Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1947/12.7TVLSB.L2.S1
Nº Convencional: 6. ª SECÇÃO
Relator: LUIS ESPIRITO SANTO
Descritores: PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
MATÉRIA DE FACTO
DUPLA CONFORME
REVISTA EXCEPCIONAL
EXTEMPORANEIDADE
ARGUIÇÃO DE NULIDADES
CONSTITUIÇÃO
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
RECURSO DE REVISTA
DESCARACTERIZAÇÃO DA DUPLA CONFORME
INCONSTITUCIONALIDADE
PRESSUPOSTOS
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
DIREITO AO RECURSO
TUTELA JURISDICIONAL EFETIVA
Data do Acordão: 05/27/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: RECLAMAÇÃO INDEFERIDA
Sumário :
I – Retirando-se das alegações apresentadas em sede de recurso de revista unicamente a (legítima) discordância dos recorrentes relativamente ao juízo de facto autónomo extraído pelo Tribunal da Relação, desenvolvidamente fundamentado no acórdão recorrido e que seguiu de muito perto o decidido em 1ª instância, trata-se de matéria que não se integra na competência deste Supremo Tribunal de Justiça, conforme resulta do disposto nos artigos 674º, nº 3, e 682º, nº 2, do Código de Processo Civil, para além da irrecorribilidade imposta no artigo 662º, nº 4, do mesmo diploma legal.

II – A mera invocação de nulidades decisórias não prejudica a existência de dupla conformidade, não sendo idónea para afastar o disposto no artigo 671º, nº 3, do Código de Processo Civil.

III - A notificação efectuada nos termos e para os efeitos do artigo 655º, nº 1, do Código Processo Civil não serve para os recorrentes terem a oportunidade de alterar o tipo de recurso pelo qual optaram, fazendo-o ex novo ao sabor das observações jurídicas que lhe foram transmitidas nesse despacho judicial, o qual se destinava unicamente ao exercício do contraditório nos termos do artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil, relativamente à pré-anunciada inadmissibilidade da sua revista.

IV – Podendo os recorrentes haver interposto revista excepcional nos termos do artigo 672º do Código de Processo Civil, o que não fizeram, tal só pode entender-se como convencimento quanto à suficiência e suporte legal da interposição da revista normal, arcando aqueles por isso com o ónus da deficiente estratégia processual que adoptaram, para além de que tal interposição da revista excepcional realizada nestas circunstâncias terá necessariamente de considerar-se extemporânea (o prazo para o efeito – relativo à revista excepcional - encontrava-se nessa altura precludido).

V - Sem prejuízo da afirmação dogmática do princípio da igualdade de tratamento das partes na contenda judicial e da protecção do direito de acção (salvaguardado pelo imperativo da tutela jurisdicional efectiva), postulados essenciais e imprescindíveis para a existência de um processo justo e equitativo, importa tomar em consideração o amplo poder de modelação e conformação do sistema processual que a Constituição da República Portuguesa confere ao legislador ordinário na escolha das soluções concretas concernentes à tramitação do processo e que, sem nunca ofender ou afectar, no plano substantivo, aqueles princípios, sejam idóneas a promover uma acção judicial célere, tramitada de forma expedita e verdadeiramente funcional, com eficaz gestão dos meios disponíveis, desenvolvida em termos racionais e sustentáveis, permitindo obter uma decisão final em tempo útil e razoável.

VI – A limitação do direito ao recurso em função da hierarquia existentes entre as diversas instâncias, através do estabelecimento de um sistema de alçadas, bem como a reserva ou selecção de competências relativamente a determinada categoria de actos (designadamente as questões puramente processuais), não é susceptível de configurar qualquer tipo de negação do acesso à justiça que colida e afronte os princípios basilares de um Estado de Direito, em termos do respeito e garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais, prescrito no artigo 2º da Constituição da República Portuguesa, desde que do funcionamento prático dessa concreta estrutura recursória, antecipadamente conhecida e vigente, não venha a resultar qualquer situação de arbítrio, tratamento discriminatório ou casuístico que ofenda, nessas anómalas circunstâncias, a equidade e a efectividade da própria tutela jurisdicional.

VII - Em suma, face à constituição de dupla conforme nos termos do artigo 671º, nº 3, do Código de Processo Civil e à não interposição (atempada) de revista excepcional nos termos do artigo 672º do Código de Processo Civil, não há lugar ao conhecimento do objecto do recurso, o qual se julga findo nos termos dos artigos 652º, nº 1, alínea b) e 679º do Código de Processo Civil.

Decisão Texto Integral:
Acordam, em Conferência, os Juízes do Supremo Tribunal de Justiça (6ª Sessão - Cível).

Foi proferida a seguinte decisão singular:

“AA e marido, BB, CC, DD, EE, FF e GG instauraram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra HH e mulher, II, Par – co-Participações Comerciais, Limitada, JJ, KK, Caixa Geral de Depósitos, S.A., LL, O..., S.A.) e Leopor - Imobiliária, S.A., LP..., S.A.

Essencialmente alegaram:

Sendo a 1ª co-Autora (MM), NN e OO, arrendatárias do prédio em causa, viram ser-lhes reconhecido o direito legal de preferirem na venda de dois terços indivisos do mesmo, na acção judicial que - em 29 de Maio de 2001 - intentaram para o efeito (Processo nº ..., da ...ª Vara Cível de ...,...ª Secção), por decisão aí transitada em julgado em 30 de Janeiro de 2012.

Tendo apenas demandado na dita acção PP, os aqui 1ºs co-Réus (HH e mulher, II) e B..., Lda. (depois ali substituída pela pessoa dos seus dois sócios, aqui 2ª co-Ré e 3º co-Réu), e tendo os mesmos procedido, na pendência de tais autos, à constituição do prédio em propriedade horizontal, e a posteriores alienações, permutas, aquisições e onerações do mesmo, juntamente com os demais aqui Réus, viram-se obrigados a intentarem os presentes autos, a fim de verem reconhecido por todos eles o seu direito de propriedade, a ineficácia de todos os actos praticados desde a violação do seu direito legal de preferência, bem como o cancelamento dos desconformes registos.

A 2ª co-Ré (Par - co-Participações Comerciais, Limitada), o 3º co-Réu (JJ), a 4ª Ré (KK), a 6ª Ré (LL), a 8ª co-Ré (Leopor – Imobiliária, Lda.) e a 9ª co-Ré (LP..., S.A.) procederam às ditas alienações, aquisições, permutas e onerações conhecendo o direito legal de preferências que lhes assistia, a respectiva violação, e a pendência da acção judicial com vista ao seu reconhecimento, fazendo-o precisamente para impedirem a substituição dos adquirentes por eles próprios, preferentes, caso aqueles obtivessem ganho de causa.

Defenderam, por isso, que, operando o reconhecimento do direito legal de preferência ex tunc, todos os actos praticados pelos Réus seriam ineficazes quanto a si, devendo ser cancelados os respectivos registos.

Assistindo-lhes ainda o direito de serem indemnizados por todos os prejuízos por eles causados, nomeadamente os custos e as despesas exigidos pela pendência das duas acções judiciais (a pretérita, de preferência, e esta), computando os danos patrimoniais em € 31.651,18, e fazendo equivaler o desgaste físico e o sofrimento por si sofrido à quantia de € 25.000,00.

Tendo NN falecido em 08 de Abril de 2012, deixou em legado à 1ª co-Autora (MM), por testamento público, os direitos que lhe adviessem da acção de preferência em que ela própria foi parte, exercendo-os por isso aquela nestes autos.

Concluem pedindo que que seja declarado o seu direito de propriedade sobre dois terços indivisos do prédio urbano sito na Travessa ..., nº ..., freguesia da ..., concelho de ..., por ter sido judicialmente reconhecido o seu direito legal de preferência sobre ele, atenta a respectiva qualidade de seus arrendatários, ou de sucessores de seus arrendatários; que sejam declarados ineficazes, quer a posterior escritura de constituição do imóvel em propriedade horizontal, quer os subsequentes actos de alienação, aquisição e oneração das suas fracções autónomas, praticados pelos diversos Réus - que discriminaram -, e ordenado o cancelamento dos respectivos registos prediais.

- a título subsidiário (prevenindo a hipótese de se considerar válida a escritura pública de constituição do imóvel em propriedade horizontal) - que seja declarado o seu direito de propriedade sobre as fracções autónomas designada pelas letras «A» (correspondente ao ... direito), «B» (correspondente ao ... esquerdo), «C» (correspondente ao ...) e «E» (correspondente ao ...), que entendem corresponder aos prévios dois terços indivisos do prédio que lhes pertenceriam;

- a título cumulativo (com os pedidos - principais e subsidiário - referidos antes) – sejam os Réus condenados a indemnizá-los dos prejuízos (patrimoniais e não patrimoniais) causados com o não reconhecimento oportuno do direito de propriedade aqui invocado (computando posteriormente os primeiros em € 31.651,18, e os segundos em € 25.000,00, na sequência de um despacho de aperfeiçoamento).

Citados todos os Réus vieram contestar a acção, à excepção dos 1ºs co-Réus (HH e mulher, II).

A 2ª co-Ré (Par - co-Participações Comerciais, Limitada), o 3º co-Réu (JJ), a 8ª co-Ré (Leopor – Imobiliária, Lda.) e a 9ª co-Ré (LP..., S.A.), fizeram-no conjuntamente, alegando essencialmente:

Não poderem os Autores beneficiar da alegada transmissão dos direitos de preferência antes titulados por OO e por NN, já que: relativamente ao primeiro, não obstante os sucessores de OO tenham sido habilitados no decurso da anterior acção de preferência (intentada para o seu reconhecimento), não beneficiaram simultaneamente da transmissão do seu direito de arrendamento (onde precisamente radicava o seu direito legal de preferência), que por isso caducou com a sua morte.

Relativamente ao segundo, de NN, o art. 420º do Código Civil interdita expressamente a transmissão - em vida e por morte - do direito de preferência, excepto convenção em contrário, que não existiu (nem quanto a ela, nem também quanto a OO).

Mais alegaram a 2ª co-Ré (Par - co-Participações Comerciais, Limitada), o 3º co-Réu (JJ), a 8ª co-Ré (Leopor – Imobiliária, Lda.) e a 9ª co-Ré (LP..., S.A.) ser a pretensão dos Autores inoponível a qualquer dos Réus, já que: quanto à 4ª Ré (KK) e à 6ª (LL), tendo as respectivas escrituras públicas de aquisição sido escrituradas há mais de dez anos, e estando ambas de boa fé, teriam adquirido as suas fracções por usucapião, nos termos do art. 1294º, al. a) do C.C.; e quanto a eles próprios, encontrar-se-ia caduco o direito dos Autores, nomeadamente por já terem decorrido cinco anos sobre a data dos registos que os beneficiam, inexistindo ainda melhor posse do que a sua (titulada, registada e de boa fé).

Relativamente ao pedido de indemnização civil deduzido pelos Autores, a 2ª co-Ré (Par - co-Participações Comerciais, Limitada), o 3º co-Réu (JJ), a 8ª co-Ré (Leopor – Imobiliária, Lda.) e a 9ª co-Ré (LP..., S.A.), para além de impugnarem todos os danos invocados, alegaram não terem violado o direito legal de preferência daqueles, sendo ainda exclusivamente imputável aos Autores a eventual demora na decisão da anterior acção de preferência, em cujo âmbito deveriam ter reclamado o pagamento das despesas suportadas (como custas de parte), não podendo fazê-lo agora aqui.

A 2ª co-Ré (Par - co-Participações Comerciais, Limitada), o 3º co-Réu (JJ), a 8ª co-Ré (Leopor – Imobiliária, Lda.) e a 9ª co-Ré (LP..., S.A.) ainda impugnaram, como falsa, a generalidade da matéria alegada pelos Autores, aceitando o teor do Processo nº ..., da ...ª Vara Cível de ..., ...ª Secção.

Por fim, a 2ª co-Ré (Par - co-Participações Comerciais, Limitada), o 3º co-Réu (JJ), a 8ª co-Ré (Leopor – Imobiliária, Lda.) e a 9ª co-Ré (LP..., S.A.) defenderam terem os Autores alegado factos cuja falta de fundamento não podiam ignorar, impetrando a esse título a sua condenação como litigantes de má fé, em multa e indemnização, nesta incluindo os honorários do seu Ilustre Mandatário.

Concluem pedindo que a acção seja julgada improcedente, sendo eles próprios absolvidos do pedido; e que os Autores condenados como litigantes de má fé, em multa e numa indemnização, incluindo os honorários do seu Ilustre Mandatário.

A 4ª Ré (KK), contestando, fê-lo pedindo que a acção fosse julgada improcedente.

Alegou para o efeito:

O direito dos Autores já caducou, uma vez que teriam sabido da aquisição da respectiva fracção autónoma, pelo menos, em 7 de Novembro de 2002 (com o registo provisório da anterior acção de preferência que intentaram), tendo desde então um prazo de seis meses para requererem a sua intervenção naqueles autos, nos termos do artigo 1410º do Código Civil, o que porém só fizeram cerca de cinco anos depois, sendo-lhe por isso indeferida.

Mercê daqueles mesmos factos, actuariam os Autores nestes autos com manifesto abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.

Tendo procedido ao registo da aquisição da sua fracção autónoma em 21 de Fevereiro de 2002, e desconhecendo à data qualquer direito de preferência dos Autores (nomeadamente, por os mesmos não terem feito registar desde logo a acção judicial intentada para o seu reconhecimento), o mesmo ser-lhe-ia inoponível, já que ela própria beneficiaria da tutela concedida ao terceiro de boa fé pelo art. 291º do C.C., previsto para os negócios nulos ou anulados mas aqui aplicável por maioria de razão.

Por fim, e relativamente ao pedido de indemnização civil deduzido pelos Autores, alegou não ter sido parte na anterior acção de preferência, por eles intentada, não lhe sendo por isso oponíveis as eventuais despesas exigidas por ela; e não ser também da sua responsabilidade a necessidade dos Autores intentarem estes autos, dado que em nada contribuíu para eles.

A 5ª Ré (Caixa Geral de Depósitos, S.A.), contestando, pediu que a acção fosse julgada totalmente improcedente, sendo ela própria absolvida do pedido.

Alegou para o efeito que, não tendo sido parte na anterior acção de preferência (Processo nº ..., da ...ª Vara Cível de ..., ...ª Secção), não lhe seria oponível nem a factualidade aí provada, nem o aí decidido, tudo impugnando.

Tendo realizado empréstimos à aqui 4ª Ré (KK) e à aqui 6ª Ré (LL), para a aquisição, por cada uma delas, de uma fracção autónoma no prédio em causa, e constituído conformes hipotecas para garantia dos seus créditos, fê-lo apenas por desconhecer a existência de qualquer direito legal de preferência dos Autores, ou a pendência da acção judicial tendente a reconhecê-lo, que à data não se mostrava registada.

Não pode a 1ª co-Autora (AA) beneficiar do direito de preferência antes titulado por NN, uma vez que, nos termos do art. 420º do Código Civil, o mesmo não seria transmissível mortis causa.

Por fim, defendeu que, mesmo que assistisse aos Autores o direito por eles invocado, sempre lhe seria o mesmo inoponível, uma vez que: as aquisições de propriedade da 4ª Ré (KK) e da 6ª Ré (LL), bem como as hipotecas por si constituídas quanto a elas, estariam registadas há mais de três anos, face ao eventual registo desta acção, beneficiando por isso ela própria da protecção conferida pelo art. 291º do C.C. ao terceiro de boa fé (em caso de declaração de nulidade, ou anulação de acto, aqui extensível à declaração de ineficácia de negócio jurídico); e os Autores actuariam em manifesto abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium, já que, tendo conhecimento das aquisições da 4ª Ré (KK) e da 6ª Ré (LL) desde, pelo menos, 7 de Novembro de 2002 - com o registo provisório da pretérita acção de preferência - , não as impugnaram até hoje, fazendo-a nomeadamente intervir naqueles outros autos.

A 6ª Ré (LL) contestou alegando essencialmente:

Haver o direito dos Autores já caducado, uma vez que teriam sabido da aquisição da sua fracção autónoma, pelo menos, em 02 de Dezembro de 2002, tendo desde então um prazo de seis meses para intentarem uma acção de preferência, nos termos do art. 1410º do C.C., o que porém não fizeram.

Desconhecer, à data da aquisição da sua fracção, a eventual existência de um direito legal de preferência dos Autores, ou a sua violação, não estando também registada a acção de preferência que viriam a intentar (Processo nº ..., da ...ª Vara Cível de ..., ...ª Secção), quando procedeu ao registo do seu próprio direito de propriedade.

É-lhe inoponível o decidido na anterior acção de preferência intentada pelos Autores, quer por não ter sido parte na mesma, quer por ela própria beneficiar da tutela conferida pelo art. 5º, nº 4 do C.R.P. aos terceiros de boa fé, com registo a seu favor.

Relativamente ao pedido de indemnização civil deduzido pelos Autores, alegou que não tendo sido parte na anterior acção de preferência intentada por eles, não lhe seriam oponíveis as despesas por eles suportadas no seu âmbito; as despesas exigidas por estes autos, deveriam ser reclamadas como custas de parte; e não lhe serem imputáveis o alegado desgaste físico e sofrimento pelo recurso, pelos Autores, durante onze anos, aos Tribunais.

Conclui pedindo que a acção fosse julgada improcedente, sendo ela própria absolvida do pedido; deduzindo reconvenção, onde impetrou a condenação dos Autores a reconhecerem o seu direito de propriedade sobre o primeiro andar esquerdo do prédio em causa, por o ter adquirido por usucapião; e pedindo a condenação dos Autores como litigantes de má-fé, em multa e indemnização correspondente aos prejuízos decorrentes para si da pendência desta acção, incluindo despesas processuais e honorários que viesse a suportar.

Já em sede de reconvenção, a 6ª Ré (LL) alegou ter adquirido a sua fracção autónoma para residência própria e permanente, o que só interrompeu com o seu divórcio, em 2010, continuando porém a assegurar o pagamento de todos os encargos inerentes à mesma (incluindo impostos, despesas de condomínio e empréstimo bancário contraído para a sua aquisição), tendo-a por isso já adquirido por usucapião, uma vez que se mostram decorridos os dez anos exigidos pelo art. 1294º, al. a) do C.C. sobre o início da sua posse, titulada e, como tal, tida de boa fé.

Por fim, e em sede de litigância de má fé, a 6ª Ré (LL) alegou terem os Autores alterado conscientemente a verdade dos factos para fazerem valer a sua pretensão, que, a proceder: fará com que perca o crédito bonificado de que beneficia (prejuízo cuja quantificação relegou para execução de sentença); e já a impediu de celebrar uma alteração ao seu contrato de mútuo, por forma a baixar a respectiva prestação (computando o seu prejuízo em € 216,00 por ano, correspondentes a € 5.000,00 até ao final do dito contrato). Impetrou, por isso, a condenação dos Autores - a este título - a indemnizarem-lhe tais danos, acrescendo ainda aos mesmos o que se veja obrigada a suportar com o presente processo, quer em termos de despesas processuais, quer em termos de honorários da sua Ilustre Mandatária.

Os Autores replicaram, relativamente a todas as contestações apresentadas, pugnando pela improcedência das excepções aí deduzidas, da reconvenção apresentada pela 6ª Ré (LL), e dos pedidos de condenação respectiva como litigantes de má fé.

Defenderam para o efeito e essencialmente:

Haver a transmissão do direito de preferência invocada nos autos ocorrido mercê das regras do direito sucessório, e não de pactos de preferência.

Ter já sido definitivamente apreciado e declarado o seu direito de preferência, no Processo nº ..., da ...ª Vara Cível de ..., ...ª Secção, tendo-se quanto a ele formado caso julgado, inexistindo por isso qualquer caducidade que o pudesse aqui afectar.

Não ser a protecção de terceiros de boa fé, consagrada no artigo 291º do Código Civil, aplicável a situações de ineficácia de negócios, com é a dos presentes autos.

Não estarem obrigados a registar a anterior acção de preferência, produzindo o seu direito de preferência efeitos erga omnes, atenta a sua natureza de direito real de aquisição.

Inexistir por tudo qualquer abuso do direito da sua parte, devendo a 5ª Ré (Caixa Geral de Depósitos, S.A.) procurar o ressarcimento dos prejuízos que invoca junto dos demais Réus.

A 6ª Ré (LL) treplicou, reiterando não lhe ser oponível o decidido na acção de preferência anteriormente intentada pelos Autores (Processo nº ..., da ...ª Vara Cível de ..., ...ª Secção), não estando abrangida pelo respectivo caso julgado.

Foi proferido despacho saneador-sentença, datado de 15 de Outubro de 2014, em que se procedeu ao conhecimento parcial do mérito da causa e à não admissão do pedido reconvencional formulados pelos 2º, 3º, 8º e 9º RR, nos seguintes termos:

“I - Julgo a presente acção parcialmente procedente, e, em consequência:

1.1. Declaro o direito de propriedade dos Autores, na proporção de dois terços indivisos, sobre o prédio urbano sito na Travessa ..., nº ..., freguesia da ..., concelho de ..., descrito na ...ª Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ..37 da referida freguesia, e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ..08;

1.2. Ordeno a substituição da inscrição da referida quota de dois terços indivisos, do prédio urbano sito na Travessa ..., nº ..., em ..., a favor de B..., Lda., na Conservatória do Registo Predial de ..., pela AP 17 de 2000/12/22, pelos Autores;

1.3. Declaro ineficaz a escritura pública de «CONSTITUIÇÃO DE PROPRIEDADE HORIZONTAL» do prédio urbano sito na Travessa ..., nº ..., freguesia da ..., concelho de ..., celebrada em 21 de Junho de 2001, no 8º Cartório Notarial de ..., e ordeno o cancelamento da sua inscrição na Conservatória do Registo Predial de ..., pela AP. 18 de 2001/07/04;

1.4. Declaro ineficaz a escritura pública de «COMPRA E VENDA, MÚTUO COM HIPOTECA E FIANÇA», da fracção autónoma designada pela letra «F», correspondente ao ..., do prédio urbano sito na Travessa ..., nº ..., freguesia da ..., concelho de ..., celebrada em 06 de Dezembro de 2001, no 9º Cartório Notarial de ..., e ordeno o cancelamento das seguintes inscrições, na Conservatória do Registo Predial de ...

. fracção autónoma designada pela letra «F» (correspondente ao ...) - de propriedade a favor de KK (aqui 4ª Ré), pela AP. ... de 2001/09/26;

. fracção autónoma designada pela letra «F» (correspondente ao ...) - de duas hipotecas registadas a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A. (aqui 5ª Ré), pela AP. 8 de 2001/09/26 e pela AP. 9 de 2001/09/26;

1.5. Declaro ineficaz a escritura pública de «COMPRA E VENDA», da fracção autónoma designada pela letra «D», correspondente ao ..., do prédio urbano sito na Travessa ..., nº ..., freguesia da ..., concelho de ..., celebrada em 19 de Fevereiro de 2002, no 16º Cartório Notarial de ..., e ordeno o cancelamento das seguintes inscrições, na Conservatória do Registo Predial de ...;

. fracção autónoma designada pela letra «D» (correspondente ao ...) - de propriedade a favor de LL (aqui 6ª Ré), pela AP. 15 de 2001/12/21;

. fracção autónoma designada pela letra «D» (correspondente ao ...) - de uma hipoteca registada a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A. (aqui 5ª Ré), pela AP. 16 de 2001/12/26;

1.6. Declaro ineficaz a escritura pública de «COMPRAS E VENDAS E PERMUTAS», das fracções autónomas designadas pelas letras «A» (correspondente ao ... direito), «B» (correspondente ao ... esquerdo), «C» (correspondente ao ...) e «E» (correspondente ao ...), do prédio urbano sito na Travessa ..., nº ..., freguesia da ..., concelho de ..., celebrada em 21 de Março de 2001, no Cartório Notarial da licenciada QQ, e ordeno o cancelamento das seguintes inscrições, na Conservatória do Registo Predial de ...

. fracção autónoma designada pela letra «A» (correspondente ao ... esquerdo) - a favor de LEOPOR - Imobiliário, Lda. (aqui 8ª co-Ré), pela AP. 7 de 2007/04/13;

. fracção autónoma designada pela letra «A» (correspondente ao ... direito) - a favor de LP..., S.A. (aqui 9ª co-Ré), pela AP. 10 de 2007/04/13 e pela AP. 13 de 2007/04/13;

. fracção autónoma designada pela letra «B» (correspondente ao ... esquerdo) - a favor de LEOPOR - Imobiliário, Lda. (aqui 8ª co-Ré), pela AP. 20 de 2007/03/23 e pela AP. 21 de 2007/03/23;

. fracção autónoma designada pela letra «C» (correspondente ao ...) - a favor de LEOPOR - Imobiliário, Lda. (aqui 8ª co-Ré), pela AP. 19 de 2007/03/23;

. fracção autónoma designada pela letra «C» (correspondente ao ...) - a favor de LP..., S.A. (aqui 9ª co-Ré), pela AP. 11 de 2007/04/13;

. fracção autónoma designada pela letra «E» (correspondente ao ...) - a favor de LEOPOR - Imobiliário, Lda. (aqui 8ª co-Ré), pela AP. 8 de 2007/04/13;

. fracção autónoma designada pela letra «E» (correspondente ao ...) - a favor de LP..., S.A. (aqui 9ª co-Ré), pela AP. 12 de 2007/04/13;

. fracção autónoma designada pela letra «E» (correspondente ao ...) - a favor de HH e II (aqui 1ºs co-Réus), pela AP. 2 de 2007/04/24.

1.7. Ordeno o cancelamento de todos e quaisquer registos que colidam com o direito de propriedade dos Autores referido no ponto 1.1. antecedente, registados posteriormente a 18 de Outubro de 2012 (data em que ocorreu o registo da presente acção, pela Ap. 2892 de 2012/10/18).

II - Julgo a presente acção parcialmente improcedente, e, em consequência, absolvo os 1ºs Réus (HH e II), a 2ª co-Ré (Par – co-Participações Comerciais, Lda.), o 3º co-Réu (JJ), a 4ª Ré (KK), a 6ª Ré (LL), a 8ª co-Ré (Leopor - Imobiliária, Lda.) e a 9ª co-Ré (LP..., S.A.) do pedido de indemnização por danos patrimoniais, formulado contra eles pelos Autores.

III - Julgo parcialmente improcedente o pedido de condenação dos Autores como litigantes de má fé, formulado pela 6ª Ré (LL), e, em consequência, absolvo-os do pedido de indemnização por danos patrimoniais correspondentes à alegada perda do crédito bonificado de que a mesma usufruirá, bem como da alegada perda, por ela, do acesso ao regime especial de crédito à habitação concedido pela Caixa Geral de Depósitos, S.A. aos seus funcionários”.

Na sequência do despacho saneador, os autos prosseguiram para apreciação do pedido de condenação dos RR. em indemnização por danos morais e para apreciação do pedido reconvencional deduzido pela 6ª Ré, bem como da eventual litigância de má fé imputável aos AA.

Nessa peça processual foram delimitados os seguintes “Temas da Prova” relativamente à parte em que o processo seguiria para julgamento:

“Face à decisão parcial do pedido proferida supra (isto é, à apreciação parcial do mérito da acção), ficou o seu objecto reduzido: a parte do segundo pedido principal deduzido pelos Autores, isto é, de condenação dos 1ºs co-Réus (HH e II), da 2ª co-Ré (Par – co-Participações Comerciais, Lda.), do 3º co-Réu (JJ), da 4ª Ré (KK), da 6ª Ré (LL), da 8ª co-Ré (Leopor - Imobiliária, Lda.) e da 9ª co-Ré (LP..., S.A.) na indemnização de € 25.000,00, a título de ressarcimento de alegados danos não patrimoniais sofridos com a instauração e pendência do Processo nº ..., da ...ª Vara Cível de ..., ...ª Secção, e deste; ao pedido reconvencional deduzido pela 6ª Ré (LL), de reconhecimento do seu direito de propriedade sobre o ... do prédio urbano correspondente ao nº ..., da Travessa ..., em ..., por o ter adquirido por usucapião; e ao pedido de condenação dos Autores como litigantes de má fé, em multa e indemnização por despesas e encargos processuais, incluindo honorários dos respectivos Mandatários, formulados pelos 2ª co-Ré (Par – co-Participações Comerciais, Lda.), 3º co-Réu (JJ), 8ª co-Ré (Leopor - Imobiliária, Lda.) e 9ª co-Ré (LP..., S.A.), na sua contestação conjunta, e pela 6ª Ré (LL).

