Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | 1ª SECÇÃO | ||
| Relator: | ANTÓNIO MAGALHÃES | ||
| Descritores: | BALDIOS HOMOLOGAÇÃO TRANSAÇÃO LEGITIMIDADE PERSONALIDADE JUDICIÁRIA CAPACIDADE JUDICIÁRIA CONSELHO DIRETIVO TITULARES DE ÓRGÃOS SOCIAIS IMPUGNAÇÃO ABUSO DO DIREITO SUPRESSIO SURRECTIO DEMOLIÇÃO DE OBRAS INDEMNIZAÇÃO OCUPAÇÃO DE IMÓVEL ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA | ||
| Data do Acordão: | 03/11/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA | ||
| Decisão: | NEGADA A REVISTA DA ASSOCIAÇÃO CULTURAL E RECREATIVA CONCEDE-SE PARCIALMENTE A REVISTA A E..., S.A | ||
| Sumário : | A Ré deve restituir o baldio que ocupou sem consentimento da assembleia de compartes e demolir o parque eólico que lá construiu, também sem consentimento da referida assembleia. | ||
| Decisão Texto Integral: | Revista nº 90/12.3TBCNF.C1.S1 Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça: * AA, casado, BB, casado, CC, solteira e maior e DD, todos residentes no lugar de ..., também conhecido como ..., freguesia de ..., ..., por si e na qualidade de representantes do universo de todos os Compartes dos Baldios dos Lugares de ..., ... e ..., freguesia de ..., concelho de ..., intentaram a presente acção declarativa comum contra: 1. E..., S.A., sociedade anónima com sede no Parque ..., na freguesia de ..., concelho de ..., com o NIPC ...74, 2. EE e mulher FF, casados sob regime de comunhão geral de bens, residentes no lugar de ..., freguesia de ... e concelho de ..., respectivamente portadores dos NIF ...90 e ...45; 3. GG e sua mulher HH, casados sob regime de comunhão geral de bens, residentes no lugar de ..., freguesia de ... e concelho de ..., respectivamente portadores dos NIF ...35 e ...10; 4. II, também conhecida pelo nome de JJ, residente na Rua de ..., no lugar de ..., freguesia de ..., concelho de ...,... portadora do NIF ...30; 5. KK, solteiro, maior, residente na Rua ..., portador do NIF ...25; 6. LL, portadora do NIF ...57 e marido MM, casados sob o regime de comunhão de adquiridos, residentes na Rua ...; 7. NN, portadora do NIF ...02 e marido OO, casados sob o regime de comunhão de adquiridos, residentes na Rua ...; 8. PP, portadora do NIF ...84 e marido QQ, casados sob regime de comunhão de adquiridos, residentes na Rua ...; 9. RR, portadora do NIF ...87 e marido SS, casados no regime de comunhão de adquiridos, residentes no lugar de ..., freguesia de ..., concelho de ..., ..., sendo a 4ª e os 5ºs a 9ºs RR. por si mas também na qualidade de representantes de: 10. Herança ainda ilíquida e indivisa que ficou por falecimento de TT, residente que foi no lugar de ..., freguesia de ..., concelho de ..., casado no regime de comunhão geral de bens com a 4ª Ré, em primeiras e únicas núpcias de ambos, herança com o NIF ...08. Pediram, em síntese, que se: a) Declare que a área de terreno descrita sob os art.s 6º, 7º e 8º da petição inicial constitui um baldio exclusivamente possuído e gerido pela comunidade local dos moradores das aldeias de ...,... e ..., da freguesia de ..., concelho de ...; b) Reconheça e declare que os quatro AA. são compartes desse baldio, em conjunto com os demais residentes daquelas três localidades. c) Declare a nulidade dos três escritos particulares configurados pelas partes celebrantes como contratos de arrendamento, caracterizados nos art.s 24º a 36º da petição inicial; d) Declare a nulidade do requerimento pela qual a primeira R. solicitou, perante o Município de ..., o licenciamento da construção e exploração do Parque Eólico dito “de ...”. e) Reconheça e declare que todos os aerogeradores, estruturas, edifício, furo artesiano, postes, antena, vias de acesso, cabos aéreos, a maior parte dos cabos soterrados e os demais cómodos e equipamentos do referido parque eólico foram construídos e implantados no terreno baldio, a que se reporta o pedido formulado sob a al. a), com excepção do sexto aerogerador, sito na área da freguesia de .... f) Declare e reconheça que os 2ºs, 3ºs, 4ºs, 5ºs, 6ºs, 7ºs, 8ºs, 9º e 10ª RR. nenhum direito têm sobre o terreno onde se acha implantado o parque eólico; g) Declare e reconheça que a ocupação do dito terreno baldio com o descrito parque eólico não foi consentida por forma válida pelos respectivos compartes ou por quem legitimamente os represente e é abusiva e ilegítima. h) Condene os RR. a assim verem julgar todos os pedidos anteriores e a acatarem as respectivas decisões, a respeitarem os direitos dos compartes do sobredito baldio, a não estorvarem, doravante, por qualquer meio, o respectivo exercício e a absterem-se de praticar sobre o terreno baldio em questão qualquer acto, material ou jurídico. i) Condene os RR. a abrirem mão e a restituírem aos AA. e demais compartes, a totalidade do terreno baldio que ocuparam com o parque eólico, livre de quaisquer pessoas, bem como de coisas a ele alheias e no estado em que se encontrava quando os mesmos RR. dele se apropriaram, no prazo de três meses a contar da notificação da sentença ou do acórdão a proferir na presente acção; j) Condene os RR., solidariamente, a demolirem integralmente e a suas exclusivas expensas todas as obras que fizeram no mesmo terreno; l) Condene os RR., solidariamente a demolirem e retiraram até às suas fundações, os cinco aerogeradores, bem como os maciços ou sapatas que os suportam, o edifício, a antena, os dois postes de suporte de cabos, a selarem o furo artesiano e a absterem-se de aí captar água, bem como a retirarem todos os cabos, aéreos ou colocados no subsolo e a removerem ou a reporem no estado anterior ao da sua intervenção todas as vias de comunicação por si construídas ou modificadas. m) Condene os RR, solidariamente, a reporem o solo natural da totalidade do terreno por si afectado, com o nível de cota de altitude em que se encontrava antes das obras e totalmente liberto de inertes a ele alheios, ou de entulho, com reposição dos penedos antes existentes nos devidos locais, apto para ser integralmente usado para as suas iniciais finalidades de pastoreio, recolha de mato, feno e lenha, em toda a sua área e extensão, no mesmo prazo de três meses a contar da notificação da sentença ou acórdão a proferir na presente acção. n) Condene os RR., solidariamente, a pagarem aos compartes dos baldios, uma indemnização por danos patrimoniais, pelos prejuízos que lhes causarem com a ocupação indevida do terreno baldio, até efectiva e integral entrega deste, reposto no seu statu quo ante, compensação de montante a liquidar em execução de sentença. o) Condene os RR., solidariamente, a pagarem aos AA. AA, BB, CC e DD, quantia não inferior a 20.000€ a título de indemnização por danos não patrimoniais. p) Condene os RR., solidariamente, a restituírem aos compartes dos baldios todos os valores correspondentes ao seu enriquecimento proveniente da ingerência em bens alheios, gerador de um aumento injustificado do seu património, mormente os resultados da facturação da primeira R. desde que o parque eólico foi ligado à rede pública, bem como os montantes das rendas percebidas pelos demais RR. e seus antecessores, desde o montante das celebrações dos contratos, tudo pelo menos no quantitativo que extravase o valor dos danos causados aos AA. e ao universo dos compartes pelos mesmos RR. e que estes sejam condenados a reparar, montante esse a liquidar em execução de sentença; q) Condene os RR. no pagamento de custas e encargos legais da presente acção e procuradoria condigna. Em sede de primeira instância, foi proferida sentença que decidiu: “a) Declarar que a área de terreno constante dos pontos 2. a 4. da factualidade provada constitui terreno baldio, exclusivamente possuído e gerido pela comunidade local dos compartes das aldeias de ..., ... e ..., da freguesia de ...; b) Reconhecer e declarar que os quatro AA. singulares são compartes desse baldio, em conjunto com os demais; c) Reconhecer e declarar que o Parque Eólico de ... (com excepção do sexto aerogerador, sito na freguesia de ...) foi construído e implantado no terreno baldio a que se reportam os pontos 2. a 4. da factualidade provada; d) Reconhecer e declarar que os 2ºs, 3ºs, 4ª, 5º, 6ºs, 7º, 8º, 9º e 10º Réus nenhum direito têm sobre tal terreno; e) Declarar que a ocupação do dito terreno com o Parque Eólico não foi consentida por forma válida pelos respectivos compartes ou por quem legitimamente os represente, sendo abusiva e ilegítima; f) Condenar a 1ª Ré E..., S.A. a acatar tal decisão, respeitando os direitos dos compartes do referido baldio, não estorvando, doravante e por qualquer meio, o respectivo exercício e abstendo-se de praticar sobre o terreno baldio em questão qualquer acto, material ou jurídico; g) Condenar a 1ª R. a abrir mão e a restituir aos AA. e demais compartes, aqui representados pelo Conselho Directivo, a totalidade do terreno baldio que ocuparam com o Parque Eólico de ... (com excepção do sexto aerogerador), livre de pessoas e bens e de coisas a ele alheias, no prazo de três meses; h) Condenar a 1ª R.E..., S.A. a demolir integralmente e a suas expensas as obras que efectuou no terreno referido nos pontos 2. a 4. da factualidade provada, repondo o solo no estado em que estava antes das obras realizadas para implantação do Parque Eólico de ...; i) Condenar a 1ª Ré a pagar aos compartes do baldio, aqui representados pelo Conselho Directivo, indemnização pelos danos patrimoniais provocados com a ocupação indevida do terreno baldio, indemnização essa que será liquidada em incidente próprio (art. 564º, nº 2, do CC e 358º a 361º do CPC) e que terá por base a percentagem de ocupação efectiva do solo pela 1ª R. , também ela a determinar em sede incidental; j) Declarar ineficaz em relação aos compartes dos Baldios dos Lugares de ..., ... e ..., aqui representados pelo Conselho Directivo, o contrato denominado pelas partes como de arrendamento para fins industriais, celebrado por escrito particular entre a 1ª R. E..., S.A. e a Chamada Associação Cultural, Recreativa e para o Desenvolvimento dos Três Lugares, de ..., ... e ..., datado de 20/10/2006; k) Condenar a Chamada Associação Cultural, Recreativa e para o Desenvolvimento dos Três Lugares de ..., ... e ... a reconhecer que nenhuma detenção, posse ou direito legítimo tem sobre o terreno baldio referido nos pontos 2. a 4. da factualidade provada; l) Absolver os RR. do demais peticionado na p.i. e réplica. Interpostos recursos de apelação pela 1ª Ré, pela chamada Associação Cultural Recreativa e para o Desenvolvimento dos três lugares, ..., ... e ... e pelos autores, foi proferido acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, que decidiu nos seguintes termos: “1. Julga-se procedente o recurso interposto contra a decisão interlocutória proferida em 14 de abril de 2016 e, em consequência, revoga-se e substituiu-se essa decisão por outra a admitir que se acrescente ao art. 8º da petição inicial a seguinte expressão: “e que, mais concretamente, é de 1 557 298m2”; 2. Julgam-se improcedentes os recursos interpostos pela ré E..., S.A. e pela Associação/chamada; 3. Julga-se parcialmente procedente o recurso interposto pelos autores e interveniente e, em consequência: a) Revoga-se a sentença na parte em que absolveu a ré E..., S.A. e a Associação Cultural, Recreativa e para o Desenvolvimento dos três Lugares, ...,... e ... do pedido de condenação solidária na restituição aos compartes dos baldios de todos os valores correspondentes ao enriquecimento proveniente da ingerência em bens alheios, gerador de um aumento injustificado do seu património, mormente os montantes das rendas por si percebidas ou a perceber, montante esse a liquidar em execução de sentença; b) Substitui-se esse segmento da sentença por decisão a condenar solidariamente a ré E..., S.A. e a Associação Cultural, Recreativa e para o Desenvolvimento dos três Lugares, ..., ... e ... a restituírem aos compartes dos baldios os montantes das rendas recebidos ou a receber pela Associação, montante esse a quantificar em incidente de liquidação. 4. Mantém-se a parte restante da sentença”. Irresignados com o decidido pelo Tribunal da Relação, vieram a Associação Cultural e Recreativa e a Ré E..., S.A. interpor recurso de revista (normal) e excepcional, tendo vindo os autores e interveniente Conselho Directivo dos Baldios de ..., ... e ... apresentado recurso subordinado de revista excepcional (tendo desistido do recurso subordinado de revista normal). Foi proferido despacho transitado em julgado em que: a) se admitiu a revista normal pela Associação Cultural e Recreativa para o Desenvolvimento dos 3 lugares ..., ... e ... restrita apenas ao segmento decisório relativo à aludida condenação de restituição das rendas; b) não se admitiu a revista normal interposta pela Associação Cultural e Recreativa para o Desenvolvimento dos 3 lugares ..., ... e ..., na parte em que, no essencial, a ora recorrente invocou a questão da legitimidade substantiva do interveniente Conselho Directivo, a violação dos direitos de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva e a ocorrência de uma situação de abuso de direito - , mantendo o decidido em primeira instância, porquanto se entendeu existir, nessa parte, uma dupla conformidade impeditiva da reapreciação de tais matérias em sede de recurso de revista; c) tendo a recorrente interposto recurso de revista excepcional a título subsidiário, invocando a relevância social e jurídica das questões suscitadas, se remeteram os autos à Formação; d) se admitiu a revista normal interposta pela Ré E..., S.A. na parte em que o acórdão recorrido condenou a chamada, ora recorrente, a restituir aos compartes dos baldios os montantes das rendas recebidas ou a receber pela Associação; e) se determinou em relação à parte restante a remessa dos autos à Formação, para os efeitos do art. 671º, nº 3 do CPC; f) se remeteu à Formação a admissibilidade do recurso subordinado de revista excepcional apresentado pelos autores e interveniente, Conselho Directivo dos Baldios de ..., ... e .... Submetidos os autos à formação de apreciação preliminar, foi, por acórdão definitivo, decidido admitir a “(…) revista excepcional interposta pela Chamada, Associação Cultural e Recreativa para o Desenvolvimento dos 3 lugares ..., ... e ... e pela Ré, E..., S.A. com fundamento em relevância social da questão relativa à apreciação da verificação dos pressupostos da figura do abuso do direito, no que tange ao pedido formulado pelos Autores, de restituição do baldio, no qual o parque eólico se integra, livre e desocupado, não se admitindo, quanto aos demais fundamentos, o recurso de revista excecional apresentado pela Chamada, Associação Cultural e Recreativa para o Desenvolvimento dos 3 lugares ..., ... e ..., e, bem assim, não se admite o recurso de revista excecional interposto pelos Autores e Interveniente, Conselho Diretivo dos Baldios de ..., ... e ...”. Em face da recusa da Formação da revista excepcional que tinha por objecto o segmento decisório relativo a matéria relacionada com a extensão e com o conteúdo da indemnização por enriquecimento sem causa, vieram os Autores e a interveniente, Conselho Diretivo dos Baldios de..., ... e ...” interpor recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão da Relação de Coimbra, com fundamento na inconstitucionalidade da interpretação dos arts. 473º e 479º do CC. Porém, tal recurso não foi admitido, tendo a reclamação dessa não admissão para o Tribunal Constitucional sido indeferida. Posteriormente, a Ré E..., S.A. requereu a homologação da transacção que afirmou ter ajustado com a interveniente “Conselho Directivo dos Baldios de ...,... e ...” e com “a Associação Cultural e Recreativa para o Desenvolvimento dos 3 lugares ..., ... e ...”, requerimento sobre o qual recaiu o seguinte despacho: “ (…) Da documentação que acompanha esse pedido extrai-se que o interveniente “Conselho Directivo da Comunidade Local dos Baldios de..., ... e ...” é actualmente integrado por UU, VV, WW, XX e YY, figurando estes como subscritores do termo de transacção anexo. Em extenso arrazoado, os Autores e o interveniente “Conselho Directivo dos Baldios de ... ...e ...” (composto por AA e ZZ) pugnaram no sentido de, em vista da invalidade da transacção, não se proceder à requerida homologação. De entre a profusão de considerações ali tecidas, avulta o facto de terem sido judicialmente impugnadas- mediante acção que corre termos sob o nº 349/21.9... - as deliberações da assembleia de compartes realizadas nos 10 de Outubro de 2021, 14 de Novembro de 2021 e 26 de Junho de 2022, entre as quais se conta a eleição daqueles que serão os identificados membros daquele órgão. A Ré e a interveniente “Associação Cultural e Recreativa Para o Desenvolvimento dos Três Lugares ..., ... e ...” pugnaram pelo indeferimento daquela pretensão. Consultado o processo nº 349/21.9T8CNF.C1.S1 (actualmente pendente neste Supremo), constatou-se que, na petição inicial que deu origem a esses autos, os ora Autores pedem: “NESTES TERMOS, E NOS MELHORES DE DIREITO, QUE VOSSA EXCELÊNCIA, DOUTAMENTE, SUPRIRÁ, DEVERÁ A PRESENTE ACÇÃO SER JULGADA PROCEDENTE, POR PROVADA, E, EM CONSEQUÊNCIA, COM RESPEITO A UMA REUNIÃO OCORRIDA EM 10.10.2021, PELAS 09,30 HORAS, NO LUGAR DE..., FREGUESIA DE ..., CONCELHO DE ..., JUNTO À ANTIGA ESCOLA PRIMÁRIA AÍ SITA, CUJOS PARTICIPANTES ARVORARAM A MESMA EM SUPOSTA ASSEMBLEIA DE COMPARTES DOS BALDIOS DE ..., ... E ..., DEVERÁ O TRIBUNAL: - POR MEIO DA PRESENTE ACÇÃO E DA DOUTA SENTENÇA A NELA PROFERIR: DAR A MESMA REUNIÃO; A CONVOCATÓRIA PARA A MESMA; A RESPECTIVA ACTA; AS DELIBERAÇÕES NELA TOMADAS E TODOS OS ACTOS DAQUELA EMANADOS E A ELA SEQUENCIAIS: NOMEADAMENTE A ELEIÇÃO NA MESMA DE UMA MESA DA ASSEMBLEIA COM OS RESPECTIVOS TITULARES; A ADMISSÃO DE NOVOS COMPARTES; A APROVAÇÃO DE NOVO CADERNO DE COMPARTES; A APROVAÇÃO DE REGULAMENTO ELEITORAL E O REGULAMENTO ASSIM APROVADO; A MARCAÇÃO E A CONVOCATÓRIA DEUMA NOVA ASSEMBLEIA DE COMPARTES PARA ELEIÇÃO DOS ÓRGÃOS DOS BALDIOS – A TER LUGAR A 14.11.2021, ENTRE AS 09,00H E AS 13,00H, NO MESMO LOCAL –; POR IMPUGNADOS, INEXISTENTES, ÍRRITOS E SEM QUALQUER VALOR JURÍDICO PARA ESSES PRETENDIDOS EFEITOS E, COMO TAL, INEXISTENTES, OU NULOS, OU ANULÁVEIS, OU DE TODA A MANEIRA CONTRÁRIOS À LEI E INEFICAZES QUANTO AOS COMPARTES DOS MESMOS BALDIOS; NOMEADAMENTE PELA VERIFICAÇÃO SUBSIDIÁRIA, COMO SE INVOCOU, DAS SEGUINTES DESCONFORMIDADES COM A LEI: - AUSÊNCIA DE CONVOCATÓRIA EFECTUADA NOS TERMOS DO DISPOSTO DO Nº 1 DO ART. 26. º DA LEI DOS BALDIOS E DE OUTROS PRECEITOS APLICÁVEIS. - INOBSERVÂNCIA, NA SESSÃO, DA PUTATIVA ORDEM DE TRABALHOS. - MARCAÇÃO DA DATA DA ELEIÇÃO SEM PRÉVIA ORGANIZAÇÃO E ACTUALIZAÇÃO (PELO CONSELHO