Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 5.ª SECÇÃO | ||
Relator: | AGOSTINHO TORRES | ||
Descritores: | RECURSO PARA FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA PRESSUPOSTOS PLURALIDADE DE ACÓRDÃOS FUNDAMENTO PLURALIDADE DE QUESTÕES DE DIREITO CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO REJEIÇÃO | ||
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Data do Acordão: | 11/28/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA (PENAL) | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
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Sumário : |
I- É jurisprudência largamente maioritária do STJ que, em recurso de fixação de jurisprudência, não podem ser invocados dois acórdãos-fundamento, mas apenas um, bem como várias questões de direito em vez de uma apenas. Tendo-o sido, não há lugar a convite a aperfeiçoamento e o recurso não pode prosseguir, devendo ser rejeitado, face a um duplo pedido de fixação de jurisprudência, uma vez que se está perante pedido, em concreto, que versa dois aspectos: -Quanto à forma/exigências de notificação relativamente a pessoas singulares em sede de processos contraordenacionais, e - Quanto à notificação de pessoas coletivas no âmbito desse mesmo tipo de processos e com referência a normas quer do RGCC, quer do CPP quer do CPC. II- Quando haja sido indicado mais de um acórdão fundamento, ainda que aparentemente similares, não cabe a este STJ escolher um entre os indicados. Não tendo os recorrentes mencionado por qual deles optariam (ainda que se entendesse por mera hipótese de raciocínio, que tal fosse viável) não há que os convidar a fazê-lo, pelo que deve ser rejeitado o recurso. | ||
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Decisão Texto Integral: | Recurso para Fixação de Jurisprudência nº 976/23.0Y2MTS.P1-A.S1 * Acordam em Conferência os Juízes na 5ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça I- Relatório 1.1- O Acórdão Recorrido. Por Acórdão de ........2024, proferido no processo de recurso de contraordenação nº 976/23.0Y2MTS.P1, da 1ª Secção do Tribunal da Relação do Porto, transitado em julgado em ........2024, sendo ali arguidos e recorrentes DD e a sociedade EE § FF, foi decidido julgar improcedente o recurso interposto da sentença proferida na 1ª instância no pressuposto de que, sinteticamente: “ (…) É regular a notificação dos arguidos pela autoridade administrativa, ao abrigo da disposição do art.º 50º do RGCO, por cartas-registadas com A/R remetidas para o domicílio e para a sede dos mesmos, assinados por alguém que não foi possível identificar, por se tratar de rubrica, embora as pessoas que assinaram os referidos avisos de recepção se encontrassem, no momento, nas moradas indicadas, e tanto mais que a disposição do art. 28º do DL-35/2019, de 11/03, não configura uma exigência legal do uso do A/R, pelo que é irrelevante saber quem o assinou e/ou em que data, motivo por que é de desatender a invocada nulidade (cfr, Certidão, 05.09.2024, 400909) (…)”cit. 1.2 - O Recurso para Fixação de Jurisprudência Os recorrentes nos autos de recurso ordinário (contraordenação) acima referenciados, tendo sido notificados do teor desse acórdão do TRP, apresentaram então requerimento de interposição do presente recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, por via eletrónica, em .../.../2024 (referência citius: ... (...)) e do despacho (referência: ...) proferido em .../.../2024, que se encontram junto aos autos. nos termos e com os seguintes fundamentos: [“(…) I. Como decorre do artigo 50.º do Decreto-Lei n.º 433/82, não é permitida a aplicação de uma coima ou de uma sanção acessória sem antes se ter assegurado ao arguido a possibilidade de, num prazo razoável, se pronunciar sobre a contraordenação que lhe é imputada e sobre a sanção ou sanções em que incorre, devendo esta possibilidade revestir a, “(…) forma de notificação, como decorre das disposições conjugadas dos artigos 41.º, n.º 1, 46.º, n.º 2, e 50.º2. Neste sentido veja-se, entre outros, o Acórdão da Relação do Porto de 2 de maio de 2012, proc. n.º 7392/11.4TAVNG.P1; O Acórdão da Relação de Évora de 11 de julho de 2013, proc. n.