Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa  | |||
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| Relator: | CRISTINA ISABEL HENRIQUES | ||
| Descritores: |  VIOLÊNCIA DOMÉSTICA REINCIDÊNCIA MEDIDA DA PENA MONTANTE DA INDEMNIZAÇÃO  | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 10/22/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | RECURSOS PENAIS | ||
| Decisão: | PROVIDOS | ||
| Sumário: |  I - O arguido vinha acusado como reincidente, e o tribunal deu como provada a existência dos pressupostos da reincidência, chegando mesmo a referir esta agravante no capítulo referente à determinação concreta da medida da pena. II - No entanto, o tribunal aplicou ao arguido a pena de 2 anos e seis meses de prisão, o que, manifestamente, leva à conclusão que na determinação concreta da pena, o tribunal não tomou em conta a agravação decorrente da lei. III - Em qualquer caso, o tribunal a quo entendeu por verificada a reincidência, conforme resulta dos factos provados e do elenco de factores tidos em conta para a determinação da medida da pena, apenas não teve em conta tal agravante na moldura abstracta da qual partiu. IV - É que, nos termos do artigo 76º do CP, limite mínimo é agravado de um terço, permanecendo inalterado o limite máximo. V - O arguido incorre, pela prática de um crime de violência doméstica, na pena mínima 2 anos e 8 meses. VI - A regra a seguir por este Tribunal de recurso, deverá ser sempre pautada pelo princípio da mínima intervenção, sendo todo o processo lógico de determinação da pena exata aplicada aferido em sede de recurso, e, caso seja insuficiente ou desajustado, alterado de acordo com o circunstancialismo factual assente, caso contrário, deverá ser mantido e consequentemente a pena concreta assim fixada. VII - Tendo em conta a moldura mínima resultante da agravação pela reincidência, entende-se adequada, proporcional e justa a pena de 3 anos e 3 meses de prisão, a qual não será suspensa, até porque, nessa parte, nenhum sujeito processual pôs em questão a decisão. VIII - No presente caso, atendendo às dores, humilhação, ansiedade, angústia e temor sofridos, a indemnização fixada peca por defeito. IX - Em todo o caso, terá o tribunal tido em consideração a actual falta de capacidade financeira do arguido, contudo, muito embora o arguido esteja preso e neste momento não trabalhe, certamente quando sair da prisão irá regressar ao trabalho, desconhecendo-se também se possui bens móveis ou imóveis que possam responder pelo pagamento da indemnização. X - Os danos sofridos (dores, humilhações, angústia e medo) justificam a fixação da indemnização no montante de 10.000.00 (dez mil) euros.  | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: |  Acordam em Conferência os Juízes da 3ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa 1. Relatório: Nos autos de Processo n.º499/24.0PBMTA.L1 foi proferida sentença na qual foi decidido: a) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de violência doméstica p. e p. pelo art.152.º, n.º1, b) e c) e n.º2, a) do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, efectiva. b) Condenar o arguido na pena acessória de proibição de contactos com a ofendida/ assistente, pelo período de 2 anos e 6 meses, nos termos do artigo 152.º, n.º4 e 5, do Código Penal c) Condenar o arguido a pagar à ofendida uma indemnização por danos não patrimoniais, no valor de 4.500,00 €. d) Condenar o arguido nas custas processuais, fixando a taxa de justiça em 2 UC. Não conformada com tal sentença, veio a assistente BB, acima melhor identificada, interpor recurso para este Tribunal, juntando para tanto as motivações que constam dos autos, e que aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais, concluindo nos seguintes termos, que se transcrevem: 1. Dão-se aqui por integralmente reproduzidos os factos provados atrás já descrito. 2. A indemnização fixada pelo Mº Juiz “a quo”, salvo melhor opinião, viola por defeito porque manifestamente diminuta, o legalmente consignado nos artigos 483º nº 1, 496º nº 1 e nº 3, 494º, todos do Código Civil, razão pela qual se pede aqui a revogação da Douta Decisão, que seja o demandante condenado no pagamento da indemnização no valor que V. Exa., entendam justo e adequado ao caso em apreço, Já que salvo melhor e douta opinião a indemnização fixada 4500 € pelo seu reduzido valor não teve em conta a gravidade das lesões e danos que a demandante sofreu e vai continuar a sofrer 3. O arguido foi condenado como reincidente, sendo evidente o seu certificado de registo criminal, e as leituras daí resultantes. 4. A sua conduta, em especial a descrita nos artigos 27 e 28 dos factos provados é gravíssima e de extrema violência. 5. Pelo exposto não se pode concordar com a pena aplicada, porque diminuta, razão pela qual e salvo melhor e Douta opinião a M Juiz violou o preceituado nos art.152.º, 1, a) e n.º2, a), 75~, 76º do Código Penal. 6. Assim deve a sentença ser revogada e a pena aplicada ao arguido prisão efetiva ser agravada de acordo com o Justo Critério de VExas. Respondeu o MºPº, pugnando pela revogação da decisão, concluindo nos seguintes termos: No que respeita ao quantum indemnizatório atribuído não nos iremos pronunciar, pois que tal matéria extravaza a competência material do Ministério Público, sendo que a assistente deduziu pedido de indemnização cível, não estando, pois, em causa o disposto no art.º 82º-A do Código de Processo Penal. 2. O arguido foi condenado na pena principal de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, efectiva, pela prática do crime de violência doméstica previsto e punido pelo art.152.º, n.º 1, b) e c) e n.º 2, a) do Código Penal. 3. Anteriormente à data dos factos em apreciação nos presentes autos, o arguido cometeu crime doloso, pelo qual foi condenado em pena de prisão efectiva, sem que tenham decorrido cinco anos entre a sua prática e a prática dos presentes factos, atento o período de tempo em que esteve preso. 