Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 5.ª SECÇÃO | ||
Relator: | HELENA MONIZ | ||
Descritores: | MEDIDA DA PENA PENA ACESSÓRIA PENA DE EXPULSÃO PENA ÚNICA DUPLA CONFORME INADMISSIBILIDADE DO RECURSO TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES | ||
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Data do Acordão: | 10/29/2020 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | REJEITADO O RECURSO DO ARGUIDO BB; JULGADO IMPROCEDENTE O RECURSO DO ARGUIDO AA. | ||
Indicações Eventuais: | TRANSITADO EM JULGADO | ||
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Sumário : |
I - É admissível o recurso de uma decisão do Tribunal da Relação relativamente aos crimes aos quais se tenha aplicado pena de prisão superior a 5 anos e não superior a 8 anos quando não haja “dupla conforme”, e de uma decisão da Relação relativamente a todos os crimes cuja pena seja superior 8 anos, ainda que haja “dupla conforme”. VI - Tendo em conta o circunstancialismo que envolve o arguido AA e os crimes praticados, em especial o crime de tráfico de estupefacientes enquanto crime lesivo (também) de bens jurídicos pessoais e que demanda, em atenção às características nefastas para toda a sociedade, fortes exigências de prevenção geral impondo que se demostre à comunidade que a norma proibitiva se mantém válida, e tendo em conta, em atenção ao percurso particular do arguido sem que tenha sido provado qualquer arrependimento (nada consta da matéria de facto provada), as fortes exigências de prevenção especial (fortemente acrescidas pelo comportamento do arguido que completamente indiferente ao Direito viola a proibição de entrada em território nacional e usando documentos de identificação falsos), consideramos que a pena única que lhe foi aplicada de 9 anos de prisão é a necessária e imprescindível, e dentro do limite imposto pela culpa. | ||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 65/16.3GBSLV.E1.S1
Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça:
I
Relatório 1. Em primeira instância, os arguidos AA e BB (entre outros), identificados nos autos, e julgados em tribunal coletivo, no Tribunal Judicial da Comarca de ... (Juízo Central Criminal de ...), por acórdão de 09.12.2019, foram julgados nos seguintes termos: «a) Condenar o Arguido AA, como reincidente, em autoria material, sob a forma consumada e em concurso real ou efectivo, de: - um crime de Tráfico de Estupefacientes, previsto e punível pelo artigos 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência às Tabelas I-A, I-B e I-C, e mapa anexo à Portaria n.º 94/96, na pena de 8 (seis) anos de prisão; - um crime de Condução Sem Habilitação Legal, previsto e punível pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2, dos Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão; - um crime de Violação da Medida de Interdição de Entrada, previsto e punível pelo artigo 187.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 23/2007, de 4 Julho, na pena de 10 (dez) meses de prisão; - um crime de Falsas Declarações, previsto e punível pelo artigo 359.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de prisão; e - dois crimes de Falsificação de Documento, previstos e puníveis pelo artigo 256.º, n.ºs 1, als. e) e f), e 3, do Código Penal, com referência ao artigo 255.º, als a) e c), do mesmo diploma legal, nas penas de 2 (dois) anos de prisão por cada um dos mesmos; b) Fazer o cúmulo jurídico das penas supra aplicadas em a) e condenar o Arguido AA na pena única de 12 (doze) anos de prisão; (...) f) Condenar o Arguido BB, pela prática em autoria material, sob a forma consumada, e em concurso real ou efectivo, de: - um crime de Tráfico de Estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência às Tabelas I-A e I-B anexas àquele diploma legal, na pena de 7 (sete) anos de prisão; e - um crime de Violação da Medida de Interdição de Entrada, previsto e punível pelo artigo 187.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 23/2007, de 4 Julho, na pena de 10 (dez) meses de prisão; g) Fazer o cúmulo jurídico das penas supra aplicadas em f) e condenar o Arguido BB na pena única de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão; h) Condenar os Arguidos AA e BB na pena acessória de expulsão, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 134º, nº 1, al. a), 151º e 144º da Lei nº 23/2007 de 4 de Julho e artigo 34º, nº 1, do DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro, interditando a sua entrada em território nacional pelo período de 10 (dez) anos; (...) j) Determinar que os Arguidos AA, CC e BB continuem a aguardar os ulteriores termos processuais sujeitos à medida de coacção de prisão preventiva – cfr. Artigo 213º, nº 1, al. b) do Código de Processo Penal; (...)» 2. Inconformados com a decisão, os arguidos AA e BB (entre outros) interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Évora que, por acórdão de 12.05.2020, decidiu quanto aos agora recorrentes que: « (...) d) Conceder provimento parcial ao recurso interposto do acórdão pelo arguido AA e revogar a decisão recorrida, nos termos das alíneas seguintes; e) Condenar o arguido AA pela prática dos crimes a seguir enumerados, reduzindo assim a medida das respectivos penas parcelares: - um crime de Tráfico de Estupefacientes, previsto e punível pelo artigos 21.º, n.º 1, do DL n.º 15/93, de 22/1, com referência às Tabelas I-A, I-B e I-C, e mapa anexo à Portaria n.º 94/96, na pena de 7 anos de prisão; - um crime de Condução Sem Habilitação Legal, previsto e punível pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 3/1, na pena de 10 meses de prisão; - um crime de Violação da Medida de Interdição de Entrada, previsto e punível pelo artigo 187.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 23/2007, de 4/7, na pena de 7 meses de prisão; - um crime de Falsas Declarações, previsto e punível pelo art. 359.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, na pena de 1 ano de prisão; e - dois crimes de Falsificação de Documento, previstos e puníveis pelo artigo 256.º, n.ºs 1, als. e) e f), e 3, do CP, com referência ao artigo 255.º, als. a) e c), do mesmo diploma legal, nas penas de 1 ano e 9 meses de prisão por cada um dos mesmos; f) Proceder ao cúmulo jurídico das penas parcelares agora aplicadas e condenar o arguido AA na pena única de 9 anos de prisão; g) Negar provimento aos recursos interpostos pelo arguido AA e CC, quanto ao mais. h) Negar provimento ao recurso interposto do acórdão pelo arguido BB e manter a decisão recorrida, na parte que lhe toca.» (negritos nossos). 3. Ainda inconformados, os arguidos interpuseram agora recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, concluindo nos seguintes termos: - o arguido AA «1ª) Não se conforma o recorrente com o teor da decisão que o condena da pena única, em cúmulo jurídico, de 9 anos de prisão, e, além do mais, na pena acessória de expulsão do país; 2.ª) O recorrente não se conforma a matéria assente nos artigos 40 a 66 da matéria de facto provada, porquanto resulta de uma convicção intimista e imotivada do julgador. 3.ª) Para chegar a esta convicção, a decisão condenatória baseia-se, quase unicamente, em presunções que redundam na convicção íntima de que o recorrente terá vendido ou cedido produto estupefaciente a todos os consumidores elencados na factualidade dada como provada; 4.ª) A decisão condenatória defende que o recorrente é, indubitavelmente, o “FF” referido na acusação pública, mas como a própria decisão recorrida constata, não existe, em momento algum, uma identificação cabal do “FF”, tendo sido necessário socorrer-se de prova indirecta ou indiciária para associar o recorrente ao uso de um gorro (que seria a atitude típica do vendedor de estupefaciente conhecimento pela referida alcunha). 5.ª) Mas, atento o teor dos depoimentos das testemunhas, isto é, os consumidoras e alegados “clientes” dos arguidos, mormente, do aqui recorrente, verificamos, quanto a este, que apenas a testemunha DD, quando questionada, referiu que conhecia o recorrente AA como sendo o tal “EE”. 6.ª) Em relação às conversações telefónicas mantidas entre os arguidos e os alegados consumidores, repare-se que, nas conversações directas com o recorrente, não existe uma única transcrição em que alguém lhe chame de “FF” ou “EE”, porquanto, não existe uma associação, directa ou indirecta, por via do telefone, entre o recorrente e as alcunhas atrás referidas. 7.ª) O recorrente AA corresponde às características do alegado “FF” apenas em alguns dos actos de traficância indiciados na douta acusação pública, quando concatenada a prova que resulta do depoimento da única testemunha que o identifica cabalmente com alguns dos relatórios de vigilância em que se vislumbra o recorrente a colocar e a retirar o gorro que utilizava para tapar a cara. 8.ª) Mas, não é razoável pensar-se que o recorrente AA era o único vendedor de produto estupefaciente que tapava a cara com um gorro para proceder directamente às transacções aos alegados consumidores que lhe apareciam e, muito menos, que todas as transcrições telefónicas constantes nos vários Apensos juntos aos autos em que se identifica o “FF” como traficante devem ser associadas ao aqui recorrente. 9.ª) Neste contexto, a fundamentação apresentada na decisão condenatória não satisfaz o disposto no art.º 374º, n.º 2 do CPP, tal como temos por imprescindível, sobretudo o exame crítico das declarações dos consumidores e, essencialmente, das transcrições das escutas telefónicas que, em termos conjunturais, não demonstram a intervenção do recorrente nos termos relatados na mesma. 10.ª) Tal análise crítica, conforme a escrutinamos, parecer ser susceptível de pôr em causa o nexo de causalidade, mormente, entre o teor das transcrições constantes nos Apensos juntos aos autos quando se presente associar o “FF” ao arguido AA e, acima de tudo, enquanto único traficante que usava tal indumentária para tapar a cara nos actos de tráfico em concreto. 11.ª) A decisão condenatória não ponderou toda a prova produzida, não a analisou e examinou criticamente, isto é, não formou a sua convicção de forma sustentada nos meios probatórios no seu todo, mas apenas de forma selectiva. 12.ª) Consequentemente, ofendeu, de forma directa e intolerável os direitos e garantias do arguido, com consequente violação do art.º 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa. 13.ª) Pelo que, enferma o acórdão condenatório de uma inquestionável nulidade, por violação do disposto no art.º 379.º, do CPP. 14.ª) Isto é, a decisão condenatória revela-se tendenciosa, em virtude de uma apreciação e de uma avaliação das transcrições das escutas telefónicas em torno da história criada pela acusação pública sobre o traficante conhecido por “FF”, ao arrepio, dizemos nós, dos princípios da prova que norteiam o processo penal, mormente, sobre a necessidade de produção de prova cabal e inequívoca que corroborem a tese de que o recorrente era o único traficante que usava o gorro para tapar a cara nos actos de traficância, acabando por revelar a cabal inobservância do preceito supra citado, por parte do Tribunal de 1.ª instância e das garantias de defesa do recorrente. 15.ª) O Tribunal de 1.ª instância limitou-se a empiricamente analisar as provas em que se baseou para dar os factos como provados e também aquelas em que se baseou no que concerne aos factos não provados, não efectuando o necessário exame crítico das provas, não obstante a procissão de fé operada perante a história criada pelos OPC´s durante o período em que decorreu o inquérito. 16.ª) Todos os testemunhos dos consumidores levados a depor tinham uma coisa em comum: durante um período mais ou menos longo deslocavam-se à zona de ..., em zona de mato, onde adquiriam para o seu consumo de produto estupefaciente a vários indivíduos de pele ..., entre eles, pelos menos um com a cara tapada com um gorro para não ser reconhecido. 17.ª) E, não obstante a associação do tal “HH” apenas ao recorrente AA, não ficou líquido nem transparente durante as várias sessões de julgamento que apenas este usava um gorro para tapar a cara enquanto fazia as transacções de produto estupefaciente. 18.ª) Bem pelo contrário, nenhuma testemunha ouvida em audiência de julgamento conseguiu garantir que o “HH” era o recorrente AA ou que era sempre e somente o recorrente AA e, por isso, associar todas as vendas operadas por alguém com a cara tapada com um gorro apenas ao recorrente AA, traduz-se num aproveitamento dos depoimentos dos consumidores em causa para extrair dos mesmos conclusões diversas e arredias ao senso e à experiência comum, e que se reflectiu, inexoravelmente, numa errada apreciação da prova carreada, traduzindo-se numa dolorosa condenação e excessiva e, por isso, injusta e desajustada à realidade concreta demonstrada em sede de julgamento. 19.ª) A decisão condenatória, face a toda a prova junta e produzida nos autos, não fez uma análise crítica da mesma nem fundamentou por que razão havia hipervalorizado ou sobreposto, na sua apreciação global, ao recorrente AA, todos os depoimentos que implicavam um traficante HH com um gorro, por forma a ser cabalmente entendido o raciocínio lógico subjacente à decisão, pelo que, violou o disposto no art.º 374º, n.º 2, do CPP, o que conduz à nulidade da sentença (art.º 379.º, n.º 1, do CPP). 20.ª) A decisão condenatória coloca claramente o acento decisivo quanto à questão da autoria do crime de tráfico de estupefacientes pelo recorrente AA nas transcrições das escutas telefónicas de um individuo que se autointitulava por “FF”, nos depoimentos testemunhais que corroboram a tese de o “FF” ser alguém que tapava a cara com um gorro para proceder às transacções de produto estupefaciente e das vigilâncias operadas pelos OPC´s que evidenciam o uso do gorro pelo recorrente AA em oito ou nove circunstâncias de contacto directo com os consumidores referenciados de produto estupefaciente, que serviram para criar a ilusão de que o recorrente seria a autor material de todos os actos de traficância que lhe foram imputados. 21.ª) Mas tal papel proeminente não aparece corroborado de forma lógica e motivável em nenhum elemento de prova suficientemente idóneo, apreciado à luz das regras da normalidade e do princípio da livre apreciação de prova, para atestar que o recorrente AA era o único “HH” em todas as circunstâncias enunciadas na douta acusação pública. 22.ª) O recorrente não concorda com o juízo da valoração da prova feita pelo Tribunal a quo, baseado em presunções e ilações ao arrepio da prova concretamente produzida em audiência de julgamento. 23.ª) A decisão condenatória não usou da perspicácia e prudência necessárias para avaliar e avalizar os depoimentos e testemunhos de acusação, mormente, os dos militares da GNR, uma vez que, os relatórios de vigilância constantes nos autos dizem respeito a dias concretos, não seguidos, de actos de traficância operados por alguém com um gorro na cabeça e, no meio deles, aparecem oito ou nove em que o recorrente AA é identificado. 24.ª) Pelo que, oito ou nove vigilâncias positivas, associadas a um depoimento de um consumidor com reconhecimento positivo do recorrente AA não dão azo a todos os actos de tráfico enunciados pela decisão condenatória. 25.ª) Consequentemente, a decisão condenatória extrapolou em muito o sentido, o alcance e o conteúdo do princípio da livre apreciação da prova plasmado no art.º 127.º do Código do Processo Penal. 