º 45/13.0TBETZ.E1; ou o Acórdão da Relação de Lisboa de 12 de setembro de 2018, proc. n.º 385/17.0YALSB-L1-3 do Decreto-Lei n.º 433/82, e do artigo 112.º, n.º 3, alínea a), do Código de Processo Penal” a qual “(…) terá de ser feita, em alternativa, por contacto pessoal com o notificando e no lugar em que este for encontrado, ou por via postal registada – artigo 113.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código de Processo Penal”, sendo que a, “(…) notificação por contacto pessoal com o notificando a lei não admite que a mesma seja feita em pessoa diversa daquele (artigo 113.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Penal)”; II. Tendo a Autoridade Administrativa optado por proceder à notificação dos arguidos na modalidade de carta registada com aviso de receção, procedimento ao qual – como é comumente conhecido – está associado um formalismo específico, concretamente à necessidade de identificação da pessoa que recebeu a carta ou aviso e a verificação da capacidade dessa pessoa para transmitir ou comunicar à arguida sociedade o conteúdo da notificação que recebeu ou a capacidade de obrigar a sociedade (circunstância que a Autoridade Administrativa tinha condições de apurar), verificando que dos avisos de receção não resulta a cabal identificação de quem e da qualidade de quem os recebeu, tinha a obrigação de regularizar tal situação. III. Não o tendo feito, dúvida não há de que os arguidos não foram regularmente notificados para os efeitos previstos no artigo 50.º do Regime Geral das Contraordenações, o que resulta numa nulidade insanável. IV. Sobre esta matéria e em sentido diametralmente oposto ao do acórdão recorrido, foram produzidos os acórdão-fundamento, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 08.07.2015, proferido no processo 857/13.5TFPRT-A.P1 (publicado no site do Ministério da Justiça - Instituto das Tecnologias de Informação na Justiça - Bases Jurídico-Documentais, in www.dgsi.pt,) referente à pessoa singular e o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10.04.2024, proferido no processo nº 1024/23.5Y2MTS.P1 (publicado no site do Ministério da Justiça - Instituto das Tecnologias de Informação na Justiça - Bases Jurídico-Documentais, in www.dgsi.pt) referente à notificação das pessoas coletivas. V. Assim sendo, a interpretação do acórdão recorrido - ao perfilhar o entendimento de que é irrelevante saber-se quem rececionou a notificação, considerando-a regular a notificação para os termos do artigo 50º do Regime Geral das Contraordenações quando o aviso de receção for enviado para a morada e sede dos arguidos, sendo assinado por terceiro sem a devida verificação da capacidade dessa pessoa para transmitir ou comunicar aos arguidos o conteúdo da notificação que recebeu, a capacidade de obrigar a sociedade ou sequer a identidade da mesma - viola o preceituado artigos 113º, 230º e 223º, ambos do Código de Processo Civil (aplicável ex vi dos artigos 41º do Regime Geral das Contraordenações e 4º do Código de Processo Penal) e atenta ainda contra as garantias constitucionais dos arguidos. VI. Portanto, a jurisprudência que deve ser acolhida – salvo o devido respeito por opinião contrária é a dos acórdãos-fundamento e não a do acórdão recorrido, ou seja, a de que: a. a comunicação ao arguido da decisão da autoridade administrativa que lhe aplicou uma coima reveste a formalidade própria de uma notificação em processo penal. b. Por isso deve ser feita por carta registada com aviso de receção devendo este ser assinado pelo próprio notificando. c. Em processo contraordenacional, a notificação das pessoas coletivas deve obedecer ao disposto no artigo 223.º do Código de Processo Civil (aplicável nos termos do disposto nos artigos 41.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações e 4.º do Código de Processo Penal). Não é, pois, válida a notificação de uma pessoa coletiva por carta registada com aviso de receção quando este aviso não foi assinado por pessoa que não é nem representante legal dessa pessoa coletiva, nem seu empregado. d. A falta ou irregularidade da notificação efetuada nos termos do art.