Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
134/21.8JELSB.L1.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: ORLANDO GONÇALVES
Descritores: RECURSO PER SALTUM
TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES
ATENUAÇÃO ESPECIAL
MEDIDA CONCRETA DA PENA
Data do Acordão: 03/24/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
I - Quando o legislador dispõe sobre a moldura penal para um certo tipo de crime, prevê as diversas modalidades e graus de realização do facto, desde os da menor até aos da maior gravidade pensáveis, de modo que, em todos os casos, a aplicação da pena concretamente determinada possa corresponder ao limite da culpa e às exigências de prevenção.
Quando, em hipóteses especiais, existem circunstâncias que diminuam de forma acentuada as exigências de punição, relativamente ao complexo “normal” dos factos visados pela moldura penal, o legislador procedeu à substituição dessa moldura penal por outra menos severa. Para além de outros casos, expressamente previstos na lei de atenuação especial da pena, o legislador, consagrou, na parte geral do Código Penal, uma cláusula geral de atenuação especial da pena, nos seus arts. 72.º e 73.º.
II - A jurisprudência tem sido exigente na aplicação do art. 72.º do CP, limitando a atenuação especial da pena a casos extraordinários ou excecionais de acentuada diminuição da ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.
III - Uma vez que a atenuação especial só em casos extraordinários ou excecionais pode ter lugar, pois para a generalidade dos casos, para os «casos normais», lá estão as molduras penais normais, com os seus limites máximo e mínimo próprios, e no presente caso não se vislumbram acentuadas circunstâncias atenuantes da responsabilidade do arguido ao nível da ilicitude, da culpa ou da necessidade da pena que levem ao abaixamento da pena abstrata prevista no crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1 do DL n.º 15/93, de 22-01, com referência à Tabela I-B anexa ao citado diploma, o STJ entende que bem andou o tribunal recorrido ao não fazer uso da atenuação especial da pena a que aludem os arts. 72.º e 73.º do CP.
IV - O STJ vem afirmando, repetidamente, que os “correios de droga” são uma peça fundamental no tráfico de estupefacientes concorrendo, de modo direto, para a sua disseminação, pelo que não merecem um tratamento penal de favor.
V- Dos padrões sancionatórios da jurisprudência suprarreferida, em que se tem em consideração a quantidade de cocaína apreendidas aos “correios de droga”, constata-se que são aplicadas, geralmente, penas de prisão que variam entre os 5 anos e os 5 anos e 6 meses de prisão por transporte de quantidades bem inferiores às que estão aqui em causa, pelo que não se pode concluir, como pretende o recorrente, que a sua condenação, numa pena de 6 anos de prisão, pelo tráfico de cerca de 6 kg de cocaína, com uma pureza entre 28,4% e 33,4%, configura “uma gritante injustiça.
Decisão Texto Integral:


Proc. n.º 134/21.8JELSB.L1.S1

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Acordam, em Conferência, na 5.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça.

                                                                                                  

I - Relatório

1. Nos autos de processo comum coletivo n.º 134/21...., que correm termos no Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo Central Criminal ... - Juiz ..., foi submetido a julgamento, sob acusação do Ministério Público, o arguido AA, devidamente identificado, imputando-se-lhe a prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1, por referência à Tabela I-B, do DL 15/93, de 22.01, tendo o Ministério Público requerido, ainda, a aplicação ao arguido da pena acessória de expulsão do território nacional, nos termos disposto no artigo 34.º do DL 15/93, de 22.01 e 134.º, n.º 1, als. e) e f), 140.º, n.º 2 e 151.º, todos da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho.

2. Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal Coletivo, por acórdão proferido a 9 de dezembro de 2021, julgou a acusação procedente e, em consequência, decidiu, além do mais:

- Condenar o arguido AA pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1 do DL nº 15/93, de 22.01, com referência à Tabela I-B anexa ao citado diploma, numa pena de seis anos de prisão; e

- Determinar a aplicação ao arguido AA da sanção acessória de expulsão

do território nacional ao arguido, nos termos do disposto no artigo 34.º, nº 1 da Lei nº 15/93, de 22.01, pelo período de seis anos.

3. Inconformado com o acórdão dele interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça o arguido AA, concluindo a sua motivação do modo seguinte (transcrição):

1. O Recurso, ora interposto, tem por Objecto a Matéria de Direito circunscrevendo-se à Atenuação Especial da Pena e à Medida Concreta da Pena, aplicada ao Recorrente pelo Distinto Colectivo que compôs o Tribunal a quo e ad cautelum à (eventual) Suspensão da Execução da Pena que os Colendos Juízes Conselheiros venham, in concreto, a considerar Justa.

2. O Recorrente chegou a Julgamento acusado da prática, em autoria material e na forma consumada, de Um (01) Crime de Tráfico de Produtos Estupefacientes, previsto e punido pelo Artigo 21.º, N.º 1 do Decreto-Lei N.º 15/93 de 22 de Janeiro com referência à Tabela I-B do mesmo Diploma.

3. Efectuado o Julgamento e produzida a Prova que suportava a querela do Ministério Público, e também a que abonava o seu carácter, optou o Recorrente por - manifesta vergonha e arrependimento do que havia perpetrado – dar palavra ao que de mal fez e que o Acusador lhe imputava, confessando a totalidade das factualidades.

4. Com essa postura deu sinais objectivos de forte e sincero arrependimento de tudo o que fez e o levou a Julgamento.

5. Em sede de Acórdão veio o Recorrente a ser condenado - pela prática de Um Crime de Tráfico de Estupefacientes previsto e punido pelo Artigo 21.º, N.º 1, do Decreto-Lei N.º 15/93, de 22 de Janeiro, por referência à Tabela I-B – na Pena de Seis anos de prisão.

6. Ora acontece que, salvaguardado o devido respeito o Tribunal a quo ao aplicar Seis anos de Prisão ao Recorrente como Pena deu mostras de, nesse Juízo, ter descurado o critério de determinação da Pena.

7. Advindo desse Douto Juízo uma manifesta desconformidade com a Prova produzida em Audiência de Julgamento e com as próprias Regras da Experiência, em bom rigor e no caso concreto, o Tribunal a quo decidiu, em parte, contra o que se provou e não provou, dando, por conseguinte, como provados factos cuja ressonância permitem uma valoração bem mais favorável à Pena que foi aplicada ao Recorrente.

8. Escrutinado o teor do Douto Acórdão Recorrido e a Prova produzida em Audiência, junta aos Autos e vertida nos factos dados por provados, constata-se, com elevado e respeitoso reparo, existirem elementos especialmente Atenuadores da Pena aplicada ao Recorrente que não foram levados em conta na Decisão final.

9. Efectivamente, existiram circunstâncias Prévias, Contemporâneas e Posteriores que, com o merecido respeito, não se vislumbram terem sido consideradas.

10. Desde logo resulta, quer das Declarações do Recorrente (em sede de Julgamento e junto da técnica de reinserção social), quer do teor do Relatório Social para Determinação da Sanção, que a força motriz da decisão criminosa do Recorrente, um individuo com 39 anos de idade, pai por afinidade uma menor de 15 anos de idade e casado, adveio das carências económicas que atravessava fruto da pandemia do Covid 19 que vimos atravessando e que o impediam de levar o pão à boca da sua prole e de lhes provir nas necessidades básicas

11. De igual modo, não pode deixar de ser atendido o facto de a quantidade de produto estupefaciente ser exíguo - quando comparado com outros Autos em que se julgam dezenas, centenas e até toneladas - não atingir sequer os 6kg.

12. Resulta também que, posteriormente à prática daqueles ilícitos, o arrependimento lhe inundou o espírito. Bastará, para o feito, atentar nas declarações prestadas em sede de Julgamento e junto da Técnica de Reinserção Social que elaborou o Relatório Social para efeitos de determinação da sanção, em concreto quando se refere “(…) O arguido enquadra o presente

julgamento e a sua situação jurídico-penal com sentido de preocupação, aparentando reconhecer os factos que é acusado e o bem jurídico violado, reiterando a sua disponibilidade de colaboração com o sistema de justiça, aspetos que são de valorizar. Segundo nos foi dado a conhecer mantêm uma rotina referida como amoldada às normas e regras deste estabelecimento, não havendo registo de problemas disciplinares. Relata sentir dificuldades em adaptar-se ao atual contexto prisional, realçando dificuldades com a alimentação, relação com terceiros e dificuldades de contacto com familiares, não tendo até à data recebido quaisquer visitas. O facto de falar uma língua diferente e não ter apoio externo, aparenta ser um entrave à sua adaptação ao contexto prisional. Segundo relata há excepção da mulher, os familiares não sabem que está detido, situação que refere ter omitido por vergonha, reiterando o seu desejo de os voltar a ver. (…)”

13. Deste modo, bem vistas e consideradas estas circunstâncias, não será difícil a V/Ex.ªs alcançarem, no Vosso Douto entendimento, que o Recorrente, praticou o Crime pelo qual foi condenado, não por mero capricho criminoso, mas para, fruto da sua circunstância a que não é alheia a época pandémica que se atravessa, poder prover às suas necessidades básicas e da sua filha por afinidade e esposa.

14. Por conseguinte, tidas por preenchidas as exigências da Atenuação Especial da Pena deveria o Colectivo, em sede de Sentença, ter atenuado o quantum condenatório do Crime em que o condenou.