26.ª) Assim, feita então a necessária apreciação crítica da prova, mormente, a que resulta dos testemunhos dos consumidores chamados a depôr e dos actos de vigilância operada pelos OPC´s, temos que: Factos provados 1 e 2: não ficou demonstrado que o recorrente AA era o único traficante na zona de mato de ... que tapava a cara com um gorro para proceder aos actos de transacção de produtos estupefacientes e, ainda menos, que tal actividade tivesse a antiguidade desde 2015. Por outro lado, não existe nenhum elemento probatório que corrobore a tese de que o recorrente tinha a colaboração II desde 2018, que tinha a função de vigilância. Factos provados 37 a 73: não ficou demonstrado, inequivocamente, que o recorrente AA vendeu ou cedeu produto estupefaciente em todas as circunstâncias ali descritas. 27.ª) O recorrente concede na factualidade descrita em 40.º dos factos provados, porquanto, a mesma encontra-se corroborada por relatórios de vigilância realizados por OPC´s, onde se descreve o tipo de actos praticados pelo recorrente. 28.ª) Em concreto, estamos a falar de 9 actos de tráfico ocorridos entre 14 de Junho de 2016 e 14 de Junho de 2018, isto é, em 2 anos inteiros, os OPC´s conseguiram descortinar (e convolaram para auto) 9 contactos entre o recorrente e consumidores de produto estupefaciente referenciados. 29.ª) Estes contactos relatados pelos OPC´s encontram-se verdadeiramente descritos nos factos 45.º, 46.º, 56.º, 57.º, 58.º, 59.º, 60.º, sendo que a factualidade descrita em 56.º a 60.º foi constatada pelos OPC´s entre Janeiro e Março de 2018. 30.ª) E, portanto, toda a restante factualidade, mormente a que resulta dos factos provados 41.º, 42.º, 43.º, 44.º, 47.º, 48.º, 49.º, 50.º, 51.º, 52.º, 53.º, 54.º, 55.º, 61.º, 62.º, 63.º, 64.º, 65.º e 66.º, respeitantes a alegados actos concretos de venda de produtos estupefacientes, não se encontram corroborados por nenhum elemento de prova suficiente de idóneo e que ultrapasse a dúvida razoável. 31.ª) De resto, a testemunha DD foi a única (de todas as elencadas) que admitiu e confirmou que o recorrente AA lhe vendeu produto estupefaciente, pelo que, deve ser considerado como assente o facto n.º 60 dos factos provados. 32.ª) Em síntese, a convicção de que o recorrente AA praticou todos os actos de tráfico enunciados na decisão condenatória assentam em meros indícios e presunções, que violam o princípio da livre apreciação da prova e das regras da experiência comum, princípio este que não pode ser discricionário, pois tem limites que não podem ser tacitamente ultrapassados, constituindo apenas uma liberdade de acordo com um dever – o dever de perseguir a verdade material. 33.ª) Por tudo o que foi infra exposto e amplamente demonstrado, os pontos essenciais da matéria de facto foram incorrecta e erroneamente apreciados, o que redundou numa deficiente apreciação da prova e na injusta condenação do arguido pela prática dos crimes ora imputados (art.º 412.º, n.º 3, do CPP). 34.ª) O princípio in dubio pro reo, é um dos princípios basilares e estruturantes do nosso sistema jurídico-penal, é uma decorrência do princípio da presunção de inocência, enquanto regra probatória, e tem como consequência o facto de caber à acusação carrear para o processo o material probatório, desonerando assim o arguido do ónus da prova da sua inocência e, em julgamento, a acusação deve apresentar de uma forma concreta e precisa, os fundamentos que criem no espírito do julgador a convicção de que as provas têm valor “irrefutável”, o que não aconteceu no caso vertente, quanto à prova e tipo de prova que foi produzida. 35.ª) O princípio da presunção da inocência do arguido e o seu corolário in dubio pro reo demandavam uma decisão diversa da ora posta em crise, porquanto, não havendo prova cabal e inequívoca da prática de todos os actos de tráfico descritos na douta acusação pública, impunha-se a avaliação dos elementos de prova indiciária existentes à luz dos critérios legais e dos ensinamentos da Doutrina e da Jurisprudência. 36.ª) A decisão condenatória fez uma incorrecta aplicação do princípio consignado no art.º 127º do CPP, isto é, que apreciou mal a prova: A) Face à ausência declarações do recorrente; B) Face à existência apenas de um testemunho directo que reconhece o recorrente AA como sendo o “HH”; C) Face às várias contradições entre os testemunhos de acusação, mormente, daqueles de que depuseram no sentido de existirem vários traficantes que usavam gorro até àquele que colocou o “HH” e o “JJ” na mesma “pele”; D) Face às resquícias vigilâncias operadas pelos OPC´s com reconhecimento cabal positivo do recorrente AA em que este coloca o gorro quando vai “encarar” os consumidores que o procuravam; E) Face à inexistência de elementos de prova concretos que consigam fazer a associação entre o recorrente AA e o uso do telefone onde o alegado traficante se autointitulava por “FF”; e, F) Face à valoração deturpada dos depoimentos dos OPC´s e a descontextualização das transcrições das escutas telefónicas; 37.ª) Consequentemente, a decisão condenatória assentou-se em presunções que violam o princípio da livre apreciação da prova e das regras da experiência comum, princípio este que não pode ser discricionário, pois tem limites que não podem ser tacitamente ultrapassados, constituindo apenas uma liberdade de acordo com um dever – o dever de perseguir a verdade material. 38.ª) Diferentemente da axiologia probatória que enforma o processo civil – onde predomina o princípio do dispositivo que se repercute e desenvolve sob diferentes ónus de prova –, já no processo penal é ao Tribunal que compete o dever de prosseguir a descoberta da verdade, pelo que, sói dizer-se, com inteira propriedade, que em processo penal não há um ónus da prova. 39.ª) – "I- O Supremo Tribunal de Justiça pode reconhecer a violação do princípio «in dubio pro reo» quando da decisão recorrida resultar que, tendo o tribunal «a quo» chegado a uma situação de dúvida sobre a realidade dos factos, decidiu em desfavor do arguido; ou quando, não reconhecendo o tribunal recorrido essa dúvida, ela resultar evidente do texto da decisão, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, ou seja, quando é verificável que a dúvida só não é reconhecida em virtude de um erro notório na apreciação da prova, nos termos da alínea c) do nº2 do art° 410° do Código de Processo Penal. II- Tendo-se provado que o arguido destinava a heroína à venda lucrativa, visando com os respectivos provemos financiar pelo menos o seu próprio consumo habitual desse estupefaciente, e havendo ficado não provado que o Arguido visava com esses proventos financiar outros gastos pessoais para além do consumo, e não permitindo o restante factualismo provado ter como existentes outros destinos de tais provemos, é manifesto que teria de concluir-se pela dúvida insanável sobre o mencionado facto da exclusividade, integrante de elemento essencial do crime privilegiado do artigo 26° do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro. III- Essa dúvida não poderia resultar em prejuízo do arguido, uma vez que, embora lhe fosse favorável, não existe em processo penal o ónus de alegação e de prova, face ao princípio da investigação que o domina, sem contradição com o princípio da acusação e da estrutura basicamente acusatória que o caracteriza. Pelo contrário, recaindo sobre um facto constitutivo de um elemento típico integrador de uma circunstância atenuante modificativa, essa dúvida teria, por força do princípio «in dubio pro reo», de ser resolvida a favor do arguido, portanto no sentido de se considerar provada essa circunstância, que lhe é favorável, da referida finalidade exclusiva." Ac. Do S.T.J. de 20-10-1999 (P. 1475-98), in Bol. do Min. da Just., 490, 64. 40.ª) Assim, a busca da verdade material dos factos demandava a concretização de todos os actos de tráfico que alegadamente foram praticados pelo recorrente AA e a prova produzida e constante nos autos não permite subsumir a gravidade da sua conduta de tráfico de estupefaciente, mormente, de todos os actos de tráfico ora imputados, nem mediante a extrapolação pela livre apreciação da prova, já que tal subsunção especulativa não se traduziria em nenhuma convicção racional e motivável conivente com os elementos probatórios carreados. 41.ª) E, concretizando a prática do crime de tráfico de estupefacientes ao crime a alguns actos concretos de traficância ao longo do tempo em que decorreu a investigação criminal, não revela a gravidade nem a reiteração que a acusação pública quer fazer crer. 42.ª) A pena de prisão de 9 anos de prisão agora aplicada ao recorrente pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora ainda é demasiado longa e pode comprometer a sua reinserção social, que é o oposto do que realmente se pretende. 43.ª) É difícil reintegrar na sociedade uma pessoa após 9 anos da sua vida preso quando tem a efectiva consciência de que não cometeu todos os actos ilícitos que lhe apontam, mormente, no que diz respeito aos acto concretos de traficância de que não ficaram demonstrados. 44.ª) É sobejamente conhecido que a pena efectiva de prisão não cumpre as exigências de prevenção especial e de ressocialização, pois introduz o condenado no meio criminógeno, altamente estigmatizante, que, por obedecer a valores e princípios próprios, é capaz de corromper e perverter os objectivos pretendidos com a sanção aplicada ao agente, afastando-o, cada vez mais, do comportamento que de si é esperado. 45.ª) A pena aplicada ao recorrente ainda se mostra excessiva, uma vez que ultrapassa o grau de culpa e, ao determinar a concreta medida da pena, a decisão condenatória assentou na prevenção e repressão do crime, alheando-se da recuperação e ressocialização do delinquente. 46.ª) A decisão condenatória violou o estatuído nos art.º 40.º do Código Penal, na medida em que procurou visar tão-somente a protecção dos bens jurídicos e a defesa da sociedade de alguém que tem mantido uma conduta contrária às normas instituídas, mas, descurou a sua reinserção social. 47.ª) Não se pode olvidar o passado criminal do recorrente, contudo, na determinação da medida da pena em cúmulo jurídico é mais relevante a finalidade de reabilitação do recorrente para sociedade do que a finalidade de punição de conduta perpetrada pelo mesmo. 48.ª) Acresce que o recorrente beneficia de uma integração social e familiar positiva, mediante o apoio familiar alargado e das visitas regulares da sua companheira (como quem vivia maritalmente antes de ser preso) e dos seus dois filhos menores (fruto de uma anterior relação marital) – Cfr. facto 165 dos factos provados. 49.ª) O recorrente não está sozinho em Portugal e, sendo cidadão ... beneficia da integração social e profissional positiva, porquanto, a comunidade ... residente presta todo o apoio de reintegração, mormente, para os reclusos ou ex-reclusos da sua comunidade. 50.ª) O recorrente usufruiu ainda um amplo apoio financeiro da sua família alargada, mormente, primos e tios que têm ajudado na sua subsistência nas necessidades básicas. 51.ª) Pelo que, na determinação da medida concreta da pena deve ser valorado positivamente todos os factores atenuantes supra considerados. 52.ª) De facto, as circunstâncias atenuantes relacionadas com o apoio familiar que é patente em relação ao recorrente e, bem assim, a concreta integração na comunidade ... residente em Portugal, não foram suficientemente sopesadas como factores de ressocialização e, consequentemente, como inibidores de continuação de qualquer actividade criminosa. 53.ª) As exigências de prevenção geral perante a necessidade de reposição contrafáctica das normas violadas, tendo em conta as circunstâncias ocorridas; as exigências de prevenção especial de socialização do arguido, a medida da culpa, e, as circunstâncias atenuantes que depõem a favor do recorrente, temos como manifesto que a pena agora aplicada de 9 anos de prisão ainda se revela excessiva, injusta e desproporcional, em face da dosimetria penal abstractamente aplicável com referência aos crimes praticados. 54.ª) Consequentemente, tudo ponderado com a avaliação global dos factos em conjunto com a personalidade do recorrente, evidencia uma tendência criminosa já superada, perante actos concretos de integração social e familiar já demonstrados, pelo que, deve corresponder a pena não superior a 8 anos, ou seja, sendo fixada próximo do limite, o que se mostra adequada às exigências de prevenção e contida no limite da culpa. 55.ª) A pena acessória de expulsão não se acha devidamente fundamentada e viola o disposto no art.º 157.º n.º 1, alínea a), da Lei n.º 23/2007, de 4/7, e os artigos 374.º n.º 2 e 379.º , do Código do Processo Penal. 56.ª) De acordo com o seu relatório social, o recorrente “é pai de 2 filhos menores fruto de uma união de facto já terminada, tendo no presente uma nova ligação afectiva. Mantém contactos telefónicos regulares com a progenitora, residente em .... (…) No Estabelecimento Prisional onde está preso preventivamente, encontra-se “a trabalhar e a fazer formação, de forma a melhorar as suas competências pessoais e laborais.” 57.ª) Portanto, o recorrente tem dois filhos menores em Portugal e, além disso, beneficia de amplo apoio familiar dos seus primos e tios que residem também em Portugal, além da comunidade ... que é um estímulo de integração social e laboral. 58.ª) Pode-se considerar que o recorrente é um residente de longa duração do nosso país, tendo criado já fortes laços familiares e de ligação e, além disso, não tem familiares em .... 59.ª) A decisão condenatória não respeitou as regras dos residentes de longa duração e nem considerou que o recorrente não tem já laços com o seu país de origem, .... 60.ª) É em Portugal que residem os seus filhos menores e a sua companheira (cidadã portuguesa), que, além do mais, se encontra disposta a ajudá-lo na sua reinserção e lhe dará todo o apoio necessário quando este sair da prisão. 61.ª) A pena acessória nada tem a ver com o efeito da pena, enquanto consequência automática e necessária do crime, pelo que, o STJ , no seu Ac. de Fixação de Jurisprudência n.º 14/96 , de 7.11.96 , in DR , I Série , de 27/11/96, centrou o seu objecto afirmando o seu carácter não automático pela condenação por crime, devendo ser sempre avaliada em concreto a sua necessidade e justificação , em conformidade com o art.º 30 .º, da Constituição da República Portuguesa. 62.ª) A pena acessória é adjuvante da eficácia da pena principal e, tal como esta, terá que ser devidamente fundamentada, suposto que se mostrem reunidos os seus pressupostos, traduzindo uma segmentada condenação injusta. 63.ª) O nosso país, em obediência ao direito comunitário e numa óptica de solidariedade e espírito de humanitarismo para com aqueles que o procuram em busca de melhores condições de vida ou sejam vítimas de violência ou de perseguição em função da sua etnia , raça ou religião , consagra na lei n.º 23/2007, de 4/7, entretanto parcialmente alterada pela Lei n.º 29/2012, de 9/8, um regime de favor à residência de estrangeiros , estabelecendo condições apertadas de expulsão, como última “ratio” à permanência no espaço nacional . 64.ª) Impera, na ponderação da expulsão, uma regra de proporcionalidade, conciliando o interesse do Estado na não manutenção nas suas fronteiras daquele que viola os seus valores comunitários e o daquele que torna insubsistente, pela gravidade dos factos, indesculpável, por pernicioso e potencialmente perigoso, o acolhimento e a presença no país estrangeiro. 