º 50º do Regime Geral das Contraordenações implica uma nulidade insanável, por analogia com o art.º 119º al. c) do Código de Processo Penal, devendo todo o processo contraordenacional ser anulado a partir, inclusive, daquela notificação a qual terá de ser repetida. NESTES TERMOS (…) deve: (…) c) Ser a final firmada jurisprudência no sentido do entendimento perfilhado pelos acórdãos-fundamento, designadamente que i. A comunicação ao arguido da decisão da autoridade administrativa que lhe aplicou uma coima reveste a formalidade própria de uma notificação em processo penal. ii. Por isso deve ser feita por carta registada com aviso de receção devendo este ser assinado pelo próprio notificando. iii. Em processo contraordenacional, a notificação das pessoas coletivas deve obedecer ao disposto no artigo 223.º do Código de Processo Civil (aplicável nos termos do disposto nos artigos 41.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações e 4.º do Código de Processo Penal). iv. Não é, pois, válida a notificação de uma pessoa coletiva por carta registada com aviso de receção quando este aviso não foi assinado por pessoa que não é nem representante legal dessa pessoa coletiva, nem seu empregado. d) tudo com as demais consequências legais e processuais.”] 1.3 - A resposta ao recurso por parte do MPº O MPº na 1ª instância promoveu a rejeição do recurso com fundamento na indicação de dois acórdãos fundamento e não de apenas um, não sendo caso de permissão para convite a aperfeiçoamento, indicando na sua promoção vária jurisprudência do STJ nesse sentido. 1.4 - Neste STJ o MPº promoveu igualmente a rejeição do recurso com idêntico fundamento, aderindo aos argumentos do seu par na 1ª instância, sufragando também em seu apoio jurisprudência vária e consensual do STJ nesse sentido. 1.5. Questão-Controvertida. Os recorrentes colocam a questão (a bem dizer aliás, duas questões): uma, a notificação de pessoas singulares e, outra, a notificação de pessoas colectivas em regime contraordenacional- art.º 50º do RGCC) dizendo que: “(…) a Autoridade Administrativa optou por proceder à notificação dos arguidos na modalidade de carta registada com aviso de receção, procedimento ao qual está associado um formalismo específico, concretamente à necessidade de identificação da pessoa que recebeu a carta ou aviso e a verificação da capacidade dessa pessoa para transmitir ou comunicar à arguida sociedade o conteúdo da notificação que recebeu ou a capacidade de obrigar a sociedade (circunstância que a Autoridade Administrativa tinha condições de apurar), verificando que dos avisos de receção não resulta a cabal identificação de quem e da qualidade de quem os recebeu, tinha a obrigação de regularizar tal situação. E que sobre esta matéria e em sentido diametralmente oposto ao do acórdão recorrido, foram produzidos os acórdão-fundamento, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 08.07.2015, proferido no processo 857/13.5TFPRT-A.P1 (publicado no site do Ministério da Justiça - Instituto das Tecnologias de Informação na Justiça - Bases Jurídico-Documentais, in www.dgsi.pt,) referente à pessoa singular e o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10.04. 2024, proferido no processo nº 1024/23.5Y2MTS.P1 (publicado no site do Ministério da Justiça - Instituto das Tecnologias de Informação na Justiça - Bases Jurídico-Documentais, in www.dgsi.pt) referente à notificação das pessoas coletivas. Concluindo que : A interpretação do acórdão recorrido - ao perfilhar o entendimento de que é irrelevante saber-se quem rececionou a notificação, considerando-a regular a notificação para os termos do artigo 50º do Regime Geral das Contraordenações quando o aviso de receção for enviado para a morada e sede dos arguidos, sendo assinado por terceiro sem a devida verificação da capacidade dessa pessoa para transmitir ou comunicar aos arguidos o conteúdo da notificação que recebeu, a capacidade de obrigar a sociedade ou sequer a identidade da mesma - viola o preceituado artigos 113º, 230º e 223º, ambos do Código de Processo Civil (aplicável ex vi os artigos 41º do Regime Geral das Contraordenações e 4º do Código de Processo Penal) e atenta ainda contra as garantias constitucionais dos arguidos. Não o tendo feito, dúvida não há de que os arguidos não foram regularmente notificados para os efeitos previstos no artigo 50.