Desconsidera-se aqui idêntico pedido formulado antes pela 5ª Ré (Caixa Geral de Depósitos, S.A.) - no seu articulado de resposta ao de aperfeiçoamento apresentado pelos Autores -, uma vez que o reportou à sua demanda em sede de pedido de indemnização civil formulado por aqueles, tendo sido porém declarada parte ilegítima quanto ao mesmo. Logo, considerou-se o conhecimento desse seu idêntico pedido (de condenação dos Autores como litigantes de má fé) prejudicado, nos termos do art. 608º, nº 2 do C.P.C.

Assim, define-se o remanescente objecto do litígio da seguinte forma:

. Acção - consiste o mesmo em apurar se os Autores têm direito a ver condenados os 1ºs co-Réus (HH e II), 2ª co-Ré (Par – co-Participações Comerciais, Lda.), 3º co-Réu (JJ), 4ª Ré (KK), 6ª Ré (LL), 8ª co-Ré (Leopor - Imobiliária, Lda.) e 9ª co-Ré (LP..., S.A.) a pagarem-lhes a quantia de € 25.000,00, a título de indemnização de alegados danos não patrimoniais sofridos com a instauração e pendência do Processo nº ..., da ...ª Vara Cível de ..., ...ª Secção, e deste, por se terem conluiado para impedirem o reconhecimento do seu direito legal de preferência, que acabaria por lhes ser reconhecido naqueles primeiros autos.

. Reconvenção - consiste o mesmo em apurar se a 6ª Ré (LL) tem direito a que se declare o seu direito de propriedade sobre o ... do prédio urbano correspondente ao nº ..., da Travessa ..., em ..., por o ter adquirido por usucapião

. Má fé - consiste o mesmo em apurar se os Autores litigaram nos autos de má fé, devendo por isso ser condenados a pagarem uma multa, bem como uma indemnização, aos 2ª co-Ré (Par – co-Participações Comerciais, Lda.), 3º co-Réu (JJ), 8ª co-Ré (Leopor - Imobiliária, Lda.) e 9ª co-Ré (LP..., S.A.), e outra à 6ª Ré (LL), correspondente às despesas e encargos processuais a que os obrigaram, incluindo os honorários devidos aos seus Ilustres Mandatários”.

Foi apresentado pelos 2º, 3º, 8º e 9º RR. recurso de apelação, o qual se encontra junto a fls. 1608 a 1626.

Prosseguindo os autos foi então proferida a sentença, datada de 22 de Janeiro de 2015, em que os 2ª, 3º, 8º e 9º RR. foram condenados a pagar aos AA. a quantia de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros).

Os 2ª, 3º, 8º e 9º RR. interpuseram recurso de apelação contra essa decisão condenatória.

Apresentaram as seguintes alegações de apelação:

1ª Deve ser alterada a matéria de facto dada como provada na forma seguinte:

a) No nº 22 da douta sentença deve ficar apenas provado que no dia 1 de Março de 2007 a acção de preferência foi remetida à conta por inércia dos AA., face à prova documental existente nos autos;

b) Devem dar-se como não provados os factos constantes do nº 35 da douta sentença, já que, o procedimento dos RR. não teve como objectivo impedir o efeito substantivo da procedência da acção, matéria esta meramente conclusiva e fundamentada apenas em meros indícios e presunções duvidosas;

c) Deve ser considerada como não provada a matéria a que se refere o nº 38 da douta sentença, já que não existe prova documental suficiente nos autos que mostre que o registo da acção de preferência foi alguma vez realizado com sucesso;

d) Deve por último, também a matéria a que alude o nº 46 da douta sentença, ou seja, que a instauração e pendência da acção de preferência causaram aos AA. desgaste físico e sofrimento, ser considerada como não provada, dado ser vaga e imprecisa, carecendo de prova, uma vez que, as testemunhas que prestaram o depoimento sobre esta matéria mostraram ter interesse directo na causa, bem sabendo que, apenas uma das AA. viveu permanentemente no arrendado falecendo em 2012;

e) Deve, pois, ser alterada a matéria de facto e julgar-se a apelação conforme for de direito.

Ainda que assim não seja entendido, o que se não concede, pelos elementos constantes dos autos, o pedido de indemnização por danos não patrimoniais terá necessariamente de improceder.

2ª Na verdade, os AA. na sua qualidade de inquilinos preferentes, manifestaram desleixo e irresponsabilidade quando abandonaram sem motivo justificativo a reunião do dia 26-10-2000, deixando que o prédio fosse licitado pelo arrendatário preferente que permaneceu na sala;

3ª Tendo conhecimento de todos os elementos essenciais para preferirem, das obras nas partes comuns que muito valorizou o prédio, decidiram já tardiamente instaurar a acção de preferência em 29 de Maio de 2001, quando o respectivo direito de preferência havia caducado, pelo menos na aquisição de 1/3 indiviso do prédio e estava prestes a ser celebrada a escritura de constituição do mesmo em propriedade horizontal (21-06-2001);

4ª Bem sabendo que existiram obras de beneficiação nas partes comuns e que tinha sido celebrada uma escritura de compra e venda e bem assim do pagamento da Sisa, os AA. de-positaram apenas em singelo o preço da preferência deixando a partir de então, de pagar aos RR. quaisquer rendas, impostos sobre imóveis, taxas de saneamento e outros;

5ª Os AA. demonstraram desinteresse e desleixo ao procederem apenas ao registo da acção de preferência em 7 de Novembro de 2002, vindo a ser recusado em 20 de Maio de 2004, ficando a instância suspensa no dia 2 de Fevereiro de 2006 por comprovada falta do registo da acção, tendo os autos ido à conta no dia 1 de Março de 2007, incorrendo os AA. no pagamento das custas por falta de impulso processual;

6ª Neste contexto, passados que foram cerca de seis anos a contar da data da propositura da acção, encontrando-se a instância permanentemente suspensa há mais de um e em fase de interrupção da instância por exclusiva culpa dos AA., os RR. HH, mulher e B..., Lda. comproprietários do prédio na proporção de 1/3 e 2/3 respectivamente, não sendo obrigados a permanecer indefinidamente na indivisão e verificado o impasse, a incerteza e a pouca probabilidade dos AA. procederem ao registo da acção, como aliás consta dos despachos emitidos pela Conservatória do Registo Predial, suspensão esta manifestamente incompatível com a actividade comercial desenvolvida pelos mesmos, celebraram com outros outorgantes no dia 21-03-2007 a escritura pública de Compras e Vendas e Permutas com o intuito de dividirem as 4 fracções ainda por alienar no prédio, procedendo à respectiva composição, acertos e vendas, dando disso conhecimento aos AA.;

7ª A necessidade da celebração da referida escritura pública teve também por finalidade retomar o comércio jurídico habitacional, com a venda de fracções nos termos do objecto e exercício da actividade comercial dos RR., uma vez que, a então Ré B..., Lda. se encontrava numa situação económica delicada, acabando por ser dissolvida no final do ano de 2007;

8ª Pouco depois da celebração da escritura pública de 21-03-2007 os AA. deduziram dois incidentes intervenção de terceiros, pedindo para serem chamados a intervir todos os ora RR.,apresentando ainda um articulado superveniente pedindo a nulidade da referida escritura e bem assim o direito de preferência na na alienação das fracções, vindo todos estes incidentes a ser indeferidos;

9ª Foram os AA. que deram causa à celebração da escritura pública de Compras e Vendas e Permutas dado não terem em termpo útil procedido ao registo da acção, não sendo os RR., passado que foi mais de um ano com a instância sucessivamente suspensa, obrigados a aguardar mais tempo, atento o prejuizo que lhes advinha de não poderem continuar o normal exercício da sua actividade comercial, ou seja, a compra e venda de propriedades, com revenda dos adquiridos;

10ª Todos os RR. outorgantes da referida escritura tinham conhecimento da suspensão da instância por mais de um ano e bem assim da negligência dos AA. ao não terem realizado o registo da acção, constatando, além do mais, que o prédio já não tinha a mesma configuração juridica delineada na P.I., nada tendo sido ocultado aos AA., inexistindo entre os RR. qualquer conluio, dolo, ou sequer entrave ao normal prosseguimento da acção de preferência com o objectivo de impedirem o efeito substantivo da mesma, a qual como mostram os autos, após decisão dos vários incidentes deduzidos pelos AA., correu os seus normais termos até final, sendo que, a 1ª e 2ª Instâncias julgaram tal acção improcedente por não provada;

11ª Nesta conformidade, a morosidade da acção de preferência a existir, apenas terá de ser imputada directamente aos próprios AA., os quais apenas de si se podem queixar, como ficou sobejamente demonstrado, dado jamais terem registado a acção de preferência (artºs 16º e 17º da P.I. doc. nºs 4 e 5), já que se tivesse operado o registo da acção de preferência, por certo que desnecessário se tornava intentarem a presente acção;

12ª Sem conceder, verifica-se que o douto acordão do STJ proferido no ambito da acção de preferência (doc. nº 3 da P-.I.) transitou em julgado e não ordenou o cancelamento de qualquer registo, pelo que sempre teriam os AA. de propor outra acção, não apenas contra os RR., mas também contra a 4ª Ré KK e 6ª Ré LL, face ao contrato de compra e venda das respectivas fracções, como de facto viria a acontecer;

13ª A eventual morosidade da acção de preferência e a necessidade dos AA. terem de propor outra acção, deveu-se às vicissitudes processuais e bem assim aos vários incidentes provocados pelos AA. nos autos, e não por qualquer conluio, dolo ou entrave deliberado dos RR. no sentido de entorpecer a acção da justiça, nem tal se pode presumir legal ou judicialmente;

14ª Verifica-se pelos autos que, ao ser celebrada a escritura de 21-03-2007 os RR. procuraram em primeiro lugar por termo à compropriedade e de seguida proceder à divisão das quatro fracções, através de partilha, acertos, composições e vendas como mostra a escritura e se encontra justificado nos artºs 32º,33º,39º,40º,46º,47º,49º e 50º da sua contestação, não se vislumbrando com este procedimento a existência de qualquer conduta dolosa e ilícita que pela sua gravidade justifique o pagamento de indemnização aos AA. por danos não patrimoniais;

15ª Na verdade, com todo o respeito não poderá dar-se como provado que a pendência das acções causou desgaste físico e sofrimento aos AA., uma vez que as testemunhas que prestaram o seu depoimento sobre esta matéria, ou sejam RR e SS demonstraram claramente terem interesse directo na causa, pronunciando-se sobre os AA. como se todos morassem permanentemente no prédio, o que não se verificou, como se constata pelas moradas constantes da P.I. dos actuais AA., não merecendo as suas declarações qualquer credibilidade;

16ª Por outro lado, o procedimento dos RR. é insusceptível de gerar nos AA. quaisquer dores fisicas ou sofrimentos, nem tal se pode presumir, na medida em que, os 1ºs AA. já não moravam no prédio desde Junho de 1999, por, entretanto, terem adquirido habitação própria no centro de Lisboa, acompanhando calmamente o desenrolar dos autos à distância, sendo certo que, a A. TT havia falecido na pendência da acção de preferência em meados de 2006 e o mesmo sucedeu à A. NN a qual viria a falecerem Abril de 2012;

17ª Os 2º a 6ºAA. encontram-se habilitados nos autos por óbito da A. TT e não morando no andar do prédio que esta arrendou, não lhes assiste o direito a qualquer indemnização por danos não patrimoniais, atenta a absoluta carência de prova, verificando-se que o contrato de arrendamento caducou, em meados do ano de 2006, caducidade esta de conhecimento oficioso;

18ª Ainda no que respeita às AA. NN e TT, tendo ambas falecido, mesmo que por mera hipótese venha a ser entendido que lhes é devida indemnização por danos não patrimoniais, o que se não concede, tal indemnização não é susceptível de ser transmitida em vida ou por morte nos termos do artº 420º do CC.;

19ª Ainda que venha a ser entendido que os AA. sofreram desgaste físico e sofrimento, o que se não concede, constata-se que se tratam de simples incómodos e de meras contrariedades e consequentemente, como tem vindo a ser entendido pela doutrina e pela jurisprudência, insusceptíveis de justificarem uma indemnização por danos não patrimoniais;

20ª Encontra-se, pois, sobejamente provado, que foram os próprios AA. os causadores da morosidade processual dos autos, manifestada ao longo da acção de preferência por não lograrem o registo da acção, tendo, por via disso, os autos ficado suspensos por mais de um ano e remetidos à conta com custas pelos AA. e bem assim, através de reduções do pedido, de incidentes de intervenção de terceiros, de um articulado superveniente, todos indeferidos, com excepção da redução do pedido, convenhamos que, não lhes assiste qualquer direito à indemnização por danos não patrimoniais;

21ª Ao contrário do que vem referido na douta sentença, os AA. não agiram com dolo, ou culpa, verificando-se que o seu procedimento nos autos é insusceptível de gerar qualquer conduta ilícita, não incorrendo, assim, em responsabilidade civil contratual ou extracontratual;

22ª Com efeito, nos termos do artº 483º do CC a obrigação de indemnizar apenas se verifica desde que reunidos os seguintes requisitos: a) um facto voluntário; b) a ilicitude; c) a imputação do facto ao lesante; d) o dano e e) um nexo de causalidade entre o facto e o dano;

23ª Com todo o respeito pela douta sentença, recaindo sobre os AA. a morosidade processual manifestada através de negligência e desleixo que levou à suspensão por mais de um ano dos autos de preferência, bem como, da dedução de sucessivos incidentes e de um articulado superveniente, é bem verdade que não se encontram reunidos os necessários requisitos que justifiquem uma indemnização, não podendo ser imputados aos RR, quaisquer factos eventualmente ilícitos geradores de danos não patrimoniais que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito ( nº 1 do artº 496º do CC);

24ª Na verdade, em ambos os processos o procedimento dos RR. manifestou-se, apenas, na defesa dos seus legítimos interesses e direitos e sempre com observância do princípio do contraditório constitucionalmente previstos e dos quais não abdicam;

25ª A douta sentença muito embora tenha ilibado duas das Rés de qualquer responsabilidade e ainda bem, e tenha condenado os AA. como litigantes de má fé apenas em multa, mesmo assim manteve na integra o pedido de indemnização formulado pelos mesmos, verificando-se que tal indemnização é manifestamente exagerada, à luz da doutrina e da jurisprudência, dado não terem sido observados e ponderados todos os critérios de equidade, segundo as regras da boa prudência, do bom senso prático e bem assim da justa medida, pelo que, a haver condenação na indemnização, o que se não concede e apenas por mera hipótese se admite, constituirá um autêntico enriquecimento sem causa dos AA., o que convenhamos, é manifestamente ilegal.

26ª Dado que os AA. foram condenados como litigantes de má fé apenas em multa, deverão também ser condenados em indemnização nos termos em que foi pedida na contestação em custas, multa e indemnização e ainda nos honorários do mandatário dos RR..

Entretanto, veio a ser proferido acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 27 de Abril de 2017, no qual se decidiu:

“(…) julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelos 2.°, 3.°, 8.° e 9.° réus a fls. 1608 e ss., em revogar também parcialmente a decisão proferida a fls. 1409 e ss na parte em que não admitiu o pedido reconvencional de condenação dos autores a pagarem aos reconvintes a quantia de € 77.581, 92, a título de benfeitorias realizadas no imóvel objecto da preferência e de despesas tidas por causa do mesmo, e em substituir esse capítulo da referida decisão por outro que ordena o conhecimento daquele pedido com ampliação da matéria de facto, ampliação essa que implica a anulação da decisão final proferida na 1ª instância, sem prejuízo da manutenção da matéria de facto que não esteja viciada”.

Nesse mesmo aresto não foi conhecida a restante matéria invocada no recurso de apelação apresentado pelos 2ª, 3º, 8º e 9º RR e que se encontra junto a fls. 1608 a 1626.

Prosseguindo os autos e realizada audiência de julgamento, veio a ser proferida sentença, datada de 23 de Maio de 2023, que julgou parcialmente procedente, por provada, a reconvenção deduzida pelos 2ª, 3º, 8º e 9º RR. e, em consequência, condenou os reconvindos a pagar a quantia de € 37.907,81 (trinta e sete mil novecentos e sete euros e oitenta e um cêntimos), quantia à qual acrescem juros de mora vencidos à taxa legal, desde a data da citação do pedido reconvencional até ao seu integral pagamento.

Os recursos de apelação interpostos pelos 1ºs., 2º, 3º 8º e 9º RR. contra o saneador sentença proferido em 15 de Outubro de 2014, bem como a sentença de 22 de Janeiro de 2015 vieram a ser julgados improcedentes por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (ora acórdão recorrido), datado de 11 de Julho de 2024, nos seguintes termos:

“- julgar a apelação interposta pelos 2º, 3º, 8º e 9ºRR. relativamente à decisão de 21-08-2014 e inserida no sistema CITIUS em 15-10-2014 improcedente, mantendo-se a decisão recorrida.

- julgar a apelação interposta pelos 2º, 3º, 8º e 9º RR. relativamente à decisão de 22-01-2015, mantendo-se a decisão recorrida.

- julgar a apelação interposta pelos 1ºs RR. relativamente à decisão de 22-01-2015, mantendo-se a decisão recorrida”.

Vieram as Rés Par-Co-Participações Comerciais Ldª (2ª Ré); JJ (3º Réu), Leopor-Imobiliária SA (8ª Ré), e LP..., S.A. (9ª Ré), interpor recurso de revista, apresentando as seguintes conclusões:

1ª Os autos correspondentes à acção de preferência nº ... da ...ª Vara Cível de ..., ...ª Secção, estiveram suspensos por falta de registo da acção pelo menos desde 29 de Maio de 2001 até 1 de Março de 2007 (factos provados sob os nºs 16,17, 21 e 22 do douto acórdão), não tendo esta matéria sido apreciada e julgada, consubstanciando omissão de pronúncia, susceptível de gerar a nulidade prevista na al.d) donº1 doartº 615º doCPC.

Constata-se, por outro lado, contradição, ambiguidade e obscuridade entre a matéria de facto inerente aos factos provados sob os nºs 39, 40 e 41 do douto acórdão.

2ª O douto acórdão conheceu de questões que não deveria tomar conhecimento, na medida em que, declarou ineficaz a escritura de Constituição do prédio em Propriedade Horizontal, sendo certo que os AA. apenas pedem o reconhecimento do direito de propriedade correspondente à quota de 2/3 (dois terços),eliminando os comproprietários correspondentes à quota de 1/3 (um terço) em violação do disposto na al. d) do nº 1 do artº 615º do CPC.

3ª Caso assim se não entenda, constata-se a ineptidão da P.I. dado que os nºs 1 e 2 do petitório são incompatíveis com o nº 3 do mesmo petitório, pois que, sendo os AA. apenas comproprietários de 2/3 (dois terços) do prédio urbano sito na Travessa ... nº ... em ..., pedem que seja declarada ineficaz a e escritura pública de constituição da propriedade horizontal em todo o prédio, carecendo de legitimidade para o efeito, em virtude de não se encontrar validado expressamente, o consentimento dos comproprietários da quota de 1/3 (um terço).

4ª Sem conceder, no nº 22 dos factos provados vem referido que os autos foram remetidos à conta “por inércia das partes”devendo ser eliminada ou considerada não escrita “por inércia das partes“ dado conter questões de direito.

5ª No nº 34 vem referido que “todos os alienantes e adquirentes das fracções autónomas tinham à data das ditas alienações e aquisições pleno conhecimento da existência do litígio entre os AA. e o antigo senhorio PP, HH e mulher, B..., Lda. e outros e absoluto conhecimento da propositura e prosseguimento da acção de preferência”, não devendo ser dada como provada.

Sucede que, esta matéria além de intimidatória, vem na sequência dos artigos anteriores, caso do artº 46º e do próprio artº 59º da P.I. tendo sido provada por meio de conjecturas e presumpções aliás ilidíveis e de carácter duvidoso, tratando-se de meras conclusões, contendo questões essencialmente de direito, por não serem de uso corrente na vida real e também juízos de valor e conclusões, devendo ser declarada como não provada, mas caso assim se não entenda deverão as questões de direito ser eliminadas ou consideradas como não escritas.

6ª Em relação ao nº 35 dos factos provados, onde se refere que “ as alienações e permutas das fracções A);B),C) e E), teve como objectivo impedir o efeito substantivo da procedência da acção de preferência “, vem na sequência de uma conclusão, verificando-se que também contém meras questões de direito, bem como juízos de valor, matéria esta não usada na vida real, em violação dos nºs 3 e 4 do artº 607º do CPC, não devendo ser dada como provada, mas, caso assim se não entenda devem as questões de direito e outras serem declaradas como não escritas.

7ª No nº 46 refere-se que a instauração e pendência quer do Procº nº ... quer do presente, causaram aos AA. desgaste físico e sofrimento.

Porém, verifica-se que esta matéria, além de conter questões de direito e juízos de valor, é conclusiva, vaga e imprecisa, dado não se encontrar provada através de parecer médico, sendo certo que tal se torna necessário, desconhecendo-se quais os AA. que sofreram desgaste físico e sofrimento, uma vez que os 2º a 6º não eram arrendatários e nunca moraram no arrendado, assim como a A. UU, devendo ser declarada como não provada e ou dada por não escritas as questões de direito ali suscitadas por não serem de uso corrente na vida real.

8ª No que respeita à escritura de constituição da propriedade horizontal do prédio em apreço tendo a mesma sido celebrada em 21 de Junho de 2001 e registada pouco depois, a declaração de ineficácia é ilegal nos termos do disposto no nºs 1 e 2 do artº 1403º do CC, uma vez que os AA. apenas são comproprietários de 2/3, carecendo da intervenção dos comproprietários com a quota de 1/3 o que não se verificou.

9ª Por outro lado, caducou o direito dos AA. deduzirem o pedido de ineficácia da dita escritura nesta fase processual, uma vez que, tendo apresentado um articulado superveniente em 24 de Abril de 2007 e apesar de ser rejeitado por extemporâneo, o certo é que os AA., só passados mais de cinco anos (5), é que deduziram o respectivo pedido de ineficácia na presente acção, convenhamos que tardiamente, pelo que caducou.

10ª E o mesmo se passa com a escritura de compras e vendas e permutas celebrada em 21 de Março de 2007, uma vez que tendo os RR. pedido a sua nulidade e o direito de preferência no articulado superveniente de 24 de Abril de 2007, e encontrando-se registados todas as operações nela constantes, caducou irremediavelmente o direito dos AA. pedirem nova anulação ou ineficácia, dado terem decorrido mais de 5 anos após o referido articulado superveniente ter sido rejeitado.

11ª Ademais, a declaração de ineficácia não prejudica o direito de terceiros de boa fé nos termos do artº 291º do CC como sucede no caso dos autos em que se verifica que os RR são terceiros de boa fé, neste negócio oneroso.

Ora,osRR.procederamao registo das fracções A), B), C) e E) até ao dia 17 de Abril de 2007, pelo que, tendo o registo desta acção sido realizado em 18 de Outubro de 2012,caducou o direito de declaração de ineficácia da escritura pública celebrada no dia 21 de Março de 2007.

12ª Aliás esta escritura pública celebrada em 21 de Março de 2007 foi realizada em primeiro lugardevidoaosautosda acçãodepreferência estarempermanentemente suspensos por mais de 6 (seis) anos a aguardar o registo da acção, sendo remetidos à conta em 1 de Março de 2007 e em segundo lugar devido à situação económica difícil de então Ré B..., Lda., à beira da insolvência, havendo absoluta necessidade de alienar ou partilhar património para pagar aos credores, acabando por ser liquidada no final do ano de 2007.

Tendo os autos do processo nº ... sido remetidos à conta, convenhamos que ficaram totalmente inertes, já que os AA. não procederam ao registo da acção, sendo certo que, os RR. não eram obrigados a permanecer perpetuamente na indefinição a aguardar que os AA registassem a acção e atento o impasse, qual “credor/devedor”, sentiram-se legitimados a celebrar a escritura de compras vendas e permutas em 21 de Março de 2007 inexistindo qualquer dolo ou conluio,como erradamente consta da douta decisão.

13ª A então A. OO faleceu ainda no decorrer da acção preferência, e não vivendo com ela no arrendado nenhum dos 2ºs a 6º AA. caducou o contrato de arrendamento, logo após o falecimento, uma vez que o direito de preferência não se transmita por vida nem por morte (artº 420º do CC).

14ª A então A. VV faleceu já após ter transitado o douto acórdão do STJ inerenteà acção de preferência, tendo legado o seu direito de preferência à A. UU. No entanto, os direitos e obrigações de preferencia não são transmissíveis nem por vida nem por morte, acarretando a respectiva ineficácia do legado artº 420º do CC.

15ª Por outro lado, foram os RR. condenados a pagar aos AA. a quantia de €25.000,00 a título de danos não patrimoniais a título de responsabilidade civil, pelo simples facto de terem celebrado entre si, em 21 de Março de 2007 uma “única” escritura de compras e vendas e permutas com o objectivo de impedirem o efeito substantivo da procedência da acção de preferência.

16ª Ora, com todo o respeito, não corresponde â verdade terem os RR impedido através da referida escritura a concretização da acção de preferência, porquanto, tendo a acção dado entrada na ...ª Vara Civel de ... ...ª Secção em 29-05-2001,aliás já caducada, os AA. apenas procederam ao registo da acção na Conservatória de Registo Predial em 4 de Novembro de 2002 ficando provisório, por natureza e por dúvidas, caducando no dia 20 de Maio de 2004 e no dia 12 de Janeiro de 2006 tendo a respectiva instância estado já antes suspensa com fundamento na falta de registo da acção , realizou-se a 1ª sessão da audiência de discussão e julgamento da referida acção, vindo a mesma a ser declarada novamente suspensa na sessão do dia 2 de Fevereiro de 2006 por comprovada falta de registo da acção (nº 21 dos factos provados).

17ª E no dia 1 de Março de 2007 os autos foram remetidos à conta por culpa dos AA. (nº 23) . e sem perspectivas de serem reactivados.

18ª No dia 21 de Março de 2007 encontrando-se a acção permanentemente suspensa há cerca de 6 anos, não se vislumbrando qualquer solução futura no registo da acção encontrando-se a Ré B..., Lda. em situação de insolvência e não sendo os RR. obrigados a permanecer indefinidamente neste impasse, atenta a sua actividade comercial no ramo do imobiliário e qual credor/devedor, os RR. sentiram-se legitimados a realizar a escritura Pública de compras e vendas e permutas inerente âs fracções A,B,C e E do prédio urbano em causa, inexistindo qualquer dolo ou conluio.

19ª Os RR. celebraram tal escritura pública do dia 21-03-2007 na defesa dos seus interesses e direitos, face à pendência sucessiva da respectiva acção, sendo certo que a actividade comercial dos RR. na área da compra e venda de propriedades náo se compadece com qualquer estagnação que prejudique o comércio jurídico.

20ª Assim sendo, foram os AA. os principais causadores das pendencias das acçóes, não podendo os RR. ser responsabilizados por eventuais demoras da justiça, dado que,jamaisdeduziram nosautosqualquer articuladotendente a entravar oua protelar os autos, como se pode constatar pelos mesmos.

