Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
104/2002.L1.S1
Nº Convencional: 1ª SECÇÃO
Relator: GABRIEL CATARINO
Descritores: CONTRATO DE EMPREITADA
CARÁCTER SINALAGMÁTICO
OBRIGAÇÕES RECÍPROCAS
ALTERAÇÃO
OBJECTO NEGOCIAL
PREÇO
DETERMINAÇÃO DO PREÇO
Data do Acordão: 05/08/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática: DIREITO CIVIL - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES/ CONTRATOS
Doutrina: - Andrade da Silva, Jorge, "Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas", 8.ª ed., 2003, pág. 52.
- Antunes Varela, João, “Das Obrigações em Geral”, II Vol., Almedina, 5.ª edição, 1992, págs. 14-15.
- Brandão Proença, José Carlos, “Lições de Cumprimento e Não Cumprimento das obrigações”, Coimbra Editora, 2011, págs. 133, 137-138.
- Cura Mariano, João, “Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra”, Almedina, Coimbra, 2008, págs. 45 a 61.
- Pereira Coelho, “Obrigações” (Sumários das Lições ao curso de 1966-1967).
- Pessoa Jorge, F. “Lições de Direito das Obrigações”.
- Romano Martinez, Pedro, “Cumprimento Defeituoso. Em especial na Compra e Venda e na Empreitada”, Colecção Teses, Almedina, 2001, págs. 129-157; “Direito das Obrigações (Parte Especial) – Contratos”, Almedina, 2.ª edição, 2001, pág. 395-397.
Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 406.º, N.º1, 798.º, 801.º, N.º1, 883.º, 1207.º, 1208.º, 1211.º, 1214.º, 1218.º, 1219.º, 1224.º, 1225.º,
DL N.º 405/93, DE 10-12: - ARTIGO 7.º
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 12-04-2007, EM WWW.DGSI.PT .
Sumário :

I - A etiologia de um contrato de empreitada está na obrigação assumida pelo empreiteiro de realizar – prestação de facere – uma obra, segundo um plano e com características previamente definidas no conteúdo contratual acordado com o dono da obra, em que este assume a obrigação do pagamento do respectivo preço (art. 1207.º do CC).
II - Sem prejuízo da possibilidade da variação da modalidade de cálculo do preço – global ou à forfait, por medida, por artigo ou mesmo por tempo –, o contrato de empreitada distingue-se de outros contratos de troca pela natureza da prestação não monetária a que uma das partes, o empreiteiro, está adstrita: a realização de uma obra.
III - O preço representa a retribuição devida ao empreiteiro pela realização da obra e tem de ser fixado em dinheiro (art. 883.º, ex vi art. 1211.º do CC), não se exigindo qualquer relação de proporcionalidade entre a remuneração do empreiteiro e a qualidade ou quantidade da sua prestação.
IV - O contrato de empreitada caracteriza-se por ser bivinculante e sinalagmático, visto que dá lugar a obrigações recíprocas, ficando as partes, simultaneamente, na situação de devedores e de credores e coexistindo prestações e contraprestações. Num dos pratos do sinalagma está a realização e entrega da obra e no outro a contra-prestação respectiva, a saber, o pagamento do preço acordado.
V - Uma empreitada ajustada por “preço global” só tendencialmente assume uma feição rígida e fixa quanto a este elemento do contrato de empreitada.
VI - Ainda que as partes sujeitem a um determinado regime de pagamento a realização de uma obra, é licito que não queiram abdicar de proceder a ajustamentos, necessários e justificados, que uma execução continuada quase sempre coenvolve.
VII - Uma obra arranca de um projecto-concepção que, na sua concretização, requesta e exige uma proposta de orçamento, na qual são especificadas e individualizadas, respectivamente, determinadas quantidades de trabalho e de materiais; no entanto, o desenvolvimento da execução pode desencadear propostas de alteração ao projecto inicial, que não figurarem no orçamento. Não seria garante de uma justiça comutativa e de boa fé contratual que as partes, porque aceitaram uma forma ou modalidade de pagamento do preço, fossem despojadas da criteriosa adaptação e conformação do conteúdo prestacional à realidade originada pelas alterações e modificações que a execução contratual ditou.

Decisão Texto Integral:


Revista n.º 104/2002.L1.S1

Recorrente: “AA (Herdeiros), Lda.”

Recorrida: “BB – Sociedade Portuguesa de Hotelaria. Lda.” 

I. – RELATÓRIO.

Irresignada com a decisão proferida na apelação que a Ré-reconvinte, “BB – Sociedade de Hotelaria Portuguesa, Lda.”, havia interposto da decisão prolatada na 9.ª Vara do Tribunal Cível de Lisboa, e que na parcial procedência condenou a Autora-reconvinda, “AA (Herdeiros), Lda.”, a pagar à Ré-reconvinte a quantia de cento e sessenta e quatro mil setecentos e setenta e seis euros e trinta e cinco cêntimos (€164.776,35), depois de operada a compensação dos valores resultantes das parciais procedências dos pedidos da acção e da reconvenção, recorre a Autora-reconvinda, havendo a considerar os sequentes,    

I.1. - ANTECEDENTES PROCESSUAIS.

“AA (HERDEIRO), Lda.”, intentou a presente acção declarativa comum, sob a forma ordinária, contra “BB – SOCIEDADE PORTUGUESA DE HOTELARIA, LDA.”, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de 108.742,61€, acrescida de 36.393,60€ de juros moratórios vencidos, bem como nos juros moratórios vincendos.

Para tanto alega, em síntese, que as partes celebraram entre si um contrato de empreitada, nos termos do qual a Autora ficaria também obrigada a efectuar trabalhos extra que lhe fossem solicitados, cujo pagamento se regeria pelos mesmos moldes dos inicialmente previstos para a empreitada. A Autora efectuou diversos trabalhos a mais, constantes de ordens de execução que recebeu da fiscalização da obra e que foram sendo pagos pela Ré. Todavia, não pagou os últimos trabalhos efectuados, invocando dificuldades financeiras, pagamento esse que a Autora vem agora reclamar.

A Ré contestou e deduziu reconvenção, defendendo ser titular dum crédito sobre a Autora, excepcionando que seja efectuada a compensação entre os créditos, na parte coincidente e pedindo a condenação da Autora reconvinda no pagamento à Ré da parte do crédito que excede o daquela.

Para tanto narrou abundantemente tudo o que ocorreu no decurso da empreitada, com realce para o facto de as facturas da Autora virem todas desacompanhadas dos autos de medição, mas foram sendo pagas pela Ré, confiando que quaisquer irregularidades seriam corrigidas aquando do fecho de contas da empreitada. Finalmente, e apesar dos trabalhos não estarem concluídos, começaram as partes com reuniões, no decurso das quais a Autora admitiu – através de um documento – creditar a Ré pelo valor de obras não efectuadas ou cujas áreas ou dimensões não eram as previstas inicialmente. Entende a Ré que tem a haver o valor destas tarefas mal executadas ou não executadas de todo e que foram adiantadamente pagas, a abater ao valor das facturas cujo pagamento ora se pede e na parte em que são devidas. Refere ainda que muitos dos trabalhos orçamentados e cobrados respeitam a erros de medição ou de contagem constantes do chamado “adicional” ao contrato, pelo que a A deve devolver à R os valores respeitantes a esses trabalhos mal orçamentados. A não se entender assim estaríamos perante uma situação de locupletamento da A., com o valor orçamentado e pago para obras que não realizou e não eram de realizar, com o correspondente desembolso, por parte da R., que pagou por trabalhos que não foram feitos, porque pura e simplesmente não existiam para serem feitos.

A Proposta/Orçamento elaborada, medida, quantificada e avaliada pela Autora para servir de elemento de referência nas discussões do Eng.º Lory (CC) com o Metropolitano e no Contrato de Empreitada, continha graves e ilícitos aumentos naquelas medições e quantificações referindo, igualmente, “obras virtuais” que, por o serem não era possível executar em locais do Hotel, excessos esses que, aliados a outros relativos a trabalhos extra, tudo já pago pela Ré – com excepção do que se viesse a apurar quanto ao pedido da Autora – por solicitação da fiscalização, mostravam que ela, Ré, pagara mais ESC 87.197.924$00 do que o executado, pelo que deveria ter sido efectuada a compensação pedido e na diferença condenada a R.

Terminou requerendo a compensação do que viesse a ser apurado dever à Autora e a condenação desta a devolver ou pagar, a ela Ré, a diferença.

Na sua réplica argumentou a Autora que o contrato de empreitada era por preço global, pelo que tinha o direito de guardar para si a totalidade dos preços unitários e respectivo somatório, quer as obras tivessem sido, ou não, executadas designadamente as obras virtuais não obstante haver decidido creditar a R. pelo valor de alguns trabalhos orçamentados e não executados havendo, todavia, aceite numerosas correcções às medições/quantificações por si anteriormente indicadas como documentado nos documentos por nós já identificados nestas alegações.

A gerência da R. encarregou o Subdirector do Hotel, Eng.º M...A..., de confirmar todas as ordens de execução (menos as 3 que se referiam a pagamentos a fazer ao Metropolitano) em virtude de, em conjunto e duma vezada lhe haverem sido entregues pouco faltava para que a obra pudesse ser considerada finalizada – o que nunca sucedeu – pelo representante do Fiscal, Eng.º L..., para serem assinadas por aquela gerência que entendeu, atentas as dezenas de documentos então recebidos, só o poder fazer após a comparação dos conteúdos das OE com o da Proposta/Orçamento e facturas, tudo já pago e proceder à sua confirmação através da medição, quantificação e valorização dos trabalhos efectivamente executados pela A.
No âmbito de reuniões finais, e tomando por base a Proposta Adicional, a Autora elaborou e enviou à Ré, um "Resumo Geral dos Erros e Omissões", no qual se propôs creditar esta por obras não realizadas ou pela diminuição de quantidades de área ou artigos, creditando-a pelo valor de cobertores, espelhos e patins de degraus, pelo valor de rodapé em maronagres que não fora colocado, corrigiu o número de portas a tratar" diminuindo-o, corrigiu o comprimento do corrimão a colocar, eliminou o corrimão da escada de caracol e a reparação da guarda da escada de serviço, diminuiu o número de sanitas e lavatórios, de bases de duche, de urinóis, de autoclismos, de misturadores de lavatório, duche, fluxómetros, reduziu ou eliminou áreas de afagamento, betume, envernizamento e pintura a tinta em várias zonas, diminuiu ou eliminou quantidades de bancadas de lavatório, tectos em pladur, portas e sua pintura, janelas, tratamento de roupeiros e guarda-roupas, etc., etc. como consta dos documentos juntos de fls. 199-212 e 213.