DIRECTIVO, A QUEM COMPETE), TOTAL E ABRANGENTE, DO CADERNO DE RECENSEAMENTO DE COMPARTES; - ADMISSÃO DE NOVOS COMPARTES SEM COMPETÊNCIA PARA TAL (E SEM PRÉVIA PRONÚNCIA DO CONSELHO DIRECTIVO LEGÍTIMO E ELEITO, ANTE O QUAL FORAM APRESENTADOS PEDIDOS FORMULADOS POR VÁRIOS POSTULANTES, EM NÚMERO MUITO SUPERIOR AO CONTEMPLADO); - ADMISSÃO DE NOVOS COMPARTES CUJOS REQUERIMENTOS NÃO CONTINHAM QUALQUER FUNDAMENTAÇÃO; TUDO EM VIOLAÇÃO, ENTRE OUTROS PRECEITOS, DO DISPOSTO NO N. º 6 DO ART. SÉTIMO DA LEI DOS BALDIOS. - DUPLICAÇÃO, SEM QUALQUER FUNDAMENTO VÁLIDO, DE ASSEMBLEIA DE COMPARTE E DE MESA DA ASSEMBLEIA, COM CRIAÇÃO ALTERNATIVA DE NOVA ASSEMBLEIA E DE NOVA MESA, QUANDO HAVIA OUTRA ASSEMBLEIA JÁ MARCADA E UMA MESA LEGÍTIMA, LEGALMENTE ELEITA, COM VIOLAÇÃO DOS ART.S 21. º E 22. º DA LEI DOS BALDIOS, ENTRE OUTROS PRECEITOS. - MARCAÇÃO E CONVOCATÓRIA DE UMA SEGUNDA ASSEMBLEIA DE COMPARTES (A ASSEMBLEIA ELEITORAL PRÓXIMA FUTURA DE 14.11.2021), EM VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NO N. º 4 DO ART. 26. º DA LEI DOS BALDIOS, SEM PRÉVIO PEDIDO EFECTUADO À PESSOA DO PRESIDENTE DA MESA DA ASSEMBLEIA DE COMPARTES ELEITO PARA QUE REALIZASSE ELE PRÓPRIO A CONVCATÓRIA. - APROVAÇÃO DE UM NOVO REGULAMENTO ELEITORAL, SEM ESTAR NA ORDEM DE TRABALHOS, PARA MAIS SEM PREVIAMENTE REVOGAR O QUE FORA APROVADO NA ASSEMBLEIA DE COMPARTES DE 06.06.2021. - FALTA DE LEITURA E DE APROVAÇÃO DA ACTA, EM VIOLAÇÃO, ENTRE OUTROS PRECEITOS, DO ART. 19. º DA LEI DOS BALDIOS.” Mais se constatou que, recentemente, foi admitida a revista excepcional do Acórdão da Relação de Coimbra proferido nesses autos. Apreciemos. A homologação jurisdicional de uma transacção (cfr. nº 3 do art. 290º do Código de Processo Civil) visa, em primeira linha, controlar a respectiva validade, atendendo-se, para tanto, ao respectivo objecto (validade objectiva) e à qualidade dos sujeitos que naquela intervém (validade subjectiva). Neste âmbito, impõe-se ao julgador que afira se os transigentes que representam pessoas colectivas têm capacidade para praticar o acto, ou, mais latamente, a sua capacidade e legitimidade para tratarem do objecto da causa. É, ainda, sabido que, tratando-se de pessoas colectivas, os respectivos representantes apenas podem transigir nos limites das respectivas atribuições (art. 287º do mesmo diploma). Posto isto, deve ter-se presente que a transacção cuja homologação se requer tem por objecto um segmento do baldio gerido pelo interveniente “Conselho Directivo dos Baldios de ..., ... e ...” no qual se encontra implantado o parque eólico que é pertença da Ré, preconizando-se, nos termos transaccionados, a futura celebração de um contrato de cessão de exploração desse espaço (cfr. ponto nº 1 e al. b) do ponto nº 5 daquela transacção). O baldio é legalmente definido como um terreno - com as suas partes e equipamentos integrantes - que é possuído e gerido por comunidades locais (cfr. corpo da al. a) do art. 2º da Lei nº 75/2017 de 17 de Agosto). A comunidade local caracteriza-se como um conjunto de compartes que possui e gere os baldios e outros meios de produção comunitários (al. c) do mesmo preceito). Como resulta do nº 3 do art. 3º do mesmo diploma, o uso, a posse, a fruição e a administração dos baldios deve, ademais, ter em consideração as deliberações dos órgãos competentes das comunidades locais democraticamente eleitos. Estatui-se, correspondentemente, no nº 1 do art. 17º do mesmo diploma que, para o exercício dos poderes de representação e disposição relativos aos correspondentes imóveis, os compartes se devem organizar em assembleia de compartes, em conselho diretivo e em comissão de fiscalização. O conselho directivo é um desses órgãos, sendo eleito pela assembleia de compartes (cfr. nº 1 do art. 17º, al. b) do nº 1 do art. 24º e nº 1 do art. 28º, todos do mesmo diploma). A lei reconhece personalidade judiciária às comunidades locais (nº 1 do art. 4º daquele diploma), cometendo à assembleia de compartes - e, em caso de urgência, ao conselho directivo - a respectiva representação em juízo (cfr. al. q) do nº 1 do art. 24º e al. h) do nº 1 do art. 29º, ambos da Lei nº 75/2017 de 17 de Agosto e parte final do art. 26º do CPC). Quer se perspective a questão sobre o prisma da personalidade judiciária, quer se considere que estamos perante uma mera questão de capacidade judiciária, é ponto assente que a actuação em juízo de um conselho directivo em representação de uma comunidade local depende, em primeira linha, da aferição da validade da respectiva constituição. Retornando ao caso, deve-se salientar que, pese embora o empenho revelado pelas partes em transpor para estes autos a discussão travada naqueles autos e, bem assim, em iniciar, nesta sede, a discussão acerca da validade das deliberações que terão sido adoptadas em assembleia de compartes que teve lugar a 10 de Dezembro de 2023, é evidente que esse não é o objecto da presente causa. Nessa medida, o tribunal não emitirá - porque não o deve fazer - qualquer pronúncia sobre essas temáticas. Não se deve, porém, ignorar que está a ser debatida, num outro processo judicial, a regularidade/validade do processo que culminou com a eleição daqueles que serão os actuais titulares do “Conselho Directivo dos Baldios de ..., ... e ...”, o que é objectivamente idóneo a gerar um estado de incerteza acerca daquela que, no presente, é a composição desse órgão, seja qual for a sua denominação. Noutro prisma, importa salientar que, como resulta do nº 2 do art. 17º da Lei nº 75/2017, de 17 de Agosto, os membros originários daquele órgão se mantêm em exercício de funções até à sua substituição. Ora, perante a impugnação judicial do acto eleitoral em questão, deve considerar-se que tal substituição - que, no caso, terá tido lugar por via eleitoral - ainda não se mostra consolidada nem assumiu foros de definitividade. Mostra-se, em suma, questionável a validade da actual constituição daquele órgão. Logo, não é viável, com a necessária propriedade, considerar que as pessoas que, na actualidade, integrarão aquele Conselho Directivo e que, nessa qualidade, subscreveram a ajuizada transacção são, efectivamente, os lídimos titulares daquele órgão da comunidade local que gere os baldios de ..., ... e ..., o que, como bem se percebe, é imperioso para aferir a sua aptidão para o representarem em juízo e, no que aqui releva, para, em seu nome, disporem acerca do objecto da causa nos termos em que o fizeram. Nessa medida, impõe-se concluir pela nulidade da transacção homologanda, o que obsta ao acolhimento da pretensão aduzida pela Ré. Em consequência mostra-se prejudicada a apreciação das remanescentes questões suscitadas pelos Autores no precedente requerimento. Pelo exposto, não homologo a transacção que antecede. Custas do incidente pela Ré “E..., S.A.”, fixando-se a taxa de justiça de 2 (duas) UC.” Deste despacho vêm a interveniente “ Conselho Directivo dos Baldios de ..., ... e ...” e a chamada Associação Cultural e Recreativa para o Desenvolvimento dos 3 lugares ..., ... e ...” reclamar para a conferência, reclamação de que se conhece desde já, dada a sua possível prejudicialidade relativamente ao mérito dos recursos interpostos. Reclamação do precedente despacho que não homologou a transacção apresentada nos autos: A Associação Cultural vem pedir que seja proferido acórdão que revogue o despacho reclamado e julgue válida a transacção, homologando-a, condenando as partes a cumpri-la nos seus precisos termos. Para tanto invoca que o referido despacho é nulo: a) por oposição entre os fundamentos e a decisão, nos termos do art. 615º, nº 1, al. c), do CPC, porquanto (…) o Senhor Relator, apesar de referir que “ o tribunal não emitirá – porque não o deve fazer – qualquer pronúncia sobre essas temáticas” (validade das deliberações que terão sido adoptadas em assembleia de compartes que teve lugar no dia 10 de Dezembro de 2023), conclui pela nulidade da transacção por entender que “não é viável, com a necessária propriedade, considerar que as pessoas que, na actualidade, integrarão aquele Conselho Directivo e que, nessa qualidade, subscreveram a ajuizada trannsacção são, efectivamente, os lídimos titulares daquele órgão da comunidade local que gere os baldios de ..., ... e ...”; b) por excesso de pronúncia, nos termos do art. 615º, nº 1, al. d), do CPC, uma vez que o tribunal se decidiu pela nulidade da transacção, sem qualquer suporte factual ou legal, pois ao ter considerado que (…) não se deve, porém, ignorar que está a ser debatida, num outro processo judicial, a regularidade/validade do processo que culminou com a eleição daqueles que serão os actuais titulares do Conselho Directivo dos Baldios de ... ... e ..., o que é objectivamente idóneo a gerar um estado de incerteza acerca daquela que, no presente, é a composição desse órgão, seja qual for a sua denominação (…), parece ser entendimento do Tribunal que se verifica uma questão prejudicial, pelo que, nos termos do disposto nos art.s 269º, nº 1 al. c) e 272º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, deveria ter ordenado a suspensão da instância neste processo até que fosse proferida decisão, com trânsito em julgado no processo 349/21.9T8CNF.C1.S1. Invoca, também, que o despacho singular do relator padece de inconstitucionalidade em face da interpretação que fez dos arts. 26º, 290º, nº 3, 287º, do CPC, 2º, 3º, nº 3, 4º, nº1, 17º, n.1, al. b),e nº 2, 24º, nº1, al. h), q), 28º, 29º, n. 1, todos da Lei 75/2017, de 17 de Agosto, por violação do art. 46º, nº 2, da CRP, na medida em que se verifica uma ingerência injustificada do Tribunal à autonomia e liberdade de associação dos Baldios de ..., ... e .... Por fim, apresenta as suas razões para que se atenda à legitimidade dos intervenientes da transacção apresentada nos autos e se considere válida a transacção, sendo, como tal, homologada por este tribunal. A ré E..., S.A., por sua vez, na reclamação que apresenta, vem pedir que seja proferido acórdão que: a) Revogue o despacho reclamado e julgue válida a transacção, homologando-a, condenando as partes a cumpri-la nos seus precisos termos (cfr. Art.s 283º nº 2, 284º, 287º e 289º a contrario sensu e 290º, todos do Código de Processo Civil), o que se requer; b) Subsidiariamente, declare suspensa a presente instância até que seja decido, com trânsito em julgado, o processo número 349/21.9T8CNF.C1.S1, identificado no despacho sub judice como causa prejudicial à requerida transacção homologanda. Para tanto, sustenta: a) que a interpretação dada aos arts. 26º, 287º e 290º, nº 3, todos do CPC, e aos arts. 2º, nº 1, al. c), 3º, nº 3, 4º, nº 1, 17º, nºs 1 e 2, 24º, nº 1, als. b) e q), 28º, 29º nº 1, todos da Lei nº 75/2017, de 17-08, no despacho em crise datado de 14-03-2024 violou frontalmente os arts. 2º e 46º da CRP, uma vez que foi a Assembleia de Compartes que aprovou o termo de transacção, enquanto órgão soberano do Baldio, tendo sido o Conselho Directivo a dar cumprimento à deliberação da Assembleia de Compartes junto do Notário, pelo que inexiste qualquer ilegitimidade das partes; b) a nulidade da decisão por oposição entre os fundamentos e a decisão, nos termos do art. 615º, nº 1, al. c), do CPC, uma vez que usa como fundamento da decisão de nulidade da transacção a pendência do proc. nº 349/21.9T8CNF.C1.S1, que diz não relevar para decisão dos presentes autos, ao mesmo tempo que avança que dessa acção resulta, para o julgador, incerteza sobre a validade e composição do órgão subscritor da transacção (Conselho Directivo), quando, na realidade, não é ao Conselho Directivo que cabe decidir acerca de contratos de cessão de exploração do baldio, competência exclusiva da Assembleia de Compartes, que aprovou a transacção por unanimidade; c) a nulidade da decisão por excesso de pronúncia, nos termos do art. 615º, nº 1, al. d), do CPC, uma vez que conheceu de questões que afirmou de que não iria tomar conhecimento e de que não podia conhecer - a discussão, a montante, travada noutros autos, relativa a deliberações anteriores tomadas pela Assembleia de Compartes e a temática, a jusante, da validade das deliberações de 10 de Dezembro de 2023. A final, explana os fundamentos relativos aos erros de direito que, no seu entender, o despacho singular do relator padece, explicando, mais uma vez que o órgão que deliberou sobre o objecto da causa, o termo de transacção, foi a Assembleia de Compartes, por unanimidade, limitando-se o Conselho Directivo a dar cumprimento e execução às referidas deliberações tomadas em Assembleia de Compartes, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 29º, nº 1, al. a), da Lei nº 75/2017. Assegurada a legitimidade e poderes das partes presentes no termo de transacção e dada a natureza disponível e licitude do objecto da transação, deverá, em seu entender, ser homologada a transacção. Subsidiariamente, e se ainda assim subsistirem dúvidas acerca da validade da transacção, em face do teor do despacho em crise, deverá ser ordenada a suspensão da presente instância, como causa prejudicial, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 272º, nº 1, do CPC, até que se mostre decidido o proc. nº 349/21.9T8CNF.C1.S1. Os reclamantes juntaram cópia do acórdão do STJ proferido no âmbito do proc. nº 349/21.9T8CNF.C1.S1, a que os autores responderam, comprovando que recorreram para o Tribunal Constitucional do acórdão proferido no proc. nº 349/21.9T8CNF.C1.S1 ( que confirmou a absolvição da instância dos ali réus e aqui reclamantes). Também a ré veio juntar aos autos cópia dos acórdãos proferidos pelo Tribunal Constitucional, com o nº 699/2024, nos autos de recurso nº 617/24, (relativo ao proc. nº 349/21.9T8CNF.C1.S1), e com o nº 679/2024, nos autos de reclamação com nº 1182/23, (relativo aos presentes autos), nos quais se decidiu pelo não conhecimento do objecto do recurso para o Tribunal Constitucional. Os autores apresentaram resposta na qual reiteraram o que alegaram nos requerimentos apresentados em 15.01.2024, 12.02.2024, 22.04.2024 e 30.04.2024, e documentos/Parecer de Jurisconsulto já juntos aos autos. Em momento posterior às reclamações apresentadas, vieram a ré e a interveniente apresentar novos requerimentos e juntar documentos, tendo os autores exercido o direito de resposta. Estes requerimentos e documentos, por serem completamente intempestivos relativamente ao incidente da reclamação e por suscitarem novos fundamentos ou questões que não foram suscitados na reclamação nem considerados no despacho singular em reclamação, não serão apreciados (Ac. do STJ de 17.10.2019, Revista nº 255/10.2T2AVR-J.P1-A.S1) Da nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão Invoca a recorrente Associação que a decisão singular de não homologação da transacção padece de nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão, nos termos do art. 615º, nº 1, al. c), do CPC, porquanto (…) o Senhor Relator, apesar de referir que “ o tribunal não emitirá – porque não o deve fazer – qualquer pronúncia sobre essas temáticas” (validade das deliberações que terão sido adoptadas em assembleia de compartes que teve lugar no dia 10 de Dezembro de 2023), conclui pela nulidade da transacção por entender que “não é viável, com a necessária propriedade, considerar que as pessoas que, na actualidade, integrarão aquele Conselho Directivo e que, nessa qualidade, subscreveram a ajuizada transacção são, efectivamente, os lídimos titulares daquele órgão da comunidade local que gere os baldios de ...,... e ...”. Por sua vez, a ré E..., S.A., invocando a mesma nulidade, alega que a decisão singular de não homologação da transacção usa como fundamento da decisão de nulidade da transacção a pendência do proc. nº 349/21.9T8CNF.C1.S1, que diz não relevar para decisão dos presentes autos, ao mesmo tempo que (a decisão) avança que dessa acção resulta, para o julgador, incerteza sobre a validade e composição do órgão subscritor da transacção (Conselho Directivo), quando, na realidade, não é ao Conselho Directivo que cabe decidir acerca de contratos de cessão de exploração do baldio, competência exclusiva da Assembleia de Compartes, que aprovou a transacção por unanimidade. Como se sabe, a nulidade da sentença prevista na al. c), do nº 1, do art. 615º, do CPC, ocorre quando os fundamentos invocados determinam, em termos lógicos e racionais, um resultado oposto, ou pelo menos diferente, do que consta da decisão, isto é, quando o julgador segue determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão e em vez de a tirar, decide noutro sentido, oposto ou divergente (Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, ob. cit., 3ª edição, vol. 2º, pág. 736). Revertendo ao caso concreto, verifica-se que a decisão singular em crise não encerra qualquer contradição entre a fundamentação e o que foi decidido. A decisão considera apenas que, em face da incerteza quanto às pessoas que integram o Conselho Directivo do Baldio, por força da impugnação das deliberações que levaram à eleição do Conselho Directivo que subscreveu a transacção, resultante da pendência do processo nº 349/21.9T8CNF.C1.S1, não é possível asseverar que aqueles que subscreveram o termo de transacção são os representantes do Baldio. Ora, este juízo não apresenta qualquer vício, mostrando-se as premissas de que partiu em sintonia com a decisão que foi exarada, a de não homologação da transação. Improcede, assim, a invocada nulidade de oposição entre os fundamentos e a decisão. Da nulidade por excesso de pronúncia Alegam, ainda, as recorrentes que a decisão singular padece de nulidade por excesso de pronúncia, nos termos do art. 615º, nº 1, al. d), do CPC, nulidade que, como se sabe, se reporta aos limites da decisão, que não pode conhecer ou emitir pronúncia sobre questões que não sejam trazidas aos autos pelas partes, sem prejuízo do conhecimento oficioso de determinadas questões (José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, ob. cit., Volume 2º, pág. 735). Pelo seu lado, a interveniente Associação sustenta que, tendo o tribunal decidido a nulidade da transacção, por entender que estava em curso outro processo judicial, que introduzia um estado de incerteza sobre a composição do Conselho Directivo dos Baldios de ...... e ..., o Tribunal deveria ter ordenado a suspensão da instância neste processo até que fosse proferida decisão, com trânsito em julgado no processo 349/21.9T8CNF.C1.S1. Por outro, a ré E..., S.A. assentou a verificação da mesma nulidade no facto de decisão singular ter conhecido de questões de que disse que não iria tomar conhecimento e de que não podia conhecer, como a discussão, a montante, travada noutros autos, relativa a deliberações anteriores tomadas pela Assembleia de Compartes e a temática, a jusante, da validade das deliberações de 10 de Dezembro de 2023. No entanto, e em cumprimento do disposto pelo nº 3 do art. 290º do CPC, a decisão singular tratou apenas de conhecer da validade da transacção para os presentes autos, tendo concluído pela sua nulidade, em face da ausência de certeza quanto à legitimidade dos representantes do Conselho Directivo do Baldio e nada mais conheceu. A decisão singular não se pronunciou acerca das questões suscitadas quanto à validade das deliberações da Assembleia de Compartes colocadas em crise no proc. nº 349/21.9T8CNF.C1.S1, limitando-se a aferir da legitimidade daqueles que se apresentaram nos presentes autos como representantes do Conselho Directivo do Baldio, questão que se mostra controvertida em face dos litígios que contrapõem alguns dos compartes e os putativos representantes do Baldio. Não padece, assim, a decisão de qualquer nulidade por excesso de pronúncia, devendo, igualmente, improceder este fundamento da reclamação. Da invocada interpretação inconstitucional Consideram as recorrentes que a decisão singular procedeu a uma interpretação inconstitucional dos arts. 26º, 287º e 290º, nº 3, todos do CPC, e aos arts. 2º, nº 1, al. c), 3º, nº 3, 4º, nº 1, 17º, nºs 1 e 2, 24º, nº 1, als. b) e q), 28º, 29º nº 1, todos da Lei nº 75/2017, de 17-08, por violação dos arts. 2º e 46º da CRP, uma vez que foi a Assembleia de Compartes que aprovou o termo de transacção, enquanto órgão soberano do Baldio, tendo sido o Conselho Directivo a dar cumprimento à deliberação da Assembleia de Compartes junto do Notário, pelo que inexiste qualquer ilegitimidade das partes, tendo ocorrido, por conseguinte, uma ingerência injustificada do Tribunal na autonomia e liberdade de associação dos Baldios de ..., ... e .... Prescreve o art. 2º da CRP que “ A República Portuguesa é um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política democráticas, no respeito e na garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais e na separação e interdependência de poderes, visando a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa”; estatuindo o art. 46º da CRP que “ 1. Os cidadãos têm o direito de, livremente e sem dependência de qualquer autorização, constituir associações, desde que estas não se destinem a promover a violência e os respectivos fins não sejam contrários à lei penal. 