Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | 3ª SECÇÃO | ||
| Relator: | GABRIEL CATARINO | ||
| Descritores: | NULIDADE DE ACÓRDÃO ALTERAÇÃO DE FACTOS | ||
| Data do Acordão: | 05/09/2019 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
| Decisão: | JULGAMENTO ANULADO | ||
| Área Temática: | DIREITO PROCESSUAL PENAL – JULGAMENTO /AUDIÊNCIA / PRODUÇÃO DE PROVA /SENTENÇA / NULIDADE DA SENTENÇA – RECURSOS / RECURSOS ORDINÁRIOS. | ||
| Doutrina: | - António Pereira Madeira, Código de Processo Penal Comentado, 2.ª Edição, Almedina, 2016, p. 1202 e 1299; - Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário de Processo Penal à Luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 2ª edição, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2008, p. 1142. | ||
| Legislação Nacional: | CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGO 358.º, 379.º, N.º 1, ALÍNEA B) E 424.º, N.º 3. | ||
| Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: - DE 04-03-1999, IN CJSTJ, VII, 1, P. 239; - DE 27-01-2009,PROCESSO N.º 08P1962, IN WWW.DGSI.PT; - DE 30-04-2014,PROCESSO N.º 168/11.0GBSVV.C1.S1, IN WWW.DGSI.PT; - DE 21-05-2015, PROCESSO N.º 128/04.8TAVLC.S1, IN WWW.DGSI.PT. -*- ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA: - DE 06-10-2004, IN CJ, XXIX, IV, P. 46. | ||
| Sumário : | I - A alteração da decisão de facto, adquirida pelo tribunal de 1.ª instância, foi operada por iniciativa do tribunal recorrido da relação. Ao contrário do que consta do acórdão recorrido da relação tais alterações não constituem simples reparos ou observações inócuas e dealbadas de alcance e sentido significativo a introdução, modificando, num enunciado fáctico. II - As alterações que se pontuam não podem deixar de produzir um alcance significativo na decisão de facto em que o tribunal se embasa para a apreciação da conduta da arguida, a reclamar e exigir que a sua inclusão na decisão não seja operada sem que sobre a sua versão seja possibilitada uma pronúncia da visada, de modo a poder opor-se-lhe, querendo, ou fornecer a sua própria e pessoal versão sobre aquela concreta realidade subjectiva-intencional. III - A arguida/recorrente tem o direito, porque não foi ela a promover as alterações e as mesmas são susceptíveis de alterar o conspecto volitivo e subjectivo da acção actuada, a pronunciar-se sobre a sua inserção na decisão e pugna por uma outra versão, mediante produção de prova que desestime a convicção a que o tribunal se alcandorou. IV - Coonestando as posições assumidas pelos intervenientes processuais, confirmar-se a existência de uma situação de inobservância de uma formalidade essencial, susceptível de afectar a esfera de defesa da arguida e inquinar o equilíbrio processual e o equitativo direito de pronúncia e de contramina das situações influenciadoras de um processo justo e de uma verdade histórico-processual produzida de acordo com regras de contrariedade e defesa. | ||
| Decisão Texto Integral: |
I. – RELATÓRIO. I.a). – ELEMENTOS PROCESSUAIS RELEVANTES PARA A DECISÃO. (i) – Findo o inquérito, a indagada, AA, foi acusada, por indiciação, da prática, em autoria material, e em concurso efectivo, de (i) um crime de homicídio qualificado previsto e punido pelos artigos 14, nº 1, 26º, 30º, 131º, 132º, nºs 1 e 2, alíneas b), d), e), h) e j); e (ii) um crime de incêndio previsto e punido pelo artigo 272º, nº 1, alínea a) e 213º, nº 1, todos do Código Penal (cfr. fls. 787 a 798, a que se encontra agregada a petição formulada pelo Ministério Público, em representação do Estado Português (fls. 798 a 805)); (ii) – Após realização de instrução, requerida pela arguida, o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo de Instrução Criminal – Juiz 3, decidiu emitir pronúncia contra a arguida pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio qualificado previsto e punido pelo artigo 132, nº 2, alíneas b), h) e j) e um crime de incêndio previsto e punido pelo artigo 272º, nº 1, em concurso aparente com um crime de dano previsto e punido pelo artigo 213º, nº 1, alínea a), do Código Penal – cfr. fls. 1290 a 1309; (iii) Submetido o feito a julgamento, foi ditado veredicto (cfr. fls. 1657 a 1718) em que, pela prática de factos consubstanciadores da autoria material de: (i) um (1) crime de homicídio qualificado, p. e p. pelo art.º 132º, n.ºs 1 e 2, als. b) e j) foi condenada na pena de 16 (dezasseis) anos de prisão; e (ii) na de um (1) crime de incêndio, p. e p. pelo art.º 272º, n.º 1 do C.P. foi condenada na pena de quatro (4) anos e seis meses de prisão. Em cúmulo jurídico de penas foi-lhe imposta a pena única de 17 (dezassete) anos de prisão. Mais foi decidido: - Julgar totalmente procedente, por provado, o pedido de indemnização civil formulado pelo Estado Português, Ministério da Administração interna Comando Metropolitano da P.S.P. de Lisboa e, em consequência, condenar a demandada AA no pagamento de € 240,00 (duzentos e quarenta Euros), acrescidos de juros à taxa legal desde a notificação até integral pagamento; - Julgar parcialmente procedente, por provado o pedido dos Assistentes BB e CC e em consequência condenar a demandada arguida no pagamento da quantia de € 56.500,00 (cinquenta e seis mil e quinhentos Euros) a titulo de danos não patrimoniais, quantia acrescida de juros á taxa legal desde a data da prolação do acórdão até integral pagamento; - Condenar a demandada arguida no pagamento aos mesmos Assistentes da quantia de € 2.400,00 a título de danos patrimoniais, acrescida de juros vencidos e vincendos desde a notificação da arguida até efectivo e integral pagamento. - Julgar parcialmente procedente, por provado, o pedido de indemnização civil formulado por DD e ... e condenada a demandada arguida a pagar-lhes a quantia de € 9.333,29 (nove mil trezentos e trinta e três euros e vinte e nove cêntimos), acrescida de juros vencidos e vincendos desde 24 de Dezembro de 2016 até afectivo e integral pagamento; (iv) Interpostos recursos da decisão referida no item antecedente (fls. 1744 a 1761, dos assistentes/demandantes cíveis, BB e CC e fls. 1768 vº a 1790, da arguida AA), veio, após a realização de audiência de julgamento (fls. 1891), a ser proferida decisão (cfr. fls. 1892 a 1994), em que se decretou (sic) “1. Rejeitar, por inadmissível, o recurso interposto pela arguida AA quanto ao pedido cível formulado pelo M.º P.º em representação do Estado Português; 2. Apesar das apontadas inserções factuais referidas no ponto 1.4. supra, negar provimento ao recurso interposto pela arguida AA; 2. Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelos assistentes/demandantes BB e CC, alterando os montantes indemnizatórios fixados relativos aos danos não patrimoniais fixando, respectivamente: 2.1. A favor de cada um dos demandantes o montante de €25.000 (vinte e cinco mil euros) por danos não patrimoniais sofridos pelos próprios demandantes; 2.2. A favor de ambos o montante de € 20.000 (vinte mil euros) pelos danos não patrimoniais sofridos pela vítima; 3. Confirmar no demais o acórdão recorrido.”; Irresignada com o julgado, alavanca, a arguida, recurso (fls. 2018 a 2040), para o que dessume o epítome conclusivo que a seguir queda extractado. I.b). – QUADRO CONCLUSIVO. CONCLUSÕES. “1º O acórdão recorrido é nulo por ter introduzido modificações na matéria de facto provada sem, obedecendo ao princípio do contraditório, conceder à arguida recorrente a oportunidade de se pronunciar. 2º Não se procedeu a nenhuma prévia comunicação, tendo-se conhecido de questões de que não se podia tomar conhecimento. 3º A norma constante da alínea c) do n° 1 do artigo 379º do CPP, aplicável por remissão do n° 4 do seu artigo 425º, é inconstitucional se interpretada no sentido de que o tribunal de segunda instância poderia modificar a matéria de facto provada sem facultar à recorrente a possibilidade de se pronunciar sobre a matéria, visto ofender-se o princípio do contraditório subjacente à garantia de um processo equitativo, assegurado pelo nº 4 do artigo 20º e pelos nºs 1 e 5 do artigo 32º da lei fundamental. 4º O acórdão recorrido deveria ter reconhecido as insuficiências da sentença proferida em primeira instância, que foi lida sem a presença de todos os membros do tribunal, para além de não proceder à identificação da arguida, dos assistentes e das partes civis, sem nada decidir quanto a custas civis. 5º Contrariamente ao que se declara no acórdão recorrido, a sentença proferida em primeira instância enferma realmente de omissão de pronúncia, pois nada decide quanto à invocada proibição de prova que atingiria a avaliação psicológica que sendo considerada como prova lícita, implicaria adesão às respectivas conclusões ou divergência fundamentada, por se tratar de prova pericial. 6º O apreendido constitui prova proibida, por não se ter elaborado auto mencionando a impossibilidade de o juntar ao processo e a identidade do responsável pelo mesmo. 7º A matéria de facto provada não permite a integração no tipo de homicídio qualificado, sendo subsumível ao homicídio a pedido da vítima ou na ajuda ao suicídio. 8º O acórdão recorrido deveria ter admitido que se impunha ordenar oficiosamente a perícia de reconhecimento do ritmo de digitação do teclado, por forma a determinar quem fez as pesquisas na Internet, sempre com submissão à contraditoriedade e ao exame em audiência. 9º Da matéria de facto provada nada se conclui quanto à autoria do crime de incêndio. 10º O tribunal recorrido deveria ter declarado a nulidade da sentença por falta de fundamentação, já que esta não explica cabalmente a fixação das penas. 11º A arguida deveria ter sido absolvida do crime de incêndio e condenada a pena suspensa de um mês de prisão, por homicídio a pedido da vítima ou, caso assim não se entendesse, a doze anos de prisão, resultante do cúmulo das penas parcelares de três e doze anos. 12º Os pedidos de indemnização devem improceder, visto que a demandada não cometeu o crime de incêndio e o ofendido concorreu para o trágico resultado. 13º A contradição insanável da fundamentação deveria ter sido reconhecida pelo acórdão recorrido, pois deu-se como provado que o imóvel tem uma dona e simultaneamente que há proprietários do mesmo, além de que a demandada é condenada a pagar uma indemnização a Songhai Yu apenas mencionado no dispositivo da sentença. 14º Há omissão de pronúncia na decisão recorrida, por nada se decidir quanto às arguidas inconstitucionalidades. 15º Quando interpretadas no sentido de que é aplicável a pena de homicídio qualificado nos casos em que o ofendido concorda num projeto de suicídio coletivo, são inconstitucionais as normas contidas no artigo 131º, no nº 1 e nas alíneas b) e j) do nº 2 do artigo 132º do código penal, por ofensa aos nºs 1 e 2 do artigo 27º, ao nº 1 do artigo 29º e ao n° 1 do artigo 30º da lei fundamental. 16º Por contrárias ao nº 1 do artigo 32º da constituição, são dela violadoras as normas ínsitas no artigo 127º e nos nºs 1 e 2 do artigo 163º do CPP, se interpretadas no sentido de que o tribunal pode não dar relevo a uma avaliação psicológica sem a declarar como prova proibida. 17º Por violação dos nºs 1 e 2 do artigo 27º, do n° 1 do artigo 32º e do n° 1 do artigo 205º da lei fundamental, é inconstitucional a norma constante do n° 3 do artigo 71º do código penal, se interpretada no sentido de que o tribunal cumpre o dever de expressamente referir os fundamentos da medida da pena, quando a sentença omite a alusão a algumas das circunstâncias mencionadas no n° 2 do artigo 71º do código penal. 