Tiveram entretanto lugar reuniões para discutir as contas finais da empreitada nas quais a R. apresentou, desta vez por escrito, as reclamações resultantes do trabalho de confirmação que efectuara (fls. 214 e sgts.) e que mereceu resposta da A. através do seu documento denominado “Resumo Geral de Erros e Omissões” (fls. 199 e sgts.)

Neste “Resumo” a R. reconheceu as correcções feitas pela R. quanto a medições/quantificações e valores unitários mas só a creditou pelo valor de alguns items não o havendo feito quanto aos demais e em cujas colunas escreveu “medições de n/ responsabilidade” no sentido de que – ainda que tivesse aceite noutros items a correcção das medições/quantificações – não creditava a R. por se tratar de empreitada por preço global. Aliás já tomara conduta semelhante no art.º 48 da sua réplica. Decisões contrárias para cuja divergência a A. não deu explicações, se a empreitada era por preço global a A. teria de manter a totalidade do constante da sua Proposta já que, não o fazendo, aceitava que aquela não era por preço global ou que, sendo-o, permitia as respectivas correcções.

Ora, de harmonia com as intenções e desejos da R. quando contratou os serviços da A., só não tinham sido executados a repintura do telhado e a pintura de gradeamento, trabalhos que a R. decide efectuar directamente pedindo, por isso, que a A. a reembolse dos valores respectivos mencionados na Proposta/Orçamento.

Sendo assim e tendo em conta os interesses da R. quanto à execução das obras nada mais tinha ela a solicitar sobre as mesmas até porque não podia perder tempo com discussões quanto a obras mal executadas em virtude de o Hotel ter de estar em condições aquando do início da Expo 98 para satisfazer as reservas que anteriormente lhe haviam sido feitas pelas agências de viagens sob pena de ter de as indemnizar.

Como a A. soube desde sempre, essas obras virtuais e pagas pela R. sempre foram inexequíveis em virtude de não existirem no Hotel locais, espaços ou necessidade para as consumar, o que a A. confessa saber quando declarou, sem que as tenha executado, que a empreitada estava terminada (fls. 362).

Estando efectuadas as obras necessárias à reparação interior do Hotel, e havendo a R. decidido tomar sobre si a repintura do telhado e a pintura do gradeamento, não tem a R. mais obras ou trabalhos a solicitar à A.

A. forjou a sua Proposta/execução e facturação delas fazendo constar obras desde sempre inexequíveis aumentando, assim, em cerca de 87 milhões de escudos o valor da empreitada, valor com que enriqueceu, tendo a R. empobrecido por idêntico valor que já havia pago.

As disposições constantes do CE, do CEG do Dec. Lei 405/93 ou as relativas ao contrato de empreitada do nosso CC não apadrinham a utilização pelo empreiteiro de meios ínvios, ilegais, imorais e ilícitos com objectivos egoístas e meramente pessoais sem causa justificativa ou fundamento que respeitasse directa e imediatamente com a obra a realizar. Antes pelo contrário o proíbe de harmonia com os arts. 227 e 334 do CC.

O caso vertente rege-se pelo nosso direito das obrigações e, designadamente pelo disposto nos artigos já referidos e nos art. 473, 476, 479 e 762 do CC quer nos preliminares quer no contrato definitivo.

A acção da fiscalização em nada diminui a responsabilidade pela boa execução dos trabalhos (art.º 28, r), § 4.º do CEG)

Assim:

 - ou se considera que a A. tinha a obrigação de satisfazer fisicamente tudo o mencionado na Proposta/Orçamento e facturação – o que como já vimos não é possível – e, porque ela não o fez, condená-la, nos termos do art.º 762 CC, no pagamento do por nós solicitado;

- ou se aceita que a A. nunca pensou executar o que naquela proposta é meramente virtual e inexistente, e nela foi incluído para sobrevalorização fictícia do valor da proposta e da falsificada remuneração dela A. e, então, será esta condenada a pagar, a repetir ou indemnizar a R. por aplicação dos princípios que decorrem designadamente dos artigos 229, 334 e 476 do CC.

Replicou a Autora, pugnando pela improcedência da excepção e da reconvenção, qualificando o contrato celebrado como de empreitada por “preço global” e mantendo o alegado e peticionado na p.i.

Foi realizado julgamento, tendo, após a decisão da matéria de facto – cfr. fls. 1442 a 1493 – e decisão da reclamação que sobre a mesma recaiu,  sido proferida sentença – cfr. fls. 1602 a 1651 – que decidiu (sic): “Pelo exposto, decide-se julgar a acção parcialmente procedente e a reconvenção totalmente improcedente, e consequentemente:

a) Condenar a Ré no pagamento à Autora do montante líquido de 106.395,98€ (cento e seis mil, trezentos e noventa e cinco euros e noventa e oito cêntimos, por redenominação automática de 21.330.479$19).

b) Condenar a Ré no pagamento à Autora dos juros de mora, às taxas supletivas para os juros comerciais sucessivamente vigentes e as que venham a vigorar até integral pagamento, sobre a quantia referida na alínea anterior, contados desde 16 de Outubro de 1999, quanto ao capital de 95.231,04€ (noventa e cinco mil, duzentos e trinta e um euros e quatro cêntimos) e desde 7 de Janeiro de 2000 quanto ao capital de 11.164,94€ (onze mil, cento e sessenta e quatro euros e noventa e quatro cêntimos).

c) Condenar a Ré no pagamento à Autora do montante que se liquidar em incidente próprio correspondente ao valor das duas misturadoras montadas, referidas no facto provado n.º 109 com o limite máximo de 47.100$00 (i.e., 234,93€)., acrescido de IVA a 17%

d) Condenar a Ré no pagamento à Autora do montante que se liquidar em incidente próprio correspondente ao valor dos trabalhos descritos a fls. 280, com a rectificação da altura da escada metálica para 2,70metros, com o limite máximo de 355.000$00 (por redenominação automática, de 1.770,73€), e acrescido de IVA a 17% sobre o montante apurado.

e) Absolver a Autora do pedido reconvencional.”

Desta sentença interpôs a R recurso de apelação, tendo no acórdão sido decidido apreciar as sequentes questões: a) – nulidade dos despachos proferidos imediatamente antes da prolação da decisão; b) - impugnação de (quase) toda matéria de facto que serviu de base à decisão de primeira instância; c) - omissão de pronúncia sobre quanto a matéria probatória aportada pela Ré; d) - pagamento de trabalhos não incluídos no contrato de empreitada; e) – compensação pelo contra-crédito que a Ré reconvinte.

A final veio a ser decidido julgar: “a) – (…) a acção parcialmente procedente reconhecendo-se a A como credora da R. pelo valor de 16.665.156$;

b) – (…) a reconvenção parcialmente procedente, pelo valor de 44.899.935$50. Efectuada a compensação entre estes créditos vai a A condenada a pagar à R a quantia de 33.034.692$ (=28.234.779$+ 17% IVA), ou seja, € 164.776,35.”

È desta decisão que a Autora traz a presente revista, para a que aporta o sequente.            

I.2. – QUADRO CONCLUSIVO.

“I. Entre Autora e Ré foi celebrado um contrato de empreitada a 17 de Dezembro de 1997 junto aos autos fls. 6 a 8.

II. Contrato cuja validade a Ré não coloca em causa, não pedindo igualmente a sua nulidade, anulação ou resolução.

III. A Ré não efectua qualquer pedido de cumprimento do contrato, no sentido de que a Autora cumpra obrigações a que ficou vinculada, realização de obras previstas.

IV. Não pede a eliminação de defeitos ou até nova construção nem tão pouco uma redução de preço com base no art.1222.º, n.º 1 do CC.

V. Não efectua qualquer pedido de indemnização.

VI. Pede sim a restituição de valor pago e acordado no âmbito do contrato de empreitada, com fundamento no facto de não terem sido feitos determinados trabalhos em quantidades constantes do orçamento.

VII. Tal restituição resulta do pedido de reconvenção efectuado no âmbito de uma acção interposta pela A. para cobranças de facturas referente a uma empreitada cuja recepção provisória foi solicitada em 25/08/1998, a recepção definitiva solicitada em 15/06/2000, sem que a Ré exercesse qualquer direito que lhe era conferido que obsta-se a que tais recepções produzissem efeitos.

VIII. Pelo que a obra terá de considerar-se definitivamente recebida, totalmente executada e sem quaisquer deficiências de execução.

IX. Quanto aos direitos conferidos no âmbito das normas imperativas que regem o contrato de empreita, no que concerne a defeitos de obra, resolução de contrato, redução de preço há muito haviam caducado quando da entrada em juízo dos presentes autos em 3 de Julho de 2002. Cfr arts. 1224.º e 1225.º do CC.

X. - Não se encontra prevista quer nas normas imperativas que regem o contrato em apreço, quer nas normas constantes do DL 405/93 quer ainda contratuais estabelecidas entre as partes, a restituição de quantias pagas pela Ré no âmbito do contrato de empreitada pelo que o pedido reconvencional não poderia ser considerado procedente.

XI. Em rigor a Ré pretende rever o preço, reduzindo-o sem que para o efeito exista preceito legal ou contratual que fundamente o seu pedido reconhecendo-lhe tal direito.

