Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
| ||
| Nº Convencional: | 3.ª SECÇÃO | ||
| Relator: | CARLOS CAMPOS LOBO | ||
| Descritores: | RECURSO DE REVISÃO INCONCIABILIDADE DE DECISÕES DIREITO À INDEMNIZAÇÃO DUPLA CONFORME FACTOS PROVADOS PRESSUPOSTOS TRÂNSITO EM JULGADO FACTO NOVO NOVOS MEIOS DE PROVA PRINCÍPIO DA LEALDADE PROCESSUAL IMPUTABILIDADE DIMINUIDA | ||
| Data do Acordão: | 10/01/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | RECURSO DE REVISÃO | ||
| Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
| Sumário : | I – No recurso de revisão acobertado pelo fundamento constante da alínea c), do nº 1 do artigo 449º do CPPenal, o legislador clama pela verificação cumulativa de uma dúplice exigência, a ocorrência de inconciliabilidade entre os factos que serviram de fundamento à condenação e os dados como provados noutra sentença e que dessa inconciliabilidade ou oposição resultem graves dúvidas sobre a justiça da condenação. II – Tal inconciliabilidade factual reclama que entre os factos que serviram de fundamento à condenação e os dados como provados noutra sentença ocorra uma incompatibilidade / dissensão / antagonismo, ou seja, uma relação de exclusão, no sentido de que, se se tiver por provada determinada concreta matéria numa outra sentença, não podem ser, ao mesmo tempo, verdadeiros outros tidos por provados na sentença em revisão. III – Diga-se, também, que essa inconciliabilidade dos factos que serviram de fundamento à condenação com os dados como provados noutra sentença, assenta apenas em factos provados na sentença em apreciação e factos provados na sentença fundamento. IV – Assim, perante quadro processual em que o Recorrente (arguido) foi considerado imputável, sendo que noutros autos posteriores, foi o mesmo tido como enfrentando quadro de imputabilidade diminuída, nada se referindo nestes últimos, nem se reportando os mesmos ao tempo daqueles outros, inexistem decisões incompatíveis sobre pessoas e factos ou sobre factos em relação à mesma ou mesmas pessoas. V- O facto de num momento o Recorrente (arguido) ter sido considerado imputável e num outro com imputabilidade diminuída, resultando tal de quadros factuais ocorridos em momentos completamente distintos, reportadas a pedaços de vida absolutamente diferentes, não decorre qualquer incompatibilidade e / ou inconciabilidade. VI – De outra banda, para o uso do fundamento consagrado na alínea d), do nº1, do artigo 449º, do CPPenal, clama-se pela verificação dos seguintes pressupostos: que a decisão a rever haja transitado em julgado, requisito geral; que após o trânsito em julgado surjam factos novos ou novos meios de prova; que esses factos novos valham ou possam influir por si ou combinados com outros que hajam sido apreciados no processo; que da apreciação, ponderação e valoração desses novos factos ou meios de prova se crie e se estabeleça, num juízo apreciativo da situação julgada, uma dúvida séria, fundada e robusta sobre a justiça da condenação. VII – Aqui também se exige que os factos e / ou meios de prova novos têm de ser novos, no sentido de desconhecidos do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento ou, no mínimo, que a sua não exibição e consideração na decisão condenatória resulte de circunstâncias justificativas da sua não apresentação tempestiva. VIII- Esta exigência tem acalento no princípio da lealdade processual pois, se o interessado conhecia os factos e / ou provas anteriormente e não o invocou aquando do julgamento não pode querer o fazer em momento oportuno futuro, evitando-se, assim, abrir a porta, com o recurso de revisão, a meras estratégias de defesa, ou dar cobertura a inépcias ou desleixos dos sujeitos processuais. IX – Existindo, alegadamente, na altura dos factos em discussão, uma realidade configuradora de imputabilidade diminuída, por forma a que operava, então, uma inconciabilidade / incompatibilidade entre aqueles e outros posteriormente dados como assentes, então, na verdade, não se está perante realidade nova; ela já operava ao tempo dos primeiros. X - Sublinhe-se, ainda, que configurando a imputabilidade diminuída um dado / facto iminentemente pessoal, não poderia o Recorrente (arguido) o mesmo desconhecer ou, pelo menos, não suspeitar da sua existência. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam em Conferência na 3ª Secção Criminal I. Relatório 1. O arguido AA (doravante Recorrente) vem interpor recurso extraordinário de revisão da sentença datada de 18 de maio de 2023, proferida pelo Tribunal da Comarca de Viseu - Juízo de Competência Genérica de Esposende – Juiz 1, no Processo nº 39/22.5GTVCT, confirmada por Acórdão de 13 de junho de 2023 do Tribunal da Relação de Coimbra, e já transitado em julgado, onde foi condenado na pena de 11 (onze) meses de prisão, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, pelo período de 2 (dois) anos, pela prática em autoria material e sob a forma consumada, de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292º, nº 1, 69º, nº 1, alínea a), 75º, nº 1 e 76º, nº 1 do CPenal. 2. Esta pretensão, tal como decorre do instrumento recursivo, assenta no plasmado nas alíneas c) e d), do nº 1, do artigo 449º, do CPPenal, considerando o Recorrente que os factos que serviram de fundamento à sua condenação, nestes autos, se mostram inconciliáveis com os dados como provados noutras sentenças e que desta oposição resultam graves dúvidas sobre a justiça da condenação, sendo que, igualmente, se verifica um quadro de novos factos ou meios de prova que combinados com os que foram apreciados em outros processos, suscita graves dúvidas sobre a justeza da sua condenação, rematando em conclusões o seu petitório, nos seguintes termos: (transcrição) I. O Recorrente foi condenado por sentença proferida pelo Juízo Local Criminal de Viseu em 18-05-2023, conformada pelo Tribunal da Relação de Coimbra, pela prática, em 22-04-2023 de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292.º n.º 1 e 69.º n.º 1 al. a), 75.º n.º 1 e 76.º n.º 1, todos do Código Penal, na pena de 11 (onze) meses de prisão. II. Julgou-se provado, e por isso se condenou o Arguido, entre outros factos, que “O arguido agiu de forma livre e com o propósito concretizado de conduzir veículo na via pública, bem sabendo que havia ingerido bebidas alcoólicas e que, por esse facto, não se encontrava em condições de efectuar uma condução prudente. e 3 - O arguido sabia ainda que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.” III. Sucede, porém, que, da prova pericial produzida nos Proc. nºs 455/23.5GCVIS, 518/23.7GCVIS e 640/23.0GCVIS todos do Juízo Local Criminal de Viseu – Juiz 1 resulta que o arguido é portador de uma síndroma de dependência alcoólica e de perturbação amnésica devido ao uso de álcool e que à data da prática dos factos, todos praticados na mesma altura, o arguido tinha diminuída a sua capacidade para avaliar o carácter proibido dos atos que praticou ou para se determinar de acordo com essa avaliação. IV. E que, por isso,“É inimputável quem, por força de uma anomalia psíquica, é incapaz, no momento da prática do facto, de avaliar a ilicitude deste ou de se determinar de acordo com essa avaliação” nos termos do disposto no artigo 20º, do Código Penal. V. A inimputabilidade em razão de anomalia psíquica representa um obstáculo à determinação da culpa, pelo que inexistindo culpa, inexistirá crime. VI. Do que se deixa dito resulta estar preenchido o disposto no art. 449º nº 1 c), possibilitando revisão: “Os factos que servirem de fundamento à condenação forem inconciliáveis com os dados como provados noutra sentença e da oposição resultarem graves dúvidas sobre a justiça da condenação;” dado que os factos dados como provados neste processo e nos outros três são inconciliáveis no que à culpa se reporta. VII. Cremos também estarem reunidos os pressupostos da alínea d) do art. 449º nº 1 do CPP: “Se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação”, que também permitem a revisão. VIII. Efectivamente as provas perícias realizadas e que fundamentaram as decisões proferidas julgaram o arguido AA criminalmente inimputável, em razão de anomalia psíquica não foram valoradas nos presentes autos por serem, à data, desconhecidas. IX. Ao serem agora conhecidas colocam em causa a justiça da condenação aplicada ao arguido, numa pena de prisão de 11 meses. X. Pelo que, devem as provas entretanto obtidas ser apreciadas pelo Supremo Tribunal de Justiça. XI. Requer-se a V. Exas. que, sendo autorizada a revisão, se suspenda a execução da pena de prisão aplicada ao Arguido até à decisão final. 