4. A Mm. Juiz a quo deu como provada a reincidência, condenando o arguido como reincidente, nos termos e para o efeito do disposto no art.º 75º do Código Penal. 5. Tem aplicação o disposto no art.º 76º, n.º 1 do Código Penal, nos termos do qual, em caso de reincidência, o limite mínimo da pena aplicável ao crime é elevado de um terço. 6. Ou seja, o limite mínimo da moldura penal em causa (de 2 anos), será elevado de um terço, passando a ser de 2 anos e 8 meses. 7. O arguido foi condenado na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão efectiva, ou seja, abaixo do limite mínimo legalmente aplicável, por força do disposto no art.º 76º, n.º 1 do Código Penal. 8. A pena de prisão aplicada tem de ter como limite mínimo 2 anos e 8 meses, devendo ser fixada em medida concreta superior a tal limite, respeitando, não só o disposto no art.º 76º, n.º 1 do Código Penal, mas também o preceituado nos art.º 40º, n.º 1 e 2, 70º e 71º, n.º 1 e 2, todos do Código Penal. 9. Em face do exposto, entendemos que a decisão recorrida deve ser revogada e substituída por outra que condene o arguido em pena de prisão efectiva de medida concreta superior a 2 anos e 8 meses. Não conformado com tal acórdão, veio o MP interpor recurso para este Tribunal, juntando para tanto as motivações que constam dos autos, e que aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais, concluindo nos seguintes termos, que se transcrevem: 1º O arguido foi condenado na pena principal de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, efectiva, pela prática do crime de violência doméstica previsto e punido pelo art.152.º, n.º 1, b) e c) e n.º 2, a) do Código Penal. 2ºAnteriormente à data dos factos em apreciação nos presentes autos, o arguido cometeu crime doloso, pelo qual foi condenado em pena de prisão efectiva, sem que tenham decorrido cinco anos entre a sua prática e a prática dos presentes factos, atento o período de tempo em que esteve preso. 3º A Mm. Juiz a quo deu como provada a reincidência, condenando o arguido como reincidente, nos termos e para o efeito do disposto no art.º 75º do Código Penal. 4º Tem aplicação o disposto no art.º 76º, n.º 1 do Código Penal, nos termos do qual, em caso de reincidência, o limite mínimo da pena aplicável ao crime é elevado de um terço. 5º Ou seja, o limite mínimo da moldura penal em causa (de 2 anos), será elevado de um terço, passando a ser de 2 anos e 8 meses. 6º O arguido foi condenado na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão efectiva, ou seja, abaixo do limite mínimo legalmente aplicável, por força do disposto no art.º 76º, n.º 1 do Código Penal. 7º A pena de prisão aplicada tem de ter como limite mínimo 2 anos e 8 meses, devendo ser fixada em medida concreta superior a tal limite, respeitando, não só o disposto no art.º 76º, n.º 1 do Código Penal, mas também o preceituado nos art.º 40º, n.º 1 e 2, 70º e 71º, n.º 1 e 2, todos do Código Penal. 8º Em face do exposto, entendemos que a decisão recorrida deve ser revogada e substituída por outra que condene o arguido em pena de prisão efectiva de medida concreta superior a 2 anos e 8 meses. Neste Tribunal o Ilustre Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer pugnando pela revogação da decisão recorrida, concluindo nos seguintes termos: A douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento uma vez que nos factos provados 46 a 48 deu por provada a reincidência; motivou-os por referência ao CRC do arguido; no capítulo da sentença relativo à determinação da pena indicou a reincidência criminal como um dos critérios do artigo 71.º/2 do CP, todavia, condenou o arguido pela prática de um crime de violência doméstica p.p. artigo 152.º/1/b/2 do CP, a que corresponde a pena abstrata de 2 a 5 anos de prisão, na pena de prisão efetiva de 2 A, 6 M, quando o limite mínimo da pena abstrata, por força da agravativa geral da reincidência, de acordo com o disposto no artigo 76.º/1 do CP é de 2 A, 8 M. Ou seja, no caso, a moldura penal abstrata é de 2 A, 8 M a 5 A de prisão, pelo que a pena concreta foi fixada abaixo do limite mínimo legal, assim em violação do disposto no cit. artigo 76.º/1 do CP e em desrespeito das premissas de facto constantes dos factos provados da douta sentença. A assistente aderiu aos fundamentos do recurso do MP. O arguido não se pronunciou sobre os recursos interpostos. Foi cumprido o disposto no artigo artº 417º nº 2 do CPP. Cumpridas as formalidades legais, procedeu-se á conferência. 2. Fundamentação: Cumpre assim apreciar e decidir. Vejamos então. As questões colocadas à consideração deste Tribunal são, essencialmente, três: A. Saber se foi tida em conta a reincidência para efeitos de determinação concreta da pena e se deverá a pena ser superior em função dessa agravante; B. Se deverá a indemnização civil ser alterada, fixando-se valor superior à mesma; *** É a seguinte, a decisão sob recurso: (fundamentação de facto e medida da pena) 2-FUNDAMENTAÇÃO Com relevância para a decisão da causa, resultaram demostrados os seguintes factos: 1.Em ... de 2022, o arguido AA e a vítima BB, iniciaram relacionamento análogo ao dos cônjuges, em comunhão de mesa, leito e habitação. 2. Residiam na .... 3. Deste relacionamento amoroso, resultou o nascimento de CC, no dia .../.../2020. 4. Com eles residiam também dois filhos de BB de outro relacionamento amoroso: DD, nascida a ........2009 e EE, nascido a ........2005. 5. O arguido é consumidor de produto estupefaciente vulgarmente designado por “haxixe” e cocaína. 6. O arguido conheceu a vítima BB, no ano de 2019, durante uma das saídas precárias do mesmo, o qual se encontrava detido no .... 7. A partir dessa data, a vítima passou a visitar o arguido regularmente, tendo iniciado uma relação amorosa com o mesmo (no ano de 2019), tendo permitido que este ficasse na sua casa durante as saídas precárias do estabelecimento prisional. 