Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
5509/10.5TBBRG-A.G1.S1
Nº Convencional: 2ª REVISTA
Relator: FERNANDO BENTO
Descritores: OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
CONTESTAÇÃO
PRINCÍPIO DA PRECLUSÃO
PRINCÍPIO DA CONCENTRAÇÃO DA DEFESA
CHEQUE
QUIRÓGRAFO
CONTRATO DE EMPREITADA
CADUCIDADE
RECURSO DE REVISTA
OBJECTO DO RECURSO
AMPLIAÇÃO DO ÂMBITO DO RECURSO
Data do Acordão: 01/29/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA E ANULADO O ACÓRDÃO RECORRIDO
Área Temática: DIREITO PROCESSUAL CIVIL - ACÇÃO EXECUTIVA – OPOSIÇÃO – EMPREITADA EXCEPÇÕES
Doutrina:
- Alberto dos Reis, Comentário, Vol.2 .º, Pág.364
- Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, Vol II, Pag. 464
- Manuel de Andrade, Noções Elementares De Processo Civil, 1976, P. 380
- Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo CPC, 2.ª Ed. 1997, P.304
- Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Vol 2.º, 2001, P. 355
- Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, 1996, P.. 145
- Lorca Navarrete, Tratado de Derecho Procesal Civil, 2000, p. 883
Legislação Nacional: ART. 193.º; 273.º; 489.º N.º 1; 508.º DO CPC;
- ART. 303.º; 329.º; 333.º; 1208.º; 1219.º; 1220.º; 1225.º, N.º 2; 1224.º, N.º 2; 1220.º N.º 1 CC.
-
Jurisprudência Nacional:
AC. STJ DE 17-06-2009, RECURSO Nº 3967/08 (SOUSA PEIXOTO)
- AC STJ DE 1/2/85, C.J. ANO III, TOMO I, PÁG.264,
- AC STJ DE 28/5/81, BMJ 307.º, PÁG.266, DE 17/1/85; BMJ 343.º, PÁG.335 E DE 8/2/94, C.J. ANO II, TOMO I, PÁG.95.
- AC RL DE 21/4/81, C.J. ANO VI, TOMO II, PÁG.194;
- AC RL DE 11/5/82, C.J. ANO VII, TOMO III, PÁG.92,
- AC RP DE 19/4/94, AC RP DE 9/5/2002;
- AC RC, DE 28-09-2004,PROC. Nº 1459/04,
Sumário :
Sumário (art. 713º nº7 ex vi do art. 726º CPC):

I – O princípio da concentração da defesa na contestação implica que todos os meios de defesa contra a pretensão devem ser deduzidos na contestação, salvo os casos de defesa superveniente.

II - Por via de tal princípio, apresentada a contestação, fica, a partir desse momento, precludida a invocação de outros meios de defesa, designadamente excepções, mesmo no caso de suprimento, esclarecimento ou aditamento (ou respectivas respostas) aos articulados, previstos no art. 508º nº 3 e 4 CPC, uma vez que se trata de complementos dos articulados.

III – Assim, tendo na oposição à execução fundada em cheque, funcionando como mero quirógrafo da obrigação de pagamento do preço de determinada obra, sido alegados defeitos desta e tendo-se o exequente limitado a contestar tais defeitos por impugnação, está-lhe vedado invocar posteriormente a excepção de caducidade dos direitos decorrentes de tais defeitos em resposta a aditamento ou explicitação complementar de tais defeitos pelo executado, ao abrigo do art. 508º nº3 CPC.

IV – Logo, julgada procedente, na 1ª instância, a excepção de incumprimento por via do cumprimento defeituoso do contrato e revogada tal sentença na 2ª instância por procedência da excepção de caducidade deduzida naquela resposta, deve o acórdão recorrido ser revogado por violação do referido princípio da concentração de defesa na contestação.

V – Não tendo o exequente requerido, na contra-alegação do recurso de revista, a ampliação do objecto do recurso com vista à apreciação dos pressupostos da excepção de incumprimento, a revogação do acórdão da Relação implica a reposição da sentença de 1ª instância.

Decisão Texto Integral:


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

RELATÓRIO

A Sociedade Construções AA SA intentou no Tribunal Judicial de Braga acção executiva sob a forma ordinária contra BB e CC, servindo de título executivo o cheque nº ... datado de 30/06/2009, no montante de €40.000,00, sacado sobre a conta n.º ... da Caixa Geral de Depósitos e emitido por CC, o qual, apresentado a pagamento no dia 14 de Abril de 2010, foi devolvido por falta de provisão.

Os executados deduziram oposição à execução, alegando, para além da ilegitimidade do opoente, a inexistência de título executivo, a indeterminação e indeterminabilidade da quantia exequenda por falta de certeza, liquidez e exigibilidade da obrigação, que o cheque dado à execução fora emitido para pagamento do resto do preço ajustado de uma obra efectuada pela exequente que se veio a revelar com defeitos que não foram eliminados e daí o seu direito à redução do preço em montante que supera o valor a execução, bem como as excepções de compensação de créditos e de incumprimento (por cumprimento defeituoso) do contrato de empreitada por parte da exequente legitimadora da recusa do pagamento do cheque.

A exequente contestou a oposição deduzida contra a execução, limitando-se, no que concerne aos alegados defeitos, a impugná-los por negação.

Na audiência preliminar foi concedido aos executados opoentes, a seu pedido, prazo para aperfeiçoarem o articulado da petição inicial com a concretização dos defeitos da obra, vaga e genericamente alegados na petição, se bem que com maior pormenorização em documentos juntos com ela para os quais aquela remetia.

E os executados complementaram tal petição com a alegação de 80 defeitos da obra, alegadamente não eliminados.

Em resposta, a exequente, para além da impugnação dessas anomalias, invocou a caducidade dos direitos decorrentes dos defeitos da obra.

Na sentença que veio a ser proferida na 1ª instância, foi a oposição julgada procedente com fundamento na excepção de incumprimento do contrato por se entender que os defeitos apurados legitimavam a recusa de cumprimento pelos executados da obrigação de pagamento do resto do preço ajustado.

A exequente, porém, apelou para a Relação de Guimarães e, para alem da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, impugnou também a decisão de direito, por entender que caducaram os direitos decorrentes dos defeitos da obra.

E teve êxito nesse recurso, já que, por acórdão de 12-09-2013, a Relação revogou a sentença proferida e ordenou o prosseguimento da execução, julgando procedente a excepção de caducidade.

Novo recurso, agora de revista para o STJ, pugnando pela revogação do acórdão recorrido, fundamentalmente por este haver julgado procedente excepção de caducidade não deduzida na contestação.