3. Recebido que foi o requerimento de revisão, e para tal notificado, o Digno Mº Pº, apresentou resposta, nos termos do plasmado no artigo 454º, primeira parte –, em peça que finalizou, com as seguintes conclusões: (transcrição) 1. O arguido foi condenado nestes autos por, no dia 22 de Abril de 2023, pelas 18h37m, conduzir o veículo ligeiro de passageiros, com a matrícula V1, na estrada municipal 585, em ..., após ter ingerido bebidas alcoólicas e apresentando uma taxa de álcool no sangue de pelo menos 2,404 g/l, correspondente à TAS registada de 2,53 g/l, após deduzido o erro máximo admissível; que o arguido agiu de forma livre e com o propósito concretizado de conduzir veículo na via pública, bem sabendo que havia ingerido bebidas alcoólicas e que, por esse facto, não se encontrava em condições de efectuar uma condução prudente e que sabia ainda que a sua conduta era proibida e punida por lei penal. 2. Nestes autos, o Tribunal deu como provadas as anteriores condenações sofridas pelo arguido, todas em penas de multa e penas de prisão, por factos praticados no período compreendido entre 6 de Março de 2009 e 22 de Outubro de 2018. O Tribunal deu ainda como provado que o arguido esteve ininterruptamente em cumprimento de pena de prisão na habitação no período compreendido entre 13 de fevereiro de 2019 e 11 de fevereiro de 2021. 3. No decurso da audiência de julgamento, não foi invocada qualquer incapacidade do arguido para compreender a ilicitude dos factos praticados, tendo o arguido prestado declarações confessórias, onde além do mais reconheceu sabia “o que estava a fazer”. 4. Os exames periciais realizados posteriormente no âmbito dos processos n.ºs 455/23.5GCVIS, 518/23.7GCVIS, do Juízo Local Criminal de Viseu – Juiz 1 concluem que “O examinado apresenta clínica compatível com o diagnóstico de Dependência de álcool, uso atual, contínuo, e Perturbação amnésica devido ao uso de álcool inscritas nas rúbricas 6C40.20/6D72 da 11ª Revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-11) da Organização Mundial de Saúde (OMS)” e que “À data dos factos, não existem dúvidas sobre o estado de intoxicação pelo álcool”, sendo a perita médica “da opinião que o examinando possuía o seu discernimento sensivelmente diminuído quando se colocou em estado de inimputabilidade” e existindo “risco de repetição de factos semelhantes aos actuais”. 5. O exame pericial realizado no âmbito do processo n.º 640/23.0GCVIS conclui que a patologia do arguido “condiciona de forma ligeira a autodeterminação do examinando e que “nada impede que o examinando seja declarado como possuindo uma imputabilidade diminuída para os factos que lhe são imputado”. 6. A imputabilidade, ou a capacidade de ser responsabilizado penalmente, é avaliada no momento da prática do facto ilícito, pelo que a imputabilidade ou não depende da sua condição mental no exacto instante em que cometeu o crime, e não em momentos anteriores ou posteriores. 7. Mesmo com base nas perícias efectuadas no âmbito dos processos n.ºs 455/23.5GCVIS, 518/23.7GCVIS e 640/23.0GCVIS, e tendo por base a imputabilidade diminuída do arguido, o julgador poderia ter concluído que inexistia fundamento para uma declaração de inimputabilidade, por à imputabilidade diminuída não corresponder uma inexistência de culpa, consoante a personalidade do arguido manifestada na prática do facto. 8. Nestes termos, a factualidade dada como provada no âmbito dos processos n.ºs 455/23.5GCVIS, 518/23.7GCVIS e 640/23.0GCVIS não é absolutamente inconciliável com aquela que foi dada como provada nestes autos, no que concerne à consciência da ilicitude e à culpa, inexistindo qualquer fundamento no alegado pelo recorrente quando pugna pela revisão da sentença. 9. A capacidade do arguido para compreender a ilicitude dos factos e se se determinar de acordo com os mesmos não pode ser entendida como um novo facto – precisamente porque o estado de saúde do próprio arguido era do seu conhecimento pessoal e, a sentir alguma afectação das suas capacidades, no momento da prática dos factos, esta tinha obrigatoriamente que ser invocada no decurso da audiência de julgamento, o que não aconteceu, tendo o arguido confessado integralmente e sem reservas os factos, incluindo os reportados ao elemento subjectivo do tipo legal de crime. 10.Afigura-se-nos que o arguido pretende fazer apelo ao recurso extraordinário de revisão para fazer face à sua inércia, e perante a iminência do cumprimento de uma pena de prisão efectiva… 11.As perícias realizadas nos processos n.ºs 455/23.5GCVIS, 518/23.7GCVIS e 640/23.0GCVIS não constituem nova prova que inviabilize as conclusões a que chegou este Tribunal para condenar o arguido, precisamente porque em causa não está uma inimputabilidade inequívoca. 12.Isto porque à imputabilidade diminuída não corresponde necessariamente uma culpa diminuída - ela tanto pode conduzir a uma culpa agravada, como a uma culpa atenuada, tudo dependendo das características da personalidade do agente reflectidas no facto. E não se alcança em que medida a personalidade do arguido, manifestadas nas declarações prestadas nos autos, evidencia incapacidade de compreender a ilicitude do facto e se se determinar de acordo com os mesmos. 13.Deste modo, a questão da imputabilidade diminuída não justifica, em si mesma, uma reapreciação da decisão anterior, com quebra do caso julgado, inexistindo qualquer incompatibilidade ou incoerência das reacções criminais. 4. Em sequência, de seu lado, o Senhor Juiz junto do Tribunal da condenação, em 2 de julho de 2025, proferiu a seguinte informação sobre o mérito do pedido, em obediência ao plasmado no artigo 454º, parte final - do CPPenal, concluindo pela concessão da revisão da decisão condenatória proferida nos autos principais: (transcrição1) (…) Se bem interpretamos a peça recursiva assenta o entendimento do recorrente, primeiramente, na inconciliabilidade entre as decisões irrogadas proferidas no âmbito dos processos nºs 455/23.5GCVIS, 518/23.7GCVIS e 640/23.0GCVIS, todos do Juízo Local Criminal de Viseu – Juiz 1 com aquela aqui prolatada, pois que ali se julgou, com base nos competentes exames periciais, o arguido criminalmente inimputável, sujeitando-o a medida de segurança suspensa na sua execução. Evidencia-se que, como bem nota o Ministério Público os factos ajuizados naqueles processos são posteriores - 15-05-2023, 05-06-2023 e 17-07-2023 - aos aqui sindicados - pois que a condução etilizada sub judice sucedeu em 22-04-2023. Razão pela qual é elementar concluir que esse juízo pericial em torno da inimputabilidade não foi realizado por referência aos factos aqui ajuizados, não constando sequer dos relatórios periciais qualquer alusão a um marco temporal a partir do qual a imputabilidade diminuída vem preexistindo e que permita concluir que já vingava à data de 22-04-2023. Acresce que os exames periciais posteriormente realizados convergem para a existência de uma imputabilidade diminuída e não de uma inimputabilidade tout court, isto é, que o examinando possuía o seu discernimento sensivelmente diminuído quando se colocou em estado de inimputabilidade existindo risco de repetição de factos semelhantes aos actuais. Lendo-se no art. 20.º, n.