15. Assim, considerando que decorre do N.º 1 do Artigo 21.º do Decreto-Lei N.º 15/93, de 22 de Janeiro que “1. Quem, sem para tal se encontrar autorizado, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer titulo receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no artigo 40.º, plantas, substâncias ou preparações

compreendidas nas tabelas I a III é punido com pena de prisão de 4 a 12 anos.”, deveria a conduta do Recorrente no Crime de Tráfico de Estupefacientes ter sido censurada em pena de prisão perto do mínimo legal, isto é, dos quatro anos.

16. Por conseguinte, tidas por preenchidas as exigências da Atenuação Especial da Pena, deveria o Colectivo, em sede de Sentença, ter atenuado o quantum condenatório desse Crime, ao não o fazer violou, entre outros normativos que V/Ex.ªs doutamente suprirão, o preceituado nos Artigos 72.º, 73.º do Código Penal e Artigo 21.º, N.º 1 do Decreto-Lei N.º 15/93, de 22 de Janeiro.

17. No que respeita à Medida Concreta da Pena, Seis anos de prisão, aplicada pelo Distinto Tribunal a quo, o Recorrente, mui respeitosamente, preconiza-a como excessiva, peticionando outra mais benévola, sem todavia ter a pretensão de Vos indicar em rigor qual.

18. Deste modo, pese embora a Prova produzida em Julgamento permita consubstanciar o juízo de condenação, por parte da factualidade dada por provada, formulado pelo Tribunal a quo, ainda assim atento o supra exposto, pronunciamo-nos pela aplicação de uma Pena mais reduzida ao Recorrente.

19. Com efeito, quanto a este ponto, impõe-se afirmar que a Pena infligida ao Recorrente (Seis anos de Prisão) é naturalmente desproporcional e desadequada perante as necessidades de justiça que o caso de per si reclama, atentas quer a quantidade de produto estupefaciente (6kg) e sua pureza (entre os 28% e os 33%, isto é, perto dos 30% de pureza), quer os valores e objectos

apreendidos, quer ainda o modo e incipiência em que o mesmo foi praticado.

Sobretudo se se estabelecer uma comparação e analogia com outros Autos, similares e idênticos, em que as Penas aplicadas não raras vezes, por produtos estupefacientes de natureza mais nefasta (Heroína, Metanfetaminas e derivados) e quantidades exponencialmente superiores e de grau de pureza perto dos 100%, senão suspensas na sua execução, são inferiores àquela que lhe foi aplicada.

20. O Direito não é matemática nem ciência exacta, é certo, porém a Justiça impõe e a Sociedade reclama que casos idênticos, senão iguais, sejam censurados em sede de Culpa e Medida da Pena em quantuns senão iguais pelo menos aproximados. O que bem vistas as coisas não ocorreu no Acórdão Recorrido, para mais quando são conhecidos - e V/Ex.ªs sabê-lo-ão melhor que o Recorrente - outros Autos em que as Penas aplicadas em iguais circunstâncias por produtos estupefacientes mais danosos á saúde pública e quantidades e graus de pureza manifestamente superiores foram, e ainda que não se compreenda e aceite hão-de continuar a ser, inferiores à que foi aplicada ao Recorrente pelo Tribunal a quo.

21. É pois este o ponto em que assenta a pretensão do Recorrente: Será necessário para a tutela da Prevenção Geral, aplicar Pena tão elevada a este homem de trinta e nove anos de idade, com uma família ao encargo e suporte familiar de ajuda à sua reintegração, aqui Recorrente da Vossa Justiça, quando em outros Autos de iguais circunstâncias - por maiores quantidades de Produto

Estupefaciente e grau de pureza manifestamente bem mais elevado – são aplicadas Penas de Prisão inferiores àquela que lhe foi aplicada?

22. Entre muitos outros do conhecimento de V/Ex.ªs, serão os casos dos Arestos dos Pares de V/Ex.ªs no Supremo Tribunal de Justiça prolatados a:

 07 de Dezembro de 2006 no Processo N.º 06P1711 quando se decidiu que “É suficiente a pena especialmente atenuada - DL 401/82, de 23-09 -, de 5 anos de prisão (e não a de 6 anos e 6 meses, aplicada na 1.ª instância), pela prática, em autoria material, de um crime de tráfico de

estupefacientes, p. e p. pelo art. 21.º do DL 15/93, de 22-01, a um arguido de nacionalidade venezuelana, sem qualquer ligação a Portugal, nem passado criminal, que, no âmbito de um transporte como correio de droga, desembarcou no Aeroporto do Porto, procedente de Caracas e em trânsito para Bruxelas, transportando no fundo falso das mochilas e no seu organismo, embalagens com cocaína, com os pesos líquidos de 7395,090 g e 993,600 g, respectivamente.”;

 23 de Janeiro de 2008 no processo n.º 4567/07-3.ª Secção em que um cidadão Venezuelano desembarca no Aeroporto de Lisboa, proveniente de Caracas, trazendo consigo, impregnada em 44 peças de roupa, cocaína, com grau de pureza de 14,6 e com o peso total bruto de 13.940 gramas e lhe foi aplicada uma Pena de 5 anos de prisão;

 10 de Julho de 2008 no processo n.º 1217/08-3.ª Secção referente a Transporte aéreo de droga proveniente de Caracas, em que o arguido desembarca no Aeroporto de Lisboa, trazendo cocaína com o peso global de 8.364,400 kg, dissimulada em 3 latas de conserva e a Pena aplicada em 1.ª Instância (5 anos e 6 meses) lhe foi reduzida para 04 anos de Prisão;

 20 de Outubro de 2011 no processo n.º 35/11.8JELSB-5.ª Secção referente a Transporte por cidadã venezuelana, com antecedentes criminais pela prática de idêntica infracção, de Caracas para Lisboa, trazendo impregnada na estrutura da mala de porão, 16.813,100 gramas de cocaína (peso líquido) com um grau de pureza de 27,4/% em que lhe foi aplicada pela 1.ª Instância e mantida pelo STJ a Pena de 5 anos e 9 meses de prisão;

 24 de Outubro de 2012 no processo n.º 298/11.9JELSB.S1-3.ª Secção relativo a cidadão Guineense, proveniente da Guiné Bissau, vivendo em Portugal, transportando de São Paulo, Brasil, para a Guiné Bissau, passando por Lisboa, 10.082,144 gramas de cocaína em que lhe foi

aplicada pela 1.ª Instância e mantida pelo STJ a pena de 5 anos e 3 meses de prisão;

 20 de Dezembro de 2012 no processo n.º 390/11.0JELSB.S1-5.ª Secção onde se verteu que “Segue os critérios jurisprudenciais, observa as regras da experiência e atende às necessidades de prevenção, quer geral, quer especial, sem ultrapassar os limites da culpa, a pena de 5 anos e 3 meses de prisão, aplicada em 1.ª instância pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01, a um arguido que, no âmbito de um transporte como correio de droga, desembarcou no Aeroporto de Lisboa, proveniente de

São Paulo, Brasil, transportando consigo cocaína, no interior de uma mala de viagem, com o peso líquido global de 7 358,630 g.”;

 17 de Janeiro de 2013 no processo n.º 57/12.1JELSB.L1.S1-3.ª Secção referente a Arguido que vive em Espanha com companheira, da qual teve dois filhos, menores de idade, desempregado desde 2011, efectua transporte, a troco de remuneração no montante de € 6.000 de 7.480 gramas de cocaína, de Santiago do Chile para Lisboa, via Madrid condenado em 1.ª Instância e mantido no STJ a pena de 5 anos e 3 meses de prisão;

 24 de Abril de 2014 no processo n.º 266/13.6JELSB.S1-5.ª Secção relativo a dois Arguidos que efectuam transporte de São Paulo, Brasil, e desembarcam no Aeroporto de Lisboa, com cocaína (cloridrato), com o peso líquido, respectivamente, de 5.971,258 e 5.967,475 gramas e

as penas aplicadas em 1.º Instância foram reduzidas de 5 anos e 10 meses para 4 anos e 6 meses de prisão;

 19 de Dezembro de 2019 no processo n.º 3/19.1JELSB.S1–5.ª Secção referente a Transporte de 5.231,800 gramas de cocaína proveniente de Colômbia, com destino a Lisboa em que foi aplicada pela 1.ª Instância e mantido pelo STJ a pena de 5 anos e 3 meses de prisão;

 Etc…

23. Diferenças que fazem ressaltar a gritante injustiça da Pena que foi aplicada pelo Tribunal a quo ao Recorrente, porquanto este, além de haver sido condenado por factos respeitantes a uma quantidade de produto estupefaciente próxima ou até mais reduzida (6kg) e de qualidade bem menos gravosa (entre 28% e 33% de grau de pureza), julgadas na maioria dos referidos Processos, viu a axiologia da sua conduta ser censurada de forma mais grave que aqueloutros em circunstâncias semelhantes e outras exponencialmente mais Ilícitas e Culposas que a sua.

24. Que lhe perdoem V/Ex.ªs a singeleza da questão, mas não lhe é de todo possível coloca-la de outro modo.

25. Deste modo acredita-se que outra Pena em concreto mais benévola, logo mais Justa, será a adequada a satisfazer as premissas de tutela que o caso concreto reivindica, não se frustrando a Justiça com isso, antes pelo contrário, será ela sem qualquer dúvida a sua grande vencedora!

