Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
239/17.0YUSTR.L1-3
Relator: NUNO COELHO
Descritores: COIMA
LIMITE MÍNIMO
LIMITE MÁXIMO
ALTERAÇÃO NÃO SUBSTANCIAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/04/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: Qualquer alteração dos factos que não implique a imputação de crime (leia-se contra-ordenação) diverso(a) ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis, é uma alteração não substancial dos factos.
A fixação das coimas, quer as coimas parcelares quer mesmo o cúmulo, não se faz entre zero e o limite máximo, mas entre um limite máximo e um limite mínimo.
A coima única é fixada em função da apreciação conjunta dos factos e da responsabilidade social-adstritiva do agente, e não em função dos critérios de determinação da medida da coima pois que, tal levaria a uma dupla valoração das mesmas circunstâncias, e, consequentemente à violação do princípio da proibição da dupla valoração.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 3.ª Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Lisboa:

I. RELATÓRIO
Em processo de contra-ordenação instaurado pela ANACOM – Autoridade Nacional de Comunicações, a arguida NOS – Comunicações, SA., foi condenada nas seguintes coimas:
. numa coima no valor de € 100 000,00 euros (cem mil euros), por violação dolosa do estatuído no ponto 2.3.2. da Decisão, em conjugação com o disposto no Art.º 113.º, n.º 3, alínea bbb) da Lei das Comunicações Electrónicas (LCE), ao não aceitar pedidos de denúncia contratual por telefone, apesar de dispor de um sistema de validação do utilizador;
. numa coima no valor de € 40 000,00 euros (quarenta mil euros), por violação dolosa do estatuído no ponto 2.4.5. da Decisão, em conjugação com o disposto no Art.º 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, resultante do facto de o SMS que envia aos clientes que lhe apresentam pedidos de denúncia incorrectamente instruídos, não indicar o prazo de 30 dias úteis para o envio da documentação em falta, sob pena de caducidade da declaração de denúncia;
. numa coima no valor de € 50 000,00 euros (cinquenta mil euros), por violação dolosa do estatuído no ponto 2.4.5. da Decisão em conjugação com o disposto no Art.º 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, resultante do facto de o SMS que envia aos clientes que denunciaram os contratos não os informar, com carácter concreto, das obrigações emergentes da denúncia;
. numa coima no valor de € 200 000,00 euros (duzentos mil euros), por violação dolosa do estatuído no ponto 2.3.1. a) da Decisão, em conjugação com o disposto no Art.º 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, por não aceitar pedidos de denúncia apresentados num endereço por si divulgado ao público (tendo ficado provados 28 casos concretos);
. numa coima no valor de € 75 000,00 euros (setenta e cinco mil euros), por violação dolosa do estatuído no ponto 2.4.6. da Decisão, em conjugação com o disposto no Art.º 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, ao não ter considerado válidas, nas datas em que as recebeu, dezasseis denúncias contratuais legíveis, corretamente instruídas e remetidas nos termos da Decisão;
. em duas coimas no valor de € 15 000,00 euros (quinze mil euros) cada uma por violação negligente do estabelecido na alínea g) do n.º 1 do Art.º 48.º da LCE, por não ter informado dois clientes acerca dos períodos contratuais mínimos a que os mesmos, segundo ela, estariam vinculados; e, por fim,
. feito o cúmulo jurídico daquelas coimas mencionadas, condenada na coima única de 347 500,00 euros (trezentos e quarenta e sete mil e quinhentos euros).
Não se conformando com esta decisão, a mesma arguida NOS - Comunicações interpôs recurso de impugnação para o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão.
Naquele tribunal foi proferida decisão que decidiu conceder parcial provimento ao recurso interposto, tendo esse mesmo tribunal decidido:
. julgar improcedente a questão prévia da nulidade da acusação;
. absolver a mesma arguida pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelo Art.º 113.º, n.º 3, alínea bbb) da Lei das Comunicações Eletrónicas (LCE), pela não aceitação de pedidos de denúncia contratual por telefone, apesar de dispor de um sistema de validação do utilizador;
. absolver essa arguida pela prática de uma contraordenação pela violação dolosa do estatuído no ponto 2.4.5. da Decisão, em conjugação com o disposto no Art.º 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, relativa ao envio de SMS aos clientes que lhe apresentam pedidos de denúncia incorrectamente instruídos, não indicar o prazo de 30 dias úteis para o envio da documentação em falta, sob pena de caducidade da declaração de denúncia;
. absolver essa mesma arguida pela prática de uma contraordenação pela violação dolosa do estatuído no ponto 2.4.5. da Decisão em conjugação com o disposto no Art.º 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, resultante do facto de o SMS que envia aos clientes que denunciaram os contratos não os informar, com carácter concreto, das obrigações emergentes da denúncia;
. condenar essa arguida numa coima no valor de € 50.000,00 euros (cinquenta mil euros), pela prática, a título negligente, da contraordenação prevista e punida no Art.º 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, em conjugação com os pontos 2.4.1. e 2.4.2., e estes com o ponto 2.3.1. a) da Decisão da ANACOM de 09.03.2012 por não ter recebido pedidos de denúncia apresentados num endereço por si divulgado ao público;
. condená-la, também, numa coima no valor de € 50.000,00 euros (cinquenta mil euros), pela prática, a título doloso, de uma contraordenação prevista e punida pelo Art.º 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, em conjugação com os pontos 2.4.1. e 2.4.6. da Decisão da ANACOM de 09.03.2012, ao não ter aceitado e/ou determinado os seus efeitos nas datas em que as recebeu, denúncias contratuais legíveis, correctamente instruídas e remetidas nos termos da Decisão;
. condená-la, mais ainda, em duas coimas no valor de € 3.500,00 euros (três mil e quinhentos euros) cada pela prática, em concurso efectivo e a título negligente, de duas contraordenações previstas e punidas pelos Art.ºs 7.º, n.º 1, e 21.º, n.º 1 e 4, ambos do Decreto-Lei n.º  57/2008, de 26.03, por não ter informado dois clientes acerca dos períodos contratuais mínimos a que os mesmos, segundo ela, estariam vinculados;
. tudo isto num cúmulo jurídico com a coima única de € 90.000,00 euros (noventa mil euros).
Inconformadas com esta sentença, recorreram para este Tribunal da Relação de Lisboa, respectivamente, a arguida NOS – Comunicações e a ANACOM.
A arguida NOS – Comunicações, apresenta as seguintes conclusões na sua motivação de recurso:
a) A alteração realizada pelo Tribunal, ao compartimentalizar artificialmente o facto em três planos, não só modifica o sentido problemático do caso, como prejudica gravemente os direitos de defesa da Recorrente, que pautou toda a sua estratégia processual nestes autos de acordo com uma determinada narrativa acusatória que, até ao presente, se manteve constante.
b) Sendo que, na aferição da substancialidade da alteração dos factos, além do sentido problemático do caso, não se pode deixar de olhar aos efeitos da alteração na estratégia processual da Recorrente,
c) Estratégia essa que, in casu, foi inequivocamente afectada ao imputar a violação de novos deveres tão perto do terminus da instância.
d) Com efeito, o Tribunal a quo não apenas alterou, ou pelo menos reconfigurou, a base factual pela qual a Recorrente vinha condenada – da não-aceitação das denúncias, que a Recorrente conseguiu demonstrar, probatoriamente, não ter ocorrido, passámos para a não-recepção dessas mesmas denúncias –,
e) Como ainda condenou a Recorrente, com base nessa nova realidade factual, na prática de um ilícito contra-ordenacional que resulta, não apenas da conjugação do ponto 2.3.1. a) da Deliberação com o artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) e n.º 11, da LCE, mas ainda da conjugação daquele ponto da Deliberação com os pontos 2.4.1. e 2.4.2. da mesma.
f) Ou seja, a Recorrente vem agora condenada com base numa nova, ou pelo menos reconfigurada, base factual, e na prática de um novo ilícito contra-ordenacional, com o qual a Recorrente nunca havia sido confrontada e que resulta do somatório de diversos deveres previstos na Deliberação.
g) Nesta medida, esta alegada alteração da qualificação jurídica corresponde, na verdade, a uma alteração substancial dos factos, que implica a nulidade da sentença, nos termos do artigo 379.º, n.º 1, alínea b), do CPP, ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO.
h) E ainda que assim não se entenda, é insofismável que a alteração em apreço representa uma violação dos direitos de defesa da Recorrente e da estrutura acusatória do processo sancionatório.
i) Na verdade, tal interpretação normativa do artigo 358.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, no sentido de que o Tribunal pode modificar de forma ilimitada o sentido de ilicitude dos factos constantes da Acusação, seria materialmente inconstitucional por violação dos direitos de defesa do Arguido e do princípio da estrutura acusatória do processo penal, consagrados, respectivamente, no artigo 32.º, n.os 1 e 5, da Constituição, inconstitucionalidade que aqui se invoca para todos os efeitos legais.
j) Acresce que os novos factos pelos quais Recorrente vem agora condenada – a saber, a não-recepção de denúncias –, são factos atípicos, i.e., não são puníveis ao abrigo das disposições da Deliberação, designadamente ao abrigo do novo ilícito contra-ordenacional construído pelo Tribunal a quo, que resulta da conjugação dos pontos 2.3.1. a), 2.4.1. e 2.4.2. da Deliberação com o artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) e n.º 11, da LCE.
k) Na verdade, a distinção realizada pelo Tribunal a quo entre recepção e aceitação das denúncias não encontra respaldo no corpo da Deliberação, na medida em que recepção e aceitação são uma e a mesma realidade.
l) Com efeito, os pontos 2.4.1. e 2.4.2. da Deliberação estabelecem as circunstâncias em que, após a recepção de uma denúncia – “Recebida uma declaração de denúncia…” –, as operadoras devem aceitar (ou “confirmar”) essas mesmas denúncias, caso as mesmas cumpram as formalidades exigidas, ou devem solicitar o envio da documentação em falta, caso as denúncias não cumpram as aludidas formalidades.
m) Por sua vez, o ponto 2.4.6. da Deliberação determina o momento em que a denúncia deve ser considerada aceite, que é o momento da recepção da denúncia, ou seja, o momento em que a Denúncia é recebida num dos endereços comunicados para o efeito.
n) Assim, a distinção realizada pelo tribunal entre recepção e aceitação de denúncias não encontra, como se disse, acolhimento nem na letra nem no espírito da Deliberação, uma vez que o que o tribuna qualifica como recepção da denúncia mais não é do que a aceitação dessa denúncia.
o) E dúvidas também não pode haver de que a Deliberação não pune a não recepção das denúncias, uma vez que, aliás, tal recepção nem sequer depende de qualquer conduta das operadoras de telecomunicações: as denúncias são recebidas através dos meios de comunicação disponibilizados para o efeito, não havendo qualquer conduta que as operadoras possam levar a cabo para impedir a recepção de tais denúncias.
p) Deve, pois, concluir-se que o enquadramento jurídico dado pela Anacom aos factos em apreço estava correcto.
q) Sucede, porém, que a Recorrente logrou demonstrar, ao longo do processo – e tal como consta dos factos provados da sentença recorrida –, que, relativamente a 22 dos 28 casos referidos na Decisão da Anacom, a Recorrente aceitou as denúncias em causa, uma vez que, não obstante ter devolvido essas mesmas denúncias, solicitando que as mesmas fossem enviadas para o Apartado do C..., fez retroagir os efeitos dessas denúncias à data em que as mesmas foram recepcionadas no Apartado de P....
r) Ou seja, ao ter feito retroagir os efeitos das denúncias à data da recepção das mesmas no Apartado de P..., a Recorrente aceitou, para efeitos do disposto nos pontos 2.3.1., 2.4.1. e 2.4.6. da Deliberação, as Denúncias enviadas para o esse Apartado, não obstante ter, erradamente, procedido à sua devolução e solicitado aos clientes que enviassem as denúncias para o Apartado do C....
s) Em consequência, deve a Recorrente ser absolvida da prática do ilícito contra-ordenacional que resulta, na opinião – aqui, errada, como se demonstrou – do Tribunal a quo, da conjugação dos pontos 2.3.1., alínea a), 2.4.1. e 2.4.2. da Decisão de 09.03.2009 com o artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) e n.º 11, da LCE.
t) A Recorrente vem condenada em € 50.000,00 (cinquenta mil euros) pela prática de uma contraordenação pela violação do disposto no ponto 2.4.6. da Deliberação de 09.03.2009, em conjugação com o artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE, pela não recepção de 5 (cinco) pedidos de denúncia não ilegíveis.
u) Todavia, na decisão da ANACOM, a Recorrente tinha sido condenada em € 75.000,00 (setenta e cinco mil euros) pela não recepção de 16 (dezasseis) pedidos de denúncia não legíveis.
v) Assim, perante um acervo factual que apenas apresenta 31,25% (trinte e um virgula vinte e cinco porcento) das ocorrências daquele que esteve na base da decisão da ANACOM, o Tribunal aplicou uma coima que representa dois terços do montante da coima originariamente aplicada.
w) O que significa que o Tribunal, na prática, agravou a coima aplicada por cada uma das ocorrências que consubstanciaram o facto típico.
x) Justificando tal reavaliação com a circunstância de esta ter alegadamente agido com dolo eventual e que tal circunstância se repercutia nas exigências de prevenção especial.
y) Contudo, tanto a imputação a título de dolo eventual como a as exigências constavam já da decisão da ANACOM.
z) Pelo que não se alcança em que medida é que tais argumentos demonstram qualquer insuficiência da dosimetria da coima resultante da ponderação da ANACOM.
aa) Logo, não há qualquer motivo atendível para que não sejam retiradas as devidas consequências da diminuição da ilicitude do facto resultante da redução do número de ocorrências.
bb) O que significa que a coima concretamente aplicada viola o disposto no artigo 5.º, n.º 1, do RQCOC, por não atender a essa diminuição da ilicitude.
cc) E também o princípio da proibição de reformatio in pejus por representar um agravamento virtual da coima aplicada, face aos factos apurados.
dd) Nesta medida, deve a coima concretamente aplicada ser reduzida para 31,25% daquela que foi aplicada pela ANACOM: € 23.437,50 (vinte e três mil e quatrocentos e trinta e sete euros e cinquenta cêntimos).