Contra-alegado o recurso, foi o mesmo remetido a este STJ onde, após o exame preliminar, foram corridos os vistos.

Nada continuando a obstar ao conhecimento do recurso, cumpre deliberar:

FUNDAMENTAÇÃO

I – O objecto do recurso:
Antes de mais, importa recordar o objecto do recurso que, como se sabe, é definido pelas conclusões da alegação do recorrente.
São elas as seguintes:

1. A apelação decreta a nulidade da sentença da I a instância, uma vez que " ... na mesma, a Mª Juíza a quo concluiu sobre a existência de defeitos alegados pela oponente/executada e, não se pronunciou sobre a questão, invocada pela exequente, da caducidade do direito dos oponentes em relação a esses alegados defeitos.
2. E julga procedente o recurso da exequente, revogando a decisão recorrida e, em consequência, verificada a caducidade do direito da executada e improcedente a oposição deduzida.
3. Reza o acórdão que "No articulado próprio e, tempestivamente, a recorrida arguiu a caducidade do direito dos oponentes, sobre a existência de eventuais defeitos, vejam-se artigos 36° e ss., da referida contestação."
4. Sucede, porém, que a apelação proferida - salvo o devido respeito - labora em erro quanto à tempestividade e oportunidade da invocação, pela exequente, da caducidade do exercício dos direitos da oponente.
5. Ao invés do que o acórdão dá como provado, a exequente não invocou na contestação à oposição à execução deduzida qualquer exceção, limitando-se a estrita defesa por impugnação.
6. Sendo certo que é causa de pedir da oposição à execução a existência de numerosos defeitos e desconformidades contratuais da empreitada sub judice, nunca eliminados pela exequente,
7. Cuja descriminação e elenco se encontram nos autos, nos documentos que acompanham a oposição,
8. Tendo a oponente aí formulado os pedidos de reconhecimento do direito à redução do preço, à compensação do débito com o contra-crédito a seu favor e ainda de exceção do não cumprimento do contrato.
9. Já a exequente, no seu articulado de contestação, estriba a defesa na sustentação do cheque dado à execução como título bastante,
10. E não toma posição quanto à extemporaneidade do exercício dos direitos pela oponente, limitando-se a repudiar a existência dos defeitos alegados.
11. E tanto assim é que o despacho saneador proferido pelo tribunal a quo conheceu das exceções invocadas pelas partes, mas não da caducidade,
12. Precisamente porque esta exceção não foi alegada nem arguida pela exequente na contestação.
13. O despacho saneador então proferido nos autos não foi objeto de qualquer reclamação nem dele foi interposto recurso, tendo transitado em julgado.
14. Assim sendo, não corresponde à realidade a asserção contida na fundamentação do acórdão quanto à arguição tempestiva e no articulado próprio da caducidade.
15. Ao invés do decidido, a contestação não consta de folhas 144 e seguintes dos autos de oposição à execução, sendo anterior.
16. Tampouco dela constam os artigos 36º e ss. para os quais remete a fundamentação, dado que a contestação é deduzida, outrossim, em trinta artigos!
17. O douto aresto, certamente por lapso, denomina contestação um requerimento da exequente de resposta ao aditamento à oposição de um artigo que reproduz os concretos defeitos constantes dos documentos que a acompanham,
18. Que transpõe para o articulado ipsa verba o elenco dos defeitos já devidamente descritos em itens numerados e acompanhados de respetivas fotografias, para facilitar a elaboração da base instrutória,
19. Pelo que do aperfeiçoamento da petição pela oponente não resultou a mínima factualidade nova ou superveniente que justificasse uma ampliação do direito de defesa, ou permitisse à exequente invocar fora da contestação a exceção da caducidade.
20. O artigo 489º do CPC contém o princípio da concentração da defesa, de que é corolário a preclusão, no sentido de que o réu tem o ónus de, na contestação, impugnar os factos alegados pelo autor e invocar exceções dilatórias ou perentórias,
21. Sob pena de, não o fazendo, precludir a possibilidade de o fazer posteriormente,
22. Ressalvando a lei casos de defesa diferida, tendo por base a superveniência de factos ou do seu conhecimento pela parte, bem como exceções de que o tribunal conhece oficiosamente.
23. A invocação da caducidade pela exequente, nos termos em que é feita, não cabe no regime excecional previsto no n° 2 do artigo 489º do CPC:
24. Não tem cabimento enquanto defesa diferida, porquanto os defeitos haviam sido invocados na oposição e encontram-se abundantemente documentados,
25. O que permitiu à exequente que sobre eles tomasse posição expressa na contestação, o que esta, aliás, fez negando a sua existência!
26. Por outro lado, a exceção da caducidade dos defeitos da empreitada trata-se de exceção perentória que não é do conhecimento oficioso do tribunal, ao versar sobre direitos disponíveis, dependendo da invocação da parte.
27. Sucede que o requerimento da exequente em que invoca a caducidade foi remetido ajuízo em 2/08/2011, quase um ano após a contestação!
28. Tendo a Mª Juíza a quo proferido despacho saneador em 10/1012011 onde conheceu exceções perentórias, sem que tenha apreciado a caducidade dos direitos da oponente.
29. Resultava do artigo 510° do CPC, que o despacho saneador tem o valor de sentença quando conhece de alguma exceção perentória.
30. Nesta conformidade, o trânsito em julgado do despacho saneador, que não apreciou a caducidade, inviabiliza o conhecimento ulterior desta exceção, maxime na sentença.
31. Assim, a apelação proferida, quando decreta a nulidade da sentença e se substitui ao tribunal a quo, julgando procedente a exceção da caducidade dos direitos da oponente, afronta o princípio da concentração da defesa, da preclusão e do caso julgado material, vertidos nos artigos 489°, 510º e 671º, nº 1 do CPC em vigor à data.
32. Incorrendo em manifesta violação da lei de processo e em errada aplicação das normas processuais civis referidas, o que constitui fundamento de revista, nos termos da alínea b) do n" I do artigo 674º do NCPC,
Concluem, pedindo a procedência da revista e a revogação da “a+elação proferida”.