º Pedindo, em consequência, que: Seja a final firmada jurisprudência no sentido do entendimento perfilhado pelos acórdãos-fundamento, designadamente que: i. A comunicação ao arguido da decisão da autoridade administrativa que lhe aplicou uma coima reveste a formalidade própria de uma notificação em processo penal. ii. Por isso deve ser feita por carta registada com aviso de receção devendo este ser assinado pelo próprio notificando. iii. Em processo contraordenacional, a notificação das pessoas coletivas deve obedecer ao disposto no artigo 223.º do Código de Processo Civil (aplicável nos termos do disposto nos artigos 41.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações e 4.º do Código de Processo Penal). iv. Não é, pois, válida a notificação de uma pessoa coletiva por carta registada com aviso de receção quando este aviso não foi assinado por pessoa que não é nem representante legal dessa pessoa coletiva, nem seu empregado.” 1.6- Os recorrentes não responderam ao parecer do MP. Os autos foram remetidos aos vistos e à Conferência. Realizada esta, cumpre agora explicitar a deliberação tomada. Sublinha-se ainda que a presente fase processual se atém à fase preliminar do recurso, porquanto se circunscreve à avaliação da sua admissibilidade (art.º 441.º, CPP) e, se for o caso ainda, à determinação da oposição de julgados. II. Os pressupostos do recurso para fixação de jurisprudência 2.1- O recurso de fixação de jurisprudência está previsto no Capítulo I, do Título II, do Livro XIX do CPP, sendo que os art.ºs 437.º (fundamento do recurso) e 438.º (interposição e efeito) são normas disciplinadoras dos requisitos de natureza formal e substancial para a admissibilidade deste recurso extraordinário. Assim, o Código de Processo Penal admite, nos n.ºs 1 e 2 do seu artigo 437.º, a interposição de recurso para fixação de jurisprudência «quando, no domínio da mesma legislação, o Supremo Tribunal de Justiça proferir dois acórdãos que, relativamente à mesma questão de direito, assentem em soluções opostas», sendo também admissível esse recurso «quando um tribunal da Relação proferir acórdão que esteja em oposição com outro, da mesma ou de diferente Relação, ou do Supremo Tribunal de Justiça, e dele não for admissível recurso ordinário, salvo se a orientação perfilhada naquele acórdão estiver de acordo com a jurisprudência já anteriormente fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça». De acordo com o n.º 3 deste mesmo preceito legal, «os acórdãos consideram-se proferidos no domínio da mesma legislação quando, durante o intervalo da sua prolação, não tiver ocorrido modificação legislativa que interfira, directa ou indirectamente, na resolução da questão de direito controvertida». O Ministério Público, o arguido, o assistente e as partes civis têm legitimidade para a interposição deste tipo de recurso (artigo 437.º, n.º 5), exigindo-se ainda que estes três últimos tenham interesse em agir (artigos 448.º e 401.º, n.º 2), o que se traduz «na possibilidade de a decisão que resolver o conflito ter uma repercussão favorável ao recorrente no processo em que o recurso foi interposto, por força do disposto no artigo 445.º, n.º 1». A estes requisitos legais, o Supremo Tribunal de Justiça, de forma pacífica, aditou a incontornável necessidade de identidade de factos, não se restringindo à oposição entre as soluções de direito- (cfr. Acórdãos do STJ de 10 de Janeiro de 2007, relativo ao processo 06P4042, e de 31 de Outubro de 2012, proferido no processo n.º 224/06.7TACBC.G2-A.S1) entendida esta, contudo, «não como uma identidade absoluta entre dois acontecimentos históricos mas que eles se equivalham para efeitos de subsunção jurídica a ponto de se poder dizer que, pese embora a solução jurídica encontrada num dos processos assente numa factualidade que não coincide exactamente com a do outro processo, esta solução jurídica continuaria a impor-se para o subscritor mesmo que a factualidade fosse a do outro processo» (Acórdão do STJ de 26 de Junho de 2014, proferido no processo n.