º 2 do Código Penal que pode ser declarado inimputável quem, por força de uma anomalia psíquica grave, não acidental e cujos efeitos não domina, sem que por isso possa ser censurado, tiver, no momento da prática do facto, a capacidade para avaliar a ilicitude deste ou para se determinar de acordo com essa avaliação sensivelmente diminuída. E como lapidarmente dilucida o Sr. Desembargador Paulo Guerra (no aresto do Tribunal da Relação de Coimbra de 31-08-2022, Processo n.º 441/20.7PBLRA.C1, acessível em www.dgsi.pt) tal preceito possibilita ao julgador duas alternativas: pode, comprovada a existência de uma anomalia psíquica do agente e afectando esta a capacidade para o mesmo poder avaliar a ilicitude do facto ou para se determinar de acordo com a mesma, tornando-a sensivelmente diminuída, considerar o agente como imputável (diminuído) ou antes declará-lo como inimputável, sendo que a primeira figura não se mostra prevista expressamente na lei. Donde, como sumariado no acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 18-09-2019 (Relatora Ana Carolina Cardoso, Processo n.º 118/18.3JALRA.C1) “à imputabilidade diminuída não corresponde necessariamente uma culpa diminuída. Ela tanto pode determinar uma culpa agravada, como uma culpa atenuada, tudo dependendo dos traços de personalidade do agente reflectidos no facto”. Ou já nos dizeres do Sr. Desembargador Paulo Guerra no supracitado aresto, é incontestável que à imputabilidade diminuída não corresponde necessariamente uma culpa diminuída, ela tanto pode conduzir a uma culpa agravada, como a uma culpa atenuada, tudo dependendo das características da personalidade do agente reflectidas no facto; quando estas se revelarem especialmente desvaliosas do ponto de vista do direito, estaremos perante uma culpa agravada, a que corresponderá uma pena necessariamente mais grave. Concordantemente, o aresto do Supremo Tribunal de Justiça de 03-07-2014 (Relator Manuel Augusto de Matos, Processo n.º 291/17.8JAAVR.P1.S1, todos acessíveis em www.dgsi.pt). Mas se assim é, tem este Tribunal, em consciência, de reconhecer que a condução etilizada aqui em juízo ocorreu nem sequer um mês antes daqueloutra ajuizada nos autos com o n.º 455/23.5GCVIS sendo assim evidente a proximidade histórica e, como tal, não meramente abstracta a hipótese de, à data de 22-04-2023, o arguido já apresentar um discernimento sensivelmente diminuído que poderia (ou não) fundar a referida declaração de inimputabilidade de harmonia com o art. 20.º, n.º 2 do Código Penal. O fundamento de revisão de sentença previsto na al. c) do n.º 1 do art. 449.º do CPP contém dois pressupostos, de verificação cumulativa: a inconciliabilidade entre os factos que serviram de fundamento à condenação e os dados como provados noutra sentença e dessa oposição resultarem dúvidas graves sobre a justiça da condenação. Assim, o aresto do Supremo Tribunal de Justiça de 17-01-2024 (Relator Lopes da Mota, Processo n.º 51/20.9PAOER-A.S1) acessível em www.dgsi.pt. Sendo ainda seguro ante a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça que a “evolução do pensamento legislativo e da jurisprudência sobre o conceito de “facto”, partindo de uma perspectiva naturalística para uma concepção normativa, resulta que, ao utilizar o termo “factos”, a lei se refere a todos os factos que constituem objecto da prova, com relevância para a decisão do processo, podendo incluir factos jurídicos e factos processuais penais. A inimputabilidade em razão de anomalia psíquica, que depende da prova sobre a capacidade de avaliação da ilicitude e de determinação da conduta do agente com referência ao concreto facto típico (artigo 20.º do Código Penal), inclui-se no conceito de “facto”, na acepção do artigo 449.º do CPP.”. Assim, o aresto do Supremo Tribunal de Justiça de 11-10-2017 (Relator Lopes da Mota, Processo n.º 1966/12.3TASXL) consultável em www.dgsi.pt. E ante as conclusões diametralmente opostas em torno da imputabilidade do condenado nestes autos e naqueles com os n.ºs 455/23.5GCVIS, 518/23.7GCVIS e 640/23.0GCVIS é, parece-nos, evidente a oposição de julgados, dela advindo graves dúvidas sobre a justiça da condenação, pois que a apurar-se a imputabilidade diminuída reconhecida naqueles autos poderá o condenado ser também aqui declarado inimputável e sujeito a medida de segurança e não ao cumprimento de uma pena (de prisão efectiva). Veja-se Conde Correia, “Comentário Judiciário do Código de Processo Penal”, Tomo V, Coimbra: Almedina, 2024, p. 527 e o aresto do Supremo Tribunal de Justiça de 27-03-2019 (Relator Manuel Augusto de Matos, Processo n.º 141/15.0PVLSB-B.S1) acessível em www.dgsi.pt. Repise-se, a inimputabilidade diminuída já atestada nos processos com os n.ºs 455/23.5GCVIS, 518/23.7GCVIS e 640/23.0GCVIS até poderá, in casu, redundar numa conclusão diversa em torno da inimputabilidade à data de 22-04-2023, mas tal desfecho per se, cremos, não aparta o fundamento do recurso evocado. Além do mais e na esteira do decidido pelos arestos do Supremo Tribunal de Justiça de 27-03-2019 e 11-10-2017 - já citados - se nos afigura que é também de admitir a revisão por se terem descobertos novos factos ou meios de prova que suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação, pois como se sumariou no derradeiro aresto: “O facto de o arguido ter sido declarado inimputável constitui um facto novo, tal como é novo o meio de prova desse facto, isto é, a sentença transitada em julgado que declarou a inimputabilidade e aplicou a medida de segurança. Este novo meio de prova, que consubstancia uma decisão fundada em juízo pericial de valor probatório reforçado, que se presume subtraído à livre apreciação do julgador (artigo 163.º, n.º 1, do CPP), é, por si mesmo, apto a criar elevada dúvida sobre a justiça da condenação”. Veja-se ainda Conde Correia, Op. Cit., p.530 e a demais jurisprudência ali mencionada. Os factos devem ser novos não só para o tribunal, como inclusivamente para o arguido recorrente. É esta a única interpretação que se harmoniza com o carácter excecional do recurso de revisão. Na verdade, essa excecionalidade não é compatível com a complacência perante situações como a inércia do arguido na dedução da sua defesa, ou a adoção de uma estratégia de defesa incompatível com a lealdade processual, que é uma obrigação de todos os sujeitos processuais”. Assim, o aresto do Supremo Tribunal de Justiça de 1-03-2018 (Relator Maia Costa, Processo n.º 558/12.1JELSB-I.S1) disponível em www.dgsi.pt. E é inegável que o arguido, em momento algum, do julgamento esboçou a sua afeção quando até tinha capacidades cognitivas para o fazer por conta do espelhado nos relatórios periciais, mas na esteira do que se decidiu no referido arresto do Supremo Tribunal de Justiça de 11-10-2017, julgamos que tal constatação não obsta à substanciação da al. d). Ante o exposto pelo recorrente, o supra exarado e tendo ainda presente o art. 455.º, n.º 4 do Código de Processo Penal, consigna-se que nada se determinará nos termos e para os efeitos do art. 453.º, n.º 1 do Código de Processo Penal. Venerandos Juízes Conselheiros, Em conformidade com o supra exposto, apresenta-se, pois, informação no sentido de que, com o devido e merecido respeito por opinião diversa, se nos afiguram verificados os fundamentos do recurso de revisão, nomeadamente a previsão da alínea c) e d) do artigo 449º, do Código de Processo Penal invocados pelo recorrente, donde a revisão rogada por AA deverá ser autorizada. 5. Já neste Supremo Tribunal de Justiça (STJ), no momento previsto no artigo 455º, o Senhor Procurador-Geral Adjunto, com sólida e atualizada fundamentação, emitiu parecer, no sentido da negação da revisão: (transcrição)2 (…) No âmbito dos autos de que o presente recurso extraordinário de revisão constitui apenso, foi AA acusado, em processo sumário, pela prática, no dia 22.04.2023, e como reincidente, de factos integradores da prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 69.