8. Em ... de 2022, o arguido saiu do Estabelecimento Prisional em liberdade condicional, ficando a viver em casa da vítima (sita na ...) juntamente com os 3 filhos da mesma. 9. Durante o período de tempo em que a vítima viveu com o arguido durante as suas saídas precárias, mantiveram um relacionamento normal. 10. Após a saída do arguido em liberdade condicional, este começou a adoptar um comportamento crescentemente agressivo física e verbalmente para com a vítima BB, o que levou a que no âmbito do processo com o n.º 1079/ 23.2PBBRR fosse alvo de aplicação de medidas de coacção de proibição de contactar com a vitima por qualquer meio e de se aproximar da residência da mesma e do seu local de trabalho, tendo sido proferido despacho de acusação em ........2023. 11. Por esta altura, o casal cessou o relacionamento amoroso que mantinha, abandonando o arguido a residência do casal, em cumprimento da decisão judicial supramencionada. 12. Por sentença datada de 26.01.2024, proferido no âmbito do referido processo com o n.º 1079/ 23.2PBBRR, que correu termos na Instância Local Criminal do Barreiro – J1, foi o arguido absolvido, por factos ocorridos até ........2023. 13. Desde o início do ano de 2024, data em que foi retirada a vigilância eletrónica ao arguido em virtude das medidas de coação aplicadas no Processo referido em 12., em data não apurada, o arguido e a vítima reataram relacionamento análogo ao dos cônjuges e por isso voltaram a partilhar a residência descrita em 2º. 14.Desde então, o arguido sempre que a vítima saia da residência, controlava o percurso que esta fazia e os contactos que mantinha com terceiros. 15. Quando a ofendida saia para trabalhar o arguido acompanhava-a, ficava à sua espera e depois regressava com a mesma a casa. 16.Sempre que a vítima queria sair de casa para ir ao café acompanhada de uma amiga, o arguido não a deixava afirmando que era uma “puta” e que esta o traia. 17. Também sempre que a vítima saía da residência para fumar um cigarro, o que aconteceu diversas vezes, embora em datas não concretamente apuradas, o arguido ia atrás de si e apertava-lhe o pescoço ao mesmo tempo que dizia “puta” e afirmava que a ia matar. 18. O arguido controlava o telemóvel da vítima e por diversas vezes lhe partiu o aparelho. 19. Na verdade, quando a vítima estava a mexer no telemóvel ou a falar com alguém, o arguido dizia que esta estava a enviar mensagens ou a falar com homens. 20. No interior da residência supra descrita, com frequência, ocorriam discussões entre o casal, no decurso das quais, o arguido dirigia, frequentemente, embora em datas não concretamente apuradas à vítima BB, as seguintes expressões “és uma puta”, “ratxui”, “metes nojo”, “vou-te matar”, “mato-te a ti e aos teus filhos”, “cala-te ou vou-te bater”. 21. Igualmente no decurso destas discussões, em mais do que uma ocasião, o arguido desferiu empurrões no corpo da vítima BB. 22. Em mais do que uma ocasião, ainda que em datas não apuradas, o arguido referiu à vítima que “preferia matar-se a ir para a cadeia” e que “se fosse para a cadeia por sua causa dela a mataria”. 23. Ao ouvir estas expressões a vítima BB temia pela sua vida e integridade física. 24. O arguido desde pelo menos o início do ano de 2024 até ao início de ... de 2024 esteve a trabalhar em ..., na ..., tendo regressado à residência do casal. 25. Na noite / madrugada do dia ... de ... de 2024, para o dia ........2024, no interior de um café próximo da residência do casal, no decurso de uma festa de aniversário, o arguido, o qual se encontrava alcoolizado, sempre que a vítima BB cumprimentava alguém conhecido, dizia à sua companheira as seguintes expressões “já comeste este também?”. 26. Pela 1.00 hora da madrugada o casal regressou a casa 27. Acto continuo utilizando para o efeito as duas mãos, o arguido apertou com força o pescoço da vítima, por vários instantes, conduta que levou a que esta perdesse os sentidos e desfalecesse. 28. Assim que a vítima recuperou os sentidos, o arguido colocou as duas mãos no interior da boca da companheira até à garganta, para impedir que esta solicitasse por auxílio, ao mesmo tempo que lhe disse “Cala-te que eu vou-te matar”, “É hoje que te mato”. 29.Neste contexto, a menor DD, presente no local, temendo pela vítima da progenitora, fugiu do imóvel e solicitou a presença da Polícia de Segurança Pública que em escassos instantes surgiu no local, devidamente uniformizada e em exercício de funções, procedendo à detenção do arguido. 30. Presentes no local, estavam igualmente os outros dos filhos da vítima, CC, menor de idade, e EE. 31. Em resultado destas condutas do arguido, a vítima BB sofreu equimose bilateral dos pilares amigdalinos com ligeiro abaulamento da parede posterior da nasofaringe do lado esquerdo que se confirmou do exame de laringoscopia, sendo que na laringoscopia observou-se exsudado purulento na parede esquerda da nasofaringe com embaulamento da mesma, ficando internada por perda da via área durante dois dias com antibiótico, tendo tais lesões lhe determinado 10 dias, sendo de dois com afectação da incapacidade para o trabalho geral e para o trabalho profissional. 32. Perante as condutas do arguido, a vítima sente-se vexada e amedrontada, vivendo com constante receio pela sua integridade física e vida, assim como, as dos seus filhos. 33. O arguido, em todas as ocasiões acima referidas, ao agredir fisicamente e psicologicamente a vítima BB, da forma como fez, actuou com o intuito de lhe causar, como efectivamente causou, sofrimento e medo, bem sabendo que a sua conduta era adequada a causar tais resultados 34. Ao actuar como o fez, designadamente, dirigindo-lhe expressões ofensivas, o arguido pretendeu ofender a honra e a consideração que são devidas à vítima, afectando-lhe deste modo o bem-estar psíquico e humilhando-a. 35. O arguido ao dirigir-se à vítima BB ameaçando-a, fê-lo com o propósito de, com o anúncio daquele mal provocar, directa e necessariamente, medo naquela que receia que este venha a concretizar a suas ameaças. 