2. As associações prosseguem livremente os seus fins sem interferência das autoridades públicas e não podem ser dissolvidas pelo Estado ou suspensas as suas actividades senão nos casos previstos na lei e mediante decisão judicial. 3. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação nem coagido por qualquer meio a permanecer nela. 4. Não são consentidas associações armadas nem de tipo militar, militarizadas ou paramilitares, nem organizações racistas ou que perfilhem a ideologia fascista.” De acordo com a alegação dos recorrentes a interpretação inconstitucional que a decisão singular terá levado a efeito prende-se com a ingerência do tribunal no direito à liberdade de associação de que os Baldios de ..., ... e ... são titulares, na sua vertente negativa, de não ingerência do Estado, in casu, dos Tribunais, na sua organização e vida interna enquanto organização associativa. Todavia, a decisão singular limitou-se a averiguar da validade formal subjectiva da transacção apresentada nos autos, sem que tal signifique qualquer intromissão na vida interna e organização associativa dos Baldios de ..., ... e .... A aferição da validade da transacção é um impositivo legal que o Tribunal observou e a que obedeceu, ao concluir pela invalidade da referida transacção, em face da incerteza da qualidade das pessoas que nela intervieram. Ao actuar como actuou, fê-lo em obediência à lei e sem violar qualquer preceito legal, incluindo a Constituição, em nada tendo contendido com a liberdade associativa ou com a vida organizativa interna dos Baldios de ..., ... e .... Improcede, desta forma, a invocada inconstitucionalidade da interpretação dos arts. 26º, 287º e 290º, nº 3, todos do CPC, e aos arts. 2º, nº 1, al. c), 3º, nº 3, 4º, nº 1, 17º, nºs 1 e 2, 24º, nº 1, als. b) e q), 28º, 29º nº 1, todos da Lei nº 75/2017, de 17-08, por violação dos arts. 2º e 46º da CRP. Da apreciação do mérito da decisão singular Resta, agora, apreciar os invocados erros de julgamento invocados pelas recorrentes e reclamantes. Conforme é sustentado na decisão singular em reclamação, deve o tribunal certificar-se que as concretas pessoas que reclamam a qualidade de legítimas representantes de uma pessoa colectiva, enquanto parte processual que se apresenta a transigir, beneficiam de legitimidade para disporem do objecto da causa (Lebre de Freitas e Isabel Alexandre , ob. cit., vol. 1º, Coimbra, pág. 571), por se tratar de um pressuposto respeitante à averiguação da validade subjectiva da transacção (cfr. Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, vol. II, 3.ª edição, pág. 78 v.). E, por isso, na decisão singular se escreveu “(…) a actuação em juízo de um conselho directivo em representação de uma comunidade local depende, em primeira linha, da aferição da validade da respectiva constituição (…)” (v. Ac. STJ de 23.9.2010, proc. nº 37/03.8TBRSD.P). Argumenta-se que o despacho reclamado prefigura uma representação factual errónea. Todavia, a decisão reclamada não ignorou a inexistência de decisão judicial que determinasse a suspensão das eleições da assembleia de compartes ou declarasse a invalidade de quaisquer deliberações. Também não formulou qualquer equiparação entre essas circunstâncias e a pendência da acção que corre termos sob o nº 349/21.9T8CNF.C1.S1. O que considerou foi apenas a pendência dessa causa e os seus contornos, tendo retirado daí as correspondentes implicações relativamente à composição do transigente “Conselho Directivo dos Baldios de ..., ... e ...” que se consideraram relevantes para o efeito de se recusar a homologação da transacção. A decisão em crise apresenta-se, deste modo, “conforme” e concordante com a realidade fáctica que nela se considerou. De igual modo, não se afigura existir qualquer erro de julgamento, decorrente do facto de o referido Conselho Directivo se ter, nas palavras da reclamante, limitado a dar “(…) cumprimento e execução às deliberações tomadas em Assembleia de Compartes, nos termos e para os efeitos do disposto no Art. 29º nº 1 al. a) da Lei nº 75/2017.”. É certo que interveio na transacção cuja homologação se requereu o “Conselho Directivo da Comunidade dos Baldios de ..., ...e ...”. Porém, não bastava essa circunstância ou a de que o dito Conselho Directivo actuou em juízo (transigindo) no seguimento de deliberações da assembleia de compartes, para concluir pela validade subjectiva da transacção, uma vez que tal não preteria a necessidade de verificar a validade da sua composição. Sendo que, como decorre da decisão reclamada, essa era, em face da oposição dos autores à homologação da transacção, a questão que se impunha apreciar, que não se resumia a uma simples e mera falta ou insuficiência dos poderes conferidos aos mandatários susceptível de suprimento nos termos do nº 3 do art. 291º do CPC ou mediante a notificação a que se refere o art. 1163º do CC. Em face do exposto, afigura-se-nos, assim, que a decisão reclamada não padece de qualquer erro de julgamento, devendo manter-se. Invoca, ainda, a ré (no que, em parte, parece ser secundada pela interveniente) que a decisão reclamada não ponderou uma eventual suspensão da instância, nos termos do art. 272º do CPC, por existência de causa prejudicial com a pendência daquela acção. De acordo com o disposto no nº 3 do art. 652º do CPC, a reclamação para a conferência tem como objecto único a reapreciação do despacho proferido pelo Relator, o que não permite à (…) Conferência colegial a constituição de decisão sobre matéria que não tenha sido submetida antes à apreciação do Relator (portanto, matéria nova) (…), conforme se escreveu no Ac. STJ de 17.10.2019, proc. nº 255/10.2T2AVR-J.P1-A.S1. Desta forma, não é permitido ao reclamante convocar novos fundamentos ou questões (cfr. neste sentido, entre muitos outros, os Acs. do STJ de 22.11.2018, Revista nº 19920/12.3YYLSB.L1.S1, e de 19.12.2018, Revista nº 20348/15.9T8LSB.P1-A.S1). Assim, uma vez que a questão avançada pela ré se reveste, inequivocamente, de cariz inovatório não deve esta conferência decidir sobre a eventual causa prejudicial. Invoca a interveniente Associação o modo de organização e funcionamento dos órgãos dos baldios e a forma como devem ser repartidas as receitas obtidas pela exploração dos bens que lhe estão afectos. Porém, essa alegação não infirma o que se sustentou no despacho reclamado acerca da influência que a pendência da acção que corre termos sob o nº 349/21.9T8CNF.C1.S1 tem na aferição da regularidade da composição de uma das partes que se apresenta a transigir, qual seja o interveniente “Conselho Directivo dos Baldios de ..., ... e ...”. A propósito da suspensão da instância, sempre se deverá notar que aquela acção 349/21.9T8CNF.C1.S1 terminou em absolvição da instância, o que, como se sabe, não impede a instauração de nova acção tendente à anulação da transacção, o que, comprovam os autos, já foi feito (e está longe do seu termo). Pelo exposto, confirma-se o despacho singular de não homologação da transacção junta. Assim, subsistem para apreciação os recursos das revistas, atrás admitidos, cujas conclusões se alinham de seguida. Recurso normal da Ré E..., S.A.: “1)A Recorrente discorda da decisão proferida pelo Tribunal a quo e entende que ocorreu violação de lei substantiva por erro de interpretação e aplicação do disposto nos Art.s 473º e seguintes do Código Civil respeitantes ao instituto do enriquecimento sem causa; 2) A nossa lei, mormente no Art. 473º do Código Civil, identifica o enriquecimento como uma concreta aquisição injusta e nela não é feita qualquer referência a um incremento patrimonial global, consistindo antes o enriquecimento numa vantagem patrimonial concreta 3) Se atentarmos à factualidade dada como provado no caso em apreço, veremos que o argumento da existência do enriquecimento sem causa improcede na sua base, pois nunca sequer existiu enriquecimento por parte da Recorrente e tão pouco os Autores e o interveniente fizeram prova cabal do mesmo; 4) Primeiramente, os Autores individualmente considerados não têm qualquer direito a indemnização por enriquecimento sem causa pois como ficou decido no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11/12/2014, proferido nestes autos, o qual faz caso julgado formal, aos Autores foi apenas atribuída legitimidade quanto aos pedidos das als A) a L) da Petição Inicial, estando assim excluídos os pedidos P) da Petição Inicial e U) da Réplica respeitantes ao enriquecimento sem causa; 5) Em segundo lugar, quanto ao período de tempo compreendido entre 2006 e 2012 nunca o Interveniente poderia ter direito a qualquer indemnização com base em enriquecimento sem causa uma vez que a Assembleia de Compartes e o Conselho Directivo apenas foram formados em Fevereiro de 2012, pelo que jamais à face da lei o Interveniente poderia ter direito a receber uma quantia referente a um período durante o qual não tinha existência jurídica; 6) Assim, no limite, poderia o tribunal a quo afirmar que, quanto a este período temporal (2006 a 2012), a Recorrente e a Chamada teriam de pagar directamente a cada um dos compartes individualmente e pro rata (que seria em partes iguais pois todos têm direito a usar a totalidade do baldio); 7) Porém, não havendo qualquer recenseamento dos compartes relativo a esse período e não tendo os Autores e Interveniente feito prova da identidade dos compartes a essas datas, nunca tal poderia ser determinado pelo Tribunal a quo; 8) É evidente que a Recorrente, contrariamente ao que entendeu o Tribunal a quo, nunca poderia ter enriquecido no valor das rendas, uma vez que foi ela que as pagou escrupulosamente à Associação Cultural – não existiu qualquer enriquecimento de rendas por parte da Recorrente pois são quantias que saíram da sua esfera patrimonial; 9) Tão pouco enriqueceu a Recorrente com a ocupação do terreno, na acepção de haver um empobrecimento dos compartes por deixarem de poder pastorear gado, recolher matos e lenhas (se é que verdadeiramente ainda o fazem), em pequena parcela do terreno baldio; 10) A compensação das rendas pagas pela Recorrente, das quais os compartes do terreno baldio beneficiaram, e continuam a beneficiar, cobre obviamente o uso pela E..., S.A. para efeitos de exploração do parque eólico e o “não uso”, nessa pequena parcela do baldio, pelos compartes; 11) É perfeitamente visível através dos factos provados nos autos, mormente os factos provados 90 e 103, que não houve enriquecimento da Associação Cultural, nem os Autores e o Interveniente fizeram prova cabal do mesmo; 12) A Associação Cultural usou as rendas que recebeu da Recorrente para beneficiar as três aldeias, para beneficiar todos os compartes; 13) Não está provado qualquer outro uso do dinheiro recebido pela Associação Cultural que não seja para benefício de todos os compartes; 14) Incumbe aos Autores e ao Interveniente a prova da existência do enriquecimento sem causa que alegam – Art. 342º nº 1 do Código Civil; 15) Efectivamente, os Autores e o Interveniente não fizeram a prova de tal enriquecimento sem causa; 16) Resultou provado precisamente o contrário, ou seja, que os compartes das três aldeias beneficiaram das rendas pagas pela Recorrente, por via das várias obras realizadas pela Associação Cultural; 17) Acresce que a existir enriquecimento – contrariamente ao que demonstrou a Recorrente, mas que o Tribunal a quo entendeu existir – ao valor do suposto enriquecimento ter-se-ia sempre que subtrair o cômputo de todos os benefícios que os compartes receberam ao longo dos anos com as várias obras realizadas pela Associação Cultural; 18) Subtracção essa que não é acautelada em parte alguma do Acórdão proferido pelo Tribunal a quo; 19) O cumprimento da decisão proferida pelo Tribunal a quo redundaria no pagamento em dobro aos compartes de tudo quanto já beneficiaram ao longo dos anos pelas várias obras feitas pela Associação Cultural, por via das rendas pagas pela Recorrente, ou seja, tal decisão determina o enriquecimento dos Autores e do Interveniente à custa da Recorrente e da Chamada; 20) A situação que o Tribunal a quo em boa verdade despoleta com a decisão tomada é simplesmente deixar para que em execução de sentença se apure a existência ou não de enriquecimento – prova que cabia aos Autores e ao Interveniente e que estes não lograram fazer – pois basta pensar que, atentos os factos provados 90 e 103, pode dar-se perfeitamente o caso de, em execução de sentença, os Autores e o Interveniente, subtraídos os benefícios que receberam, terem um saldo de zero euros a receber, ou seja, por absurdo, o tribunal de execução determinaria, em contradição com a decisão de mérito proferida pelo tribunal superior, que não havia qualquer enriquecimento; 21) A decisão do tribunal a quo neste ponto é violadora não só da lei substantiva como da lei adjectiva; 22) O tribunal de execução não tem poderes para decidir do mérito da causa nos autos principais e não é esse o fim da acção executiva nos termos e para os efeitos do disposto no Art. 10º nºs 4 e 5 do CPC; 23) Dispõe o Art. 497º do Código Civil que: “A solidariedade de devedores ou credores só existe quando resulte da lei ou da vontade das partes.”; 24) O legislador, ao contrário do que prescreve quanto ao gestor de negócios (Art. 467º do Código Civil), à responsabilidade civil por culpa (Art. 497º do Código Civil) e à responsabilidade pelo risco (Art. 507º do Código Civil), é omisso no que respeita à solidariedade dos “devedores enriquecidos”; 25) Dos presentes autos não consta qualquer vontade das partes quanto à solidariedade invocada; 26) Assim, não se vislumbra, e o tribunal a quo não fundamenta, a que título é solidária a condenação de restituição por enriquecimento sem causa; 27)Devendo, pois, pelo acima exposto, entender-se o contrário, ou seja, na ausência de disposição legal e/ou acordo nesse sentido não poderá haver obrigação solidária da restituição.” Pede, a final, que o acórdão recorrido seja revogado e por outro substituído, julgando o pedido de enriquecimento sem causa improcedente por não provado, e a Recorrente totalmente absolvida do pedido.” Recurso de revista excepcional da Ré E..., S.A.: “1) Pelas razões expostas nestas Alegações, a Recorrente entende que é manifesto estarem em causa na presente acção interesses de particular relevância social, nomeadamente no que concerne à discussão sobre a demolição do parque eólico da 1ª Ré e o abuso de direito dos pedidos formulados pelos Autores e o Interveniente nesse sentido, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do nº 2 do Art. 672º do CPC; 2) É igualmente de admitir o presente recurso de revista excepcional nos termos do Art. 672º nº 1 al. c) do CPC verificando-se estarem cumpridos todos os seus requisitos, incluindo estarem devidamente descritos os aspectos de identidade que determinam a contradição entre o acórdão-recorrido e o acórdão-fundamento (Doc. nº 1), nos termos e para os efeitos do Art. 672º nº 2 al. c) do CPC; 3) A sentença sub judice constitui uma intolerável aceitação de abuso do direito; Senão vejamos, 4) “É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito” (art. 334º do Código Civil); 5) No caso concreto, o abuso do direito manifesta-se na desproporção entre a vantagem do titular e o sacrifício por ele imposto a outrem; 6) A este respeito e num caso perfeitamente idêntico ocorrido com a utilização de um terreno baldio, decidiu exemplarmente como segue o Supremo Tribunal de Justiça (Acórdão de 17 de Maio de 2016): “No caso, sopesando-se todas as circunstâncias e razões acima descritas, parece-nos que a pretensão do autor, de ver restituído o terreno ocupado pela ré, com destruição da obra aí edificada, afronta, de forma flagrante, o princípio da boa-fé e o fim social e económico do direito (de uso e fruição comunitária) exercido sobre tal terreno. Por um lado, foi tardia a reacção, provada, dos compartes do baldio e dos órgãos que os representam, encetada muito depois de concluída a obra realizada pela ré. Se a utilização do terreno baldio assumia uma importância tão fundamental para os compartes que tradicionalmente dele beneficiavam, justificava-se uma atitude mais pronta e veemente de oposição à construção dos depósitos, que impedia essa utilização. Não se compreende que tenham assistido passivamente a tal construção, deixando concluir esse avultado investimento, só depois, anos depois, vindo a alegar a ilegalidade da ocupação. (…) Por outro lado, importa realçar o manifesto interesse da obra para as populações que dela vão beneficiar, obra que se materializou em avultado investimento económico. (…) Pensa-se que no nosso caso ocorre uma tal situação de desequilíbrio: uma evidente legitimidade formal do direito exercido pelo autor, tendo este exercício, porém, como resultado, uma desproporção manifesta e intolerável entre a vantagem obtida, reduzida pelas razões acima referidas e o sacrifício que iria ocasionar, com a destruição da obra, impedindo a satisfação do interesse colectivo que esta visa satisfazer e que se situa num patamar superior.” 