26. Razão pela qual o Recorrente discorda da dosimetria da Pena que lhe foi aplicada, e pugna, no essencial, por outra mais adequada aos critérios de Justiça que o caso em concreto reclama, nomeadamente uma Pena perto do mínimo legalmente estabelecido e suspensa na sua execução.

27. Colendos Conselheiros, a terem por bons os argumentos acima aduzidos e relevando V/Ex.ªs a possibilidade de aplicarem uma Pena de Prisão ao Recorrente perto do limite minino legal, toma o aqui Subscritor a liberdade de aduzir uns (quiçá im)pertinentes parágrafos rogando-vos a Suspensão da Execução da Pena de Prisão que venham a considerar justa, por conta da culpa

na prática das factualidades perpetradas, aplicar a este homem de quase 40 anos de idade.

28. Como V/Ex.ªs melhor sabem, apurado que esteja o quantum da Pena a aplicar há, necessariamente, que reflectir, em consonância com o que se encontra legalmente estipulado, se in casu se mostra viável, ou não, a Suspensão da Execução da Pena.

29. Acreditando na Boa e Justa Decisão que V/Ex.ªs virão a prolatar em Douto Aresto, que se augura não muita afastada do limite mínimo legal para este Ilícito, é entendimento do Recorrente que - a ser como espera - as exigências legais para a Suspensão de Execução da Pena de Prisão que lhe vier a ser aplicada, ex vi do disposto no N.º 1 do Artigo 51.º do Código Penal, verificar-se-ão in totum nos presentes Autos.

30. Isto porque, é consabido que existem dois pressupostos para a aplicação deste Instituto Jurídico, a saber:

 Um de ordem formal, que consiste em que a Pena de Prisão aplicada não seja superior a 5 anos (o que se augura da Serena, Boa e Justa Decisão de V/Ex.ªs); e,

 Outro de ordem material, que consiste no facto de o Tribunal concluir, que face à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias que o envolvem, a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da prevenção.

31. Por conseguinte, sendo o Recorrente condenado, por V/Ex.ªs, numa Pena de Prisão perto do limite mínimo legal previsto no Artigo 21.º do Decreto-Lei 15/93, como augura, ter-se-á por preenchido o pressuposto de natureza formal exigido pela Lei.

32. Acresce que face às circunstâncias já descritas do caso, a simples ameaça da aplicação da Pena e a correspectiva advertência são suficientes para que o Recorrente, no futuro não cometa mais crimes e, inevitavelmente, assuma um comportamento consonante com os valores do Sistema Penal. Estando, desta forma, igualmente preenchido o requisito de ordem material e, consequentemente, afastado o efeito estigmatizante da Pena de Prisão Efectiva, para mais na idade e com as responsabilidades familiares que este homem tem.

33. O Recorrente, conforme decorre do Acórdão Recorrido, nunca foi condenado em quaisquer processos judiciais, nem tão pouco contra-ordenacionais aquém e além-fronteiras.

34. Pressupostos formais que, como já referido ao longo desta Motivação, se encontram, manifestamente, preenchidos.

Com efeito,

35. No que respeita à “personalidade do agente” - não olvidando que a personalidade é um processo gradual, complexo e único de cada indivíduo mas que, ainda assim, se poderá resumir ao conjunto das características marcantes de uma pessoa e, como termo abstracto que é, utiliza-se para descrever e dar uma explicação teórica do conjunto de peculiaridades de cada um de nós a fim de nos caracterizar e diferenciar do outro - tenham V/Ex.ªs presente, Colendos Conselheiros, que o Recorrente, conforme decorre da Prova junta aos Autos e da que foi produzida em Audiência de Julgamento:

 Tem 39 anos de idade;

 É uma pessoa calma e conscienciosa;

 É casado, tem uma enteada que para si é uma filha e família que estão dispostas a acolhe-lo e prestar-lhe toda a ajuda que necessite na sua reintegração;

 É urbano no trato e comportamento;

 É respeitador dos valores éticos, culturais e morais;

 É uma pessoa de imensos afectos e imbrincadas relações sociais e familiares; e,

 Tem toda a comunidade onde reside disposta a acolhê-lo.

36. Relativamente às “condições da sua vida”, igualmente, como se extrai da Prova junta aos Autos e daquela que se produziu em Julgamento e, em parte, vertida no teor do Douto Acórdão Recorrido, impõe-se não descurar que o Recorrente, tendo tido uma vivência sofrida é, ainda assim, um individuo familiar e socialmente integrado.

37. Derradeiramente exige a Lei que se atenda às “circunstâncias do crime”, factualidade quanto à qual é susceptível de se retirar da Prova junta aos Autos e daquela que se produziu em Julgamento e, também em parte, vertida no teor do Douto Acórdão Recorrido que o Recorrente: Praticou os factos pelos quais acabou condenado, mas fê-lo num período existencial de grandes dificuldades económicas que lhe obstavam de poder ajudar economicamente a família.

38. Daqui decorre que, a ser como augura, se encontram preenchidos os pressupostos formais e materiais necessários à Suspensão da Execução da Pena de Prisão que lhe vier a ser aplicada por V/Ex.ªs., mesmo que por questões de conveniência e adequação à realização das finalidades da punição subordinada à observância de alguma(s) regra(s) de conduta(s).

39. O que, em entendimento do Recorrente, se apresenta como uma possibilidade, assim V/Ex.ªs o venham a entender no vosso Douto escrutínio por julgarem insuficiente a suspensão tout court, e quanto ao que este, para tanto e de forma esclarecida, aqui, pela pena do seu Mandatário, dá o seu consentimento. O que se vislumbra ser, na pior das hipóteses, a Sanção mais correcta e justa a aplicar nestes Autos.

40. Por tudo o que se expôs entende o Recorrente que a Pena de Prisão que lhe vier a ser aplicada por V/Ex.ªs deve ser Suspensa na sua Execução, isto porque, o cumprimento efectivo de uma pena de prisão, in casu, ao invés de contribuir para a Reintegração deste, terá graves efeitos dessocializantes.

41. A ser como augura da Decisão de V/Ex.ªs, as finalidades da Punição, no caso concreto, serão melhor alcançadas mediante a aplicação, ao Recorrente, de Pena de Substituição Não Privativa da Liberdade, do que através do cumprimento de prisão efectiva porque o tempo já sofrido preventivamente preso, quase um ano, a censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, e a suspensão da execução da pena de prisão revela-se eficaz na prossecução das exigências de prevenção geral e especial.

42. Caso tal não se mostre viável no Douto escrutínio dos Colendos Conselheiros, é entendimento do Recorrente que, em alternativa deverá a Pena aplicada ser suspensa, mais que não seja, mediante subordinação, nomeadamente, à observância de alguma(s) regra(s) de conduta(s), como a de cumprir determinadas obrigações e conexo Regime de Prova.

Em suma, nos presentes autos, não só ficou cabalmente provado que o Recorrente praticou o Crime de Tráfico de Produtos Estupefacientes em que foi condenado, como foi demonstrado que a circunstância em que o praticou, não sendo jamais nobre, comporta factos que lhe permitem atenuar e alterar a Pena que lhe vier a ser aplicada por V/Ex.ªs para perto do limite mínimo legalmente estabelecido para a prática desse Ilícito e a sua Execução Suspensa.

Nestes termos, nos melhores e demais de Direito que os Colendos Juízes Conselheiros suprirão, deve o presente Recurso do Recorrente AA obter Provimento e, em consequência, ser Atenuada Especialmente a Pena que lhe foi aplicada diminuindo-se o limite da mesma, para valores mais comedidos, nomeadamente para perto do limite mínimo legal estipulado para esse Ilícito e a sua Execução Suspensa.

4. O Ministério Público, no Juízo Central Criminal ..., respondeu ao recurso, pugnando pelo seu não provimento e manutenção da decisão recorrida, por considerar que a pena que lhe foi aplicada é adequada e justa.

5. O recurso foi remetido ao Tribunal da Relação ..., por despacho de 20 de janeiro de 2022.

6. A Ex.ma Desembargadora no Tribunal da Relação ..., por despacho de 11 fevereiro de 2022, determinou que os autos, dirigidos pelo recorrente ao S.T.J., fossem remetidos a este Supremo Tribunal, por o Tribunal da Relação ser materialmente incompetente para conhecer do recurso.

7. A Ex.ma Procuradora-Geral-Adjunta no Supremo Tribunal de Justiça emitiu parecer, nos termos do art.416.º do Código de Processo Penal, concluindo no sentido da improcedência do recurso interposto pelo arguido. 

8. Cumprido o disposto no art.417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, não houve resposta.

9. Colhidos os vistos, foram os autos presentes à Conferência.

II Fundamentação

10.  Com relevo para a decisão do recurso, consigna-se no acórdão recorrido:

Factos provados

1. No dia 01 de Maio de 2021, pelas 07h43, o arguido desembarcou no Aeroporto ..., em Lisboa, procedente de ... - …, no Brasil, no voo ...50, com destino a Lisboa.