36. O arguido actuou sempre por motivos frívolos e egoístas, dominado por um sentimento de posse para com a vítima BB. 37. O arguido sabe que viola os particulares deveres de respeito a que se encontra sujeito mercê do relacionamento que mantêm com a vítima e a filha que possuem em comum. 38. O arguido actuou da forma acima descrita, reiteradamente, no interior da residência da vítima e presença da filha do casal (de 4 anos de idade) e da filha da vítima (de 14 anos de idade), como bem sabia. 39. Em todas as situações acima mencionadas que a ofendida teve de suportar, o arguido sabia que a estava a molestar física e psicologicamente, mais sabia que a humilhava e a ofendia na sua honra e consideração pessoal, que a atemorizava, diminuía na sua honra e consideração, o que conseguiu, bem sabendo que as expressões por si proferidas e atitudes adotadas são adequadas a causar medo, receio e inquietação e de lhe limitar a sua liberdade de movimentação e de lhe causar sentimentos de vergonha e humilhação. 40. O arguido sabia que, ao atuar da forma descrita, molestava o corpo e a saúde psíquica de BB, a humilhava, criando terror e receio pela sua integridade física, ofendendo-a na sua dignidade de pessoa humana, submetendo-a à sua vontade, o que quis e logrou alcançar. 41. O arguido sabia dever uma especial obrigação de respeito à ofendida, por ser sua companheira e mãe da sua filha e que ao praticar os atos acima descritos no interior de residência, os tornava particularmente gravosos 42. O arguido quis humilhar, intimidar, ofender o corpo e a saúde e a honra e bom nome daquela, conseguindo fazer a ofendida temer pela sua vida e pela sua integridade física, causando-lhes temor e inquietação, restringindo a sua liberdade de movimentação, o que conseguiu. 43. Como consequência do comportamento do arguido, e da violência psicológica utilizada, a ofendida vive num estado de ansiedade, angústia e de temor permanente. 44. O arguido quis com o seu comportamento inferiorizar e atemorizar a ofendida perante ele, causando-lhe um sentimento permanente de temor e ansiedade, garantindo, deste modo, a sua superioridade e domínio sobre ela, o que conseguiu. 45. O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas são proibidas e punidas por lei. 46. Da Reincidência Anteriormente à data dos factos atrás descritos, o arguido, cometeu, crime doloso, pelo qual foi condenado em pena de prisão efectiva, sem que tenham decorrido cinco anos entre a sua prática e a prática dos presentes factos, atento o período de tempo em que esteve preso. 48. De facto, o arguido AA foi julgado e condenado no Processo 853/11.7PBBRR, do Juízo Central Criminal Comarca do Barreiro J2, por acórdão datado de 27.06.2012, transitado em julgado em 03.09.2012, pela prática de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210º, n.º 1, do Código Penal, cometido a ........2011, na pena de 5 anos de prisão efectiva, assim como foi julgado e condenado no Processo 1071/11.0PBBRR, do Juízo Central Criminal Comarca do Barreiro J2, por acórdão datado de 08.01.2013, transitado em julgado em 29.01.2013, Processo: 499/24.0PBMTA pela prática de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210, n.º 1 e n.º 2, alínea b), do Código Penal, cometido a ........2011 na pena de 6 anos de prisão efectiva e, em cúmulo jurídico, na pena de 11 anos de prisão, por decisão proferida no processo 1063/11.9PBBRR por acórdão datado de 26.10.2017, transitado em julgado em 27.11.2017. 49. O arguido encontrava-se em liberdade condicional, quando cometeu o crime pelo qual nestes autos é acusado, estando o termo da pena previsto para 27.02.2025. 50.O arguido é solteiro, é ..., tem uma filha menor de idade, durante o período em que residiu com a ofendia o arguido trabalhou por curtos períodos em .... 51. Atualmente encontra-se preso preventivamente à ordem dos presentes autos no .... 52. O arguido foi condenado pela prática de: - Um crime de condução sem habilitação legal - Um crime de roubo, - Um crime de ameaça e um crime de ofensa à integridade física, - Um crime de ofensa à integridade física e um crime de ameaça, - Um crime de coação agravada, - Um crime de sequestro, - Um crime de roubo, - Dois crimes de roubo - Um crime de roubo e um crime de furto - Dois crimes de ameaça agravada. - Dois crimes de condução de veículo sem habilitação legal - Um crime de violência doméstica e um crime de condução de veículo sem habilitação legal (factos de ........2022 e sentença transitada em julgado em 20.03.2025), Tudo conforme CRC que se dá como integralmente reproduzido. 53. Foi realizada perícia psiquiátrica ao arguido, no âmbito deste autos, e não se apuram indícios da existência de anomalia psíquica grave, no sentido da existência de patologia susceptível de alterar a sua capacidade de avaliar o alcance das suas acções ou de se determinar de acordo com essa avaliação. Existem indícios de Perturbação de Personalidade de Tipo Dissocial (ICD10: F60.2, ICD-11 6D10.0 a 3 consoante gravidade), caracterizada por baixa capacidade de empatia e de arrependimento, com instrumentalização de outros para benefício próprio e baixa capacidade de conformidade com as normas sociais em vigor, tratando-se de indivíduos com predisposição a consumo de substâncias e actos ilícitos. Existem alguns sinais sugestivos de Perturbação de Hiperactividade e Défice de Atenção, quadro que não configura alteração da capacidade de avaliação da ilicitude dos actos que praticou nem de se determinar de acordo com essa avaliação. Não se apura, nenhum diagnóstico psiquiátrico susceptível de diminuir ou impedir a capacidade de avaliação da natureza ou alcance dos seus actos, ou de se determinar de acordo com essa avaliação. Inexistem quaisquer indícios, directos ou indirectos, de que o examinando padeça de anomalia psíquica grave. 