Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
377/18.1T8FAF.P1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: MARIA DA GRAÇA TRIGO
Descritores: PROCESSO DE PROMOÇÃO E PROTEÇÃO
MEDIDA DE PROMOÇÃO E PROTEÇÃO
MEDIDA DE CONFIANÇA COM VISTA À FUTURA ADOÇÃO
INTERESSE SUPERIOR DA CRIANÇA
PATERNIDADE BIOLÓGICA
LEI DE PROTEÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS EM PERIGO
REQUISITOS
DIREITOS FUNDAMENTAIS
ADOÇÃO
PROGENITOR
FILIAÇÃO
PODERES DE COGNIÇÃO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Data do Acordão: 02/02/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
I. Estando os poderes do STJ limitados à sindicância de juízos de legalidade, a questão a apreciar é a de saber se o acórdão recorrido violou algum dos parâmetros legais do decretamento da medida de promoção e protecção de confiança com vista a adopção.

II. Ponderada a factualidade dada como provada, considera-se que o tribunal recorrido subsumiu correctamente a situação de facto aos pressupostos legais formalmente consagrados no art. 1978.º do CC e demais preceitos aplicáveis, não se descortinando qualquer erro na interpretação e aplicação de tais normas nem a violação de nenhum dos princípios gerais norteadores da aplicação de medidas de promoção e protecção, consagrados na CRP, na CEDH e na CNUDC.

III. Conclui-se assim que, efectivamente, conforme ajuizado pelo TR, o interesse das crianças impõe, por verificação da previsão do art. 1978.º, n.º 1, al. d), e n.º 3, do CC, que se lhes aplique, a seu favor, a medida de promoção e protecção de confiança com vista a futura adopção, prevista no art. 35.º, n.º 1, al. g), da LPCJP, medida que se revela proporcional e adequada nos termos fundamentados no acórdão recorrido.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


I – Relatório

1. O Ministério Público instaurou acção judicial de promoção e protecção a favor das crianças AA e BB (arts. 100.º e segs. da Lei n.º 144/99, de 1 de Setembro (Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, adiante LPCJP).

 Os menores foram acolhidos na instituição Fundação ..., em ..., ..., no dia 02-08-2019, em cumprimento da medida de acolhimento residencial que lhes foi aplicada pelo período de três meses, por se considerar que as crianças não podiam ficar entregues aos cuidados do progenitor, porquanto este não era capaz de assegurar as mais elementares necessidades daquelas, colocando em perigo a integridade e desenvolvimento integral das mesmas crianças.

Por despacho datado de 30-10-2019, foi determinada a prorrogação da medida provisória de acolhimento, até ao período de seis meses.

Em 14-02-2020, foram elaborados e assinados acordos de promoção e protecção, relativos à aplicação, em benefício das crianças AA e BB, da medida de acolhimento residencial, pelo período de seis meses.

Foram juntos aos autos os relatórios de acompanhamento da medida pelas técnicas competentes da Segurança Social, tendo sido realizada perícia às competências parentais do requerido, não tendo sido realizada perícia psicológica à progenitora, por esta ter faltado ao exame.

Por decisão datada de 26-08-2020, foi decidido prorrogar a medida de acolhimento residencial por mais dois meses.

Por despachos datados de 03-03-2021 e de 03-09-2021, procedeu-se à revisão da medida, e foi decidido manter a medida de promoção e protecção de acolhimento residencial aplicada em benefício das crianças AA e BB, por mais seis meses.

A Equipa Multidisciplinar de Apoio aos Tribunais (EMAT) propôs a medida de promoção e protecção de confiança a pessoa seleccionada para a adopção ou a instituição com vista à adopção, ao abrigo da alínea g), do n.º 1 do artigo 35.º, da LPCJP, e do artigo 1978.º do Código Civil por se considerar ser a medida necessária e adequada a salvaguardar o superior interesse das crianças.

O requerido opôs-se à medida proposta pela EMAT.

Por despacho de 29-06-2022, foi decidido prorrogar a medida de promoção e protecção de acolhimento residencial aplicada em benefício das crianças, pelo período de três meses, enquanto se procede ao diagnóstico da situação das crianças e à definição do seu encaminhamento subsequente.

O Ministério Público apresentou alegações, e promoveu a aplicação da medida de promoção e protecção de confiança das crianças à instituição onde se encontram com vista à sua futura adopção.

O progenitor apresentou alegações, manifestando-se contra a aplicação da medida de promoção e protecção proposta, e a favor da aplicação de uma medida de apoio junto do pai.

Procedeu-se a debate judicial, com produção da prova requerida pelo Ministério Público e pelo requerido, após o que foi proferida sentença que decidiu:

a) Aplicar às crianças AA, nascida em .../.../2018 e BB, nascido em .../.../2015, a medida de promoção e protecção de confiança à instituição Fundação ..., em ..., ..., com vista à adopção;

b) Decretar a inibição do exercício das responsabilidades parentais relativas às mencionadas crianças por parte de CC e de DD;

c) Decretar a inibição de visitas às crianças por parte da família natural ou biológica.

Inconformado, o requerido progenitor dos menores interpôs recurso de apelação para o Tribunal de Relação do Porto, que, em 14/12/2022, proferiu acórdão, que julgou o recurso improcedente e, em consequência, confirmou a sentença recorrida.  

Novamente inconformado, o requerido progenitor interpôs o presente recurso de revista, por via excecpional, para o Supremo Tribunal de Justiça.

O Ministério Público apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.


2. Em 19/01/2023, foi proferida decisão da relatora com o seguinte teor:

«Nos termos do disposto no art. 671.º, n.º 3, do CPC, não é admissível revista por via normal do acórdão que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível.

No presente caso, o acórdão recorrido confirmou integralmente a decisão de 1.ª instância, não existindo qualquer voto de vencido; por outro lado, a fundamentação do acórdão recorrido não é essencialmente diferente da fundamentação da decisão da 1.ª instância.

Tendo o Recorrente vindo interpor recurso de revista por via excepcional, invocando as alíneas a) e b) do n.º 1 do art. 672.º do CPC, a decisão de admissibilidade cabe à Formação prevista no n.º 3 do art. 672.º do CPC.

Contudo, considerando que o presente processo de promoção dos direitos e protecção das crianças e jovens em perigo é um processo de jurisdição voluntária, como decorre do art. 100.º da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (Lei n.º 147/99, de 1 de setembro), cumpre, em primeiro lugar, apreciar se a revista é admissível à luz do disposto no art. 988.º, n.º 2 do CPC.

Dispõe tal normativo que “das resoluções proferidas segundo critérios de conveniência e oportunidade não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça”.

Tem entendido este Supremo Tribunal que, “no âmbito de um processo de jurisdição voluntária, a intervenção do STJ pressupõe, atenta a sua especial incumbência de controlar a aplicação da lei processual ou substantiva, que se determine se a decisão recorrida assentou em critérios de conveniência e de oportunidade ou se, diferentemente, a mesma corresponde a um processo de interpretação e aplicação da lei” (Acórdão de 06-06-2019, proc. n.º 2215/12.0TMLSB-B.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt).

À luz deste entendimento, haverá que, antes de mais, “ajuizar sobre o cabimento e âmbito do recurso de revista das decisões proferidas nos processos de jurisdição voluntária de forma casuística, em função dos respectivos fundamentos de impugnação, e não com base na mera qualificação abstracta de resolução tomada segundo critérios de conveniência ou de oportunidade” (acórdãos deste Supremo Tribunal de 16-11-2017 (proc. n.º 212/15.2T8BRG-A.G1.S2) e 11-11-2021 (proc. n.º 1629/15.8T8FIG-D.C1.S1), consultáveis em www.dgsi.pt).

Cumpre apreciar.

No caso concreto dos autos, a confirmação da aplicação aos menores da medida de promoção e protecção de confiança à instituição com vista à adopção partiu da consideração de que a família biológica não tem condições para recuperar o seu papel na vida dos menores e de que o interesse superior destes impõe que se defina, desde já, um projecto de vida claro e determinado.

A este propósito, o Tribunal da Relação considerou ser “particularmente relevante a circunstância de ao progenitor terem sido dadas várias oportunidades para assumir uma paternidade responsável e a responsabilidade pela criação de condições para assegurar a confiança destes (factos dos pontos 9, 15, 16 e 22), os quais apenas lhe foram retirados e colocados em acolhimento residencial quando se apurou «que as crianças não podem ficar entregues aos cuidados do progenitor, porquanto este não é capaz de assegurar as mais elementares necessidades daqueles, colocando em perigo a integridade e desenvolvimento integral destas crianças».

Esse acolhimento ocorreu quando a AA tinha sensivelmente ano e meio de idade e o BB quase quatro anos de idade. Dada a idade que os menores tinham nessa altura, os mais de três anos que já dura esse acolhimento na instituição, os escassos e sucessivamente menores convívios ou contactos com o pai, a praticamente absoluta inexistência de contactos com a progenitora durante esse período, a inexistência de alternativas na família alargada de qualquer dos progenitores, é fácil de constatar, atenta a idade dos menores, as etapas em que se divide o seu crescimento e a caracterização destas, não custa concluir que entre os menores e a sua família biológica não existem já os vínculos afectivos fortes que são próprios de uma família.”.

Poderia afirmar-se que resulta do exposto que, na fundamentação do acórdão recorrido, a apreciação do caso é meramente casuística, incidindo nas circunstâncias concretas da vivência dos menores e da sua relação com cada um dos progenitores, além de relevar também a motivação e empenho do progenitor recorrente no exercício das responsabilidades parentais, o que levaria a concluir que a valoração em causa é puramente factual e não jurídica.

Sucede, porém, que a valoração factual em causa nos autos não se mostra, no contexto da argumentação do acórdão, dissociável da necessária subsunção dos factos assim apurados aos pressupostos legais conducentes à adopção tal como previstos no art. 1978.º, n.º 1 do CPC.

Entende-se, assim, que, pese embora a análise casuística que é necessariamente levada a cabo, a decisão do Tribunal da Relação não deixa também de ser orientada por critérios de legalidade estrita, que se encontram impugnados pelo recorrente (cfr. conclusões de recurso constantes dos pontos 18. a 31.).

Deste modo, a impugnação por via recursória não se atém aos juízos de oportunidade ou de conveniência adoptados pela decisão recorrida, questionando também a própria interpretação e aplicação dos critérios normativos em que se funda tal decisão e, bem assim, a respectiva constitucionalidade (cfr. ponto 30.º das conclusões recursórias).

Assim, num caso, como o dos autos, de processo de jurisdição voluntária para aplicação de medida de promoção e protecção, em que o recorrente impugna o acórdão do Tribunal da Relação com fundamento em que nele foi cometido erro de aplicação dos critérios legais constantes do arts. 1978.º, n.º 1, do CC, 35.º, n.º 1, alínea g), e 38.º-A, alínea b), da LPCJP, 6.º, n.º 1, 8.º e 13.º da CEDH,  mediante incorrecta análise dos factos dados como provados, sustentando que a correcta aplicação daquelas normas levaria a que, atenta a situação actual do progenitor, bem como o interesse dos menores, não fosse decretada a medida de confiança a instituição com vista a futura adopção, a revista mostra-se admissível para conhecer da alegada violação de tais parâmetros legais.

Na verdade, e atendendo aos termos das alegações de recurso, não se afigura que o recorrente se limite a invocar os preceitos pretensamente violados, já que, ainda que de forma perfunctória, indica em que consiste essa violação, como é o caso da alegação que é feita a propósito de os factos provados serem insuficientes para preencherem o pressuposto legal da inexistência ou sério comprometimento do vínculo afectivo entre o progenitor e a criança, por tal implicar necessariamente a aferição de um dos requisitos legais de adotabilidade impostos pela norma do art. 1978.º, n.º 1 do CPC.