2. Nessa ocasião, o arguido trazia dissimuladas no interior de duas malas de porão que transportava:

- uma (1) embalagem/placa de cocaína (cloridrato), com o peso líquido de 873 gramas, com

um grau de pureza de 28,4 %.

- uma (1) embalagem/placa de cocaína (cloridrato), com o peso líquido de 1129 gramas, com um grau de pureza de 31,2 %.

- uma (1) embalagem/placa de cocaína (cloridrato), com o peso líquido de 1566 gramas, com um grau de pureza de 33,4%.

- uma (1) embalagem/placa de cocaína (cloridrato), com o peso líquido de 1912 gramas, com um grau de pureza de 31,8%.

3. Nessas circunstâncias, o arguido trazia ainda consigo:

- 2 (duas) malas de viagem;

- um telemóvel de marca ..., modelo ..., com um cartão;

- a quantia monetária de €370 (trezentos e setenta euros) em notas do Banco Central Europeu;

- duas etiquetas de bagagem em nome do arguido;

- um cartão telefónico de operadora boliviana;

- um boarding card em nome do arguido;

- a quantia monetária de 1081 (mil e oitenta e um) Reais, em notas emitidas pelo Banco do Brasil;

- a quantia monetária de 3 (três) dólares americanos.

4. O arguido conhecia a natureza e características estupefacientes do produto que transportava e que lhe foi apreendido.

5. Produto esse que aceitara transportar por, para tanto, lhe ter sido prometida quantia monetária não inferior a € 3000.

6. O telemóvel e cartões telefónicos apreendidos foram utilizados pelo arguido, além do mais,

nos contactos que estabeleceu para concretizar o transporte da cocaína apreendida.

7. As quantias apreendidas eram parte do lucro que iria obter com o transporte de cocaína.

8. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, sabendo que a detenção, o transporte

e a comercialização de cocaína eram proibidos e punidos por lei.

9. O arguido é natural da ..., não possuindo quaisquer ligações familiares e/ou profissionais em Portugal, onde se deslocou com o único propósito de transportar a cocaína.

10. O arguido admitiu integralmente e sem reservas os factos que lhe vinham imputados.

Condições pessoais e antecedentes criminais do arguido

11. O processo de socialização de AA decorreu na cidade ... - ..., inserido no agregado familiar nuclear, composto pelos progenitores e quatro irmãos, sendo o segundo da fratria.

12. Tratava-se de uma família de classe média, trabalhando o pai como ... e a mãe como

..., tendo o arguido disposto de condições materiais, afectivas e educativas adequadas ao seu desenvolvimento.

13. O trajecto escolar do arguido decorreu num colégio privado, sendo investido e regular, tendo

o arguido concluído o equivalente ao 12ºano, aos 18 anos de idade.

14. Cerca dos 18 anos de idade do arguido, o seu pai foi vítima de um ... que o deixou em coma, vindo a morrer um ano depois, perda que viria a condicionar negativamente a dinâmica e economia familiar.

15. De forma a apoiar a mãe e os irmãos, emigrou para ... - ..., para trabalhar na ..., não se tendo adaptado, pelo que cerca de um ano depois, viria a regressar à ... reintegrando o agregado familiar.

16. AA permaneceu na ..., junto da família, até aos 35 anos de idade, não tendo estabelecido relacionamentos amorosos de relevo ou tido filhos no país de origem.

17. Laboralmente, no de país de origem, trabalhou 5 anos como empregado ..., tendo deixado a função para trabalhar …, dedicado ao transporte …, numa … pertencente a um familiar.

18. Cerca dos 35 anos de idade emigrou para … para junto de familiares, numa tentativa de melhorar as suas condições de vida e autonomizar-se.

19. Pouco após a sua chegada, constituiu agregado com BB, conterrânea natural da ..., nacionalizada ... e a filha desta, residindo cerca de 2 anos em …, após o que mudaram e fixaram-se na zona de ..., por motivos profissionais.

20. O arguido manteve consumos de cocaína desde o início da idade adulta, maioritariamente

aos fins-de-semana e para fins recreativos.

21. Aquando da mudança para …, face aos seus hábitos de consumo, viria a viver problemas económicos, tendo sido vítima …, no contexto da adição, por fragilidades cardíacas.

22. O arguido encontra-se abstinente desde 2016.

23. À data dos factos na base do presente processo, o arguido mantinha residência em ...

– …, com a companheira BB e a enteada CC de 15 anos de idade, atravessando uma fase de particular instabilidade familiar, marcada por dificuldades económicas.

24. Nos primeiros anos em ..., o arguido e o seu agregado viriam a conseguir manter uma vida organizada e fazer face a despesas, sendo que ambos trabalhavam, o arguido como  instalador de ar condicionado e a companheira como empregada doméstica para terceiros.

25. Esse equilíbrio alterou-se por motivos de saúde, tendo sido vítima de mais um AVC no início de 2020, problema de saúde que lhe deixou sequelas e fez perder trabalho.

26. A situação laboral viria a agravar-se devido à pandemia, permanecendo o casal, entre 2020

a 2021, maioritariamente desempregados e confinados, subsistindo através de subsídios do governo espanhol, apoios que lhes permitiriam suprir a renda da habitação e alguns bens essenciais de alimentação, mantendo uma situação precária.

27. AA encontra-se detido preventivamente no Estabelecimento Prisional ... desde o dia 01/05/21, tendo como aspiração futura poder regressar a ... para junto da mulher e da enteada.

28. Mantém uma rotina adequada às normas e regras do Estabelecimento Prisional em que se

encontra, não havendo registo de problemas disciplinares.

29. O arguido manifesta dificuldades em adaptar-se ao contexto prisional, designadamente à alimentação, relação com terceiros e dificuldades de contacto com familiares, não tendo até à data recebido quaisquer visitas.

30. À excepção da mulher, os familiares não sabem que está detido, informação que omitiu por

vergonha.

31. O arguido não tem antecedentes criminais registados.

11. Objeto do recurso

O âmbito do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação (art. 412.º, n.º 1 do Código de Processo Penal). São apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respetivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar, sem prejuízo das de conhecimento oficioso.[1]

Face às conclusões da motivação do recorrente as questões a decidir são as seguintes:

- Da atenuação especial da pena;

- Da excessiva medida concreta da pena aplicada; e

- Da (eventual) substituição da pena aplicada por suspensão da execução da pena.

12. Apreciando

12.1 Previamente ao conhecimento do objeto do recurso, impõe-se fazer uma breve consideração sobre a competência do Supremo Tribunal de Justiça para o conhecimento do recurso, na medida em que o Tribunal de 1.ª instância remeteu os autos ao Tribunal da Relação ..., e que a Ex.ma Relatora do processo nesse Tribunal Superior determinou a sua remessa ao Supremo Tribunal de Justiça, por o considerar competente para o conhecimento do recurso interposto pelo arguido.
O art. 432.º do Código de Processo Penal, sob a epígrafe «Recurso para o Supremo Tribunal de Justiça» dispõe, designadamente, o seguinte:
«1 - Recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça:
 (…)
c) De acórdãos finais proferidos pelo tribunal do júri ou pelo tribunal coletivo que apliquem pena de prisão superior a 5 anos, visando exclusivamente o reexame de matéria de direito;
(…)
2 - Nos casos da alínea c) do número anterior não é admissível recurso prévio para a relação, sem prejuízo do disposto no n.º 8 do artigo 414.º

Em função do estabelecido no n.º 2 do artigo 432.º do CPP, que resulta da revisão do Código Penal de 2007, é evidente a obrigatoriedade do recurso per saltum, desde que o recorrente tenha em vista a reapreciação de pena aplicada em medida superior a 5 anos de prisão e vise exclusivamente a reapreciação da matéria de direito.
A Relação só tem competência para o conhecimento do recurso de pena aplicada em medida superior a 5 anos de prisão se o recorrente, ao provocar a reapreciação do caso penal, quiser abranger a própria matéria de facto.

No caso em apreciação, o arguido AA interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça; o objeto do recurso é um acórdão condenatório proferido por um tribunal coletivo; em que foi aplicada ao recorrente uma pena de 6 anos de prisão – e a essa dimensão se deve atender para definir a competência material.

Deste modo, estando em equação uma deliberação final de um tribunal coletivo, visando o recurso apenas o reexame de matéria de direito (circunscrita à redução da pena que lhe foi aplicada e eventual suspensão da execução da pena de prisão), cabe efetivamente ao Supremo Tribunal de Justiça conhecer do recurso, direto, per saltum, nos termos do art. 432.º, n.ºs 1, alínea c) e 2, do Código de Processo Penal.

13. Da atenuação especial da pena

O recorrente defende que o acórdão recorrido ao aplicar-lhe uma pena de 6 anos de prisão, violou o disposto nos artigos 72.º e 73.º do Código Penal e 21.º do DL n.º 15/93, de 22 de janeiro, porquanto não atendeu às exigências de atenuação especial da pena que, no caso, se mostram preenchidas.

Apresenta, no essencial, os seguintes argumentos: (i) a força motriz da decisão criminosa do arguido adveio das carências económicas que atravessava o seu agregado familiar, fruto da pandemia do Covid 19, para lhe provir nas necessidades básicas; (ii) a quantidade do produto estupefaciente é exíguo, pois não atingiu sequer os 6 kg; (iii) e, posteriormente à prática dos factos, mostrou vergonha e arrependimento do que havia perpetrado, confessando a totalidade dos factos e cumpre as regras do Estabelecimento Prisional sem registo de problemas disciplinares apesar não falar a língua e não ter apoio externo.

