida o acórdão recorrido, que se mantém quanto ao demais; e improcedente o recurso subordinado do autor.

As custas são a cargo de ambas as partes, na proporção de 35% pelo autor e de 65% pela ré.

Lisboa, 6 de Novembro de 2025

Isabel Salgado (relatora)

Ana Paula Lobo

Carlos Portela

__________

1. Cfr. AUJ n.º 1/2020 que fixou sobre o tópico a seguinte jurisprudência - “o recurso subordinado de revista está sujeito ao n.º 3 do artigo 671.º, a isso não obstando o n.º 5 do art. 633.º do mesmo Código.” E ainda o AUJ 7/2022.

2. Em transcrição do acórdão recorrido.

3. Reordenado no elenco dos factos relativos à dinâmica do acidente

4. Como se preconiza no AC.STJ de 27-04-2017- “Um dano não é, apenas, a consequência da sua causa imediata; em regra, é produto de um encadeamento ou sequência de causas.”, proc. nº 1523/13.7T2AVR.P1.S1, in www.dgsi.pt.

5. Cfr. Acórdão do STJ de 2.12.2020, proc. nº 9452/18.1T8PRTP1S1, in www.dgsi.pt.

6. MAFALDA MIRANDA BARBOSA, Do nexo de causalidade ao nexo de imputação: contributo para a compreensão da natureza binária e personalística do requisito causal ao nível da responsabilidade civil extracontratual, Dissertação de Doutoramento na área de Jurídico-civilísticas na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, sob orientação do Senhor Professor Doutor Pinto Monteiro, Coimbra, 2012, p. 1202, nota 2487, consultável em https://estudogeral.uc.pt/handle/10316/23223 Cfr. José Carlos Brandão Proença, Direito das Obrigações –Relatório sobre o programa, o conteúdo e os métodos de ensino da disciplina, Porto, Publicações Universidade Católica, 2007, p.193.

7. Cfr. inter alia AC. STJ de 23.09.2025, proc. nº5345/21.T8STB.S1, e, no mesmo sentido, Ac.STJ de 01/10/2024, proc. n º 758/22.6T8VRL.G1.S1; argumentação também acolhida pelos acórdãos do STJ de 08-04-2010 , de 02-06-2016 , todos in www.dgsi.pt.

8. Adriano Vaz Serra, “Culpa do devedor ou do agente”, Separata do Boletim do Ministério da Justiça, Lisboa, 1957, pp. 78-79.

9. Pires de Lima/Antunes Varela, Código Civil Anotado, volume I, Coimbra, Coimbra Editora, 1987, pp. 587-588.

10. José Carlos Brandão Proença, Comentário ao Código Civil – Direito das Obrigações, Lisboa, Universidade Católica Portuguesa, 2018, p. 579.

11. Processo n.º 595/14.1TVLSB.L1.S1, in www.dgsi.pt.

12. Cfr. Artigo 7º do Código da Estrada.

13. Assim fica prejudicada da avaliação da presunção de culpa decorrente do n.º 3 do art. 503.º do CC, que recaía sobre o condutor do veículo seguro na ré, que o conduzia por conta de outrem, nem das normas pertinentes à responsabilidade civil objetiva referidas pela ré seguradora nas suas alegações.

14. Proc. n.º 265/20.1T8VRL.G2.S1, in www.dgsi.pt

15. A sua abordagem não é uniforme na jurisprudência - Cfr. MARIA DA GRAÇA TRIGO, “O conceito de dano biológico como concretização jurisprudencial do princípio da reparação integral dos danos – breve contributo”, Julgar, n.º 46, 2022, p.269.

16. Seguindo a orientação admitida por larga parte da jurisprudência do Supremo Tribunal -cfr. respeito, entre outros, os acórdãos do STJ de 04-07-2023 , proc.º 342/19.1T8PVZ.P1.S1; de 11-01-2024 , n.º 25713/15.9T8SNT.L1.S1; de 07-05-2024 , proc.º 807/18.2T8VFR.P1.S1;de 07-03-2023,proc. º 766/19.4T8PVZ.P1.S1; de 19/09/2024 , proc. nº17587/16.9T8LSB.L1.S1,todos disponíveis in www.dgsi.pt.