XII. Do contrato fazem parte, além do clausulado do mesmo de acordo com o n.º 2 da cláusula 1.ª, entre outros, o caderno de encargos geral, junto aos autos a fls. 9 a 41.

XIII. Nos termos do art. 3 do caderno de encargos, sob a epígrafe regime da Empreitada "a empreitada é realizada por preço global, isto é, a totalidade dos trabalhos que constituem a empreitada, tal como é definida no projecto, será liquidada pelo valor global da proposta aprovada, independentemente das quantidades de trabalho e importâncias constantes do orçamento discriminativo que acompanha a proposta do Empreiteiro".

XIV. Donde resulta que as partes acertaram um preço global, resultante das negociações, e com ele concordaram independentemente das quantidades e importâncias discriminadas no orçamento do empreiteiro, como resulta da mateira provada: nomeadamente pontos 75), 76), 77), 79) e 18).

xv. As quantidades e importâncias não são vinculativas.

XVI. De acordo com o douto acórdão de que ora se recorre "dúvidas não se colocam sobre a qualificação do contrato de empreitada sujeito ao regime do pagamento de preço dito «valor global".

XVII. As partes acordaram sujeitar o contrato ao regime do DL 405/93 de 10/12 cláusula 6.ª.

XVIII. Nos termos do art. 7.º "Entende-se por preço global a empreitada cujo montante da remuneração corresponde á realização de todos os trabalhos necessários para a execução da obra ou parte da obra objecto do contrato é previamente fixado"

XIX. O caderno de encargos (art.1.º, paragrafo 4) refere que "a empreitada corresponde á execução de todos os trabalhos de construção civil definidos no Projecto"

XX. No § 1.º do art. 3 do caderno de encargos ficou estipulado que" Atendendo a que as medições que servem de base ao valor da proposta do Empreiteiro foram por este realizadas, não haverá lugar a qualquer reclamação contra erros e/ou omissões .

XXI. Assim entendeu o tribunal a quo que apenas ao empreiteiro fica negado o direito, o mesmo não acontecendo ao Dono da Obra que ás mesmas não se vinculou.

XXII. Atendendo ao regime do contrato – preço global – o preço dos trabalhos é determinado no momento da sua celebração, não está o mesmo dependente do apuramento do volume de trabalhos realmente executados.

XXIII. Numa empreitada por preço global o preço apenas será alterado nas seguintes circunstâncias: Supressão de trabalhos – trabalhos a menos; Realização de trabalhos a mais; Rectificações de erros ou omissões do projecto, tal como decorre do Acórdão do Supremo Administrativo de 12 Abril 2007 Processo 01207/06, acima transcrito.

XXIV. Não decorre do contrato de empreitada, caderno de encargos, qualquer clausula que permita a reclamação por parte do Dono da Obra sobre quantidades de trabalho, entenda-se medições.

XXV. Não decorre igualmente do Código Civil bem como do DL n.º 405/93 de 10 de Dezembro, qualquer norma que permita tal reclamação.

XXVI. Donde resulta que as reclamações efectuadas pela Ré no que concerne a erros de medições por parte do empreiteiro não podem ser atendidas.

XXVII. Art. 3.º parágrafo 4.º terá de ser interpretado á luz do art. 36.º, n.º 1 do DL 405/93 -No qual se prevê uma indemnização para o empreiteiro no caso de redução do valor total dos trabalhos.

XXVIII. Trata-se de uma norma para acautelar o empreiteiro em relação ao poder do Dono da Obra em proceder á supressão de trabalhos incluídos no contrato.

XXIX. No que se refere ao acerto final de contas, da matéria provada nomeadamente pontos 24, 25, 27 e 28 apenas resulta que a Ré criou essa convicção sem qualquer fundamento, sendo que os pontos 30 e 31 não resulta qualquer aceitação por parte da A. em fazer esse acerto de contas tendo por as medições constantes no orçamento.

XXX. Os documentos em causa foram elaborados na sequência de reuniões, depois da obra efectuada e paga.

XXXI. Tais documentos não substituem ou anulam o regime aplicável bem como as cláusulas contratuais acordadas entre as partes.

XXXII. Os documentos em causa resultam das reclamações efectuadas pelo Eng. A... da parte do Dono da Obra e serviu para as negociações que decorreram entre as partes, negociações que se frustraram pelo que os efeitos do documento se limitam a essa fase, já há muito ultrapassada.

XXXIII. As partes são livres de em termos negociais tentar através da negociação encontrar um ponto de equilíbrio que a ambas satisfaça, sem que as posições assumidas nessas negociações, em termos de algumas cedências, constituam reconhecimento de direitos e obrigações.

XXXIV. Ainda quanto ao acerto final de contas, o caderno de encargos, refere fecho final de contas dos trabalhos que constituem a empreitada, incluindo eventuais trabalhos a mais e a menos reclamação de erros e omissões e revisão de preços.

XXXV. O tratamento das alterações, quer a nível de retirada de trabalhos e inclusão de outros, está devidamente plasmado nas ordens de execução e aditamentos elaborados, sendo que as ordens de execução estão assinadas pela fiscalização de acordo com poderes que tinha para o efeito.

XXXVI. Contudo neste fecho final de contas não se permite correcções de erros de medições.

XXXVII. No caderno de encargo estipulou-se que, não haverá lugar a qualquer revisão do preço da empreitada – Art. 3.º paragrafo 2.º

XXXVIII. O DL 405/93 apenas refere Reclamações, Rectificações de erros ou omissões do projecto.

XXXIX. Nos termos do caderno de encargos art. 23.º referente aos pagamentos ao empreiteiro estipula que são feitos mensalmente de acordo com o cronograma financeiro anexo á proposta, mediante verificação de valores através de autos de medição dos trabalhos executados, devendo a factura e auto de medição serem visados pela fiscalização.

XL. A fiscalização das obras foi entregue pela Recorrida á "CC. -Consultores Técnicos de Engenharia, Lda., a quem cabia, designadamente, e para além da fiscalização das obras, colaborar na elaboração dos Aditamentos propostos pela Autora, assinar as ordens de execução, as propostas de aditamento, e tudo o mais constante no Caderno de Encargos nomeadamente no seu art. 28.

XLI. As facturas apresentadas pela Autora referente ao orçamento foram remetidas pela Fiscalização para os serviços da Ré alegando que as mesmas estavam de acordo com o cronograma anexo a proposta. Pontos 23), 25) da matéria assente.

XLII. De acordo com o artigo 29.º do caderno de encargos "o Empreiteiro obriga-se a executar outros trabalhos que devam se executados por decisão do Dono da Obra e não estejam incluídos o objecto do empreitada ".

XLIII: Com referência a tais aditamentos, que eram usualmente acompanhados com a discriminação das obras e seus custos, a fiscal CC emitia uma Ordem de Execução na qual mencionada a obra a realizar e o respectivo custo global

XLIV. A Recorrente procedeu á execução de diversos trabalhos, não incluídos no objecto da empreitada, que lhe foram mandados executar por decisão do Dono da Obra, conforme ordens transmitidas pela fiscalização da obra, trabalhos estes que lhe foram sendo normalmente pagos.

XLV. Tais ordens de execução referem tratar-se de trabalhos de alteração não incluídos na proposta inicial e terem sido apresentados á Administração da BB (ora Ré) que os mandou executar.

XLVI. Em relação aos últimos trabalhos realizados, não incluídos no objecto da empreitada mandados executar por decisão da Recorrente, esta ainda não liquidou o montante oportunamente facturado pela Recorrida.

XLVII. A Recorrente apresentou á Recorrida facturas datadas de 1 de Outubro de 1999 e 23 de Dezembro de 1999, num total de 16 (dezasseis) referentes a trabalhos não incluídos no objecto da empreitada.

XLVIII. Facturas que não foram pagas pela Recorrente.

XLIX. As facturas ora reclamadas tiveram sempre como suporte as Ordens de Execução juntas a fls. 60-96, devidamente assinadas pela fiscalização.

L. As ordens de execução sempre foram entregues pela CC á Autora (quer para trabalho a mais, quer para trabalhos a menos), face ás alterações efectuada pela Ré ao projecto e ás necessidades da empreitada.

LI. De acordo com o § 2.º do artigo 29.º, do Caderno de Encargos Geral (aludido em C), o" valor dos trabalhos extra-contrato executados é pago nas mesmas condições dos pagamentos da empreitada, conforme estabelecido no art. 23 destas Condições jurídicas Administrativas" ou seja, " no prazo de 15 (quinze) dias contados a partir da data da apresentação da facturas.

LII. Entendeu o tribunal a quo que os erros de medição tem de ser corrigidos, com as inerentes consequências ao nível do valor da empreitada, entendendo ainda que os erros de medição para mais sempre poderiam ser enquadrados no trabalho não realizado, a que se alude no art. 3.º parágrafo 4.º.

LIII. Consequentemente "acertou as contas" eliminando aqueles trabalhos que não foram realizados constantes do orçamento e da OE, e corrigindo as " quantidades/unidades " erradamente orçamentadas.

LIV. Com base neste acerto de contas a A. terá de devolver á R. quantias recebidas, ainda que para pagamento de facturas com ordens de pagamento por parte da fiscalização (visadas pela fiscalização), no que concerne aos trabalhos constantes do "Adicional" bem como quantias recebidas para pagamento de trabalhos constantes de facturas acompanhadas de ordens de execução emitidas pela fiscalização.

LV. Tal acerto resulta dos factos provados no ponto 91) dos factos assentes o qual "representa as obras realizadas, quantidades preços unitários, importância facturadas e diferença", esta ultima expressão com sentido diferença entre o valor total indicado o adicional e o valor total resultantes do produto quantidade preço unitário indicado no adicional",

LVI. Sem que se explicite o que são erros de medição/trabalhos não realizados, trabalhos não realizados necessários á execução da obra.