 13.1. Examinando a questão.

 Quando o legislador dispõe sobre a moldura penal para um certo tipo de crime, prevê as diversas modalidades e graus de realização do facto, desde os da menor até aos da maior gravidade pensáveis, de modo que, em todos os casos, a aplicação da pena concretamente determinada possa corresponder ao limite da culpa e às exigências de prevenção.

Quando, em hipóteses especiais, existem circunstâncias que diminuam de forma acentuada as exigências de punição, relativamente ao complexo “normal” dos factos visados pela moldura penal, o legislador procedeu à substituição dessa moldura penal por outra menos severa.

Para além de outros casos, expressamente previstos na lei de atenuação especial da pena, o legislador, consagrou, na parte geral do Código Penal, uma cláusula geral de atenuação especial da pena, nos seus artigos 72.º e 73.º.

Nos termos do artigo 72º, nº 1 do Código Penal «O tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.

O seu n.º 2, acrescenta que, «Para o efeito do disposto no número anterior, são consideradas, entre outras, as circunstâncias seguintes:

a) Ter o agente atuado sob influência de ameaça grave ou sob ascendente de pessoa de quem dependa ou a quem deva obediência;

b) Ter sido a conduta do agente determinada por motivo honroso, por forte solicitação ou tentação da própria vítima ou por provocação injusta ou ofensa imerecida;

c) Ter havido atos demonstrativos de arrependimento sincero do agente, nomeadamente a reparação, até onde lhe era possível, dos danos causados;

d) Ter decorrido muito tempo sobre a prática do crime, mantendo o agente boa conduta.

A atenuação especial da pena funda-se, pois, na diminuição, por forma acentuada, da ilicitude, da culpa e da necessidade da pena.

Em termos sintéticos, diremos que na ilicitude do facto há a considerar o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente.

A culpa do agente consiste no juízo de censura dirigido ao agente pelo facto de este ter atuado em desconformidade com a ordem jurídica quando podia, e devia, ter atuado em conformidade com esta, sendo uma desaprovação sobre a conduta do agente. O juízo de censura, ou desaprovação, é suscetível de se revelar maior ou menor sendo, por natureza, graduável e dependendo sempre das circunstâncias concretas em que o agente desenvolveu a sua conduta, traduzindo igualmente um juízo de exigibilidade determinado pela vinculação de cada um a conformar-se pela atuação de acordo com as regras estipuladas pela ordem jurídica superando as proibições impostas.

A necessidade da pena remete-nos para o objetivo último das penas, que é a proteção, o mais eficaz possível, dos bens jurídicos fundamentais (art. 40.º do Código Penal).

Esta proteção implica a utilização da pena como instrumento de prevenção geral, servindo primordialmente para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força de vigência das normas do Estado na tutela de bens jurídicos e, assim, no ordenamento jurídico-penal (prevenção geral positiva ou de integração).

A prevenção geral radica no significado que a “gravidade do facto” assume perante a comunidade, isto é, no significado que a violação de determinados bens jurídico penais tem para a comunidade e visa satisfazer as exigências de proteção desses bens na medida do necessário para assegurar a estabilização das expectativas na validade do direito.

A reintegração do agente na sociedade está ligada à prevenção especial ou individual, isto é, à ideia de que a pena é um instrumento de atuação preventiva sobre a pessoa do agente, com o fim de evitar que no futuro, ele cometa novos crimes, que reincida.

A jurisprudência tem sido exigente na aplicação do art.72.º do Código Penal, limitando a atenuação especial da pena a casos extraordinários ou excecionais de acentuada diminuição da ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.

A acentuada diminuição significa que a imagem global do facto se apresenta com uma gravidade tão específica ou diminuída em relação aos casos para os quais está prevista a fórmula de punição, que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em tais hipóteses quando estatuiu os limites normais da moldura do tipo respetivo.

Só pode ser decretada (mas se puder deve sê-lo) quando a imagem global do facto revele que a dimensão da moldura da pena prevista para o tipo de crime não poderá realizar adequadamente a justiça do caso concreto, quer pela menor dimensão e expressão da ilicitude ou pela diminuição da culpa, com a consequente atenuação da necessidade da pena, vista a necessidade no contexto e na realização dos fins das penas.[2]

Acerca do pressuposto material da atenuação da pena, escreve Figueiredo Dias que “a diminuição da culpa ou das exigências da prevenção só poderá, por seu lado, considerar-se acentuada quando a imagem global do facto, resultante da(s) circunstância(s) atenuante(s), se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respetivo.

Por isso, tem plena razão a nossa jurisprudência – e a doutrina que a segue – quando insiste em que a atenuação especial só em casos extraordinários ou excecionais pode ter lugar: para a generalidade dos casos, para os «casos normais», lá estão as molduras penais normais, com os seus limites máximo e mínimo próprios.”.[3]

Subscrevemos integralmente este entendimento jurisprudencial e doutrinal.

O art. 73.º do Código Penal, alegadamente violado pelo Tribunal a quo, estabelece os termos da atenuação especial da pena.

13.2. Posto isto.

Em primeiro lugar, o art. 21.º do DL n.º 15/93, não é um caso em que a lei preveja especificamente a aplicação da atenuação especial da pena.

Em segundo lugar, considerando a factualidade dada como provada no acórdão recorrido é manifesta a não verificação de qualquer das circunstâncias descritas nas alíneas a) e d) do nº 2 do art. 72º do Código Penal, que diminuem de forma acentuada a imagem global do facto.

Como também não se verifica a circunstância descrita na alínea b), do nº 2, do art. 72º do Código Penal, pois as dificuldades económicas pelas quais passava o agregado económico do recorrente à data dos factos - que terão pesado na motivação da conduta criminosa do ora recorrente -, não integram qualquer das situações ali descritas, nomeadamente, o agente ser determinado por “motivo honroso” ou “forte solicitação”. Aliás, resultando do ponto n.º 26 dos factos provados do acórdão recorrido que o agregado familiar do arguido recebia, em 2021, subsídios do governo espanhol, que lhe permitia suprir a renda da habitação e alguns bens essenciais de alimentação, existia suficiente contra motivação para não enveredar pela conduta criminosa pelo qual foi julgado nestes autos.

E a alínea c) do nº 2, do art.72º do Código Penal, também não se mostra preenchida, pois não constam dos factos dados como provados, no acórdão recorrido, quaisquer “atos demonstrativos de arrependimento sincero do agente”.

Não deve confundir-se a confissão dos factos, com atos de arrependimento “sincero”, mais ainda numa situação em que o agente é detido por autoridade policial em flagrante delito com o produto estupefaciente e não constam provados atos que o demonstrem como seria, por exemplo, uma colaboração relevante que permitisse descobrir quem estava a montante e a jusante no circuito do tráfico de estupefacientes,.

Tal confusão parece acontecer na fundamentação de direito do acórdão recorrido, ao afirmar-se que a admissão integral da prática dos factos “… sempre evidencia algum arrependimento pela respetiva prática”. Não há graus de arrependimento relevantes; ou há arrependimento sincero ou não há, e no caso concreto não há, pelas razões expostas.

Nada têm igualmente de excecional, as circunstâncias posteriores aos factos, traduzidas no cumprimento das regras do Estabelecimento Prisional pelo recorrente, sem registo de problemas disciplinares, assim como a manifestação de dificuldades na adaptação ao contexto prisional - a que não será alheio o facto de não falar a língua e nem ter apoio externo.

Em suma, da factualidade dada como provada resulta que a ilicitude do facto é muito elevada, considerando, designadamente, que o recorrente atuou como “correio de droga” entre a América latina e Portugal, no âmbito de tráfico internacional de estupefacientes; que a cocaína é um dos produtos estupefacientes mais perigosos e nefastos para a saúde dos consumidores; que a quantidade apreendida ao recorrente é elevada (e não exígua como pretende o recorrente); e que, com a sua conduta, colocou em causa uma pluralidade de bens jurídicos, com especial relevo para a saúde pública.

A culpa do arguido, dada pela censurabilidade da ação ilícita-típica em função da atitude interna juridicamente desaprovada que nela se expressa e fundamenta, é também muito elevada face às circunstâncias em que o tráfico foi praticado, com dolo direto e intenso, e quando o próprio já vivenciou as nefastas consequências do consumo de cocaína, bem descritas nos pontos n.ºs 21 e 25 da factualidade dada como provada.

Por fim, as necessidades da pena, estão longe de serem diminutas, seja, considerando as elevadas exigências de prevenção geral neste tipo de criminalidade, seja, ainda, de prevenção especial, considerando os factos e a personalidade do arguido que deles resulta.

Uma vez que a atenuação especial só em casos extraordinários ou excecionais pode ter lugar, pois para a generalidade dos casos, para os «casos normais», lá estão as molduras penais normais, com os seus limites máximo e mínimo próprios, e no presente caso não se vislumbram acentuadas circunstâncias atenuantes da responsabilidade do arguido ao nível da ilicitude, da culpa ou da necessidade da pena que levem ao abaixamento da pena abstrata prevista no crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1 do DL nº 15/93, de 22.01, com referência à Tabela I-B anexa ao citado diploma, o Supremo Tribunal de Justiça entende que bem andou o Tribunal recorrido ao não fazer uso da atenuação especial da pena a que aludem os artigos 72.º e 73.º do Código Penal.