21ª Nos termos do artº 483º do CC para que opere a responsabilidade civil é necessário que se verifique um facto voluntário, a ilicitude, a imputação dos factos ao lesante, o dano e um nexo de causalidade entre o facto e o dano.

Sucede todavia que, com todo o respeito, não se verificam os requisitos necessários para que os RR. sejam obrigados a indemnizar os AA..

22ª Falece por completo a condenação dos RR. na indemnização aos AA. dado inexistir qualquer acto ilícito ou dolo, já que os simples e vulgares incómodos ou contrariedades não justificam a indemnização por danos não patrimoniais,

23ª Pelo contrário, os AA. não agiram diligentemente na questão do registo da acção na Conservatória do Registo Predial, evidenciando negligencia, desleixo, desinteresse, bem como desrespeito para com o Tribunal.

24ª Aliás, tendo os AA. sido condenados como litigantes de má fé apenas em multa, encontram-se reunidos todos os requisitos para que sejam condenados a pagar uma indemnização aos RR, por prejuízos sofridos.

DO RECURSO DE REVISTA

Os RR. fundamentaram o recurso de revista normal no douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09-07-2024 – Procº nº 2830/18 sendo Relator o Senhor Conselheiro Henrique Antunes.

O douto acórdão violou o artº 186º nº 2 al.c) , 607º nº 4, 608º, 615º nº 1 al. b), c) e d), artºs 640º e 662º todos do CPC:-O artº 291º, 420º, 483º 1095º e 1403º todos do CC, bem como o artºs 3º e 5º nº 4 do Código do Registo Predial.

Nestes termos e nos de direito deve dar-se provimento ao recurso revogando-se a douta decisão recorrida que deverá ser substituída por douto acórdão, que julgue a acção improcedente por não provada, absolvendo os RR. dos pedidos.

Contra-alegaram os AA. apresentando as seguintes conclusões:

A- A interposição do presente recurso de revista pelos 2º, 3º 8º e 9º RR: Par-Co-Participação Comerciais Ldª; JJ; Leopor – Imobiliária Ldª; LP..., S.A. tem por claro e único objectivo obstar o trânsito em julgado do douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, que confirmou, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, o despacho saneador-sentença proferido pelo Tribunal de 1ª instância, de 15/10/2014.

B- Razão pela qual, as alegações apresentadas pelos 2º, 3º 8º e 9º RR: Par-Co-Participação Comerciais Ldª; JJ; Leopor – Imobiliária Ldª; LP..., S.A. no presente recurso de revista deverão ser apreciadas à luz do disposto no artº 670º do CPC, com as legais consequências.

C- O douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa em 11 de Julho de 2024 não deverá merecer qualquer juízo de censura ou de revogabilidade, por no caso em apreço existir dupla conformidade decisória e por se verificar extemporaneidade na interposição de recurso do despacho saneador-sentença proferido pelo Tribunal de 1ª instância, de 15/10/2014, que duplamente obsta à admissibilidade do presente recurso de revista, nos termos do disposto no artigo 671º, nº3, do CPC.

D- O douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, que aqui é posto em causa pelos 2º, 3º 8º e 9º RR: Par-Co-Participações Comerciais Ldª; JJ; Leopor – Imobiliária Ldª; LP..., S.A., confirmou integralmente, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, o douto despacho saneador-sentença proferido pelo Tribunal de 1ª instância, de 15/10/2014, verificando-se, assim, dupla conformidade decisória, que obsta à admissão do recurso de revista regra ou normal.

E- Nos termos do disposto no artigo 671º, nº3, do CPC:” Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida a revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte.”.

F- No caso em apreço, verifica-se que os Recorrentes vieram interpor recurso de revista normal do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, que confirmou, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, o despacho saneador-sentença proferido pelo Tribunal de 1ª instância, de 15/10/2014.

G- Situação de facto, que obsta à admissibilidade do presente recuso de revista para este douto Supremo Tribunal de Justiça, face à verificação da existência de dupla conformidade decisória, atento ao disposto no artigo 671º, nº3, do CPC.

H- Com efeito, em 23/05/2023, o Tribunal de 1ª instância proferiu uma segunda decisão, na qual deu por integralmente reproduzido o despacho saneador sentença proferido no âmbito da presente acção, por tal matéria de facto não estar viciada, pronunciando-se, de seguida, apenas e tão só sobre o pedido reconvencional, que julgou parcialmente procedente, por provada, a reconvenção.

I- Notificados daquela 2ª decisão do Tribunal de 1ª instância, os Recorrentes Par-Co-Participação Comerciais Ldª; JJ; Leopor – Imobiliária Ldª; LP..., S.A., dela não interpuseram novo recurso de apelação, deixando que a mesma decisão transitasse em julgado.

J- Pelo que, também por este motivo, o recurso de revista interposto pelos 2º, 3º 8º e 9º RR: Par-Co-Participação Comerciais Ldª; JJ; Leopor – Imobiliária Ldª; LP..., S.A., do despacho saneador-sentença proferido pelo Tribunal de 1ª instância, de 15/10/2014, deverá ser liminarmente rejeitado, por extemporaneidade.

K- Nos termos do requerimento de interposição de recurso, os 2º, 3º 8º e 9º RR: Par-Co-Participação Comerciais Ldª; Domingos Pires Leal do Paço; Leopor – Imobiliária Ldª; LP..., S.A. interpuseram o presente recurso de revista com fundamento no disposto no artigo 640º do CPC, revista normal.

L- Nas alegações de recurso de revista, os 2º, 3º 8º e 9º RR: Par-Co- Participação Comerciais Ldª; JJ; Leopor – Imobiliária Ldª; LP..., S.A. reproduzem as mesmas alegações e os mesmos fundamentos do recurso de apelação, que não mereceram qualquer provimento por parte do Tribunal recorrido.

M- Determina o artigo 640º, nº 1, alíneas a), b) e c), do C.P.C. que: “Quando seja impugnada a decisão sobre matéria de facto, deve do recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos prontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c)A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.

N- Incumprindo a norma do artigo 640º do CPC nas alegações do presente recurso de revista os 2º, 3º 8º e 9º RR: Par-Co-Participação Comerciais Ldª; JJ; Leopor – Imobiliária Ldª; LP..., S.A. alegam, em síntese, o seguinte: “(…)

Os RR. Recorrentes já nas alegações de recurso de apelação tiveram oportunidade de revelar as ilegalidades da douta sentença, mantendo-se os pressupostos no douto acórdão.

Os recorrentes apresentaram alguns vícios existentes na matéria de facto dada como provadana 1ªinstância,nãomerecendoqualqueralteração nodoutoacórdão. (…)”.

O- O douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, após a reapreciação dos meios de prova disponíveis e mencionados pelos RR no âmbito do recurso de apelação, e após ponderar todas as questões de facto suscitadas pelos mesmos RR, decidiu não atender a pretensão dos apelantes.

P- Da leitura do acórdão recorrido resulta que o Tribunal da Relação de Lisboa reapreciou os meios de prova disponíveis e mencionados pelos Recorrentes, bem como ponderou todas as questões de facto por estes suscitadas nas alegações de recurso de apelação, actuando em conformidade com o disposto no artigo 662º, nº1, do CPC.

Q- Não se verificando ofensa de qualquer disposição que fixe a força probatória de determinado meio de prova e estando em causa meios de prova sujeitos à livre apreciação do Tribunal, encontra-se arredada a possibilidade de o Supremo Tribunal de Justiça sindicar, em sede de revista, o eventual erro na apreciação da prova e na fixação dos factos materiais em causa, face ao disposto nos artigos 674º nº3, e 682, no2, ambos do CPC.

R- No âmbito do presente recurso de revista os 2º 3º 8º e 9º RR pretendem impugnar matéria de facto que não foi impugnada no recurso de apelação, nomeadamente que: “(…) o douto acórdão omitiu pronúncia sobre esta matéria, a que correspondem os nºs16, 17, 21 e 22 dos factos provados, tendo os mesmos sido suscitados nas conclusõesdas alegações do recurso, não se encontrando a decisão prejudicada pela solução dadaaoutras.”.

S- A pretensão aqui deduzida pelos recorrentes: Par-Co-Participação Comerciais Ldª; JJ; Leopor – Imobiliária Ldª; LP..., S.A. constitui uma clara violação das regras sobre os limites objectivos dos recursos.

T- Com efeito, em sede do recurso de apelação interposto pelos aqui recorrentes do despacho-saneador sentença, as únicas conclusões relativas à impugnação da matéria de facto dada como provada foram as seguintes:

“(…)

9ª No que respeita à matéria de facto provada, verifica-se que o nº 22 contém matéria que nãocorresponde inteiramente à verdade, pois que, os autos não foram suspensos por inércia das partes, mas por exclusiva culpa dos AA. que se desleixaram no registo da acção de preferência, dando origem à celebração da escritura de Compras e Vendas e Permutas de 21-03-2007;

10ª No que respeita á matéria do nº 31 dos factos provados também não corresponde inteiramente á verdade que os AA. tenham registado a acção de preferência nº ... e só esta, já que na sequência de um articulado superveniente e de Intervenção Provocada deduzidos pelos AA. em data posterior a 23-4-2007 os mesmos AA. registaram em todas as fracções adquiridas pelos ora RR., a nulidade e ineficácia da escritura de 21-3-2007, a intervenção de terceiros, o cancelamento de registos e um pedido subsidiário para que lhes fosse concedido o direito de preferência sobre as fracções alienadas nesta escritura, registo este que viria a ser recusado (doc. nºs 4 e 5 da P.i.)” ;

U- Questões/conclusões, que o acórdão recorrido apreciou e decidiu nos termos seguintes:

“(…) Relativamente à contradição entre o facto nº 22 e os documentos juntos, entende-se que os apelantes colocam em causa o valor probatório atribuído pelo tribunal recorrido aos documentos, pelo que se impõe a análise da mencionada impugnação da matéria de facto. E fazendo-o, dir-se-á que não assiste qualquer razão aos apelantes. Na verdade, o facto nº 22 (22 - No dia 01 de Março de 2007, a acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05 foi remetida à conta, por inércia das Partes) corresponde exactamente ao que se passou naqueles autos, sendo a menção pretendida pelos apelantes, no sentido da inércia se dever aos ali AA., uma valoração da tramitação processual, que não deve ser transposta para a factualidade assente.

No que se refere ao facto nº 31, há que referir que o mesmo se limita a referir que no dia 4 de Julho de 2007 foi registada a acção, o que corresponde a uma mera descrição factual, não se apreendendo da argumentação dos apelantes qual o sentido da alteração de facto pretendida, nem sequer os motivos para a mesma.

Consequentemente, improcede também este segmento da apelação. (…)”.

V- Face a todo o exposto, as alegações do recurso de revista apresentadas pelos os 2º 3º 8º e 9º RR: Par-Co-Participação Comerciais Ldª; JJ; Leopor – Imobiliária Ldª; LP..., S.A.; carecem fundamentação, de facto e de direito.

W- Pelo que, o douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, que confirmou, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, o despacho saneador-sentença proferido pelo Tribunal de instância, de 15/10/2014 não deverá qualquer juízo de censura ou de revogabilidade por parte deste douto Supremo Tribunal de Justiça.

FACTOS PROVADOS.

1 - No dia 29 de Novembro de 2000, por meio de uma escritura notarial de «COMPRA E VENDA», lavrada no 8º Cartório Notarial de ..., que aqui se dá por integralmente reproduzida, HH (aqui 1º co-Réu), em nome próprio e como mandatário de PP, comprou a este, por Esc. 22.200.000$00, o prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número ..., composto de ..., ... e ..., descrito na 3ª Conservatória do Registo Predial de ... sob o número ..37 - ..., inscrito na matriz da freguesia de ... sob o artigo ..08.

2 - No mesmo dia 29 de Novembro de 2000, por meio de uma escritura notarial de «COMPRA E VENDA», lavrada no 8º Cartório Notarial de ..., que aqui se dá por integralmente reproduzida, HH e mulher, II (aqui 1ºs co-Réus), venderam, por Esc. 14.800.000$00, a B..., Lda. dois terços do mesmo prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número

3 - A aquisição referida do facto anterior foi inscrita na Conservatória do Registo Predial de ... a favor de B..., Lda. pela AP. 17 de 2000/12/22, conforme certidão predial permanente que aqui se dá por integralmente reproduzida.

4 - Após os Autores terem recebido do aqui 1º co-Réu (HH) a comunicação escrita de 04 de Dezembro de 2000 (onde lhes dizia que «a escritura para meu nome foi feita em 29/11/2000 e tive de vender dois terços do prédio à B..., Lda. (…). De imediato irei fazer obras no meu andar e, conjuntamente com a B..., Lda., iremos fazer obras nas partes comuns do prédio. Findas as obras estaremos abertos a vender aos inquilinos as fracções que habitam»), afixaram, em cada uma das janelas do ... que ladeiam a porta de entrada do prédio, um placar escrito, onde se lia «A venda deste prédio está em litígio, por não ter sido dado aos inquilinos o direito de preferência na compra do mesmo», estando o mesmo ali desde o início de 2001.

5 - No dia 29 de Maio de 2001, AA e marido BB (aqui 1ºs co-Autores), NN e OO - falecida na sua pendência, tendo sido habilitados como seus sucessores CC, EE, WW, DD e FF (aqui 2º, 3º, 4º, 5º e 6º co-Autores) -, propuseram uma acção de preferência contra PP, contra HH e mulher, II (aqui 1ºs co-Réus), e contra B..., Lda. - esta última substituída na pendência da causa pelos seus sócios Par - co-Participações Comerciais Ldª e JJ (aqui 2ª co-Ré e 3º co-Réu, respectivamente) - , a qual correu termos pela 1ª Vara Cível de ..., ...ª Secção, com o nº ..., depois nº 9.954/01.9...

6 - Na acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, os respectivos Autores formularam os seguintes pedidos:

. a título principal - que fosse reconhecido às aí Autoras o direito de preferência na transmissão do direito de propriedade do aí réu PP para os réus HH e mulher, II, sendo elas próprias investidas na posição destes últimos, para haverem para si o prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número ..., composto de ..., ... e ..., descrito na 3ª Conservatória do Registo Predial de ... sob o número ..37 - ... e inscrito na matriz da freguesia de ... sob o artigo ..08, ordenando-se o cancelamento dos registos antes efectuados, sendo-lhes ainda entregues as rendas dos locados, vencidas e vincendas;

. a título subsidiário - em primeiro lugar, e para o caso do réu HH provar a sua legitimidade para preferir, pediram que se abrisse o processo de licitação para que fosse então reconhecido aos Arrematantes o direito de preferência, com direito de haverem para eles, através de substituição, o identificado prédio, ordenando-se o cancelamento dos registos que foram efectuados, e sendo as rendas dos locados - vencidas e vincendas - entregues a quem fosse reconhecido o direito de preferência; em segundo lugar (e também subsidiariamente), pediram que se reconhecesse às ali Autoras o direito de preferência na transmissão de uma quota de dois terços do direito de propriedade do identificado prédio, sendo as mesmas investidas na posição da ali ré B..., Lda., para efeitos de haverem para elas essa quota, ordenando-se o cancelamento dos registos que foram efectuados e sendo-lhes entregues as rendas dos locados, vencidas e vincendas.

7 - No dia 21 de Junho de 2001, por escritura pública de «CONSTITUIÇÃO DE PROPRIEDADE HORIZONTAL», lavrada no 8º Cartório Notarial de ..., que aqui se dá por integralmente reproduzida, HH e mulher, II (aqui 1ºs co-Réus), e os Legais Representantes de B..., Lda., constituíram em propriedade horizontal o prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número ..., dando origem a 06 fracções autónomas («A» - «B» - «C» - «D» - «E» e «F»).

8 - A constituição da propriedade horizontal sobre o prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número ..., encontra-se inscrita na Conservatória do Registo Predial de ... pela AP. 18 de 2001/07/04.

9 - Na acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, os respectivos Réus contestaram-na (fazendo-o nomeadamente em 05 de Julho de 2001), da seguinte forma: PP - concluiu pela improcedência da acção, e pela condenação das ali Autoras como litigantes de má fé, em multa e em indemnização no valor de Esc. 800.000$00, e ainda no valor dos honorários pagos ao seu Advogado;

. HH e mulher, II, e B..., Lda. concluíram pela sua absolvição da instância, e pela condenação das ali Autoras como litigantes de má fé, em multa, em indemnização, e ainda no valor dos honorários pagos ao seu Advogado; e, para o caso de procedência da acção, deduziram reconvenção, pedindo a condenação dos Autores a pagarem-lhes a quantia de Esc. 18.312.225$00, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal, a título de despesas tidas com o prédio em discussão (v.g. impostos e taxas municipais -vencidos e vincendos -, custos notariais e registos), e obras nele realizadas, defendendo que «indubitavelmente valorizam o imóvel, pelo que constituiriam um enriquecimento sem causa se não fossem reembolsados em caso de vencimento da pretensão dos AA. – C civil, artº 473º e seguintes».

10 - Na acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, os respectivos Autores replicaram, concluindo pela improcedência das excepções, e pela procedência da reconvenção apenas em relação a benfeitorias úteis e necessárias, segundo as regras do enriquecimento sem causa.

11 - No dia 06 de Dezembro de 2001, por meio de uma escritura pública de «COMPRA E VENDA, MÚTUO COM HIPOTECA E FIANÇA», lavrada pelo 9º Cartório Notarial de ..., que aqui se dá por integralmente reproduzida, HH e mulher, II (aqui 1ºs co-Réus), e B..., Lda., venderam, pelo preço de Esc. 15.000$00 -equivalente a € 75.000,00 - a KK (aqui 4ª Ré), a fracção autónoma, designada pela letra «F», correspondente ao ... do prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número ....

12 - A fracção autónoma, designada pela letra «F», correspondente ao ... do prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número ..., encontra-se inscrita na Conservatória do Registo Predial de ..., e na matriz predial urbana, a favor de KK (aqui 4ª Ré), pela AP. 7 de 2001/09/26, tendo o registo sido inicialmente lavrado como provisório, em 26 de Setembro de 2001, e depois convertido em definitivo, em 21 de Fevereiro de 2002, conforme teor de certidão predial permanente e de caderneta predial urbana respectiva, que aqui se dão por integralmente reproduzidas.

13 - No dia 19 de Fevereiro de 2002, por meio de uma escritura pública de «COMPRA E VENDA», lavrada pelo 16º Cartório Notarial de ..., que aqui se dá por integralmente reproduzida, HH e mulher, II (aqui 1ºs co-Réus), e B..., Lda., venderam, pelo preço de € 68.584,00, a LL (aqui 6ª Ré), a fracção autónoma, designada pela letra «D», correspondente ao ... do prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número ....

14 - A fracção autónoma, designada pela letra «D», correspondente ao ... do prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número ..., encontra-se inscrita na Conservatória do Registo Predial de ..., e na matriz predial urbana, a favor de LL (aqui 6ª Ré), pela AP. 15 de 2001/12/21, tendo o registo sido inicialmente lavrado como provisório, em 21 de Dezembro de 2001, e depois convertido em definitivo, em 19 de Junho de 2002, conforme teor de certidão predial permanente e de caderneta predial urbana respectivas, que aqui se dão por integralmente reproduzidas.

15 - Antes da aquisição das fracções «D» e «F» do prédio em causa, respectivamente pela 4ª Ré (KK) e pela 6ª Ré (LL), estas estiveram no local.

16 - No dia 07 de Novembro de 2002, foi registada a acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, pela AP. 6 de 2002/11/07, ficando porém o registo como provisório, por natureza e dúvidas, tendo a Srª Conservadora do Registo justificado o seu entendimento por despacho de 27 de Novembro de 2002, onde nomeadamente se lê: «implicando a procedência da acção que os actos de propriedade horizontal e das consequentes transmissões das fracções autónomas e das suas hipotecas serão ineficazes relativamente aos preferentes, tal acção só será registável quando a decisão a proferir se mostre também oponível aos titulares inscritos ainda que de direitos decorrentes dos referentes actos (devendo ser demandados na acção), o que, por outro lado, implica a ampliação dos pedidos formulados no sentido de que a decisão final venha a declarar a ineficácia de todos os citados actos».

17 - No dia 20 de Maio de 2004, caducou o registo da acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, pela AP. 6 de 2002/11/07.

18 - Na acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, findos os articulados foi proferido despacho saneador, em que se decidiu: admitir a reconvenção; julgar improcedente a excepção da ilegitimidade dos ali autores AA e marido, BB; julgar procedente a excepção da ilegitimidade do ali réu PP, quanto ao pedido subsidiário referido na al. c) do seu petitório final, sendo em consequência absolvido da respectiva instância; julgar que nada mais obstava ao conhecimento do mérito da causa; julgar improcedente a excepção da caducidade da acção; julgar improcedente a acção e, consequentemente, absolver os ali Réus dos pedidos, desse modo não conhecendo do pedido reconvencional.

19 - Na acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, tendo os ali Autores interposto recurso da decisão referida no facto anterior (invocado, nomeadamente, a sua nulidade, nos termos da al. b) do nº 1 do art. 668º do C.P.C.), foi proferido despacho, nos termos dos arts. 668º, nº 1, al. b) e nº 4, e 744º, ambos do C.P.C., que declarou nula e de nenhum efeito a aludida decisão, na parte em que, julgando improcedente a acção, absolveu os ali Réus dos pedidos.

20 - Na acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, prosseguindo os autos, em audiência preliminar proferiu-se novo despacho saneador, em que se decidiu: julgar improcedente a excepção da ilegitimidade dos ali autores AA e marido, BB; julgar prejudicada a apreciação da excepção da ilegitimidade do réu PP quanto ao pedido subsidiário referido na al. c); relegar para final o conhecimento da excepção da caducidade da acção; e organizar a selecção da matéria de facto, com elaboração de base instrutória.

21 - No dia 12 de Janeiro de 2006, e tendo a respectiva instância estado já antes suspensa - com fundamento na falta de registo da acção - realizou-se a primeira sessão da audiência de julgamento da acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, vindo a mesma a ser declarada novamente suspensa na sessão de julgamento do dia 02 de Fevereiro de 2006, por comprovada falta de registo da acção.

22 - No dia 01 de Março de 2007, a acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05 foi remetida à conta, por inércia das Partes.

23 - JJ (aqui 3º co-Réu) foi um dos sócios de B..., Lda., desde a sua constituição, registada em 10 de Dezembro de 1999, tendo a mesma Sociedade sido posteriormente dissolvida e encerrada a sua liquidação, factos registados em 27 de Dezembro de 2007 (conforme certidão permanente respectiva, que é fls. 172 e 173 dos autos, e que aqui se dá por integralmente reproduzida).

24 - XX foi gerente de B..., Lda., desde a sua constituição (conforme certidão permanente respectiva, que é fls. 172 e 173 dos autos, e que aqui se dá por integralmente reproduzida).

25 - XX é sócio e gerente de Par-co-Participações Comerciais, Lda. (aqui 2ª co-Ré), desde a sua constituição, registada em 02 de Setembro de 1988 (conforme certidões permanentes respectivas, que é fls. 181 a 184, e fls. 221 a 227, e que aqui se dão por integralmente reproduzidas).

26 - XX foi gerente de Leopor - Imobiliária, Lda. (aqui 8ª co-Ré), desde a sua constituição, registada em 30 de Janeiro de 2003, até 07 de Fevereiro de 2006, data em que renunciou à gerência (conforme certidões permanentes respectivas, que são fls. 179 e 180, e fls. 229 a 232, e que aqui se dão por integralmente reproduzidas).

27 - JJ (aqui 3º co-Réu) foi Presidente do Conselho de Administração, e Administrador Delegado, de LP..., S.A. (aqui 9ª co-Ré), desde a sua constituição, registada em 01 de Junho de 2000 (conforme certidão permanente respectiva, que é fls. 174 a 178 dos autos, e que aqui se dá por integralmente reproduzida).

28 - No dia 21 de Março de 2007, por meio de uma escritura pública de «COMPRAS E VENDAS E PERMUTAS», lavrada no Cartório Notarial da licenciada YY, que aqui se dá por integralmente reproduzida, reportada às fracções autónomas designadas pelas letras «A» (correspondente ao ... direito), «B» (correspondente ao ... esquerdo), «C» (correspondente ao ...) e «E» (correspondente ao ...) do prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número ..., os Legais Representantes de B..., Lda. venderam, pelo preço global de € 60.000,00, a LP..., S.A. (aqui 9ª co-Ré), os seguintes imóveis:

. por € 15.000,00, um terço da fracção autónoma designada pela letra «A» (correspondente ao ... direito);

. por € 15.000,00, um terço da fracção autónoma designada pela letra «B» (correspondente ao ... esquerdo);

. por € 15.000,00, um terço da fracção autónoma designada pela letra «C» (correspondente ao ...);

. por € 15.000,00, um terço da fracção autónoma designada pela letra «E» (correspondente ao ...).

29 - No dia 21 de Março de 2007, por meio da mesma escritura pública de «COMPRAS E VENDAS E PERMUTAS», lavrada no Cartório Notarial da licenciada YY, já integralmente dada por reproduzida, reportada às fracções autónomas designadas pelas letras «A» (correspondente ao ... direito), «B» (correspondente ao ... esquerdo), «C» (correspondente ao ...) e «E» (correspondente ao ...) do prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número ..., os Legais Representantes de B..., Lda. venderam, pelo preço global de € 60.000,00, a LEOPOR -Imobiliária, Lda. (aqui 8ª co-Ré), os seguintes imóveis:

. por € 15.000,00, um terço da fracção autónoma designada pela letra «A» (correspondente ao ... direito);

. por € 15.000,00, um terço da fracção autónoma designada pela letra «B» (correspondente ao ... esquerdo);

. por € 15.000,00, um terço da fracção autónoma designada pela letra «C» (correspondente ao ...);

. por € 15.000,00, um terço da fracção autónoma designada pela letra «E» (correspondente ao ...).

30 - No dia 21 de Março de 2007, por meio da mesma escritura pública de «COMPRAS E VENDAS E PERMUTAS», lavrada no Cartório Notarial da licenciada YY, já integralmente dada por reproduzida, reportada às fracções autónomas designadas pelas letras «A» (correspondente ao ... direito), «B» (correspondente ao ... esquerdo), «C» (correspondente ao ...) e «E» (correspondente ao ...) do prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número ...:

. HH e II (aqui 1ºs co-Réus) cederam, pelo valor de € 22.500,00, a LEOPOR - Imobiliária, Lda. (aqui 8ª co-Ré), um terço da fracção autónoma designada pela letra «B» (correspondente ao ... esquerdo);

. e, em troca, LEOPOR - Imobiliária, Lda. (aqui 8ª co-Ré) cedeu, pelo valor de € 22.500,00, a HH e II (aqui 1ºs co-Réus), um terço da fracção autónoma designada pela letra «E» (correspondente ao ...), que aquela havia adquirido pela mesma escritura.

31 - No dia 21 de Março de 2007, por meio da mesma escritura pública de «COMPRAS E VENDAS E PERMUTAS», lavrada no Cartório Notarial da licenciada YY, já integralmente dada por reproduzida, reportada às fracções autónomas designadas pelas letras «A» (correspondente ao ... direito), «B» (correspondente ao ... esquerdo), «C» (correspondente ao ...) e «E» (correspondente ao ...) do prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número ...:

. HH e II (aqui 1ºs co-Réus) cederam, pelo valor de € 22.500,00, a LP..., S.A. (aqui 9ª co-Ré), um terço da fracção autónoma designada pela letra «A» (correspondente ao ... direito);

. e, em troca, LP..., S.A. (aqui 9ª co-Ré) cedeu, pelo valor de € 22.500,00, a HH e II (aqui 1ºs co-Réus), um terço da fracção autónoma designada pela letra «E» (correspondente ao ...), que aquela havia adquirido pela mesma escritura.