7) A fundamentação invocada pelo Tribunal a quo para afastar identidade do caso em apreço com o acórdão-fundamento e a aplicabilidade do abuso do direito não tem qualquer suporte; 8) Dizer, como fazem os Senhores Desembargadores, que estamos perante uma obra de interesse exclusivamente particular sem qualquer vantagem para as populações (das comunidades locais ou do conjunto do país) é estar fora da realidade e ignorar a lei e as regras que regem sob os mais variados pontos de vista e incidência geográfica um dos maiores e mais importantes pilares da nossa vida em sociedade. 9) Pelo contrário são abundantes os factos que demonstram ausência de boa-fé por parte dos Autores ao longo dos anos, com perfeito conhecimento de todo o processo de construção do parque eólico, tendo a reação dos mesmos sido mais que tardia (seis anos após conhecimento público do projecto e cinco anos após a construção do mesmo); 10) A sentença sub judice, a manter-se, iria sancionar uma situação grave de abuso do direito, na forma de desequilíbrio no exercício; 11) O abuso do direito é de conhecimento oficioso; 12) A demolição do parque eólico, com todas as infraestruturas inerentes representa uma imensa destruição de riqueza (produção de electricidade através de uma fonte de energia renovável), com danos para o país, para o município e para os próprios compartes que se vêm privados da sua maior fonte de rendimento; 13) Sendo, assim, manifesta a violação grosseira do disposto no Art. 334º do Código Civil; 14) Sem prejuízo da convolação oficiosa prevista no Art. 672º nº 5 do CPC, sem conceder o acima exposto e por mera cautela de patrocínio, caso o Tribunal ad quem entenda que não se verificam os pressupostos da revista excepcional, poderão V. Exas. Juízes Conselheiros admitir a revista nos termos gerais uma vez que a apreciação por parte do tribunal a quo quanto às questões relativas ao abuso de direito levantadas ex novo nas alegações de recurso da 1ª Ré não configura uma verdadeira situação de “dupla conforme”. 15) Assim, requer-se seja o presente recurso subsidiariamente admitido como de revista (normal) nos termos gerais do Art. 671º nº 1 do CPC, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo nos termos dos Art.s 675º e 676º do CPC. Nestes termos e nos mais de Direito, que V. Exas., Ilustres Conselheiros, doutamente suprirão, deverá o presente Recurso de Revista Excepcional ser admitido por se verificarem cumpridos os requisitos do Art. 672º nº 1 als b) e c) do Código de Processo Civil (ou, por mera cautela, ser admitido o mesmo como Revista normal nos termos do Art. 671º nº 1 do CPC) e, em qualquer caso, o acórdão ora recorrido ser revogado e por outro substituído, no que respeita à restituição do terreno baldio, dando provimento ao presente recurso e consequentemente absolvendo a 1ª Ré por manifesto abuso do direito dos Autores e Interveniente, e a 1ª Ré, aqui Recorrente, como é de direito e de inteira Justiça” Associação Cultural e Recreativa para o Desenvolvimento dos 3 lugares ..., ...e ...”: “1- O presente recurso de revista vem interposto do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, que decidiu julgar improcedente o recurso apresentado pela Recorrente e julgou procedente o recurso apresentado pelos AA., alterando a decisão da 1ª Instância, condenando solidariamente a RÉ E..., S.A. E A ASSOCIAÇÃO CULTURAL, RECREATIVA E PARA O DESENVOLVIMENTO DOS TRÊS LUGARES, ..., ... E ... a restituírem aos Compartes dos baldios os montantes das rendas recebidas ou a receber pela associação, montante esse a quantificar em incidente de liquidação, pelo que é admissível recurso de revista normal nos termos do art. 671º, nº 1 do Código de Processo Civil. 2- Caso se considere não ser admissível recurso de revista normal para todos os segmentos da decisão do acórdão, a título subsidiário, requer que seja admitida revista excepcional nos termos do art. 672º, nº 1, do CPC. 3- As questões fundamentais emergentes do decidido pelo Tribunal a quo que, seja pela sua importância jurídica, seja pela necessidade de assegurar uma melhor aplicação do direito justificam o presente recurso de revista são cinco, a saber: 1.ª As decisões das instâncias padecem de nulidade prevista nas als d) do nº1 do art. 615º CPC? 2.ª É compatível com o direito fundamental à tutela jurisdicional efectiva e com o princípio da igualdade processual um Tribunal não permitir a uma das partes fazer prova de factos essenciais relativamente à legitimidade substantiva da contraparte? 3.ª A Chamada interveio no contrato que foi celebrado com a 1.ª R. como representante dos habitantes dos três lugares, para que na esfera desses se produzissem os respectivos efeitos? 4:ª Estão preenchidos os requisitos do enriquecimento sem causa? 5.ª . Há abuso de direito dos AA/interveniente? 4- Salvo melhor opinião, as questões suscitadas pelo acórdão recorrido assumem as características e dignidade suficientes para serem objecto de revista por parte deste Venerando Supremo Tribunal, estando preenchidos os pressupostos exigidos pelo art. 672º, nº 1 do CPC. 5- Na verdade, a questão de saber se é compatível com o direito fundamental à tutela jurisdicional efectiva e com o princípio da igualdade processual um Tribunal não permitir a uma das partes fazer prova de factos essenciais relativamente à legitimidade substantiva da contraparte justifica a admissibilidade do recurso. 6- O mesmo acontece quanto à questão de saber se a Chamada interveio no contrato que foi celebrado com a 1ª R. como representante dos habitantes dos três lugares (Compartes dos baldios), para que na esfera desses se produzisse os respectivos efeitos, dado que a resposta a esta questão não é simples nem pacífica, existindo polémica doutrinal sobre a mesma, como demonstram os pareceres juntos aos autos. 7- Assim, julga-se estarem preenchidos in casu os pressupostos de que o art. 672º, nº 1 do CPC faz depender a admissibilidade do recurso de revista, devendo este ser admitido e apreciadas e resolvidas as questões de importância fundamental suscitadas pelo acórdão recorrido. 8- Para além de estarem preenchidos os pressupostos do recurso de revista, deverá dizer-se que no entender da recorrente o acórdão posto em crise, por não se ter pronunciado sobre os argumentos invocados pela Chamada/Recorrente no recurso sobre a questão do abuso de direito, incorreu na violação do art. 615º, nº 1, al. d) do C. P. Civil, sendo um dos possíveis fundamentos da revista (art.s 674º, nº 1, 666º do mesmo diploma legal). 9- Assim, o acórdão em recurso padece da nulidade prevista na al. d) do nº 1 do art. 615º do código processo civil, nulidade desde já se argui para os devidos efeitos legais. 10- Acresce que, o acórdão Tribunal da Relação de Coimbra ao entender que o Tribunal de primeira instância não tinha o dever de apreciar na sentença a questão da personalidade e da capacidade judiciárias do Conselho Directivo, violou o direito da Chamada à Tutela Jurisdicional efectiva. 11- Na verdade, a Chamada, na contestação, suscitou a questão da falta de personalidade e de capacidade judiciária do interveniente Conselho Directivo dos Baldios; 12- Para o efeito, alegou no art. 4º da contestação que “ até à presente data não foi realizada assembleia de Compartes, nem foram eleitos os respectivos órgãos directivos dos Compartes” 13- Alegou, ainda, desconhecer que tenha havido uma qualquer convocatória ou edital a anunciar a reunião de assembleia de Compartes, desconhecendo igualmente da eleição de quaisquer órgãos de gestão dos baldios, tendo impugnado qualquer eleição que tenha sido realizada. 14- E, no art. 23 da contestação, impugnou, entre outros, os factos alegados pelos AA. nos art.s 11º e 12º da réplica, ou seja, que o recenseamento dos Compartes tivesse sido efectuado e que os Compartes dos Baldios dos Lugares de ..., ... e ... se tivessem constituído em assembleia em 20 de Fevereiro de 2012. 15- Consequentemente, contrariamente ao referido no douto acórdão quanto a esta questão, a Chamada alegou expressamente no art. 4º da contestação, apresentada em 22 de Fevereiro de 2013 que (…)assim, o pretenso Conselho (…) não tem existência jurídica, de tal modo que carece de personalidade judiciária”, defendendo que o Conselho Directivo não foi validamente constituído, tendo impugnado a eleição do Conselho Directivo dos Baldios dos Lugares de ..., ... e ... 16- É certo que a sentença proferida em 11 de Dezembro de 2013 que indeferiu a intervenção principal activa do Conselho Directivo foi revogada por acórdão da Relação do Porto em 9 de Dezembro de 2014. 17- No entanto, esse acórdão da Relação do Porto tratou única e exclusivamente de uma questão de legitimidade processual. 18- Contudo, a alegação da Chamada suscita a questão da legitimidade substantiva do interveniente Conselho Directivo. 19- Por isso, salvo devido respeito, não faz o menor sentido considerar que pelo facto do acórdão da Relação do Porto em 9 de Dezembro de 2014 ter admitido a intervenção principal espontânea do Conselho Directivo, a Chamada ficasse impedida de produzir prova relativamente à legitimidade substantiva deste órgão. 20- E a Chamada ao alegar o que alegou na contestação, está a exercer o direito de acção consagrado no art. 20º da CRP, direito este que se traduz em levar a sua pretensão ao conhecimento do órgão jurisdicional. 21- Perante esta pretensão da Chamada, o tribunal tinha o dever de pronúncia mediante uma decisão fundamentada, tal como impõe o art. 205º da Constituição da República Portuguesa. 22- Consequentemente, o douto acórdão ao decidir como decidiu, impedindo a Chamada de fazer prova dos factos que alegou quanto à validade da constituição do Conselho Directivo dos Baldios dos Lugares de ..., ... e ..., com os fundamentos acima referidos, violou o direito da Chamada à Tutela Jurisdicional efectiva, enfermando a decisão de inconstitucionalidade por violação do disposto no art. 20º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidade que desde já se invoca. 23- O aresto em recurso também incorreu em erro na aplicação da lei de processo ao concluir que a recorrente estava a agir em nome próprio e, em consequência determinar a ineficácia do contrato em relação aos AA.” 24- Na verdade, recorde-se que a Chamada no art. 30º da contestação alegara “os terrenos dados de arrendamento constituem um baldio que têm vindo a ser administrados pela comunidade dos três lugares e continuam a sê-lo, por intermédio da ora Chamada”. 25- E este facto alegado pela Chamada foi objecto de declaração confessória e que não foi atendida, além de resultar do conteúdo do contrato de arrendamento junto pela 1.ª Ré com a contestação. 26- Ora, do confronto do alegado pela Chamada e das declarações prestadas pelos AA. na audiência de discussão e julgamento, é manifesto que estes confessaram o facto alegado no art. 30º da contestação apresentada pela Chamada, ou seja, os habitantes dos três lugares, Compartes dos baldios, quiseram que fosse a Associação a administrar os baldios em nome dos Compartes. 27- O A. AA confessou no seu depoimento de parte que era a Associação que os representava, tal como resulta do seu depoimento/ declarações de parte do Autor, prestado em audiência, no dia 15 de Novembro de 2017 ( registo magnético 15.08.06 – 15.12:54) quando diz; minuto 00:12:17 AA Sim. Oh senhor Dr. Juiz, se eles não têm nada no deles, eles trabalharam de má-fé. E porquê? Porque eles foram os primeiros que fizeram o contrato com os das eólicas. Quando se soube, eles já o tinham feito, vieram logo aqui à Câmara quando em ... souberam e quiseram saber de nada, nem avisar ninguém. Calaram-se, assinaram o outro contrato, mas não vieram aqui reconhecê-lo à Câmara. Mas há mais dois contratos por fora que os senhores sabem. Mas os senhores pagam dinheiro a eles. 28- E também o próprio presidente da assembleia de Compartes AAA, via legitimidade na Chamada para representar os habitantes dos três lugares, tal como resultou do depoimento no dia 22 de Novembro de 2017 ( registo magnético 16.08.18 – 17.12:51): Senhor Dr. Juiz, desculpe. Mandei-o para ele, como sabia que ele fazia parte da Associação e havia a Associação, seria a Associação e seria, pronto, a coisa de ver isso, porque eu não sabia. Ia mandá-lo para quem? Para este, para aquele, para aquele outro? Não. Não havia mais ninguém, não havia um grupo. O senhor, no fundo, se eu estou a perceber bem, o senhor via alguma legitimidade naquela Associação? Não havia mais ninguém que pudesse representar as pessoas daqueles lugares, portanto o senhor mandou falar com a Associação. Com a Associação. É isso mesmo, senhor Dr. Pronto, é isso. 29- Por outro lado, do próprio contrato resulta que a Chamada celebrou o contrato em representação dos habitantes dos três lugares, e, por isso, no considerando A e B é referido que o terreno baldio está na posse dos três lugares e tem vindo a ser gerido e administrado pela Associação. 30- Deste modo, da conjugação da confissão feita pelos AA. com o contrato junto aos autos, não podia o Tribunal considerar que a Chamada agiu em nome próprio e no seu interesse, tendo-o feito por aplicação errada da lei de processo. 31- O aresto em recurso também incorreu em erro de julgamento ao condenar a Chamada, pela via do enriquecimento sem causa, a restituir aos Compartes dos baldios os montantes das rendas recebidos ou a receber pela associação, montante esse a quantificar em incidente de liquidação. 32- Na verdade não se verificou qualquer enriquecimento da Chamada, pois quem beneficiou dos rendimentos provenientes das rendas foram os habitantes dos três lugares, ou seja, os Compartes. 33- Além disso, não houve qualquer sacrifício económico suportado pelos Compartes, antes pelo contrário, as rendas recebidas serviram para melhoramento a favor das três aldeias (v. facto 90 dado como provado), ou seja, os Compartes beneficiaram com o contrato. Além disso, não ficaram privados da utilização dos terrenos (v. facto 91 dado como provado) 34- Por outro lado, dado que os Compartes possuem a via da responsabilidade civil extracontratual, atendendo a natureza subsidiária do enriquecimento sem causa, não podia o Tribunal condenar a Chamada a devolver as rendas com base neste instituto. 35- Muito menos podia ser condenada à restituição das rendas, pois, na verdade, ainda que se entendesse que se verificou um enriquecimento (que não verificou), esse enriquecimento não foi à custa dos Compartes, mas sim da 1ª R. 36- Em todo o caso, como se sabe, quem invoca o enriquecimento deve alegar e provar o montante do enriquecimento e do empobrecimento, assim como dos demais requisitos. 37- Contudo, nos presentes autos ficou por provar quer o enriquecimento da Chamada, quer o empobrecimento dos Compartes. 38- Assim, tal como resulta da nossa jurisprudência mais autorizada, acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Janeiro de 1993, na coletânea de jurisprudência, Ano I, tomo I, páginas 23 a 26 e no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Maio de 1996, disponível na Coletânea de Jurisprudência Ano IV, Tomo II, páginas 70 a 73, quem invoca o enriquecimento sem causa deve alegar e provar o montante do enriquecimento e do empobrecimento. 39- Ora, por falta de alegação e prova do enriquecimento sem causa, deve a decisão ser revogada e substituída por outra que absolva a Chamada do pedido de enriquecimento sem causa. 40- Por fim, como se disse no recurso interposto para o Tribunal da Relação de Coimbra, admitindo que os AA. teriam algum direito, que não têm, não poderiam ver esse direito reconhecido pelo tribunal, dado que o resultado, in concreto, traduziria uma clara injustiça. 41- Ao decidir como decidiu o douto acórdão recorrido violou, o disposto, entre outros preceitos, nos art.s 154º, nº 1, 608º, nº 2 e 615º, nº1, al. d) e C), 662º, 666º, todos do Código Processo Civil, art.s, 334º, 342º, 352º, 356º, 358º, 362º, e 363º 473º, 474º, e 475º, todos do Código Civil; art.s 5º, 10º, e 11º, da Lei 68/93, de 4 de Setembro art.s 1º, 2º, 3º, 16º, nº 2 , 20º, 26º e 205º da Constituição da República Portuguesa e 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, publicada no Diário da República em 9 de Março de 1978.” Pede, a final, que seja revogado o acórdão recorrido, absolvendo a Chamada dos pedidos contra si formulados. Em face das decissões do despacho do relator e da Formação, as questões a resolver ão as seguintes: - a de saber se o direito de restituição do baldio aos Autores e ao interveniente “Conselho Directivo dos Baldios de ..., ... e ...” foi por estes abusivamente exercido. - a de saber se a Ré e a interveniente “Associação Cultural e Recreativa para o Desenvolvimento dos 3 lugares ..., ... e ...” devem entregar aos Autores e ao interveniente “Conselho Directivo dos Baldios de ..., ... e ...” as retribuições recebidas e a receber pela segunda em virtude do ajuste firmado com a primeira. A matéria de facto fixada pelas instâncias é a seguinte: “1. Na parte superior da freguesia de ..., existem três aldeias, próximas entre si, denominadas ..., ... e .... 2. Subindo para o alto da Serra do ..., em localização superior em altitude, às três aldeias, existe uma área de terreno, genericamente denominada “do ...”. 3. A qual, no seu conjunto, confronta pelo Norte com prédios de particulares que bordejam as três aldeias, dos quais está devidamente separada e demarcada por muros, pelo Nascente com o limite da freguesia de ... e pelo Sul com o limite da freguesia de ... e com alguns prédios particulares, dos quais está devidamente separada e demarcada por muros e, pelo Poente, com o limite da freguesia de ... e com alguns prédios particulares, dos quais está devidamente separada e demarcada por muros. 4. Tal terreno, denominado genericamente de ..., abrange uma área de 155,7298 hectares. A área de terreno referida em 2. a 4. abrange, concretamente, e entre outras, as zonas denominadas ..., ..., ..., ..., ..., ... ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e .... 5. Desde tempo imemorial, pelo menos há mais de 100 anos, que esta área de terreno tem vindo a ser usada, gozada, fruída, possuída e administrada, em comum e de forma comunitária, mas exclusiva, pelas populações moradoras nos três aglomerados de ..., ... e .... 6. Os moradores indiscriminados dos três lugares, desde essa recuada época que assim usam, gozam, fruem, possuem e gerem em comum a dita área, designadamente dela retirando mato, penso, aí levavam e levam todos os seus gados a pastar, incluindo rebanhos comunitários de ovinos e caprinos, nesta região denominados “vigias” e aí efectuavam sementeiras comunitárias de centeio, denominadas “cavadas”, em parcelas que eram seleccionadas, anualmente, por acordo de todos os utentes, aproveitando o melhor possível as apetências naturais dos ditos terrenos, de forma a manter as respectivas características e produtividade. 7. Toda esta actividade humana vem sendo desenvolvida na dita área de terreno, durante todo o referido período, de forma livre, contínua e ininterrupta, à vista de toda a gente e sem qualquer oposição, com exclusão de outrem, e como se todo aquele terreno pertencesse, como pertence, em exclusivo, comunitariamente, aos moradores dos ditos três lugares, para apoio da sua actividade agrícola e sustento próprio e dos animais, estando todas as pessoas que vêm residindo nas faladas aldeias, ao longo dos tempos, absolutamente convictas de que assim exerciam, como exercem, um verdadeiro direito de propriedade comum próprio, sem lesarem quem quer que fosse. 8. Tal uso esmoreceu nos últimos anos, fruto do despovoamento das aldeias, envelhecimento da população e abrandamento da agricultura, mas nunca cessou por completo. 9. Aquando da reorganização das novas matrizes prediais rústicas no concelho de ..., que ocorreu no ano de 1989, grande parte da referida área foi distribuída em termos matriciais por art.s, cuja titularidade foi atribuída a grande parte dos moradores das três aldeias, embora nunca tenha ocorrido qualquer apropriação parcelar dessa área de terreno por pessoas singulares. 10. Os quatro primeiros AA., AA, BB, CC e DD são agricultores e têm as sedes das suas explorações agrícolas no mencionado lugar de ..., vivem em casas de habitação aí existentes, onde têm centradas as suas vidas domésticas, onde habitualmente dormem, tomam as suas refeições e recebem os seus familiares, e em cujas imediações são donos de prédios rústicos, que agricultam. 11. Os ditos quatro AA. foram e são utentes da referida área de terreno, para os fins supramencionados e em comum com os demais residentes das três localidades. 12. Efectivamente, desde data não concretamente apurada que os ditos quatro AA., usam, gozam, fruem, possuem e administram a dita área, em comum entre si e os demais utentes comunitários da mesma e dela retiram mato, penso, aí levam os seus gados a pastar e aí efectuam sementeiras de centeio. 13. Tudo nas circunstâncias de tempo e modo que acima se descreveram para a generalidade dos moradores das três localidades. 14. A 1ª Ré é uma sociedade anónima que tem como objecto a realização e gestão de parques eólicos. 15. TT, marido da 4ª Ré, com quem foi casado em primeiras e únicas núpcias de ambos, sob regime de comunhão geral de bens, faleceu em 30 de Julho de 2008, sem testamento ou outra qualquer disposição de última vontade, deixando a suceder-lhe a mesma 4ª R., seu cônjuge sobrevivo, bem como os cinco filhos do casal e aqui RR., KK, LL, NN, PP e RR, quatro deles casados, cada um de per si, respectivamente, com os demais RR. seus cônjuges. 16. Nem o falecido TT, nem qualquer os 2ºs, 3ºs, 4ºs, 5ºs, 6ºs, 7ºs, 8ºs, 9ºs e 10ª Ré residiu ou reside ou tem sede em ... ou em ... ou em .... 17. Do mesmo modo, não são nem foram utentes da referida área de terreno. 18. Por escrito particular, datado de 22 de Agosto de 2006, os 2ºs RR. EE e mulher, declaram “dar de arrendamento” à 1ª R. E..., S.A., um prédio rústico cuja propriedade aí se arrogaram, descrito nesse documento como sendo em ..., freguesia de ..., concelho de ..., composto de terra de mato, inscrito na matriz respectiva sob o art. nº ...30, constando ainda do referido documento que o prédio tem “a localização constante do desenho na planta anexa à escala 1/25.000 a este contrato, que dele faz parte integrante como Anexo I”. 19. No dizer das partes outorgantes do referido documento, destinava-se o prédio dado “de arrendamento” “à construção e instalação de equipamentos necessários à operação de utilização de energia eólica, à construção das estações necessárias, de comando, de medição e de transformação e seccionamento, à instalação dos anexos necessários, bem como à execução de todos os trabalhos necessários à ligação e operação de instalações eólicas”. 20. O dito escrito particular é omisso quanto à área do prédio dado “de arrendamento”. 21. Para além das demais cláusulas e condições acordadas, na cláusula sexta do documento prevê-se a que a 1ª Ré pagará aos 2ºs RR. o montante de 2000€ na data de assinatura, como contrapartida devida até ao início das obras do parque eólico, bem como o montante anual de 2000€, a partir da data da assinatura do auto de ligação à rede pública. 22. Prestações essas que vêm desde então sendo pagas. 23. Por escrito particular, datado de 22 de Agosto de 2006, os 3ºs RR. GG e mulher, declaram “dar de arrendamento” à 1ª R. E..., S.A., um prédio rústico cuja propriedade aí se arrogaram, descrito nesse documento como sendo em ..., freguesia de ..., concelho de ..., composto de terra de mato, inscrito na matriz respectiva sob o art. nº ...33, constando ainda do referido documento que o prédio tem “a localização constante do desenho na planta anexa à escala 1/25.000 a este contrato, que dele faz parte integrante como Anexo I”. 24. No dizer das partes outorgantes do referido documento, destinava-se o prédio dado “de arrendamento” “à construção e instalação de equipamentos necessários à operação de utilização de energia eólica, à construção das estações necessárias, de comando, de medição e de transformação e seccionamento, à instalação dos anexos necessários, bem como à execução de todos os trabalhos necessários à ligação e operação de instalações eólicas”. 25. O dito escrito particular é omisso quanto à área do prédio dado “de arrendamento”. 26. Para além das demais cláusulas e condições acordadas, na cláusula sexta do documento prevê-se a que a 1ª Ré pagará aos 3ºs RR. o montante de 2000€ na data de assinatura, como contrapartida devida até ao início das obras do parque eólico, bem como o montante anual de 2000€, a partir da data da assinatura do auto de ligação à rede pública. 27. Prestações essas que vêm desde então sendo pagas. 28. Por escrito particular, datado de 22 de Agosto de 2006, a 4ª R. e o seu falecido marido, TT, declaram “dar de arrendamento” à 1ª R. E..., S.A., um prédio rústico cuja propriedade aí se arrogaram, descrito nesse documento como sendo em ..., freguesia de ..., concelho de ..., composto de terra de mato, inscrito na matriz respectiva sob o art. nº ...32, constando ainda do referido documento que o prédio tem “a localização constante do desenho na planta anexa à escala 1/25.000 a este contrato, que dele faz parte integrante como Anexo I”. 29. No dizer das partes outorgantes do referido documento, destinava-se o prédio dado “de arrendamento” “à construção e instalação de equipamentos necessários à operação de utilização de energia eólica, à \ das estações necessárias, de comando, de medição e de transformação e seccionamento, à instalação dos anexos necessários, bem como à execução de todos os trabalhos necessários à ligação e operação de instalações eólicas”. 30. O dito escrito particular é omisso quanto à área do prédio dado “de arrendamento”. 31. Para além das demais cláusulas e condições acordadas, na cláusula sexta do documento prevê-se a que a 1ª Ré pagará aos 3ºs RR. o montante de 2000€ na data de assinatura, como contrapartida devida até ao início das obras do parque eólico, bem como o montante anual de 2000€, a partir da data da assinatura do auto de ligação à rede pública. 32. Prestações essas que vêm desde então sendo pagas. 33. Na certidão matricial do prédio referido em 18., o mesmo consta como tendo a área de 7500m2. 34. Na certidão matricial do prédio referido em 23., o mesmo consta como tendo a área de 3,13ha. 35. Na certidão matricial do prédio referido em 28., o mesmo consta como tendo a área de 1,475ha. 36. A 1ª Ré apresentou junto do Município de ..., pedido de licenciamento de um parque eólico, composto por cinco aerogeradores, posto de seccionamento e acessos, invocando no mesmo que o pretendia implementar “em terrenos arrendados a proprietários particulares, designadamente ao Sr. EE, GG e ao Sr. TT”, numa superfície de 33,68ha, fazendo acompanhar tal pedido dos sobreditos contratos de arrendamento, que apresentou, então, nos serviços de obras da CM de .... 37. A denominação atribuída pela 1ª Ré ao parque eólico que pretendeu construir foi de P.E. de .... 38. Na memória descritiva e justificativa apresentada pela 1ª Ré na C.M. de ... declara a 1ª Ré que “após um enquadramento administrativo, constatou-se que toda a área onde se irá implantar o “Parque Eólico de ...” são terrenos baldios pertencentes a particulares”. 39. De acordo com a planta que então juntou ao processo administrativo de licenciamento municipal do parque eólico, a área de implantação do denominado P.E. de ..., inseria-se integralmente, com respeito aos cinco aerogeradores inicialmente previstos e implantados, na área de terreno referida em 2. a 4. 40. Os prédios referidos em 18., 23. e 28. não têm as áreas nem as localizações que constam das plantas anexas a esses escritos particulares. 41. Nenhum dos aerogeradores ou dos demais elementos, cómodos, equipamentos ou estruturas que compõem o parque eólico, foi implantado nos prédios referidos no ponto anterior ou foi projectado para os mesmos. 42. Todos os 2ºs, 3ºs, 4ª, 5º, 6ºs, 7ºs, 8ºs, 9ºs e 10ª RR., bem como TT, entretanto falecido, sempre souberam que nada possuíam ou detinham fora dos muros delimitativos dos prédios referidos em 18., 23. e 28 e que nenhum direito lhes assistia sobre o terreno onde o parque eólico foi construído. 43. Os legais representantes da 1ª R., os seus funcionários e os autores dos projectos destinados ao licenciamento do parque eólico, sempre souberam que as áreas atribuídas para os três prédios eram inferiores às dimensões projectadas para a implantação do parque eólico. 44. Antes e depois da implantação do parque eólico, tiveram os representantes e funcionários da 1ª Ré múltiplos contactos com vários moradores dos lugares de ..., ...e ..., que os informaram da natureza “baldia” dos terrenos onde o mesmo parque viria a ser implantado. 45. A Direcção Geral dos Recursos Florestais, no parecer por si emitido, datado de 15/09/2006, junto ao processo de licenciamento municipal, refere que a 1ª Ré “deveria obter autorização por parte da Assembleia de Compartes co-gestora dessas áreas baldias”. 46. O processo administrativo do licenciamento do Parque Eólico dito “de ...” foi levado a seu termo, tendo a certa altura sofrido uma alteração, que permitiu a ampliação do mesmo de um número de cinco, para seis aerogeradores, sendo que o último dos mesmos foi projectado para a freguesia de ..., onde veio a ser implantado. 47. Concluído em data não concretamente apurada, o P.E. de ... foi quase integralmente construído e implantado na área referida em 2. a 4., sendo que da área de implantação, estimada em 33,68ha, apenas uma percentagem, não concretamente apurada, se encontra efectivamente ocupada pelo mesmo. 48. Na área mencionada em 2. a 4., foram implantados por conta e sob a direcção da 1ª R., e no interesse desta, cinco aerogeradores, sobre torres metálicas tubulares com cerca de 77m de altura, com hélices de três pás, para produção de energia a partir da força do vento, com a potência de 2000 Kw cada um, implantados no solo em profundidade, por meio de sapatas ou maciços de betão de enormes dimensões. Os cinco aerogeradores foram implantados, concretamente, nos locais com as seguintes denominações: ..., ..., ..., ... e .... 49. Todos os cinco aerogeradores foram interligados entre si por largas estradas com revestimento em “tout-venant”, rasgadas para o efeito, que permitem o acesso a todos eles, e também consentem que cada um dos mesmos seja completamente circundado, acessos esses que permitem a passagem a veículos pesados de grandes dimensões. 50. Todas essas estradas, ligadas entre si em rede, conduzem para o exterior dessa área. 51. As vias existentes entre os vários aerogeradores foram construídas de raiz pela 1ª Ré. 52. As estradas que permitem o acesso de e para o exterior, foram construídas em locais onde já antes existiam caminhos, os quais foram significativamente alargados pela 1ª Ré. 53. Em todas as vias que construiu ou modificou, a 1ª R. rasgou valetas laterais, de dimensões não concretamente apuradas. 54. Todos os aerogeradores estão ligados entre si por cabos eléctricos que comunicam com a rede nacional de energia. 55. Próximo de um dos aerogeradores, construiu a 1ª R. um edifício, em pedra e betão, que consubstancia um posto de seccionamento ou subestação. 56. Também nesse local, colocou a 1ª Ré uma esteira de cabos aéreos, destinados à condução de energia, suportados pelo menos por dois postes metálicos, implantados na área referida em 2. a 4. 57. Na mesma área, foi instalada uma antena metálica de elevada altura. 58. Todas as obras realizadas pela 1ª R. na freguesia de S. Cristóvão de Nogueira, para construção e manutenção do Parque Eólico dito “de ...”, foram-no na área referida em 2. a 4, com excepção do sexto aerogerador, colocado já na freguesia de .... 59. Nos prédios referidos em 18., 23. e 28. não foram realizadas quaisquer obras e nada foi instalado. 60. Todas as obras foram realizadas sem o consentimento dos compartes ou utentes, prestado em assembleia legalmente constituída e convocada para o efeito. 61. Todas as obras foram levadas a cabo por conta e sob iniciativa da 1ª Ré e no interesse desta. 62. Os aerogeradores, o edifício, os postes, a antena e as vias de acesso ocuparam terreno útil de produção de mato, e penso. 63. A 1ª R. colocou cancelas a bloquear as estradas de acesso à área referida em 2. a 4. 64. A 1ª Ré tem auferido rendimentos, de montante não concretamente apurado, da exploração do referido P.E. de .... 65. Os prédios com os art.s matriciais ...30 e ...33 encontram-se perfeitamente delimitados por muros. 66. São os mesmos usados e fruídos pelos RR. que por si e antecessores, aí pastam gados, cortam mato e aproveitam lenha. 67. O que vem sucedendo ao longo de vinte e cinco anos e um dia, 68. Sem que ninguém a isso se oponha, 69. Actuando de forma contínua e consecutiva, por todos sendo considerados seus legítimos e únicos proprietários e como tal agindo. 70. O estudo de impacte ambiental, incluindo o resumo não técnico, foi disponibilizado no Instituto do Ambiente, na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do ... e na Câmara Municipal de ... e o resumo não técnico esteve também disponível na Junta de freguesia de ..., para o que foram afixados anúncios na Câmara de ... e na Junta de .... 71. O projecto, a memória descritiva e justificativa esteve sujeito a prazo de reclamação dos interessados, sem que se tenha registado qualquer reclamação ou objecção, designadamente dos AA. 72. Os trabalhos do P.E. foram demorados, fizeram-se à luz do dia e os operários não se dissimularam. 73. Durante a construção, nunca ninguém, incluindo os AA., levantou qualquer objecção ou disse que se estavam a apropriar do “baldio do ...”. 74. Em meados de 2005, quis a 1ª Ré iniciar a construção de um parque eólico no Concelho de .... 75. Ao iniciar a prospecção dos terrenos para a construção do parque eólico, identificou 3 terrenos, na freguesia de ..., pertencentes a 3 proprietários particulares. 76. Pelo que a primeira R. celebrou com cada um destes proprietários, a saber, EE, GG e TT, os escritos referidos em 18., 23. e 28., tendo sido indicada em cada um deles a matriz predial correcta. 77. A primeira R. deu entrada do pedido de licenciamento do P.E. de ... na CM de ..., instruído com tais escritos. 78. No decorrer das investigações para saber a quem pertenciam as áreas necessárias à construção do parque eólico denominado parque eólico de ..., a 1.ª ré apurou, através do seu técnico que andava no local,BBB, que os terrenos que lhe interessavam para um projecto que inicialmente previa a implantação de 5 aerogeradores (mais tarde passou a 6 aerogeradores), eram terrenos baldios. 79. Ao constatar esse facto, a primeira ré falou com os habitantes das várias aldeias que a informaram que não havia nenhuma Assembleia de Compartes legalmente constituída. 80. Pelo que foi contactar a Junta de Freguesia de ..., na pessoa do seu Presidente, Sr. CCC. 81. O Presidente da Junta de ... confirmou à 1ª R. que não existia nenhuma Assembleia de Compartes legalmente constituída, nem nenhum processo de recenseamento de compartes. 82. E informou a 1ª R. de que a Junta de Freguesia não tinha quaisquer poderes para agir em nome dos baldios. 83. E ainda que, uma vez que os terrenos estavam divididos por matrizes prediais, a Junta de Freguesia não queria intervir neste processo. 84. Todavia, no desenvolvimento das investigações que tinha feito, a primeira R. tomou conhecimento que uma parte dos habitantes se tinham organizado para a criação de uma Associação – a Associação Cultural Recreativa e para o desenvolvimento dos três lugares de ..., ... e ... (doravante, apenas Associação). 85. A 1ª R. contactou então o Sr. UU, Presidente da Associação, que já havia recolhido, em Agosto de 2005, as assinaturas e os elementos identificativos dos três lugares, para a proposta de uma outra empresa de construção de um parque eólico naquele local, tendo então recolhido 55 assinaturas. 86. A 1ª R. iniciou então negociações com a Associação, vindo a celebrar, a 20 de Outubro de 2006, documento particular que apodaram de “contrato de arrendamento para fins industriais”. 87. Através deste documento, a Associação declara ceder à 1ª R. o “terreno comunitário, composto por mato, sito na freguesia de ..., concelho de ..., com as confrontações de Norte com parcelas dos próprios, de Sul e Nascente com limite da freguesia de ... e de Poente com limite da freguesia de ..., localizado entre as cotas 922 e 1009m, conforme o extracto de planta a escala 1/25000 que ora se anexa (…)”. 