18º Normas jurídicas violadas: - Do Código penal: - artigo 26º; - artigo 43º; - artigo 50º; - artigo 58º; - nºs 1, 2 e 3 do artigo 71º; - artigo 131º; - n° 1 e alíneas b) e j) do n° 2 do artigo 132º; - artigo 134º; - artigo 135º; - n° 1 do artigo 272º; - Do Código de Processo Penal: - n° 2 do artigo 14º; - n° 5 do artigo 97º; - alínea e) do artigo 119º; - n° 1 do artigo 124º; - artigo 125º; - artigo 126º; - artigo 127º; - artigo 151º; - artigo 157º; - artigo 163º; - artigo 327º; - nºs 1 e 4 do artigo 339º; - n° 1 do artigo 340º; - artigo 355º; - artigo 358º; - artigo 359º; - artigo 368º -artigo 369º; - n° 3 do artigo 372º; - alíneas a) e b) do n° 1, n° 2 e n° 4 do artigo 374º; -alíneas b) e c) do n° 1 do artigo 379º n° 4 do artigo 425º; - Da Constituição: - n° 4 do artigo 20º; - nºs 1 e 2 do artigo 27º; - n° 1 do artigo 29º; - n° 1 do artigo 30º; -nºs 1 e 5 do artigo 32º; -nº 1 do artigo 205º. 19º Normas jurídicas que devem ser aplicadas: - artigo 43º, artigo 50º, artigo 58º, n° 3 do artigo 71º, artigo 134º e artigo 135º do Código Penal; - nº 5 do artigo 97º, artigo 126°, artigo 163º, n° 3 do artigo 372º, alíneas a) e b) do nº 1, nº 2 e nº 4 do artigo 374º do Código de Processo Penal. 20º Termos em que deve ser dado provimento ao recurso e o acórdão recorrido ser declarado nulo ou, caso assim não se entenda, ser a arguida condenada por homicídio a pedido da vítima ou por ajuda ao suicídio e absolvida do crime de incêndio, absolvendo-se ainda a arguida dos pedidos de indemnização.” Em resposta, o Ministério Público, junto do Tribunal da Relação, admite que: “1.ª - O douto acórdão recorrido, proferido após audiência, é nulo por violação do disposto no art. 424º, nº 3 do CPP e por força do estipulado nos arts. 425.º, nº 4 e 379º, nº 1, al b) do CPP; mas que, 2.ª - Em todo o caso, sempre se dirá, quanto às restantes questões suscitadas, que o STJ, conhecendo apenas sobre a matéria de direito, não pode conhecer das questões sobre a matéria de facto suscitadas no recurso, excepto se oficiosamente entender fazê-lo nos termos do art.° 410º, nº 2 do CPP; 3.ª- O acórdão da 1.ª instância não é (nem pode ser) objecto deste recurso, pelo que as eventuais "irregularidades" do mesmo não podem ser aqui conhecidas, e, quanto às restantes questões suscitadas (prova proibida, prova que deveria ter sido feita, autoria do incêndio - e esta é matéria de facto), porque foram sabiamente decididas pelo venerando tribunal a quo, torna irrelevante qualquer comentário a acrescer aos fundamentos ali expendidos.” Dispõe o artigo 400.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, sob epígrafe “Decisões que não admitem recurso” que “[O] recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil só é admissível desde que o valor do pedido seja superior à alçada do tribunal recorrido e a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade desta alçada” (destaque nosso). Este preceito reproduz, assim, para o Código de Processo Penal a regra básica de recorribilidade em matéria cível, constante do artigo 629.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, o qual dispõe o seguinte: “O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa” (destaque nosso). Nos termos do artigo 296.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, sob epígrafe “Atribuição de valor à causa e sua influência” (aplicável ex vi art. 4.º do CPP), “[a] toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido”. Da conjugação dos artigos 297.º, n.º 1, (“Critérios gerais para a fixação do valor”) e 299.º, n.º 1, (“Momento a que se atende para a determinação do valor”) do Código de Processo Civil (também aplicáveis ex vi art. 4.º do CPP), é possível concluir que o valor da presente causa é de 70.620.79 €, correspondendo este ao valor do pedido de indemnização formulado pelos ora Demandantes a título de danos emergentes e lucros cessantes (cfr. art. 73.º e pág. 16 do Pedido de Indemnização Cível). Por sua vez, no que respeita aos valores das alçadas dos Tribunais, dispõe o artigo 44.º, n.º 1, da Lei da Organização do Sistema Judiciário[1] que “[e]m matéria cível, a alçada dos tribunais da Relação é de (euro) 30 000,00 e a dos tribunais de primeira instância é de (euro) 5 000,00” (destaque nosso). Ora, Tendo o Tribunal de 1.ª Instância julgado parcialmente procedente o pedido de indemnização cível formulado pelos ora Demandantes, condenado a Arguida a pagar-lhes a quantia de 9.333,29 € (acrescida de juros de mora, a contar desde 24 de dezembro de 2016 até integral pagamento) (pág. 63 do Acórdão de 1.ª Instância), Decisão esta que foi confirmada pelo Acórdão recorrido (cfr. pág. 102 do Acórdão recorrido), É possível concluir que a decisão impugnada é desfavorável para a Arguida nesse mesmo montante (9.333,29 €), correspondendo este seu valor de sucumbência. Sendo este valor inferior a metade da alçada do Tribunal recorrido, ou seja, a 15.000,00 €, deve o presente recurso ser considerado inadmissível na parte relativa ao pedido de indemnização cível formulado pelos ora Demandantes e, consequentemente, rejeitado / não apreciado pelo Supremo Tribunal de Justiça, nos termos e para os efeitos dos artigos 400.º, n.º 2, 414.º, n.º 2, e 420.º, n.º 1, alínea b), todos do Código de Processo Penal. Caso assim não se entenda, o que não se concede: Nos termos do artigo 671.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, “[s]em prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância (...)” (destaque nosso). Esta norma é subsidiariamente aplicável aos pedidos de indemnização civis julgados no processo penal, por força do disposto no artigo 4.º do Código de Processo Penal, conforme resulta de doutrina e jurisprudência (proferida pelos tribunais superiores) maioritárias quanto a esta matéria. A este propósito, cita-se, pela clareza das palavras, estrutura de raciocínio e contextualização histórica, o muito douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30.04.2014 [2], citado pelo Acórdão deste mesmo Tribunal de 21.05.2015 [3], no qual se pode ler o seguinte: No domínio da versão do CPP anterior à resultante da Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto, o Supremo Tribunal de Justiça, através do acórdão nº 1/2002, publicado no DR, I série, de 21/05/2002, fixou a seguinte jurisprudência: «No regime do Código de Processo Penal vigente – nº 2 do artigo 400º, na versão da Lei nº 59/98, de 25 de Agosto – não cabe recurso ordinário da decisão final do tribunal da Relação, relativa à indemnização civil, se for irrecorrível a correspondente acção penal». Negava, pois, esta jurisprudência que o critério de admissibilidade de recurso dos acórdãos proferidos em recurso pelas relações relativamente à acção civil de indemnização instaurada no processo penal fosse o mesmo que vigorava no processo civil: valor do pedido superior à alçada da Relação e valor da sucumbência superior a metade dessa alçada. A Lei nº 48/2007 acrescentou um nº 3 ao artº 400º do CPP, com o seguinte texto: «Mesmo que não seja admissível recurso quanto à matéria penal, pode ser interposto recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil». Com esta norma quis-se claramente afirmar solução oposta àquela a que chegou o referido acórdão de fixação de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, estabelecendo-se sem margem para dúvidas, ao que se julga, que as possibilidades de recurso relativamente ao pedido de indemnização são as mesmas, seja o pedido deduzido no processo penal ou em processo civil. É nesse sentido inequívoca a afirmação com que na Exposição de Motivos da Proposta de Lei nº 109/X se justificou a disposição: «Para garantir o respeito pela igualdade, admite-se a interposição de recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil mesmo nas situações em que não caiba recurso da matéria penal». Se o legislador do CPP quis consagrar a solução de serem as mesmas as possibilidades de recurso, quanto à indemnização civil, no processo penal e em processo civil, há que daí tirar as devidas consequências, concluindo-se que uma norma processual civil, como a do nº 3 do artº 671º do CPC, que condiciona, nesta matéria, o recurso dos acórdãos da Relação, nada se dizendo sobre o assunto no CPP, é aplicável ao processo penal, havendo neste, em relação a ela, caso omisso. Até porque o legislador do CPP, na versão da Lei nº 48/2007, afirmou a igualdade de oportunidades de recurso em processo civil e em processo penal, no que se refere ao pedido de indemnização, numa altura em que já fora publicado o DL nº 303/2007, que introduzia no processo civil norma correspondente – o nº 3 do artº 721º do anterior CPC – à do nº 3 do artº 671º do actual CPC. Por outro lado, a aplicação do nº 3 desse artº 671º ao pedido de indemnização civil deduzido no processo penal não cria qualquer desarmonia com as normas do processo penal. Não existe, efectivamente, razão para que em relação a duas acções civis idênticas haja diferentes graus de recurso apenas em função da natureza civil ou penal do processo usado, quando é certo que neste último caso a acção civil conserva a sua autonomia. Pode mesmo dizer-se que outro entendimento que não o aqui defendido conduziria ao inquinamento da decisão a tomar pelo lesado nos casos em que a lei lhe permite deduzir em separado, perante os tribunais civis, o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime. Pense-se, por exemplo, no caso de danos ocasionados pela prática de um crime de ofensa à integridade física por negligência da previsão do artº 148º, nº 3, do CP, em que o pedido de indemnização tanto pode ser formulado em processo civil como no processo penal, nos termos do artº 72º, nº 1, alínea c), do CPP. A opção pelo processo civil estaria clara e injustificadamente condicionada, se a norma limitativa do nº 3 do artº 671º do CPC não se aplicasse ao pedido deduzido no processo penal” Nas palavras de António Pereira Madeira [[4]]: “Por força do disposto no artigo 4.º do CPP, e uma vez que a ação civil se autonomiza dos destinos da causa penal, importa ter em conta que a admissibilidade de recurso não está condicionada apenas pelas circunstâncias do n.º 2 do artigo 400.º. A pretendida igualação com o regime de recursos da ação civil importa, com efeito, que os casos de inadmissibilidade previstos no artigo 721.º o Código de Processo Civil na redação do DL 303/2007, de 24 de agosto (que corresponde ao atual 671.º do CPC 2013), nomeadamente o de «dupla conforme», previsto no n.º 3, sejam aqui aplicáveis” (destaque nosso). Tendo o Acórdão da relação confirmado, sem voto de vencido (cfr. pág. 102 do Acórdão recorrido) e sem fundamentação essencialmente diferente (cfr. págs. 92 e 94 do Acórdão recorrido), a decisão proferida pelo Tribunal 1.ª Instância quanto ao pedido de indemnização cível deduzido pelos ora Demandantes (cfr. págs. 58 a 61 e 63 do Acórdão de 1.ª Instância), Não se admite, nesta parte, recurso de revista, devendo o mesmo ser rejeitado/não apreciado pelo Supremo Tribunal de Justiça, nos termos e para os efeitos do artigo 671.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (aplicável ex vi art. 4.º do CPP), conjugado com os artigos 414.º, n.º 2 e 420.º, n.º 1, alínea b), ambos do Código de Processo Penal. Em face do exposto, conclui-se, assim, Que o Acórdão recorrido, na parte em que confirma a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª de Instância quanto ao pedido de indemnização formulado pelos ora Demandantes, já transitou em julgado (cfr. art. 628.º do CPC, aplicável ex vi art. 4.º do CPP), com todos os efeitos inerentes (cfr. art. 619.º do CPC, aplicável ex vi art. 4.