LVII. A decisão de que os valores em causa, são a deduzir aos valores dos trabalhos pagos e a pagar pela Ré á Autora, não se encontra devidamente fundamentada, nem tão pouco possui base legal ou contratual, atento o regime da empreitada.

LVIII. Ainda assim sempre se dirá quanto aos valores.

LIX. Quantos aos pontos 44), 45) 49) 50), estas reduções resultam de quantidades, pelo que igualmente não pode ser consideradas por falta de suporte legal ou contratual.

LX. E ainda ponto 59) sendo que esta redução resulta do facto de as facturas 952, 955, 962 e 963 se referirem a trabalhos extra sem ordens de execução, se a Ré aceitou proceder ao pagamento de facturas sem ordens de execução não pode após tal pagamento alegar tal fundamento.

LXI. No que se refere aos ponto 104 e 105 não podem igualmente ser contabilizados para efeitos de deduções por tudo o que atrás de disse.

LXII. No que concerne às facturas reclamadas nos presentes autos a Recorrente tão-somente impugnou o valor de três (1308, 1319, 1373).

LXIII. Não tendo impugnado as restantes terá de ser condenada no pagamento.

LXIV. A própria Ré referiu nas suas conclusões de recursos que quando contratou os serviços da A., só não tinham sido executados a repintura do telhado e a pintura do gradeamento, trabalhos que decidiu efectuar directamente pedindo, por isso que a A. a reembolse dos valores respectivos mencionados na Proposta/ Orçamento.

LXV. Tendo igualmente alegado que estando efectuadas as obras necessárias á reparações interior do Hotel, e havendo a R. decidido tomar sobre si a repintura do telhado e a pintura do gradeamento, não tem a R. mais obras ou trabalhos a solicitar á A.

LXVI. O Tribunal a quo não interpretou correctamente o contrato de empreitada bem como o Caderno de Encargos Geral do qual constam as condições jurídicas e administrativas e condições gerais (doc. N.º 1 e n.º 2 juntos pela A. com a petição inicial) violando o disposto no art. 406.º, n.º 1 do Cod Civ e no art. 238.º do Cod Civ.”

Sem menção de epítome conclusivo, a Ré contra-alegou, pedindo a manutenção do julgado.   

I.3. – QUESTÕES A MERECER APRECIAÇÃO.

Contrato de Empreitada; Preço (Valor Global); Acerto de Contas.

II. – FUNDAMENTAÇÃO.

II.A. – DE FACTO.

A extensão da matéria de facto dada como assente, vinda da primeira instância, com as alterações que lhe foram introduzidas pelo Tribunal da Relação, notadamente a que se reporta à indicação de peças, materiais e extensão dos serviços realizados em diversos pisos do hotel, aconselham, nesta sede, em que o tribunal apenas aplica o direito aos factos, o uso do artigo 726.º do Código Processo Civil, ex vi do n.º 6 do artigo 713.º do mesmo livro de leis.

Assim, e em vista da questão de direito supra proposta, suprimir-se-á, pela extensão e pelo que desinteressante se mostra para a imo da questão a decidir, os pontos da matéria de facto respeitantes à matéria referida no parágrafo antecedente, o que vale por dizer aqueles que atinam com o quadro enunciativo e descritivo das obras e materiais cuja desconformidade foi verificada elas instâncias.

Concretamente suprimir-se-ão de expressa indicação neste troço da decisão os seguintes itens: 39 a 65; 91 a 115.                

“1) A Autora dedica-se à execução de empreitadas de construção civil (A).

2) A 17 de Dezembro de 1997, Autora e Ré celebraram entre si um acordo escrito, que intitularam “Contrato de Empreitada”, junto a fls. 06-08, tendo “por objecto a execução dos trabalhos da EMPREITADA GERAL DE CONSTRUÇÃO CIVIL DAS OBRAS DE REPARAÇÕES E RESTAURO INTERIORES DO HOTEL A...P..., EM LISBOA, nas suas instalações sitas na Rua 1º de Dezembro, tornejando para a Praça dos Restauradores, concelho de Lisboa”, acordando-se em que a empreitada terminaria impreterivelmente no dia 30 de Março de 1998 (B).

3) De acordo com o número 2, da sua cláusula 1ª, “integram o Contrato o disposto nas Cláusulas seguintes e ainda o Programa do Concurso, o Caderno de Encargos Geral e Cadernos de Encargos Específicos de cada um dos Projectos, o Projecto (constituído pelo conjunto de Projectos de Arquitectura, Instalações e Equipamentos das Redes de Água e Esgotos, Instalações e equipamentos Eléctricos, e Instalações e equipamentos de ventilação e ar condicionado), a proposta apresentada pelo empreiteiro e seus adicionais e o Plano de Trabalhos Definitivo (...) prevalecendo as Cláusulas seguintes sobre os demais documentos”,o qual se mostra junto de fls. 09 a 41 (C).

4) De acordo com o artigo 29º, do mencionado Caderno de Encargos Geral “o Empreiteiro obriga-se a executar outros trabalhos que devam ser executados por decisão do Dono da Obra e que não estejam incluídos no objecto da empreitada”(D).

5) Procedeu a Autora à execução de diversos trabalhos, não incluídos no objecto da empreitada, que lhe foram mandados executar, conforme ordens transmitidas pela fiscalização da obra, trabalhos estes que lhe foram sendo normalmente pagos (E).

6) “Em relação aos últimos trabalhos realizados, não incluídos no objecto da empreitada, esta ainda não liquidou o montante oportunamente facturado pela A (F).”

7) A 01 de Outubro de 1999, a Autora apresentou à Ré as suas facturas datadas de 01 de Outubro de 1999, com os nºs : - 1307, no montante de 4.550.247$00; - 1309, no montante de 533.520$00; - 1310, no montante de 1.193.400$00; - 1311, no montante de 1.469.999$00; - 1312, no montante de 1.145.425$00; - 1313, no montante de 1.469.672$00; - 1314, no montante de 456.066$00; - 1315, no montante de 1.208.025$00 ; - 1316, no montante de 1.521.059$00; - 1317, no montante de 1.045.688$00; - 1318, no montante de 422.370$00; - 1320, no montante de 421.200$00; - 1321, no montante de 1.737.450$00 (G).

8) Em 23 de Dezembro de 1999, a Autora apresentou à Ré a sua factura nº 1373, no montante de 2.238.369$00 (H).

9) A 01 de Outubro de 1999, a Autora apresentou à Ré as suas facturas datadas de 01 de Outubro de 1999, com os nºs: - 1308, no montante de 1.973.096$00; - 1319, no montante de 415.350$00 (I).

10) As facturas indicadas em G, H e I, tiveram sempre como suporte as Ordens de Execução juntas a fls. 60-96, devidamente assinadas pela fiscalização (CC, Lda) (J).

11) Tais ordens referem tratar-se de trabalhos de alteração, não incluídos na proposta inicial, e terem sido apresentados à Administração da BB (ora Ré), que os mandou executar (K).

12) De acordo com o §2º, do artigo 29º, do Caderno de Encargos Geral (aludido em C), o “valor dos trabalhos extra-contrato executados é pago nas mesmas condições dos pagamentos da empreitada, conforme estabelecido no Artigo 23º destas Condições Jurídicas e Administrativas”, ou seja, “no prazo de 15 (quinze) dias contados a partir da data da apresentação da factura” (L).

13) As facturas aludidas em G, H e I, não foram pagas pela Ré (M).

14) A abertura de um túnel efectuada por ordem do Metropolitano de Lisboa, provocou grandes danificações no prédio sito na Rua ..., em Lisboa, onde, desde há décadas, está instalado o “Hotel A...P...”, unidade hoteleira de luxo propriedade da Ré (N).

15) Face à necessidade de adequada recuperação daquela unidade, a Ré iniciou negociações com o Metropolitano de Lisboa para ser indemnizada pelos prejuízos sofridos, reparações a efectuar e lucros cessantes (O).

16) Para determinar o valor dos prejuízos sofridos e das reparações a fazer, a Ré solicitou os serviços do Engenheiro Civil Sr. J...M...L..., o qual foi, igualmente, encarregado de levar por diante as negociações com o Metropolitano de Lisboa (P).

17) Nessa ocasião, já a empresa BRATIR estava procedendo a alguns trabalhos de conservação dentro do referido imóvel (Q).

18) A Autora enviou à Ré, por carta de 27/11/1997, “Proposta” que intitulou de “Adicional”, junta de fls. 150 a 197, com o valor de 371.726.361$00, e do qual consta a discriminação especificada das obras que iria efectuar e os respectivos preços por unidade e globais (R).

19) A fiscalização das obras foi entregue pela R. à “CC – Consultores Técnicos de Engenharia, Lda. (acordo), atentas as relações do Eng. Lory com ambas as contratantes (S).

20) À CC cabia, designadamente, e para além da fiscalização das obras, colaborar na elaboração dos Aditamentos propostos pela Autora, assinar as Ordens de Execução às propostas de aditamento, e tudo o mais constante do Caderno de Encargos nomeadamente no seu artigo 28º (vd. fls. 28) (T).

21) De harmonia com o artigo 23º, do Caderno de Encargos, os pagamentos à empreiteira deviam reger-se pelas seguintes regras: “Os pagamentos ao Empreiteiro serão feitos mensalmente de acordo com o cronograma financeiro anexo à proposta, mediante verificação de valores através de autos de medição dos trabalhos executados.

Para este efeito, o Empreiteiro deverá entregar ao Dono da Obra, até ao dia 5 de cada mês, uma factura acompanhada de um auto de medições dos trabalhos executados no mês anterior, ambos visados pela Fiscalização. O pagamento da importância constante deste auto de medições, depois de efectuados os descontos estabelecidos neste Caderno de Encargos, será feito pelo Dono da Obra no prazo de 15 (quinze) dias contados a partir da data da apresentação da factura e respectivo auto de medições.

