Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
281/20.3T8LRA.C1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: CARLOS PORTELA
Descritores: RECURSO DE REVISTA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
REVISTA EXCECIONAL
CONTRADIÇÃO DE JULGADOS
IMPUGNAÇÃO PAULIANA
INDEFERIMENTO
DOAÇÃO
CADUCIDADE DA AÇÃO
PRAZO DE PRESCRIÇÃO
Data do Acordão: 05/15/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: INDEFERIDA
Sumário :
I. Nos casos em que há lugar ao recurso de revista nos termos gerais, falta necessariamente o pressuposto da admissibilidade do art.º 629º, nº2, alínea d) do CPC.

II. A apreciação da contradição de julgados apenas é possível se tiver sido interposto recurso de revista por via excepcional, ao abrigo do disposto na alínea c) do nº1 do art.º 672º do CPC, cabendo à Formação apreciar da sua admissibilidade.

Decisão Texto Integral:

Acordam em Conferência no Supremo Tribunal de Justiça


I. Relatório:

A Autora, Atlanticofra, Lda., instaurou a presente acção de impugnação pauliana contra os Réus AA e mulher, BB e CC, pedindo na respectiva procedência, a impugnação da doação, mediante declaração de ineficácia em relação à Autora, da doação feita pelos 1ºs Réus em 17/04/2013 a favor do 2º Réu dos bens descritos no art.º 9º da petição inicial, bem como da constituição do usufruto vitalício, com a restituição dos imóveis objecto de doação à esfera patrimonial dos 1ºs Réus, para que se possa ressarcir à custa dos mesmos.

Na sua contestação, o 2º Réu veio arguir a excepção de caducidade do direito invocado pela Autora, nos termos do art.º 618º do Código Civil, alegando, em síntese, que a presente acção foi instaurada decorridos mais de 5 anos para além do prazo em que o poderia fazer, mais concretamente 1 ano, 9 meses e 5 dias para além desse prazo, pois que entre 17/04/2013 e 22/01/2020 decorreram 6 anos, 9 meses e 5 dias; e que ainda que assim não se entenda, e mesmo que a Autora se pretenda prevalecer do facto de ter instaurado, em 03/04/2018, uma acção idêntica à dos presentes autos, que correu termos com o nº 1278/18.9...-J... no Juízo Central Cível da Comarca de Leiria, tal acção veio a ser julgada deserta, devido à inércia injustificada e negligente da Autora, por despacho datado de 14/01/2020.

A Autora, em resposta, concluiu pela improcedência da excepção de caducidade, alegando, em suma, que a primeira acção foi interposta 14 dias antes de decorrido o prazo de prescrição de cinco anos; que a propositura dessa acção interrompeu o prazo referido, iniciando-se a contagem de novo prazo, pelo que, quando foi julgada deserta, não se encontrava esgotado o novo prazo prescricional, nem se esgotava nos dois meses seguintes ao do seu trânsito; e que, ainda que se entenda de forma diversa, tendo a primeira acção sido intentada nos 14 dias antes de decorrido o prazo de prescrição, mesmo considerando os cinco dias para citação, sempre teria sido interposta a 9 dias do termo do prazo prescricional; ora, tendo a A. sido notificada do despacho de deserção da instância no dia 20/01/2020, e tendo instaurado a presente acção nos dois dias após a respectiva notificação, fê-lo no prazo de 9 dias remanescente, após a interrupção.

Tramitados os autos proferiu-se decisão onde se julgou procedente a excepção peremptória de caducidade invocada pelo 2º Réu na sua contestação e se absolveram, todos os Réus dos pedidos deduzidos pela Autora.

Interposto recurso de apelação desta decisão, a Relação proferiu decisão na qual negou provimento ao recurso e confirmou a decisão proferida.

Notificado desta decisão veio a Autora interpor recurso de Revista para o Supremo Tribunal de Justiça.

Perante tal pretensão, foi proferida decisão singular na qual e como se pode verificar da consulta dos autos, se considerou que não estava verificada a alegada contradição de decisões que pudesse justificar o recurso de revista, concluindo-se assim pela não admissibilidade da revista.

Notificada desta decisão veio a Autora reclamar para a conferência nos termos do disposto no nº3 do art.º 652º do CPC.

O Réu CC, veio responder ao requerido, defendendo a improcedência da reclamação apresentada.

II. Enquadramento jurídico:

Vejamos, pois.

Resulta claro estarmos, na hipótese dos autos, perante uma acção comum na qual haveria lugar a revista nos termos gerais (cf. o nº1 do art.º 629º do CPC).

A ser deste modo não se pode ter como verificado o pressuposto da admissibilidade previsto no art.º 629º, nº2, alínea d) do CPC.

Mesmo assim na Relação o recurso foi admitido como sendo de revista excepcional (cf. despacho proferido a 28.01.2025, com a referência ......49).

De todo o modo e consultadas as alegações de recurso verifica-se que o recurso não foi interposto como revista excepcional, mas sim ao abrigo do disposto no art.º 629º, nº2, alínea d) do CPC (cf. documento com a Referência ......69).

Ora é consabido que a contradição de julgados só poderia ser objecto de apreciação na hipótese da revista ter sido interposta pela via do recurso excepcional e ao abrigo das regras previstas na alínea c) do nº1 do art.º 672º do CPC, cabendo à Formação – e não a este colectivo – apreciar da sua admissibilidade.

Estamos pois, perante aqueles casos em que importa conciliar as regras previstas no art.º 629º, nº2, alínea d) com as previstas no art.º 672º do CPC (a este propósito cf. o acórdão do STJ de 26.11.2019, no processo 1320/17.0T8CBR-C1-A.S1, em www.dgsi.pt).

Em suma e pelas razões expostas, impõe-se concluir que no caso não estão preenchidos os requisitos do art.º 629º, nº2, alínea d) do CPC.

Nestes termos, impõe-se confirmar a decisão do Relator, no sentido da não admissibilidade da revista aqui interposta.


*


III. Decisão:

Pelo exposto, acorda-se em indeferir a reclamação e confirmar a decisão reclamada.


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Custas a cargo da Autora (cf. art.º 527º, nºs 1 e 2 do CPC).

Lisboa, 15 de Maio de 2025

Relator: Carlos Portela

1ª Adjunta: Maria da Graça Trigo

2ª Adjunta: Ana Paula Lobo