Não se encontram, por outro lado, impedimentos à admissibilidade do recurso relacionados com os requisitos gerais de recorribilidade (cfr., designadamente, arts. 629.º, n.º 1, 631.º e 638.º do CPC) nem com o requisito específico do recurso de revista (cfr. artigo 671.º, n.º 1, do CPC).

3. Pelo exposto, remetam-se os autos à Formação prevista no art. 672.º, n.º 3, do CPC para análise e verificação da admissibilidade da revista por via excepcional.».

3. Por acórdão de 25/01/2023 da Formação prevista no art. 672.º, n.º 3, do Código de Processo Civil o recurso foi admitido.


II – Objecto do recurso

Atentas as conclusões de revista, temos que, além do mais, o recorrente impugna o teor do acórdão do Tribunal da Relação com fundamento em erro de aplicação dos critérios legais constantes dos artigos 1978.º, n.º 1 do Código Civil, 35.º, n.º 1, al. g) e 38.º-A, alíena b), da LPCJP, 6.º, n.º 1, 8.º e 13.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH),  mediante análise incorrecta dos factos dados como provados, sustentando que a correcta aplicação daquelas normas levaria a que, atenta a situação actual do progenitor, bem como o interesse dos menores, não fosse decretada a medida de confiança a instituição com vista a futura adopção.

Como se afirma na decisão da relatora supra transcrita, estando os poderes deste Supremo Tribunal limitados à sindicância de juízos de legalidade, a questão essencial a apreciar é, pois, a de saber se o acórdão recorrido violou algum daqueles parâmetros legais e se estão verificados os pressupostos do decretamento da medida de promoção e protecção de confiança com vista a adopção.


III – Fundamentação de facto (mantém-se a redacção das instâncias)

1- Os presentes autos de promoção e proteção foram instaurados em benefício da criança AA, nascida em .../.../2018, conforme Assento de Nascimento n.º 878 do ano de 2018, da Conservatória do Registo Civil ..., junto a fls. 3v.º e 4, atualmente com 4 anos de idade, e os autos de promoção e proteção em apenso (apenso A) foram instaurados em benefício da criança BB, nascido em .../.../2015, conforme assento de nascimento n.º 2760 do ano de 2015 da Conservatória do Registo Civil ..., junto a fls. 3v.º daqueles autos, atualmente com 6 anos de idade.

2- As crianças AA e BB são irmãos, sendo ambos filhos de CC e de DD.

3- A situação da AA foi sinalizada à Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) de ... em 20/2/2018, na sequência de informação proveniente do Serviço Social do Hospital ..., por existir irmão uterino de três anos, EE, que foi entregue pela EMAT aos cuidados do progenitor, antigo companheiro da aqui progenitora, “por negligência nos cuidados básicos por parte da mãe e por companheiro da mãe”, CC (progenitor da AA e do BB), conforme informação da CPCJ de fls. 5 e ss.

4- O processo referente ao EE teve início com denúncia anónima dando conta que “um bebé se encontra a viver com a progenitora numa garagem sem condições de habitabilidade. Acresce que a progenitora não prestará os cuidados adequados”. Ao longo da avaliação diagnóstica, a CPCJ constatou que EE estava em situação de perigo “derivado das situações para que fomos alertados; de comportamentos de mentira frequente … exaltação e falta de colaboração da progenitora e do seu companheiro, Sr. CC; comportamentos de negligência grave (e eventuais maus tratos) do Sr. CC verificados em outros processos de promoção e proteção”.

5- A CPCJ entendeu que enquanto a progenitora estivesse com o seu actual companheiro, Sr. CC, o ambiente familiar constituía risco para a segurança e bem-estar do EE, tendo este sido entregue aos cuidados do seu progenitor, conforme informação da CPCJ de fls. 5 e ss., datada de 22/4/2018.

6- O Sr. CC já era conhecido pela CPCJ ... por processos de promoção e protecção anteriores, relativos a outros seus filhos e sobrinha, designadamente:

- Referente à criança FF (nascida em .../.../2010), que no ano de 2013 vivia com o pai CC e a sua companheira (diversa da progenitora da AA e do BB), sendo que a sinalização indicava que a criança “passava fome e é maltratada pela madrasta, bate-lhe e aperta-lhe a boca para não chorar”. O processo de promoção e protecção seguiu para Tribunal, tendo a FF sido confiada aos cuidados da avó materna;

-Referente à criança GG (nascida em .../.../2005), filha de HH, irmão do aqui progenitor CC, tendo o processo de promoção e protecção sido aberto na CPCJ aquando do nascimento da criança, por a mãe apresentar consumo abusivo de álcool e o pai estar detido. Em .../.../2005, foi aplicada a medida de apoio junto de outro familiar, designadamente do tio paterno (CC) e a sua companheira àquele tempo. Todavia, a CPCJ veio a constatar que esta criança estava em risco junto dos tios (CC e companheira), pelo que esta medida cessou por revogação do consentimento dos progenitores, tendo o processo seguido para tribunal.

- Em março de 2018, foram reabertos dois processos de promoção e protecção na CPCJ, referentes a dois filhos de CC e da sua antiga companheira II, designadamente relativo ao JJ, nascido em .../.../2004, e relativo a KK, nascida em .../.../2013, conforme informação da CPCJ de fls. 5 e ss.

7 - Os Progenitores da AA e do BB não deram consentimento para intervenção da CPCJ, relativamente à AA, pelo que o processo de promoção e proteção foi remetido aos Serviços do MP junto do Juízo de Família e Menores ..., tendo o MP instaurado processo de promoção e proteção, em benefício da criança AA, em 15/4/2018.

8 - Após alta hospitalar em 19/2/2018, a AA ficou a residir com os seus progenitores DD e CC, e com o irmão BB, o irmão (apenas do lado do pai) JJ e o avô paterno.

9 - Em 13/9/2018, foi aplicada, em benefício da AA, a medida de promoção e proteção de Apoio junto dos Pais, pelo período de 6 meses, tendo o acordo de promoção e proteção sido assinado pelos progenitores.

10 - A situação do BB foi sinalizada à CPCJ ... em 30/9/2018, mediante email de alegada “vizinha”, relativo ao BB e aos irmãos AA e JJ, indicando estar muito preocupada porque o progenitor CC encontra-se sozinho com os filhos “e não é competente para tal”, referindo que a mãe se ausentou de casa, suspeitando-se que o pai não será competente para cuidar dos filhos sozinho, que “deixa a noite os filhos sozinhos”. A CPCJ consigna que “recebeu contacto telefónico de pessoa que solicitou o anonimato informando o seguinte: tem conhecimento que a mãe da AA e do BB fugiu de casa e terá ido para ...; as crianças estão aos cuidados do pai que não é capaz de lhes prestar cuidados; o JJ “bate no BB …”; “as crianças choram muito”; “não têm comida”; o pai deixa as crianças aos cuidados do irmão JJ…”.

11 - A CPCJ, que tinha conhecimento da pendência judicial de processos de promoção e proteção, um relativo à AA e outro relativo ao JJ, transmitiu a informação à EMAT, e remeteu o processo de promoção e proteção relativo ao BB aos Serviços do MP junto do Juízo de Família e Menores ....

12 - Em 12/10/2018, o MP instaurou processo de promoção e protecção relativo ao BB, processo que foi apensado ao presente processo da irmã AA.

13 - Os progenitores da AA e do BB viveram em união de facto durante cerca de 4 anos, encontrando-se separados, conforme relatório efectuado pela EMAT, datado de 12/11/2018.

14 - Durante o período que durou o relacionamento, os referidos progenitores mudaram diversas vezes de residência, sendo que desde Abril de 2018 (data em que iniciou o processo de promoção e protecção da AA), haviam mudado 3 vezes de casa com os 3 menores a seu cargo (BB, AA e JJ), conforme relatório efectuado pela EMAT, datado de 12/11/2018.

15 - Em 13/11/2018, foi aplicada em benefício da criança BB, a medida de promoção e protecção de Apoio junto do Pai, pelo prazo de 1 ano, tendo o acordo de promoção e protecção sido assinado pelos progenitores.

16 - Em 20/11/2018, foi decidido substituir a medida de promoção e protecção aplicada em benefício da AA, pela medida de Apoio junto do Pai, por um período de 6 meses, tendo sido ponderado, além do mais, que a progenitora emigrou para ..., ficando a AA e o BB aos cuidados do pai.

17 - À data de 14/3/2019, o progenitor havia mudado novamente de residência, com os três filhos menores, para a Rua ..., ..., ..., conforme informação da EMAT datada de 14/3/2019, junta aos presentes autos.

18 - Em entrevista datada de 29/4/2019, o progenitor CC verbalizou intenção de ir viver para os ... com os filhos, assim que a filha mais velha KK regresse ao agregado familiar, conforme informação da EMAT de Maio de 2019.

19 - O Sr. CC mantinha, à data, relacionamento amoroso com LL (nascido em .../.../1998), jovem que beneficiou da medida de acolhimento institucional desde os 11 anos até à maioridade, conforme informação da EMAT de Maio de 2019.

20 - A CPCJ ... foi contactada por MM, irmã do progenitor CC, tendo a mesma dito, além do mais, “que estava muito preocupada com os sobrinhos”, afirmando que o “Sr. CC não é um bom pai, mete muitos homens em casa, que vai para a noite e é o JJ que fica com os irmãos. A KK vem a casa ao fim de semana e a casa está sempre cheia de homens. O Sr. CC muda de namorado várias vezes e são esses namorados que vão buscar a KK à instituição”, conforme informação da CPCJ ... datada de 4/6/2019.

21 - Nessa ocasião, a D. MM disse estar disponível para tomar conta da AA e do BB, mas não está disponível para cuidar do JJ (cf. fls. 65).

22 - Em 4/7/2019, foi determinada a prorrogação das medidas de promoção e protecção aplicadas à AA e ao BB, de Apoio junto do Pai, por um período de 6 meses.

23 - Em 31/7/2019, a CPCJ ... recebeu contacto telefónico de dois vizinhos que informaram, além do mais, que “as crianças passam as noites a chorar; pai sai de casa com o namorado durante a noite; ouvem-se berros do pai com as crianças” (cf. fls. 94).

24 - Em 2/8/2019, foi determinado a aplicação a favor dos menores AA e BB da medida de promoção e protecção de Acolhimento Residencial, na instituição Fundação ..., em ..., ..., pelo período de 3 meses.

25 - Consigna-se no despacho que determinou a aplicação de tal medida, além do mais, que “dos elementos trazidos aos autos e das declarações informais prestadas pelo menor JJ à EMAT (no âmbito do proc. n.º 2583/06.... deste Juízo) constata-se uma situação de enorme gravidade que demonstra que esta criança (a qual habita na mesma residência onde estão os menores AA e BB), para além de ter pedido ajuda, em grande aflição, demonstrando com suficiência que a criança não pode permanecer na residência do pai, estando em grave perigo a integridade psíquica e emocional de todas elas”. Mais se refere, entre o mais, que “da factualidade supra exposta resulta que as crianças não podem ficar entregues aos cuidados do progenitor, porquanto este não é capaz de assegurar as mais elementares necessidades daqueles, colocando em perigo a integridade e desenvolvimento integral destas crianças” (cf. fls. 106 e ss.).

26 - Em 2/8/2019, a AA e o BB foram conduzidos à Fundação ..., em ....