88. Embora o “contrato” tenha sido celebrado entre a 1ª Ré e a Associação, a 1ª R. estava consciente de que os terrenos em causa poderiam vir a ser administrados por uma Assembleia de Compartes que viesse a ser constituída, conforme expressa menção que fez constar do considerando B do documento. 89. Como contrapartida pela cedência desse terreno, a 1ª Ré acordou em pagar à Associação as seguintes quantias (Cláusula 5ª do “Contrato): “1. A título de compensação pelo presente contrato de arrendamento, a Segunda Outorgante pagará à Primeira Outorgante as seguintes quantias: a) Na data de assinatura do presente contrato, o montante anual de EUR 5.000 (cinco mil euros), como contrapartida do arrendamento do terreno objecto do presente contrato até à assinatura do Auto de Ligação do Parque Eólico à Rede Pública; b) A partir da data da assinatura do Auto de Ligação do Parque Eólico à Rede Pública e até ao termo do presente contrato, a Segunda Outorgante compromete-se a pagar à Primeira Outorgante o montante anual de EUR 20.000 (vinte mil euros). 2. Os montantes das compensações serão indexados anualmente à taxa de inflação prevista pelo INE”. 90. Estes valores têm sido pagos pela 1ª R. e pelo menos parte desse dinheiro tem sido utilizado, desde essa altura, em obras realizadas nas três aldeias. 91. Acresce que os compartes dos baldios não ficaram privados da utilização dos terrenos, nomeadamente para pastorícia, produção de mato, feno e penso, pois apenas uma percentagem não concretamente apurada do terreno foi efectivamente ocupada com os novos acessos, implantação dos aerogeradores e do posto de seccionamento. 92. O projecto foi dado a conhecer às autoridades competentes para o seu licenciamento, nomeadamente Direcção-Geral da Energia e Geologia e Câmara Municipal de ..., tendo sido ainda chamados a pronunciar-se algumas outras entidades e o estudo do impacto ambiental foi publicitado através de anúncios e envio de Resumo Não técnico e de notas da imprensa para o jornal de Notícias, envio de nota de imprensa e do RNT para vários órgãos de comunicação social, envio de ofício circular e RNT às entidades constantes do anexo I, disponibilização, no site do instituto do ambiente do resumo não técnico e de informação genérica acerca do processo de consulta pública. 93. A designação do parque eólico como sendo de ... prende-se com o facto de a intenção inicial da 1.ª ré ter sido a de construir o parque eólico na freguesia de ..., mas a concretização de tal intenção não foi possível, o que levou a alterar a localização do projecto. 94. O documento referido em 86. prevê na Cláusula 6ª que “1. As quantas supra indicadas [pagas a título de compensação] serão objecto de devolução pela Primeira Outorgante, devidamente actualizadas, se, por qualquer motivo, surgir uma qualquer pessoa, estranha a esta, que não a Associação Cultural Recreativa e para o desenvolvimento dos três lugares ..., ...e ..., a reclamar a propriedade ou a posse do terreno objecto do presente contrato. 2. Na eventualidade da situação referida no número um da presente Cláusula, a Segunda Outorgante poderá rescindir o presente contrato sem o pagamento de qualquer indemnização à Primeira Outorgante.” 95. Por escrituras de compra e venda outorgadas no Cartório Notarial de ..., a 25/1/1980, a fls. 86v a 87v, do Livro de Notas para Escrituras diversas nº 19-... e em 27/9/1982, a fls. 15 a 16, do Livro de Notas para Escrituras diversas nº 3-..., TT e respectiva esposa, adquiriram o prédio rústico inscrito na matriz rústica da freguesia de ..., sob o nº ...97 e o prédio rústico inscrito na matriz rústica da mesma freguesia, sob o nº ...96, respectivamente. 96. A tais prédios corresponde actualmente o art. matricial ...32, da freguesia de ..., concelho de .... 97. Os prédios rústicos inscritos na matriz rústica da freguesia de ..., sob o nº ...97 e sob o nº ...96, actual art. matricial ...32, desde pelo menos o ano de 1915, que se encontram inscritos nas respectivas matrizes prediais rústicas. 98. Pelo menos desde essa data que o art. rústico ora em causa, se encontra perfeitamente delimitado por muros. 99. É usado e fruído pelos RR., que por si e seus antecessores, aí pastam gados, cortam matos, aproveitam lenhas, há mais de vinte e trinta anos, 100. Sem ninguém a isso se opor, agindo de boa fé, como se de verdadeiros proprietários se tratassem, tudo sem interrupções, sem oposição de quem quer que seja, com o conhecimento de toda a gente e com a convicção de, assim, se encontrarem no exercício de um direito próprio, agindo como tal e assim sendo considerados. 101. Antes da celebração do documento referido em 86., já uma outra empresa com o mesmo objecto que a 1ª R. – realização e gestão de parques eólicos – contactou os habitantes dos três lugares, ... ... e ..., tendo com eles realizado uma reunião na escola primária com o objectivo de tomarem de arrendamento os terrenos baldios. 102. A Chamada é uma associação cultural, recreativa e para o desenvolvimento rural dos três lugares: ..., ... e .... É uma instituição sem fins lucrativos. É composta por associados, alguns deles residentes nos três lugares. 103. Desde a sua constituição, a Associação já desenvolveu e concluiu várias obras em benefício dos três lugares, ..., ... e .... 104. O acesso ao terreno referido em 2. a 4. continua a poder ser feito, sem qualquer alteração, por um caminho antigo, de carro de bois. 105. Os AA. tiveram conhecimento, em data não concretamente apurada, dos contratos referidos em 18., 23., 28 e 86. 106. Acompanharam igualmente as obras de construção do Parque Eólico de .... 107. A primeira Assembleia de Compartes ocorreu a 19/2/2012, tendo nessa data sido eleitos os seus órgãos representativos. 108. Nessa mesma assembleia foi decidido, por unanimidade, “recorrer a juízo para defesa da posse dos baldios e para pedir uma indemnização contra a pessoa, pessoas ou entidades que ilegalmente o venham ocupando e aproveitando ilegalmente os terrenos e os respectivos proveitos, para o que se dão plenos poderes ao Conselho Directivo, quer para propor acções ou quaisquer meios judiciais, quer para intervir, por qualquer maneira, nas acções ou meios judiciais propostos por Compartes individuais, quer para ratificar quaisquer actos praticados por estes em representação, ainda que inidónea, do universo dos Compartes, sanando qualquer vício de representação ou outro, podendo passar procuração a advogado que represente os Compartes dos Baldios (…)”. 109. O registo nacional de pessoa colectiva do “Conselho Directivo dos Baldios dos Lugares de ..., ... e ...” foi criado a 27/3/2012. 110. A 24/6/2012 foi deliberado, por unanimidade, pelo Conselho Directivo, em votação do ponto 2 da respectiva ordem de trabalhos, “passar procuração com poderes forenses gerais ao Sr. Advogado (…), com poderes de a subestabelecer, para que represente este Conselho Directivo e os Compartes dos Baldios em juízo e para usar de todos os meios judiciais e extrajudiciais ao seu alcance para defesa da posse dos baldios, para restaurar a legalidade com respeito ao uso, gozo e fruição de todos os terrenos baldios pertencentes aos Compartes, para pedir uma indemnização contra a pessoa, pessoas ou entidades que ilegalmente o venham ocupando e aproveitando ilegalmente os terrenos e os respectivos proveitos, quer para propor acções ou quaisquer meios judiciais, quer para intervir, por qualquer maneira, nas acções ou meios judiciais propostos por Compartes individuais, quer para ratificar quaisquer actos praticados por estes em representação, ainda que inidónea, do universo dos Compartes, sanando qualquer vício de representação ou outro, nomeadamente na acção judicial proposta por AA e outros contra E..., S.A. e outros, a qual já corre termos no Tribunal Judicial da comarca de ... sob o nº 90/12.3TBCNF.”. 111. Encontra-se registada a favor de EE, casado com FF, pela Ap. ...88 de 20/2/2015, a aquisição do prédio rústico denominado “...”, com o art. matricial ...30, descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ...94/20150220.” Da questão do abuso do direito (revistas excepcionais da ré E..., S.A. e da chamada Associação Cultural e Recreativa) O acórdão recorrido enfrentou a invocação do abuso do direito (que, inovatoriamente, foi formulada na apelação da Ré) com a seguinte argumentação: “Interpretado o art. 334º do Código Civil com o sentido e o alcance expostos, a propósito do exercício de um direito depois de um período prolongado de inacção por parte do seu titular, é de concluir que o preceito em causa não dá guarida à pretensão dos recorrentes. Com efeito: 1. Em primeiro lugar, nos factos provados, o mais que se colhe, é que os autores pediram a restituição dos terrenos baldios cerca de seis anos após a implantação em tais terrenos do parque eólico. Não há, no entanto, na matéria assente nenhum facto que aponte objectivamente no sentido de que os autores criaram na 1.ª ré a convicção de que não iriam exercer o direito à restituição do terreno baldio e que foi por ter adquirido esta convicção que a 1.ª ré implantou o parque eólico em terrenos baldios. Ao invés, os factos apurados mostram que não há qualquer relação entre a decisão de construir o parque eólico no terreno baldio e o facto de os autores terem proposto a acção decorridos cerca de seis anos após tal construção; 2. Em segundo lugar, a matéria de facto não permite afirmar que a 1.ª ré, ao implantar o parque eólico nos terrenos baldios, agiu com os cuidados e precauções usuais no tráfego jurídico. Ao invés, os factos apurados apontam no sentido de que a 1.ª ré não agiu de boa fé nem com os cuidados usuais no tráfego jurídico. Vejamos. Sabendo que os terrenos que lhe interessavam para o seu projecto eram terrenos baldios, pediu à câmara municipal o licenciamento da obra (construção e implantação do parque eólico) com base em 3 contratos de arrendamento que tinham por objecto terrenos não baldios, apesar de saber que as áreas atribuídas a esses prédios nas plantas anexas aos contratos de arrendamentos não correspondiam à realidade. Isto é, a ré E..., S.A. sabia que o que lhe interessava para o projecto eram terrenos baldios, mas pediu licença para uma obra em terrenos particulares. Quem age assim não age de boa fé, ou, pelo menos, não age com o cuidado com que devia ter agido. Mas a má-fé ou a falta de cuidado não se ficaram por aqui. À margem do processo de licenciamento da obra e procurando obter um título que justificasse a ocupação dos terrenos baldios, celebrou um contrato de arrendamento com a chamada, sabendo, ou não devendo ignorar, que esta não tinha legitimidade para lhe proporcionar o gozo dos terrenos baldios. Conclui-se, assim, que a circunstância de os autores terem pedido a restituição do baldio livre e desocupado cerca de seis anos após a implantação do parque eólico não configura exercício ilegítimo do direito que lhes assistia de pedirem tal restituição. Porém, ainda que se entendesse que a boa fé impunha aos autores que não deixassem passar seis anos para reagirem contra a ocupação do baldio, este entendimento não era válido para os órgãos do baldio. Com efeito, aquando da implantação das obras a assembleia de compartes não estava constituída, nem havia sido eleito o Conselho Directivo. A assembleia de compartes ocorreu em 19/2/2012, tendo nessa data sido eleitos os seus órgãos representativos (ponto nº 107 dos factos provados). Nessa assembleia foi decidido, por unanimidade, “recorrer a juízo para defesa da posse dos baldios e para pedir uma indemnização contra a pessoa, pessoas ou entidades que ilegalmente o venham ocupando e aproveitando ilegalmente os terrenos e os respectivos proveitos, para o que se dão plenos poderes ao Conselho Directivo, quer para propor acções ou quaisquer meios judiciais, quer para intervir, por qualquer maneira, nas acções ou meios judiciais propostos por Compartes individuais, quer para ratificar quaisquer actos praticados por estes em representação, ainda que inidónea, do universo dos Compartes, sanando qualquer vício de representação ou outro, podendo passar procuração a advogado que represente os Compartes dos Baldios (…)” (ponto nº 108 da matéria de facto provada). E a 24/6/2012 foi deliberado, por unanimidade, pelo Conselho Directivo, em votação do ponto 2 da respectiva ordem de trabalhos, “passar procuração com poderes forenses gerais ao Sr. Advogado (…), com poderes de a subestabelecer, para que represente este Conselho Directivo e os Compartes dos Baldios em juízo e para usar de todos os meios judiciais e extrajudiciais ao seu alcance para defesa da posse dos baldios, para restaurar a legalidade com respeito ao uso, gozo e fruição de todos os terrenos baldios pertencentes aos Compartes, para pedir uma indemnização contra a pessoa, pessoas ou entidades que ilegalmente o venham ocupando e aproveitando ilegalmente os terrenos e os respectivos proveitos, quer para propor acções ou quaisquer meios judiciais, quer para intervir, por qualquer maneira, nas acções ou meios judiciais propostos por Compartes individuais, quer para ratificar quaisquer actos praticados por estes em representação, ainda que inidónea, do universo dos Compartes, sanando qualquer vício de representação ou outro, nomeadamente na acção judicial proposta por AA e outros contra E..., S.A. e outros, a qual já corre termos no Tribunal Judicial da comarca de ... sob o nº 90/12.3TBCNF (ponto nº 110 dos factos julgados provados). Esta matéria combinada com o pedido de intervenção do Conselho Directivo dos Baldios na presente acção mostra que os órgãos representativos dos compartes, logo que foram eleitos, reagiram contra a ocupação do terreno baldio pela 1.ª ré. Vejamos de seguida a questão de saber se o pedido de restituição do baldio livre e desocupado configura o exercício de um direito com grave desequilíbrio de prestações. Em primeiro lugar, não tem amparo na matéria de facto provada a alegação de que a demolição do parque eólico irá privar os compartes da sua maior fonte de rendimento. Com efeito, a renda acordada no contrato de arrendamento do terreno baldio é paga à Associação/chamada e não aos compartes. O rendimento é da Associação e não dos compartes. Esta conclusão não é afastada pelo facto de estar provado que parte do dinheiro das rendas tem sido utilizado em obras realizadas nas três aldeias (ponto nº 90 dos factos julgados provados). Em segundo lugar, se é certo que, com a restituição do terreno baldio aos compartes, livre e desocupado, o parque eólico deixará de existir e não haverá, no local, produção de electricidade de fonte renovável, também é certo que este resultado não torna ilícito o exercício do direito dos autores e do interveniente à restituição dos baldios. Na verdade, este resultado é uma consequência normal, uma consequência querida pela ordem jurídica para o exercício de tal direito. Quando alguém ocupar sem título a propriedade de outrem ou fizer nela uma obra sem consentimento do respectivo proprietário, a lei confere ao proprietário o direito de exigir a restituição livre e desocupada da coisa e o direito de exigir que o terreno seja restituído ao seu primitivo estado à custa do autor da obra. É o que resulta dos números 1 e 2 do art. 1311º do CC, aplicável ao direito dos compartes por remissão do art. 1315º, e do disposto no art. 1341º do mesmo diploma. Daí que os autores e o interveniente, ao reagirem contra a ocupação ilícita do terreno baldio e ao pedirem a respectiva restituição, estão a exercer o direito à restituição dentro dos limites consentidos pela lei. De resto, o único meio de tornar efectivo o direito dos compartes ao uso e administração dos terrenos baldios é a restituição do baldio livre e desocupado. Ao invés seria a paralisação do exercício do direito dos autores e do interveniente que criaria uma situação de grave desequilíbrio em seu prejuízo. Na verdade, se se reconhecesse que o exercício do direito era ilegítimo, tal implicaria a manutenção da situação actual. E na situação actual, a ré ocupa o baldio, sem pagar aos compartes, que são titulares do direito de uso e fruição do baldio, qualquer valor pelo uso do baldio. A chamada, que não tem qualquer direito ao uso e fruição do baldio, continuaria a receber da ré E..., S.A. uma renda pelo uso do terreno. Com a manutenção da situação actual, apenas seriam sacrificados os direitos dos compartes. Em terceiro lugar, a criação de riqueza invocada pela ré, para obstar ao exercício do direito dos autores e do interveniente, é uma criação de riqueza, que aproveita a si e é uma criação de riqueza que assenta numa ocupação ilícita de um terreno alheio. Ora, o autor de um facto ilícito não pode prevalecer-se da figura do abuso de direito para manter a situação ilícita constituída com a sua acção com a alegação de que o fim dela importa, para ele, custos e prejuízos. Em quarto lugar, ao ocupar o terreno baldio nas condições em que o ocupou, a 1.ª ré sabia ou não podia ignorar, que o fazia sem título válido. Algumas cláusulas do contrato de arrendamento celebrado com a chamada mostram que a 1.ª ré sabia que corria o risco de ser despejada do terreno baldio e de ser obrigada a demolir as construções que nele implantou.” A argumentação aduzida na revista pela Ré centra-se na invocação de que existe um manifesto desequilíbrio entre a vantagem adveniente, para os Autores, da demolição do parque eólico e o dano que esta condenação comporta para os interesses nacionais e europeus e para os próprios interesses dos compartes, mantendo o entendimento de que aqueles tiveram conhecimento da construção do parque e que a tal reagiram tardiamente. Nos termos do art. 334º do Código Civil, há “abuso de direito quando o titular do direito o exercer de forma a ofender manifestamente os limites da boa-fé, dos bons costumes e do fim social e económico do direito”. Como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Dezembro de 2008, no proc. nº 0B2688, em www.dgsi.pt. “(…) a figura do abuso do direito surge como um modo de adaptar o direito à evolução da vida, servindo como válvula de escape a situações que os limites apertados da lei não contemplam por forma considerada justa pela consciência social, em determinado momento histórico, ou obstando a que, observada a estrutura formal do poder conferido por lei, se excedam manifestamente os limites que devem ser observados, tendo em conta a boa fé e o sentimento de justiça em si mesmo. (…)”. E, pese embora aquele normativo preveja a ilegitimidade do exercício abusivo do direito, “(…) não estabelece ou determina as sanções que lhe devam corresponder, cumprindo achar, de entre as várias soluções possíveis, entre as quais se contam a neutralização ou paralisação do seu exercício ou a competente indemnização, a mais adequada à situação concreta ajuizada (…)” ( Pires de lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, 3.