§ 1º - Quando da assinatura do contrato, nos termos do Artigo 195º do Decreto-Lei nº405/93, de 10 de Dezembro, o Dono da Obra fará um adiantamento ao Empreiteiro de 35% (trinta e cinco por cento) do valor global contratual da empreitada, mediante prestação, pelo Empreiteiro, de garantia bancária idónea, de acordo com o critério do Dono da Obra, de igual valor”(U) .

22) A Autora iniciou os trabalhos, havendo enviado previamente à Ré a factura nº 813, datada de 10/12/1997, no valor de 152.221.944$00, correspondente a 35%, do valor da empreitada (adiantamento previsto no art. 23º, do Caderno de Encargos), valor que lhe foi pago pela Ré, que recebeu o correspondente recibo (V).

23) Por carta de 07/01/1998, junta a fls. 198, a CC enviou aos serviços financeiros da Ré, a factura da Autora, nº 840, no valor de 28.269.789$00, na qual refere “ Junto enviamos a V. Exas. a factura nº 0840, datada de 02 deste mês, do Empreiteiro AA (Herdeiro), Lda., referente ao primeiro pagamento contratual do valor da EMPREITADA GERAL DE CONSTRUÇÃO CIVIL DAS OBRAS DE REPARAÇÕES E RESTAURO INTERIORES DO HOTEL A...P..., EM LISBOA.

Esta factura está de acordo com o cronograma financeiro anexo à proposta do Empreiteiro, apresentado nos termos da alínea g) do Artigo 4º do Programa do Concurso, e considera, nos termos do disposto no § 3º do Artigo 23º do Caderno de Encargos, o reembolso proporcional do adiantamento de 35% do valor da adjudicação que foi feito ao Empreiteiro nos termos do § 1º do mesmo Artigo. Não houve qualquer alteração ao cronograma financeiro nos termos da alínea b) do Artigo 19º do mesmo Capítulo do Caderno de Encargos da empreitada.

Nos termos do disposto no acima referido Artigo, 23º, o pagamento deverá ter lugar no prazo de 15 dias contados a partir de hoje, ou seja, até ao dia 22 do corrente mês.

No acto do pagamento, o Empreiteiro deverá apresentar, nos termos do disposto na alínea a) do § 4º do mesmo Artigo, uma garantia bancária, no valor de 10% do valor facturado, para formação do depósito de garantia da empreitada. No caso presente a garantia bancária deverá ser no valor de Escudos:-3.717.264$00 (três milhões setecentos dezassete mil duzentos sessenta quatro escudos).

Simultaneamente com o pagamento desta factura, deverão V. Exas. escrever ao Crédito Predial Português, que emitiu a garantia bancária para caucionar o adiantamento feito ao Empreiteiro, informando o Banco que, a partir da data da realização do pagamento ao Empreiteiro, por já ter sido reembolsada por este a importância de Escudos:-13.0l0.423$00 (treze milhões dez mil quatrocentos vinte três escudos) do adiantamento, a garantia bancária emitida em caução do adiantamento deverá ser reduzida do valor agora reembolsado” (W).

24) A factura nº 840, referida em W, não ia acompanhada do “auto de medições dos trabalhos executados no mês anterior”, mas, os serviços financeiros cumpriram o solicitado pela entidade fiscalizadora certos de que quaisquer irregularidades seriam corrigidas a quando do auto de fecho de contas da empreitada (X) .

25) Por cartas de 09/02/1998, 03/03/1998, 02/04/1998 e 07/05/1998 (esclarecendo que os valores das facturas estão de acordo com o cronograma anexo à proposta e não juntando, ou mencionando, quaisquer autos de medição dos trabalhos), a CC remeteu aos serviços da Ré, as facturas números 852 (70.674.474$00), 873 (70.674.474$00), 895 (84.809.369$00) e 904 (28.269.792$00) (Y).

26) Nenhuma das facturas aludidas em W, X e Y, refere os trabalhos efectuados, limitando-se a mencionar o referido cronograma (Z).

27) Tendo em conta as relações do Eng. Lory, com as contratantes, a Ré foi cumprindo o dito cronograma desconhecendo se o valor das facturas correspondia ao trabalho realmente efectuado mas certa de que, se assim não acontecesse, a correcção seria feita aquando da elaboração do auto do fecho final das contas (AA).

28) A Ré enviou à Autora, após para tanto solicitada, cheques datados de 13/05/1998 (40.086.026$00), 30/06/1998 (5.000.000$00) e 28/07/1998 (20.000.000$00) - constando dos correspondentes recibos, que se destinavam à “liquidação por conta de diversas facturas”, sem dizer quais - e outro cheque, no valor de 20.000.000$00( e em cujo recibo consta que é “pagamento por conta do saldo”) (AB).

29) Em finais de 1998 ocorreram reuniões entre Autora, Ré e fiscalização (AC).

30) No âmbito de reuniões e tomando por base a Proposta Adicional, a Autora elaborou e enviou à Ré, um “Resumo Geral dos Erros e Omissões”, no qual se propôs creditar esta por obras não realizadas ou pela diminuição de quantidades de área ou artigos, creditando-a pelo valor de cobertores, espelhos e patins de degraus, pelo valor de rodapé em maronagres que não fora colocado, corrigiu o número de portas a tratar diminuindo-o, corrigiu o comprimento do corrimão a colocar, eliminou o corrimão da escada de caracol e a reparação da guarda da escada de serviço, diminuiu o número de sanitas e lavatórios, de bases de duche, de urinóis, de autoclismos, de misturadores de lavatório, duche, fluxómetros, reduziu ou eliminou áreas de afagamento, betume, envernizamento e pintura a tinta em várias zonas, diminuiu ou eliminou quantidades de bancadas de lavatório, tectos em pladur, portas e sua pintura, janelas, tratamento de roupeiros e guarda-roupas, etc., etc. como consta dos documentos juntos de fls. 199-212 e 213 (AD).

31) Pelos trabalhos relacionados na Proposta Adicional, a Autora creditou a Ré, por 2.772.148$00, e por 641.229$00, por trabalhos que teria realizado a menos no que respeita a Aditamentos e Ordens de Execução, consoante os documentos elaborados no fim de 1999 e em 2000, juntos de fls. 199-212 e 213 (AE).

32) Na coluna à direita do documento de fls. 199-212, que contém os globais parciais das deduções feitas na coluna anterior, o subtítulo “importâncias a facturar” deve ser entendido como “importâncias a deduzir” (AF).

33) Quanto ao b.1/2.13, referido no quadro indicado no Facto 29º, o trabalho foi efectuado pela Bratir a quem a Ré pagou (AH).

34) No art. A/02.4 do Adicional/Proposta está contida a execução da rede eléctrica e telefones na cave e sub-cave, orçamentada em 6.980.894$00 e de 698.090$00, de acordo com o primeiro projecto de instalações eléctricas elaborado pelo Arq. Moreira Braga, quantias que a Autora recebeu acrescida do IVA (AI).

35) Concluiu-se posteriormente que a prevista execução eléctrica e telefones da cave e sub-cave referidas no art.º supra do Adicional/Proposta era muito exagerada em potência de iluminação para as necessidades e localização de equipamentos a instalar (AJ).

36) O exagero na potência reflectia-se em excessivo número de quadros eléctricos, armaduras, e kits de emergência e tomadas (AK).

37) Decidiu-se, por isso, anular o projecto do Arq. Moreira Braga e solicitar outro ao Eng. Alberto Henriques, sem excessos de corrente e adequado às referidas necessidades (AL).

38) O segundo projecto, que foi o que a Autora efectivou, tornou desnecessária parte dos artigos e mão de obra orçamentados no Adicional/Proposta (AM).

(…)

65) O Eng. Lory adoeceu e foi submetido a uma intervenção cardiovascular (BN).

66) A Autora enviou à Ré a carta junta a fls. 362, datada de 25/08/1998, na qual quanto ao "Assunto: Auto de Recepção Provisória", refere "Estando já concluída à algum tempo a Empreitada Geral da Construção Civil das Obras de Reparações e Restauro de Interiores do Hotel A...P..., vimos solicitar, de acordo com o artigo 21 das Condições Jurídicas e Administrativas do Caderno de Encargos, a elaboração do respectivo auto de recepção provisória" (BO).

67) A Autora enviou à Ré a carta junta a fls. 363, datada de 15/06/2000, na qual quanto ao "Assunto: Recepção Definitiva" refere que "serve a presente para solicitar a V. Exas. a marcação da data da Recepção definitiva da "Empreitada Geral de Construção Civil das Obras de Reparações e Restauro de Interiores do Hotel A...P...", visto já ter decorrido o prazo de 24 meses após a ocupação das áreas respeitantes à nossa intervenção" (BP).

68) Exarou-se no Caderno de Encargos (art.º 1º, parágrafo 4º) que “a empreitada compreende a execução de todos os trabalhos de construção civil definidos no Projecto” que “Atendendo a que as medições que servem de base ao valor da proposta do Empreiteiro foram por este realizadas, não havendo lugar a qualquer reclamação contra erros e/ou omissões das medições” (art.º 3º § 1º), que “no caso de não serem executados alguns trabalhos que constam do projecto ou deste Caderno de Encargos ou dos Cadernos de encargos específicos de cada projecto ou do orçamento discriminativo anexo à proposta, o valor global da proposta deverá ser corrigido por dedução de 90% (noventa por cento) dos valores desses trabalhos “(art. 3, § 4º), que “os trabalhos que constituem a presente empreitada e todos os actos a que a ela digam respeito, obedecerão a este Caderno de Encargos” (art. 5) e, ainda, que “todos os trabalhos necessários à execução da obra de acordo com o projecto, quer mencionados, ou não, neste Caderno de Encargos, fazem parte da empreitada” (art. 1º Cad. Enc.), fazendo parte dela “a execução dos trabalhos que embora não especificadamente designados neste Caderno de Encargos (…) forem pelo Dono da Obra considerados necessários para a execução da obra e seu perfeito acabamento “(art. 1º, § 3º) (BQ) .