ee) De forma mais geral, também a coima única de € 90.000,00 (noventa mil euros) foi determinada em desconformidade aos critérios de determinação da medida da coima, consagrados no artigo 5.º, do RQCOC.
ff) Na sequência de recurso de impugnação judicial interposto pela NOS, a Decisão da Anacom veio a ser alterada pelo Tribunal a quo, que determinou que (i) a Recorrente fosse absolvida das três primeiras contraordenações; (ii) o elemento subjectivo na violação da alínea a) do ponto 2.3.1. da Decisão de 09.03.2009 passasse de dolo para negligência; (iii) na violação do ponto 2.4.6 da Decisão de 09.03.2009, fossem dadas como provadas apenas 5 (cinco) ocorrências em vez de 16 (dezasseis); e (iv) a alteração da qualificação jurídica dos factos que suportavam a alegada violação do artigo 48.º, n.º 1, alínea g), da LCE, requalificando-os, em termos favoráveis à Recorrente, como uma violação do artigo 7.º, n.º 1, e 21.º, n.º 4, ambos do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de Março.
gg) Do exposto se conclui que a alteração do elemento subjectivo do tipo na contraordenação por violação da alínea a), do ponto 2.3.1., da Deliberação de 09.03.2009, e que a diminuição do número de ocorrências na base da violação do ponto 2.4.6. da mesma Deliberação representam, respectivamente, uma diminuição da culpa da Recorrente e da ilicitude do facto, face à imputação da ANACOM.
hh) Sendo que tais circunstâncias abonatórias deveriam ter influído na determinação da medida concreta da pena, afastando-a do limiar máximo do cúmulo jurídico.
ii) Todavia, sucedeu precisamente o inverso: apesar de se verificarem circunstâncias que deveriam diminuir a medida concreta da coima, quando comparamos a sanção aplicada ao limite máximo da moldura legal do cúmulo jurídico, vemos que a coima aplicada pelo Tribunal está mais próxima desse limite do que a coima aplicada pela ANACOM.
jj) Com efeito, a coima concretamente aplicada pela ANACOM representava 70,2% (setenta virgula dois porcento) do limite máximo da moldura legal, contudo a coima concretamente aplicada pelo Tribunal representava 84,11% (oitenta e quatro virgula onze porcento) do limite máximo.
kk) E se tivermos em conta as repercussões no limite máximo do cúmulo jurídico que a diminuição devida da coima concretamente aplicada pela violação do ponto 2.4.6. da Deliberação de 09.03.2009, a coima aplicada pelo Tribunal passa exceder o limite superior da moldura legal.
ll) Assim sendo, e de forma a manter a congruência com a ponderação da ANACOM e com o desagravamento dos elementos que determinam a medida da sanção, a coima concretamente aplicada nunca poderia exceder o limite máximo de € 80.437,50 (oitenta mil e quatrocentos e trinta e sete euros e cinquenta cêntimos).
mm) Por fim, cumpre referir que a valoração in malam partem das circunstâncias que contribuíram para a determinação da medida da coima aplicada pela ANACOM consubstancia uma violação material do princípio da proibição da reformatio in pejus.
nn) Isto porque o Tribunal, para conseguir agravar, em termos relativos, o montante da coima, teve necessariamente de valorar de forma mais grave os restantes elementos determinantes da medida da coima.
oo) Revaloração essa que revela, in casu, uma violação material do princípio da proibição da reformatio in pejus.
pp) A não redução da sanção, apesar de uma requalificação jurídica in bonam partem, viola aquele princípio, porque, ao permitir a neutralização dos efeitos benéficos daquela requalificação, dissuade o arguido de recorrer por criar um risco artificial de inutilidade do recurso.
qq) Mais: a não redução da sanção implica que, materialmente, comparando a coima aplicada pela ANACOM, tendo por referência as contraordenações aí consideradas, com aquela aplicada na Sentença, a NOS tenha ficado numa posição desfavorável face àquela em que se encontrava antes do Recurso.
rr) Não é lícito ao Tribunal de primeira instância, em sede de recurso interposto no exclusivo interesse do arguido, alterar a qualificação jurídica de certos factos em benefício do recorrente e, em simultâneo, agravar a qualificação jurídica de outros factos alheios ao objecto do recurso, com o intuito de neutralizar, total ou significativamente, o efeito das primeiras alterações.
ss) Foi o que sucedeu in casu: apesar de verificar a existência de circunstâncias que deveriam militar a favor da redução da coima concretamente aplicada, o Tribunal vem, quase em jeito de “compensação”, agravar, em termos relativos, a ponderação dos elementos determinantes da medida da sanção, aproximando esta do seu limite máximo.
tt) A redução da coima concretamente aplicada tem de ser materialmente significativa, no contexto do montante global da coima e das circunstâncias atenuantes em causa.
uu) Circunstâncias essas que, no caso em apreço, se reconduzem (i) ao facto de se terem provado metade das ocorrências que consubstanciam uma violação do ponto 2.4.6. da Deliberação de 09.03.2009 e (ii) ao facto de ter sido alterada a imputação subjectiva de dolo para negligência inconsciente na contraordenação por violação da alínea a), do ponto 2.3.1., dessa Deliberação.
vv) A pluralidade de circunstâncias descritas impõem uma reformatio in melius da coima concretamente aplicável num grau muito maior do que aquele que efectivamente se verificou.
ww) Devendo, por isso, o Tribunal da Relação revogar a parte da sentença que estabelece a coima única e substituí-la por uma outra, significativamente mais baixa, que reflicta devidamente a ilicitude e culpa reduzidas, em concreto, e proporcionalmente à coima única que tinha sido fixada pela ANACOM, por uma coima nunca superior a € 56.467,13 (cinquenta e seis mil e quatrocentos e sessenta e sete euros e treze cêntimos), correspondente a 70,2% do limite máximo de € 80.437,50 (oitenta mil e quatrocentos e trinta e sete euros e cinquenta cêntimos).
Termos em que, e nos mais de Direito, deverão V. Ex.as:
(i) declarar nula a sentença recorrida;
Sem prejuízo,
(ii) revogar a sentença recorrida, substituindo-a por outra que absolva a Recorrente da prática da contraordenação resultante da conjugação dos pontos 2.3.1., alínea a), 2.4.1. e 2.4.2., todos da Deliberação de 09.03.2009, e do artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE;
Sem prejuízo para os pedidos anteriores,
(iii) revogar a sentença recorrida, substituindo-a por outra que, por força do artigo 5.º, n.º 1, do RQCOC, e do princípio da proibição da reformatio in pejus, reduza a coima parcial concretamente aplicada à violação do ponto 2.4.6. da Deliberação de 09.03.2009 para montante nunca superior a € 23.437,50 (vinte e três mil e quatrocentos e trinta e sete euros e cinquenta cêntimos); e
(iv) revogar a sentença recorrida, substituindo-a por outra que, por força do artigo 5.º, n.º 1, do RQCOC, e do princípio da proibição da reformatio in pejus, reduza a coima única aplicada em cúmulo jurídico, para montante nunca superior a € 56.467,13 (cinquenta e seis mil e quatrocentos e sessenta e sete euros e treze cêntimos).
Por seu turno, a ANACOM concluiu a sua motivação de recurso, nos seguintes moldes:
1. A deliberação da ANACOM de 09.03.2012 designada “Decisão sobre Procedimentos exigíveis para a cessação de contratos, por iniciativa dos assinantes, relativos à oferta de redes públicas ou serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público” contém, cita-se da deliberação “indicação clara dos limites a que devem obedecer os procedimentos de cessação dos contratos” e implica a obrigação das empresas de comunicações definirem procedimentos, designadamente, no Ponto 2.3.4 em que se dispõe que “para efeitos do disposto no número 2.3.1., as empresas devem criar uma minuta facultativa de formulário de denúncia […]”, referindo-se no ponto 5.1. que “5.1. As empresas que oferecem redes de comunicações públicas e que prestam serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público devem implementar as medidas necessárias ao cumprimento do disposto na presente decisão no prazo de 120 dias úteis a contar da notificação da decisão final”.
2. “Implementar as medidas necessárias ao cumprimento daquelas normas” e implementar as normas são realidades diferentes – a douta sentença errou ao não fazer essa distinção, que existe;
3. Se as empresas devem implementar medidas necessárias é porque as normas se não devem aplicar diretamente, e é necessário que as empresas as adotem nos procedimentos que definam, aquela deliberação é uma ordem às demais empresas para que alterem os procedimentos que definam de modo a incorporar as práticas ali descritas;
4. A sentença errou ao considerar que a deliberação visou estabelecer algum código de procedimentos a adotar uniformemente por todas as empresas, em vez de, como ela própria refere, limites;
5. O exercício da douta sentença, ao fazer a exegese das normas para daí concluir pela sua aplicabilidade imediata é um exercício tão errado quanto procurar distinguir um decreto-lei de uma diretiva pelo conteúdo das normas a transpor;
6. Os ilícitos em causa, nesta perspetiva em que ao regulador compete a defesa de interesses difusos como a concorrência e os interesses gerais dos consumidores, são de perigo abstrato, o que implica que não seja necessário um concreto resultado, bastando que o procedimento definido pela empresa desrespeite aquelas determinações - a infração resulta da violação pela empresa, da sua obrigação de implementar procedimentos (que a deliberação afirma serem necessários) e que integrem aquelas regras (que a deliberação qualifica como limites);
7. Mas, como se não bastasse, provou-se que a arguida não aceita pedidos de denúncia contratual por telefone desde agosto 2012, violando-se assim a regra do ponto 2.3.2. da Deliberação da ANACOM que deveria ter implementado;
8. Ora, se a arguida não aceitou pedidos é porque esses pedidos existiram pois só se pode aceitar ou recusar um pedido se algum pedido existe e, inversamente, é impossível aceitar ou recusar algo que não existe nem é proposto – por outras palavras, tendo-se provado a ocorrência de recusas de denúncias contratuais por telefone provou-se também que existiram pedidos de denúncias contratuais por telefone;
9. A douta sentença não extraiu deste facto qualquer consequência, não obstante afirmar a necessidade de prova de violação concreta daquela disposição em denúncias de clientes;
10. Todavia, mesmo que nada constasse do elenco da factualidade provada, é um facto que resulta necessariamente das regras da experiência comum e de parâmetros de normalidade e razoabilidade que os consumidores que pretendem denunciar contratos utilizam, entre outros meios, como o envio de cartas, mensagens por correio eletrónico ou deslocações a loja, a comunicação telefónica: negar isto seria negar o óbvio;
11. Importa referir que as demais objeções da recorrida porquanto esta dispunha de um sistema de validação do utilizador definido no ponto 2.2.3. da DECISÃO, como “qualquer procedimento de confirmação da identidade do assinante, por parte da empresa, nomeadamente através de senhas de acesso ou da indicação de dados de identificação que, com o acordo expresso ou tácito deste, seja utilizado para a celebração ou modificação do contrato” – e provou-se que a recorrida fazia uso de tal sistema para modificações do contrato, sem que esta alegue que o fazia contra a vontade do cliente, não sendo razoável supor que a mesma deliberação contenha conceitos distintos de “sistema de validação do utilizador”;
12. A Deliberação de 09.03.2012 impõe, no seu ponto 2.4.2., que quando seja recebida uma declaração de denúncia nos termos previstos no respetivo ponto 2.3. e sempre que esta não cumpra os requisitos fixados nos pontos 2.1. e 2.2., as empresas devem, no prazo de três dias úteis a contar da data da sua receção, solicitar ao assinante o envio da informação ou documentação em falta;
13. Nos termos do ponto 2.4.5. da Deliberação, a comunicação prevista no ponto 2.4.2. deve fixar um prazo de 30 dias úteis para o envio da informação ou da documentação em falta e informar o assinante que, em caso de não cumprimento desse prazo, a declaração de denúncia considerar-se-á caducada. Conforme estabelecido no ponto 2.4.3. da Deliberação, as comunicações que as empresas dirijam aos assinantes a solicitar o envio de informação ou documentação em falta devem ser feitas por escrito e enviadas para qualquer um dos contactos indicados por aqueles ou entregues em mão aos assinantes;
14. Do que supra se referiu nas primeiras seis conclusões, resulta também que a douta sentença desaplicou a referida deliberação ao exigir a verificação de “casos concretos” para além da não implementação de medidas que visassem dar efeito ao determinado nos pontos 2.4.4. e 2.4.5. da Deliberação de 09.03.2012;
15. Isto apesar de se ter provado, designadamente nos parágrafos 40 a 46 da douta sentença, que os procedimentos definidos pela arguida, ao gerar mensagens SMS com conteúdos insuficientes os quais foram concebidos pela sua Direção de Melhoria Contínua, não davam cumprimento aos referidos nos pontos 2.4.4. e 2.4.5. daquela deliberação;
16. O único contacto escrito provado nos autos é o que resulta da SMS, sendo irrelevante que a referida SMS contenha a informação de que para a obtenção de mais informação deve ser utilizado um número telefónico para a realização de uma chamada, porquanto tal procedimento não só não respeita o que foi fixado naquele ponto da Deliberação, como constitui um obstáculo ao procedimento de denúncia – e, por isso, não permitido pela Deliberação de 09.03.2012;
17. Aquelas mensagens escritas omitem a informação de que os assinantes dispõem de um prazo para regularizar a documentação em falta nos respetivos pedidos de denúncia e, ainda, que, findo esse prazo sem que o façam, tais pedidos caducam, informações essenciais à defesa dos direitos dos assinantes no procedimento de denúncia contratual, cujo desconhecimento fará com que permaneçam mais tempo clientes da arguida e não possam alcançar o seu desiderato legítimo, e acautelado pela Deliberação de 09.03.2012, de se desvincularem da empresa.