54. Em consequência dos factos praticados pelo arguido, em... de 2024, a ofendia/assistente sentiu dores, teve que receber assistência hospitalar, teve dificuldades em comer. Em consequência dos factos praticados pelo arguido a ofendida/ assistente, sentiu-se humilhada, com medo e receio do comportamento do arguido. (..) 2.4. Determinação da medida da pena Após o enquadramento jurídico-penal, cumpre agora determinar a pena concretamente a aplicar ao arguido, tendo em atenção as penas abstractamente aplicáveis, os critérios de escolha e das finalidades da pena. A aplicação das penas tem como finalidade “a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade” art.40.º, n.º1 do Código Penal. A pena tem natureza preventiva, de prevenção geral, como meio de protecção do bem jurídico e prevenção especial, como meio de reintegração do agente na sociedade (Figueiredo Dias, Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, 2009). Dentro do quadro que é oferecido pela lei, cabe ao juiz a tarefa de determinar a moldura penal abstracta que cabe aos factos provados no processo e encontrar dentro dessa moldura penal o “quantum” concreto da pena em que o arguido deve ser condenado (Figueiredo Dias, obra referida). Determina o art.70.º, do Código Penal, quanto à escolha da pena, que “se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa da liberdade e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição” No que respeita à medida abstracta da pena, no caso dos autos, ficaram provados factos que consubstanciam a prática de um crime de violência doméstica previsto e punido pelo art.152.º, n.º1, b) e n.º2, a), do Código Penal. Tal incriminação prevê como moldura abstracta a pena de prisão de 2 a 5 anos. Na escolha da pena há que atender a razões de prevenção especial de socialização, estritamente ligadas à recuperação do arguido e prevenção geral, respeitante às exigências irremediáveis de tutela do ordenamento jurídico. Ora, no caso dos presentes autos, atentos os factos provados e numa ponderação global dos mesmos, cumpre ter em consideração os seguintes aspectos: as exigências de prevenção geral revelam-se elevadas tendo em conta os bens jurídicos violados e a frequência com que o crime de violência doméstica é praticado na nossa sociedade e na nossa comarca; no que concerne às exigências de prevenção especial, as mesmas mostram-se elevadas uma vez que o arguido não apresenta antecedentes criminais da mesma natureza (uma vez que a condenação pela prática de crime de violência doméstica respeita a sentença transitada em julgado posteriormente), mas apresenta várias antecedentes criminais pela prática de crimes de ofensa à integridade física e ameaça (que protegem bens jurídicos semelhantes ao crime de violência doméstica). Tendo em consideração a medida penal abstracta aplicável nos autos, terá que ser aplicada uma pena de prisão. No que respeita à medida concreta da pena estipula o art.71.º do C.P. que a mesma será encontrada dentro da moldura penal abstracta, tendo em conta a culpa do agente e as exigências de prevenção. Impõe esta disposição legal que a moldura penal tenha por limite máximo a culpa e por limite mínimo as exigências de prevenção geral. A culpa surge, assim, como limite máximo da pena, constituindo um limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações preventivas, sejam de prevenção geral, integração ou intimação, sejam de prevenção especial, de socialização (Figueiredo Dias, obra referida). O “quantum” da pena será o que for indispensável para que não seja colocada em causa a confiança da comunidade nas instituições penais. Para alcançar a medida da pena deverá ter-se em conta que as circunstâncias relativas à culpa respeitam ao momento da prática dos factos e que as considerações referentes à prevenção se reportam ao momento do julgamento (Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal, Universidade Católica Editora, 2.º Edição). Quanto aos factores a ter em conta na determinação da medida da pena, fornece-nos o n.º2 do art.71.º do Código Penal as circunstâncias que devem ser aferidas Assim, nos termos do art.71.º, do Código Penal, na determinação da pena concreta a aplicar ao arguido cumpre atender às seguintes circunstâncias: - Os factos inserem-se na ilicitude elevada, atenta a factualidade dada como provada, a forma como foram praticados os factos e as consequências dos mesmos na pessoa da ofendida. - O arguido agiu com dolo directo, em todas as circunstâncias; - O arguido à data dos factos estava familiar, profissional e socialmente inserido, atualmente encontra-se preso preventivamente. - A reincidência criminal Atento o exposto e tudo ponderado, tendo em conta a moldura abstracta da pena, a culpa do agente e as necessidades de prevenção geral e de prevenção especial, entende o Tribunal adequado fixar ao arguido uma pena de 2 anos e 6 meses de prisão. 2.5. Da suspensão da pena de prisão aplicada ao arguido Uma vez que a pena de prisão deverá ser sempre a última a ser aplicada, o legislador penal criou um sistema substitutivo da pena de prisão. Assim sendo, e tendo em consideração a medida concreta da pena aplicada, cumpre analisar a suspensão da execução da pena de prisão. Prescreve o art.50.º do Código Penal que “o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às suas condições de vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição” Se julgar conveniente o tribunal subordina a suspensão da execução da pena de prisão ao cumprimento de deveres ou observância de regras de conduta ou determina que a mesma seja acompanhada de regime de prova (n.2.º do art.50.