69) No artigo 3º, do documento aludido em C, sob a epígrafe “Regime de Empreitada”, estipula-se que “A empreitada é realizada por preço global, isto é, a totalidade dos trabalhos que constituem a empreitada, tal como é definida no Projecto, será liquidada pelo valor global da proposta aprovada, independentemente das quantidades de trabalho e importâncias constantes do orçamento discriminativo que acompanha a proposta do Empreiteiro” (BR) .

70) Pela carta junta fls. 331-332, enviada pela Autora à Ré, aquela aceitou todas as condições e disposições expressas no Programa de Concurso e no Caderno de Encargos Geral, Caderno de Encargos Específicos de cada um dos Projectos da empreitada e obrigou-se ao seu integral cumprimento (BS).

71) A Ré alegou, pelo menos por uma vez, ter procedido como referido na alínea F), por falta de disponibilidade financeira para a sua liquidação, em virtude de lhe faltar receber dinheiro do “Metropolitano de Lisboa, EP” (resposta ao art.º 1º)

72) Por diversas vezes, quer pessoalmente, quer por via telefónica, quer por escrito, a Autora, solicitou à Ré, o pagamento das facturas em causa (resposta ao art.º 2º).

73) Por indicação do Eng. Lory, a Ré recebeu da Autora uma proposta para os trabalhos a efectuar a fim de servir de base às negociações a desenvolver com o Metropolitano de Lisboa (Assente por acordo das partes na audiência de 3/7/2008).

74) A recomendação do Eng. Lory deveu-se, segundo explicou, ao resultado dos trabalhos efectuados pela Autora aos laboratórios Abbot e na empresa de construções Amadeu Gaudêncio onde ele, engenheiro, havia prestado serviços e daí o conhecimento que tinha de Manuel Fernando Jorge, sócio gerente da Autora há mais de 30 anos (resposta ao art.º7º).

75) Com base no “Caderno de Encargos” elaborado pelo Sr. Eng. Lory (aludido em C), a Autora elaborou, e fez entregar a ora Ré, uma proposta de empreitada, no valor de 399.042.405$00, que enviou à Ré por carta de 11/11/1997 (resposta ao art.º8º).

76) Provado apenas que, estudada aquela proposta em conjunto pela Autora, Ré e Eng.º Lory, foi decidido efectuar-lhe diversas alterações (resposta ao art.º9º).

77) Daí tendo resultado a proposta aludida em G (resposta ao art.º10º).

78) Para servir de base às negociações, quer com o Metropolitano de Lisboa, quer com a Ré, a Autora, face aos projectos iniciais que lhe tinham sido patenteados, apresentou à Ré, com data de 11/11/1997, os seguintes elementos:

I – proposta nº 098/044/97 (referente a Empreitada Geral de Construção Civil da Obras de Reparações e Restauro Interiores do Hotel A...P..., em Lisboa, no montante de 399.042.405$00) ;

II – proposta nº 099/044/97 (referente a Empreitada Geral de Construção Civil de Exteriores e Cobertura do Hotel A...P..., em Lisboa, no montante de 111.641.161$00) ;

III – Carta-compromisso de, em relação àquela primeira Empreitada, serem creditados diversos valores totalizando 45.000.000$00 (resposta ao art.º 11º).

79) Houve conversações com a presença e participação da Ré, da Autora e do Eng. Lory, as quais, concluído que foi o novo Projecto - dado, então, como definitivo - tiveram como resultado a alteração das propostas iniciais apresentadas pela Autora, consubstanciada no documento referido em R (resposta ao art.º12º).

80) A elaborou aditamentos à proposta inicial e obteve da CC as correspondentes ordens da execução (resposta ao art.º13º).

81) As ordens de execução sempre foram entregues pela CC à Autora (quer para trabalhos a mais, quer para trabalhos a menos), face às alterações efectuadas pela Ré ao projecto e às necessidades da empreitada (resposta ao art.º14º).

82) Eliminado (correspondia ao art.º 15.º:” E sempre com o acordo prévio da Ré”)

83) A Ré – cuja gerência, serviços administrativos e pessoal continuavam desenvolvendo actividade no imóvel onde permaneciam instalados – ia, assim que de tanto se apercebia, chamando a atenção para trabalhos deficientes ou inexistentes, exigindo a correspondente correcção e feitura (resposta ao art.º17º).

84) O Eng.º Araújo, na sua permanência quotidiana no Hotel, ia chamando a atenção da Autora para as deficiências de que se apercebia, e pedindo as correspondentes correcções (resposta ao art.º18º).

85) Para além de meros contactos informais, tais assuntos eram tratados aquando das reuniões, ou na presença, da Fiscalização e o Dono da Obra (resposta ao art.º 19º).

86) Ou quando a Autora ia procedendo à desocupação entrega da obra já executada, piso a piso, para que pudessem entrar os restantes empreiteiros de outras especialidades –resposta art.º 20.º

86-A) A Autora não procedia formalmente à entrega da obra”já executada” piso a piso, acompanhada da correspondente vistoria em que participaria a Fiscalização da obra – resposta art.º 68.º

87) Eliminado (correspondia ao art.º 21.º:”Casos em que sempre se fazia com a Fiscalização e o Dono da Obra a devida vistoria ao andar que era entregue”).

 88) E, então, se apontada qualquer deficiência, de imediato a Autora solucionava o caso, para que, os restantes empreiteiros pudessem iniciar os seus trabalhos (resposta ao art.º 22º).

89) As reuniões aludidas em AC tiveram por finalidade, do ponto de vista da Ré, apurar, face à Proposta, aos Aditamentos da Autora, às Ordens de Execução da CC, ao conteúdo das facturas e às “descrições dos trabalhos”, a forma como estes haviam sido realizados, as suas deficiências, os trabalhos previstos mas não consumados ou mal feitos (resposta ao art.º23º).

90) Nas últimas dessas reuniões (que foram interrompidas no início de 2001, por doença grave do Eng. Lory) a Ré reformulou reclamações, pediu a respectiva reparação, discordou de lançamentos contabilísticos, não quis aceitar a obra e efectuar a sua recepção provisória, alegando ter concluído que era credora da Autora (resposta ao art.º 26º).

(…)

115) O Hotel A...P... nunca deixou de estar ocupado pela Ré e foram muitas as reuniões realizadas com a Autora durante os anos de 1998 a 2001, nas quais se discutiram problemas apontados pela Ré (resposta ao art.º64º).
115-A) A Ré ia arrumando ou colocando móveis e /ou objectos nos locais que a autora desimpedia. (resposta ao art.º69.º)

116) A Autora nunca enviou à Ré os relatórios quinzenais sobre o andamento da obra e tudo o mais referido na alínea o) do artigo 28º do Caderno de Encargos (resposta ao art.º70º).

117) A Ré foi efectuando algumas reclamações no decurso da obra (resposta ao art.º71º).

118) Em meados de 1998, apareceram infiltrações nas caves do hotel provenientes da má drenagem de águas perdidas da responsabilidade do Metropolitano (resposta ao art.º72º).

119) Feita a reclamação pela ora Ré, o Metropolitano acedeu a suportar directamente o custo das correspondentes obras (resposta ao art.º73º).

120) Por indicação do Eng. J...M...L... ao Metropolitano, a obra foi adjudicada à Autora e iniciada por esta no início do ano 2002 (resposta ao art.º74º).

E mais se considera provado, nos termos permitidos pelos arts. 712.º e 659.º do CPC:

121) A R pagou à A, o valor contratado para a empreitada referido no Adicional/Proposta de 434.919.842$00 (acordo das partes - art.º 22.º da contestação e 42.º da réplica)”

II.B. – DE DIREITO.

Em intróito à fundamentação de Direito é mister, por constituir alegação da recorrente – cfr. artigos sob os números II a IX - tomar posição quanto ao que vem alegado a propósito do pedido formulado pela Ré na respectiva reconvenção, nomeadamente que não foi pedida a nulidade ou a resolução do contrato, por cumprimento defeituoso, com a eliminação dos eventuais defeitos que elenca ou a redução do preço, pedindo a restituição do valor pago e acordado no âmbito do contrato, com fundamento no facto de não terem sido feitos determinados trabalhos em quantidades constantes do orçamento. (“VII. Tal restituição resulta do pedido de reconvenção efectuado no âmbito de uma acção interposta pela A. para cobranças de facturas referente a uma empreitada cuja recepção provisória foi solicitada em 25/08/1998, a recepção definitiva solicitada em 15/06/2000, sem que a Ré exerce-se qualquer direito que lhe era conferido que obsta-se a que tais recepções produzissem efeitos.

VIII. Pelo que a obra terá de considerar-se definitivamente recebida, totalmente executada e sem quaisquer deficiências de execução.

IX. Quanto aos direitos conferidos no âmbito das normas imperativas que regem o contrato de empreita, no que concerne a defeitos de obra, resolução de contrato, redução de preço há muito haviam caducado quando da entrada em juízo dos presentes autos em 3 de Julho de 2002. Cfr arts. 1224.º e 1225.º do CC.”)

Com a alegação – que parcialmente acaba de ser transcrita – a recorrente alanceia o pedido reconvencional de caduco, por haver transcorrido há muito o prazo para a recorrida/reconvinte poder peticionar o cumprimento pontual e integral do contrato empreitada que celebrou com a autora/reconvinda – cfr. artigos 1224.º e 1225.º do Código Civil.

Resulta da etiologia dos meios de impugnação das decisões judiciais que os recursos são meios de impugnação das decisões proferidas por tribunais de hierarquia inferior que devem versar as questões que foram objecto de apreciação na decisão cuja sindicância, para revogação ou alteração é requestada ao tribunal superior.