27 - O irmão JJ integrou a mesma casa de acolhimento (conforme decisão proferida no processo de promoção e proteção n.º 2583/06....).

28 - À data de 25/10/2019, a AA e o BB encontram-se bem integrados na casa de acolhimento, tendo vindo a adquirir estabilidade. As crianças mantêm grande proximidade com o irmão mais velho JJ aí acolhido. Desde a integração institucional, os progenitores têm visitado com regularidade as crianças, sendo que a progenitora não se percepciona ela mesmo como alternativa aos filhos. Por seu lado, o progenitor perspectiva que os filhos venham a reintegrar o seu agregado familiar, sendo que, além de presença assídua nas visitas, efectua telefonemas diários aos filhos, revelando-se um pai cuidadoso, revelando proximidade e carinho com ambos, conforme relatório social datado de 25/10/2019.

29 - Em meados de Agosto de 2019, o progenitor mudou novamente de residência, passando a residir na Rua ..., ..., ... (cf. resulta do aludido relatório social).

30 - Quanto à sua situação laboral, encontrava-se desempregado (cf. resulta do aludido relatório social).

31 - Por despacho datado de 30/10/2019, foi determinada a prorrogação da medida provisória de acolhimento em instituição, ao abrigo do disposto no artigo 37.º da LPCJP, até ao período de 6 meses.

32 - O jovem JJ (irmão da AA e do BB) apresentou no processo de promoção e proteção n.º 2583/06...., um requerimento datado de 13/12/2019, no qual alegava, além do mais, que “muitas vezes eu ficava em casa com a AA e o BB enquanto o meu pai saia com a minha irmã KK para a discoteca até as tantas da noite. O meu pai quando a minha irmã KK fugiu para a casa dele, ele foi para um hotel e só veio no dia seguinte e deixou a mim, a KK, a AA e o BB na casa de um amigo dele, sozinhos. …” “Ele saia sempre a noite e eu ficava em casa com os meus irmãos, e ele só chegava de madrugada. Eu é que cuidava deles todos os dias.” … (cf. fls. 150).

33- O progenitor CC possui 7 filhos:

- Fruto da relação com II: 1) KK (que foi alvo do PPP 2583/06...., e esteve acolhida no colégio ... desde 11/2/2019); 2) JJ (que residia com o pai, e que também foi alvo do PPP 2583/06...., tendo-lhe sido aplicada a medida de acolhimento residencial aquando do BB e da AA, tendo sido acolhido na mesma casa que os irmãos mais novos); 3) NN (que vive aos cuidados da mãe em ...).

- Fruto da relação com OO: 4) PP e FF, ambas residentes com a avó materna em ... (as quais foram alvo do PPP 1322/08....).

- Fruto da relação com DD: BB e AA (cf. relatório efetuado pela EMAT de ..., datado de 19/12/2019, junto a fls. 102 e ss, apenso A, e Informação da Segurança Social de 4/7/2022).

34 - A progenitora foi novamente mãe de uma menina, QQ, nascida em .../.../2019, a qual foi alvo do PPP 21/20...., e que foi acolhida, em .../.../2020, na casa de acolhimento “Associação ...”, em ..., ao abrigo de medida cautelar decretada em processo de promoção e protecção.

35 - A progenitora visitou a AA e o BB com alguma regularidade até meados de Novembro de 2019, porém nunca estabeleceu contactos telefónicos com a equipa técnica.

36 - No início de Dezembro de 2021, contactou a Casa de Acolhimento a solicitar visita aos filhos e nunca mais voltou a contactar.

37 - De acordo com a progenitora, encontrava-se a residir provisoriamente em ..., no agregado familiar do namorado RR e da mãe e irmão deste.

38 - Assumiu não ter condições socio económicas nem habitacionais para receber os filhos, nem o perspectivando num futuro próximo.

39 - Em 14/2/2020, foram elaborados e assinados acordos de promoção e protecção, relativos à aplicação, em beneficio da AA e do BB, da medida de Acolhimento Residencial, pelo período de 6 meses, sendo que no ponto 4, do referido acordo, ficou estabelecido que o progenitor poderá conviver com os menores, aos sábados, domingos e feriados, no período compreendido entre as 14h00 e as 18h00, sendo permitida a saída da casa de acolhimento para o exterior, devendo o progenitor salvaguardar as crianças de situações desadequadas e/ou conflituosas. No ponto 5, ficou estabelecido que a progenitora poderá visitar os menores na instituição, mediante prévio contacto com a instituição.

40 - Ouvido em Tribunal, o progenitor referiu, além do mais, que, ainda na referida data, celebrará contrato de arrendamento por forma a fixar a sua residência no concelho .... Referiu ainda estar inscrito no centro de emprego, vislumbrando muito brevemente iniciar trabalho numa pastelaria.

41 - Por requerimento entrado em 5/3/2020, o progenitor veio informar estar a residir, desde 26/2/2020, na Rua ..., ..., ... (cf. fls. 195).

42 - Mediante contacto telefónico, o Sr. CC informou a EMAT de que não concretizou mudança para a casa situada na freguesia ..., ..., estando a residir na Rua ..., ..., ... (cf. informação datada de 30/4/2020, junta a fls. 154 do apenso A).

43 - Efetuada perícia psicológica ao progenitor CC, concluiu-se, no relatório de perícia médico legal de Psicologia, efectuado pelo IML, datado de 13/3/2020, nos seguintes termos:

“… somos de parecer que CC não evidencia sintomatologia psicopatológica clinicamente significativa, embora apresente elevações de nível clínico na dimensão ideação paranóide. Em relação à personalidade, pese embora este não evidencie perturbação clinicamente significativa, este apresenta alguns traços disfuncionais. Entre eles destaca-se a impulsividade, a instabilidade emocional e a imaturidade emocional e afectiva. CC evidencia ainda um discurso pautado pela vitimização e atribuição externa da culpa, tendendo a responsabilizar os outros pelas suas dificuldades e pelos problemas que enfrenta. Quanto à paternidade, foi possível constatar que CC se encontra motivado, revelando interesse e preocupação para com o bem-estar e segurança dos filhos. No que respeita a competências parentais, este mostrou possuir competências mínimas ao nível da interacção e expressão de afecto para com os mesmos. CC evidenciou ainda competências básicas ao nível dos cuidados básicos (alimentação, saúde, higiene e segurança) e mostrou conhecer as principais características, modos de funcionamento e marcos desenvolvimentais dos filhos. Da mesma forma, foram perceptíveis sentimentos positivos e de afectividade em relação aos menores. Este mostrou-se ainda capaz de perspectivar e reconhecer as necessidades actuais e futuras dos menores e revelou possuir conhecimentos e competências mínimas ao nível das estratégias educativas e didácticas. Não obstante o anteriormente exposto, da avaliação de CC resultou a presença de algumas vulnerabilidades, as quais podem interferir com o exercício da parentalidade. Para além das questões anteriormente referidas a respeito das características da personalidade de CC (i.e., impulsividade, instabilidade emocional, imaturidade emocional e afectiva, postura de vitimização, atribuição externa da culpa), destaca-se a instabilidade que vem caracterizando os relacionamentos íntimos de CC, a instabilidade laboral, o parco suporte social e familiar e a relação de marcado conflito e hostilidade que vem mantendo com a mãe dos filhos mais velhos. Face ao exposto, e atendendo a que alguns dos elementos enunciados poderão interferir com o exercício das responsabilidades parentais, entendemos como fundamental a integração do progenitor num programa de educação parental com vista ao reforço das suas competências/capacidades parentais, bem como a sua integração em consultas de Psicologia com vista a promover a sua estabilidade emocional e a aquisição de competências de resolução de problemas mais eficazes” (cf. fls. 199 e ss).

44 - Diligenciou-se pela realização de perícia psicológica à progenitora, todavia esta faltou ao exame (cf. fls. 176 do Apenso A).

45 - Por decisão datada de 8/7/2020, foi determinado um alargamento das visitas das Crianças ao pai, passando, no mês de Julho de 2020, as Crianças a conviver com o pai entre as 10h00 e as 19h00 de sábado ou domingo.

46 - O pai mantinha contactos regulares com os filhos (também a nível telefónico), perspectivando que as Crianças venham a reintegrar o seu agregado.

47 - A mãe não estabelece contactos com os filhos desde Novembro de 2019, conforme referido pela EMAT em relatório datado de 5/8/2020 (cf. fls. 235 e ss).

48 - Por decisão datada de 26/8/2020, foi decidido prorrogar a medida de acolhimento residencial por mais 2 meses (cf. fls. 250) e por mais 6 meses (cf. fls. 194 do apenso A).

49 - Por email de 8/11/2020, o progenitor CC informou que a sua residência actual se situa na Rua ..., em ... (cf. fls. 268 dos autos e fls. 202 do apenso A).

50 - Em relatório social datado de 26/10/2020, a EMAT referiu que o pai manifesta o desejo de vir a constituir-se resposta familiar quanto aos filhos AA e BB. Do seu ponto de vista sempre fez tudo para garantir a guarda e cuidados dos filhos, tendo dificuldade em aceitar que a instabilidade pessoal/relacional, laboral e habitacional que caracteriza a sua vida constituem vulnerabilidades susceptíveis de afectarem os seus filhos, adoptando antes uma postura de culpabilização de terceiros. A mãe reconhece não ter competências nem dispor de condições que lhe permitam vir a ser alternativa familiar, sendo uma figura ausente da vida dos filhos há aproximadamente um ano.

51- Em relatório social datado de 1/3/2021, a EMAT referiu que da articulação efectuada com a CA, a AA e o BB manifestam grande carinho e proximidade com o pai, sendo que o pai evidencia preocupação, carinho e afeto pelos filhos. Todavia, reconhecem que durante quase ano e meio de acolhimento residencial o progenitor manifestou um padrão de grande instabilidade profissional, pessoal e social, nomeadamente com alteração de concelhos de residências, inúmeras alterações de atividade profissional e elevado grau de hostilidade nas relações pessoais com familiares. Esta inconstância na sua vida pessoal, relacional, social, laboral, entre outras, leva a que haja uma preocupação acrescida com a criação de estabilidade emocional, ambiente securizante e todas as condições associadas ao exercício da parentalidade.

52 - Por despachos datados de 3/3/2021, procedeu-se à revisão das medidas, tendo-se decidido manter as medidas de promoção e proteção de acolhimento residencial aplicadas às crianças AA e BB, por mais 6 meses. Mais se decidiu autorizar os convívios das crianças AA e BB com o progenitor aos fins de semana e férias letivas, mediante articulação entre a CA e Técnica da ATT, devendo as visitas serem suspensas se ocorrerem situações que o justifiquem, por comprometerem a saúde e o bem-estar dos menores.

53 - Em 5/4/2021, o irmão da AA e do BB, JJ, fez uma exposição ao processo, alegando, além do mais, que “o meu pai muitas vezes obrigou-me a roubar …”, “uma vez o meu pai queria que ficasse em casa com os meus irmãos mais novos AA e o BB e eu disse que não, minha irmã KK ainda tentou me oferecer um cigarro para ficar mas eu disse sempre não, então meu pai fechou todas as portas de casa e eu fiquei lá dentro, não conseguia comer, apenas conseguia ir casa de banho”, entre outros factos ocorridos enquanto residia com o pai e os irmãos mais novos AA e BB (cf. fls. 290).

54 - Em relatório social datado de 19/4/2021, a EMAT informa que os convívios aos fins de semana entre as Crianças e o progenitor, em casa deste, têm decorrido com normalidade.