II – Fundamentos de facto
Após a alteração da decisão sobre a matéria de facto pela Relação, são os seguintes os factos provados:

1. Nos autos de execução comum nº 5509/10.5TBBRG a Exequente “Construções AA SA”, deu à execução o cheque n.º 4937887095 datado de 30/06/2009, no montante de €40.000,00, sacado sobre a conta n.º ... da Caixa Geral de Depósitos e emitido por CC e que apresentado a pagamento no dia 14 de Abril de 2010 foi devolvido por falta de provisão. – Alínea A) da matéria de facto assente.
2. BB e CC casaram no dia 04 de Outubro de 1998 com Convenção Antenupcial tendo sido estipulado o regime de separação de bens. – Alínea B) da matéria de facto assente.
3. “Construções AA SA” e BB e CC subscreveram no dia 15 de Maio de 2007 documento particular denominado “Contrato Promessa de Benfeitorias” onde consta ser adicional ao contrato promessa de compra e venda datado de 15 de Maio de 2007 respeitante à fracção BE correspondente ao oitavo andar esquerdo, fazendo parte uma garagem, situada na sub-cave, com entrada pelo nº 14 de policia na Rua Fonte das Águas Férreas, sito na Urbanização de S. Tiago de Fraião, freguesia de Fraião, designado por lote 17/18/19, situado na Rua Maria Ondina Braga, nº 20, pelo qual a sociedade “Construções AA SA” se obrigou a supervisionar as referidas benfeitorias e acabamento da fracção objecto do contrato nas condições apostas na memória descritiva e no projecto aprovado pela Câmara Municipal de Braga, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. – Alínea C) da matéria de facto assente.
4. Do documento referido na alínea anterior consta que as despesas com as mesmas benfeitorias correrão por conta de BB e CC pelo montante de €193.100,00; como sinal e princípio de pagamento estes entregarão à “Construções AA SA” e esta receberá, dando logo a competente quitação, o montante de €19.310,00 e o montante em divida de €173.790,00 será pago no acto da posse ou da celebração da escritura pública de compra e venda. – Alínea D) da matéria de facto assente.
5. “Construções AA SA” e BB e CC subscreveram no dia 15 de Maio de 2007 documento particular denominado “Contrato Promessa de Compra e Venda” através do qual aquela prometeu vender e estes prometeram comprar a fracção autónoma “BE”, correspondente ao 8º andar esquerdo, Tipo T4+1, destinada a habitação, fazendo parte uma garagem situada na sub-cave, com entrada pelo nº 14 de policia na Rua Fonte das Águas Férreas e identificada provisoriamente pelo nº 27, a qual faz parte do prédio situado na Urbanização de S. Tiago de Fraião, freguesia de Fraião, Rua Maria Ondina Braga, nº 20, descrito na Conservatória sob o nº 00985 da freguesia de Fraião, pelo preço de €156.900,00, tendo acordado que a escritura seria outorgada até Maio de 2008 e o montante em divida de €141.210,00 pago até à celebração da escritura definitiva uma vez que como sinal e principio de pagamento os promitentes-compradores entregaram o montante de €15.690,00. – Alínea E) da matéria de facto assente.
6. O Título de Compra e Venda da fracção referida na alínea anterior foi outorgado no dia 26 de Junho de 2008 tendo nesse dia sido entregue à exequente a parte restante do preço das obras, materiais e electrodomésticos no valor de €40.000,00, através do cheque referido em 1). – Alínea F) da matéria de facto assente.
7. A execução comum nº 5509/10.5TBBRG foi instaurada em 10 de Setembro de 2010 e a presente oposição apresentada no dia 04/11/2010. – Alínea G) da matéria de facto assente.
8. No decurso do mês de Fevereiro ou Março de 2009 a Exequente efectuou uma vistoria ao apartamento dos Oponentes e procedeu a afinações, rectificações e reparações. – Alínea H) da matéria de facto assente.
9. No dia 26 de Junho de 2008 a Executada entrou na posse da fracção. – Resposta ao quesito 2º da base instrutória.
10. No wc privado (quarto principal) a saída do antigo tubo de água está deficientemente rematada. – Resposta ao quesito 3º da base instrutória.
11. A porta do armário do controlo do equipamento de aquecimento não é insonorizada. – Resposta ao quesito 7º da base instrutória.
12. A porta do armário do controlo do equipamento de aquecimento está com vestígios de oxidação na sala. – Resposta ao quesito 8º da base instrutória.
13. O acabamento da madeira no corredor, junto ao armário, encontra-se deficiente. – Resposta ao quesito 10º da base instrutória.
14. Todas as portas interiores, com a excepção da porta da entrada, não têm qualquer tipo de insonorização e/ou batente e conforto. – Resposta ao quesito 11º da base instrutória.
15. A porta da entrada tem insonorização normal mas o isolamento da mesma não é eficiente pois existe um intervalo de cerca de 5mm entre o limite inferior da porta e o pavimento sem qualquer tipo de remate. – Resposta ao quesito 12º da base instrutória.
16. O acabamento junto ao “olho” da porta da entrada, pelo exterior, não está bem executado – Resposta ao quesito 13º da base instrutória.
17. O puxador da porta de entrada não é de “bola” (conforme solicitado durante a execução - eliminado na sequência da impugnação da matéria de facto). – Resposta ao quesito 14º da base instrutória.
18. O tecto falso não está alinhado com o pavimento, na cozinha, (conforme solicitado durante a execução - eliminado na sequência da impugnação da matéria de facto). – Resposta ao quesito 15º da base instrutória.
19. O interior dos armários da cozinha não tem a cor cinzenta, (conforme solicitado durante a execução - eliminado na sequência da impugnação da matéria de facto). – Resposta ao quesito 16º da base instrutória.
20. A porta de correr do vestiário da “suite”, pelo interior, não está acabada. – Resposta ao quesito 20º da base instrutória.
21. O armário da wc da “suite” possui danos na sua face direita. – Resposta ao quesito 21º da base instrutória.
22. Existe uma chapa com “publicidade” que cobre o “pivot” da porta de vidro no hall de entrada. – Resposta ao quesito 22º da base instrutória.
23. Existem diversas paredes com acabamento deficiente, nomeadamente na sala. – Resposta ao quesito 23º da base instrutória.
24. Existem diversos furos nos tectos de pladur, previstos para a instalação de som, que deverão ser emassados ou colocada “tampa” adequada, na sala. – Resposta ao quesito 24º da base instrutória.
25. Não foram colocados batentes nas diversas portas, nomeadamente no hall da entrada (porta de vidro), wc das visitas, wc das crianças e armário da “electricidade” do hall da entrada. – Resposta ao quesito 26º da base instrutória.
26. A madeira no interior do armário da banca encontra-se ligeiramente expandida provavelmente por acção de humidade. – Resposta ao quesito 27º da base instrutória.
27. O resguardo do “polivan” do wc da suite, não isola a água. – Resposta ao quesito 28º da base instrutória.
28. Existem diversos aros das portas de madeira com acabamentos deficientes. – Resposta ao quesito 29º da base instrutória.
29. Falta a colocação de “funil” de resguardo da tubagem do aquecimento solar, que se encontra no compartimento junto ao hall de entrada. – Resposta ao quesito 31º da base instrutória.
30. O remate na inserção dos tubos de aquecimento solar no pavimento no compartimento junto ao hall de entrada é esteticamente deficiente. – Resposta ao quesito 32º da base instrutória.
31. A água quente da coluna de hidromassagem tem pouca temperatura no “máximo”, comparativamente com a torneira da banheira, na suite. – Resposta ao quesito 37º da base instrutória.
32. As janelas de alumínio, depois de ter sido substituída, deixou de ser possível efectuar o basculamento conforme estava inicialmente, apenas efectua abertura normal, na suite e na sala. – Resposta ao quesito 38º da base instrutória.
33. A caixilharia, depois de ter sido substituída a janela, ficou com rebites de “remendo”, no wc da suite. – Resposta ao quesito 39º da base instrutória.
34. Existem danos nas madeiras das padieiras, na sala. – Resposta ao quesito 41º da base instrutória.
35. Os cabos eléctricos da caldeira encontram-se visíveis e acessíveis mas não constituem perigo. – Resposta ao quesito 42º da base instrutória.
36. A parede adjacente à caldeira encontra-se danificada com uma depressão de cerca de 1 cm de diâmetro. – Resposta ao quesito 43º da base instrutória.
37. O wc das crianças tem, esporadicamente, “mau cheiro”. – Resposta ao quesito 46º da base instrutória.
38. O armário do hall tem a porta empenada. – Resposta ao quesito 47º da base instrutória.
39. Devido ao empeno da porta do armário do hall, o pavimento flutuante encontra-se danificado. – Resposta ao quesito 48º da base instrutória.
40. Mecanicamente alguns focos apresentam deficiências. – Resposta ao quesito 52º da base instrutória.
41. Existem vestígios de humidade no tecto da garagem. – Resposta ao quesito 53º da base instrutória.
42. Entre as juntas das tijoleiras da platinada, no terraço, existem diversos escorridos do cimento cola. – Resposta ao quesito 54º da base instrutória.
43. Os armários de madeira dos wc´s encontram-se danificados com “bolhas”. – Resposta ao quesito 55º da base instrutória.
44. A divisória entre a sala e o escritório e respectiva porta não foram efectuadas de acordo com o projecto, ou seja, deverão ser considerados trabalhos a menos. – Resposta ao quesito 56º da base instrutória.
45. A churrasqueira não foi efectuada de acordo com o solicitado, apesar de ter sido enviado atempadamente projecto da mesma. – Resposta ao quesito 58º da base instrutória.
46. A garagem não pode ser utilizada para arrumação de produtos perecíveis. – Resposta ao quesito 67º da base instrutória.
47. No ar condicionado, apenas foi efectuada pré-instalação. – Resposta ao quesito 68º da base instrutória.
48. A tampa do sifão do wc das crianças não tem parcialmente cromagem e o aro está oxidado. – Resposta ao quesito 70º da base instrutória.
49. A porta de correr da cozinha caiu, ao abrir. – Resposta ao quesito 71º da base instrutória.
50. Existem infiltrações de água, possivelmente na cobertura que resultam na degradação do “pladur” na sala. – Resposta ao quesito 73º da base instrutória.
51. Os focos exteriores de “alumínio” estão a “descascar”. – Resposta ao quesito 74º da base instrutória.
52. O batente da tampa de sanita do wc da suite encontra-se danificado. – Resposta ao quesito 76º da base instrutória.
53. As tampas de sanita dos wc´s não têm “slow close” (conforme previsto na “Vivenda” modelo -eliminado na sequência da impugnação da matéria de facto). – Resposta ao quesito 77º da base instrutória.
54. O tecto falso em “pladur”, nomeadamente na sala, não se encontra regular mas sim às “ondas”. – Resposta ao quesito 78º da base instrutória.
55. Os acabamentos dos apainelados de madeira das portas e janelas são deficientes. – Resposta ao quesito 79º da base instrutória.
56. A obra executada não está de acordo com o projecto licenciado. – Resposta ao quesito 80º da base instrutória.
57. Não foi entregue a Compilação Técnica da obra. – Resposta ao quesito 81º da base instrutória.
58. O hall de entrada do prédio não tem acesso apropriado a deficientes. – Resposta ao quesito 82º da base instrutória.
59. Os oponentes enviaram à Exequente carta registada datada de 06 de Julho de 2010 e cuja cópia consta de fls. 12 a 13. – Resposta ao quesito 83º da base instrutória.
60. Os problemas referidos nos quesitos anteriores foram comunicados à Exequente. – Resposta ao quesito 85º da base instrutória.
61. A caldeira não funciona com temporizador e foi assim entregue em 26/06/2008 com o conhecimento da oponente. – Resposta aos quesitos 87º e 88º da base instrutória.
62. A Exequente colocou na fracção os sensores acordados. – Resposta ao quesito 89º da base instrutória.
63. A insonorização da porta referida em 11) não foi orçamentado nem acordado com a Exequente a sua execução e a porta foi assim entregue em 26/06/2008, com conhecimento da Executada. – Resposta aos quesitos 90º e 91º da base instrutória.
64. Os parafusos utilizados nas padieiras de madeira das portas e janelas exteriores foram executados em conformidade com o “apartamento modelo” tendo sido assim entregue em 26/06/2008 com o conhecimento da Executada que o aceitou. – Resposta ao quesito 92º da base instrutória.
65. O referido em 14), 17), 19), 22), 24), 25), 29) 32) e 47) era já do conhecimento da Executada em 26/06/2008. – Resposta ao quesito 93º da base instrutória.
66. A ficha técnica da habitação foi entregue à Executada em 26.06.2008. – Resposta ao quesito 94º da base instrutória.
67. A intervenção que a Exequente efectuou referida em 8) é um procedimento que a Exequente efectua em todas as habitações no ano subsequente à venda, de forma a garantir a qualidade e satisfação dos clientes. – Resposta ao quesito 95º da base instrutória.

