Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 2.ª SECÇÃO | ||
Relator: | FERNANDO BAPTISTA | ||
Descritores: | RESPONSABILIDADE BANCÁRIA INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA DEVER DE INFORMAÇÃO VIOLAÇÃO PRESUNÇÃO DE CULPA ILICITUDE DANO NEXO DE CAUSALIDADE ÓNUS DA PROVA APLICAÇÃO FINANCEIRA VALORES MOBILIÁRIOS INSTITUIÇÃO BANCÁRIA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA | ||
Data do Acordão: | 11/30/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA | ||
Sumário : | I. No âmbito dos deveres impostos ao intermediário financeiro, destacam-se os deveres de informação, relativamente aos serviços que ofereça, lhe sejam solicitados ou que efectivamente preste, os quais deverão ser cumpridos através da prestação de “todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada”, sendo ilícita a informação a prestar pelo intermediário financeiro ao investidor não qualificado quando tem lugar a violação do dever de informação, com os seus requisitos indispensáveis: completude, veracidade, actualidade, clareza, objectividade e licitude. II. Para o preenchimento dos pressupostos da responsabilidade civil contratual, do intermediário financeiro, impõe-se a prova: do facto ilícito (omissão ou prestação de informação errónea pelo intermediário financeiro); da culpa (que se presume); do dano (perda do capital entregue para a subscrição do produto financeiro); e do nexo de causalidade entre o facto e o dano, incidindo sobre o investidor o ónus da prova desse nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano. III. Tendo o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça, lavrado no processo n.º 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A, produzido jurisprudência no sentido de que “ (…). 4. Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir” , e resultando não provado “Que se a Autora tivesse conhecimento que aquele produto” – obrigações SLN 2006, que comprara – “não era do banco, não tinha capital garantido, nem poderia ser mobilizado a todo o tempo, nunca teria dado ordem para a sua subscrição.”, não pode considerar-se estabelecido o nexo de causalidade entre o facto e o respectivo resultado danoso. IV. E daí que falte o pressuposto da obrigação de indemnização a que alude o art.º 563.º do Código Civil. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, Segunda Secção Cível I – RELATÓRIO
AA, residente na Rua ..., lugar de ..., ..., comarca ..., intentou acção declarativa sob a forma de processo comum contra BANCO BIC PORTUGUÊS, S.A., deduzindo o seguinte petitório: - ser o Réu condenado a restituir e a pagar à Autora a quantia de € 55.897,81 (cinquenta e cinco mil oitocentos e noventa e sete euros e oitenta e um cêntimo), acrescida de juros à taxa supletiva legal para as operações comerciais, contados sobre a quantia de €50.000,00 (cinquenta mil euros), desde a citação e até integral e efectivo pagamento, bem como em custas e em procuradoria condigna[1]. Citado, o Réu, veio o contestar, invocando: > A ineptidão da petição inicial por ininteligibilidade da causa de pedir; > A prescrição do direito da Autora, por já ter decorrido o prazo de 2 anos a contar do conhecimento da conclusão da operação de transacção por parte do intermediário financeiro; > A excepção peremptória de abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium; E impugnando, aduziu, em súmula, que: > As Obrigações SLN 2006 foram emitidas, como o próprio nome indica, pela SLN, SGPS, S.A., sociedade que era titular de 100% do capital social do Banco-R.; > Participação que deteve de forma permanente até Novembro de 2008, altura em que foi nacionalizada; > Vale isto por dizer que já qualquer obrigação é tendencialmente um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente, com garantia de capital, no sentido de que o seu valor de reembolso não sofre variações de natureza especulativa ou sequer que resultem de qualquer tipo de negociação; > E cujo único risco é o risco geral do incumprimento, existente em todos os contratos; > A esta segurança acrescia, no caso concreto, o facto de a entidade emitente ser “mãe” do Banco, sendo este necessariamente, um garante da solvabilidade daquela, por ser o principal activo do seu património; > Pelo que dificilmente haveria um produto financeiro tão seguro ou conservador como a subscrição daquelas obrigações; > Tal produto era efectivamente seguro e de baixíssimo risco, tendo o incumprimento acabado por ser determinado por circunstâncias imprevisíveis e anormais; > À data da subscrição, mesmo uma situação de insolvência da SLN implicaria, necessariamente, uma prévia insolvência do próprio Banco, por ser um seu activo ; > Pelo que, também por aqui, o risco da aplicação era semelhante ao de um depósito bancário no próprio Banco ; > Sendo que nenhuma informação falsa foi transmitida à Autora; > O produto era conservador e de risco equivalente ao do próprio Banco, pelo que encaixava perfeitamente no perfil de investidor da Autora; > O gestor explicou à Autora a natureza do produto, que a sociedade emitente era a sociedade-mãe do Banco, pelo que se tratava de um produto naturalmente seguro, com um nível de risco equivalente ao do próprio Banco; > As condições do produto foram-lhe explicadas, acompanhadas da respectiva nota técnica, o que a Autora compreendeu de forma exaustiv ; > Tendo dado ordem expressa para a subscrição dos ditos instrumentos financeiros; > Ademais, nunca a Ré disse á Autora que o Banco garantiria fosse o que fosse quanto ao cumprimento ou incumprimento das obrigações da SLN. Conclui, no sentido da improcedência da acção e, por tal via, pela sua consequente absolvição do pedido.
Por despacho de fls. 118 e 119, datado de 20/03/2017, nos termos dos artigos 3º, nº. 3 e 6º, ambos do Cód. de Processo Civil, determinou-se a notificação da Autora para se pronunciar, querendo, no prazo de 10 dias, sobre as excepções arguidas na contestação. Notificada, veio a Autora pronunciar-se sobre as excepções deduzidas - cf., fls. 122 a 125 -, negando a existência de nulidade principal por ineptidão da petição inicial, que existe dolo ou culpa grave na actuação do Réu, pelo que o prazo prescricional é de 20 anos, nos termos do artº. 309º, do Cód. Civil e negando a existência de qualquer abuso de direito Conclui, pela improcedência das excepções deduzidas, devendo os autos prosseguir os seus ulteriores trâmites.
Fixado o valor da causa e dispensada a realização de audiência prévia, foi indeferida a suscitada nulidade principal por ineptidão da petição inicial, saneados os autos, relegada para final o conhecimento da excepção peremptória de prescrição e fixados o objecto de litígio e os temas de prova. Foram, ainda, apreciados os requerimentos probatórios e designada data para a audiência final.
Foi realizada a audiência de julgamento, conforme resulta da acta de fls. 155 e 156, com observância do formalismo legal, após o que foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, decido julgar improcedente a acção e, consequentemente absolvo a ré do pedido formulado pela Autora. Custas pelos AA. Notifique e registe”.
Inconformada com o decidido, a Autora interpôs recurso de apelação, em 16/10/2017, por referência à decisão prolatada. Conforme Acórdão da Relação de Lisboa, datado de 07/02/2019 - cf., fls. 374 a 425 -, foi decidido: 1. «determinar a ampliação da matéria factual apurada, no que concerne ao ponto factual alegado no artº. 71º da petição inicial, na parte em que refere que a Autora, caso se lhe tivesse sido mostrado e explicado o conteúdo da nota informativa respeitante ao produto financeiro em apreço (ou mesmo da informação existente a nível interno, mencionada no facto 15.), nomeadamente no que se refere à Subordinação do produto financeiro proposto, não teria efectuado o investimento naquela Obrigação; 2. consequentemente, determinar, nos termos do artº. 662º, nº. 2, alín. c) e 3, alín c), do Cód. de Processo Civil, a anulação da sentença recorrida/apelada, devendo o julgamento a efectuar cingir-se apenas à produção probatória citada, sem prejuízo “da apreciação de outros pontos da matéria de facto, com o fim de evitar contradições”; 3. após, deverá ser prolatada nova sentença, na qual deverá figurar resposta à matéria factual omitida; 4. em considerar, atento o supra exposto e, pelo menos, por ora, ocorrer prejudicialidade no conhecimento das demais questões objecto da presente apelação; …». * Cumprido o determinado, foi designada nova data para a audiência final, após a qual foi prolatada nova sentença, com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, decido julgar improcedente a acção e, consequentemente absolvo a ré do pedido formulado pela Autora. Custas pelos AA. Notifique e registe”.
Novamente inconformada com o decidido, a Autora interpôs recurso de apelação, por referência à decisão prolatada, vindo, a final, por Acórdão da Relação de Lisboa, datado de 27 de Maio de 2021, a ser decidido: 1. «julgar totalmente improcedente o recurso interposto ; 2. confirmar, ainda que com argumentação não totalmente coincidente, o juízo absolutório feito constar na sentença recorrida/apelada»[2]. ** Mais uma vez inconformada, veio a Autora AA interpor recurso de revista ordinário, apresentando alegações que remata com as seguintes CONCLUSÕES: « B. O Venerando Tribunal da Relação de Lisboa fez uma errada interpretação e aplicação da lei. C. A prolação do douto acórdão recorrido vai contra a jurisprudência constante e quase uniforme do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa e até do Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, bem como deste Colendo Tribunal. D. É um facto notório, de conhecimento geral e, necessariamente, de conhecimento judicial, a forma como o Banco réu comercializava as obrigações SLN aos seus balcões. à forma como eram comercializadas as obrigações SLN aos balcões do Banco réu, originada pela situação financeira que a mesma então atravessava. E. Tanto o Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, como o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, ora recorrido, prolataram, entre muitos outros, em sentido completamente oposto ao agora professado, em causas da mesma natureza e basicamente com os mesmos intervenientes (de um lado, lesados pela venda de obrigações da SLN aos balcões do BPN e do outro o ora réu e recorrido, o Banco BIC), um grande conjunto de acórdãos. F. Em todos eles se discute a mesma questão fundamental de direito: aquilatar da existência do nexo de causalidade entre a conduta do Banco e o prejuízo sofrido pela autora, ora recorrente. G. Sendo certo que não existem processos ou «casos» iguais, neles assomando diversas realidades e uma multiplicidade de questões de facto e de direito, certo é também que é já um facto conhecido do público em geral a situação económica e financeira da SLN aquando da subscrição das obrigações SLN Rendimento Mais 2004 e SLN 2006 e o modus operandi utilizado pelo Banco réu para as comercializar, aos seus balcões. H. Independentemente de estarem em causa, do lado ativo, diferentes sujeitos e de serem diversos os factos alegados em cada caso já levado a tribunal, ou até da variedade de factos provados e não provados, em função quer dos meios de prova apresentados, quer da diversidade de tribunais que os apreciam em diversas circunscrições e instâncias judiciais, o certo é que todos eles se reportam à forma como eram comercializadas as obrigações SLN aos balcões do Banco réu, originada pela situação financeira que a mesma então atravessava - tal facto é um facto notório, de conhecimento geral e, necessariamente, de conhecimento judicial. I. A representação, razoavelmente feita pela autora, de que o produto financeiro era seguro, com risco igual ao do Banco réu, e que poderia ser resgatado a qualquer altura, resultou de falsa informação prestada pelo Banco réu, que violou o dever de informação leal e verdadeira, não correspondendo aos ditames da boa-fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência, assinalados no n.º 1 do artigo 304.º do C.V.M.. J. No caso dos autos, foi omitida relevante informação que os factos demonstraram ser crucial: o produto não era seguro, nem o Banco réu, ante a insolvência da SLN, reembolsou a autora, que perdeu o valor investido, o que exprime o prejuízo sofrido de €50.000,00. K. A alínea h) dos factos não provados, deveria ter ficado a constar dos factos provados, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 607.º do CPC. L. Como se retira do depoimento das testemunhas BB; CC e DD, se não foi mostrada à autora a nota informativa do produto em causa, se não lhe foi sequer falado em obrigação, se não lhe foi explicada a característica da subordinação, se lhe foi dito que o Banco era o responsável pela emissão daquele produto, se o mesmo lhe foi apresentado como um produto do Banco, semelhante a um depósito a prazo, se a autora, como os demais clientes do Banco réu, acabou por aceitar e subscrever tal produto porque acreditava e confiava plenamente nos funcionários do Banco réu que a aconselhavam quanto ao melhor destino a dar ás suas poupanças, se tudo foi feito praticamente “ás cegas”, com base nessa mesma confiança, será de concluir que a autora nunca aceitaria fazer tal subscrição se as verdadeiras características do produto em causa lhe fossem mostradas e devidamente explicadas. M. E ainda que à data da subscrição não se previsse a possibilidade de ocorrer a insolvência da entidade emitente, que nunca sequer se tivesse falado em insolvência de Bancos ou de outras instituições financeiras, se acreditasse que tanto o Banco réu como a sua dona eram, de facto, entidades seguras, ainda assim não se pode de boa-fé concluir que a autora foi devida e convenientemente informada pelo Banco réu (como devia) e que a característica da subordinação da obrigação dos autos era de somenos importância para a sua tomada de decisão. N. Só quando uma pessoa é cabalmente esclarecida e informada sobre as características do produto que lhe é proposto subscrever, advertida dos riscos e dos benefícios que tal produto lhe poderá trazer, é que se poderá dar por devidamente informada nos termos previstos no artigo 312.º do CVM. O. A característica da subordinação não era de somenos importância, mas de importância crucial para a aquisição daquele tipo de produto financeiro. P. Uma coisa é adquirir-se um produto com risco Banco, que seria pago pelo Banco, com quem, no fundo, se estava (ou pensava estar) a contratar; outra é adquirir-se um produto de uma entidade que, na altura, nem se sabia bem o que era; uma coisa é adquirir-se um produto com um risco semelhante a um depósito a prazo, julgando-se estar sempre garantido pelo Banco; outra é adquirir-se um produto de uma entidade que se desconhece e que, ainda que seja muito pouco provável a sua insolvência, que até à data nunca sequer se tenha cogitado tal hipótese, se tal vier a acontecer, ainda que por mera suposição, só se receberá alguma coisa depois de todos os credores comuns terem recebido a totalidade dos seus créditos. Q. Uma coisa é julgar estar a adquirir-se um produto efetivamente seguro e garantido pelo próprio Banco, outra é adquirir-se um produto que, afinal, de seguro nada tem e que existe sempre um risco, ainda que longínquo, de se perder nele as poupanças de uma vida. R. O tribunal recorrido deveria, pois, ter dado por provado que caso à autora tivesse sido mostrado e explicado o conteúdo da nota informativa respeitante ao produto financeiro em apreço (ou mesmo da informação existente a nível interno mencionada no facto 15.), nomeadamente no que se refere à Subordinação do produto financeiro proposto, a autora não teria efetuado o investimento naquela Obrigação. S. E não está vedado legalmente ao Supremo verificar se o uso de presunções judiciais pelo Tribunal da Relação ofende qualquer norma legal, se padece de alguma ilogicidade ou se parte de factos não provados. T. O tribunal recorrido violou as mais elementares regras na apreciação e valoração das provas. U. Os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados aqualquer pessoa em consequência da violação de deveres respeitantes ao exercício da sua atividade. A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação. V. A relação contratual obrigacional que se estabelece entre o cliente e o intermediário financeiro exige deste um elevado padrão de conduta, com lealdade e rigor informativo pré-contratual e contratual: informação completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita, tendo em conta que, entre clientes não qualificados, a avaliação do risco não é tão informada quanto a contraparte. W. O não cumprimento dos deveres de informação é sancionado, no quadro da responsabilidade civil contratual, impendendo sobre o intermediário financeiro ou Banco, que age nessa veste, presunção de culpa, nos termos do art. 799.º, n.º 1 do Código Civil, sendo claro o n.º 2 do art. 304.º-A do C.V.M. quando estatui – “A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito das relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado por violação de deveres de informação”. X. Na presença de um acordo entre o banqueiro e o seu cliente, a falta do resultado normativamente prefigurado implica presunções de culpa, de ilicitude e de causalidade. Assim, numa situação de tipo obrigacional, a mera falta de informação do beneficiário responsabiliza, automaticamente, o obrigado. Y. Pese embora a comercialização de produto financeiro com informação de ter capital garantido responsabilize em primeira linha a entidade emitente do produto, não significa que essa responsabilidade não se estenda também ao intermediário financeiro se, no relacionamento contratual que desenvolve com o cliente, assumir, em nome desse relacionamento contratual, também o reembolso do capital investido. Z. Tendo o Banco réu violado o dever de prestar à autora a informação completa, leal e diligente – que os seus deveres profissionais impunham – é ele responsável pela obrigação de indemnizar o prejuízo causado; não só o réu não ilidiu a presunção de culpa que sobre si impendia, como ficou plenamente demonstrada nos autos a sua culpa efetiva. AA. Existindo ilicitude, culpa e dano, consubstanciado este na não recuperação do valor investido que, afinal, não foi garantido pelo Banco, bem como o nexo de causalidade entre a atuação culposa e inadimplente do Banco réu, estão preenchidos os requisitos da obrigação de indemnizar, nos termos do disposto no artigo 483.º, n.º 1 do C.C.. BB. A decisão agora posta em crise, para além de consubstanciar uma flagrante injustiça, procede a uma autêntica lavagem, se não mesmo derrogação, do regime da responsabilidade do intermediário financeiro. CC. Perante a incontroversa omissão de um dever informativo, cabe ao Banco algum esforço probatório demonstrativo da irrelevância de tal omissão na produção dos danos sofridos pelo credor. DD. De outro modo, alimentar-se-ia uma lógica perversa de transferência do risco do negócio do próprio Banco para terceiros a ele alheios; à margem de qualquer vontade livre e esclarecida, situação que o legislador de todo não visou. EE. O legislador não visou a instalação da indiferença perante a observância ou a inobservância dos deveres contratuais do Banco. FF. Na prática, a decisão recorrida alimenta uma lógica perversa de transferência do risco do negócio do próprio Banco para os clientes, investidores não qualificados, e instala a indiferença perante a observância ou a inobservância dos deveres contratuais do Banco. GG. O ónus probatório deve ser distribuído, não por causa da função que os factos desempenham no processo, mas antes em função do conceito de prova mais fácil, atribuindo-o, especificamente, à parte que está casuisticamente em posição mais favorável de o demonstrar. HH. Este entendimento faz todo o sentido, uma vez que só deste modo, se estimula a efetiva produção de prova e a procura da verdade material, onerando a parte com maior facilidade probatória, bem como se promove a igualdade material entre as partes, dando a ambas maior igualdade na possibilidade de fazerem valer a posição em juízo. II. De facto, a parte com maior facilidade probatória pode sempre demonstrar a versão do facto que lhe aproveita e a parte contrária, apesar de ter menor facilidade em provar, pode sempre beneficiar de uma decisão de ónus da prova, caso a outra parte não consiga realizar a prova. JJ. No plano de direito substantivo, só desta forma será possível repor a equivalência subjetiva entre a prestação e a contraprestação contratualmente fixada pelas partes. KK. Por sua vez, no plano do direito adjetivo, só deste modo será possível garantir a prossecução do princípio da efetividade, do dever de verdade processual e da justa composição do litígio em prazo razoável, enquanto corolários do princípio da celeridade e da economia processuais. LL. Cabe ao investidor lesado em virtude do incumprimento de um dever de informação por parte do intermediário financeiro, demonstrar a existência desse dever, enquanto sobre o intermediário financeiro recai o ónus da prova de que cumpriu cabalmente o dever de informar, de acordo com os padrões enunciados nos artigos 7.º e 312.º do CVM. MM. O Venerando Tribunal da Relação de Lisboa violou as regras da apreciação de prova, ao não impor ao Banco recorrido, intermediário financeiro, o ónus da prova. NN. De facto, o tribunal recorrido deixou de extrair dos factos apurados as presunções impostas por lei, como impõe o n.º 4 do artigo 606.º do C.P.C.. OO. O douto acórdão recorrido, contornando ostensivamente factos notórios vem passar uma esponja e branquear todo um conjunto de crimes perpetrados pelo falecido EE e companhia. PP. A informação prestada pelo Banco/réu, reportada à data em que foi prestada, no que respeita à venda das obrigações da SLN, não era completa, verdadeira, clara nem objetiva, em virtude de já em 2006 a situação do grupo SLN/BPN se encontrar em rutura financeira e os elementos económico-financeiros que apresentavam e serviram de base para a subscrição da emissão de obrigações da SLN eram falsos, estarem viciados e não traduzirem a verdadeira situação económico-financeira do grupo SLN/BPN. QQ. O impacto da realidade informal, a sua inclusão nas contas da SLN, implicavam capitais próprios negativos, ou seja, o grupo estava tecnicamente falido na data em que foi emitida a obrigação dos autos. RR. As condenações nos processos n.º 121/08.... e n.º 4.910/08.... demonstram cabalmente que afinal não foi a crise financeira do SUB PRIME que esteve na origem na rutura e no buraco financeiro do grupo SLN/BPN, pelo que não se pode afastar a existência do nexo de causalidade entre o dano sofrido pela autora e a conduta ilícita do Banco réu. SS. Dever-se-á presumir a existência de nexo de causalidade entre a ilicitude figurada pela inobservância dos deveres contratuais, nomeadamente, pela violação dos deveres (acessórios) de informação por parte do Banco e o dano sofrido pela cliente pela falta de reembolso do capital e dos juros na data acordada. TT. Num caso como o dos autos (em que temos de um lado um Banco que exerce a intermediação financeira com profissionalidade e, do outro, uma cliente, investidora não qualificada), as partes, atentos os interesses em jogo e a respetiva condição, não podem ser colocadas em igualdade de posições, no que tange ao esforço probatório de cada uma. UU. No caso sub judice, é evidente e cristalino e ressalta à vista o nexo de causalidade entre a conduta ilícita do réu e o prejuízo sofrido pela autora. VV. O douto acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 9.º, n.º 2; 341º, 342.º, n.º 1; 344.º, 349º, 483.º, n.º 1; 563.º e 799.º do Código Civil, nos artigos 304.º-A; 306.º, 309.º, 310.º, 312.º e 314.º, n.º 1 do CVM e 607.º, n.ºs 3, 4 e 5, 640º, e 662º, nº1, do C.P.C.. Nestes termos, deverão V. Exas julgar procedente o presente recurso e revogar o douto acórdão recorrido, substituindo-o por outro que julgue a ação totalmente procedente, com o que farão, como é timbre deste Colendo Tribunal, como sempre, inteira JUSTIÇA! * Não foram apresentadas contra-alegações. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir. ** II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Nada obsta à apreciação do mérito da revista. Com efeito, a situação tributária mostra-se regularizada, o requerimento de interposição do recurso mostra-se tempestivo (artigos 638º e 139º do CPC) e foi apresentado por quem tem legitimidade para o efeito (art.º 631º do CPC) e se encontra devidamente patrocinado (art.º 40º do CPC). Para além de que tal requerimento está devidamente instruído com alegação e conclusões (art.º 639º do CPC). * Considerando que o objecto do recurso (o “thema decidendum”) é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, atento o estatuído nas disposições conjugadas dos artigos 663º nº 2, 608º nº 2, 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (CPC), as questões a decidir consistem em saber:
** III – FUNDAMENTAÇÃO III. 1. FACTOS PROVADOS ■ É a seguinte a matéria de facto provada (fixada na Relação, após decisão da impugnação da matéria de facto – figuram a negrito os factos objecto de alteração, bem como os factos aditados, pela Relação, nos termos do artº. 607º, nºs. 4 e 5, ex vi do nº. 2, do artº. 663º e 662º, nº. 1, todos do Cód. de Processo Civil): 1. O Banco réu girava anteriormente sob a denominação “BPN - Banco Português de Negócios, S.A.” -cf. certidão junta a fls. 19 vº a 37; 2. Até à nacionalização do “BPN - Banco Português de Negócios, S.A.”(com a Lei nº 62-A/2008, de 11/11) a totalidade do capital social do Banco era detida, na íntegra, pela sociedade “BPN, SGPS, S.A.”, a qual, por sua vez, era detida, também na íntegra, pela sociedade então denominada “SLN - Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.”. - cf. certidão de fls. 38 a 52 e 52 vº a 57; 3. A autora é há cerca de 15 anos, cliente do Banco réu, através da agência de ...; 4. Pela “SLN - Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.”, foi decidido emitir 1000 obrigações subordinadas a 10 anos, denominadas “SLN 2006”, por “emissão de 1.000 obrigações subordinadas, no valor nominal de 50.000€ cada, por dez anos, em 08/05/2016, nos termos da nota informativa junta a fls. 63 vº a 79 vº, cujo teor se reproduz; 5. Nos termos da nota informativa referida refere-se quanto a juros do 1º cupão 4,5%, e os 9 cupões seguintes TANB Euribor 6 meses + 1,5%, e como capital garantido, transaccionáveis fora de bolsa, bem como a natureza de obrigações subordinadas, com possibilidade de “call option” a partir do 5º ano - cf. fls, 65 a 67; 6. A autora tinha, no Banco réu, em Maio de 2006, valores em depósito no valor de 40.000€ e de 10.000€, por transferências ocorridas entre Abril e Maio desse mesmo ano - cf. fls. 87 vº e 88 cujo teor se reproduz; 7. A A. era considerada conservadora nas aplicações financeiras que possuía no Banco réu, avessa ao risco e tendo no mesmo essencialmente depósitos bancários; 7-A. em Maio de 2006, a Autora não tinha realizado no Banco Réu quaisquer operações de volume significativo nos mercados de valores mobiliários, com a frequência média de, pelo menos, 10 operações por trimestre ao longo dos últimos 4 trimestres, nem tinha uma carteira de valores mobiliários de montante superior a €500.000,00, nem tinha, por último, prestado funções, pelo menos durante 1 ano, no sector financeiro, numa posição profissional em que seja exigível o conhecimento do investimento em valores mobiliários ; 7-B. a Autora é licenciada em economia ou gestão de empresas, desempenhando, em ... de 2006, as funções de Directora Financeira numa empresa; 8. A Autora foi contactada em Abril de 2006, por um funcionário do Balcão onde a A. tinha conta, dizendo-lhe que estava a ser lançado um novo produto financeiro, com a natureza de Obrigação, de características similares às de um depósito a prazo, só que melhor remunerado, com capital garantido; 9. Mais referiu que, atentas as características do produto, o mesmo estava a ter uma procura enorme junto dos clientes do Banco; 10. À A. foi dito que tal produto era semelhante a um depósito a prazo; 11. Os funcionários do balcão onde a autora tinha depositadas as suas quantias acreditavam que os produtos que vendiam eram seguros e que não ofereciam risco para os subscritores; 12. A A. autorizou tal operação verbalmente, tendo procedido à compra de “PTSLNRMais2E” no dia 08/05/2006 e no valor de 50.000€; 13. O funcionário do banco explicou ainda à A. que podia proceder ao resgate do valor em causa, desde que transmitisse as obrigações, por endosso a terceiros, e se o fizesse antecipadamente perderia apenas os juros; 14. Foi ainda dito à autora que o produto financeiro adquirido era um produto seguro e emitido pela dona do banco, a SLN; 14.-A. Nunca tendo sido transmitido à Autora que a Obrigação descrita em 8. tinha natureza subordinada; 15. A nível interno existia ainda uma informação cuja cópia se encontra junta a fls. 97 a 101 e cujo teor se reproduz, que servia de base à explicação dada aos clientes, mas cuja cópia não era dada, salvo se o cliente a solicitasse; 15.-A. Tal informação, bem como a nota informativa descrita em 4. e 5., nunca foram mostradas à Autora, nem lhe foi entregue cópia das mesmas; 16. O título em causa encontra-se indicado nos extractos emitidos pela Ré à Autora como pertencendo ao item “carteira de títulos”, onde figuravam “Obrigações EUR” e SLN2006, no valor de 50.000€, encontrando-se a mesma depositada no banco - cf. doc. de fls. 88 vº cujo teor se reproduz; 17. Os juros contratados na aquisição efectuada nos autos foram pagos até 2015 pela Galilei, através do banco réu (artº 77º da pi); 18. A “SLN - Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.”, hoje denominada “Galilei, SGPS, S.A.” apresentou, no Tribunal da Comarca de Lisboa, um Processo Especial de Revitalização, o qual corre seus termos pela ... Secção de Comércio - J4, com o número 22922/15...., tendo sido logo proferido o despacho e sido proferida sentença que, declarando encerrado o processo negocial, sem aprovação do Plano de Recuperação, determinou o encerramento do Processo de Revitalização - cf. doc. de fls. 90 a 92 vº; 19. Por sentença de 29/06/2016, proferida pelo Tribunal da Comarca de Lisboa, ... Secção de Comércio-J4, no âmbito do processo número 23449/15.... foi a sociedade “Galilei, SGPS, S.A.” declarada insolvente - cf. fls. 93 e 93 vº; 20. A «SLN - Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.», presentemente denominada «Galilei, SGPS, S.A.», não pagou a obrigação identificada em 12. na data do seu vencimento. ** ■ E são os seguintes os factos considerados não provados – após a decisão, pela Relação, da impugnação da matéria de facto ali havida, figurando a negrito os factos objecto de alteração e aditamento pela Relação: a) Que tenham sido dadas instruções aos funcionários do Banco para não entregarem aos clientes, potenciais ou efectivos subscritores das obrigações, as notas informativas das obrigações em causa, ou para nem sequer mostrarem tal nota informativa aos clientes ; b) Que a venda das obrigações foi determinada pela auditoria às contas do Banco réu, e a ordem do Banco de Portugal para que este reforçasse os seus capitais próprios; c) Que à A. tenha sido afiançado pelos funcionários do mesmo que o retorno das quantias em questão era garantido pelo próprio Banco (mas sim o provado em 13. e 14.); d) Que a A. é uma pessoa com elevado espírito de trabalho e de poupança (artº 54º da pi); e) que tenha sido dito à Autora, aquando da aquisição descrita de 8. a 12., que a f) Que os funcionários do banco réu, a partir de 2008, tenham dito à A. para aguardar que brevemente teria o dinheiro (artº 76º da pi ); g) Que a A. tenha interpelado várias vezes o Banco e que este se tenha recusado a restituir a quantia “que lhe foi confiada” (arts 1140 da pi) ; h) “que a Autora, caso lhe tivesse sido mostrado e explicado o conteúdo da nota informativa respeitante ao produto financeiro em apreço (ou mesmo da informação existente a nível interno, mencionada no facto 15.), nomeadamente no que se refere à Subordinação do produto financeiro proposto, não teria efectuado o investimento naquela Obrigação” **
III. 2. DO MÉRITO DO RECURSO Analisemos, então, as questões suscitadas na revista.
· Da (re)apreciação da decisão da matéria de facto: se a Relação violou as regras da apreciação de prova, ao não incluir nos factos provados a alínea h) dos factos não provados[4]. Não vemos que a Relação tenha incorrido em qualquer violação das regras adjectivas (ou substantivas) atinentes à apreciação da prova. Antes de mais, deve lembrar-se à Recorrente que, mesmo que se retirasse dos factos não provados a dita al. h), ainda assim tal não bastava para a Autora levar de vencida a sua pretensão. É que, como abaixo se explicará, a mera violação dos deveres de informação pelo Intermediário Financeiro não implica uma presunção de causalidade. Pois que, em conformidade com o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça, proferido no proc. n.º 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A, o nexo causal tem de ser provado (com factos) e pelo Investidor. E, é claro, a prova do nexo causal não se bastaria com a prova do que consta da alínea dos factos não provados ora em crise, pois que a mesma respeita tão somente ao conhecimento da Autora sobre a natureza subordinada do produto financeiro que adquiriu. E o facto de desconhecer a natureza subordinada das obrigações não significa que se tivesse tal conhecimento deixaria de investir. * Sem embargo, não pode olvidar-se que no conspecto dos poderes do Supremo Tribunal em matéria de facto, temos como particularmente relevantes os seguintes normativos: O artº 674º do CPC (que reza: “1. A revista pode ter por fundamento: a) A violação da lei substantiva, que pode consistir tanto no erro de interpretação ou de aplicação como no erro de determinação da norma aplicável; b) A violação ou errada aplicação da lei de processo; c) As nulidades previstas nos artigos 615.ºe 666.º.” (…). 3. O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que lhe fixe a força de determinado meio de prova.”. E o artigo 682.º do CPC que, sob a epígrafe, a dispor: “Termos em que julga o tribunal de revista”, dispõe o nº 2 que “A decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada, salvo o caso excecional previsto no n.º 3 do artigo 674.”. Dos mesmos preceitos legais resulta, com toda a clareza, que os poderes do STJ, em sede de apreciação/alteração da matéria de facto, são muito restritos. Em regra, ao Supremo Tribunal de Justiça apenas está cometida a reapreciação de questões de direito (ut art. 682º, nº 1, do CPC), assim se distinguindo das instâncias encarregadas também da delimitação da matéria de facto e modificabilidade da decisão sobre tal matéria. Esta restrição, contudo, não é absoluta, como decorre da remissão que o nº 2 do referido art. 682º faz para o aludido art. 674º, nº 3, do NCPC, norma que atribui ao Supremo a competência para sindicar o desrespeito de lei no que concerne à violação de norma expressa que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova. Assim, portanto, só excepcionalmente o Supremo Tribunal de Justiça pode apreciar matéria de facto, ou seja: § Se tiver lugar a violação de direito probatório material por ofensa de disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova ou por ofensa de disposição expressa da lei que fixe a força de determinado meio de prova; § Se houver violação de direito probatório adjectivo[5], designadamente por mau uso que a Relação fez dos seus poderes de reapreciação da matéria de facto: pelo uso meramente formal dos poderes de reapreciação; pelo estabelecimento de presunções judiciais em oposição a norma legal, em oposição com os factos apurados ou com insuficiência dos mesmos, ou mediante patente ilogicidade; pela anulação de respostas em desconformidade com as regras processuais; § Se houver insuficiência da matéria de facto apurada para a correcta solução jurídica da causa[6]. Se se verificar contradição essencial na matéria de facto[7]. Ora, parece-nos evidente que nenhuma das apontadas situações se verifica, nomeadamente, não se constata ter a Relação, na reapreciação da matéria de facto que levou a cabo, ofendido disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência de um facto ou que fixe a forma de determinado meio de prova. Pelo contrário: o tribunal a quo levou a cabo a reapreciação da decisão de facto impugnada no âmbito da valoração da prova segundo a livre e prudente convicção do julgador, dentro dos limites do seu poder de cognição estipulados no artigo 662.º, n.º 1, do CPC, sendo tal reapreciação sustentada em análise crítica nos termos do disposto no artigo 607.º, n.º 4, 1.ª parte, e n.º 5, 1.ª parte, aplicável ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo Código. Assim, nos sobreditos termos, não pode este Supremo Tribunal sindicar essa reapreciação de facto operada pela Relação. Aliás, é justo referir que a relação, na sua análise da impugnação da decisão de facto, levou a cabo uma análise cuidada e bem fundamentada, ponderando todos os elementos probatórios carreados aos autos, não apenas, portanto, a prova testemunhal, mas também os documentos, aos quais deu o devido valor probatório em conformidade com a sua natureza (particular), a sua impugnação pela contraparte e a incidência das regras sobre o ónus da prova, tudo ponderado com serenidade e a devida profundidade. Em boa verdade, a recorrente limita-se a alegar que houve erro na apreciação das provas, mas sem procurar demonstrar o preenchimento de qualquer circunstância que preenchesse alguma das excepções previstas no referido atrº 674º, nº3 do CPC que permitissem a este Supremo Tribunal imiscuir-se na reapreciação da decisão de facto operada pela Relação. Não basta, para fundamentar o recurso de revista no que tange à matéria de facto, a alegação vaga de que o Tribunal a quo interpretou erradamente a matéria de facto. Como já em tempos idos sublinhava este STJ, no acórdão de 17-03-1993, disponível em www.dgsi.pt “Exceptuando o caso de ter havido "ofensa duma disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova", é vedado ao Supremo Tribunal apreciar se o Tribunal da Relação errou ou acertou na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa- artigos 722, n. 2 e 729, n. 2 Código de Processo Civil.”[8]. Assim, tal como entendeu o (mais recente) aresto deste STJ (acórdão de 27/09/2018)[9] disponível em www.ecli.pt, “A recorrente não imputa ao Acórdão a violação de lei adjectiva ou a ofensa a disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova ou que fixe o valor de determinado meio de prova, pelo que entendemos estar afastada a intervenção deste Supremo Tribunal de Justiça que, como já se deixou dito, não pode interferir na decisão da matéria de facto, por ser da exclusiva competência das instâncias.”[10]. Como acima foi observado, o que na impugnação da matéria de facto, deduzida nesta Revista, está em causa é, apenas e só, saber se deveria (ou não) ser levado à factualidade provada o teor da al. h) dos factos não provados. E para tal, socorre-se a Recorrente, designadamente das presunções judiciais, entendendo que com recurso a elas este Supremo Tribunal chegará à alteração daquela matéria de facto. Bom, não vemos que a Relação tenha incorrido em qualquer ilogicidade – e, como tal, que este Supremo Tribunal possa, ou deva, alterar a decisão de facto recorrendo a presunções judiciais. Sobre o recurso às presunções judiciais, a posição deste STJ está consolidada. Veja-se, designadamente: “V - Cabe nos poderes da Relação alterar a decisão fáctica proferida na l.ª instância, extraindo ilações em matéria de facto, induzindo, a partir dos factos provados, mediante raciocínios lógicos sobre conhecimentos radicados na experiência comum e na normalidade da vida, a existência de factos desconhecidos, que poderiam ser adquiridos nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal (arts. 351.º e 396.º do CC, e 607.º, n.º 5, do CPC)” (proc. 23-02-2021 - Revista n.º 2445/12.4TBPDL.L1.S1). “IV - Na medida em que o juízo presuntivo consubstancia um julgamento da matéria de facto, encontra-se, …, o STJ impedido de apurar a extracção da presunção judicial pela Relação, excepto nos casos de violação de lei e das normas disciplinadoras do instituto, designadamente, sempre que ocorra ilogicidade e/ou a alteração da factualidade adquirida processualmente, ou seja, quando a presunção parta de factos não provados” (Ac. do TJ de 14-01-2021 - Revista n.º 2342/15.1T8CBR.C1.S1). “II - A possível intervenção do STJ no campo das presunções judiciais situa-se ao nível da perscrutação de vícios na formação desse juízo indutivo. Se a presunção não for legalmente admitida (art. 351.º do CC), se partir de factos não provados (art. 349.º do CC) ou se padecer de evidente ilogicidade, o STJ pode invalidar o uso da presunção.” (ac. do STJ de 09-03-2021 - Revista n.º 9726/17.9T8CBR.C1.S1). “V - As presunções judiciais inserem-se no contexto do apuramento da matéria de facto, e daí que os factos tidos por demonstrados à luz delas não podem, em sede de recurso de revista, ser objeto de escrutínio por parte do STJ, exceto se houver violação de norma legal impositiva em matéria de meios de prova, ou se padecerem de ilogicidade ou partirem de factos não provados” (Ac. do STJ de 09-03-2021 - Revista n.º 850/14.0YRLSB.S3) E, como dito, não se vislumbra que a Relação, ao dar como não provado o facto aqui em questão, tivesse ofendido qualquer norma legal impositiva em matéria de meios de prova, ou tivesse feito uso indevido de presunção judicial, por ilogicidade ou servindo-se de factos não provados. E, como já observado, também não é pelo recurso a presunções judiciais que este Supremo Tribunal vai, in casu, alterar a resposta dada àquela al. h) dos factos não provados, levando-a à matéria factual provada como pretende a Recorrente, pois os factos dados como provados, por si só, não permitem concluir pela prova do teor daquela mesma alínea – até porque, como se verá da fundamentação apresentada pela Relação para responder a tal facto, nada permite concluir que o desconhecimento pela Autora do que se refere à Subordinação do produto financeiro proposto tivesse sido determinante da vontade de contratar. * Analisando a motivação apresentada pela Relação para considerar como não provada a matéria factual dessa alínea, vemos que o fez de forma perfeitamente lógica e racional, em perfeita sintonia com a prova produzida nos autos. Vejamos o que escreveu o acórdão recorrido. «Conforme a determinada, e já supra referenciada, ampliação da matéria de facto apuranda, foi aditado como objecto de prova o seguinte ponto factual: “caso à Autora tivesse sido mostrado e explicado o conteúdo da nota informativa respeitante ao produto financeiro em apreço (ou mesmo da informação existente a nível interno mencionada no facto 15.), nomeadamente no que se refere à Subordinação do produto financeiro proposto, não teria efectuado o investimento naquela Obrigação”. Ajuizando a prova produzida, entendeu a sentença apelada considerar tal ponto factual como não provado. Tal entendimento é questionado pela Autora Apelante, invocando, basicamente, o seguinte argumentário: (…). A sentença apelada fundamentou/motivou a resposta negativa a tal factualidade nos seguintes termos: (…). Decidindo: Relativamente à matéria factual aditada foram inquiridas duas testemunhas, arroladas pela Autora, tendo-se procedido à devida audição dos seus depoimentos, os quais se encontram fielmente transcritos, conforme teor de fls. 609 a 617. Constata-se, basicamente, que tais testemunhas incidiram os seus depoimentos, basicamente, na natureza da Obrigação em equação, e na sua maior ou menor garantia, avaliada à data da sua venda, o que reiteraram e insistiram, mesmo após serem confrontados, por várias vezes, com a questão em apreciação. Assim, a testemunha BB, pessoa que procedeu à venda do produto comercial à Autora, fundou o seu depoimento, de forma insistente, na alegada garantia de que dispunha o produto e juro mais favorável associado, que não veio a confirmar-se. Mencionou ter assegurado à Autora que tal aplicação “era 100% garantida”, que era segura, que tinha uma “taxa de juro melhor, por causa do prazo” e que o que estava então em causa era se tal aplicação era “comparável com um depósito a prazo ou não”. E que o que esteve em causa em tal aplicação foi garantir ao “cliente que era uma aplicação segura e que a única coisa que podia ocorrer ou variar, porque eu não conseguia garantir, era a taxa de juro, porque estava indexada à Euribor”. Confrontado directamente com a pergunta em equação, a testemunha referenciou, desde logo, que naquela concreta situação a Autora não teria subscrito o produto, logo acrescentando que não o teria aconselhado, caso tivesse “conhecimento real, do produto, da situação que existe hoje, também não tinha, porque fui eu que aconselhei (...). Portanto, e eu na altura aconselhei-a, com base na garantia do produto”. Todavia, confrontado com a natureza da subordinação da Obrigação e articulação desta com a aludida garantia, acabou por mencionar que aquela característica da subordinação nada teria a ver com a garantia que reconhecia no produto Obrigação, e que o levou a sugeri-lo e a referenciá-lo como seguro» – o destaque é nosso, e fizemo-lo para percutir ou reiterar que o facto de as obrigações terem, ou não, natureza subordinada, não foi, de forma alguma, decisivo ou determinante da decisão de compra pela Autora. Daí o facto de não ser tão relevante para a questão da causalidade (abaixo tratada) o teor desta alínea que a recorrente pretende seja aditada aos factos provados: não se poderia dar como provado que a Autora não teria investido, apenas pelo facto de, eventualmente, desconhecer a natureza subordinada das obrigações. «Detalhou, inclusive, que na altura nem sequer sabiam o que era tal característica ou natureza da subordinação e, tendo-lhe sido novamente perguntado, e ressalvado, que estava apenas em equação o conhecimento da subordinação por parte da Autora, e não o facto do produto ser ou não seguro, acabou por referenciar não saber responder, pois nunca lhe fez tal abordagem - “Doutor, não sei não sei responder, porque eu não lhe expliquei isso”, e que “não expliquei, porque eu também não sabia na altura”. Acrescentou que na altura não se falava, nem era relevante, nem era questionável qualquer questão relacionada com insolvências ou falências de Bancos, situação que apelidou de impensável, sem ter logrado explicitar devidamente qual a correlação que foi sempre tentando fazer entre a subordinação e a segurança ou garantia associada ao produto. Por sua vez, a testemunha DD, bancário, que comercializou produto idêntico ao adquirido pela Autora, referenciou que na altura não tinham presente o conceito de subordinação e que tal questão nem sequer se colocava “para nós em termos de risco”, pois tal produto era vendido com naturalidade, ou seja, as Obrigações eram vendidas “como um produto seguro e nem nos passava pela cabeça que pudesse eventualmente ter algum risco associado”. Confrontado especificamente com a questão, e sem que alguma vez tivesse contacto com a Autora, referenciou que os seus clientes, caso soubessem de tal característica do produto Obrigações, não o teriam adquirido. Contudo, interpelado a concretizar a razão de ser de tal afirmação, referenciou que o conceito de um Banco poder ir à falência era questão que não se colocava, o mesmo acontecendo com a possibilidade de insolvência da dona do Banco. Acrescentou que a venda foi efectuada de forma natural, que não havia qualquer indício que algo pudesse correr mal e que a mesma venda foi efectuada sem “esse contexto negativo de eventuais riscos que poderiam correr”. Resulta dos depoimentos prestados terem estes sofrido clara mácula no declarado resultante da confusão efectuada pelas testemunhas entre o que entendiam configurar-se como uma aplicação segura e garantida e os ulteriores acontecimentos, que destituíram de solidez tais aplicações, resultante da insolvência da entidade emitente das Obrigações que, por sua vez, era a detentora da sociedade que, por sua vez, era titular da totalidade do capital social do Banco. Deste modo, o declarado pelas testemunhas relativamente á questionada decisão da Autora teve sempre por critério aferidor os ulteriores desenvolvimentos ocorridos com o produto financeiro em equação, e não propriamente uma avaliação reportada à data da subscrição da Obrigação. Ou seja, quando responderam afirmativamente ao questionado, o juízo subjacente à resposta foi determinado por aqueles acontecimentos que, como reconheceram, não tinham a mínima previsibilidade à data da subscrição, pois nem sequer era ponderado ou equacionado um quadro donde resultasse uma posterior insolvência da entidade emitente, sendo esta, por intermédio de uma outra sociedade, a proprietária da totalidade do capital social da entidade bancária. Donde, resultou claramente que a resposta conferida foi dada por influência daqueles acontecimentos supervenientes, e sem que lograssem propriamente aferir, ou mesmo realmente conhecer, acerca da concreta vontade e sentido de decisão da Autora, caso lhe tivesse sido transmitida a natureza Subordinada do produto financeiro proposto. Resultando, deste modo, a resposta mais de uma pressuposição do que seria a decisão de acordo com o conhecimento presente e na ponderação dos ulteriores desenvolvimentos quanto à situação da entidade emitente, e não tanto na avaliação de uma concreta situação, existente à data da subscrição, de acordo com a relevância, ou falta desta, que seria conferida àquela característica do produto, tendo em consideração o grau de fiabilidade associado à entidade emitente que, na prática, não o sendo, se confundiria com a instituição bancária. Por todo o exposto, afigura-se-nos não ter sido efectuada concreta e sólida prova acerca de tal factualidade, que, assim, deverá manter-se como não provada.»[11]. Não vemos, assim, censura a fazer à Relação, não se vislumbrando razões válidas para modificar a resposta dada no ac. Recorrido à matéria contida naquela al. h) da materialidade de facto considerada não provada, resposta que, com tal, se mantém.
Os contratos de intermediação financeira têm como objecto a prestação de serviços financeiros, podendo assumir diversas espécies, consoante o respectivo conteúdo (cf. Arts. 325.º, 335.º e 337.º do CVM [12]), mas todos assumem a natureza de um contrato de prestação de serviços ou de mandato, consoante a natureza da obrigação assumida pelo intermediário financeiro (um resultado ou actos jurídicos): art. 1154.º e 1157.º do Código Civil. E, dado que tais actos são praticados em nome do mandante, o mandato diz‑se mandato com representação, ao qual se aplicam as regras do instituto da representação (art. 1178.º, n.º 1, do CC). Temos, assim, que contrato de intermediação financeira encerra um negócio jurídico celebrado entre um intermediário financeiro e um cliente (investidor), relativo à prestação de actividades de intermediação financeira, enunciando-se, a propósito que, nos termos do n.º 1 do art.º 289.º do Código dos Valores Mobiliários, são actividades de intermediação financeira: a) Os serviços de investimento em valores mobiliários; b) Os serviços auxiliares dos serviços de investimento; c) A gestão de instituições de investimento colectivo e o exercício das funções de depositário dos valores mobiliários que integram o património dessas instituições, sublinhando, outrossim, que os serviços de investimento compreendem: a) A recepção e a transmissão de ordens por conta de outrem; b) A execução de ordens por conta de outrem; c) A gestão de carteiras por conta de outrem; d) A colocação em ofertas públicas de distribuição. O objectivo essencial da actividade de intermediação é o de propiciar decisões de investimento informadas, em ordem a defender o mercado e a prevenir a lesão dos interesses dos clientes, importando que ao nível dos deveres impostos ao intermediário financeiro, incluindo o banco para tal autorizado, se destacam os deveres de informação, expressos no Código dos Valores Mobiliários, relativamente aos serviços que ofereça, lhe sejam solicitados ou que efectivamente preste, os quais deverão ser cumpridos através da prestação de “todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada”, sendo que a informação a prestar pelo intermediário financeiro ao investidor não qualificado, será ilícita se ocorrer a violação do dever de informação, com os seus requisitos indispensáveis: completude, veracidade, actualidade, clareza, objectividade e licitude. * Não se questiona, n casu, a qualificação jurídica do Banco Réu - Banco BIC Português, S.A. - ou do seu antecessor BPN - Banco Português de Negócios, S.A. - como intermediários financeiros na venda ou comercialização, em 2006, das chamadas ‘Obrigações SLN 2006’ na óptica dos artºs 1º, nº 1, al. b); 289º, nº 1, al. a), e 290º, nº 1, al. a), todos do CVM, aprovado pelo Dec. Lei nº 486/99, de 13/11, na redação vigente em 2006 (DL nº 66/2004, de 24/03). E não parece haver qualquer dúvida de que o BPN, relativamente à Autora AA, levou a cabo actos de intermediação financeira (o BPN além de ser uma instituição de crédito, era também um intermediário financeiro, tratando da comercialização, aos seus balcões, nomeadamente, de obrigações da SLN, executando ordens de subscrição, que lhe foram transmitidas).
Atenta a data em que ocorreu a subscrição do produto pela Autora, são aplicáveis a essa actividade as normas constantes do Código de Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-lei n.º 486/99, de 13 de novembro, com as alterações que se seguiram, até à alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 52/2006, de 15 de Março, nos termos das regras de aplicação da lei no tempo contantes do artigo 12.º do Código Civil, sendo essa a versão do Código de Valores Mobiliários que doravante será aqui mencionada. Impõe-se, então, de seguida aferir se o Banco/Réu violou, quanto à Autora, os deveres que sobre si impendiam, enquanto intermediário financeiro, aquando da aquisição, por esta, do alegado e provado produto financeiro, e, consequentemente, apurar se o Banco/Réu responde pelo ressarcimento à Autora do aqui peticionado. Neste aspecto dos deveres de informação, importa salientar, desde logo, que a extensão e a profundidade da informação, a cargo do intermediário financeiro, devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente (princípio da proporcionalidade inversa), o que pressupõe o reconhecimento de que as exigências de informação variam em função do perfil do cliente a quem o serviço é prestado, assentando o cumprimento do dever de informação num princípio de proporcionalidade, o que, de resto, este Tribunal de recurso reconhece, e não questiona. Mas atentemos nos normativos legais que devem orientar os intermediários financeiros no exercício da respectiva actividade, nos deveres de informação, mormente os deveres comuns, e, de igual modo, nos preceitos legais respeitantes à responsabilidade civil dos intermediários financeiros, por danos causados a qualquer pessoa, em consequência da violação dos deveres respeitantes à organização e ao exercício da sua actividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública. Sobre estes aspectos gerais, deixamos aqui plasmado o que ficou dito no recentíssimo acórdão do STJ de 10.11., também relatado pelo ora relator, produzido no processo nº 2165/19.9T8LRA.C1.S1: «“O Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (R.G.I.CS.F. - DL 298/92, de 31/12, na redação vigente à data dos factos introduzida pelo DL n.º 252/2003, de 17/10) estabelece a regulação pública da atividade das instituições de crédito e instituições financeiras, contendo um conjunto de "Regras de Conduta" (no respetivo Título VI, Capítulo I), balizados com o seguinte dispositivo de ordem geral: "As instituições de crédito devem assegurar, em todas as atividades que exerçam, elevados níveis de competência técnica, garantindo que a sua organização empresarial funcione com os meios humanos e materiais adequados a assegurar condições apropriadas de qualidade e eficiência. " (cfr. art. 73.º). Sequencialmente, os artigos 74.º e 75.º, entre outros deveres de conduta, determinam que os administradores e os empregados das instituições de crédito devem proceder "com diligência, neutralidade, lealdade e discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados." e, obrigando a um elevado nível de competência técnica, que "devem proceder nas suas funções com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, de acordo com o princípio da repartição de riscos e da segurança das aplicações e ter em conta o interesse dos depositantes, dos investidores, dos demais credores e de todos os clientes em geral. " As regras de conduta previstas no referido R.G.I.C.S.F. traduzem-se claramente num código de conduta financeira. A Associação Portuguesa de Bancos elaborou em 1993 um "Código de Conduta", versando precisamente sobre intermediação de valores mobiliários. Entretanto surgiram outros códigos de conduta, designadamente os elaborados pela "Interbolsa – Sociedade Gestora de Sistemas de Liquidação e de Sistemas Centralizados de Valores Mobiliários, S.A.", "APFIPP - Associação Portuguesa de Fundos de Investimento, Pensões e Patrimónios", "APAF - Associação Portuguesa de Analistas Financeiros" e "Associação Portuguesa de Bancos". E já com os artigos 10.º-B e 10.º-C do Regulamento da CMVM n.º 3/2010 relativo aos "Deveres de Conduta e Qualificação Profissional dos Analistas Financeiros e Consultores para Investimento" vieram promover a elaboração de "códigos de conduta e ou deontológicos" tendentes a "(...) definir as políticas e procedimentos de atuação a ser respeitados no exercício da atividade de consultoria para investimento (...)." e necessariamente "(...) suscetíveis de proporcionar que as recomendações de investimento sejam emitidas com competência, independência e objetividade." Feito este enquadramento geral, vejamos agora mais de perto os deveres específicos dos intermediários financeiros, interpretados à luz do antecedente enquadramento: Há uma generalidade de princípios que as partes devem respeitar durante a negociação e execução dos contratos de intermediação financeira, desde logo os princípios do direito civil comum que são transportados para o âmbito comercial sem perder a sua força impositiva, em especial o princípio geral da boa-fé previsto respetivamente nos artigos 227.º e 762.º do Código Civil. Já no âmbito do CVM (sempre na redação vigente à data dos factos, como acima já referido), importa destacar as seguintes normas com relevo para o caso concreto em apreciação: Artigo 7.º (Qualidade da Informação) 1 - Deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita a informação respeitante a valores mobiliários, a ofertas públicas, a mercados de valores mobiliários, a atividades de intermediação e a emitentes que seja susceptível de influenciar as decisões dos investidores ou que seja prestada às entidades de supervisão e às entidades gestoras de mercados, de sistemas de liquidação e de sistemas centralizados de valores mobiliários. 2 - O disposto no número anterior aplica-se seja qual for o meio de divulgação e ainda que a informação seja inserida em conselho, recomendação, mensagem publicitária ou relatório de notação de risco. 3 - O requisito da completude da informação é aferido em função do meio utilizado, podendo, nas mensagens publicitárias, ser substituído por remissão para documento acessível aos destinatários. 4 - À publicidade relativa a valores mobiliários e a atividades reguladas neste Código é aplicável o regime geral da publicidade. Artigo 304.º (Princípios) 1 - Os intermediários financeiros devem orientar a sua atividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado. 2 - Nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência. 3 - Na medida do que for necessário para o cumprimento dos seus deveres, o intermediário financeiro deve informar-se sobre a situação financeira dos clientes, a sua experiência em matéria de investimentos e os objectivos que prosseguem através dos serviços a prestar. 4 - Os intermediários financeiros estão sujeitos ao dever de segredo profissional nos termos previstos para o segredo bancário, sem prejuízo das exceções previstas na lei, nomeadamente o cumprimento do disposto no artigo 382.º. 5 - Estes princípios e os deveres referidos nos artigos seguintes são aplicáveis aos titulares do órgão de administração do intermediário financeiro e às pessoas que efetivamente dirigem ou fiscalizam cada uma das atividades de intermediação. Artigo 312.º (Deveres de Informação) 1 - O intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efetivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, incluindo nomeadamente as respeitantes a: a) Riscos especiais envolvidos pelas operações a realizar; b) Qualquer interesse que o intermediário financeiro ou as pessoas que em nome dele agem tenham no serviço prestado ou a prestar; c) Existência ou inexistência de qualquer fundo de garantia ou de proteção equivalente que abranja os serviços a prestar; d) Custo do serviço a prestar. E do disposto no art. 39.º, n.º 1, do Regulamento da CMVM n.º 12/2000: Antes de iniciar a prestação de um serviço, o intermediário financeiro: a) fornece ao investidor informação adequada sobre a natureza, os riscos e as implicações da operação ou do serviço em causa, cujo conhecimento seja necessário para a tomada de decisão de investimento ou de desinvestimento, tendo em conta a natureza do serviço prestado e o conhecimento e a experiência do investidor em causa; b) entrega ao investidor documento sobre os riscos gerais do investimento em valores mobiliários ou noutros instrumentos financeiros; c) fornece ao investidor informação específica e detalhada sobre o risco envolvido, quando os produtos ou serviços envolvam risco de liquidez, risco de crédito ou risco de mercado; d) informa o investidor sobre a existência e modo de funcionamento do serviço do intermediário financeiro destinado a receber a analisar as reclamações dos investidores e da possibilidade de reclamação junto da entidade de supervisão. Artigo 304.º-A 1 - Os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação de deveres respeitantes ao exercício da sua actividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública. 2 - A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação. Na versão original do CVM o legislador assumia ter privilegiado a consagração de princípios e de regras gerais, recorrendo com frequência a conceitos indeterminados e a cláusulas gerais, justificando que a sua "densificação se espera que seja continuada pela jurisprudência, pela prática das autoridades administrativas e pela doutrina." (cfr. preâmbulo). Entretanto, já no atual CVM, a transposição da Diretiva 2004/39/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 21/04/04, através do D.L. nº 357-A/2007 de 31/10 (que entrou em vigor já posteriormente à data dos factos em causa), veio densificar e intensificar estes deveres de conduta, estando em causa essencialmente disposições legais destinadas à proteção do próprio mercado e dos investidores. Neste âmbito, é essencial a disposição legal do art. 101.º da Constituição da República Portuguesa, segundo a qual "O sistema financeiro deve ser estruturado por lei, de modo a garantir a formação, a captação e a segurança das poupanças, bem como a aplicação dos meios financeiros necessários ao desenvolvimento económico e social." Uma das principais atribuições da CMVM (cfr. art. 358.º, alínea b), do CVM) é precisamente garantir a eficiência e regularidade de funcionamento dos mercados de instrumentos financeiros. O CVM contém, no n.º 2 do art. 304.º do CVM, um princípio geral nesta matéria, com a consagração de um dever geral de lealdade e de boa fé, ao enunciar que “Nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência." De seguida contém duas disposições legais diretamente respeitantes à defesa do mercado (cfr. artigos 310.º e 311.º), onde se procuram sintetizar as diretrizes gerais deste princípio estruturante do direito dos valores mobiliários com um conjunto de deveres impostos aos intermediários financeiros. Noutra perspetiva, ..., é consequência do reconhecimento de um interesse público inerente ao correto funcionamento do mercado de valores mobiliários a prevalência deste mesmo interesse sobre o interesse privado de um participante em tal mercado, seja ele intermediário financeiro ou investidor. Ou seja, trata-se de proteger o mercado em si mesmo e não o agente do mercado. No entanto, é evidente que os investidores individuais sairão reflexamente beneficiados com uma cabal e consistente proteção do sistema financeiro, designadamente por esta conferir segurança e eficácia aos investimentos. O princípio da proteção dos interesses do investidor em valores mobiliários é o segundo elemento modelador e estruturante do regime jurídico do mercado de valores mobiliários, sendo já um princípio de carácter privado, encarando o investidor sob uma perspetiva individual. O CVM estabelece, como princípio orientador geral, o de o intermediário financeiro dever pautar a sua atuação no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes, os quais se identificam com o melhor interesse do cliente na sua vertente económico-financeira. O art. 7.º do CVM equipara, em termos gerais, a informação de qualidade com aquela que é completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita. Ou seja, a informação deve ser casuisticamente adaptada e compreender todos os elementos relevantes, ser fiel à realidade, ser apresentada no momento oportuno, ser percetível e isenta de elementos subjetivos e conformada com a lei, a ordem pública e os bons costumes. Estas características da informação aplicam-se seja qual foi o meio de divulgação, e inclusivamente a conselhos, recomendações, mensagens publicitárias ou relatórios de notação de risco (art. 7.º, n.º 2, do CVM). Posteriormente, estes específicos deveres de informação foram sequencialmente concretizados no Aviso do Banco de Portugal n.º 10/2008, de 09 de Dezembro (in D.R. II Série n.º 246, de 22/12/08). Concretizando: o intermediário financeiro deve, em primeiro lugar, informar-se junto do cliente sobre os seus conhecimentos e experiências na área e, em seguida, promover uma atuação pedagógica, tendo presente que este dever de informar é tanto mais premente quanto menos experiente for o cliente. Assim sendo, é, desde logo, essencial a categorização dos clientes, depois, em execução deste "teste de adequação", o intermediário deverá indicar ao investidor os instrumentos financeiros "adequados" ao seu perfil de risco. Na sua vertente negativa, temos que, verificando o intermediário que o cliente não tem perfil para aquela concreta operação financeira ou não tem possibilidade de apreender as características e riscos de uma certa operação financeira, deverá aconselhar o cliente a não investir nesse produto específico.”. Acrescenta-se que, em matéria de conflitos de interesses e realização de operações pessoais, o art.º 309º do Código dos Valores Mobiliários prevê os seguintes princípios gerais: “1 - O intermediário financeiro deve organizar-se e actuar de modo a evitar ou a reduzir ao mínimo o risco de conflito de interesses. 2 - Em situação de conflito de interesses, o intermediário financeiro deve agir por forma a assegurar aos seus clientes um tratamento transparente e equitativo. 3 - O intermediário financeiro deve dar prevalência aos interesses dos clientes, tanto em relação aos seus próprios interesses ou de empresas com as quais se encontra em relação de domínio ou de grupo, como em relação aos interesses dos titulares dos seus órgãos sociais e dos seus trabalhadores. 4 - Sempre que o intermediário financeiro realize operações para satisfazer ordens de clientes, deve pôr à disposição destes os valores mobiliários pelo mesmo preço por que os adquiriu.”. Acresce sublinhar que o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, prevenido no Decreto-Lei n.º 298/92 de 31 de Dezembro, impõe, nos seus artºs. 73º, a 76º, às instituições de crédito, em quaisquer das actividades que pratiquem, que garantam aos seus clientes, superlativos graus de tecnicidade, provendo a respectiva organização com os meios materiais e humanos necessários para realizar condições apropriadas de qualidade e eficiência, devendo os seus administradores e empregados proceder com diligência, lealdade e respeito consciencioso dos interesses que lhe são confiados, pelos clientes, informando-os sobre a remuneração que oferecem pelos fundos recebidos e sobre o preço dos serviços prestados e outros encargos prestados, devendo sempre e em todo o caso, proceder com a diligência de um gestor criterioso. Aqui é de salientar o estatuído no nº1 do art.º 77.º, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras - Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro – que dispõe: “As instituições de crédito devem informar com clareza os clientes sobre a remuneração que oferecem pelos fundos recebidos e os elementos caracterizadores dos produtos oferecidos, bem como sobre o preço dos serviços prestados e outros encargos a suportar pelos clientes”. ** Dos normativos citados, emerge com toda a clareza que a relação contratual obrigacional estabelecida entre o cliente e o intermediário financeiro, deve estar sempre pautada pela lealdade, sustentada no rigor informativo pré-contratual e contratual por parte do intermediário financeiro, condizente a uma informação objectiva, completa, verdadeira, actual, clara, e lícita, sendo de salientar que entre clientes não qualificados, a avaliação do risco não é tão informada quanto a da contraparte. E também a Jurisprudência e Doutrina têm como assente que as aludidas normas legais salientam à evidência a imposição ao intermediário financeiro, para além do dever de transmitir uma informação, clara e relevante para a opção que o investidor pretenda tomar, o dever de avaliar a adequação das operações financeiras face aos conhecimentos, experiência, situação financeira e objectivos do mesmo investidor, seu cliente, sendo certo, afinal, que o dever contratual de agir conforme os elevados padrões de diligência, lealdade e transparência, impostos ao intermediário financeiro no interesse legítimo dos seus clientes, resulta no dever de agir de boa-fé[13]. No que respeita à responsabilidade civil do intermediário financeiro, por danos causados ao investidor em consequência da violação dos deveres respeitantes à organização e ao exercício da sua actividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública, remete-se para o já citado art.º 304º-A do CVM. Porém, como é evidente, a responsabilidade ali prevista pressupõe a verificação/prova dos (todos os) pressupostos da responsabilidade civil: o facto ilícito (omissão ou prestação de informação errónea, no quadro de relação contratual bancária e intermediação financeira); a culpa (esta que se presume nos termos do art.º 799.º n.º 1 do Código Civil e art.º 304º-A do Código dos Valores Mobiliários); o dano (que equivale à perda do capital entregue para subscrição do ajuizado produto financeiro); o nexo de causalidade entre o facto e o dano (sendo que o ónus da prova da existência do nexo causal entre a ilicitude e o dano incide sobre quem alega o direito, não havendo lugar a presunção, quer do nexo de causalidade, quer do dano, e daí que para se responsabilizar o intermediário financeiro pelo dano sofrido pelo investidor, impõe-se que este/investidor consiga fazer a prova do nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano, prova essa que tem de resultar dos factos provados). ** Sobre esta temática da responsabilidade dos intermediários financeiros, foi recentemente uniformizada jurisprudência, no recurso de Uniformização formulado e admitido no âmbito do Processo n.º 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 8/2022 - Diário da República n.º 212/2022, Série I de 2022-11-03), o qual, sobre o pressuposto da ilicitude, deu a seguinte resposta uniformizadora: “1. No âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos arts. 7º, nº 1, 312º, nº 1, al. a), e 314º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo DL nº 357-A/07, de 31-10, e 342º, nº 1, do CC, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano; 5. Se o Banco, intermediário financeiro – que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em “produtos de risco” – informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto, que o “reembolso do capital era garantido (porquanto não era produto de risco”, sem outras explicações, nomeadamente, o que era obrigações subordinadas), não cumpre o dever de informação aludido no art. 7º, nº 1, do CVM.”. E, da mesma forma, no mesmo acórdão de Uniformização de Jurisprudência, agora acerca do nexo de causalidade entre o facto e o dano, consignou-se que a demonstração desse nexo de causalidade é um ónus a cargo do investidor, mesmo que não qualificado, como se vê no ponto 1 do sumário desse AUJ, explanado nos pontos 3 e 4 da respetiva resposta uniformizador: “3. O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir. 4. Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir.”[14]. Ficaram assim dissipadas as dúvidas acerca do ónus da prova do nexo causal: é sobre o interessado que recai esse ónus, não podendo dispensar-se os factos integrantes deste pressuposto, ao invés do entendimento que alguns Autores têm sustentado, de que ilicitude (a violação dos deveres de informação) presume a causalidade (esta resultaria, e automaticamente, daquela). DA ILICITUDE Regressando aos factos, dir-se-á que, aferir da verificação deste pressuposto da responsabilidade civil implica se apure, desde logo e antes de mais, da violação, ou não, pelo Réu dos deveres respeitantes ao exercício da sua actividade de intermediário financeiro, impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública e em particular dos deveres de informação vigentes aquando da subscrição do produto financeiro. Ora, parece evidente que teve lugar, in casu (ao nível do caso concreto, considerando o perfil do cliente e as específicas circunstâncias da contratação), a violação dos deveres de informação, por parte Banco/Réu, enquanto intermediário financeiro. Basta atentar na factualidade ínsita nos pontos de facto provados sob os nºs 7-B, 8, 9, 10, 11, 13, 14, 14-A, 15, 15-A, para se concluir, sem margem para dúvidas, que aqueles específicos deveres do Banco Réu (constituído – em 2012 – mediante a fusão, por incorporação, do anterior Banco BIC Português, S.A., no BPN - Banco Português de Negócios, S.A., e com a alteração da denominação social deste último para a daquele primeiro) foram por ele violados, enquanto intermediário financeiro perante a Autora. Efectivamente, cremos resultar claro desta factualidade que o BPN, de forma deliberada, pautou a sua conduta, enquanto intermediário financeiro, na colocação em mercado das chamadas Obrigações SLN 2006, por uma clara e deliberada omissão dos seus deveres de conduta e de informação para com os seus clientes, que nele confiavam, pois que se limitava a acenar aos clientes com uma taxa de juros apelativa e dizendo-lhes tratar-se de produto semelhante a depósito a prazo, para assim os levar a investir, e sem lhes falar em obrigações e no risco associado a este tipo de produto, para, desse modo manifestamente desinformativo e potencialmente lesivo dos clientes, os não informar com verdade, por forma completa, objectiva e de forma clara sobre o tipo de produto em questão e riscos a ele associados. Assim, portanto, temos como seguro que o Réu violou, de forma grave, os seus deveres de informação, ínsitos nas normas mencionadas supra, nomeadamente, nos artºs 7º, nº 1[15], 304º[16] e 312º[17] do CVM e no art. 39.º, n.º 1, do Regulamento da CMVM n.º 12/2000[18]. Violação dos deveres de informação, cujo entendimento está conforme ao que se plasmou no corpo do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça, proferido no supra citado processo n.º 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A, já transitado em julgado[19]. Com efeito, como ali se diz, «… a informação a prestar pelo intermediário financeiro ao investidor (cliente) relativa a atividades de intermediação e emitentes, que seja suscetível de influenciar as decisões de investimento, deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita (artigo 7.º do CVM), devendo o intermediário financeiro prestar todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, sendo que a extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimento e de experiência do cliente, informando dos riscos especiais que as operações envolvem (artigo 312.º do CVM) e orientar a sua atividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes, devendo observar os ditames da boa fé, com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência, informando-se, previamente, sobre a situação financeira dos clientes, a sua experiência e investimentos (aspetos que o intermediário financeiro tem o dever de conhecer) e sem esquecer que compete ao intermediário financeiro tomar a iniciativa de prestar todas as informações e não aguardar que o investidor (cliente) as solicite”. “(…) Existe um conjunto de informações que o intermediário está obrigado a prestar a um cliente, potencial investidor, antes de lhe prestar qualquer serviço de intermediação financeira. Trata-se de informações prévias no âmbito das quais se inserem todas as necessárias para que o cliente tome uma decisão de investimento esclarecida e fundamentada (art.312.º Cód. VM), as respeitantes à estrutura empresarial do intermediário financeiro e ainda as relativas à natureza e características do investimento a realizar (artigos 38.º e 39.º do Regulamento n.º12/2000).” “A lei não enumera taxativamente o conteúdo da informação considerada necessária, tendo por obrigatório prestar aquela informação que se revele relevante para efeitos de uma tomada de decisão consciente por parte do investidor. O legislador não dispensou, contudo, o enunciado de um conjunto mínimo de dados informativos que necessariamente terão de ser fornecidos pelo intermediário financeiro, encontrando-se nesse grupo elementos cujo conhecimento é, desta forma, reconhecido como indispensável à adopção de qualquer decisão de investimento. Entre esses elementos encontram-se os riscos envolvidos pelas operações a realizar e suas implicações, o custo do serviço a prestar, a existência ou inexistência de qualquer fundo de garantia ou de protecção equivalente bem como a possibilidade de uma eventual reclamação ser recebida pela CMVM e ainda qualquer interesse que o intermediário financeiro tenha no serviço que presta [alíneas a) a d) do n.º1 do art. 312.º do Cód. VM e 39.º do Regulamento CMVM n.º12/2000]. O intermediário financeiro deverá ainda fornecer ao investidor toda a documentação necessária.». * De entre os factos provados, são, neste aspecto da violação dos deveres de informação, particularmente impressivos os seguintes (o destaque é nosso): - A Autora é licenciada em economia ou gestão de empresas, desempenhando, em ... de 2006, as funções de Directora Financeira numa empresa (7-B) – aspecto este relevante no que tange às exigências relativamente ao dever de informação a cargo do Banco Réu, pois, como acima dissemos, as exigências de informação variam em função do perfil do cliente a quem o serviço é prestado, assentando o cumprimento do dever de informação num princípio de proporcionalidade. E sendo a Autora “licenciada em economia ou gestão de empresas, desempenhando, em ... de 2006, as funções de Directora Financeira numa empresa”, é claro que se não pode dizer que seja uma investidora desqualificada, completamente desconhecedora destes meandros (e riscos…) da actividade bancária); -A Autora foi contactada em Abril de 2006, por um funcionário do Balcão onde a A. tinha conta, dizendo-lhe que estava a ser lançado um novo produto financeiro, com a natureza de Obrigação, de características similares às de um depósito a prazo, só que melhor remunerado, com capital garantido (8); - Mais referiu que, atentas as características do produto, o mesmo estava a ter uma procura enorme junto dos clientes do Banco (9); - À A. foi dito que tal produto era semelhante a um depósito a prazo (10). - Os funcionários do balcão onde a autora tinha depositadas as suas quantias acreditavam que os produtos que vendiam eram seguros e que não ofereciam risco para os subscritores (11); - Foi ainda dito à autora que o produto financeiro adquirido era um produto seguro e emitido pela dona do banco, a SLN (14). - A Nunca tendo sido transmitido à Autora que a Obrigação descrita em 8. tinha natureza subordinada (14-A); - A nível interno existia ainda uma informação cuja cópia se encontra junta a fls. 97 a 101 e cujo teor se reproduz, que servia de base à explicação dada aos clientes, mas cuja cópia não era dada, salvo se o cliente a solicitasse (15); - Tal informação, bem como a nota informativa descrita em 4. e 5., nunca foram mostradas à Autora, nem lhe foi entregue cópia das mesmas (15-A). Percute-se, assim, que estes factos revelam a violação dos apontados deveres de informação por banda do Réu/Recorrido, enquanto Intermediário Financeiro, a que alude com especial enfoque o artº 7º, n.º1 CVM, desta forma se preenchendo o requisito ou pressuposto da ilicitude da conduta do Réu perante o concreto cliente que constituía a Autora. Mas tal não basta, para a responsabilização do Réu. Ou seja, temos como preenchido o pressuposto ilicitude da conduta do Banco/Réu, na violação do dever de informação e do compromisso assumido de garantia do capital investido, sendo este não cumprimento sancionado no âmbito da responsabilidade civil contratual. E impendendo, de igual modo, sobre o Banco/Réu, enquanto intermediário financeiro, uma presunção de culpa, nos termos do direito substantivo civil, podendo bem dizer-se que a culpa do Banco/Réu é claramente grave, até pelo especial dever de diligência que sobre ele impendia e que foi desconsiderado de forma, no mínimo, grave. E igualmente temos preenchidos outros pressupostos da responsabilidade civil contratual, quais sejam, a culpa – que, como já dito, se presume – e, outrossim, o dano, correspondente à perda do capital entregue para subscrição do produto financeiro. Falta, porém, o nexo de causalidade entre o facto e o dano, ou seja, saber se a Autora, acaso tivesse sido informada das características reais do produto que adquiriu, não teria levado a cabo essa aquisição. ** DA FALTA DO NEXO CAUSAL Ao contrário do que alguma Doutrina e Jurisprudência tem sustentado, não consideramos que a apontada violação dos deveres de informação por banda do Intermediário Financeiro imponha, sem mais, a conclusão de que, face a tal violação, o Banco Réu fica obrigado a indemnizar o investidor – considera aquela Doutrina que com a apontada violação dos deveres de informação ficam verificados os requisitos de uma conduta ilícita e culposa do Intermediário Financeiro e simultaneamente adequada à verificação de danos para o investidor. Esta conduta dequada à verificação de danos pelo Investidor – aqui, pela Autora – não pode considerar-se, sem mais, verificada. Com efeito, como consta do dispositivo do acima referido Acórdão de Uniformização de Jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça, proferido no proc. n.º 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A, “1. (…). (2. …). “3. O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir.” “4. Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir.”[20]. Como se escreveu no recente Ac. deste STJ de 27.10.2022[21], «se, nas relações pré-contratuais e contratuais em que intervenham intermediários financeiros, a culpa se presume (art.º 314.º n.º2 do CVM, na redacção anterior a 2007), presunção que também resulta do disposto no art.º 799.º n.º1 do Código Civil, para serem indemnizáveis os danos (perda do capital investido na aquisição das obrigações) devem ligar-se causalmente ao incumprimento do dever pré-contratual ou contratual (a prestação, por omissão, de informação errónea). Neste sentido, mesmo que uma dada situação seja configurada como facto ilícito (por exemplo, a prestação, por omissão, de informação errónea, nomeadamente no que concerne à concreta identificação ou às características do produto e a natureza subordinada), essas circunstâncias podem não ser causais da subscrição efetuada e consequente dano. Portanto, se a culpa se presume, mas a presunção não abrange o nexo de causalidade, este terá de ser alegado e comprovado, pois como decorre do art.º 563.º do Código Civil, a obrigação de indemnizar só ocorre em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não houvesse lesão. Nesta decorrência, incumbe ao cliente (investidor) a prova do nexo de causalidade entre o facto e o dano, ou seja, que, se tivesse sido informado, por completo, da concreta identificação, natureza e características do produto financeiro que lhe foi proposto, bem como da sua natureza, não as teria adquirido (cabe a quem invoca o direito à indemnização alegar e demonstrar o nexo causal entre o facto ilícito e o dano, que também não se presume, nos termos do disposto no n.º1 do art.º 342.º do Código Civil).». Ora, este pressuposto da responsabilidade civil (o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação e o dano – aferido em conformidade com a designada teoria da causalidade adequada, segundo a qual, é necessário que, em concreto, a acção ou omissão tenha sido condição do dano, e que, em abstracto, dele seja causa adequada, desta forma seguindo o nosso ordenamento jurídico a teoria da “causalidade adequada” na sua formulação negativa, ou seja, para que um facto seja causa adequada de um determinado evento, “não é de modo nenhum necessário que o facto, só por si, sem a colaboração de outros, tenha produzido o dano”, sendo essencial que o “facto seja condição do dano, mas nada obsta a que, como vulgarmente sucede, ele seja apenas uma das condições desse dano”) não se provou – não logrou a Autora/Investidora prová-lo. E tal ónus da prova incidia sobre a Autora/investidora para poder levar de vencida a sua pretensão. Tinha, com efeito, de constar tal factualidade, expressamente, da relação dos factos provados. O que não acontece. Pelo contrário: consta, como visto, dos factos não provados: “h) “que a Autora, caso lhe tivesse sido mostrado e explicado o conteúdo da nota informativa respeitante ao produto financeiro em apreço (ou mesmo da informação existente a nível interno, mencionada no facto 15.), nomeadamente no que se refere à Subordinação do produto financeiro proposto, não teria efectuado o investimento naquela Obrigação”. Não basta, assim, naturalmente – para a prova do nexo de causalidade –, a factualidade que está assentes: uma coisa é estar provado que se tratava de um “produto financeiro, com a natureza de Obrigação, de características similares às de um depósito a prazo, só que melhor remunerado, com capital garantido”, produto seguro e sem risco, bem assim que não foi transmitido à Autora que a Obrigação descrita em 8. tinha natureza subordinada; outra, bem diferente, é saber se (é provar-se que) acaso à Autora tivessem sido dadas tais informações (que corria o risco de perder o dinheiro investido), então não tinha efectuado o investimento naquela Obrigação – não tomava a decisão de subscrever o produto financeiro. E isto não está provado – ónus probatório incidente sobre a Autora, conforme estatuído no referido Acórdão Uniformizador de Jurisprudência deste STJ. * Compreende-se a insistência da Recorrente na questão da presunção da causalidade, recorrendo a citações de Doutrina e Jurisprudência, sustentando que o nexo causal entre o facto e o dano está abrangido pela presunção do artº 799º, nº1 do CC. Pelo que, a seu ver, compete ao intermediário financeiro – devedor da informação – provar que, mesmo perante um cumprimento pontual dos deveres de informação, o investidor/credor da informação teria tomado a mesma decisão, correndo deste modo o primeiro o risco de não serem provados factos que permitam uma conclusão clara em matéria de nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e a decisão do investidor. Ou seja, sustenta que se presume o nexo causal entre o incumprimento ou deficiente cumprimento dos deveres de informar e a decisão de investimento adotada pelo investidor – presunção que retira do art. 304.º-A, n.º 2 do Cód. Valores Mobiliários, entendendo que esta disposição contem, não apenas uma presunção de culpa e de ilicitude, mas também uma presunção de nexo de causalidade. Dito de outra forma, remata a Recorrente que, neste segmento da causalidade, se presume que a vontade individual do investidor foi determinada pela irregularidade da informação, ou seja, o nexo causal entre a informação deficiente e a decisão do investidor; que se trata “de uma presunção iuris tantum (art. 350.º, n.º 2 do Cód. Civil), pelo que o intermediário financeiro pode infirmar a causalidade mediante a alegação e a prova de factos idóneos para tal, incluindo a possibilidade de utilização das praesumptiones hominis para o efeito”. Mas não foi esse o entendimento do supra citado AUJ – entendeu-se ali que a prova do nexo causal entre a violação dos deveres de informação pelo Intermediário Financeiro e o dano havido é ónus do investidor (in casu, da Autora). Assim, portanto, não logrou a Autora fazer a prova, precisamente, do facto que o referido Acórdão Uniformizador exige para que se possa considerar preenchido o nexo de causalidade entre o facto – aquela violação dos deveres de informação – e o verificado dano. E à falta desse pressuposto ou requisito da responsabilidade civil, imprescindível para a obrigação de indemnizar (ut artº 563º do Cód. Civil), a pretensão da Autora estava, fatalmente, votada ao insucesso, pelo que a decisão recorrida deve ser confirmada. IV. DECISÃO Face ao exposto, acorda-se em julgar improcedente o recurso e, consequentemente, negar a revista, mantendo-se o decidido no Acórdão da Relação. Custas pela Autor/Recorrente.
Lisboa, 30 de novembro de 2022 Fernando Baptista de Oliveira (Juiz Conselheiro Relator) Ana Paula Lobo (Juíza Conselheira 1º Adjunto) Afonso Henrique (Juiz Conselheiro 2º Adjunto) _____ [1] Fundamentou o alegado, essencialmente, no seguinte: • na altura, a Autora tinha no Banco réu dois depósitos a prazo, um no montante de €10.000,00 (dez mil euros) e outro no montante de €40.000,00 (quarenta mil euros), os quais totalizavam a quantia de €50.000,00 (cinquenta mil euros) ; • Mais lhe referiu o sobredito funcionário que se tratava de um produto com muita procura, o qual lhe proporcionaria um rendimento bem superior ao de um depósito a prazo que tinha ali no Banco, pelo que lhe aconselhava a compra de 1 obrigação SLN 2006, no valor de €50.000,00 ; • A Autora deixou-se convencer, apesar de ser uma pessoa avessa a qualquer tipo de jogo ou risco, só aceitando a subscrição do título aqui em causa porque lhe foi afiançado pelo Banco réu que o retorno da quantia subscrita era garantido pelo próprio Banco, uma vez que se tratava de um sucedâneo melhor remunerado de um depósito a prazo, com semelhantes características; • Não lhe foi entregue qualquer nota informativa da operação, tendo-lhe mencionado os funcionários do Banco Réu que se tratava de um produto sem qualquer risco e que podia ser resgatado a qualquer altura ; • Tendo-lhe, ainda, sido assegurado que não obstante tratar-se de obrigação a dez anos, esta poderia, querendo, resgata-la a qualquer altura, com o que apenas sofreria, como sucede nos depósitos a prazo, uma penalização nos juros ; • Enquanto houve lugar ao pagamento de juros pela Galilei, SGPS, S.A., que sucedeu à SLN - Sociedade Lusa de Negócios, S.A., o mesmo sempre teve lugar por intermédio do Banco Réu, o que sucedeu até Abril de 2015 ; • Deste modo, por via da força da garantia dada, da omissão da informação correcta acerca da exacta posição da autora perante a “SLN - Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A:” e da exacta intervenção do Banco réu, que violou os mais elementares deveres de informação, constituiu-se este na obrigação de indemnizar o cliente pelos prejuízos causados, nos termos do artigo 798.º do C. C.; • A “Galilei, SGPS, S.A.” foi, entretanto, declarada insolvente por sentença, de 29/06/2016, proferida pelo Tribunal da Comarca de Lisboa, 1.ª Secção de Comércio-J4, no âmbito do processo número 23449/15.0T8LSB, sem que tivesse sido paga a obrigação dos autos; • A declaração de insolvência levará à liquidação do ativo da devedora, sendo certo que, por o crédito da autora ser um crédito subordinado, esta só receberá alguma coisa depois de todos os credores comuns terem recebido a totalidade do seu crédito, o que seguramente nunca acontecerá; • Por estes motivos, a autora desinteressou-se por completo do recebimento de quaisquer quantias por parte da “Galilei, SGPS, S.A.”; • E, por essa razão, demanda neste processo apenas o Banco réu, de quem exige o pagamento da quantia que lhe é devida; • Ora, o Banco réu, numa postura altamente censurável, não obstante várias interpelações feitas pela autora no seu balcão, recusa-se a restituir-lhe a quantia que lhe foi confiada; • Invocando que é a “SLN - Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.”, actualmente “Galilei, SGPS, S.A.”, com quem a autora nunca celebrou qualquer negócio, a única responsável pelo pagamento desse valor; • A obrigação de indemnização decorrente da violação dos apontados deveres de informação, lealdade e protecção move-se forçosamente no âmbito da responsabilidade contratual; • Constituiu-se, assim, o Banco réu na obrigação de indemnizar, nos termos do disposto no artigo 798.º do C.C. e no artigo 304.º-A do C.V.M.; • A referida indemnização abrange o dano emergente e o lucro cessante, ou seja, os valores entregues pela autora (capital) e os juros de mora, contados a partir da citação. [3] Que reza: caso à autora tivesse sido mostrado e explicado o conteúdo da nota informativa respeitante ao produto financeiro em apreço (ou mesmo da informação existente a nível interno mencionada no facto 15.), nomeadamente no que se refere à Subordinação do produto financeiro proposto, a autora não teria efetuado o investimento naquela Obrigação. [4] Que reza: caso à autora tivesse sido mostrado e explicado o conteúdo da nota informativa respeitante ao produto financeiro em apreço (ou mesmo da informação existente a nível interno mencionada no facto 15.), nomeadamente no que se refere à Subordinação do produto financeiro proposto, a autora não teria efetuado o investimento naquela Obrigação. [5] Cfr. acórdãos do STJ de 05.02.2020 (proc. 13097/17.5T8LSB.L1.S1), de 20.02.2020 (processo 1893/12.4TBSCR.L2.S2) e Ac. no proc. 6126/15.9T8BRG.G1.S1. Ainda, ABRANTES GERALDES, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª ed., págs.434-436. [6] Art.º 682º, nº 3, do CPC. [7] Art.º 682, nº 3, do CPC. [8] Destaque nosso. [9] Disponível em www.dgsi.pt [10] Destaque nosso. (Qualidade da Informação) 1 - Deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita a informação respeitante a valores mobiliários, a ofertas públicas, a mercados de valores mobiliários, a atividades de intermediação e a emitentes que seja susceptível de influenciar as decisões dos investidores ou que seja prestada às entidades de supervisão e às entidades gestoras de mercados, de sistemas de liquidação e de sistemas centralizados de valores mobiliários. [16] Artigo 304.º (Princípios) - Os intermediários financeiros devem orientar a sua atividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado. 1 - Nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência. 2 - Na medida do que for necessário para o cumprimento dos seus deveres, o intermediário financeiro deve informar-se sobre a situação financeira dos clientes, a sua experiência em matéria de investimentos e os objectivos que prosseguem através dos serviços a prestar. (…). [17] “(Deveres de Informação) 1 - O intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efetivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, incluindo nomeadamente as respeitantes a: a) Riscos especiais envolvidos pelas operações a realizar; b) Qualquer interesse que o intermediário financeiro ou as pessoas que em nome dele agem tenham no serviço prestado ou a prestar; c) Existência ou inexistência de qualquer fundo de garantia ou de proteção equivalente que abranja os serviços a prestar; d) Custo do serviço a prestar.’. [18] ‘Antes de iniciar a prestação de um serviço, o intermediário financeiro: a) fornece ao investidor informação adequada sobre a natureza, os riscos e as implicações da operação ou do serviço em causa, cujo conhecimento seja necessário para a tomada de decisão de investimento ou de desinvestimento, tendo em conta a natureza do serviço prestado e o conhecimento e a experiência do investidor em causa; b) entrega ao investidor documento sobre os riscos gerais do investimento em valores mobiliários ou noutros instrumentos financeiros; c) fornece ao investidor informação específica e detalhada sobre o risco envolvido, quando os produtos ou serviços envolvam risco de liquidez, risco de crédito ou risco de mercado; “1. No âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos artigos 7.º, nº 1, 312º nº 1, alínea a), e 314º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de Outubro, e 342.º, nº 1, do Código Civil, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano.” “2. Se o Banco, intermediário financeiro – que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em “produtos de risco” – informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto, que o “reembolso do capital era garantido (porquanto “não era produto de risco”), sem outras explicações, nomeadamente, o que eram obrigações subordinadas, não cumpre o dever de informação aludido no artigo 7.º, n.º1, do CVM.” “3. O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir.” |