Sentença de Julgado de Paz
Processo: 196/2018-JPBBR
Relator: ELENA BURGOA
Descritores: DEVERES DE CONDÓMINOS. PAGAMENTO CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS AO CONDOMÍNIO. CITAÇÃO DE AUSENTE. DEFENSOR/A OFICIOSO/A
Data da sentença: 11/30/2018
Julgado de Paz de : OESTE
Decisão Texto Integral: Processo n.º 196/2018 JP-BBR
SENTENÇA
I- IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES E OBJETO DO LITÍGIO
O Condomínio da Rua …, n.º …, em Caldas da Rainha, com o NIF …, doravante Demandante, representado pela sua administração, veio propor contra B, com o NIF…, doravante Demandada, todos melhor identificados nos autos, a presente ação, relativa a direitos e deveres de condóminos – matéria enquadrável na alínea c) do n.º 1, artigo 9º da Lei 78/2001, de 13 de julho (Lei dos Julgados de Paz) pedindo a condenação desta no pagamento de €1.374,85 (mil trezentos e setenta quatro euros e oitenta cêntimos), juros de mora e custas.
Alega os factos constantes no Requerimento inicial que aqui se dão por reproduzidos (fls. 2 a 4) e juntou 7 documentos.
Após inúmeras diligências (fls. 16 a 47) no sentido de apurar o paradeiro da Demandada, foi a mesma declarada ausente e em sua representação foi nomeada a Ilustre Defensora Oficiosa da Demandada Ausente, Dra. C, que não apresentou contestação.
É muito importante salientar que foi citada nos termos do n.º 1 e 5 do art.º 229º do CPC na pessoa da Ilustre Defensora Oficiosa nomeada em representação da ausente.
Parece claro, como refere o Tribunal Constitucional que "'[...] o legislador tem de prever mecanismos para evitar que o processo fique parado indefinidamente, à espera de que o demandado seja localizado e chamado ao processo'. Há que conciliar e equilibrar os vários princípios e interesses em jogo, nomeadamente os do contraditório e da referida proibição da indefesa com aquele outro princípio da celeridade processual e ainda com os princípios da segurança e da paz jurídica, que são valores e princípios de igual relevância e constitucionalmente protegidos 'e não permitir que o processo se arraste indefinidamente […] o que poderia ter consequências desestabilizadoras e frustrar assim o alcance da justiça' (Acórdão TC n.º 508/2002, também transcrito no Acórdão n.º 287/2003), cfr. http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20030287.html .
Deste modo, o Defensor Oficioso garante a legalidade e o princípio do contraditório (conexo com o princípio da igualdade das partes) que o Tribunal deve observar e fazer cumprir ao longo de todo o processo, uma vez que, como se sabe, não há Ministério Público junto dos Julgados de Paz. A doutrina (J. O. Cardona in Julgados de Paz- Organização, Competência e Funcionamento, Coimbra Editora, 2001, pág. 64) e a jurisprudência dos Julgados de Paz são, neste aspeto, unânimes e têm promovido uma cultura judiciária garantista.
Agendada a audiência de julgamento para o dia 15 de novembro de 2018, esta realizou-se com cumprimento das formalidades legais conforme da respetivaata se alcança. Em 16.11.2018 foram juntos pelo Demandante os documentos em cumprimento do despacho proferido na audiência.
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Estando reunidos os pressupostos da estabilidade da instância, cumpre apreciar e decidir se a Demandada é devedora das quantias peticionadas e decorrentes da sua responsabilidade pela quota-parte nas despesas com as partes comuns do edifício.