º 1714/11.5GACSC.L1.S2). Por outro lado, a oposição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento– oposição de julgados – é a que resultará de ambos os acórdãos se terem pronunciado e terem resolvido a mesma questão de direito controvertida, no domínio da mesma legislação, adotando soluções opostas na interpretação e aplicação das mesmas normas, decidindo em termos contraditórios em idênticas situações de facto. Assim, os referidos art.ºs 437.º/1/2/3 e 438.º/1/2, do CPP, assim como a jurisprudência pacífica deste STJ (para o efeito, vd., por todos, pereira madeira, Código de Processo Penal, Comentado, 2016, p. ,1469) fazem, pois, depender a admissibilidade do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência de pressupostos (i)formais e ii) substanciais). 2.2- Quanto aos pressupostos formais: A legitimidade e interesse em agir do recorrente estão verificadas. Os acórdãos em conflito são de tribunais superiores: um, o acórdão recorrido, de Tribunal da Relação, mas de que não é já admissível recurso ordinário e os outros, os acórdãos-fundamento, também de Tribunais da Relação (cfr. artigo 437.º nºs 1 e 2 do Código Processo Penal. Confirma-se também o trânsito em julgado e a publicação dos acórdãos - artigos 437º n.º 4 e 438º n º 1 do Código Processo Penal. Foi tempestiva a interposição do recurso no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar (acórdão recorrido) - artigo 438º n.º 1 do Código Processo Penal. A identificação dos arestos com o qual o acórdão recorrido se encontra em oposição (acórdãos-fundamento) - artigo 438.º n.º 2 do Código Processo Penal, e a indicação da publicação do acórdão-fundamento - artigo 438º n.º 2 do Código Processo Penal foi respeitada. Porém, já quanto à indicação de apenas um acórdão-fundamento - artigos 437º nºs 1, 2 e 3 e 438º n.º 2 do Código Processo Penal- a mesma não se mostra respeitada e, como adiantaremos de seguida, só quando se verifiquem e sejam válidos todos os pressupostos formais se prosseguirá com a análise dos restantes pressupostos, esses de natureza já substancial. No presente caso concreto, não foi indicado apenas um acórdão-fundamento, mas dois, por isso que essa falha, por excesso, gera a rejeição do recurso e não há lugar a convite a aperfeiçoamento. Na verdade, insurgem-se os recorrentes contra o Acórdão recorrido e não se conformando com o mesmo, dele interpuseram RFJ com base em alegada contradição entre o citado acórdão com outros dois, que expressamente mencionaram: - O Acórdão do T.R.P. - Tribunal da Relação do Porto de 08.07.2015, proferido no processo 857/13.5TFPRT-A.P1 in www.dgsi.pt (1): “I -A comunicação ao arguido da decisão da autoridade administrativa que lhe aplicou uma coima reveste a formalidade própria de uma notificação em processo penal. - O Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10-04-2024 no processo nº 1024/23.5Y2MTS.P1, in www.dgsi.pt: “I – Em processo contraordenacional, a notificação das pessoas coletivas deve obedecer ao disposto no artigo 223.º do Código de Processo Civil (aplicável nos termos do disposto nos artigos 41.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações e 4.º do Código de Processo Penal) II - Não é, pois, válida a notificação de uma pessoa coletiva por carta registada com aviso de receção quando este aviso não foi assinado por pessoa que não é nem representante legal dessa pessoa coletiva, nem seu empregado.” (2) No decorrer da evolução processual, sequer em momento de possível resposta ao parecer do MPº os recorrentes fizeram opção por qualquer deles. Na verdade, nem podiam verdadeiramente fazê-lo pois misturaram no mesmo recurso duas questões, ainda que só aparentemente iguais, por resultarem de uma decisão abrangente de vários arguidos, um singular e outro referente a pessoa colectiva, mas na realidade jurídica autónomas entre si para o efeito da verificação de pressupostos do recurso extraordinário de fixação de jurisprudência. Ora, tem toda a razão o MPº ao apelar à rejeição, desde logo por constatação da indicação