55 - Entretanto, o progenitor relatou à EMAT ter recebido um pedido de casamento por parte de um individuo residente em ..., com quem assumiu ter uma relação de namoro há cerca de 8 meses, tendo este uma situação profissional estável, pelo que equaciona a hipótese de vir a alterar a residência para esse distrito, todavia só após a deliberação de alteração da medida, defendendo priorizar no momento os convívios com os filhos.

56 - Entretanto, a EMAT e a Casa de Acolhimento foram contactadas pela irmã do progenitor, MM, no sentido de expor algumas preocupações com o bem-estar e desenvolvimento integral dos sobrinhos, referindo ter provas e indícios que sustentam a sua posição, no que concerne ao facto do progenitor não apresentar competências nem idoneidade para se constituir uma solução positiva e adequada no projecto de vida dos filhos, em particular, dos mais novos. Referiu várias afirmações nesse sentido, constantes de fls. 295 e 296, que aqui se dão por reproduzidas, salientando-se que, segundo relatos da mesma, o Sr. CC dedica-se à prática de prostituição homossexual, descrevendo ser habitual o mesmo receber clientes em casa e/ou frequentar uma casa de prostituição no .... Responsabilizou o Sr. CC por contratualização de créditos em nome do pai e filho JJ, alegando a existência de várias dividas nas finanças, falta de pagamento de rendas de habitação, entre outros factos. Confrontado, o progenitor refere serem calúnias (cf. fls. 321).

57 - Em relatório datado de 3/5/2021, a EMAT referiu que o progenitor e o seu noivo se dirigiram às instalações da Segurança Social, com vista a confirmar a sua decisão de contrair casamento civil, sendo o noivo SS, nascido em .../.../1992, nacionalidade brasileira, residente em ..., exercendo actividade profissional como trabalhador independente, prestando serviços de ..., pretendendo no futuro, o progenitor, alterar a residência para junto do Sr. JJ, tendo em consideração que este apresenta uma situação mais estável e que a zona de ... oferece mais oportunidades de emprego, tendo no entanto o Sr. CC referido não mudar de residência enquanto a medida de promoção e protecção a favor dos filhos não for alterada. O Sr. CC referiu ter deixado de exercer actividade profissional para a anterior empresa, informando ter iniciado novas funções laborais para outra empresa, no final do mês de Março, estando a trabalhar numa fábrica de palmilhas designada ..., em ..., em período nocturno.

58 - Nesse mesmo relatório, a EMAT consigna que a Casa de Acolhimento terá partilhado preocupações com as práticas parentais utilizadas pelo Sr. CC, dado que “os menores assumem guardar segredos, sendo que, dois destes segredos, de forma alguma podem revelar, acrescentando que no momento que o façam não podem mais visitar a casa do pai, nos fins de semana”.

59 - Em entrevista efetuada em 7/6/2021, o Sr. CC reconheceu desentendimentos com o seu noivo, assumindo que a relação entre eles terá terminado, conforme relatório da EMAT datado de 29/6/2021.

60 - A EMAT consignou também ter apurado junto do senhorio do progenitor que o Sr. CC apresenta 5 meses de rendas em atraso, ou seja, já não paga desde Janeiro de 2021, para além de não ter efetuado o pagamento das despesas mensais com água, luz e gás.

61 - Referiu ainda que a Casa de Acolhimento relatou que, no dia 28/6/2021, o BB terá regressado com um olho inchado e que o progenitor terá alegado um treçolho. A Casa de Acolhimento levou o BB para ser visto por médica no centro de saúde, ao qual admitiu considerar a hipótese de “trauma” no olho. Neste seguimento, na presença da Dr.ª Rita e da médica, o menor foi questionado sobre o que tinha acontecido, tendo o menor revelado grande ansiedade e angústia, acabando por revelar ter sido o pai que lhe bateu e que “ele disse que eu não posso falar”, na sequência do que foi apresentada queixa crime, que deu origem ao inquérito 758/21...., que foi arquivado por despacho datado de 30/3/2022.

62 - O progenitor continua a apresentar vários trabalhos e por curtos períodos de tempo, verificando-se após consulta ao SISS, que em 9 meses, o Sr. CC alterou de emprego duas vezes, tendo exercido atividade entre outubro e dezembro de 2020 (3 meses) para a Empresa B..., Unipessoal Lda., somente aparecendo declarado respetivamente, 11,5 dias, 19 dias e 22 dias de trabalho, num total de 30 dias. Entretanto, verificou-se reinício da sua atividade profissional entre Abril e Maio de 2021 (2 meses), para a Empresa T... Lda., tendo sido declarado nesses dois meses, 15 dias e 16 dias de trabalho, num total de 30 dias, conforme consta do referido relatório.

63 - No parecer técnico do referido relatório social, a EMAT consignou que “as equipas que acompanham e avaliam a execução da medida de p.p. a favor dos menores (EMAT e Casa de Acolhimento) continuam a verificar a existência de vários indicadores que suscitam preocupação com o seu bem-estar e segurança, comprometendo assim o seu desenvolvimento harmonioso e integral. Apesar das dificuldades e factores de perigo identificados no passado do progenitor e que levaram alegadamente à integração dos filhos na casa de acolhimento, verifica-se que alguns dos pressupostos se mantém, designadamente, a instabilidade na sua fixação de emprego e residência, situação económica irregular e precária, dividas contraídas com o arrendamento, falta de pagamento de serviços essenciais como água, luz e gás, existência de suporte social e/ou familiar frágil e/ou inexistente, pautada por conflitos familiares e inimizades, existência de instabilidade no desenvolvimento das suas relações pessoais e/ou de intimidade, admitindo o inicio de relações diferentes por curtos períodos de tempo, expondo os filhos às mesmas, para além de descrever alguns litígios e conflituosidade nas suas relações de amizade, as quais normalmente resultam em acusações e queixas sobre a sua idoneidade e competências para se constituir uma alternativa ao futuro dos filhos.” Refere-se ainda, além do mais, “que, este serviço já terá articulado com o progenitor face à possibilidade do mesmo poder beneficiar de acompanhamento psicológico e/ou com a sua integração em acções para uma parentalidade mais positiva, pese embora o mesmo tenha assumido resistência face a essa possibilidade, conforme sugerido pelo próprio perito autor da sua perícia psicológica, uma vez que se verifica alguma imaturidade emocional e afectiva, vitimização e atribuição de culpa aos outros pelas suas dificuldades e problemas que apresenta, apesar de se verificar que o mesmo exterioriza preocupações e afecto pelo BB e AA, não sendo no entanto, na nossa opinião, suficiente para se revelar uma alternativa positiva e adequada aos filhos. Não podemos ainda deixar de ressalvar que, quase todos os filhos do progenitor apresentam processos de promoção e proteção, por evidenciarem apresentar situações de perigo … sendo notório a existência de várias disfuncionalidades no seu percurso de vida que interferem com as exigências do seu papel parental, conforme já descrito anteriormente e a titulo de exemplo: a instabilidade profissional/rendimentos, desresponsabilização no pagamento das despesas mensais e/ou criação de dividas de arrendamento, contratualização dos serviços de agua, luz e gás, promovendo a mudança de residência em curtos espaços de tempo, instabilidade nos relacionamento íntimos, existência de relações de conflito e hostilidade com familiares, ex-amigos, ex-companheiros, expondo os filhos a essa volubilidade.”

64 - Enquanto, o Sr. CC viveu no concelho ... (cerca de 9 meses), a equipa da EMAT foi informada por elementos da sua rede de vizinhança, de que era comum a pernoita de jovens menores na casa do Sr. CC e a frequência de muitas pessoas diferentes, o que suscitava preocupação na comunidade.

65 - Quanto ao facto de haver menores a pernoitar na sua casa, o Sr. CC assumiu ter aceite um jovem, filho de uma amiga, enquanto esta teve que tratar de uns assuntos pessoais”. A própria progenitora chegou a confirmar essa situação junto da CPCJ ..., onde decorria processo de promoção e protecção a favor desse jovem.

66 - Em email datado de 5/7/2021, o progenitor veio informar ter mudado de residência, encontrando-se a residir na Rua ..., ... (fls. 371 e fls. 288 do Apenso A).

67 - Por despachos datados de 9/7/2021, foi decidido a suspensão, imediata, das visitas das Crianças ao pai nos fins de semana. Mais foi decidido que o pai poderá visitar as Crianças na casa de acolhimento nos termos a definir pela instituição, em articulação com a coordenadora do caso.

68 - Ouvido o progenitor, em 10/8/2021, em diligência judicial, o mesmo confirmou continuar a residir na morada supramencionada situada na ..., onde tenciona permanecer a viver. É verdade que o seu filho BB tinha o olho inchado e vermelho, mas que isso se desenvolveu nesse fim de semana e que tinha a ver com um “terçolho”, negando ter agredido o filho. Referiu não ter qualquer dívida relacionada com os arrendamentos. Que trabalhou a primeira semana de Agosto, mas que já se encontra de baixa médica, o que já vinha sucedendo desde Junho de 2021. Neste período, em resultado da baixa médica, apenas recebeu cento e poucos euros, o que sucedeu em Julho de 2021. Que de renda de casa suporta o montante de 350,00€. Que vive com o seu actual companheiro, cidadão de nacionalidade brasileira, TT, com quem iniciou uma relação há cerca de 1 mês, e que este o tem ajudado a suportar as despesas do arrendamento e outras despesas com a habitação.

Esclareceu que, no que concerne ao BB, no dia 26/6/2021, entre as 23h06 e as 23h15 esteve com ele no Hospital ..., com vista a tratar do terçolho, conforme cópia de declaração de presença, que juntou (a fls. 393 dos autos e fls. 310 do apenso A, foi junto resumo de informação clínica referente à presença do BB no Hospital ..., em ..., no dia 26/6/2021).

69 - Por despachos datados de 3/9/2021, foi decidido manter a medida de promoção e proteção aplicada às crianças AA e BB, por mais 6 meses.

70 - Por email datado de 14/10/2021, o progenitor CC solicitou que toda a correspondência seja remetida para a Rua ... ..., loja ...1, alegando estar a trabalhar e passar a maior parte do tempo lá, pelo que será mais fácil toda a correspondência ir para tal morada (cf. fls. 407).

71 - Atendendo ao facto da filha mais velha, KK, se recusar a voltar para a Casa de Acolhimento, após as férias de Natal/Ano Novo e faltar poucos meses para atingir a maioridade, o Tribunal alterou a medida de acolhimento residencial para Apoio Junto do Pai, com o compromisso da jovem continuar a frequentar a escola, todavia, ambos não cumpriram com o assumido, tendo o processo de promoção e protecção sido posteriormente arquivado, após a jovem ter atingido a maioridade e assumir interesse na não continuidade da intervenção.

72 - O Sr. CC contraiu casamento com TT, no dia .../.../2021, conforme Assento de Casamento n.º ...90 do ano de 2021 da Conservatória do Registo Civil/Predial/Comercial de ..., junto em sede de Debate Judicial.

73 - No dia 11/11/2021, o Sr. CC assumiu no Juízo de Família e Menores ..., capacidade para se constituir uma resposta positiva e adequada ao filho JJ, tendo nessa sequência o Tribunal alterado a medida de acolhimento residencial para Apoio Junto do Pai. O Sr. CC realizou um pedido de transferência escolar e respetiva matrícula para a Escola Profissional ..., sendo que um mês depois o filho assumiu que não iria regressar à escola em virtude da decisão de mudança de residência do pai.