º). Determinando-se que a pena concreta a aplicar ao arguido é uma pena meses de 2 anos e 6 meses de prisão, deverá o Tribunal verificar se, tendo em consideração a personalidade e as condições de vida do arguido, bem como a sua conduta anterior e posterior ao crime, é possível fazer um prognóstico favorável quanto ao comportamento futuro do arguido. O arguido prestou declarações, não tendo reconhecido a totalidade dos factos que lhe são imputados, nem admitiu os factos mais graves, relativos às agressões físicas e ameaças de morte, pese embora todos os elementos de prova existentes nos autos. O arguido não demostrou empatia pela ofendida e responsabilizou a mesma pelos factos em causa nos autos, não tendo demostrado ter realizado qualquer exercício de auto censura. Para além disso, o arguido apresenta já diversas condenações anteriores por factos de ofensa à integridade física e ameaça, crimes que protegem bens juridios também protegidos pelo crime de violência doméstica. Mais se verifica que o arguido veio a ser condenado em pena de prisão efectiva, ainda que por sentença transitada em julgado após os factos em causa nos autos (20.03.2025), pela prática de um crime de violência doméstica, por factos ocorridos num período entre o relacionamento com a ofendida, mas em que se encontrava separado da mesma. Acresce que, o arguido encontrava-se em liberdade condicional na data dos factos. Assim, atento o até aqui referido, consideramos que não é possível fazer uma prognostico favorável e considerar que o arguido é capaz de se alterar o seu comportamento futuro. Assim, por se considerar que ameaça da prisão não realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade) não se suspende a execução da pena de prisão aplicada ao arguido, 2.7.Pedido de Indemnização civil apresentado pela ofendida/ assistente Assim sendo, importa, antes de mais, averiguar se os factos dados como provados preenchem os pressupostos da responsabilidade por facto ilícito. Neste âmbito, dispõe do art.483.º n.º 1 do Código Civil que, «Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação». A responsabilidade civil por facto ilícito pressupõe: a) O facto; b) A ilicitude; c) A imputação do facto ao lesante; d) O dano; e) Um nexo de causalidade entre o facto e o dano». No que respeita aos danos não patrimoniais, estes serão indemnizáveis nos termos do art.496.º, n.º 1 do Código Civil, quando, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. Vale isto por dizer, que é reparável a título de dano moral, aquele cuja gravidade mereça a protecção do direito. Na fixação do montante da indemnização a título de reparação de danos de natureza não patrimonial, deve o Tribunal socorrer-se das regras da equidade, não estando vinculado a critérios de legalidade estrita (citado art.496.º, n.º 3). A indemnização "in natura" deste tipo de danos é impossível, pela própria natureza das coisas, o que não nos dispensa de lhes atribuir um valor monetário que funcione como modo de os minorar. Contudo, atenta a dificuldade de apreciação de tal matéria, dada a subjectividade que acompanha a análise da existência e extensão dos danos, e porque eles são insusceptíveis de ser «reparados», apenas se preocupa a lei com a atribuição aos lesados de uma compensação monetária. Para a determinação do montante dos danos sofridos pelo demandante, consideraremos a natureza dos factos e a sua extensão No caso dos autos ficou provado que o arguido praticou um crime de violência doméstica, através de maus tratos físicos, psicológicos e ameaças de morte contra a ofendida. Mais resultou que o arguido sabia que estava a molestar física e psicologicamente a ofendida, mais sabia que a humilhava e a ofendia na sua honra e consideração pessoal, que a atemorizava, diminuía na sua honra e consideração, o que conseguiu, bem sabendo que as expressões por si proferidas e atitudes adotadas são adequadas a causar medo, receio e inquietação e de lhe limitar a sua liberdade de movimentação e de lhe causar sentimentos de vergonha e humilhação, ofendendo-a na sua dignidade de pessoa humana, submetendo-a à sua vontade, o que quis e logrou alcançar. Como consequência do comportamento do arguido, a ofendida sentiu dores, humilhação, ansiedade, angústia e temor. Da situação dos presentes autos reconhece-se, assim, à ofendida o direito a indemnização por danos de natureza não patrimonial emergentes das dos factos praticados pelo arguido. Dúvidas não se colocam, pois, ao tribunal de que tais danos devem ser ressarcidos. Aqui chegados, cumpre aferir como se procede à ressarcibilidade do dano não patrimonial. Na esteira de Pessoa Jorge, in “Ensaio Sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil”, pg. 376), a ressarcibilidade do dano baseia-se“(...) na generosa formulação do art.º 496.º do C. Civil, que confia ao julgador a tarefa de determinar o que é equitativo e justo em cada caso, no que fundamentalmente releva, não o rigor algébrico de quem faz a adição de custos, despesas, ou de ganhos (como acontece no cálculo da maior parte dos danos de natureza patrimonial), mas, antes, o desiderato de, prudentemente, dar alguma correspondência compensatória ou satisfatória entre uma maior ou menor quantia de dinheiro a arbitrar à vítima e a importância dos valores de natureza não patrimonial em que ela se viu afectada” Porém, a dificuldade de quantificar os danos não patrimoniais não pode entravar a fixação de uma indemnização que procurará ser justa. Atento o exposto, considero justo e adequado fixar uma indemnização no valor de 4.500,00 €. *** A. Saber se foi tida em conta a reincidência para efeitos de determinação concreta da pena e se deverá a pena ser superior em função dessa agravante; O arguido foi condenado pela prática de um crime de violência doméstica p. e p. pelo art.152.º, n.º1, b) e c) e n.º2, a) do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, efectiva. O arguido vinha acusado como reincidente, e o tribunal deu como provada a existência dos pressupostos da reincidência, chegando mesmo a referir esta agravante no capítulo referente à determinação concreta da medida da pena. No entanto, o tribunal aplicou ao arguido a pena de 2 anos e seis meses de prisão, o que, manifestamente leva à conclusão que na determinação concreta da pena, o tribunal não tomou em conta a agravação decorrente da lei. Senão vejamos. Dispõe o artigo 75º do CP que: 