18. No que tange aos SMS a arguida agiu com dolo;
19. Provou-se no facto constante do parágrafo 62 que a arguida, ao decidir criar o apartado do C..., não pretendeu que denúncias recebidas noutros endereços fossem rejeitadas mas que contudo, não evitou, o que era capaz, uma deficiente implementação desse procedimento, tendo sido esta a razão pela qual sucederam os factos descritos nos pontos 47 a 62 da sentença;
20. Ocorre erro notório na apreciação da prova: o que se deveria ter por provado no facto 62 foi que a arguida ao decidir não aceitar denúncias contratuais recebidas noutros endereços que não o apartado do C..., agiu livre e conscientemente;
21. a douta sentença refere a fls. 52 o seguinte (AE... foi uma testemunha apresentada pela recorrente): “282. A decisão impugnada alude ainda, na fundamentação de direito, a 1516 denúncias em relação às quais terá sido observado o mesmo procedimento, com base na informação prestada na diligência realizada no dia 19 de junho de 2013 na sede da NOS (cf. fls. 455) – cf. pp. 50 a 54 da decisão e fls. 1187 a 1191. AE... confirmou, em audiência de julgamento, este facto. Contudo, em primeiro lugar, a decisão não assume esse dado como uma imputação fática, pois não lhe é efetuada qualquer referência na matéria de facto provada. […]”;
Ora,
22. A prática das operações materiais descritas, por 1516 vezes, tendo a recorrida contado essas vezes, pressupõe uma intencionalidade que se não coaduna com a negligência, e só é imaginável se for querida e consentida pelos órgãos da Empresa, não sendo razoável admitir que os custos financeiros dessa prática bem como a afetação de recursos da mesma não fossem consentidos e queridos;
23. Tanto mais que a não aceitação de cada uma daquelas comunicações escritas implicou a necessidade de redigir uma resposta-tipo, elaborar 1516 cartas de resposta, endereçar 1516 cartas, pagar portes para 1516 cartas e transportar essas cartas de respostas à estação do correio – toda uma atividade e logística específica e propositada que terá ocorrido repetidamente, no julgamento de facto do Tribunal, 1516 vezes, por negligência, a qual forçosamente, terá ocorrido em quem na empresa teria a competência para aprovar a despesa, bem como terá ocorrido em quem teria competência para fiscalizar o cumprimento das ordens e das normas aplicáveis, que igualmente foi negligente.
24. A prática de todas essas operações materiais, por 28 vezes, pressupõe uma intencionalidade que se não coaduna com a negligência.
25. Esta indicação do número de vezes consta da decisão da autoridade recorrida para sustentar a imputação a título doloso, e consta também da douta sentença, que qualifica essa factualidade como uma imputação genérica (fls. 53 - sic.).
26. Diz ainda a douta sentença a fl.s 55 o seguinte: “293. É certo que a tese da Recorrente suscita alguns fatores de estranheza. Assim, é estranho que não tenha sido identificada a pessoa, no departamento de atendimento ao cliente, que tenha delineado o procedimento (facto afirmado por AE...). É igualmente estranho um comportamento dicotómico e descoordenado dentro da mesma empresa e que o serviço de atendimento ao cliente da Recorrente tenha assumido este procedimento sem se articular com o departamento de regulação e concorrência para aferir se o mesmo era correto ou a questão não tenha sido colocada ao Conselho de Administração”.   // “295. É certo que a não receção das denúncias e a sua devolução foi um procedimento pensado e querido por quem executou os factos. Não estamos evidentemente perante atos que escapam à representação e vontade conscientes de quem (pessoas singulares) os praticou. Contudo, o problema está na possibilidade – que tem de ser aceite como razoável e, nessa medida, possível – dessa representação e vontade não se mostrarem acompanhadas da noção de que esse procedimento estava a violar uma ordem da ANACOM, uma vez que a informação relativa ao conteúdo da Decisão – essencial para uma correta apreensão do ilícito e que, nessa medida, é suscetível de afastar o dolo – era detida por outro departamento da Recorrente”.”;
27. E assim, o dolo é afastado por uma falta de consciência da ilicitude de uma parte da recorrida que age e gasta recursos da recorrida sem prestar contas por indicação de alguém de que apenas se sabe que trabalha no departamento de atendimento ao cliente e que assim decidiu, sendo que o conhecimento das regras era detido por outra parte da recorrida a qual não terá feito essa comunicação à tal pessoa que trabalha no departamento de atendimento ao cliente, porventura por ninguém saber quem é, embora todos tenham recebido e cumprido ordens suas…
28. Não parece que este cenário possa ter qualquer adesão à realidade de uma empresa em que há uma cadeia de responsabilidades.
29. Do teor da própria sentença, que a aceitação da veracidade daquele quadro factual negligente viola as regras da experiencia comum que o tribunal recorrido cometeu erro notório na apreciação da prova ao não considerar verificado o nexo de imputação subjectiva a título doloso, dos factos provados descritos nos parágrafos números 47 a 62, havendo que acrescentar à matéria de facto a verificação desse nexo, como se refere na conclusão 20;
30. Uma contra-ordenação a título doloso todo aquele que, no momento em que age o faz com conhecimento e vontade de realização da factualidade material típica, ou seja, da conduta descrita como infração contraordenacional, e com consciência da respetiva proibição, sendo que no caso essa consciência não poderia deixar de existir; face às circunstâncias que a douta sentença descreve, designadamente, o número de vezes em que aquela conduta se repetiu, poderia seguramente ser presumido - não se tratou de uma qualquer conduta isolada, mas sim de um comportamento massificado, que denuncia uma orientação pré-definida com vista a um determinado resultado, e que afasta, por si só, a possibilidade de se poder equacionar tratar-se da mera violação de um dever de cuidado;
31. E é válido o recurso à prova indiciária como se refere no Ac. do STJ, de 11.07.2007, todos disponíveis em www.dgsi.pt), também chamada prova indiciária, por presunções ou circunstancial. Quer a prova directa, quer a prova indirecta são modos, igualmente legítimos, de chegar ao conhecimento da verdade, ainda que prosseguindo de modo silogístico e que podem ser regras jurídicas ou máximas da experiência, como se disse, visando a descoberta da verdade, como se refere na conclusão VIII do Ac. do STJ de 12.03.2009 ( ) – “a liberdade de apreciação da prova é uma liberdade de acordo com um dever – o dever de perseguir a chamada «verdade material» –, de sorte que a apreciação há-de ser, em concreto, recondutível a critérios objectivos e, portanto, em geral susceptível de motivação e controlo – cf. Figueiredo Dias, ob. cit., págs. 202-203”.
32. Aliás, não havendo confissão, a prova dos elementos subjectivos do tipo (doloso ou negligente) não poderá fazer-se senão por meio de prova indireta;
33. Pelas razões expressas na decisão da autoridade administrativa que se dá por integralmente reproduzida, em particular de fls, 76 a 81, deverá ser a arguida condenada nas seguintes coimas parcelares:
a. Uma coima de 100 000,00 euros por uma contraordenação muito grave prevista na alínea bbb) do n.º 3 do artigo 113.º da Lei das Comunicações Eletrónicas (LCE) , por violação dolosa do estatuído no ponto 2.3.2. da Deliberação da ANACOM de 09.03.2012, por não aceitar pedidos de denúncia contratual por telefone, apesar de dispor de um sistema de validação do utilizador;
b. Uma coima de 40 000,00 euros por uma contraordenação muito grave prevista na alínea bbb) do n.º 3 do artigo 113.º da LCE, por violação dolosa do estatuído no ponto 2.4.5. da Deliberação da ANACOM de 09.03.2012, por o SMS que enviava aos clientes que lhe apresentavam pedidos de denúncia incorretamente instruídos, não indicar o prazo de 30 dias úteis para o envio da documentação em falta, sob pena de caducidade da declaração de denúncia;
c. Uma coima de 50 000,00 euros por uma contraordenação muito grave prevista na alínea bbb) do n.º 3 do artigo 113.º da LCE, por violação dolosa do estatuído no ponto 2.4.4. da Deliberação da ANACOM de 09.03.2012, por o SMS que enviava aos clientes que denunciavam contratos não os informar, com caráter concreto, das obrigações emergentes da denúncia;
34. Aderindo às doutas considerações dos parágrafos 466 e ss. da douta sentença, exceto no que tange à apreciação da culpa da arguida, entende-se que se mantém adequada a aplicação de uma coima de 200 000,00 euros por uma contraordenação muito grave prevista na alínea bbb) do n.º 3 do artigo 113.º da LCE, por violação dolosa e não apenas negligente do estatuído no ponto 2.3.1. a) da Deliberação da ANACOM de 09.03.2012, por não aceitar pedidos de denúncia apresentados num endereço por si divulgado ao público  e não os 50.000,00 euros referidos na douta sentença.
35. Mantendo-se as demais coimas parcelares constantes nos pontos VI e VIII do dispositivo da douta sentença, que não são objeto deste recurso, havendo que proceder ao cúmulo jurídico, afigura-se adequada uma coima única de 300.000,00 euros, mantendo-se a decisões quanto à condenação em custas constante da decisão administrativa – mas a V. Exas Venerandos Desembargadores, compete decidir.
Termos em que, tudo visto e ponderado, deverão V.Exas., Venerandos Juízes Desembargadores, revogar a decisão sob recurso, substituindo-a por outra que, nos termos supra referidos nas conclusões e motivação que antecedem, condene a recorrida aplicando uma coima única de €300.000,00, assim se fazendo JUSTIÇA!
A estes recursos responderam o Ministério Público e, respectivamente, as recorrentes e recorridas ANACOM e NOS - Comunicações, pronunciando-se estas pelas improcedências dos recursos das contrapartes e o Ministério Público pela improcedência de ambos os recursos, embora com mera alteração do enquadramento jurídico relativo à devolução das 28 denúncias contratuais, condenando-se a arguida pela contra-ordenação prevista no Art.º 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE em conjugação com o ponto 2.3.1. al. a) da Deliberação e mantendo-se a coima parcelar referente à violação do 2.4.6. da Deliberação e a coima única.
O Exmo. Senhor Procurador Geral-Adjunto nesta Relação, pronunciou-se também pela improcedência total de ambos os recursos, remetendo para as respostas que o Ministério Público apresentou em 1.ª instância.  
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II. QUESTÕES A DECIDIR
Conforme jurisprudência constante e amplamente pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. Art.º 119.º, n.º 1; 123.º, n.º 2; 410.º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do CPPenal, Acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória do STJ de 19/10/1995, publicado em 28/12/1995 e, entre muitos, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 25/6/1998, in BMJ 478, pp. 242, e de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271).
No que respeita a este recurso de sentença que conheceu de uma impugnação judicial de uma decisão administrativa de contra-ordenação há que atender, todavia, à especificidade do Art.º 75.º, n.º 1, do DL 433/82 de 27/10 (RGCOA), que nos diz que em sede contra-ordenacional esta instância conhece, em regra, da matéria de direito e, salvo os casos previstos no Art.º 410.º, n.º 2, do Código do Processo Penal, está vedado a este Tribunal sindicar o julgamento em matéria de facto, pelo que deve ater-se à que se mostra assente na decisão impugnada.
Tendo em conta este contexto normativo e o teor das conclusões efectuadas pelo recorrente, são estes os quatro grupos de questões em apreciação:
(i) da aventada nulidade da sentença impugnada, nos termos do Art.º 379.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal (CPPenal), ex vi Art.º 41.º, n.º 1, do Regulamento Geral das Contra-Ordenações (RGCO), por alteração da qualificação jurídica e alteração substancial de factos (alteração do enquadramento jurídico realizada pelo tribunal a quo, relativa aos factos sobre a não aceitação de denúncias no Apartado de P...) e eventual inconstitucionalidade da interpretação do Art.º 358.º, n.º 3, do CPPenal, por violação dos direitos de defesa e do princípio da estrutura acusatória do processo penal – Art.º 32.º, n.ºs 1 e 5, da Constituição da República Portuguesa (CRPortuguesa) [NOS – Comunicações];
(ii) da impugnação estrita da matéria de facto, por erro notório na apreciação da prova ao não considerar verificado o nexo de imputação subjectiva a título doloso dos factos provados descritos nos §§ 47 a 62, o que se imporia face à prova indiciária, por presunções ou circunstancial [ANACOM];
(iii) da impugnação de direito, isto porque a sentença terá errado ao considerar que a Deliberação da ANACOM visou estabelecer algum código de procedimentos a adoptar uniformemente por todas as empresas e não que existia uma obrigação que dolosamente foi violada de implementar procedimentos (ilícito de perigo abstracto) [ANACOM], ou porque deveriam considerar-se atípicos os factos novos pelas quais a recorrente NOS – Comunicações foi condenada, em resultado da alteração (substancial de factos) acima referida, isto é, a não recepção de denúncias são factos atípicos à luz da Deliberação ANACOM, isto porque a mesma recorrente NOS – Comunicações, aceitou efectivamente as denúncias, tal como ficou demonstrado na sentença [NOS – Comunicações]; e
(iv) da escolha e medida das coimas aplicadas pelo tribunal a quo, por decorrência dos demais fundamentos de recurso [ANACOM e NOS - Comunicações] e da violação da proibição da reformatio in pejus na sua compreensão lata e materialmente orientada (cfr. Art.º 72.º-A, n.º 1, do RGCO, ex vi Art.º 36.º do Regime Quadro das Contra-Ordenações do Sector das Comunicações (RQCOC), ou do disposto no Art.º 5.º, n.º 1, do mesmo RQCOC, por não atender à diminuição da ilicitude na determinação da medida da coima (coimas parcelares e coima única resultante do cúmulo) [NOS – Comunicações].