º do CPP). Como tal, não pode a Arguida, numa tentativa de violação das regras de recorribilidade aplicáveis, tentar “arrastar” para o recurso penal (o qual é admissível in casu) aspetos relacionados com aquele pedido, tendo em vista a sua admissibilidade. Caso assim não se entenda, o que não se admite: A motivação de um recurso – e respetivas conclusões – constituem elementos estruturantes do mesmo, com vista ao seu adequado conhecimento. Daí que o artigo 412.º do Código de Processo Penal, sob epígrafe “Motivação do recurso e conclusões”, disponha o seguinte: “1 – A motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. 2 – Versando matéria de direito, as conclusões indicam ainda: a) As normas jurídicas violadas; b) O sentido em que, no entendimento do recorrente, o tribunal recorrido interpretou cada norma ou com que a aplicou e o sentido em que ela devia ter sido interpretada ou com que devia ter sido aplicada; e c) Em caso de erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, deve ser aplicada. 3 – Quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; c) As provas que devem ser renovadas” (destaque nosso). Como bem nota António Pereira Madeira [[5]], “sendo a motivação o alicerce de todo o procedimento do recurso, convirá que esta peça seja criativa, original e assente nas circunstâncias concretas daquele processo e daquele recurso e não de outro” (destaque nosso). Nas palavras deste mesmo Autor: “É pois, processualmente descabido repetir ipsis verbis no recurso para o Supremo, apenas e só a mesma fundamentação com que foi entendido atacar a decisão de 1.ª instância. Por muito que os problemas permaneçam idênticos num e noutro caso, não é seguramente o caso do tratamento dado pelo tribunal de recurso àquelas questões. Nalguns casos, a mera repetição porque descabida, pode ocasionar mesmo a ausência de fundamentação, com as consequências inerentes (cfr. artigo 414º, nº 2). E mesmo quando se mantenham em discussão exatamente as mesmas questões, não pode ter-se como atuação elegante por banda do recorrente e desconsideração ostensiva da decisão de um tribunal superior entretanto proferida” [[6]]. No mesmo sentido aponta o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27.01.2009 [[7]], o qual, a propósito de recursos apresentados no âmbito do mesmo processo, sequencial e hierarquicamente, decidiu o seguinte: Em face do exposto, conclui-se, assim, que a falta de motivação para efeitos de admissibilidade do recurso abrange não apenas uma total omissão de motivação, como também a falta de uma “verdadeira motivação”. Semelhante raciocínio pode ser aplicável quanto às conclusões de recurso. Quanto a estas, dispõe o artigo 417.º, n.º 3 do Código de Processo Penal o seguinte: “Se a motivação do recurso não contiver conclusões ou destas não for possível deduzir total ou parcialmente as indicações previstas nos n.ºs 2 a 5 do artigo 412.º, o relator convida o recorrente a apresentar, completar ou esclarecer as conclusões formuladas, no prazo de 10 dias, sob pena de o recurso ser rejeitado ou não ser conhecido na parte afectada” (destaque nosso). Assim, ao contrário do que acontece com a falta de motivação, a falta de concisão das conclusões não é motivo de imediata rejeição do recurso, mas antes de um convite ao aperfeiçoamento das conclusões apresentadas. Como bem nota Paulo Pinto de Albuquerque [[8]], “[a] falta de concisão das conclusões também ocorre quando se apresenta, como conclusões, uma cópia quase integral do texto da motivação, com pequeníssimas e irrelevantes diferenças de pormenor” [[9]] (destaque nosso), Ou quando, na mesma lógica, se apresenta como conclusões uma “cópia quase integral do texto” de outras conclusões formuladas em recurso anterior no mesmo processo. Descendo ao caso dos presentes autos: Ao compararmos a motivação do recurso (e respetivas conclusões) interposto pela Arguida para o Tribunal da Relação de Lisboa (cfr. págs. 37 e 40 do Recurso interposto para o TRL) com a motivação do recurso (e respetivas conclusões) objeto da presente resposta (cfr. págs. 16, 17 e 20 do Recurso interposto para o STJ, objeto da presente resposta) no que ao pedido de indemnização formulado pelos ora Demandantes diz respeito, Percebemos que a(s) última(s) se traduz(em) num (quase autêntico) “copy paste” da(s) primeira(s), O que nos leva a concluir, pelos motivos expostos, que inexiste uma verdadeira motivação (e respetivas conclusões). Por este motivo, deve o recurso interposto pela Arguida ser rejeitado/não apreciado pelo Supremo Tribunal de Justiça, nos termos e para os efeitos dos artigos 412.º, n.ºs 1 e 2, 414.º, n.º 2 e 420.º, n.º 1, alínea b), todos do Código de Processo Penal, Ou, quanto muito, no que às conclusões diz respeito, deve ser formulado um convite ao seu aperfeiçoamento, nos termos e para os efeitos do artigo 417.º, n.º 3 do mesmo diploma legal. Caso assim não se entenda – o que não se admite –, e tendo em conta que a motivação da Arguida é a mesma do seu recurso anterior, Dão-se aqui por integralmente reproduzidos todos os fundamentos constantes da resposta ao recurso interposto pela Arguida para o Tribunal da Relação de Lisboa, Subscrevendo-se, ainda, na íntegra, todo o conteúdo do Acórdão recorrido, o qual, de forma muito clara, certeira e sintética, decidiu, no que ao pedido de indemnização formulado pelos ora Demandantes diz respeito (e contrariamente ao alegado pela Arguida) o seguinte: Termos em que se requer, muito respeitosamente, a V. Exas. se dignem rejeitar/não apreciar o recurso interposto pela Arguida quanto ao pedido de indemnização formulado pelos ora Demandantes, na medida em que: (i) a decisão impugnada é desfavorável para a Arguida em valor inferior a metade da alçada do tribunal recorrido (9.333,29 € < 15.000,00 €) (cfr. arts. 400.º, n.º 2, 414.º, n.º 2 e 420.º, n.º 1, alínea b), todos do CPP); (ii) o Acórdão recorrido confirmou, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância quanto àquele pedido (cfr. art. 671.º, n.º 3 do CPC, aplicável ex vi art. 4.º do CPP, conjugado com os arts. 414.º, n.º 2 e 420.º, n.º 1, alínea b), ambos do CPP); e (iii) não existe uma verdadeira motivação (nem respetivas conclusões) (cfr. arts. 412.º, n.ºs 1 e 2, 414.º, n.º 2, 417.º, n.º 3 e 420.º, n.º 1, alínea b), todos do CPP).” [[10]] Neste Supremo Tribunal de Justiça, o Ministério Público, é de parecer que (sic): “A. Por acórdão proferido em 11 de Setembro de 2018, pela 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa, foi, no essencial, confirmada a condenação penal da arguida - AA - pela prática em autoria material e em concurso efectivo de: • Um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelo arts. 131º, 132º, n º s 1 e 2, alíneas b) e j), na pena de 16 anos de prisão; • Um crime de incêndio, p. e p. pelo art. 272, n º 1, do CP, na pena de 4 anos e seis meses de prisão; • Na pena única de 17 anos de prisão. A. Inconformada, traz agora a arguida recurso a este Alto Tribunal, concluindo pela forma documentada a págs. 2014v-2016. B. O MP na 2ª instância apresentou resposta a págs. 2048-2050, anotando, ao demais, que alteração do facto provado sob o n º 32, no âmbito do recurso da matéria de facto e na sequência de audiência, foi consubstanciada sem que a recorrente fosse dela notificado. - cf. Acta de págs.1891. Concluiu, assim, que o «acórdão recorrido, proferido após audiência, é nulo por violação do disposto no artº. 424º, n º 3, do CPP e por força do estipulado nos arts. 425º, n º 4 e 379º, n º 1, alínea b), do CPP». C. O acórdão sub censura como melhor resulta da sua análise, começa por analisar um conjunto de questões suscitadas no recurso, que denomina de formais, que devemos desde já aqui dizer, cujas decisões, merecem a nossa inteira adesão. Todavia a págs.1789v, o arguido «veio requerer a realização de audiência», a fim de debater vários pontos que indica de seguida, começando pela nulidade da sentença. Com efeito, a defesa persiste no recurso que interpôs da decisão proferida sobre a matéria de facto, em lograr alterar aos factos provados sobre os nºs 22; 23; 24; e 32, vide págs.196, alteração que permitiria subsumir o crime cometido pela recorrente tão só ao crime de homicídio a pedido da vítima, p. e p. pelo art. 134º do CP. Ora, a leitura da nova redacção da matéria de facto introduzida pela Relação, que vai no sentido contrário ao pretendido pela recorrente, foi efectuada sem que contudo se tenha cumprido o art. 424º (deliberação) nº 3 do CPP, que preceitua: “Sempre que se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na decisão recorrida ou da respectiva qualificação jurídica não conhecida do arguido, este é notificado para, querendo, se pronunciar no prazo de 10 dias”. Afigura-se-nos, também, que o Tribunal da Relação ao proceder em sede de apreciação do recurso de impugnação da decisão da matéria de facto, à modificação da factualidade provada sobre os nºs 22; 23; 24 e 32, não deu cumprimento ao disposto nos artigos 424º, n º 3 e 358º do CPP, pelo que se entende que o acórdão se mostra ferido da nulidade da «sentença», prevista no art. 379º, n º 1, alínea b), do CPP. (vide acta de págs. 1891). Na procedência de tal nulidade da sentença, devem os autos baixar á 2ª instância, para reabertura da audiência e cumprimento do formalismo legal omitido, seguindo-se os ulteriores trâmites, com o que fica, por ora, precludido, o conhecimento das demais questões objecto do recurso.” O parecer do Ministério Público mereceu resposta da arguida, nos termos exarados no texto que a seguir se deixa transcrito (sic): “Afigura-se que, realmente, o acórdão recorrido é nulo, conforme invocado pela arguida na motivação de recurso, na resposta à mesma apresentada pelo Ministério Público ainda na Relação de Lisboa e no douto parecer do Digno Procurador-Geral-Adjunto junto da instância em que se impugna a decisão, a que agora se responde. Com efeito, não foi observado o dever imposto pelo nº 3 do artigo 424º do CPP, segundo o qual o arguido é notificado para se pronunciar, querendo, no prazo de dez dias, quando se verificar uma alteração dos factos descritos na decisão recorrida. A preterição desta formalidade, destinada a assegurar o contraditório, acarreta nulidade, conforme resulta das seguintes normas constantes do mesmo compêndio normativo: - alínea b) do n° 1 do artigo 379°; - n° 4 do artigo 424º. Não pode valer, produzir efeitos, uma decisão que seja proferida sem que a arguida tenha a oportunidade de se defender.” I.c). – QUESTÕES A MERECER APRECIAÇÃO. A pretensão recursiva da demandante convoca, para cabal apreciação, as sequentes questões: (a) – Nulidade da sentença por inobservância do disposto do artigo 358º nº 3 do artigo 424º, ex vi e nº1, alínea c) do artigo 379º, ex vi do artigo 425º, nº 4, todos do Código de Processo Penal; do Código de Processo Penal; (b) – Admissibilidade do recurso quanto à condenação cível decretada a favor dos demandantes cíveis, DD e EE – questão suscitada pelos demandantes cíveis na resposta de fls. 2054 a 2065; A recorrente repristina um séquito de questões que havia encarreirado no recurso para o Tribunal da Relação e que, nesta sede pretende recavar como temas a reapreciar e que se consubstanciam em desvios de forma da sentença e com questões de actividade probatória desatendidas no acórdão recorrido, a saber: (a) erros materiais de escrita; (b) identificação da arguida; (c) identificação das partes civis; (d) condenação em custas cíveis; (e) leitura da sentença (tão só pela presidente do colectivo); (f) nulidade da sentença por omissão de pronúncia - al. c) do n.º 1 do art.º 379º CPP; (g) se as apreensões são prova proibida; (h) impugnação da matéria de facto provada; (i) se houve violação do art.º 340º CPP por não efectivação de perícia; (j) se os factos preenchem o tipo legal do crime de homicídio a pedido da vitima do art.º 135º ou de ajuda ao suicídio do art.º 134º CP; (k) se as penas se mostram não fundamentadas e exageradas. [[11]] As demais questões – concernentes aos pedidos cíveis – recamam, no essencial e no que convocam em apreciação recursiva, as questões que já haviam enformado o recurso para o Tribunal da Relação. [[12]] (A decantada questão de inadmissibilidade do recurso interposto da condenação (mantida) da acção cível agregada não será objecto de conhecimento pela prejudicialidade que se antolha à procedência da nulidade da decisão recorrida). II. – FUNDAMENTAÇÃO. II.A). – DE FACTO. O tribunal de recurso estimou estar comprovada a factualidade que a seguir queda extractada. [[13]] “1. A arguida AA e FF de 34 anos conheceram-se em Novembro de 2011 quando ambos frequentavam o mestrado “Realização para Cinema e Televisão”, na Escola Superior Artística do ... e iniciaram um relacionamento amoroso que se manteve até 23 de Dezembro de 2016. 2. FF veio a revelar-se ao longo do tempo como uma pessoa emocionalmente instável, de trato difícil. 3. A ideia do suicídio do FF era um tema recorrente entre o casal 4. Chegando o FF a falar em suicídio conjunto. 5. A arguida AA e FF nunca tiveram residência comum, sendo que a arguida residia habitualmente em ... e FF com os pais em .... 6. FF não exercia qualquer profissão remunerada, nem por conta de outrem, nem individualmente e nem exercia qualquer atividade donde obtivesse proventos económicos, vivendo à custa dos pais que o alimentavam, vestiam e lhe davam semanalmente a quantia de 70€. 7. A arguida AA é licenciada em ..., iniciou a sua vida profissional em 2006, dando aulas como professora substituta em várias escolas, funções que cessou em 30.07.2012, no Agrupamento de Escolas ..., em ..., passando desde então a dar explicações. 8. No dia 30 de Junho de 2014, a arguida na qualidade de inquilina celebrou um contrato de arrendamento habitacional da fração... andar, do prédio sito no nº ..., na freguesia do ..., em Lisboa, com o senhorio EE, ident. a fls. 268 com início a 1.07.2017, pelo prazo de um ano e pela renda anual de €9.000,00 correspondente a um montante mensal de 750€. 10. A arguida AA pagou por transferência bancária e exclusivamente a expensas suas, o montante de 9.000€ (nove mil euros), correspondente ao valor global anual das rendas. 10. A arguida AA viria a renovar por várias vezes este contrato, sendo a última em Junho de 2016 até Janeiro de 2017, tendo procedido sempre ao pagamento antecipado do valor global das rendas. 11. Desde então, a arguida AA e FF passaram a pernoitar nesta casa nas várias vezes que se deslocavam a Lisboa e, nomeadamente, em dois fins de semana por mês. 12. Nessas alturas era a arguida AA quem suportava as despesas de alimentação e de transporte para e de circulação em .... 13. A arguida AA e FF entre 2014 a 2016 fizeram várias viagens ao estrangeiro (Itália, Suíça, Alemanha) sendo as despesas de transporte e de alojamento integralmente suportadas pela arguida. 14. A arguida queria casar com o FF e adquiriu alianças duplas com inscrição dos nomes e da data em que começaram a namorar. 15. Em momento não determinado da relação a arguida AA e FF foram construindo e transmitindo uma história de vida aos familiares do FF que não correspondia à realidade, nomeadamente que a arguida estava a dar aulas em Lisboa, que estava grávida do FF, que iriam casar e que fixariam residência em ... e que o FF tinha arranjado trabalho na escola onde a arguida dava aulas em Lisboa. 16. Em 27 de Outubro de 2015, a arguida e o FF chegaram a ir à Conservatória do Registo Civil de ... tratar do processo de casamento, mas deixaram caducar o Processo Preliminar de publicações nº 8811/2015 que era válido até 27 de abril de 2016, não mais o renovando, por desistência do FF. 17. Quer a arguida quer o FF convencerem os pais e a irmã deste que iriam casar, inventando datas para a celebração do casamento, datas essas que iam sucessivamente adiando, sendo a última fixada em 25 de Dezembro de 2016 e o local em .... 18. Em Julho de 2016, a arguida AA telefonou à irmã do FF e disse-lhe que estava grávida do irmão e que o bebé iria nascer no princípio do mês de Setembro. 19. Porém, à medida que o tempo passava e o parto não se concretizava e era confrontada pela irmã do FF, a arguida inventava desculpas para o adiamento do parto, mantendo, ainda, no dia 22 de Dezembro de 2016, por telefone, a versão da gravidez e mais uma vez o adiamento do parto. 20. No dia 23 de Dezembro de 2016, pelas 10h, o FF apanhou o comboio em ... com destino Lisboa, encontrando-se com a arguida em ..., estando os pais do FF convencidos que eles iriam casar no dia 25 de Dezembro de 2016, em ..., conforme lhes tinha sido transmitido no início de Dezembro de 2016 pelo FF. 21. FF tinha igualmente convencido os pais que em Janeiro de 2017 iria começar a trabalhar na escola onde a arguida dava aulas. Assim convencidos e sem que desconfiassem destas mentiras, os pais do FF deram-lhe 2100€ (dois mil e cem euros) para ajudar com as despesas do casamento. 22. Bem sabendo a arguida AA que a encenação criada à volta do seu emprego, do emprego de FF, do casamento, da gravidez, não poderia manter-se por mais tempo e começando a ficar desesperada na sua relação com o FF começou a planear forma de se livrar de FF, pondo-lhe termo à vida e assim libertar-se de todos os seus problemas, aproveitando a ideia deste se querer suicidar. (“22. Bem sabendo a arguida AA que a encenação criada à volta do seu emprego, do emprego de FF, do casamento, da gravidez, não poderia manter-se por mais tempo e começando a ficar desesperada na sua relação com o FF, pelo menos a 16 de Dezembro de 2016, começou a planear forma de se livrar de FF, pondo-lhe termo à vida e assim libertar-se de todos os seus problemas, aproveitando a ideia deste se querer suicidar.” – redacção conferida pela decisão/reapreciação da prova aduzida pelo colectivo no tribunal de recurso – fls. 1961). 23. O falecido tinha concordado no projecto de suicídio coletivo para aquela altura no que a arguida anuiu daí o jantar no ... (“23. O falecido tinha falado, em data e momento circunstancial anterior não apurados, em projecto de suicídio coletivo para aquela altura no que a arguida anuiu; daí o jantar no Ritz.” - redacção conferida pela decisão/reapreciação da prova aduzida pelo colectivo no tribunal de recurso – fls. 1961): 24. Porém a arguida já tinha decidido não morrer. (“24. Porém, neste jantar, a arguida já tinha decidido não morrer.” - redacção conferida pela decisão/reapreciação da prova aduzida pelo colectivo no tribunal de recurso – fls. 1961) 25. Tendo em momentos anteriores, não concretamente apurados, o FF falado em “gelo seco” e em monóxido de carbono, como uma das melhores maneiras de morrer sem sangue e sem dor a propósito da ideia de suicídio coletivo, a arguida AA começou a pesquisar na internet as características e efeitos desse produto, ficando ciente das consequências da libertação do dióxido de carbono e do sério risco de asfixia para os seres humanos aquando da sua inalação e também a pesquisar empresas que o vendessem. 26. Assim, no dia 17 de Dezembro de 2016, a arguida contactou telefonicamente a firma “...” que se dedica ao comércio e distribuição de gás e material de soldadura e de “gelo seco” perguntando se vendiam gelo seco, qual o tempo de demora entre a encomenda e a entrega, a forma de embalagem, o tamanho das caixas de embalagem e o grau de pureza do gelo. 27. No dia 22 de Dezembro de 2016, a arguida AA, cerca das 13h11m telefonou novamente para a firma “...” encomendando a quantia de 35 Kg de gelo seco a entregar na Rua..., em Lisboa. 28. No dia 23 de Dezembro de 2016, cerca das 12h50, quando chegou a Lisboa com FF, telefonou novamente para a firma “...” confirmando a entrega do gelo seco às 15 horas na Rua ..., em Lisboa, o que veio a acontecer, sendo o mesmo entregue acondicionado em caixas de esferovite, três de 10kg cada uma e uma de 5Kg e pelo qual foi pago o valor de 192.21€ (cento e noventa e dois euros), em dinheiro entregue pelo FF. 29. Como a casa estivesse fria e não tivessem aquecimento, FF e a arguida AA deslocaram-se ao hipermercado “Continente”, no Centro Comercial Vasco da Gama onde compraram uma braseira e carvão vegetal. 30. Depois do jantar que efetuaram no Hotel Ritz e já em casa, cerca das 24h, acenderam a braseira com o carvão, tendo FF levado a mesma para o quarto de dormir, levando também as caixas de esferovite com o gelo seco da cozinha para o quarto com a ajuda da arguida. 31. Já após a 1h da madrugada do dia 24 de Dezembro de 2016, após ter ingerido comprimidos para dormir (Diazepam), FF retirou-se para o quarto onde adormeceu. 32. A arguida não tomou os comprimidos com medo de morrer; (“ 32. A arguida não tomou os comprimidos pois já havia decidido não morrer.” - redacção conferida pela decisão/reapreciação da prova aduzida pelo colectivo no tribunal de recurso – fls. 1961) 33. Pouco depois das 2h, e determinada a tirar a vida ao FF, a arguida retirou o gelo seco das embalagens onde estava acondicionado e espalhou-o pelo chão e molhou-o com água, expondo o FF aos efeitos da inalação do dióxido de carbono libertado e, de seguida, determinada a conseguir os seus intentos e apagar eventuais vestígios, pegou fogo em dois sítios diferentes da cama onde o FF estava deitado, um na zona da cabeceira e outro na zona dos pés e, de imediato, abandonou o quarto, fechando a porta. 34. Apesar de ter ouvido FF gemer e de o ouvir cair no chão quando tentou agarrar-se ao cortinado para se levantar e fugir do fogo que alastrava na cama, a arguida nada fez para o ajudar. 35. Cerca das 3h10m, a arguida AA vendo que o incêndio estava em progressão e que o ... estava sem reação e com o fumo já a sair pela porta fazendo disparar o alarme anti-incêndio do prédio, pegou numa bolsa e na mochila de FF contendo os 2,100€ e com uma peruca de cor castanho clara na cabeça, saiu de casa e dirigiu-se para o patamar de entrada do apartamento. 36. Foi surpreendida aí pelos vizinhos do 2º D, alarmados com o facto de o alarme ter disparado e de verem bastante fumo a sair pela porta do 2º B e acabou por se dirigir na companhia destes para o piso 0, saindo depois para a rua na direção da Gare do Oriente, onde apanhou um táxi para Vila Nova de Gaia. 37. Em nenhuma ocasião fez referência a FF, nem pediu ajuda para o mesmo, nem fez qualquer referência ao incêndio mesmo perante estes vizinhos. 38. O incêndio viria a ser combatido pelo Regimento Sapadores de Bombeiros de Lisboa, com 8 viaturas compostas por 23 elementos, tendo a PSP tomado conta da ocorrência e a Polícia Judiciária procedido às inspeções judiciárias. 39. Após o fogo ser declarado extinto FF, foi encontrado já cadáver, no chão entre os “pés da cama” e a parede cujo reboco caiu, sem roupa, com um chinelo calçado no pé direito, em posição de decúbito dorsal, com a pele no tronco e nos membros superiores apresentando vestígios de ter estado exposta a altas temperaturas e com a zona das pernas apresentando um grau de dano muito acentuado, quer na parte posterior, quer na parte anterior, sendo que a carbonização dos tecidos já se encontrava bastante avançada. 40. Aos pés do cadáver de FF encontrava-se a braseira ainda com vestígios de carvão, da qual ainda saía algum fumo. 41. No entanto os pés do cadáver, que se encontravam mais próximos da braseira, não se encontravam afetados pela combustão do mesmo. 42. Os estragos mais elevados do incêndio na supra identificada fracção circunscreveram-se ao referido quarto, em especial à cama, cujo colchão e parte da estrutura em madeira ficaram destruídos, à queda do reboco na parede em frente à cama, em resultado da acumulação de calor resultante da combustão do revestimento do colchão e roupa da cama. 43. No canto do colchão mais próximo da janela, foi detetado pela equipa forense grau de destruição mais profundo ao nível dos metais (por oposição ao lado contrário, ainda com vestígios de fuligem), coincidente com o dano mais acentuado nos tecidos da perna esquerda do cadáver, coincidentes com os dois focos de fogo distintos, um na zona da cabeceira e outro na zona dos pés. 44. O restante apartamento ficou completamente conspurcado de fuligem (tectos e paredes de estuque, armários, janelas) vestígios que se estenderam para as partes comuns do edifício, nomeadamente, para o patamar que dá acesso aos vários apartamentos do 2° piso e também às escadas de acesso aos restantes andares. 45. Em consequência do incêndio FF sofreu queimaduras em várias partes do corpo, de diversos graus, nomeadamente as descritas no Relatório de Autópsia (fls. 777 a 785): Hábito Externo: CABEÇA: Queimaduras de 1º e 2º grau da face, de coloração avermelhada, com edema associado, e zona de vesículas, já sem pele, com fuligem preta, dispersa pela face; TÓRAX: Áreas escoriadas, com desidratação associada, na face anterior do tórax, interessando toda cintura escapular …; MEMBROS: Membro superior direito: queimaduras de 1º e 2º dispersas, de coloração avermelhada, com edema, associado e zonas de vesículas já sem pele. Membro superior esquerdo: queimaduras de 1º e 2º dispersas de cor avermelhada, com edema associado e zonas de vesículas já sem pele. Membro inferior direito: Queimaduras de 3° e 4° grau, com exposição dos planos musculares e ósseos e carbonização parcial do membro e da cintura pélvica, nas faces anterior e posterior. Membro inferior esquerdo queimaduras de 3° e 4° grau, com exposição dos planos musculares e ósseos e carbonização parcial do membro e da cintura pélvica, nas faces anterior e posterior. Hábito Interno: CABEÇA: Fossas nasais e seios maxilares frontais e esfenoides: fossas nasais com presença de líquido avermelhado, com pontos de negro de fumo e fuligem Cavidade oral e língua: presença de líquido avermelhado, com pontos de negro de fumo/fuligem PESCOÇO: Laringe e traqueia: presença de líquido avermelhado, com pontos de negro de fumo/fuligem. Mucosa de coloração carminada TORAX: traqueia e brônquios presença de líquido avermelhado nas vias aéreas desde a laringe até aos brônquios principais, com pontos de negro de fumo/fuligem. MEMBROS: Membros inferior direito: Carbonização dos planos musculares e ósseos do membro e cintura pélvica em relação com as queimaduras de 3° e 4° grau descritas no hábito externo. Membro Inferior esquerdo: Carbonização dos planos musculares e ósseos do membro e cintura pélvica em relação com as queimaduras de 3º e/4º grau descritas no hábito externo. 46. Sendo que as lesões traumáticas descritas ao nível da face e dos membros denotam ter sido produzidas por agente físico “calor” sendo compatíveis com incêndio. 47. Em face dos dados necrósicos e do resultado dos exames complementares de Toxicologia e de Anatomia Patológica Forense concluiu a autópsia que a morte de FF foi devida a intoxicação por monóxido de carbono. 48. O monóxido de carbono produzido pela combustão e a sua inalação determinaram como consequência direta e necessária a morte de FF. 49. Apesar das lesões descritas no Hábito Externo serem idóneas a provocar a morte tudo indica que tenham sido provocadas post mortem por permanência na divisão da residência. 50. Apontando as conclusões médicas-legais para a compatibilidade dos dados necrópsicos, dos exames complementares de Toxicologia e de Anatomia Patológica Forense e da informação circunstancial com uma etiologia médico-legal homicida. 51. A arguida sabia que no quarto onde o FF dormia a janela se encontrava fechada e que tinha uma braseira com carvão vegetal acesa e que essa combustão libertava monóxido de carbono que inalado pode provocar tonturas, desmaios e a morte. 52. Quando o mesmo se encontrava a dormir sob o efeito de sedativos, lançou água sobre o gelo seco que se encontrava nas caixas e espalhado no chão, libertando dióxido de carbono. 53. Sabia também a arguida que o gelo seco produz dióxido de carbono que pode ser letal em grandes concentrações e em ambientes fechados. 54. A arguida ateou fogo à cama onde o FF se encontrava em dois pontos distintos, um à cabeira e outro ao pés, sabendo que o seu estado de letargia e de sedação, não lhe iria permitir reagir e fugir. 55. A arguida AA representou, quis e logrou alcançar a morte do seu companheiro, FF, o que conseguiu. 56. Ouviu o FF gemer com dores e ouviu o barulho que o mesmo fez ao cair no chão quando tentou levantar-se para fugir ao fogo. 57. Não providenciou socorro ou pediu ajuda e quando o fogo alastrou e o fumo começou a sair para fora do quarto disparando o alarme de incêndios, a arguida fugiu deixando a porta do quarto fechada e FF a morrer. 58. Ainda assim e apesar de saber que o incêndio era na sua casa e que no interior da mesma estava o seu companheiro ..., a arguida AA abandonou o local, não fornecendo qualquer indicação sobre o FF, nem pediu ajuda para o mesmo, apanhando um táxi com destino a .... 59. Sabia que ateando fogo à cama onde FF dormia sob o feito de sedativos, lhe podia causar a morte, o que efetivamente desejou e conseguiu e que o fogo poderia alastrar-se após consumir o colchão, as roupas, os móveis, propagar-se às outras divisões, às restantes frações e aos imóveis existentes nas proximidades, pondo, dessa forma, em perigo vidas e bens patrimoniais alheios de valor elevado. 60. Sabia que ao atuar da forma descrita estragava o apartamento causando prejuízos aos seus proprietários. 61. A arguida quis matar FF, quis lançar fogo ao colchão e provocar um incêndio, quis danificar o apartamento causando prejuízos aos seus proprietários. 62. No dia 24 de Dezembro de 2016, ao ser confrontada pelos familiares do FF com o facto de este ter morrido a arguida afirmou não saber o que se passava, mentindo mais uma vez sobre a hora e forma como tinha regressado a sua casa em .... 63. A arguida agiu denotando ausência de responsabilização e total desprezo pela vida humana, bem sabendo que por se tratar do seu companheiro tinha para com o mesmo o dever especial de o respeitar e de o salvaguardar. 64. A arguida atuou não se coibindo de provocar um incêndio. 65. Agiu ainda, com frieza de ânimo e com reflexão sobre os meios empregados. 66. A arguida agiu, em todos os momentos livre, consciente e voluntariamente, bem sabendo serem as suas condutas proibidas por lei e que tinha a liberdade necessária para se determinar de acordo com essa avaliação. Dos pedidos de indemnização civil: 67. Em virtude da arguida ter provocado um incêndio o agente ..., do efectivo da P.S.P. fez parte do serviço de patrulhamento que se deslocou ao local onde decorria o incêndio. 68. Na operação de evacuação e no rescaldo da operação com vista a elaborar o auto de notícia sobre a ocorrência dos factos, o mesmo agente entrou na zona queimada tendo inalado fumos e necessitando de receber assistência médica hospitalar No Hospital de .... 69. Deste facto resultou um dia de incapacidade para o trabalho, por inalação de fumos, tendo a P.S.P. despendido com despesas médicas €139,13 com abonos e vencimentos - um dia - €73,36 e €28,05 de taxa moderadora. 70. BB e CC são pais e únicos herdeiros do ofendido. 71. Ambos sofreram angústia, tristeza e falta de apoio e orientação com a perda do seu filho o falecido FF. 72. FF vivia e pernoitava em casa dos pais várias noites por mês. 73. No entanto, FF falava muito pouco com os pais. 74. FF queria estar distante dos pais, daí a casa ter sido arrendada em Lisboa. 75. a sua outra filha irmã do FF há mais de quinze anos e por motivos profissionais deixou a casa dos pais, sendo o FF a sua companhia, amparo e conforto com o qual mantinham uma relação afectiva. 76. Sofreram desgosto, com perda de alegria de viver, tristeza e consternação. 77. Com as despesas de funeral e trasladação do corpo de Lisboa para ... gastaram €2400,00 78. DD é dona da fracção onde os factos ocorreram a fracção AF, 2º andar B, do prédio sito na Avenida .... 79. Havia arrendado tal fracção à arguida em 1 de Julho de 2014 pela renda anual de €9.000,00. 80. A fracção foi dada de arrendamento com mobília, tendo o respectivo contrato um anexo com o inventário respectivo. 81, O contrato foi sendo sucessivamente renovado tendo ocorrido a última renovação em Junho de 2016. 82. A demandada procedeu sempre ao pagamento antecipado da renda anual. 83. Em virtude do Incêndio a cama o colchão e a parte da estrutura em madeira ficaram destruídos, tendo-se verificado a queda do reboco na parede em frente á cama, em resultado da acumulação de calor resultante da combustão do revestimento do colchão e roupa da cama. 84. No canto do colchão mais próximo da janela foi detetado um grau de destruição mais profundo ao nível dos metais coincidente com o dano mais acentuado nos tecidos da perna esquerda do cadáver. 85. O restante apartamento ficou completamente conspurcado de fuligem – tetos e paredes de estuque, armários e janelas - vestígios que se estenderam para as partes comuns dos edifícios, nomeadamente, para o patamar que dá acesso aos vários apartamentos do 2º piso e também às escadas de acesso aos restantes andares. 86. - A demandada sabia que o fogo podia alastrar-se a outras divisões, às restantes fracções e aos imóveis existentes nas proximidades pondo, dessa forma em perigo vidas e bens patrimoniais alheios de valor elevado. 87. Sabia que ao atuar da forma descrita estragava o apartamento causando prejuízos aos proprietários. 88. Em 16 de Janeiro de 2017 o demandante e a demandada celebraram um acordo escrito de revogação do contrato de arrendamento. 89. Em virtude do incêndio a fracção em causa teve que ter intervenção. 90. Recorreram aos serviços da empresa ... que apresentou um orçamento de obras no montante de €12.793,70 que foi suportado pela ... SA. 91. Os demandantes suportaram o valor da franquia no total de €145.00. 92. Do incêndio resultou igualmente a danificação do sistema de climatização da fracção. 93. A .... SA orçamentou a reparação em €3.779,00 valor que foi igualmente suportado pela mesma seguradora, ficando a cargo dos demandantes a franquia de €145,00. 94. Resultou, ainda, a destruição dos móveis que tiveram que ser repostos no valor total de €2.166,00. 95. Os demandantes tiveram que se deslocar a Portugal tendo gasto os seguintes valores em despesas entre 3 de Maio de 2017 e 22 de Maio do mesmo ano: 96. - Em voos €942,7; 97 - em alimentação €222,98; - 98. - €1061,41 e €150,00 em alojamento, no total de €2.377,29. 99. Deixaram de receber, pelos dias que não trabalharam, €1287,50. 100. Em virtude da realização das obras na fracção os demandantes ficaram impossibilitados de dar de arrendamento o referido apartamento, desde fevereiro a julho de 2017 deixando de receber €4.500,00, Condições pessoais da arguida: - A sua vida familiar na infância caracterizou-se como funcional ao nível dos afetos e das dinâmicas familiares, sinalizando-se uma relação próxima da arguida com os pais e os avós que preservou ao longo dos anos, mesmo quando saiu da aldeia. - O estilo educativo preconizado pela família foi descrito como ajustado às regras e valores embora rígido e exigente. - A vida escolar da arguida decorreu de forma regular e investida, sendo referenciada como excelente aluna e com um registo comportamental ajustado. - Foi referido por vizinhos que devido a traços de carater de introversão seria vítima de bullyng por parte dos colegas. Padecia de um problema de pele que a complexava e obrigava-a a abrigar-se do sol com guarda-chuva, o que lhe determinava um certo isolamento fora do convívio com os pares. - Concluiu o 12º ano com distinção na Escola Secundária de ... e prosseguiu os estudos superiores no Porto, terminando a licenciatura de professor do ensino básico variante português e inglês cerca dos 23 anos. - Quando foi estudar para o Porto, em 1999 ... passou a residir num apartamento que lhe terá sido oferecido pela família materna, tendo conquistado nessa altura a sua autonomia e não voltou a viver com a família de origem, visitando-se de um modo geral aos fins- de-semana. - Mais tarde em virtude de alegadas obras de conservação neste apartamento, a arguida arrendou outro em Vila Nova de Gaia, recentemente devolvido ao proprietário. - Participou num curso de escrita de ficção para cinema e televisão na Universidade ... de Lisboa em 2008. -Em 2011 frequentou o 1º ano de mestrado de realização para cinema e televisão na escola superior artística do ..., onde conheceu .... - No plano afectivo terá tido outros dois relacionamentos em relação aos quais pouco concretiza dando-lhes reduzida relevância afectiva sobrevalorizando o relacionamento com FF referendo que toda a sua vida social e pessoal a partir de 2011 se circunscreveu a esta relação. - Iniciou a sua actividade de professora em 2006, colocada numa escola de .... - A morte da mãe em Novembro de 2006 na sequência de um enfarte precipitou a interrupção da actividade para assumir os cuidados que aquela prestava à avó materna portadora de doença incapacitante, voltando a ser colocada em 2008/2009, sendo a sua ultima colocação numa escola em Odivelas entre Fevereiro Julho de 2012. - Posteriormente optou por dar explicações em casa de português e inglês. - Foi formadora em dois cursos inseridos no programa novas oportunidades, leccionando as mesmas disciplinas durante um ano, antes de ter conhecido FF. Em Julho de 2014 arrendou o apartamento em Lisboa para onde o casal acabou por se fixar. - A partir daqui regista uma gradual desistência da vida profissional como explicadora e um progressivo afastamento dos familiares referindo que tal se deveu a passar a viver só para a vítima, amava-o mais do que tudo na vida “eramos uns siameses, num casulo, nem o meu pai sabia da minha verdadeira existência” (sic). - Não se lhe identificam amigos ou conhecidos à exceção de uma ou duas amigas que manteve enquanto frequentou a faculdade e das quis entretanto se afastou. - Não tinha ocupação de tempos livres justificando-o com os ciúmes do FF. - Desde o final de Verão de 2013 o casal realizou viagens ao estrangeiro, quatro dessas viagens em 2016. - No campo socioeconómico subsistia dos rendimentos resultantes da venda de bens herdados por morte da mãe. - Os seus rendimentos foram diminuindo a partir de 2014 deixando de trabalhar definitivamente em 2016 alegando falta de saúde psicológica. - A arguida referiu sintomas depressivos a partir de 2015, situando os primeiros sintomas em 2013 quando começou a lavar frequentemente as mãos situação que terá piorado em 2015 época em que terá tido os primeiros sinais de alopecia. - É acompanhada pelos serviços clínicos do EP de .. com consultas de psiquiatria e psicologia, com medicação ansiolítica. - É descrita no meio residencial de origem como uma pessoa bem educada, cordial e de bom trato. - Como perspectiva de futuro pretende regressar á sua habitação no Porto, contando com o apoio incondicional do pai que reside só desde que os avós paternos faleceram. - Tem estado estável e adequada ao confinamento e à restrição de actividades a que esta sujeita merce da privação de liberdade e não regista qualquer incidência disciplinar. - Recebe apoio financeiro do pai com uma mesada de €150,00, assim como visitas regulares do pai e dos tios, dispostos a prestar-lhe o apoio necessário. - É bem aceite no meio social de origem e a sua imagem associada à sua família é descrita como socialmente integrada. - Não tem antecedentes criminais. 2.2. Factos não provados: Não resultaram provados os factos que contrariam os factos assentes ou que se mostram em oposição com estes, designadamente: a) Que FF fosse agressivo verbalmente, não gostando de ser contrariado, conflituoso e procurando controlar a vida da arguida, isolando-a familiar e socialmente. b) Que o relacionamento em causa veio sendo pautado ao longo do tempo por violência psicológica e física c) Que FF mantivesse uma relação de proximidade afectiva com os pais. d) Que FF fosse um jovem alegre e que ajudava os pais nas tarefas domésticas que estes já não podiam realizar. e) Que fracção onde os factos ocorreram a fracção ... desvalorizou €60.000,00, ou que tivessem perdido €1287,50 por dias de trabalho. f) Qua a arguida tenha tentado desmotivar FF das ideias de suicídio. g) Que as viagens planeadas e realizadas tenham sido efectuadas para tentar demover FF das ideias de morte. h) Que a braseira tivesse sido comprada apenas por insistência de FF porque este queria que a sua morte sobreviesse em clima aquecido que lhe fazia lembrar a infância. i) Que o casal tivesse tido muito trabalho para acender a braseira o que demorou bastante tempo. j) Qua a arguida tivesse abandonado o imóvel com a evaporação do gelo seco k) …e que tenha regressado de novo ao apartamento com o soar do alarme de incêndio. l) Que a arguida tivesse levado a mala e a mochila quando saíra pela primeira vez. m) Que FF tivesse falecido devido à inalação de CO2 libertado pelo gelo seco. n) Que a arguida tivesse agido sem qualquer motivo.” II.B). – DE DIREITO. II.B.1. – NULIDADE DO ACÓRDÃO POR DESESTIMAÇÃO DO PRECEITUADO NOS ARTIGOS 424.º, Nº 3, EX VI DO 358º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. Ocorre unanimidade dos intervenientes processuais – arguida; Ministério Público junto do tribunal recorrido; e Ministério Público junto deste Supremo Tribunal de Justiça – relativamente à verificação de uma nulidade do acórdão recorrido, por violação dos artigos 379º, nº 1, alínea b), ex vi dos artigos 424º, nº 3 e 425º, nº 4, todos do Código de Processo Penal. A lei comina com a falta de subsistência formal uma decisão judicial quando ocorra um veredicto de condenação com base em factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia “fora dos casos e das condições previstas nos artigos 358º e 359º.” Para que ocorre a nulidade prescrita na citada alínea do artigo 379º torna-se inafastável que (i) ocorra um juízo de condenação na sentença a declarar írrita; (ii) que essa condenação seja operada, ou tenha por base factos desconformados, incongruentes e/ou desconectados com aqueles que serviram de base ao tema ou feixe essencial de matéria sobre que versou a actividade probatória dos intervenientes que hajm actuado no julgamento; (iii) e que esses factos que serviram de base à condenação – “factos diversos” – hajam sido subtraídos e escamoteados ao conhecimento dos sujeitos processuais, vale dizer não hajam sido submetidos ao exercício do direito do contraditório. A lei manda que definido o thema decidendum, que queda percintado com o recebimento da acusação, no despacho que designa data para audiência de julgamento, o tribunal e os sujeitos processuais confinem a cinjam a sua actividade probatória a feixe factual que lhe foi dado a conhecer e que serve de fundamento ao núcleo incriminante que lhe é imputado e por que lhe é pedida responsabilidade jurídico-criminal. A alteração desse feixe de factos essenciais e fundantes da responsabilidade criminal só pode ser alterada se, durante a actividade probatória decorrida em audiência de discussão e julgamento, o tribunal os considerar relevantes para a concretização da responsabilidade criminal do arguido (artigo 358º do Código de Processo Penal) ou, sendo autonomizáveis, se revelem com pertinência jurídico-criminal para indagação da responsabilidade, superveniente do arguido (artigo 359º do mesmo livro de leis). Assim, “se no decurso da audiência se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, com relevo para a decisão da causa, o presidente, oficiosamente ou a requerimento, comunica a alteração ao arguido e concede-lhe, se ele o requer, o tempo estritamente necessário para a preparação da defesa.” – nº 1 do artigo 358º do Código de Processo Penal. A regra de segurança de defesa e inviolabilidade do thema decidendum factualmente descrito na acusação, e confinado com o despacho que designa dia para julgamento, repercute-se na exigência estabelecida no nº 3 do artigo 424º do Código de Processo Penal ao inculcar a necessidade de o tribunal, “sempre que se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na de cisão recorrida ou da respectiva qualificação jurídica não conhecida doa arguido, este é notificado para, querendo, se pronunciar no prazo de 10 dias.” Na situação normativizada no preceito acabado de citar a exigência legal de preservar e manter incólume, inconcussa e inconsútil a cognoscibilidade factual por que o arguido venha a ser condenado projecta-se para além da audiência de discussão de discussão e julgamento, inculcando ao tribunal que inove a factualidade descrita na acusação – ainda que de forma não substancial – de comunicar as alterações que pretende introduzir na decisão (condenatória) ao arguido para que ele, querendo, possa, tomado o conhecimento, opor a sua versão ou produzir as alterações que, em seu juízo, se congraçam ou coadunem com a nova versão (narrativa factual-real) que lhe é proposta. Em definitivo um processo justo e equitativo não consente que se forme um juízo condenatório com recurso a factos de que o arguido não tenha tido conhecimento antecipado e sobre os quais tenha tido possibilidade de organizar a sua defesa e verter uma actividade processual probatória que possibilite a infirmação dessa factualidade (conhecida e adquirida para discussão). A cognoscibilidade de uma narrativa factual – suposta realidade em que o arguido agiu e actuou uma acção ilícita e antijurídica – constitui-se como núcleo fundante e invadeável para uma condenação, por aquela concreta, precisa e imota facticidade, de alguém sujeito a processo judicial conformado pelas regras da equidade e da justiça histórico-processual. A modificabilidade objectiva, ainda que não determinante e essencial, desse núcleo factual-material medular, pelo qual um determinado sujeito é chamada a responder perante um órgão de aplicação da lei, não pode servir de base a uma possível modificação subjectiva do tribunal de julgamento, sob pena de ocorrer uma perversão da base cognitiva-comunicacional em que o discurso da lide se constitui e dirimiu. Ocorreria, ou promover-se-ia, uma disrupção funcional e cognitiva entre o sentido do estar e agir com base em tablado factual adquirido e estabilizado e uma realidade inovada – ainda que não substancialmente diversa da conhecida – pela percepção/compreensão surgida e dimanada numa sede – a audiência de discussão e julgamento – que está para além do momento em que a factualidade deve ser estabelecida e dada a conhecer aquele que vai prestar contas por essa concreta e delimitada factividade e que o arguido não controla, se não lhe for dada a conhecer. A possibilidade de reacção a esta nova factualidade surgida numa fase de compreensão/aquisição da realidade (factual) que escapa ao arguido por depender de um juízo conviccional apreciativo formado pelo tribunal, constitui-se como um inderrogável e inauferível direito de defesa de quem virá a sofrer um juízo de condenação. No caso o tribunal “criou” a nova realidade factual a partir da apreciação a que procedeu do troço impugnatório, impulsado pela recorrente, da decisão de facto a que tinha chegado o tribunal de primeira (1ª) instância. Aforrando razões de compreensibilidade não será despiciendo transcrever o tramo da decisão em que se formou o vício com que a mesma é alanceada. “1.4. Como quarta questão insurge-se a recorrente quanto à matéria de facto provada que se mostra fixada no acórdão defendendo que na mesma deveriam ser aditados dois factos “No dia 23 de dezembro de 2016, tal como já o tinha feito em momentos anteriores, o ofendido FF disse à arguida que queria morrer, mencionando a provocação da morte através de gelo seco ou monóxido de carbono, solicitando à arguida que colaborasse na execução de tal projeto. A arguida agiu determinada pela manifestação de vontade do ofendido, que a declarou de modo categórico, perentoriamente, naquele momento e de forma direta e terminante.” Essa pretensão mostra-se assente - na sua perspectiva impõem dar-se como provados tais factos - em meios de prova produzidos em audiência a que faz referência e que cita: declarações da arguida, depoimentos de assistentes, demandante e testemunhas, com concreta indicação dos segmentos em que as declarações que transcreve se mostram gravadas. A pretensão da recorrente no aditamento de tais factos traduz a tentativa de introdução, no elenco dos factos provados, da versão que a própria trouxe à audiência de julgamento segundo a qual os factos que praticou conducentes à morte da vítima FF nada mais eram que a cumprimento das solicitações que o mesmo lhe vinha fazendo de o ajudar a morrer, projecto e decisão em que a mesma também se havia inicialmente associado, no sentido de um pacto de suicídio entre ambos, mas que abandonou posteriormente. Se bem que se mostre dado cumprimento pela recorrente ao disposto no art.º 412º n.º 3 al.s a) e b) CPP, a leitura dos excertos que a recorrente aponta como base nessa sua pretensão não impõem, por um lado, que esses factos sejam aditados como provados e, por outro, a tomada de uma decisão diversa da tomada pelo Colectivo. As próprias declarações da arguida, postas em relevo agora no recurso, nunca falam de qualquer pacto de suicídio abrangendo ambos, nenhuma referência concreta fazem quanto ao modo como esse suicídio iria ser feito, quaisquer pedidos e respectiva insistência da vítima nessa intenção. Por outro lado, as transcrições que a recorrente avançou dos depoimentos testemunhais ou dos assistentes também nenhuma referência concreta fazem a essa concreta intenção da vitima ou a essa verbalização junto dos mesmos ou de terceiros., De resto, socorrendo-nos das menções inseridas pelo Colectivo na motivação da decisão fáctica resulta evidente que a versão da arguida, agora avançada na impugnação de facto com a pretensão de introdução de dois factos provados, já havia sido desenvolvida pela mesma em audiência de discussão e julgamento, tendo sido ali desmontada com recurso a critérios lógicos e análise de outros elementos probatórios e, por esse motivo, remetida para o seguimento dos factos não provados, tal como se mostra desenvolvido no acórdão e que nos abstemos de aqui reproduzir. Este conjunto de factos apenas nos merecem pequenas observações/reparos, isto derivado da respectiva redacção que não se mostra feita de modo perfeitamente claro e isento de dúvidas. Assim, o inserido nos pontos de facto provados 3 e 4 não se mostra em plena correspondência com o afirmado no facto provado 23, na medida em que não se mostra atribuída a autoria da ideia originária do “projecto de suicídio colectivo”. Na realidade, a ser atribuído à vítima, como pareceria decorrer do afirmado no facto provado 4, então não seria necessária a sua concordância (relatada no ponto 23). Por outro lado, se a concordância referida neste último facto diz respeito ao momento da respectiva execução, então também se mostraria inútil a referência ali feita à anuência da arguida. A compatibilização desses duas realidades factuais apontam para que, do referido no facto provado 4 (o FF falar em suicídio conjunto), o texto do facto provado 23 tenha de ser alterado para “O falecido tinha falado, em data e momento circunstancial anterior não apurados, em projecto de suicídio coletivo para aquela altura no que a arguida anuiu; daí o jantar no ...” Tal alteração é a que se mostra também consentânea com o referido pela própria arguida nas respectivas declarações, como o Colectivo pôs em destaque na fundamentação: “Foi em Dezembro de 2016 que a arguida aderiu a este plano do gelo seco. Ficou com uma depressão muito grande e acabou por concordar com o plano do gelo seco, plano este para morrerem os dois.” (pág. 23). Impõe-se ainda a compatibilização o referido no facto provado 22 (começou a planear forma de se livrar de FF, pondo - lhe termo à vida e assim libertar-se de todos os seus problemas, aproveitando a ideia deste se querer suicidar.) e o descrito no facto provado 25 (Tendo em momentos anteriores, não concretamente apurados, o FF falado em “gelo seco” e em monóxido de carbono, como uma das melhores maneiras de morrer sem sangue e sem dor a propósito da ideia de suicídio coletivo, a arguida AA começou a pesquisar na internet as características e efeitos desse produto…), isto para, dentro do possível, estabelecer o marco temporal da formulação pela arguida do desígnio de tirar a vida à vítima. Ora, fazendo apelo ao que se mostra referido na fundamentação acerca do momento temporal em que as buscas informáticas se mostram feitas, a págs. 27 e 28 do texto do acórdão recorrido, a primeira delas ocorreu a 16/12/2016 às 17h e 46 m, teremos de concluir que, pelo menos nesta data, já a arguida havia maturado na decisão de tirar a vida a vítima. Ainda por relação ao último dos factos provados acima referidos, a indicação de não se ter apurado o momento temporal em que o ... terá falado em “gelo seco” e em monóxido de carbono, apesar da indicação feita pela arguida nas suas declarações como tendo sido “Em Dezembro de 2012 falaram pela primeira vez em gelo seco.” – cfr. fls. 23 -, dificilmente seria de aceitar essa referência, com essa exactidão, como presente na memória face à dilação temporal. Daí o “não apurado”. Deste conjunto de explicações teremos ainda que concluir que a menção feita no facto provado 24 acerca da decisão tomada pela arguida de não morrer, terá de ser reportada à data em que foi feito o jantar no ... (no dia 23 de Dezembro, como se depreende do facto provado 30), isto como decorrência também das pesquisas feitas no computador que acima mencionámos. Finalmente, importa esclarecer o conteúdo do facto provado 32 [A arguida não tomou os comprimidos com medo de morrer] no sentido de que a razão de não tomada do comprimido assentou, na realidade, na decisão previamente já tomada de não morrer e não por qualquer medo desse desfecho pessoal. Importa, assim, reformular este conjunto de factos sem que dessa alteração resulte qualquer alteração substancial em moldes de influir/interferir em qualquer aspecto da posterior integração jurídica dos factos, mormente aqueles que a recorrente pôs em concreto na sua impugnação: a integração jurídica no crime de auxílio ao suicídio ou de homicídio a pedido da vítima a que mais à frente nos referiremos. Assim, tais factos passarão a ter a seguinte redacção: “22. Bem sabendo a arguida AA que a encenação criada à volta do seu emprego, do emprego de FF, do casamento, da gravidez, não poderia manter-se por mais tempo e começando a ficar desesperada na sua relação com o FF, pelo menos a 16 de Dezembro de 2016, começou a planear forma de se livrar de FF, pondo-lhe termo à vida e assim libertar-se de todos os seus problemas, aproveitando a ideia deste se querer suicidar.” “23. O falecido tinha falado, em data e momento circunstancial anterior não apurados, em projecto de suicídio coletivo para aquela altura no que a arguida anuiu; daí o jantar no ....” “24. Porém, neste jantar, a arguida já tinha decidido não morrer.” “ 32. A arguida não tomou os comprimidos pois já havia decidido não morrer.” A não adopção da tese do pretenso pacto de suicídio pelo Colectivo não se mostra incompatível com as referências a “suicídio” inseridas nos factos provados 3, 4, 25, 30 e 31 na medida em que dos mesmos nunca se consegue extrair uma persistência da vítima nessa intenção e, muito menos, pedidos insistentes, temporalmente repetidos junto da arguida com essa finalidade. As indicações que a arguida faz durante o seu depoimento e que refere como transmitidos aos familiares da vítima mostram-se de sentido radicalmente contrário a quem está determinado a morrer, suicidando-se, mesmo que na assunção de um plano conjunto e uma finalidade que abrangesse ambos. Improcede, pois, a impugnação factual que pretendia ver aditados aos factos provados os inicialmente citados pela recorrente. A factualidade dada como provada merece ainda a dissidência da recorrente quanto ao facto provado 33 ["a arguida pegou fogo em dois sítios diferentes da cama onde o ... estava deitado, um na zona da cabeceira e outro na zona dos pés"], manifestando a existência de sérias dúvidas, pelos depoimentos testemunhais, na atribuída autoria em exclusiva que ali se mostra feita. Para demonstração dessas dúvidas e, mais precisamente, na tentativa de impor essas dúvidas (”fica sempre a incerteza sobre quem provocou o fogo: o ofendido, a arguida ou os dois”), a recorrente tece uma série de considerações acerca dos depoimentos testemunhal prestados por ... e ... e dos prestados pelas testemunhas moradores no prédio e invoca ainda o conteúdo de provas documentais constantes dos autos, como sejam os de folhas 6-8, 55-76 e 163-172, as imagens de folhas 8, 9, 10, 13, 64-66 e 167-172 e o relatório de folhas 163 a 172. Não podendo concordar com a tese da recorrente, não só o Colectivo não alimentou quaisquer dúvidas quanto ao facto provado em questão, afastando, por esta via, qualquer resquício de aplicação do princípio in dubio pro reo, como as provas em questão são exactamente aquelas que habilitaram o Colectivo na formação da respectiva convicção acerca da autoria do incêndio por parte da arguida, não impondo, só por si, qualquer outra e diversa conclusão acerca da autoria do incêndio. De resto, não deixará a recorrente de relembrar que a sua própria versão afastava da cogitação pela vítima de morrer mediante tal meio pois, como se mostra indicado na fundamentação, a arguida mencionou “que tinha acordado com o seu companheiro, o falecido ..., que ambos se iriam suicidar utilizando gelo seco”. A convicção a que o Colectivo chegou para dar como provados os factos postos em crise pela recorrente mostra-se devidamente fundamentada, de forma minuciosa, exaustiva, com enumeração dos elementos probatórios em que se baseou para formar a sua convicção, com indicação dos depoimentos das testemunhas prestados em audiência, e do porquê da relevância/credibilidade que lhe foi atribuída, com critérios lógicos e objectivos, e alicerçada nos elementos de prova obtidos em audiência, bem como nos documentos juntos aos autos e invocados na motivação da matéria de facto, encontrando-se a matéria de facto fixada de acordo com um raciocínio lógico e coerente, de acordo com a regra da livre apreciação da prova inserta no art.º 127º, do CPP. A recorrente faz uma diferente apreciação da prova produzida em audiência, impugnando dessa forma a convicção adquirida pelo tribunal a quo e pondo em causa a regra da livre apreciação da prova. Contudo, a motivação expressa pelo Colectivo é suficiente para habilitar os sujeitos processuais, bem como o Tribunal ad quem, a concluir que o julgador seguiu um processo lógico e racional na formação da sua convicção, desta não resultando uma decisão ilógica, arbitrária, contraditória ou claramente violadora das regras experiência comum na apreciação da prova.” O tribunal fautor da decisão incoa por anotar a necessidade de proceder a “pequenas observações/reparos, isto derivado da respectiva redacção que não se mostra feita de modo perfeitamente claro e isento de dúvidas” para, empós, “para compatibilização dessas duas realidades factuais” – a matéria factual descrita nos itens 3 e 4 e aquela que resultava provada no item 23 – dever ser “alterada” para ““O falecido tinha falado, em data e momento circunstancial anterior não apurados, em projecto de suicídio coletivo para aquela altura no que a arguida anuiu; daí o jantar no Ritz.” A “alteração” promovida pelo colectivo julgador estendeu-se pela concreção do momento temporal em que a arguida terá formulado o desígnio de se “livrar do ...” e do momento em que a arguida decidiu “não morrer” para concluir pela alteração, que estimou não resultar (sic) “qualquer alteração substancial em moldes de influir/interferir em qualquer aspecto da posterior integração jurídica dos factos, mormente aqueles que a recorrente pôs em concreto na sua impugnação: a integração jurídica no crime de auxílio ao suicídio ou de homicídio a pedido da vítima a que mais à frente nos referiremos.” Daí que se tenha alcandorado a proceder a uma alteração dos factos numerados sob os números 22; 23; 24 e 32, nos termos transcritos supra. O tribunal recorrido terá partido do princípio de que uma alteração factual, traduzida, no caso concreto, da necessidade de marcar a autoria quanto à “ideia originária do “projecto de suicídio colectivo”; ao estabelecimento do marco temporal relativamente à “formulação pela arguida do desígnio de tirar a vida à vítima”; quanto ao momento em que a “arguida terá tomada a decisão de não morrer” e o esclarecimento do item provado sob o número 32. alterando o facto provado “A arguida não tomou os comprimidos com medo de morrer” para “A arguida não tomou os comprimidos pois já havia decidido não morrer”, não induziria uma diversa, ou divertida, qualificação jurídico-penal da imputação formulada na acusação o que, dessumimos nós, o terá inibido de comunicar à arguida a alteração a que procedia. A primeira observação que cabe assinalar é que a alteração da decisão de facto, adquirida pelo tribunal de primeira (1ª) instância, foi operada por iniciativa do tribunal recorrido (“Este conjunto de factos apenas nos merecem pequenas observações/reparos, isto derivado da respectiva redacção que não se mostra feita de modo perfeitamente claro e isento de dúvidas.”) As alterações decorrem, deste modo, de uma actividade reapreciativa da factualidade que vinha adquirida na decisão sob reapreciação (por via de recurso), o que sendo louvável, não deveria ter olvidado as obrigações que a lei comina para a alteração/modificação da decisão de facto, anda quando por esse esforço se pretende alcançar uma compatibilização/harmonização do conspecto factual em que uma narrativa se deve ancorar para reverberar uma logicidade, razoabilidade e coerência argumentativa de uma decisão judicial. (Anotar-se-á, no entanto, que as “observações” e “reparos” efectuados não derivam da consertos da redacção, no sentido de permitir uma melhor compreensão propositiva, ou de clarificações de contexto, com alcance de tornar mais perceptível a leitura da proposição, mas antes resultam de inserções de realidades factuais que, no próprio dizer do tribunal, se destinam a conferir uma dimensão compreensiva entre diversos enunciados fácticos e conchavar alterações de conteúdo significativo que modificam e convertem o sentido das proposições enunciativas que estavam adquiridas pelo tribunal de primeira (1ª) instância.) [[14]] Não se consente que se diga que constituem simples reparos ou observações inócuas e dealbadas de alcance e sentido significativo a introdução, modificando, num enunciado fáctico, v. g. o item nº 32, de estado de espirito larvar e de feição instintiva, como é o “medo” por um estado de assumpção consciente e voluntário de “já ter decidido” não morrer. Um estado de “medo”, estado corporal-emotivo e de índole e feição instintiva não se confunde com um estado de consciência deliberadamente assumido e voluntária e racionalmente adquirido que está contido e se dessume da expressão “já ter decidido”. Ter-se “decidido”, o que quer que seja, pressupõe uma elaboração racional e uma ponderação sopesada e equacionada de vectores, factores e variáveis que se concitam para a o processo formativo da decisão e que depois de colimados num feixe de interesse pessoal e momentâneo concitam a eleição por uma das distintas opções que poderiam ter sido assumidas para a decisão. Do passo que o “medo” se traduz num estado de acção inibitório e constritor da vontade, da capacidade de reacção e de tomada de uma decisão condizente com uma acção que seria natural dever ser tomada naquela concreta e actual circunstância vivencial e não o foi. O “medo” é um factor instintivo e psicossomático que opera com elemento de inibição perante uma situação real e que o portador desse estado emotivo não consegue configurar e processar de modo a poder enfrentá-la de forma racional e consciente. O alcance significativo e compreensivo dos estados de acção descritos na matéria de facto da primeira (1ª) instância, “medo” e na matéria de facto alterada/modificada pelo juízo “reparador”, “decisão”, do tribunal recorrido são totalmente diferentes, quando apreciados à luz da psicologia e da voluntariedade de acção da pessoa. Como não pode deixar de assumir uma alteração significativa da decisão de facto dizer-se que a arguida desde 16 de Dezembro de 2016 tinha começado “planear forma de se livrar de ..., pondo-lhe termo à vida e assim libertar-se de todos os seus problemas, aproveitando a ideia deste se querer suicidar” ou não ter pontuado um momento temporal para urdir a forma de se livrar do companheiro, como modo de se libertar do “fardo” que para ela constituiria a relação que carregava com a vítima. Do mesmo passo não deixa de ter um alcance e dimensão significante diversa a expressão contida no item 23 da matéria de facto da primeira (1ª) instância de que a vítima tinha “concordado” num plano de suicídio colectivo com o que acabou por ter sido como comprovado na decisão recorrida, a saber (sic) “[O falecido] tinha falado, em data e momento circunstancial anterior não apurados (…)”. Não pode aceitar-se que se confira o mesmo significado expressivo e comunicativo-institucional a um estado de “concordância” e a uma “alusão” indeterminada, inconcreta e evanescente como uma “fala”. Enquanto que no caso de existência de um estado de “concordância” ocorre uma conúbio e conchavo de vontades reflectidas, mancomunadas e congraçadas num espirito de em comum alcançarem um determinado objectivo, numa “fala”, em que é legitimo e significativo traduzir a expressão “tinha falado”, alguém, de per si e sem compromisso de mais quem quer, alude à possibilidade de realização ou concretização de um determinado sucesso ou evento, sem que nessa intenção volitiva e comunicacional agregue ou comparta qualquer intenção voluntarista de outro sujeito. Ressuma das duas expressões uma postura intencional e volitiva que não pode deixar de significar uma alteração significativa e ponderativa das atitudes pessoais que se pretendem descrever e fazer sobressair para efeitos do comportamento activo e intencional da arguida. As alterações que se pontuam – ao fim e ao cabo aquelas que resultaram da acção modificativa do colectivo que julgou o recurso – não podem deixar de produzir um alcance significativo na decisão de facto em que o tribunal se embasa para a apreciação da conduta da arguida, a reclamar e exigir que a sua inclusão na decisão não seja operada sem que sobre a sua versão seja possibilitada uma pronúncia da visada, de modo a poder opor-se-lhe, querendo, ou fornecer a sua própria e pessoal versão sobre aquela concreta realidade subjectiva-intencional. A arguida/recorrente tem o direito, porque não foi ela a promover as alterações e as mesmas são susceptíveis de alterar o conspecto volitivo e subjectivo da acção actuada, a pronunciar-se sobre a sua inserção na decisão e pugna por uma outra versão, mediante produção de prova que desestime a convicção a que o tribunal se alcandorou. Coonestando as posições assumidas pelos intervenientes processuais, confirma-se a existência de uma situação de inobservância de uma formalidade essencial, susceptível de afectar a esfera de defesa da arguida e inquinar o equilíbrio processual e o equitativo direito de pronúncia e de contramina das situações influenciadoras de um processo justo e de uma verdade histórico-processual produzida de acordo com regras de contraditoriedade e defesa.
III. – DECISÃO. Na defluência do que foi expendido, acordam os juízes que constituem este colectivo na 3ªa secção criminal, do Supremo Tribunal de Justiça, em: - Declarar a nulidade da decisão recorrida, por violação do preceituado na alínea b) do nº 1 do artigo 379º, ex vi do nº 3 do artigo 424º, ambos do Código de Processo Penal e, em consequência, ordenar a sanação da nulidade mediante a comunicação à arguida/recorrente da alteração da facticidade, oficiosamente, operada; - Sem custas.
Lisboa, 8 de Maio de 2019
(Gabriel Martim Catarino – Relator)
(Manuel Augusto de Matos)
------------------------------------- “22. Bem sabendo a arguida ... que a encenação criada à volta do seu emprego, do emprego de ..., do casamento, da gravidez, não poderia manter-se por mais tempo e começando a ficar desesperada na sua relação com o ... começou a planear forma de se livrar de ..., pondo-lhe termo à vida e assim libertar-se de todos os seus problemas, aproveitando a ideia deste se querer suicidar. (“22. Bem sabendo a arguida ... que a encenação criada à volta do seu emprego, do emprego de ..., do casamento, da gravidez, não poderia manter-se por mais tempo e começando a ficar desesperada na sua relação com o ..., pelo menos a 16 de Dezembro de 2016, começou a planear forma de se livrar de ..., pondo-lhe termo à vida e assim libertar-se de todos os seus problemas, aproveitando a ideia deste se querer suicidar.” – redacção conferida pela decisão/reapreciação da prova aduzida pelo colectivo no tribunal de recurso – fls. 1961). 23. O falecido tinha concordado no projecto de suicídio coletivo para aquela altura no que a arguida anuiu daí o jantar no Ritz. (“23. O falecido tinha falado, em data e momento circunstancial anterior não apurados, em projecto de suicídio coletivo para aquela altura no que a arguida anuiu; daí o jantar no Ritz.” - redacção conferida pela decisão/reapreciação da prova aduzida pelo colectivo no tribunal de recurso – fls. 1961): 24. Porém a arguida já tinha decidido não morrer. (“24. Porém, neste jantar, a arguida já tinha decidido não morrer.” - redacção conferida pela decisão/reapreciação da prova aduzida pelo colectivo no tribunal de recurso – fls. 1961) 32. A arguida não tomou os comprimidos com medo de morrer; |