A pretensão do recorrente, de atenuação especial da pena, numa situação de condenação pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1 do DL n.º 15/93, de 22 de janeiro, não seria, assim, adequada à sua culpa, nem proporcional à sua perigosidade, e poria em causa as necessidades de prevenção geral neste tipo de crimes.

Deste modo, não se mostrando violado os disposto nos artigos 72.º e 73.º do Código Penal em conjugação com o art. 21.º, n.º 1 do DL n.º 15/93, de 22 de janeiro, improcede esta primeira pretensão do recorrente.

            14. Da medida excessiva da pena aplicada

            O arguido não questiona que com a sua conduta, descrita nos factos dados como provados, praticou, em autoria material, um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1 do DL nº 15/93, de 22.01, com referência à Tabela I-B anexa ao citado diploma, com pena de 4 a 12 de prisão.

Entendendo, porém, que é excessiva a pena de 6 anos de prisão que lhe foi aplicada, peticiona outra mais benévola, mais perto do mínimo legal, sem indicar concretamente qual.

Para o efeito, apela, nas conclusões 17 a 26 da motivação, essencialmente, à quantidade do produto estupefaciente (6 kg) e sua pureza (entre os 28% e os 33%), aos valores e objetos apreendidos, ao modo e incipiência em que o crime foi praticado, à sua idade (39 anos), e ao encargo com a família e, especialmente, por comparação e analogia com outros acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal de Justiça, como os nove que especifica, dos anos de 2006, 2008, 2011, 2012, 2013, 2014 e um de 2019.

14.1. Vejamos.

O art. 71.º, n.º 1 do Código Penal dispõe, quanto ao critério geral da determinação da medida concreta da pena, que esta é feita, dentro dos limites definidos na lei, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, devendo o tribunal atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele.

É a prevenção geral positiva, a que já fizemos referência, que fornece uma moldura de prevenção geral positiva dentro de cujos limites podem e devem atuar considerações de prevenção especial.

Entre o ponto ótimo e o ponto ainda comunitariamente suportável de medida de tutela dos bens jurídicos, podem e devem atuar pontos de vista de prevenção especial de socialização, sendo estes que vão determinar, em último termo a medida da pena.

Nesta tarefa, importa atender aos fatores de medida da pena, que na linguagem do art. 71.º, n.º 2 do Código Penal «…depuserem a favor do agente ou contra ele», considerando, designadamente, as suas várias alíneas.

As circunstâncias gerais enunciadas exemplificativamente no n.º 2 do art. 71.º do Código Penal, são, no ensinamento de Figueiredo Dias, elementos relevantes para a culpa e para a prevenção e, “por isso, devem ser consideradas uno actu para efeitos do art. 72.º-1; são numa palavra, fatores relevantes para a medida da pena por força do critério geral aplicável.”.

Para o mesmo autor, esses fatores podem dividir-se em “Fatores relativos à execução do facto”, “Fatores relativos à personalidade do agente” e “Fatores relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto”.

Por respeito à eminente dignidade da pessoa a medida da pena não pode ultrapassar a medida da culpa (art. 40.º, n.º 2 do C.P.), designadamente por razões de prevenção.

A culpa tem aqui uma função limitadora do intervencionismo estatal.

14.2. Retomando o caso concreto.

      No que respeita aos “Fatores relativos à execução do facto”, num sentido global e complexo, que podem agrupar-se, nas alíneas a), b), c) e e), parte final, do n.º 2 do art.71.º, do Código Penal resulta da factualidade dada como provada, que o grau de ilicitude dos factos cometidos pelo arguido é muito elevado, revelando aqui, como anota o acórdão recorrido “… o peso muito relevante do produto estupefaciente transportado, o facto de o arguido atuar conjuntamente com outros indivíduos, numa operação de âmbito internacional e a natureza do estupefaciente em causa – cocaína – (com um grau de danosidade acrescido)”. Acresce ainda “… a posição do arguido - “correio de droga” - uma peça fundamental na execução do ilícito e na cadeia delitiva.”.

Efetivamente, como o Supremo Tribunal de Justiça vem afirmando, repetidamente, os “correios de droga” são uma peça fundamental no tráfico de estupefacientes concorrendo, de modo direto, para a sua disseminação, pelo que não merecem um tratamento penal de favor.

Conforme bem se acentua no acórdão deste Supremo Tribunal de 11-4-2012: “(…) não é possível ignorar o papel essencial dos mesmos «correios» na conformação dos circuitos de tráfico, permitindo a disseminação de um produto que produz as consequências mais nocivas em termos sociais. Sendo pessoas fragilizadas em termos económicos, os mesmos «correios» têm, todavia, a consciência de serem os instrumentos de um mal.”.[4]        

O modo de execução do tráfico, integrado em voos comerciais internacionais, é particularmente preocupante, pela organização que demonstra e pela dificuldade de deteção do estupefaciente, como aqui acontece, em que o arguido residindo em Espanha se desloca ao Brasil para a partir daí transportar e introduzir no nosso país, dissimulada em vulgares malas, uma elevada quantidade de cocaína.

Como bem refere, ainda, o acórdão recorrido, o arguido agiu com “dolo direto e intenso”, e “os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram” são a “obtenção de dinheiro, inerente à atividade de tráfico”.

No que respeita aos «Fatores relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto», que integram a alínea e), n.º 2 do art. 71.º do Código Penal, depõe a favor do arguido a ausência de antecedentes criminais.

A confissão integral e sem reservas dos factos provados tem pouco ou nenhum relevo para a descoberta da verdade, uma vez que o arguido foi detido em flagrante delito.

Como bem ensina Eduardo Correia, esta circunstância atenuante praticamente não tem relevância quando o arguido é detido em flagrante delito e, duma maneira geral, em todos os casos em que se torna claro que a prova está feita por outros meios.[5]

O comportamento prisional que mantém é adequado à instituição, sem registo de problemas disciplinares. À exceção da sua mulher os familiares não sabem da prisão do arguido, informação que omitiu por vergonha.

Nos “Fatores relativos à personalidade do agente”, a que aludem as alíneas d) e f), n.º2 do art.71.º do Código Penal, assumem preponderância a média condição social do arguido e as suas fracas condições económicas à data dos factos, bem como de saúde, descritas nos pontos n.ºs 11 a 30 da factualidade dada como provada e que o acórdão recorrido não deixou de ponderar.

Com respeito às exigências de prevenção geral, reafirmamos aqui que o tráfico de estupefacientes, em especial de cocaína e heroína, é dos crimes que mais preocupa e alarma a nossa sociedade pelos seus nefastos efeitos e que mais repulsa causa quando praticado como meio de obtenção de proveitos à custa da saúde e liberdade dos consumidores, com fortes reflexos na coesão familiar e da comunidade em geral.

As elevadas penas previstas para o crime de tráfico de estupefacientes, próximas das aplicáveis ao crime de homicídio, evidenciam a intensa ressonância ética daquele tipo penal inscrita na consciência da comunidade.

Como a integração do tipo fundamental de tráfico de estupefacientes na definição de criminalidade altamente organizada (art.1º al.ª m) do C.P.P.) evidencia uma necessidade de proceder a um combate acrescido a esta atividade criminosa.

Muito elevadas são, assim, as exigências de prevenção geral no crime de tráfico de estupefacientes, pela forte ressonância negativa na consciência social das atividades que os consubstanciam, em particular quando está em causa o tráfico de produtos estupefacientes com forte nocividade, como é o caso da cocaína, e em quantidade significativa, pelo que se justifica reforçar a ideia da validade dos bens jurídicos inerentes à norma violada.

Considerando, particularmente, a natureza e quantidade do produto estupefaciente que o arguido transportou, importou e deteve no âmbito de tráfico internacional organizado, e a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, temos como prementes as razões de prevenção especial, como forma de reinserção social, obstando a que no futuro volte a praticar crimes desta elevada gravidade.

Por fim, também a culpa do arguido é muito elevada face às circunstâncias em que o tráfico foi executado, com dolo direto e intenso, quando bem conhece os nefastos efeitos da cocaína, pois dos seus hábitos de consumo deste produto estupefaciente, desde a idade adulta até 2016, advieram-lhe graves problemas de saúde e económicos (pontos n.ºs 20 a 22 e 25 da factualidade dada como provada).

Será que em face de todas as circunstâncias a que se aludiu, uma pena de 6 anos de prisão, como a que lhe foi aplicada na 1.ª instância, pelo tráfico de cerca de 6 kg de cocaína, com uma pureza entre 28,4% e 33,4%, configura “uma gritante injustiça”, por comparação e analogia com outros acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal de Justiça, em que a natureza do produto e o peso são similares?

Na resposta à afirmação do recorrente, não pode este Supremo Tribunal limitar-se à jurisprudência escolhida pelo recorrente, em que as penas aplicadas nos acórdãos vão desde os 4 anos de prisão - no proc. n.º 1217/08-3.ª Secção, em que o arguido detém cocaína com o peso global de 8.364,400 kg -, até aos 5 anos e 9 meses de prisão - no proc. n.º 35/11.8JELSB-5.ª Secção, em que a arguida detém 16.813,100 gramas de cocaína (peso líquido) com um grau de pureza de 27,4/%.