II- FUNDAMENTAÇÃO - MATÉRIA DE FACTO
A convicção probatória do Tribunal Jurisdicional, ficou a dever-se ao conjunto de prova produzida nos presentes autos, tendo sido tomadas em consideração as declarações da administradora do condomínio, Sra. D, na audiência de julgamento e os documentos juntos ao processo, uma vez que não foram apresentadas quaisquer testemunhas.
Com interesse para a decisão, ficaram provados os seguintes factos:
1 – A Demandada é dona e legítima proprietária da fracção autónoma designada pela letra “B”, correspondente ao R/Ch. Direito (Bloco A), destinado a habitação, garagem na cave e logradouro, do prédio sito na Rua…, n.º …,Caldas da Rainha, descrito na Conservatória do Registo Predial de Caldas da Rainha sob o n.º …(cfr. doc. fls. 5);
2 - Na Assembleia de Condóminos de 9 de novembro de 2017 foram apresentadas e aprovadas as contas do ano 2016/2017;
3 - O Relatório de contas- que faz parte integrante da Ata da Assembleia de Condóminos de 8 de novembro de 2017, foi enviado a todos os condóminos junto a respetiva convocatória (doc. fls. 7);
4- A Demandada teve conhecimento de todas deliberações da Assembleia de condóminos, mediante receção da Ata, em 12.11.2017;
5 - A empresa …, Lda. foi reeleita como Administração do condomínio, a qual, por sua vez, é representada por D (doc. fls. 7);
6 – Deste modo, resulta que a Demandada enquanto titular da fração B, são imputadas as contribuições/despesas que se encontram por liquidar;
7 -A Demandada não pagou as contribuições mensais de condomínio a partir de janeiro de 2015 até julho de 2018, totalizando a dívida a quantia de € 1.374,85 (doc. fls 12);
8 – A quota da fração B- R/Ch Dto de janeiro a dezembro de 2015 era de 22,63€ mensais e de 4,53€ de contribuição ao fundo comum de reserva; de janeiro a dezembro de 2016 era de 23,6€7 e de 2,33€ fundo comum de reserva, assim como a de janeiro a outubro de 2017; de novembro de 2017 a março 2018 era de 23,63€ e de 2,37€ de fundo comum de reserva, de abril a julho de 2018 era de 23,74€ e 2,26€ de fundo comum de reserva. E 2 quotas extraordinárias, uma no valor de 62,93€ de 29.09.2016 para processo judicial (referenciado) e outra de 28.06.2018 para despesas de contencioso no valor de 180,00€ (doc. fls. 12 e 13);
9 –O atual administrador do condomínio remeteu cartas registadas à demandada em 8 de junho de 2018 (doc. fls. 7 a 11);
10 – As referidas comunicações foram devolvidas pelos serviços de expedição CTT e não rececionadas;
11 – A Demandada também foi interpelada por diversas vias (telefónica, e-mail, cartas) para o pagamento das quotas em dívida, sem qualquer sucesso;
12 – A Demandada não procedeu ao pagamento das quotas, ordinárias e extraordinárias, desde janeiro de 2015 até julho de 2018, na data do seu vencimento nem posteriormente.
Não resultaram provados quaisquer outros factos, alegados pelas partes ou instrumentais, com interesse para a decisão da causa.