 É que, nos termos do artigo 76º do CP, limite mínimo é agravado de um terço, permanecendo inalterado o limite máximo. O arguido incorre, pela prática de um crime de violência doméstica, na pena mínima 2 anos e 8 meses. A propósito da pena o tribunal levou em conta o seguinte: Ora, no caso dos presentes autos, atentos os factos provados e numa ponderação global dos mesmos, cumpre ter em consideração os seguintes aspectos: as exigências de prevenção geral revelam-se elevadas tendo em conta os bens jurídicos violados e a frequência com que o crime de violência doméstica é praticado na nossa sociedade e na nossa comarca; no que concerne às exigências de prevenção especial, as mesmas mostram-se elevadas uma vez que o arguido não apresenta antecedentes criminais da mesma natureza (uma vez que a condenação pela prática de crime de violência doméstica respeita a sentença transitada em julgado posteriormente), mas apresenta várias antecedentes criminais pela prática de crimes de ofensa à integridade física e ameaça (que protegem bens jurídicos semelhantes ao crime de violência doméstica). Tendo em consideração a medida penal abstracta aplicável nos autos, terá que ser aplicada uma pena de prisão. Assim, nos termos do art.71.º, do Código Penal, na determinação da pena concreta a aplicar ao arguido cumpre atender às seguintes circunstâncias: - Os factos inserem-se na ilicitude elevada, atenta a factualidade dada como provada, a forma como foram praticados os factos e as consequências dos mesmos na pessoa da ofendida. - O arguido agiu com dolo directo, em todas as circunstâncias; - O arguido à data dos factos estava familiar, profissional e socialmente inserido, atualmente encontra-se preso preventivamente. - A reincidência criminal Atento o exposto e tudo ponderado, tendo em conta a moldura abstracta da pena, a culpa do agente e as necessidades de prevenção geral e de prevenção especial, entende o Tribunal adequado fixar ao arguido uma pena de 2 anos e 6 meses de prisão. Entendemos, e disso já demos conta noutras decisões proferidas, que a fixação da medida concreta da pena envolve para o juiz, escreve Jesheck , in Derecho Penal , pág. 1192 , Vol. II , uma certa margem de liberdade individual , não podendo , no entanto , esquecer-se que ela é, e nem podia deixar de o ser , estruturalmente aplicação do direito , devendo ter-se em apreço a culpabilidade do agente e os efeitos da pena sobre a sociedade e na vida do delinquente , por força do que dispõe o art.º 40.º n.º 1 , do CP. Em nosso entendimento, o Tribunal de recurso deverá sindicar o quantum da pena, e a sua natureza, tendo em atenção os critérios de determinação utilizados pelo Tribunal recorrido, e a fundamentação de todo o processo cognitivo que foi seguido, intervindo, no sentido da alteração se se revelarem falhas que possam influenciar essa mesma determinação ou se a mesma se revelar manifestamente desproporcionada. Assim, a regra a seguir por este Tribunal de recurso, deverá ser sempre pautada pelo princípio da mínima intervenção, sendo todo o processo lógico de determinação da pena exata aplicada aferido em sede de recurso, e, caso seja insuficiente ou desajustado, alterado de acordo com o circunstancialismo factual assente, caso contrário, deverá ser mantido e consequentemente a pena concreta assim fixada. Tendo em conta a moldura mínima resultante da agravação pela reincidência, entende-se adequada, proporcional e justa a pena de 3 anos e 3 meses de prisão, a qual não será suspensa, até porque, nessa parte, nenhum sujeito processual pôs em questão o decidido. B) Saber se deverá a indemnização civil fixada deve ser alterada: Em síntese, no pedido de indemnização civil, o demandante peticiona a condenação do arguido no pagamento de uma indemnização por danos morais/materiais (embora não os quantifique) no montante de 50.000 euros. O tribunal a quo fixou a indemnização por danos morais em 4.500.00 euros, já que não deu como provados quaisquer factos relativos a danos materiais/patrimoniais. Na sentença recorrida, escreveu a Mma Juiz a quo o seguinte, a propósito do pedido de indemnização civil: No caso dos autos ficou provado que o arguido praticou um crime de violência doméstica, através de maus tratos físicos, psicológicos e ameaças de morte contra a ofendida. Mais resultou que o arguido sabia que estava a molestar física e psicologicamente a ofendida, mais sabia que a humilhava e a ofendia na sua honra e consideração pessoal, que a atemorizava, diminuía na sua honra e consideração, o que conseguiu, bem sabendo que as expressões por si proferidas e atitudes adotadas são adequadas a causar medo, receio e inquietação e de lhe limitar a sua liberdade de movimentação e de lhe causar sentimentos de vergonha e humilhação, ofendendo-a na sua dignidade de pessoa humana, submetendo-a à sua vontade, o que quis e logrou alcançar. Como consequência do comportamento do arguido, a ofendida sentiu dores, humilhação, ansiedade, angústia e temor. Da situação dos presentes autos reconhece-se, assim, à ofendida o direito a indemnização por danos de natureza não patrimonial emergentes das dos factos praticados pelo arguido. (…) Atento o exposto, considero justo e adequado fixar uma indemnização no valor de 4.500,00 €. “A indemnização de perdas e danos emergentes de crime é regulada pela lei civil”, conforme dispõe o artigo 129º do Código Penal. O que significa, como tem sido pacificamente entendido, que a lei civil regula essa indemnização quantitativamente e nos seus pressupostos. As questões processuais, por seu turno, são reguladas no Código de Processo Penal, nomeadamente nos seus artigos 71º a 84º. Nos termos do artigo 71º do Código de Processo Penal, “o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo...”. Eis a consagração legal do princípio da adesão. E o fundamento para a consagração legal do princípio geral da adesão com esta abrangência (como defende Costa Pimenta, Código de Processo Penal Anotado, 2ª Ed., págs. 235 e 236) é que “dele derivam vantagens para a vítima do crime. Intervindo em processo penal, a vítima economiza tempo e dinheiro - este processo corre mais célere e é mais barato que o processo cível ou administrativo. Por outro lado, aproveita as provas carreadas para o processo pelo Ministério Público e demais entidades. Também o interesse geral lucraria com o enxerto. A sua obrigatoriedade constituiria remédio a uma eventual inércia probatória do Ministério Público. Além disso, a descoberta da verdade, a que tende o processo penal, beneficiaria com os elementos de prova fornecidos pela vítima. Por outro lado, a prevenção geral e especial torna-se mais eficaz, uma vez que à pena em si é acrescentada a indemnização pelos danos sofridos”. Mas, como decorre desta norma legal, existe uma limitação a este princípio da adesão: o pedido tem de ser atinente ao dano causado pelo crime que é também objecto do processo penal em que o pedido civil se insere (Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, vol. 1, 2ª Ed., pág. 129). Ou, por outras palavras, o pedido de indemnização civil deduzido em processo penal, tem como causa de pedir a prática de um crime (ver Ac. Rel. Lisboa de 16/06/1998, processo nº 0036905, sumariado na Internet - http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/). Como se disse, de acordo com o disposto no artigo 129º do Código Penal, será na lei civil que deveremos procurar os pressupostos da responsabilidade civil, bem como o critério para a fixação quantitativa da indemnização. Decorre, do artigo 483º do Código Civil que o dever de reparação, resultante da responsabilidade civil por factos ilícitos, em que o demandante baseia a sua pretensão, depende (como refere Almeida Costa, in “Direito das Obrigações”, 5ª Ed., Coimbra, 1991, pág. 446) de vários pressupostos: • a existência de um facto voluntário do agente e não de um mero facto natural causador de danos; • a ilicitude desse facto; • que se verifique um nexo de imputação do facto ao lesante; • que da violação do direito subjectivo ou da lei derive um dano; • e que haja um nexo de causalidade entre o facto praticado pelo agente e o dano sofrido pela vítima, de modo a poder concluir-se que este resulta daquele. Só no caso de se encontrarem preenchidos todos estes pressupostos, surge a obrigação de indemnizar imposta ao lesante. Resultou provado que o arguido, com a sua conduta, agrediu, ameaçou, humilhou a vítima. Tal, traduz-se no facto do agente - acção ou acções domináveis ou controláveis pela vontade do agente. Implicando tais factos, por um lado a prática de um crime de violência doméstica (artigo152º do Código Penal) nisso consiste a sua ilicitude. Agiu o arguido com dolo, existindo, por isso, o nexo de imputação do facto ao agente. Dos factos praticados pelo arguido, não resultaram danos patrimoniais. Quanto aos danos morais, tem-se entendido que merecem a tutela do direito os danos que “espelhem uma dor, angústia, desgosto ou sofrimento, que, segundo as regras da experiência e do bom senso, se tornem inexigíveis em termos de resignação” (Ac. Rel. Coimbra de 5/06/1979, CJ, tomo III, pág. 892, ver também Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Tomo I, pág. 572 e Ac. STJ de 12/10/1973, BMJ 230, pág. 107) - o simples incomodo não justifica a indemnização por danos não patrimoniais. Só são indemnizáveis aqueles danos, que afectem profundamente os valores ou interesses da personalidade física ou moral como, entre outros, as ofensas à honra, à reputação, à liberdade pessoal, à violação do domicílio ou do segredo que interessa à vitima, as lesões corporais ou de saúde e, em casos limites ou duvidosos, os causados por vizinhanças insalubres. Entre os direitos que não são merecedores de tutela para ressarcibilidade de danos não patrimoniais podem citar-se o “desgosto” causado por uma moradia não estar concluída na data pretendida e o “desgosto” causado pela morte de um cavalo numa “ecurie” (cfr. Ac. STJ de 19/11/1975, BMJ 251, pág. 148). É que a gravidade do dano mede-se por um padrão objectivo, embora tendo em linha de conta as circunstancias de cada caso concreto, afastando factores susceptíveis de sensibilidade exacerbada ou requintada e aprecia-se em função de tutela do direito (cfr. Antunes Varela, ob. cit., pág. 576; Vaz Serra, RLJ, 109, pág. 115 e Ac. STJ de 22/11/1978, BMJ 275, pág. 211). No presente caso, atendendo às dores, humilhação, ansiedade, angústia e temor sofridos, a indemnização fixada peca por defeito. Em todo o caso, terá o tribunal tido em consideração a actual falta de capacidade financeira do arguido, contudo, muito embora o arguido esteja preso e neste momento não trabalhe, certamente quando sair da prisão irá regressar ao trabalho, desconhecendo-se também se possui bens móveis ou imóveis que possam responder pelo pagamento da indemnização. Os danos sofridos (dores, humilhações, angústia e medo) justificam a fixação da indemnização no montante de 10.000.00 (dez mil) euros. 3. Decisão: Assim, e pelo exposto decide-se: - concede-se provimento ao recurso do MP, e consequentemente, revoga-se a decisão recorrida, fixando-se a pena pela prática do crime de violência doméstica, p. e p. pelo art.152.º, n.º1, b) e c) e n.º2, a) do Código Penal, agravado pela reincidência, na pena de 3 (três) anos e 3 (três) meses de prisão; -concede-se provimento ao recurso da assistente, fixando-se em 10.000 (dez mil) euros a indemnização a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora legais, contados do trânsito em julgado da presente decisão, até efectivo e integral pagamento; Custas pela assistente, na proporção do decaimento relativo ao pedido de indemnização civil. Notifique. Lisboa, 22 de Outubro de 2025 Cristina Isabel Henriques Cristina Almeida e Sousa Francisco Henriques  | ||||||||||||||||||