ª edição, pág. 397). As categorias doutrinárias em que se desdobra o abuso do direito e que vêm concretamente suscitadas pela recorrente são a supressio - assim o indica a persistência na invocação da inacção dos Autores - e o exercício em desequilíbrio. Comecemos pela primeira. Em geral, a “(…) supressio e surrectio são tipos do venir contra factum próprio. Traduzem o comportamento contraditório do titular do direito que o vem exercer depois de uma prolongada abstenção. A abstenção prolongada no exercício de um direito pode, em certas circunstâncias, suscitar uma expectativa legítima e razoável de que o seu titular o não irá exercer ou que haja renunciado ao próprio direito, ao exercício de algum dos poderes que o integram ou a certo modo do seu exercício (…)” (Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil, 9ª edição, págs. 279 e 284). Porém, importa enfatizar, como se fez no acórdão recorrido, que não bastará o mero não exercício prolongado do direito. São necessários, além desse, os seguintes requisitos: uma situação de confiança, uma justificação para essa confiança, um investimento de confiança e a imputação da confiança ao não exercente. O quantum do não exercício será determinado pelas circunstâncias do caso: o necessário para convencer um homem normal (cfr. Ac. STJ de 4.11.2021, proc. nº 17431/19.5T8LSB.L1.S1, Ac. STJ de 20.4..2021, proc. nº 7268/18.4T8LSB-A.L1.S1, ambos em www.dgsi.pt). Apreciando o caso vertente, verifica-se a inacção dos Autores - patenteada pela concatenação da factualidade inscrita nos pontos nºs 10 a 13, 71 a 73 e 106 do elenco factual com a data da propositura da acção, em 12.3.2012 - que perdurou por mais de 6 anos. Porém, do elenco factual não resulta qualquer facto do qual emerja que a Ré adquiriu, em virtude daquela inércia, a convicção de que esse direito jamais seria exercido por aqueles e/ou pelos demais compartes e, muito menos, que a edificação das estruturas, edifícios e acessos que integram o parque eólico assentou nessa induzida convicção. Ou dito de outra forma, nada indica que a Ré tenha entendido a inicial abstenção de acção como uma tomada de posição vinculante para o futuro. Por outro lado, da factualidade fixada nos pontos nºs 43 a 45 do elenco factual resulta que a Ré sempre teve conhecimento da índole baldia do “terreno de ...” - onde foram implantados cinco dos seis geradores que compõem o parque eólico por si explorado -, resultando, ainda, dos pontos nºs 6 a 8 do dito elenco que o uso comunitário - para fins de cultivo e de pastoreio - desse espaço, subsistia, ainda que esmorecido, Perante este factualismo, é de considerar, à luz de critérios de razoabilidade e de normalidade social, que inexistiam motivos suficientemente consistentes para que a Ré acreditasse na aparência de que jamais iria ser colocado em causa, por qualquer um dos compartes, a utilização que efectuou de parte do terreno. Deve, assim, concluir-se que a inacção dos Autores não se apresenta como objectivamente idónea à criação de uma legítima expectativa no não exercício do direito de restituição do baldio, não se mostrando, pois, reunidos os requisitos atinentes à formação de uma situação de confiança ou à existência de um investimento na confiança, de que depende o reconhecimento da existência de abuso do direito, na modalidade referida. Tanto basta para desatender a invocação da supressio. Atentemos, então, na segunda modalidade do abuso do direito que é convocada pela Ré. Como acima já se aflorou, o abuso do direito visa garantir o exercício justo do direito, isto é, o exercício em conformidade com os ditames da boa fé e os princípios da segurança, da confiança e do equilíbrio. O exercício em desequilíbrio constitui, no âmbito do abuso do direito, uma categoria residual, ainda que nela se integrem um conjunto extenso de actuações que contradizem esses vectores e que, grosso modo, se caracterizam pelo despropósito entre o exercício do direito e os efeitos que dele derivam. Nesta categoria, usualmente distinguem-se diversas subcategorias, a saber: - o exercício danoso inútil; - o dolo agit qui petit quod statim redditurus est; - a grave desproporção entre o benefício auferido pelo exercente e o sacrifício por ele imposto a outrem (assim, Menezes Cordeiro, Da Boa Fé no Direito Civil, vol. II, Almedina, pág. 853, “ O abuso do direito: estado das questões e perspectivas”, in ROA nº 65, Setembro de 2005 e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de Novembro de 2010, CJSTJ, Ano XVIII, Tomo III, pág. 166.) Esta última variante contempla “(…) o desencadear de poderes-sanção por faltas insignificantes, a actuação de direitos com lesão intolerável de outras pessoas e o exercício jussubjectivo sem consideração por situações especiais (…)”, abarcando a segunda situação “(…) a generalização do princípio que aflora no art. 437º/1; segundo esse princípio, ninguém pode ser obrigado a suportar o exercício de um direito quando o sacrifício implicado afecte gravemente os princípios da boa fé (…). Os exemplos paradigmáticos de actuações deste tipo surgem em Direitos Reais; assim, o proprietário que, com licitude formal, exerce o conteúdo do direito provocando, contudo, danos desconformes aos vizinhos (…)” (Menezes Cordeiro, Da Boa Fé …, págs. 857 e 858), bem como o “(…) exigir demolições custosas para pequenas vantagens (…)” (Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, tomo V, pág. 380; no mesmo sentido, v. ainda o Ac. STJ de 23.4.1998, CJSTJ, VI, tomo II, pág. 52 e o Ac. STJ de 21.3.2013, proferido no proc. nº 660/07.1TVLSB.L1.S1 e acessível em www.dgsi.pt; ver também o Ac. STJ de 29.1.2014, proc. nº 926/07.0TBPRG.P1.S1). O excesso manifesto que, de acordo com o princípio geral vertido no art. 334º do Código Civil, afronta a boa fé e torna ilegítimo o exercício do direito, advém, pois, do cotejo entre a consideração da vantagem auferida pelo titular e a avaliação do sacrifício prático a outrem imposto pelo exercício do direito, do qual deve resultar a intolerável desproporcionalidade entre esses polos, assim evidenciando a contrariedade “ (…) à própria ideia de justiça, intuída como proporção ou justa medida (…)” . (Ac STJ de 24.2.2015, proferido no proc. nº 283/2002.P2.S1 e acessível em www.dgsi.pt). Nessa medida, o desequilíbrio grave deve possibilitar a intervenção correctiva em “(…) soluções que, ainda que legalmente suportadas, se apresentariam em concreto contrárias ao normal sentimento de justiça. Através ou por recurso ao princípio da proporcionalidade o juiz verificará se a aplicação dos instrumentos legais ao caso concreto se detém dentro dos limites necessários e adequados de actuação – através da proporcionalidade verifica se os meios são necessários, adequados e proporcionais aos fins já escolhidos (…)” . ( cfr. o citado Ac STJ de 24.2.2015) Apreciemos a factualidade relevante. Resulta dos pontos de facto nºs 6 a 8 e 11 a 13 do elenco factual que as populações das aldeias de ..., ... e ... e os Autores têm comunitariamente usado - designadamente, para fins de cultivo e de pastoreio e para a recolha de mato - a área de terreno baldio descrita nos pontos nºs 2 a 4 e que esse aproveitamento ainda permanece. São, pois, estes os concretos moldes em que, no caso, tem vindo a ser efectivada a extracção das utilidades propiciadas pelo baldio. Por outro lado, a área de implantação do dito parque eólico ascende a 33,68ha de terreno baldio (tendo este uma área total de 155,7298ha), sendo que, dessa área de implantação, apenas uma porção - não concretamente delimitada - se encontra efectivamente ocupada com acessos, implantação de aerogeradores e posto de seccionamento (cfr. ponto nº 47 e parte final do ponto nº 91, ambos do elenco factual). Assim, e apesar de os aerogeradores, o edifício, os postes, a antena e as vias de acesso que compõem o dito parque eólico ocuparem terreno útil de produção de mato e penso (ponto nº 62), os compartes dos baldios não ficaram nem ficarão privados da utilização que vinham fazendo do terreno, nomeadamente para os designados fins (cfr. primeira parte do ponto nº 91 do elenco factual), não se devendo, aliás, olvidar o progressivo esmorecimento do uso que vinha (e ainda vem) a ser dado ao baldio, “ fruto do despovoamento das aldeias, envelhecimento da população e abrandamento da agricultura” (cfr. ponto nº 8). Deste modo, a demolição da quase integralidade dos equipamentos, acessos e outros bens que compõem o parque eólico não se revelará, efectivamente, indispensável ou imprescindível para repor o uso comunitário que os Autores e os demais compartes (representados pelo interveniente “Conselho Directivo dos Baldios de ..., ... e ...”) têm vindo a fazer do baldio. A exploração do parque eólico ( nos termos em que tem vindo a ser feita) não contende, pois, com o uso colectivo do baldio, não determina a inutilização total do conteúdo do direito de fruição colectiva nos moldes em que, na prática, tem vindo a ser exercido. É certo, também, que- ainda que não se tenha provado quaisquer números- que a demolição do parque eólico - que compreende aerogeradores, edifício de apoio, postes, antena e vias de acesso – implicará custos avultados ( não se sabendo, porém, quanto e qual o impacto na situação financeira da Ré). Porém, e apesar da consideração conjugada de todos estes aspectos, cremos que não se poderá afirmar que a preconizada demolição do parque eólico e daqueles seus componentes se constituirá como uma consequência manifestamente desproporcionada entre, por um lado, a medida do necessário e adequado para a tutela dos legítimos interesses dos Autores e dos demais compartes e, por outro, a medida do sacrifício imposto à Ré. Em primeiro lugar, a vantagem para os AA. não pode ser reduzida à exploração do baldio para fins de pastorícia, produção de mato, feno e penso. Como resulta do art. 3º, nº 1 da Lei nº 75/2017 “os baldios constituem, em regra, logradouro comum dos compartes, designadamente para efeitos de apascentação de gados, de recolha de lenhas e de matos, de culturas e de caça, de produção elétrica e de todas as suas outras atuais e futuras potencialidades económicas, nos termos da lei e dos usos e costumes locais.” (itálico nosso) Assim, a vantagem que o baldio pode proporcionar não pode ser resumida à que resulta da sua aptidão para a pastorícia e para a exploração da floresta, mas àquela que resulta também de outras potencialidades rentáveis (como a produção eléctrica ou, mesmo, a exploração do terreno para energia eólica). Não se pode, por isso, afirmar, com certeza, que, com a exploração do parque eólico, os AA. não ficarão privados de rendimentos futuros significativos. Deste ponto de vista, recuperar perto de 1/5 da área total não é uma “ pequena vantagem”. É evidente que a inércia dos Autores, a falta, à data da edificação do parque eólico, de quaisquer órgãos encarregues da gestão do baldio, a inexistência de um processo de recenseamento de compartes e o facto da falta de poderes da Junta de Freguesia para agir em nome dos baldios (cfr. pontos nºs 79, 81 e 82 do elenco factual) constituem-se como factores mitigadores da responsabilidade que deve àquela ser reconhecida na situação gerada. Cremos, porém, que essas circunstâncias não são de molde a legitimar a permanência da Ré e a justificar a paralisação do direito dos autores à restituição do baldio livre e desocupado.. Assim, o facto de os AA. terem demorado a constituir os órgãos encarregados da gestão do baldio não pode legitimar a ocupação. O AA. não podem ser penalizados por não terem órgãos de gestão para negociar com a Ré, nem podiam prever que iam ser vítimas de actos ilícitos. A Ré conhecia a natureza da área como baldio (pontos nºs 38 e 78) e sabia que devia celebrar contrato com a assembleia de compartes e, por isso, se precaveu no contrato com a chamada Associação Recreativa e Cultural ( pontos nºs 88 e 94). Se a assembleia não existia (e muito menos conselho directivo), então a Ré não devia ter avançado com a ocupação e com a construção do parque eólico. Porém, não se conteve e não hesitou em pedir o licenciamento da obra (construção e implantação do parque eólico) com base em três contratos de arrendamento com os RR, apesar de saber, pelo menos- não ficou provado que soubesse que os RR não tinham qualquer direito sobre o terreno do parque eólico, ponto nº 42- que as áreas atribuídas aos prédios dos RR eram inferiores às dimensões projectadas para a implantação do parque eólico (ponto nº 43). Agiu, portanto, com temeridade, evidenciando algumas cláusulas do contrato de arrendamento celebrado com a Associação que a Ré não desconhecia o risco de ser despejada de terreno baldio e de ser obrigada a demolir as construções que nele implantou (ponto nº 94). A demolição não é, assim, uma consequência completamente imprevista para a Ré, que arriscou a ocupação e a construção, bem sabendo que não estava a contratar com quem de direito. Porém, se a demolição (como consequência) se mostra pesada para a 1ª Ré, também a falta dela e a manutenção da situação se revelam penalizadoras para os compartes. Com a manutenção da situação, os AA., ficando privados de escolher livremente a parte com quem querem contratar, poderão ver-se obrigados a recorrer a uma acção de indemnização naturalmente custosa e demorada, para serem ressarcidos da ocupação. Ora, não parece justo que o prevaricador possa ser recompensado com a manutenção da situação. E não se diga que a decisão judicial não se pode quedar à margem da transcendente importância dos objectivos de transição energética para as “energias limpas” - entre as quais se conta a energia gerada por parques eólicos terrestres - a que o Estado Português se acha adstrito (v. considerando nº (42) da Diretiva (UE) 2018/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho de 11 de Dezembro de 2018 e o disposto na al. a) do seu art. 2º.). Como é óbvio, esse objectivo não pode ser atingido por empresas privadas com atropelo e sacrifício dos direitos dos titulares dos baldios. Em conclusão, não se afigura que os AA. estejam a ultrapassar os limites razoáveis do exercício do direito de restituição do que lhes pertence e , designadamente, que do exercício formal do direito de restituição possa resultar uma desproporção intolerável entre a vantagem obtida pelos compartes ( que, repete-se, não pode ser vista estritamente em função do uso que tem sido dado ao baldio) e o sacrifício ocasionado com a destruição da obra. Nessa medida, deve manter-se o acórdão da Relação, no que respeita à inexistência do abuso de direito. Das retribuições recebidas e a receber (revistas da ré E..., S.A. e da chamada Associação Cultural e Recreativa) A respeito da obrigação de indemnizar a cargo da Ré e da Interveniente, o acórdão recorrido, aduziu a seguinte argumentação: “A instalação do parque eólico nos terrenos baldios constituiu intromissão ilícita e culposa no direito de uso e fruição dos compartes desses baldios. Tal acção constituiu a 1.ª ré na obrigação de indemnizar os lesados pelos danos resultantes dessa intromissão (nº 1 do art. 483º do CC). E perante o que se disse acima, se a 1.ª ré, com essa intromissão, obteve um enriquecimento superior ao dano que causou aos compartes, então é lícito aos autores pedir a restituição da diferença com fundamento no princípio da proibição do enriquecimento sem causa. (…) No caso, a 1.ª ré só terá de restituir, dentro dos limites do seu enriquecimento, o valor do uso do terreno baldio, ou seja, o preço que paga à chamada pelo arrendamento do terreno baldio. Com efeito, uma vez que o arrendamento do terreno baldio que lhe foi dada pela chamada é ineficaz em relação aos compartes, é de concluir que a ocupação do terreno baldio com o parque eólico não tem causa justificativa e é feito à custa dos compartes. (…). Como se escreveu acima, o recurso procede contra a Associação/chamada. Vejamos. Está provado que a 1.ª ré pagou à chamada, aquando da celebração do contrato de arrendamento, a quantia de 5 mil euros e que se obrigou a pagar, a partir da data da assinatura do auto de ligação do parque eólica à rede pública e até ao termo do contrato, o montante anual de 20 000,00 que têm sido pagos à 1.ª ré (pontos nºs 89 e 90 dos factos julgados provados). O recebimento destas importâncias configura, inequivocamente, um enriquecimento da chamada, mais concretamente um aumento do respectivo património. Este aumento não tem causa justificativa e está a ser feito à custa dos compartes. Na verdade, como se escreveu acima, o enriquecimento à custa de outrem, de que fala o nº 1 do art. 473º do Código Civil, não compreende apenas a obtenção de vantagens que tem como correspectivo uma diminuição do património do lesado. Ainda que não haja diminuição do património, há enriquecimento à custa de outrem, quando, de acordo com a ordem jurídica, era a esse outrem que cabia a vantagem. Visto que o terreno que a chamada deu de arrendamento foi o terreno baldio e que, de acordo com a Lei dos baldios, o uso e fruição deles cabe exclusivamente aos compartes (art.s 1º, nº 1 e 5º, nº 1), é de afirmar que a chamada está a receber as rendas à custa de direitos dos compartes. Por outras palavras, a chamada, que não tinha o poder de proporcionar o gozo dos terrenos baldios, está a apropriar-se, sob a forma de rendas, do valor do uso da coisa, valor que cabe, segundo a lei dos baldios, aos compartes. Assim como aquele que dispõe de coisa alheia enriquece com o produto da venda, também o locador de bens alheios enriquece com as rendas que recebe, pois estas, segundo a ordem jurídica competem a quem tem legitimidade para dar de arrendamento. Deste modo deve concluir-se que, ao receber as rendas por ter dado de arrendamento, à 1.ª ré, uma área do terreno baldio, a chamada está a enriquecer-se à custa dos compartes. Em consequência, há fundamento para revogar a sentença na parte em que julgou improcedente o pedido de condenação da chamada a restituir aos autores as rendas recebidas e substituí-la por decisão a condenar a chamada a restituir à autora as rendas que recebeu da 1.ª ré. Condenação que será em regime de solidariedade com a 1.