III- APRECIAÇÃO DE FACTO E DE DIREITO
Perante a ação proposta, o Tribunal deve considerar a responsabilidade por encargos condominiais derivados do incumprimento por parte da Demandada, das suas obrigações de condómina, por falta de pagamento das contribuições mensais de condomínio relativas à fração de que é proprietária.
Porque, por um lado, a posição de condómino, confere direitos e obrigações, sendo uma dessas obrigações aquela que resulta do disposto no art.º 1424.º do Código Civil (C.C.) que “salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comuns são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações.”. Porque, a administração das partes comuns do edifício cabe à Assembleia dos condóminos e a um administrador (cfr. art.º 1430.º do C.C.) e é função do administrador, entre outras, cobrar as receitas e exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas (als. d) e e) do art.º 1436.º do C.C.), enquadrando-se nessa categoria as quotas, ordinárias e extraordinárias, de condomínio a pagar por cada condómino. E constatada a validade da aprovação das contas/despesas referentes aos últimos exercícios. Assim, como que as deliberações das Atas das Assembleias dos condóminos são do conhecimento da Demandada que, não obstante a faculdade prevista pelo art.º 1433, n.º 1 do C. C., não as veio a impugnar. Assim, são estas válidas e eficazes, implicando a obrigação da Demandada contribuir para todos os encargos das partes comuns do edifício.
Resulta, pois, provado que a Demandada é, nos termos do registo predial, proprietária da fração autónoma objeto dos presentes autos e que, na qualidade de condómina, incumpriu a obrigação prevista no art. 1424, nº 1 do C. C.l, escusando-se de proceder ao pagamento das quotizações e despesas mensais da sua responsabilidade que se encontram vencidas, desde o ano de 2015, com as perturbadoras consequências de “sustentabilidade financeira” que acarreta a um condomínio o atraso dos condóminos no pagamento tempestivo das contribuições devidas.
Como afirma a Sentença, de 15-03-2018, no P179/2017-JPBBR- Julgado de Paz do Oeste, Relatora Cristina Eusébio, www.dgsi.pt:
A lei apela á activa participação dos condóminos na vida do condomínio, mas não raras vezes assistimos ao alheamento dos problemas condominiais com nefastas consequências para todos os comproprietários.
É inconcebível que o proprietário de uma fracção autónoma de um prédio constituído em propriedade horizontal, não tenha pago qualquer contribuição para os serviços comuns desde 2010, nem se tenha preocupado em saber quem presta serviços como a limpeza, energia eléctrica, manutenção de elevadores, obras etc.”.
Ora, nesta perspectiva, salienta a crítica, veemente, de Rui Vieira Miller: “quem vive em condomínio sabe que tem responsabilidades para com os seus compartes, que há encargos comuns que por todos têm de ser assumidos, que a vida em propriedade horizontal, com integração de várias frações em unidade predial, acarreta incómodos e afazeres para os seus proprietários, que o exercício dos seus direitos e deveres obedecem a regulamentos e normas, não pode ignorar que as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício bem como o pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos, que há uma administração para as partes comuns do edifício que compete à assembleia de condóminos e a um administrador”, in “A propriedade horizontal no Código Civil a propósito do Acórdão de 12.10.2009 no Processo n.º 5944/05.0TBVFR.P1.
No que diz respeito aos juros de mora peticionados, diga-se que, em regra, a falta de pagamento de quantias a que o devedor esteja obrigado, dentro do prazo acordado, constitui o faltoso em mora e na obrigação de reparar os danos causados ao credor, verificando-se que a mora se inicia com a interpelação, judicial ou extrajudicial, para cumprimento (artº 804º e 805º do Código Civil). Por seu turno, o artº. 806º do mesmo Código, dispõe que, nas obrigações pecuniárias, a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora.
Assim, por força dos citados preceitos, verifica-se que, quando ocorre a falta de cumprimento de uma obrigação em dinheiro, o credor desse valor tem direito a receber uma indemnização, para compensar os prejuízos resultantes do atraso, indemnização essa que é igual aos juros vencidos, calculados à taxa dos juros legais (artº. 559º do Código Civil), desde a constituição em mora até integral e efetivo pagamento.
Face ao que antecede, e sem necessidade de maiores justificações, não pode deixar de proceder o pedido de condenação da “infratora”, na sua totalidade, por legalmente admissível. Quanto aos juros, estes são devidos à taxa legal em vigor, desde a data de vencimento de cada uma das prestações até integral e efetivo pagamento, pelo que o pedido a este título haverá de proceder.
DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos invocados, julgando a presente ação totalmente procedente, porque provada, decido condenar a Demandada a pagar ao Demandante, a quantia de €1.374,85 (mil trezentos e setenta quatro euros e oitenta cêntimos), relativa às contribuições mensais e para o fundo de reserva, vencidas e não pagas de a janeiro de 2015 até julho de 2018,acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral e efetivo pagamento.

As custas serão suportadas pela Demandada (art.º 8.º da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de dezembro) que se declara parte vencida sem prejuízo isenção de custas nos termos do art. 4º do Regulamento da Custas Processuais aplicável ex via art.º 63º da Lei dos Julgados de Paz, interpretado à luz do disposto no artº 9º do C.C. e da Deliberação n.º 5/2011, do Conselho de Julgados de Paz de 8 de fevereiro de 2011.
Proceda ao reembolso do Demandante nos termos do art. 9º da Portaria n.º 1456/2001 de 28 de Dezembro.
Registe.
Notifique o Ministério Público, nos termos do disposto no art. 60º nº 3 da LJP
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Julgado de Paz do Oeste, Bombarral,30 de novembro de 2018
(redigiu e reviu em computador – Art.º 131.º/5 do C.P.C.)

A Juíza de Paz


Elena Burgoa