32 - No dia 21 de Março de 2007, por meio da mesma escritura pública de «COMPRAS E VENDAS E PERMUTAS», lavrada no Cartório Notarial da licenciada YY, já integralmente dada por reproduzida, reportada às fracções autónomas designadas pelas letras «A» (correspondente ao ... direito), «B» (correspondente ao ... esquerdo), «C» (correspondente ao ...) e «E» (correspondente ao ...) do prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número ...:

. LEOPOR - Imobiliária, Lda. (aqui 8ª co-Ré) cedeu, pelo valor de € 22.500,00, a LP..., S.A. (aqui 9ª co-Ré), um terço da fracção autónoma designada pela letra «A» (correspondente ao ... direito), que aquela havia adquirido pela mesma escritura;

. e, em troca, LP..., S.A. (aqui 9ª co-Ré) cedeu, pelo valor de € 22.500,00, a LEOPOR - Imobiliária, Lda. (aqui 8ª co-Ré), um terço da fracção autónoma designada pela letra «B» (correspondente ao ... esquerdo), que aquela havia adquirido pela mesma escritura.

33 - As alienações e permutas referidas nos factos enunciados sob os números 28 a 32, deram origem às seguintes inscrições prediais:

. fracção autónoma designada pela letra «A» (correspondente ao ... esquerdo) - a favor de LEOPOR - Imobiliário, Lda. (aqui 8ª co-Ré), pela AP. 7 de 2007/04/13;

. fracção autónoma designada pela letra «A» (correspondente ao ... direito) - a favor de LP..., S.A. (aqui 9ª co-Ré), pela AP. 10 de 2007/04/13 e pela AP. 13 de 2007/04/13;

. fracção autónoma designada pela letra «B» (correspondente ao ... esquerdo) - a favor de LEOPOR - Imobiliário, Lda. (aqui 8ª co-Ré), pela AP. 20 de 2007/03/23 e pela AP. 21 de 2007/03/23;

. fracção autónoma designada pela letra «C» (correspondente ao ...) -a favor de LEOPOR - Imobiliário, Lda. (aqui 8ª co-Ré), pela AP. 19 de 2007/03/23;

. fracção autónoma designada pela letra «C» (correspondente ao ...) -a favor de LP..., S.A. (aqui 9ª co-Ré), pela AP. 11 de 2007/04/13;

. fracção autónoma designada pela letra «E» (correspondente ao ...) – a favor de LEOPOR - Imobiliário, Lda. (aqui 8ª co-Ré), pela AP. 8 de 2007/04/13;

. fracção autónoma designada pela letra «E» (correspondente ao ...) – a favor de LP..., S.A. (aqui 9ª co-Ré), pela AP. 12 de 2007/04/13;

. fracção autónoma designada pela letra «E» (correspondente ao ...) – a favor de HH e II (aqui 1ºs co-Réus), pela AP. 2 de 2007/04/24.

34 - Todos os alienantes e adquirentes das então fracções autónomas designadas pelas letras «A», «B», «C» e «E» do prédio urbano correspondente ao nº 19, da Travessa ..., em ..., tinham - à data de realização das ditas alienações e aquisições - pleno conhecimento da existência do litígio entre os Autores e o antigo senhorio do prédio, PP, os ora 1ºs Réus (HH e mulher, II) e B..., Lda., e absoluto conhecimento da propositura e prosseguimento da acção de preferência referida no facto provado enunciado sob o número 05.

35 - As alienações e permutas das fracções autónomas designadas pelas letras «A», «B», «C» e «E» do prédio urbano correspondente ao nº 19, da Travessa ..., em ..., pelos 1ºs co-Réus (HH e mulher, II) e B..., Lda., às aqui 8ª co-Ré (Leopor - Imobiliária, Lda.) e 9ª co-Ré (LP..., S.A.), e destas àqueles, teve como objectivo o impedir o efeito substantivo da procedência da acção de preferência referida no facto provado enunciado sob o número 05.

36 - No dia 24 de Abril de 2007, os Autores da acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05 apresentaram na mesma um articulado superveniente, dando notícia do referido nos factos enunciados sob os números 23 a 28, e pedindo: a declaração de nulidade da escritura pública de 21 de Março de 2007, por alegada simulação, bem como o cancelamento dos registos efectuados em consequência da mesma; ou, subsidiariamente, o reconhecimento do seu direito de preferência no negócio havido.

37 - No dia 09 de Maio de 2007, os Autores da acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, invocando os factos referidos nos factos enunciados sob os números 23 a 28, apresentaram na mesma num requerimento:

. de intervenção principal provocada, por forma a fazer intervir na mesma XX e ZZ (aqui 3º co-Réu), - ao terem actuado em representação de B..., Lda. -, LL (aqui 6ª Ré), KK (aqui 4ª Ré), Caixa Geral de Depósitos, S.A. (antes aqui 5ª Ré), e HH mulher, II (aqui 1ºs co-Réus);

. de redução do pedido inicial, por forma a eliminar o pedido de cancelamento dos registos a favor dos ali réus HH e mulher, II (aqui 1ºs co-Réus), e B..., Lda..

38 - No dia 04 de Julho de 2007, foi registada a acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, pela AP. 26 de 2007/07/04, ficando porém o registo como provisório, por natureza.

39 - No dia 31 de Janeiro de 2008, na acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05 foi proferido despacho, declarando cessada a suspensão da respectiva instância.

40 - No dia 05 de Novembro de 2008, na acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, foi proferido despacho:

. a rejeitar, por extemporâneo, a intervenção principal provocada, formulada pelos ali Autores em 09 de Maio de 2007;

. a admitir a redução do pedido formulada pelos ali Autores em 09 de Maio de 2007, eliminando o pedido de cancelamento dos registos a favor dos ali réus HH e mulher, II (aqui 1ºs co-Réus), e B..., Lda..

41 - No dia 13 de Janeiro de 2008, na acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, concluiu-se a realização da respectiva audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual foi indeferido o articulado superveniente que os ali Autores tinham apresentado em 24 de Abril de 2007; e foi proferida sentença, julgando a acção improcedente, por não provada, absolvendo os ali Réus dos pedidos, julgando prejudicado o conhecimento do pedido reconvencional.

42 - Na acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, os ali Autores interpuseram recurso de apelação da decisão referida no facto anterior, e os ali réus HH e mulher, II, e AAA, interpuseram recurso subordinado.

43 - Na acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, foi proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa, que julgou improcedente o recurso principal, e não tomou conhecimento do recurso subordinado.

44 - No dia 12 de Janeiro de 2012, na acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, e mercê de recurso interposto pelos ali Autores da decisão referida no facto anterior, foi proferido Acórdão - transitado em julgado no dia 30 de Janeiro de 2012 -, julgando procedente, por provado, o segundo pedido subsidiário formulado pelos ali Autores, e não conhecendo o recurso subordinado dos Réus, por ter sido julgado deserto, acórdão cujo teor aqui dá por integralmente reproduzido, e onde nomeadamente se lê:

«(…)

B) Os Factos

São os seguintes os factos dados como provados pelas instâncias:

1 - As autoras são inquilinas do ... direito, ... esquerdo e primeiro direito, respectivamente, do prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número ..., composto de ..., ... e ..., descrito na 3ª Conservatória do Registo Predial de ... sob o número ..37-... e inscrito na matriz da freguesia de ... sob o artigo ..08, nos termos que constam do documento nº 1 junto com a petição inicial que se dá por reproduzido;

2 - Os contratos de arrendamento das autoras duram há mais de vinte anos, cada um;

3- Por carta datada de 4/10/2000, o réu PP notificou as autoras para, querendo, exercerem o direito de preferência na venda do prédio, nos termos que constam do documento nº 2 junto com a petição inicial que se dá por reproduzido;

4 - Nos termos desta notificação para preferência, o preço era de 22.000.000$00 (vinte e dois milhões de escudos) e a compradora era a S..., Lda.;

5 - Acrescentava a notificação que o réu PP constituía procurador o réu HH referindo-se que “qualquer assunto relacionado com esta carta, deverá ser tratado directamente com o Exmo. Sr. HH, na Rua ..., ..., ... andar (…)”;

6 - As autoras comunicaram a intenção de exercerem o direito de preferência, por cartas datadas de 12 e 16 de Outubro de 2000, nos termos que constam dos documentos nºs 3 e 4 juntos com a petição inicial que se dão por reproduzidos;

7 - No documento nº 3 junto com a petição inicial solicita-se ao réu HH que “(…) nos informe se a venda em apreço, será feita livre de quaisquer ónus, e que, como encargos só tem os arrendamentos dos andares a que corresponde o primeiro andar direito e o segundo andar direito”;

8- As inquilinas NN e AA, pretendiam, conjuntamente, exercer o aludido direito de preferência;

9 - O réu PP entregou ao réu HH o original do documento junto a fls. 74, que aqui se dá por integralmente reproduzido, mas através do qual o informa pretender exercer direito de preferência;

10 - O réu HH remeteu ao réu PP o documento junto a fls. 75, que aqui se dá por integralmente reproduzido, mas através do qual o informa pretender exercer direito de preferência;

11 - Por carta datada de 20/10/2000, o réu PP informou as autoras que quatro inquilinos tinham exercido o direito de preferência e que iria proceder a uma licitação, nos termos que constam do documento nº 5 junto com a petição inicial que se dá por reproduzido;

12 - O réu PP, no documento nº 5 junto com a petição inicial (último parágrafo), refere que “em relação à V/ questão, o prédio é vendido livre de quaisquer ónus, e como encargos tem os arrendamentos do ... e ... – ... e o ... e ...”;

13 - O réu PP, até à carta datada de 20/10/2000, cuja cópia foi junta a fls. 29, nunca tinha feito qualquer referência à existência de um inquilino no ...;

14 - A reunião de 26/10/2000 teve lugar com vista à realização das licitações;

15 - Na reunião de 26/10/2000, as autoras obtiveram a confirmação de que o quarto preferente não era a Srª. Dª. BBB, inquilina do ..., mas sim o réu HH;

16 - O réu HH, antes da reunião de 26/10/2000, nunca fora visto no prédio pelos seus habitantes;

17 - O ... estava desabitado há quatro anos;

18 - As autoras recusaram-se a licitar com o réu HH;

19 - Quando as autoras colocaram em causa a legitimidade do réu HH para licitar, o réu PP informou que aquele era inquilino do ...;

20 - Na reunião de 26/10/2000, nem o réu PP, nem o réu HH exibiram um contrato de arrendamento às autoras;

21 - Por não ter sido exibido às autoras contrato de arrendamento celebrado entre o réu PP e o réu HH, aquelas recusaram-se a negociar com este e abandonaram a reunião;

22 - A autora AA chegou a ver uma folha de papel branco, onde supostamente estava firmado o contrato de arrendamento entre o réu PP e o réu HH;

23 - A renda que constava no documento apresentado à autora AA era de 10.000$00 (dez mil escudos);

24 - A autora AA teve dúvidas sobre a licitude do documento referido no nº 22;

25 - O mesmo não tinha qualquer prova de apresentação nas finanças;

26 - As autoras NN e OO nunca viram o papel referido no nº 22;

27 - As autoras abandonaram a reunião e recusaram-se a proceder à licitação;

28 - As autoras receberam, após a reunião, uma carta do réu PP, com uma acta da reunião de 26/10/2000, nos termos que constam do documento nº 6 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido;

29 - Por carta de 22/11/2000, as autoras impugnaram o conteúdo da referida acta da reunião, nos termos que constam do documento nº 8 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido;

30 - O réu PP respondeu, por carta de 28/11/2000, negando a falsidade da acta, nos termos que constam do documento nº 8 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido;

31 - O réu PP no último parágrafo do documento nº 8 junto com a petição inicial afirma que “ o Sr. Florindo sempre pretendeu vender ou parte do imóvel, ou todas as fracções, porque as sua posses não vão além da possibilidade de ficar com o andar arrendado (…)”;

32 - Por escritura de 29/11/2000 o réu HH, em nome próprio e como mandatário do réu PP, celebrou o contrato de compra e venda, pelo qual comprou o prédio ao réu PP por 22.200.000$00 (vinte e dois milhões e duzentos mil escudos), nos termos que constam na certidão junta como documento nº 9 da petição inicial, que se dá por reproduzido;

33 - Por escritura de 29/11/2000 os réus HH e mulher, II, venderam à ré B..., Lda., dois terços do prédio, pelo de 14.800.000$00 (catorze milhões e oitocentos mil escudos), nos termos que constam na certidão junta como documento nº 10 da petição inicial, que se dá por reproduzido;

34 - Os réus HH e mulher, II não notificaram as autoras para, querendo, exercerem o direito de preferência no negócio aludido no nº 33;

35 - O réu HH enviou à autora AA a comunicação escrita cuja cópia foi junta a fls. 44 e se dá por reproduzida, a qual está datada de 4/12/2000, onde consta “a escritura para meu nome foi feita em 29/11/2000 e tive de vender dois terços do prédio à B..., Lda. (…). De imediato irei fazer obras no meu andar e, conjuntamente com a B..., Lda., iremos fazer obras nas partes comuns do prédio. Findas as obras estaremos abertos a vender aos inquilinos as fracções que habitam (…)”;

36 - No dia 4/12/2000, por carta que enviou à autora AA, o réu HH afirma que: “ como estava interessado apenas no meu andar e não tinha dinheiro para tudo, tive que arranjar alguém que me financiasse”, nos termos que constam na certidão junta como documento nº 11 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzido;

37 - As autoras tiveram conhecimento das transmissões quando obtiveram as certidões das escrituras de compra e venda juntas como documentos nºs 9 e 10 da petição inicial;

38 - Os réus HH e mulher, II, e a ré B..., Lda., realizaram despesas com a sisa, escrituras, registo predial, ramal de electricidade e contribuição autárquica, todas relativas ao imóvel identificado no nº 1, no valor de 1.780.447$00;

39 - O prédio está degradado tendo os réus HH e mulher, II, e a ré B..., Lda., resolvido fazer obras, o que o réu HH comunicou à autora AA em 4/12/2000;

40 - As obras foram adjudicadas e estão a ser executadas desde Março de 2001, o que os autores sabem;

41 - Foram adjudicadas à firma J..., S.A., nos termos que constam dos documentos juntos a fls. 103/114, que se dão por reproduzido;

42 - As obras que se encontram a ser realizadas nas partes comuns e ... importam em 16.860.000$00, acrescidos de IVA, e as obras que se encontram a ser realizadas no ... importam em 3.800.000$00, acrescidos de IVA;

43 - As obras estão executados em 70% (incluindo IVA), nos termos que constam dos documentos juntos a fls. 115/120, que se dão por reproduzido;

44 - Na procuração forense, subscrita por AA e seu marido ao Dr. CCC Cabral, está indicado o domicílio na Rua ..., nº ..., ..., ....

Por escritura de 29/11/2000 o réu HH, em nome próprio e como mandatário do réu PP, celebrou o contrato de compra e venda, pelo qual comprou o prédio ao réu PP por 22.200.000$00, o prédio urbano sito em ..., na Travessa ..., número ..., composto de ..., ... e ..., descrito na 3ª Conservatória do Registo Predial de ... sob o número ..37 – ... e inscrito na matriz da freguesia de ... sob o artigo ..08.

Por escritura de 29/11/2000 os réus HH e mulher, II, venderam à ré B..., Lda., dois terços do prédio, pelo de 14.800.000$00”.

C) O Direito I - Agravo:

Os RR HH, mulher e outro agravaram do acórdão da Relação que julgou deserto o seu recurso de revista subordinado por não apresentação atempada das respectivas alegações.

(…)

Tendo os aqui recorrentes apresentado as alegações, do recurso subordinado, nos trinta dias após a notificação das alegações dos recorrentes principais é evidente que se encontra deserto aquele recurso por intempestividade na apresentação das mesmas, não merecendo qualquer reparo o acórdão da Relação que não violou nenhuma das normas invocadas pelos recorrentes.

Nessa conformidade, sem necessidade de mais considerandos, acórdão os Juízes do Supremo Tribunal de Justiça em julgar improcedente o agravo confirmando o douto acórdão recorrido.

(…)

II - Revista:

1º - Recurso das AA:

Delimitado o thema decidendum temos que no presente recurso está em apreciação se às AA assiste ou não direito de preferência na compra do imóvel de que são arrendatárias e, em caso afirmativo, decidir-se das consequências jurídicas do exercício de tal direito.

(…)

Em conclusão, e de acordo com a jurisprudência prevalente do STJ, temos que a preferência existe para a fracção autónoma arrendada, no caso do prédio estar constituído em propriedade horizontal, ou para todo o imóvel se este não estiver legalmente parcelado, uma vez que não havendo parcela autónoma, a preferência não pode incidir, apenas sobre a parte arrendada, não sendo de interpretar restritivamente o art. 47º, nº 1 do RAU. A preferência na compra e venda de todo o imóvel pode ser em concorrência com outros eventuais locatários (por todos Ac. STJ 1842/04.3TVPRT.S1 de 12.11.2009, in ITIJ – acórdãos do STJ).

Decidindo-se, pois, que às AA assistia o direito de preferência na compra e venda da totalidade do prédio onde detinham o arrendamento vejamos, agora, quais as consequências jurídicas subsumíveis da prova produzida.

Retira-se desta que em 4/10/2000 o R PP notificou as AA para, querendo, exercerem a preferência na venda do prédio identificado nos autos tendo sido, para o efeito, indicado o nome da compradora e o preço porque era efectuada a venda.

As AA, por cartas datadas de 12 e 16 de Outubro de 2000, comunicaram a intenção de exercerem o direito de preferência.

O R PP constitui seu procurador o R HH que, por seu turno, declarou, ele também, pretender exercer o direito de preferência. Na sequência disso o R PP informou as AA, por carta de 20 de Outubro de 2000, que quatro inquilinos pretendiam exercer os respectivos direitos de preferência indo proceder-se a licitação, em reunião que se realizou em 26/10/2000.

As AA por razões que se prendem com a validade do contrato de arrendamento feito ao R HH recusaram-se a licitar o prédio dos autos e abandonaram a reunião. Foi-lhes, entretanto, dado conhecimento da acta da reunião após a efectuação desta, cujo conteúdo as AA impugnaram por carta de 22/11/2000.

De todo o acervo probatório retira-se, por um lado, que às AA foi comunicada, pelo senhorio, a intenção de vender o prédio onde aquelas eram locatárias bem como todos os elementos necessários ao exercício dos respectivos direitos de preferência, por outro, que lhes foi comunicada as condições em que a venda se realizou após a reunião de 26/10/2000. As AA entre 26/10/2000 e 22/11/2000 tiveram perfeito conhecimento dos elementos essenciais da alienação, não se encontrando minimamente provada a falsidade do contrato de arrendamento do R HH nem a falsidade da acta referente à reunião do dia 26/10/2000. Assim, tendo as AA tido conhecimento dos elementos essenciais da alienação, pelo menos em 22/11/2000, e tendo a acção de preferência sido proposta em 29/5/2001 encontra-se caducado, nos termos do art. 49º do RAU e 1410º, nº 1 do CC, o direito das AA quanto à preferência na venda do prédio dos autos feita ao R HH.

O mesmo não se dirá da venda efectuada em 29/11/2000 pelo RR HH e mulher II à R. B..., Lda., venda essa que não foi comunicada às AA para, também aqui, poderem exercer o seu direito de preferência. A A AA apenas teve conhecimento da realização da escritura supra referida por carta de 4/12/2000 que os RR HH e mulher lhe enviaram. As AA, resulta da prova produzida, tiveram conhecimento das transmissões agora efectuadas com a R B..., Lda., pelas certidões das escrituras de compra e venda.

Neste particular, está em tempo a acção de preferência interposta pelas AA quanto à transmissão de uma quota de dois terços do direito de propriedade do prédio identificado vendida à R B..., Lda. Na verdade sendo lícito às AA preferirem na totalidade do prédio conforme ficou explanado supra, tendo, agora, sido vendida apenas dois terços do prédio em causa a preferência opera, relativamente a elas, na base da quota parte vendida tendo por isso aquelas direito a haver para si a quota alienada.

O efeito substantivo da procedência da acção de preferência opera ex tunc, a partir do momento da celebração do negócio por ela atacado, sendo por isso procedente o segundo pedido subsidiário das AA a partir da data da celebração do negócio aqui posto em crise.

2º - Recurso dos RR:

Não há que tomar conhecimento do recurso subordinado de revista interposto pelos RR opor o mesmo ter sido julgado deserto.

Nesta conformidade, por todo o exposto, acordam os Juízes no Supremo Tribunal de Justiça em conceder revista parcial ao recurso dos AA e revogando o acórdão recorrido, julgar procedente por provado o segundo pedido subsidiário por elas formulado.

(…)».

45 - A presente acção foi intentada no dia 10 de Outubro de 2012, e registada no dia 18 de Outubro de 2012, pela Ap. 2892 de 2012/10/18, ficando porém o registo como provisório, por natureza.

46 - A instauração e pendência, quer do Processo nº ..., da ...ª Vara Cível de ..., ...ª Secção (depois Processo nº 9954/2001.9...), quer do presente, causaram aos Autores desgaste físico e sofrimento.

47 - LL (aqui 6ª Ré), nasceu no dia ... de ... de 1982, sendo filha de DDD e de EEE (conforme certidão de assento de nascimento respectivo, que é fls. 470 e 471 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida).

48 - A 6ª Ré (LL) adquiriu o ... do prédio urbano correspondente ao nº ..., da Travessa ..., em ..., para sua habitação própria e permanente.

49 - Desde 19 de Fevereiro de 2002, o ... do prédio urbano correspondente ao nº ..., da Travessa ..., em ..., é a única casa que a 6ª Ré (LL) possui como proprietária.

50 - A 6ª Ré (LL) casou civilmente com FFF, no dia 29 de Julho de 2005, vindo esse casamento a ser dissolvido por divórcio, por decisão de 04 de Novembro de 2009, transitada em julgado na mesma data (conforme certidão de assento de nascimento respectivo, que é fls. 470 e 471 dos autos, já dada por integralmente reproduzida).

51 - GGG nasceu no dia ... de ... de 2005, sendo registado como filho de FFF e de LL (conforme certidão de assento de nascimento respectivo, que é fls. 1692 dos autos, e que aqui se dá por integralmente reproduzida).

52 - Desde 19 de Fevereiro de 2002 até Janeiro de 2010, que a 6ª Ré (LL) viveu, permanente e ininterruptamente, no ... do prédio urbano correspondente ao nº ..., da Travessa ..., em ....

53 - Até ao início de 2010, e então por motivos relacionados com o seu divórcio, a 6ª Ré (LL) sempre manteve a sua vida familiar, recebeu os seus amigos, tomou as suas refeições e pernoitou no seu apartamento, no ... do prédio urbano correspondente ao nº ..., da Travessa ..., em ....

54 - Após o seu divórcio (em 04 de Novembro de 2009), a 6ª Ré (LL) ficou com o Filho menor a seu cargo, o que dificultou a sua vida pessoal.

55 - Após o seu divórcio (em 04 de Novembro de 2009), a 6ª Ré (LL) teve que procurar novo emprego.

56 - Mercê do referido nos factos anteriores, a 6ª Ré (LL) dependeu da ajuda da sua Mãe, com quem teve que passar a residir temporariamente, na Praceta ..., em ....

57 - Não obstante o referido no facto anterior, a 6ª Ré (LL) continuou a ter no apartamento correspondente ao ... do nº ..., da Travessa ..., em ..., a sua única casa.

58 - Desde a data em que a 6ª Ré (LL) adquiriu o ... do nº ..., da Travessa ..., em ..., foi e é ela quem pagou, e paga, as contribuições referentes ao mesmo, as despesas de condomínio, e os demais encargos com as partes comuns do prédio.

59 - Desde a data em que a 6ª Ré (LL) adquiriu o ... do nº ..., da Travessa ..., em ..., foi e é ela quem pagou, e paga, atempadamente o crédito que solicitou à Caixa Geral de Depósitos, S.A. para a aquisição do imóvel.

60 - Quando a 6ª Ré (LL) adquiriu o ... do nº ..., da Travessa ..., em ..., foi na convicção de que não existia qualquer direito ou litígio para além dos que estavam registados sobre o prédio.

61 - Desde a data em que adquiriu o ... do nº..., da Travessa ..., em ... (19 de Fevereiro de 2002) a 6ª Ré (LL) esteve sempre na convicção de que exercia um direito próprio, adquirido por título válido, e ignorando a existência de qualquer direito de Terceiro que fosse lesado com a sua posse.

62 - Inexiste qualquer grau de parentesco entre a 4ª Ré (KK) e XX.

63 - DDD e EEE - pais da aqui 6ª Ré (LL) - não têm qualquer relação de parentesco com XX.

Factos NÃO PROVADOS.

Da factualidade articulada pelas Partes, com interesse para a decisão das questões enunciadas, não se provaram os seguintes factos:

1’ - Os Autores tenham afixado o placar escrito, onde se lia «A venda deste prédio está em litígio, por não ter sido dado aos inquilinos o direito de preferência na compra do mesmo», logo que receberam do aqui 1º co-Réu (HH) a comunicação escrita de 04 de Dezembro de 2000 (onde lhes dizia que «a escritura para meu nome foi feita em 29/11/2000 e tive de vender dois terços do prédio à B..., Lda. (…). De imediato irei fazer obras no meu andar e, conjuntamente com a B..., Lda., iremos fazer obras nas partes comuns do prédio. Findas as obras estaremos abertos a vender aos inquilinos as fracções que habitam»).

2’ - A 4ª Ré (KK) e a 6ª Ré (LL) tenham lido o placar referido no artigo anterior antes da aquisição respectiva das fracções «D» e «F» do prédio em causa.

3’ - A 4ª Ré (KK) e a 6ª Ré (LL) tenham sido pessoalmente informadas e advertidas pelas Arrendatárias do prédio em causa, antes da respectiva aquisição das fracções «D» e «F» do mesmo, que haviam instaurado junto do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa uma acção de preferência, contra o seu antigo dono e senhorio, PP, e os seus então adquirentes, os aqui 1ºs co-Réus (HH e mulher, II), bem como a subadquirente destes, B..., Lda.

4’ - A 4ª Ré (KK) e a 6ª Ré (LL) apenas tenham servido de «testas de ferro» na alienação das fracções «D» e «F» do prédio em causa (com o claro objectivo de impedir o efeito substantivo do ganho de caso na acção de preferência referida no facto anterior).

5’ - Os Autores nunca tenham colocaram qualquer placard junto do prédio urbano correspondente ao nº ..., da Travessa ..., em ..., nomeadamente da sua fachada principal, onde se lesse: «A venda deste prédio está em litígio, por não ter sido dado aos inquilinos o direito de preferência na compra do mesmo».

6’- Sabendo os Autores desde 2002 da aquisição, pela 6ª Ré (LL), do ... do nº ..., da Travessa ..., em ..., nada a tenham informado relativamente à sua intenção de requererem a preferência.

Notificado o recorrente nos termos e para os efeitos do artigo 655º, nº 1, do Código de Processo Civil, veio o mesmo aos autos referir:

Os RR. ora recorrentes requereram recurso de revista normal com fundamento no disposto no artº 640º do CPC.

No entanto, verifica-se que o recurso apropriado é o de revista excepcional previsto no nº 1 al. a) e b) do artº 672º do CPC.

Com efeito, face à dupla conforme, estão em causa várias questões cuja apreciação, pela sua relevância jurídica é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, encontrando-se ainda em causa vários interesses de particular relevância social, como se afere pelas conclusões da revista, as quais se dão aqui por integralmente reproduzidas para todos os efeitos.

Na verdade, os RR. dedicam-se à compra e venda de propriedades e neste sentido adquiriram por compra em finais do ano de 2000 2/3 indivisos do prédio urbano sito na Travessa ... ... em ..., devidamente identificado nos autos, já que os arrendatários na ocasião ora, autores haviam abandonado, sem qualquer motivo aparente, a reunião de licitações para preferência.