ª ré, visto que ambas enriquecem à custa dos direitos dos compartes. (…)”. A Ré insurge-se contra o assim decidido, sustentando que a lei não contempla qualquer referência a um incremento patrimonial global, que os Autores e o interveniente “Conselho Directivo dos Baldios de ..., ... e ...” carecem, respectivamente, de legitimidade adjectiva e substantiva para receber a indemnização em causa, que nem ela nem a interveniente usufruíram de qualquer enriquecimento, que não houve qualquer empobrecimento dos compartes em virtude da ocupação que protagoniza, que estes, por via da interveniente “Associação Cultural e Recreativa Para o Desenvolvimento dos três Lugares ..., ...e ...”, beneficiam da exploração do parque eólico, que o correspondente valor auferido pelos compartes deveria ser subtraído ao valor do enriquecimento ter-se-ia sempre que subtrair o cômputo (sob pena de se verificar o enriquecimento dos compartes), que a acção executiva não é o momento próprio para decidir o mérito da causa e que a obrigação de restituição não tem índole solidária. A interveniente “Associação Cultural e Recreativa Para o Desenvolvimento dos três Lugares ..., ... e ...” contrapõe, por seu turno, que não beneficiou de qualquer enriquecimento, que as retribuições que lhe foram pagas pela Ré beneficiaram os compartes, que foi preterido o cariz subsidiário do enriquecimento sem causa, que não foi feita prova do enriquecimento ou do correlativo empobrecimento e que a decisão assim proferida configura uma clara injustiça. Vejamos. Não vem questionado que a ocupação pela Ré de uma parte do baldio do “terreno de ...” constitui um acto ilícito. Porém, o certo é que não se identifica no elenco factual qualquer dano indemnizável que seja imputável àquela conduta. Como já se salientou, tal ocupação não importou, para os compartes, qualquer privação de uso do baldio (cfr. ponto nº 91 do elenco factual). Assim, e independentemente do entendimento que se adopte acerca da ressarcibilidade dessa específica categoria de dano, importa concluir que, por falta de reunião de todos os pressupostos de que depende a obrigação de indemnizar (nº 1 do art. 483º do Código Civil), não haveria lugar ao pagamento de uma indemnização nos termos gerais. Mas se assim é importa convocar o instituto do enriquecimento por intervenção. E isto porque a apreciação dos concretos contornos do caso sub judice conforma uma hipótese de enriquecimento por intervenção por intromissão em bens e direitos alheios, que é definível como a “exploração das possibilidades fácticas e jurídicas da coisa, a qual se considera ilegítima, porque o direito que sobre ela incide se encontra atribuído a outrem que não permite essa exploração (…) “ (Menezes Leitão, O enriquecimento sem causa no Direito Civil, Cadernos de Técnica e Ciência Fiscal nº 176, Centro de Estudos Fiscais, pág. 710; cfr. , além do Ac STJ de 23.3,1999 - citado no acórdão recorrido - os Ac. STJ de 26.5. 2009, proc. nº 3313/09.2TBOER.L1.S1 e o Ac. STJ de 22.1.2013, proc. nº 09A0531, acessíveis em www.dgsi.pt). Como escreveu Antunes Varela “(…) os direitos reais e direitos absolutos afins reservam para o respectivo titular o aproveitamento económico dos bens correspondentes, expresso nas vantagens provenientes do seu uso, fruição, consumo ou alienação. Tudo quanto estes bens sejam capazes de render ou produzir pertence, em princípio, de acordo com o conteúdo da destinação ou afectação (Zuweisungsgehalt) de tais direitos, ao respectivo titular. A pessoa que, intrometendo-se nos bens jurídicos alheios, obtém uma vantagem patrimonial, obtém-na à custa do titular do respectivo direito, mesmo que este não estivesse disposto a realizar os actos donde a vantagem procede. A aquisição feita pelo intrometido carece de causa porque, segundo a tal correcta ordenação jurídica dos bens, a vantagem patrimonial alcançada pelo enriquecido pertence a outra pessoa - ao titular do direito. Trata-se de uma vantagem que estava reservada ao titular do direito segundo o conteúdo da destinação desse direito. E a mesma ideia, consideram alguns autores aplicável, quer à titularidade e ao direito de cobrança dos créditos, quer aos direitos pessoais de gozo (…)”. (Das Obrigações em Geral, vol. I, 10.ª edição, Almedina, págs. 491 a 493). O enriquecimento por intervenção constitui-se, assim, como uma categoria autónoma do enriquecimento sem causa que se impõe quando alguém, através de uma ingerência no uso e fruição de bens que não lhe pertencem, obtém, a expensas do seu titular, um enriquecimento carecido de justificação, na medida em que se apropriou de utilidades que a ordem jurídica reservava exclusivamente a este último. Diferentemente do escopo da indemnização - destinada a suprir a perda ou diminuição verificada no património do lesado - a obrigação de restituição assenta no enriquecimento injustificado do interventor e corresponde à situação hipotética do património do enriquecido (cfr. Ac. STJ de 27.9.2022, proc. nº 637/20.1T8PRT.P1.S, em www.dgsi.pt). Deve-se, aliás, “(…) articular devidamente a obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa com a obrigação de indemnização baseada na responsabilidade civil (…)”, pois os “(…) dois institutos podem concorrer na qualificação da mesma situação, principalmente no caso da intromissão em bens ou direitos alheios. Se a intromissão não envolve responsabilidade civil (por ex. porque não há culpa ou não há dano), mas existe enriquecimento sem causa justificativa, o carácter subsidiário da obrigação de restituir nele fundada não impede, como é óbvio, a sua aplicabilidade. (…)” (Pires de Lima e Antunes Varela., Código Civil Anotado, vol. I, 4.ª Edição, pág. 460, Menezes Leitão, ob. cit., pág. 702). Retomemos o caso dos autos, começando pela apreciação da argumentação expendida pela Ré no seu recurso. Parece inquestionável que a ocupação de parte do baldio não se acha legitimada pelo consentimento dos compartes- aos quais, como se viu, a lei outorga, em exclusivo, o direito real de aproveitamento integral das vantagens- aproveitamento que está compreendido no “conteúdo da destinação” do direito e é feito à custa dos titulares de tal direito (Menezes Leitão, ob. cit.., pág. 819). Esse aproveitamento constitui uma vantagem de cariz patrimonial de índole suficientemente “concreta”, atenta a rendibilidade propiciada àquela recorrente pela exploração do parque eólico (v. ponto nº 64 da matéria de facto) . É nessa vantagem que consiste o enriquecimento por ela obtido contra a vontade dos compartes e à custa dos respectivos interesses. E essa vantagem carece de qualquer causa justificativa, já que o contrato de arrendamento descrito nos pontos nºs 86 a 89 do elenco factual - na medida em que não foi subscrito pelos compartes e/ou pelos seus órgãos representativos - não se constitui como uma fonte legitimadora da intromissão no uso e fruição do baldio (v. ponto nº 60). Mostram-se, pois, reunidos os requisitos do enriquecimento por intromissão em bens alheios. Dir-se-á, ainda, que as retribuições pagas à interveniente “Associação Cultural e Recreativa Para o Desenvolvimento dos três Lugares ..., ... e ...” por conta daquele contrato constituem a medida financeira - livremente contratualizada com os outorgantes (cfr. ponto nº 89) - do enriquecimento que, por via do contrato, foi injustificadamente proporcionado à Ré. Por outras palavras: as rendas pagas são a expressão monetária da vantagem patrimonial ilegitimamente auferida pela Ré com o uso do terreno baldio. Assim, o cumprimento pela Ré da obrigação de restituição dos valores das rendas corresponde à reposição da ordenação querida pela ordem jurídica. Nessa medida, é irrelevante que a Ré recorrente tenha vindo a pagar pontualmente essas retribuições à interveniente -.recorrente pois, por um lado, esta carecia de legitimidade substantiva para as receber e, por outro, a eventual boa fé da intrometida na realização desses pagamentos – boa fé que, no caso, não existe - apenas relevaria para efeitos de determinação da medida da obrigação de restituir (cfr. nº 2 do art. 479 º e al. b) do art. 480 º, ambos do Código Civil). Deve-se, por outro lado, assinalar que no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido nestes autos (em que foi revogado o despacho proferido em 1ª instância, que se tinha pronunciado no sentido da ilegitimidade activa dos Autores) os Autores foram declarados como “(…) partes legítimas para a presente acção (…)”, sem contemplar qualquer ressalva quanto a qualquer um dos pedidos por eles formulados. Foi essa a solução dada à questão que lhe foi colocada e que consistia em determinar “(…) se os autores são partes legítimas para a presente acção”. Não se ignora que da fundamentação, consta da “(…) análise dos factos vertidos na petição inicial pelos autores vemos que é fundamento bastante para se dever considerá-los partes legítimas, enquanto compartes singularmente considerados, conjuntamente com o Conselho Directivo relativamente aos pedidos a) a l), sendo que o Conselho Directivo enquanto representante da Assembleia de Compartes é parte legítima para todos os pedidos formulados pelos autores. (…)”. Porém, da interpretação desse trecho da motivação decisória (nº 1 do art. 236º e nº 1 do art. 238º ex vi art. 295º, todos do Código Civil) não se extrai que se tenha denegado, expressa ou implicitamente, a legitimidade adjectiva aos Autores para os demais pedidos formulados, mormente aquele que foi formulado na al. o) do petitório vertido e na al. c) da ampliação do pedido vertida na réplica (cujo acolhimento ora se aprecia). E tanto assim é que esse entendimento não foi reflectido na decisão a final. Resta, assim, concluir que o caso julgado formado por esse aresto não excluiu a legitimidade dos Autores para aquele pedido, o que, de resto, se mostra consonante com a qualidade de compartes que lhes foi reconhecida com a inerente titularidade do direito de baldio. Ainda no que respeita à legitimidade, é certo que, como resulta do ponto nº 107 do elenco dos factos provados, a constituição do Conselho Directivo data de 19 de Fevereiro de 2012. Recorda-se, porém, que a ocupação ilegítima pela Ré, de parte do baldio remonta, pelo menos, a 2006 e que é esse fundamento material da obrigação de restituição, não subsistindo dúvidas acerca do facto de, no período compreendido entre 2006 e 2012, se verificarem já os pressupostos de que depende o reconhecimento do enriquecimento por intromissão no gozo e fruição daquele direito real dos compartes. E, tanto no domínio da lei pré-vigente (als. h) e l) do art. 21º da Lei nº 68/93, de 4 de Setembro) como na actual legislação (als. h) e l) do art. 29º da Lei nº 75/2017, de 17 de Agosto), é ao conselho directivo que cabe representar os compartes em juízo e fora dele. Desse modo, em virtude de o direito ao cumprimento da obrigação de restituição já existir na esfera dos compartes (excluindo-se os Autores) à data da constituição do interveniente “Conselho Directivo dos Baldios de ..., ... e ...”, o facto de o Conselho Directivo ter sido instituído apenas em 2012 não obsta a que se reconheça aos demais compartes o direito, no segmento referente ao período em causa. Importa não olvidar que o “Conselho Directivo dos Baldios de ..., ... e ...” litiga na qualidade de representante dos restantes compartes em juízo e não em nome próprio, pelo que carece de sentido a argumentação atinente à sua “existência jurídica”. A solução oposta equivaleria, aliás, a que, com referência a esse período (entre 2006 e 2012), se desconsiderasse a materialidade subjacente, permitindo que ficasse por sancionar um período sensivelmente longo de intromissão num direito alheio, ao mesmo tempo que se propiciaria que apenas os Autores (que se apresentaram individualmente) pudessem receber, na sua totalidade, as retribuições respeitantes a esse período. Por outro lado, dos factos provados não resulta que os habitantes das aldeias de ..., ... e ... sejam, simultaneamente, compartes nem que as obras realizadas nesses lugares pela interveniente “Associação Cultural e Recreativa Para o Desenvolvimento dos três Lugares ..., ... e ...” com parte (e não com a totalidade) dos montantes pagos pela Ré ( cfr. Pontos nºs 90 e 103), tenham contribuído, concretamente, para a consecução de qualquer uma das finalidades a que se destinam as receitas obtidas pela exploração dos baldios (cfr. o disposto no nº 1 do art. 14º da Lei nº 75/2017 de 17 .8). Assim, não se pode concluir que a realização de tais obras represente, para os compartes (legítimos credores daquelas rendas) uma prestação que, ainda que efectuada por intermédio da recorrente Associação Cultural e Recreativa, tenha beneficiado os titulares do direito à exploração do baldio e que os haja compensado pela utilização de parte deste. Tratam-se, pois, de factos desprovidos de relevância para o afastamento da obrigação de restituir ou, sequer, para a sua delimitação quantitativa. E, assim sendo, fica por demonstrar a existência do alegado “duplo enriquecimento” dos Autores e demais compartes. Importa sublinhar que a condenação ilíquida contida no acórdão recorrida não cometeu à acção executiva ou ao tribunal que a tramitará a decisão sobre a “existência do enriquecimento”. É que o acertamento de que esse enriquecimento por intromissão se verifica consta do próprio acórdão recorrido, importando, unicamente, em sede de incidente de liquidação, determinar o quantitativo das rendas e respectivas actualizações que foram e irão ser percebidas pela interveniente. Nessa sede, não haverá, à luz do que se expôs, quantificar e/ou subtrair os benefícios auferidos pelos compartes. Do que ficou exposto resulta, assim, a improcedência dos argumentos contidos nas conclusões 1) a 22) do recurso da Ré. Relativamente à conclusão 26) deve-se notar que, de harmonia com o art. 513º do Código Civil, a solidariedade entre devedores ou entre credores constitui, no Direito Civil, um regime excepcional que apenas pode resultar directamente da lei (solidariedade legal) ou da vontade das partes (solidariedade convencional). No caso, não é apontada qualquer disposição contratual ou norma que fundamente a condenação solidária da Ré e da interveniente, não se divisando que o disposto no nº 1 do art. 497º do Código Civil, atentas as assinaladas diferenças entre a obrigação de indemnizar e a obrigação de restituir, seja aqui aplicável. Deve, por isso, ser suprimida a menção à condenação solidária no cumprimento, repondo-se a vigência do regime regra da conjunção no que toca à contitularidade da referida obrigação plural. Atentemos agora no recurso da interveniente “Associação Cultural e Recreativa Para o Desenvolvimento dos três Lugares..., ... e ...”. Na esteira do que acima se assinalou, a análise dos factos provados permite considerar que, efectivamente, ocorreu o enriquecimento da interveniente. Com efeito, apesar de não ter legitimidade substancial para tanto, a “Associação Cultural e Recreativa Para o Desenvolvimento dos três Lugares ..., ...e ...” ajustou com a Ré recorrente um contrato de arrendamento que teve como objecto material uma parte de um terreno baldio, recebendo da Ré as correspondentes rendas. É, assim, inequívoco que, mediante a cedência de uso de um bem em relação ao qual é absolutamente alheia, a dita Associação obteve uma vantagem patrimonial à custa dos compartes, que são os únicos a quem lei atribui o direito de uso e fruição das utilidades directa ou indirectamente propiciadas pelo “baldio do ...”. Não tem, por isso, cabimento sustentar que o enriquecimento auferido pela interveniente “Associação Cultural e Recreativa Para o Desenvolvimento dos três Lugares ..., ... e ...” se deu unicamente à custa da Ré recorrente. O enriquecimento deu-se e está a dar-se com as rendas que a interveniente injustificadamente recebe(u) com base na locação de um bem que pertencente aos compartes. Estão, assim, reunidos os requisitos do enriquecimento por intromissão, de que acima demos conta, o qual, como se notou, pode ser também reportado à cobrança de direitos de crédito. Como se aflorou, a medida desse enriquecimento foi, pelas próprias recorrentes, estabelecido no contrato de arrendamento que entre si firmaram. O valor das retribuições que têm vindo a ser praticadas constitui a medida de um e de outro enriquecimento. Já antes se expuseram as razões pelas quais os factos vertidos nos pontos nºs 90 e 103 do elenco de facto são desprovidos de efectiva relevância para o afastamento ou delimitação da obrigação de restituir que impende sobre as recorrentes. Além disso, o facto vertido no ponto nº 91 não tem a aptidão de excluir o cumprimento daquela obrigação. Como se teve já o ensejo de referir, o que é determinante não é, neste âmbito, a concreta utilização que é preterida (devendo-se, de resto, recordar que aquele facto não se reporta, como é claro, aos terrenos efectivamente ocupados pelo parque eólico), mas a intromissão nos poderes de uso e fruição que se acham legal e exclusivamente conferidos aos compartes. Reitere-se, ainda, que a consideração da concreta configuração do objecto da presente causa arreda, nos moldes acima traçados, a pertinência da argumentação alicerçada no cariz subsidiário do enriquecimento sem causa. Por outras palavras: não se identificando um concreto dano a ressarcir, o recurso ao instituto do enriquecimento sem causa não é afastável pelo cariz subsidiário deste. Não se mostram violados os preceitos internacionais, constitucionais e legais citados pela recorrente ou quaisquer outros. Improcede, pois, o recurso da interveniente “Associação Cultural e Recreativa Para o Desenvolvimento dos três Lugares ..., ... e ...”. Pelo exposto, acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça em: 1- negar as revistas (excepcionais) da Ré “E..., S.A.” e da interveniente “Associação Cultural e Recreativa Para o Desenvolvimento dos três Lugares ..., ... e ...” e confirmar o acórdão recorrido no que respeita à restituição do terreno baldio; 2- negar a revista normal da interveniente Associação Cultural e Recreativa e confirmar o acórdão recorrido no ponto 3, al. b) do seu dispositivo, na parte em que a condena a restituir aos compartes dos baldios os montantes das rendas recebidos ou a receber pela Associação, montante esse a quantificar em incidente de liquidação; 3- conceder parcialmente a revista da ré E..., S.A., revogar o acórdão na parte em que condena solidariamente a ré E..., S.A. e a interveniente Associação Cultural e Recreativa, substituindo-a por decisão que condena a Ré e a interveniente a restituírem aos compartes dos baldios os montantes das rendas recebidos ou a receber pela Associação, montante esse a quantificar em incidente de liquidação. Os recorridos e a recorrente Associação mostram-se isentos de custas (art. 4º, nº 1, al. x) do RCP) Atendendo a que a revista da Ré E..., S.A. logra parcial provimento, fixa-se a responsabilidade desta pelas custas do respectivo recurso em 7/8. * Lisboa, 11 de Março de 2025 António Magalhães (Relator) Jorge Leal Nelson Borges Carneiro |