º, n.º 1, alínea a), 75.º, n.º 1, 76.º, n.º 1, 292.º, n.º 1 do Código Penal. Em sede de julgamento em 1ª instância, no Juízo Local Criminal de Viseu - Juiz 2 -, foi condenado, por sentença datada de 18.05.2023, pela prática do crime pelo qual se mostrava acusado, na pena de 11 (onze) meses de prisão, bem como na pena acessória de 2 (dois) anos de proibição de conduzir veículos com motor. Em 16.03.2023 recorreu dessa decisão para o Tribunal da Relação de Coimbra, pedindo a execução da pena de prisão em que havia sido condenado em regime de permanência na habitação. Na motivação desse recurso, a dado passo, refere (vd. conclusão 10ª) que o seu principal (e talvez único) problema em termos de reintegração social seja o seu problema com o álcool. Em 01.02.2024 foram juntas aos autos certidões extraídas dos processos, igualmente do Tribunal de Viseu, com os NUIPC 455/23.5GCVIS e 518/23.7GCVIS, nas quais o arguido foi julgado criminalmente inimputável, em razão de anomalia psíquica, nos termos do artigo 20.°, n.°s 1, 2 e 3, do Código Penal, pela prática de factos suscetíveis de integrar a prática de 1 (um) crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. nos termos dos artigos 292.º, n.º 1 e artigo 69.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal, aplicando-lhe a medida de segurança de internamento, pelo período máximo de 1 ano, de acordo com o disposto nos artigos 91.° e 92.°, do Código Penal, pena esta que foi suspensa até à cessação do estado de perigosidade criminal, com o limite máximo de 1 ano (artigos 92.º, n.ºs 1 e 2 e 98.°, n.ºs 1 e 2, ambos do Código Penal), mediante a sujeição da arguida a um plano de acompanhamento em regime de ambulatório, sob a orientação da Direção Geral de Reinserção Social; Em 22.01.2025 o Tribunal da Relação de Coimbra profere acórdão mantendo integralmente a decisão e 1ª instância neste processo 382/23.6GCVIS. O arguido/recorrente então, em 28.01.2025, arguiu a nulidade do acórdão por omissão de pronúncia, dado o Tribunal da Relação não se ter pronunciado acerca das outras decisões judiciais e perícias ali efetuadas (que igualmente haviam sido juntas aos autos). Em resposta, o Tribunal da Relação de Coimbra, em acórdão datado de 12.03.2025, manteve a decisão anterior, afastando a existência da invocada nulidade por naquele ter existido pronúncia acerca de todas as questões que haviam sido levantadas no recurso. Na sequência, mostra-se interposto o presente recurso extraordinário de revisão. No mesmo, o arguido, baseando-se nas decisões (e exames) realizados nos processos atrás mencionados e ainda no decidido no processo 640/23.0GCVIS, alega que existem motivos para revisão da decisão condenatória, quer por via do constante na alínea c) do artº 449º do CPP (…). (…) No que se refere à alínea d), porque os factos que invoca, mesmo na sua alegação, não se podem entender como «novos»: Na verdade, o que o requerente alega é que a sua inimputabilidade existiria já à data dos factos pelos quais aqui foi condenado, tal como verificado em sede de exames realizados noutros processos em que foi arguido, em período temporal aproximado e por factos da mesma natureza. O facto não é, deste modo, «novo». Ora, assim sendo, ter-lhe-ia cabido, neste processo – tal como fez nos outros – solicitar a realização dos necessários exames periciais. Aquela circunstância poderia ter sido invocada à data do julgamento, por já então existente. Não foi descoberta posteriormente, não «nasceu» com as conclusões médicas dos exames levados a cabo nos outros processos. No máximo, o que se pode dizer é que o recorrente apenas depois se lembrou de invocar aquela inimputabilidade. (…) Ora, nada veio o recorrente alegar em termos de poder justificar o ter-se «esquecido» de invocar qualquer perturbação de que sofresse. Mas, mesmo se tivesse de forma consistente justificado aquele «esquecimento», sempre a jurisprudência mais recente deste Supremo Tribunal aponta no sentido de que isso não seria suficiente para poder ser admitida a revisão (…) o requerente necessariamente tinha conhecimento da existência dos factos que ora invoca, por pessoais. Se não os indicou (requerendo a efetivação de perícia), foi uma opção que tomou. Como referido por Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal, quarta edição, 2011, página 1207, «factos ou meios de prova novos são aqueles que eram ignorados pelo recorrente ao tempo do julgamento e não puderam ser apresentados antes deste (…). Se o arguido (ou o MºPº em seu benefício) conhecia os factos e os meios de prova ao tempo do julgamento e os podia apresentar, devia ter requerido a investigação desses factos e a produção desses meios de prova (…). Só esta interpretação faz jus à natureza excepcional do remédio da revisão e, portanto, aos princípios constitucionais da segurança jurídica, da lealdade processual e da proteção do caso julgado.» (…) Invoca ainda o arguido/requerente/recorrente a alínea c) do mencionado artº 449º do CPP, ou seja, a que prevê a possibilidade de revisão quando «Os factos que servirem de fundamento à condenação forem inconciliáveis com os dados como provados noutra sentença e da oposição resultarem graves dúvidas sobre a justiça da condenação (…) Ora no caso os factos não são inconciliáveis em si mesmos, pois o autor dos factos, que ocorreram e não estão em causa, foi o arguido, pelos quais teria de responder. O facto de num processo o arguido ser considerado inimputável e no outro imputável resulta da diferente apreciação pericial a que o arguido foi sujeito em momentos distintos, juízo esse subtraído à apreciação do tribunal (artº 163º CPP). Não há apreciação diferente da prova, mas a mesma valoração, ínsita nesse juízo pericial feito por pessoas diversas em momentos diversos. (…) No caso dos autos, embora a factualidade dum e dos outros processos seja muito similar, integrando mesmo tipo de ilícito, não se excluem – são situações ‘paralelas’ que não se podem entender integrar o conceito de ‘factos inconciliáveis’ numa e noutra decisão para efeitos daquela alínea d). Aliás, verifica-se que nem é sequer invocado que o arguido não tenha praticado os factos integradores do ilícito criminal que a sua conduta preencheu, apenas se questiona o modo como deverá ser punido pela sua prática, atento o dado como provado noutros processos quanto ao seu estado mental. Ou seja, nem é colocada a questão da existência de dúvidas sobre a justiça da condenação, muito menos a existência de dúvidas que se pudessem qualificar como ‘graves’, tal como é exigido pela alínea c) invocada. Assim, no máximo que se conseguiria alcançar com uma eventual revisão seria a alteração da pena/medida de segurança a aplicar, não que se verificasse a absolvição pela prática de qualquer um dos crimes praticados. Perante isto, e como tem vindo a ser entendido, não se colocando a possibilidade de absolvição, único caso em que o recurso de revisão deverá ser admitido (vejam-se, neste sentido, o acórdão deste STJ de 20.11.2014, no processo 131/06.3GCMMN-A.S1 [Relator – Souto de Moura], e ainda – a título meramente exemplificativo – os de 24.02.2021, no processo 95/12.4GAILH-A.S1 [Relator – Nuno Gonçalves] e de 02.12.2021, no processo 156/14.5TACLD-A.S1 [Relator – Eduardo Loureiro], há que concluir pela improcedência do pedido formulado pelo arguido. (…) Assim, e tal como no caso abordado naquele acórdão, não sendo aqui posta em causa a justeza da condenação, nem nenhum elemento sendo avançado para que possa ocorrer uma absolvição, nunca se justificaria a pretendida revisão. Assim sendo, sem necessidade de maiores considerações, é parecer do Ministério Público neste Supremo Tribunal de Justiça que o pedido de revisão formulado pelo requerente/arguido AA deverá ser negado. 6. Notificado deste pronunciamento, para efeitos do exercício do contraditório, o arguido nada disse. 