65.ª) Só em casos ponderosos que tornam intolerável a presença do estrangeiro se justifica o afastamento do espaço territorial soberano de estrangeiro indesejável 66.ª) Na decisão da pena de expulsão, ponderou-se ser o recorrente natural de ..., tendo-se também apurado que, embora encontrando-se irregular, possuía (e possui) residência (casa morada de família) com a sua companheira e, além disso, uma ampla ligação familiar, mais directamente, com os seus dois filhos menores. 67.ª) Assim sendo, o perfil pessoal do recorrente é manifestamente positivo e, não obstante o seu cadastro criminal, não veio para Portugal só para traficar ou para praticar outros crimes e, igualmente se mostra divorciada da realidade a asserção de que não possua integração familiar em Portugal e em termos de concorrerem para a sua reinserção social, potenciada, de resto, pelo nascimento dos seus dois filhos menores. 68.ª) Está suficientemente apurado (através do relatório social) que o recorrente não tem nenhum familiar em ... e beneficia de um amplo apoio familiar atinente à sua reinserção. 69.ª) De facto, como tem considerado a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, a presença de um núcleo familiar com alguma consistência em Portugal, com o qual mantém alguma ligação (sendo certo que a mãe se encontra a viver e a trabalhar em ..., nos ...), leva a ponderar que a expulsão para o país natal seria votá-lo ao abandono absoluto, que não estará a coberto da filosofia inspiradora daqueles diplomas sobre o regime de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros, além de que, com o apoio familiar descrito, tal medida se antolha desproporcionada, mostrando-se algo mitigado o receio de que, futuramente, seja um perigo, uma ameaça à ordem e tranquilidade do país que o acolheu. 70.ª) Pelo que, deve merecer provimento a revogação da execução da pena acessória de expulsão. Termos em que, se requer a V. Exas. Senhores Juízes Conselheiros, que o presente recurso seja julgado procedente, por provado, e, consequentemente, face à matéria ora alegada e verificada existência dos vícios elencados, deverão V. Exas., salvo o devido respeito por opinião adversa, na impossibilidade de decidir da causa, determinar o reenvio do processo para novo julgamento, para que os invocados vícios sejam sanados e para permitir uma nova discussão sobre a matéria de facto ora em crise.» - o arguido BB «1 - Das Interceções Telefónicas: Assim, relativamente ao valor probatório das interceções e localizações sempre diremos que a ora Recorrente não se conforma, nem se poderia conformar, com o entendimento do Tribunal a quo, no tocante a esta matéria, perfilhando entendimento diverso levado a cabo por alguma Doutrina e Jurisprudência. 2 - O legislador processual-penal intitula as «escutas telefónicas» como um dos «meios de obtenção da prova». 3- Enquanto tal, as escutas telefónicas constituem um meio de investigação do thema probandi e, pois, de obtenção da prova, não constituindo elas em si a prova do crime. 4 -«Os meios de obtenção de prova são instrumentos de que se servem as autoridades judiciárias para investigar e recolher meios de prova, não são instrumentos de demonstração do thema probandi, são instrumentos para recolher no processo esses instrumentos. 5 - (...) Na perspectiva lógica os meios de prova caracterizam-se pela sua aptidão para serem por si mesmo fonte de convencimento, ao contrário do que sucede com os meios de obtenção da prova que apenas possibilitam a obtenção daqueles meios» - Cf. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II volume, edição de 1999, páginas 189 e 190. 6 -Ou seja, as gravações das escutas telefónicas são os "suportes técnicos referentes a conversações ou comunicações". 7- Encontrando-se o Código de Processo Penal elencado e dividido em diversos Capítulos, as Intercepções telefónicas encontram-se alocadas nos “meios de obtenção de prova” e não nos meios de prova. 8 -Consideramos que a mera transcrição das intercepções telefónicas não constituem de per si prova documental, pois isso seria fazer “entrar pela janela o que não entra pela porta”, subvertendo o espírito da lei processual penal. 9- Mas, ainda assim, admitindo que as transcrições das intercepções telefónicas processualmente válidas constituem em si um meio de prova documental apto a ser valorado pelo Tribunal e assim um instrumento idóneo de convencimento do Tribunal, sempre diremos que esse instrumento apenas deverá ser utilizado quando corroboradas/sustentadas por qualquer outra prova. 10-Pois, como meio de prova documental, a transcrição de intercepção telefónica, apenas prova que num preciso dia e hora uma certa pessoa proferiu uma determinada locução. 11-A transcrição de uma intercepção telefónica ou SMS, não prova de modo algum, que o facto a que esta se refere tenha efectivamente ocorrido, e muito menos, prova, que tenha sucedido nos precisos termos/circunstâncias, indicados pelo autor da locução. 12- Desta forma, a conversa em si, gravada validamente e transcrita, apenas poderá valer como elemento de prova quando valorado em confronto e sustentado com os demais elementos de prova. 13 -E apenas, nesses termos, quando valorada em confronto com os demais elementos de prova, a transcrição de uma intercepção telefónica ou SMS, ou a localização e activação de células, é susceptível de constituir uma das premissas atendíveis na prova indirecta. 14-Tal posição foi já perfilhada diversas e inúmeras vezes, por jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça. "Não constituindo as escutas telefónicas, no sentido técnico, meios de prova, através exclusivamente do conteúdo de uma conversação escutada, e sem a concorrência dos adequados meios de prova sobre os factos, não se poderá considerar directamente provado um determinado facto, que não seja a mera existência e o conteúdo da própria conversação.) A documentação da escuta não será mais do que a cristalização em suporte do simples conteúdo da comunicação escutada ou interceptada, nada lhe acrescentando, permite a prova directa - mas só - de que uma comunicação existiu, a certa hora, entre determinados sujeitos e com determinado conteúdo”. (cf. - Acórdão do Venerando Supremo Tribunal de Justiça de 07.01.2004. Processo n.º 03P3213. Relator: Juiz Conselheiro Henriques Gaspar, in www.dsgi.pt/istj/ ). 15-Não constituindo as escutas telefónicas, no sentido técnico, meios de prova, através exclusivamente do conteúdo de uma conversação escutada, e sem a concorrência dos adequados meios de prova sobre os factos, não se poderá considerar directamente provado um determinado facto, que não seja a mera existência e o conteúdo da própria conversação. 16- Por último dir-se-á que nenhuma prova foi carreada para os autos que corrobore suficientemente a participação da Arguida ora Recorrente nos factos, apenas assentar nas escutas telefónicas não é o correcto e válido. 17-Ora, o salto lógico, que o Tribunal a quo deu não era de todo permitido. 18-Uma decisão condenatória - deve sustentar-se na necessária e indispensável concretização dos factos capazes de suportar um juízo seguro sobre a responsabilidade jurídico-penal do agente, sendo, por isso, de realçar, para esse efeito, a irrelevância jurídico-penal das imputações genéricas, que não encontram no texto da decisão aquele limiar indispensável de concretização. 19-Ora, salvo melhor entendimento, a decisão recorrida não se sustenta na tal necessária e indispensável concretização dos factos concretos capazes de suportar o referido e exigido juízo seguro sobre a responsabilidade jurídico-penal da Recorrente quanto à prática do crime pelo qual foi condenado, na medida em que como se já referiu supra, o Tribunal a quo, em momento algum, indica um única prova concreta válida e admissível, da prática dos factos por parte do Recorrente. 20-É, pois, de concluir no sentido de se verificar, no que à recorrente respeita, uma ausência de provas válidas e admissíveis - ausência essa impeditiva do exercício dos direitos constitucionais previstos no artigo 32° da CRP, desde logo do seu direito de defesa. 21-Por outro lado, verificando-se a ausência de tal concretização e, mesmo assim, havendo condenação da Recorrente, entende-se, com todo o respeito por melhor opinião, que o Tribunal recorrido, violou, ainda, o princípio constitucional de presunção de inocência previsto no art.° 32°, n° 2 da CRP. 22-Por último, diga-se, ainda, que com a violação de tais normativos constitucionais, o Tribunal a quo, e quanto à ora Recorrente, fez uma interpretação inconstitucional do princípio consagrado no art.° 127° do CPP (livre apreciação da prova). 23-Ora, pelo exposto, apenas podemos concluir que foram dados como provados factos que o não deveriam ter sido, havendo factos sobre os quais houve total ausência de prova. 24-Enferma em nosso modesto entendimento o douto acórdão de nulidade por falta de fundamentação. 25-Com efeito, a ora recorrente procurou escalpelizar o douto acórdão ora recorrido e contraditar o mesmo, evidenciando os seus erros de julgamento e erros de apreciação da prova (não obstante o princípio da livre apreciação da prova), procurando a recorrente sempre sustentar as suas posições na prova produzida em sede de audiência de julgamento. 26-Porém, é difícil procurar contraditar o raciocínio do douto tribunal à quo quando o mesmo não resulta evidente do texto recorrido. 27-Fazendo a leitura da motivação do douto acórdão recorrido vislumbramos (com todo o respeito que nos merece o douto tribunal à quo) um texto de motivação confuso e pouco claro, que de per si não permite objectivamente concluir porque meios e com que objectivos critérios chegou o douto tribunal à quo à conclusão de onde resultou a condenação da recorrente pelos crimes porque veio a ser condenada. 28-O douto tribunal à quo limita-se a fazer referência a nomes de testemunhas, sem que sequer enuncie claramente a forma como esses depoimentos conduziram à formação da convicção, faltando o exame crítico das provas. 29-Não tendo o tribunal indicado completamente as provas que serviram para formar a sua convicção, nem tendo efectuado o exame crítico de tais provas, existe insuficiente fundamentação da sentença, o que determina a sua nulidade, nos termos do art.º 379º, nº 1, al. a), com referência ao art.º 374º, nº 2, ambos do CPP; Nesse preciso sentido o Ac. Do TRL sob o processo n.º 1670/07.4TAFUN-A.L1-5, disponível em www.dgsi.pt Nesse sentido também o Ac. 151/10.3GBPBL.C1 do TRC, igualmente disponível em www.dgsi.pt 30-Ora, a recorrente para bem conseguir impugnar e contraditar o raciocínio do douto tribunal à quo teria de o entender, o que não sucede na sua plenitude, violando assim o douto acórdão recorrido o basilar e constitucional princípio de que o processo criminal assegura todas as garantias de defesa (ex. vi n.º 1 do art.º 32º da Constituição da República Portuguesa). 31-Enfermando assim o douto acórdão recorrido de nulidade, nos termos do art.º 379º, nº 1, al. a) com referência ao art.º 374º, nº 2, ambos do CPP, o que expressamente se arguí. 32-Ainda que assim se não entenda, o que apenas por mera cautela se admite, sempre devemos aferir se se encontram preenchidos todos os requisitos objetivos e subjetivos para o preenchimento dos crimes porque foi a Recorrente condenada. Assim. 33- Quanto ao crime de Violação da medida de interdição de entrada o Tribunal deverá fundar a sua convicção quanto aos factos provados e não provados na análise crítica do conjunto da prova produzida. 34- Efectivamente não basta a indicação dos meios de prova pré constituídos e produzidos em audiência de julgamento que serviram para fundamentar uma sentença ou acórdão. 35- É ainda necessário um exame critico desses meios, que servirá para convencer os interessados e a comunidade em geral da correta aplicação da justiça no caso concreto. 36- Estes motivos de facto que fundamentam a decisão não são nem os factos provados (thema decidendum), nem os meios de prova (thema probandum), mas os elementos que em razão das regras da experiencia ou de critérios lógicos constituem o substrato racional que conduziu a que a convicção do Tribunal se formasse em determinado sentido ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados em audiência. 37- A fundamentação ou motivação deve sr tal que, intraprocessualmente permita aos sujeitos processuais o exame do processo lógico ou racional que subjaz, conforme impõe o artº 410º, nº2 do C.P.P. 38- E extraprocessualmente a fundamentação deve assegurar, pelo conteúdo, um respeito efectivo pelo princípio da legalidade na sentença ou acórdão e a própria independência e imparcialidade dos Juízes, uma vez que os destinatários da decisão não são apenas os sujeitos processuais, mas a própria sociedade. 39- Não existe qualquer elemento de prova directa ou indirecta que possa consubstanciar que o Arguido violou a medida de interdição de entrada. 40- Não é possível retirar a ilação segundo regras da experiência comum de que o Arguido entrou em território nacional antes da data que lhe foi estipulada (00.00.2018) 41- Na matéria de facto dada como provada, nomeadamente nos pontos 135, 136, 147, 148, onde apenas se afirma que alegadamente o mesmo terá entrado em território nacional, sendo que no ponto 148. É referido que o mesmo voltou a entrar em Portugal em data não concretamente apurada do ano de 2016. 42- Não concretizou a forma porque fundamentou tal conclusão dada como provada na matéria de facto, concretamente no ponto 148. 43- Ora não tendo o Tribunal “a quo” pronunciado sobre o momento em que o Arguido terá entrado em território nacional, manifesto é que a decisão agora recorrida padece de insuficiência da matéria de facto provada para a decisão. 44- Ficando prejudicado pelos motivos invocados e em consequência devendo o Arguido ser absolvido do crime de violação da medida de interdição de entrada, ficará automaticamente prejudicada a punibilidade do Arguido ora recorrente da pena acessória de expulsão pelo período de 10 (dez) anos. 45- Mesmo que o Douto Tribunal, e sua Excelências assim não o entendessem (de que não existiu o crime de violação da medida de interdição de entrada pelos motivos invocados), o que se faz por mera hipótese académica, enfermava ainda o Douto acórdão de falta de fundamentação para a aplicação da pena acessória de expulsão, uma vez que esta não é de aplicação automática devendo ser sempre avaliada em concreto a sua necessidade e justificação (ac. STJ nº14/96 pub. Em DR nº275/1996, serie 1-A de 1996 do 11/27). 46- Assim, não poderia o Douto acórdão, ter aplicado ao Arguido ora recorrente, na pena acessória de expulsão, uma vez que não fundamentou em concreto a necessidade e justificação da mesma. 47- Em consequência deverá o recorrente não ser condenado na pena acessória de expulsão. 48- Para além disso, o Arguido ora recorrente, tem dois filhos menores, um de nacionalidade ... mas que reside legalmente em território nacional e ainda uma filha de 0 ano e 0 meses de nacionalidade Portuguesa que antes da sua detenção se encontravam à sua responsabilidade. 49- Ora, conforme Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, Processo: 169/16.2BEALM , Secção: CA- 2º JUÍZO de 09/21/2017 Relator: PEDRO MARCHÃO MARQUES Sob o tema: ESTRANGEIROS EXPULSÃO LIMITES ii) De acordo com a actual letra do artigo 135.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 59/2017, de 31 de Julho, em vigor desde 7 de Agosto, resulta que nas situações em que o cidadão estrangeiro tenha a seu cargo filhos menores de nacionalidade portuguesa ou estrangeira a residir em Portugal e sobre os quais exerça efectivamente responsabilidades parentais e a quem assegure o sustento e a educação, não pode o mesmo ser alvo de decisão de afastamento coercivo ou de expulsão (e desde que não se verifique a suspeita fundada da prática de crimes de terrorismo, sabotagem ou atentado à segurança nacional ou de condenação pela prática de tais crimes). iii) Perante o deficit instrutório existente relativamente à questão assinalada no acórdão (filhos menores efectivamente a cargo), impõe-se a anulação oficiosa da sentença, com vista a ser completada a instrução do processo e ampliada a matéria de facto, proferindo-se então nova decisão em conformidade com o que for apurado (art. 662.º, n.º 2, al. c) do CPC). 50- Pelo que tal matéria de direito deverá ser aplicada ao presente caso alvo de recurso por parte de Arguido, devendo ser proferida decisão nos termos agora invocados e de acordo com a supra citada jurisprudência. 51-A tipificação do art.º 25.° do DL 15/93 teve o objetivo de permitir ao julgador que, sem prejuízo do natural rigor na concretização da intervenção penal relativamente a crimes desta natureza (de elevada gravidade, considerando a grande relevância dos valores postos em perigo com a sua prática e frequência desta), encontre a medida justa da punição para casos que, embora de gravidade significativa, ficam aquém da gravidade do ilícito justificativa da tipificação do art. 21.° e encontram resposta adequada dentro das molduras penais previstas no art. 25.°. Ao indagar do preenchimento do tipo legal do art. 25.°, haverá que proceder a uma valorização global do facto, sopesando todas e cada uma das circunstâncias aí referidas, para além de outras. (cf- Acórdão do STJ de 02/11/2006 in www.dgsi.pt). 52-O que se torna necessário é que ilicitude do facto se mostre diminuída de forma considerável, ou como diz a lei, consideravelmente diminuída. Trata-se de um facto típico cujo elemento distintivo do crime-tipo reside, apenas, na diminuição da ilicitude, redução que o legislador impõe seja considerável, indicando como fatores aferidores de menorização da ilicitude, a título meramente exemplificativo, os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação e a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações. A aferição de qualquer situação de tráfico no sentido de saber se se deve ou não qualificar como de menor gravidade não pode prescindir de uma análise de todas as circunstâncias objetivas que em concreto se revelem e sejam suscetíveis de aumentar ou diminuir a quantidade do ilícito. 53-Com vem acentuando o STJ, «(...) o advérbio “consideravelmente”, da cláusula geral, não está lá por acaso. No seu significado etimológico, prevalece a ideia de digno de consideração, notável, grande, importante ou avultado» (neste sentido, Ac. S.T.J., de 3/7/96, in www.dgsi.pt) 54-Assim, e para além das circunstâncias atinentes aos fatores de aferição da ilicitude indicados no texto do art. 25.º do DL 15/93, já atrás citados, há que ter em conta todas as demais suscetíveis de interferir na graduação da gravidade do facto, designadamente as que traduzam uma menor perigosidade da ação e/ou desvalor do resultado, em que a ofensa ou o perigo de ofensa aos bens jurídicos protegidos se mostre significativamente atenuado, sendo certo que para a subsunção de um comportamento delituoso (tráfico) àquele tipo privilegiado, como vem defendendo o STJ, torna-se necessária a valorização global do facto. 55- Em resumo, e seguindo por inteiro o entendimento do Acórdão do STJ de 23.11.2011 «Diríamos, em suma, que o agente do crime de tráfico de menor gravidade do art.º 25.º do DL 15/93, de 22 de Janeiro, deverá estar nas circunstâncias seguidamente enunciadas, tendencialmente cumulativas: a)A atividade de tráfico é exercida por contacto direto do agente com quem consome (venda, cedência, etc.), isto é, sem recurso a intermediários ou a indivíduos contratados, e com os meios normais que as pessoas usam para se relacionarem (contacto pessoal, telefónico, internet); b) Há que atentar nas quantidades que esse vendedor transmitia individualmente a cada um dos consumidores, se são adequadas ao consumo individual dos mesmos, sem adicionar todas as substâncias vendidas em determinado período, e verificar ainda se a quantidade que ele detinha num determinado momento é compatível com a sua pequena venda num período de tempo razoavelmente curto; c) O período de duração da atividade pode prolongar-se até a um período de tempo tal que não se possa considerar o agente como “abastecedor”, a quem os consumidores recorriam sistematicamente em certa área há mais de um ano, salvo tratando-se de indivíduo que utiliza os proventos assim obtidos, essencialmente, para satisfazer o seu próprio consumo, caso em que aquele período poderá ser mais dilatado; d) As operações de cultivo ou de corte e embalagem do produto são pouco sofisticadas. e) Os meios de transporte empregues na dita atividade são os que o agente usa na vida diária para outros fins lícitos; f) Os proventos obtidos são os necessários para a subsistência própria ou dos familiares dependentes, com um nível de vida necessariamente modesto e semelhante ao das outras pessoas do meio onde vivem, ou então os necessários para serem utilizados, essencialmente, no consumo próprio de produtos estupefacientes; g) A atividade em causa deve ser exercida em área geográfica restrita; h) Ainda que se verifiquem as circunstâncias mencionadas anteriormente, não podem ocorrer qualquer das outras mencionadas no art.º 24.º do DL 15/93.» (in www.dgsi.pt). 56- Ora, o Arguido BB apenas foi investigado quer em sede de escutas telefónicas, quer em sede de vigilâncias e no fundo globalmente e alegadamente investigado durante o período que mediou entre o ano de 2018. 57- Nesse período de tempo em que alegadamente exerceu a sua atividade por contato direto do agente com consumidores, estes foram apenas 5 (cinco), (pontos 118., 119, 121. 122., 123.) e nunca teve recurso a quaisquer intermediários. 58- As quantidades que alegadamente transmitia era adequada ao consumo individual dos mesmos 59- Quanto ao período que desenvolveu a atividade, foi o período de cerca de 5 (cinco), meses, entre 6/7/2018 (ponto 118 e 119) ate 12/2018 ( 123.) período que deverá ser considerado ainda assim como curto. 60- Os meios de embalagem ou corte eram pouco sofisticados. 61- Não se provou que os proventos obtidos fossem maiores do que os necessários para a subsistência própria ou dos familiares dependentes, com um nível de vida necessariamente modesto e semelhante ao das outras pessoas do meio onde vivia, sendo que se provou que parte deles era gasto no consumo próprio de produtos estupefacientes; 62- Os meios de transporte empregues na dita atividade foram os que o Arguido usa na vida diária para outros fins lícitos. 63- E a atividade foi apenas praticada na área circunscrita de .... 64- Preenche assim, na modesta opinião da defesa o arguido todos os requisitos que anteriormente e de acordo com o referido Acórdão do STJ para que lhe seja aplicado o disposto no artº25º do Decreto Lei 15/93 de 22/01. 65- Todos estes elementos remetem-nos para uma considerável diminuição da ilicitude da conduta deste arguido, compaginável com o disposto no citado art.º 25.º al. a) do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22.1. 66- Conclui-se assim, quanto ao arguido BB pela verificação do tipo privilegiado do art.º 25.º al. a) do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22.1. 67-Uma vez efetuado o enquadramento jurídico-penal da conduta do arguido, urge proceder à determinação da natureza e medida da sanção penal a aplicar, isto tendo em atenção quer o enquadramento dado pelo Douto Tribunal “a quo” que entende ser de aplicar o artigo 21º, quer com o entendimento da defesa que entende ser de aplicar o artigo 25º do decreto Lei 15/93 de 22/1. 68-A pena abstrata aplicável ao crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21.º nº1 do Decreto-Lei n.º 15/93 de 22/1 é de 4 a 12 anos de prisão, sendo que o crime de tráfico de menor de gravidade, p. e p. pelo art.º 25º al. a) do citado diploma tem uma moldura penal de 1 a 5 anos de prisão. 69-De acordo com disposto no art.º 40º n.º1 e 2 do C.Penal a aplicação da pena visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, a qual em caso algum pode ultrapassar a medida da culpa. Com este preceito, o ordenamento penal reflete de forma clara o princípio da culpa, segundo o qual não há pena sem culpa e a culpa decide da medida da pena, como seu limite máximo (art.ºs 1º, 13º n.º1 e 25º n.º1 CRP). 70-Desta forma, a pena há-de ser determinada (dentro dos limites mínimo e máximo fixados na lei) mediante critérios legais, quais sejam, em 1º lugar, o da culpa do agente que fixa o limite máximo inultrapassável da pena, intervindo depois (ao mesmo nível) as exigências de prevenção, especial e geral (a chamada margem de liberdade) (Ac. STJ, 24/5/95, CJSTJ, T.II, p.210 e Ac. RC, 17/1/96, CJ, T. I, p.40). 71-Definidos todos estes parâmetros, a necessidade da pena respeitar a referida proporcionalidade constitui exigência que resulta, além do mais, do princípio que decorre desse art. 18.º n.º 2 da CRP, só assim se harmonizando com o Estado de direito democrático. 72 -A dimensão da lesão jurídica mede-se desde logo pela magnitude e qualidade do dano causado, devendo atender-se, em sentido atenuativo ou agravativo, tanto as consequências materiais do crime como as psíquicas. Importa, ainda, considerar o grau de colocação em perigo do bem jurídico protegido quer na tentativa quer nos crimes de perigo. 73-A medida da violação jurídica depende, também, da forma de execução do crime. 74-Tendo presente tais considerações há que atender no caso em apreço às seguintes circunstâncias, o período de tempo não demasiado curto em que o Arguido praticou o crime de trafico de estupefacientes. 75-A forma simples quer como exercia esse tráfico, quer os meios que utilizava quer para a prática quer para o seu transporte. 76-Atendendo ao período em que praticou o crime de tráfico de estupefacientes, e ao numero de pessoas e vezes que se provou terem adquirido produto estupefaciente os parcos lucros que consequentemente obteve, sendo que não foi demonstrado o contrário em audiência de julgamento, nomeadamente que o arguido tivesse boas casas, bons carros, contas bancárias etc etc. 77-O seu comportamento prisional que demonstra a sua atitude colaborante e de assunção de responsabilidade sobre os factos que praticou. 78-Razão pela qual, e quer se entenda que aplicando o artº21º ou o artº 25º do decreto Lei 15/93 de 22/1, a pena a aplicar ao arguido nunca deverá ser superior a 5 (cinco) anos de prisão, entendendo a defesa que caso e entenda que estamos perante o crime de trafico do artigo 25º a pena a aplicar ao Arguido deverá se de 3 (três) anos de prisão, e caso se entenda que estamos perante a prática do crime p. e p. pelo artigo 21º a pena deverá ser de 4 (quatro) anos de prisão. 79-Entende que ao Arguido deverá a respetiva pena ser suspensa na sua execução. 80-Isto porque o Arguido em momento algum demonstrou não ter consciência da sua conduta antinormativa, pelo contrário, a mesmo tem consciência de que aquilo que fez está errado e não quer voltar a repetir a prática de condutas ilícitas. 81-Diz-nos o artigo 50.º n.º 1 do Código Penal, o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. 82-Neste sentido, a defesa acredita que deverá ser dada uma oportunidade ao Arguido, que, in casu, o Arguido já mudou o seu comportamento, sendo bastante e adequado a aplicação de uma pena de prisão inferior a 5 (Cinco) anos, suspensa por igual período, caso contrário não se está a visar a ressocialização mas apenas a castigar por factos que a mesma cometeu antes de ter contacto com o estabelecimento prisional, que já serviu para a corrigir e mudar a sua conduta diária, sendo que nesse caso estaremos a compactuar com uma verdadeira desressocialização de uma pessoa, in casu, de BB. 83-Face ao que ficou exposto, o Arguido, ainda que o juízo de prognose possa não ser inequivocamente favorável, julga-se não existirem razões para que no caso concreto o Arguido não possa beneficiar da suspensão da pena de prisão a que vier a ser condenado por igual período, servindo-lhe essa condenação como mais um elemento para que não sejam praticados por si novos crimes, pois a mesma já interiorizou as consequências das suas condutas. 84-Relembrando-se novamente que a pena suspensa na sua execução, não perde a sua virtualidade enquanto elemento dissuasor da prática de novos crimes que é, pois todo e qualquer arguido sujeito a uma pena suspensa na respetiva execução sabe que se prevaricar a suspensão é revogada, além de ser objeto de apertado acompanhamento através do regime de prova. 85-Atendendo à conduta anterior e posterior aos fatos manifestada pelo arguido, e por tudo o que se expôs relativamente à referida matéria, deverá a respetiva pena de prisão a aplicar ao Arguido não superior a 5 anos ser suspensa na sua execução. 86- Levanta-se questão de inconstitucionalidade de acordo com o Acórdão n.º 232/2004, Diário da República n.º 122/2004, Série I-A de 2004-05-25, Tribunal Constitucional, Número:232/2004 87- Declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes dos artigos 101.º, n.ºs 1, alíneas a), b) e c), e 2, e 125.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 244/98, de 8 de Agosto, na sua versão originária, da norma do artigo 68.º, n.º 1, alíneas a), b) e c), do Decreto-Lei n.º 59/93, de 3 de Março, e da norma do artigo 34.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, enquanto aplicáveis a cidadãos estrangeiros que tenham a seu cargo filhos menores de nacionalidade portuguesa residentes em território nacional 88- Requerendo-se assim a inconstitucionalidade da referida norma e consequentemente a aplicação desta ao Arguido aqui recorrente.» 4. O recurso foi admitido por despacho de 20.07.2010. 5. Ao recurso interposto respondeu o Senhor Procurador-Geral Adjunto no Tribunal da Relação de Évora considerando que ambos os recursos deviam ser julgados “totalmente improcedentes”. 6. Subidos os autos ao Supremo Tribunal de Justiça, o Senhor Procurador-Geral Adjunto começou por verificar da admissibilidade (ou não) dos recursos interpostos tendo concluído que se impunha: «-A rejeição in totum do recurso do arguido BB nos termos dos art.ºs 399º, 400º n.º 1 al.as f), 420º n.º 1 al.ª b) e 414º n.ºs 2 e 3, todos do CPP; - A rejeição do recurso do arguido AA no tocante à comprovação, figuração e imputação de todos os crimes por que o Recorrente foi condenado e à escolha e medida das respectivas penas parcelares de prisão e da pena acessória de expulsão, nos termos dos, mesmos, art.ºs 399º, 400º n.º 1 al.as f), 420º n.º 1 al.ª b) e 414º n.ºs 2 e 3, todos do CPP. Quanto à pena única aplicada ao arguido AA entende que se “justifica a pena de 9 anos de prisão decretada pelo Tribunal da relação de Évora”, concluindo pela improcedência do recurso. 7. Notificados os arguidos, nos termos do art. 417.º, n.º 2, do CPP, nada responderam. 8. Colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência para decisão.
II Fundamentação
A. Matéria de facto provada Matéria de facto dada como provada (apenas se transcrevem os factos relevantes para os arguidos agora recorrentes): «1. O Arguido AA, que se também se identificava como KK e era conhecido por “FF”, “EE” ou “GG” (por utilizar sempre um passa montanha ou gorro quando contactava com os consumidores), dedicou-se à venda e distribuição de produtos estupefacientes, nomeadamente heroína e cocaína, em zonas de matos conhecidas por “Ponto 3,5”, “Casa ...”, “Sítio ...”, “Sítio ...”, “Vales ...”, “...”, “...”, e “...”, sitas no concelho de ... e no concelho de ..., pelo menos desde o ano de 2015, até à data da sua detenção, em 12 de Dezembro de 2018, detendo e fazendo a entrega dessas substâncias a consumidores e/ou vendedores das mesmas, a troco de uma compensação pecuniária, ou como contrapartida pelos serviços prestados por alguns consumidores. 2. No exercício da referida actividade e pelo menos a partir do ano de 2018 o Arguido AA contou com a colaboração de II (também conhecido por “LL” ou “MM”), que vigiava as referidas zonas de mato para prevenir a aproximação de qualquer elemento da polícia, enquanto decorriam as transacções de estupefaciente, levadas a cabo pelo Arguido AA. (...) * 4. O Arguido AA foi julgado e condenado no âmbito do processo comum colectivo n.º 26/08.6..., que correu termos no 2.º Juízo Criminal do Tribunal de ..., entre outras, na pena acessória de expulsão do território nacional, fixando-se então em 8 anos o período de interdição de (re)entrada em Portugal. Tal acórdão transitou em julgado no dia 20.08.2009. 5. Por decisão do Tribunal de Execução de Penas de ..., foi determinada a execução da pena de expulsão do território nacional para ..., aplicada ao Arguido AA, bem como reiterada a interdição de entrada em território português pelo período de 8 anos, sob qualquer forma ou com outra identidade, a contar da data da sua expulsão efectiva. 6. A expulsão foi efectivada e concretizada no dia 00.00.2013, pelos competentes serviços do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. 7. Aquando da sua efectiva expulsão, foi o Arguido devidamente informado e notificado dos procedimentos em concretização, nomeadamente que, a partir daquela data lhe ficava vedada nova entrada em território português pelo período de 8 anos, ou seja, até 00.00.2021 e que, em consequência, seria inscrito na lista nacional de pessoas não admissíveis. 8. Foi ainda informado que caso não fosse acatada a determinação de interdição de entrada em Portugal e viesse a ser encontrado em território nacional durante o supra referido período, incorreria na prática de um crime de violação da medida de interdição de entrada. * 9. No dia 9 de Dezembro de 2016, pelas 20h30m, na Estrada de ..., em ..., o Arguido AA conduzia o veículo automóvel de marca e modelo Ford Fiesta, com a matrícula 00-00-JN, transportando no lugar do pendura o Arguido NN, altura em que se dirigiram para uma rua sem saída, tentando inverter o sentido de marcha. 10. Nessa ocasião e quando se aperceberam da presença de militares da G.N.R. naquele local, o Arguido NN arremessou para o exterior daquela viatura um pequeno invólucro de cor azul, que ambos os Arguidos detinham, contendo no seu interior, heroína com o peso de 0,715 gramas. 11. Nas circunstâncias de tempo e lugar indicadas em 9., os Arguidos AA e NN detinham ainda no interior do referido automóvel, os seguintes objectos: a. Em baixo do banco do lugar do pendura, na parte traseira: uma bolsa de cor preta, contendo no seu interior a quantia total de € 1.208,12 (mil duzentos e oito euros e doze cêntimos), e um canivete contendo resíduos de cocaína e heroína; b. 1 (um) telemóvel, de marca Samsung; c. 1 (um) telemóvel de marca e modelo Alcatel One Touch; d. 5 (cinco) cartões de telemóvel Moche; e. 10 (dez) saquetas de Brufen 600; f. 5 (cinco) saquetas de Panadol Extra 600mg; e g. 1 (uma) aliança em ouro. 12. O Arguido AA conduziu o sobredito veículo automóvel sem que fosse portador de carta de condução válida, ou outro documento equivalente, emitido pelas autoridades competentes, que nos termos da legislação em vigor, o habilitasse a conduzir tal veículo. 13. O mesmo conhecia as características da via onde conduziu, sabendo que não era possuidor de documento que legalmente o habilitasse a conduzir o veículo automóvel acima identificado e que, nessas condições, lhe estava vedada a sua condução na via pública. 14. Na sequência dos factos acima descritos os Arguidos AA e NN foram detidos em flagrante delito e sujeitos a 1.º interrogatório judicial, no dia 10.12.2016, onde prestaram declarações, nessa qualidade, perante Juiz do Tribunal de ... e no âmbito do qual considerou-se fortemente indiciada a prática pelos mesmos de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo artigo 25.º, al. a), do D.L. n.º 15/93, de 22.01, tendo sido aplicadas as medidas de coacção indicadas a fls. 68 do apenso n.º 281/18.8GDABF (cumprimento das obrigações decorrentes do TIR; obrigação de se apresentarem todas as 6.ªs feiras junto do posto policial da área da sua residência). 15. A referida diligência foi presidida pela Mma. Juiz de Turno que, verbalmente, advertiu o Arguido AA que era obrigado a responder com verdade às perguntas que lhe fossem feitas sobre a sua identificação. 16. Mais, foi o mesmo informado e advertido de que não podia recusar-se a responder àquelas perguntas e tinha de fazê-lo com verdade, sob pena de incorrer em responsabilidade criminal, do que o Arguido ficou ciente. 17. No que tange à sua identificação pessoal, o Arguido AA identificou-se com sendo KK, filho de OO e de PP, natural e nacional de ..., nascido em 00.00.0000, com o estado civil de …. 18. O Arguido AA sabia que, na supra referida situação, havia declarado falsamente a sua identidade pessoal, no que tange ao seu nome completo, à sua filiação e data de nascimento, apesar de advertido da obrigação de responder com verdade às perguntas que lhe fossem feitas sobre a sua identificação pessoal. 19. O Arguido AA quis prestar falsas declarações sobre a sua identificação durante a realização de um interrogatório de arguido detido e perante um Magistrado Judicial, o que quis e conseguiu. 20. O Arguido AA ao declarar que se chamava KK, assinando com tal identificação a constituição como arguido, o auto de interrogatório de arguido e o termo de identidade e residência, bem sabia que tal não correspondia à verdade, que estava a declarar e a atestar uma identidade falsa em documentos elaborados pela G.N.R. e pelo Tribunal de .... 21. O mesmo agiu pretendendo ludibriar as autoridades portuguesas acerca da sua identidade, o que quis e conseguiu. * (...) 28. No interior do sobredito veículo encontravam-se, ainda, os seguintes objectos: a) Uma carta de condução da República de ..., com a fotografia do Arguido AA e onde figuravam os seguintes dados identificativos: - N.º S-0000 - 1. Apelido: QQ - 2. Nome: RR - 3. Nascimento: Data: 00-00-0000 Local: ... - 4. Residência: ... – … - 5. Emitida por: Serviços de Viação … - 6. Em: 14.11.2009 - 7. N.º de Controlo: 0000 b) Um cartão da Unicâmbio com o n.º 0000; c) Um recibo comprovativo de renovação de Autorização de residência em nome de KK; e d) Um contrato de proposta de adesão – cartão pré-pago da Unicâmbio, em nome de KK. (...) 30. O documento em causa (indicado na al. a), de 28.), foi utilizado pelo Arguido AA, no dia 03.01.2017, em …, para celebrar o contrato de aluguer do veículo de matrícula 00-QQ-00, com a sociedade “Europcar International – Aluguer de Automóveis, S.A.”, que nessa ocasião o exibiu à referida sociedade. 31. Todavia o sobredito documento não foi emitido pelas autoridades competentes para o efeito (República de ...), já que aquela não é a sua verdadeira identidade e, bem assim, o Arguido não é titular de qualquer documento que lhe permita o exercício da condução de veículos automóveis. 32. O Arguido AA sabia que o sobredito documento era desconforme com a realidade, adquirindo-o a pessoa ou a entidade não autorizada à emissão de tais documentos, e que utilizou para ocultar a sua verdadeira identidade e ainda com benefício de poder conduzir e alugar automóveis sem estar legalmente habilitado a tal, através do engano a que conduziu terceiros e as autoridades fiscalizadoras do trânsito, face ao crédito que tal documento oferecia. 33. E dessa forma poder circular nas estradas portuguesas, sabendo que não possuía os requisitos legais, tais como a frequência e aproveitamento no respectivo curso de condução. (...) * 37. Como supra se referiu e não obstante o Arguido AA se encontrar sujeito ao regime coactivo indicado em 14., o mesmo não cessou a actividade a que se vinha dedicando, ou seja, à venda de produtos estupefacientes, nomeadamente heroína e cocaína, o que fez pelo menos desde o ano de 2015, até à data da sua detenção, no dia 12 de Dezembro de 2018, detendo e fazendo a entrega dessas substâncias a consumidores e/ou vendedores das mesmas, a troco de uma compensação pecuniária, ou como contrapartida pelos serviços prestados por alguns consumidores. 38. Nesse contexto, os consumidores que pretendiam adquirir aqueles produtos estupefacientes contactavam o Arguido AA, pessoalmente ou através dos seus telemóveis com os IME’s n.ºs 0000 e 0000 e recebiam dele quantidades não apuradas de heroína e cocaína, entregando-lhe quantias em dinheiro, como contrapartida. 39. Nos contactos que estabelecia com os consumidores/vendedores, o Arguido AA mantinha conversações alusivas à aquisição de produtos estupefacientes, preços, locais de encontro, designando o produto estupefaciente, nomeadamente a cocaína por branca e claro, e a heroína por escuro e através da mensagem “bom dia”, informava que dispunha de produto estupefaciente para venda. 40. Designadamente, nos dias 14.06.2016, 17.01.2018, 08.03.2018, 09.03.2018, 14.03.2018, 15.03.2018, 11.06.2018, 12.06.2018 e 14.06.2018, diversos indivíduos, alguns já conotados com o consumo de estupefacientes, contactaram-no com vista à aquisição de estupefacientes. Concretamente, 41. Durante o ano de 2018 e por diversas vezes, o Arguido AA vendeu quantidades de heroína não apuradas, pelo preço unitário de € 20,00 (vinte euros), ao consumidor SS, que para o efeito se deslocava às zonas de mato sita em ..., denominadas Sítio ..., ... e Sítio .... 42. No período compreendido entre o ano de 2015 e o final de Novembro de 2017, e por diversas vezes, o Arguido AA, vendeu quantidades de heroína não concretamente apuradas, pelo preço unitário de € 20,00 (vinte euros) e quantidades de cocaína não concretamente apuradas pelo preço unitário de € 10,00 (dez euros), ao consumidor TT. 43. Pelo menos durante o ano de 2018 e por diversas vezes, o Arguido AA, vendeu quantidades de heroína não concretamente apuradas, pelo preço unitário de € 40,00 (quarenta euros), ao consumidor UU. 44. No período compreendido entre os anos de 2015 e 2017, e por cerca de três vezes, o Arguido AA, vendeu quantidades de heroína não concretamente apuradas, pelo valor unitário de € 35,00 (trinta e cinco euros) e € 40,00 (quarenta euros) ao consumidor VV. 45. No dia 14.06.2016, o Arguido AA vendeu 1 mucha de heroína, com o peso de 0,972 gramas, pelo preço de € 20,00 (vinte euros), ao consumidor WW, que para o efeito se deslocou à zona de mato sita em ..., denominada Casa .... 46. No dia 20.08.2018, pelas 15h05m, o Arguido AA foi contactado pelo consumidor XX, com vista à aquisição de heroína e cocaína, pelo preço global de € 30,00 (trinta euros). 47. No período compreendido entre o ano de 2016 e Dezembro de 2017, e por diversas vezes, o Arguido AA, vendeu quantidades de heroína não concretamente apuradas, pelo preço de unitário de € 20,00 (vinte euros), ao consumidor YY. 48. No período temporal compreendido entre o ano de 2016 e o verão de 2018 e em média cerca de 10 vezes por mês, o Arguido AA, vendeu quantidades de heroína não concretamente apuradas, pelo valor unitário que variava entre € 10,00 a € 20,00 (dez e vinte euros), ao consumidor ZZ. 49. No decurso no ano de 2016 e pelo menos por quatro vezes, o Arguido AA vendeu quantidades não apuradas de heroína, pelo preço unitário de € 20,00 (vinte euros) ou € 40,00 (quarenta euros) e cedeu a título gratuito quantidades de cocaína não apuradas, ao consumidor AAA. 50. No período compreendido entre o ano de 2016 até Janeiro de 2018, por diversas vezes, o Arguido AA, vendeu quantidades de cocaína não concretamente apuradas, pelo preço unitário de € 20,00 e € 50,00, ao consumidor BBB. 51. No decurso do ano de 2016, e por diversas vezes, o Arguido AA, vendeu quantidades de heroína não concretamente apuradas, pelo preço unitário de € 20,00 (vinte euros), ao consumidor CCC. 52. No período compreendido entre o ano de 2016 até Dezembro de 2017, o Arguido AA vendeu, pelo menos três vezes, quantidades de heroína não apuradas, pelo preço unitário de € 20,00 e € 40,00 (vinte e quarenta euros), ao consumidor DDD. Em algumas ocasiões, o Arguido cedeu ainda ao sobredito consumidor, quantidades de cocaína como bónus (vulgo fezada), pela compra de estupefaciente realizada. 53. Em não concretamente apurado, mas até finais de 2018, por diversas vezes, o Arguido AA vendeu quantidades de heroína não concretamente apuradas, pelo preço unitário de € 20,00 (vinte euros), ao consumidor EEE. 54. Em datas não apuradas mas anteriores a Dezembro de 2018, o Arguido AA vendeu quantidades não apuradas de heroína, pelo preço de € 20,00 (vinte euros) e quantidades não apuradas de cocaína, pelo preço de € 10,00 (dez euros), ao consumidor FFF que, para o efeito se deslocou à zona de mato, sita em ..., denominada “...”. 55. Em datas não concretamente apuradas, mas situadas entre os anos de 2017 e 2018 e entre sete a oito vezes, o Arguido AA, vendeu quantidades de heroína não concretamente apuradas, pelo preço unitário de € 20,00 (vinte euros), ao consumidor GGG. 56. No dia 17.01.2018, o Arguido AA vendeu quantidades de heroína não concretamente apuradas, peço preço de € 20,00, ao consumidor HHH. Noutra ocasião, o Arguido já havia vendido ao sobredito consumidor, quantidades de heroína não concretamente apuradas, também pelo preço de € 20,00 (vinte euros). 57. No dia 09.03.2018, o Arguido AA vendeu 0,978 gramas de heroína, pelo preço de € 20,00 (vinte euros) e cedeu um pequeno pacote, contendo cocaína, com o peso de 0,68 gramas, ao consumidor III. Em 17.08.2018, o Arguido AA voltou a vender quantidades de heroína não concretamente apuradas, pelo preço unitário de € 20,00 (vinte euros), ao sobredito consumidor. 58. No dia 14.03.2018, o Arguido AA vendeu 1,916 gramas de heroína e 0,366 gramas de cocaína por preço não concretamente apurado, ao consumidor JJJ. 59. No dia 15.03.2018, após contactar o Arguido AA, o consumidor KKK, tinha na sua posse 0,903 gramas de heroína e 0,121 gramas de cocaína. 60. No dia 15.03.2018, o Arguido AA vendeu 0,920 gramas de heroína, pelo preço de € 20,00, aos consumidores DD e LLL. Noutras ocasiões, no período compreendido entre 2015 e 2018 e por diversas vezes, o Arguido vendeu aos sobreditos consumidores, quantidades de heroína não apuradas, pelo valor unitário de € 20,00. 61. No período compreendido entre o ano de 2017 e Dezembro de 2018 e cerca de 10 vezes, o Arguido AA vendeu quantidades de heroína não concretamente apuradas, pelo preço unitário de € 20,00 (vinte euros) e € 40,00 (quarenta euros), ao consumidor MMM. 62. Em datas não concretamente apuradas mas no período compreendido entre o ano de 2015 e 2018, cerca de três vezes, o Arguido AA vendeu quantidades de heroína não apuradas, pelo preço unitário de € 20,00 (vinte euros), ao consumidor NNN. 63. No período compreendido entre os anos de 2015 e 2018, em número de vezes não concretamente apuradas, o Arguido AA vendeu quantidades de heroína não apuradas, pelo preço unitário que variava entre € 10,00 e € 20,00 (dez e vinte euros), e pelo preço unitário de € 35,00 (trinta e cinco euros), à consumidora OOO. 64. Em datas não concretamente apuradas mas que se situam entre os anos de 2017 ou 2018, por várias vezes, o Arguido AA vendeu quantidades de heroína não concretamente apuradas, por valor não apurado, à consumidora PPP. 65. No decurso do ano de 2018 e entre 1 a 2 vezes, o Arguido AA, vendeu quantidades de heroína não concretamente apuradas, pelo preço unitário de € 20,00 e € 40,00 (vinte e quarenta euros), e quantidades de cocaína não concretamente apuradas, pelo preço unitário € 10,00 (dez euros), ao consumidor QQQ. 66. Para além dos consumidores acima indicados, o Arguido AA foi também procurado por RRR, SSS e TTT, todos consumidores de produto estupefaciente, a quem vendeu, por mais que una vez, quantidades de heroína não concretamente apuradas, normalmente pelo preço unitário de € 10,00 e € 20,00 (dez e vinte euros) e quantidades de cocaína não concretamente apuradas, normalmente pelo preço unitário de € 5,00 e € 10,00 (cinco e dez euros). 67. Para esconder o produto estupefaciente que posteriormente vendia/cedia a terceiros e aos consumidores acima indicados, o Arguido AA utilizava as zonas de mato indicadas em 1., bem como as zonas de mato localizadas nas proximidades da sua residência, sita em ..., .... 68. Assim, no dia 11 de Dezembro de 2018, cerca das 14h53m, o Arguido AA, saiu do interior da sua residência, sita em ..., ..., deslocou-se apeado por um dos caminhos adjacentes àquela habitação, por si utilizado para se deslocar para os locais onde procede à venda de produto estupefaciente a terceiros. 69. Volvidos alguns minutos, o Arguido AA parou a sua marcha, olhando em seu redor, após o que se agachou e, de seguida, retirou uma pedra que se encontrava na berma do referido caminho. 70. Acto contínuo, retirou um saco plástico transparente que ali se encontrava e, após manusear o mesmo, 71. Assim, no dia 12 de Dezembro de 2018, no período compreendido entre as 07h30m e as 10h40m, o Arguido AA detinha, dissimulado debaixo de uma pedra, junto da berma do sobredito caminho, localizado nas proximidades da sua residência, sita em ..., ... (com as coordenadas GPS 000; - 000), local por si utilizado para guardar produto estupefaciente, os seguintes objectos: - 8 (oito) pacotes, contendo no seu interior heroína, com o peso global de 7,862 gramas, e 9 (nove) saquetas, contendo no seu interior cocaína, com o peso global de 0,298 gramas. 72. Também na referida data (12.12.2018), no período compreendido entre as 07h30m e as 10h40m, o Arguido AA detinha ainda no interior da sua residência, sita em ..., ..., mais concretamente: a) No hall de entrada: - 5 (cinco) embalagens do medicamento Redrate, usualmente utilizado para ser misturado com produto estupefaciente; e b) No quarto do Arguido AA: - no interior de um maço de tabaco da marca “Português”: 3 (três) pedaços de haxixe (canábis – resina), com o peso global de 10,619 gramas; - 1 (um) telemóvel de marca Huawei, modelo dual Sim, com o IMEI n.º 0000; - 1 (um) telemóvel de marca F1, com os IMEI’s n.ºs 0000 e 0000; e - no interior de uma bolsa de cor preta, da marca “Lacoste”: a quantia de € 95,00 (noventa e cinco euros) - em 9 (nove) notas de dez euros, e uma nota de cinco euros; - 1 (um) documento denominado “Cartão de Inscrição Consular da República de ---”, emitido em 17.10.2018, que tem aposta a fotografia do Arguido AA e onde constam, entre outros elementos de identificação, o nome de KK, nascido em 00.00.0000, ..., com residência na Av. ..., n.º 0, 0, .... 73. Na mesma data, ou seja, no dia 12.12.2018, no período compreendido entre as 07h30m e as 10h40m, o Arguido AA detinha igualmente no perímetro exterior da residência acima indicada, mais concretamente sobre um muro de pedra ali existente, uma colher de inox tipo “concha de sopa”, contendo vestígios de cocaína. 74. Apesar do sobredito documento denominado “Cartão de Inscrição Consular” não apresentar vestígios nítidos de manipulação, a fotografia que aí consta, como sendo a do respectivo titular, é do Arguido AA, o qual a forneceu a um indivíduo não identificado, com vista à obtenção do referido documento e a quem pagou para esse efeito. 75. Aliás, nos serviços da Embaixada de ... inexiste inscrição consular para o nome de KK. 76. O Arguido não é KK tendo-se apurado que a sua identificação é AA. 77. O Arguido sabia que o cartão de inscrição consular acima referido não se encontrava emitido em seu nome. 78. Não obstante quis obter e exibir tal cartão, de modo a ludibriar as autoridades nacionais, tendo entrado em Portugal com essa identidade, no decurso do ano de 2014, após ter sido expulso do território nacional em 00.00.2013. * (...) 116. O Arguido BB também conhecido por UUU, e pelas alcunhas de “VVV”, “WWW” ou “XXX”, dedicou-se à venda e distribuição de produtos estupefacientes, nomeadamente heroína e cocaína, em zonas de matos conhecidas por “Ponto 3, 5”, “Casa ...”, “Sítio ...”, “Sítio ...”, “Vales ...”, “...”, “...” e “...”, , sitas no concelho de ... e no concelho de ..., pelo menos durante o ano de 2018 e até à data da sua detenção (12.12.2018), detendo e fazendo a entrega dessas substâncias a consumidores e/ou vendedores das mesmas, a troco de uma compensação pecuniária. 117. Nesse contexto, os consumidores/vendedores que pretendiam adquirir aqueles produtos estupefacientes contactavam o Arguido BB, pessoalmente ou através dos seus telemóveis, e recebiam dele quantidades não apuradas de heroína e cocaína, entregando-lhe quantias em dinheiro, como contrapartida. Designadamente, 118. No dia 06.07.2018, cerca das 16h39m, no Sítio ..., em ..., o Arguido BB encontrou-se com o consumidor YYY (que se fazia transportar no veículo automóvel de matrícula 00-00-HT), e entregou-lhe uma saqueta contendo heroína, recebendo em troca quantia monetária não concretamente apurada. 119. Na mesma data (06.07.2018), cerca das 17h23m, no Sítio ..., em ..., o Arguido BB encontrou-se com o consumidor ZZZ (que se fazia transportar no veículo automóvel de matrícula 00-LC-00), e entregou-lhe uma saqueta contendo heroína e, ou cocaína, recebendo em troca quantia monetária não concretamente apurada. 120. No dia 02.08.2018, pelas 10h00m, no Sítio ..., em ..., no local conhecido por ..., o Arguido BB foi novamente contactado por YYY, com vista à aquisição de produto estupefaciente. 121. No dia 30.08.2018, AAAA, após ter contactado BB, encontrava-se na posse de 1,905 gramas de heroína, que adquiriu ao referido Arguido. 122. No período compreendido entre os meses de Junho e Setembro de 2018, em número de vezes não concretamente apuradas, o Arguido BB, vendeu quantidades de heroína não concretamente apuradas, pelo preço unitário de € 20,00 (vinte euros), ao consumidor BBBB. 123. Pelo menos durante o ano de 2018 e até ao dia 11 de Dezembro de 2018, por diversas vezes, o Arguido BB, vendeu quantidades de heroína não concretamente apuradas, pelo preço unitário de € 20,00 (vinte euros), ao consumidor CCCC. 124. Para esconder o produto estupefaciente que posteriormente vendia/cedia a terceiros e aos consumidores acima indicados, o Arguido BB utilizava as zonas de mato supra indicadas, bem como, as zonas de mato localizadas nas proximidades da sua residência, sita no Sítio ..., ..., em ..., residência que partilhava com o Arguido CC. 125. Assim, no dia 11 de Dezembro de 2018, cerca das 15h26m, o Arguido BB, saiu do interior da sua residência (composta pelas habitações n.ºs 0 a 0), sita em Sítio ..., ..., em ... e deslocou-se apeado para um caminho situado no lado esquerdo, junto a um poço ali existente, situado a cerca de dez metros de distância da referida habitação. 126. Ali chegado, o Arguido BB agachou-se, após o que se levantou, trazendo consigo numa das mãos um objecto de cor escura. 127. Na mesma data e após estabelecer breves contactos com indivíduos em circunstâncias que indiciam tratar-se de transacções de produto estupefaciente, o Arguido BB voltou a deslocar-se ao local acima indicado, pelas 15h35m, ali permanecendo agachado, após o que retornou trazendo consigo numa das mãos um objecto de cor escura. 128. Também na mesma data, pelas 15h41m, o Arguido BB voltou a efectuar o trajecto acima indicado e, após o regressou para o interior da sua residência, mormente para a habitação identificada com o n.º 3. 129. Assim no dia 12 de Dezembro de 2018, no período compreendido entre as 08h00m e as 10h50m, o Arguido BB detinha no local acima indicado, dissimulado debaixo de uma pedra, nas proximidades da sua residência sita em Sítio ..., ..., em ..., local por si utilizado para guardar produto estupefaciente, os seguintes objectos: - 1 (uma) embalagem envolta em fita-cola de cor castanha, contendo uma bolsa de cor preta, contendo no seu interior 13 (treze) pacotes de heroína, com o peso global de 16,984 gramas, e um saco plástico contendo no seu interior cocaína, com o peso de 12,892 gramas. 130. A cerca de dois metros de distância do local referido em 129., o Arguido BB detinha ainda dissimulado debaixo de uma pedra, 1 (um) embrulho envolto em fita-cola de cor castanha, contendo no seu interior 10 (dez) saquetas do medicamento Redrate, usualmente utilizado para ser misturado com produto estupefaciente. 131. Também na referida data (12.12.2018), no período compreendido entre as 08h00m e as 10h50m, o Arguido BB detinha ainda no interior da sua residência, sita em Sítio ..., ..., em ... (composta pelas habitações n.ºs 0 a 0), que partilhava com o Arguido CC, mais concretamente: - Na habitação n.º 3: a) na sala/cozinha: 1 (um) rolo de fita-cola de cor castanha; b) no seu quarto: dois (2) telemóveis da marca Samsung, com os IMEI’s n.º 0000 e 0000, e 0000 e 0000. 132. Por último, e também na data acima indicada (12.12.2018), os Arguidos CC e BB, detinham igualmente na residência que ambos partilhavam e acima indicada, sita no Sítio ..., ..., em ..., mais concretamente: - Na habitação n.º 4: a) no quarto/cozinha: um telemóvel de marca Apple, modelo iPhone, com o IMEI n.º 0000; a quantia de € 65,00 (sessenta e cinco euros); 2 (dois) rolos de fita-cola de cor castanha; e um bilhete de autocarro da rede Expressos, com origem em … e destino ..., com data do dia 09.12.2018, às 22h30m; b) na casa de banho: 3 (três) recipientes em plástico contendo amoníaco. * 133. No dia 03.02.2008 o Arguido BB foi julgado e condenado no âmbito do processo comum colectivo n.º 300/02.5PASLB, que correu termos na 6.ª Vara Criminal de …, entre outras, na pena acessória de expulsão do território nacional, fixando-se então em 10 anos o período de interdição de (re)entrada em Portugal. Tal sentença transitou em julgado. 134. Em 15.12.2008, por decisão do Tribunal de Execução de Penas de ..., foi concedida a liberdade condicional ao Arguido e ordenada (concretizada) a expulsão do território nacional para ..., bem como, reiterada a interdição de entrada em território português pelo período de 10 anos, sob qualquer forma ou com outra identidade, a contar da data da sua expulsão efectiva. 135. A expulsão foi efectivada e concretizada no dia 00.00.2008, pelos competentes serviços do S.E.F. Aquando da sua efectiva expulsão, foi o Arguido devidamente informado e notificado dos procedimentos em concretização, nomeadamente que, a partir daquela data lhe ficava vedada nova entrada em território português pelo período 10 anos, (até 00.00.2018) e que, em consequência, seria inscrito na lista nacional de pessoas não admissíveis. 136. Foi ainda informado que caso não fosse acatada a determinação de interdição de entrada em Portugal e viesse a ser encontrado em território nacional durante o supra referido período, incorreria na prática de um crime de violação da medida de interdição de entrada. * 137. Os Arguidos AA, NN, CC e BB destinavam os medicamentos Brufen, Panadol e Redrate, bem como o amoníaco que lhes foram apreendidos para preparar a cocaína e heroína que vendiam. 138. Os Arguidos AA, NN, CC e BB conheciam a natureza e características estupefacientes das substâncias detidas, e não as destinavam ao seu consumo, mas para venda e/ou cedência junto de consumidores que o procurassem para comprar, e que em troca como pagamento das mesmas lhe entregavam dinheiro. 139. Os Arguidos AA, NN, CC e BB não exercem qualquer actividade profissional lícita regular, através da qual, aufiram qualquer ganho monetário. 140. Aliás, a venda de produtos estupefacientes constituía o modo de sobrevivência de todos os Arguidos, e um negócio com o qual, os mesmos obtinham ganhos monetários. 141. O dinheiro que foi apreendido aos Arguidos era proveniente dessa actividade de tráfico. 142. Os telemóveis que foram apreendidos aos Arguidos e acima indicados foram pelos mesmos utilizados na concretização da actividade de venda de heroína e cocaína. 143. Com a conduta descrita, os Arguidos AA, NN, CC e BB quiseram deter, vender, ceder, distribuir e transportar cocaína, heroína e canábis, bem sabendo a qualidade, quantidade e as características estupefacientes dos produtos que possuíam, intentos que lograram alcançar. 144. Os mesmos tinham conhecimento que a detenção, importação, exportação, compra, preparação, transporte, distribuição, venda, oferta, cedência, recebimento a qualquer título de produtos estupefacientes são proibidos por lei e, não obstante, quiseram desenvolver tal conduta, apesar de não se encontrarem autorizados a tal. 145. O Arguido AA sabia ainda que estava proibido de entrar em Portugal nos oito anos posteriores à data da sua expulsão (00.00.2021), bem como, sabia que a sua identificação não correspondia à que constava da carta de condução e cartão de inscrição consular que detinha e acima indicados e que os mesmos eram falsos. 146. Não obstante, o Arguido quis utilizar os referidos documentos emitidos em nome de KK, de modo a ludibriar terceiros e as autoridades nacionais, com o intuito de obter um benefício ilegítimo e prejudicar a segurança e credibilidade no tráfico jurídico-probatório do Estado Português, o que efectivamente conseguiu, tendo entrado em Portugal com essa identidade em data não concretamente apurada do ano de 2014, após ter sido expulso do território nacional em 00.00.2013. 147. O Arguido BB sabia que estava proibido de entrar em Portugal nos dez anos posteriores à data da sua expulsão (00.00.2018). 148. Não obstante, o mesmo voltou a entrar em Portugal em data não concretamente apurada do ano de 2016, após ter sido expulso do território nacional em 00.00.2008. 149. Ao actuar da forma descrita, queriam os Arguidos AA e BB, como conseguiram, entrar em Portugal, desrespeitando a proibição de entrada neste território, muito embora soubessem que tal lhes estava vedado. 150. Todos os Arguidos agiram sempre de forma livre e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal. 151. O Arguido AA já havia sido condenado, entre outros processos, no âmbito do processo comum colectivo n.º 26/08.6..., pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22.01, e de dois crimes de condução de veículo a motor sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2, do D.L. n.º 2/98, de 03.01, na pena única de 4 anos e 4 meses de prisão e ainda na pena de expulsão do território nacional, pelo período de 8 anos, por factos praticados no decurso dos anos de 2007 e 2008, por acórdão transitado em julgado a 20.08.2009. 152. Tal pena foi cumprida até ao dia 00.00.2013, data em que executada a pena acessória de expulsão que lhe foi aplicada no sobredito processo. 153. Não obstante, o Arguido AA não se coibiu de voltar a praticar factos da mesma natureza dos que estiveram na base da pena de prisão em que foi condenado, não tendo a anterior condenação lhe servido de suficiente advertência contra a prática de ilícitos criminais. 154. Acresce que, os Arguidos AA e BB são naturais e nacionais de ..., encontrando-se em situação irregular em território nacional, dado que no âmbito dos processos acima indicados foi-lhes aplicada a pena de expulsão de território nacional, respectivamente, pelo período de 8 e 10 anos, com interdição de entrada em território nacional por idêntico período. (...) 157. Os Arguidos AA e BB não têm a seu efectivo cargo, filhos menores e o Arguido AA, além da companheira e dos filhos não tem outros familiares próximos conhecidos no território nacional. Não exercem qualquer profissão remunerada fixa, sendo que os meios de subsistência de que dispunham provinham do tráfico de estupefacientes. 158. Nas circunstâncias de tempo, lugar e modo, supra descritas, foram apreendidos aos Arguidos os objectos, as quantias e o veículo automóvel referidos em 9. a 11., 27., 71. a 73., 98., 99., 114. e 115. e 129. a 132., deste despacho acusatório, que serviram ou podiam servir para os Arguidos desenvolver a actividade de tráfico ou eram produto da sua comercialização. Mais se apurou relativamente Ao Arguido AA 159. Antes de ser sujeito a uma medida de prisão preventiva no EP de ... em 13 de Dezembro/2018, AA tinha como morada para notificações judiciais um apartamento de tipologia T2 arrendado na zona de ..., ..., onde ainda residem hoje a sua ex-companheira e os filhos desta relação, DDDD, 0 anos e EEEE, 00 meses, sendo frequente o Arguido deslocar-se ao .... Há cerca de 2 anos, que AA tem uma ligação afectiva com outra mulher de nacionalidade ..., FFFF, 00 anos. 160. O quadro económico era limitado devido a prolongadas fases de inactividade laboral que refere ter atravessado antes de ser preso, desenvolvendo sobretudo biscates temporários como ... em obras de .... 161. AA nasceu na ..., ..., filho de um casal de ... e foi criado num contexto social e económico desfavorecido. Tem uma irmã que ainda hoje vive na terra natal. 162. Estudou em ... até ao 0º ano de escolaridade e ainda ajudou a família em tarefas rurais, antes de migrar para Portugal em 2005, indo viver com uma tia para a zona da ..., ..., empregando-se na ..., única área profissional em que foi trabalhando a espaços ao longo dos anos. 163. Por volta dos anos 2006/7 iniciou um relacionamento marital com GGGG, mas esta ligação afectiva, apesar dos 2 filhos, nunca foi marcada pela harmonia devido ao estilo de vida instável do Arguido. Alvo de vários processos-crime por condução sem habilitação legal e tráfico de estupefacientes, AA foi condenado por factos praticados em 2007 e 2008 no processo nº 26/08.6... a uma pena de 4 anos e 4 meses de prisão efectiva, tendo estado privado da liberdade desde final de 2008 até Fevereiro/2013. 164. Após a sua libertação do Estabelecimento Prisional de ... foi enviado para ... no cumprimento de uma decisão judicial de expulsão do território português por 8 anos, mas regressou em 2014 a Portugal com uma identidade falsa. Retomou a ligação com a companheira, mas os problemas persistiram e a relação terminou no final de 2017, altura em que terá iniciado o namoro com FFFF, que constitui no presente o seu principal apoio no exterior. O pai do Arguido já faleceu e a sua progenitora vive em ..., nos …. AA fala regularmente com a mãe por telefone e esta vai dando algum suporte económico ao filho e netos. Sem problemas de saúde, o Arguido não possui documentação válida passada pelo SEF, estando assim numa situação irregular em território português. 165. No estabelecimento prisional e para além das visitas quinzenais da namorada, o Arguido tem recebido visitas de outros familiares e já viu os filhos. Desenvolve em meio institucional trabalho como ... e ..., estando a frequentar um curso de .... Apresenta um bom comportamento interno, sem registo de problemas disciplinares. 166. Do seu Certificado de Registo Criminal constam as seguintes condenações: - no Processo nº 26/08.6..., por decisão de 30.07.2009, transitada em julgado em 20.08.2009, pela prática, em 2007 e 2008 de um crime de Tráfico de Estupefaciente e de dois crimes de Condução Sem Habilitação Legal, na pena de 4 anos e 4 meses de prisão e na pena acessório de expulsão pelo período de 8 anos; - no Processo nº 672/08.8..., por decisão de 30.09.3010, transitada em julgado em 02.11.2010, pela prática, em 25.06.2008, de um crime de Detenção de Arma Proibida na pena de 200 dias de multa; e - no Processo nº 562/10.4... por decisão de 16.01.2012, transitada em julgado em 15.02.2012, pela prática, em 18.03.2008, de um crime de Condução Sem Habilitação Legal, na pena de 80 dias de multa. (...) Ao Arguido BB 178. Em 15.12.2008, por decisão do Tribunal de Execução de Penas de ..., foi concedida a liberdade condicional a BB e ordenada a expulsão do território nacional para ..., bem como reiterada a interdição de entrada em território português pelo período de 10 anos. A expulsão foi efectivada e concretizada no dia 00.00.2008. Posteriormente, BB reentrou em Portugal, entre 2011 e 2014, afirmando que corria perigo de vida em .... 179. Vivia com a companheira desde 2015, desconhecendo esta o seu passado criminal. Tem uma filha de 0 ano e meio, de outro relacionamento. Tem outro filho em ... com 0 anos de idade. 180. Frequentou a escola na idade própria tendo concluído o 0.º ano de escolaridade já em cumprimento de pena de prisão. 181. Trabalhou desde que reentrou em Portugal, desenvolvendo de forma irregular actividades na área da ..., sem enquadramento legal porque se encontraria indocumentado. 182. Não foram referidos problemas de saúde relevantes ou comportamentos aditivos. 183. Tem antecedentes criminais, tendo já cumprido pena de prisão. Aguarda julgamento no processo 899/16.9T9ABF acusado de crime de tráfico de menor gravidade. 184. Tem mantido no estabelecimento prisional um comportamento adequado, sendo que na anterior reclusão registou diversos procedimentos disciplinares. 185. Do Certificado de Registo Criminal deste Arguido constam as seguintes condenações: - no Processo nº 300/02.5..., por decisão de 07.02.2003, transitada em julgado em 24.02.2003, pela prática, em 14.09.2002, de um crime de Tráfico de Estupefacientes, na pena de 5 anos e 6 meses e na pena acessória de expulsão do território nacional pelo período de 10 anos; - no Processo nº 197/02.5..., por decisão de 27.06.2005, transitada em julgado em 13.07.2005, pela prática, em 21.04.2002, de um crime de Detenção de Arma Proibida, na pena de 6 meses de prisão suspensa na sua execução; e - no Processo nº 1011/02.7..., por decisão de 02.02.2007, transitada em julgado em 27.02.2007, pela prática, em 04.09.2002, de um crime de Violação, na pena de 6 anos de prisão.»
B. Matéria de direito 1. Da admissibilidade dos recursos interpostos Comecemos por analisar em que medida pode haver recurso para este Supremo Tribunal de Justiça do acórdão do Tribunal da Relação que num caso confirmou integralmente a condenação em 1.ª instância (quanto ao arguido BB) e no outro caso confirmou in mellius a condenação (quanto ao arguido AA). O arguido BB foi condenado em primeira instância pelo crime de tráfico de estupefacientes (nos termos do art. 21.º, n.º 1, do Dec.Lei n.º 15/93, de 22.01) numa pena de prisão de 7 anos, e pelo crime de violação da medida de interdição de entrada no país (nos termos do art. 187.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 23/2007, de 04.07) numa pena de prisão de 10 meses. Em cúmulo jurídico foi-lhe aplicada a pena única de 7 anos e 6 meses de prisão. O arguido AA viu, pela decisão do Tribunal da Relação de Évora, as suas penas diminuídas: em vez de uma pena 8 anos de prisão pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, foi-lhe aplicada uma pena de prisão de 7 anos; em vez de uma pena de prisão de 1 ano e 2 meses, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, foi-lhe aplicada uma pena de 10 meses de prisão; em vez de uma pena de 10 meses de prisão, pela prática de um crime de violação da medida de interdição de entrada no país, foi-lhe aplicada uma pena de prisão de 7 meses; em vez de uma pena de prisão de 1 ano e 4 meses, pela prática de um crime de falsas declarações, foi-lhe aplicada uma pena de prisão de 1 ano; em vez de uma pena de prisão de 2 anos por cada um dos dois crimes de falsificação de documentos praticados, foi-lhe aplicada uma pena de prisão de 1 ano e 9 meses por cada um. Em cúmulo jurídico, foi-lhe aplicada a pena única de 9 anos de prisão (quando em 1.ª instância tinha sido aplicada uma pena única de 12 anos de prisão). Ora, tendo em conta o disposto no art. 400.º, n.º 1, al. e), do CPP, onde se impede a possibilidade de recurso das decisões do Tribunal da Relação que apliquem pena de prisão não superior a 5 anos de prisão, e o disposto no art. 400.º, n.º 1, al. f), do CPP, onde apenas se admite (a contrario) o recurso de acórdãos da Relação que confirmando decisão anterior apliquem pena de prisão superior a 8 anos, e sabendo que, ainda que a pena única seja superior a 8 anos de prisão, se analisa a recorribilidade do acórdão relativamente a cada crime individualmente considerado, necessariamente temos que concluir não ser admissível o recurso das condenações, relativas a cada crime, do Tribunal da Relação, quando seja aplicada pena não superior a 5 anos de prisão; e das condenações em pena de prisão superiores a 5 anos de prisão e não superiores a 8 anos de prisão, quando haja conformidade com o decidido na 1.ª instância. Dito de outro modo: apenas é admissível o recurso de uma decisão do Tribunal da Relação relativamente aos crimes aos quais se tenha aplicado pena de prisão superior a 5 anos e não superior a 8 anos quando não haja “dupla conforme”, e de uma decisão da Relação relativamente a todos os crimes cuja pena seja superior 8 anos, ainda que haja “dupla conforme”. Como vem sendo jurisprudência desta instância, em caso de concurso de crimes, e havendo dupla conforme, o Supremo Tribunal de Justiça não pode conhecer de tudo o referente aos crimes parcelares punidos com pena de prisão inferior a 8 anos, apenas podendo conhecer do respeitante aos crimes que concretamente tenham sido punidos com pena de prisão superior a 8 anos, e do respeitante ao concurso de crimes (para além, de poder conhecer oficiosamente dos vícios previstos nos art. 410.º, n.º 2, do CPP, quando a partir do texto da decisão sejam evidentes). Neste sentido se tem pronunciado este Tribunal, como por exemplo, e entre muitos outros, no acórdão de 24.03.2011, no processo n.º 322/08.2TARGR.L1.S1[1] e no acórdão de 11.11.2010, no processo n.º 117/09.6JAGRD.C1.S1[2].Aliás, em sentido idêntico se tem pronunciado o Tribunal Constitucional que, no acórdão n.º 186/2013, entendeu “não julgar inconstitucional a norma constante da alínea f), do n.º 1, do art. 400.º, do Código de Processo penal, na interpretação de que havendo uma pena única superior a 8 anos, não pode ser objeto de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a matéria decisória referente aos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão” (e isto mesmo foi já entendido perante a redação do CPP dada pela Lei n.º 20/2013 — assim, no acórdão n.º 269/2014[3]). Isto sem referir jurisprudência anterior do mesmo tribunal, como o acórdão n.º 649/2009, onde se concluiu que não ser inconstitucional o art. 400.º, n.º 1 al. f) do CPP interpretado no sentido de que “no caso de concurso de infrações tendo a Relação confirmado, em recurso, decisão de 1.ª instância que aplicou pena de prisão parcelar não superior a 8 anos, essa parte não é recorrível para o STJ” nos termos daquele dispositivo. Acrescentando: «Quer dizer: o direito ao recurso para o Supremo Tribunal de Justiça só poderia considerar-se violado se, por via da cisão, ao Supremo Tribunal de Justiça nada restasse, a final, para apreciar, no recurso perante este tribunal interposto e admitido. Tal, porém, não sucede. É possível ao Supremo Tribunal de Justiça apreciar a matéria do cúmulo jurídico e as questões relativas à pena única aplicada, sem concomitante apreciação das questões relativas às penas parcelares, como o demonstra o regime do artigo 78º do Código Penal: decorre, na verdade, deste preceito que é possível aplicar uma pena única tendo já transitado em julgado a decisão respeitante à pena parcelar, o que, em virtude do caso julgado desta decisão, inviabiliza a reapreciação das questões relativas a esta pena parcelar aquando da ponderação daquele cúmulo.»[4]. Ora, no que se refere ao arguido BB, as penas que lhe foram aplicadas em 1.ª instância e depois confirmadas pelo Tribunal da Relação são todas inferiores a 8 anos de prisão, pelo que é inadmissível o recurso para este Tribunal, por força do disposto nos arts. 432.º, n.º 1, al. b), e 400.º, n.º 1, al. f), ambos do CPP. Além disso, não houve qualquer alteração da matéria de facto provada (que se manteve inalterada pelo Tribunal da Relação de Évora), nem da qualificação jurídica, nem houve qualquer alteração dos pressupostos a partir dos quais se determinaram as penas a aplicar. Assim sendo, não é admissível o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do art. 400.º, n.º 1, al. f), do CPP, relativamente - ao crime de tráfico de estupefacientes condenado na pena de prisão de 7 anos e confirmada pelo Tribunal da Relação, - ao crime de violação da medida de interdição de entrada condenado na pena de oprisão de 10 meses, - e à pena única, aplicada ao concurso de crimes, de 7 anos e 6 meses. É certo que o arguido, na sua interposição de recurso, defende, entre outras alegações, a nulidade, nos termos dos arts. 379.º, n.º 1, al. a) e 374.º, n.º 2, ambos do CPP, do acórdão recorrido por falta de fundamentação, e a insuficiência da matéria de facto para a condenação no crime de violação da medida de interdição de entrada em território nacional. Porém, sendo a decisão irrecorrível, estas nulidades deviam ter sido arguidas, no prazo de 10 dias após a notificação, para o próprio tribunal que proferiu a decisão, no caso o Tribunal da Relação de Évora[5]. Além disto, alega que o Tribunal violou o princípio da presunção de inocência, previsto no art. 32.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP) considerando que não existem provas válidas e admissíveis, e alega também uma interpretação inconstitucional do art. 127.º, do CPP, bem como a inconstitucionalidade do art. 34.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22.01, e a sua aplicação ao arguido. Ora, sendo a decisão irrecorrível, nos termos dos arts. 70.º, n.º 2, da Lei n.º 28/82, de 15.11 (e alterações posteriores), o recurso deveria ter sido interposto para o Tribunal Constitucional, a partir da notificação do acórdão do Tribunal da Relação. Tendo em conta o exposto, rejeita-se o recurso interposto pelo arguido BB, nos termos dos arts. 432.º, n.º 1, al. b) a contrario e 400.º, n.º 1, al. f), todos do CPP, por inadmissibilidade legal. No que respeita ao arguido AA, verifica-se que foi condenado pelo Tribunal da Relação em penas inferiores às que tinham sido aplicadas em 1.ª instância. E todas as penas aplicadas a cada crime individualmente considerado são penas inferiores a 8 anos de prisão. Trata-se, pois, também aqui de uma situação de dupla conforme em pena de prisão inferior a 8 anos, a favor do arguido. Estamos perante um caso em que há uma confirmação da punição em medida mais favorável ao arguido. Ora, assim sendo, o acórdão do Tribunal da Relação de Évora constitui um acórdão condenatório, que confirmou in mellius a condenação anterior do arguido. Tratando-se, igualmente, de um acórdão a confirmar a decisão de 1.ª instância e com aplicação de uma pena inferior a 8 anos de prisão, por força do disposto no art. 432.º, n.º 1, al. b), do CPP, articulado com o art. 400.º, n.º 1, al. f), do CPP, deve (ao abrigo do disposto no art. 417.º, n.º 6, al. b), do CPP), também aqui, ser o recurso rejeitado por inadmissibilidade legal, nos termos do art. 420.º, n.º 1, al. b), e art. 414.º, n.º 2, todos do CPP. Acresce que tem sido jurisprudência uniforme deste Tribunal o entendimento de que uma confirmação in mellius da condenação em primeira instância cabe ainda dentro do conceito de dupla conforme pressuposto pelo art. 400.º, n.º 1, al. f), do CPP. Tal como se afirmou no acórdão de 26.02.2014 (proc. n.º 851/08.8TAVCT. G1. S1, relator: Maia Costa), “a confirmação não significa nem exige a coincidência entre as duas decisões. Pressupõe apenas a identidade essencial entre as mesmas, como tal devendo entender-se a manutenção da condenação do arguido, no quadro da mesma qualificação jurídica, e tomando como suporte a mesma matéria de facto.” E esta confirmação admite “a redução da pena pelo tribunal superior; ou seja, haverá confirmação quando, mantendo-se a decisão condenatória, a pena é atenuada, assim se beneficiando o condenado.” (ac. cit.) E a identidade na qualificação jurídica abrange “não só a manutenção da mesma pelo tribunal superior, como também a desagravação da imputação penal, por meio da desqualificação do tipo agravado para o tipo simples do mesmo crime. Já não haverá confirmação se for imputado ao condenado um tipo de crime diferente.” (idem). Ora, não só houve uma confirmação da decisão condenatória (sem qualquer alteração da matéria de facto provada ou da qualificação jurídica dos factos), como as penas foram modificadas no sentido da diminuição. De referir ainda que este entendimento tem sido acolhido, no que respeita à sua conformidade com a Constituição, pelo Tribunal Constitucional — cf. acórdão n.º 20/2007 (e outros aí referidos). Além disto, e ainda que se considere como no acórdão deste STJ, de 06.11.2014 (proc n.º 161/05.2JAGRD.C2.S1, Relator: Cons. Rodrigues da Costa) que “Não pondo em causa a tese da confirmação in melius como preenchendo o requisito da dupla conforme para efeitos do preceituado no art. 400.º, n.º 1, al. f), do CPP, obstando, assim, à possibilidade de recurso para o STJ, o certo é que essa tese seguida pela maioria da jurisprudência do STJ e caucionada pela jurisprudência do TC, pressupõe que a alteração para melhor das penas aplicadas seja apenas devida a uma diferente aplicação dos critérios de determinação da medida concreta da pena, nesses casos feita de forma mais favorável ao recorrente. Não assim, quando simultaneamente haja uma alteração da matéria de facto ou da qualificação jurídica”, ainda assim nos presentes autos não houve qualquer alteração da matéria de facto ou da qualificação jurídica. Conclui-se, pois, pela irrecorribilidade do acórdão do Tribunal da Relação de Évora na parte em que, relativamente ao arguido AA, confirmou as diversas penas aplicadas a cada um dos crimes praticados em medida inferior à condenação pelo Tribunal de 1.ª instância, e em medida inferior a 8 anos de prisão, nos termos dos arts. 432.º, n.º 1, al. b) e 400.º, n.º 1, al. f), do CPP, da confirmação in mellius das condenações em 1.ª instância (e sem que esta diminuição decorra de qualquer alteração da matéria de facto provada ou de uma alteração da qualificação jurídica). E dada a irrecorribilidade da decisão nesta parte, fica prejudicado o conhecimento de todas as questões com esta relacionadas, nomeadamente, falta de fundamentação do acórdão recorrido quanto à matéria de facto provada relativa ao tráfico de estupefacientes, nulidade do acórdão, nos termos dos arts. 374.º, e 379.º, do CPP, por falta de exame crítico das provas (alegando o recorrente que diversos factos provados não ficaram demonstrados, o que constituiria um recurso da matéria de facto fora do âmbito de competência deste Supremo Tribunal de Justiça) e, consequentemente segundo o arguido, violação dos princípios do in dubio pro reo, da livre apreciação da prova e da investigação. E sendo a decisão irrecorrível relativamente a todos as penas parcelares, igualmente, é irrecorrível a parte do recurso referente à pena acessória de expulsão. Na verdade, a pena acessória constitui uma pena dependente da pena principal, uma pena aplicada conjuntamente com a pena principal, e no caso a pena aplicada ao crime de tráfico de estupefacientes; ora, não sendo admissível o recurso na parte referente ao crime de tráfico de estupefacientes não o é quer quanto à pena principal, quer quanto à pena acessória dependente daquela. Resta salientar que as questões colocadas para além de coincidirem com as colocadas aquando do recurso interposto para o Tribunal da Relação, referem-se ao acórdão de 1.ª instância, não sendo este que está agora sob recurso. Assim sendo, o recurso deve também ser rejeitado nesta parte. Nestes termos, é apenas admissível o recurso do arguido AA na parte referente à aplicação da pena única de 9 anos de prisão, dado tratar-se de uma pena de prisão superior a 8 anos [cf. art. 400.º, n.º 1, al. f), do CPP]. 2. Da medida da pena única do arguido AA A determinação da pena tem como limite máximo o admitido pela culpa de cada arguido — a culpa de cada um é individualizável e insuscetível de equiparação entre os diversos arguidos, pois estes participam de forma diferente e de modo diverso nos diferentes factos praticados, assim revelando uma atitude particular contra o direito —, e como limite mínimo o determinado pelas exigências de prevenção geral impostas pela comunidade de acordo com os crimes praticados; será dentro destas balizas que em função das exigências de prevenção especial de cada arguido que se determinará a medida concreta da pena, necessariamente diferente consoante as distintas exigências que cada um impõe. A determinação da pena, realizada em função da culpa e das exigências de prevenção geral de integração e da prevenção especial de socialização (de harmonia com o disposto nos arts. 71.º, n.º 1 e 40.º, do CP), deve, no caso concreto, corresponder às necessidades de tutela dos bens jurídicos em causa e às exigências sociais decorrentes daquela lesão, sem esquecer que deve ser preservada a dignidade da pessoa do delinquente. Para que se possa determinar o substrato da medida concreta da pena, dever-se-á ter em conta todas as circunstâncias que depuseram a favor ou contra o arguido, nomeadamente os fatores de determinação da pena elencados no art. 71.º, n.º 2, do CP. Nesta valoração, o julgador não poderá utilizar as circunstâncias que já tenham sido utilizadas pelo legislador aquando da construção do tipo legal de crime, e que tenham sido tomadas em consideração na construção da moldura abstrata da pena (assegurando o cumprimento do princípio da proibição da dupla valoração). Acresce que o nosso sistema de reações criminais é claramente caracterizado por uma preferência pelas penas não privativas da liberdade ─ cf. art. 70.º do CP ─ devendo o tribunal dar primazia a estas quanto se afigurem bastantes para que sejam cumpridas, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição. Mas, a determinação da medida da pena, em sede de concurso de crimes, apresenta especificidades relativamente aos critérios gerais do art. 71.º do CP. Nos casos de concurso de crimes (e em obediência ao princípio constitucional da legalidade criminal, a pena única apenas pode ser aplicada caso estejam verificados os seus pressupostos de aplicação, isto é, caso estejamos perante uma situação de concurso efetivo de crimes), a determinação da pena única conjunta tem que obedecer (para além daqueles critérios gerais) aos critérios específicos determinados no art. 77.º, do CP. A partir dos critérios especificados é determinada a pena única conjunta, com base no princípio do cúmulo jurídico. Assim, após a determinação das penas parcelares que cabem a cada um dos crimes que integram o concurso, é construída a moldura do concurso, tendo como limite mínimo a pena parcelar mais alta atribuída aos crimes que integram o concurso, e o limite máximo a soma das penas, sem, todavia, exceder os 25 anos de pena de prisão (de harmonia com o disposto no art. 77.º, n.º 2, do CP). A partir desta moldura, é determinada a pena conjunta, tendo por base os critérios gerais da culpa e da prevenção (de acordo com o disposto nos arts. 71.º e 40.º, ambos do CP), ao que acresce um critério específico — na determinação da pena conjunta, e segundo o estabelecido no art. 77.º, n.º 1, do CP, "são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente". Assim, a partir dos factos praticados, deve proceder se a uma análise da "gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique”. Na avaliação da personalidade, ter-se-á que verificar se dos factos praticados pelo agente decorre uma certa tendência para o crime ou se estamos apenas perante uma pluriocasionalidade, sem possibilidade de recondução a uma personalidade fundamentadora de uma "carreira" criminosa. Apenas quando se possa concluir que se revela uma tendência para o crime, quando analisados globalmente os factos, é que estamos perante um caso onde se suscita a necessidade de aplicação de um efeito agravante dentro da moldura do concurso. Para além disto, e sabendo que também influem na determinação da pena conjunta as exigências de prevenção especial, dever se á atender ao efeito que a pena terá sobre o delinquente e em que medida irá ou não facilitar a necessária reintegração do agente na sociedade; exigências, porém, limitadas pelas imposições derivadas de finalidades de prevenção geral de integração (ou positiva). São estes os critérios legais estabelecidos para a determinação da pena e, em particular, para a determinação da pena única conjunta. Constitui, pois, requisito da aplicação de uma pena única a existência de um concurso de crimes. Nos termos do art. 77.º, n.º 2, do CP, a pena única conjunta, a aplicar a um caso de concurso crimes, é determinada a partir de uma moldura que tem como limite mínimo “a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes”, e como limite máximo “a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes”. Pelo que as penas concretas aplicadas a cada crime constituem os elementos a partir das quais se determina aquela moldura. Nestes termos, a moldura do concurso de crimes a partir da qual deve ser determinada a pena concreta a aplicar tem como limite mínimo 7 anos de prisão (a pena concreta mais elevada) de prisão, e como limite máximo 12 anos e 11 meses (correspondente à soma das penas concretas aplicadas, nos termos do art. 77.º, n.º 2, do CP). A partir de uma análise global do comportamento do arguido, tendo em conta a matéria de facto provada e sedimentada a partir do acórdão do Tribunal da Relação, verificamos que o arguido, durante cerca de 4 anos (desde o ano de 2015 e até 12.12.2018 – cf. facto provado 1) dedicou-se ao tráfico de estupefacientes (heroína e cocaína), constituindo o seu meio de sobrevivência (cf. facto provado 140), pois não exercia qualquer atividade profissional lícita de forma regular (cf. facto provado 139). O arguido traficou os estupefacientes referidos por um número alargado de consumidores (cerca de 28 – cf. factos provados 41 a 66) e não obstante ter sido detido em flagrante delito a 10.12.2016, estando indiciado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade e tendo ficado sujeitos à prestação de termo de identidade e residência e obrigação de apresentação periódica (cf. facto provado 14), continuou a comercializar os estupefacientes (cf. facto provado 37). Mas, nesta análise global dos factos não se pode esquecer que, após ter sido expulso do território nacional por um período de 8 anos (por decisão transitada em julgado a 20.08.2009 – cf. facto provado 4), e tendo sido esta expulsão concretizada a 00.00.2013 (cf. facto provado 6), o arguido, ignorando a decisão, retornou a Portugal bem sabendo que estava proibido de o fazer (cf. facto provado 145) e passou a usar documentação falsa [cf. factos provados 28, al. a), e 30, 31, 32, 72, 74 a 78 e 146]. Acresce que já em momento anterior o arguido havia sido condenado pelo crime de tráfico de estupefacientes (cf. factos provados 151 e 166) sendo que este elemento foi já decisivo para a agravação da moldura penal, pelo que não será valorado novamente. Para além disto, tinha sido também punido pela prática de três crimes de condução sem habilitação legal e um crime de detenção de arma proibida (cf. facto provado 166). Antes da privação da liberdade, o arguido vivia num quadro económico limitado, com frequentes fases de inatividade laboral e desenvolvendo sobretudo “biscates temporários” (cf. facto provado 160). Todavia, atualmente, em meio prisional, desenvolve trabalho como ... e ... (cf. facto provado 165) e frequenta um curso de ... (idem). Tendo em conta todo este circunstancialismo e os crimes praticados, em especial o crime de tráfico de estupefacientes enquanto crime lesivo (também) de bens jurídicos pessoais e que demanda, em atenção às características nefastas para toda a sociedade, fortes exigências de prevenção geral impondo que se demostre à comunidade que a norma proibitiva se mantém válida, e tendo em conta, em atenção ao percurso particular do arguido sem que tenha sido provado qualquer arrependimento (nada consta da matéria de facto provada), as fortes exigências de prevenção especial (fortemente acrescidas pelo comportamento do arguido que completamente indiferente ao Direito viola a proibição de entrada em território nacional e usando documentos de identificação falsos), consideramos que a pena única que lhe foi aplicada de 9 anos de prisão é a necessária e imprescindível, e dentro do limite imposto pela culpa. Pelo que improcede o recurso interposto pelo arguido.
III Conclusão Nos termos expostos, acordam em conferência na secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça, em a) rejeitar o recurso interposto pelo arguido BB, por inadmissibilidade legal, nos termos dos art. 432.º, n.º 1, al. b) a contrario e 400.º, n.º 1, al. f), todos do CPP; b) rejeitar parcialmente o recurso interposto, nos termos do art. 432.º, n.º 1, al. b) e 400.º, n.º 1, al. f), do CPP, e negar provimento ao recurso interporto por AA, mantendo a pena única aplicada de 9 (nove) anos de prisão.
Supremo Tribunal de Justiça, 29 de outubro de 2020 Os juízes conselheiros,
Helena Moniz (Relatora) Francisco Caetano
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