17. In NÓTULA SOBRE O TRATAMENTO JURISPRUDENCIAL DOS ACIDENTES QUE MERECEM A QUALIFICAÇÃO SIMULTANEAMENTE DE ACIDENTES DE TRABALHO E DE ACIDENTES DE VIAÇÃO in Revista Julgar, nº46, 2022.

18. De igual modo não é despiciendo que o legislador tenha optado por eleger a responsabilidade primordial a responsabilidade civil pela ocorrência do acidente de viação, e a responsabilidade por acidente de trabalho assumir uma natureza meramente complementar- cfr. artigo 17.º da LAT.

19. No artigo e local já citados.

20. Proc. n.º 394/14.0TBFLG.P2.S1, e também os acórdãos do STJ de 10/10/2012 632/2001.G1.S1, e de 12-07-2018 , 1842/15.8T8STR.E1.S1, todos in www.dgsi.pt

21. Proc. n.º 1633/18.4T8GMR.G1.S1, na mesma página.

22. Proc n.º111/17.3T8MAC.G1.S1;no mesmo sentido o AC.STJ 12/04/2024, proc. 34/14.8T8PNF-A.P1.S,1 na mesma página.

23. Cfr. Maria da Graça Trigo, obra e local citados, p. 170.

24. Cfr., neste âmbito, os acórdãos do STJ de - de 31-01-2024 , de 17-01-2023 , de 31-01-2023 , de 14-03-2023 , de 14-03-2023 , de 14-03-2023 , de 30-03-2023 , de 30-03-2023 , de 09-05-2023 , de 06-06-2023 , de 16-01-2024 , de 14-09-2023 , in www.dgsi.pt.

25. Cfr. neste sentido os Ac.STJ de 06-12-2017 e de 01.03.2018, in www.dgsi.pt.

26. Processo n.º 773/07.0TBALR.E1.S1

27. Processo n.º 3496/16.5T8FAR.E1.S1.

28. Cfr. neste sentido, os acórdãos do STJ de 29/10/2020, proc. n.º 111/17.3T8MAC.G1.S, e de 06/04/2021, proc n.º 2908/18.8T8PNF.P1.S1, in www.dgsi.pt.

29. Processo n.º 3496/16.5T8FAR.E1.S1, in www.dgsi.pt.

30. Processo n.º 2712/18.3T8PNF.P1.S1, in www.dgsi.pt.

31. Processo n.º 33/14.0T8MCN.P1.S1, todos in www.dgsi.pt.

32. Processo n.º 4861/11.0TAMTS.P1.S1

33. Processo n.º 2833/17.0T8CBR.C1.S1,

34. Processo n.º 22082/15.0T8PRT.P1.S1, todos in www.dgsi.pt.

35. Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 8.ª edição, Coimbra, Almedina, p. 141.

36. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 7.ª edição, Coimbra, Almedina, 2022, p. 128. Também neste sentido, cfr. Rui Pinto, Manual do Recurso Civil, volume I, Lisboa, AAFDL Editora, 2020, pp. 255-256 e Jorge Noronha Silveira, Pluralidade de partes na fase dos recursos em processo civil, Coimbra, Almedina, 1981, pp. 53-54.

37. Pedro Romano Martinez, Direito do Trabalho, 9.ª edição, 2019, p. 911; nesse mesmo sentido JÚLIO GOMES in local citado e Apud Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11/05/2011, processo n.º 242-A/2001.C2.S1, in ww.dgsi.pt.

38. Cfr. neste sentido, António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 7.ª edição, Coimbra, Almedina, 2022, p. 126.

39. Cfr., a este respeito, Januário da Costa Gomes, Assunção Fidejudiciária de Dívida – Sobre o sentido e o âmbito da vinculação como fiador, Coimbra, Almedina, 2000, pp. 874.