Aditado na sequência da procedência da impugnação da matéria de facto:
68. Os problemas identificados nos quesitos 3º a 82º eram conhecidos da oponente no mês de Fevereiro de 2009.

III – Apreciação jurídica:

A questão de direito a que se reconduz o objecto da presente revista é apenas a da oportunidade, validade e eficácia da excepção peremptória invocada fora do articulado de contestação.
Relembrando o caso: exigido judicialmente por via executiva o cumprimento da obrigação de pagamento do preço de determinada obra, o demandado defendeu-se, além do mais, alegando “a inexecução rigorosa de obras de variado tipo a que (a demandante, empreiteira) se vinculou pela subscrição de um caderno de encargos alusivo ao dito imóvel, patente na existência de numerosos defeitos do imóvel, (...)” .
Juntou documentos relativos a correspondência trocada entre as partes na fase pré-judicial e da qual constava uma relação de anomalias da obra.
A não eliminação desses defeitos teria gerado um direito à redução do preço e à compensação do crédito exequendo com o crédito dos demandados, legitimando também a estes a invocação da excepção de incumprimento do contrato.
A exequente contestou a oposição deduzida contra a execução por impugnação.
Na audiência preliminar, em 07-07-2011, e na sequência de requerimento nesse sentido dos executados oponentes, foi-lhes concedido o prazo de 5 dias para aperfeiçoarem a oposição que deduziram à execução, concretizando os defeitos e a deficiências por eles alegadas.
E foi na sequência disso que apresentaram então o aditamento de um novo artigo à oposição – o art. 26º-A – elencando uma lista de 80 defeitos da obra realizada pela exequente, alguns dos quais constavam da relação de anomalias junta com a petição de oposição.
Notificada de tal requerimento, a exequente impugnou e excepcionou com a invocação da caducidade dos direitos previstos nos art. 1225º nº2 CC, 1224º nº2 CC e 1220º nº1 CC.
Tendo a 1ª instância julgado procedente a oposição com a procedência, a favor dos executados, da excepção de incumprimento do contrato por banda do cumprimento defeituoso da exequente, a Relação revogou tal decisão por entender que os direitos dos executados decorrentes do contrato de empreitada haviam caducado.
Escreveu-se no douto acórdão recorrido:
Resta, agora, apurar se a oposição deduzida pela executada, com fundamento nos defeitos existentes na obra cuja aquisição esteve na origem da emissão do cheque, pode proceder como decidiu a sentença recorrida ou, como defende a exequente/recorrente deveria ter sido julgada procedente a excepção de caducidade do direito da executada em, na presente oposição, vir invocar os defeitos na obra, que a mesma nunca reconheceu e, que defende caducaram.
Há, então, que apurar se lhe assiste razão, uma vez que o conhecimento de tal excepção deve ser feito pelo tribunal, uma vez que, contrariamente, ao referido pela executada na conclusão 9 das suas contra-alegações, esta questão foi levantada pela exequente na sua contestação à oposição.
Está provado que a exequente foi construtora e vendedora da fracção que a executada adquiriu e que alega apresentar defeitos e cuja invocação efectua na presente oposição, tendo o tribunal “a quo” considerado legítima a excepção de não cumprimento invocada pela mesma e, por isso julgado procedente a oposição.
Não concordamos que assim possa ser, atenta a excepção invocada pela exequente.
Actualmente já não existe qualquer controvérsia nos tribunais superiores quanto ao regime legal aplicável à denúncia e eliminação de defeitos de um imóvel destinado a longa duração, construído pelo próprio vendedor, cfr. entre outros os Acs. do STJ de 26.11.09 e de 24.09.2009, acessíveis in www.dgsi.pt.
Esse regime é o constante do artº 1225 do CC, e não o regime genérico da venda de coisas defeituosas, plasmado nos artºs 914 e 916 do CC, nomeadamente no que se refere aos prazos para o exercício dos direitos ali previstos.
O estabelecido naquele preceito legal para o exercício dos direitos outorgados ao comprador do imóvel defeituoso implica a clara distinção entre:
- os planos da garantia legal de 5 anos que lhe é conferida, a contar da entrega do imóvel, consequente à celebração do contrato de compra e venda;
- o do exercício do direito potestativo à denúncia dos defeitos, com vista a obter a consequente indemnização ou a respectiva eliminação pelo vendedor – construtor, a exercitar no prazo de 1 ano a contar do conhecimento do vício construtivo da coisa;
- e, finalmente, do exercício em juízo do direito de indemnização ou eliminação dos defeitos denunciados, no prazo de 1 ano subsequente à denúncia;
Deste regime decorre que, o direito de acção (no caso, de oposição, atento o tipo de processo em causa) tem de ser exercido no prazo de um ano a contar da denúncia dos defeitos.
Será que a oponente o fez ou o seu direito caducou como defende a exequente?
Sabido que, os prazos definidos no artº 1225, são prazos de caducidade (artºs 331, nº 2, e 329 do CC) e, consequentemente, o seu decurso preclude o exercício do direito.
Com interesse provou-se que, o título de Compra e Venda da fracção referida na alínea anterior foi outorgado no dia 26 de Junho de 2008 tendo nesse dia sido entregue à exequente a parte restante do preço das obras, materiais e electrodomésticos no valor de €40.000,00, através do cheque referido em 1). – Alínea F) e ponto 6 da matéria de facto assente.
No dia 26 de Junho de 2008 a Executada entrou na posse da fracção. – Resposta ao quesito 2º da base instrutória e ponto 9 da matéria de facto assente.
Os problemas identificados nos quesitos 3º a 82º eram conhecidos da oponente no mês Fevereiro de 2009. - Resposta ao quesito 84º da base instrutória e ponto 68 da matéria de facto assente.
A execução comum nº 5509/10.5TBBRG foi instaurada em 10 de Setembro de 2010 e a presente oposição apresentada no dia 04/11/2010. – Alínea G) e ponto 7 da matéria de facto assente.
A discriminação dos defeitos foi apresentada no processo em 14.07.2011, cfr. consta a fls. 132 e ss., destes autos.
O artº 1225 do Cód. Civil, dispõe:
“1. Sem prejuízo do disposto nos artigos 1219º e seguintes, se a empreitada (...) no decurso de cinco anos a contar da entrega (...) apresentar defeitos, o empreiteiro é responsável pelo prejuízo causado (...) a terceiro adquirente.
2. A denúncia em qualquer dos casos, deve ser feita dentro do prazo de um ano e a indemnização deve ser pedida no ano seguinte à denúncia.
3. Os prazos previstos no número anterior são igualmente aplicáveis ao direito à eliminação dos defeitos, previstos no artº 1221.”
Dispõe o nº 2 do artº 1224 do mesmo código, que “... em nenhum caso, porém, aqueles direitos podem ser exercidos depois de decorrerem dois anos sobre a entrega da obra.”
Ora, dos factos apurados, não se suscitam dúvidas que decorreram mais de dois anos, após a data em que a oponente entrou na posse da obra e apurou-se ter conhecimento daquilo que alega como sendo os eventuais defeitos, mais de um ano, antes da data em que os invocou.
Assim, perante os factos provados e o disposto naqueles artigos, os eventuais direitos à eliminação e invocação dos referidos defeitos, como forma de legitimar a falta de pagamento do cheque, destinado a satisfazer a sua obrigação no cumprimento do negócio celebrado com a exequente, caducaram nos termos previstos no nº 2, daquele artº 1225.
E, há data em que a executada veio exercê-los, também, já tinham decorrido os dois anos a que alude o nº2, do artº 1224, referido.
Assim tendo a exequente invocado tal excepção e cumprindo-lhe o ónus de provar que quando foi deduzida a oposição e a invocação dos defeitos pela executada, já havia caducado o respectivo direito, tendo logrado fazer tal prova, teremos de concluir ter sido a presente oposição intentada fora de tempo.
Pelo que, terá de proceder a invocada excepção de caducidade e, improceder a oposição, por se encontrar precludido o exercício do direito invocado pela oponente.
Procedem, mais uma vez, nesta parte, as conclusões do recurso da exequente, com a consequente revogação da sentença recorrida e, a procedência da apelação”.