***
III. FUNDAMENTAÇÃO
É do seguinte teor a decisão recorrida, com referência à questão prévia conhecida, aos factos, à sua fundamentação e também qualificação jurídica, com vista a aquilatar da bondade dos fundamentos deste recurso:
“***
Saneamento
*
8. Primeira questão prévia – nulidade da acusação:
9. Sustenta a Recorrente, a propósito desta questão, o seguinte: (i) os factos 4 e 5 da Decisão foram nesta acrescentados, quando não constavam da Acusação, não tendo sido a Arguida confrontada com os mesmos em momento anterior à prolação da Decisão final, pelo que a Arguida não exerceu o seu direito de defesa quanto a esses factos; (ii) tais factos relevam para a condenação da Arguida, designadamente ao nível da imputação da infração a título de dolo; (iii) a inclusão de factos novos na decisão final, sem que o arguido seja previamente notificado para que dos mesmos se possa defender configura nulidade daquela decisão, que decorre do disposto no artigo 50.º do RGCO, conjugado com o disposto no artigo 379.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal, aplicável ex vi artigo 41.º, n.º 2, do RGCO, bem como viola o direito de defesa, consagrado no artigo 32.º, n.º 10, da Constituição da República Portuguesa, pelo que a Decisão da ANACOM é, pois, nula; (iv) o artigo 50.º do RGCO, interpretado no sentido de que a decisão final se pode basear em factos, elementos de direito constitutivos da infracção ou meios de prova que não tenham sido comunicados ao arguido, em momento anterior à prolação da decisão final, e sobre os quais o arguido não teve oportunidade de se pronunciar, é, nessa interpretação, materialmente inconstitucional, por violação do direito de defesa, consagrado no artigo 32.º, n.os 1, 2, 5 e 10 da Constituição da República Portuguesa.
10. Por sua vez, defende a ANACOM que não se verifica o vício invocado, pelos seguintes fundamentos: (i) não ocorreu alteração da matéria de facto – consubstanciada na descrição dos pontos 4.º e 5.º (da matéria de facto provada) – que tivesse determinado a violação do direito de defesa da Arguida/Recorrente, porquanto a matéria em causa naqueles pontos já constava da descrição genérica efetuada no artigo 192.º da Acusação que lhe foi notificada; (ii) os referidos pontos transcrevem, o 4.º, uma citação extraída da resposta apresentada pela Arguida/Recorrente no âmbito da Consulta Pública lançada pela ANACOM em 27.10.2011, relativa ao projeto de decisão sobre os procedimentos exigíveis para a cessação de contratos, e 5.º, um excerto do Relatório referente à Consulta Pública respeitante a uma tomada de posição da ANACOM sobre a exceção constante dos pontos 2.2.2. e 2.2.3. daquele projeto, na sequência da análise das várias respostas apresentadas pelos operadores que nela participaram, entre os quais a Arguida/Recorrente; (iii) no mencionado artigo 192.º da Acusação foi feita referência à participação da Arguida/Recorrente na referida Consulta Pública, com a expressa indicação da interiorização, por parte da mesma, dos termos de cada uma das obrigações a que ficou sujeita, tendo sido, ainda, indicado o link da Internet através do qual seria possível aceder a toda a documentação respeitante àquela Consulta, onde se incluía, naturalmente, quer o projeto de decisão submetido a consulta, quer as pronúncias dos interessados (sobre esse projeto) – entre as quais, a da Arguida/Recorrente –, quer o Relatório da Consulta, quer a própria Decisão aprovada, a final; (iv) ao fazê-lo, a Acusação acautelou, evidentemente, o direito de Defesa da Arguida/Recorrente, que ficou, desse modo, a saber que o referido procedimento de consulta pública, em que interveio, através da apresentação de pronúncia (que passou a integrar o correspondente processo), seria tomado em consideração na análise das condutas que lhe foram imputadas, em sede da decisão final a proferir; assim, os factos descritos nos referidos pontos 4.º e 5.º não são ‘factos novos’, pois, já estavam incluídos na factualidade descrita no referido artigo 192.º da Acusação, estando também disponíveis no endereço de Internet da ANACOM, sendo, pois, factos públicos e notórios, que não careciam sequer de ser dados como provados na Decisão; (v) além disso, respeitando o ponto 4.º da matéria de facto provada a um excerto da pronúncia da ZON, já era um facto conhecido da própria, que não pode, assim, vir alegar ter sido surpreendida com as suas próprias afirmações; (vi) e, no tocante ao ponto 5.º, tendo sido integrado na Deliberação de 09.03.2012, que foi devidamente notificada aos interessados, para além de ter sido publicada no sítio da ANACOM na Internet, também não constitui qualquer surpresa para a Arguida/Recorrente, que o conhecia já; (vii) é, pois, manifesto que não ocorreu qualquer violação do direito de defesa da Arguida/Recorrente, que teve, efetivamente, oportunidade de se pronunciar, no prazo de exercício do seu direito de defesa, sobre os factos cujo conhecimento vem agora pôr em causa na sua Impugnação; (viii) e, ainda que se viesse a entender – o que apenas para efeitos de raciocínio se equaciona, sem conceder –, que os pontos 4.º e 5.º da matéria de facto dada como provada violaram, de facto, o direito de defesa da NOS, nunca tal circunstância poderia determinar a nulidade da Decisão administrativa, conforme por si pugnado, em virtude da mera instrumentalidade de tais factos face à factualidade típica, quer objetiva, quer subjetiva; (ix) quando muito, a única consequência que se antevê como admissível seria a consideração de tais pontos como não constantes da Decisão – isto é, não escritos – circunstância que, a ocorrer, não teria a virtualidade de alterar as conclusões sobre a conduta dolosa da Arguida/Recorrente, nem, consequentemente, teria qualquer consequência ao nível da redução da coima (única) aplicada; (x) porém, verificando-se que a Arguida/Recorrente se defendeu relativamente a todas as matérias, designadamente sobre aquela factualidade específica – cfr. pontos 9. a 36. e 88. a 106. da sua Impugnação – sempre se teria que considerar que o vício invocado, a existir, se mostra sanado, em razão da jurisprudência fixada no referido Assento n.º 1/2003 do STJ.
11. Cumpre apreciar e decidir.
12. O direito de defesa, na fase organicamente administrativa do processo de contraordenação, está consagrado no artigo 22.º, do Regime Quadro das Contraordenações do Sector das Comunicações (RQCSC), aprovado pela Lei n.º 99/2009, de 04.09 , ex vi artigo 1.º, n.º 3, alínea j), e, no que respeita especificamente a conteúdo da “acusação”/notificação, no artigo 50º, do RGCO, sendo uma concretização, na lei ordinária, da garantia constitucional prevista no artigo 32.º, n.º 10, da Constituição.
13. Este direito, segundo a jurisprudência do Tribunal Constitucional, exarada no acórdão nº 659/2006 e reiterada em outros arestos, nomeadamente nos acórdãos nº 461/2011 e nº 73/2012, implica, no essencial, “a inviabilidade constitucional da aplicação de qualquer tipo de sanção, contraordenacional, administrativa, fiscal, laboral, disciplinar ou qualquer outra, sem que o arguido seja previamente ouvido (direito de audição) e possa defender-se das imputações que lhe são feitas (direito de defesa), reagindo contra uma acusação prévia, apresentando meios de prova e requerendo a realização de diligências tendentes a apurar a verdade” .
14. Para o efeito, é essencial que o arguido tenha conhecimento das imputações que lhe são feitas. O que implica, de acordo com o acórdão do Tribunal Constitucional nº 99/2009, “a descrição sequencial, narrativamente orientada e espácio-temporalmente circunstanciada, dos elementos imprescindíveis à singularização do comportamento contraordenacionalmente relevante; e que essa descrição deve contemplar a caracterização, objetiva e subjetiva, da ação ou omissão de cuja imputação se trate” . Trata-se, no essencial, da fórmula adotada pelo Supremo Tribunal de Justiça no acórdão de fixação de jurisprudência nº 1/2003, publicado no Diário da República I série nº 21, de 25.01.2003, e que é a seguinte: deverão ser fornecidos “os elementos necessários para que o interessado fique a conhecer todos os aspetos relevantes para a decisão, nas matérias de facto e de direito (artigo 101º, nº 2)”.
15. Mais esclarece o Tribunal Constitucional que o “artigo 50.º do RGCO … não imp[õe] que a aludida notificação contenha a alusão às provas tidas em conta pela autoridade administrativa e que sustentam a imputação que lhes é dirigida” (acórdão n.º 537/2011).
16. Contudo, admitindo-se que a notificação não tem de fazer referência aos meios de prova que sustentam os factos imputados, é evidente que os mesmos têm de constar no processo, a fim de poderem ser consultados pelo arguido, pois o direito de defesa inclui a possibilidade de os contraditar.
17. A violação do artigo 50º, do RGCO, consubstancia uma nulidade sanável, sujeita ao regime previsto no CPP, ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, tal como foi decidido pelo acórdão de fixação de jurisprudência nº 1/2003.
18. Definidos estes parâmetros legais e incidindo sobre o caso concreto, impõe-se esclarecer, em primeiro lugar, que os factos em causa, que constam nos artigos 4.º e 5.º da matéria de facto provada da decisão impugnada não são factos essenciais, corporizadores dos elementos típicos de qualquer uma das infrações imputadas. Na verdade, são parâmetros de prova que a ANACOM utilizou para concluir pela verificação do dolo no que respeita à contraordenação decorrente da violação do ponto 2.3.2. da Decisão de 09.03.2012, conforme consta nas pp. 40 a 43 da decisão impugnada, fls. 1177 a 1180 dos autos. Nesta medida e aceitando-se a posição sufragada pelo Tribunal Constitucional, supra referida, não tinham de constar na acusação.
19. Dir-se-á, mas tratando-se de elementos probatórios, nos quais a ANACOM sustentou a sua decisão em relação ao elemento subjetivo, impunha-se que constassem no processo. E o que se verifica, a propósito, é que os documentos nos quais constam os parâmetros enunciados nos referidos artigos 5.º e 6.º da decisão impugnada, designadamente a Resposta da, então, ZON à consulta pública e o Relatório da Consulta de março de 2012, foram juntos após a notificação nos termos e para os efeitos do artigo 50.º, do RGCO – cf. fls. 1043 e ss.. Antes deste momento, os documentos, em si mesmos, não estavam incorporados nos autos, sendo certo que a Recorrente procedeu à consulta do processo antes da apresentação da sua defesa escrita – cf. fls. 912. E, quanto ao artigo 192.º da acusação, a remissão para os documentos que constam no endereço indicado não é bastante para esclarecer que o conteúdo de todos os documentos aí alojados será considerado como meio de prova, pois o artigo 192.º delimita a relevância dessa remissão ao aludir ao facto da Recorrente ter participado na consulta pública, pelo que a referência ao conteúdo da página da internet aí indicada está circunscrita a este segmento factual.
20. Esta argumentação não é procedente, por duas razões. Em primeiro lugar, os meios de prova relevantes podem ser juntos após a notificação a que alude o artigo 50.º, do RGCO, desde que o arguido tenha conhecimento disso. E, no caso, as testemunhas arroladas pela Recorrente foram confrontadas com este elemento, sendo certo que a sua inquirição ocorreu na presença do Mandatário da Recorrente, pelo que em circunstâncias que permitiam ter perceção de que se tratava de um elemento de ponderação, nada tendo sido requerido. Em segundo lugar, o Relatório da Consulta, que contém a Resposta da NOS, na parte reproduzida no artigo 4.º da decisão impugnada, faz parte integrante da Decisão de 09.03.2012, em cujo Preâmbulo se exarou o seguinte: a “análise das posições manifestadas pelas diversas entidades no âmbito daquele procedimento de consulta, bem como o entendimento do ICP-ANACOM sobre as mesmas, constam do correspondente relatório final que, como anexo, integra e fundamenta a presente decisão”.
21. Sendo elementos que integram a Decisão, que dá corpo ao complexo normativo que sustenta a infração imputada e publicada pela ANACOM, basta a referência à mesma, na acusação, para se perceber que todo o seu conteúdo pode ser utilizado, valorado e ponderado como parâmetro decisório, nomeadamente ao nível da demonstração do elemento subjetivo, na medida em que incorpora procedimentos de consulta junto dos operadores.
22. Por conseguinte, considera-se que o vício invocado carece de fundamento legal, não existindo qualquer violação do direito de defesa da Recorrente, sendo certo que, caso se entendesse o contrário, tal vício sempre e mostraria sanado, uma vez que a Recorrente, no recurso, se pronunciou sobre o mesmo, tendo exercido o seu direito de defesa (cf. artigo 121.º, n.º 1, alínea c), do CPP, ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, e artigos 88.º a 95.º do recurso).
23. Por fim, improcede a questão de inconstitucionalidade material suscitada, uma vez que a interpretação do artigo 50.º, do RGCO, que conduz à improcedência do vício, foi conciliada com a garantia constitucional prevista no artigo 32.º, n.º 10, da Constituição.
24. Termos em que, se julga improcedente esta questão prévia.
*
25. Segunda questão prévia - nulidade da sentença devido à alteração da qualificação jurídica:
26. Não se concorda com os argumentos apresentados pela Recorrente. Assim, em primeiro lugar, da alteração da qualificação jurídica efetuada não resulta a imputação de mais contraordenações do que aquelas pelas quais foi condenada pela Recorrente.
27. Em segundo lugar, não se trata de estabelecer conexões entre ilícitos diferentes, nem de imputar um acontecimento histórico diferente daquele que individualiza o objeto do processo, pois não há qualquer alteração de factos. Do que se trata é apenas e só de reconduzir os factos imputados a disposições da Deliberação diversas daquelas que foram identificadas pela ANACOM. A identificação de um dever de receção, de um dever de aceitação e um dever de determinar o momento da produção dos efeitos da denúncia é uma decorrência dessa qualificação jurídica e uma pura tarefa de interpretação jurídica dos dispositivos legais aplicáveis.
28. Em terceiro lugar, não há violação da reformatio in pejus, porquanto da alteração não resulta qualquer agravamento das sanções aplicáveis. Também não há violação do artigo 50.º, do RGCO, nem do princípio do acusatório, na medida em que foi concedida à Recorrente a possibilidade de reorientar a sua estratégia de defesa.
29. Em consequência, a alteração efetuada e a interpretação do artigo 358.º, n.º 3, do CPP, ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, interpretada no sentido de permitir a modificação realizada não viola os normativos constitucionais invocados pela Recorrente, não sendo materialmente inconstitucional.
30. Por conseguinte, a sentença ao acolher as alterações comunicadas não enferma de qualquer nulidade.
31. Termos em que, improcede esta questão prévia.
*
32. Não há mais questões prévias, nulidades ou exceções que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
***
Fundamentação de facto
*
33. Factos provados:
34. Da não aceitação de denúncias por telefone:
35. Em diligências realizadas entre 31 de outubro e 16 de novembro de 2012, nas suas lojas de Setúbal, Santarém, Vila Franca de Xira e Torres Vedras, a Arguida informou, através dos seus colaboradores melhor identificados nos autos de diligência de fls. 73 e 74, 88 e 89, 106 e 107, 140 e 141 dos autos, que não aceita pedidos de denúncia contratual por telefone desde agosto 2012.