pelos recorrentes de dois acórdãos fundamento e não apenas de um, indicação essa ao arrepio do que tem vindo a ser entendido por variadíssima jurisprudência neste STJ, que também cita. Assim, como doutamente o salientou: “(…) um dos pressupostos indeclináveis exigidos pela economia normativa do regime legal regulador dos recursos extraordinários para fixação de jurisprudência é que apenas podem ter por fundamento uma única questão jurídica, inserta num único aresto pretensamente antagónico e um único pedido de fixação de jurisprudência relativamente ao mesmo tratamento conflituante sobre uma única questão, o que não foi manifestamente observado pelos recorrentes (…) motivo para rejeição liminar do recurso, sem possibilidade de aperfeiçoamento, como constitui jurisprudência unanime e pacifica nesse Supremo Tribunal de Justiça – S.T.J. e liminarmente decorre da simples leitura do programa normativo decorrente da disciplina contida no disposto do artigo 437.º n.º 4 do Código de Processo Penal – C.P.P (…)” Convocando, entre o mais, correctamente, o citado apoio jurisprudencial largamente maioritário (senão mesmo uniforme) nesse sentido e ainda no de não haver sequer lugar a convite ao aperfeiçoamento. Assim, entre eles e muitos outros do STJ, vejam-se: - Acórdão do STJ de 09-10-2013 proc.º 272/03.9TASX com ampla recensão jurisprudencial e doutrinária. -Acórdão do S.T.J. de 21/09/2016 in www.dgsi.pt -Acórdão do S.T.J. de 07/06/2017 in www.dgsi.pt -Acórdão de 24-03-2021- proc.º 64/15.2IDFUN.L1-A.S1, com extensa recensão jurisprudencial (3) -O Acórdão do STJ de 17-06-2021, proferido no proc.º n.º 701/16.1T9MTJ.L1-A.S1 -Acórdão do S.T.J. de 23/06/2021 in www.dgsi.pt - O Acórdão de STJ, 01.12.2021, P- 335/19.9GAVNF.G1-A.S1 -Acórdão do S.T.J. de 09/05/2024 in www.dgsi.pt. - O Acórdão de 23.05.2024, P-461/22.7GBFLG-A.S1 Mais recentemente, em situação muito similar, o Acórdão deste STJ e secção nº 1028/23.8Y2MTS.P1-A.S1 (Albertina Pereira), de 19-09-2024 (4), também subscrito pelo Exmº Sr. Conselheiro aqui 1º adjunto (Jorge Gonçalves) e onde, aliás, se convocaram igualmente o primeiro dos acórdãos-fundamento e um outro, bem como não apenas uma, mas duas questões de direito, idênticas às invocadas nos presentes autos de RUJ. Assim, na mesma linha do ali defendido, quando haja sido indicado mais de um acórdão fundamento, ainda que aparentemente similares, não cabe a este STJ escolher um entre os indicados. Não tendo os recorrentes mencionado por qual deles optariam (ainda que se entendesse por mera hipótese de raciocínio, que tal fosse viável) não há que os convidar a fazê-lo, pelo que deve ser rejeitado o recurso ex vi das disposições conjugadas dos artigos 440.º, n.º 3 e 4, e 441.º, n.º 1, 1ª parte, do C.P. O recurso não pode prosseguir não só por terem sido invocados dois acórdãos-fundamento, mas também por se estar, no fundo, perante um duplo pedido de fixação de jurisprudência, ou seja, por se estar perante pedido que versa, no entender dos recorrentes, a fixação de jurisprudência quanto a dois aspetos: -Quanto à forma/exigências de notificação relativamente a pessoas singulares em sede de processos contraordenacionais, e - Quanto à notificação de pessoas coletivas no âmbito desse mesmo tipo de processos e com referência a normas quer do RGCC, quer do CPP quer do CPC. Ou seja, é efetuado um duplo pedido de fixação de jurisprudência no mesmo requerimento, o que nos parece extravasar o que a lei permite no art.º 437º, n.º 1, do CPP, ao referir que o recurso de fixação é interposto quando forem proferidas duas decisões que «relativamente à mesma questão de direito, assentem em soluções opostas. Também, como mais em detalhe no último dos arestos citado claramente foi mencionado: “ (…) Este Supremo Tribunal, tem sido praticamente unânime em afirmar que não é possível invocar mais do que um acórdão para fundamentar a oposição de julgados. Trata-se de um requisito que decorre de forma expressa da Lei, ao estabelecer-se no art.º 437.º, n.º 1 do Código de Processo Penal «Quando, no domínio da mesma legislação, o Supremo Tribunal de Justiça proferir dois acórdãos que, relativamente à mesma questão de direito, assentem em soluções oposta (…)» e, ainda, no art.