Os 1ºs RR. e os ora recorrentes constituíram o prédio em questão em propriedade horizontal em 21-06-2001, com a finalidade de ser alienado por fracções

Os AA. arrendatários de algumas fracções intentaram uma acção de preferência contra os RR. na ...ª Vara Cível de ... ...ª Secção a que coube o Procº nº ... alegando a sua qualidade de preferentes por serem arrendatários habitacionais. Na data da propositura da acção esta entrou para além do prazo legal, verificando-se a caducidade (parcial), como se verifica pelo douto Ac. do STJ junto aos autos com a P.I..

Sucede que, ao fim de 6 (seis) anos o julgamento ainda não tinha sido realizado, dado os AA. não terem procedido ao registo da acção, tendo os autos ido por mais de uma vez à conta.

Mostrando-se os autos suspensos há mais de um ano, por incúria dos AA., dado não lograrem o registo da acção, e encontrando-se a Ré B..., Lda. detentora de 2/3 indivisos do citado prédio em situação económica muito complicada, à beira da insolvência, os RR., dado o impasse constituído na acção de preferência e a mora injustificada, legitimou-os a celebrarem em 21 de Março de 2007 uma escritura de compras e vendas e permutas correspondente a 2/3 indivisos do citado prédio dividindo as frações pelos mesmos, dado ninguém ser obrigado a permanecer infinitamente numa situação de impasse.

Os AA. viriam em meados de 2007, após pagamento das custas a dar prosseguimento à acção.

Realizado o julgamento, a douta sentença, absolveu os RR. do pedido, sentença esta confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

Foi, entretanto, junto aos autos um processo de habilitação de herdeiros por falecimento da A. OO.

Por último, o Supremo Tribunal de Justiça, atenta a excepção de caducidade deduzida pelos RR., deu parcial provimento ao recurso dos AA. concedendo-lhes o direito de preferência correspondente a apenas 2/3 indivisos do citado prédio urbano sito na Travessa ... nº ... em ....

Os AA., sabiam perfeitamente que o prédio já se encontrava desde meados de 2001 constituído em propriedade horizontal e assim se mantinha na data do trânsito em julgado do douto acórdão do STJ.

No ano de 2012 foram os RR. citados para a presente acção (1947/12) onde os AA. pedem a ineficácia da escritura pública de compras e vendas e permutas de 21-03-2007 e bem assim a ineficácia da escritura pública de constituição do prédio em propriedade horizontal, pedindo ainda uma indemnização por dano não patrimoniais, de €25.000,00.

Os RR. contestaram, impugnando toda a matéria, tendo no Saneador -Sentença sido julgada parcialmente provada a acção, declarando ineficaz a escritura de compras e vendas e permutas, declarando também ineficaz a escritura pública de constituição do prédio em propriedade horizontal.

Por último, foram os RR. condenados por sentança a pagar aos AA a quantia peticionada de €25.000,00 a título de danos não patrimoniais.

Os RR. recorreram para o Tribunal da Relação, o qual por douto acórdão confirmou, sem qualquer voto de vencido a sentença da 1ª instância.

Os RR. recorreram de revista normal para STJ . Porém pelos factos provados subsistem muitas questões que pela sua relevância jurídica necessitam de uma douta apreciação para a melhor aplicação do direito, sendo certo que, por envolver questões relacionadas com o arrendamento e direito de preferência da respectiva habitação do prédio constituído por escritura pública de 21-06-2001 em propriedade horizontal há mais de 10 anos e devidamente registada, veio a mesma a ser, com todo o respeito indevidamente, declarada ineficaz.

Foi alegada a caducidade do contrato de arrendamento por morte da arrendatária OO na pendência da acção de preferência, dado terem sido habilitados herdeiros que nunca viveram no local arrendado objecto da preferência, nos termos do disposto no artº 1051º al. d) do código civil.

No decorrer dos autos ocorreram indevidamente transmissões de direitos de preferência para terceiros ao arrepio do artº 420º do Código Cívil.

A declaração de nulidade ou anulação do negócio jurídico que respeite a bens imóveis não prejudica os direitos adquiridos sobre os mesmos bens , a título oneroso por terceiros de boa fé, como estabelece o artº 291º do código civil, sendo certo que, nos presentes autos os 4º e 6º RR. são terceiros de boa fé que não obtiveram ganho de causa, dado que a douta sentença confirmada pelo douto acórdão recorrido entendeu que, a protecção conferida ao terceiro adquirente de boa fé “reveste natureza excepcional não permitindo a sua aplicação analógica”.

Tal colide com o entendimento de Pires de Lima e Antunes Varela ( Código Cìvil anotado 3ª edição Pag.266) no que concerne ao artº 292º do CC, o qual versa sobre a questão da nulidade e anulação, salientando no ponto 2 que “o disposto neste artigo pode ser aplicado por analogia aos casos de ineficácia do negócio, ou àqueles em que haja pluralidade de negócios relacionados entre si.”

Deve ser analisada devidamente o pedido dos AA. de ineficácia da escritura pública de compras e vendas e permutas de 21-03-2007 por se encontrar caducado o direito dos AA. de obterem a respectiva ineficácia e bem assim no tocante á constituição do prédio em propriedade horizontal pela escritura pública celebrada em 21 de junho de 2001, carecendo de legitimidade para o efeito, dado que sendo apenas detentores de 2/3 indivisos do mesmo prédio pedem ilegalmente a ineficácia da mesma sem intervenção dos demais comproprietários detentores de 1/9 indivisos, desrespeitando o litisconsórcio necessário (artºs 30º a 33º do CPC) violando os interesses e direitos dos demais comproprietários, constituindo tal uma nulidade insuprível, invocada em qualquer altura.

Por outro lado, encontrando-se a escritura pública de propriedade horizontal registada há mais de 10 anos na data de propositura da acção, com conhecimento dos AA., caducou o direito de ser declarada ineficaz por uma das partes, sem o consentimento dos demais comproprietários.

Foram os RR. condenados em danos não patrimoniais aos AA. na quantia de €25.000,00 , por eventuais e ligeiros sofrimentos, sendo certo que, A. UU nem sequer vivia no arrendado, nem vive, tendo ocorrido o falecimento de duas Autoras antes da propositura da presente acção, sendo certo que, os eventuais sofrimentos não são passiveis de serem transmitidos por morte, para terceiros.

Estas questões constituem também interesses de relevância social com fundamento na vertente do arrendatário do prédio urbano ter direito de preferência para habitação própria num prédio urbano que foi constituído em propriedade horizontal para uns arrendatários, ficando indiviso para outros, sendo certo que uma das interessadas nem sequer reside permanentemente no arrendado.

No caso dos presentes autos, e nos termos em que foi apresentado o recurso de revista (normal) impede os recorrentes de obterem uma decisão de mérito levada ao conhecimento do Tribunal Superior.

O mesmo é dizer que, a decisão de não admissão do recurso constitui, com todo o respeito, uma violação do disposto no artº 20º da Constituição da República que consagra o direito a uma tutela de jurisdição efectiva e do direito fundamental a um processo judicial equitativo e justo.

Ficando ainda violados os princípios da adequação, igualdade e proporcionalidade consagrados nos artºs 2º, e 18º nº 2 da Lei Fundamental.

Nestes termos e nos de direito que V.Exª se dignará suprir e porque está em tempo, requerem a convolação do recurso de revista normal para recurso de revista especial com fundamento nas al. a) e b) do nº 1 do artº 672º do Código de Processo Civil, admitindo-se o recurso com estes fundamentos.

Apreciando liminarmente da admissibilidade da revista.

O acórdão recorrido, datado de 11 de Julho de 2024, confirmou integralmente, sem qualquer voto de vencido ou fundamentação essencialmente divergente, o decidido pela 1ª instância (quer no saneador-sentença de conhecimento parcial da causa proferido a 21 de Agosto de 2014 em que se ordenou o prosseguimento da lide para apreciação das matérias remanescentes, quer na sentença que veio a ser proferida em 22 de Janeiro de 2015) tendo decidido concretamente:

“- julgar a apelação interposta pelos 2º, 3º, 8º e 9ºRR. relativamente à decisão de 21-08-2014 e inserida no sistema CITIUS em 15-10-2014 improcedente, mantendo-se a decisão recorrida.

- julgar a apelação interposta pelos 2º, 3º, 8º e 9º RR. relativamente à decisão de 22-01-2015, mantendo-se a decisão recorrida.

- julgar a apelação interposta pelos 1ºs RR. relativamente à decisão de 22-01-2015, mantendo-se a decisão recorrida.

Custas da apelação interposta pelos 2º, 3º, 8º e 9º RR. relativamente à decisão de 21-08-2014 e inserida no sistema CITIUS em 15-10-2014 pelos apelantes, cfr. art. 527º do CPC”.

Logo, relativamente às duas decisões judiciais em apreço (a de 21 de Agosto de 2014 e a de 22 de Janeiro de 2015) constituiu-se dupla conforme nos termos do artigo 671º, nº 3, do Código de Processo Civil, impeditiva da interposição de revista normal.

Por outro lado, os recorrentes (por razões que aos mesmos dizem exclusivamente respeito) não decidiram não interpor revista excepcional conforme lhes permitiria, em abstracto, o artigo 672º do Código de Processo Civil, nada mencionando nas suas alegações/conclusões de recurso a esse mesmo propósito.

Acresce outrossim que nenhuma das variadas e envolventes questões apresentadas no seu recurso de revista é por si susceptível de descaracterizar a dupla conforma que efectivamente se constituiu neste tocante.

As mesmas podem sumariamente elencar-se nos seguintes termos:

1 - Questões quanto à matéria de facto fixada. Contradição, ambiguidade e obscuridade entre a matéria de facto inerente aos factos nºs 39, 40 e 41. Factos provado nº 22 – remessa dos autos à conta por inércia das partes. Facto nº 34 – entendimento de que não deve ser dada como provada (com ligação aos artigos 46º e 59º dos factos dados como provados). Facto nº 35 – entendimento que se trata de questões de direito. Facto nº 46 – entendimento de que se trata de matéria conclusiva. Refutação do facto dado como provado de que pretendiam impedir a concretização da acção de preferência.

2 – Questões respeitantes à suspensão da instância ocorrida no processo nº ..., da...ª Vara Cível de ..., ...ª secção, com invocação de omissão de pronúncia nos termos do artigo 615º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil.

3 – Declaração de ineficácia da escritura de Constituição do prédio em Propriedade Horizontal, com invocação da nulidade de excesso de pronúncia prevista no artigo 615º, nº 1, alínea d), in fine, do Código de Processo Civil e ilegalidade nos termos do artigo 1403º, nº 1 e 2 do Código Civil.

4 – Ineptidão da petição inicial.

5 – Caducidade do direito dos AA.

6 – Protecção de direitos de terceiro consignado no artigo 291º do Código Civil.

7 – Caducidade do contrato de arrendamento por morte da arrendatária.

8 – Falta de fundamentação para a responsabilização dos RR. por eventuais demoras da justiça e ausência dos requisitos necessários à sua responsabilidade extra-contratual.

Apreciando:

1 - Questões quanto à matéria de facto fixada. Contradição, ambiguidade e obscuridade entre a matéria de facto inerente aos factos nºs 39, 40 e 41. Factos provado nº 22 – remessa dos autos à conta por inércia das partes. Facto nº 34 – entendimento de que não deve ser dada como provada (com ligação aos artigos 46º e 59º dos factos dados como provados). Facto nº 35 – entendimento que se trata de questões de direito. Facto nº 46 – entendimento de que se trata de matéria conclusiva. Refutação da facto dado como provado de que pretendiam impedir a concretização da acção de preferência.

Sobre esta matéria escreveu-se no acórdão recorrido:

“B – Da apelação dos 2º, 3º, 8º e 9º RR. relativa à decisão de 22-01-2015:

B.1. Da impugnação da matéria de facto:

Pugnam os apelantes pela modificação da matéria de facto dada como provada, defendendo a alteração do facto nº 22, por forma a que do mesmo conste que a aludida acção de preferência foi remetida à conta por inércia dos AA.; que se dê como não provados os factos nºs 35, 38 e 46.

No que se refere ao facto nº 22, reitera-se aqui o que já se decidiu quanto a esta matéria: o aludido facto corresponde exactamente ao que se passou naqueles autos, sendo a menção pretendida pelos apelantes, no sentido da inércia se dever aos ali AA., uma valoração da tramitação processual, que não deve ser transposta para a factualidade assente.

Igual raciocínio deve ser feito quanto ao facto nº 38, o qual se limita a referir que no dia 04 de Julho de 2007, foi registada a acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, pela AP. 26 de 2007/07/04, ficando o registo como provisório, por natureza, facto este que decorre da análise dos documentos juntos aos autos, assim se devendo manter o facto em apreço.

Quanto ao facto nº 35, defendem os apelantes que, embora todos os alienantes e adquirentes das fracções a que correspondem as letras A, B, C e E tivessem conhecimento da acção de preferência, não se pode extrair dai a existência de conluio.

Da leitura da fundamentação da matéria de facto extrai-se que o tribunal a quo considerou provado o facto nº 35 por via indiciária, através de presunções judiciais, discordando os apelantes do uso de presunções feito pela 1ª instância.

Como se pode ler no Ac. TRL de 08-11-2022, proc. 127/20.2T8LRS.L1, relator José Capacete, “Uma das atribuições do Tribunal de Relação em sede de matéria de facto consiste em sindicar o uso que a 1.ª instância fez de presunções judiciais, cabendo-lhe ainda, sempre que disso for o caso, fazer uso de tais presunções na formulação da sua própria e autónoma convicção.

No tocante ao controlo sobre o uso de presunções judiciais feito pela 1.ª instância, o Tribunal da Relação pode proceder à alteração da matéria de facto se dispuser de todos os meios de prova que fundaram a decisão do tribunal a quo sobre os concretos pontos de facto objeto de impugnação (art. 662.º, n.ºs 1 e 2, al. c)).

Em suma, a intervenção do Tribunal da Relação no que se refere a presunções faz-se: - ou pela via do controlo do uso de presunções judiciais pela 1.ª instância;

- ou pela via da utilização de presunções judiciais pela própria Relação quando formule a sua convicção autónoma.

O uso autónomo das presunções judiciais pelo Tribunal da Relação pode ainda ser feito sempre que se tratar de retirar dos factos provados presunções impostas pelas regras da experiência, conforme decorre dos arts. 607.º, n.º 4 e 663.º, n.º 2, ainda que, nestes casos, a Relação não possa contrariar outros factos que, tendo sido considerados provados pela 1.ª instância, não foram objeto de impugnação.”.

No caso vertente, estamos na primeira das hipóteses, ou seja, no controlo sobre o uso de presunções judiciais feito pela 1.ª instância, pelo que será sobre esse prisma que se analisará o facto nº 35 (“35 - As alienações e permutas das fracções autónomas designadas pelas letras «A», «B», «C» e «E» do prédio urbano correspondente ao nº ..., da Travessa ..., em ..., pelos 1ºs co-Réus (HH e mulher, II) e B..., Lda., às aqui 8ª co-Ré (Leopor - Imobiliária, Lda.) e 9ª co-Ré (LP..., S.A.), e destas àqueles, teve como objectivo o impedir o efeito substantivo da procedência da acção de preferência referida no facto provado enunciado sob o número 05”).

Nos termos do art. 349º do CC, “presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido”.

Ou seja, a presunção supõe a prova de um facto conhecido (base da presunção), do qual, depois, se infere o facto desconhecido.

As presunções podem assentar em factos essenciais que tenham sido considerados provados ou que resultem plenamente provados dos autos, embora derivem normalmente da convicção formada sobre factos de natureza puramente instrumental que resultem da instrução da causa, tenham ou não tenham sido alegados pelas partes.

As presunções são “judiciais, simples ou de experiência, quando assentam no simples raciocínio de quem julga.

(…) inspiram-se nas máximas da experiência, nos juízos correntes de probabilidade, nos princípios da lógica ou nos próprios dados da intuição humana.” (Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, Volume I, 4ª edição revista e actualizada, pág. 312)

Como explica Luís Filipe Pires de Sousa, in Prova por Presunção no Direito Civil, 2017, 3ª Edição, págs. 55-56, “As pessoas, ao contemplarem a sucessão dos factos, formam uns standards de conduta nos termos dos quais, perante a ocorrência “normal” de um facto determinado, estimam produzidos igualmente todos aqueles factos que costumam acompanhar o primeiro. O facto-base e o facto presumido devem estar vinculados entre si por uma relação lógica de causa-efeito, segundo uma regra de critério ou experiência humana. Em suma, verifica-se que, num elevado número de casos, um determinado facto encontra-se associado a um outro facto segundo uma relação de antecedência, coexistência ou sucesso de modo que pode supor-se que os dois factos se apresentam constantemente relacionados de modo que se ocorre um também ocorrerá o outro.”.

Revertendo estas considerações para o caso dos autos, constata-se que a ponderação dos elementos existentes nos autos, em conjugação com a prova produzida permite, tal como sustentado pelo Tribunal recorrido, dar como assente o facto nº 35.

Com efeito, e tal como analisado pelo tribunal recorrido existe um facto base da presunção, a partir do qual é possível estabelecer um nexo lógico que permita concluir pela existência de conluio entre os RR. com o objectivo o impedir o efeito substantivo da procedência da acção de preferência.

Como bem se diz na sentença recorrida, “como facto base da presunção (facto instrumental), considera-se a existência de relações entre os Réus em causa, nomeadamente: a qualidade de sócio de JJ (aqui 3º co-Réu) e a qualidade de gerente de XX, em B..., Lda. (primeiro demandada na acção de preferência); a qualidade de sócio e gerente de XX, em Par – co-Participações Comerciais, Lda. (aqui 2ª co-Ré), bem como a sua simultânea qualidade de gerente de Leopor - Imobiliária, Lda (aqui 8ª co-Ré) até 07 de Fevereiro de 2006; e a qualidade de Presidente do Conselho de Administração e Administrador Delegado de JJ (aqui 3º co-Réu) em LP..., S.A. (aqui 9ª co-Ré).

Já como nexos lógicos com as inerentes máximas de experiência catalisadora, consideram-se os indicados supra, isto é, a confiança mútua e intimidade de interesses que se geram entre pessoas singulares que prosseguem societariamente negócios, bem como o conhecimento comum que tendem a ter das situações que os afectam economicamente, procurando conjugar esforços para maximizar o ganho e diminuir a perda.

Por fim, e como facto presumido, o terem tais Réus procedido, em 21 de Março de 2007, de forma concertada e por meio de uma única escritura notarial, a sucessivas compras, vendas e permutas - todas elas sobre o prédio objecto da primitiva acção de preferência - por todos eles terem conhecimento da pendência dos ditos autos, e visarem obstar desse modo ao seu êxito, ou futura eficácia prática.

Acresceu a este juízo o facto dos Réus não terem apresentado qualquer explicação para tais operações, quando tão fácil lhes teria sido fazê-lo (v.g. documentando a existência de outras habituais operações económicas ou negócios ente eles, documentando terem as compras, vendas e permutas de 21 de Março 2007 actuado como acertos de contas, como formas de pagamento, ou como outro meio de concretização de justificadas e legítimas relações e propósitos)”.

Conclui-se, pois, e face a esta justificação, que o facto nº 35 se deve manter no elenco dos factos provados.

No que diz respeito ao facto nº 46 (46 - A instauração e pendência, quer do Processo nº ..., da ...ª Vara Cível de ..., ...ª Secção (depois Processo nº 9954/2001.9...), quer do presente, causaram aos Autores desgaste físico e sofrimento.), entendem os apelantes que o mesmo deve ser dado como não provado face à parcialidade das testemunhas inquiridas quanto a essa matéria.

De salientar que o tribunal recorrido, depois de ter efectuada uma análise conjugada de todos os meios de prova existentes nos autos, justificou este segmento da factualidade provada, referindo que “a ter a instauração e pendência, quer do Processo nº ..., da ...ª Vara Cível de ..., ...ª Secção (depois Processo nº 9954/2001.9...), quer do presente, causado aos Autores desgaste físico e sofrimento - mostrou-se confirmado pelos depoimentos concertados das testemunhas HHH, III, RR e JJJ, sendo ainda essa prova consentânea com os efeitos que a longa pendência de um processo judicial (em que se discute a casa de morada própria) normalmente causa à generalidade das pessoa (em particular tão idosas como as suas primitivas Autoras o eram).

Não foi ainda a produzida qualquer prova, que infirmasse aquela primeira.”.

Recorde-se que a Relação só deve lançar mão dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância referente à matéria de facto quando seja possível, com segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente aos concretos pontos de facto impugnados.

A este propósito, refira-se que, no âmbito do nosso sistema processual vigora o sistema da liberdade de julgamento ou da prova livre (cfr. art. 607º, nº 5 do CPC), apreciando o tribunal livremente os meios de prova, atribuindo-lhes o valor probatório que entenda adequado face à apreciação crítica efectuada à luz das regras da experiência, da lógica e da ciência, com excepção das situações da chamada prova legal, isto é, das situações em que para a prova de um determinado facto a lei exige um específico meio de prova ou impede que o mesmo possa ser provado mediante certos meios de prova.

Não olvidando este enquadramento, ouvidos atentamente todos os depoimentos prestados e analisada a demais prova constante dos autos, conclui-se não ser possível proceder à alteração pretendida, nomeadamente face à forma detalhada e sensata com que a prova foi analisada.

Acresce que os apelantes não apresentam qualquer argumentação susceptível de afastar o juízo efectuado pelo tribunal a quo, limitando-se a atacar a credibilidade das testemunhas e a decisão tomada.

Concluindo, entende-se que o facto nº 46 se deve manter no elenco dos factos provados, assim se julgando improcedente a impugnação da matéria de facto”.

Vejamos:

Das alegações apresentadas em sede de recurso de revista apenas se retira a (legítima) discordância dos recorrentes relativamente ao juízo de facto autónomo extraído em 2ª instância, aliás desenvolvidamente fundamentado no acórdão recorrido e que seguiu de muito perto o decidido em 1ª instância, com o mesmo concordando inteiramente.

Logo, está em causa matéria que não se integra na competência deste Supremo Tribunal de Justiça conforme resulta do disposto nos artigos 674º, nº 3, e 682º, nº 2, do Código de Processo Civil, para além da irrecorribilidade que resulta do artigo 662º, nº 4, do mesmo diploma legal.

É sintomático neste sentido a indicação efectuada pelos recorrentes no sentido de que o recurso de revista é “apresentado nos termos do artigo 640º do Código de Processo Civil”, o que só pode, sem dúvida alguma, significar estar em causa, verdadeira e unicamente, argumentário relacionado com o conhecimento da impugnação da decisão de facto, tal como ela se firmou, em termos da sua sindicância, no Tribunal da Relação.

Nenhuma das alegações produzidas configura em rigor qualquer verdadeira censura ao exercício dos poderes/deveres conferidos ao Tribunal da Relação pelo que vigora neste particular, e como se salientou supra, a regra da irrecorribilidade para o Supremo Tribunal de Justiça constante do nº 4 do artigo 662º do Código de Processo Civil.

Acrescente-se ainda que não se descortina sequer a existência de qualquer ponto de facto que possa ser qualificado como meramente conclusivo ou que encerre exclusivamente conceitos de direito, sendo que o conjunto desses mesmos factos provados, vistos na sua globalidade e contexto, sempre suportariam suficientemente a decisão de direito que, com base neles, foi adequadamente extraída.

O que acontece, tal simplesmente, é que os recorrentes entendem que se provou – e não provou – matéria factual diversa da considerada pelas instâncias, olvidando que ao Tribunal da Relação assiste, salvo situações excepcionais que não se verificam in casu, a última e definitiva palavra quanto à definição dos termos da decisão de facto que efectivamente reapreciou.

Por outro lado, não faz sentido invocar “ambiguidade e contradição entre factos”, concretamente os indicados nos pontos 39, 40 e 41.

A contradição a que alude a alínea b) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil reporta-se à análise de questões jurídicas e não ao confronto entre a factualidade dada como provada e não provada – definitivamente resolvida em 2ª instância.

Dir-se-á também que a mera invocação de nulidades decisórias, como sucede no presente recurso de revista, não prejudica a existência de dupla conformidade.

(Neste sentido, vide Abrantes Geraldes in “Recursos em Processo Civil”, 2024, 8ª edição, a página 491; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Julho de 2019 (Graça Amaral), proferido no processo nº 843/17.6T8OVR-A.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt).

2 – Questões respeitantes à suspensão da instância ocorrida no processo nº ..., da ...ª Vara Cível de ..., ...ª secção, com invocação de omissão de pronúncia nos termos do artigo 615º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil.

Alegam os recorrentes que:

“Da análise à matéria de facto provada verifica-se que apesar da acção de preferência nº ... ter sido proposta pelos AA., no dia 29-05-2001, quando já tinha operado o prazo de caducidade, como consta do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça junto aos autos, o certo é que apenas no dia 7 de Novembro de 2002 procederam ao registo da acção ficando esta suspensa, vindo a ser recusado em 20-05-2004.

A instância ficou suspensa no dia 2 de Fevereiro de 2006 por comprovada falta de registo da referida acção,sendo os autos remetidos à conta no dia 1 de Março de 2007, tendo entretanto decorrido mais de 6 anos, dando origem à interrupção da instância.

Ora, o douto acórdão omitiu pronúncia sobre esta matéria, a que correspondem os nºs 16, 17, 21 e 22 dos factos provados, tendo os mesmos sido suscitados nas conclusões das alegações do recurso, não se encontrando a decisão prejudicada pela solução dada a outras.

A omissão de pronúncia consubstancia uma nulidade do douto acórdão, como previsto na al. d) do nº1 do artº 615º do CPC aplicável pelo preceituado no artº 666º do mesmo código, nulidade que aqui se invoca para os devidos e legais efeitos”.

Vejamos:

O acórdão recorrido procedeu, como lhe competia, à análise da relevância dos registos de venda realizados e da protecção que lhes poderia eventualmente ser concedida pelo artigo 291º do Código Civil.

Essa temática foi amplamente desenvolvida em estreita concordância com o decidido sobre a mesma questão jurídica na sentença de primeira instância.

Conforme judiciosamente se salientou – e obteve total concordância no acórdão recorrido – a questão a decidir nestes autos é apenas a de apurar se é possível impor aos RR. neste acção o direito de propriedade adquirido pelos AA. e definitivamente reconhecido na acção nº ..., com trânsito em julgado.

Ou seja, nesse processo ... e através do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça transitado em julgado em 30 de Janeiro de 2012, ficou definitivamente assente o exercício tempestivo do direito de preferência por parte dos AA.

Já quanto às transmissões subsequentes, a questão não tem a ver com o exercício do direito legal de preferência que assiste indiscutivelmente aos AA., mas diferentemente com o alcance dos efeitos a extrair do seu reconhecimento, afectando e vinculando consequentemente os AA.

E concluiu-se mencionados arestos que o artigo 291º do Código Civil só é aplicável às situações de nulidade ou anulabilidade do negócio e não à sua mera ineficácia jurídica.

Ora, é no âmbito desta temática geral e abrangente que se insere a questão suscitada pelos recorrentes, a qual foi decidida, em termos conformes, tanto pela primeira instância como pelo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa.

Logo, não existe qualquer omissão de pronúncia, nos termos do artigo 615º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil, conforme infundadamente pretendem os recorrentes.

Repete-se, a este propósito, que a mera invocação de nulidades decisórias não prejudica a existência de dupla conformidade pelo que a matéria suscitada não seria idónea a afastar o disposto no artigo 671º, nº 3, do Código de Processo Civil.

3 – Declaração de ineficácia da escritura de Constituição do prédio em Propriedade Horizontal, com invocação da nulidade de excesso de pronúncia prevista no artigo 615º, nº 1, alínea d), in fine, do Código de Processo Civil e ilegalidade nos termos do artigo 1403º, nº 1 e 2 do Código Civil.