36. A Arguida decidiu e transmitiu aos seus colaboradores que a partir de agosto de 2012 não são aceites denúncias por telefone, de forma livre.
37. No final do ano de 2012 e início de 2013 (tal como à data), quando contactava telefonicamente com os seus clientes, tendo em vista certificar-se da identidade do seu interlocutor, a Arguida solicitava-lhes que indicassem, simultaneamente, dois dados de identificação (n.º de cartão de identificação, n.º de contribuinte e/ou morada).
38. No mesmo período a Arguida aceitava modificações contratuais realizadas por telefone.
39. Das sms’s enviadas:
40. Em ação de fiscalização efetuada nos dias 4 e 5 de fevereiro de 2013, na sede da ZON, a Arguida informou que, quando recebe um pedido de denúncia acompanhado de documentação incompleta, o procedimento implementado é no sentido de ser enviada, com recurso ao Serviço de Mensagens Curtas (“SMS”), uma mensagem com o seguinte conteúdo: “ZON: informamos que a documentação recebida não está completa pelo que manteremos os seus serviços ZON ativos. Se pretender prosseguir, reenvie o pedido de denúncia acompanhado de cópia dos documentos de identificação (ex. BI). Mais informações 16990. Obrigado”.
41. Concomitantemente ao envio do SMS descrito acima (sem que tenha sido possível apurar precisamente se em momento imediatamente anterior ou posterior à mensagem escrita), a Arguida tinha estipulada a realização de uma chamada telefónica para os clientes que manifestassem a sua intenção de denunciar os respetivos contratos sem que apresentassem a documentação correta/completa, na qual deviam ser prestadas as informações a que alude o ponto 2.4.5 da “DECISÃO”, designadamente que dispunham de um prazo de 30 (trinta) dias para remeter os elementos em falta.
42. Quando a Arguida recebe um pedido de denúncia contratual devidamente instruído tinha estipulado, na data referida, o envio ao cliente um SMS com o seguinte teor: “Na sequência do seu pedido informamos que os seus serviços serão desligados em AAAA-MM-DD respeitando as condições gerais em vigor. Caso o período mínimo contratual esteja a decorrer, a ZON procederá à cobrança das mensalidades dos meses em falta e, se aplicável, dos equipamentos não devolvidos. No caso dos equipamentos solicitamos que aguarde pelo agendamento de recolha ZON. Obrigado pela sua preferência”.
43. Paralelamente ao envio do SMS descrito acima, a Arguida tinha estipulada a realização de uma chamada telefónica para os clientes que apresentem os pedidos de denúncia contratual corretamente instruídos, destinada a prestar-lhes informação concreta sobre obrigações decorrentes da cessação do contrato, nomeadamente relacionadas com períodos contratuais mínimos e com entrega de equipamentos.
44. O conteúdo do SMS referido acima não contemplava informação relativa a valores devidos em virtude de incumprimento de períodos contratuais mínimos, porque este cálculo, por limitações no sistema informático da Arguida, apenas era realizado pela Arguida no momento do fecho de contas com o cliente
45. O texto das duas mensagens descritas anteriormente foi concebido pela Direção de Melhoria Contínua da Arguida para ser enviado aos clientes, respetivamente, nos casos de pedidos de denúncias contratuais incorretamente instruídos e devidamente instruídos.
46. Os factos precedentes consistentes na previsão da realização das mencionadas chamadas telefónicas paralelamente ao envio dos SMS, bem como a informação concretamente prestada através de cada de um dos dois meios de comunicação (quer no caso de pedidos corretamente instruídos, quer no caso de haver documentação em falta), foi pensado, delineado e querido pela Arguida (especificamente, pela sua Direção de Melhoria Contínua).
47. Do envio de denúncias para P...:
48. Pelo menos até 03.06.2013 a Arguida divulgou aos seus clientes, através das Condições Gerais disponíveis no seu sítio da Internet, o Apartado de P... como morada para receção de quaisquer comunicações escritas.
49. Ainda no seu sítio da Internet, na área de “suporte” na parte correspondente à “faturação” existia, até 03.06.2013, um conjunto de “frequently asked questions” em que constava a pergunta “quero rescindir o contrato com a ZON. O que devo fazer?” cuja resposta remetia para uma hiperligação com todos os procedimentos e informações necessários para o cliente terminar o contrato com a ZON e da qual não constava diretamente a morada da Arguida para envio de correspondência, apenas indicando que o cliente deveria enviar o formulário de denúncia ou um documento alternativo “para a morada atualizada da ZON, indicada no verso do formulário de denúncia”.
50. No verso do mencionado formulário de denúncia constava que este “pode ser remetido por correio registado com aviso de receção para “ZON TV CABO Portugal, S.A.”, Apartado 5..., EC C..., 1…-… Lisboa”.
51. O Apartado do C... foi criado pela Arguida com a intenção de aí reunir todos os pedidos de denúncia contratual, visando o cumprimento dos prazos estabelecidos pela DECISÃO.
52. Da análise dos documentos recolhidos na ação de fiscalização que teve lugar na sede da Arguida, em 19 de junho de 2013, constatou-se que a Arguida não aceitou as denúncias remetidas para a morada Apartado ..., EC P..., 2...-9.. P... referentes aos contratos celebrados entre a ZON, pelos seguintes clientes:
52.1. CJ..., cliente ZON n.º C8... e NIF 103..., cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013.
52.2. MC..., cliente ZON n.º C82... e NIF 259..., cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 08.06.2013.
52.3. FG..., cliente ZON n.º C827... e NIF 190..., cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 31.05.2013.
52.4. PN..., cliente ZON n.º C82878 e NIF 208..., cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 11.04.2013 e que veio a ser desligado em data não concretamente apurada, mas não posterior a 31.05.2013;
52.5. JP..., cliente ZON n.º C826... e NIF 211..., cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 11.04.2013 e cujo desligamento, tendo em conta a data do término da faturação, foi em 31.05.2013.
52.6. MD..., cliente ZON n.º C43... e NIF 190..., cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013;
52.7. GC..., cliente ZON n.º C677… e NIF 1948..., cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 08.04.2013 e cujo desligamento foi efetuado em 31.05.2013;
52.8. MM..., cliente ZON n.º C23… e NIF 1238…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento foi efetuado em 31.05.2013;
52.9. VG..., cliente ZON n.º C230… e NIF 2072…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento foi efetuado em 31.05.2013;
52.10. TN..., cliente ZON n.º C82… e NIF 214…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento, para efeitos de terminus da faturação, ocorreu em 31.05.2013;
52.11. CL..., cliente ZON n.º C71… e NIF 1232…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento, para efeitos de terminus da faturação, ocorreu em 31.05.2013;
52.12. AA..., cliente ZON n.º C82845… e NIF 22…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento, para efeitos de terminus da faturação, ocorreu em 31.05.2013;
52.13. AR..., cliente ZON n.º C829… e NIF 226… cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 13.04.2013 e cujo desligamento, para efeitos de terminus da faturação, ocorreu em 31.05.2013;
52.14. TF..., cliente ZON n.º C164… e NIF 1868…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 15.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 06.05.2013;
52.15. MA..., cliente ZON n.º C443… e NIF 130…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 31.05.2013;
52.16. AT..., cliente ZON n.º C825… e NIF 2267…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 11.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 31.05.2013;
52.17. JM..., cliente ZON n.º C4265… e NIF 1350…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 08.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 31.05.2013;
52.18. JG..., cliente ZON n.º C22877… e NIF 145…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 10.06.2013;
52.19. SR..., cliente ZON n.º C82748… e NIF 2174… cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 09.06.2013;
52.20. PR..., cliente ZON n.º C451… e NIF 2142…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 31.05.2013;
52.21. RCR..., cliente ZON n.º C2581… e NIF 116… cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 31.05.2013;
52.22. MGL..., cliente ZON n.º C4306.... e NIF 1442…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 31.05.2013 e em 30.06.2013 (serviços em duas moradas);
52.23. LAM..., cliente ZON n.º C7108… e NIF 1826… cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 18.05.2013;
52.24. SBG..., cliente ZON n.º C8280… e NIF 2138…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 31.05.2013;
52.25. JDA..., cliente ZON n.º C2353… e NIF 1806…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 31.05.2013;
52.26. MEM..., cliente ZON n.º C8274… e NIF 1415…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 15.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 12.05.2013;
52.27. JXT..., cliente ZON n.º C8269… e NIF 172… – cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 08.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 30.06.2013;
52.28. FBP..., cliente ZON n.º C2408… e NIF 158…, cujo pedido de denúncia foi recebido no Apartado de P... em 12.04.2013 e cujo desligamento ocorreu em 31.05.2013.
53. Os factos descritos sucederam não obstante o referido Apartado lhe pertencer, sendo-lhe entregue toda a correspondência aí depositada.
54. Nos 28 (vinte e oito) casos acima elencados, a Arguida informou os respetivos clientes que as denúncias deveriam ser remetidas para a morada Apartado ... EC C... 1... 5.. L....
55. A Arguida não iniciou os 28 (vinte e oito) procedimentos de denúncia que lhe foram comunicados para a morada Apartado ..., EC P..., 2...-9.. P..., apenas procedendo ao seu tratamento depois e nos casos em que os clientes entregarem novamente os pedidos de denúncia na morada Apartado ... EC C... 1... 5.. L... ou em loja.
56. Toda a correspondência dirigida à ZON para a morada Apartado ..., EC P..., 2...-9.. P... é transportada para a estação de correios de P... pelos CTT, sendo aí levantada por um estafeta ao serviço da Arguida.
57. Os avisos de receção, depois de devidamente preenchidos pela Arguida, são devolvidos pelo referido estafeta na estação de correios de P..., que procede ao seu encaminhamento.
58. A correspondência registada dirigida à Arguida para a morada Apartado ..., EC P..., 2...-9.. P... não é devolvida.
59. De acordo com a cláusula 10.3 das Condições Gerais do serviço, à data dos factos, se o assinante apresentasse uma denúncia nos 15 (quinze) dias anteriores ao termo do período inicial do contrato ou de qualquer das suas renovações, o desligamento era efetuado até ao final do mês em curso. Caso o pedido não fosse recebido com a referida antecedência, o desligamento seria efetuado até ao final do mês seguinte.
60. Se considerarmos o período de faturação coincidente com o mês – que era a regra –, os pedidos de denúncia recebidos antes de dia 15 (meio do mês) produziriam os seus efeitos ao final desse mês. Os recebidos após esse dia 15 seriam processados até ao final do mês seguinte (com faturação até então).
61. Em relação a vinte e dois dos vinte e oito clientes supra indicados, a Recorrente fez produzir os efeitos das denúncias remetidas para o Apartado de P... à data em que as mesmas foram ali recebidas.
62. A Arguida, ao decidir criar o apartado do C..., não pretendeu que denúncias recebidas noutros endereços fossem rejeitadas. Contudo, não evitou, o que era capaz, uma deficiente implementação desse procedimento, tendo sido esta a razão pela qual sucederam os factos descritos.
63. Dos documentos ilegíveis:
64. Da denúncia de PS...:
65. PS..., cliente da ZON n.º C251..., contribuinte fiscal n.º 200..., mediante documento datado de 25.07.2012 solicitou à Arguida a cessação do contrato em vigor.
66. A Arguida recebeu o documento de denúncia contratual no dia 19.09.2012, acompanhado de um documento de identificação ilegível.
67. A Arguida considerou o documento ilegível.
68. A Arguida não procedeu ao desligamento do serviço.
69. A Arguida veio a proceder ao desligamento do serviço em 31.10.2012 após reclamação do cliente em loja no dia 08.10.2012.
70. PS... não foi prejudicado pela Arguida no que respeita à data de desligamento do serviço, na medida em que este também ocorreria no dia 31.10.2012 caso a ZON tivesse aceitado a sua denúncia contratual no dia 19.09.2012.
71. Da denúncia de CM...:
72. CM..., cliente da ZON n.º C4123..., contribuinte fiscal n.º 10261..., mediante documento datado de 05.12.2012 solicitou à Arguida a cessação do contrato em vigor.
73. A Arguida recebeu o documento de denúncia contratual no dia 21.12.2012, acompanhado de um documento de identificação não legível.
74. A Arguida considerou o documento ilegível.
75. No dia 24.12.2012 a Arguida recebeu novamente a denúncia contratual (também datada de 05.12.2012), acompanhada de um documento de identificação não legível.
76. A Arguida considerou o documento ilegível.
77. A Arguida não procedeu ao desligamento do serviço e em 04.02.2013 o contrato de CM... ainda se encontrava ativo.
78. Da denúncia de ACT...:
79. ACT..., cliente da ZON n.º C8296…, contribuinte fiscal n.º 1261…, mediante documento datado de 08.10.2012, solicitou à Arguida a cessação do contrato em vigor.
80. A Arguida recebeu o documento de denúncia contratual no dia 12.10.2012.
81. O documento de denúncia contratual recebido pela Arguida era legível, tendo ocorrido um erro na digitalização do mesmo que o tornou ilegível.
82. Em função de ilegibilidade do documento de denúncia, a Arguida não a aceitou e manteve o serviço ativo (ao invés de o desligar em 31.10.2012).
83. O serviço prestado pela Arguida a ACT... veio a ser desligado no dia 31.12.2012 na sequência do reenvio, em 17.12.2012, da mesma denúncia inicialmente considerada ilegível.
84. Da denúncia de MAM...:
85. MAM..., cliente da ZON n.º C825…, contribuinte fiscal n.º 133…, mediante documento datado de 25.09.2012 solicitou à Arguida a cessação do contrato em vigor.
86. A Arguida recebeu o documento de denúncia contratual no dia 12.10.2012.
87. O documento de denúncia contratual recebido pela Arguida era legível, tendo ocorrido um erro na digitalização do mesmo que o tornou ilegível.
88. Circunstância que determinou que a Arguida não aceitasse a denúncia contratual e mantivesse o serviço ativo (ao invés de o desligar em 31.10.2012).
89. O serviço prestado pela Arguida a MAM... veio a ser desligado no dia 31.12.2012 na sequência do reenvio, em 15.11.2012 e 17.12.2012, da mesma denúncia inicialmente considerada ilegível.
90. Da denúncia de APM...:
91. APM..., cliente da ZON n.º C237…, contribuinte fiscal n.º 1569…, mediante documento datado de 07.09.2012 solicitou à Arguida a cessação do contrato em vigor.
92. A Arguida recebeu o documento de denúncia contratual no dia 12.10.2012, com um documento de identificação não legível.
93. Circunstância que determinou que a Arguida não aceitasse a denúncia contratual e mantivesse o serviço ativo (ao invés de o desligar em 31.10.2012).
94. O serviço prestado pela Arguida a APM... veio a ser desligado no dia 31.01.2013.
95. Da denúncia de PMG...:
96. PMG..., cliente da ZON n.º C511…, contribuinte fiscal n.º 15…, mediante documento datado de 17.09.2012 solicitou à Arguida a cessação do contrato em vigor.
97. A Arguida recebeu o documento de denúncia contratual no dia 19.09.2012, acompanhado de um documento ilegível.
98. A Arguida não aceitou a denúncia contratual, por considerar o documento ilegível, e mantive o serviço ativo (ao invés de o desligar em 30.10.2012).
99. O serviço prestado pela Arguida a PMG... veio a ser desligado no dia 27.12.2012.
100. Da denúncia apresentada por JFR...:
101. JFR..., cliente da ZON n.º C33..., contribuinte fiscal n.º 160..., mediante documento datado de 11.10.2012 solicitou à Arguida a cessação do contrato em vigor.
102. A Arguida recebeu o documento de denúncia contratual no dia 22.10.2012.
103. O documento de denúncia contratual recebido pela Arguida nessa data era ilegível, pelo que a Arguida informou JFR... que deveria remeter novamente o documento de denúncia legível, acompanhado de documento de identificação.
104. Em 29.10.2012 a Arguida recebeu novamente o documento de denúncia contratual de JFR..., que não era legível.
105. Circunstância que determinou que a Arguida não aceitasse imediatamente a denúncia contratual e mantivesse o serviço ativo.
106. O serviço prestado pela Arguida a JFR... veio a ser desligado no dia 30.11.2012.
107. JFR... não foi prejudicado pela Arguida no que respeita à data de desligamento do serviço, na medida em que este também ocorreria no dia 30.11.2012 caso a ZON tivesse aceite a sua denúncia contratual no dia 29.10.2012.
108. Da denúncia de ARG...:
109. ARG..., cliente da ZON n.º C4383..., contribuinte fiscal n.º 1088..., mediante documento datado de 15.11.2012 solicitou à Arguida a cessação do contrato em vigor.
110. A Arguida recebeu o documento de denúncia contratual no dia 16.11.2012, acompanhado de um documento de identificação não legível.
111. Circunstância que determinou que a Arguida não aceitasse a denúncia contratual e mantivesse o serviço ativo (ao invés de o desligar em 31.12.2012).
112. Em 11.12.2012 a Arguida recebeu novamente o documento de denúncia contratual de ARG..., acompanhado de um documento de identificação que não era legível.
113. A Arguida não aceitou a denúncia contratual e manteve o serviço ativo (ao invés de o desligar em 31.12.2012).
114. O serviço prestado pela Arguida a ARG... veio a ser desligado no dia 31.01.2013.
115. Caso a Arguida tivesse aceite o pedido de denúncia contratual no dia em que o recebeu (16.11.2012), o serviço de ARG... teria sido desligado no dia 31.12.2012.
116. A Arguida procedeu ao acerto da quantia cobrada pela prestação do serviço em data posterior à denúncia formulada por ARG....
117. Da denúncia de PTL...:
118. PTL..., cliente da ZON n.º C6618..., contribuinte fiscal n.º 1876..., mediante documento datado de 21.09.2012 solicitou à Arguida a cessação do contrato em vigor.
119. A Arguida recebeu o documento de denúncia contratual no dia 12.10.2012, acompanhado de um documento de identificação não legível.
120. Circunstância que determinou que a Arguida não aceitasse a denúncia contratual e mantivesse o serviço ativo (ao invés de o desligar em 31.10.2012).
121. O serviço prestado pela Arguida a PTL... veio a ser desligado no dia 31.12.2012.
122. Da denúncia de CAB...:
123. CAB..., cliente da ZON n.º C8286..., contribuinte fiscal n.º 191..., mediante documento datado de 09.10.2012 solicitou à Arguida a cessação do contrato em vigor.
124. A Arguida recebeu o documento de denúncia contratual no dia 29.10.2012.
125. O documento de denúncia contratual recebido pela Arguida era legível, tendo ocorrido um erro na digitalização do mesmo que o tornou ilegível.
126. Circunstância que determinou que a Arguida não aceitasse a denúncia contratual e mantivesse o serviço ativo (ao invés de o desligar em 30.11.2012).
127. O serviço prestado pela Arguida a CAB... veio a ser desligado no dia 31.12.2012.
128. Da denúncia de LCS...:
129. LCS..., cliente da ZON n.º C263..., contribuinte fiscal n.º 212..., mediante documento datado de 10.09.2012 solicitou à Arguida a cessação do contrato em vigor.
130. A Arguida recebeu o documento de denúncia contratual no dia 04.10.2012.
131. O documento de denúncia contratual recebido pela Arguida era legível, tendo ocorrido um erro na digitalização do mesmo que o tornou ilegível.
132. Circunstância que determinou que a Arguida não aceitasse a denúncia contratual e mantivesse o serviço ativo.
133. O serviço prestado pela Arguida a LCS... veio a ser desligado em data não concretamente apurada.
134. Da denúncia de NMC...:
135. NMC..., cliente da ZON n.º C2527..., contribuinte fiscal n.º 213..., mediante documento datado de 23.10.2012 solicitou à Arguida a cessação do contrato em vigor.
136. A Arguida recebeu o documento de denúncia contratual no dia 15.11.2012.
137. O documento de denúncia contratual recebido pela Arguida era legível, tendo ocorrido um erro na digitalização do mesmo que o tornou ilegível,
138. Circunstância que determinou que a Arguida não aceitasse imediatamente a denúncia contratual e mantivesse o serviço ativo.
139. O serviço prestado pela Arguida ao cliente veio a ser desligado no dia 30.11.2012.
140. O cliente não foi prejudicado pela Arguida no que respeita à data de desligamento do serviço, na medida em que este também ocorreria no dia 30.11.2012 caso a ZON tivesse aceite a sua denúncia contratual no dia 15.11.2012.
141. Da denúncia de JPG...:
142. JPG..., cliente da Arguida n.º C8281..., contribuinte n.º 1530..., cartão do cidadão n.º 093..., residente na Rua B..., n.º ..., T..., 2...- 0.. B..., através de fax enviado às 19:49 do dia 17.09.2012, a partir do n.º 262182605, solicitou à Arguida “a desativação do vosso serviço ZON TV com maior brevidade possível, pois já não [estava] interessado em continuar com os vossos serviços”.
143. Conforme relatório de transmissão do fax do reclamante, o mesmo teve resultado ‘ok’.
144. Em anexo a este fax de 17.09.2012, JPG... remeteu cópia legível da fatura relativa ao mês de setembro, emitida pela Arguida em 03.08.2012, bem como cópia não legível de frente e verso do seu cartão do cidadão.
145. Passados alguns dias, JPG... foi contactado telefonicamente por um funcionário da Arguida, o qual o questionou da razão do pedido de cessação da prestação dos serviços, tendo o cliente, nessa chamada, confirmado a sua intenção de cancelamento.
146. Em outubro de 2012, a Arguida não tinha ainda cancelado os serviços prestados a JPG..., tendo emitido a fatura relativa àquele mês.
147. Através de faxes enviados às 20:21 do dia 15.10.2012, e às 16:25 do dia 23.10.2012, JPG... veio reclamar junto da Arguida a falta de cancelamento dos seus serviços, agradecendo “a rápida resolução do problema acima apresentado”.
148. Da denúncia de MCN...:
149. MCN..., cliente da Arguida n.º C8242..., contribuinte n.º 1764..., cartão do cidadão n.º 64..., residente na Rua A..., Lote .., ...º D, Urbanização Vale C..., 8...-5.. F..., através de denúncia escrita datada de 07.09.2012, enviada à Arguida em 13.09.2012 e recebida por esta em 17.09.2012, veio “solicitar a cessação do contrato atualmente em vigor com a V/empresa”.
150. Em anexo àquela denúncia MCN... remeteu cópia legível de frente e verso do seu cartão do cidadão.
151. Em 22.09.2012, MCN... deslocou-se pessoalmente ao balcão da Arguida sito no Fórum Algarve com o intuito de confirmar o cancelamento e devolver os equipamentos da Arguida, tendo o funcionário aí presente confirmado que o processo de cancelamento estava tratado e finalizado e que os equipamentos seriam recolhidos na casa de MCN....
152. Em outubro de 2012, a Arguida emitiu, em 21.10.2012, a fatura relativa àquele mês.
153. Em 12.11.2012, por carta enviada para a Arguida, MCN... apresentou reclamação sobre o ocorrido.
154. Da denúncia de MCB...:
155. MCB..., era cliente da Recorrente com o n.º C1434..., contribuinte n.º 138..., bilhete de identidade n.º 220..., residente na Rua T..., .., 1...-3... L....
156. Em dezembro de 2012, os serviços prestados a MCB... pela Arguida continuavam ativos.
157. Tendo sido emitido a fatura relativa àquele mês.
158. Por carta dirigida à Anacom e datada de 23.04.2013, MCB... informou que a Arguida creditou a faturação que tinha feito relativa aos meses de dezembro de 2012 e janeiro de 2013, juntando documento por ela assinado no qual declara ter recebido nota de crédito no montante de 161,80 euros (cento e sessenta e um euros e oitenta cêntimos).
159. Da denúncia de AFA...:
160. AFA..., contribuinte n.º 1056..., cartão do cidadão n.º 36..., residente no Largo do Chafariz, ..., M..., 2...-... V..., T... V..., através de denúncia escrita, enviada à Arguida em 27.12.2012, veio “resolver livremente o contrato”.
161. Em anexo àquela denúncia, AFA... remeteu cópia legível de frente e verso do seu cartão do cidadão.
162. Em 31.12.2012, pelas 16h27, AFA... recebeu um SMS, no n.º 916..., com o seguinte teor: “ZON: Na sequência do contacto e conforme acordado informamos que o seu processo de desligamento encontra-se pendente da sua avaliação, a proposta que lhe apresentamos. Contactaremos após resolução, para que nos indique a sua decisão final. Caso pretenda manter a sua intenção inicial, deverá reenviar-nos por favor o pedido completo (pedido de desligamento + copia de BI), uma vez que existe documentação em falta”.
163. Do procedimento interno de gestão documental adotado pela Arguida:
164. À data dos factos (bem como na data da inquirição das testemunhas), todos os documentos que dão entrada na Arguida são digitalizados.
165. Para o efeito a Arguida celebrou um contrato de prestação de serviços com a sociedade XP... – E..., Lda. (“XP... – E..., Lda.”).
166. A digitalização é realizada manualmente, sendo os originais dos documentos arquivados por outra sociedade contratada pela Arguida para o efeito.
167. No momento da digitalização o original era confrontado com a versão digital, repetindo-se a digitalização caso se detetasse um problema na visualização do documento dela decorrente.
168. A Arguida cataloga os documentos como ilegíveis quando há problemas de qualidade/perceção ao visualizá-lo, mas também quando entende existir problemas quanto à sua validade (por exemplo, questões relacionadas com a assinatura constante de um documento).
169. Os colaboradores da Arguida que analisam os pedidos de denúncia contratual não têm acesso aos documentos físicos, acedendo à sua versão digital, em sistema.
170. Os colaboradores da gestão documental, ao digitalizarem os documentos, dão indicação em sistema se o documento era inicialmente ilegível (em termos de qualidade e de validade),
171. Tendo os colaboradores de back office acesso a essa informação.
172. Deparando-se com a ilegibilidade de um documento digital, os colaboradores de back office podem questionar os colaboradores da gestão documental para que estes verifiquem o documento original.
173. Existem casos em que o documento original é legível mas por vicissitudes no processo de digitalização deixa de o ser (como por exemplo, em função da qualidade do papel do documento original).
174. À data dos factos o trabalho da XP... – E..., Lda. era auditado semanalmente, com recurso a amostras, tendo os resultados obtidos sido positivos.
175. À data da inquirição das testemunhas, a Arguida ainda mantinha o contrato de prestação de serviços celebrado com a XP... – E..., Lda..
176. A Arguida sabia existirem falhas no processo de digitalização.
177. Verificando ilegibilidades nos documentos digitais (quer pela sua qualidade, quer pela sua validade) que instruíam os pedidos de denúncia de CG..., AT..., MAM..., de LS... e de ..., a Arguida, na pessoa dos seus colaboradores de back office, decidiu, de forma consciente, solicitar aos seus clientes que reenviassem esses mesmos documentos, colocando a possibilidade dos documentos originais remetidos pelos clientes e arquivados serem legíveis e conformando-se com essa possibilidade, tendo consciência da ilicitude da sua conduta.
178. Do procedimento relativo ao período de fidelização:
179. O sistema da Arguida calcula automaticamente o período de fidelização a partir da data de ativação dos serviços, com base na informação sobre períodos contratuais mínimos para cada pacote de serviços oferecido ao público pela Arguida.
180. Nos anos de 2011 e 2012 os formulários de adesão das vendas porta a porta eram preenchidos manualmente, podendo haver desconformidade entre a indicação dada ao cliente acerca do período contratual mínimo e aquela gerada pelo sistema da Arguida.
181. É política da Arguida creditar valores indevidamente faturados decorrentes de putativos períodos de fidelização aos clientes que reclamem.
182. Caso os clientes indevidamente faturados não reclamem e não paguem o valor relativo ao putativo período de fidelização indevidamente faturado pela Arguida o processo avança até à fase contenciosa.