Socorrendo-nos do acórdão do S.T.J. de 28-10-2020 (proc. n.º 475/19.4JELSB.S1, in www.dgsi.pt), que indica um largo conjunto de decisões deste Supremo Tribunal, com o expresso propósito de tentar manter um critério igualitário na aplicação da medida da pena no que respeita aos chamados “correios de droga”, verificamos que os padrões sancionatórios nos acórdãos escolhidos pelo recorrente AA, não são os mais correntes, considerando a quantidade da cocaína importada e detida pelo arguido.

Assim:

“No acórdão de 16-01-2008 (processo n.º 4565/07-3.ª): uma arguida de nacionalidade coreana desembarca no aeroporto de Lisboa, proveniente da Guiné Bissau, trazendo consigo no interior de uma mala, cocaína com o peso líquido de 3051,977 gramas: aplicada uma pena de 5 anos de prisão, mas afastada a suspensão;

No acórdão de 16-01-2008 (processo n.º 4728/07-3.ª): um arguido holandês desembarca no aeroporto Sá Carneiro, proveniente do Rio de Janeiro, e com destino à Holanda, trazendo 2986, 305 gramas de cocaína: aplicada uma de 5 anos e 6 meses de prisão;

No acórdão de 31-01-2008 (processo n.º 4554/07-5.ª): arguido desembarca no aeroporto Sá Carneiro, proveniente de São Paulo, transportando cocaína, com o peso líquido de 1988,604, gramas, pretendendo viajar até Itália, onde iria entregar o produto: aplicada uma pena de 5 anos e 3 meses de prisão;

No acórdão de 20-02-2008 (processo n.º 295/08-3.ª): transporte de 2.185,33 gramas de cocaína; procedência Caracas; detecção no aeroporto Sá Carneiro; destino Bruxelas: aplicada uma pena de 5 anos de prisão, afastando-se a suspensão;

No acórdão de 9-04-2008 (processo n.º 825/08-5.ª): espanhol transportando do Brasil, por Portugal, com destino a Espanha, 1.387,852 gramas de cocaína, transformada em 140 botões cosidos em 6 casacos: mantida a pena de 5 anos de prisão e afastada a suspensão da execução;

No acórdão de 17-04-2008 (processo n.º 806/08-5.ª): caso de transporte por holandês, da Venezuela com destino a Holanda, desembarcado no Aeroporto de Lisboa, transportando na mala de mão 21 cabides com 1.427, 380 gramas de cocaína - confirmada a pena de 5 anos de prisão efectiva aplicada pela Relação;

No acórdão de 07-05-2008 (processo n.º 1409/08-3.ª): transporte de Buenos Aires e após, de Madrid em autocarro, com destino a Lisboa, de 47 embalagens de cocaína, com o peso líquido de 2.357,638 gramas: mantida a pena de 5 anos e 3 meses de prisão;

No acórdão de 08-05-2008 (processo n.º 1134/08-5.ª): cidadã cabo-verdiana desembarca na gare do Oriente, em Lisboa, proveniente do Senegal – via Madrid, trazendo cocaína, com o peso líquido de 2.975,070 gramas: aplicada a pena de 4 anos de prisão efectiva;    

No acórdão de 05-06-2008 (processo n.º 4569/07-5.ª): cidadão venezuelano desembarca no Aeroporto de Lisboa, proveniente de Caracas e com destino a Madrid, trazendo duas placas, contendo, respectivamente, 3kg e 797,170 gramas de cocaína: aplicada a pena de 5 anos e 6 meses de prisão;

No acórdão de 05-06-2008 (processo n.º 1142/08-5.ª): cidadão venezuelano desembarca no Aeroporto de Lisboa, proveniente de Caracas e com destino a Madrid, trazendo consigo, dentro do organismo, 55 embalagens contendo cocaína, com o peso total de 384,677 gramas – aplicada e confirmada a pena de 5 anos e 6 meses de prisão;

No acórdão de 04-09-2008 (processo n.º 2378/08-5.ª): transporte da América Latina de 211,630 gramas de cocaína – mantida a pena de 5 anos e 3 meses de prisão fixada na 1.ª instância;

No acórdão de 11-09-2008 (processo n.º 2155708-5.ª): arguida detida no Aeroporto de Lisboa procedente do Brasil, tendo como destino final Espanha, que transportava numa mochila várias embalagens de cocaína, com o peso líquido de 3.114, 777 gramas – mantida a pena de 5 anos e 3 meses de prisão;

No acórdão de 16-09-2008 (processo n.º 2382/08-3.ª): cidadão venezuelano desembarca no Aeroporto de Lisboa, proveniente de Caracas e com destino a Amesterdão, transportando no interior do organismo, 114 invólucros, em forma de bolota, contendo cocaína, com o peso líquido total de 1.705,634 gramas – confirmada pena de 5 anos de prisão aplicada pela Relação;

No acórdão de 23-10-2008 (processo n.º 2813/08-5.ª): cidadã malaia desembarca no Aeroporto da Maia, proveniente do Rio de Janeiro, transportando 3.962, 06 gramas de cocaína – aplicada a pena de 5 anos e 6 meses de prisão;

No acórdão de 14-05-2009 (processo n.º 46/08.0ADLSB.S1-3.ª): transporte por arguido de nacionalidade espanhola, desembarcado no Aeroporto de Lisboa, proveniente de Rio de Janeiro, no interior de mala de porão, de 17 embalagens próprias para cosméticos, contendo cocaína, com o peso líquido de 3.968,17 gramas – confirmada a pena de 5 anos e 6 meses de prisão;

No acórdão de 18-06-2009 (processo n.º 368/08.0JELSB.S1-3.ª): arguido português, desembarcado no Aeroporto de Lisboa, proveniente de Dakar, trazendo consigo, dissimuladas junto ao corpo duas embalagens, contendo cocaína, com o peso líquido de 2.931,285 gramas – confirmada a pena de 5 anos e 6 meses de prisão;

No acórdão de 15-10-2009 (processo n.º 24/09.2JELSB.S1-5.ª): transporte vindo do exterior da comunidade de 2507,870 gramas de cocaína dissimulada em cinta calção – confirmada pena de 5 anos e 6 meses de prisão;

No acórdão de 10-02-2010 (processo n.º 217/09.2JELSB.S1-3.ª): adequada a pena de 4 anos e 9 meses de prisão a arguido de nacionalidade brasileira, desembarcado no aeroporto de Lisboa, proveniente de São Paulo – Brasil, trazendo consigo no interior de uma mala, cocaína, com o peso líquido total de 2907,562 gramas;

No acórdão de 25-02-2010 (processo n.º 137/09.0JELSB.S1-5.ª): arguido de nacionalidade portuguesa, residente na Holanda, desembarcado no Aeroporto de Lisboa, proveniente de Salvador, Brasil, e em trânsito para Amesterdão, transportando numa mala de porão 3.116,400 gramas de cocaína – aplicada a pena de 5 anos de prisão;

No acórdão de 25-03-2010 (processo n.º 312/09.8JELSB.S1-3.ª): caso de transporte por cidadão brasileiro de 2.891,19 gramas de cocaína, proveniente de Caracas, e desembarcado no Aeroporto de Lisboa – confirmada a pena de 5 anos e 2 meses de prisão;

Acórdão de 15-04-2010 (processo n.º 7/09.2ABPRT.P1.S1-3.ª): transporte de cocaína com o peso líquido de 1.690,83 gramas, feita por arguido de nacionalidade canadiana, que desembarcou no Aeroporto Sá Carneiro, proveniente de São Paulo, Brasil, em trânsito para a Holanda – aplicada a pena de 5 anos de prisão;   

Acórdão de 09-06-2010 (processo n.º 294/09.6JELSB.L1.S1 – 3.ª): transporte de cocaína, com o peso líquido de 3.415 gramas, do Brasil para Portugal – aplicada a pena de 4 anos e 6 meses de prisão;

Acórdão de 13-01-2011 (processo n.º 369/09.1JELSB-3.ª): cidadão brasileiro transporta, com o peso líquido de 2.633,394 gramas de cocaína de São Salvador para Lisboa – aplicada a pena de 4 anos e 6 meses de prisão, mas afastando a suspensão da execução da pena;

Acórdão de 29-06-2011 (processo n.º 1878/10.5JAPRT.S1-3.ª): cidadão brasileiro, desembarcado em 14-11-2010, no Aeroporto Sá Carneiro, Maia, transportando de Salvador/Brasil, com destino a Barcelona, 2.121,819 gramas de cocaína – reduzida a pena de 5 anos e 6 meses para 5 anos de prisão;

No acórdão de 02-05-2012 foi aplicada a pena de 4 anos e 10 meses de prisão, pelo transporte da Venezuela de 2996,5 g de cocaína.

