Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 1.ª SECÇÃO | ||
Relator: | ANTÓNIO MAGALHÃES | ||
Descritores: | EMBARGOS DE EXECUTADO TÍTULO EXECUTIVO EXEQUIBILIDADE JUROS DE MORA JUROS COMPENSATÓRIOS JUROS REMUNERATÓRIOS LIQUIDEZ DECISÃO SURPRESA PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO AUDIÊNCIA PRÉVIA ARGUIÇÃO DE NULIDADES NULIDADE DE ACÓRDÃO OMISSÃO DE PRONÚNCIA | ||
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Data do Acordão: | 09/05/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA | ||
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Sumário : | “I-Não é nulo o acórdão da Relação que remete para a fundamentação que consta da sentença; II- As nulidades da sentença não são cognoscíveis pelo Supremo Tribunal de Justiça; III- Se não existir condenação em juros de mora, a sentença não constitui título executivo relativamente aos juros de mora legais antes do trânsito em julgado; IV- Os juros compulsórios são devidos desde a data do trânsito em julgado da sentença exequenda; V- Se a obrigação de juros bancários não é líquida em face do título executivo (sentença exequenda) e a liquidação, que não depende de simples cálculo aritmético, não foi efectuada por via incidental, os embargos devem ser julgados procedentes relativamente àqueles juros por iliquidez dessa obrigação não suprida na fase instrutória da execução e determinada a extinção da execução nessa parte.” | ||
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Decisão Texto Integral: |
Acordam na 1ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça: * AA, BB, e CC intentaram acção executiva para pagamento de quantia certa, com base em sentença condenatória transitada em julgado, proferida em acção de prestação de contas pela administração de herança ilíquida e indivisa, contra DD, EE e FF, reclamando o pagamento das seguintes quantias monetárias: 35265,42 € do Executado DD, sendo 20632,86 € a título de capital, e 14623,04 € a título de juros de mora, remuneratórios e compulsórios; 168035,77 € do Executado EE, sendo 98313,45 € a título de capital, e 69722,32 € a título de juros de mora, remuneratórios e compulsórios; 13930,55 € do Executado FF, sendo 8150,416 a título de capital, e 5780,14 € a título de juros de mora, remuneratórios e compulsórios, tudo acrescido de juros vincendos até efectivo e integral pagamento. Os Executados/Embargantes DD, EE e FF deduziram embargos de executado, alegando, em síntese, que os Exequentes/Embargados careciam de legitimidade processual activa para instaurar a presente acção executiva uma vez que não são eles os credores daquelas quantias mas sim a herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de GG e mulher, HH. Mais alegam que pretenderam entregar à herança as quantias que foram reconhecidas na acção de prestação de contas mas que só não o fizeram porque os Exequentes pretendiam mais 90.125,50 € a título de juros. Entendem os Embargantes que não são devidos quaisquer juros pois não foram peticionados na acção de prestação de contas. Assim, entendendo que o título dado à execução é inexigível quanto ao pagamento de juros, consideram que não são devidas as quantias reclamadas a título de juros. Os Exequentes/Embargados responderam, alegando serem partes legítimas na acção executiva e de a obrigação constante do título executivo dado a execução ser certa, exigível e líquida. Foi proferido despacho saneador-sentença, que concluiu assim: “Pelo exposto, o Tribunal decide julgar procedentes os presentes embargos de executado e, em consequência: A - Determino a extinção da execução apensa, nos termos do art. 732.°, n.° 4 do Código de Processo Civil; B - Condeno os Embargados nas custas do processo”. Inconformados, vieram os exequentes/embargados interpor recurso de apelação, pedindo a revogação da decisão e a sua substituição por outra que julgue totalmente improcedentes os embargos. No entanto, foi negado provimento ao recurso interposto, confirmando-se a decisão recorrida, com outros fundamentos. Do acórdão da Relação interpuseram os exequentes/embargados revista excepcional. Pediram, a terminar, que fosse revogado o acórdão e mantida a execução. Porém, neste Supremo, foi proferido acórdão, que concluiu assim: “Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção em, ao abrigo do art. 682°, n° 3 do CPC, determinar a remessa dos autos ao Tribunal da Relação a fim de que, com o necessário recurso à Ia instância, se discriminem, de forma autónoma, os factos que se consideram como provados, designadamente, os factos que se mostram alegados no requerimento executivo, os factos que constam do título executivo relacionados com a parte dispositiva da sentença da acção de prestação de contas e, ainda, os factos que se mostram provados entre os alegados nos artigos 17°, 18°, 32° e 33° da contestação.” Baixados os autos, foi proferido novo acórdão na Relação, que voltou a concluir pela improcedência do recurso de apelação e pela confirmação da decisão recorrida, desta vez com declaração de voto (do Desembargador 1º adjunto) e com voto de vencido do Desembargador 2º adjunto: “Declaração de Voto Os executados como fundamento dos embargos invocaram a ilegitimidade dos exequentes. A decisão recorrida entende que inexiste, mas diz que isso lhe serviu de alerta para outra questão, que oficiosamente levantou. A saber, a impropriedade duma acção executiva para dar satisfação a uma sentença proferida em acção declarativa de prestação de contas e, consequentemente, entendeu que havia erro no recurso a tal acção executiva pois a mesma só poderia ser interposta se previamente tivesse sido proposta uma acção de petição de herança e aí declarado o direito exequendo. E, portanto, extinguiu totalmente a execução, devido ao referido erro e conclusão tirada de que não existia título executivo. Isso mesmo foi referido na pág. 5 do acórdão do Supremo, onde se diz que a sentença foi mais longe que a oposição dos executados ao considerar que não havia título executivo, e ainda na pág. 10 do mesmo acórdão, ao mencionar que uma das questões postas no recurso é a exequibilidade da acção de prestação de contas. Não vejo, com todo o respeito e esforço de alcance o digo, que nas diversas partes do presente acórdão, designadamente na parte III, esteja tratada a questão da existência ou não de título executivo, que é matéria de objecto de recurso e devia ser tratada. Ou seja, que se tivesse apreciado e decidido se a decisão proferida na acção declarativa de prestação de contas vale como título executivo para exigir os valores nela definidos a favor dos exequentes ou se é necessária, para tal efeito, uma prévia acção de petição de herança. Por conseguinte entendo que o acórdão devia abordar tal questão em concreto, existência ou não de título executivo - parece que a parte III do projecto é o ponto mais aproximado desse conhecimento, mas está formulado de modo genérico e, por isso, insuficiente e incompreensível a nível de fundamentação jurídica - sob pena de omissão de pronúncia. Concluo, pois, haver omissão de pronúncia, sobre tal tema, sendo ao acórdão nesta parte nulo.” “Voto de Vencido Embora na parte IV do acórdão se defenda que não há decisão-surpresa, entendo que ela existe, pois isso até resulta das palavras expressas pelo juiz recorrido na sua fundamentação jurídica, ao dizer que a invocação pelos executados da ilegitimidade activa dos exequentes, como fundamento de embargos, o alertou para outra questão, a tal que levantou oficiosamente e que gerou, de todo, um resultado inesperado para os exequentes: a extinção total da execução, que abrangeu, por isso, o capital reclamado. Veja-se que os executados invocam ilegitimidade activa dos exequentes, o juiz convoca uma audiência preliminar que consistiu numa simples tentativa de conciliação e depois sem dizer nada aos exequentes arranca para uma decisão de inexistência de título executivo, em que extingue a execução e os exequentes nem o capital definido na decisão exequenda a favor de cada um recebem. Então isto não é uma verdadeira decisão-surpresa !! Para nós é. Daí o voto de vencido.” De novo inconformado veio o exequente/embargado CC interpor recurso de revista, formulando as seguintes conclusões: “1º. O Dig.º Tribunal recorrido confirmou a decisão do Tribunal de 1.ªinstância, sustentando tal decisão que: (1) o processo de prestação de contas não permite relegar o montante do saldo em questão (juros) para execução de sentença; (2) a obrigação enquanto pressuposto material da execução, deve resultar expressamente declarada ou constituída na sentença; (3) é impossível face aos elementos constantes nos autos, apurar do valor aritmético ou matemático do incumprimento parcial imputável aos exequentes; (4) a prestação exequenda não seria líquida; (5) seria aos exequentes que deveria imputar-se a falta da sua liquidação e a consequência seria a extinção da execução. 2º- O Tribunal a quo ao declarar que a sentença exarada na acção de prestação de contas (Proc. 48/14.8T8IDN) não é título executivo bastante para fundar a acção executiva contra os Recorridos (executados), encontra-se em contradição com o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26-09-2006 (proc. 0624521, Relator: Cândido Lemos, quanto à mesma questão de direito. 3º Constando na sentença da acção de prestação de contas (Proc. 48/14.8T8IDN), “tendo ficado provado que os réus DD, EE e FF têm sob a sua administração bens pertencentes à herança ilíquida e indivisa de GG e mulher, HH, decorre imediatamente da lei o dever de prestar contas da sua actividade nos termos do art. 2093º do CC”. 4º- Correspondendo, o título executivo na acção executiva, à causa de pedir o Exequente munido de um título de tal natureza, não carece de justificar o direito que pretende fazer cumprir com a execução. 5º- Tendo os Recorridos procedido ao levantamento dos saldos bancários bem como, das aplicações financeiras existentes nos CTT – certificados de aforro, as quais rendiam juros, tendo passado a administrar todas essas quantias. 6º- Os Recorridos tinham a obrigação de saber os bens que tinham sob o seu domínio, bem como, o destino que deram às importâncias que detinham sob sua gestão e os rendimentos que os mesmos produziram. 7º- Seguindo o entendimento vertido no Acórdão da Relação de Lisboa de 23-04-1998, Relator: Salvador da Costa, (acessível em www.dgsi.pt): “O administrador de patrimónios alheios sabe ou tem a obrigação de saber o que deve, pelo que, a ser ilíquido o montante da dívida, a liquidez é apenas aparente e não real, não impedindo a constituição em mora”. 8º- A sentença proferida na acção de prestação de contas (Proc. Lamnto 48/14.8T8IDN) expressamente enuncia os saldos em que cada um dos Recorridos foi condenado, e bem assim, que a estes “acrescem os rendimentos de capitais e rendimentos de prédios rústicos e urbanos recebidos desde a data de início da administração até à data da partilha dos bens pelos herdeiros”. 9º-Tanto a sentença da acção de prestação de contas (Proc. n.º 48/14.8...(IDN) quando enuncia “rendimentos de capitais desde a data da sua administração”, como a nota de precisão n.º 2 da sentença dos Embargos quando conclui “era aos rendimentos desses bens que o Tribunal se estava a referir”, se referem a rendimentos de bens concretos, no caso, os depósitos bancários e certificados de aforro. 10º- Inexistindo no humilde entendimento propugnado pelos Autores, qualquer situação de incerteza quanto à definição do direito do Recorrente e da correspondente obrigação dos Recorridos. 11º- Constituindo os juros, rendimentos dos depósitos bancários e dos certificados de aforro, tal como o previsto no artigo 5.º n.º 1 e 2 do CIRS, não existe incompatibilidade entre aquilo que o Recorrente pede na acção executiva, relativamente aquilo que consta no título executivo, leia-se, a sentença da acção de prestação de contas. 12º-De acordo com os Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 21-11-1997 e do Tribunal da Relação de Lisboa de 22-06-2004, “A sentença de condenação no pagamento de um quantia determinada é título executivo bastante para, na respectiva execução, o credor poder exigir o pagamento de juros de mora à taxa legal, mesmo que dessa decisão apenas conste o pagamento do capital pedido” pelo que a “notificação dessa sentença ao devedor valer por interpelação para efeitos do artigo 805º, nº1 do Código Civil, não sendo por isso necessário que uns e outros figurem no título executivo.” 13º- O Acórdão recorrido ao vir proclamar que a obrigação (quantos aos juros) é ilíquida e deveria imputar-se a falta da sua liquidação aos Exequentes, com a consequência da extinção da execução, está em oposição com o Acórdão proferido quanto a esta matéria pelo Supremo Tribunal de Justiça de 20-12-1966 (Proc. 060708), Relator: Lopes Cardoso, ao afirmar que o “mandatário deve juros legais pelo saldo das contas do mandato, a partir da data em que é interpelado para as prestar”. 14º- De igual modo, o Tribunal a quo ao declarar que o título executivo não comporta o pedido de juros moratórios está em oposição com os Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 21-11-1997 (Proc 0021365), Relator: Soares de Almeida, bem como, do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22-06-2004 (Proc. 3345/2004-7), Relator: Pimentel Marcos. 15º- O Tribunal a quo ao proferir a decisão de não admitir o pedido de juros compensatórios reclamado pelos Exequente no requerimento executivo, está em frontal oposição com o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-12-1996 (Proc. 97B156), Relator: Almeida e Silva, quanto à mesma questão de direito, bem como o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11-08-2018 (Proc. 1772/14.0..., Relator: Oliveira Abreu), quando declarou: “VII. Na execução para pagamento de quantia certa, diversamente do que acontece na execução para prestação de facto, a secretaria procede oficiosamente, não carecendo a sanção pecuniária compulsória de ser pedida nem de ser fixada pelo juiz pois o direito a ela constituiu-se automaticamente.” 16º- A sanção pecuniária compulsória aqui em causa prevista no n.º 4 do artigo 829º-A do Código Civil, é disciplinada pelo próprio legislador ao estabelecer o seu montante e o momento a partir do qual é devida. 17º Não parecendo razoável a discriminação do credor exequente que disponha de sentença judicial transitada em julgado face ao credor exequente que disponha de título executivo não judicial, tendo este, se assim não se entender, que recorrer à acção declarativa, ainda que munido de título com manifesta força executiva. 18º- Exigindo o princípio da igualdade que ambas as situações sejam tratadas do mesmo modo. 19º- Constando na sentença dos Embargos (proc. n.º 48/14.8T8IDN-A): “se o processo declarativo não foi o próprio, então também a sentença aí proferida não poderá valer como título executivo” (...) assim, inexistindo título executivo para a execução instaurada pelos Exequente”, tal constitui uma verdadeira decisão-surpresa, nos termos do artigo 3º, n.º(s) 1 e 3 do Código de Processo Civil e, como tal, padece de nulidade. 20º- Conforme consta vertido no Voto de Vencido do Acórdão do Tribunal a quo: “(...) o juiz convoca uma audiência preliminar que consistiu numa simples tentativa de conciliação e depois sem dizer nada aos exequentes arranca para uma decisão de inexistência de título executivo, em que extingue a execução e os exequentes nem o capital definido na decisão exequenda a favor de cada um recebem”. 21º- Em causa, está a decisão duma questão relativa ao mérito da causa, proferida pelo mesmo Magistrado que previamente conduziu e julgou o processo (declarativo) de prestação de contas, com um fundamento jurídico diverso e até então omitido nos Autos, não ponderado pelas partes, e sem que estas tenham sido previamente convidadas a pronunciar-se sobre os mesmos. 22º- Da leitura do trecho do Acórdão recorrido, de páginas 23 a 27, apenas se retira uma alusão genérica à interpretação da sentença, sem que exista uma pronúncia por parte do Tribunal a quo sobre qual a interpretação que este oferece para fundamentar a resposta negativa às questões formuladas em “V” do recurso, e que no entender dos aqui Recorrentes ficou por esclarecer. 23º- Pelo que o Tribunal a quo ao responder às questões suscitadas no ponto V do recurso por mera remissão para a decisão de 1ª instância, transcrevendo-a integralmente, incorreu em omissão de pronúncia e encontra-se em oposição com o Acórdão proferido quanto a esta matéria pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-03-2001 (Proc. 01B3974). 24º- A decisão do Tribunal a quo ao decretar a extinção da execução por o título não comportar os pedidos de juros legais e juros compensatórios colide com o vertido nos Acórdãos proferidos quanto a esta matéria pelo Tribunal da Relação do Porto de 03-02-2010 (Proc. 8931/06.8...), Relator: Maria do Carmo Rodrigues e pelo Supremo Tribunal de Justiça de 11-04-1997, (Proc. 97A690), Relator: Fernandes Magalhães. 25º- Pronunciou-se o Tribunal da Relação do Porto no Acórdão de 21-11- 1997, nos seguintes termos: “Se o título executivo for uma sentença condenatória no pagamento de determinada quantia em dinheiro, apesar de essa sentença não fazer referência a juros, podem incluir-se no requerimento executivo os juros legais, pela mora, posteriores ao trânsito em julgado da sentença, bem como os juros à taxa de 5% a título de sanção pecuniária compulsória”. 26º- Por sua vez, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22-06-2004 (Proc. 3345/2004-7), veio afirmar que: “A sentença de condenação no pagamento de uma quantia determinada é título executivo bastante para, na respectiva execução, o credor poder exigir o pagamento de juros de mora à taxa legal, mesmo que dessa decisão apenas conste o pagamento do capital pedido. Neste caso, os juros são devidos desde a notificação da sentença, a tal não obstando o facto de ter sido expressamente indeferido o pagamento de juros de mora desde a citação.” 27º- Assim, não obstante o título executivo (neste caso a sentença condenatória transitada em julgado cujo teor decisório se transcreveu antecedentemente) determinar o fim e os limites da execução, consideram-se por ele abrangidos os juros de mora, à taxa legal, da obrigação dele constante (artigos 703.º, n. º2 e 704.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Civil). 28º-Havendo porventura “excesso de execução, ou seja, se o exequente no requerimento inicial, formula para além do pedido para o qual tem título executivo, um outro pedido para o qual não tem título executivo, o juiz deve indeferir liminarmente, a petição só na parte em que não há título, prosseguindo a execução na outra parte”, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11-04-1997 (Proc. 97A690), Relator: Fernandes Magalhães. 29º- Pelo que caso se entenda que o Exequente apenas poderá pedir juros moratórios desde a data da notificação da sentença, tal não deverá acarretar a extinção total da execução. Termos em que, deve merecer provimento o presente recurso, e por via disso ser revogado o douto Acórdão recorrido, devendo ser mantida a presente execução, com as legais consequências.” Não houve contra-alegações. Cumpre decidir. Após a baixa dos autos a Relação considerou assente a seguinte matéria de facto: “Factos que se mostram alegados no requerimento executivo (“Requerimento de execução de Decisão Judicial Condenatória): «Finalidade da Execução: Pagamento de Quantia Certa - Divida civil [Instância Local Cível] Título Executivo: Decisão judicial condenatória Factos: - Os AA. AA, BB e CC instauraram contra os RR, aqui Executados, DD, EE, FF uma Acção Especial de Prestação de Contas com o N.o PROC. 48/14.8T8IDN. - Os RR. não contestaram a acção tendo os AA. apresentado as contas nos termos do disposto no art. 943, 1º do C.P.C. - Ficou provado que os Executados têm sob a sua administração bens pertencentes à herança ilíquida e indivisa de GG e mulher, HH, tendo sido apurado um saldo positivo a favor da mesma herança no valor de €127.096,82, dos quais €20.632,96 sob a administração do Réu DD; €98.313,45 sob a administração do Réu EE e €8.150,41 sob a administração do Réu FF. - Delimitada a obrigação de prestar contas em função da administração "de facto" que os RR. exerceram sobre os bens pertencentes à herança desde a data do óbito de GG, tem a herança ilíquida e indivisa de GG e mulher HH a haver as quantias acima descritas dos respectivos RR. - Assim, foi proferida sentença condenatória dos RR e aqui. Executados a qual transitou em julgado em 27/04/2016, cuja cópia aqui se junta sob o DOC. 1, a saber: a) Porque validamente prestadas sob a forma adequada de conta-corrente, julgar prestadas, pelos Autores, as contas da Administração da herança aberta por óbitos de GG e mulher, HH, fixando a receita bruta em €150.341,22 e as despesas em €23.244,40. b) O saldo a favor da herança ilíquida e indivisa de GG e mulher, HH é no valor de €127.096,82, a suportar pelos Executados na seguinte proporção: - €20.632,96 a suportar pelo Executado DD; - €98.313,45 a suportar pelo Executado EE; - €8.150,41 a suportar pelo Executado FF. c) Acrescem ainda os rendimentos de capitais e rendimentos dos prédios rústicos e urbanos recebidos desde a data do início da administração até à data da partilha dos bens pelos herdeiros». - Fazendo-se, ainda, consignar no requerimento executivo (“Requerimento de execução de Decisão Judicial Condenatória): que: “Acrescem ainda, os juros de mora já vencidos, à taxa legal, perfazem a quantia de 55.546,53, a título de juros vencidos e dados como provados pela sentença condenatória, acrescidos de juros compulsórios desde o trânsito em julgado à presente data, perfazendo a quantia de €957,58, bem como os juros vincendos, que serão calculados a final. Acrescerão os juros bancários no total de 33.621,40, bem como os juros vincendos, que serão calculados a final”. - Factos tidos como emergentes dos que constam do título executivo relacionados com a parte dispositiva da sentença da acção de prestação de contas (Proc. Nº 48/14.8T8IDN, onde se referencia: «- AA, contribuinte fiscal n.º ...42, BB, contribuinte fiscal n.º ...44, e CC, contribuinte fiscal n.º ...60, intentaram uma acção especial de prestação de contas contra DD, contribuinte fiscal n.º ...23, EE, contribuinte fiscal n.º ...23, II, contribuinte fiscal n.º ...40, e FF, contribuinte fiscal n.º ...31, respeitante à administração dos valores monetários e rendimentos de capitais sob sua gestão, bem como dos prédios rústicos e urbanos, tudo bens pertencentes à herança aberta por óbito de GG e mulher, HH. - Alegaram, em síntese, que os Réus nunca prestaram quaisquer informações sobre a administração dos valores e activos financeiros que se encontram sob a sua gestão, bem como sobre a situação dos bens imóveis que integram a herança. - Requerem, assim, que os Réus prestem contas da administração de todos os bens que pertencem à herança. - Regularmente citados, os Réus não apresentaram contestação. (…) - Ora, no caso dos Autos, vieram os Autores requerer que os Réus prestem contas do exercício das suas funções como administradores “de facto” de determinados bens pertencentes à herança aberta por óbito de GG. - Assim, tendo ficado provado que os Réus DD, EE e FF têm sob sua administração bens pertencentes à herança ilíquida e indivisa de GG e mulher, HH, decorre imediatamente da lei o dever de prestar contas da sua actividade, nos termos do art. 2093.° do CC. - Está, assim, verificado o facto constitutivo de onde resulta a obrigação de prestar contas por banda dos Réus DD, EE e FF. Existe, pois, a obrigação de prestar contas. - Delimitada a obrigação dos Réus de prestar contas em função da Administração efectiva que exerceram sobre os bens pertencentes à herança de GG e mulher, HH, e não tendo a acção sido contestada pelos Réus, foram as contas apresentadas pelos Autores (…); - No caso vertente, as receitas e despesas apresentadas encontram-se validamente documentadas nos autos a fls. 54 a 70, 87 a 89, 98 e 99, 115 e 116, pelo que, julgo correctas as contas apresentadas pelos Autores a fls. 128 a 130, nos seus precisos termos, que aqui se dão por integralmente por reproduzidas por meras razões de economia processual. - Foi apurado um saldo positivo a favor da herança ilíquida e indivisa de GG e mulher, HH, no valor de 127096,82 € (receita líquida deduzida do montante de 23244,40 € por despesas com o lar onde residia HH até à sua morte); dos quais 20632,96 € estavam sob a administração do Réu DD; 98313,45 € sob a administração do Réu EE; e 8150,41 € sob a administração do Réu FF. - Face a todo o exposto, delimitada a obrigação de prestar contas em função da administração "de facto" que os Réus exerceram sobre os bens pertencentes à herança desde a data do óbito de GG, tem a herança ilíquida e indivisa de GG e mulher, HH, a haver as quantias acima descritas dos respectivos Réus. - Em face de todo o exposto, julgo a acção procedente e, em consequência, decido: A - Absolver o Réu II de todos os pedidos; B - Porque validamente prestadas sob a adequada forma de conta corrente, julgar prestadas, pelos Autores, as contas da administração da herança aberta por óbitos de GG e mulher, HH, fixando a receita bruta em 150341,22 € (cento e cinquenta mil trezentos e quarenta e um euros e vinte e dois cêntimos), e as despesas em 23244,40 (vinte e três mil duzentos e quarenta e quatro euros e quarenta cinco mil duzentos e oitenta e dois euros), sendo o saldo a favor da herança ilíquida e indivisa de GG e mulher, HH, de 127096,82 € (cento e vinte e sete mil e noventa e seis euros e oitenta e dois cêntimos), dos quais 20632,96 € são a suportar pelo Réu DD, 98313,45 € a suportar pelo Réu EE, e 8150,41 € a suportar pelo Réu FF, ao que acrescem os rendimentos de capitais e rendimentos dos prédios rústicos e urbanos recebidos desde a data de início da administração até à data da partilha dos bens pelos herdeiros; C -Condeno os Réus DD, EE e FF nas custas do processo». Factos que se mostram provados entre os alegados nos artigos 17º, 18º, 32º e 33º da contestação: “- 17/ Após a instauração pelos exequentes da acção especial de prestação de contas, os executados, regularmente citados para apresentarem as contas, deixaram correr o prazo fixado na lei para o efeito, não as apresentando; - 18/ Pelo que coube aos aqui exequentes apresentar as contas; - 32/ Na sentença, pode, designadamente, ler-se: «no caso vertente, a administração “de facto” dos bens da herança aberta por óbito de GG ficou a cargo de cada um dos herdeiros, na medida dos bens que ficaram sob a gestão de cada um deles. Por conseguinte, o dever de administrar o património hereditário passou a recair sobre cada um dos herdeiros»; Não se consideram como “não provados” quaisquer factos, por se revelarem insusceptíveis de configuração relevante para a decisão da causa.” Este o enunciado dos factos provados feito pela Relação. O Direito. Nulidade por omissão de pronúncia: O tribunal da Relação elegeu no ponto V como questão a que resultava das conclusões 25 a 29 da apelação, que aqui se transcrevem: ”25/NA ACÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS, OS EMBARGANTES FORAM CONDENADOS CONFORME A DOUTA SENTENÇA, NO SALDO DE €127.096,82 “(...) AO QUE ACRESCEM OS RENDIMENTOS DE CAPITAIS(...) DESDE A DATA DE INÍCIO DA ADMINISTRAÇÃO(...)”.26/ O N.º 1 DO ART.º 5º DO CIRS, DISPÔE QUE RENDIMENTOS DE CAPITAIS SÃO OS FRUTOS E DEMAIS VANTAGENS ECONÓMICAS, QUALQUER QUE SEJA A SUA NATUREZA OU DENOMINAÇÃO, SEJAM PECUNIÁRIOS OU EM ESPÉCIE, DIRECTA OU INDIRECTAMENTE, DE ELEMENTOS PATRIMONIAIS, BENS, DIREITOS OU SITUAÇÕES JURÍDICAS, DE NATUREZA MOBILIÁRIA, BEM COMO DA RESPECTIVA MODIFICAÇÃO, TRANSMISSÃO OU CESSAÇÃO (...). 27/COMPREENDENDO OS FRUTOS E VANTAGENS ECONÓMICAS OS JUROS E OUTRAS FORMAS DE REMUNERAÇÃO DERIVADAS DE DEPÓSITOS À ORDEM OU A PRAZO EM INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS, BEM COMO DE CERTIFICADOS DE DEPÓSITOS E DE CONTAS DE TÍTULOS COM GARANTIA DE PREÇO OU DE OUTRAS OPERAÇÕES SIMILARES OU AFINS, E AINDA OS JUROS, OS PRÉMIOS DE AMORTIZAÇÃO OU DE REEMBOLSO E AS OUTRAS FORMAS DE REMUNERAÇÃO DE TÍTULOS DA DÍVIDA PÚBLICA, OBRIGAÇÕES, TÍTULOS DE PARTICIPAÇÃO, CERTIFICADOS DE CONSIGNAÇÃO, OBRIGAÇÕES DE CAIXA, OU OUTROS TÍTULOS ANÁLOGOS, EMITIDOS POR ENTIDADES PÚBLICAS OU PRIVADAS, E DEMAIS INSTRUMENTOS DE APLICAÇÃO FINANCEIRA, DESIGNADAMENTE LETRAS, LIVRANÇAS E OUTROS TÍTULOS DE CRÉDITO NEGOCIÁVEIS, ENQUANTO UTILIZADOS COMO TAIS (ALÍNEAS B); C) DO N.º 2 DO ART. 5º CIRS).28/ PELO QUE ATENDENDO AO DISPOSTO NO ARTIGO 5º DO CIRS, NÃO EXISTE, NO ENTENDIMENTO DOS RECORRENTES, INCOMPATIBILIDADE ENTRE AQUILO QUE OS RECORRENTES/EMBARGADOS PEDEM NA ACÇÃO EXECUTIVA, RELATIVAMENTE AQUILO QUE CONSTA NO TÍTULO EXECUTIVO. 29/ CONCLUINDO OS RECORRENTES, SALVO MELHOR ENTENDIMENTO, QUE A PARTE DISPOSITIVA DA SENTENÇA QUE CONDENA OS RECORRIDOS/EMBARGANTES NOS RENDIMENTOS DE CAPITAIS DOS DEPÓSITOS BANCÁRIOS E CERTIFICADOS DE AFORRO, COMPREENDE OS RENDIMENTOS OS JUROS E DEMAIS FORMAS DE REMUNERAÇÃO OU CAPITALIZAÇÃO.” A questão tinha, pois, a ver com a parte da sentença relativa aos rendimentos de capital e à sua abrangência relativamente aos juros. Ora, a Relação transcreveu a decisão recorrida da 1ª instância: «Analisemos com atenção o que pretendem os Embargados com a presente acção executiva o título executivo que lhe serve de base. Os ora Embargados intentaram em 2014 uma acção de prestação de contas contra os aqui Embargantes por estes terem sob sua administração bens pertencentes à herança ilíquida e indivisa de GG e mulher, HH, e nunca terem prestado informações sobre a administração dos valores e activos financeiros que se encontravam sob a sua gestão, bem como sobre a situação dos bens imóveis que integravam a herança. O Tribunal reconheceu a obrigação de prestação de contas por banda dos aqui Embargantes, tendo estes apresentado as contas da administração que exerceram. Nesse seguimento, o Tribunal julgou validamente prestadas as contas da administração da herança aberta por óbitos de GG e mulher, HH, fixando a receita bruta em 150341,22 €, e as despesas em 23244,40 €, sendo o saldo a favor da herança ilíquida e indivisa de GG e mulher, HH, de 127096,82 €, dos quais 20632,96 €eram a suportar por DD, 98313,45 €a suportar por EE, e 8150,41 € a suportar porFF, ao que acresciam os rendimentos de capitais rendimentos dos prédios rústicos e urbanos recebidos desde a data de início da administração até à data da partilha dos bens pelos herdeiros (uma vez que a herança integrava certificados de aforro e depósitos a prazo e alguns imóveis estavam arrendados). Tendo a sentença transitado em julgado, os ora Embargados vieram instaurar a presente acção executiva para pagamento de quantia de certa, reclamando o pagamento daqueles 127096,82 €, acrescido de 90125,50 €por juros de mora, remuneratórios e compulsórios. Ora, uma acção especial de prestação de contas constitui, efectivamente, uma acção declarativa de condenação, significando que uma sentença que julgue o pedido procedente constitui, por sua vez, uma sentença condenatória e, como tal, susceptível de constituir um título executivo para instaurar a competente acção executiva (art. 703.º, n.º 1, al. a) do Código de Processo Civil). Deste modo, temos, no caso vertente, um título executivo constituído pela sentença condenatória proferida numa acção de prestação de contas relativamente a quem tinha a administração “de facto” de uma herança ilíquida e indivisa. Sendo que, o que os ora Embargados pretendem com a presente execução é a restituição à herança do saldo credor que foi reconhecido na sentença proferida na acção de prestação de contas, no qual consideram estar incluída a quantia de 90125,50 €reclamada a título de juros de mora, juros remuneratórios, e juros compulsórios (que, esclareça-se desde já, não estão previstos nem contemplados na sentença que foi apresentada como título executivo, pelo que não existe título executivo para a cobrança dessa quantia reclamada a título de juros). Os Embargantes, por sua vez, consideram que aquela quantia de 90125,50 €reclamada na execução não constitui dinheiro da herança, pelo que não têm a obrigação de a conferir. Assim, tendo em conta a finalidade visada pelos ora Embargados com a instauração desta execução, e a posição assumida pelos Embargantes, importa saber se esta acção executiva, fundada na concreta sentença apresentada como título executivo, é a forma de processo adequada para satisfazer a pretensão dos Embargados. Salvo melhor opinião, entendemos que não». Destacando as notas de precisão com os nºs 2 e 3 - fls. 55v. e 56 -, onde, clarificando, se diz: «Permita-se-nos um desabafo quanto a este aspecto: só uma leitura pouco séria e abusiva do dispositivo da sentença, concretamente o último segmento do ponto B, podia dar azo a que os Embargados viessem reclamar juros moratórios, remuneratórios, e compulsórios, com base no determinado nesse segmento do dispositivo da sentença. Em boa verdade, tendo sido alegado nos articulados da acção de prestação de contas que os aqui Embargantes tinham sob a sua administração certificados de aforro, depósitos bancários e imóveis arrendados a terceiros, que pertenciam à herança, devia ser escusado lembrar que era aos rendimentos desses bens que o Tribunal se estava a referir no dispositivo da sentença, e não a uma qualquer obrigação de pagamento de juros a impender sobre eles Acrescendo que em relação aos juros remuneratórios (ou “bancários” como sugestivamente lhes chamam os Embargados) não existe qualquer fundamento fáctico para os reclamar uma vez que não foi alegado nem ficou provado que tivesse sido estipulado pelas partes o pagamento de juros dessa natureza (e a que taxa, pergunta-se ainda). É que uma coisa são os juros legais (devidos pela mora do devedor e que decorrem da lei pelo incumprimento das obrigações pecuniárias), outra bem diferente são os juros remuneratórios (juros de remuneração do capital, os quais não decorrem da lei e que por isso só são devidos se foram convencionados pelas partes em todos os seus elementos essenciais). E até mesmo os juros de mora reclamados pelos Embargados é matéria que suscita sérias questões porquanto a obrigação de conferir para a partilha os bens da herança sob administração dos herdeiros não se confunde com a obrigação de pagamento de certa quantia pecuniária que caracteriza as obrigações pecuniárias» Prosseguiu então a Relação: “Clarificando, como não podia deixar de ser, de acordo com a intencionalidade judiciária de correspondência, pois que decisão judicial, constituindo um acto jurídico, há-de interpretar-se segundo os princípios legalmente impostos e acomodados para os negócios jurídicos. Neste contexto, terá o intérprete de indagar qual a vontade do julgador expressa no texto onde se consagra a decisão tomada, de tal modo que, encontrada esta, todas as circunstâncias envolventes do processo se clarificam e tomam um sentido definitivamente exacto (Cf. Ac. STJ de 13.10.2011. Proc. 97/2002: Sumários. Out./2011). O que, assim, por sua vez, acarreta resposta negativa às questões em V.” Entende o recorrente que o tribunal a quo ao responder às questões suscitadas no ponto V do acórdão por mera remissão para a decisão de 1ª instância, transcrevendo-a integralmente, incorreu em omissão de pronúncia, relativamente à extensão da exequibilidade da sentença aos rendimentos dos capitais (juros dos depósitos bancários e certificados de aforro). E, de facto, a tais questões a Relação respondeu aderindo e remetendo para a fundamentação da sentença, a qual, por sua vez, considerou que não havia fundamento para o pedido de juros “bancários” em que viu o pedido de pagamento de juros remuneratórios (que não se mostram mencionados na petição executiva), distinguindo-os, assim, dos rendimentos dos capitais. Pode argumentar-se que a argumentação é errada ou insuficiente, mas não se pode é dizer que ela é inexistente, pelo facto de ter remetido para a fundamentação da 1ª instância, que transcreve. No sentido de que é admissível a fundamentação por remissão decidiu o Acórdão do STJ de 9.3.2022, proc, 1600/17.5T8PTM.E1.S1, que, por sua vez, se escorou no Acórdão do STJ de 25.2.2014, proc. 5796/04.8TVLSB.L1.S1: “não é nulo o acórdão da Relação que, após isolar e situar as questões a resolver, procedeu à remissão para o conteúdo da sentença, que reproduziu e integrou no texto do acórdão, afirmando expressamente que a decisão recorrida não merecia censura, adoptando a integralidade da respectiva fundamentação”; e ainda no Acórdão de 9.2.2021, proc. 753/08.8TBLGS.E1.S1, no qual se pode ler em IV do respectivo sumário: “ Nas conclusões da revista o recorrente confunde falta de fundamentação com eventual fundamentação insuficiente; ora, só a falta de fundamentação constitui causa de nulidade da decisão e, in casu, não se identifica que ocorra uma falta de fundamentação. Há fundamentação, quer por remissão para a sentença, na parte em que o tribunal adere à mesma fundamentação que constava na sentença.” Como assim, julga-se improcedente a nulidade. Decisão-Surpresa por violação do princípio do contraditório: Na apelação figuram as seguintes conclusões: “18/ O CONTRÁRIO SERIA RECONHECER A FORÇA DE CASO JULGADO MATERIAL A UMA HIPOTÉTICA CONDENAÇÃO NÃO PEDIDA E, NÃO CONSIDERADA PELOS EXEQUENTES, QUANDO FORAM CONFRONTADOS COM A OPOSIÇÃO. 19/ ORA, A AUDIÊNCIA PRÉVIA REALIZADA EM 10-01-2017, TEVE COMO FINALIDADE:- “PROCEDER À REALIZAÇÃO DE TENTATIVA DE CONCILIAÇÃO, NOS TERMOS DO ART. 594 E 591, N.º 1 AL. A) DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL”;- “EM CASO DE FRUSTRAÇÃO DO REFERIDO SUPRA, TERÁ AINDA A AUDIÊNCIA PRÉVIA OS OBJECTIVOS A QUE SE REPORTAM AS ALÍNEAS D), F) E G) DO N.º 1 DO REFERIDO ART. 591º DO CPC”.20/ DA ACTA (Ref.ª ELECTRÓNICA N.º 28536750), FICOU CONSIGNADO QUE ESTANDO PRESENTES OS ILUSTRES MANDATÁRIOS DAS PARTES, APÓS A GORADA TENTATIVA DE CONCILIAÇÃO, FOI ABERTA CONCLUSÃO “(...) A FIM DE SER PROFERIDO SANEADOR-SENTENÇA, SEM PREJUÍZO DE NO PRAZO DE 2 SEMANAS PODER DAR ENTRADA NOS AUTOS TERMO DE TRANSACÇÃO(...)”. 21/ NÃO TENDO HAVIDO QUALQUER DISCUSSÃO DAS PARTES SOBRE OS ASPECTOS JURÍDICOS, NEM SOBRE A MATÉRIA DE FACTO, NOS TERMOS E PARA OS EFEITOS DA ALÍNEA C) DO ARTIGO 591º DO CÓD. PROCESSO CIVIL, NÃO HOUVE QUALQUER ALTERAÇÃO DO QUADRO FÁCTICO. 22/ O TRIBUNAL A QUO AO TER AFIRMADO “(...) O QUE OS ORA EMBARGADOS PRETENDEM COM A PRESENTE EXECUÇÃO É A RESTITUIÇÃO À HERANÇA DO SALDO CREDOR QUE FOI RECONHECIDO NA SENTENÇA PROFERIDA NA ACÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS (...)”, DAÍ EXTRAINDO QUE “(...)O QUE SE IMPUNHA ERA A PROPOSITURA DE UMA ACÇÃO DE PETIÇÃO DE HERANÇA” , VIOLOU O PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO NA PROLAÇÃO DA DECISÃO SOB RECURSO, CONFORME OS ARTIGOS 3.º N.º 3 DO CÓD. PROCESSO CIVIL E ARTIGO 20º DA CONSTITUIÇÃO REPÚBLICA PORTUGUESA. 23/ NOS TERMOS DO ARTIGO 3º, N.º 1 DO CÓD. PROCESSO CIVIL, O TRIBUNAL NÃO PODE RESOLVER O CONFLITO DE INTERESSES POSTO À SUA APRECIAÇÃO POR UMA DAS PARTES, SEM QUE A OUTRA SEJA CHAMADA A PROFERIR A SUA OPOSIÇÃO, POR FORMA A QUE A ACTIVIDADE DE UM DOS LITIGANTES POSSA SER CONTROLADA PELO OPONENTE. 24/ NÃO TENDO SIDO CONCEDIDO ÀS PARTES A OPORTUNIDADE DE SE PRONUNCIAREM SOBRE TODAS AS QUESTÕES, AINDA QUE DE DIREITO E DE CONHECIMENTO OFICIOSO, A DECISÃO DO TRIBUNAL A QUO CONSTITUI UMA DECISÃO SURPRESA, E COMO TAL PADECE DE NULIDADE (ART. 3, N.º 3 DO CPC, E ART. 20º DA CRP).” Sobre esta nulidade o Tribunal da Relação discorreu assim: “Neste particular, aprecie-se, face ao teor do que os Autos evidenciam - a este propósito também convocado, nos termos que consubstanciam a questão em perfil -, que a dispensa de audiência prévia no NCPC 2013 não é possível quando o tribunal entenda conhecer do mérito da causa; a situação está prevista na al. b) do n.º 1 do art. 591.°, não excepcionada na norma que prevê tal dispensa, a do artigo 593.°. n.º1. A referência à dispensa de audiência prévia para prolação de saneador-al. d). do art. 591.°. n.º 1 -, restringe-se ao saneador com o conteúdo previsto na al. a). do n.º 1. do art. 595.°, não se estendendo à al. b) (Ac. RL. de 13.11.2014: Proc. 673/03.dgsi.Net). Ora, no presente caso, a audiência prévia realizou-se no referencial consignado. Cujo alcance, em função do módulo, tido por previsível, que se consumou, a saber, “frustração de tentativa de conciliação”, se teve como consumada quanto aos outros itens consagrados. Não podendo, deste modo, conceber-se como a sua própria duplicação quanto, depois e mais uma vez, a eles respeitantes. Exactamente, porque, nos termos do disposto na al. b) do n.º 1 do art. 595.º do NCPC, deve conhecer-se do mérito da causa no saneador sempre que o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas, a apreciação, total ou parcial, do ou dos pedidos deduzidos. Tal acontecerá quando toda a matéria de facto se encontre provada por confissão expressa ou tácita, por acordo ou por documentos, quando seja indiferente, para qualquer das soluções plausíveis, a prova dos factos que permanecem controvertidos, e quando todos os factos controvertidos careçam de prova documental (Ac. RG. de 2.5.2016. Proc. 16/14: dgsi.Net), como nos Autos. Consequentemente, o princípio da proibição das decisões-surpresa, contido no n.º 3 do art. 3.° do NCPC (2013), vale apenas para os casos em que a qualificação jurídica que o juiz se propõe adoptar não corresponda àquilo com que as partes, pelas posições assumidas, possam contar. Este princípio não pode ser levado tão longe que esqueça que as partes são representadas por técnicos que devem conhecer o direito e não ignorar as qualificações jurídicas, que os factos são susceptíveis de integrar (Cf. Ac. STJ, 28.52015, Proc. 73/04:Sumários, 2015, p.321). O que, por igual forma, também se estriba em considerar que o incumprimento do princípio do contraditório (art. 3.º do NCPC) não surge, na economia da lei adjectiva, erigido como nulidade principal, com regulação, forma de arguição e momento de conhecimento autónomos definidos, sendo, antes, subsumível à disciplina do art. 195.º do NCPC, constituindo o desvio na prática (ou omissão) daquele principio nulidade secundária quando relevante porque a lei especialmente o declare ou porque possa influir no exame ou na decisão da causa (Cf. Ac. STJ, de 2.7.2015. Proc. 2641/13: dgsi.Net). Ou seja, só há decisão surpresa se o juiz, de forma absolutamente inopinada e apartado de qualquer aportamento factual ou jurídico, envereda por uma solução que os sujeitos processuais não quiseram submeter ao seu juízo, ainda que possa ser a solução que mais se adeque a uma correcta e atinada decisão do litígio (cf. Ac. STJ, de 19.5.2016, Proc. 6473/07)” (fim da transcrição) Insiste o recorrente que constando na sentença dos Embargos (proc. n.º 48/14.8T8IDN-A) “se o processo declarativo não foi o próprio, então também a sentença aí proferida não poderá valer como título executivo” (...) assim, inexistindo título executivo para a execução instaurada pelos Exequente”, tal constitui uma verdadeira decisão-surpresa, nos termos do artigo 3º, n.º(s) 1 e 3 do CPC e, como tal, padece [ a sentença] de nulidade, na medida em que, conforme consta vertido no voto de vencido do Acórdão do Tribunal a quo:“(...) o juiz convoca uma audiência preliminar que consistiu numa simples tentativa de conciliação e depois sem dizer nada aos exequentes arranca para uma decisão de inexistência de título executivo, em que extingue a execução e os exequentes nem o capital definido na decisão exequenda a favor de cada um recebem”. Em causa está, entende o recorrente, a decisão duma questão relativa ao mérito da causa, proferida pelo mesmo Magistrado que previamente conduziu e julgou o processo (declarativo) de prestação de contas, com um fundamento jurídico diverso e até então omitido nos autos, não ponderado pelas partes, e sem que estas tenham sido previamente convidadas a pronunciar-se sobre os mesmos. Entende, ainda, que a referida decisão-surpresa deve ser considerada nulidade por excesso de pronúncia por interpretação extensiva do disposto no art. 615º, nº 1, al. d) do CPC, interpretação com a qual se concorda: “1. A violação do princípio do contraditório do art. 3º, nº 3 do CPC dá origem não a uma nulidade processual nos termos do art. 195º do CPC, que origina a anulação do acórdão, mas a uma nulidade do próprio acórdão, por excesso de pronúncia, nos termos arts. 615º, nº 1, al. d), 666º, n.º 1, e 685º do mesmo diploma” (cfr. Ac. STJ de 3.10,2020, proc. 392/14.4.T8CHV-A.G1.S1) Acontece, porém, que as nulidades da sentença não são cognoscíveis por este Supremo, como bem frisa o Acórdão do STJ de 9.3.2022, proc. 11103/17.2T8PRT.P1.S1, que cita, nesse sentido, o Acórdão do STJ de 14.4.2011, Revista nº 603-B/2001.G1.S1, os acórdãos do STJ de 24.3.2011 (Revista n.º 491/05.3TBSLV.E1.S1), de 16..4.2009 (Revista n.º 138/09), de 7.7. 2009 (Revista n.º 7614/05.0TBVNG-A.S1) e de 16.3.2017 (Revista n.º 568/11.6TCFUN.L1-A.S1) e ainda o sumário do Acórdão deste Supremo Tribunal, de 16.3. 2017 (Revista n.º 568/11.6TCFUN.L1-A.S1). “A questão apreciada no acórdão recorrido sobre a arguida nulidade da sentença constitui matéria fora da apreciação do STJ, o qual não conhece dos eventuais vícios da sentença proferida em 1.ª instância, mas sim de vícios apontados ao acórdão da Relação, em caso de admissibilidade de recurso”. Como assim, improcede esta questão. Exequibilidade da sentença: Na 1.ª instância a sentença, considerando que o processo de prestação de contas não é o próprio para o pedido de condenação dos réus a entregar certos bens à herança, concluiu pela inexistência de título executivo. Reagiu o apelante contra este entendimento, considerando a sentença nula nos termos do art. 615º, nº 1 do CPC. Porém, o acórdão recorrido decidiu apenas no sentido de que a sentença não era nula. Ou seja: apesar das considerações tecidas, não se pode asseverar que acolheu a posição da 1ª instância. Pelo contrário: tal como se assinalou no acórdão anterior, afigura-se-nos que a Relação confirmou a decisão recorrida, não com base na inexistência do título executivo mas com base na iliquidez da obrigação exequenda, matéria de que se conhecerá adiante. De todo o modo, ainda que se entendesse que a Relação tinha acolhido a posição da 1ª instância, sempre estaria tal fundamento votado à improcedência. É que se se considerar, como consideramos, que a oposição à execução deve ser entendida como uma petição de uma acção declarativa autónoma, em que o seu objecto é definido pelo executado, então não se pode deixar de entender que cada um dos fundamentos que se invoca são verdadeiras e autónomas causas de pedir (cfr. Ac. STJ de 24.5,2022, proc. 327/20.5T8CBT.G1. S1). E se é verdade que o tribunal não pode conhecer de causa de pedir não alegada, também o tribunal não poderá conhecer também de fundamento de oposição à execução que não foi alegado. Juros legais de mora: Os exequentes pediram, no requerimento executivo, a quantia de 55.546,53€, a título de juros vencidos. Porém, tendo a sentença de prestação de contas, que fixou a quantia global em 127.096,82 €, transitado em julgado em 27.4.2016 e a execução instaurada em 22.6.2016, é óbvio que a quantia de 55.546,53 € indicada a título de juros de mora se reporta a período anterior à da sentença da prestação de contas. Dispõe o nº 2 do art. 703º do CPC: “Consideram-se abrangidos pelo título executivo os juros de mora, à taxa legal da obrigação dele”. Sobre o assunto da extensão da exequibilidade da sentença relativamente aos juros de mora, comunga-se, no entanto, da posição expressa por Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, em CPC anotado, volume II, 2020, pág. 22: “Era discutida a extensão da força executiva da sentença aos juros de mora que nela não estivessem expressamente consignados. Em face do anterior regime que não continha o segmento normativo que agora corresponde ao nº 2 do artigo 703º, Abrantes Geraldes já defendera a extensão da executoriedade a essa prestação complementar (em “ Exequibilidade da sentença condenatória quanto aos juros de mora, CJ 2001, t. I, pp. 55 a 62). As dúvidas a tal respeito dissipararam-se com o aditamento do nº 2 do artigo 46º do CPC de 1961 tornando inequívoca a possibilidade de ser exigido o cumprimento coercivo dos juros de mora à taxa legal. Porém, em atenção à jurisprudência fixada pelo AUJ nº 9/15 ( “Se o autor não formula na petição inicial, nem em ulterior ampliação, pedido de juros de mora, o tribunal não pode condenar o réu no pagamento desses juros”) apenas poderão ser exigidos juros de mora vencidos posteriormente à prolação da sentença já que seria contraditório negar a possibilidade de condenação oficiosa no pagamento de juros correspondentes a um período anterior e aceitar, apesar disso, que a sentença pudesse servir para sustentar um pedido executivo de pagamento de juros não peticionados na acção declarativa”. Aliás, Teixeira de Sousa em anotação ao AUJ nº 9/15, nos CDP nº 52, conclui assim: “ Independentemente dos problemas que o acordão suscita e das soluções que para eles se encontra, é certo o que fazer uma interpretação restritiva da proposição que enuncia a uniformização da jurisprudência dado que, segundo a orientação realmente adotada pelo Supremo, o que o tribunal apenas não pode fazer e, não tendo o autor formulado nenhum pedido relativo a juros, é condenar o réu nos juros que se vencerem antes do trânsito em julgado da sentença condenatória” No caso sub judice, não se surpreende qualquer decisão de condenação em juros de mora anteriores. Há, assim, que concluir que a sentença não constitui título executivo relativamente aos juros de mora pedidos antes do trânsito em julgado da sentença proferida na acção de prestação de contas. Juros compulsórios: Do acórdão decorre que o tribunal a quo não aceitou a exequibilidade dos jutos compulsórios previstos no art 829º-A, nº 4 do CC, que os exequentes pediram no requerimento executivo: “Acrescem ainda, os juros de mora já vencidos, à taxa legal, perfazem a quantia de 55.546,53, a título de juros vencidos e dados como provados pela sentença condenatória, acrescidos de juros compulsórios desde o trânsito em julgado à presente data, perfazendo a quantia de €957,58, bem como os juros vincendos, que serão calculados a final.” Alega, porém, o recorrente que eles são devidos. Nos termos do art. 829º-A, nº 4,” quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, são automaticamente devidos juros a taxa de 5% ao ano desde a data em que a sentença de condenação transitar em julgado, os quais acrescerão aos juros demora, se este forem também devidos, ou a indemnização a que houver lugar” Quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, (como é o caso), os juros compulsórios são, pois, automáticos, não carecendo de estarem previstos na sentença condenatória. A jurisprudência é unânime nesse sentido, deixando-se, a título exemplificativo, os sumários de alguns acórdãos do Supremo: “I. De acordo com a jurisprudência predominante do STJ, a sanção pecuniária compulsória prevista no n.º 4 do art. 829.º-A, do CC, deve ser contabilizada, pese embora não tenha sido referenciada pelo exequente no requerimento executivo. II. De acordo com o art. 829.º-A, n.º 4, do CC, os juros compulsórios seriam devidos desde a data do trânsito em julgado da sentença dada à execução” (Ac. STJ de 31.3.2022, proc. 9423/19.0T8SNT-A.L1.S1); “ (…) II - A aplicação dessa sanção não depende de qualquer pedido do credor no requerimento executivo, decorrendo automática e oficiosamente da dedução do pedido exequendo (Ac. STJ de 23.2.2021, proc. 708/14.3T8OAZ-A.P1.S1); “ II (…) a sanção pecuniária compulsória prescrita no n.º 4 emerge da própria lei, de modo taxativo e automático, em virtude do trânsito em julgado de sentença que condene o devedor no cumprimento de obrigação pecuniária, sem necessidade de intermediação judicial, tomando a designação de sanção pecuniária compulsória legal ou de juros legais compulsórios (Ac. STJ 12. 9.2019, proc. 8052/11.1TBVNG-B.P1.S1). Juros bancários: A sentença dos embargos exclui o pagamento de “juros bancários” assimilando-os a juros remuneratórios, entendimento a que o acórdão aderiu. Todavia, interpretando o segmento dispositivo da sentença da prestação de contas (que não se refere a quaisquer juros remuneratórios) há que concluir que tais juros se incluem nos rendimentos de capitais (cfr. art. 5º, nº 1 e ala. b), c) e d) do nº 2 do CIRS). Tendo sido, porém, qualificados como juros bancários só se podem reportar não a todos os rendimentos de capitais (designadamente, aos certificados de aforro do CTT) mas a produtos bancários (depósitos bancários). Iliquidez da obrigação exequenda: Sobre esta matéria, escreveu-se no acórdão recorrido: “Destarte, e com este estrito alcance, também na sequência do anteriormente consagrado, sendo impossível face aos elementos constantes dos autos, apurar do valor aritmético ou matemático do incumprimento parcial imputável aos exequentes - e, assim, apurar do exacto montante da prestação a cuja recusa (em função dessa redução) os executados estariam legitimados, não impende sobre estes, sequer, o ónus de prova do exacto montante da prestação que podem validamente recusar. Se aos executados assistiria o direito de recusar parcialmente, em montante não liquidado, a prestação que os exequentes vieram exigir pela execução, implicaria também considerar que a própria prestação exequenda não seria líquida. Apurada - para o efeito -, a iliquidez da obrigação em face da “oposição” deduzida, sempre seria aos exequentes que deveria imputar-se a falta da sua liquidação no âmbito do processo executivo e a consequência seria, ainda face a estes considerandos, a extinção da execução (cf. Ac. RP. de 22.11.2011: Proc. 1437/07.0TBVCD-A.P1.dgsi.Net). Em todo o caso - mais uma vez e sempre -, a sentença pode basear a acção executiva, ainda que não condene expressamente no cumprimento duma obrigação, basta que a obrigação fique declarada ou constituída por ela. A obrigação, porém, enquanto pressuposto material da execução, deve resultar expressamente declarada ou constituída na sentença (Cf. Ac. RE, de 22.10.2015: Proc. 243/11.TBMRA-C.E1.dgsi.Net). O que, na situação sub judice que, por este modo e no particular que problematiza (juros referenciados), se não revela, na medida tida por indispensável.” Objecta o recorrente (reportando-se, necessariamente, aos juros bancários) que a falta de liquidação não é imputável aos exequentes, na medida em que os recorridos tinham a obrigação de saber os bens que tinham em seu domínio. Em relação aos juros de mora e aos juros compulsórios não existe qualquer problema de apuramento, como já se viu. Restam os juros bancários, reportados, como se disse, aos juros dos depósitos bancários. A obrigação é ilíquida quando não se encontra determinada em relação a sua quantidade, carecendo da efectivação de cálculos aritméticos ou da alegação de factos que, depois de submetidos ao contraditório, permitam a sua quantificação (Abrantes Geraldes e outros, ob.cit, Vulume II, pág. 41). Ora, revertendo ao caso sub judice, verifica-se que o montante da obrigação de juros bancários não se mostra apurado, à face do título (nem se encontram especificados no requerimento executivo os valores que se consideram compreendidos na prestação). A obrigação de juros “bancários” (incluída nos rendimentos de capitais) não era, portanto, líquida em face do título executivo (sentença de prestação de contas). “Estando em causa sentença que contenha uma condenação ilíquida há que distinguir: se a liquidação só depender de simples de cálculo aritmético pode ser imediatamente executada, nos precisos termos em que pode ser executada uma sentença que contenha uma condenação líquida (art. 626º); se a sentença carecer de liquidação no processo declarativo, a execução apenas pode iniciar-se depois do obtida a liquidação nos termos definidos no art. 358º, nº 2. “(Abrantes Geraldes, ob.cit. volume II, pág. 33); “Quando a sentença careça de liquidação que não dependa de mero cálculo aritmético, não pode dar-se logo início à atividade executiva devendo começar-se pelaa dedução da liquidação por via incidental (arts 358º, nº 2, 360º, nº 3 e 704º, nº 6” (ob. cit. volume I, pág. 749; v., ainda, volume II, pág. 47); “ Nos termos do artigo 704, nº 6 a liquidação é condição necessária para a formação do título executivo judicial pelo que o incidente é obrigatório quando se pretende executar a sentença de condenação genérica. A liquidação da obrigação ilíquida reconhecida em sentença proferida em processo declarativo não depende de simples calculo aritmético sempre que o exequente tenha que acrescentar/ introduzir/alegar factos que não constam do título executivo” (ob. cit, volume I, pág. 415). Socorre-se o recorrente do teor do acórdão de uniformização de 20.12.1996, proc. 060708, que concluiu assim: “ O mandatário deve juros legais pelo saldo das contas do mandato, a partir da data em que é interpelado para as prestar.” Todavia, não existe aqui uma qualquer relação de mandato. Por outro lado, não estão em causa juros legais, mas os rendimentos de capital em depósitos bancários, os chamados “juros bancários” Invoca, ainda, o recorrente o Ac. R. Lx. de 23.4.1998, em cujo sumário se pode ler: “O administrador de patrimónios alheios sabe ou tem a obrigação de saber o que deve, pelo que, a ser ilíquido o montante da dívida, a liquidez é apenas aparente e não real, não impedindo a constituição em mora”. Todavia, o que está aqui em causa no caso sub judice não é a constituição em mora, a determinação do termo inicial da dívida de juros moratórios, para os efeitos do art. 805º, nº 3 do CC (v. Ac. STJ de 7.11.2006, proc. n.º 2874/06) mas a necessidade ou não de liquidação da obrigação de juros bancários para que ela possa ser executada. De tudo decorre, assim, que os exequentes deviam ter liquidado a obrigação do juros bancários através do incidente previsto no art. 358º, nº 2 do CPC. Não o tendo feito, tal obrigação deve ser considerada ilíquida e a execução extinta nessa parte. Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção em conceder parcialmente a revista e: “a) revogar o acórdão na parte em que julga procedentes os embargos com base na iliquidez da obrigação exequenda e determina a extinção total da execução, sendo que os juros de mora e os juros compulsórios são devidos a partir do trânsito em julgado da sentença de prestação de contas: b) em substituição, julgar procedentes os embargos relativamente aos juros bancários, por iliquidez dessa obrigação não suprida na fase introdutória da execução e determinar a extinção da execução nessa parte; c) ordenar o prosseguimento dos embargos quanto às demais questões suscitadas.” Custas pelo recorrente na proporção de metade. e pelos recorridos, na mesma proporção. * Lisboa, 5 de Setembro de 2023
António Magalhães (Relator) Jorge Arcanjo Manuel Aguiar Pereira |