Não tem cabimento algum a invocação do vício de excesso de pronúncia nos termos do artigo 615º, nº 1, alínea d), in fine, do Código de Processo Civil, na medida em que a decisão de declaração de ineficácia da constituição da propriedade horizontal foi apreciada substantivamente pelas instâncias, como constituía sua obrigação processual, dentro dos concretos limites definidos pelo pedido e pela causa de pedir apresentados.

De resto, nenhuma dúvida subsistiu nos arestos proferidos de que a ineficácia relativa da constituição da propriedade horizontal se encontrava delimitada a dois terços do prédio e não à sua totalidade, o que resultava ainda com total clareza do decidido no processo nº ... supra citado e que nunca esteve verdadeiramente em discussão.

Rigorosamente nenhuma dúvida se levantou em momento algum a este respeito.

Para além de que, como se disse, a invocação de nulidades não afasta nem prejudica a existência de dupla conformidade.

4 – Ineptidão da petição inicial.

A questão da ineptidão da petição inicial encontra-se largamente abordada, desenvolvida e resolvida nos autos, não constituindo motivo sério e atendível para a anulação do acórdão recorrido.

Escreveu-se, a este propósito, no acórdão recorrido:

“Insurgem-se os RR. com a decisão de considerar improcedente a excepção de ineptidão da petição inicial, por entenderem que se verifica “com clareza a contradição e a obscuridade da P.I., cumulando-se pedidos e causas de pedir substancialmente incompatíveis”.

Ao instaurar uma acção, o autor deve formular um pedido, requerendo ao tribunal o meio de tutela pretendido para efectivar o direito por si alegado (cfr. art. 552º, nº 1, al. e) do CPC) e deve ainda, nos termos da al. d) do citado preceito, expor os factos que servem de fundamento à acção, isto é, deve indicar os factos concretos constitutivos do direito que alega, não se podendo limitar “à indicação da relação jurídica abstracta” (vide, Anselmo de Castro, in Direito Processual Civil Declaratório, vol. I, pág. 208).

Donde, o pedido deve reportar-se à tutela de uma situação jurídica material com conexão com os factos trazidos a juízo e que constituem a causa de pedir. Quer isto dizer que o autor não se pode limitar a apresentar uma determinada pretensão ao Tribunal, sem que esta tenha uma qualquer conexão com a tutela jurídica pretendida e que, concomitantemente, se enquadre numa das previsões do art. 10º, nº 2 do CPC, o qual define, quanto às acções declarativas, o fim das várias acções, isto é, o seu objectivo.

Assim sendo, o autor deve formular o seu pedido de forma clara e inteligível, devendo o pedido ser preciso e determinado, referindo-se o destinatário da pretensão apresentada em termos tais que não se possam suscitar dúvidas quanto ao seu alcance.

Por outro lado, o autor deve invocar os factos concretos que estão na origem da sua pretensão e que tenham uma relevância jurídica tal que permitam fundamentar a acção de acordo com as várias soluções possíveis e aceites na doutrina e na jurisprudência.

Desta forma, a factualidade invocada pelo autor deverá ser concretizada por forma a individualizar a pretensão e o objecto do processo e, por essa via, possibilitar a definição do caso julgado e, assim, evitar uma eventual repetição de causas.

Ao especificar os factos integradores da causa de pedir, o autor deve recorrer apenas aos factos essenciais, isto é, àqueles “factos que preenchem a previsão da norma que concede a situação subjectiva alegada pela parte” (cfr. Miguel Teixeira de Sousa, in Introdução ao Processo Civil, Lisboa, 1993, pág. 24), e que sejam juridicamente relevantes para fundamentar a pretensão do autor, ou, como ensina o Prof. Alberto dos Reis, in CPC Anotado, vol. II, pág. 351, “os factos pertinentes à causa e que sejam indispensáveis para a solução que o autor quer obter: os factos necessários e suficientes para justificar o pedido”. Ou seja, ao falar em factos essenciais, tem-se em vista todos aqueles factos constitutivos do direito alegado que se incluem no quadro fáctico da norma legal em que se apoia a pretensão do autor e que possam servir para a fundamentar.

Por essa razão, existe ineptidão da petição inicial quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir, ou seja, quando entre ambos não exista o mesmo nexo lógico que entre as premissas de um silogismo e a sua conclusão (Prof. Alberto dos Reis, ob. cit., pág. 381) ou quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis, entendendo-se que assim sucede quando haja uma contradição entre os factos apresentados como fundamento da acção e a pretensão deduzida.

No caso dos autos, não se pode concordar com os apelantes quando alegam que os pedidos e causas de pedir apresentadas são substancialmente incompatíveis.

Com efeito, há que recordar que os AA. efectuaram um pedido a título principal (a declaração do seu direito de propriedade e subsequente ineficácia dos actos praticados), apresentando como fundamento de tal pedido o exercício do seu direito legal de preferência em negócio relativo ao prédio objecto do seu direito de propriedade, não existindo qualquer contradição entre este pedido e os factos apresentados como seu fundamento.

De igual modo, não existe contradição entre este pedido (principal) e o pedido subsidiário, o qual assenta na validade da escritura de constituição de propriedade horizontal (cuja ineficácia é pedida a título principal), concretizando a ineficácia dos actos e o cancelamento dos registos subsequentes.

Como bem se escreve na decisão recorrida, “independentemente da procedência ou improcedência da sua pretensão, face à lei substantiva, e tal como os Autores o defenderam na réplica que apresentaram, inexiste qualquer contradição entre os pedidos formulados e a causa de pedir que os sustenta, ou qualquer cumulação de pedidos e de causas de pedir substancialmente incompatíveis”.

Concordando inteiramente com esta apreciação, entende-se que não se verifica a excepção dilatória de ineptidão da petição inicial, sendo este segmento da apelação improcedente”.

Ou seja, tratou-se de matéria que foi concretamente abordada e decidida em 1ª instância, tendo merecido a integral concordância por parte do Tribunal da Relação de Lisboa.

Logo, formou-se obviamente dupla conforme neste tocante.

Não se compreende, assim, a interposição de revista normal neste tocante quanto a uma matéria em que houve convergência total e absoluta entre a sentença e o acórdão recorrido.

5 – Caducidade do direito dos AA.

Mais uma vez, estamos perante matéria que foi suficientemente desenvolvida no acórdão recorrido, onde pode ler-se:

“A.8. Da ineficácia da escritura pública de compras e vendas e permuta celebrada em 21-03-2007:

De acordo com os apelantes, a circunstância de o proc. ... ter sido remetido à conta, levando à interrupção da instância, nos termos do art. 285º do CPC anterior a 2013, fez operar a caducidade do direito de preferência, sendo válidas as escrituras de compra e venda.

Nos termos do art. 1410º, nº 1 do CC, “o comproprietário a quem se não dê conhecimento da venda ou da dação em cumprimento tem o direito de haver para si a quota alienada, contanto que o requeira dentro do prazo de seis meses, a contar da data em que teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação, e deposite o preço devido nos 15 dias seguintes à propositura da acção”.

Este preceito fixa um prazo de 6 meses a contar da data em que o sujeito passivo teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação, para a propositura da acção de preferência, prazo este que é um prazo de caducidade.

A caducidade do prazo para exercer o direito de preferência é de conhecimento oficioso, não dependendo de alegação pelas partes, uma vez que estamos perante um direito real de aquisição, excluído da sua disponibilidade.

No caso dos autos, independentemente da configuração teórica da questão, importa referir que está assente que o proc. ... foi remetido à conta no dia 01-03-2007 (facto nº 22), sendo as aludidas escrituras outorgadas a 21-03-2007, data em que todos os intervenientes tinham conhecimento do litígio existente da propositura e prosseguimento da acção de preferência em causa, tendo como objectivo o impedir o efeito substantivo da procedência da aludida acção de preferência (cfr. factos nºs 34 e 35).

Resulta ainda dos autos que, no âmbito de tal acção de preferência, ficou assente o exercício tempestivo do direito de preferência das ali AA., isto é, a não verificação da caducidade respectiva, no que diz respeito à venda de dois terços indivisos do prédio e ora em discussão.

Por outro lado, no que se refere às posteriores transmissões, temos de acompanhar a sentença recorrida quando refere que “Relativamente às transmissões e onerações ocorridas posteriormente violação daquele direito legal de preferência -nomeadamente aos actos praticados pelas aqui 4ª Ré (KK), 5ª Ré (Caixa Gerald e Depósitos, S.A.), 6ª Ré (LL), 8ª co-Ré (Leopor – Imobiliária, Ldaª) e 9ª co-Ré (LP..., S.A.) - a actuação dos aqui Autores, quanto a elas, não se prende com o exercício do seu direito legal de preferência, mas sim com os efeitos a extrair do reconhecimento do mesmo.

Por outras palavras, no momento inicial em que se exerça, ou não exerça, o direito legal de preferência, importará verificar da tempestividade desse exercício (uma vez que a respectiva caducidade é de conhecimento oficioso), reportada necessariamente ao negócio que o haja violado, e relativamente ao qual o preferente pretende substituir a contraparte do sujeito obrigado a dar-lhe preferência.

Já nos actos ou negócios jurídicos subsequentes, não está o titular do direito de preferência obrigado a demandar os novos adquirentes ou onerantes (um a um, sucessivamente, com eles discutindo a validade e eficácia dos respectivos actos ou negócios praticados), uma vez que, operando o reconhecimento do seu direito ex tunc, todos aqueles se tornarão, sem mais, retroactivamente ineficazes.

Isto mesmo se retira, de novo, do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, que reconheceu às ali Autoras o «direito a haver para si a quota [de dois terços do prédio em causa] alienada», quando de seguida precisa que o «efeito substantivo da procedência da acção de preferência opera ex tunc, a partir do momento da celebração do negócio por ela atacado, sendo por isso procedente o segundo pedido subsidiário das AA a partir da data da celebração do negócio aqui posto em crise» (facto provado enunciado sob o número 37)”.

Donde, concordando inteiramente com este entendimento, conclui-se que as escrituras em causa não podem subsistir, nada havendo a censurar na decisão de as considerar ineficazes, assim improcedendo este aspecto da apelação”.

Vejamos:

Nenhuma dúvida pode subsistir de que a apreciação da excepção de caducidade foi realizada em termos perfeitamente uniformes na 1ª instância e no Tribunal da Relação de Lisboa.

Houve uma abordagem minuciosa do tema em 1ª instância (no saneador-sentença de conhecimento parcial do pedido), a qual foi inteiramente corroborada no acórdão recorrido exactamente com os mesmos fundamentos jurídicos.

Logo, há dupla conforme neste particular, não existindo base legal para a interposição de revista normal.

6 – Protecção de direitos de terceiro consignado no artigo 291º do Código Civil.

Escreveu-se a este respeito no acórdão recorrido:

“A.10. Da tutela do terceiro de Boa Fé:

De acordo com os apelantes, “sempre a acção terá de improceder em relação aos RR. que na qualidade de terceiros de boa fé adquiriram as fracções identificadas na citada escritura de Compras, Vendas e Permutas”, por aplicação do art. 291º do CC.

Pela forma clara e bem fundamentada pela qual a sentença recorrida aborda esta questão, passa-se à sua transcrição:

“5.4.1. Lê-se no art. 291º do C.C. que, estando «de boa fé o terceiro adquirente que no momento da aquisição desconhecia, sem culpa, o vício do negócio nulo ou anulável», a «declaração de nulidade ou a anulação do negócio jurídico que respeite a bens imóveis, ou a bens móveis sujeitos a registo, não prejudica os [seus] direitos adquiridos sobre os mesmos bens, a título oneroso, (…) se o registo da aquisição for anterior ao registo da acção de nulidade ou anulação ou ao registo do acordo entre as partes acerca da invalidade do negócio», e desde que a acção impugnante do mesmo não seja «proposta e registada dentro dos três anos posteriores à conclusão» do dito negócio.

Mais se lê, no art. 7º do C.R.P., que o «registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define», aqui se consagrando uma presunção iuris tantum (isto é, que pode ser ilidida por prova em contrário - art. 350º, nº 2 do C.P.C.).

Por fim, lê-se no art. 17º, nº 2 do C.R.P. que a «declaração de nulidade do registo não prejudica os direitos adquiridos a título oneroso por terceiro de boa fé, se o registo dos correspondentes factos for anterior ao registo da acção de nulidade».

Logo, verificadas sucessivas alienações de uma mesma coisa, ou de um mesmo direito, sujeitos a registo, e ainda que uma delas não devesse ter ocorrido, por o respectivo transmitente não ser titular da coisa ou do direito em causa, desde que o seu adquirente o ignorasse, tenha procedido ao registo a seu favor do objecto da transmissão que o beneficiou, e o adquirente conflituante não tenha feito registar a acção de declaração de nulidade, ou de anulação da venda a non domino nos três anos subsequentes ao indevido negócio, não poderá depois opor àquele a decisão que nela venha a ser proferida.

Contudo, e conforme resulta expressamente do teor, quer do art. 291º do C.C. (que se cinge tão só às relações entre o alienante e o adquirente), quer do art. 17º, nº 2 do C.R.P., esta tutela do terceiro de boa fé encontra-se consagrada na lei apenas para as hipóteses de nulidade ou de anulação do acto ou negócio indevido, e não também para os casos de ineficácia do mesmo.

Ponderou-se, a propósito, que «enquanto que a nulidade é uma forma de ineficácia, em sentido amplo, pressupondo uma falta ou irregularidade, quando aos elementos internos ou essenciais do negócio [falta de capacidade, falta ou defeito da declaração de vontade, impossibilidade física ou legal do objecto, ilicitude], a ineficácia em sentido estrito, baseia-se na falta ou irregularidade de outra natureza, não já de uma falta ou irregularidade dos elementos internos do negócio, mas antes de alguma circunstância extrínseca que, conjuntamente com o negócio, integra a situação de facto produtiva de efeitos jurídicos [falta de titularidade do direito de que se dispôs, falta de registo relativamente a terceiros, etc.]» (Ac. do STJ, de 29.04.2010, Hélder Roque, Processo nº 81/05.0TBMTS.P1.S1, com bold apócrifo).

Poder-se-ia, porém, discutir a hipótese de aplicar analogicamente tais preceitos (isto é, a protecção que consagram) às situações de ineficácia do acto ou negócio.

Contudo, sendo a regra geral do nosso direito nemo plus juris in alium transfere potest quam habet - isto é, num negócio de aquisição derivada, o adquirente do direito só pode adquirir aquilo que o transmitente respectivo tivesse efectivamente na sua titularidade (ninguém pode transmitir direitos que não lhe pertençam) - , de imediato resulta que a protecção conferida ao terceiro adquirente a non domino, quer pelo art. 291º do C.C., quer pelo art. 17º, nº 2 do C.R.P., reveste natureza excepcional. Logo, não permite a sua aplicação analógica às hipóteses de ineficácia do negócio, conforme expressamente dispõe o art. 11º do C.C..

Compreende-se, por isso, que já se tenha decidido que, face a «subadquirentes ineficazes em relação à autora, o caso não é de nulidade ao de anulação do negócio, pressuposto do art. 291º do C.C., nem tal norma pode aplicar-se analogicamente à figura da inexistência, por a mesma ser excepcional, pois constitui uma excepção ao princípio “nemo plus júris in alium transfere potest quam habet”, bem como à regra da retroactividade consagrada no art. 289º do C.C.».

Com efeito, a «regra é a de que o direito do adquirente depende da existência do direito do transmitente e a de que a nulidade comporta efeito retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente».

Por outro lado, as «regras do registo, designadamente o invocado art. 17º, nº 2 do Cód. Reg. Predial, também não valem no caso concreto, na medida em que o registo é meramente declarativo e não constitutivo» (Ac. do STJ, de 29.04.2014, Azevedo Ramos, Processo nº 353/2002.P1.S1).

Assim, «não é terceiro, para efeitos do registo, quem adquire ou deduz um direito de quem nunca foi titular de um direito registado e depois transmitido»; se o art. 7º do C. R. Predial actuasse dessa forma, «estabeleceria não presunções, mas ficções, e então o registo teria efeitos constitutivos, independentemente das normas de direito material» (Ac. do STJ, de 09.12.2004, Custódio Montes, Processo nº 04B3891, citando H. E. Horster).

5.4.2. Concretizando, verifica-se que, tendo os Autores intentado a presente acção em 10 de Outubro de 2012, fizeram-na registar em 18 de Outubro de 2012 (facto provado enunciado sob o número 40).

Mais se verifica que, pretendendo nomeadamente com a mesma o reconhecimento da ineficácia de actos de transformação jurídica, alienação, aquisição e oneração praticados pelos Réus sobre o prédio urbano correspondente ao nº ..., da Travessa ..., em ..., tais actos foram praticados em datas compreendidas entre 21 de Junho de 2001 e 21 de Março de 2007; e mostram-se registados, a favor dos Réus seus autores, todos em momento anterior a 24 de Abril de 2007 (factos provados enunciados sob os números 06, 07, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 23, 24, 25, 26, 27 e 28).

Assim, defendendo estes desconhecer, à data da sua prática, a existência do direito legal de preferência dos aqui Autores, e mostrando-se há muito decorridos três anos sobre a conclusão dos respectivos actos ou negócios, no momento em que esta acção - alegadamente destinada a invalidá-los - foi registada, beneficiariam da protecção conferida pelo art. 291º do C.C. ao terceiro de boa fé.

Contudo, e conforme se referiu supra, os actos e/ou negócios posteriores à violação do direito do preferente legal não são nulos ou anuláveis em relação ao mesmo, mas sim ineficazes quanto a si; e a ineficácia encontra-se fora do âmbito de incidência quer do art. 291º do C.C. (que se cinge tão só às relações entre o alienante e o adquirente), quer do art. 17º, nº 2 do C.R.P..

Compreende-se, assim, que o mesmo já tenha sido decidido em acção análoga, onde expressamente se precisou que «não estamos em presença de uma acção de nulidade, mas antes de declaração de ineficácia da hipoteca [aqui, também compras e vendas, permutas e constituição de propriedade horizontal] em relação à autora preferente» (Ac. do STJ, de 29.04.2014, Azevedo Ramos, Processo nº 353/2002.P1.S1. No mesmo sentido, Ac. do STJ, de 29.04.2010, Hélder Roque, Processo nº 81/05.0TBMTS.P1.S1, que nem mesmo considerou como obstáculo «a diferente formulação do pedido inicial, já que os Autores articularam os factos que permitem a correcta qualificação do efeito jurídico pretendido»).

Pretendendo, porém, reverter a dita tutela do terceiro de boa fé à pretérita acção de preferência intentada pelos Autores - Processo nº ..., da ...ª Vara Cível de ..., ...ª Secção -, verifica-se que, tendo sido a mesma intentada em 29 de Maio de 2001, apenas foi registada em 07 de Novembro de 2002 (factos provados enunciados sob os números 04 e 16).

Mais se verifica que os actos praticados pelas 4ª Ré (KK), 5ª Ré (Caixa Geral de Depósitos, S.A.) e 6ª Ré (LL) - de aquisição, por cada uma das 4ª Ré e 6ª Ré, de uma fracção autónoma, face à constituição do prédio em propriedade horizontal, ocorrida em 21 de Junho de 2001, e de constituição de hipotecas sobre tais fracções, por parte da 5ª Ré - , ocorreram todos antes do registo da acção referido, protestando qualquer destas Rés desconhecer à data o direito de preferência dos aqui Autores (factos provados enunciados sob os números 06, 07, 10, 11, 12, 13, 14 e 15 e 16).

Por fim, verifica-se ainda que, tendo o registo da mesma acção caducado em 20 de Maio de 2004, só viria a ser novamente efectuado em 04 de Julho de 2007, sendo que em 21 de Março de 2007 a 2ª co-Ré (Par – co-Participações Comerciais, Limitada), o 3º Ré (JJ), a 8ª co-Ré (Leopor - Imobiliária, Limitada) e a 9ª co-Ré (LP..., S.A.) celebraram entre si permutas, alienações e aquisições sobre o prédio objecto do direito de preferência dos Autores, que fizeram registar em data anterior a 25 de Abril de 2007 (factos provados enunciados sob os números 17, 23 a 28, e 31).

Contudo, e tal como referido supra, também a hipótese de protecção de terceiro de boa fé consagrada no art. 17º, nº 2 do C.R.P. (potencialmente aplicável às 4ª Ré, 5ª Ré e 6ª Ré, mas dificilmente aplicável aos demais, face à notícia da acção de preferência dada pelo seu pretérito registo, ainda que caduco) pressupõe expressamente a prática de um acto nulo, e não a prática de um acto ineficaz, impedindo a natureza excepcional de tal norma qualquer interpretação analógica, ou aplicação a outras situações por argumento ad majorem ad minus.

Em hipótese análoga se decidiu recentemente que, «no caso concreto, é sempre lícito à titular do direito de preferência, que não fizera registar a respectiva acção de preferência, fazer valer o seu direito, na actual acção, contra o credor hipotecário, pois a falta de registo daquela acção não produz a ineficácia do direito contra terceiro, mas só a ineficácia do caso julgado em relação a estes».

Logo, o «direito continua, apesar da falta de registo daquela acção, a ser eficaz erga omnes, e apenas o caso julgado que na acção se formou não pode ser oposto a terceiros que tenham feito registar a sua hipoteca antes do registo da acção de preferência» (Ac. do STJ, de 29.04.2014, Azevedo Ramos, Processo nº 353/2002.P1.S1. No mesmo sentido, Adriano Vaz Serra e Antunes Varela, em anotação ao Ac. do STJ, de 20.06.1969, RLJ, ano 103º, p. 471).

Assim, e não obstante ter por essa via agravado a sua situação, o preferente ver-se-á tão só obrigado a propor uma nova acção contra «o possuidor actual da coisa» (J. Oliveira Ascensão, «Direito de preferência do arrendatário», Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Inocêncio Galvão Telles, Vol. III, Almedina, Dezembro de 2002, p. 271); mas o objecto desta nova acção limitar-se-á à discussão da ineficácia do acto invocado pelo posterior adquirente (ou titular de direito real de garantia registado sobre a coisa objecto da dita preferência), e não também da sua eventual qualidade de terceiro de boa fé, por ser irrelevante para aquele efeito.

«Doutro modo [isto é, sendo aplicável ao subadquirente a tutela consagrada legalmente para o terceiro de boa fé], estaria sempre descoberto o processo para inutilizar o direito que a lei concede ao arrendatário de poder preferir na venda do bem arrendado» (Ac. do STJ, de 09.12.2004, Custódio Montes, Processo nº 04B3891, citando H. E. Horster).

Dir-se-ia, porém, em desabono da solução perfilhada, que a mesma redundaria em intolerável desprotecção do posterior adquirente da coisa - ou titular de um direito real de garantia sobre a coisa - objecto da preferência.

Contudo, precisa-se que «daí [da solução legal, de acordo com o entendimento feito supra] não se segue que o credor hipotecário [leia-se ainda o subadquirente] fique sem qualquer protecção, pois deve reconhecer-se-lhe direito contra o autor da hipoteca [leia-se ainda o alienante], a não ser que a haja adquirido a seu risco. (…) Se na acção de preferência intervierem o terceiro adquirente do prédio e o credor hipotecário [leia-se ainda o alienante], poderá este, na medida em que a lei do processo o consentir, acautelar nessa acção o seu direito contra o adquirente; e pode também, ainda que não intervenha na acção, recorrer aos meios legais de conservação do mesmo direito» (Adriano Vaz Serra e Antunes Varela, em anotação ao Ac. do STJ, de 20.06.1969, RLJ, ano 103º, p. 472 e 474, com bold apócrifo).

Logo, «as expectativas do adquirente, nomeadamente, do adquirente de boa fé, que ou não indagou, devidamente, sobre a situação de facto e de direito do imóvel, ou, então, foi informado, falsamente, pelo alienante, não se encontram no instituto da preferência legal, mas antes, nesta última hipótese, no âmbito do instituto da responsabilidade civil, com a consequente obrigação de indemnizar, por parte do alienante, por violação do dever de boa-fé, nos termos do estipulado pelos artigos 227º, nº 1, e 762º, nº 2, ambos do C.C., pelos danos sofridos pelo adquirente derivados da frustração das suas expectativas de celebração do contrato» (Ac. do STJ, de 29.04.2010, Hélder Roque, Processo nº 81/05.0TBMTS.P1.S1, com bold apócrifo).

Concluindo, os registos efectuados na sequência de alienações ou onerações (v.g. hipoteca) ocorridas após a violação do direito do preferente, uma vez reconhecido tal direito ao mesmo - e atenta a sua eficácia ex tunc - deixam de ter substrato, pois o originário ultraadquirente foi substituído na sua aquisição pelo preferente, por força da decisão judicial proferida na acção constitutivo que este último intentou, a tanto não obstando a protecção ao terceiro de boa fé, consagrada nomeadamente no art. 291º do C.C., e no art. 17º, nº 2 do C.R.P..”.

Concordando inteiramente com esta apreciação, e nada mais havendo a acrescentar, conclui-se que os RR., ora apelantes, não gozam da protecção legal conferida aos terceiros de boa fé, assim sendo improcedente a apelação”.

Ora, quanto a esta matéria, à semelhança do que acontece das restantes situações mencionadas, a coincidência de julgados é absolutamente clara e evidente, bastando para esse efeito notar que o acórdão recorrido se limitou a transcrever a sentença de 1ª instância para, após essa tarefa, colocar a sua chancela de concordância, sem mais.

Logo, existe dupla conforme inequívoca.

7 – Caducidade do contrato de arrendamento por morte da arrendatária.

Escreveu-se no acórdão recorrido:

“A.4. Da intransmissibilidade do direito de preferência:

Discordam os apelantes da decisão recorrida na parte em que a mesma julgou improcedente a excepção peremptória não transmissibilidade do direito legal de preferência dos AA. OO e de NN.

Para tanto, defendem que a A. OO faleceu na pendência da acção de preferência, caducando o contrato de arrendamento nos termos do disposto na al. d) do art. 1091º do CC, e que a A. UU já não morava no arrendado na data em que foi notificada para exercer a preferência pelo anterior senhorio.

No que se refere a esta matéria, o tribunal recorrido entendeu que: “5.3. Transmissibilidade do direito de preferência

5.3.1. Lê-se no art. 420º do C.C. que o «direito e a obrigação de preferência não são transmissíveis em vida nem por morte, salvo estipulação em contrário».

Logo, a lei consagra expressamente, para a preferência convencional, o seu carácter pessoal como regra - por se reconhecer que, na grande maioria dos casos, será concedida intuitu personae - , embora com carácter supletivo («salvo convenção em contrário»).

Recorda-se, porém, que, no caso do direito legal de preferência do arrendatário, a remissão feita para o regime da preferência convencional (quer no art. 49º do R.A.U., quer no nº 4 do art. 1091º do C.C.) se limita aos arts. 416º a 418º, e 1410º, todos do C.C., e não também ao art. 420º do mesmo diploma.

Importará, assim, determinar se aquele direito será igualmente intransmissível como regra; ou, pelo contrário, poderá ser transmitido, nomeadamente mortis causa.

Neste juízo a formular, tem-se por certo que, subjacente ao direito legal de preferência em causa se encontra uma pretendida tutela do arrendatário, isto é: reconhecendo que o mesmo tem o seu centro de vida organizado num determinado local (o locado), e admitindo-se que o queira manter, permite-se-lhe consolidar a propriedade plena do mesmo na sua esfera jurídica. Do mesmo passo, e conforme é próprio de qualquer direito de preferência, reduz-se o número dos direitos em potencial conflito - proprietário versus arrendatário -, deixando aquele primeiro de estar sujeito ao ónus constituído por este segundo.