º 438.º do Código de Processo Penal, que «No requerimento de interposição do recurso o recorrente identifica o acórdão com o qual o acórdão recorrido se encontre em oposição». Tal indicação, no singular - o recorrente identifica o acórdão - conduz-nos à conclusão de que não poderão ser indicados vários acórdãos fundamento. A esse elemento literal alia-se a questão da viabilidade prática na medida em que a exigência de confrontar apenas dois acórdãos - o recorrido e o fundamento - assenta numa lógica de delimitação precisa da questão ou questões a decidir, já que se em grande número de casos não é tarefa fácil descortinar a questão, quando e estejam em causa dois (ou mais acórdãos) acórdãos, essa tarefa tornar-se-ia muito mais complexa e difícil de obter. Nesta linha, entende-se que a indicação de mais do que um acórdão fundamento é motivo de rejeição do recurso para fixação de jurisprudência em virtude de assim se não mostrarem preenchidos os requisitos formais, legalmente previstos. Acresce que os recorrentes suscitam uma pluralidade de questões jurídicas, requerendo que seja firmada jurisprudência no sentido de que: «i. A comunicação ao arguido da decisão da autoridade administrativa que lhe aplicou uma coima reveste a formalidade própria de uma notificação em processo penal. ii. Por isso deve ser feita por carta registada com aviso de receção devendo este ser assinado pelo próprio notificando. iii. Sendo a acoimada uma sociedade e, tendo a mesma sido notificada para apresentar defesa nos termos do art.º 50.º do Regime-Geral das Contraordenações (Regime Geral das Contraordenações), por carta registada com A/R, para se aferir da regularidade dessa notificação há que recorrer aos art.º s 230.º e 223.º, ambos do Código de Processo Civil (aplicável ex vi os art.º s 41º do Regime Geral das Contraordenações e 4º do Código de Processo Penal) devendo considerar-se aplicável, à notificação efetuada nos termos do art.º 50.º do Regime Geral das Contraordenações, a citação em termos civis (efetuada de acordo com o art.º 228.º do Código de Processo Civil), pois é através dessa notificação que se chama, pela primeira vez, a acoimada ao processo. iv. Assinado o A/R por pessoa diversa do destinatário, sem indicação da concreta identificação dessa pessoa, implica a irregularidade do respetivo A/R o que, por sua vez, leva a que se tenha de concluir que a acoimada não foi devidamente notificada para exercer o seu direito de defesa nos termos do art.º 50.º do Regime Geral das Contraordenações. v. A falta ou irregularidade da notificação efetuada nos termos do art.º 50.º do Regime Geral das Contraordenações implica uma nulidade insanável, por analogia com o art.º 119º al. c) do Código de Processo Penal, devendo todo o processo contraordenacional ser anulado a partir, inclusive, daquela notificação a qual terá de ser repetida». Os recorrentes, partindo da questão geral (formalidades da notificação dos arguidos para apresentação de defesa nos termos do art.º 50.º do Regime Geral das Contraordenações) o que pretendem é que o Supremo Tribunal de Justiça, em sede de fixação de jurisprudência dê resposta a todas as ramificações supra referidas, como se de um recurso ordinário se tratasse. Ora, é também unânime a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça no sentido de que não é possível indicar mais do que uma questão fundamental de direito, por a isso obstar, desde logo, o referido art.º 437.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, que se refere “à mesma questão de direito”, bem como as concretas finalidades deste tipo de recurso extraordinário - através do qual se pretende a uniformização dos critérios interpretativos de modo a garantir a unidade do ordenamento jurídico penal ou processual penal, os princípios de segurança, previsibilidade e certeza das decisões judiciais e, com isso, a realização do interesse público através da garantia da igualdade dos cidadãos perante a lei. Consoante tem sido assinalado pela jurisprudência deste Supremo Tribunal, neste tipo de recurso, não está em causa a reapreciação