74 - Na conferência judicial no Tribunal ..., o pai teria admitido junto da equipa de ATT e equipa técnica do Colégio ... que iria trabalhar para outra empresa e que pretendia tirar o curso de ... na Escola do JJ, no período noturno.

75- Durante este período, o Sr. CC não acautelou a frequência escolar do filho JJ, na medida em que se mudou para ... entre dezembro/janeiro, tendo desde esse período o JJ faltado à escola, para além de não ter efetuado qualquer pedido de transferência escolar.

76 - Por despacho datado de 17/11/2021, os autos foram remetidos para o Juízo de Família e Menores ..., em virtude de o progenitor residir em ... e ali ter o seu centro de vida há mais de 3 meses.

77 - Em informação social datada de 20/12/2021, a EMAT defende que o pai não se constitui uma alternativa positiva ao futuro de nenhum dos filhos, relembrando que todos os menores tiveram e/ou têm processo de promoção e proteção a decorrer a seu favor, vários com medidas de acolhimento residencial e com evidências profundas de instabilidade, sofrimento e com comportamentos que comprometem gravemente o seu bem-estar físico e psicológico, afetando o seu harmonioso desenvolvimento (cf. fls. 437). Nessa informação, a EMAT emitiu parecer técnico no sentido de que os pressupostos que levaram à aplicação/prorrogação da medida de acolhimento residencial dos filhos BB e AA se mantêm inalteradas, constatando-se as sucessivas mudanças de residência, de atividade profissional, de relacionamentos, sendo notório manter-se as fragilidades por parte do progenitor, embora venham sendo dadas constantes oportunidades ao mesmo para alteração das suas circunstâncias de vida, as quais acabam por no nosso entender prejudicar e hipotecar o futuro dos filhos, os quais continuam a ver priorizados o interesse superior do pai em detrimento do seu interesse superior.

78 - Do relatório social datado de 4/4/2022, resulta que durante a avaliação da execução da medida de promoção e proteção a favor do BB e da AA, procurou-se avaliar frequentemente junto do progenitor, se este eventualmente reuniu as condições necessárias para se poder revelar uma alternativa positiva e adequada à medida vigente dos filhos mais novos, atendendo ao manifesto interesse verbal do pai e a ausência de contactos da progenitora com os filhos (seguramente nos últimos dois anos de vida dos mesmos) e inexistência de alternativas na família alargada.

79 - No parecer técnico do mesmo relatório social efectuado pela EMAT, datado de 4/4/2022, refere-se, além do mais que, nos primeiros contactos estabelecidos com o progenitor, este reafirmou o seu manifesto interesse em se constituir uma solução na vida dos filhos BB e AA, tendo desde logo sido confrontado com alguns aspectos na sua vida que suscitavam preocupação e necessidade de melhorar/alterar, descrevendo-se a titulo de exemplo, a necessidade de se fixar ao nível da residência, conseguir manter uma situação de emprego estável e capacidade económica para fazer face às suas despesas fixas mensais, estabilidade no ambiente familiar (atendendo ao facto de se conhecer vários relacionamentos nos últimos tempos de curta duração) e evitar exposição dos menores a situações indesejáveis como terão sido reportadas nos autos.

80 - Apesar do Sr. CC evidenciar um discurso pautado na pretensão dos filhos reintegrarem o seu agregado familiar, na prática, as várias equipas de intervenção verificaram diminuição dos contactos presenciais do pai com os filhos, distanciamento geográfico do Sr. CC em relação à Casa de Acolhimento, para além de se continuar a verificar as mesmas dificuldades e instabilidade nas suas circunstâncias de vida.

81 - Durante os últimos 17 meses (por reporte à data do mencionado relatório), o Sr. CC mudou de residência 2 vezes em ..., no período de 9 meses, tendo-se aferido junto do último senhorio, o não pagamento da renda da habitação referente aos últimos 5 meses, não pagamento das despesas de água/luz/gás; 2 mudanças de residência em ..., 2 vezes, no período de 6 meses; 1 mudança de residência para ..., sita na Travessa ..., ... ..., onde actualmente se encontra, desde Dezembro/Janeiro de 2022, ou seja, 3 meses (após articulação com vários elementos da família dos menores, foi referido à ATT de ... que a referida habitação conta com cerca de 20 herdeiros, entre netos e filhos da avó do Sr. CC, sendo que não estão de acordo que o progenitor fique lá a viver).

82 - Trata-se de uma moradia térrea, composta por uma pequena cozinha com mesa de refeições, uma sala de estar, uma casa de banho completa e 3 quartos, sendo que dois deles contam com cama de casal e um com uma cama de solteiro e outra incorporada num gavetão. Os compartimentos primam pela aparente organização e higiene, e dispõe de todos os equipamentos necessários à vida quotidiana, porém, a estrutura necessita de obras de restauro, pois denuncia a idade e grande desgaste pelo tempo. O terreno circundante encontra-se vedado, onde alberga uma cabra e um espaço para a criação de galinhas, uma cozinha, e um local para arrumos e a viatura, conforme informação prestada pela Dr.ª UU, datada de 18/2/2022, após visita efectuada ao local, a que se alude, nomeadamente, na informação da Equipa da Segurança Social de ... de 24/8/2022.

83 - Verificou-se também sucessivas alterações de actividade profissional, e dificuldades no progenitor em dar continuidade ao seu posto de trabalho, garantir a sua frequência assídua e consequentemente obter um rendimento regular e/ou capacidade para fazer face às suas despesas fixas mensais, descrevendo-se que, após consulta ao SISS, se verificou ter exercido actividade:

. Na empresa - B..., Unipessoal Lda., entre outubro e dezembro de 2020, respetivamente, num total de 11, 19 e 22 dias (num total de 3 meses);

. Na Empresa - T... Lda., em Abril e Maio de 2021, tendo somente exercido funções, 15 e 16 dias (num total de 2 meses), tendo a empresa assumido junto da equipa de ATT de ..., que o Sr. CC “entrou de baixa poucos dias depois de iniciar contrato (…) desde meados de Julho que não tentou entregar baixa”;

. Entretanto, após mudança de residência para ..., mais concretamente, a 24 e 30 de Setembro, o Sr. CC informou a Equipa de ATT de ... que teria iniciado actividade por conta própria, pelo que teria arrendado um pequeno espaço, onde dispunha de 3 máquinas de costura, das quais era proprietário, para desenvolver funções na área da confecção têxtil, tendo adiantado o facto de ter procedido à contratação de uma funcionária e assumindo a sua intenção de alargar o negócio, devido ao volume de trabalho.

. Cerca de um mês depois, em novembro de 2021, o Sr. CC reconheceu junto das equipas de ATT, que o seu negócio não estaria a correr conforme expectativas, adiantando pretensão em procurar actividade como trabalhador por conta de outrem durante o dia, tirar o curso de ... pós-laboral na Escola Profissional onde o filho se encontrava matriculado e continuar a realizar como biscates, a produção têxtil em casa aos fins-de-semana;

. Entretanto, em dezembro de 2021, informou da sua decisão de mudança de residência para o Distrito ... e inserção profissional na empresa de limpezas – S... Lda., verificando-se registo de 2 dias de trabalho em novembro, 29,5 dias em dezembro, 23,5 dias em janeiro de 2022 e 18 dias em fevereiro;

. Auferiu remunerações abaixo do SMN entre Novembro de 2021 e Julho de 2022, para a Empresa S... Lda., bem como rendimentos provenientes de prestação de doença/baixa, em Fevereiros (7 dias), Agosto (27 dias) e Setembro (3 dias), o que se confirmou após consulta do Sistema Informático da Segurança Social (SISS), conforme informação da ATT de ... de 24/8/2022.

84 - A Diretora do Departamento de Recursos Humanos da Empresa S... Lda., Dr.ª VV, confirmou a contratação do Sr. CC, pelo período de 30 horas semanais (tendo por vezes ocorrido algumas horas extras quando se justificasse), no horário de trabalho das 17:00H às 23:00H, entre segunda e sexta-feira, e informou que o Sr. CC deixou de pertencer ao quadro da empresa, na sequência do mesmo ter apresentado no dia 12/08/2022, “rescisão de contrato com efeitos imediatos a partir desta data”, desconhecendo os motivos inerentes à sua posição, pese embora posteriormente tivesse enviado situação de baixa médica, conforme informação da ATT de ... de 24/8/2022.

85 - Durante o exercício das suas funções, o progenitor revelou alguma instabilidade emocional, sendo comum apresentar um discurso incoerente em vários momentos “diz uma coisa agora, amanhã diz outra completamente diferente” (sic), ainda conforme informação da ATT de ... de 24/8/2022.

86 - Nos últimos contactos estabelecidos com os filhos/técnicos da Casa de Acolhimento, o progenitor terá partilhado uma experiência nova de trabalho, assumindo exercer funções nos cuidados de higiene de pessoas idosas, ainda conforme informação da ATT de ... de 24/8/2022.

87 - O Sr. CC declarou sempre verbalmente rendimentos provenientes do trabalho acima da média, pese embora nunca tenham sido comprovados os mesmos e/ou suscitando dúvidas entre as várias equipas de acompanhamento sobre a veracidade da sua capacidade económica, uma vez que o discurso/postura do progenitor contradizia sistematicamente as dificuldades assumidas/verificadas, descrevendo-se a título de exemplo: em assegurar o pagamento das suas despesas fixas mensais; com as deslocações para ir ver os filhos às instituições de acolhimento, alegando como principal motivo para não os ir visitar, e atendendo ao facto de ser recorrente assumir junto das equipas não ter ido trabalhar para tratar de assuntos pessoais, verificando-se faltas ao trabalho, diminuição dos seus rendimentos e períodos constantes de desemprego sem direito a subsidio por não completar o período mínimo como requisito para beneficiar desse tipo de prestação social.

88 - O progenitor verbaliza constantes mudanças de discurso, planos, objetivos na sua vida, evidenciando muita instabilidade das suas tomadas de decisão, verificando-se com frequência discursos distintos do progenitor em curtos períodos de tempo, sendo notória a sua dificuldade em cumprir responsabilidades e compromissos a médio/longo prazo. A título de exemplo, refira-se que, no dia 11/11/2021, foi alterada a medida de promoção e protecção aplicada em benefício do JJ (irmão da AA e do BB) de acolhimento residencial para apoio junto do pai, tendo este assumido o compromisso de proceder ao pedido de transferência escolar. No dia 15/11/2021, o progenitor efectuou o pedido de transferência escolar do filho para a Escola Profissional ..., tendo, entretanto, o JJ se despedido de toda a comunidade escolar no dia 22/12/2021, alegando como principal motivo a mudança de residência do progenitor para outro concelho da periferia do .... A situação de absentismo e/ou abandono permaneceu, uma vez que o pai não procedeu à transferência do filho, nem garantiu a sua frequência escola até o mesmo completar os 18 anos.

89 - As visitas do progenitor aos menores na instituição foram semanais no ano de 2019, ascenderam a 6 visitas no ano de 2021, e a 5 visitas no ano de 2022, no período de julho a dezembro, a última no dia 26/8. [Com base na motivação da sentença, esclarece-se que o período de Julho a Dezembro se reporta ao ano 2021]

90 - De acordo com informação partilhada pela Casa de Acolhimento (reportada a inícios de março de 2022), no que toca ao regime de contactos presenciais e/ou alternativos com a família: “O progenitor tem mantido os contactos telefónicos e por videochamadas com regularidade, cumprindo os horários estabelecidos. Contudo, salienta que ultimamente a relação entre o Sr. CC e as crianças tem se demonstrado mais distante, na medida em que estas apenas evidenciam maior interesse nestes contactos quando os irmãos mais velhos (JJ e KK) estão presentes nas videochamadas. As chamadas têm sido mais curtas, não sendo notório um envolvimento emocional positivo tendo em conta que se trata do único contacto, extra Casa de Acolhimento.”