Defende-se, por isso, aqui que esta protecção da lei apenas se justifica desde que exista, e enquanto subsista, a sua qualidade de arrendatário, extinguindo-se o dito direito de preferência com a extinção daquela qualidade, independentemente do facto que lhe esteja na origem (v.g caducidade do arrendamento, por morte do locatário, ou resolução daquele primeiro, por incumprimento deste segundo).

Por outras palavras, exige-se uma necessária coincidência entre a existência do direito base (de arrendamento) que funda a preferência e o direito de preferir que aquele primeiro autoriza, não apenas inicial, histórica, mas ainda necessariamente subsistente à data do exercício do direito potestativo de preferência, incluindo o seu eventual reconhecimento judicial, por decisão transitada em julgado. É que não faria sentido que subsistisse um direito de preferência, destinado a facultar ao arrendatário a permanência no local onde habita - agora na veste de proprietário -, quando a relação locatícia que fundamenta o dito direito estivesse extinta; e, por isso, não subsistindo qualquer ligação actual entre o titular da preferência e o local originariamente arrendado. (Neste sentido, porém com distintas amplitudes: Antunes Varela, anotando o Ac. do STJ, de 28.07.1981, onde defende que o «espírito da lei que instituiu o direito de preferência a favor do locatário residencial, conforme se depreende do sucinto preâmbulo do diploma, é o de facilitar a aquisição do prédio, não a quem apenas o arrendou, mas a quem nele efectivamente habita, mediante o vínculo locatício, criado pela locação do imóvel»; e Ac. do STJ, de 27.05.1775, BMJ, nº 247, p. 142, Ac. do STJ, de 25.02.1981, BMJ, nº 304, p. 375, Ac. do STJ, de 20.12.1984, BMJ, nº. 341, p. 432, Ac. do STJ, de 27.11.2001, Revista nº 3238, 6ª Secção, ou Ac. do STJ, de 04.02.2010, Lopes do Rego, Processo nº 3370/05.0TBPVZ.P1.S1, dando exemplarmente notícia dos diferentes momentos em que se tem exigido a reunião do direito de arrendatário e do exercício válido e eficaz da preferência).

Logo, rejeita-se aqui a posição daqueles que, após a originária ligação genética entre a posição de arrendatário e a titularidade do direito de preferência respectivo, desvinculam totalmente este último da relação locatícia que lhe serviu de fundamento, defendendo que aquele direito - uma vez adquirido -, se tornou imune às vicissitudes por esta sofridas, por se ter como mais razoável (face à ratio do instituto) a exigência daquela necessária coincidência até à prolação de decisão judicial que reconheça o válido exercício da preferência. (No sentido, porém, da tese aqui rejeitada - com distintas amplitudes - Ac. do STJ, de 08.01.1974, BMJ, nº 233, p. 190, e Ac. do STJ, de 27.11.2001, Revista nº 3238/2001, 6ª Secção).

Assente que, extinguindo-se o direito de arrendamento, necessariamente se extinguirá o direito de preferência nele fundado, em qualquer momento prévio à sua definitiva actuação potestativa, precisa-se que, admitindo-se a transmissão do direito de preferência aos sucessores do arrendatário, a mesma apenas ocorrerá desde que, simultaneamente, se tenha transmitido a estes o direito de arrendamento.

Quando assim não suceda, falecido o arrendatário exercente do direito legal de preferência na pendência da acção judicial com vista ao seu reconhecimento, e não ocorrendo a simultânea sucessão dos seus herdeiros no direito de arrendamento, dever-se-á declarar extinta a respectiva instância, por impossibilidade superveniente da lide (anterior art. 276º, nº 3, e actual art. 269º, nº 3, ambos do C.P.C.).

Não tendo ocorrido aquela declaração, a mera habilitação processual dos seus sucessores para, em seu nome, prosseguirem na causa, não poderá equivaler (por isso não o autorizar a lei) a uma idêntica sucessão (apenas permitida pelo direito substantivo) na relação material controvertida, incluindo o prévio direito de arrendamento onde originalmente se funda.

Compreende-se, por isso, que se afirme que «o princípio de que o direito de preferência surge no momento da celebração do contrato de compra e venda da coisa locada apenas significa que os actos de modificação ou distrate da alienação, a que se reporta o nº 2 do artigo 1410º do Código Civil, não relevam em termos de afectação do direito do preferente, e que, enquanto não transitar em julgado a sentença que ao arrendatário reconheça o direito de preferência este lhe não está assegurado» (José Gualberto de Sá Carneiro, Revista dos Tribunais, Ano 92º, 1974, p. 378).

Crê-se ainda perfeitamente justificado esse entendimento, já que a preferência «do arrendatário de um local não pode ser transformada em cana de pesca para a aquisição» de vantagens que excedam a intenção inicial da lei ao consagrá-la, ou ser convertida numa «oportunidade óptima de litigiosidade e de enriquecimento casual». «A preferência não é um imperativo inderrogável: é um instituto que funciona dentro das possibilidades, numa conjugação óptima dos interesses em presença. Doutra maneira a preferência seria muito menos um meio de defesa da posição do arrendatário do que um direito de aquisição de novas coisas, onerando ainda mais gravemente a situação do senhorio» (J. Oliveira Ascensão, Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Inocêncio Galvão Telles, «Direito de Preferência do Arrendatário»,Vol. III, Almedina, 2002, 255).

5.3.2. Concretizando, e tal como os Autores desde logo o afirmaram na sua petição inicial, pretendendo ver aqui reconhecidos, contra plúrimos co-Réus, alegados direitos de preferência próprios sobre o prédio urbano sito na Travessa ..., nº ..., na freguesia da ..., em ..., invocaram para o efeito a sua qualidade de arrendatários do mesmo, inclusivamente já reconhecida em prévia acção de preferência, intentada em 29 de Maio de 2001 (inicial Processo nº ... - depois nº 9.954/01.9... - da ...ª Vara Cível de ..., ...ª Secção), por Acórdão do S.T.J. nela proferido em 12 de Janeiro de 2012, transitado em julgado em 30 de Janeiro de 2012 (factos provados enunciados sob os números 04, 05 e 37).

Contudo, reportando-se a dita qualidade de arrendatários urbanos ao ..., ao ... e ao ... do prédio em causa, apenas os 1ºs co-Autores (AA e BB) se mantêm como originários arrendatários (mais precisamente, do ...), tendo as demais primitivas Arrendatárias falecido entretanto. Com efeito, OO (antes ocupante do ...) faleceu na pendência da anterior acção de preferência; e NN (antes ocupante do ...) faleceu em 08 de Abril de 2012, já depois do trânsito em julgado da sentença ali proferida (factos provados enunciados sob os números 37 e 38).

Ora, e de acordo com a tese perfilhada supra, entende-se que, com a morte das ditas Arrendatárias, extinguiram-se os contractos de arrendamento respectivos (nos quais se fundavam os direitos legais de preferência invocados na primeira acção de preferência intentada -Processo nº ..., da ...ª Vara Cível de ...,...ª Secção -, e agora nesta).

Contudo, e relativamente a OO, não obstante se ter extinta a sua qualidade de arrendatária antes do dito direito legal de preferência lhe poder ter sido ali reconhecido, certo é que o 2º co-Autor (CC), o 3º co-Autor (DD), o 4º co-Autor (EE), a 5ª co-Autora (FF) e a 6ª co-Autora (GG) sucederam conjuntamente na posição daquela primeira, na inicial acção de preferência, conforme habilitação ali promovida e sentenciada.

Poder-se-ia argumentar (contestando, ainda assim, a transmissão do direito legal de preferência da primeira a estes) que a habilitação referida teria sido apenas processual, a tanto tendo limitando os seus efeitos, já que não teria virtualidade para, ao arrepio da lei substantiva, permitir uma simultânea sucessão num direito substantivo extinto com a morte do respectivo titular (de acordo com o disposto no art. 2025º, nº 1 do C.C., onde expressamente se acautela que não «constituem objecto de sucessão as relações jurídicas que devam extinguir-se por morte do respectivo titular, em razão da sua natureza ou por força da lei»). Ora, não tendo os referidos co-Autores alegado que, face ao regime do arrendamento urbano então em vigor, sucederam -conjunta e simultaneamente - na posição ocupada por OO no contrato de arrendamento respectivo, não teriam podido suceder no direito legal de preferência que o mesmo pressupunha.

Logo, a habilitação processual havida, desacompanhada de outra adicional consideração, poderia ser tida como insuficiente para a legitimação dos 2º co-Autor (CC), 3º co-Autor (DD), 4º co-Autor (EE), 5ª co-Autora (FF) e 6ª co-Autora (GG) nestes autos: em «sede de apreciação da viabilidade do incidente de habilitação e da legitimidade dos habilitados, o Tribunal não tem que fazer um juízo prévio acerca da titularidade do direito invocado. Releva é que na pendência da acção principal a parte falecida se arrogava a titularidade do direito, no caso do direito de preferência do arrendatário. Saber se, em definitivo, tal direito lhe assiste é questão estranha à finalidade do incidente de habilitação de herdeiros» (Ac. do STJ, de 08.05.2007, Agravo nº 1107/07, 6ª Secção, in www.dgsi.pt).

Contudo, e após a habilitação processual dos ditos co-Autores (para, conjuntamente, prosseguirem a acção de preferência no lugar inicialmente ocupado na mesma por OO), viria a ser proferida decisão final de mérito, transitada em julgado, que -expressa e inequivocamente - considerou terem os mesmos igualmente beneficiado da transmissão do direito legal de preferência antes titulado pela dita OO, ao reconhecê-lo conjuntamente com as demais ali co-Autoras.

Com efeito, quer no relatório, quer nos factos provados, quer na fundamentação de direito, quer no dispositivo final, surgem as Autoras referidas colectivamente, sem qualquer exclusão, retirando-se logo do primeiro facto provado que foram consideradas na decisão como as «inquilinas do ..., do ...e ...» (facto provado enunciado sob o número 37).

Terá, assim, o dito Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (afastando-se da tese perfilhada supra), seguido a mesma orientação defendida pelo seu Sr. Conselheiro Lopes do Rego, quando o mesmo afirma: «Aderindo, no essencial, à orientação que, numa interpretação funcionalmente adequada, exige a subsistência da relação locatícia com base na qual se constituiu originariamente o direito de preferência no momento em que este vai ser actuado, apenas se introduz uma precisão na doutrina que afere os pressupostos do direito de preferência à data em que é proferida a decisão judicial definitiva que o reconhece: no nosso entendimento a qualidade de arrendatário que substancialmente legitima a titularidade do direito real de aquisição deverá subsistir, não no momento “processual” do encerramento da discussão e julgamento da causa (até ao qual seria possível trazer à colação os factos supervenientes que tivessem posto termo a uma relação de arrendamento, originariamente existente), mas no momento “substantivo” em que se subjectiva o direito a exercer a referida preferência - e que é, por força do estipulado no art.1410º do CC, aquele em que o titular do direito real de aquisição teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação, ficando, consequentemente, colocado em condições de exercitar o seu direito. Deste modo, apreendidos pelo interessado os elementos essenciais da alienação ainda em vida da relação locatícia que fundamenta a outorga do direito potestativo em causa, poderia ele intentar ainda, nos 6 meses subsequentes, a respectiva acção, sendo identicamente possível, v. g., a habilitação de herdeiros nesta causa, desde que tempestivamente proposta, no caso de decesso do inquilino, mesmo que o óbito deste extinguisse a relação de arrendamento. O que, neste nosso entendimento, estará excluído será a possibilidade de exercício da preferência quando o seu originário titular alega ter tido conhecimento dos elementos essenciais da alienação apenas numa data em que já não detinha a qualidade jurídica de arrendatário, nenhuma conexão tendo, nesse momento, com o imóvel que funciona como objecto mediato do seu direito» (Ac. do STJ, de 04.02.2010, Processo nº 3370/05.0TBPVZ.P1.S1, com bold apócrifo).

Logo, encontra-se definitivamente assente, e de forma vinculativa para estes autos, que o inicial direito legal de preferência de OO se transmitiu conjuntamente aos 2º co-Autor (CC), 3º co-Autor (DD), 4º co-Autor (EE), 5ª co-Autora (FF) e 6ª co-Autora (GG).

Já relativamente a NN, viu a mesma ser-lhe judicialmente reconhecido - em 30 de Janeiro de 2012 - o seu direito legal de preferência, só após tendo falecido - em 08 de Abril do mesmo ano; e com esse óbito sido extinta a sua qualidade de arrendatária (factos provados enunciados sob os números 37 e 38).

Contudo, defendeu a 1ª co-Autora (AA) nestes autos ter-lhe sucedido no dito direito, com base no mesmo demandando os co-Réus, por o ter adquirido por legado testamentário, instituído a seu favor pela primitiva Arrendatária.

Com efeito, por testamento público de 03 de Junho de 2008, NN declarou que «lega a AA, (…) os direitos que lhe advierem na acção judicial em que é autora, e que corre os seus termos sob o número de processo ..., pela ... Secção, da ... Vara Cível de ..., na medida em que os mesmos sejam transmissíveis “mortis causa”» (facto provado enunciado sob o número 39).

Dir-se-á, reiterando a tese perfilhada supra, que, tendo já ocorrido o eficaz exercício do direito potestativo de preferência legal de arrendatário, incluindo o seu reconhecimento judicial, com trânsito em julgado, ocorreu então (por força daquele reconhecimento) a transferência da titularidade do direito de propriedade sobre dois terços indivisos do prédio urbano sobre que incidia, limitando-se esta acção a impor a sua eficácia aos Réus não simultaneamente demandados naquela outra.

Assim, sendo este novo direito (repete-se, de propriedade sobre dois terços indivisos de um prédio urbano) de conteúdo patrimonial - ou, pelo menos, sendo o actual reflexo patrimonial daquele anterior direito (de preferência legal) -, por sua natureza passível de sucessão mortis causa, nada obstou à respectiva transmissão por legado testamentário.

Logo, e também relativamente ao inicial direito legal de preferência de NN, se verifica terem-se transmitido à 1ª co-Autora (AA), 3º co-Autor (DD), os reflexos patrimoniais do seu oportuno exercício.

Concluindo, e salvo sempre o devido respeito por opinião contrária, não asiste razão aos 2ª co-Ré (Par – co-Participações Comerciais, Limitada), 3º co-Réu (JJ), 8ª co-Ré (Leopor - Imobiliária, Limitada) e 9ª co-Ré (LP..., S.A.), nem à 5ª Ré (Caixa Geral de Depósitos, S.A.), quando os mesmos defenderam nos autos a impossibilidade legal dos Autores aqui exercerem os direitos resultantes dos iniciais direitos legais de preferência titulados por OO e por NN.

Deverá, assim, julgar-se em conformidade, considerando improcedente, por não provada, a excepção peremptória de não transmissibilidade aos Autores do direito legal de preferência de OO e de NN, deduzida pelos 2ª co-Ré (Par – co-Participações Comerciais, Limitada), 3º co-Réu (JJ), 8ª co-Ré (Leopor - Imobiliária, Limitada) e 9ª co-Ré (LP..., S.A.), na contestação conjunta que apresentaram, e pela 5ª Ré (Caixa Geral de Depósitos, S.A.).”.

O que se vem de transcrever assume-se como a decisão acertada face aos factos assentes e à interligação entre os vários momentos processuais da acção de preferência, pelo que nada mais há a acrescentar.

Sustentam ainda os apelantes que, a proceder a argumentação da decisão recorrida, ainda terá de se entender que ““a ratio” da preferência do arrendatário habitacional está no objectivo de facilitar o acesso à habitação própria do mesmo e não de outros (artº 65 nº 2 da Constituição da República)”, pelo que considerar válida a transmissão do direito de preferência no caso dos autos viola este preceito constitucional.

Antes de mais, refira-se que esta alegação de inconstitucionalidade não se mostra fundamentada em termos perceptiveis, não se entendendo qual a interpretação que os apelantes pretendem ver consagrada.

Por outro lado, o juízo de inconstitucionalidade apenas pode recair sobre a interpretação de normas e não sobre as decisões relativas a essas normas, pelo que nada há a decidir quanto a esta matéria.

Assim sendo, e quanto a este aspecto, é a apelação improcedente”.

Vejamos:

Igualmente neste tocante a identidade de razões de decidir, entre o constante da sentença de 1ª instância e o acórdão recorrido, é total e absoluta.

Logo, existe obviamente dupla conforme.

8 – Falta de fundamentação para a responsabilização dos RR. por eventuais demoras da justiça e ausência dos requisitos necessários à sua responsabilidade extra-contratual.

Neste tocante, encontramo-nos perante a impugnação, do ponto de vista substantivo, do decidido na sentença proferida em 22 de Janeiro de 2015 e, desde logo, pela simples enunciação dos temas de discordância se demonstra que os recorrentes visam afinal pedir ao Supremo Tribunal de Justiça a reapreciação do que foi materialmente decidido pela 1ª instância e pelo Tribunal da Relação de Lisboa, como se existisse e sobrasse ainda uma outra instância a quem competisse fazê-lo (sendo certo que nos precisos termos do artigo 671º, nº 3, do Código de Processo Civil tal não é juridicamente possível).

Logo, existe indiscutivelmente dupla conforme.

Dir-se-á, ainda, relativamente ao referido pelos recorrentes aquando da sua notificação nos termos e para os efeitos do artigo 655º, nº 1, do Código de Processo Civil:

1º - Os recorrentes interpuseram revista normal e não revista excepcional, não fazendo aliás a menor alusão ao disposto no artigo 672º do Código de Processo Civil, nem aos correspondentes fundamentos autónomos (que pura e simplesmente ignoraram).

É matéria completamente omissa nas suas alegações/conclusões de revista (normal).

Ora, a notificação nos termos e para os efeitos do artigo 655º, nº 1, do Código Processo Civil não serve para os recorrentes alterarem, querendo, o tipo de recurso que, livre e voluntariamente, optaram por interpor, fazendo-o ex novo ao sabor das observações jurídicas que lhe foram transmitidas nesse despacho judicial, o qual era unicamente destinando ao exercício do contraditório, nos termos do artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil, relativamente à pré-anunciada inadmissibilidade da sua revista.

Se podendo interpor revista excepcional o não fizeram, tal só pode ser entendido como o seu convencimento quanto à suficiência e suporte legal da interposição de uma revista normal, arcando por isso mesmo com o ónus da deficiente estratégia processual que adoptaram.

No fundo, sibi imputet.

Para além de que tal invocação da revista excepcional prevista no artigo 672º do Código de Processo Civil, realizada nestas circunstâncias, terá necessariamente de considerar-se extemporânea (o prazo para a interposição da revista excepcional encontra-se há muito precludido)

(Neste mesmo sentido, vide o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Junho de 2022 (relatora Ana Resende), proferido no processo nº 6236/13.7TBMAI-F-P1.S1, publicado in www.dgsi.pt).

Pelo que não tem fundamento a referida convolação visada pelos recorrentes.

2º - É evidente que a não admissibilidade do presente recurso de revista não constitui, de forma alguma, uma afronta, em termos gerais, ao princípio da tutela jurisdicional efectiva e ao direito ao acesso aos tribunais consagrado nos artigos 2º, 18º, nº 2, e 20º da Constituição da República Portuguesa.

Dispõe o artigo 20º, nºs 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa:

“A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direito e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos” (nº 1).

“Para a defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter a tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos”.

Conforme enfatizam sobre esta matéria Gomes Canotilho e Vital Moreira, in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, I Volume, Coimbra Editora, 2007, a página 418:

“(...) a Constituição alude expressis verbis ao direito à tutela jurisdicional efectiva (epígrafe) ou ao direito à tutela efectiva (nº 5 do artigo 20º da CRP). Não é suficiente garantia o direito de acesso aos tribunais ou o direito de acção. A tutela dos tribunais deve ser efectiva. O princípio da efectividade articula-se entre direitos materiais e direitos processuais, entre direitos fundamentais e organização e processo de protecção e garantia. (...) O princípio da efectividade postula, desde logo, a existência de tipos de acções ou recursos adequados (cfr. Código de Processo Civil artigo 2º-2), tipos de sentenças apropriados às pretensões de tutela deduzida em juízo e clareza quanto ao remédio ou acção à disposição do cidadão”.

Referem, por seu turno e a este mesmo propósito, Jorge Miranda e Rui Medeiros in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Tomo I, Coimbra Editora 2005, a páginas 190 a 191:

“O direito ao processo traduz-se no direito de abertura de um processo após a apresentação da pretensão inicial, com o consequente dever do órgão jurisdicional sobre ela se pronunciar mediante decisão fundamentada (...)

a) O legislador dispõe de uma ampla margem de liberdade na concreta modelação do processo, cabendo-lhe designadamente ponderar os diversos direitos e interesses constitucionalmente protegidos relevantes – incluindo o próprio interesse de ambas as partes (e não apenas do autor) – e, em conformidade, disciplinar o âmbito do processo, a legitimidade, os prazos, os poderes de cognição do tribunal e o processo de execução. Não é, por isso, incompatível com a tutela constitucional do acesso à justiça a imposição de ónus processuais às partes;

b) Em qualquer caso, e antecipando considerações que não podem ser dissociadas da ideia de um processo equitativo, os regimes adjectivos devem revelar-se funcionalmente adequados aos fins do processo e conformar-se com o princípio da proporcionalidade, não estando, portanto, o legislador autorizado, nos termos do artigos 13º e 18º, nºs 2 e 3, a criar obstáculos que dificultem ou prejudiquem, arbitrariamente ou de forma desproporcionada, o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efectiva (...)

O direito ao processo, conjugado com o direito à tutela jurisdicional efectiva, impõe, por conseguinte, a prevalência da justiça material sobre a justiça formal, isto é, sobre uma pretensa justiça que, sobre a capa de “requisitos processuais” se manifeste numa decisão que, afinal, não consubstancie mais que uma simples denegação de justiça.

O princípio pro actione, assim afirmado, não impede, naturalmente, a existência de requisitos ou pressupostos processuais e não significa, mesmo nos litígios que opoem os particulares aos poderes públicos, pro particular, pois não opera no plano do direito material, mas no plano do direito processual. Por isso, em rigor, a titularidade do direito de acesso aos tribunais não pressupõe a efectiva titularidade de um direito ou interesse legalmente protegido, lesado ou ameaçado. Aliás, bem vistas as coisas, no âmbito do artigo do artigo 20º, e uma vez que é legítima a interposição por lei de ónus processuais às partes, o tribunal nem sequer está vinculado “a que, seja qual for a conduta processual da parte, se profira sempre uma decisão sobre o mérito da causa” (e ainda que no meio processual utilizado se visa a tutela de hipotéticos direitos fundamentais) e se faculte, enquanto ela não for proferida, o recurso da mais alta instância dos tribunais judiciais.

Porém, o princípio pro actione impede que simples obstáculos formais sejam transformados em pretextos para recusar uma resposta efectiva à pretensão formulada. A ideia da favor actionis aponta outrossim para a atenuação da natureza rígida e absoluta das regras processuais”.

Salienta Gomes Canotilho in “Direito Constitucional e Teoria da Constituição”, Almedina 7ª edição, a página 275 a 277:

“(...) Imposição jurídico-constitucional ao legislador.

O princípio visa garantir uma melhor definição jurídico-material das relações entre Estado-cidadão e particulares-particulares, e, ao mesmo tempo, assegurar uma defesa dos direitos “segundo os meios e métodos de um processo juridicamente adequado”. Por isso, a abertura da via judiciária é uma imposição directamente dirigida ao legislador no sentido de dar operatividade prática à defesa de direitos. Esta imposição é de particular importância nos aspectos processuais.

(...) Condição de um direito subjectivo.

A defesa dos direitos e o acesso aos tribunais não pode divorciar-se das várias dimensões reconhecidas pela constituição ao catálogo dos direitos fundamentais. O sentido global da combinação das dimensões objectiva e subjectiva dos direitos fundamentais é que o cidadão, em princípio, tem assegurada uma posição jurídica subjectiva cuja violação lhe permite exigir a protecção jurídica. Isto pressupõe que, ao lado da criação de processos legais aptos para garantir essa defesa, se abandone a clássica ligação da justicialidade ao direito subjectivo e se passe a incluir no espaço subjectivo do cidadão todo o círculo de situações juridicamente protegidas. O princípio da protecção jurídica fundamenta, assim, um alargamento da dimensão subjectiva, e alicerça, ao mesmo tempo, um verdadeiro direito ou pretensão de defesa das posições jurídicas ilegalmente lesadas (artigo 202º, nº 2, que se refere, precisamente, “a defesa dos direitos e interesses protegidos”)”.

Ou seja, estes princípios de natureza constitucional, absolutamente estruturantes do sistema judiciário português, consagram e impõem a superior prevalência dos vectores fundamentais que exigem a conformidade da aplicação da lei processual com os imperativos impostos pela Constituição da República Portuguesa nos seguintes termos gerais:

a) Garantia dada pelo sistema judiciário de que serão rigorosamente observadas todas as condições para que a lide processual fique subordinada, por um lado, ao princípio da plena igualdade de armas entre as partes litigantes e, por outro, à salvaguarda da real e substantiva possibilidade de afirmação material das respectivas pretensões, sem a colocação de entraves iníquos, obstáculos de índole processual desproporcionados ou excessivamente formalistas que, as impeçam, diminuam ou dificultem injustificadamente, impondo-se igualmente, a prosseguir e realizar através do esquema processual concretamente adoptado pelo legislador ordinário, o primado da substância (verdade material) sobre a forma (verdade estritamente processual), enquanto concretização do princípio pro actione.

O processo judicial tal como o legislador constitucional o consagrou deve servir como espaço privilegiado da efectivação, a cada passo, do princípio da igualdade no exercício das faculdades legalmente previstas e no cumprimento das obrigações processuais estabelecidas, sem que da aplicação da lei do processo possa concretamente resultar um indevido benefício de uma das partes em desfavor da outra, num quadro de identidade de circunstâncias, tratando desigualmente aquilo que na, sua essência, é igual.

É este o limite (vulgo, linha vermelha) que, uma vez ultrapassado ou desrespeitado, origina necessariamente a severa e intransigível intervenção do juízo de inconstitucionalidade, o qual se destina a repor, fazer valer e reafirmar a aplicação concreta, em cada momento, desses princípios básicos e intransponíveis, evitando que os mesmos possam ser, de algum modo, ofendidos, afectados ou desvalorizados.

b) Porém, e sem prejuízo da afirmação dogmática do princípio da igualdade de tratamento das partes na contenda judicial e da protecção do direito de acção (salvaguardado pelo imperativo da tutela jurisdicional efectiva), postulados essenciais e imprescindíveis para a existência de um processo justo e equitativo, importa tomar em consideração, dentro deste quadro geral, o amplo poder de modelação e conformação do sistema processual que a Constituição da República Portuguesa confere ao legislador ordinário na escolha das soluções concretas concernentes à tramitação do processo e que, sem nunca ofender ou afectar, no plano substantivo, aqueles princípios, sejam idóneas a promover uma acção judicial célere, tramitada de forma expedita e verdadeiramente funcional, com eficaz gestão dos meios disponíveis, desenvolvida em termos racionais e sustentáveis, permitindo obter uma decisão final em tempo útil e razoável, com o afastamento de quaisquer expedientes dilatórios, manobras de entorpecimento processual, pedido realização de diligências inúteis ou tentativas de gerar delongas injustificadas e desnecessárias.

Ou seja, sem colocar em causa a consagração, em termos gerais, dos princípios estruturantes da igualdade e da necessária garantia de um processo justo e equitativo, o sistema jurídico nacional dispõe ainda de ampla liberdade de modelação quanto ao esquema processual que, na sua visão política e estratégica próprias, melhor prossiga as finalidades práticas associadas ao desígnio da obtenção de uma decisão judicial final em tempo razoável, através de uma eficaz gestão dos meios disponíveis (naturalmente escassos), desenvolvida em termos racionais e em moldes sustentáveis.