7. Mostrando-se o recurso instruído com os pertinentes elementos, e nada obstando ao seu conhecimento, colhidos os vistos foi o processo remetido à Conferência (artigo 455º, nºs 2 e 3, do CPPenal). II. Fundamentação O recurso extraordinário de revisão anuncia no plano infraconstitucional o direito fundamental dos cidadãos, injustamente condenados, à revisão da sentença e à indemnização pelos danos sofridos, inscrito no artigo 29º, nº 6, da CRP3, emergindo como meio processual em cuja configuração legal se reflete a tensão entre o princípio da justiça e o da certeza e segurança do direito, e o da intangibilidade do caso julgado, que destes últimos é instrumental. Estas máximas, também estruturantes do Estado de Direito, cedem perante novos factos ou a verificação da existência de falhas essenciais de julgamento ou de procedimento suscetíveis de abalar a decisão4. Neste desiderato, o recurso de revisão apresenta-se como um expediente impugnatório que, contrariamente ao recurso de fixação de jurisprudência, também mecanismo de intervenção extraordinária, tem como escopo último oferecer um remédio contra erros que inquinem uma decisão judicial, provocando ulterior intervenção para que, através desta, se corrijam esses erros e se faça genuína e verdadeira justiça5. Assim, o fundamento da revisão assenta na ideia de que (…) a firmeza deve retroceder quando factos posteriormente descobertos demonstrem que a sentença se apresenta como manifestamente falsa e colide de forma insuportável contra os sentimentos de justiça ou quando a condenação não se fundamenta numa medida mínima de justiça do procedimento6. Ou seja, é uma via de reação contra sentenças e / ou despachos, transitados em julgado, em que o caso julgado se firmou em circunstâncias patológicas, conducentes à criação de quadro de injustiça clamorosa, mostrando-se assim como meio para eliminar / ultrapassar o “escândalo” dessa injustiça7. Tanto quanto se pensa, não se trata aqui de uma revisão do julgado / decidido, mas antes de um julgado novo com sustento em novos elementos8, sendo que entre o interesse em dotar / atribuir firmeza e segurança a determinado ato jurisdicional, máxime uma sentença ou acórdão, e o contraposto interesse em que não prevaleçam / dominem decisões que contradigam ostensiva e gritantemente a verdade e, através dela, a justiça, o legislador tem de escolher e, utilizando determinados mecanismos, mitigar / temperar a ideia do dogma absoluto do caso julgado9. Assim, face a determinados retratos, o princípio da imutabilidade da decisão deve ceder, e nas estritas e rigorosas condições da lei, sempre que tenha operado o injusto e o intolerável / inaceitável / inconcebível sacrifício da verdade no veredito tomado, envergando o recurso de revisão a natureza de um compromisso entre, por um lado, a salvaguarda do caso julgado, que assegura a certeza e a segurança do direito, condição essencial da manutenção da paz jurídica, e, por outro, as exigências da justiça material10. Neste contexto, a lei faz depender do conchavo de concretos pressupostos / requisitos a possibilidade de reabertura de um caso, apelando a um elenco de fundamentos, o qual, ao que transluz, é taxativo, não suportando quaisquer derivações11. E entre esses assola, em boa verdade, o primeiramente adiantado pelo Recorrente (arguido) e constante da alínea c), do nº 1 do artigo 449º do diploma que se vem mencionando, ou seja, o de Os factos que servirem de fundamento à condenação forem inconciliáveis com os dados como provados noutra sentença e da oposição resultarem graves dúvidas sobre a justiça da condenação. Olhando a este registo normativo, crê-se que para a procedência desta manifestação processual de revisão, o legislador clama pela verificação cumulativa de uma dúplice exigência, a ocorrência de inconciliabilidade entre os factos que serviram de fundamento à condenação e os dados como provados noutra sentença e que dessa inconciliabilidade ou oposição resultem graves dúvidas sobre a justiça da condenação. Diga-se, também, que esta inconciliabilidade factual reclama que entre os factos que serviram de fundamento à condenação e os dados como provados noutra sentença ocorra uma incompatibilidade / dissensão / antagonismo, ou seja, uma relação de exclusão, no sentido de que, se se tiver por provada determinada concreta matéria numa outra sentença, não podem ser, ao mesmo tempo, verdadeiros outros tidos por provados na sentença em revisão. Acresce, tanto quanto se vem entendendo, ao apelar-se à inconciliabilidade dos factos que serviram de fundamento à condenação com os dados como provados noutra sentença, o legislador limitou a inconciliabilidade aos factos provados na sentença em apreciação e aos factos provados na sentença fundamento e, por isso, não é legalmente relevante a inconciliabilidade entre factos não provados nas sentenças a rever e fundamento, entre factos provados na sentença revivenda e factos não provados na sentença fundamento e entre factos não provados na sentença questionada e factos provados na sentença fundamento12. Ou seja, somente os factos dados como provados em decisões judiciais podem ser inconciliáveis e desencadear este mecanismo extraordinário de quebra do caso julgado, sendo assim indispensável que os factos que, considerados provados, serviram de base à condenação e os também dados como provados numa outra sentença se excluam / anulem mutuamente13. Por outra banda, graves dúvidas sobre a justiça da condenação são todas aquelas que são de molde a pôr em causa, de forma séria e inaceitável, a condenação de determinada pessoa, sendo que aquelas terão de incidir sobre a condenação enquanto tal, a ponto de se colocar fundadamente o problema de o arguido dever ter sido absolvido14. Cotejando todos estes enunciados considerandos, cabe olhar a todo o quadro concreto que aqui se exibe. Tal como acertadamente entendido e cristalinamente veiculado pelo Digno Mº Pº junto deste STJ, calcorreando todo o processado, como se verá, imediata e prontamente se repara que não se mostram verificados os pressupostos da revisão requerida, com base neste pressuposto / fundamento. Resulta pacífico, crê-se, que nos autos agora em discussão (Processo nº 382/23.6GCVIS), e centrando-se na data de 22 de abril de 2023, se deu como provado (…) O arguido agiu de forma livre e com o propósito concretizado de conduzir veículo na via pública, bem sabendo que havia ingerido bebidas alcoólicas e que, por esse facto, não se encontrava em condições de efectuar uma condução prudente (…) O arguido sabia ainda que a sua conduta era proibida e punida por lei penal (…), sendo que em outros autos, mormente o Processo nº 640/23.0GCVIS, factos ocorridos em 17 de julho de 2023, se entendeu como provado (…) O arguido é portador de uma síndroma de dependência alcoólica e de perturbação amnésica devido ao uso de álcool (…) À data da prática dos factos, o arguido tinha diminuída a sua capacidade para avaliar o carácter proibido dos atos que praticou ou para se determinar de acordo com essa avaliação (…). Ou seja, numa situação, o Recorrente (arguido) foi considerado imputável, sendo que noutros autos posteriores, foi o mesmo tido como enfrentando quadro de imputabilidade diminuída. Numa leitura, ainda que rápida, destes apontamentos, imediatamente se perceciona que inexistem decisões incompatíveis sobre pessoas e factos ou sobre factos em relação à mesma ou mesmas pessoas, ou seja, não demonstra inconciliabilidade entre “factos” para a economia normativa da alínea c), do n.º 1, do artigo 449.º, do Código de Processo Penal15. Com efeito, no processo em apreciação o que se afirma é que o arguido, ao tempo, conduzindo um veículo a motor, o fazia sob o efeito de álcool, sabendo que tendo ingerido bebidas alcoólicas, não se encontrava em condições de efetuar uma condução adequada e prudente, sabendo e conhecendo que tal era proibido por lei. De outra banda, e em datas e momentos posteriores, em circunstâncias referidas a esses contextos, foi entendido e considerado que o arguido seria portador de determinada síndroma que (…) à data da prática dos factos (…) lhe tinha diminuído a sua capacidade para avaliar o caráter proibido dos atos que praticou. Exulta daqui, com evidente clareza, pensa-se, que nos autos posteriores ao aqui em causa, o que apenas se afirma é que no tempo e nas circunstâncias envolventes do ocorrido, o Recorrente (arguido) estava diminuído na sua capacidade de avaliação do seu comportamento, nunca se afirmando, nem sequer se insinuando, que tal se estendia a outras situações / quadros, nomeadamente anteriores. Acresce, e com bem o enfatiza o Digno Mº Pº junto do Tribunal recorrido, seguido pelo posicionamento assumido pelo Senhor Procurador-Geral Adjunto, neste Alto Tribunal, que as perícias feitas nos autos posteriores aos aqui em discussão, reportando-se (…) À data dos factos, não existem dúvidas sobre o estado de intoxicação pelo álcool (…) o examinando possuía o seu discernimento sensivelmente diminuído quando se colocou em estado de inimputabilidade (…), em nenhum momento afirmam o Recorrente (arguido) como inimputável e que essa situação advém desde determinado e certo momento, abrangendo a data da prática da factualidade constante do processo em revisão. O facto de num momento o Recorrente (arguido) ter sido considerado imputável e num outro com imputabilidade diminuída, in casu, assenta em quadros factuais ocorridos em momentos distintos e respeita a condutas que, podendo ser similares em abstrato, são absolutamente diversas em termos concretos, desde logo, porque reportadas a pedaços de vida absolutamente diferentes. Mais, a circunstância de o Recorrente (arguido) poder ser considerado com imputabilidade diminuída, como se sabe, não conduz à sua absolvição. Ante todo este expendido, mostra-se claro que não exuberam factos opostos e / ou inconciliáveis, inexistindo qualquer contradita / desmentido, sendo que as diferentes conclusões tiradas nos diversos processos não resulta de factualidade que se contradiga / contraponha / confronte porque, conforme se enunciou, estribam-se em momentos e tempos distintos. E, nessa senda, não exuberando factos incompatíveis, inconciliáveis e / ou antagónicos nos julgados transitados e em ponderação, igualmente não despontam quaisquer dúvidas, graves ou outras, sobre a justiça da condenação, o que faz sucumbir a pretensão apresentada neste vetor. * O Requerente (arguido) a suportar a sua pretensão, como atrás se referiu, igualmente se socorre do fundamento inserto na alínea d), do nº 1, do artigo 449º do CPPenal, ou seja, o de Se descobrirem factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação. Em sustento desde caminho recursivo alega que as perícias médicas realizadas no âmbito de processos posteriores, e que concluíram pela sua imputabilidade diminuída, configuram prova nova (…) cuja existência era ignorada ao tempo do julgamento não foram valoradas nos presentes autos, precisamente por serem desconhecidas. Conjeturando sobre esta normação, ao que se pensa, para a procedência da manifestação processual de revisão, o legislador clama pelos seguintes pressupostos: que a decisão a rever haja transitado em julgado, requisito geral; que após o trânsito em julgado surjam factos novos ou novos meios de prova; que esses factos novos valham ou possam influir por si ou combinados com outros que hajam sido apreciados no processo; que da apreciação, ponderação e valoração desses novos factos ou meios de prova se crie e se estabeleça, num juízo apreciativo da situação julgada, uma dúvida séria, fundada e robusta sobre a justiça da condenação16. Assim, e grosso modo, para além de uma decisão transitada em julgado, para fazer operar o alicerce aqui em discussão - alínea d) do nº 1 do artigo 449º do CPPenal - importa a verificação cumulativa de dois pressupostos: por um lado, a descoberta de novos factos ou meios de prova e, por outro lado, que tais novos factos ou meios de prova suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação17. Quanto à primeira exigência, ultrapassando posicionamento existente durante largo período temporal de que essa novidade se dirigia apenas ao tribunal, sendo indiferente que o recorrente já conhecesse ou não a mesma, passou a dominar o entendimento de que os factos e / ou meios de prova novos têm de ser novos, no sentido de desconhecidos do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento ou, no mínimo, que a sua não apresentação e consideração na decisão condenatória resulte de circunstâncias justificativas da sua não apresentação tempestiva18. Na verdade, e em apelo ao princípio da lealdade processual19, se o interessado conhecia os factos e / ou provas anteriormente e não o invocou aquando do julgamento não pode querer o fazer em momento oportuno futuro. Este balizar, tanto quanto se crê, pretende evitar abrir a porta, com o recurso de revisão, a meras estratégias de defesa, ou dar cobertura a inépcias ou desleixos dos sujeitos processuais e, nesse ensejo, obviar à transformação deste mecanismo recursório em expediente banal, perigando, por essa via, o interesse na estabilidade do caso julgado, para além do aceitável20. De outra banda, e no que concerne ao segundo pressuposto, míster é que os novos factos ou as novas provas se revelem tão seguros e / ou relevantes que suscitem / desencadeiem / provoquem dúvidas qualificadas / graves sobre a justiça da condenação; que da sua produção e consideração resulte não uma qualquer dúvida, mas sérias / evidentes / sólidas / irrefragáveis interrogações sobre a bondade da condenação21; aquelas que atinjam grave e profundamente um julgado passado na base de dados presentemente surgidos22. Partindo de todos estes enunciados considerandos, há que visitar todo o quadro concreto que aqui se exibe. Como primeiro tom, esta linha de defesa, ao que se pensa, entra em total contradição com o alicerce de revisão anteriormente analisado e trazido pelo Recorrente (arguido). Na verdade, se a realidade configuradora da alegada imputabilidade diminuída já existia na altura dos factos em discussão nestes autos, por forma a que existiria uma inconciabilidade / incompatibilidade entre aqueles e outros posteriormente dados como assentes, então, na verdade, não se está perante realidade nova. Ela já operava ao tempo dos primeiros. De outra banda, mostra-se confortadamente claro, por tudo o que se enunciou anteriormente, que nenhum sinal desponta que desenhe este mote de revisão. A existir a dita imputabilidade diminuída e a retroagir a mesma ao momento dos factos aqui em sindicância, era a mesma operante nesse tempo e, por conseguinte, não se trata de realidade nova. Por seu turno, a assim ser, nada tinha impedido - pelo menos nada se demonstra que o ilustre – que o Requerente (arguido) ao tempo e no devido momento, tivesse requerido a realização de perícia que avaliasse a vertente da sua imputabilidade. Sublinhe-se, ainda, que estando em causa um dado / facto iminentemente pessoal, não poderia o Recorrente (arguido) o mesmo desconhecer ou, pelo menos, não suspeitar da sua existência. Em último, reforce-se, o que decorre das perícias que foram levadas a cabo, é apenas e só uma ponderação centrada no momento das práticas ali em questão, não se apontando o menor sinal que alargue o espetro avaliativo feito ao momento da prática dos factos aqui em causa. Com efeito, pese embora a afirmação encetada na informação prestada pelo Tribunal a quo - sendo assim evidente a proximidade histórica e, como tal, não meramente abstracta a hipótese de, à data de 22-04-2023, o arguido já apresentar um discernimento sensivelmente diminuído que poderia (ou não) fundar a referida declaração de inimputabilidade – a verdade é que em nenhum passo das perícias realizadas, se discorre sobre a existência de alguma “limitação” na pessoa do Recorrente (arguido) remontando à data da factualidade apurada nestes autos, nem