Objectam, porem, os executados que a invocação da caducidade, em resposta a um aperfeiçoamento da petição, não teria respeitado o princípio da concentração da defesa na contestação.
Logo, tal excepção não deveria ter sido atendida.
Apreciemos:
O art. 489º nº1 CPC enuncia o princípio da concentração da defesa na contestação ao prescrever que toda ela deve ser deduzida nesse articulado, com excepção dos incidentes que a lei mande deduzir em separado.
O nº2 prevê a defesa superveniente: depois da contestação só podem ser deduzidas as excepções, incidentes e meios de defesa que sejam supervenientes ou que a lei expressamente admita passado esse momento, ou de que se deva conhecer oficiosamente,
Ora, entre os fundamentos da oposição à execução, os executados alegaram o incumprimento pela exequente da obrigação de eliminar os defeitos da obra (que legitimaria a sua recusa de pagamento do preço convencionado) e o crédito que, por via da não eliminação desses defeitos, deteriam sobre a exequente em sede de direito à redução do preço e compensação.
Essencial e nuclear para esta “construção” do crédito dos executados é, por um lado, a existência de defeitos e deficiências na obra e, por outro, a sua alegação; eles constituem a causa de pedir, o fundamento genético do crédito invocado pelos executados contra a exequente, empreiteira.
Prescreve o art. 1208º CC que “o empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato”.
Os vícios ou desconformidades reportam-se tanto à obra em si, como aos materiais nela utilizados e supõem sempre um desvio relativamente à qualidade devida.
O conceito de defeito, envolvendo sempre o resultado de uma execução mal feita - logo reportando a acontecimentos ou factos da vida real - reconduz-se sempre a uma ou várias das seguintes circunstâncias:
* uma desconformidade entre a obra efectivamente realizada e a obra contratada,
* uma desconformidade entre a obra e as normas legais e regulamentares aplicáveis, sejam de natureza imperativa ou dispositiva (não afastadas pelas partes),
* uma desconformidade entre os materiais ou elementos de construção efectivamente incorporados e os materiais ou elementos de construção previstos no contrato,
* uma desconformidade entre os materiais ou elementos de construção efectivamente incorporados e os materiais ou elementos de construção previstos nas normas legais e regulamentares aplicáveis, ou entre as suas características efectivas e as características legalmente exigíveis,
* qualquer vício da obra ou dos materiais nela incorporados que a desvalorizem, reduzam a sua utilidade ou aptidão para os fins a que se destina (cfr. Mariana Campos Abelenda, A responsabilidade do empreiteiro por defeitos em imóveis constituídos em regime de propriedade horizontal, Dissertação de Mestrado acessovel na INTERNET em http://repositorio.ucp.pt/bitstream/10400.14/9683/1/Disserta%C3%A7%C3%A3o%20pdf.pdf e acedida em 01-01-2014).

Ora, é certo que os executados não concretizaram no articulado da sua oposição à execução qualquer desconformidade ou anomalia da obra, limitando-se a invocar, vaga e genericamente, defeitos da mesma, sem qualquer pormenorização ou detalhe.
Como aliás, eles próprios reconheceram quando, de motu proprio, solicitaram a concessão de um prazo de cinco dias para a apresentação de aditamento à oposição com essa concretização que vieram a fazer, descrevendo um total de 80 alegadas anomalias.
No entanto, ao remeterem no art. 27º da sua oposição para documentos que acompanhavam tal articulado, supriram por esta via a omissão de inclusão nele das referidas anomalias.
O que – forçoso é reconhecê-lo – não deixa de constituir um desvio da função dos documentos que são (devem ser...) meios de prova (art. 362º e segs CC) e não extensão dos articulados, como tem sido prática generalizadamente aceite, com o beneplácito da jurisprudência, como, v.g, o acórdão deste STJ de 17-06-2009, segundo o qual se admite “que a exposição dos fundamentos de facto possa ser feita por remissão para os factos contidos noutros documentos que acompanhem a petição inicial, desde que essa remissão se destine a completar a exposição já feita na petição” (cfr. Recurso nº 3967/08 -4.ª Secção Sousa Peixoto (Relator).
Na verdade, esta questão da alegação por remissão para documentos juntos com o articulado tem merecido duas soluções na jurisprudência e na doutrina:
“a) - Uma, mais rigorosa, no sentido da inadmissibilidade, com o argumento de que os documentos não são factos, mas meios de prova dos factos, pelo que obrigação de os expor na petição inicial não pode ser suprida pela referência a documentos juntos com esse articulado, visto assumirem uma função instrumental probatória (cf., por ex., Ac STJ de 1/2/85, C.J. ano III, tomo I, pág.264, Ac RL de 21/4/81, C.J. ano VI, tomo II, pág.194, Ac RL de 11/5/82, C.J. ano VII, tomo III, pág.92, Ac RP de 19/4/94, Ac RP de 9/5/2002, in www dgsi).
b) - Outra, mais flexível, que, na esteira da doutrina de ALBERTO DOS REIS (Comentário, vol.2º, pág.364) admite a possibilidade de remissão, por os documentos juntos com a petição se considerem parte integrante da mesma, suprindo as lacunas que comportem ( cf., por ex., Ac STJ de 28/5/81, BMJ 307, pág.266, de 17/1/85, BMJ 343, pág.335, de 8/2/94, C.J. ano II, tomo I, pág.95 ).
Mesmo a admitir-se esta posição mais benévola, só pode aceitar-se a alegação por remissão para documentos desde que neles os factos estejam inequivocamente individualizados, sem quaisquer dúvidas ou ambiguidades, até para que fique definida a causa de pedir, com as implicações processuais inerentes, designadamente, a estabilidade da instância (cfr, resenha na Ac Relação de Coimbra de 28-09-2004,Proc. Nº 1459/04, acessível na INTERNET através de http://www.dgsi.pt e acedido em 06-01-2013, sublinhado nosso).