183. Da reclamação apresentada junto da ANACOM por TCA...:
184. Em 10.05.2012 TCA..., cliente da ZON n.º C82..., contribuinte fiscal n.º 2328..., alterou os serviços subscritos com a Arguida e por esta prestados.
185. No final de 2012 TCA... denunciou o contrato celebrado com a Arguida,
186. Tendo sido informado pela ZON que se encontrava vinculado a um período de fidelização a correr desde a alteração contratual de 10.05.2012.
187. Formalizada a denúncia contratual, a Arguida endereçou uma carta a TCA... para cobrança do período de fidelização remanescente no valor de 67,73 euros (sessenta e sete euros e setenta e três cêntimos).
188. Aquando da alteração contratual TCA... não foi informado de que o contrato tinha associado um período contratual mínimo.
189. Inconformado com a situação, TCA... reclamou no livro de reclamações da Arguida em 29.11.2012.
190. Tendo tomado conhecimento da reclamação, a Arguida verificou não existir contrato de adesão para a alteração contratual e, consequentemente, um período contratual mínimo,
191. Pelo que anulou a cobrança dos 67,73 euros (sessenta e sete euros e setenta e três cêntimos).
192. Da reclamação apresentada junto da ANACOM por AF...:
193. Em 15.11.2011 AF..., cliente da ZON n.º C83012..., contribuinte fiscal n.º 218..., celebrou um contrato para prestação de serviços de comunicações eletrónicas com a Arguida.
194. Aquando da celebração do referido contrato, AF... foi informado de que se encontrava vinculado a um período de fidelização de 12 (doze) meses.
195. Em 09.11.2012 AF... denunciou o contrato celebrado com a Arguida,
196. Tendo sido informado de que se encontrava vinculado a um período de fidelização de 24 (vinte e quatro) meses.
197. Mediante carta datada de 22.1.2012 a Arguida informou AF... que iria proceder à cobrança de 114,29 euros (cento e catorze euros e vinte e nove cêntimos) por violação do período de fidelização.
198. Inconformado com a situação, AF... apresentou reclamação por email junto da Arguida e da ANACOM.
199. A faturação por violação do período de fidelização do cliente AF... foi anulada pela Recorrente.
200. A Arguida não agiu de modo a assegurar que, em todos os casos, a informação concretamente prestada aos clientes acerca do período contratual mínimo coincidia com aquela constante do seu sistema, gerada automaticamente.
201. Outros factos relevantes:
202. A Arguida é uma empresa de grande dimensão, resultante da fusão, em 16.05.2014, de duas empresas que, à data da fusão, ofereciam serviços de comunicações eletrónicas há mais de 10 anos (com licenças de Operador de Redes Públicas de Telecomunicações atribuídas em 05.11.1998 e em 18.11.1999 pela ANACOM).
203. A DECISÃO, aprovada pelo Conselho de Administração da ANACOM em 09.03.2012 – foi notificada à Recorrente através do Ofício-Circular n.º ANACOM S019663/2012  e está disponível no endereço da Internet http://www.ANACOM.pt/render.jsp?contentId=1120684.
204. A Arguida participou na consulta pública que foi promovida pela ANACOM sobre o projeto de decisão (cfr. http://www.ANACOM.pt/render.jsp?
contentId=1102146), tendo interiorizado perfeitamente os termos de cada uma das obrigações a que estava sujeita.
205. A ANACOM concedeu um prazo de 120 dias a contar da data da notificação da DECISÃO para que a Arguida e os demais destinatários procedessem à sua implementação.
206.     Ao não aceitar os pedidos de denúncia contratual recebidos nas outras moradas por si publicitadas como meio de comunicação com o cliente que não a Apartado ... EC C... 1... 5.. L... e ao considerar incorretamente a ilegibilidade de documentos que instruem as denúncias contratuais, a Arguida beneficiou economicamente por ter faturado aos seus clientes (a seis casos de denúncias remetidas para P..., cujos efeitos não foram retroagidos e aos casos de documentos erradamente considerados ilegíveis em relação aos clientes AT..., MAM..., CB..., LS... e ...) serviços por mais tempo do que o por eles pretendido e que seria devido caso a ZON aceitasse a primeira denúncia, como era sua obrigação.
207. De acordo com os dados constantes do seu Relatório e Contas relativo ao ano de 2012, a ZON TV CABO PORTUGAL, S.A., pessoa coletiva n.º 503..., apresentava, à altura, um resultado líquido positivo no montante de 30 781 923,00 euros, um volume de negócios de 653 115 693,00 euros e um balanço total de  1 295 915 258,00 euros, tendo empregado um número médio de 674 trabalhadores.
208. No ano de 2016, a Recorrente obteve um volume de negócios de € 29.540.880,75 e um lucro tributável de € 37.161.867,10.
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209. Factos não provados:
210. Quando contactou o call-center da Recorrente, a cliente MCN... foi informada por um funcionário da Arguida que um dos documentos enviados não estava legível e que foi tentado um contacto telefónico com a cliente.
211. MCB... através de denúncia escrita, enviada à Arguida em 10.11.2012 e recebida por esta em 14.11.2012, veio “solicitar a cessação do contrato atualmente em vigor com a V/empresa”.
212. Em anexo àquela denúncia, MCB... remeteu cópia legível de frente e verso do seu bilhete de identidade, bem como do seu cartão de contribuinte e de parte da fatura daquele serviço.
213. Passados alguns dias, MCB... foi contactada telefonicamente por um funcionário da Arguida, o qual a questionou da razão do pedido de cessação da prestação dos serviços, tendo ainda informado oralmente que a denúncia não estava completa, pelo que os serviços da Arguida poderiam continuar a ser mantidos.
214. Não corresponde à verdade que o pedido de denúncia enviado por MCB... à Arguida não estivesse completo.
215. Em 02.01.2013, MCB... recebeu um telefonema de um colaborador do Departamento de Fidelização da Arguida, A..., que acabou por informar a cliente que a cessação do contrato iria ser feita apenas no final de janeiro de 2013.
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216. Tudo o mais que consta nos factos provados e não provados é matéria de direito, de natureza conclusiva ou irrelevante.
217. Cumpre efetuar uma referência especial aos factos relativos ao benefício económico, exarados nos artigos 200.º, 201.º, 202.º, 204.º e 205.º da matéria de facto provada que consta na decisão impugnada. Nestes pontos, a ANACOM conclui pela possibilidade de obtenção de benefício económico. Sucede que a formulação fática do benefício económico como uma hipótese é irrelevante, pois ou há uma demonstração segura da existência de benefício económico ou, não havendo, a mera possibilidade equivale à não demonstração da obtenção de benefício económico. Por conseguinte, nesta parte assiste razão à Recorrente (cf. artigos 253.º a 275.º dos recurso), tendo sido desconsideradas estas asserções hipotéticas.
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218. Motivação:
219. Para apuramento dos factos provados e não provados foram tidos em consideração os meios de prova produzidos na fase de impugnação judicial e também os elementos recolhidos na fase organicamente administrativa, salientando-se que no “processo contraordenacional não vigora o princípio da imediação, na sua versão rígida”, pelo que “a prova produzida na fase administrativa mantém a sua validade na fase judicial” . Pelas mesmas razões, ou seja, “por força da versão flexível do princípio da imediação consagrada no artigo 68º, nº 1, do RGCO” , a “confissão nos articulados pode ser valorada pela autoridade administrativa ou pelo juiz” , podendo também o Tribunal valorar as declarações prestadas pelo arguido e bem assim os depoimentos prestados pelas testemunhas na fase organicamente administrativa .
220. Na admissão e valoração destes meios de prova foram levadas em conta, quando necessário, as normas legais relativas à admissibilidade dos meios de prova no processo de contraordenação (cf. art. 42º, do RGCO) e no processo penal, aplicáveis subsidiariamente e com as devidas adaptações (cf. art. 41º/1, do RGCO), bem como o princípio geral da livre apreciação da prova (cf. art. 127º, do CPP, ex vi art. 41º/1, do RGCO).
221. Três notas complementares se impõem antes de se enunciar, em pormenor, os fundamentos da convicção do Tribunal.
222. Em primeiro lugar, a não referência, na motivação, a qualquer meio de prova produzido e admitido significa que o mesmo não foi considerado relevante, designadamente por não fornecer qualquer contributo para o apuramento dos factos
223. Em segundo lugar, para evitar constantes repetições, esclarece-se também que sempre que seja efetuada referência a um meio de prova para sustentar a convicção relativamente a um facto, sem específica alusão às razões pelas quais o mesmo mereceu credibilidade, significa que tal meio de prova foi considerado credível no que respeita à demonstração do facto em causa, designadamente por ter aptidão para o efeito, não apresentar qualquer sinal de inveracidade ou manipulação, não se mostrar incompatível com padrões de normalidade e razoabilidade e não ter sido contrariado, de todo ou de forma minimamente consistente, por qualquer outro meio de prova.
224. Em terceiro lugar, com exceção dos concretos pontos impugnados pela Recorrente e de natureza mais controvertida, que mereceram uma análise mais detalhada, não há razões, em termos gerais, para duvidar da exatidão e suficiência dos meios de prova indicados pela ANACOM e do juízo probatório formulado em relação aos pontos não controvertidos.
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225. Da não aceitação de denúncias por telefone:
226. Não há qualquer dúvida face ao teor dos autos de diligência indicados nos factos provados, à defesa escrita apresentada pela Recorrente (cf. artigo 76.º) e ao depoimento, entre o mais, da testemunha AE... (colaborador da NOS, à data dos factos, do departamento de Regulação e Concorrência), ouvida quer na fase administrativa, quer na fase de julgamento, que a Arguida decidiu e transmitiu aos seus colaboradores que não são aceites denúncias por telefone.
227. Mais do que isto, designadamente que a Recorrente recebeu e não aceitou denúncias por telefone, não se retira, desde logo, da imputação fática que consta na decisão impugnada.
228. Assim, sobre este tema, a ANACOM imputa o seguinte, nos factos provados,: “Em diligências realizadas entre 31 de outubro e 16 de novembro de 2012, nas suas lojas de Setúbal, Santarém, Vila Franca de Xira e Torres Vedras, a Arguida informou, através dos seus colaboradores melhor identificados nos autos de diligência de fls. 73 e 74, 88 e 89, 106 e 107, 140 e 141 dos autos, que não aceita pedidos de denúncia contratual por telefone” (artigo 6.º da decisão impugnada, fls. 1144 dos autos); “A Arguida não aceita pedidos de denúncia contratual por telefone desde agosto 2012” (artigo 7.º da decisão impugnada, fls. 1144 dos autos); “No que respeita à não aceitação dos pedidos de denúncia contratual e aos SMS-tipo que enviava aos seus clientes (quer em caso de receção de denúncia contratual incompleta, quer quando as recebe devidamente instruídas), a Arguida, não obstante conhecer as obrigações que sobre si impendem nos termos da DECISÃO, optou, de forma livre e consciente, por adotar um procedimento contrário àquele documento (sendo que as formas de receção de pedidos de denúncia e as mensagens-tipo de resposta enviadas aos clientes foram pensadas e construídas pela Arguida com tempo e por forma a abrangerem o maior número de casos possível), tendo-se conformado com o resultado da sua escolha” (artigos 193.º e 194.º ambos da decisão, fls. 1166 dos autos); “Ao não aceitar denúncias contratuais por via telefónica a Arguida poderá ter beneficiado economicamente, na medida em que alguns dos seus clientes podem ter deixado de denunciar os seus contratos por ser necessário fazê-lo por correio ou em loja” (artigo 200.º da decisão, fls. 1167 dos autos).
229. Mesmo que fosse aceitável uma imputação genérica, sem identificação de denúncias concretas (que não é, conforme se explicitará melhor infra a propósito das sms´s enviadas), a verdade é que das fórmulas descritas não se retira que a Recorrente não tenha aceitado denúncias por telefone. Com efeito, afirmar-se que a Arguida admite que não aceita denúncias por telefone e que a NOS não aceita este tipo de denúncias e que adotou estes procedimento de forma livre e consciente, não é o mesmo que afirmar-se que a Arguida recebeu denúncias por telefone e que não as aceitou. Também asseverar-se que a Arguida poderá ter beneficiado economicamente porque os seus clientes poderão ter desistido de denunciar o contrato, ao serem formulações hipotéticas e que, nessa medida, nem sequer devem constar nos factos provados (conforme já referido), não pressupõe necessariamente que a Recorrente recebeu denúncias por telefone e que não as aceitou.
230. E não se diga, conforme sugere a ANACOM, na p. 38 da decisão, fls. 1175 dos autos, que os pedidos de esclarecimentos efetuados pelos seus Técnicos nas lojas de Setúbal, Santarém, Vila Franca de Xira e Torres Vedras equivalem a pedidos denúncia por telefone, porque a informação que lhes foi prestada seria a mesma que seria transmitida a clientes reais. Este tipo de argumentação não vale pela simples razão de que não foram pedidos de denúncia efetuados por telefone.
231. Por fim, mesmo que se admitisse que a fórmula “a Arguida não aceita denúncias por telefone desde agosto de 2012” significa que a Recorrente recebeu e não aceitou denúncias por telefone desde a data indicada, o certo é que não há a mínima evidência de que isso tenha sucedido e é um facto que não resulta apenas e só ou necessariamente das regras da experiência comum ou de parâmetros de normalidade e razoabilidade.
232. Por conseguinte, de forma a que a imputação fática não suscite equívocos, decidiu-se incluir nos factos provados a seguinte formulação: “A Arguida decidiu e transmitiu aos seus colaboradores que a partir de agosto de 2012 não são aceites denúncias por telefone, de forma livre”.
233. No que respeita aos demais factos, relativos ao procedimento utilizado pela Recorrente para efeitos de identificação dos clientes por telefone e à aceitação de modificações contratuais por telefone, os mesmos não são controvertidos, face à prova testemunhal na qual se sustentou a decisão impugnada, nomeadamente o depoimento da testemunha já identificada.