tal alguma vez se alegou e demonstrou. E, assim sendo, não assumem estas perícias a qualificativa de prova nova. Concatenando todos estes dados, entende-se como irrefutável que não se está ante realidade e / ou provas desconhecidas do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento, tendo desse desconhecimento resultado a sua não apresentação oportuna, sendo que por nenhum modo exubera retrato que traduza a exigência (…) suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação. A concretização / ilustração da existência de graves dúvidas sobre a justiça da condenação, aponta para provas, ainda que alegadamente novas, o que como se viu aqui não se verifica, possuam a virtualidade / capacidade / potencialidade de atingirem / abaterem de forma profunda e essencial uma decisão transitada em julgado23; provas que causem uma dúvida relevante, qualificada, atingindo um patamar tal que seria escandaloso / clamoroso / insustentável manter a estabilidade razoavelmente reclamada por uma decisão transitada em julgado24. Como se anteviu, não é aqui o caso pois, o Requerente (arguido) não seria absolvido. III - DECISÃO Nestes termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Supremo Tribunal de Justiça - 3ª Secção Criminal – em: a. Denegar a pretendida revisão da sentença proferida no Processo nº 382/23.6GCVIS; b. Condenar o Recorrente (arguido) nas Custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC (artigos 456º, 1ª parte, do CPPenal e 8º, nº 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III, em anexo); * O Acórdão foi processado em computador e elaborado e revisto integralmente pelo Relator (artigo 94º, nº 2, do CPPenal), sendo assinado pelo próprio, pelos Senhores Juízes Conselheiros Adjuntos e pelo Senhor Juiz Conselheiro Presidente da Secção. * Supremo Tribunal da Justiça, 1 de outubro de 2025 Carlos de Campos Lobo (Relator) Jorge Raposo (1º Adjunto) Lopes da Mota (2º Adjunto) Nuno António Gonçalves (Presidente da secção)
__________ 1. Apenas o que para aqui eleva, prescindindo-se da reprodução de peças processuais cujo conteúdo já consta do Relatório. 2. Reprodução dos aspetos relevantes do Parecer, expurgando-se toda a parte relativa ao histórico processual, já vertida nos pontos anteriores do Relatório. 3. ARTIGO 29.º (Aplicação da lei criminal) 1. (…) 2. (…) 3. (…) 4. (…) 5. (…) 6. Os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão da sentença e à indemnização pelos danos sofridos. 4. Neste sentido, CAVALEIRO DE FERREIRA, M., “Revisão Penal”, in Scientia Jurídica, XIV, nº 75, pp. 520 e 521 – (…) o direito não pode querer e não querer a manutenção duma condenação, em homenagem à estabilidade de decisões judiciais, a garantia dum mal invocado prestígio ou infabilidade do juízo humano, à custa postergação de direitos fundamentais dos cidadãos, transformados então cruelmente em vítimas ou mártires de uma ideia mais do que errada (…) da lei e do direito (…) é melhor aceitar como ónus da imperfeição humana, a existência de decisões injustas, que escondê-las, para salvaguardar um prestígio martelado sobre a infalibilidade do juízo humano e sob a capa de uma juridicidade directamente criada pelos tribunais(…). 5. FERREIRA, Amâncio, Manual dos Recursos em Processo Civil, 4ª edição, p. 334. 6. ROXIN, Claus e SCHÜNEMANN Bernd, Derecho Procesal Penal, Ediciones Didot, p. 691. 7. Neste sentido, ALBERTO DOS REIS, José, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, 1981, p. 158 8. OSÓRIO DA GAMA, Luís e BATISTA, Castro de Oliveira, Comentário ao Código de Processo Penal, Vol. IV, p. 403. 9. Neste sentido, ORBANEJA, Emílio e QUEMADA, Vicente, Derecho Procesal Penal, 11ª Edição, 1986, Madrid, p. 334. Igualmente, ROMEIRO, Jorge Alberto, “A Valorização da Magistratura pela Revisão”, in Scientia Jurídica, XVII, nºs 92 a 94, pp. 616 e ss. – Não surgiu a revisão para salvar a causa julgada, mas para prestigiar o judiciário, permitindo que, na esfera deste, fossem corrigidos (…) alguns de seus erros, como bem comprovam a História e o Direito (…) conceituámos a revisão como o reexame jurisdicional de um processo penal já encerrado por decisão transitada em julgado, mirando à sua reforma, quando contenha erro cuja reparação pelo próprio judiciário possa valorizá-lo como órgão de Estado gerador da causa julgada (…) Uma justiça que reconhece os próprios erros e corrige, que não os procura manter e defender com fórmulas vãs, não é uma justiça edificante, que só confiança pode inspirar (…). Também, na mesma linha de pensamento, o Acórdão do STJ, de 29/03/2007, proferido no Processo nº 625/2007 – 5º, referido em SIMAS SANTOS, Manuel, LEAL-HENRIQUES, Manuel, Recursos Penais, 9ª Edição, 2020, Rei dos Livros, p. 208 – (…) nenhuma legislação moderna adoptou o caso julgado como dogma absoluto face à injustiça patente (…) foi escolhida entre nós, uma solução de compromisso entre o dotar o acto jurisdicional de firmeza e segurança e o interesse de que não prevaleçam as sentenças que contradigam ostensivamente a verdade, e através dela, a justiça (…). 10. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ, de 04/07/2024, proferido no Processo nº 301/20.1T9MTS-A.S1, de 20/06/2024, proferido no Processo nº 18/18.7T9FND-B.S1 – (…) O recurso extraordinário de revisão de sentença, estabelecido no art. 449.ºe ss. do Código de Processo Penal constitui uma solução de compromisso entre a segurança que o caso julgado assegura e a alteração de decisões que seria chocante manter (…) – de 06/03/2024, proferido no Processo nº 361/18.5T9VPV-B.S1 - (…) Constitui jurisprudência pacífica que o recurso de revisão (…) visa reagir contra manifestos e intoleráveis erros judiciários; será a evidência de erro que permitirá sacrificar os valores da segurança do direito e do caso julgado, de modo a fazer prevalecer o princípio da justiça material, numa solução de compromisso entre a segurança que o caso julgado assegura e a reparação de decisões que seria chocante manter, todos disponíveis em www.dgsi.pt.↩ 11. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ, de 08/05/2024, proferido no Processo nº 158/22.8JACBR-B.S1 – (…) o recurso de revisão, como meio de reacção processual excepcional, visa reagir contra manifestos e intoleráveis erros judiciários, disciplinando o art. 449.º do CPP os casos taxativos em que este recurso extraordinário é admissível (…), de 15/01/2014, proferido no Processo nº 13515/04.2TDLSB-C.S1 – (…) Os fundamentos do recurso extraordinário de revisão de sentença são os taxativamente enumerados no art.449º, nº 1, do CPP (…), disponíveis em www.dgsi.pt. Ainda, GAMA, António, LATAS, António, CORREIA, João Conde, LOPES, José Mouraz, TRIUNFANTE, Luís Lemos, SILVA DIAS; Maria do Carmo, MESQUITA, Paulo Dá, ALBERGARIA, Pedro Soares de e MILHEIRO, Tiago Caiado, Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo V – artigos 399º a 524º, 2024, Almedina, p. 513 – O instituto jurídico extraordinário de revisão, ainda que em benefício do cidadão injustamente condenado, só é admissível nos casos expressamente previstos na lei (…). 12. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ, de 03/03/2010, proferido no Processo nº 2576/05.7TAPTM-A.S1, de 15/09/2021, proferido no Processo nº 699/20.1GAVNF-A.S1- O fundamento consistente na inconciliabilidade dos factos provados na decisão condenatória e em outra, exige que a realidade “retratada” numa e na outra sentença seja antagónica, reciprocamente excludente (…) A inconciliabilidade tem de referir-se a factos “que façam parte da arquitetura típica do crime, na vertente objetiva ou subjetiva” e à participação do condenado na sua prática(…), de 13/01/2021, proferido no Processo nº 757/18.2T9ESP-A.S1 – (…) O fundamento previsto no art. 449.º, n.