Ora, não pode afirmar-se, como diz a recorrida, que os recorrentes omitiram, por completo, a alegação de defeitos no articulado da oposição: fizeram-no, se bem que em documentos com ele junto, colmatando com estes as lacunas do ónus de alegação e suprindo as deficiências da petição a esse nível.
No que concerne ao reconhecimento do crédito dos executados fundado em defeitos da obra realizada pela exequente, a petição de oposição não enfermava, pois, de falta absoluta de substanciação da causa de pedir.
Esta, no domínio dos direitos pessoais emergentes de contratos, é constituída pelos factos concretos em que se fundam os direitos que se pretendem ver reconhecidos e não pelas categorias abstractas ou previsões normativas; logo, para a indicação da causa de pedir é essencial a especificação dos factos concretos que, à luz da lei vigente, são constitutivos do direito invocado.
Não basta, pois, a mera alegação vaga e genérica de defeitos da obra, para daí poder nascer um qualquer direito contra o empreiteiro.
Mas se tal alegação for complementada pelo teor de documentos, devidamente identificados e apresentados com o articulado que para eles remeta, haverá eventualmente insuficiência ou deficiência da causa de pedir, mas não omissão desta.
Logo, em bom rigor, a petição não pode ser fulminada com a ineptidão: a concretização fáctica não está no articulado, mas está nos documentos com ele juntos e devidamente identificados, para os quais aquele remete (art. 193º nº2-a) CPC).
A exequente limitou-se a impugnar por negação os alegados defeitos da obra.
E, em bom rigor, pela relação de anomalias junta com o articulado, estava em condições de invocar a caducidade.
A caducidade é a extinção do direito pelo seu não exercício durante certo tempo e o seu fundamento específico é a necessidade de certeza jurídica já que, como ensinava Manuel Andrade, “certos direitos devem ser exercidos durante certo prazo para que ao fim desse tempo fique inalteravelmente definida a situação jurídica das partes. É de interesse público que tais situações fiquem, assim, definidas duma vez para sempre com o transcurso do respectivo prazo” (cfr. Teoria Geral da Relação Jurídica, vol II, pag. 464).
Assentando a caducidade num prazo a contar de determinado acontecimento, este coincide, por via de regra, com o momento a partir do qual o direito pode ser exercido (art. 329º CC).
E o direito só pode ser exercido a partir do momento em que o respectivo titular tem dele conhecimento.
Logo, a caducidade dos direitos decorrentes dos defeitos de obra pressupõe, no mínimo, que entre o momento do seu conhecimento pelo dono da obra e o momento da sua denúncia ao empreiteiro medeia um intervalo de tempo superior ao previsto na lei para essa denúncia.
Porque, como se sabe, os defeitos podem ser aparentes (e logo, cognosciveis) ou ocultos.
Aqueles devem ser denunciados ou objecto de reserva no momento da aceitação da obra (art. 1219º nº1 CC).
Estes devem ser denunciados no prazo de 30 dias subsequentes ao seu descobrimento (art. 1220º nº1 CC) ou, no caso dos imóveis destinados a longa duração, no prazo de um ano (art. 1225º nº2 CC).
Daí a essencialidade da concretização dos defeitos, para, por via dela, se aferir desde logo do momento do seu conhecimento (ou da sua cognoscibilidade) e da tempestividade da sua invocação.
Porque se se verificam defeitos numa obra e mesmo assim ela é aceite sem reservas e com conhecimento deles pelo respectivo dono, o empreiteiro não responde por eles.
E se os defeitos surgem posteriormente, importa saber quando é que foram conhecidos do dono da obra para a partir desse momento aferir a invocabilidade da caducidade.
Pela relação de defeitos junta com a petição, a exequente foi colocada em posição de se pronunciar quanto à caducidade dos direitos deles emergentes.
E o certo é que não invocou qualquer caducidade na contestação do articulado de oposição à execução, limitando-se, para além da defesa relacionada com a validade e eficácia do título executivo, a impugnar, por negação, esses defeitos.
Sendo certo que, estando em causa matéria não excluída da disponibilidade das partes, está vedado ao tribunal o conhecimento oficioso da caducidade (art. 303º ex vi do nº2 do art. 333º CC).
Logo, a caducidade teria que ser alegada pela parte a quem a respectiva procedência aproveitaria, in casu, a exequente.
Prevê a lei que o juiz convide as partes a suprir as irregularidades dos articulados, fixando prazo para o suprimento ou correcção do vício e a suprir as insuficiências e imprecisões na exposição ou concretização da matéria de facto alegada, fixando prazo para a apresentação de articulado em que se complete ou corrija o inicialmente produzido (art. 508º nº 2 e 3 CPC).
Foi com base nestes preceitos que se concedeu aos executados a oportunidade de corrigirem as deficiências na alegação dos defeitos, remediando as deficiências do articulado.
Nas palavras de Teixeira de Sousa,
O articulado é deficiente quando contenha insuficiências ou imprecisões na exposição ou concretização da matéria de facto (cfr. Art. 508º, nº3), isto é, quando nele não se encontrem todos os factos principais ou a sua alegação seja ambígua ou obscura. A deficiência respeita, por isso, ao conteúdo do articuilado e à apresentação da matéria de facto; esse vício pode traduzir-se, por exemplo, na insuficiência dos factos alegados ou em lacunas ou saltos na sua exposição.
Os factos alegados pela parte para o suprimento dessa deficiência não podem implicar uma alteração da causa de pedir ou da defesa anteriormente apresentadas...” (cfr. Estudos sobre o Novo CPC, 2ª ed. 1997, p.304).