91 - Não existe família alargada que contacte as crianças ou que apresente disponibilidade e idoneidade para acolher as crianças. No relatório social datado de 4/4/2022, a EMAT refere “que caso os menores venham a reintegrar o agregado familiar do pai, existe o risco elevado de voltarem a ser expostos a comportamentos que afetam o seu bem-estar emocional, segurança e saudável desenvolvimento, para além dos exemplos dos irmãos mais velhos apontarem para a grande disfuncionalidade e sofrimento que vão pautando as suas vidas,” emitindo parecer técnico propondo a aplicação da medida de promoção e proteção, em beneficio das crianças AA e BB, de confiança a pessoa selecionada para adoção ou a instituição com vista a adoção.

92 - Por despacho datado de 29/4/2022, os presentes autos foram remetidos para este Juízo de Família e Menores ....

93 - Por despacho de 29/6/2022, foi decidido prorrogar a medida de promoção e proteção de acolhimento residencial aplicada em benefício das Crianças, pelo período de 3 meses, enquanto se procede ao diagnóstico da situação das crianças e à definição do seu encaminhamento subsequente.


IV – Fundamentação de direito

1. Vejamos, separadamente, cada uma das questões suscitadas em sede de recurso a propósito da errada interpretação e aplicação da lei por parte do tribunal recorrido.

A título prévio, e a respeito do invocado pelo recorrente em parte das suas conclusões recursórias, diga-se que a arguida contradição entre a fundamentação – na parte em que, no acórdão recorrido, se escreve que “desde outubro de 2021 que (o progenitor) não faz visitas presenciais” – com o facto provado em 89. – do qual consta que o progenitor fez 5 visitas aos menores no ano de 2022, a última no dia 26 de Agosto – corresponderá apenas a um lapso de escrita manifesto. Mas o que importa salientar é que, atendendo à multiplicidade de factos tidos em consideração pelo tribunal recorrido e à fundamentação aí expendida, a invocada divergência factual – conforme ficará claro ao longo da fundamentação do presente acórdão – não se assume como determinante para a decisão que veio a ser proferida.

Por sua vez, não vemos que exista qualquer contradição apontada entre o que consta da pág. 34 do acórdão – quando se afirma que o recorrente mudou continuamente de residência (o que decorre à saciedade do quadro factual provado, analisado na sua globalidade) – e o facto provado em 82., do qual resulta que desde Dezembro[de 2021]/Janeiro de 2022, o progenitor se encontra a residir numa moradia térrea em ....

Por último, a referência feita ao casamento do progenitor, ora recorrente, que se assume como puramente factual (cf. decorre do facto provado em 72.) e surge contextualizado, de resto, como um facto favorável ao mesmo, por se consubstanciar como um elemento estabilizador na sua vida relacional afectiva, não reveste qualquer cariz discriminatório, susceptível de violar o artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa (CRP).


2. Apreciemos, então, os fundamentos essenciais – confinados às questões de legalidade estrita – que subjazem à discordância, por parte do recorrente, da decisão proferida pelo acórdão recorrido.

2.1. O progenitor recorre da decisão do tribunal recorrido, começando por defender a sua revogação por não estarem reunidos os pressupostos legais da aplicação da medida de confiança com vista à adopção, estatuídos no art. 1978.º, n.º 1, alínea d), do Código Civil e no art. 35.º, n.º 1, alínea g), da LPCJP, alegando, em síntese, que não se mostram comprometidos os vínculos afectivos entre si e os menores.

Segundo o artigo 3.º da LPCJP, justifica-se a intervenção para promoção dos direitos e protecção da criança e do jovem quando este se encontra numa situação de perigo. E isso ocorre quando os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto coloquem em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento. São situações típicas desse perigo, designadamente aquelas em que a criança não recebe a afeição ou os cuidados adequados à sua idade e situação pessoal e está sujeita, de forma directa ou indirecta, a comportamentos que afectem gravemente a sua segurança ou o seu equilíbrio emocional.

De acordo com o preceituado no artigo 38.º-A, alínea b), da LPCJP, a medida de confiança a instituição com vista a futura adopção é aplicável quando se verifique alguma das situações previstas no artigo 1978.º do CC e que consiste na colocação da criança ou jovem sob a guarda de instituições com vista a futura adopção.

Por sua vez, dispõe o artigo 1978.º, n.º 1, do CC, que

O tribunal, no âmbito de um processo de promoção e proteção, pode confiar a criança com vista a futura adoção quando não existam ou se encontrem seriamente comprometidos os vínculos afetivos próprios da filiação, pela verificação objetiva de qualquer das seguintes situações:

a) Se a criança for filha de pais incógnitos ou falecidos;

b) Se tiver havido consentimento prévio para a adopção;

c) Se os pais tiverem abandonado a criança;

d) Se os pais, por ação ou omissão, mesmo que por manifesta incapacidade devida a razões de doença mental, puserem em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento da criança;

e) Se os pais da criança acolhida por um particular, por uma instituição ou por família de acolhimento tiverem revelado manifesto desinteresse pelo filho, em termos de comprometer seriamente a qualidade e a continuidade daqueles vínculos, durante, pelo menos, os três meses que precederam o pedido de confiança.

2. Na verificação das situações previstas no número anterior, o tribunal deve atender prioritariamente aos direitos e interesses da criança.

3. Considera-se que a criança se encontra em perigo quando se verificar alguma das situações assim qualificadas pela legislação relativa à proteção e à promoção dos direitos das crianças.

4. A confiança com fundamento nas situações previstas nas alíneas a), c), d) e e) do n.º 1 não pode ser decidida se a criança se encontrar a viver com ascendente, colateral até ao 3.º grau ou tutor e a seu cargo, salvo se aqueles familiares ou o tutor puserem em perigo, de forma grave, a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento da criança ou se o tribunal concluir que a situação não é adequada a assegurar suficientemente o interesse daquela”.

Conforme decorre da citada norma legal, o pressuposto comum da aplicação da medida de confiança é a inexistência ou o sério comprometimento dos vínculos afectivos próprios da filiação, apresentando-se as hipóteses previstas nas diversas alíneas do n.º 1 como situações meramente indiciárias da sua verificação. No mesmo sentido, vejam-se os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 27-05-2021 (proc. 2389/15.8T8PRT-D.P1.S1) e de 23-06-2022 (proc. n.º 23290/19.0T8LSB.L1.S1), ambos disponíveis em www.dgsi.pt.

Neste sentido, a doutrina maioritária tem vindo a consolidar o entendimento de que não basta concluir-se pela verificação de uma das situações descritas nas diferentes alíneas do n.º 1 do artigo 1978.º do CC; para além disso, haverá que comprovar se as mesmas traduzem, em concreto, inexistência ou sério comprometimento dos vínculos afectivos próprios da filiação. Cfr., v.g., Helena Bolieiro/Paulo Guerra, A Criança e a Família: uma questão de direito(s), 2ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2014, págs. 365-366; Maria Clara Sottomayor, “A nova lei da adopção”, in Direito e Justiça, Vol. XVIII, Tomo II, 2004, págs. 244-247; Francisco Pereira Coelho/Guilherme de Oliveira, Curso de Direito da Família, Vol. II - Direito da Filiação, Tomo I - Estabelecimento da filiação; adopção, Coimbra Editora, Coimbra, 2006, pág. 278; Tomé de Almeida Ramião, A adopção – regime jurídico actual, Quid Juris, Lisboa, 2007, págs. 57-59. Em sentido diverso, considerando que a ocorrência de qualquer das referidas situações faz presumir a inexistência ou comprometimento dos aludidos vínculos, veja-se Beatriz Marques Borges, Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2011, págs. 148 e 171-172.

A propósito da interpretação da norma do artigo 1978.º, n.º 1, alínea d), do Código Civil, escreve-se no referido Acórdão do STJ de 27-05-2021 que a mesma:

“[N]ão exige uma verificação de culpa, de vontade consciente ou de imprevisão censurável, por parte dos progenitores, mas antes uma simples situação de impreparação, de falta de aptidão, de inexistência de possibilidade de simbolizar conscientemente a necessidade de criação de vínculos cuidadores, posto que, antes da idade adulta, o ser humano é totalmente dependente de terceiros para sobreviver.”.

Acrescenta o mesmo Acórdão, com relevância para a apreciação do caso dos autos, convocando o entendimento constante do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27-02-2014 (proc. n.º 1035/06.5TBVFX-A.L1-2), consultável em www.dgsi.pt, o seguinte:

“[A]inda que se considere que o “comprometimento sério dos vínculos afectivos próprios da filiação”, referido no corpo do art. 1978.º, n.º1 CCiv, é o verdadeiro requisito da confiança com vista a futura adopção, apenas indiciado ou presumido pelas previsões das diversas alíneas citadas do normativo, é necessário salientar que esses vínculos afectivos não se constituem como uma abstracção, isto é, “não basta que haja relação afetiva entre pais e filhos, é necessário que esta assuma a natureza de verdadeira relação pai/mãe – filho, com a inerente auto-responsabilização do progenitor pelo cuidar do filho, por lhe dar orientação, estimulá-lo, valorizá-lo, amá-lo e demonstrar esse amor de forma objetiva e constante, de molde que a própria criança encare o progenitor como referência com as referidas caraterísticas; pais são aqueles que cuidam dos filhos no dia a dia, são aqueles que cuidam da segurança, da saúde física e do bem estar emocional das crianças, assumindo na íntegra essa responsabilidade” [negrito nosso].

Ora, o acórdão recorrido entendeu estar demonstrada a verificação da inexistência ou sério comprometimento dos vínculos próprios da filiação, apresentando a seguinte conclusão após apreciação exaustiva das vicissitudes ocorridas ao longo do presente processo de promoção e protecção:

“É particularmente relevante a circunstância de ao progenitor terem sido dadas várias oportunidades para assumir uma paternidade responsável e a responsabilidade pela criação de condições para assegurar a confiança destes (factos dos pontos 9, 15, 16 e 22), os quais apenas lhe foram retirados e colocados em acolhimento residencial quando se apurou «que as crianças não podem ficar entregues aos cuidados do progenitor, porquanto este não é capaz de assegurar as mais elementares necessidades daqueles, colocando em perigo a integridade e desenvolvimento integral destas crianças».

Esse acolhimento ocorreu quando a AA tinha sensivelmente ano e meio de idade e o BB quase quatro anos de idade. Dada a idade que os menores tinham nessa altura, os mais de três anos que já dura esse acolhimento na instituição, os escassos e sucessivamente menores convívios ou contactos com o pai, a praticamente absoluta inexistência de contactos com a progenitora durante esse período, a inexistência de alternativas na família alargada de qualquer dos progenitores, é fácil de constatar, atenta a idade dos menores, as etapas em que se divide o seu crescimento e a caracterização destas, não custa concluir que entre os menores e a sua família biológica não existem já os vínculos afectivos fortes que são próprios de uma família.”. [negrito nosso]

Do exposto, resulta manifesto que o tribunal recorrido subsume a situação de facto aos requisitos legais formalmente consagrados no art. 1978.º do CC, discorrendo de forma fundamentada acerca da inexistência ou o sério comprometimento dos “vínculos afetivos próprios da filiação”.

E, sopesados os factos apurados e acima transcritos, não vemos como não concluir que os mesmos integram a previsão da alínea d) do n.º 1 e do n.º 3 do art. 1978.º do CC, com referência ao artigo 3.º, n.º 2, alíneas c) e f), da LPCJP, não se descortinando qualquer erro na interpretação e aplicação destes preceitos legais por parte do tribunal recorrido.

Saliente-se que, para se aquilatar da vinculação afectiva, é absolutamente essencial perscrutar o modo como o progenitor se relaciona com os menores, a forma como compreende as suas necessidades desenvolvimentais físicas, sociais, cognitivas e afectivas e a forma como consegue colocar as necessidades das crianças à frente dos seus próprios interesses, sacrificando estes e dando prioridade àqueles.

E, a este propósito, dos factos recentes com maior relevo para o caso, constata-se o seguinte:

- O presente processo de promoção foi instaurado logo após a AA nascer e quando o BB tinha 2 anos de idade (cf. factos 1. e 3.);

- Foi primeiramente aplicada a medida de apoio junto do pai, medida que foi sucessivamente prorrogada, tendo, em 02-08-2019, sido aplicada a medida de promoção e protecção de acolhimento residencial em instituição por se constatar que o pai deixava as duas crianças menores (sendo AA ainda um bebé de um ano de idade), bem como o seu outro filho JJ, sozinhos em casa (cf. factos 9., 15., 16., 22. e 24.);

- Durante o período de institucionalização, o progenitor mudou de residência várias vezes e continuou a desempenhar vários trabalhos profissionais por curtos períodos de tempo e teve, como foi pelo próprio assumido, vários relacionamentos afectivos diferentes, expondo os filhos aos mesmos (cf. factos 29., 30., 40. a 42., 49., 55. a 57., 62., 66., 70., 72., 74., 75., 81., 83., 84. e 86.);

-  Em 03/03/2021 foi autorizado o convívio das crianças com o pai aos fins de semana e férias lectivas, medida que foi, porém, suspensa em 09/07/2021, em virtude de a EMAT e a Casa de Acolhimento terem partilhado preocupação com o bem-estar dos menores tendo em conta o exposto pela irmã do progenitor (cf. facto 56.) e o relatado pelos menores (cf. factos 58. e 61.), sendo que, nessa data, o progenitor apresentava já cinco rendas em atraso e apresentava dívidas quanto ao pagamento das despesas mensais com água, luz e gás (cf. facto 60.);

- No dia 11/11/2021, foi alterada a medida de acolhimento residencial do filho JJ do ora recorrente, que passou a beneficiar da medida de apoio junto do pai; nesse período, o progenitor mudou mais uma vez de residência e não acautelou a frequência escolar do filho JJ (cf. facto 75.); o mesmo sucedeu com a filha mais velha do ora recorrente, KK (cf. facto 71);

- As visitas do progenitor aos menores na instituição foram semanais no ano de 2019, 6 visitas no ano de 2021 e 5 visitas no ano de 2022, a última em 26-08 (cf. facto 89.);

- O progenitor encontra-se, desde Dezembro [de 2021]/Janeiro de 2022, a viver numa moradia térrea em ..., havendo informação de que a referida habitação tem cerca de 20 herdeiros, os quais não estarão de acordo em que o mesmo lá permaneça a viver (cf. facto 81.);

- O progenitor continua a apresentar instabilidade profissional, tendo rescindido, em 12/08/2022, o contrato de trabalho que havia celebrado com a empresa S..., Lda. (cf. facto 84.);

- Não existe família alargada que contacte ou que apresente disponibilidade para acolher as crianças (cf. facto 91).

Ora, esta matéria de facto, que foi exaustivamente avaliada pela Relação, associada aos relatórios que se mostram juntos aos autos, que servem de prova instrumental, revela que o progenitor ainda não reúne condições para suportar as responsabilidades relativamente a qualquer dos menores.

O período de tempo entretanto decorrido – cerca de 4 anos – revela, por sua vez, de forma cabal, a necessidade de se adoptar uma medida que, ultrapassando as anteriores tentativas de apoio junto do pai com vista à aquisição de competências parentais, avance no sentido da estabilização do futuro dos menores que apenas é proporcionada, in casu, pela medida de confiança com vista a futura e eventual adopção.

Perante o exposto, não encontra o menor fundamento a alegação do progenitor de que não está legitimada a conclusão de que os menores se encontram numa situação de perigo e de que a decisão não encontra respaldo no artigo 1978.º, n.º 1, alínea d), do Código Civil.

São relevantes, neste contexto, os considerandos expostos, a respeito de uma situação fáctica com paralelismo com a dos presentes autos, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18-10-2018 (Proc. n.º 533/14.1TBPFR.P2.S1), disponível em www.dgsi.pt:

“Nenhuma das normas por que se regem os processos de promoção e de proteção de menores em situação de risco pode ser interpretada de modo a converter-se em obstáculo à realização dos superiores interesses das crianças que é o objetivo final desses processos, não estando afastada, mesmo nestes casos, a ponderação das vantagens e dos inconvenientes que estariam associados a mais um recuo do processo, com dilação ainda mais longa de uma solução que definitivamente possa pôr fim aos “sinais de sofrimento” que evidenciam e à situação de carência afetiva individualizada.”

“A este respeito verificamos que todos os menores se encontram internados numa instituição há mais de 3 anos, sendo pouco frequentes os contactos com os progenitores (…).”

“Os progenitores apresentam como única alternativa a de os menores continuarem submetidos à medida de acolhimento institucional, enquanto estes estão a “evidenciar sinais de sofrimento, com manifestações físicas e emocionais decorrentes do impacto da institucionalização prolongada”, mostrando-se “extremamente carentes de atenção individualizada, sendo bastante recetivos, correspondendo à troca de afetos com outras figuras de referência na CA”.

“Todas estas circunstâncias – e especialmente esta última - tornam desnecessária mais uma diligência que, a ser decretada, obrigaria a que o processo retomasse a tramitação na 1ª instância, com arrastamento, ainda mais longo e grave, da situação em que os menores se encontram, sendo premente, isso sim, que se encontre uma solução que defina o seu futuro e evite o prolongamento da situação de acolhimento institucional que, independentemente da qualidade dos serviços, não constitui para nenhuma criança uma solução que deva eternizar-se.”

“Se nestes últimos quatro anos em que está pendente o processo judicial o futuro das crianças tem estado em suspenso, a verdade é que o relógio biológico está em constante movimento, urgindo que se encontre uma solução estável enquanto a idade dos menores ainda o permitir, a qual passará pela passagem a uma outra importante fase, qual seja, a da confiança dos menores com vista à sua futura (e eventual) adoção.”

Secundamos tais considerações, que são integralmente transponíveis, com as devidas adaptações quanto a alguns dados de facto, para o caso sob escrutínio.

Assim, tal como decorre da motivação do acórdão recorrido, considera-se não merecer censura o entendimento do tribunal a quo, segundo o qual, a única medida adequada, que respeita os direitos da AA e do BB, e alcança o seu superior interesse é a medida de confiança a instituição com vista a futura adopção, uma vez que estão irremediavelmente comprometidos os vínculos afectivos próprios da filiação – que, como já salientado, não se basta com a demonstração de interesse por parte do progenitor ou da existência de uma relação afectiva com os menores –, intercedentes entre estas crianças e o progenitor, não se antevendo como provável que este venha a adquirir, em tempo útil, como não adquiriu nos últimos quatro anos desde que foi instaurado o processo de promoção e protecção, as capacidades parentais necessárias a garantir o desenvolvimento psico-afectivo destas crianças. E a alternativa à medida ora aplicada não pode ser o prolongar da institucionalização dos menores. Neste sentido, a respeito de uma situação com contornos similares aos do caso sub judice, ver o recente Acórdão deste Supremo Tribunal de 10/11/2022 (proc. n.º 1455/20.2T8GDM.P1.S1), ainda não publicado.

Saliente-se que esta medida tem como finalidade primeira a defesa das crianças, evitando que se prolonguem situações em que os menores sofram as carências derivadas da ausência de uma relação familiar com um mínimo de qualidade, visando criar as condições para que, em tempo útil – atendendo ao “tempo da criança” – se encontre um projecto de vida que permita o seu integral desenvolvimento. Que permita, finalmente, que a AA e o BB possam ser felizes.

Termos em que, tudo visto e ponderado, se conclui que o interesse destes menores impõe, por verificação da previsão do artigo 1978.º, n.º 1, alínea d), e do n.º 3, do Código Civil, que se lhes aplique, a seu favor, a medida de promoção e protecção de confiança com vista a futura adopção, prevista no art. 35.º, n.º 1, alínea g), da LPCJP.

2.2. O recorrente invoca ainda a violação, por parte do acórdão recorrido, do disposto nos artigos 6.º, n.º 1, 8.º, e 13.º, da CEDH e dos artigos 8.º, 9.º, 16.º e 20.º da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, alegando que a decisão proferida constitui ingerência não justificada, não proporcional, nem necessária num Estado de Direito Democrático, no âmbito de um processo judicial que não considera justo e equitativo, entendendo ter sido postergada a observância dos princípios da protecção da vida familiar e da manutenção da família biológica

Neste âmbito, importa começar por dizer que o progenitor, apesar de invocar a violação do artigo 6.º, n.º 1, da CEDH – referente ao direito a um processo equitativo – acaba por não referir em que se traduziu essa violação na tramitação processual concretamente em causa. Considerando que o recorrente foi sempre ouvido ao longo do processo e que ao mesmo foram dadas várias oportunidades para adquirir as competências parentais necessárias para reverter a institucionalização dos menores, não se vê que tenha existido, no caso, preterição do direito ora invocado. O mesmo se diga quanto à invocação da violação do artigo 13.º da CEDH, que prevê o direito a um recurso efectivo.

Quanto ao artigo 8.º da CEDH, o mesmo consagra o direito ao respeito pela vida privada e familiar, referindo-se, em particular, à “proibição de ingerência da autoridade pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança pública, para o bem - estar económico do país, a defesa da ordem e a prevenção das infracções penais, a protecção da saúde ou da moral, ou a protecção dos direitos e das liberdades de terceiros”.

Às normas da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança invocadas pelo recorrente também subjazem os princípios do superior interesse da criança, da intervenção mínima, da protecção da vida familiar e da manutenção da família biológica. Princípios estes que encontram, por sua vez, respaldo no direito interno nos artigos 36.º, n.º 6, e 69.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e no artigo 4.º, alíneas a), d), e) e h), da LPCJP.

O princípio da intervenção mínima, que não é mais do que uma concretização do princípio da proporcionalidade, significa que não devem ser aplicadas medidas que não sejam indispensáveis à efectiva promoção dos direitos e à protecção da criança.

Em relação ao princípio da protecção da vida familiar e sua conjugação com o princípio da manutenção da família biológica, consideremos a fundamentação do acima referido Acórdão do STJ de 10/11/2022 (proc. n.º 1455/20.2T8GDM.P1.S1):

A salvaguarda do superior interesse da criança deve obedecer ao princípio da prevalência da família, mas no sentido lato, que abarca a prevalência das medidas que a integrem em família, quer na sua família biológica, quer promovendo a sua adoção ou outra forma de integração familiar estável, a par dos princípios da indispensabilidade, da proporcionalidade, da actualidade e da necessidade da intervenção precoce (cf. art. 4° al. a), c), d), e) e h) da Lei nº 47/99 de 1/9].

O primado do interesse das crianças constitui um princípio fundamental de Direito da Família e das Crianças consagrado no Direito Internacional (artigo 3.° da Convenção das Nações Unidas sobre os direitos das crianças) e no Direito da União Europeia (artigo 24.°, n.° 2, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia).