Percorrido o processo não se descortina que a demandante/reconvinda tivesse suscitado a questão da caducidade do direito da demandada/reconvinte em pedir a qualquer das providências indicadas no artigo 1224.º do Código civil – eliminação dos defeitos; redução do preço; resolução do contrato e indemnização. Nem o objecto do litigio tal como é configurado na acção ou na reconvenção autorizava que tal questão tivesse sido oposta ao direito da demandada, dado que o que esta pede não é a eliminação de defeitos ou a redução do preço, mas sim a compensação ou acerto de contas por trabalhos que foram facturados e não foram realizados. A demandada/reconvinte pretende, no pedido que formula, que a autora/demandante seja condenada a pagar-lhe parte da quantia que já havia pago e que se verificou se reportarem a trabalhos que não foram efectuados realizados.

Não tendo sido q questão da excepção dilatória de caducidade sido oposta à pretensão da demandada/reconvinte, não foi objecto de conhecimento nas instâncias – despacho saneador – fls. 447 a 479 –, sentença proferida na primeira instância – fls. 1602 a 1651 – nem no douto acórdão sob revista – cfr. fls.     

Tratando-se de questão nova não é legitimo à recorrente suscitá-la em sede de revista e tendo-o feito não deverá ser objecto de conhecimento.

Ainda que assim não fosse, a questão nunca poderia ser objecto de apreciação, dado que a demandada/reconvinte não formula o pedido com base em defeitos na execução da obra, mas sim em trabalhos e materiais que terão sido facturados e que não foram realizados e/ou fornecidos. A questão aqui em tela de juízo, prende-se, para a demandada/reconvinte em acertar o preço global ajustado com o que foi efectivamente realizado e não com redução do preço, por cumprimento defeituoso. Trata-se, e nessa perspectiva se mostra fundamentada a contestação/reconvenção, de encontrar um ponto de satisfação entre o que foi realizado/fornecida pela demandante nos trabalhos adicionais constantes das facturas cujo pagamento lhe foi pedido pela demandante e aquilo que a demandada estima que não foi prestado. Não coloca a demandada em causa a validade do contrato pelo que não faria sentido pedir a sua anulação, o que afastaria e neutraliza a alegação de caducidade de um direito que não foi exercitado.

No entanto, a prudência e a cautela impõem que não se deixe de emitir juízo apreciativo sobre este troço da alegação da recorrente, para que não quedem ou sejam suscitadas eventuais omissões de pronúncia. 

II.B.1. – Contrato de Empreitada. Preço (Valor Global); Acerto de Contas.

A tipicidade do contrato que emerge do litigio desenhado na lide proposta pela demandante, “AA (Herdeiros), Lda.”, contra a demandada “”BB – Sociedade Portuguesa de Hotelaria, Lda.” não vem posta em causa, antes ambos os contendores aceitam que entre eles foi celebrado um contrato de empreitada, mediante o qual a primeira se comprometia a efectuar, mediante pagamento de um preço denominado global, serviços ou trabalhos atinentes com a construção civil num hotel propriedade da segunda.   

“O contrato pelo qual se acorda na realização duma obra, fornecendo o realizador desta os materiais necessários para a sua efectivação, é um contrato de empreitada […]”.[[1]]

Trata-se de um contrato sinalagmático, oneroso, comutativo e consensual.   

Desbordando das querelas que envolveram a sua qualificação, na obrigação assumida pelo empreiteiro de realizar – prestação de facere – uma obra, segundo um plano e com características previamente definidas no conteúdo contratual acordado com o dono da obra e em que este assume a obrigação do pagamento do respectivo preço – cfr. artigo 1207.º do Cód. Civil - está a etiologia de um contrato de empreitada. O conceito de obra é, pois, essencial para se qualificar um contrato como empreitada e determinar, consequentemente, qual o regime jurídico que lhe é aplicável. O resultado de uma actividade exercida no interesse de outrem tem a natureza de obra quando: o resultado se materializar numa coisa concreta, susceptível de obter um acto de entrega e um acto de aceitação; se o resultado for específico e discreto; se o resultado for concebido em conformidade com projecto, encomenda, plano, entregue ou aprovado pelo beneficiário (arts. 1208º, 1214º e 1218º do C. Civil).

Sem prejuízo da possibilidade da variação da modalidade de cálculo do preço – global ou à forfait, por medida, por artigo ou mesmo por tempo – o contrato de empreitada distingue-se de outros contratos de troca pela natureza da prestação não monetária a que uma das partes – o empreiteiro está adstrita: a realização de uma obra no sentido referido supra.

O preço, por seu turno, representa a retribuição devida ao empreiteiro pela realização da obra e tem de ser fixado em dinheiro (art. 883º, ex vi art. 1211º do Código Civil). Trata-se, naturalmente, de um elemento essencial do contrato de empreitada, mas não se exige qualquer relação de proporcionalidade entre a remuneração do empreiteiro e a qualidade ou quantidade da sua prestação.

O contrato de empreitada caracteriza-se por ser bivinculante e sinalagmático, visto que dá lugar a obrigações recíprocas, ficando as partes, simultaneamente, na situação de devedores e de credores e coexistindo prestações e contraprestações

Num dos pratos do sinalagma está a realização e entrega da obra e no outro a contraprestação respectiva, a saber o pagamento do preço acordado. O empreiteiro desonera-se da obrigação a que está adstrito quando executa o plano acordado e procede à efectivação da entrega da obra sem quebra dos compromissos de específicos que derivaram do consensuado. A não realização/efectivação do plano contratualizado faz incorrer o empreiteiro, adstrito ao dever de realizar uma obra, na violação do seu dever de prestar por uma de duas formas: ou pelo puro e simples incumprimento ou tornando impossível a prestação (arts. 798º e 801º nº 1 do C. Civil). Existe, no entanto, uma terceira possibilidade, que, relativamente ao contrato de empreitada, é objecto de previsão específica: a de ter havido um cumprimento defeituoso ou inexacto (art. 1218º e ss. do C. Civil). O empreiteiro não está vinculado apenas à obrigação de realizar uma obra, de obter certo resultado; ele encontra-se ainda vinculado executar uma obra isenta de vícios e conforme com o convencionado, quer dizer, sem defeitos (arts. 1218º nº 1 e 1219º nº 1, ambos do C. Civil).

O devedor cumpre a obrigação quando realiza, pontualmente, a prestação a que está vinculado (art. 406.º, n.º 1 do Código Civil), o que significa, que «o cumprimento deve coincidir, ponto por ponto, em toda a linha, com a prestação a que o devedor se encontra adstrito». [[2]]

“Surgindo da obrigação um dever de conduta especifico, uma prestação de conteúdo (dar, entregar, fazer, não fazer) e significado (dever principal, secundário e lateral) multiformes., esse(s) dever(es) pode(m) não ser cumprido(s), em regra, por vontade do devedor e, por vezes sem culpa do obrigado, num circunstancialismo que pode estar relacionado com a falta de cooperação de credor ou com um comportamento creditório ainda mais gravoso.” [[3]]   

O incumprimento reparte-se em quatro estratos: artigos 790.º a 797.º e 813.º a 816.º - impossibilidade de cumprimento e mora não imputáveis ao devedor - artigos 798.º a 808.º - falta de cumprimento e mora imputáveis ao devedor - artigos 809.º a 812.º - fixação contratual dos direitos do credor - e 817.º a 836.º - realização coactiva da prestação. 

Como categoria heterogénea – entre a mora e o incumprimento definitivo [[4]] – a doutrina tem procurado definir ou desenhar os contornos da figura do cumprimento defeituoso (chamada na doutrina alemã “violação contratual positiva”), afirmando que “na execução defeituosa o devedor realiza a totalidade da prestação (ou parte dela) mas cumpre mal, sem ser nas condições devidas,” valorando a sua autonomia para os “danos que credor não teria sofrido se o devedor de todo não tivesse cumprido a obrigação”ou exigindo certos pressupostos, a saber: realização da prestação contra a pontualidade, aceitação da prestação pelo credor, não conhecendo este o vicio ou, em caso de conhecimento, emitindo reservas, relevância do vicio e verificação de danos específicos.” [[5]]                    

“Em sentido amplo, o cumprimento defeituoso corresponde a uma desconformidade entre a prestação devida e a que foi realizada.

O cumprimento defeituoso depende do preenchimento de quatro condições. A saber: a primeira, ter o devedor realizado a prestação violando o princípio; segunda, ter o credor procedido à sua aceitação por desconhecer a desconformidade, ou conhecendo-a, apontando reserva; terceira, mostrar-se o defeito relevante; quarta, sobrevirem danos típicos.” [[6]]

O que essencialmente surge como ponto de dissensão nas decisões proferidas nas instâncias atina com a concepção/interpretação a conferir a conceito “contrato de empreitada por preço global”. Enquanto que na primeira instância se entendeu, grosso modo, que tendo sido acordado um “preço global” é vedado aos contraentes impugnaram as concretas quantidades de trabalho e as importâncias discriminadas pelo empreiteiro – cfr. a título exemplificativo o que ficou escrito de forma lapidar a fls. 1635 - enquanto que na decisão revidenda se entendeu que o regime de empreitada por preço global não inibe a possibilidade de a final poderem as partes contraentes efectuarem um acerto de contas, se se verificar terem sido realizados trabalhos ou incorporados materiais que não tinham sido os que constavam do respectivo caderno de encargos.

O preço da empreitada, na doutrina de Pedro Romano Martinez, é normalmente fixado até ao momento da celebração do negócio jurídico, sendo uso já constar do orçamento aprovado aquando do ajuste do contrato. [[7]] Se assim no direito privado, já no regime de empreitadas públicas “[a] retribuição pode ser estipulada: a) por preço global; b) por série de preços; c) por percentagem.”    

“O preço pode ter sido determinado de um modo global, normalmente designado por preço a forfait, a corpo ou per aversionem (….)

Nas obras de maior vulto é frequente a preexistência de um projecto, pormenorizado e completo, de todo o trabalho a realizar, com a fixação de respectivo preço. Esta forma de determinação do preço apresenta-se, em princípio, como mais vantajosa para o dono da obra, porque fica, de antemão, conhecedor do montante que lhe será exigido; em contrapartida, o empreiteiro corre mais riscos, porquanto terá de suportar eventuais maiores despesas se a sua previsão, quando à realização de toda a obra, não estava correcta.

