Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1060/22.9T8TMR.E1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: JOSÉ EDUARDO SAPATEIRO
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
RESPONSABILIDADE AGRAVADA
VIOLAÇÃO DE REGRAS DE SEGURANÇA
REPRESENTANTE
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
ÓNUS DE PROVA
Data do Acordão: 05/28/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDO PARCIALMENTE O RECURSO DE REVISTA
Sumário :
I – O trabalhador que operou a grua de transporte do pilar de cimento que veio a chocar com os pilares que delimitavam o posto de trabalho do trabalhador sinistrado que, por força do acontecido, faleceu de imediato, violou regras de segurança no trabalho que foram uma das causas da ocorrência daquele.

II – Encontrando-se apenas o operador da grua e o sinistrado no Pavilhão da empregadora 2.ª Ré e nada mais resultando da factualidade dada como provada, não é possível, nessa medida, imputar ao primeiro a qualidade de «representante» referida no número 1 do artigo 18.º da LAT, quando competiria às Autoras ou à Companhia de Seguros alegar e provar factos que permitissem a este STJ qualificar o referido operador como tal, nos termos dos artigos 552.º e 571.º a 573.º do NCPC e 342.º, n.º 1, do Código Civil.

III – Logo, o operador da grua, ao atuar como atuou, em violação das referidas regras de segurança, não agiu como «representante» da 2.ª Ré, nos termos e para os efeitos do número 1 do artigo 18.º da LAT.

IV - A presença, pelo menos regular ou, no mínimo, nos momentos críticos e com maiores riscos, de um encarregado ou chefe de secção que aferisse se tudo estava conforme, não apenas com as regras de segurança legais e internas, mas também com as boas práticas que o espaço em que se deslocava a grua, com as suas especificidades e circunstâncias particulares demandavam, parece-nos evidente, dado aquela atividade de fabrico dos pilares nos moldes, retirada das vigas dos mesmos e sua movimentação pelo ar e entre paredes para os espaços de armazenamento, era efetuada diária e repetidamente ou, pelo menos, com muita frequência.

V – Tal presença de um terceiro, naturalmente mais experiente e com maior responsabilidade perante a empresa e os trabalhadores que ali se encontravam no dia do sinistro dos autos, poderia ter evitado o acidente de trabalho dos autos ou, pelo menos, diminuído de uma forma mais ou menos intensa os riscos a este associados, através da observação, da orientação, da correção e da chamada de atenção para o que DD estava a fazer – orednado a colocação a uma altura maior do pilar, alertando-o para o facto de não o poder deixar sem vigilância e proibindo-o de não levar o comando consigo - e, também, pedindo a este último ou determinando ele próprio que o sinistrado se afastasse do seu posto de trabalho e se colocasse a uma distância segura.

VI - Quanto ao local ou posto de trabalho do sinistrado, há que questionar não apenas a sua existência naquele preciso lugar, que, como se viu, estava situado na zona de risco do transporte com a aludida grua de cargas pesadas, como era habitual, como ainda a sua conceção, que, de alguma forma, emparedava o sinistrado entre vigas de cimento, assentes em barrotes de madeira, que podiam atingir a altura de 3 metros e que estavam distanciadas entre si apenas 2 metros, deixava o trabalhador num espaço claustrofóbico e sem grande margem para o mesmo fugir ou se proteger de uma qualquer eventualidade que ocorresse nesse seu posto de trabalho.

VII – Deve encarar-se tal posicionamento e conceção do posto de trabalho do sinistrado, nas circunstâncias concretas em que se deu o acidente de trabalho dos autos, como uma concausa, que concorreu, em conjunto com a conduta imprudente e desafortunada do DD e a ausência de vigilância relativa ao trabalho do mesmo e até do sinistrado, para a sua verificação.

VIII - Foram assim violadas regras de segurança no trabalho que, em última análise e não obstante as condutas do operador da grua, podem e devem ser assacadas à 2.ª Ré, nos termos do número 1 do artigo 18.º da LAT, o que implica a revogação parcial do Acórdão recorrido nessa parte.

IX - Tendo em atenção que, de acordo com os artigos 665.º e 679.º do NCPC, não é aplicável ao STJ o princípio da substituição do tribunal recorrido pelo tribunal de recurso, quando, na sequência da procedência total ou parcial da revista, existem questões jurídicas pendentes, que por terem ficado prejudicadas, não foram objeto de análise e decisão pela 2.ª instância [no caso dos autos, as consequências jurídicas da responsabilização agravada da 2.ª Ré que se mostram previstas, designadamente, nos números 4 a 6 do artigo 18.º da LAT ] impõe-se determinar ainda que os autos baixem ao Tribunal da Relação de Évora afim de aí serem julgadas tais questões de natureza jurídica.

Decisão Texto Integral:
RECURSO DE REVISTA N.º 1060/22.9T8TMR.E1.S1 (4.ª Secção)

RECORRENTES: AA

BB

RECORRIDAS: FIDELIDADE COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.

VIGOBLOCO – PRÉ-FABRICADOS, S.A.

(Processo n.º 1060/22.9T8TMR – Tribunal Judicial da Comarca de Santarém - Juízo do Trabalho de ... - Juiz...)

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

I – RELATÓRIO

1. AA, por si e em representação de sua filha menor BB, com os sinais constante dos autos, apresentou Petição Inicial no dia 2/5/2023, assim se abrindo a fase contenciosa desta ação declarativa emergente de acidente de trabalho com processo especial [que teve início, em termos da sua fase conciliatória, no dia no dia 28/06/2022, com a participação do sinistro mortal por parte da Seguradora] contra a FIDELIDADE COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. [1.ª Ré] e VIGOBLOCO – PRÉ-FABRICADOS, S.A. [2.ª Ré], também com os sinais constante dos autos, requerendo a final o seguinte:

“Termos em que, e nos melhores e Direito, deve a presente ação ser julgada procedente, por provada e, em consequência:

I - Ser julgado o acidente que o trabalhador sinistrado sofreu, como acidente de trabalho.

II - Ser julgado que à data da morte do trabalhador sinistrado, o seu salário anual ilíquido ascendia a € 26.414,50.

III – Com referência a esse valor, ser a 1.ª Ré Seguradora e a 2.ª Empregadora - em virtude da diferença entre o valor da média anual ilíquida, realmente recebida pelo trabalhador sinistrado e aquele cuja responsabilidade foi transferida – sem prejuízo do eventual direito de regresso daquela, serem condenadas no seguinte:

i - A pagarem à Autora AA uma pensão por morte do trabalhador sinistrado, na percentagem de 30 % da retribuição deste até perfazer a idade de reforma por velhice e 40 % a partir daquela idade ou da verificação de deficiência ou doença crónica que afete sensivelmente a sua capacidade para o trabalho

De que resulta:

Para a 1.ª Ré - uma pensão anual e vitalícia no valor de € 7.347,39 e para a 2.ª Ré , uma pensão anual e vitalícia no valor de € 576,96, atualizáveis, nos termos descritos, para € 9.796,52 para aquela e € 769,28, para esta, acrescidas de juros de mora legais, com início em 29/06/2022, as quais deverão ser pagas às beneficiárias, adiantada e mensalmente, até ao 3.º dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual, e os subsídios de férias e de Natal, cada um no valor de 1/14 da pensão anual, respetivamente, nos meses de Junho e Novembro.

ii – A pagarem à 2.ª Autora BB, representada pela 1.ª Autora, uma pensão por morte, na percentagem de 20 % da retribuição do sinistrado, devida até completar os 18, 22 ou 25 anos, enquanto frequentar o ensino secundário, curso equiparado ou ensino superior

De que resulta:

Para a 1.ª Ré, uma pensão anual e temporária, no valor de € 4.898,26 e para a 2.ª Ré uma pensão anual e temporária, no valor de € 384,64, acrescidas de juros de mora legais, com início em 29/06/2022, as quais deverão ser pagas às beneficiárias, adiantada e mensalmente, até ao 3.º dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual, e os subsídios de férias e de Natal, cada um no valor de 1/14 da pensão anual, respetivamente, nos meses de junho e novembro.

IV – Ser a 1.ª Ré, Seguradora condenada a pagar à 1.ª Autora a quantia de € 2.925,12, a título de subsídio por morte, acrescida de juros à taxa legal, desde a data do acidente até integral embolso.

V - Ser a 1.ª Ré, Seguradora condenada a pagar à 1.ª Autora a quantia de € 60,00, a título de despesas suportadas com deslocações, acrescida de juros à taxa legal, desde a data do acidente até integral embolso.

VI - Ser a 1.ª Ré, Seguradora condenada a pagar à segunda Autora a quantia de € 2.925,12, a título de subsídio por morte, acrescida de juros à taxa legal, desde a data do acidente até integral embolso.

VII - Deve ser julgado que 2.ª Ré, Empregadora, atuou de forma culposa ao não observar as regras sobre segurança e saúde no trabalho que lhe eram exigidas e que foram causa, direta e necessária para ocorrência do acidente de trabalho de que resultou a morte do trabalhador sinistrado.

VIII - Em consequência ser a 2.ª Ré Empregadora, condenada no seguinte:

i - A pagar às Autoras as pensões resultantes do agravamento da responsabilidade por atuação culposa do empregador, não cobertas pela 1.ª Ré, com referência à média anual ilíquida de € 26.414,50, repartida por ambas as beneficiárias na percentagem de 60% para a primeira e 40% para a segunda, do que resulta para aquela, a pensão anual e vitalícia no valor de € 7.954,35, e para esta, a pensão anual e temporária, no valor de € 5.302,90, devida até completar os 18, 22 ou 25 anos, enquanto frequentar o ensino secundário, curso equiparado ou ensino superior, acrescidas de juros de mora à taxa legal, com início em 29/06/2022, as quais deverão ser pagas às beneficiárias, adiantada e mensalmente, até ao 3.º dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual, e os subsídios de férias e de Natal, cada um no valor de 1/14 da pensão anual, respetivamente, nos meses de Junho e Novembro.

IX - A pagar às Autoras a totalidade dos prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos pelo trabalhador e seus familiares, nos termos gerais, conforme se discriminam:

a) – Pelo Dano morte, na quantia de € 60.000,00: € 30.000,00 para cada uma, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a data do acidente até integral embolso.

b) - Pelo Dano Moral Próprio da Vítima, na quantia de € 15.000,00: € 7.500,00 para cada uma, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a data do acidente até integral embolso.

c) - Pelos Danos Morais das Autoras, na quantia de € 30.000,00; 15.000,000 para cada uma, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a data do acidente até integral embolso”.


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2. As Autoras alegaram para o efeito e muito em síntese, que o acidente que vitimou o Sinistrado CC, respetivamente, seu cônjuge e pai, derivou de violação de normas de segurança e saúde no trabalho por parte da entidade empregadora, devendo ser compensadas e indemnizadas nos termos que reclamam.

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3. A Ré Seguradora, que foi regularmente citada, contestou a presente ação, onde, muito em síntese, pugnou pela sua absolvição, com fundamento em ter o acidente de trabalho sido provocado pela violação culposa da 2.ª Ré das regras de segurança no trabalho, pelo que responderá nos termos em que responderia caso o acidente não fosse devido à conduta culposa da 2.ª Ré, tendo, por isso, direito de regresso sobre esta.

Apenas aceitou que o contrato de seguro de acidentes de trabalho celebrado com a Entidade Empregadora garantia a transferência da remuneração anual do Sinistrado no montante de € 26.102,26.


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4. A Ré VIGOBLOCO – PRÉ-FABRICADOS, SA., também regularmente citada, pugnou, na contestação que igualmente apresentou nos autos, pela sua absolvição, invocando a sua ilegitimidade e alegando ter cumprido todas as regras de segurança e saúde.

Invocou ter transferido integralmente a remuneração do Sinistrado para a Seguradora, derivando a divergência do reclamado na petição inicial, da contabilização em duplicado das diuturnidades (€ 26,86 x 14 = €1.018,50).

Subsidiariamente, suscitou o incidente de intervenção acessória provocada de M..., Lda., caso se entenda que se verificou a inobservância das regras de segurança e saúde no trabalho ou de DD, caso se entenda que ocorreu violação das regras de segurança e saúde no trabalho existentes.


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5. Foi indeferido o chamamento de M..., Lda. e de DD, conforme consta do despacho judicial de 20/10/2023, que transitou em julgado.

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6. A Segurança Social foi igualmente citada para os termos desta ação, mas nada veio requerer dentro do prazo legal.

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7. Foi proferido, com data de 17/11/2023, Despacho Saneador, onde foi julgada improcedente a exceção dilatória de ilegitimidade arguida pela Ré empregadora e foram organizados os factos assentes, identificado o objeto do litígio e efetuada a enunciação dos temas da prova.

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8. Foi realizada a Audiência Final, com observância do legal formalismo.

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9. Por sentença de 27/04/2024, proferida nos autos principais, foi decidido o seguinte:

“Nesta conformidade e em face de tudo o exposto, declara-se que CC, em 28/06/2022, sofreu um acidente de trabalho indemnizável, do qual lhe adveio a morte em 28/06/2022, auferindo a remuneração média anual e ilíquida de, pelo menos, € 26.102,26, nessa data, tendo deixado como únicas beneficiárias AA e BB e, em consequência, decide-se:

1.- Condenar a 1.ª Ré FIDELIDADE - COMPANHIA DE SEGUROS SA. a pagar à Autora AA, a pensão anual, vitalícia e atualizável, devida desde 29/06/2022, no valor de € 7.830,68, correspondente a 30% da retribuição do Sinistrado até perfazer a idade de reforma por velhice.

A pensão será de 40% a partir daquela idade ou da verificação de deficiência ou doença crónica que afete sensivelmente a sua capacidade para o trabalho;

2.- Condenar a 1.ª Ré FIDELIDADE - COMPANHIA DE SEGUROS SA. a pagar à Autora AA a quantia de € 2.925,12, a título de subsídio por morte, devida desde 29/06/2022 e a quantia de € 60,00 a título de despesas com deslocações;

3.- Condenar a 1.ª Ré FIDELIDADE - COMPANHIA DE SEGUROS SA. a pagar à Autora AA juros legais sobre as quantias referidas em 1. e 2., no que se refere à pensão anual e subsídio por morte, contados desde 29/06/2022 e das despesas com deslocações, contados desde a sua citação até integral e efetivo pagamento;

4.- Absolver, no mais, a Ré FIDELIDADE - COMPANHIA DE SEGUROS SA. do peticionado pela Autora AA;

5.- Condenar a 1.ª Ré FIDELIDADE - COMPANHIA DE SEGUROS SA. a pagar à Autora BB, a pensão anual, temporária e atualizável, no valor de € 5.220,45, devida desde 29/06/2022 e até completar os 18, 22 ou 25 anos, enquanto frequentar o ensino secundário, curso equiparado ou ensino superior, e a quantia de € 2.925,12, a título de subsídio por morte, quantias estas acrescida de juros contados desde 29/06/2022 e até integral pagamento, absolvendo-se, no mais, esta Ré do demais por esta Autora peticionado;

6.- Absolver a Ré VIGOBLOCO – PRÉ-FABRICADOS, SA. de todos os pedidos contra a mesma deduzidos pelas Autoras AA e BB;

7.- Condenar as Autoras AA e BB e a 1.ª Ré FIDELIDADE - COMPANHIA DE SEGUROS SA. no pagamento das custas, na proporção do decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário das primeiras.

Registe e notifique.

A causa tem o valor de € 269.160,06.

A responsabilidade pelo pagamento das custas tem a seguinte proporção:

- 39,01% para as Autoras;

- 60,99% para a 1.ª Ré. […]”.


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10. As Autoras e a Ré Seguradora interpuseram recursos de apelação, que foram admitidos e subiram ao tribunal da 2.ª instância, onde correram os seus normais termos.

Por Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 12.09.2024, foi decidido julgar improcedentes os dois recursos de Apelação e confirmar a decisão recorrida.


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11. As Autoras e a Ré Seguradora vieram interpor recursos de revista excecional, tendo as primeiras o feito com os fundamentos constantes das alíneas a), b) e c) do número 1 do artigo 672.º do CPC/2013, ao passo que a segunda o fez ao abrigo do artigo 672.º, n.º 1, alíneas a) e b) do C.P.C.

A Ré Empregadora contra-alegou.

Por despacho do Juiz-Desembargador Relator de 28/10/2024, os dois recursos foram admitidos.


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12. Tendo os dois recursos de revista excecional chegado a este Supremo Tribunal de Justiça, foram objeto de um despacho liminar, datado de 22/11/2024, onde se considerou que, por se mostrarem verificados os requisitos legais gerais e especiais de aceitação de cada um deles, os mesmos deveriam ser admitidos e remetidos à formação prevista no número 3 do artigo 672.º do NCPC.

A formação prevista em tal disposição normativa decidiu por Acórdão prolatado no dia 29/01/2025, admitir tais recursos de revista excecional quanto às questões suscitadas pelas partes e que se mostram abordadas nos seguintes moldes, em sede da sua fundamentação:

«Como se vê, um e outro recurso colocam questões jurídicas delicadas, tanto sobre o conceito de representante para efeitos da aplicação do artigo 18.° da LAT (e sua articulação com o artigo 17.°), como quanto ao juízo de culpa do empregador, mormente em que medida é que este se estende à conceção do local de trabalho e à supervisão efetiva do cumprimento das regras de segurança.

Trata-se de questões com relevância jurídica que merecem uma apreciação por este Supremo Tribunal por ser necessária tal apreciação para uma melhor aplicação do direito. Estando preenchida a alínea a) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC, torna-se desnecessário verificar se também estarão preenchidas as alíneas b) ou c) porquanto basta o preenchimento de uma das alíneas do n.º 1 do artigo 672.º do CPC para que a revista excecional deva ser admitida.»


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13. As Autoras apresentaram alegações, tendo formulado as seguintes conclusões recursórias:

«1.º - O presente Recurso de Revista Excecional deve ser admitido porque o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora ao julgar que o acidente de trabalho que o sinistrado sofreu não resultou da falta de observação por parte da 2ª Ré Empregadora das regras sobre a segurança e saúde no trabalho, donde resultaria a responsabilidade agravada desta, prevista no n.ºs 1 e 4 do art.º 18.º da LAT., com as consequências legais daí resultantes, antes decidindo que não existiu violação das regras sobre a segurança, higiene e saúde no trabalho da sua parte, nem o acidente foi por si provocado, subsumindo os factos apurados à hipótese prevista no artigo 17.º da Lei 98/2009, de 04/09 por DD não ser seu representante, incorre no erro de interpretação e aplicação da lei, violando as disposições de ambos os artigos, questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, se torna claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

2.º - O presente Recurso de Revista Excecional deve ser admitido porque o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora ao julgar que o acidente de trabalho que o sinistrado sofreu não resultou da falta de observação por parte da 2.ª Ré Empregadora das regras sobre a segurança e saúde no trabalho, donde resultaria a responsabilidade agravada desta, prevista no n.ºs 1 e 4 do art.º 18.º da LAT, com as consequências legais daí resultantes, antes decidindo que não existiu violação das regras sobre a segurança, higiene e saúde no trabalho da sua parte, nem o acidente foi por si provocado, subsumindo os factos apurados à hipótese prevista no artigo 17.º da Lei 98/2009, de 04/09 por DD não ser seu representante, incorre no erro de interpretação e aplicação da lei, violando as disposições de ambos os artigos, o que coloca em causa interesses de particular relevância social.

3.º - O presente Recurso de Revista Excecional deve ser admitido porque o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora ao julgar que o acidente de trabalho que o sinistrado sofreu não resultou da falta de observação por parte da 2.ª Ré Empregadora das regras sobre a segurança e saúde no trabalho, donde resultaria a responsabilidade agravada desta, prevista no n.ºs 1 e 4 do art.º 18.º da LAT, com as consequências legais daí resultantes, antes decidindo que não existiu violação das regras sobre a segurança, higiene e saúde no trabalho da sua parte, nem o acidente foi por si provocado, subsumindo os factos apurados à hipótese prevista no artigo 17.º da Lei 98/2009, de 04/09 por DD não ser seu representante, incorre no erro de interpretação e aplicação da lei, violando as disposições de ambos os artigos e está em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, designadamente com o Ac. do STJ. N.º 559/18.6T8VIS. C1.S1 de 15/09/2021.

4.º - O Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora viola os n.ºs 1, 2 e 3 do art.º 281.º do Cód. do Trabalho ao não condenar a 2.ª Ré Empregadora em responsabilidade agravada com fundamento na violação de regras sobre a segurança e saúde no trabalho, pelo facto de não ter assegurado aos trabalhadores condições de segurança e saúde em todos os aspetos relacionados com o trabalho, aplicando as medidas necessárias tendo em conta princípios gerais de prevenção, o que originou o acidente.

6.º - O Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora viola os arts. n.ºs 5.º, 15.º e 20.º do Regime Jurídico da Promoção da Segurança e Saúde no Trabalho aprovado pela Lei nº 102/2009, de 10.9, na redação dada pela Lei n.º 3/2014, de 28.1., ao não condenar a 2.ª Ré Empregadora em responsabilidade agravada com fundamento na violação de regras sobre a segurança e saúde no trabalho, pelo facto de não assegurar aos trabalhadores condições de segurança e de saúde em todos os aspetos do seu trabalho, o que originou o acidente.

7.º - O Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora viola os arts. nºs 5 e 6 do art.º 69.º da Portaria n.º 53/71 de 03/02 na redação que lhe foi dada pela Portaria n.º 702/80 de 22/09, que aprova o Regulamento Geral de Segurança e do Trabalho nos Estabelecimentos Industriais ao não condenar a 2.ª Ré Empregadora em responsabilidade agravada com fundamento na violação de regras sobre a segurança e saúde no trabalho, pelo facto de permitir que os seus trabalhadores procedam à elevação, transporte horizontal e descida das cargas suspensas em clara desobediência àqueles referidos dispositivos, designadamente que, sob as suas ordens, direção e fiscalização, os condutores dos aparelhos de elevação não se façam acompanhar por sinaleiros que devem dirigir a manobra de maneira que as cargas não esbarrem em qualquer objeto; transportem as cargas por cima dos trabalhadores e dos locais onde a sua eventual queda possa constituir perigo, bem como abandoná-las sem vigilância quando se encontra suspensa uma carga, o que originou o acidente.

8.º - O Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora viola o n.º 4 do art.º 33.º do DL. n.º 50/2005, de 25 de Fevereiro que regula as Prescrições Mínimas de Segurança e de Saúde na Utilização de Equipamentos de Trabalho e que sobre Equipamentos de Trabalho de Elevação de Cargas pelo facto de permitir, sob as suas ordens, direção e fiscalização, a presença de trabalhadores sob cargas suspensas ou a deslocação de cargas suspensas por cima de locais de trabalho não protegidos e habitualmente ocupados por trabalhadores, o que originou o acidente.

9.º - O Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora viola os n.ºs 1 e 2 do art.º 11º do DL. n.º 50/2005, de 25 de Fevereiro que regula as Prescrições Mínimas de Segurança e de Saúde na Utilização de Equipamentos de Trabalho/Equipamentos de Trabalho de Elevação de Cargas ao permitir sob as suas ordens, direção e fiscalização, que os sistemas de comando de um equipamento de trabalho que têm incidência sobre a segurança não sejam claramente visíveis e identificáveis e ter, se for caso disso, uma marcação apropriada e ainda por não assegurar que os mesmos sejam colocados fora das zonas perigosas, de modo que o seu acionamento, nomeadamente, por uma manobra não intencional, possa ocasionar riscos suplementares, o que originou o acidente.

10.º - O Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora viola os n.ºs 1 e 4 do art.º 17.º da LAT, ao não condenar a 2.ª Ré Empregadora em responsabilidade agravada com fundamento na violação de regras sobre a segurança e saúde no trabalho, ao entender que quando essa violação possa provir de outro trabalhador, não é, de igual forma, responsável, com o benefício do direito de regresso que lhe assista, quando essa violação lhes seja imputável.

Motivo por que deverá ser revogada e substituída por outra que atenda a pretensão das Recorrentes já que, só assim se fará Justiça!»

14. A recorrida e 2.ª Ré VIGOBLOCO – PRÉ FABRICADOS, S.A. veio apresentar contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões:

«[…]

I. Porém, o referido Acórdão alegado pelas Recorrentes e que sustenta o seu recurso, assenta numa situação em que (i) o acidente ocorreu quando o trabalhador estava a trabalhar numa Empresa terceira (ii) ocorreu violação das regras de segurança, (iii) o sinistrado não estava a fazer as suas funções habituais, (iv) não tinha formação para aquelas funções, (v) não havia uma avaliação de riscos associados àquela tarefa, (vi) nao havia procedimentos de segurança para aquelas funções, permitindo que as garrafas de gás comprimido fossem transportadas sem qualquer bloqueio de segurança; entre outras irregularidades que não se verificaram no caso em apreço!!!

J. Diga-se ainda, que, tanto o Tribunal de 1.ª Instância, como o TRE, aplicaram corretamente o art.º 17.º. e o art.º 18.º, da LAT, demonstrando conhecer que são figuras distintas; aliás, a 1.ª Instância justificou ao longo da sentença, por um lado, a não aplicação do art.º 18.º da LAT, e, por outro lado, a aplicação do art.º 17.º; E, por sua vez, também o TRE confirmou que não ocorreu violação de regras de segurança nos termos do art.º 18.º da LAT, uma vez que “trabalhador DD, como bem se decidiu na sentença recorrida, não se pode considerar “representante” da empregadora para efeitos do artigo 18.º da LAT, uma vez que na altura em que ocorreu o acidente não estava a exercer o poder diretivo que é conferido ao empregador no âmbito do contrato de trabalho – cf. acórdão desta Secção Social de 30-03-2023, proferido no processo n.º 955/21.1T8LRA-A.E1, acessível em www.dgsi.pt, no qual se desenvolve a matéria relacionada com a definição de “representante” ínsita no artigo 18.º da LAT.” [vide pág. 31/32, do Acórdão recorrido].

K. Porém, e em bom rigor, não poderia o Tribunal de 1.ª Instância e o TRE, condenarem a Recorrida, nos termos do art.º 18.º da LAT, quando toda a prova junta e produzida na 1.ª Instância, indicou que não foi esta a responsável pelo acidente, porquanto todos os trabalhadores eram especializados nas funções que desempenhavam, tinham formação exaustiva, a Empresa tinha visitas regulares por parte de uma TSST, e que tinha instituídas as regras sobre segurança e saúde no trabalho necessárias a evitar a ocorrência de acidentes, as quais eram do conhecimento de todos os trabalhadores, e que, a serem cumpridas, teriam evitado o acidente.

L. Deste modo, não só o Tribunal de 1.ª Instância verificou que a Recorrida não era responsável nos termos do art.º 18.º da LAT, como concluiu que o acidente ocorreu por culpa do seu trabalhador DD; tendo sido confirmado pelo TRE;

M. No art.º 18.º da LAT, o terceiro tem necessariamente uma conexão de responsabilidade (uma correlação) com a organização do trabalho do sinistrado; e, no caso do art.º 17.º da LAT, essa conexão não existe, o que justifica a diversidade dos regimes.

N. O Tribunal de 1.ª Instância, e o TRE, não afastaram a aplicação do art.º 18.º da LAT, apenas e tão só, porque o trabalhador DD foi responsável pelo acidente, mas porque aferiram que, atentos todos os factos apurados, não era a Recorrida responsável, nos termos de tal preceito legal.

O. As Recorrentes levantaram ainda, em sede de recurso, a violação dos art.º 281.º do CT, os art.ºs 5.º, 15.º e 20.º da Lei 102/2009; o art.º 69.º, da Portaria n.º 53/71 e os art.ºs 11.º e 33.º, do DL 50/2005; o que, salvo melhor opinião, processualmente, tampouco o podem fazer.

P. Tais preceitos apenas pretendem demonstrar obrigações – cumpridas pela Recorrida, enquanto empregadora e devidamente analisadas – mas que não foram cumpridas por um dos seus trabalhadores, o que não recai no art.º 18.º da LAT, porquanto não existiu atividade culposa da Recorrida, enquanto empregadora.

Q. O art.º 281.º CT e art.ºs 5.º e 15.º da Lei 102/2009, correspondem a princípios e obrigações gerais do empregador; não tendo as Recorrentes concretizado o que, no S. entender, a Recorrida não terá cumprido, em tais disposições legais; não podendo bastar-se a alegar, de forma geral, preceitos e obrigações gerais;

R. Quanto ao art.º 20.º, Lei 102/2009, o Tribunal de 1.ª Instância deu como provado que, tanto o sinistrado, como o trabalhador DD tinham formação exaustiva e eram trabalhadores especializados naquelas funções – vide factos provados 75, 76, 77 e 78, e pág. 38, da sentença da 1.ª Instância;

S. Quanto ao art.º 69.º Portaria n.º 53/71, e art.ºs 11.º e 33.º DL 50/2005, todas as regras de segurança para manutenção e elevação de cargas, e sistema de comando, agora alegadas, eram cumpridas pela Recorrida – ver, a título de ex., os factos provados 17, 18, 19, 27, 28, 59, 61, 62, 64, 65, 66, 67; o facto cc) não provado; e pág. 27 a 29, 38 e 39, da sentença da 1.ª Instância;

T. De acordo com o acervo fáctico provado, o acidente foi causado por outro trabalhador da Recorrida, o Sr. DD, desde logo porque não pousou a carga suspensa (se tivesse baixado a carga, como devia – e sabia que devia, por ter formação e instruções claras nesse sentido –, o acidente nunca tinha ocorrido); ora, não só o referido trabalhador não cumpriu esta importante e basilar regra de segurança, como levou consigo o comando;

U. O trabalhador DD era um trabalhador especializado e experiente, e, nem ele, nem o sinistrado, precisavam de ter alguém a orientar o trabalho – págs. 38 e 40, respetivamente, da sentença da 1.ª Instância;

V. O trabalhador DD confessou que precisou de interromper o trabalho de manobrar a carga suspensa, porém, sabia que não podia deixar a carga, suspensa, e sem supervisão – veja-se, a título de ex: “De acordo com os procedimentos de operação de pontes rolantes instituídos pela Ré é expressamente proibida a passagem de cargas suspensas sobre trabalhadores e de deixar a carga suspensa sem vigilância, proibições estas que são conhecimento de todos os trabalhadores que executam estas tarefas para a 2.ª Ré.” – facto provado, da sentença da 1.ª Instância; e ainda “o acidente ocorreu em virtude de o trabalhador DD, ter deixado a carga suspensa, sem a vigiar, e pressionado inadvertidamente o comando (…) Entende-se que a regra de vigiar a carga suspensa, por parte do manobrador, existente na 2.ª Ré, que era do conhecimento dos trabalhadores, e que consta da instrução técnica 112, ponto 5, era adequada a evitar o acidente.” – pág. 38, da sentença da 1.ª Instância;

W. Deste modo, ao contrário do que alegam as Recorrentes, não é verdade que não pudesse o trabalhador DD estar a desempenhar as suas funções habituais, sozinho, sem que o encarregado estivesse a orientá-lo. Nem é verdade, que, o facto do local para onde queria transportar o pilar estar, alegadamente, com lixo o “obrigou a interromper a manobra e deixar a carga suspensa e levar consigo o comando da ponte rolante” – conforme alegam as Recorrentes –, pois, fosse qual fosse o motivo pelo qual tinha de interromper o trabalho, o trabalhador tinha sempre de baixar a carga. Não podia, nunca, deixar a carga suspensa, sem supervisão, virar costas e ir executar outro trabalho (fosse ele qual fosse), levando ainda o comando consigo, sem tampouco o pousar.

X. Alegam ainda as Recorrentes que, o trabalho do sinistrado devia ser feito fora da zona onde ocorreu o sinistro e que “obrigá-lo” a fazer aquele trabalho no local onde existe “maior trânsito de cargas suspensas … é confiar na perfeição dos seus trabalhadores”.

Y. Primeiramente, o sinistro não ocorreu, por causa do layout, que nunca poderia estar de outra forma, porém, existem regras para as pontes rolantes serem manobradas. Regras instituídas e que são do conhecimento de todos. Regras essas que se tivessem sido cumpridas, como dispõe a sentença da 1.ª Instância, eram suficientes para impedir a ocorrência do acidente.

Z. Para além do mais, nunca as Recorrentes referiram até então que existia no local um “maior trânsito de cargas suspensas”, as Recorrentes não recorreram da matéria de facto, nos termos do art.º 640.º do CPC; pelo que, tal facto novo deve ser rejeitado!

AA. Para além de processualmente inadmissível, tal facto novo é totalmente irrelevante, tendo presente o circunstancialismo em que ocorreu o sinistro, uma vez que não houve um choque de cargas, nem o acidente ocorreu porque o trabalhador DD manobrava uma carga suspensa e precisou de se desviar de uma outra eventual carga suspensa;

BB. Pelo supra exposto, as regras de segurança existiam, eram suficientes, e do conhecimento de todos os trabalhadores e, se tivessem sido cumpridas pelo trabalhador DD, o acidente nunca teria acontecido! Pelo que, apenas se pode concluir, em concordância com o Tribunal de 1.ª Instância que, não existe atividade culposa da Recorrida, e, é a entidade Seguradora a responsável por todos os valores devidos às Recorrentes, nos termos em que tinha – como se encontra provado – transferido integralmente a sua responsabilidade.

CC. Sendo que, não se termine sem antes referir que, nas alegações de recurso a que responde, as Recorrentes mais não fizeram do que repetir o teor do Recurso de Apelação, que interpuseram junto do TRE, e que foi julgado totalmente improcedente.

Nestes termos, e nos melhores que Vossas Excelências, mui douta e proficientemente suprirão, não deverá ser concedido provimento ao recurso de revista, confirmando-se a sentença da 1.ª Instância, bem como o Acórdão Recorrido; apenas mantendo-se inalterada a decisão de absolvição da Recorrida, de todos os pedidos, estar-se-á a asseverar a acostumada JUSTIÇA!»


*


15. A recorrente FIDELIDADE COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. resume nas suas conclusões as diversas facetas do seu recurso de revista:

«[…]

3. Dissente respeitosamente a recorrente do Acórdão recorrido que decidiu absolver do pedido a recorrida por considerar que o acidente se deveu à conduta do trabalhador desta, DD, não tendo a empregadora violado qualquer norma ou preceito sobre segurança e saúde no trabalho.

4. Considerou ainda o acórdão recorrido que a solução do pleito se inscreve no art.º 17.º da Lei 98/2009 de 4 de Setembro e, por isso, não lhe compete indemnizar os herdeiros da vítima em sede de responsabilidade agravada.

5. Considera a recorrente que se impunha a condenação da recorrida em sede de responsabilidade agravada, sem prejuízo de poder exercer sobre o seu trabalhador causador do sinistro o direito de ação que o art.º 17.º da NLAT lhe assegura.

6. É sempre o empregador que responde, em primeira linha, pelas consequências da violação das regras de segurança no trabalho, quer estas se devam diretamente a ação ou omissão sua ou a ação ou omissão de trabalhadores/colaboradores que tenha ao seu serviço.

7. Perpassa do acórdão recorrido ao comungar do entendimento vertido na 1.ª instância que a exoneração da responsabilidade da empregadora parece assentar no facto de esta não ter o domínio de todos os factos causadores do acidente, de não os protagonizar, para afastar o agravamento da responsabilidade naquele resultado.

8. A empregadora não pode demitir-se de uma atuação concertada e efetiva com vista ao cumprimento, no terreno, das regras que regulam a segurança no trabalho, não lhe bastando fornecer aos seus funcionários formação ou um manual com orientações (v. pontos 57. a 64., 77. a 79. da matéria de facto provada).

9. Os factos provados em 15. a 21. e 26. a 28. inculcam a ideia de severa negligência na execução de uma atividade perigosa (ponto 47. da matéria provada), não podendo a recorrida escapar à responsabilidade por tal atuação danosa, porquanto dela tira benefício.

10. A movimentação da carga, concebida como atividade perigosa, foi efetuada sem que qualquer dos encarregados da seção se encontrasse a controlar as operações no momento do acidente, permitindo a empregadora que os trabalhos fossem executados pelos operadores das pontes rolantes, o que revela uma tremenda falta de segurança da qual a recorrida não pode ser desresponsabilizada.

11. Para afastar o entendimento propugnado pela recorrente veio o Acórdão recorrido sufragar a ideia vertida na sentença da 1.ª instância de que a operação efetuada pelo DD não necessitava de ser supervisionado pelo superior hierárquico, nomeadamente, por qualquer encarregado da secção “porque o mesmo detinha formação e conhecimentos suficientes para poder executar a operação em segurança para a integridade física de outras pessoas, desde que cumprisse as regras instituídas pela empregadora, que eram adequadas e suficientes para evitar que qualquer carga suspensa e em movimento atingisse pessoas e bens”.

12. O Tribunal recorrido não possui factos de onde seja possível retirar a ilação de que a presença do superior hierárquico estava dispensada pela competência do trabalhador DD.

13. O Tribunal possui factos para afirmar com certeza que, se o encarregado da secção se encontrasse no local de trabalho o acidente certamente não se verificaria.

14. Numa atividade como a da recorrida, que envolve diariamente a movimentação de estrutura em pedra com toneladas de peso, o que potencia o perigo de produção de lesões, saltava seguramente aos olhos de um encarregado atento, que é pago para vigiar, inspecionar, supervisar e assegurar a normal execução do trabalho, uma carga de 6,5 toneladas suspensa, sem que com ela se encontrasse o trabalhador a quem essa operação estava confiada.

15. O DD elevou o pilar com 6,5 toneladas a cerca de 2 metros (pontos 15. e 16. da matéria de facto), manobrou-o até ao local próximo dos pilares e do corredor onde se encontrava a vítima (ponto 17.) parou a manobra, deixou a carga suspensa, levou consigo o comando da ponte rolante e foi realizar uma tarefa necessária para depositar o pilar no lugar que lhe tinha previamente destinado (ponto 18.).

16. A presença do encarregado de secção no local teria, com alta probabilidade, impedido tão horrendo acontecimento, ao agir em conformidade com o seu dever profissional, pondo cobro a tal situação.

17. A ausência do encarregado da secção constitui, por isso, causa adequada à produção do acidente e é imputável à recorrida porque permitiu que os trabalhos fossem executados pelos operadores das pontes rolantes sem a presença daquele.

18. Resulta com evidência que a recorrida não acautelou o controle/fiscalização da execução dos trabalhos e da movimentação dos trabalhadores na obra, tendo dado causa ao acidente com essa conduta omissiva.

19. Deve, por isso, responder por tal atuação culposa.

20. Todavia, caso assim se não entenda, o que não se concede, terá sempre a recorrida de ser condenada nos termos do art.º 18.º da NLAT em virtude do trabalhador DD ser seu auxiliar, de acordo com o art.º 800.º do Código Civil.

21. A noção de representante do art.º 18.º, n.º 1 da NLAT foi alargando o seu âmbito de aplicação, englobando as pessoas que atuem em nome ou representação da empregadora ou agem sob as suas ordens diretas, como é o caso de qualquer pessoa colocada na escala hierárquico-laboral de uma empresa.

22. Temos como certo que a recorrida permitiu que os operadores das pontes rolantes executassem os trabalhos que lhe competiam sem que qualquer dos encarregados se encontrasse a controlar a operação.

23. Tal traduz que a escala hierárquica na execução desse serviço está limitada a duas pessoas: o trabalhador que o realiza e o empregador que o ordena e no proveito do qual a execução é operada.

24. Quando ocorreu o acidente, o trabalhador DD agia sob as ordens diretas do empregador, em substituição do encarregado da secção, situação que configura situação análoga à do representante, prevista no art.º 18.º da NLAT.

25. No momento do acidente, tinha sido conferido diretamente ao trabalhador DD o poder quanto à execução dos trabalhos nas pontes rolantes, dispensando a empregadora o seu controle pelo encarregado de seção nas operações nas pontes rolantes, o que configura o conceito “de representante” previsto no art.º 18.º da NLAT.

26. Na ocasião do acidente, atenta a dispensa da presença do encarregado da secção nas pontes rolantes, o trabalhador DD agia sob as ordens diretas da entidade empregadora, o que determina a responsabilidade solidária da recorrida com esse trabalhador, ao abrigo do art.º 18.º, n.º 1 da NLAT.

27. Decidindo como decidiu violou o Tribunal recorrido o comando do art.º 18.º n.º 1 da NLAT.

Termos em que, deve ser concedido provimento ao recurso e, em consequência, deve a empregadora recorrida ser condenada em responsabilidade agravada, com todas as consequências. Assim se fazendo JUSTIÇA»


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16. A recorrida e 2.ª Ré VIGOBLOCO – PRÉ FABRICADOS, S.A. veio apresentar contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões:

«[…]

G. No fundo, a Recorrente recorre para o STJ sob o pretexto de querer que o conceito de “representante”, nos termos do art.º 18.º, n.º 1, da LAT, inclua a situação em apreço nos presentes autos – que, ficou provado, foi o acidente de trabalho causado por um trabalhador – colega do sinistrado – operador de pontes rolantes – operador fabril como aquele.

H. No caso em apreço, tanto a 1.ª Instância, como o Tribunal da Relação, apuraram as concretas circunstâncias em que ocorreu o acidente e decidiram que não ocorreu nenhuma das situações previstas no art.º 18.º da LAT e que o acidente só ocorreu por culpa, única e exclusiva, do colega, nos termos do art.º 17.º da LAT - Cfr. por exemplo, factos provados 17, 18, 19, 27, 28, 59, 61, 62, 64, 65, 66, 67 e pág. 27, 28, 29, 38, 39, 40, da sentença de 1.ª Instância e ainda pág. 30 a 32, do Acórdão recorrido;

I. O TRE analisou e concluiu que o Tribunal de 1.ª Instância tinha total razão, confirmando a sentença na íntegra, uma vez que não ocorreu violação de regras, tendo o acidente sido causado “apenas” pelo colega DD, que, como referiu e bem o Tribunal da Relação, não era “representante”, do empregador.

J. Ao contrário do que alega – e do que já tinha alegado no recurso de apelação – não é verdade que não pudesse o trabalhador DD estar a desempenhar as suas funções habituais, sozinho, sem que o encarregado estivesse, naquele exato momento no local, a orientá-lo.

K. Se um trabalhador especializado, com formação exaustiva, que, há anos, desempenha diariamente aquela função, precisasse de ter um encarregado a vigiar e orientar o seu trabalho, ao segundo, todas as Empresas precisariam de ter um encarregado por cada trabalhador, o que seria impossível.

L. Cfr. ficou provado, a partir do momento em que viu que o local não estava preparado, o trabalhador DD tinha sempre que baixar a carga. Não podia, nunca, deixar a carga suspensa, sem supervisão, virar costas e ir executar outro trabalho (fosse ele qual fosse), levando ainda o comando consigo, sem tampouco o pousar.

M. Nesse sentido, a mui douta sentença apelada julgou com rigor e objetividade os factos demonstrados por prova documental, e em sede de julgamento, subsumindo-os reta e adequadamente à decisão de Direito.

N. A verdade é, pois, só uma: As regras de segurança existiam, eram suficientes, e oportunas, sendo do conhecimento de todos os que ali trabalhavam e, inclusive, do trabalhador DD. E, se tais regras de segurança tivessem sido cumpridas por aquele trabalhador da Recorrida, o fatídico acidente (que muito se lamenta) nunca teria acontecido! – vide 6.º parágrafo, da pág. 31, do Acórdão recorrido;

O. Pelo que, s.m.o, entende a Recorrida que, só se poderá concluir, em concordância com a sentença proferida pelo Tribunal 1.ª Instância, e com o Acórdão do TRE, que, não existe atividade culposa da Recorrida, enquanto empregadora, e, é a Entidade Seguradora, a responsável por todos os valores devidos às beneficiárias, nos termos em que tinha – como se encontra provado – transferido integralmente a sua responsabilidade.

P. O trabalhador DD era um operador – que embora especializado na movimentação de pontes rolantes, era um operador fabril, como o sinistrado – e não se encontrava a substituir o encarregado, mas sim, como aliás era suposto, a desempenhar as suas funções de operador de pontes rolantes, para as quais, cfr. melhor veremos adiante, era especializado (fazia todos os dias, há já vários anos), e tinha formação e habilitação para o efeito (como aliás, considerou a 1.ª Instância, na pág. 40: “Como já se disse anteriormente, DD tinha formação adequada para as tarefas que estava a executar, sendo habilitado para o efeito e podendo executá-las com autonomia, não carecendo de ser controlado/vigiado pelo encarregado de secção”).

Q. Nestas circunstâncias, e atento o acervo fáctico provado, não teria qualquer cabimento legal, condenar a Recorrida nos termos do art.º 18.º da LAT, desde logo quando existe o normativo legal previsto no art.º 17.º da LAT!

R. Ora, o TRE ao confirmar a decisão proferida em 1.ª Instância, veio, por um lado, confirmar que não ocorreu qualquer violação de normas de segurança e saúde no trabalho pela empregadora, e, por outro lado, que, o fatídico acidente ocorreu por causa imputável ao trabalhador DD, que não é “representante” da empregadora, para efeitos do art.º 18.º da LAT, uma vez que não exercia qualquer poder diretivo que é conferido ao empregador.

S. Nesse prisma, e tendo presente o acervo fáctico provado, também o TRE apenas podia concluir que “nenhuma censura merece a decisão recorrida por ter considerado que não existia responsabilidade agravada da empregadora, de harmonia com o disposto no artigo 18.º da LAT.

T. Alega ainda a Recorrente, subsidiariamente, que o conceito de representante deve ser alargado a outras pessoas, designadamente aos auxiliares da empregadora na execução laboral; tratando-se da solução prevista nos artigos 500.º e 800.º do C. Civil, porém, o regime de responsabilidade por atos auxiliares pressupõe a responsabilidade civil, como sistema de reparação, sucede que, a reparação dos acidentes de trabalho terá, necessariamente, de ser procurada noutro sistema reparatório.

U. Os artigos 500.º e 800.º do CC são preceitos legais de Direito Civil, no âmbito do qual poderá, ou não, existir responsabilidade civil, o que não se poderá alegar, nem nesta fase processual, nem tampouco o tribunal de trabalho seria competente para dirimir sobre tal matéria. Assim, não é, e nunca foi, objeto do litígio.

V. À cautela sempre se diga, que, os artigos 500.º e 800.º, do CC, têm cabimento legal numa situação de prestação de serviços de natureza civil. Veja-se, por exemplo, o Ac. TRL, de 22.02.2024, proc.º 17587/16.9T8LSB.L1-8 e ainda o Ac. STJ, de 28-01-2016, proc.º n.º 136/12.5TVLSB.L1.S1.

W. Porém, no caso em apreço nos presentes autos estamos perante um acidente de trabalho que encontra enquadramento legal, em geral, na legislação laboral, e, em especial, na LAT e que estará protegido pelo Seguro de Acidentes de Trabalho;

X. Atento o supra exposto, e tendo presente o acervo fáctico provado, não existe atividade culposa da Recorrida, enquanto empregadora, e, é a Entidade Seguradora, 1.ª Ré nos autos de primeira instância, a única responsável por todos os valores devidos às beneficiárias do sinistrado, nos termos em que tinha – como se encontra provado nestes autos – transferido integralmente a sua responsabilidade.

Nestes termos, e nos melhores que Vossas Excelências, mui douta e proficientemente suprirão, não deverá ser concedido provimento ao recurso de revista, confirmando-se a sentença da 1.ª Instância, bem como o Acórdão Recorrido; apenas mantendo-se inalterada a decisão de absolvição da Recorrida, de todos os pedidos, estar-se-á a asseverar a acostumada JUSTIÇA!»


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17. As Autoras não vieram apresentar contra-alegações, dentro do prazo legal, apesar de notificadas para o efeito.

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18. O Ministério Público emitiu parecer no sentido da procedência das revistas, tendo concluído o mesmo nos seguintes termos:

«O Ministério Público é, assim, de parecer que os recursos de revista deverão ser julgados procedentes.»

As partes vieram pronunciar-se sobre o teor de tal Parecer nos moldes constantes dos autos e em conformidade com as posições neles assumidas.


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19. Cumpre decidir, tendo sido remetido previamente o projeto do Acórdão aos restantes Juízes-conselheiros do coletivo e tendo estes últimos tido acesso ao processo no CITIUS.

II. FACTOS

20. Com relevância para a decisão, há a considerar os factos provados que constam do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora [TRE] de 12/9/2024 [sendo certo que não houve Impugnação da Decisão sobre a Matéria de Facto por nenhuma das partes]:

I - FACTOS DADO COMO PROVADOS

1.- O Sinistrado CC nasceu em .../02/1965.

2.- Faleceu no dia .../06/2022, no estado de casado com AA.

3.- É filha do falecido BB, nascida em .../03/2009.

4.- O funeral implicou transladação e o seu custo foi suportado por VIGOBLOCO, SA.

5.- Até ao dia 25/01/2023, AA, despendeu com deslocações obrigatórias, a quantia de € 60,00.

6.- No dia 28/06/2022, pelas 07h20, em ..., ..., no estabelecimento da VIGOBLOCO, SA., quando o Sinistrado se encontrava entre pilares de betão a retirar cofragem do “cachorro” num deles, foi atingido pelos pilares que sobre si caíram.

7.- Como consequência direta e necessária do acidente, sobreveio a morte ao Sinistrado no mesmo dia.

8.- O acidente ocorreu enquanto operador fabril de 1.ª, por conta, sob as ordens e orientação de VIGOBLOCO, SA.

9.- À data do acidente o Sinistrado auferia a remuneração média anual e ilíquida de, pelo menos, € 26.102,26.

10.- A Ré VIGOBLOCO, SA. tinha transferida a responsabilidade por acidentes de trabalho, através de contrato de seguro celebrado com a Ré FIDELIDADE – COMPANHIA DE SEGUROS, SA., titulado pela apólice AT ...02, quanto ao Sinistrado, até ao montante de, pelo menos, a quantia de € 26.102,26.

11.- No dia .../06/2022, pelas 07:20h, no interior das instalações fabris da 2.ª Ré, CC encontrava-se a efetuar trabalhos de descofragem de uma saliência de um pilar - comummente denominado cachorro - num pilar de betão com 18 m. de comp.; 80 cm. de alt. e 50 cm. de larg.

12.- Fazia-o com auxílio de uma ferramenta semelhante a um pé-de-cabra, trabalho que realizava habitualmente.

13.- O CC, encontrava-se a realizar aquele trabalho num corredor formado por quatro pilares sobrepostos, armazenados, dois de cada lado, todos com 18 T. de peso; 18 m. de comp.; 80 cm. de alt. e 50 cm. de larg., assentes em dois barrotes de madeira sobrepostos, em cada uma das extremidades.

14.- Tais pilares, assentes na forma descrita, formavam duas paredes com cerca de 2 metros e 16 cm de altura, separadas entre si por um corredor de 2 metros de largura em todo o comprimento das mesmas, no qual o trabalhador efetuava os referidos trabalhos, num dos pilares inferiores.

15.- Ao mesmo tempo que o CC efetuava os trabalhos descritos, o colega de trabalho, DD, procedia, ao fundo do pavilhão, na zona dos moldes, ao trabalho de retirar do molde, um pilar de cerca de 10 m. de comp.; 50 cm. de larg. e alt.; com o peso de 6,5 T., para depois o armazenar.

16.- Para tanto, o DD elevou o pilar retirado do molde a uma altura de cerca de 2 m., pretendendo transportá-lo até ao local de armazenamento.

17.- DD manobrou o pilar suspenso até local próximo dos pilares e do corredor onde se encontrava CC.

18.- Parou a manobra, deixou a carga suspensa, e levando consigo o comando da ponte rolante, foi realizar uma tarefa necessária para depositar o pilar no lugar que tinha destinado previamente para o efeito.

19.- Nesta ação, deixou de vigiar a carga suspensa e, de forma não apurada, acionou inadvertidamente o comando da ponte rolante, fazendo com que o pilar suspenso se movimentasse, impactando nos pilares já empilhados.

20.- E fazendo-os tombar por arrastamento, sobre CC, esmagando-o, entalado entre os pilares que tombaram e os dois pilares já armazenados nas suas costas.

21.- Do esmagamento do trabalhador sinistrado pelos pilares que tombaram, resultou a morte deste, no local.

22.- Os pilares entre os quais se encontrava o trabalhador sinistrado a trabalhar e que sobre ele tombaram, estavam a ser armazenados, empilhados uns sobre os outros, sobre quatro barrotes de madeira de eucalipto, dois em cada extremidade de cada um deles, com dimensões de 60 cm de comprimento X 14,5 cm de largura X 14 cm de altura, cada um.

23.- O pilar superior identificado com a Ref.ª PD-...65 que tombou para cima do trabalhador sinistrado, foi fabricado no dia 27/06/2022.

24.- O pilar inferior, onde aquele assentou com a Ref.ª PD-6 ...565, foi produzido em 23/06/2022.

25.- No plano de avaliação de riscos, com referência ao local de trabalho onde ocorreu o acidente, estavam previstos aqueles que dizem respeito ao choque de cargas suspensas noutros objetos, decorrentes da movimentação através das pontes rolantes e armazenamento dos pilares, mas não especificava concretamente o risco de choque noutros objetos e trabalhadores como o que sucedeu no acidente que vitimou o Sinistrado.

26.- A morte do trabalhador sinistrado teve causa, direta e necessária, no arrastamento e posterior queda dos pilares sobre si, que o esmagaram, o que, por sua vez, ficou a dever-se à movimentação da carga suspensa, não elevada a uma distância que salvaguardasse os pilares já armazenados, e que por isso encostou nesses, fazendo-os tombar.

27.- A carga suspensa foi movida, por acionamento inadvertido do comando da ponte rolante pelo trabalhador DD, que a deixou dessa forma, sem vigilância sua.

28.-A - DD sabia que não podia deixar a carga suspensa sem a vigiar.

28.-B [1] - O acidente mortal ocorreu porque DD, deixou a carga suspensa, não elevada a uma distância que salvaguardasse os pilares já armazenados e sem a vigiar, acionando inadvertidamente o comando da ponte rolante que por isso, fez o pilar deslocar-se, encostando aos pilares já armazenados, fazendo-os tombar sobre o Sinistrado.

29.- O Trabalhador sinistrado tinha na altura do acidente 57 anos de idade.

30.- Era um homem saudável, capaz para o trabalho.

31.- Muito trabalhador.

32.- Muito alegre e feliz.

33.- Muito comunicativo, amigo e bom colega.

34.- Morreu bastante cedo, considerando a esperança média de vida.

35.- Era pessoa bem-conceituada e estimada por todos.

36.- Revelava vontade de viver.

37.- O Sinistrado sofreu angústia pela perceção que teve da morte.

38.- O trabalhador sinistrado mantinha com a mulher e a única filha menor de ambos, uma relação muito especial.

39.- Longe da terra que os viu nascer, que abandonaram para procurar melhor vida, sempre se mantiveram muito unidos na adversidade.

40.- Adorava a filha e a mulher e sentia-se retribuído nesse amor.

41.- A sua falta, ainda tão novo, causou-lhes e continuará a causar muitas carências e saudades.

42.- O trabalhador sinistrado, passava a maior parte do tempo, com elas, após a jornada laboral.

43.- Saíam aos fins de semana.

44.- A sua morte causou-lhes um grande sofrimento, desgosto e tristeza.

45.- A Autora ficou privada da companhia do seu marido aos 51 anos de idade, depois de, pelo menos, 16 anos de comunhão de vida com ele, vê-se obrigada agora, a suportar sozinha, o que com ele partilhou.

46.- À filha fica a faltar o pai, com quem tão bons momentos passaram e de quem muito dependia, tanto a nível emocional, como económico.

47.- A atividade prosseguida pela vítima e pelos colegas de trabalho que se encontravam presentes por ocasião da eclosão do acidente é uma atividade perigosa por estarem diariamente no raio de ação de estruturas em pedra com toneladas de peso e possui especial aptidão para produzir danos e lesões.

48.- Sem que qualquer um dos encarregados de secção se encontrasse a controlar as operações, no momento do acidente, a 2.ª Ré permitiu que os trabalhos fossem executados pelos operadores das pontes rolantes.

49.- A 2.ª Ré é uma sociedade comercial anónima que tem por objeto social a atividade de fabrico, comercialização e montagem de pré fabricados em betão; construção civil, compra, venda e locação de propriedades, revenda das adquiridas para os mesmos fins; arrendamento de bens imobiliários; conceção e execução de projetos; elaboração de projetos e acompanhamento técnico e comercial a obras; prestação de serviços de consultoria e assessoria, nomeadamente no âmbito da consultoria económica, financeira e para os negócios e a gestão e outros serviços às empresas.

50.- O Sinistrado foi admitido ao serviço da 2.ª Ré, a 26/05/2003, e realizava as tarefas de descofragem há cerca de 19 anos.

51.- O trabalhador DD é especializado na operação da ponte rolante.

52.- Os barrotes são colocados nas zonas de elevação de cargas, sendo esta solução comummente utilizada para volumes de grande peso e dimensão.

53.- Os barrotes eram todos novos e foram verificados após a ocorrência do acidente de trabalho e encontravam-se em condições.

54.- Existem situações que se podem armazenar até 3 pilares, mas não são armazenados pilares cuja altura de empilhamento seja superior a 3m.

55.- Os pilares são sempre tirados dos moldes no dia a seguir.

56.- Os trabalhadores todos os dias colocam os pilares no molde e no dia seguinte retiram os pilares do molde.

57.- As instruções técnicas eram dirigidas a todos os trabalhadores (e não apenas aos encarregados de secção) e mencionavam as regras de segurança a observar, na manobra de cargas suspensas com as pontes rolantes.

58.- A Instrução Técnica 116 “TAREFAS DE APOIO À MOVIMENTAÇÃO MECÂNICA DE CARGAS” elaborada por DIR. QAS., aprovado pela Administração e datada de 01/04/2020 – descreve o procedimento de segurança a ser cumprido quando é necessário o auxílio manual da carga, movimentada por meios mecânicos.

59.- De acordo com o ponto 5. Medidas de Prevenção, da Instrução referida consta: “Durante a tarefa só os colaboradores envolvidos terão autorização para estar junto da carga. É expressamente proibida a permanência e circulação de pessoas sob as cargas suspensas”.

60.- Existia ainda a Instrução Técnica 112 “UTILIZAÇÃO DE PONTES ROLANTES”, elaborado por DIR. PRODUÇÃO/DIR. QAS., aprovado pela Administração e datado de 01/02/2017 – que descreve o procedimento a ser seguido na utilização das pontes rolantes.

61.- De acordo com o ponto 5. Descrição, de tal Instrução Técnica consta:

A utilização de pontes rolantes deve obedecer às seguintes regras:

- Apenas operadores autorizados e qualificados podem manusear as pontes rolantes;

- Antes de iniciar o trabalho, o operador deve realizar uma inspeção visual ao equipamento. Caso observe qualquer anomalia, tanto na inspeção inicial quanto ao longo da atividade, deve comunicar de imediato ao Responsável Unidade Fabril;

- A manutenção periódica de pontes rolantes está prevista e descrita no Plano anual de manutenção e somente deve ser feita por profissionais especializados;

- Antes de iniciar a movimentação da carga, verifique:

- o seu peso e o estado dos elementos de elevação

- a capacidade da ponte rolante

- o estado do cabo de aço e dos ganchos

- se o espaço livre é suficiente para que ela seja elevada e movimentada

– se existem instalações aéreas (ar comprimido, elétricas,…)

- presença de outras pessoas e/ou equipamentos fixos ou móveis

- A elevação da carga deve ser realizada com cuidado e lentamente;

- O operador deve manter um controlo permanente e total da ponte rolante e operá-la de forma responsável;

- Se as condições de trabalho exigirem o transporte de carga que limite a visibilidade, a ponte rolante deve ser manuseada com o máximo de cuidado e com o auxílio de uma segunda pessoa para orientar o manuseamento;

- Quando a ponte rolante se encontra em movimento, o operador não deve estar próximo da carga suspensa;

- Não é permitido permanecer ou passar sob cargas suspensas;

- Os operadores devem usar a ponte rolante apenas para movimentação de cargas.

(…)

62.- Existe um MANUAL DE SEGURANÇA NA OPERAÇÃO DE PONTES ROLANTES, o qual prevê, na pág. 13, o seguinte:

1.4.1 MOVIMENTAÇÃO DE CARGA SUSPENSA

“Os movimentos da ponte e dos seus componentes não devem ser feitos bruscamente a fim de reduzir os efeitos adicionais nos componentes do sistema e evitar balanços indesejáveis. (…)

❖ Ter a certeza de que o caminho da carga está livre de pessoas e desobstruído; (…)

❖ Nunca passar com o equipamento suspenso por cima de pessoas ou permitir que alguém apanhe boleia sobre a carga;

63.- Do relatório de Segurança no Trabalho, no ano do sinistro, consta, na pág. 31 e seguintes, o Capítulo 20.4 exclusivamente destinado às Pontes Rolantes.

64.- Desse capítulo consta:

CONFORMIDADES

Verificou-se que as pontes rolantes apresentavam a carga máxima admissível bem visível, gancho de sustentação de cargas com patilha de segurança, verificou-se ainda a existência de sinalização de indicação de perigo de cargas suspensas.

MEDIDAS ACONSELHADAS (…)

✓ Assegurar que, antes de qualquer deslocação, ninguém se encontra na zona de movimentação da carga e que não há ferramentas ou obstáculos a obstruir os carris.

✓ Não permitir a presença de pessoas na área adjacente à movimentação das cargas;

✓ (…)

✓ Não passar com cargas por cima de pessoas ou permitir que estas passem por baixo de uma carga, em locais não protegidos.»

65.- De acordo com os procedimentos de operação de pontes rolantes instituídos pela Ré é expressamente proibida a passagem de cargas suspensas sobre trabalhadores e de deixar a carga suspensa sem vigilância, proibições estas que são conhecimento de todos os trabalhadores que executam estas tarefas para a 2.ª Ré.

66.- A Ré tem a regra de os trabalhadores serem alertados pelos operadores que estão a manobrar as pontes rolantes para saírem do local de passagem das cargas suspensas ou os trabalhos são interrompidos.

67.- O Sinistrado e DD conheciam essas normas de segurança instituídas pela 2.ª Ré, conheciam as instruções técnicas sobre o manuseamento da ponte rolante e movimentação de cargas e tinham formações que os habilitava a esse conhecimento.

68.- O Sinistrado encontrava-se no local habitual de trabalho, a realizar tarefas habitualmente exercidas no interior da secção fabril UF6B.

69.- A 2.ª Ré tem os serviços de segurança no trabalho organizados, através da modalidade de serviços externos, sendo, desde 2009, a empresa prestadora dos serviços de segurança M..., Lda., tendo esta designado a TSST, EE, para prestar esse serviço na 2.ª Ré.

70.- À data do acidente a TSST efetuava visitas, presenciais, regulares, à 2.ª Ré, pelo menos, uma ou duas vezes por semana.

71.- Foi efetuada uma ação se sensibilização sobre a utilização de pontes rolantes, pela mencionada TSST, após a ocorrência do acidente de trabalho.

72.- À data do acidente, existia avaliação de riscos, com referência ao local da ocorrência, assim como, do posto de trabalho e dos equipamentos existentes, datada de 29.07.2021, elaborada pela já referida TSST.

73.- Nessa avaliação de riscos, estavam identificados os riscos do local de trabalho UFB6 e do posto de trabalho do trabalhador Sinistrado.

74.- Com referência à movimentação de objetos através das pontes rolantes, do local do acidente de trabalho, menciona a avaliação de riscos, nas páginas 144 e 145, os seguintes riscos:

Outras situações de risco”, com medidas preventivas/corretivas “quando se utilizam pontes rolantes para levantar e transladar os produtos deverão ter-se em conta os seguintes aspetos (…) manter e garantir a distância de segurança do trabalhador e partes móveis do equipamento e aos produtos elevados (…)”;

9. Contactos/pancadas em objetos ou ferramentas” com medidas preventivas/corretivas “criar zonas de armazenamento provisório e definitivo. Delimitar as zonas de armazenamento. Informar e formar os trabalhadores no sentido de armazenarem os objetos e materiais nos locais próprios e não deixarem quaisquer resíduos”.

Com referência ao equipamento de trabalho, ponte rolante, equipamento utilizado no local do acidente de trabalho, menciona a avaliação de riscos, nas páginas 189, 190 e 191, os seguintes riscos:

Quedas de objetos por desprendimento”, com medidas preventivas/corretivas “não permitir a presença de pessoas na área adjacente à movimentação de cargas e/ou quanto esticar/tensor os cabos de aço (…)

9. Choques/pancadas/perfurações em objetos/máquinas/ferramentas”, com medidas preventivas/corretivas “organização layout; Acondicionar corretamente a mercadoria/máquinas/equipamentos; Formação e informação dos colaboradores”.

11. Entalamento com ou entre objetos”, com medidas preventivas/corretivas “(…) Afastamento das zonas de movimento dos equipamentos/máquinas”.

36. Outras situações de risco”, com medidas preventivas/corretivas “quando se utilizam pontes rolantes para levantar e transladar os produtos deverão ter-se em conta os seguintes aspetos (…) manter e garantir a distância de segurança do trabalhador a partes móveis dos equipamentos e aos produtos elevados”.

75.- O Sinistrado tinha certificado de Segurança na Condução de Equipamentos de Elevação de Cargas, ou seja, tinha certificado válido de aptidão para condução de empilhador.

76.- E certificado de aptidão para o exercício da profissão de Condutor-Manobrador de Equipamentos de Elevação (nível 2 de qualificação de formação), desde 29.05.2009.

77.- Ao longo da prestação de trabalho para a 2.ª Ré, o Sinistrado, por determinação desta, participou nas seguintes ações de formação:

No dia 01.09.2007 e no dia 17.09.2007, o Sinistrado participou nas ações de formação para "Construção da Ponte sobre o Mondego, Obra Geral e Obras de Arte, Correntes do Lote 8 da A17 II - .../..." com a temática “Informações Gerais de Segurança e Ambiente”, “Plano de Emergência/Simulacro” e “Regras de Segurança nas atividades de Movimentação de Cargas e Execução de OAC Pré-Fabricadas”, respetivamente.

No dia 13.09.2008, o Sinistrado participou na Ação de Formação “Sensibilização em Saúde e Segurança no Trabalho & Plano de Emergência”, com a duração de 4h.

Em 18.09.2009, o Sinistrado frequentou a formação em HST, onde abordou temáticas como “Procedimento de Segurança e Saúde – trabalhos com riscos especiais”, “Segurança e Saúde no estaleiro de Construção” e “Procedimentos gerais de segurança a observar em estaleiro”.

De 07.11.2009 a 25.06.2010, o Sinistrado frequentou o curso de Formação profissional de “C8 – Gestão e Motivação para a estratégia”, com a duração de 16h.

No dia 25.09.2010, o Sinistrado frequentou o curso de Formação profissional de “Aperfeiçoamento de Pedreiro”, com a duração de 7h, onde abordou as temáticas de “Segurança e Higiene no Trabalho da profissão”.

No dia 13.11.2010, o Sinistrado frequentou nova formação profissional "Segurança e Higiene em Meio Laboral", com a duração de 2 h.

No dia 16.12.2010, o Sinistrado frequentou a ação de formação/sensibilização, onde abordou as temáticas de “sinalização gestual” e “conceitos gerais de higiene e segurança no trabalho e ambiente”.

No dia 09.02.2011, o Sinistrado participou na formação/sensibilização com os temas "Conceitos gerais de higiene e segurança no trabalho" e "Colocação de arnês de segurança".

No dia 19.05.2011, o Sinistrado participou na ação de “Sensibilização geral para conceitos de HST” com algumas das seguintes temáticas: "Utilização de EPI's com determinados equipamentos (uso de auriculares - martelo elétrico)", "Ponto de encontro onde localizar em caso de acidente" e "Plataformas de trabalho (andaimes)".

No dia 02.06.2011, o Sinistrado participou na sensibilização geral de HST com os temas "Distância de segurança de cargas suspensas", "Uso equipamento proteção individual (arnês de proteção)", "Postura de trabalho (Ergonomia)" e "Proteção coletiva em Taludes".

No dia 29.10.2011, o Sinistrado concluiu a formação profissional "Higiene, Segurança e Saúde em Meio Laboral", com a duração de 4h.

No dia 29.06.2012, o Sinistrado frequentou a ação de formação, com a duração de 11h, subordinada ao tema “Conceitos Gerais para condições HST”, onde abordou as temáticas de “EPI’s” e “Conceitos Gerais HST”.

No dia 18.01.2013, o Sinistrado frequentou o curso de Formação profissional de “Higiene, Segurança e Saúde em Meio Laboral”, com a duração de 4 h, onde abordou as temáticas “Conceitos definições HST. Segurança, Higiene e Saúde do Trabalho” de “riscos físicos” e “máquinas e ferramentas, movimentação manual de cargas”.

No dia 31.01.2014, o Sinistrado frequentou novo curso de Formação profissional de “Higiene, Segurança e Saúde em Meio Laboral”, com a duração de 4 h, onde abordou as temáticas de “segurança em equipamentos de elevação de cargas” e “Pontes Rolantes – Regras de Segurança”.

No dia 20.03.2014, o Sinistrado frequentou curso de Português para Falantes de Outras Línguas.

No dia 20.12.2014, o Sinistrado frequentou o curso de Formação profissional de “Segurança na Operação de Plataformas Elevatórias”, com a duração de 8 h, na qual abordou temáticas como a “Elevação de Cargas”.

No dia 24.01.2015, o Sinistrado frequentou o curso de Formação profissional de “Trabalhos em Altura”, com a duração de 14h.

No dia 01.12.2015, o Sinistrado frequentou novo curso de Formação profissional de “Higiene, Segurança e Saúde em Meio Laboral”, com a duração de 4h.

No dia 26.09.2016, o Sinistrado frequentou formação, subordinada ao tema “Acolhimento em Obra”, onde se abordou temática como “Indicação de como atuar em caso de emergência…”, “Identificação dos perigos existentes no estaleiro de obra”, “Identificação e explicação dos riscos e medidas preventivas inerentes aos trabalhos de montagem de pré-fabricados”, “Identificação e explicação dos riscos e medidas preventivas inerentes à movimentação manual e mecânica de cargas”.

No dia 18.10.2016, o Sinistrado frequentou ação de “Formação e Sensibilização no âmbito do procedimento de Segurança para as reparações a efetuar na obra”.

No dia 25.11.2016, o Sinistrado frequentou novo curso de Formação profissional de “Higiene, Segurança e Saúde em Meio Laboral”, onde abordou as temáticas de “EPI’s”, “Normas de Segurança” e “Organização de Emergência”, com a duração de 3 h.

No dia 21.02.2017, o Sinistrado frequentou a “Formação específica em matéria de segurança e saúde do trabalho no âmbito da FPS23 Reparações de Patologias de Betão armado em PA’s e PI – IC9 E FPS24 Reparações de Patologias de betão armado da PS8 ao km 046+820; PS10 ao km 050+000; PS11 ao km 051+667 do IC9)”, onde abordou temáticas como “Procedimentos de atuação em caso de emergência – medidas de primeiros socorros” e “medidas e instruções a adotar em caso de perigo grave e iminente”.

No dia 01.06.2017, o Sinistrado frequentou a formação de “Procedimento de Segurança e Saúde – Trabalhos com Riscos Especiais no âmbito de SST”.

No dia 24.02.2018, o Sinistrado frequentou o curso de Formação profissional de “Segurança na Operação de Pontes Rolantes”, com a duração de 8h, onde abordou as temáticas “Elevação de Cargas Suspensas” e “Pontes Rolantes”.

No dia 18.09.2018, o Sinistrado frequentou o curso de Formação profissional de “Medidas de autoproteção”, com a duração de 8 h, onde foi abordada a temática da “Organização de emergência”.

De 18.01.2019 e 01.02.2019, o Sinistrado frequentou a formação, com duração de 88h, subordinada ao tema “Responsável da Expedição”, onde se abordou a temática da “movimentação e acondicionamento de cargas”.

No dia 02.12.2019, o Sinistrado frequentou novo curso de Formação profissional de “Higiene2, Segurança e Saúde em Meio Laboral”, onde abordou as temáticas de “Conceitos e Riscos”, “Identificação e avaliação de riscos”, “medidas preventivas, corretivas e de proteção” e “máquinas, equipamentos EPI’s e EPC’s” e “movimentação de cargas”, com a duração de 2 h.

No dia 26.03.2020, o Sinistrado participou na ação de formação “IT114 – Procedimentos a adotar – COVID 10 + IT115 Trabalhos c/Utilização de Escadas”, com a duração de 1 h.

No dia 12.10.2020, o Sinistrado frequentou formação, com duração de 2 h, subordinada ao tema “Segurança e Saúde em Meio Laboral”, onde, entre outros conteúdos programáticos, se destacam a temática “acidentes de trabalho”, “riscos e medidas preventivas” e “movimentação de cargas”.

No dia 19.05.2021, o Sinistrado frequentou formação subordinada ao tema “Leitura e interpretação de Projeto”, com duração de 2 h.

No dia 08.07.2021, o Sinistrado frequentou nova ação de sensibilização para manobrar empilhadores, com a duração de 1 h.

No dia 15.10.2021, o Sinistrado frequentou novo curso de Formação profissional de “Segurança e Saúde em Meio Laboral”, com a duração de 2 h, onde abordou a temática “Controlo e gestão de riscos” e “Acidentes de Trabalho e Doenças profissionais”.

No dia 20.11.2021, o Sinistrado frequentou o curso de Formação profissional de “Segurança na Condução de Empilhadores”, com a duração de 8 h, na qual de destaca a temática “Elevação de cargas”.

78.- Ao longo da prestação de trabalho para a 2.ª Ré, DD, por determinação desta, participou nas seguintes ações de formação:

De 17.04.2019 a 16.05.2019, o trabalhador DD frequentou a ação de formação “Auxiliar Fabril – Formação de Acolhimento”, com a duração de 176 h, onde abordou temáticas como a “Movimentação e acondicionamento de cargas”. - Fls. 636

No dia 30.04.2019, o trabalhador DD frequentou a formação profissional “Sensibilização - Segurança”, duração de 9h30m, com as seguintes temáticas: “Sensibilização em HST; Regras a cumprir na VIGOBLOCO; Perigos e Riscos; Procedimentos em caso de emergência”.

No dia 02.12.2019, o trabalhador DD frequentou o curso de “Formação Profissional de Segurança e Saúde em Meio Laboral”, onde abordou várias temáticas como “Identificação e avaliação de riscos”, “Medidas preventivas corretivas e de proteção”, “movimentação de cargas” e “conservação, manutenção e limpeza”.

De 02.01.2020 a 24.01.2020, o trabalhador DD frequentou ação de formação “Operador Fabril de Pré-fabricados de betão em molde”, com a duração de 102 h, onde abordou temáticas sobre a limpeza, moldagem, controlo do enchimento dos moldes com betão e condução e manobrar equipamentos de movimentação/elevação/transporte e empilhamento.

No dia 26.03.2020, o trabalhador DD participou na ação de Formação “IT114 – Procedimentos a adotar – COVID 10 + IT115 Trabalhos c/Utilização de Escadas”, com a duração de 1 h.

No dia 07.05.2020, o trabalhador DD frequentou ação de formação sobre algumas das Instruções Técnicas, a IT 114, IT 115 e a IT 116, com a duração de 1 h.

A 21.01.2021, o trabalhador DD frequentou ação de Formação “IT.114 – COVID 19 – Procedimentos a adotar”, com a duração de 1h.

No dia 12.03.2021, o trabalhador DD frequentou (sozinho) a Ação de Sensibilização para Acidentes de Trabalho, com a duração de 1 h, com as seguintes temáticas: “Riscos existentes nas Tarefas executadas”; “Manter locais de trabalho organizados e limpos”, entre outras;

No dia 24.04.2021, o trabalhador DD frequentou o Curso de Formação Profissional de “Segurança na Operação de Pontes Rolantes”, com a duração de 8 h, onde abordou a temática da “Elevação de Cargas Suspensas” (na qual obteve classificação de 92/100) e a temática “Pontes Rolantes – Prática” (na qual obteve classificação de 80/100).

No dia 21.05.2021, o trabalhador DD frequentou a ação de formação “Leitura e interpretação de Projetos”, com a duração de 8 h.

E frequentou ainda ação de formação “Leitura e Interpretação de Projeto”, com a duração de 2 h.

No dia 15.10.2021, o trabalhador DD frequentou o “Curso de Formação Profissional de Promoção da Saúde”, com a duração de 2 h, onde abordou a temática do “Stress Laboral”.

No dia 04.08.2022, o trabalhador DD frequentou (sozinho) a Ação de Movimentação de Cargas Suspensas, com a duração de 2h30m, com as seguintes temáticas “Segurança na operação de pontes rolantes”; “Verificação de Equipamentos”, “Verificação de carga”, “Verificação do espaço envolvente” “Manobrar cargas”, “utilização dos comandos do equipamento”, entre outras.

No dia 06.08.2022, o trabalhador DD frequentou o Curso de Formação Profissional de “Segurança na Condução de Empilhadores”, com a duração de 8 h.

No dia 16.12.2022, o trabalhador DD frequentou nova ação de formação “Sensibilização em HST”, com a duração de 10h30m, com várias temáticas, nas quais foram abordadas as Instruções Técnicas supra referidas.

No dia 21.01.2023, o trabalhador DD frequentou nova formação profissional “Segurança na operação de pontes rolantes”, duração de 8 h.

A 02.03.2023, o trabalhador DD frequentou ação de formação onde foram entregues e disponibilizados os objetivos para 2023, os índices de sinistralidade de 2022, a avaliação de riscos por secção, com respetivas medidas preventivas/corretivas; a descrição de funções por trabalhador/unidade de produção; instruções técnicas por atividade, em cada secção, com medidas de prevenção implementadas; plano de inspeção e ensaios gerais da unidade de produção e politica de processos de gestão do SGQ.

No dia 15.06.2023, o trabalhador DD frequentou nova Ação de Formação de Segurança, com a duração de 1 h, com várias temáticas, nas quais foram novamente abordadas as Instruções Técnicas suprarreferidas, entre outras.

79.- A Instrução Técnica 116 “TAREFAS DE APOIO À MOVIMENTAÇÃO MECÂNICA DE CARGAS” –, descreve o procedimento de segurança a ser cumprido quando é necessário o auxílio manual da carga, movimentada por meios mecânicos.


*


II – FACTOS NÃO PROVADOS:

a.- Aquando do referido em 15), DD, encontrava-se, na extremidade dos pilares e do corredor formado por estes, mas apenas o mencionado em 15).

b.- O local de armazenamento referido em 16) foi previamente designado pelo encarregado FF, situado junto à parede do lado direito do pavilhão.

c.- Para efetuar o percurso até ao local de armazenamento designado, o pilar elevado e suspenso, tinha de passar por cima dos pilares e do corredor onde o CC se encontrava a trabalhar e o referido em 19) ocorreu quando o trabalhador DD manobrava o pilar suspenso e tentava passar com ele por cima daqueles outros, mas apenas o mencionado em 19).

d.- Não existiam instruções de trabalho escritas dirigidas diretamente aos trabalhadores, mas, tão só, aos encarregados de secção e o pilar inferior, com a Ref.ª PD-...565, foi retirado dos moldes em 25/06/2022.

e.- À data do acidente de trabalho, o trabalhador sinistrado auferia, como contrapartida do trabalho prestado para a VIGOBLOCCO, SA., a retribuição anual de € 26.088,12 [2] (mas apenas o referido em 9)).

f.- O trabalhador DD, manobrou a carga, não salvaguardando o facto de se encontrar um outro trabalhador por baixo, não tendo respeitado a regra de segurança de se certificar que não se encontrava nenhum trabalhador nas imediações ou por baixo da carga suspensa.

g.- Não existia um estudo que assegurasse a estabilidade dos barrotes de madeira onde assentavam os pilares armazenados.

h.- O armazenamento dos pilares da forma antes referida, origina alturas de empilhamento superiores a 3 metros – dependendo essa arrumação, da decisão e supervisão do chefe de secção, sem que existissem no local de trabalho, um layout definido sobre essa atividade, que prevenisse a segurança no trabalho, cabendo tal decisão ao chefe de secção.

i.- A forma de armazenamento dos pilares, empilhados uns sobre os outros, como ficou ilustrada, em prática no local da ocorrência do acidente, origina a existência de corredores manifestamente estreitos para os trabalhadores efetuarem os seus trabalhos, impedindo a fuga destes em situações de queda de objetos, dado o exíguo espaço que lhe é destinado.

j.- A forma de armazenamento dos pilares, empilhados uns sobre os outros, em prática no local da ocorrência do acidente, obriga, necessariamente, à passagem de cargas suspensas (pilares) em pontes rolantes, sobre os que já se encontram empilhados, potenciando a queda destes, como aconteceu.

k.- O pilar superior identificado com a Ref.ª PD-...65 foi retirado dos moldes no mesmo dia do fabrico, o que revela um período de maturação e secagem extremamente curto.

l.- A zona de armazenamento nas instalações da empregadora, obriga a que os pilares suspensos a armazenar, tivessem de passar sobre os outros trabalhadores, quando estes se encontram no exercício das suas funções.

m.- DD não respeitou a regra de segurança de se certificar que não se encontrava nenhum trabalhador nas imediações ou por baixo da carga suspensa.

n.- O acidente não teria ocorrido se existissem instruções de trabalho escritas, dirigidas diretamente a DD, que mencionassem as regras de segurança a observar na manobra de cargas suspensas com as pontes rolantes.

o.- O acidente de trabalho não teria ocorrido, se os pilares entre os quais se encontrava o trabalhador sinistrado a trabalhar, com as características enunciadas, não estivessem a ser armazenados, empilhados uns sobre os outros, apenas, sobre quatro barrotes de madeira de eucalipto sobrepostos, com as características supra descritas, mas sim na forma a que um estudo prévio assegurasse a sua estabilidade.

p.- Também não aconteceria, se existissem no local de trabalho, instruções escritas ou um layout definido, sobre a forma como esse armazenamento deveria ser realizado, que prevenisse a segurança no trabalho.

q.- Da mesma forma, ter-se-ia evitado o acidente de trabalho, se existisse uma maior e mais definida zona de armazenamento dos pilares, o que evitaria tão altos empilhamentos e a existência de corredores manifestamente estreitos para os trabalhadores efetuarem os seus trabalhos, que impedem a fuga destes em situações de queda de objetos.

r.- Também uma maior e mais definida zona de armazenamento dos pilares, evitaria a necessária, passagem de cargas suspensas (pilares) em pontes rolantes, sobre os que já se encontram empilhados, potenciando a queda destes, como aconteceu e que deu origem à morte do trabalhador.

s.- O acidente de trabalho também nunca teria acontecido, se o pilar superior identificado com a Ref.ª PD-...65 que tombou para cima do trabalhador sinistrado, não tivesse sido retirado do molde e armazenado no mesmo dia da sua fabricação, sem que passasse por um período normal de maturação e secagem.

t.- Seria também evitado, se os trabalhadores da 2.ª Ré, estivessem devidamente alertados dos riscos de choque de cargas suspensas noutros objetos ou em trabalhadores, decorrentes da movimentação através das pontes rolantes, e dos riscos de armazenamento dos pilares

u.- A vontade do Sinistrado de viver era invulgar.

v.- O Sinistrado era conhecido, pela alegria com que levava a sua vida e como a valorizava.

w.- O acidente por esmagamento de que resultou a morte do trabalhador Sinistrado, causou-lhe um período, embora curto, de dores.

x.- O acidente resultou da atuação culposa da entidade empregadora por ausência de identificação dos riscos associados às tarefas que estavam a ser executadas por ocasião do sinistro e consequente falta de adoção e planificação de medidas para o prevenir, não avaliando o risco, não dando instruções concretas, diretas e escritas aos trabalhadores envolvidos e não adotando medidas de proteção da zona de perigo, sendo essa conduta omissiva a causa do acidente mortal.

y.- A Autora viveu 23 anos da comunhão de vida com o Sinistrado, mas apenas o indicado em 45).

z.- A 2.ª Ré não cuidou de dotar os seus trabalhadores de informação e de os vincular a procedimentos adequados a evitar o acidente.

aa.- A 2.ª Ré não instruiu os operadores das pontes rolantes dos cuidados a tomar durante as operações de manuseamento das cargas suspensas por forma a salvaguardarem a altura dos pilares que se encontravam empilhados, pois operavam a baixas altitudes, e a segurança dos trabalhadores que se encontravam nas imediações e no raio de ação das cargas suspensas, permitindo a coexistência dessas manobras sobre os trabalhadores que aí operavam.

bb.- Só os encarregados de secção possuíam tais instruções pelo que competia à 2.ª Ré proibir a execução de tais funções na ausência desses encarregados de secção.

cc.- A 2.ª Ré permitia que os operadores das pontes rolantes trouxessem consigo o respetivo comando, quando não estivessem a manusear a ponte rolante, em vez de o depositarem em local reservado, potenciando o seu acionamento inadvertido.

dd.- O comportamento da 2.ª Ré determinou o acidente que vitimou o Sinistrado.

ee.- O local de armazenamento foi designado pelo Encarregado FF e situava-se num espaço disponível entre pilares armazenados do lado poente do pavilhão.

ff.- O pilar elevado e suspenso não tinha de passar por cima dos pilares, mas sim, lateralmente, a uma distância de segurança.

gg.- O trabalhador DD viu que o Sinistrado se encontrava no local e, por essa razão, suspendeu os trabalhos.»


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III – OS FACTOS E O DIREITO

21. É pelas conclusões do recurso que se delimita o seu âmbito de cognição, nos termos do disposto nos artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e 679.º, 639.º e 635.º, n.º 4, todos do Novo Código de Processo Civil, salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608.º n.º 2 do NCPC).


*


A – REGIME ADJECTIVO E SUBSTANTIVO APLICÁVEIS

22. Importa, antes de mais, definir o regime processual aplicável aos presentes autos, atendendo à circunstância da presente ação (na sua fase conciliatória - cf. artigo 26.º, números 2 e 3 e 99.º do Código do Processo do Trabalho de 1999) ter dado entrada em tribunal em 28/06/2022, ou seja, depois da entrada das alterações introduzidas pela Lei n.º 107/2019, datada de 4/9/2019 e que começou a produzir efeitos em 9/10/2019.

Esta ação, para efeitos de aplicação supletiva do regime adjetivo comum, foi instaurada depois da entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil, que ocorreu no dia 1/9/2013.

Será, portanto, e essencialmente com os regimes legais decorrentes da atual redação do Código do Processo do Trabalho e do Novo Código de Processo Civil como pano de fundo adjetivo, que iremos apreciar as diversas questões suscitadas neste recurso de Apelação.

Também se irá considerar, em termos de custas devidas no processo, o Regulamento das Custas Processuais, que entrou em vigor no dia 20 de abril de 2009 e se aplica a processos instaurados após essa data.

Importa, finalmente, atentar na circunstância dos factos que se discutem no quadro destes autos, face à data em que se verificou o acidente de trabalho – 28/06/2022 – terem todos ocorrido na vigência das normas constantes do Código do Trabalho de 2009 – que entrou em vigor em 17/02/2009 - relativas aos acidentes de trabalho (artigos 281.º e seguintes) e da legislação especial que só veio a encontrar a luz do direito com a Lei n.º 98/2009, de 4/09 e que, segundo os seus artigos 185.º, 186.º e 187.º, revogou o regime anterior (ou seja, a Lei dos Acidentes do Trabalho aprovada pela Lei n.º 100/97, de 13/09 e a respetiva regulamentação inserida no Decreto-Lei n.º 143/99, de 30/04) e está em vigor desde 1/01/2010 e para eventos infortunísticos de carácter laboral ocorridos após essa data.

B – OBJETO DA PRESENTE REVISTA

23. As questões de índole substantiva que se discutem neste recurso de revista são as seguintes:

Está em causa, nos dois recursos, saber se estão verificados os pressupostos da responsabilidade agravada da Ré VIGOBLOCO – PRÉ-FABRICADOS, S.A. nos termos do artigo 18.º da LAT por:

- o acidente ter resultado da violação pelo empregador de regras de segurança ou saúde no trabalho e

- o trabalhador DD dever ser considerado representante da Ré.

C – FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA DA 1.ª INSTÂNCIA

24. A sentença do Juízo do Trabalho de Tomar reconheceu, nos moldes constantes da sua argumentação que adiante se reproduz, o direito das Autoras a receber da Ré Seguradora as prestações normais previstas pela Lei de Acidentes de Trabalho para cenários de sinistros laborais compensados ao abrigo do regime regra da responsabilidade objetiva [fundamentação extraída do Acórdão recorrido]:

«No caso que nos ocupa, não há dúvida que o acidente de trabalho que vitimou mortalmente CC no dia 28/06/2022 é um acidente de trabalho, tal qual se encontra enunciado no artigo 8.º da L 98/2009, de 04/09, nem essa caraterização é posta em causa pelas partes.

A questão em dissenso primacial é a de se saber se o acidente foi provocado por violação das regras de segurança e saúde no trabalho por parte da Ré VIGOBLOCO, SA., entidade patronal do Sinistrado.

O regime dos acidentes de trabalho assenta na responsabilidade objetiva da entidade empregadora, ou seja, na ideia de que o empregador deve suportar os danos decorrentes dos acidentes sofridos pelos trabalhadores ao seu serviço, não sendo necessário demonstrar a existência de culpa por parte do empregador (risco de autoridade)[3].

A entidade patronal tem necessariamente de transferir para uma companhia de seguros a responsabilidade pela reparação de acidentes de trabalho [4].

Para efeitos da lei (Regime de Reparação de Acidentes de Trabalho e de Doenças Profissionais – Lei n.º 98/2009, de 04/09), considera-se acidente de trabalho aquele que ocorre no local e no tempo de trabalho e produza direta ou indiretamente lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte redução na capacidade de trabalho ou de ganho ou de morte [5].

O trabalhador e os seus familiares têm direito à reparação de danos emergentes de acidentes de trabalho ou doença profissional [6].

A posição das Autoras e da Seguradora é a de que o acidente resultou da falta de observação, pela Ré VIGOBLOCO, SA., das regras sobre segurança e saúde no trabalho, nos termos do artigo 18.º da L 98/2009, de 04/09.

Dispõe o artigo 18.º da L 98/2009, de 04/09 que:

[reprodução integral do texto legal]

A responsabilidade agravada da empregadora, prevista no artigo 18.º da LAT, pode ter um de dois fundamentos: (a) que o acidente tenha sido provocado pela empregadora, seu representante ou entidade por aquela contratada e por uma empresa utilizadora de mão de obra, ou (b) que o acidente resulte da falta de observância, por parte daqueles, das regras sobre segurança e saúde no trabalho; II - A única diferença entre estes dois fundamentos reside na prova da culpa, necessária no primeiro caso, e desnecessária no segundo; III - Todavia, ambos os fundamentos exigem, para além do comportamento culposo ou da violação normativa, respetivamente, a necessária prova do nexo causal entre o ato ou omissão que os corporizam e o acidente que veio a ocorrer (…)”. [7]

A responsabilidade agravada da entidade empregadora em matéria de acidentes de trabalho exige a demonstração da inobservância das regras sobre a segurança, higiene e saúde no trabalho por parte da entidade empregadora, e que foi essa inobservância a causa adequada do acidente. II- A afirmação desse juízo de adequação causal exige a demonstração de que: i) o acidente decorreu naturalisticamente da ação ilícita da empregadora sem a qual aquele acidente não teria ocorrido; ii) a violação daquelas regras de segurança tornavam previsível a eclosão do acidente (juízo abstrato de adequação), nas concretas circunstâncias em que o mesmo ocorreu e com as consequências dele decorrentes (juízo concreto de adequação); iii) o acidente representa a concretização objetivamente previsível de um dos perigos típicos que a ação da empregadora era suscetível de criar e que, justamente, justificaram a criação das regras de segurança violadas; iv) a verificação do acidente não ficou a dever-se a circunstâncias contemporâneas da ação alheias ao modelo de perigo, não conhecidas do agente e para ele imprevisíveis, não tendo a realização do modelo de perigo sido precipitada por circunstâncias que o não integram”. [8]

No caso vertente, o sinistrato sofreu um acidente de trabalho, que lhe determinou a morte. No entanto, dos factos dados como provados e não provados, resulta que não existiu, por parte da Ré VIGOBLOCO, a violação das regras de segurança e saúde no trabalho nem este resultou de culpa desta.

Esta Ré deu abundante formação ao Sinistrado e ao seu trabalhador DD quanto ao trabalho que cada um deles estava a executar. Estes trabalhadores eram especializados, não carecendo da presença do encarregado de secção para controlar as operações/tarefas que desempenhavam. Todos os trabalhadores sabiam, bem como aqueles, das regras de segurança e saúde a observar nas tarefas que cada um estava a executar, especificamente, o trabalhador DD quanto ao trabalho com a ponte rolante. A Ré VIGOBLOCO tinha instruções técnicas adequadas à execução desse trabalho, tinha visitas regulares por parte de uma técnica de segurança e saúde no trabalho, os pilares tinham maturação adequada e estavam assentes sobre barrotes de madeira em bom estado de conservação. O corredor onde estava a trabalhar o Sinistrado tinha cerca de 2 metros de largura o que se afigura adequado. A ponte rolante, seus componentes e o comando estavam sem qualquer anomalia. Porém, o acidente ocorreu em virtude de o trabalhador DD, ter deixado a carga suspensa, sem a vigiar, e pressionado inadvertidamente o comando. A carga deixada suspensa, não estava elevada a uma altura que salvaguardasse a dos dois pilares armazenados e sobrepostos onde se encontrava a trabalhar o Sinistrado. Entende-se que a regra de vigiar a carga suspensa, por parte do manobrador, existente na 2.ª Ré, que era do conhecimento dos trabalhadores, e que consta da instrução técnica 112, ponto 5, era adequada a evitar o acidente.

A avaliação de riscos da 2.ª Ré, à data do acidente, previa aqueles que dizem respeito ao choque de cargas suspensas noutros objetos, decorrentes da movimentação através das pontes rolantes e armazenamento dos pilares. Contudo não especificava o risco de choque noutros objetos e trabalhadores como o que sucedeu no acidente que vitimou o Sinistrado. Não se entende que esta falta de concreta especificação importe a violação de uma regra de segurança. A avaliação de riscos prevê o risco de choque noutros objetos e não é permitido aos trabalhadores estarem perto da carga suspensa, pelo que, conquanto, face ao ocorrido, se possa concretizar melhor os perigos em nova avaliação de riscos a elaborar, não se vislumbra que a avaliação de riscos da 2.ª Ré, à data do acidente, estivesse deficientemente elaborada não identificando os riscos previsíveis em todas as atividades da empresa. Ou seja, entende-se que não se verifica a violação ao disposto no artigo 15.º, n.º 2, al. c) da Lei 102/2009, de 10/09. Mas ainda que outro fosse o entendimento, inexistiria qualquer nexo de causalidade [9] entre essa falta de concretização e o acidente, não sendo a mesma sequer concausa do mesmo. Mais se entende que esta falta de concretização não se traduziu num aumento da probabilidade da ocorrência do acidente, tal como ele efetivamente veio a verificar-se [10].

A morte do trabalhador sinistrado teve causa, direta e necessária, no arrastamento e posterior queda dos pilares sobre si, que o esmagaram, o que, por sua vez, ficou a dever-se à movimentação da carga suspensa, não elevada a uma distância que salvaguardasse os pilares já armazenados, e que por isso encostou nesses, fazendo-os tombar. A carga suspensa foi movida, por acionamento inadvertido do comando da ponte rolante pelo trabalhador DD, que a deixou dessa forma, sem vigilância sua. DD sabia que não podia deixar a carga suspensa sem a vigiar. O acidente mortal ocorreu porque DD, deixou a carga suspensa, não elevada a uma distância que salvaguardasse os pilares já armazenados e sem a vigiar, acionando inadvertidamente o comando da ponte rolante que por isso, fez o pilar deslocar-se, encostando aos pilares já armazenados, fazendo-os tombar sobre o Sinistrado.

Como já se disse anteriormente, DD tinha formação adequada para as tarefas que estava a executar, sendo habilitado para o efeito e podendo executá-las com autonomia, não carecendo de ser controlado/vigiado pelo encarregado de secção. A 2.ª Ré tinha instruções técnicas do conhecimento daquele quanto à execução das tarefas com recurso à ponte rolante. Tinha também regras de segurança e saúde instituídas na empresa e do conhecimento tanto daquele como do falecido. Se DD tivesse cumprido a regra de vigiar a carga suspensa, em vigor na empresa 2.ª Ré e que era do seu conhecimento, o acidente não teria ocorrido. Foi essa omissão, em conjunto com o acionamento inadvertido do comando da ponte rolante e a elevação da carga suspensa a uma distância que não salvaguardou a dos pilares já armazenados, que determinou o arrastamento destes que tombaram sobre o Sinistrado provocando-lhe a morte. Os factos apurados subsumem-se à hipótese prevista no artigo 17.º da Lei 98/2009, de 04/09 e não à previsão do artigo 18.º da lei mencionada pois DD não era representante da 2.ª Ré [11].

Porquanto, conclui-se que não existiu por parte da Ré VIGOBLOCO, SA. violação das regras de segurança e saúde nem o acidente foi por si provocado.

Nestes termos, não se verifica a responsabilidade agravada da mesma, soçobrando a posição das Autoras nesta parte, pelo que não lhes é devida, indemnização agravada, nos termos do artigo 18.º, n.ºs 1 e 5 da Lei 98/2009, de 04/09, nem o arbitramento de indemnização pelo dano morte, dano moral próprio da vítima e danos morais próprios das Autoras.

Cabe assim, à Seguradora, reparar as Autoras, em virtude do acidente de trabalho que sofreu CC visto para si estar transferida a responsabilidade da Ré VIGOBLOCO, SA, em cumprimento do artigo 79.º, n.º 1 da Lei 98/2009, de 04/09, abrangendo a totalidade da retribuição anual do sinistrado, no valor de € 26.102,26, não havendo lugar ao funcionamento dos n.ºs 4 e 5 do citado preceito.».

D – ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA

25. O Tribunal da Relação de Évora, chamado a decidir os recursos de Apelação que foram interpostos pelas Autoras e pela Ré Seguradora da mencionada sentença final, veio a julgar os mesmos improcedentes, por concordar com a argumentação de direito nela desenvolvida [e que acima deixámos transcrita] e com base ainda na seguinte fundamentação jurídica:

«Com arrimo nos factos assentes, apura-se que o infeliz acidente teve na sua génese dois comportamentos assumidos pelo colega de trabalho do sinistrado de nome DD.

Desde logo, o mesmo deixou, sem vigilância, um pilar de cerca de 10 m de comprimento; 50 cm de largura e altura; com o peso de 6,5 toneladas, suspenso a uma altura de cerca de 2 metros do solo, num local próximo dos pilares que ladeavam o sinistrado e do corredor onde este se encontrava.

Além disso, inadvertidamente, acionou o comando da ponte rolante, fazendo com que o pilar em suspensão se movimentasse, impactando com os pilares que ladeavam o corredor onde se encontrava o sinistrado, que, devido ao embate, tombaram sobre o sinistrado, tendo este ficado esmagado entre os pilares que tombaram e os pilares que se situavam nas suas costas, o que provocou a sua morte.

Saliente-se que cada um dos pilares que estava armazenado formando o corredor onde se localizava o sinistrado pesava 18 toneladas de peso e tinha 18 metros de comprimento, 80 cm de altura e 50 cm de largura.

Ora, a ré empregadora tinha imposto regras explicitas sobre segurança e saúde no trabalho no que respeita à movimentação de cargas suspensas, como se deduz dos pontos 58 a 62, 65, 66 e 79 do acervo fáctico provado.

Estas regras eram do conhecimento de todos os trabalhadores, nomeadamente do trabalhador DD.

De acordo com as regras instituídas, em brevíssima síntese, era proibida a elevação e movimentação de cargas sem se verificar se o espaço livre era suficiente para tais operações e sem se garantir que nesse espaço não existiam quaisquer pessoas e/ou equipamentos fixos ou móveis.

Ademais, tais regras impunham que o operador teria que manter um controle permanente e total da ponte rolante e nunca poderia deixar a carga suspensa sem vigilância.

Acresce que o trabalhador DD era especializado na operação da ponte rolante, tinha vasta formação profissional em matéria de segurança e saúde no trabalho, com particular destaque para a segurança na operação de pontes rolantes, elevação e movimentação de cargas suspensas – cf. pontos 51 e 78.

Atendendo à sua especialização profissional, a operação que o mesmo estava a executar não necessitava de ser supervisionada por superior hierárquico, nomeadamente por qualquer encarregado da secção, pois o mesmo detinha formação e conhecimentos suficientes para poder executar a operação em segurança para a integridade física de outras pessoas, desde que cumprisse as regras instituídas pela empregadora, que eram adequadas e suficientes para evitar que qualquer carga suspensa e em movimento atingisse pessoas e bens.

A empregadora previu os riscos inerentes à operação em causa e estabeleceu medidas de prevenção e segurança, suficientes e adequadas, a evitar ou minimizar esses riscos.

Entendemos, por isso, e subscrevendo totalmente a fundamentação exposta na sentença recorrida, que não ocorreu qualquer violação de normas de segurança e saúde no trabalho pela empregadora que tenha causado o acidente.

Acresce que o trabalhador DD, como bem se decidiu na sentença recorrida, não se pode considerar “representante” da empregadora para efeitos do artigo 18.º da LAT, uma vez que na altura em que ocorreu o acidente não estava a exercer o poder diretivo que é conferido ao empregador no âmbito do contrato de trabalho – cf. acórdão desta Secção Social de 30-03-2023, proferido no processo n.º 955/21.1T8LRA-A.E1, acessível em www.dgsi.pt, no qual se desenvolve a matéria relacionada com a definição de “representante” ínsita no artigo 18.º da LAT.

Em suma e concluindo, nenhuma censura merece a decisão recorrida por ter considerado que não existia responsabilidade agravada da empregadora, de harmonia com o disposto no artigo 18.º da LAT.»

E – VIOLAÇÃO DAS REGRAS DE SEGURANÇA

26. Abordando a primeira questão suscitada neste recurso de Revista [e que nos remete juridicamente para o artigo 18.º da LAT e também para os artigos 281.º a 284.º do Código do Trabalho e legislação específica e regulamentar, como a da Lei n.º 102/2009, de 10/9 e Decreto-Lei n.º 50/2005, de 25/02 [12]], a mesma destina-se a aferir se ocorreu a violação ou não por parte da empregadora das regras de segurança reclamadas, quer no que concerne às funções e condições de trabalho do trabalhador sinistrado CC, quer no que respeita ao manuseamento e funcionamento do equipamento mecânico que se destinava ao transporte em altura de todo o tipo de materiais dentro das instalações fabris da Ré VIGORBLOCO – PRÉ-FABRICADOS, SA e que, na altura do sinistro dos autos, procedia à deslocação de um pilar de cimento com o peso de 6,5 toneladas, com vista ao seu armazenamento no local próprio, sendo tal grua operada por outro trabalhador da Recorrida, de nome DD.

Encontrando-se tal pilar, de 10 metros de comprimento e de 50 centímetros de largura e altura, a cerca de 2 metros do solo, quando era transportado do molde onde tinha sido fabricado para o espaço de armazenamento, o referido colega do sinistrado parou tal operação e afastou-se do lugar onde a dita carga ficou suspensa e onde não havia mais ninguém a tomar conta dela, tendo levado o comando consigo que, em circunstâncias não apuradas, foi acionado inadvertidamente por aquele, vindo o equipamento que levava o pilar a funcionara de novo e a fazer deslocar aquele até o mesmo embater nos pilares que formavam uma das «paredes» [digamos assim] do espaço onde o sinistrado se achava [habitualmente] a laborar [13] e que, com tal embate, vieram a tombar sobre tal espaço e os pilares da outra «parede» e a matar, de forma direta e imediata, CC [14].

Chegados aqui e depois de procedermos a uma descrição sumária do acidente de trabalho mortal dos autos [15], importa começar por dizer que os referidos dois trabalhadores tinham um historial de formação qualificada e certificada dada pela Ré empregadora em diversos aspetos da sua prestação profissional, dos riscos que a mesma envolvia e das melhores práticas para diminuir ao máximo esses perigos que importa, desde logo, aqui destacar [até porque é pouco habitual encontrar-se com tal intensidade em processos desta natureza] [16], sendo um e outro trabalhadores experientes relativamente às respetivas atividades que executavam [cf. Pontos Provados 50. e 51.] e conheciam as regras técnicas e de segurança, assim como os riscos inerentes aos diversos trabalhos que tinham de ser realizados no interior do pavilhão onde se deu o sinistro [cf. Ponto Provado 67.]

Impõe-se referir aqui que, como é legalmente obrigatório, a Ré empregadora tinha contratado, desde 2009, a empresa a empresa prestadora dos serviços de segurança M..., Lda., que por seu turno designou a TSST, EE, para prestar esse serviço na 2.ª Ré, que era, de facto, efetuado, designadamente através de visitas/inspeções periódicas semanais às instalações fabris da 2.ª Ré e da avaliação – que, por exemplo abrangeu o posto de trabalho do sinistrado - e eventual sensibilização para os diversos riscos existentes [cf. Pontos de Facto Provados 69. a 74.]

Por outro lado, a recorrida VIGORBLOCO – PRÉ-FABRICADOS, SA tinha implementadas e comunicadas a todos os trabalhadores uma série de Regras Técnicas e de Segurança que, como já referimos, eram do conhecimento do sinistrado e do DD.

O Ponto Provado 47. explica, desde logo, por que razão as mesmas existiam:

«47.- A atividade prosseguida pela vítima e pelos colegas de trabalho que se encontravam presentes por ocasião da eclosão do acidente é uma atividade perigosa por estarem diariamente no raio de ação de estruturas em pedra com toneladas de peso e possui especial aptidão para produzir danos e lesões.» [17]

Tais regras técnicas e de segurança incidiam, com particular intensidade e como é natural, atentas as diversas atividades industriais desenvolvidas dentro das suas instalações e as dimensões, peso e perigosidade dos materiais que aí eram produzidos, armazenados e trabalhados, sobre as operações respeitantes aos equipamentos que faziam o translado de um local para o outro de todo o tipo de objetos [aí se destacando, como ressalta com nitidez dos autos, as vigas ou pilares de cimento de tamanho e carga consideráveis].

Ora, se analisarmos devidamente alguns dos factos que foram dados como assentes e que nos falam de circunstâncias anómalas ocorridas na altura do sinistro e que estão desconformes com algumas dessas regras técnicas e de segurança que vigoravam internamente na empregadora [18], facilmente concluímos que houve violação destas últimas, na forma como foi manuseada a grua de transporte, quer no que se refere à altura da carga, como à paragem de tal migração sem que aquela, por precaução, tivesse sido colocada em espaço disponível no solo, como ao seu abandono sem vigilância, como, finalmente, à manutenção por parte de DD da posse do comando do dito equipamento e que possibilitou, infeliz e inadvertidamente, o seu acionamento e choque contra os pilares que formavam um dos lados do posto de trabalho do sinistrado e que lhe tombaram em cima:

«28.-A - DD sabia que não podia deixar a carga suspensa sem a vigiar.

28.-B - O acidente mortal ocorreu porque DD, deixou a carga suspensa, não elevada a uma distância que salvaguardasse os pilares já armazenados e sem a vigiar, acionando inadvertidamente o comando da ponte rolante que por isso, fez o pilar deslocar-se, encostando aos pilares já armazenados, fazendo-os tombar sobre o Sinistrado.

26.- A morte do trabalhador sinistrado teve causa, direta e necessária, no arrastamento e posterior queda dos pilares sobre si, que o esmagaram, o que, por sua vez, ficou a dever-se à movimentação da carga suspensa, não elevada a uma distância que salvaguardasse os pilares já armazenados, e que por isso encostou nesses, fazendo-os tombar.

65.- De acordo com os procedimentos de operação de pontes rolantes instituídos pela Ré é expressamente proibida a passagem de cargas suspensas sobre trabalhadores e de deixar a carga suspensa sem vigilância, proibições estas que são conhecimento de todos os trabalhadores que executam estas tarefas para a 2.ª Ré.»

Atendendo ao que, designadamente, os Pontos Provados n.ºs 59. e 66. afirmam, o DD deveria ter avisado pessoalmente o sinistrado do transporte que este estava a fazer [19] mas nada está demonstrado nos autos, ficando nós mesmo sem saber se o segundo sequer se apercebeu desse tranlado de carga no interior daquele seu espaço de trabalho.

Chegados aqui e face à violação de tais regras técnicas e de segurança por parte do operador da grua DD, a pergunta que se nos coloca, de imediato – até por força das decisões judiciais coincidentes das instâncias – é a seguinte: tais condutas são imputáveis, direta e unicamente, a esse trabalhador ou, ao invés, podem e devem ser antes assacadas à entidade empregadora?

F – TRABALHADOR REPRESENTANTE DA RÉ EMPREGADORA

27. Entramos então na abordagem da segunda questão que se prende com a possibilidade de se encarar o trabalhador DD como representante da sua entidade empregadora, para efeitos do funcionamento do regime constante do número 1 do artigo 18.º da LAT/2009 [20].

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto colocado junto deste Supremo Tribunal de Justiça, no seu Parecer emitido ao abrigo do número 3 do artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho, defende o seguinte a esse respeito [21]:

«Ainda que assim não fosse, deve considerar-se que o operador da ponte rolante DD atuou no contexto em que se deu o acidente como um «representante» do empregador, para os efeitos do n.º 1 do art.º 18.º da LAT.

A doutrina e a jurisprudência têm vindo a assinalar que o conceito de representante não se reconduz apenas ao conceito de representante de pessoa coletiva previsto no art.º 163.º do Código Civil, devendo ser considerado em termos amplos. Um conceito alargado de representante, como se designou no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17-02-2020 (p. 6652/18.8T8VNG-A.P1)

Assim, é esse o entendimento expresso por Luís Azevedo Mendes (em “Apontamentos em torno do artigo 18.º da LAT de 2009: entre a clarificação e a inovação na efetividade da reparação dos acidentes de trabalho”, in Prontuário de Direito do Trabalho, CEJ/ Coimbra Editora, n.ºs 88/89, 2011, pp. 125 e ss., p. 129 a 131), acompanhando Luís Menezes Leitão (em “A reparação de danos emergentes de acidentes de trabalho”, in Estudos do Instituto de Direito do Trabalho, Almedina, Coimbra, 2001, p. 577).

Será, por isso, representante para este efeito quem detenha poderes de direção ou de chefia atribuídos pelo empregador. O que pode ser o caso de um chefe da equipa, tal como se entendeu no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06-12-2011 (p. 188/07.TTCTB.C1.S1).

O que realmente releva é que no contexto concreto da execução do trabalho o trabalhador tenha uma responsabilidade que o diferencia da generalidade dos demais trabalhadores.

Ora, no caso dos autos, a entidade empregadora ao não colocar um trabalhador com funções de nível superior à do operador a executar a vigilância da operação de movimentação de carga, estava efetivamente a considerar que o mesmo tinha autonomia e responsabilidade suficientes para dispensar essa supervisão e controlo, considerando-o, dessa forma, como estando em posição correspondente à do trabalhador que deveria fazer a vigilância, ou seja, conferindo-lhe poder de controlo fáctico sobre a organização e execução do trabalho no que releva das questões de segurança no trabalho.

Não era assim esse trabalhador tido como um trabalhador comum. Será, antes, em face da forma como o empregador considerou que dispensava vigilância e supervisão, um auxiliar qualificado (cfr. o n.º 1 do art.º 800.º do Código Civil).

Deverá, assim, no contexto concreto da situação em que se deu o acidente ser considerado como representante do empregador, para os efeitos previstos no art.º 18.º da LAT.

Tendo presente que o n.º 1 do art.º 17.º da LAT prevê os casos em que o acidente foi causado «por outro trabalhador», e não deixando esta norma de ter o seu campo próprio de aplicação, considerando o conceito amplo ou alargado de representante do art.º 18.º e o acima exposto quanto ao enquadramento do operador DD, o mesmo agiu no caso como representante do empregador (art.º 18.º da LAT) e não como outro trabalhador (art.º 17.º da LAT).»

Ora, quanto a tal temática, muito embora possamos aceitar que um dado trabalhador possa ser investido de poderes de controlo, direção e vigilância de uma determinada atividade diretamente pelo empregador ou por quem o represente na altura de tal delegação momentânea ou mais permanente de poderes [basta pensar no disposto nos artigos 128.º, número 2, 351.º, número 2, alínea a) ou 329.º, números, 2, 4 e 7 do Código do Trabalho de 2009, quanto ao poderes de direção e disciplinar], nada resulta de concreto e efetivo da Factualidade dada como Provada acerca de tal estatuto jurídico-laboral do operador da grua de transporte.

Se lermos com atenção tal Matéria de Facto Assente, deparamo-nos apenas com o referido DD e com o sinistrado CC no Pavilhão da 2.ª Ré e nada mais, não sendo, nessa medida, possível imputar a qualquer um deles tal qualidade de «representante», quando competiria às Autoras ou à Companhia de Seguros alegar e provar factos que permitissem a este STJ qualificar o referido DD como tal, nos termos dos artigos 552.º e 571.º a 573.º do NCPC e 342.º, n.º 1, do Código Civil.

A atribuição de tal categoria e papel de «representante» da Ré empregadora ao DD, por força das funções, formação e experiência profissional que possuía como manobrador da grua e transporte de cargas pesadas e de dimensões muito consideráveis [como seria o caso das vigas de cimento fabricadas nas instalações da empregadora] só se pode presumir, face à carência de factualidade que, de uma forma expressa ou tácita, o afirme, sendo certo, por outro lado, que nada obstava a que pudesse ser o sinistrado a assumir tal estatuto, dado que estava no local, não participava no transporte do aludido pilar e tinha formação e certificação profissional nessa mesma área de atividade, possuindo já 19 anos de casa [como se usa dizer] contra uma antiguidade desconhecida do outro trabalhador mas que tudo indica, a partir do confronto entre as ações de formação de cada um deles, seria significativamente superior à de DD.

Logo, por esse conjunto de razões, não parece possível considerar qualquer um desses dois trabalhadores como «representantes» da Ré no local do acidente de trabalho dos autos.

A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça já se pronunciou por diversas vezes sobre tal figura do «representante»:

- Acórdão do STJ de 5/02/2003, Recurso n.º 3607/02 - 4.ª Secção, Relator: José Mesquita, publicado em www.dgsi.pt, com o seguinte Sumário parcial:

VI – É de considerar que houve culpa da entidade patronal no acidente de trabalho que vitimou o trabalhador por o representante daquela (encarregado geral e responsável pela obra) ter organizado a subida do trabalhador a um poste de alta tensão através de uma escada não escorada (amarrada) e montada sobre duas tábuas colocadas em cima de um andaime constituindo para quem subisse um risco manifesto de queda, ter ordenado a sua efectivação depois da recusa pelo trabalhador, e ainda por ter abandonado a tarefa a que se comprometera de segurar a escada, sem qualquer aviso ao trabalhador.

- Acórdão do STJ de 30/09/2004, Recurso n.º 3775/03 - 4.ª Secção, Relator: Vítor Mesquita, tirado por maioria com um Voto de Vencido, publicado em www.dgsi.pt, com o seguinte Sumário parcial:

V - Ainda que a responsabilidade pela observância das condições de segurança num determinado local incumba a um terceiro (que responderá por tal perante as entidades fiscalizadoras competentes ou até em face da entidade patronal, na sede própria), continua a ser a entidade patronal - que paga a remuneração e exerce o seu poder de autoridade sobre o trabalhador -, a responsável direta perante este por determinar a execução da prestação laboral em local onde não foram previamente cumpridas as prescrições legais sobre higiene e segurança no trabalho.

VI - Nestes casos o terceiro (empreiteiro, empresa utilizadora, ou cessionário, no caso de cedência ocasional de trabalhadores) sob a direção de quem o trabalhador presta temporariamente a sua atividade conforme lhe foi determinado pela sua entidade patronal funciona perante o trabalhador como “representante” da entidade patronal nos termos e para os efeitos da Base XVII da Lei n.º 2.127, pois foi a entidade patronal que determinou a execução da prestação laboral sob a direção daquele terceiro na obra ou atividade em que se deu o acidente, sujeitando o sinistrado ao modo como na mesma são, ou não, cumpridas por aquele as prescrições legais de higiene e segurança, e exercendo deste modo o seu poder de autoridade sobre o trabalhador a quem remunera periodicamente.

- Acórdão do STJ de 31/05/2005, Recurso n.º 256/05 - 4.ª Secção, Relator: Mário Pereira, publicado em www.dgsi.pt, com o seguinte Sumário parcial:

III - Executando a autora o seu trabalho de limpeza de acordo com as instruções conferidas pelos funcionários administrativos de uma escola, em conformidade com uma determinação nesse sentido emitida pela empresa de limpeza sua entidade patronal, continuava submetida ao poder de direção da sua entidade patronal ao obedecer às instruções daqueles funcionários da escola, o que implica a responsabilização da entidade patronal pelo incumprimento, por parte da escola, das obrigações em matéria de higiene e segurança no trabalho, em conformidade com o que prescreve a Base XVII da Lei n.º 2.127 de 03-08-65 que estabelece o direito às prestações agravadas em caso de culpa da entidade patronal “ou do seu representante” – n.º 2 da Base.

- Acórdão do STJ de 03/02/2010, Recurso n.º 162/2001.L1.S1- 4.ª Secção, Relator: Mário Pereira, publicado em www.dgsi.pt, com o seguinte Sumário parcial:

III - O termo “representante”, a que alude o art.º 18.º, n.º 1, da LAT, aplica-se às pessoas que gozem de poderes representativos de uma entidade patronal e atuem nessa qualidade, abrangendo normalmente os administradores e gerentes da sociedade, cujas características preenchem as próprias do mandato, e ainda quem no local de trabalho exerça o poder diretivo.

IV - Tendo o encarregado geral e o encarregado de segurança da Ré omitido, perante incêndio que deflagrava num silo da fábrica desta, o chamamento dos bombeiros e tendo, ao invés, permitido aos trabalhadores da Ré, entre eles o Autor, que fossem os mesmos a tentar apagar o fogo, bem sabendo que não tinham formação para o efeito e nem sequer usavam roupas apropriadas, temos por verificada a omissão das regras de segurança no trabalho em matéria de incêndios, previstas nos arts. 8.º, n.º 1 e 2, als. i), j) e o) do DL n.º 441/91, de 14 de Novembro, na redação dada pelo DL n.º 133/99, de 21 de Abril.

V - No quadro das funções que aqueles encarregados assumiam – e dado que não vem demonstrado que os órgãos representativos da Ré tenham assumido ou avocado para si a liderança do combate ao incêndio – cabia-lhes assumir poderes de atuação e decisão no que concerne a medidas a adotar com vista ao combate ao incêndio e à preservação da segurança dos demais trabalhadores e à defesa dos bens da Ré.

VI - Nesta medida, tais encarregados participavam do poder diretivo próprio da sua entidade empregadora, sendo que não vem demonstrado que hajam contrariado instruções que, a esse respeito, lhes tivessem sido dadas pela Ré, daí que os seus apontados comportamentos traduzam atos da própria Ré, que a vinculam e responsabilizam e que impõem se conclua pela violação culposa, por esta, através dos ditos “representantes”, das apontadas regras legais de segurança no trabalho.

VIII - Tendo a Ré, através dos seus “representantes”, omitido o chamamento dos bombeiros para que fossem estes a combater o incêndio que, há várias horas, deflagrava num dos silos da fábrica, e tendo esperado que fossem os trabalhadores da empresa, entre os quais se contava o Autor, a combater tal incêndio, sendo que esses trabalhadores não usavam roupas adequadas para o efeito e não dispunham de formação em matéria de combate a incêndios, temos por verificado o nexo causal entre tal violação e o acidente, traduzido na explosão de chamas provindas do silo e que vieram a atingir o Autor, quando este colaborava no combate ao incêndio, deitando água, com uma mangueira, para dentro do silo.»

- Acórdão do STJ de 15/09/2010, Recurso n.º 182/07.0TUFIG.C1.S1 - 4.ª Secção, Relator: Mário Pereira, publicado em www.dgsi.pt, com o seguinte Sumário parcial:

IV - Os deveres ou obrigações que, em matéria de segurança, higiene e saúde, a lei faz recair sobre o empregador/sociedade unipessoal não podem ser interpretados como vinculando pessoalmente o gerente e, como tal, valerem como obrigações do trabalhador/gerente, designadamente nos termos e para os efeitos do art.º 7.º, n.º 1 da LAT.

V - Hão-de, pois, de ser tratados como obrigações da empregadora e o seu desrespeito como violação por parte da mesma, ainda que, na base do respetivo incumprimento, esteja uma acção ou omissão do sócio-gerente, o que se harmoniza com a previsão do n.º 1 do art.º 18.º e n.º e do art.º 37.º da LAT de que a entidade empregadora é a responsável, a título principal e agravado pelo acidente de trabalho provocado pelo seu representante, sem prejuízo do direito de regresso do empregador contra o seu representante que tenha provocado o acidente.

- Acórdão do STJ de 29/3/2012, Processo n.º 289/09.0TTSTB.E1.S1, Relator: Sampaio Gomes, publicado em www.dgsi.pt, com o seguinte Sumário parcial:

V - O termo “representante” a que alude o art.º 18.º, n.º 1, da LAT, refere-se às pessoas que gozam de poderes representativos de uma entidade patronal e atuem nessa qualidade, abrangendo normalmente os administradores e gerentes da sociedade, cujas características preenchem as próprias do mandato, e ainda quem no local de trabalho exerça o poder diretivo, o que significa que os comportamentos da empresa utilizadora se traduzem em atos da própria empresa de trabalho temporário, que a vinculam e responsabilizam pela violação culposa das regras legais de segurança no trabalho que àquela venham a ser imputáveis.

- Acórdão do STJ de 15/1/2025, Processo n.º 2638/18.0T8VCT-B.G1.S1, Relator: Júlio Gomes, publicado em www.dgsi.pt, com o seguinte Sumário parcial:

I. O conceito de representante para efeitos do artigo 18.º da LAT abrange todos os que exercem poderes próprios do empregador no local de trabalho e são responsáveis pelo cumprimento das regras de segurança e saúde no local de trabalho.

Afigura-se-nos que, não obstante a doutrina referida no Parecer do ilustre magistrado do Ministério Público e da doutrina nela citada, parece extrair-se deste extenso quadro jurisprudencial que o operador da grua, ao atuar como atuou, em violação das referidas regras de segurança, não agiu como «representante» da 2.ª Ré VIGORBLOCO - PRÉ-FABRICADOS, S.A., nos termos e para os efeitos do número 1 do artigo 18.º da LAT.

Ora, a ser assim, terá o sinistro dos autos de ser reconduzido ao regime do artigo 17.º do mesmo diploma legal, como o faz o Aresto recorrido?

G – DEVER DE VIGILÂNCIA

28. Importa, para responder com objetividade e certeza a tal pergunta, atentar na forma como tal questão do dever de vigilância foi suscitada nos autos, de forma direta ou indireta, pelas partes:

- PETIÇÃO INICIAL DAS AUTORAS

«7.º - Para tanto, o DD elevou o pilar retirado do molde a uma altura de 2 m., pretendendo transportá-lo até ao local de armazenamento, previamente designado pelo encarregado FF, situado junto à parede do lado direito do pavilhão.

11.º - Tal como o trabalhador sinistrado, à data dos factos, também os colegas de trabalho DD e o encarregado FF, trabalhavam sob as ordens, direção e fiscalização da 2.ª Ré, em execução de um contrato de trabalho celebrado entre si e a referida entidade.

34.º - Não existiam instruções de trabalho escritas dirigidas diretamente aos trabalhadores, mas, tão só, aos encarregados de secção - que muitas vezes não se encontram a acompanhar o processo de fabricação e armazenamento, como sucedeu no momento em que o acidente de trabalho ocorreu - e mesmo essas, não mencionavam as regras de segurança a observar, na manobra de cargas suspensas com as pontes rolantes.

36.º - O armazenamento dos pilares da forma antes referida, origina alturas de empilhamento superiores a 3 metros - na medida em que, se verificaram situações em que se encontravam mais do que três pilares empilhados - dependia, exclusivamente, da decisão e supervisão do chefe de secção, sem que existissem no local de trabalho, quaisquer instruções escritas ou um layout definido sobre essa atividade, que prevenisse a segurança no trabalho, cabendo tal decisão ao chefe de secção.»

- CONTESTAÇÃO DA SEGURADORA

«9.º - Só os encarregados de secção possuíam tais instruções pelo que competia à 2.ª Ré proibir a execução de tais funções na ausência desses encarregados de secção. Todavia,

10.º - Sem instruções e sem que qualquer um dos encarregados de secção se encontrasse a controlar as operações, a 2.ª Ré permitia que esses trabalhos fossem executados pelos operadores das pontes rolantes, mau grado a particular perigosidade que envolviam, tal como aconteceu no dia em que aconteceu o acidente sub judice

- CONTESTAÇÃO DA EMPREGADORA

«17. O trabalhador DD elevou o pilar retirado do molde a uma altura aproximada de 2 m., pretendendo transportá-lo até ao local de armazenamento, previamente designado pelo encarregado FF.

19. E, o local de armazenamento designado pelo Encarregado FF situava-se num espaço disponível entre pilares armazenados do lado poente do pavilhão.

60. As instruções técnicas eram dirigidas a todos os trabalhadores (e não apenas aos encarregados de secção) e mencionavam as regras de segurança a observar, na manobra de cargas suspensas com as pontes rolantes,

149. Relembramos que, a Instrução Técnica 116 “TAREFAS DE APOIO À MOVIMENTAÇÃO MECÂNICA DE CARGAS” – junta como Doc. 10 – cfr. supra aludido, descreve o procedimento de segurança a ser cumprido quando é necessário o auxílio manual da carga, movimentada por meios mecânicos (veja-se que, mais uma vez, cai por terra o alegado pelas Autoras de que as Instruções eram apenas dadas ao encarregado e não a todos os trabalhadores)».

Confrontando tal alegação factual com a matéria de facto dada como Provada ou Não Provada, facilmente verificamos que apenas foi dado como assente [Ponto 57.] que as ditas regras técnicas e de segurança implementadas pela 2.ª Ré era do conhecimento de todos os trabalhadores [e não apenas das chefias intermédias] assim como o que consta do Ponto n.º 48.- quando afirma [22] que os trabalhos de transporte que estavam a ser realizados pelo DD não estavam a ser orientados ou supervisionados por nenhum encarregado da respetiva secção, tendo a 2.ª Ré consentido que tal assim acontecesse.

Ficou igualmente demonstrado que não seria obrigatório ou, pelo menos, inédito que a referida atividade, apesar de perigosa, fosse apenas efetuada pelos operadores propriamente ditos, como resulta do Ponto 66.: «A Ré tem a regra de os trabalhadores serem alertados pelos operadores que estão a manobrar as pontes rolantes para saírem do local de passagem das cargas suspensas ou os trabalhos são interrompidos.»

Importa realçar ainda, nesta matéria, o que já antes foi dito e que é o seguinte: quer o sinistrado como o DD eram trabalhadores experientes, devidamente certificados para trabalharem com o dito equipamento e com uma significativa formação aos diversos níveis antes referenciados [cf., designadamente, o Ponto Provado 67.].

Finalmente, é defensável sustentar que, atendendo às primeiras vertentes do objeto social da 2.ª Ré, conforme se acha descrito no Ponto Provado n.º 49. [23] e aos factos descritos nos Pontos Provados 52. a 56., não seria porventura exigível à empresa ter sempre, constantemente, algum superior hierárquico dos operadores do referido equipamento ou de outro igualmente problemático, por ser perigoso, a controlar, fiscalizar e dirigir tais trabalhos em permanência.

Será, de facto, assim?

Importa, no que concerne a este aspeto [ausência de vigilância], ter na devida atenção o que o Exmo. Procurador-Geral Adjunto colocado junto deste Supremo Tribunal de Justiça defende no já referido Parecer e que é o seguinte:

«No que aqui agora releva, importa ter em consideração o que é imposto em matéria de segurança na atividade de movimentação de cargas em altura no DL n.º 50/2005, de 25 de Fevereiro, sobre prescrições mínimas de segurança e de saúde para a utilização pelos trabalhadores de equipamentos de trabalho (o qual transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2001/45/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de Junho).

Assim constam do diploma as seguintes normas que se transcrevem.

« Artigo 33.º

Equipamentos de trabalho de elevação de cargas

(…)

4 - É proibida a presença de trabalhadores sob cargas suspensas ou a deslocação de cargas suspensas por cima de locais de trabalho não protegidos e habitualmente ocupados por trabalhadores, exceto se a boa execução dos trabalhos não puder ser assegurada de outra forma e se forem adotadas as medidas de proteção adequadas.»;

Artigo 35.º

Organização do trabalho na elevação de cargas

1 - As operações de elevação de cargas devem ser corretamente planificadas, vigiadas de forma adequada e efetuadas de modo a proteger a segurança dos trabalhadores.

2 - As operações de elevação de cargas suspensas devem ser vigiadas permanentemente, a não ser que seja impedido o acesso à zona de perigo e a carga esteja fixada e conservada em suspensão com total segurança.»

No caso dos autos é manifesto que essas regras de segurança no trabalho não foram cumpridas.

Por um lado, o operador da ponte rolante DD manobrou o pilar suspenso no ar sobre a zona em que se encontrava e onde trabalhava o sinistrado (factos 16 a 20), sendo que não podia ser permitida a presença do sinistrado naquele local enquanto fosse movimentado o pilar pelo ar, como decorre da proibição do n.º 4 do art.º 33.º citado.

Por outro lado, «No plano de avaliação de riscos, com referência ao local de trabalho onde ocorreu o acidente, estavam previstos aqueles que dizem respeito ao choque de cargas suspensas noutros objetos, decorrentes da movimentação através das pontes rolantes e armazenamento dos pilares, mas não especificava concretamente o risco de choque noutros objetos e trabalhadores como o que sucedeu no acidente que vitimou o Sinistrado.» (facto 25). Ou seja, no plano de avaliação de riscos não se previu essa proibição da presença de trabalhadores na zona em que eram movimentados no ar os pilares.

Embora constasse em instruções técnicas da empresa que não podiam estar pessoas sob as cargas a ser movimentadas (factos 58 a 62), essa proibição não foi objeto de vigilância permanente e adequada na situação em que ocorreu o acidente dos autos, como é imposto na segunda parte do n.º 1 e na primeira parte do n.º 2, ambos do art.º 35.º citado.

Este dever de vigilância imposto ao empregador exige que aquando da operação de movimentação de cargas o operador esteja acompanhado por um trabalhador com funções de supervisão ou controlo, dado que, como parece claro, não é o próprio operador que pode cumprir a obrigação de vigilância sobre si próprio.

Pelo que, se não afigura correta a conclusão obtida no acórdão recorrido, de acordo com a qual «Atendendo à sua especialização profissional, a operação que o mesmo estava a executar não necessitava de ser supervisionada por superior hierárquico, nomeadamente por qualquer encarregado da secção, pois o mesmo detinha formação e conhecimentos suficientes para poder executar a operação em segurança para a integridade física de outras pessoas, desde que cumprisse as regras instituídas pela empregadora, que eram adequadas e suficientes para evitar que qualquer carga suspensa e em movimento atingisse pessoas e bens.»

A vigilância nas operações de movimentação das cargas é imposta na lei, a ser feita por um outro trabalhador (designadamente um encarregado), tendo a lei como pressuposto que o trabalho do operador, considerando a perigosidade da atividade, exige a vigilância por um outro trabalhador.

Nada na lei permite que se conclua que o eventual elevado nível de conhecimentos do operador dispensa a vigilância ou supervisão do seu trabalho.

Foi, por isso, violada a obrigação de vigilância imposta ao empregador na segunda parte do n.º 1 e na primeira parte do n.º 2, ambos do art.º 35.º citado.

O incumprimento destas regras de segurança é diretamente imputável à entidade empregadora do sinistrado, a segunda Ré nos autos.

Assim, também se considerou no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-10-2016 (p. 443/13.0TTVNF.G1.S1), onde se escreveu o seguinte:

«Tudo para concluir que a empregadora violou as regras sobre segurança no trabalho contidas no n.º 4 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 50/2005, ao ter permitido a deslocação de cargas suspensas por cima de locais de trabalho não protegidos e ocupados por trabalhadores, sem ter adotado as medidas de proteção adequadas, e as regras sobre segurança no trabalho previstas nos n.ºs 1 e 2 do 35.º do Decreto-Lei n.º 50/2005, ao não ter elaborado plano de trabalho ou de prevenção para a execução da tarefa de desmontagem, não ter procedido à vedação da zona onde se realizavam os trabalhos de elevação de cargas e não ter garantido, adequadamente, a vigilância permanente, no local, das operações de elevação e movimentação de cargas.»

Acresce que, como se refere no acórdão no trecho que acima se citou, o operador DD «(…) deixou, sem vigilância, um pilar de cerca de 10 m de comprimento; 50 cm de largura e altura; com o peso de 6,5 toneladas, suspenso a uma altura de cerca de 2 metros do solo, num local próximo dos pilares que ladeavam o sinistrado e do corredor onde este se encontrava.

Além disso, inadvertidamente, acionou o comando da ponte rolante , fazendo com que o pilar em suspensão se movimentasse, impactando com os pilares que ladeavam o corredor onde se encontrava o sinistrado, que, devido ao embate, tombaram sobre o sinistrado (…)»

Ora, a falta de cumprimento do dever de vigilância, o qual, como se disse, teria de ser assegurado por um trabalhador distinto do operador, designadamente um encarregado, não permitiu que fosse efetuado o devido controlo da atuação do operador e este tivesse agido de forma incorreta, o que levou a que os pilares caíssem sobre o sinistrado.

Pode, por isso, afirmar-se que, sendo realizada essa vigilância devida por força das imposições em matéria de segurança, teria seguramente ou, pelo menos, muito provavelmente sido evitada a ocorrência do acidente. Com efeito, a supervisão da execução da tarefa de movimentação da carga em altura que executava o operador permitira que se verificasse que o sinistrado se encontrava por baixo da zona de movimentação aérea do pilar e, também, que se impedisse que o operador deixasse sem vigilância o pilar que estava a ser movimentado e assim acionou, inadvertidamente, o comando da ponte rolante, fazendo com que o pilar em suspensão se movimentasse.

O exercício da vigilância por um diferente trabalhador da operação de movimentação aérea dos pilares permitiria impedir que a operação se realizasse sem que as condições de segurança estivessem asseguradas.

Através do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 6/2024 foi uniformizada jurisprudência nos seguintes termos:

«Para que se possa imputar o acidente e suas consequências danosas à violação culposa das regras de segurança pelo empregador ou por uma qualquer das pessoas mencionadas no artigo 18.º, n.º 1, da LAT, é necessário apurar se nas circunstâncias do caso concreto tal violação se traduziu em um aumento da probabilidade de ocorrência do acidente, tal como ele efetivamente veio a verificar-se, embora não seja exigível a demonstração de que o acidente não teria ocorrido sem a referida violação.»

Ora, no caso dos autos, como se referiu, a violação das obrigações das regras de segurança pelo empregador aumentou significativamente a probabilidade de ocorrência do acidente, tal como ele se verificou.

Pelo que, a entidade empregadora responde pela obrigação de reparação nos termos previstos no art.º 18.º da LAT)».

Registe-se que as Autoras já haviam mencionado antes nas alegações do recurso de Apelação [onde também fazem alusão a um relatório elaborado pela ACT de ... que também refere tais regras legais e que se acha junto aos autos na fase conciliatória dos autos] e mencionam agora nas alegações da Revista a violação efetiva das seguintes normas jurídicas: «n.ºs 5 e 6 do art.º 69.º da Portaria n.º 53/71 de 03/02, na redação que lhe foi dada pela Portaria n.º 702/80 de 22/09, que aprova o Regulamento Geral de Segurança e Higiene do Trabalho nos Estabelecimentos Industriais [24], bem como o n.º 1 e 2 do art.º 11.º [25] e n.º 4 do art.º 33.º, do DL. n.º 50/2005, de 25 de Fevereiro que regula as Prescrições Mínimas de Segurança e de Saúde na Utilização de Equipamentos de Trabalho e que sobre Equipamentos de Trabalho de Elevação de Cargas».

Pensamos útil enquadrar devidamente tais dispositivos normativos e diplomas legais com os princípios gerais que resultam, quer do artigo 281.º do Código de Trabalho de 2009, quer dos artigos 4.º, alíneas a), c), e), f), g) e h) [conceitos], 5.º , números 1, 2 e 3, alínea b) [princípios gerais], 15.º, números 1, 2, alíneas a), c), d), e), g), h), i) e j), 6, 7 e 8 [obrigações gerais do empregador], 17.º, números 1 , 2 e 3 [obrigações do trabalhador] da Lei n.º 102/2009, de 10/09, que estabelece o regime jurídico da promoção da segurança e saúde no trabalho [26].

Tal legislação é aplicável, indiscutivelmente, à atividade, equipamento e instalações da Ré empregadora bem como às condições de trabalho dos trabalhadores ao seu serviço e não pode ser ignorada nem substituída por regras internas emanadas do empregador que não as tenham na devida consideração em toda a sua extensão, na parte que seja relevante.

Impõe-se constatar que a recorrida não assegurava uma supervisão, controlo e orientação mínimos, por parte de alguém apto a tal, designadamente que fosse superior hierárquico do sinistrado e do operador de grua DD, no que respeita ao transporte de um pilar que estava a ser feito, de maneira a certificar-se que a manobra em si, em todas as suas diversas implicações, não colocava em risco o referido trabalhador ou outros que pudessem estar na zona envolvente do dito translado e relativamente aos quais pudesse haver perigo para a sua integridade física.

A presença, pelo menos regular ou, no mínimo, nos momentos críticos e com maiores riscos, de um encarregado ou chefe de secção que aferisse se tudo estava conforme, não apenas com as regras de segurança legais e internas, mas também com as boas práticas que o espaço em que se deslocava a grua, com as suas especificidades e circunstâncias particulares demandavam, parece-nos evidente, dado aquela atividade de fabrico dos pilares nos moldes, retirada das vigas dos mesmos e sua movimentação pelo ar e entre paredes para os espaços de armazenamento, era efetuada diária e repetidamente ou, pelo menos, com muita frequência.

Tal presença de um terceiro, naturalmente mais experiente e com maior responsabilidade perante a empresa e os trabalhadores que ali se encontravam no dia do sinistro dos autos, poderia ter evitado o acidente de trabalho dos autos ou, pelo menos, diminuído de uma forma mais ou menos intensa os riscos a este associados [27], através da observação, da orientação, da correção e da chamada de atenção para o que DD estava a fazer – ordenado a colocação a uma altura maior do pilar, alertando-o para o facto de não o poder deixar sem vigilância e proibindo-o de não levar o comando consigo [28] - e, também, pedindo a este último ou determinando ele próprio que o sinistrado se afastasse do seu posto de trabalho e se colocasse a uma distância segura.

Interessa igualmente e quanto ao local ou posto de trabalho do sinistrado, questionar não apenas a sua existência naquele preciso lugar, que, como se viu, estava situado na zona de risco do transporte com a aludida grua de cargas pesadas, como era habitual, como ainda a sua conceção, que, de alguma forma, emparedava o sinistrado entre vigas de cimento, assentes em barrotes de madeira, que podiam atingir a altura de 3 metros e que estavam distanciadas entre si apenas 2 metros, deixava o trabalhador num espaço claustrofóbico e sem grande margem para fugir ou se proteger de uma qualquer eventualidade que ocorresse nesse seu posto de trabalho.

Ora, sabendo nós que a referida atividade industrial era intrinsecamente perigosa para todos que ali laborassem e se movimentassem no interior do dito armazém, não se pode deixar de assinalar aqui o que nos diz o Ponto Provado 25.: «No plano de avaliação de riscos, com referência ao local de trabalho onde ocorreu o acidente, estavam previstos aqueles que dizem respeito ao choque de cargas suspensas noutros objetos, decorrentes da movimentação através das pontes rolantes e armazenamento dos pilares, mas não especificava concretamente o risco de choque noutros objetos e trabalhadores como o que sucedeu no acidente que vitimou o Sinistrado.» [sublinhado a negrito da nossa responsabilidade].

Nessa medida, temos de encarar tal posicionamento e conceção do posto de trabalho de CC, nas circunstâncias concretas em que se deu o acidente de trabalho dos autos, como uma concausa, que concorreu, em conjunto com a descrita conduta imprudente e desafortunada do DD e com a ausência de vigilância relativa ao trabalho do mesmo e até do sinistrado, para a sua verificação.

Afigura-se-nos assim que, de facto, foram violadas regras de segurança no trabalho que, em última análise e não obstante as condutas DD, podem e devem ser assacadas à 2.ª Ré, nos termos do número 1 do artigo 18.º da LAT.

H – CONCLUSÃO

29. Logo, pelo conjunto de argumentos deixados expostos, tem estes recursos de Revista das Autoras AA e BB [sendo esta última Autora, por ser menor, representada na ação pela primeira Autora] e da Ré FIDELIDADE COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. de serem julgados parcialmente procedentes, assim se revogando o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora no que concerne à imputação exclusiva ao trabalhador DD da responsabilidade pela verificação do sinistro dos autos e configuração da mesma ao abrigo do artigo 17.º da LAT/2009.

Tendo em atenção que, de acordo com os artigos 665.º e 679.º do NCPC, não é aplicável ao STJ o princípio da substituição do tribunal recorrido pelo tribunal de recurso, quando, na sequência da procedência total ou parcial da revista, existem questões jurídicas pendentes, por terem ficado prejudicadas que não foram objeto de análise e decisão pela 2.ª instância [ no caso dos autos, as consequências jurídicas da responsabilização agravada da Ré VIGOBLOCO – PRÉ-FABRICADOS, S.A. que se mostram previstas, designadamente, nos números 4 a 6 do artigo 18.º da LAT – impõe-se determinar ainda que os autos baixem ao Tribunal da Relação de Évora a fim de aí serem julgadas tais questões de natureza jurídica.

IV – DECISÃO

30. Por todo o exposto, nos termos dos artigos 87.º, número 1, do Código do Processo do Trabalho e 679.º e 663.º do Novo Código de Processo Civil, acorda-se, neste Supremo Tribunal de Justiça em julgar parcialmente procedentes os presentes recursos de Revista interpostos pelas Autoras AA e BB [sendo esta última Autora, por ser menor, representada na ação pela primeira Autora] e pela Ré FIDELIDADE COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. revogando-se, nessa medida, pelos fundamentos constantes da fundamentação do presente Aresto, o recorrido Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, quanto à imputação exclusiva ao trabalhador DD da responsabilidade pela verificação do sinistro dos autos e configuração da mesma ao abrigo do artigo 17.º da LAT/2009.

Existindo questões jurídicas pendentes, que não foram objeto de análise e decisão pela 2.ª instância, determina-se ainda que os autos baixem ao Tribunal da Relação de Évora a fim de aí serem julgadas tais questões de natureza jurídica.

Custas dos presentes recursos a cargo da recorrida VIGOBLOCO – PRÉ-FABRICADOS, S.A. - artigo 527.º, número 1 do Novo Código de Processo Civil.

Registe e notifique.

Lisboa, 28 de maio de 2025


José Eduardo Sapateiro – Juiz-Conselheiro Relator

Mário Belo Morgado – Juiz-Conselheiro Adjunto

Paula Leal de Carvalho – Juíza-Conselheira Adjunta

_____________________________________________




1. «Na sentença recorrida constam, por lapso, dois pontos com o n.º 28. Assim, para evitar confusões, decidimos designar um por 28-A e o outro por 28-B.» - NOTA DE RODAPÉ DA MATÉRIA DE FACTO REPRODUZIDA NO ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA, COM O NÚMERO 2↩︎

2. «Tem-se em conta a retificação ao valor indicada pelas Autoras no Requerimento com a Ref.ª 9974775.» - NOTA DE RODAPÉ DA MATÉRIA DE FACTO REPRODUZIDA NO ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA, COM O NÚMERO 32↩︎

3. «Cfr. Xavier, Bernardo da Gama Lobo, “Manual de Direito do Trabalho”, 2.ª Ed., Verbo, fevereiro de 2014, pág. 1039.» - NOTA DE RODAPÉ DA FUNDAMENTAÇÃO TRANSCRITA COM O NÚMERO 2.↩︎

4. «Cfr. artigo 79.º, n.º 1 da Lei n.º 98/2009, de 04/09.» - NOTA DE RODAPÉ DA FUNDAMENTAÇÃO TRANSCRITA COM O NÚMERO 3.↩︎

5. «Cfr. artigo 8.º, n.º 1 do Regime de Reparação de Acidentes de Trabalho e de Doenças Profissionais – Lei n.º 98/2009, de 04/09.» - NOTA DE RODAPÉ DA FUNDAMENTAÇÃO TRANSCRITA COM O NÚMERO 4↩︎

6. «Cfr. artigo 283.º, n.º 1 do CTrabalho e 2.º do Regime de Reparação de Acidentes de Trabalho e de Doenças Profissionais – Lei n.º 98/2009, de 04/09. Os familiares abrangidos são unicamente os referidos nos artigos 57.º e 60.º da Lei n.º 98/2009, de 04/09.» - NOTA DE RODAPÉ DA FUNDAMENTAÇÃO TRANSCRITA COM O NÚMERO 5.↩︎

7. «Cfr. Ac. do TRE de 30/03/2017, acessível em www.dgsi.pt.» - NOTA DE RODAPÉ DA FUNDAMENTAÇÃO TRANSCRITA COM O NÚMERO 6.↩︎

8. «Cfr. Ac. do TRC de 07/04/2017, acessível em www.dgsi.pt.» - NOTA DE RODAPÉ DA FUNDAMENTAÇÃO TRANSCRITA COM O NÚMERO 7.↩︎

9. “A responsabilidade agravada do empregador, nos termos do art. 18.º n.º 1 da LAT, com fundamento na falta de observação de regras sobre segurança e saúde no trabalho, dispensa a prova da culpa, mas exige a verificação de um nexo de causalidade entre essa violação e a eclosão do acidente” – Ac. do TRE, de 11/07/2019, P. 1270/15.5T8TMR.E1, in dgsi.pt; “Nos termos do art.º 18.º, n.º 1, da LAT, estamos perante responsabilidade agravada da entidade empregadora num acidente de trabalho, por falta de observação, por esta, das regras sobre segurança e saúde no trabalho, quando a entidade empregadora possui um dever de observância de determinadas normas ou regras de segurança, dever esse que incumpre, existindo um nexo de causalidade entre esse incumprimento e o acidente de trabalho” - Ac. do TRE, de 02/03/2023, P 727/18.0T8CSC.E1, in dgsi.pt» - NOTA DE RODAPÉ DA FUNDAMENTAÇÃO TRANSCRITA COM O NÚMERO 8.↩︎

10. «“Para prova do nexo causal, basta a demonstração de que o sinistro é uma consequência normal, previsível da violação das regras de segurança, independentemente de se provar ou não, com todo o rigor e extensão, a chamada dinâmica do acidente. No entanto, para que a violação das regras de segurança se possa considerar causal relativamente ao acidente ocorrido é necessário apurar se no caso concreto ela se traduziu em um aumento da probabilidade de ocorrência do acidente, tal como ele efetivamente veio a verificar-se” – Ac. do STJ, de 03/11/2023, P 1694/20.6T8CSC.C1.S1, in dgsi.pt.» - NOTA DE RODAPÉ DA FUNDAMENTAÇÃO TRANSCRITA COM O NÚMERO 9.↩︎

11. “(…) será representante, não apenas quem no seio da organização do empregador exerça o poder de direção – aliás a delegação do poder de direção mesmo fora dessa organização poderá relevar, embora nesses casos se possa estar perante um utilizador de trabalho temporário que é expressamente referido ou um cessionário numa cedência ocasional (que poderá caber no conceito de empresa contratada) – mas também quem exerça cargos, vulgarmente designados de chefia, que lhe atribuem competências (e responsabilidades) na organização e execução do trabalho. – Cfr. Júlio Gomes e Viriato Reis, Acidente de trabalho devido a culpa, in revista eletrónica do STJ, publicação n.º 4.» - NOTA DE RODAPÉ DA FUNDAMENTAÇÃO TRANSCRITA COM O NÚMERO 10.↩︎

12. A Ré VIGORBLOCO – PRÉ-FABRICADOS, SA vem nas suas contra-alegações de revista sustentar que as Autoras recorrentes não podiam invocar nas suas alegações de recurso tal legislação, por não o terem feito em sede da Petição Inicial, omissão essa que lhes vedaria a sua convocação posterior nos autos.

Ora, há que dizer que tais diplomas legais já haviam sido identificados e discutidos nas alegações de Apelação dessas mesmas Autoras, tendo igualmente a Ré Seguradora nas suas alegações de Apelação feito menção aos mesmos.

Tiveram as partes oportunidade de exercer o princípio do contraditório quanto a tais textos legislativos e normas jurídicas concretamente arguidas como constitutivas dos direitos invocados pelas Autoras.

Pretender qualificar a legislação vigente em território nacional – e que transpõe mesmo diversas Diretivas da União Europeia – como uma questão privada e fora do conhecimento – designadamente oficioso – dos tribunais não tem qualquer razão de ser, desde que tenha a ver com o litígio dos autos e a sua apreciação de direito, sendo certo, por outro lado, que, segundo o número 3 do artigo 5.º do NCPC, «o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito».

Interessa igualmente recordar que a ignorância da lei não aproveita a ninguém [artigo 6.º do Código Civil] e que a referida legislação, por regular os diversos aspetos relativos à saúde e segurança no trabalho, tinham de ser de conhecimento obrigatório por parte da Ré empregadora.

Logo, não colhe minimamente a alegação da 2.ª Ré no sentido deste Supremo Tribunal de Justioça não poder conhecer e decidir segundo tais regimes legais. [veja, ainda, o que se afirma na Nota de Rodapé com o número [21] quanto ao Parecer elaborado pelo Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste STJ e à legitimidade do mesmo para levantar questões novas, desde que naturalmente relacionadas com as problemáticas em questão no recurso ou, porventura, na ação].↩︎

13. Ficou o provado o seguinte quanto ao espaço, condições e funções desempenhadas pelo sinsitrado:

«11.- No dia 28/06/2022, pelas 07:20h, no interior das instalações fabris da 2.ª Ré, CC encontrava-se a efetuar trabalhos de descofragem de uma saliência de um pilar - comummente denominado cachorro - num pilar de betão com 18 m. de comp.; 80 cm. de alt. e 50 cm. de larg.

12.- Fazia-o com auxílio de uma ferramenta semelhante a um pé-de-cabra, trabalho que realizava habitualmente.

13.- O CC, encontrava-se a realizar aquele trabalho num corredor formado por quatro pilares sobrepostos, armazenados, dois de cada lado, todos com 18 T. de peso; 18 m. de comp.; 80 cm. de alt. e 50 cm. de larg., assentes em dois barrotes de madeira sobrepostos, em cada uma das extremidades.

14.- Tais pilares, assentes na forma descrita, formavam duas paredes com cerca de 2 metros e 16 cm de altura, separadas entre si por um corredor de 2 metros de largura em todo o comprimento das mesmas, no qual o trabalhador efetuava os referidos trabalhos, num dos pilares inferiores.

22.- Os pilares entre os quais se encontrava o trabalhador sinistrado a trabalhar e que sobre ele tombaram, estavam a ser armazenados, empilhados uns sobre os outros, sobre quatro barrotes de madeira de eucalipto, dois em cada extremidade de cada um deles, com dimensões de 60 cm de comprimento X 14,5 cm de largura X 14 cm de altura, cada um.

23.- O pilar superior identificado com a Ref.ª PD-...65 que tombou para cima do trabalhador sinistrado, foi fabricado no dia 27/06/2022.

24.- O pilar inferior, onde aquele assentou com a Ref.ª PD-6 ...565, foi produzido em 23/06/2022.

68.- O Sinistrado encontrava-se no local habitual de trabalho, a realizar tarefas habitualmente exercidas no interior da secção fabril UF6B.»↩︎

14. «6.- No dia 28/06/2022, pelas 07h20, em ..., ..., no estabelecimento da VIGOBLOCO, SA., quando o Sinistrado se encontrava entre pilares de betão a retirar cofragem do “cachorro” num deles, foi atingido pelos pilares que sobre si caíram.

21.- Do esmagamento do trabalhador sinistrado pelos pilares que tombaram, resultou a morte deste, no local.

7.- Como consequência direta e necessária do acidente, sobreveio a morte ao Sinistrado no mesmo dia.»↩︎

15. Cf. Pontos Provados n.ºs 15 a 21, 27 e 28-A, quanto à forma como o acidente de trabalho dos autos ocorreu.↩︎

16. Veja-se quanto a tal formação os Pontos de Facto n.ºs 75, 76 e 77 [sinistrado] e 78 [DD↩︎

17. Cf., aliás, os Pontos de facto Provados n.ºs 52. a 56., que relatam os procedimentos normais e habituais levados a cabo no âmbito da aludida atividade, que tudo indica, ser a principal.↩︎

18. Regras essas que, importa realçar, não se reconduzem apenas a normas jurídicas com assento em diplomas legais ou regulamentares mas a outros tipos e fontes, como tem vindo a ser frisado por este Supremo Tribunal de Justiça [cf., por exemplo, o Acórdão do STJ de 30/4/2025, Processo n.º 945/22.7T8VFX.L1.S2, Relator: Júlio Gomes, publicado em www.dgis.pt, com o seguinte Sumário parcial: «I. O artigo 18.º da LAT não se refere hoje apenas a normas legais, quando se refere à violação de regras de segurança.» e o Acórdão do STJ de 30/4/2025, Processo n.º 1013/18.1T8FIG.C2.S2, Relator: Júlio Gomes, publicado em www.dgis.pt, com o seguinte Sumário parcial: «I. O atual artigo 18.º da LAT não faz referência a normas legais, mas sim a regras de segurança, bem podendo as mesmas resultar da experiência ou dos usos;».↩︎

19. Seria talvez preferível que existisse algum sinal sonoro específico com essa mesma função, mas ignoramos se o mesmo existia ou não, pois nada ressalta dos autos, quer em sede de prova, como de alegação [ver, aliás, o que determinam os números 3 e 4 do artigo 11.º do DL 50/2005, analisado mais à frente] .↩︎

20. Artigo 18.º

Actuação culposa do empregador

1 - Quando o acidente tiver sido provocado pelo empregador, seu representante ou entidade por aquele contratada e por empresa utilizadora de mão-de-obra, ou resultar de falta de observação, por aqueles, das regras sobre segurança e saúde no trabalho, a responsabilidade individual ou solidária pela indemnização abrange a totalidade dos prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos pelo trabalhador e seus familiares, nos termos gerais.↩︎

21. Importará fazer notar aqui que este Parecer foi notificado às partes e que as mesmas tiveram oportunidade de se pronunciar sobre o seu teor e as questões nele levantadas, nos termos da aludida disposição legal e por força até do despacho judicial proferido nesse mesmo sentido pelo relator deste recurso.

Tendo o Ministério Público legitimidade processual e estatutária para suscitar quaisquer questões no âmbito do seu Parecer e não se encontrando, nessa medida, condicionado pelas matérias levantadas pelas partes e/ou tratadas pelas instâncias, não há que falar quanto aquelas, quando novas, em violação do princípio do contraditório ou em decisão surpresa.↩︎

22. «48. - Sem que qualquer um dos encarregados de secção se encontrasse a controlar as operações, no momento do acidente, a 2.ª Ré permitiu que os trabalhos fossem executados pelos operadores das pontes rolantes.»↩︎

23. «49.- A 2.ª Ré é uma sociedade comercial anónima que tem por objeto social a atividade de fabrico, comercialização e montagem de pré fabricados em betão; construção civil, compra, venda e locação de propriedades, revenda das adquiridas para os mesmos fins; arrendamento de bens imobiliários; conceção e execução de projetos; elaboração de projetos e acompanhamento técnico e comercial a obras; prestação de serviços de consultoria e assessoria, nomeadamente no âmbito da consultoria económica, financeira e para os negócios e a gestão e outros serviços às empresas.» [sublinhados a negrito da nossa responsabilidade]↩︎

24. Esse artigo 69.º, números 5 e 6 da aludida Portaria possui a seguinte redação [sublinhados a negrito da nossa responsabilidade]:

« Artigo 69.º

(Manutenção de cargas)

1 - A elevação das cargas deve efectuar-se verticalmente, a fim de evitar oscilações no decurso da operação. Quando for absolutamente necessária uma elevação oblíqua, devem ser observadas as precauções convenientes.

2 - As cargas devem ser içadas, arreadas ou removidas de modo a evitar choques bruscos.

3 - Os recipientes destinados a içar ou arrear ferramentas ou materiais soltos devem ser concebidos de maneira que nenhum dos objectos transportados possa cair.

4 - A elevação deve ser precedida da verificação da correcta fixação dos cabos, lingas ou outras amarras às cargas, do bom equilíbrio destas e da não existência de qualquer perigo para outros trabalhadores.

Recomendação. - Em caso de má sustenção de uma carga no decurso da sua elevação, o condutor deve accionar imediatamente o sinal avisador e pousar a carga, a fim de ser correctamente amarrada.

5 - No decurso da elevação, transporte horizontal e descida das cargas suspensas os sinaleiros devem dirigir a manobra de maneira que as cargas não esbarrem em qualquer objecto.

Recomendação. - Precauções idênticas se devem tomar relativamente às lingas suspensas e aos próprios ganchos quando os aparelhos de elevação funcionem em vazio.

6 - Os condutores dos aparelhos de elevação devem evitar, tanto quanto possível, transportar as cargas por cima dos trabalhadores e dos locais onde a sua eventual queda possa constituir perigo.

Recomendação. - Quando seja necessário deslocar, por cima dos locais de trabalho, cargas perigosas, tais como metal em fusão ou objectos presos a electroímanes, deve lançar-se um sinal de advertência eficaz, a fim de alertar os trabalhadores para abandonarem a zona perigosa.

Recomendação. - Os condutores dos aparelhos de elevação não os devem deixar sem vigilância quando estiver suspensa uma carga.»↩︎

25. Esse artigo 11.º, números 1 e 2 do aludido Decreto-Lei possui a seguinte redação[sublinhados a negrito da nossa responsabilidade]:

« Artigo 11.º

Sistemas de comando

1 - Os sistemas de comando de um equipamento de trabalho que tenham incidência sobre a segurança devem ser claramente visíveis e identificáveis e ter, se for caso disso, uma marcação apropriada.

2 - Salvo nos casos de reconhecida impossibilidade, os sistemas de comando devem ser colocados fora das zonas perigosas e de modo que o seu accionamento, nomeadamente por uma manobra não intencional, não possa ocasionar riscos suplementares.

3 - O operador deve poder certificar-se a partir do posto de comando principal da ausência de pessoas nas zonas perigosas ou, se tal não for possível, o arranque deve ser automaticamente precedido de um sistema de aviso seguro, nomeadamente de um sinal sonoro ou visual.

4 - Após o aviso previsto no número anterior, o trabalhador exposto deve dispor do tempo e, se necessário, dos meios indispensáveis para se afastar imediatamente da zona perigosa.

5 - Os sistemas de comando devem ser seguros e escolhidos tendo em conta as falhas, perturbações e limitações previsíveis na utilização para que foram projectados.»↩︎

26. Este diploma legal, conforme referido no seu artigo 2.º. procede à transposição de diversas Diretivas Comunitárias, destacando-se aquela referida no seu número 1:

«1 - A presente lei transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 89/391/CEE, do Conselho, de 12 de junho, relativa à aplicação de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde dos trabalhadores no trabalho, alterada pelo Regulamento (CE) n.º 1882/2003, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de setembro, pela Diretiva n.º 2007/30/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho, e pelo Regulamento (CE) n.º 1137/2008, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro.»↩︎

27. Seguindo-se aqui o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência deste STJ, prolatado em 17/4/2024, relatado pelo Juiz-Conselheiro Júlio Gomes e publicado em www.dgsi.pt:

«Para que se possa imputar o acidente e suas consequências danosas à violação culposa das regras de segurança pelo empregador ou por uma qualquer das pessoas mencionadas no artigo 18.º, n.º 1 da LAT, é necessário apurar se nas circunstâncias do caso concreto tal violação se traduziu em um aumento da probabilidade de ocorrência do acidente, tal como ele efetivamente veio a verificar-se, embora não seja exigível a demonstração de que o acidente não teria ocorrido sem a referida violação».↩︎

28. Comando esse, aliás, que deveria ter uma cobertura de proteção, um travão ou um outro mecanismo de bloqueio, que impedisse o seu acionamento involuntário, como aconteceu nos autos [cf., aliás, número 5 do artigo 11.º do Decreto_lei n.º 50/2005, de 24/02, acima transcrito na Nota de Rodapé [25]]↩︎