da bondade da decisão (da aplicação do direito ao caso) proferida no acórdão recorrido (já transitado em julgado), mas tão só verificar, partindo de factualidade equivalente, se a posição tomada no acórdão recorrido, quanto a certa questão de direito, seria a que o mesmo julgador tomaria, se tivesse que decidir no mesmo momento essa questão, no acórdão fundamento, e vice-versa. Como tal, «Sendo propósito primordial do recurso a definição de uma interpretação, tendencialmente normativa, para uma questão jurídica (e, apenas de modo reflexo, consequencial, a solução do caso concreto cuja decisão formou caso julgado), afastada está a possibilidade de um recurso de objeto complexo, composto por 2, 3…10 questões de direito. Outra solução traduzir-se-ia na solução do caso, aproximando-se assim de um recurso ordinário, numa fase em que, face ao caso julgado, aquele era já inadmissível (Vd. entre outros, os Acórdãos do STJ de 12-01-2023, proc. 11/20.0GAMRA.E1-A.S1, de 12-10-2022, proc. 2113/21.6T9AVR-A.P1-A.S1, de 24-03-2021, proc. 64/15.2IDFUN.L1-A.S1, de 06-01-2021, proc. 112/15.6T9VFR.P1-D.S1, disponíveis em www.dgsi.pt). Destarte, a questão a decidir, deve ser delimitada e única, não podendo desdobrar-se em várias questões, como pretendem os recorrentes. De notar é também que se entende não ser de admissível formular convite ao aperfeiçoamento, seja quanto à apresentação de várias questões em oposição, seja quanto à indicação de mais de um acórdão fundamento, visto tratar-se de um recurso extraordinário e tal aperfeiçoamento não se encontrar expressa e legalmente previsto” Por idênticas razões em tudo que igualmente se aplica aos presentes autos, sem vislumbrarmos fundamentos sérios e robustos que permitam deles divergir, rejeita-se o recurso por falta de preenchimento daqueles pressupostos formais enunciados, ficando consequentemente prejudicada a continuação para apreciação de eventual oposição de julgados. III- DECISÃO 3.1 - Pelo exposto, acordam os juízes nesta Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em: a) Rejeitar o presente recurso extraordinário para fixação de jurisprudência interposto nos termos do disposto no artigo 441.º, n.º 1, do Código de Processo Penal; e b) Condenar cada um dos recorrentes, nas custas, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UC (artigos 513.º, n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Penal e 8.º, n.º 9 e tabela III do Regulamento das Custas Processuais), a que acresce, ao abrigo do disposto no artigo 420.º, n.º 3, do CPP, aplicável ex vi do art.º 448.º do mesmo diploma, a condenação também de cada um deles no pagamento da importância de 5 (cinco) UC. STJ, 28 de Novembro de 2024 (certifica-se que o acórdão foi processado em computador pelo relator e integralmente revisto e assinado eletronicamente pelos seus signatários, nos termos do artigo 94.º, n.ºs 2 e 3 do CPP)
Agostinho Torres- (relator) Jorge Gonçalves (1.º adjunto) Vasques Osório - (2.º adjunto)
__________ 1. https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/-/EB074CDBA14398BD80257E85005599A5↩︎ 2. https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/e268c6ef1aa80fab80258b2300554798?OpenDocument↩︎ 3. Onde se salienta, também: “(…)A corrente largamente maioritária, adotada nos acórdãos de 12/3/2003 (proc. nº 4623/02), de 4/03/2004 (proc. 03P2387), de 4-04-2010 (proc. 242/08.0TTCSC.L1.S1), de 21/03/2013 (proc. 465/07.0TALSD.P1.L1), de 4/07/2013 (proc. nº 712/00.9JFLSB-U.L1-A.S1), de 21/03/2013 (proc. 465/07.0TQLSD.P1-A.S1), de 19/06/2013, o Ac. STJ de 6.3.2014. e de 16/10/2014 (proc. 113/07.8IDMGR.C1-B.S1), vai na linha que acima se expôs. (…)A corrente minoritária é adotada nos acórdãos de 4/11/2010, 3/07/2014 (proc. 1431/11.6PEARVR.C1-A.S1), de 22/10/2014 (proc. 154/11.0PAPNI.L1-A.S1) e de 8/10/2015 (proc. 804/03.2TAALM-B.S1). Contudo, acaba concedendo que que se reconheceu haver oposição relativamente a cada questão de direito tem de, seguidamente, instaurar-se processo separado para apreciação autónoma.↩︎ 4. Pubº no site da Dgsi - https://juris.stj.pt/1028%2F23.8Y2MTS.P1-A.S1/wNg6rM-UbvJBIfhVkkwof0q_rcM?search=pNvxP5jFwfMAjcIP30I↩︎ |