Se é certo que, como decorre do nº 4 do art. 508º CPC, os factos aditados ficam sujeitos ao regime geral de contraditório, já o nº 5 deste mesmo preceito limita o ónus da respectiva alegação, proibindo que com eles se altere a causa de pedir ou se invoquem novos meios de defesa.
Os princípios que regem o processo civil designadamente em matéria de alteração da causa de pedir (art. 273º CPC) e de concentração de toda a defesa na contestação (artr. 489º CPC) não podem ser postergados pela faculdade de corrigir, completar ou esclarecer os articulados.
E se toda a defesa – por impugnação e por excepção - deve ser deduzida na contestação, então a eventual resposta ao aperfeiçoamento da petição – no qual, recorde-se, é vedada a alteração (v.g, o aditamento) da causa de pedir - também não pode servir de pretexto para acrescentar um novo fundamento de defesa, como é a dedução de uma excepção peremptória; de outro modo, estar-se-ia a violar aquele princípio da concentração da defesa na contestação cujo corolário lógico é a preclusão (caducidade) de todos os demais meios de defesa não invocados; dir-se-à que, com a contestação, “caducou” o direito a invocar, doravante, quaisquer outros meios de defesa (que não sejam supervenientes)...
Deste princípio da preclusão decorre uma importante consequência: os fundamentos da acção e da defesa devem ser invocados, respectiva e simultaneamente, na petição e na contestação, se bem que em planos não necessariamente ao mesmo nível (a título principal e/ou subsidiário ou eventual).
Nas palavras de Manuel Andrade:
Devendo os fundamentos da acção ou da defesa ser formulados todos de uma vez num certo momento a parte terá de deduzir uns a título principal e outros in eventu – a título subsidiário, para a hipótese de não serem atendidos os formulados em primeira linha.
O princípio traduz-se, portanto, essencialmente, na preclusão das deduções das partes” (cfr. Noções Elementares de Processo Civil, 1976, p. 380).

Do que, aplicado à defesa, decorre que o demandado tem que deduzir, desde logo, na contestação, todos os meios de defesa, directa ou indirecta, de que disponha contra a pretensão formulada e que lhe seja possível antever em face desta e da causa de pedir invocada, sem curar de distinguir a maior ou menor eficiência de qualquer deles, sob pena de, não o fazendo, não o poder vir a fazer mais.
Assim, se nesta não foi invocada a caducidade, estaria precludida a possibilidade de a deduzir contra o aditamento ou correcção ulterior.
A este propósito, anota Lebre de Freitas:
Excluída está também a utilização do despacho de aperfeiçoamento para suscitar a invocação pela parte de nova ou distinta causa de pedir ou de nova, ou diferente excepção (nº 5). O despacho de aperfeiçoamento e o subsequente articulado da parte devem conter-se no âmbito da causa de pedir ou excepção invocada” (cfr. Código de Processo Civil Anotado, vol 2º, 2001, p. 355).

Quer dizer: os factos integradores da causa de pedir e da excepção são (devem ser...) alegados, em primeira mão e em primeira linha, nos articulados principais e não nos respectivos aperfeiçoamentos, correcções ou aditamentos, porquanto estes são complementos daqueles.
O contraditório desencadeado com este articulado complementar é, portanto, limitado, na medida em que, sendo ele apresentado pelo autor (impedido de, através dele, alterar a causa de pedir, como vimos), está vedado à parte contrária a invocação de novos meios de defesa não alegados na contestação primitiva.
Assim, o objecto do processo, definido nos articulados principais (pedido, causa de pedir e excepções), não pode ser alterado nos articulados complementares (princípio da proibição da mutatio libellis); salvo o caso de articulados supervenientes, as alegações das partes subsequentes aos articulados principais não podem, em caso algum, implicar uma mudança no objecto fixado na demanda, na contestação e, se tiver sido deduzida, na reconvenção.
A proibição da mutatio libellis não afecta, contudo, a faculdade de formular alegações complementares desde que nestes se respeite aquela proibição: os articulados complementares são, por conseguinte, sempre admissíveis desde que não acrescentem nova causa de pedir nem nova excepção (cfr. Lorca Navarrete, Tratado de Derecho Procesal Civil, 2000, p. 883).
Como se referiu, a causa petendi (do direito invocado pelos executados contra a exequente decorrente da execução defeituosa da obra) analisa-se em concretas anomalias e víciosdesajustamentos entre o que foi convencionado e o que foi executado ou entre o que foi executado e o que deveria ter sido executado... - que foram totalmente omitidos na petição inicial.
Logo, era essencial à alegação da causa de pedir, o confronto dos factos integradores deste desvio entre o ser e o dever ser, isto é, entre o que foi feito e o que deveria ter sido feito...
Conjugando os artigos 25º e segs da petição inicial com a documentação com ela junta, descortina-se claramente a alegação de anomalias e vícios da obra que, mediante requerimento dos próprios opoentes e sem oposição da exequente, o Tribunal entendeu mandar completar e concretizar.
E, em face do articulado da petição de oposição à execução conjugado com os documentos juntos, era possível antever a viabilidade da excepção de caducidade dos direitos emergentes dos defeitos da obra, nas várias vertentes que tal excepção comporta (caducidade do direito à denúncia, caducidade do direito à eliminação, à redução do preço, etc).
Não tendo invocado a caducidade dos direitos emergentes dos defeitos da obra no momento próprio, ou seja, na contestação da oposição à execução, precludiu o direito de a invocar em qualquer momento processual posterior.
Como refere Lebre de Freitas, o ónus de contestar inclui quer o de impugnar, quer o de excepcionar com a dedução de todas as excepções que, não sendo de conhecimento oficioso, tenha contra a pretensão do autor (art. 489º). A inobservância de qualquer destes ónus dá lugar a preclusões (de contestar, de impugnar, de excepcionar) (cfr. Introdução ao Processo Civil, 1996, p.. 145).
De todo o exposto decorre que, tendo sido omitida na contestação, a excepção de caducidade deduzida em resposta a um aperfeiçoamento, correcção ou aditamento à petição inicial é ineficaz porque, constituindo defesa nova, precludira o direito de a invocar depois da contestação.
Logo, deveria a mesma ter sido rejeitada no acórdão recorrido.
Não o tendo sido, impõe-se a revogação do acórdão recorrido para ficar a subsistir a sentença de 1ª instância, uma vez que a exequente, ora recorrida. não requereu a ampliação do objecto do recurso, designadamente quanto à verificação dos requisitos da excepção de incumprimento do contrato, legitimadora da recusa de prestação pelos executados, como foi julgado pela 1ª instância.
ACÓRDÃO

Pelo exposto, acorda-se em, concedendo a revista, revogar o acórdão recorrido para ficar a subsistir a sentença de 1ª instância.
Custas pela recorrida.

Lisboa e STJ, 29-01-2014
Os Conselheiros
Fernando Bento
João Trindade

Tavares de Paiva