No direito nacional, a Constituição, apesar de não se referir expressamente a tal princípio, consagra direitos fundamentais específicos das crianças, designadamente o direito da criança ao desenvolvimento integral, onde se insere o direito à manutenção das suas relações afetivas profundas (artigo 69.°, n.° 1, da CRP), como tem sido entendimento da doutrina (cfr. Armando Leandro, "Direito e Direitos dos Menores, síntese da situação em Portugal, no domínio do direito civil e no domínio do direito para-penal e penal", Infância e Juventude, n.° especial, 1997, p. 263 e Dulce Rocha, "Adopção - consentimento - conceito de abandono", Revista do Ministério Público, Lisboa, A.230, n°92 (Out.-Dez.2002), pp. 98 e 107)

A família é o lugar, por natureza e por excelência, do afecto e do amor, onde por todos os seus elementos, avós, pais, filhos e irmãos, vivem e partilham os sonhos, as tristezas e as alegrias, os sucessos e as desventuras.

A primazia da integração familiar das crianças (prevalência da família) afirma-se como modo de exercício do direito/dever de providenciar pelo normal desenvolvimento, formação, educação e manutenção dos filhos, assim se observando e cumprindo o princípio constitucional ínsito no art. 37° da CRP, segundo o qual "os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos" e "os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial".

Contudo, este princípio da prevalência da família, em ordem à satisfação do interesse superior da criança, pode ter ou terá de ceder quando se configurar uma situação em que os progenitores, por acção ou omissão dos pais, colocam em causa e fazem perigar a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o são desenvolvimento da criança, que assim fica posto em perigo.

É unânime a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça no sentido de que a salvaguarda do superior interesse de uma criança em situação de perigo deve obedecer ao princípio da prevalência da família (entre outros os Ac. de 13/10/2020, no processo 1397/16.6T8BCL.GI.S2, de 16/12/2020 no processo 1210/17.7T8CSC.L2.S1, de 29/10/2020, no processo 634/09.8TBPVZ-B.P1 .SI e de 14/07/2021, no processo 1906/20.6T8VCT.G1.S1).

Este princípio da prevalência da família encontra-se desenhado de harmonia com o art. 9º da Convenção sobre os Direitos das Crianças (adoptada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 20 de Novembro de 1989 e ratificada por Portugal em 21 de Setembro de 1990), que preceitua que "Os Estados Partes garantem que a criança não é separada dos seus pais contra a vontade destes, salvo se as autoridades competentes decidirem, sem prejuízo de revisão judicial e de harmonia com a legislação e o processo aplicáveis, que essa separação é necessária no interesse superior da criança. Tal decisão pode mostrar-se necessária no caso de, por exemplo, os pais maltratarem ou negligenciarem a criança ou no caso de os pais viverem separados e uma decisão sobre o lugar da residência da criança tiver de ser tomada."

Tal decorrendo também do n° 6 do art. 36° da CRP, que admite expressamente a aplicação da medida estadual, particularmente gravosa, consubstanciada na separação dos filhos daqueles, embora impondo que se verifique a especial justificação do não cumprimento pelos pais dos seus deveres "fundamentais" para com os filhos, ainda que a título de negligência" e a reserva de jurisdição, "sempre mediante decisão judicial".

Das expostas exigências constitucionais decorre, com clareza, que, sendo o interesse superior da criança o critério norteador que deve presidir a toda e qualquer decisão do tribunal em matéria de promoção e proteção, deve esse critério colocar-se acima dos direitos e interesses dos pais quando estes sejam conflituantes com os do seu próprio filho.

Impõe o princípio do superior interesse da criança que no caso de a criança se encontrar colocada em perigo pela sua própria família biológica, nomeadamente pelos seus progenitores, sejam decretadas medidas de proteção que visem a sua segurança e saúde junto de uma terceira pessoa, seja junto de outro familiar ou de confiança a pessoa idónea, tendo em vista, quando a família se revelar impotente para cuidar da criança com carácter duradouro, afastando-a da situação de perigo, que a criança venha a ser confiada tendo em vista futura adopção, por esta via também se privilegiando o princípio da prevalência da família, agora adoptiva.

Neste sentido se pronunciando também com unanimidade, este Supremo Tribunal de Justiça, entre outros, nos Acórdãos de 14/07/2016 no processo 8605/13.3TBCSC.L1 .SI, de 18/10/2018 no processo 533/14.1TBPFR.P2.S1, de 30/04/2020 no processo 2353/19.8T8BRG.GI.S1, de 25/09/2018 no processo 20085/16.7PRT.P1.S1.S1.S1, de 13/10/2020 no processo 1397/16.6T8BCL.G 1 .S2, de 09/02/2021 no processo 211/20.2T8STC.EI.S1 e de 19/10/2021 no processo 686/18.0T8PTG-A.E1.S1.”  [negritos nossos]

Tendo presentes estes princípios, a que a motivação da decisão alude expressamente, o tribunal da Relação concluiu no sentido de que o progenitor pouco ou nada fez no sentido de organizar e estabilizar a sua vida pessoal, profissional e afectiva, de modo a poder acolher os menores na sua casa e proporcionar-lhes a segurança devida, razão pela qual não pode ser visto como uma alternativa viável à institucionalização.

Perante o quadro factual dado como assente, não vemos que a decisão da Relação se mostre desproporcional ou violadora do princípio da prevalência da família.

Com efeito, de modo algum se pode considerar, neste caso, violado o princípio da proporcionalidade, decorrido que está um largo período que se traduziu em apoio junto do pai e em acolhimento institucional dos menores, com simultânea tentativa de reforço das capacidades do progenitor, que se mostrou insuficiente ou infrutífera.

Igualmente cede a alegação de que sai violado o princípio da responsabilidade parental e da prevalência da família. Contrariamente ao que afirma o progenitor, a matéria de facto apurada revela à exaustão a sua incapacidade para, neste momento, prover aos cuidados básicos dos menores, de forma autónoma, sendo que resultaram fracassadas todas as tentativas no sentido de ganhar competências parentais, que revelou não possuir desde que se iniciou a intervenção junto da família. A situação ocorrida com o seu filho JJ é, a esse propósito, esclarecedora e não permite que se possa firmar um juízo de prognose positiva em matéria de aquisição de competências parentais consistentes e estruturadas.

É certo que, a este propósito, o recorrente alega, porém, que não se acha demonstrada na decisão ora recorrida a existência de comportamentos negligentes em relação aos cuidados devidos aos filhos menores de higiene, saúde, alimentação, habitação e educação (cf. conclusão 27) e, bem assim, que não estão em causa situações de violência ou de maus tratos em relação às crianças, abusos sexuais, carências afectivas ou estado de saúde preocupante (cf. conclusão 29).

Ora, quanto a esta concreta alegação, é importante começar por referir que por maus tratos não se entende só a agressão física ou psicológica, mas também “o insucesso na garantia do bem-estar material e psicológico da criança, necessário ao seu desenvolvimento saudável e harmonioso” (Paula Cristina Martins, “Sobre a Convenção dos Direitos da Criança. Da psicologia dos direitos aos direitos da psicologia”, apud Gustavo Ferraz de Campos Mónaco, A Declaração Universal dos Direitos da Criança e seus Sucedâneos Internacionais, Coimbra Editora, Coimbra, 2004, pág. 152).

Não é, pois, necessário que se comprovem situações de gravidade extrema para se justificar a retirada definitiva de uma criança aos seus progenitores. A comprovada incapacidade, ao longo de um período de tempo considerável (4 anos), como sucedeu no caso dos autos, de criar uma estrutura parental equilibrada e consistente de modo a prover as necessidades de duas crianças tão pequenas (que eram deixadas ao abandono em casa e que eram expostas a comportamentos agressivos), a que se alia o enfraquecimento dos vínculos afectivos que são próprios de uma família, é também legitimadora da aplicação da medida de promoção e protecção de confiança com vista a futura adopção, desde que verificados os demais pressupostos legais.

No caso concreto, o que resultou provado é que a única alteração relevante da situação do progenitor prende-se com a composição do seu agregado familiar. As demais vulnerabilidades que interferem com o exercício da parentalidade e que motivaram a institucionalização dos menores mantiveram-se, com a agravante de terem diminuído substancialmente os contactos presenciais com os menores ao longo dos anos.

Não basta, pois, que o progenitor mostre interesse ou preocupação pelo bem estar dos filhos; era necessário que um tal interesse se tivesse materializado em mudanças estruturais e positivas na sua vida, o que, pese embora o tempo decorrido, não veio a ocorrer. Conforme realçado no Relatório Social de 04/04/2022, o progenitor evidencia ainda muita instabilidade nas suas tomadas de decisões, sendo notória a sua dificuldade em cumprir com as suas responsabilidades e compromissos a médio e longo prazo.

Esta inconstância continua, pois, a colocar em perigo o bem-estar, a educação, formação e desenvolvimento dos filhos, devido ao impacto que tem na vida destes últimos.

Assim sendo, como se escreve no acórdão recorrido, numa fundamentação que se secunda: 

“[N]ão só não existem razões para crer no contrário, como existem fundadas razões para crer que a confiança dos menores AA e BB ao progenitor os manterá em situações de risco e não lhes proporcionará de modo algum a estabilidade, o cuidado, a atenção, a afetividades e dedicação que são indispensáveis para que cresçam de forma saudável e alcancem um desenvolvimento integral.”.

Perante o que se deixa dito, não se vê, assim, de que forma é que os direitos fundamentais do progenitor, nos termos do preceituado nos artigos 18.º, 26.º e 36.º da CRP, se mostram violados; nem assim os princípios que vem invocar e que têm acolhimento no artigo 8.º da CEDH e nos artigos 8.º, 9.º, 16.º e 20.º da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança.

Saliente-se, neste contexto, que a alternativa à medida de promoção e protecção com vista à adopção seria, neste momento, a de os menores continuarem submetidos à medida de acolhimento institucional, o que implicaria um arrastamento, ainda mais longo e grave, da situação em que os menores se encontram. Uma tal solução é que se mostra, quanto a nós, desproporcional e atentatória dos direitos fundamentais e do interesse superior destas crianças.

Pelo contrário, afigura-se urgente que se encontre uma solução que evite o prolongamento da situação de acolhimento institucional.

Do exposto, resulta manifesto que o tribunal recorrido subsumiu correctamente a situação de facto aos pressupostos legais formalmente consagrados no artigo 1978.º do Código Civil e demais preceitos aplicáveis, não se descortinando qualquer erro na interpretação e aplicação de tais normas nem a violação de nenhum dos princípios gerais norteadores da aplicação de medidas de promoção e protecção invocados pelo recorrente.

Ponderando, pois, tudo quanto aí se discorre, conclui-se que efectivamente, conforme ajuizado pelo Tribunal da Relação, o interesse da AA e do BB impõe, por verificação da previsão do artigo 1978.º, n.º 1, alínea d), e n.º 3, do Código Civil, que se lhes aplique, a seu favor, a medida de promoção e protecção de confiança com vista a futura adopção, prevista no artigo 35.º, n.º 1, alínea g), da LPCJP, medida que se revela proporcional e adequada nos termos fundamentados no acórdão recorrido.


V – Decisão

Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente, confirmando-se a decisão do acórdão recorrido.

Custas pelo requerido sem prejuízo do benefício apoio judiciário concedido.


Lisboa, 2 de Fevereiro de 2023


Maria da Graça Trigo (Relatora)

Catarina Serra

Paulo Rijo Ferreira