º 1, al. c), do CPP exige que os factos que motivam a condenação e os provados em outra sentença definitiva realidade reciprocamente excludente (…)É irrelevante (…) a divergência entre os factos provados na sentença visada e os factos não provados em outra sentença (…) Não há inconciliabilidade entre um facto julgado provado na sentença condenatória e a não prova do mesmo facto em outra sentença (…), todos disponíveis em www.dgs.pt e de 21/05/2020, proferido no Processo nº 447.15.8GCTND.A.S1 – (…) exige que os factos que serviram de fundamento à condenação, ou seja, os factos provados na sentença respeitantes à imputação do crime e à determinação da pena sejam inconciliáveis com os factos provados noutra sentença, de modo a que no confronto de uns com outros se suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação (…) a incompatibilidade corresponde a uma insuportável contradição entre ter que se dar por ocorrido um facto na decisão a rever e ter que se dar por não ocorrido o mesmo facto noutra decisão e que dessa oposição resultem graves dúvidas sobre a justiça da condenação (…) é necessário que que entre esses factos exista uma relação de exclusão ou de oposição, no sentido de que, se se tiverem por provados determinados factos numa outra sentença, não podem ser, ao mesmo tempo, verdadeiros os tidos por provados na sentença revidenda (…), disponível em ECLI:PT:STJ. No mesmo sentido, GASPAR, António Henriques, CABRAL, José António Henriques dos Santos, COSTA, Eduardo Maia, OLIVEIRA MENDES, António Jorge de, MADEIRA, António Pereira, GRAÇA, António Pires Henriques da, Código de Processo Penal, Comentado, 2016, 2ª edição revista. Almedina, p. 1508 – o fundamento de revisão previsto na alínea c) obedece a dois pressupostos substantivos e outro adjetivo, todos de verificação cumulativa (…) a inconciliabilidade entre os factos que serviram de fundamento à condenação (…) e os dados como provados noutra sentença e (…) que dessa oposição resultem dúvidas graves sobre a justiça da condenação. O pressuposto adjectivo inultrapassável, consiste em que nem todos os factos (…) relevam (…) a inconciliabilidade pressuposta na lei é apenas e só a que resulta de factos provados numa e noutra sentença, e não quaisquer outros (…). 13. GAMA, António, LATAS, António, CORREIA, João Conde, LOPES, José Mouraz, TRIUNFANTE, Luís Lemos, SILVA DIAS; Maria do Carmo, MESQUITA, Paulo Dá, ALBERGARIA, Pedro Soares de e MILHEIRO, Tiago Caiado, ibidem, pp. 522 e 523. 14. Neste sentido, os Acórdão do STJ, de 15/09/2021 e de 13/01/2021, referidos na nota anterior - (…) Dúvidas sérias e graves capazes de evidenciar a injustiça da condenação são aquelas que demonstram que o arguido deveria ter sido absolvido. 15. Parecer do Digno Mº Pº, junto deste STJ – Referência Citius ......28. 16. Neste sentido, o Acórdão do STJ, de 20/09/2017, proferido no Processo nº 603/13.3GAPTL-A.S1, disponível em ww.dgsi.pt. Igualmente, GASPAR, António Henriques, SANTOS CABRAL, José António Henriques dois Santos, COSTA, Eduardo Maia, OLIVEIRA MENDES, António Jorge de, MADEIRA, António Pereira, GRAÇA, António Pires Henriques da, Código de Processo Penal, Comentado, 2016, 2ª edição revista. Almedina, pp. 1508 e 1509 – (…) exige, como pressuposto da revisão, por um lado, o surgimento de factos novos (…) factos novos relativamente aos considerados na sentença revidenda e, por outro, que esses novos factos suscitem dúvidas qualificadas “graves” sobre a justiça da condenação (…). 17. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ, de 08/01/2015, proferido no Processo nº 19/10.3GCRDD-E.S1, de 23/05/2024, proferido no Processo nº 401/19.0PAABT-C.S1 – (…) fundamento de revisão previsto na al. d) do n.º 1 do artigo 449º do CPP (…) nele se exige acerca da verificação cumulativa da novidade do facto ou meio de prova desconhecido ao tempo do julgamento ou, pelo menos, que a sua não apresentação e consideração na sentença condenatória resulte de circunstâncias justificativas da sua não apresentação tempestiva e que da sua produção e consideração resulte não uma qualquer dúvida, mas graves dúvidas sobre a justiça da condenação. disponível em www.dgsi.pt. 18. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ mencionado na nota anterior, de 08/01/2015 - (…) hoje em dia pode considerar-se maioritária a jurisprudência do STJ que entende que “novos” são tão só os factos e/ou os meios de prova que eram ignorados pelo recorrente ao tempo do julgamento e, porque aí não apresentados, não puderam ser considerados pelo tribunal (…)-, de 13/03/2024, proferido no Processo nº 19/21.8SFPRT-D.S1 – (…) a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a considerar de forma pacífica, desde já há algum tempo, que factos e/ou meios de prova novos têm de ser novos, no sentido de desconhecidos do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento ou, pelo menos, que a sua não apresentação e consideração na sentença condenatória resulte de circunstâncias justificativas da sua não apresentação tempestiva e que da sua produção e consideração resulte não uma qualquer dúvida, mas graves dúvidas sobre a justiça da condenação (…) e de 04/07/2024, proferido no processo nº 301/20.1T9MTS-A.S1- (…) Os factos e/ou as provas têm de ser “novos” no sentido de desconhecidos do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento, tendo desse desconhecimento resultado a sua não apresentação oportuna, considerando-se ainda equiparável ao desconhecimento a não apresentação em julgamento, embora conhecidos do recorrente, desde que sejam apresentadas razões atendíveis e ponderosas que possam justificar essa omissão, todos disponíveis em www.dgsi.pt. 19. Máxima que não se assumindo como noção jurídica autónoma, sendo sobretudo de natureza essencialmente moral, reclama a todos os intervenientes no processo que se comportem de forma aberta e nessa medida, sugere que qualquer imperfeição notada, seja de pronto suscitada por forma a causar o menor dano na tramitação processual, e não como último argumento que se mantém resguardado para se utilizar como derradeiro recurso caso o resultado final não agrade. 20. Neste sentido, o Acórdão do STJ, de 12/09/2009, proferido no Processo nº 1077/00.4JFLSB-C.S1, disponível em www.dgsi.pt.. 21. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ, de 15/05/2024, proferido no Processo nº 1205/20.3SFLSB-A.S1 – (…) que factos e/ou meios de prova novos têm de ser novos, no sentido de desconhecidos do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento ou, pelo menos, que a sua não apresentação e consideração na sentença condenatória resulte de circunstâncias justificativas da sua não apresentação tempestiva e que da sua produção e consideração resulte não uma qualquer dúvida, mas graves dúvidas sobre a justiça da condenação (…) -, de 06/03/2024, proferido no Processo nº 361/18.5T9VPV-B.S1 – (…) os factos e as provas têm de ser novos, no sentido de desconhecidos do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento, derivando a sua não apresentação oportuna desse desconhecimento ou, no limite, duma real impossibilidade de apresentação da prova em julgamento; e a dúvida sobre a justiça da condenação tem de ser séria e consistente (…) -, de 08/01/2015, proferido no Processo nº 19/10.3GCRDD-E.S1, disponíveis em www.dgsi.pt. Também, GASPAR, António Henriques, SANTOS CABRAL, José António Henriques dois Santos, COSTA, Eduardo Maia, OLIVEIRA MENDES, António Jorge de, MADEIRA, António Pereira, GRAÇA, António Pires Henriques da, ibidem, p. 1509. 22. Neste sentido, LEAL-HENRIQUES, Manuel, Anotação e Comentário ao Código de Processo Penal de Macau, Volume III (Artigos 362º a 499º), 2014, Centro de Formação Jurídica e Judiciária, p.454. 23. Neste sentido, entre outros, o Acórdão do STJ de 12/09/2024, proferido no Processo nº 127/20.2GAVNO-B.S1, disponível em www.dgsi.pt. 24. Neste sentido, os Acórdãos do STJ de 20/09/2017, proferido no Processo nº 603/13.3GAPTL-A.S1, de 10/03/2022, proferido no Processo nº 983/11.5TAOER-B.S1 e de 29/4/2009, proferido no Processo nº 15189/02.6.DLSB.S1, todos disponíveis em www.dgsi.pt. |