De resto e neste sentido, há muito que constitui jurisprudência absolutamente firmada do Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal de Justiça que o legislador ordinário dispõe de plena liberdade de conformação na concreta modelação processual por si adoptada, desde que não se estabeleçam mecanismos arbitrários ou desproporcionados de compressão ou negação do direito à prática dos actos predispostos ao exercício do direito de acção, em particular no caso da impugnação recursiva das decisões judiciais desfavoráveis.

Ou seja, a limitação do direito ao recurso em função da hierarquia existentes entre as diversas instâncias, através do estabelecimento de um sistema de alçadas, bem como a reserva ou selecção de competências relativamente a determinada categoria de actos (designadamente as questões puramente processuais), não é susceptível de configurar qualquer tipo de negação do acesso à justiça que colida e afronte os princípios basilares de um Estado de Direito, em termos do respeito e garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais, prescrito no artigo 2º da Constituição da República Portuguesa, desde que do funcionamento prático dessa concreta estrutura recursória, antecipadamente conhecida e vigente, não venha a resultar qualquer situação de arbítrio, tratamento discriminatório ou casuístico que ofenda, nessas anómalas circunstâncias, a equidade e a efectividade da própria tutela jurisdicional.

Conforme se enfatizou no acórdão do Tribunal Constitucional nº 159/2018, de 13 de Março de 2019 (relatora Catarina Sarmento e Castro), proferido no processo nº 43/16, publicado in www.tribunalconstitucional.pt:

“Sublinhe-se ainda que, como se afirmou no Acórdão n.º 370/2007, o qual seguiu, no mesmo sentido, os Acórdãos n.os 157/88 e 187/90, «a vinculação jurídico-material do legislador ao princípio da igualdade não elimina a liberdade de conformação legislativa, pertencendo-lhe, dentro dos limites constitucionais, definir ou qualificar as situações de facto ou as relações da vida que hão de funcionar como elementos de referência a tratar igual ou desigualmente». Continua o mesmo aresto, afirmando que «aos tribunais, na apreciação daquele princípio, não compete verdadeiramente «substituírem-se» ao legislador, ponderando a situação como se estivessem no lugar dele e impondo a sua própria ideia do que seria, no caso, a solução “razoável”, “justa” e “oportuna” (do que seria a solução ideal do caso); compete-lhes, sim “afastar aquelas soluções legais de todo o ponto insuscetíveis de se credenciarem racionalmente” (acórdão da Comissão Constitucional, n.º 458, Apêndice ao Diário da República, de 23 de agosto de 1983, pág. 120)».

Tal entendimento encontra-se aliás sufragado vários outros arestos do Tribunal Constitucional.

A este propósito, vide:

- o acórdão do Tribunal Constitucional nº 396/2014, de 7 de Maio de 2014 (relator Fernando Ventura), proferido no processo nº 698/13, publicado in www.tribunalconstitucional.pt., onde se salientou:

“(...) é entendimento abundante e reiterado deste Tribunal que o princípio da igualdade não proíbe ao legislador que faça distinções, mas apenas diferenciações de tratamento sem qualquer fundamento razoável ou sem qualquer justificação objetiva e racional (cfr., por exemplo, os Acórdãos n.ºs 319/2000 e 460/2011 e, entre outros autores, GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, ob. cit., p. 339); avaliação que se obtém mediante a ponderação da ratio das soluções em confronto e aferição destinada a determinar se a diferenciação possui fundamento razoável. Neste domínio, o Tribunal Constitucional controla sobretudo o respeito pela proibição do arbítrio, enquanto critério negativo e limitador da liberdade do legislador ordinário”.

- o acórdão do Tribunal Constitucional nº 383/2009, de 23 de Julho de 2009 (relator Vítor Gomes), proferido no processo nº 930/08, publicado in www.tribunalconstitucional.pt, que referiu:

“(...) o princípio da igualdade consagrado no n.º 1 do artigo 13.º da Constituição, enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se na ideia geral de proibição de arbítrio. O que ele proíbe ao legislador não é que estabeleça distinções: proíbe-lhe, isso sim, que estabeleça distinções de tratamento materialmente infundadas, irrazoáveis ou sem justificação objectiva e razoável”.

- o acórdão do Tribunal Constitucional nº 46/2005, de 26 de Janeiro de 2005 (relator Benjamin Rodrigues), proferido no processo nº 260/03, publicado in www.tribunalconstitucional.pt, onde pode ler-se:

(...) no que toca à garantia constitucional de acesso ao direito e à justiça, o Tribunal Constitucional já teve, por diversas vezes, oportunidade de explicitar quais são as suas exigências, para o efeito de com elas confrontar normas que impõem ónus processuais, resultando da consideração de tal jurisprudência que não é incompatível com a tutela constitucional do acesso à justiça a imposição de ónus processuais às partes, desde que, na linha do que supra se referiu, tais encargos não sejam, nem arbitrários, nem desproporcionados, quando confrontada a conduta imposta com a consequência desfavorável atribuída à correspondente omissão”.

- o acórdão do Tribunal Constitucional nº 253/2018, de 17 de Maio de 2018 (relator Gonçalo de Almeida Ribeiro), proferido no processo nº 699/2017, publicado in www.tribunalconstitucional.pt., onde se afirmou:

“Sobre o alcance básico do princípio da igualdade enquanto norma de controlo judicial do poder legislativo, é representativa da jurisprudência constitucional a posição expressa no seguinte trecho Acórdão n.º 409/99, recentemente reiterada e desenvolvida no Acórdão n.º 157/2018:

«O princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, impõe que se dê tratamento igual ao que for essencialmente igual e que se trate diferentemente o que for essencialmente diferente. Na verdade, o princípio da igualdade, entendido como limite objetivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a adoção de medidas que estabeleçam distinções. Todavia, proíbe a criação de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, isto é, desigualdades de tratamento materialmente não fundadas ou sem qualquer fundamentação razoável, objetiva e racional. O princípio da igualdade enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se numa ideia geral de proibição do arbítrio.

(...) A recorrente questiona a conformidade da norma aplicada na decisão recorrida com o direito de acesso à justiça (artigo 20.º, n.º 1, da Constituição).

O Tribunal Constitucional tem concluído, em jurisprudência antiga e consolidada, pela inexistência, em processo civil, de um direito fundamental a um duplo grau de jurisdição. Como se afirmou no Acórdão n.º 638/98, «o direito à tutela jurisdicional não é (…) imperativamente referenciado a sucessivos graus de jurisdição. Ali se assegura apenas em termos absolutos, e num campo de estrita horizontalidade, o acesso aos tribunais para obter a decisão definitiva de um litígio (Acórdão n.º 65/88) ou o direito a ver solucionados os conflitos, segundo a lei aplicável, por um órgão que ofereça garantias de imparcialidade e independência, e face ao qual as partes se encontrem em condições de plena igualdade no que diz respeito à defesa dos respetivos pontos de vista (…) (Acórdão n.º 638/98).» E tem entendido ainda que a «existência de limitações de recorribilidade, designadamente através do estabelecimento de alçadas (de limites de valor até ao qual um determinado tribunal decide sem recurso), funciona como mecanismo de racionalização do sistema judiciário, permitindo que o acesso à justiça não seja, na prática, posto em causa pelo colapso do sistema, decorrente da chegada de todas (ou da esmagadora maioria) das ações aos diversos “patamares” de recurso.» (Acórdãos n.ºs 239/97, 100/99 e 431/2002).

Segundo a interpretação da lei acolhida na decisão recorrida, o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça para superação de contradições jurisprudenciais, em domínios em que a regra é a da irrecorribilidade da decisão do Tribunal da Relação, está condicionado pelos critérios gerais de valor da causa e da sucumbência consagrados no n.º 1 do artigo 629.º do Código de Processo Civil. No caso dos presentes autos, em que é interposto recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdão do Tribunal da Relação que reaprecia sentença de 1.ª instância proferida em recurso de uma decisão de natureza administrativa, o que a recorrente pretende é um terceiro grau de jurisdição. Ora, entendendo-se que a Constituição não impõe sequer um segundo grau de jurisdição em processo civil e que a regulação dos graus de jurisdição através do estabelecimento de alçadas nada tem de arbitrária, é forçoso concluir que não se verifica aqui qualquer violação do direito de acesso à justiça.

(...) não estando em causa o direito de acesso aos tribunais de quem recorre, o legislador goza de uma ampla liberdade de conformação política na fixação dos critérios de acesso ao vértice da ordem jurisdicional em que o processo se insere. Tendo o Supremo Tribunal de Justiça interpretado a lei no sentido de que tal acesso é condicionado pelo valor da causa e da sucumbência, valem, neste âmbito, as seguintes palavras do Acórdão n.º 701/2005: «nenhuma norma ou princípio constitucional impõe a obrigatoriedade de recurso para o Supremo, para uniformização de jurisprudência, de todos os acórdãos proferidos pelas Relações; concretamente, nenhuma norma ou princípio constitucional impõe a obrigatoriedade de recurso para o Supremo, para uniformização de jurisprudência, de acórdão da Relação do qual não seja possível recorrer por motivo respeitante à alçada da Relação.».

No âmbito da vasta jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça nesta matéria, vide, entre muitos outros, os seguintes arestos:

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Outubro de 2020 (relator Oliveira Abreu), proferido no processo nº 8111/16.4T8PRT-B.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt;

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Outubro de 2020 (relator Acácio das Neves), proferido no processo nº 954/18.0T8VRL-A.G1-1.S1, publicado in www.dgsi.pt;

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Dezembro de 2020 (relatora Rosa Tching), proferido no processo nº 956/10.5TBSTS.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt;

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Outubro de 2020 (relator Pedro Lima Gonçalves), proferido no processo nº 19705/16.8T8SNT-A.L1.A.S1, publicado in www.dgsi.pt;

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Março de 2021 (relatora Leonor Rodrigues), proferido no processo nº 488/12.7TTTMR.E3.A.S1, publicado in www.dgsi.pt;

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Março de 2022 (relator José Rainho), proferido no processo nº 1097/21.5T8LRA.G1.S1, publicado in www.dgsi.pt;

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Novembro de 2021 (relator Ricardo Costa), proferido no processo nº 9561/19.0T8VNG.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt;

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de Abril de 2021 (relatora Ana Paula Boularot), proferido no processo nº 20896/12.2YYLSB-A.L2.S1, publicado in www.dgsi.pt;

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de Junho de 2020 (relator Chambel Mourisco), proferido no processo nº 1074/17.0T8PTG.E1.S1, publicado in ECLI.pt;

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de Junho de 2023 (relatora Ana Resende), proferido no processo nº 33/20.0T8FNC-F.L1.S1, publicado in www.dgsi.pt;

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Maio de 2022 (relatora Graça Trigo), proferido no processo nº 63943/03.2TVLSB-B.L1.S1, publicado in www.dgsi.pt;

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de Abril de 2024 (relatora Clara Sottomayor), proferido no processo nº 8111/16.4T8PRT-I.P1.S1, publicado in www.dgsi.pt;

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Novembro de 2024 (relatora Maria de Deus Correia), proferido no processo nº 2051/21.2T8LLE-A.E1.S1, publicado in www.dgsi.pt;

- acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de Dezembro de 2023 (relatora Isabel Salgado), proferido no processo nº 9330/19.7T8LSB-B.L1.S1, publicado in www.dgsi.pt.

Em suma e por todo o exposto, face à manifesta constituição de dupla conforme nos termos do artigo 671º, nº 3, do Código de Processo Civil e à não interposição de revista excepcional nos termos do artigo 672º do Código de Processo Civil, não há lugar ao conhecimento do objecto do recurso o qual se julga findo, nos termos dos artigos 652º, nº 1, alínea b) e 679º do Código de Processo Civil.

Pelo exposto:

Julgo findo o presente recurso de revista, não havendo lugar ao conhecimento do seu objecto, nos termos dos artigos 652º, nº 1, alínea b), e 679º do Código Civil.

Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 2 (duas) UCs”.

Apresentaram os recorrentes reclamação para a Conferência nos seguintes termos:

1º Os RR. ora recorrentes não se conformando com o douto acórdão da Relação de Lisboa que confirmou a douta sentença a 1ª instância, apresentaram um recurso de revista normal, com fundamento do disposto no artº 640º nº 1 do CPC (Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto), o qual refere que:

1º Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto , deve o recorrente obrigatoriamente especificar , sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) a decisão, que no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas

2º Os RR. nas suas alegações de recurso de apelação impugnaram expressamente a matéria constante dos pontos 22, 35, 38, e 46 da fundamentação de facto, mantendo, todavia, a Relação de Lisboa a decisão da 1ª instância.

3º Na verdade, houve um erro de direito ao consignar-se que, no Procº nº ... a acção de preferência foi remetida à conta, por inércia das partes, como consta do nº 22 da fundamentação de facto.

O Tribunal da 1ª instância fixou erradamente esta matéria, que nem sequer foi articulada pelas partes, sentindo-se os RR. muito prejudicados.

4º Ora, se inércia houve, os únicos culpados são os AA., aos quais incumbia o impulso processual, já que, passados que foram mais de 6 anos após a data da propositura da acção, ainda não tinham logrado realizar o registo da acção de preferência, na respectiva Conservatória como era obrigatório .

5º Por outro lado, não fazia qualquer sentido, que fossem os RR. a suportar a taxa de justiça, da exclusiva responsabilidade dos AA., em virtude dos autos terem sido remetidos à conta, para o eventual prosseguimento da instância.

Assim sendo, a acção de preferência foi remetida â conta por inércia dos AA.. pelo que tratando-se de um erro de direito é sindicável pelo STJ.

6º A matéria constante do nº 35 da fundamentação de facto foi provada por mera presunção judicial.

Analisando a matéria constante do artº 55º da P.I., confrontada com a que consta no nº 35 da fundamentação de facto, verifica-se que inexiste qualquer ilacção, ou inferência susceptível de ser considerada uma presunção, na medida em que, acabou por ser considerada provada na integra a matéria constante deste artigo da PI..

7º Assim, não houve lugar a qualquer presumpção judicial, na medida em que, não se verificou a ilacção de um facto conhecido, para firmar um facto desconhecido (artº 349º do CC), constituindo um erro de direito.

Aliás, convenhamos que a prova por presumção judicial era completamente desnecessária e descabida, bastando analisar o pacto social dos RR. ali intervenientes, para se verificar a inexistência de qualquer conluio, mas apenas um acto normal de gestão, constituindo um grave erro de direito, concluir-se que as alienações e permutas tiveram como “objectivo impedir o efeito substantivo da procedência da acção de preferência “.

Desta forma, tratando-se de uma questão direito compete ao STJ avaliar da admissibilidade ou não das referidas ilacções, face ao disposto no artº 351º do CC (Ac. do STJ de 15-06-2005 in DGSI).

8º Aliás, reveste natureza jurídico-conclusiva a matéria respeitante :- “as alienações e permutas das fracções .. do prédio urbano”….” teve como objectivo o impedir o efeito substantivo da procedência da acção de preferência”, devendo tais expressões, ser consideradas como não escritas.

9º A matéria do nº 46 dos factos provados, onde vem referido que :“a instauração e pendência, quer do Procº nº ... da ...ª Vara Cível de ... ...ª secção, quer do presente, causaram aos AA. desgaste físico e sofrimento”, é vaga e imprecisa, consubstanciando um erro de direito, na medida em que, quando este processo (Procº nº ...) deu entrada em Juízo, as ex-AA. OO e KKK já tinham falecido, como se comprova pelos autos, não beneficiando da pendencia deste processo, constituindo imprecisão, sendo certo que, apenas os factos concretos podem integrar a matéria de facto, já que, as eventuais dores e sofrimento são intransmissíveis, devendo a matéria do nº 46 deve ser declara como não escrita.

Como já se aludiu, os RR. impugnaram expressamente a matéria de facto constante dos nºs 22, 35, 38, e 46º da fundamentação de facto na sentença da 1ª instância e apenas o douto acórdão da Relação, ora recorrido, se pronunciou, pelo que com todo o respeito, não existe quanto a esta matéria qualquer dupla conforme.

Assim sendo, não se verificando a dupla conforme, com todo o respeito, que é muito, deveria ser admitido o recurso de revista normal, nos termos do disposto no artº 640º do CPC.

A rejeição liminar do recurso desrespeita o princípio da proporcionalidade dos ónus, cominações e preclusões impostos pela lei processual que constitui uma manifestação do principio da proporcionalidade das restrições, consagradas no artº 18º nºs 2 e 3 da CRP e da garantia do processo justo e equitativo previsto no artº 20º nº 4 da CRP.(Ac. do STJ de 27-04-2023 in dgsi)

O recurso que cabe da rejeição da impugnação da matéria de facto por incumprimento do ónus da impugnação é a revista normal (Ac. do STJ de 10-12-2020), sendo certo que, na verificação do cumprimento dos ónus de impugnação prevista no artº 640º do CPC os aspectos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade (Ac. do STJ de 21-03-2019 e Ac do STJ de 03-11-2020 in dgsi).

10º Verifica-se, por outro lado, que a matéria dada como provada nºs 39, 40 e 41, do douto acórdão da Relação, além de contraditória, está completamente inquinada, face aos erros de direito ali constantes, que urge por termo.

11º Assim, no nº 41 refere-se que:- no dia 13 de Janeiro de 2008 concluiu-se a respectiva audiência de discussão e julgamento.

12º No nº 39 vem referido que no dia 31 de Janeiro de 2008 foi proferido despacho declarando cessada a suspensão da instância.

13º Porém, no nº 40 consta que no dia 5 de Novembro de 2008 foi proferido despacho a rejeitar por extemporâneo a Intervenção principal provocada e a admitir a redução do pedido.

Pelo exposto, não faz qualquer sentido que no dia 13 de Janeiro de Janeiro de 2008 se tenha realizado o julgamento e logo no dia 31 de janeiro de 2008, tenha sido proferido despacho declarando cessada a suspensão da instância e no dia 5 de Novembro de 2008 se verifique que foi rejeitada a intervenção principal e admitindo a redução do pedido.

Os RR. consideram que esta matéria é relevante e carece de ser apreciada e corrigida ainda que oficiosamente, para os devidos e legais efeitos.

14º Tendo a Relação de Lisboa confirmado a douta sentença, os RR. vieram interpor recurso de revista com fundamento no artº 640º nº 1 do CPC., uma vez que, impugnaram a matéria de facto na 1ªinstancia, inexistindo quanto a esta matéria, qualquer dupla conforme, como já se aludiu.

Os RR. requereram a anulação do douto acórdão da Relação de Lisboa atenta o erro de direito constante dos citados nºs 39,40 e 41 da matéria de facto, não tendo operado qualquer modificação, cabendo a este Alto Tribunal proceder às necessárias apreciações, ainda que oficiosamente.

15º Por outro lado, os RR. não se conformam com o facto de ter sido declarada ineficaz a escritura pública de constituição do prédio urbano sito na Travessa ... em ... em propriedade horizontal, por comproprietários correspondentes a 2/3 do direito de propriedade, sem intervenção dos demais comproprietários correspondentes a 1/9 do mesmo prédio, constituindo tal prática uma nulidade insuprível podendo ser invocada a todo o tempo, sendo de conhecimento oficioso artº 186º do CPC.

16º Aliás, com todo o respeito, constata-se que, os factos dados como provados nos nºs 1 a 33 estão em manifesta contradição com os factos 44 a 46 da fundamentação de facto, acarretando a nulidade do douto acórdão.

A douta decisão singular violou o disposto nº artº 640º, artº 662º, artº 671º e artº 674º do CPC.

Respondeu a reclamada pugnando pela manutenção do despacho sob reclamação.

Apreciando do mérito da reclamação apresentada nos termos do artigo 652º, nº 3, do Código de Processo Civil:

Não assiste razão aos reclamantes, pelos motivos desenvolvidos na decisão singular.

Relativamente aos pontos de facto mencionados na presente reclamação, os mesmos referem-se à seguinte factualidade:

“22 - No dia 01 de Março de 2007, a acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05 foi remetida à conta, por inércia das Partes.

(documento autêntico – certidão judicial que é fls. 1.124 a 1.164, e que aqui se dá por integralmente reproduzida - facto provado enunciado sob o número 20, na fase de saneamento dos autos).

35 - As alienações e permutas das fracções autónomas designadas pelas letras «A», «B», «C» e «E» do prédio urbano correspondente ao nº ..., da Travessa ..., em ..., pelos 1ºs co-Réus (HH e mulher, II) e B..., Lda., às aqui 8ª co-Ré (Leopor - Imobiliária, Lda.) e 9ª co-Ré (LP..., S.A.), e destas àqueles, teve como objectivo o impedir o efeito substantivo da procedência da acção de preferência referida no facto provado enunciado sob o número 05.

(Tema da Prova I - artigo 55º da petição inicial)

38 - No dia 04 de Julho de 2007, foi registada a acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, pela AP. 26 de 2007/07/04, ficando porém o registo como provisório, por natureza.

46 - A instauração e pendência, quer do Processo nº ..., da ...ª Vara Cível de ..., ...ª Secção (depois Processo nº 9954/2001.9...), quer do presente, causaram aos Autores desgaste físico e sofrimento”.

Vejamos:

Quanto a esta matéria em particular não se nos afigura sequer a aparência de qualquer tipo de violação pelo Tribunal da Relação de Lisboa de uma qualquer regra pertinente ao direito probatório material que assim justificasse a admissibilidade da presente revista normal.

Consta a este propósito do acórdão recorrido:

“Mais referem os apelantes que “alguma da matéria de facto dada como provada necessita de ser rectificada por desrespeitar a prova produzida mediante certidões juntas pelos RR.”, incluindo nessa matéria os factos nºs 22 e 31.

Nos termos do art. 640º, nº 1 do CPC, cabe ao recorrente que impugne a matéria de facto especificar obrigatoriamente e sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados (al. a)), os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que, em seu entender, impunham decisão diversa quanto a cada um desses factos (al. b)), a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre tais questões de facto (al. c)).

Nos autos, constata-se que os apelantes não indicam qual seja a matéria que impunha esclarecer ou que deva ser alterada, pelo que, nesse aspecto, nada há a ordenar.

Relativamente à contradição entre o facto nº 22 e os documentos juntos, entende-se que os apelantes colocam em causa o valor probatório atribuído pelo tribunal recorrido aos documentos, pelo que se impõe a análise da mencionada impugnação da matéria de facto.

E fazendo-o, dir-se-á que não assiste qualquer razão aos apelantes.

Na verdade, o facto nº 22 (22 - No dia 01 de Março de 2007, a acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05 foi remetida à conta, por inércia das Partes) corresponde exactamente ao que se passou naqueles autos, sendo a menção pretendida pelos apelantes, no sentido da inércia se dever aos ali AA., uma valoração da tramitação processual, que não deve ser transposta para a factualidade assente.

No que se refere ao facto nº 31, há que referir que o mesmo se limita a referir que no dia 4 de Julho de 2007 foi registada a acção, o que corresponde a uma mera descrição factual, não se apreendendo da argumentação dos apelantes qual o sentido da alteração de facto pretendida, nem sequer os motivos para a mesma.

Consequentemente, improcede também este segmento da apelação”.

Concordando-se com a perspectiva expressa pelo Tribunal da Relação de Lisboa, cumpre simplesmente referir:

Quanto ao facto nº 22, trata-se unicamente da mera constatação da tramitação processual que teve lugar nos autos em referência.

Com efeito, consignou-se que a acção judicial em referência fora remetida à conta por motivos de “inércia das partes”, sem que tal signifique, só por si, que tal acto processual tenha sido bem ou mal praticado.

O que se registou foi apenas que o processo teve essa sequência com base na mencionada razão de ser que a explica (seja ela correcta ou incorreta do ponto de vista jurídico).

Nada mais do que isso.

Quanto ao facto nº 35, o que as instâncias consideraram demonstrado foi um facto de cariz volitivo, psicológico, ou seja, uma determinada e concreta intenção de uma das partes, justificada com base na motivação apresentada e que teve a ver com uma análise conjunta da prova a que se procedeu, não sendo a impugnação de facto sequer suficientemente concretizadora para o colocar verdadeiramente em crise.

O mesmo se diga quanto ao facto nº 46 que tem apenas a ver com o demonstrado sentimento de sofrimento e desgaste dos aí AA., enquanto facto de natureza psicológica, que foi dado como provado, sem necessidade do recurso a qualquer tipo de presunção.

Quanto ao facto nº 38, trata-se igualmente da descrição de um acontecimento objectivo, no caso concreto, a instauração de uma acção judicial e o seu registo.

Também nada mais do que isso.

O que se verifica independentemente de outras vicissitudes que poderiam, na opinião dos recorrentes, ter sido afirmadas, mas que, no plano estritamente factual, o não foram.

Assim sendo, não se compreende, de todo, a afirmação produzida pelos recorrentes de que “os RR. impugnaram expressamente a matéria de facto constante dos nºs 22, 35, 38, e 46º da fundamentação de facto na sentença da 1ª instância e apenas o douto acórdão da Relação, ora recorrido, se pronunciou, pelo que com todo o respeito, não existe quanto a esta matéria qualquer dupla conforme. Assim sendo, não se verificando a dupla conforme, com todo o respeito, que é muito, deveria ser admitido o recurso de revista normal, nos termos do disposto no artº 640º do CPC”.

Tratando-se obviamente de matéria de facto dada como provada em 1ª instância, com base na motivação que aí consta, e em relação à qual o Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do acórdão recorrido, esclareceu suficientemente as razões que impunham a sua integral manutenção, não deferindo nestes termos o recurso de apelação.

Não faz sentido algum invocar a pronúncia originária por parte da 2ª instância de modo a, por essa enviesada via, pretender contornar o efeito da dupla conforme, que efectivamente ocorreu.

Da mesma forma, os recorrentes aludem aos pontos de facto nºs 39, 40 e 41, onde se refere:

“39 - No dia 31 de Janeiro de 2008, na acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05 foi proferido despacho, declarando cessada a suspensão da respectiva instância.

40 - No dia 05 de Novembro de 2008, na acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, foi proferido despacho:

. a rejeitar, por extemporâneo, a intervenção principal provocada, formulada pelos ali Autores em 09 de Maio de 2007;

. a admitir a redução do pedido formulada pelos ali Autores em 09 de Maio de 2007, eliminando o pedido de cancelamento dos registos a favor dos ali réus HH e mulher, II (aqui 1ºs co-Réus), e B..., Lda..

41 - No dia 13 de Janeiro de 2008, na acção de preferência referida no facto enunciado sob o nº 05, concluiu-se a realização da respectiva audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual foi indeferido o articulado superveniente que os ali Autores tinham apresentado em 24 de Abril de 2007; e foi proferida sentença, julgando a acção improcedente, por não provada, absolvendo os ali Réus dos pedidos, julgando prejudicado o conhecimento do pedido reconvencional”.

Mais uma vez encontramo-nos unicamente perante a descrição objectiva de determinada tramitação processual, sendo por isso mesmo absolutamente inconcebível, neste especial contexto, a invocação de contradição e os ditos “erros de direito que a inquinam”

No restante e em suma, na reclamação apresentada os reclamantes limitam-se a repetir, sem qualquer verdadeira novidade, o argumentário já antes exposto, aquando da sua notificação nos termos e para os efeitos do artigo 655º, nº 1, do Código de Processo Civil.

Nada há, portanto, nada mais a acrescentar ao que antes foi dito pelo relator do processo.

Concorda-se, assim e inteiramente, com o despacho reclamado, para cujos fundamentos se remete.

Pelo exposto, acordam, em Conferência, os juízes do Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção - Cível) em indeferir a reclamação apresentada, mantendo-se a decisão singular reclamada que decidiu o não conhecimento do objecto do recurso, nos termos dos artigos 652º, nº 1, alínea b), e 679º do Código de Processo Civil.

Custas pelas recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três duas) UCs.

Lisboa, 27 de Maio de 2025.

Luís Espírito Santo (Relator)

Teresa Albuquerque

Maria Olinda Garcia

V – Sumário elaborado pelo relator nos termos do artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil.