Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | 6.ª SECÇÃO | ||
| Relator: | JOSÉ RAINHO | ||
| Descritores: | RECURSO DE REVISTA REVISTA EXCECIONAL ADMISSIBILIDADE DE RECURSO DECISÃO INTERLOCUTÓRIA DIREITO AO RECURSO ACESSO AO DIREITO INCONSTITUCIONALIDADE | ||
| Data do Acordão: | 06/09/2021 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA | ||
| Decisão: | NÃO SE CONHECE DO OBJECTO DO RECURSO. | ||
| Indicações Eventuais: | TRANSITADO EM JULGADO. | ||
| Sumário : |
I- Os acórdãos da Relação que apreciem decisões interlocutórias que recaiam unicamente sobre a relação processual só podem ser objeto de revista nas situações referidas nas als. a) e b) do n.º 2 do art. 671.º do CPC. II- O acórdão da Relação que recai sobre decisão interlocutória confinada à relação processual não é suscetível de recurso de revista excecional, por a situação quadrar precisamente no disposto no art. 671.º, n.º 2, do CPC. III- Não há qualquer imposição constitucional no sentido de que toda e qualquer causa cível deva poder ser revista pelo Supremo, sendo a lei ordinária livre de determinar os casos em que tal poderá acontecer. | ||
| Decisão Texto Integral: |
Processo n.º 1155/20.3T8CSC-D.L1.S1 Revista Tribunal recorrido: Tribunal da Relação .......
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Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção):
Vem interposto recurso de revista excecional por AA contra o acórdão da Relação ....... proferido nos autos, na parte em que confirmou o despacho (de 24 de junho de 2020) da 1ª instância, que indeferiu o requerimento da respetiva mandatária tendente ao adiamento da conferência de pais por impossibilidade da sua (da mandatária) comparência. Embora o acórdão recorrido tenha conhecido de um outro recurso – o interposto contra a decisão que fixou um regime provisório aquando da conferência de pais -, é certo que o presente recurso de revista vem interposto unicamente contra a decisão que julgou o supra citado recurso relativo ao não adiamento da conferência de pais.
+ Neste Supremo o relator proferiu despacho preliminar no sentido do recurso não ser admissível. Foi dada às partes a oportunidade de se pronunciarem acerca da inadmissibilidade do recurso. A parte Recorrida, BB, pronunciou-se no sentido da inadmissibilidade do recurso. O Recorrente pronunciou-se no sentido do recurso dever ser objeto de conhecimento.
+ Cumpre apreciar e decidir.
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O recurso não é admissível. Tudo exatamente como se demonstra no despacho do relator. E não é admissível pelo seguinte (reproduz-se basicamente o que consta do despacho preliminar do relator, por nada haver a suprimir, modificar ou acrescentar): Na parte que é objeto do recurso, o acórdão recorrido apreciou uma decisão interlocutória da 1ª instância que recaiu unicamente sobre a relação processual. Decisão interlocutória (ou intercalar) é toda a decisão que, apreciando uma questão autónoma, não põe fim ao processo. É toda a decisão (que pode ser de forma ou de índole material) de natureza incidental que surja no decorrer do processo (v. Abílio Neto, Novo Código de Processo Civil Anotado, 3ª ed. Revista e Ampliada, pp. 829 e 830). A questão que foi colocada no sentido da conferência não se dever realizar pelo facto da mandatária estar impedida de comparecer cai nesse âmbito: é uma questão de natureza interlocutória e unicamente processual. Sendo assim, como é, só pode ser aplicável ao caso o n.º 2 do art. 671.º do CPCivil, que estabelece um regime específico quanto à admissibilidade do recurso de revista relativamente a decisões interlocutórias sobre a relação processual, e não o regime da revista excecional prevista no art. 672.º. Como se aponta no acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 15 de dezembro de 2020 (processo n.º 330/19.8T8OAZ-D.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt) “tratando-se como se trata de uma decisão interlocutória, o fundamento recursório não reside no disposto no artigo 671º, nº 1, e, consequentemente, face ao preceituado no seu nº 3, no disposto na alínea a) do nº1 do artigo 672º, este como aquele do CPCivil, mas antes em qualquer uma das alíneas do nº 2 daquele normativo, isto é nos casos em que o recurso seja sempre admissível ou quando a decisão recorrida esteja em oposição com outra produzida pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito (…)”. No mesmo sentido cite-se o recente acórdão ainda deste Supremo de 2 de março de 2021 (processo n.º 1257/13.2TJCBR-AD.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt), de cujo sumário se contém que: “II - Os acórdãos da Relação que apreciem decisões interlocutórias que recaiam unicamente sobre a relação processual só podem ser objeto de revista nas situações referidas nas als. a) e b) do n.º 2 do art. 671.º do CPC. III - O acórdão da Relação que recai sobre decisão interlocutória confinada à relação processual não é suscetível de recurso de revista excecional, por a situação quadrar precisamente no disposto no art. 671.º, n.º 2, do CPC”.[1] É esse, aliás, o entendimento reiterado da formação a que alude o n.º 3 do art. 672.º do CPCivil, de que é exemplo, entre muitos outros, o acórdão de 11 de abril de 2019 (Revista excecional n.º 1355/10.4JPRT-I.P1.S1), de cujo sumário (acessível em www.stj/jurisprudência/revista excecional) se pode ler que “O acórdão da Relação que recaiu sobre decisão interlocutória confinada à relação processual não é suscetível de recurso de revista excecional, por a situação quadrar no disposto no art. 671.º, n.º 2, do CPC.” Entende a lei que nestes casos basta o duplo grau de jurisdição, não se justificando a intervenção de mais uma jurisdição. Daqui que o presente recurso só seria admissível se se verificasse alguma das situações de exceção previstas nas alíneas do n.º 2 do art. 671.º. Acontece que nem é caso do recurso ser sempre admissível, nem foi invocada qualquer oposição de julgados quanto à mesma questão fundamental de direito. E muito menos foi cumprido o ónus estabelecido no n.º 2 do art. 637.º do CPCivil (junção obrigatória de cópia do acórdão-fundamento, sob pena de rejeição do recurso). Consequentemente, não é admissível o presente recurso de revista.
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No pronunciamento que emitiu a propósito do despacho do relator, convoca o Recorrente certas normas (art.s 18.º, n.º 1 e 20.º, n.º 2) da Constituição da República Portuguesa, do que decorreria, na sua interpretação (e se bem se entende a confusa alegação), que seria mandatório conhecer do recurso que interpôs (observe-se, a propósito, a incoerência do Recorrente: sustenta que tem direito absoluto a que o seu recurso seja admitido e conhecido, mas o que é facto é que interpôs revista excecional, e é da própria natureza desta que o recurso possa ser ou não admitido e conhecido). Mas o Recorrente carece de razão. Anote-se desde logo que apesar de convocar ao caso tais normas constitucionais, o Recorrente não invoca a inconstitucionalidade de qualquer norma de direito ordinário reguladora do regime de recursos em processo civil. À parte isso, é de dizer que em matéria de processo civil não existe constitucionalmente um direito irrestrito ao recurso. É verdade que alguma doutrina (assim, Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, volume I, 4ª ed., p. 418; Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, tomo I, p. 200) defende que o recurso das decisões judiciais que afetem direitos fundamentais, mesmo fora do âmbito penal, pode apresentar-se como garantia imprescindível desses direitos. Mas isto tem unicamente em vista a garantia de recurso, não se confundindo com qualquer pseudo direito a um triplo grau de jurisdição. Não há qualquer imposição constitucional no sentido de que toda e qualquer causa cível deva poder ser revista pelo Supremo, sendo a lei ordinária livre de, dentro dos amplos poderes de modelação do processo que a Constituição lhe reconhece, determinar os casos em que tal poderá acontecer. Ora, no caso vertente, a estar eventualmente em causa algum direito fundamental (o que nos parece nem sequer ser o caso), o direito ao recurso já foi garantido (duplo grau de jurisdição), com o que sempre estaria cumprida a suposta garantia constitucional. E se a lei ordinária não admite a intervenção de uma terceira jurisdição (neste caso, o Supremo), isso é apenas a forma (constitucionalmente legítima) como entendeu organizar o sistema de recursos, organização essa a que este tribunal deve obediência. Conclusão: não é admissível a presente revista, sendo definitivo o que foi decidido no acórdão recorrido.
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Decisão
Pelo exposto acordam os juízes neste Supremo Tribunal de Justiça em julgar inadmissível o presente recurso de revista, considerando findo o recurso por não haver que conhecer do seu objeto.
Regime de custas
O Recorrente é condenado nas custas do incidente. Taxa de justiça: 3 Uc’s.
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Lisboa, 9 de junho de 2021
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José Rainho (Relator) Graça Amaral (tem voto de conformidade, não assinando por razões de ordem operacional. O relator atesta, nos termos do art. 15.º-A do Dec. Lei. n.º 10-A/2020, essa conformidade) Maria Olinda Garcia (tem voto de conformidade, não assinando por razões de ordem operacional. O relator atesta, nos termos do art. 15.º-A do Dec. Lei. n.º 10-A/2020, essa conformidade)
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Sumário (art.s 663.º, n.º 7 e 679.º do CPCivil).
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