No acórdão de 15-01-2014 (processo n.º 10/13-3.ª Secção): foi aplicada a pena 5 anos de prisão, sem lugar a suspensão da execução, a um arguido que desembarcou no Aeroporto Internacional de Lisboa, proveniente de São Paulo (Brasil), com escala em Genebra (Suíça), trazendo consigo, no forro da sua mala de viagem, cocaína com o peso líquido total de 2.002,572 g;

No acórdão de 15-10-2014 (processo n.º 553/13-3.ª Secção), estando em causa o transporte de 2132,809 g de cocaína, foi aplicada a pena de 5 anos de prisão;

No acórdão de 03-02-2016 (processo n.º 426/15.5JAPRT-3.ª Secção), foi aplicada a pena de 5 anos e 6 meses de prisão pelo transporte de 2.919,812 g de cocaína, dissimulada no interior das estruturas rígidas de uma mala de mão e duas malas de porão, num voo procedente de S. Paulo.

Podem acrescentar-se ainda os seguintes acórdãos[6]:

No acórdão de 21-01-2016 (processo n.º 38/15.3JELSB.S1 – 5.ª Secção), considerou-se proporcionada às necessidades de prevenção e à culpa a aplicação da pena de 5 anos e 6 meses de prisão, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01, ao arguido que, no âmbito de um transporte como correio de droga, desembarcou no Aeroporto Internacional de Lisboa, proveniente de Manaus, no Brasil, trazendo dissimuladas na zona das coxas e pernas, coladas nas calças elásticas de cor creme, que o arguido vestia por debaixo das calças que envergava, 4 embalagens envoltas num tecido de velcro preto, contendo cocaína com o peso líquido total de 959,656 g.

No acórdão de 13-07-2017 (processo n. º 2795/16.0JAPRT. S1 – 5.ª Secção), foi aplicada a pena de 5 anos e 4 meses de prisão a arguido sem antecedentes criminais, que por via aérea, transportava, na mala de porão, desde o Rio de Janeiro, no Brasil, com destino ao Luxemburgo, fazendo escala no Porto, uma mochila contendo cocaína com o peso líquido total de 976,28 g, com um grau de pureza de 47,6%, permitindo a feitura de 2323 doses individuais.

No acórdão de 20-06-2018 (Proc. n.º 2176/17.9JAPRT.S1 - 3.ª Secção), supra citado, foi confirmada a pena de 5 anos e 2 meses de prisão a arguido sem antecedentes criminais que procedente do Brasil, transportava cocaína com o peso líquido total de 2.287,647 gramas.

Muito mais recentemente, no acórdão de 30-10-2019, proferido no processo n.º 419/ 18.0JELSB.L1.S1 – 3.ª Secção (inédito), foi fixada a pena de 5 anos e 4 meses de prisão a arguido que transportava cocaína com o peso líquido de 2028,765 gramas.

Convocando decisões deste Supremo Tribunal que se reportam a casos em que a quantidade do produto estupefaciente transportado se aproxima do valor do produto apreendido nestes autos [8,586 kg], temos que:

- No acórdão de 23-01-2008 (Proc. n.º 4555/07-3.ª): arguido desembarca no Aeroporto de Lisboa, proveniente do Rio de Janeiro, com destino a Málaga, trazendo consigo, cocaína, com o peso líquido total de 7. 879,72 gramas - 6 anos e 3 meses de prisão;

- No acórdão de 03-09-2008 (Proc. n.º 1973/08-3.ª: cidadão brasileiro desembarca no Aeroporto de Lisboa, proveniente de Porto Seguro, Brasil, trazendo 6.067, 877 gramas de cocaína – mantida a pena de 5 anos e 6 meses, fixada na 1.ª instância;

- No acórdão de 13-11-2008 (Proc. n.º 3267/08 - 5.ª): arguida portuguesa, residente em Portugal, desembarca no Aeroporto da Maia, proveniente do Rio de Janeiro, Brasil, trazendo consigo, dissimulada no interior da mala de porão que transportava, e dissimulados no interior de frascos de champô e no meio de peças de vestuário, 6.837,432 gramas de cocaína – reduzida a pena de 7 anos de prisão fixada na 1.ª instância para 6 anos de prisão;

- No acórdão de 09-05-2019 (Proc. n.º 67/18.5JELSB.L1.S1-5.ª): transporte, pelas arguidas, de cerca de 5kg de cocaína dissimulada em malas de porão, desde o Brasil até Portugal, mantidas as penas de 5 anos e 8 meses de prisão aplicadas pela 1.ª instância;

- No acórdão de 06-11-2019 (Proc. n.º 358/18.5JELSB.L1.S1-3.ª): o arguido que desembarcou no Aeroporto Internacional de Lisboa, proveniente de Fortaleza, Brasil, e com destino final na Guiné Bissau, com 20 embalagens contendo 3.100 gramas de cocaína, escondidas entre o forro de três malas, fixada a pena de 5 anos e 6 meses de prisão;

- Acórdão de 09-12-2019 (Proc. n.º 3/19.1JELSB.S1-5.ª): arguido, de naturalidade colombiana, desembarcou no Aeroporto ..., em Lisboa, procedente de Madrid (Espanha), tendo sido detectados, no interior da sua bagagem 2 frascos plásticos com indicação de gel redutor que continham cocaína (cloridrato) com o peso líquido de 5 251,800 g. o tribunal aplicou-lhe a pena de 5 anos e 3 meses de prisão.”.

Dos padrões sancionatórios da jurisprudência suprarreferida, em que se tem em consideração a quantidade de cocaína apreendidas aos “correios de droga”, constata-se que são aplicadas, geralmente, penas de prisão que variam entre os 5 anos e os  5 anos e 6 meses de prisão por transporte de quantidades bem inferiores às que estão aqui em causa, pelo que não se pode concluir, como pretende o recorrente, que a sua condenação, numa pena de 6 anos de prisão, pelo tráfico de cerca de 6 kg de cocaína, com uma pureza entre 28,4% e 33,4%, configura “uma gritante injustiça”.

Em suma, perante as fortes exigências de prevenção geral e especial e a elevada culpa do arguido AA, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1 do DL nº 15/93, de 22.01, com referência à Tabela I-B anexa ao citado diploma, o Supremo Tribunal de Justiça conclui que a pena de 6 anos de prisão, fixada pelo Tribunal a quo, não merece censura, por ser proporcional e adequada àquelas exigências, sem ultrapassar a medida da culpa, em integral respeito do disposto nos artigos 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa e 40.º e 71.º do Código Penal.

Assim, não pecando por excesso a pena de 6 anos de prisão - próxima do limite mínimo legal de 4 anos e bem longe dos 12 anos de prisão como limite máximo -, improcede também esta questão.

15. Da (eventual) suspensão da execução da pena.
Os pressupostos da suspensão da execução da pena vêm enunciados no art. 50.º, n.º 1 do Código Penal.
Nos termos deste preceito legal, «O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.».
O pressuposto formal de aplicação da suspensão da execução da prisão é apenas que a medida concreta da pena aplicada ao arguido não seja superior a 5 anos.
O pressuposto material da suspensão da execução da pena de prisão é que o Tribunal conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do arguido, ou seja, que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
No caso concreto, pressuposto da suspensão da pena de prisão pretendida pelo recorrente, nos termos dos artigos 50.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal, era a redução da pena de prisão para medida não superior a 5 anos.

Tendo em conta que o arguido foi condenado, em 1.ª instância, na pena de 6 anos de prisão, confirmada pelo Supremo Tribunal de Justiça, não se mostra verificado o pressuposto formal de aplicação da suspensão da execução da prisão.

Faltando, o preenchimento do primeiro pressuposto desta pena de substituição, falece imediadamente a pretenção do ora recorrente de lhe vir a ser suspensa a execução da pena de prisão, sem necesidade sequer de abordar o preenchimento pelo mesmo do respetivo pressuposto material.

Com a improcedência, também, desta terceira questão objeto de recurso, resta negar provimento ao recurso.

III - Decisão

           

Nestes termos e pelos fundamentos expostos, acorda o Supremo Tribunal de Justiça, em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA, e confirmar o acórdão recorrido.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 6 UCs (art. 513º, nºs 1 e 3, do C. P.P. e art.8.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III, anexa).

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(Certifica-se que o acórdão foi  processado em computador pelo relator e integralmente revisto e assinado eletronicamente pelos seus signatários, nos termos do art. 94.º, n.ºs 2 e 3 do C.P.P.). 

                                                                                             

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Lisboa, 24 de março de 2022

Orlando Gonçalves (Relator)

Adelaide Sequeira (Adjunta)

Eduardo Loureiro (Presidente)

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[1] Cf. entre outros, os acórdãos do STJ de 19-6-96 (BMJ n.º 458º, pág. 98) e de 24-3-1999 (CJ, ASTJ, ano VII, tomo I, pág. 247) e Germano Marques da Silva , in “Direito Processual Penal Português – Do Procedimento (Marcha do Processo)”, Universidade Católica Portuguesa, vol. 3, 2018, págs. 335/336.
[2] Cf. entre outros, os acórdãos do STJ de 25 de maio de 2005 (proc. n.º 05P1566), de 12 de Julho de 2006 (proc. n.º 06P796) e de 25 de Outubro de 2006 (proc. n.º 06P1286), in www.dgsi.pt/jstj.
[3]  Cf. “Direito Penal Português, as consequências jurídicas do crime”, noticias editorial, páginas 306 e 307.  
[4] Cf. Proc. n.º 21/11.8JELSB.S1, in www.dgsi.pt.
[5] Cfr, “ Direito Criminal”, Vol. II, Almedina, edição de 1971, pág. 387.