Diferentemente, as partes podem estabelecer que o preço da obra seja determinado por cada artigo, por unidade a executar. Por exemplo, o empreiteiro obriga-se a fazer vinte cadeiras a X por objecto, ou a plantar mil eucaliptos a Y por unidade. A determinação do preço por unidades implica a perfeita diferenciação e divisão das partes que integram a obra, com respeito ao todo a obter.

Da mesma forma, se as partes estabelecerem um preço por medida, o preço total da obra vai depender da dimensão que esta tiver depois de concluída. Será o caso de o empreiteiro se obrigar a rasgar uma estrada a X por quilómetro, ou a desinfectar uma seara de trigo a Y por hectare, ou a alcatifar um apartamento a Z por metro quadrado. As obras cujo preço for determinado por medida não se concebem sem uma absoluta identidade e continuidade qualitativa do todo, mas com parte quantitativamente determinada em razão da sua extensão.

Nestes dois caso, a remuneração do empreiteiro resulta da aplicação dos preços unitários, previstos no contrato para cada espécie de trabalho a realizar, às quantidades desses trabalhos efectivamente executados.” [[8]]

(…) “Todavia, se a partes não estabeleceram uma forma de fixação do preço ou se o orçamento tinha uma finalidade de mera orientação, terá de se estabelecer um critério para assentar no valor dessa prestação do dono da obra: de facto, como se depreende do disposto no art.º 1221.º CC, a perfeição do contrato de empreitada não depende da fixação, por acordo, do preço. O preço, apesar de ser um elemento integrador da noção de empreitada, pode ser determinado em momento posterior ao ajuste.” [[9]]

Do Caderno de Encargos, anexo ao contrato de empreitada – cfr. artigo 3.º - sob a epigrafe “Regime de Empreitada”, estipulou-se: “a empreitada é realizada por preço global, isto é, a totalidade dos trabalhos que constituem a empreitada, tal como é definida no Projecto, será liquidada pelo valor global da proposta aprovada. Independentemente das quantidades de trabalho e importâncias constantes do orçamento discriminativo que acompanha a proposta do Empreiteiro.”  

De acordo com o art. 7.º, do DL 405/93, de 10 de Dezembro: "Entende-se por preço global a empreitada cujo montante da remuneração correspondente à realização de todos os trabalhos necessários para a execução da obra ou parte da obra objecto do contrato é previamente fixado".

"A empreitada é por preço global (ou, como também se diz, por preço único e fixo, a corpo, a forfait ou per avisionem), quando o seu preço é previamente determinado para todos os trabalhos a executar; o preço é único, está logo fixado no momento da celebração do contrato, pelo que, para a sua fixação, não existem operações ulteriores, designadamente de cálculo ou medição (cfr. o artigo 9.º) Arts. 7 e 8 do DL 405/93.. Trata-se, como se vê, de uma modalidade de empreitada claramente favorável ao dono da obra que, assim, fica a coberto das vicissitudes por que os custos dos elementos de produção eventualmente passem, de erros de cálculo que empreiteiro porventura tenha cometido sobre as reais dimensões da obra ou das dificuldades da sua execução. Porém, tudo isto só em princípio, já que, na realidade, o processo não pode desenvolver-se com uma rigidez total, sob pena de, injustamente, se adulterar o equilíbrio económico do contrato" (...).Por isso só em termos relativos se pode afirmar que, na empreitada por preço global, tal preço está desde logo fixado". [[10]]

Decorre do que ficou escrito que uma empreitada ajustada por “preço global” só tendencialmente assume uma feição rígida e fixa quanto a este elemento do contrato de empreitada. Na verdade, como se retira do Ac. do STA, de 12-04-2007, “[na] empreitada por preço global, o seu custo é, em princípio, determinado no momento da celebração do contrato. Todavia, se existirem trabalhos suprimidos ou acrescentados ao acordado no contrato - por terem sido retirados ou aditados ou por existir erro no projecto num sentido ou noutro - o respectivo valor será deduzido ou acrescentado ao valor do contrato (arts. 7.º, 14.º n.º 1 e 15, do DL 405/93).” [[11]]

O axioma de que arranca a tese da demandante - e que viria a ser assumida na decisão da 1.ª instância - não reveste, como se depreende das posições expressas supra, um carácter absoluto e infranqueável, antes deverá ser adaptada a alterações decorrentes da execução continuada da obra e tendo em conta as vicissitudes que nela as partes vão assumindo, de modo a fornecer um equilíbrio plausível e concreto entre o que foi prestado, reciprocamente, por cada uma das partes. Daí que não possa a posição, inabalável e inderrogável, assumida na decisão da primeira instância ser sufragada e corroborada, como bem salientou a decisão revidenda – cfr. fls. 

Nem de outro modo se nos afigura que pudesse ser, sob pena de se frustrar o desejável equilíbrio prestacional que se almeja numa relação contratual tendencialmente indutora de uma satisfação recíproca e mútua dos interesses em jogo. Ainda que as partes sujeitem a um determinado regime de pagamento a realização de uma obra é licito pensar que não queiram abdicar de proceder a ajustamentos, necessários e justificados, que uma execução continuada quase sempre coenvolve. Uma obra arranca de um projecto-concepção que na sua concretização requesta e exige uma proposta de orçamento na qual são especificadas e individualizadas, respectivamente, determinadas quantidades de trabalho e de materiais. O desenvolvimento da execução pode desencadear, tanto por iniciativo do dono da obra, como não raras vezes do próprio empreiteiro, propostas de alteração ao projecto inicial, como substituição de materiais, como ainda supressões ou acrescentos que não estavam previstos no projecto e não poderiam figurar no orçamento, dada a imprevisibilidade com que estas ocorrências surgem. Não seria garante de uma justiça comutativa e de boa fé contratual que as partes, porque aceitaram uma forma ou modalidade de pagamento do preço, despojarem-se criteriosa adaptação e conformação do conteúdo prestacional à realidade originada pelas alterações e modificações que a execução contratual ditou.  

Anunciada a posição por que se irá enveredar pouco mais haverá a dizer do que já foi dito na detalhada, munificente e exaustiva análise a que se procedeu na decisão revidenda, notadamente na completa, minuciosa e extenuante análise critica a que procedeu na reapreciação da decisão de facto (afinal quase toda a decisão de facto que vinha da primeira instância). A decisão revidenda procede a uma análise detalhada e proficiente de cada uma das facturas cujo pagamento é peticionado pela demandante, do mesmo passo que confronta as ordens de execução com as quantidades fornecidas, com os erros de medição, pelo que não se afigura necessário outras considerações para além das que constam do texto do aresto do Tribunal da Relação.

Coonesta-se, pontualmente, o que ficou escrito na decisão de direito do acórdão revidendo, restando a confirmação do que ficou decidido quanto aos valores encontrados.

III. - DECISÃO.

Na defluência do que foi exposto, acordam os juízes que constituem este colectivo, na 1.ª secção do Supremo Tribunal de Justiça, em:

- Negar provimento ao recurso;

- Condenar a recorrente nas custas.

                                     Lisboa, 8 de Maio de 2012

                           

                                        Gabriel Catarino - ( Relator)

                           

                                        António Piçarra

                                        Sebastião Póvoas

          -----------------
[1] Cfr. Cura Mariano, João, “Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra”, Almedina, Coimbra, 2008, págs. 45 a 61.  
[2] Cfr. Antunes Varela, João, in “Das Obrigações em Geral”, II Vol., Almedina, 5.ª edição, 1992, pág. 14-15. Quanto ao princípio da pontualidade e as variáveis em que se desdobra (modo distinto do estabelecido no acordo; tempo distinto do acordado - inexactidão; ser de quantidade distinta da devida; não ser realizada no local devido; entrega de coisa diferente da acordada; a prestação seja de qualidade diversa da devida; quando, para realização da prestação principal, foram violados deveres acessórios; outros que estejam especialmente previsto na lei, no caso de contratos especiais) veja-se Romano Martinez, Pedro, in Cumprimento Defeituoso. Em especial na Compra e Venda e na Empreitada”, Colecção Teses, Almedina, 2001, págs. 130 a 134.      
[3] Cfr. Brandão Proença, José Carlos, in “Lições de Cumprimento e Não Cumprimento das obrigações”, Coimbra Editora, 2011, pág. 133.
[4] Cfr. Romano Martinez, Pedro in “Cumprimento Defeituoso. Em especial na Compra e Venda e na Empreitada”, Colecção Teses, Almedina, 2001, págs. 129-157. “[O] cumprimento defeituoso constitui um tipo de responsabilidade contratual ao lado do não cumprimento definitivo e da mora, totais ou parciais, podendo abranger uma multiplicidade de situações.”
[5] Cfr. Brandão Proença, José Carlos, in op. loc. cit. págs. 137-138, e ainda Pessoa Jorge, F. “Lições de Direito das obrigações”, e Pereira Coelho, “Obrigações” (Sumários das Lições ao curso de 1966-1967), citados na obra referida.  
[6] Cfr. Romano Martinez, Pedro in “Cumprimento Defeituoso. Em especial na Compra e Venda e na Empreitada”, Colecção Teses, Almedina, 2001. págs. 129 e 130.
[7] cfr. Romano Martinez, Pedro, in Direito das Obrigações (Parte Especial) – Contratos”, Almedina, 2.ª edição, 2001, pág. 395.  
[8] Cfr. Romano Martinez, Pedro, in op. loc. cit. , pág. 395-396.
[9] cfr. Romano Martinez, Pedro, in op. loc. cit. , pág. 397.

[10] Cfr. Andrade da Silva, Jorge, in "Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas", 8.ª ed., 2003, pág. 52.
[11]Consultável em www.dgsi.pt.