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234. Das sms’s enviadas:
235. Não há qualquer dúvida face ao teor do auto de fls. 5, elaborado por Técnicos da ANACOM, e aos depoimentos de JTC... (colaborador da Arguida que, quer à data dos factos, quer à data da inquirição, e que desempenhava funções como manager de backoffice e acompanhou as ações de fiscalização desenvolvidas pela ANACOM - auto de inquirição de fls. 1119 e depoimento constante do CD de fls. 1120) e de RL... (colaborador da Arguida, à data dos factos e na data da inquirição, a desempenhar funções de especialista em melhoria contínua, sendo o responsável pelos processos de controle e canais não presenciais - auto de inquirição de fls. 1118 e depoimento constante do CD de fls. 1120), prestados na fase organicamente administrativa e nos quais se sustentou a decisão da ANACOM, que a Recorrente, por via do departamento indicado nos factos provados, concebeu e implementou as mensagens e contactos telefónicos descritos nos factos provados.
236. Neste âmbito, coloca-se novamente a questão de saber se a decisão impugnada imputa apenas um procedimento geral – no sentido de que a Recorrente decidiu e implementou todos os atos necessários a proceder nesses termos (no pressuposto de que basta esta factualidade para corporizar as infrações imputadas, conforme se defende a ANACOM na p. 37 da decisão, fls. 1174 dos autos) – ou se faz mais do que isto, designadamente se afirma, enquanto facto provado, que a NOS procedeu nesses termos perante denúncias efetuadas por clientes, ainda que não concretamente identificadas. Tem-se a primeira hipótese como certa, vejamos porquê.
237. Vamos admitir, por exercício de raciocínio, que a segunda possibilidade se retira das formulações adotadas pela ANACOM quanto aos factos provados e ainda da p. 36 da decisão (fls. 1173 dos autos), designadamente quando refere que “a admissão da Arguida (corroborada pelas testemunhas ouvidas) de que tem essa prática é suficiente para a constatação de que houve assinantes a quem foram enviadas SMS com o conteúdo descrito nos mencionados artigos”. A questão que se coloca é se este tipo de imputação genérica, sem identificação de denúncias concretas, é admissível.
238. Não é. Efetivamente, as contraordenações imputadas, que resultam da combinação dos elementos tipificados no artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE, com os pontos 2.4.4. e 2.4.5. da Decisão de 09.03.2012, destinam-se a proteger quer a autoridade da ANACOM, por via dos elementos previstos no citado artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE, quer os interesses dos consumidores, através dos elementos que constam na Decisão (cf. preâmbulo da Decisão). Trata-se, por conseguinte, de uma infração complexa.
239. No que respeita aos interesses dos consumidores coloca-se a questão de saber se estão em causa os interesses de consumidores concretos e individuais ou os interesses dos consumidores em geral, sendo que, na primeira hipótese, estaremos perante um bem jurídico individual e, na segunda, perante um bem jurídico supra-individual. A resposta está na configuração do objeto da ação na estrutura típica da infração.
240. Assim, o objeto da ação é a projeção, no plano do tangível, do interesse jurídico protegido . Interesse este que se situa num nível mais profundo ou fundacional e, por isso, mais abstrato. Ora, a expressão real dos interesses dos consumidores, no contexto de aplicação da Decisão de 09.03.2012, é as denúncias, sendo este o objeto da ação.
241. Então, a questão que se deve colocar é se este objeto da ação surge, na estrutura típica, como indiferenciado ou indeterminado ou se, em contrapartida, é um objeto concreto, individualizado. Esta segunda hipótese é a correta, pois qualquer que tenha sido o desiderato da ANACOM, o certo é que resulta, de forma inequívoca da Decisão, que a infração pressupõe uma denúncia de um consumidor concreto. Efetivamente, os pontos 2.4.4. e 2.4.5. têm de ser articulados com os pontos 2.4.1. e 2.4.2., e aí se refere expressamente “recebida uma denúncia”.
242. Na fundamentação de direito, explicitar-se-á melhor a razão pela qual se entende, a propósito da questão conexa e prévia a esta, que a infração não se basta com um procedimento geral.
243. Neste momento, o que se pretende salientar é que – para além da contraordenação não se bastar com um procedimento geral – também não se conforma com um objeto da ação indiferenciado ou indeterminado. O que conduz à conclusão de que o interesse protegido não é um interesse supra-individual, mas os interesses individuais de consumidores concretos.
244. Esclarecida a natureza do interesse protegido conclui-se que a imputação fática não pode ser feita em termos gerais, como reportando-se a um número de denúncias indeterminadas e indiferenciadas, sem nenhum elemento adicional que permita individualizar o objeto da ação.
245. Efetivamente e antes mesmo de se chegar ao direito de defesa do arguido (que também pode ficar comprometido com imputações genéricas), trata-se de observar o princípio da tipicidade, que exige, quanto às infrações em análise, a imputação de factos que permitam individualizar um concreto titular do interesse protegido, pois “recebida uma denúncia” significa uma denúncia de um consumidor concreto e individual.
246. As asserções precedentes destinam-se a esclarecer que se adaptou a formulação fática de forma a não suscitar equívocos, eliminando-se ou alterando-se expressões que pudessem ser interpretadas no sentido de que a Recorrente, para além de ter decidido e implementado os procedimentos gerais em causa, os aplicou a um número indeterminado e indiferenciado de denúncias.
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247. Do envio de denúncias para P...:
248. Os factos relativos à divulgação do Apartado de P... para a receção de quaisquer comunicações escritas foram extraídos do relatório de fiscalização de fls. 381 a 383 e das condições gerais de fls. 406 a 426, não sendo factos controvertidos face à prova produzida.
249. A factualidade que se reporta à divulgação do apartado de C... para efeitos de denúncias resultou do mesmo relatório de fiscalização, da cópia de fls. 442 e 443 com a informação relativa à forma de terminar o contrato de prestação de serviços com a Recorrente e da cópia de um formulário, de fls. 445-446.
250. No que respeita às razões que motivaram a criação do apartado de C..., os factos respetivos fundaram-se no auto de diligência de 17 de junho de 2013 à sede da Recorrente, que consta a fls. 453 e 454 e, entre o mais, no depoimento de AE..., prestado em audiência de julgamento.
251. Quanto aos casos concretos identificados (28), a factualidade relativa a CJ..., resultou de fls. 398-399 e adicionalmente do auto de diligência de 19 de junho de 2013 na sede da Recorrente, de fls. 455 e do documento anexo de fls. 456.
252. Os factos referentes a MMC... foram extraídos de fls. 402 e 403, em conjugação com o auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, os documentos de fls. 495 a 501 e a informação de fls. 561, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide, no que respeita à data de desligamento, com a alegação da Recorrente (cf. artigo 148 do recurso).
253.     Os factos relativos a FG... foram extraídos de fls. 400, do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 512 a 516 e da informação de fls. 561, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide, no que respeita à data de desligamento, com a alegação da Recorrente (cf. artigo 149 do recurso).
254. Quanto à factualidade que respeita a PN..., a mesma resultou do documento de fls. 401, do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 463 a 465 e da informação e fls. 561 quanto à data do primeiro pedido de denúncia que coincide com a informação alegada pela Recorrente (cf. artigo 150.º do recurso). No que respeita à data do desligamento, alega a Recorrente que o mesmo ocorreu em 10.05.2013 (cf. artigo 150). Contudo, a informação que consta a fls. 561 é que o desligamento terá ocorrido em 31.05.2013, não sendo, por isso, possível concluir que a data do desligamento tenha sido especificamente aquela que a Recorrente indicou, mas que o desligamento ocorreu em data não concretamente apurada, mas não posterior a 31.05.2013.
255. Quanto aos factos relativos ao cliente JP... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 502 a 507 e da informação de fls. 561, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide, em parte, com a alegação da Recorrente (cf. artigo 151 do recurso). Não há coincidência exata quanto à data da entrada do pedido, mas a diferença – de um dia – é irrelevante, tendo-se acolhido a versão da NOS. Quanto à data do desligamento também não há total convergência. Contudo, é seguro concluir-se – porque, nesta parte, há coincidência – que o desligamento, tendo em conta a data do terminus da faturação foi de 31.05.2013.
256. Quanto aos factos relativos ao cliente MD... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 478 a 486 e da informação de fls. 561, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto à data do pedido de denúncia (cf. artigo 152 do recurso).
257. Quanto aos factos relativos à cliente GC... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 487 a 490 e da informação de fls. 561, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto à data do pedido de denúncia e quanto à data do desligamento (cf. artigo 153 do recurso).
258. Quanto aos factos relativos ao cliente MM... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 466 a 470 e da informação de fls. 561, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto à data do pedido de denúncia e quanto à data do desligamento (cf. artigo 154 do recurso).
259. Quanto aos factos relativos ao cliente VG... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 525 a 527 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto à data data do desligamento e quanto à data da denúncia há uma ligeira diferença, mas é irrelevante, tendo-se acolhido a versão da Recorrente (cf. artigo 155 do recurso).
260. Quanto aos factos relativos à cliente TN... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 527 a 530 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide, em parte, com a alegação da Recorrente (cf. artigo 156 do recurso). Não há coincidência exata quanto à data da entrada do pedido, mas a diferença é irrelevante, tendo-se acolhido a versão da NOS. Quanto à data do desligamento também não há total convergência. Contudo, é seguro concluir-se – porque, nesta parte, há coincidência – que o desligamento, tendo em conta a data do terminus da faturação foi de 31.05.2013.
261. Quanto aos factos relativos ao cliente CL... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 491 a 494 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide, em parte, com a alegação da Recorrente (cf. artigo 157 do recurso). Não há coincidência exata quanto à data da entrada do pedido, mas a diferença é irrelevante, tendo-se acolhido a versão da NOS. Quanto à data do desligamento também não há total convergência. Contudo, é seguro concluir-se – porque, nesta parte, há coincidência – que o desligamento, tendo em conta a data do terminus da faturação foi de 31.05.2013.
262. Quanto aos factos relativos à cliente AA... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 530 a 533 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide, em parte, com a alegação da Recorrente (cf. artigo 158 do recurso). Não há coincidência exata quanto à data da entrada do pedido, mas a diferença é irrelevante, tendo-se acolhido a versão da NOS. Quanto à data do desligamento também não há total convergência. Contudo, é seguro concluir-se – porque, nesta parte, há coincidência – que o desligamento, tendo em conta a data do terminus da faturação foi de 31.05.2013.
263. Quanto aos factos relativos à cliente AR... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 532 a 535 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide, em parte, com a alegação da Recorrente (cf. artigo 159 do recurso). Não há coincidência exata quanto à data da entrada do pedido, mas a diferença é irrelevante, tendo-se acolhido a versão da NOS. Quanto à data do desligamento também não há total convergência. Contudo, é seguro concluir-se – porque, nesta parte, há coincidência – que o desligamento, tendo em conta a data do terminus da faturação foi de 31.05.2013.
264. Quanto aos factos relativos à cliente TF... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 532 a 535 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto à data do pedido de denúncia (cf. artigo 160 do recurso). Não há coincidência no que respeita ao desligamento. Contudo, da informação de fls. 535 a 538, não é absolutamente claro que a cliente estivesse ativa, uma vez que tal referência respeita apenas ao serviço de 4 canais nacionais e modem multimédia, podendo a denúncia respeitar a outro tipo de serviços. Acresce que consta no quadro de fls. 535 uma referência a desligamento de serviços em por fax datado de 06.05.2013, pelo que se aceita a alegação da Recorrente como correta.
265. Quanto aos factos relativos à cliente MA... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 538 a 540 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto à data do desligamento (cf. artigo 161 do recurso). Não há coincidência exata quanto à data da entrada do pedido, mas a diferença é irrelevante, tendo-se acolhido a versão da NOS.
266. Quanto aos factos relativos à cliente AT... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 540 a 542 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto à data da denúncia e do desligamento (cf. artigo 162 do recurso).
267. Quanto aos factos relativos ao cliente JM... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 542 a 544 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto à data da denúncia e do desligamento (cf. artigo 163 do recurso).
268. Quanto aos factos relativos ao cliente JG... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 544 a 547 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto do desligamento (cf. artigo 164 do recurso). Não há coincidência exata quanto à data da entrada do pedido, mas a diferença é irrelevante, tendo-se acolhido a versão da NOS.
269. Quanto aos factos relativos ao cliente SR... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 547 a 549 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto do desligamento (cf. artigo 165 do recurso). Não há coincidência exata quanto à data da entrada do pedido, mas a diferença é irrelevante, tendo-se acolhido a versão da NOS.
270. Quanto aos factos relativos à cliente PR... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 549 a 551 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto do desligamento (cf. artigo 166 do recurso). Não há coincidência exata quanto à data da entrada do pedido, mas a diferença é irrelevante, tendo-se acolhido a versão da NOS.
271. Quanto aos factos relativos ao cliente RCR... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 551 a 553 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto do desligamento (cf. artigo 167 do recurso). Não há coincidência exata quanto à data da entrada do pedido, mas a diferença é irrelevante, tendo-se acolhido a versão da NOS.
272. Quanto aos factos relativos à cliente MGL... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 557 a 559 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide, em parte, com a alegação da Recorrente quanto do desligamento (cf. artigo 168 do recurso). Não há coincidência exata quanto à data da entrada do pedido, mas a diferença é irrelevante, tendo-se acolhido a versão da NOS. Também quanto ao desligamento, a informação de fls. 562 refere que o cliente doi desligado em 30.06.2013. Contudo, do quadro de fls. 554 resulta a referência a dois desligamentos, razão pela qual se aceita também, neste âmbito, a alegação da Recorrente.
273. Quanto aos factos relativos à cliente LAM... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 557 a 559 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto do desligamento (cf. artigo 169 do recurso). Não há coincidência exata quanto à data da entrada do pedido, mas a diferença é irrelevante, tendo-se acolhido a versão da NOS.
274. Quanto aos factos relativos à cliente SBG... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 457 a 461 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto à data da denúncia e do desligamento (cf. artigo 170 do recurso).
275. Quanto aos factos relativos ao cliente JDA... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456 e dos documentos de fls. 471 a 474. Não há coincidência entre a informação de fls. 562 e a alegação da Recorrente quanto à data da denúncia (cf. artigo 171 do recurso), mas a diferença é irrelevante, tendo-se acolhido a versão da NOS. Quanto ao desligamento, refere-se na informação de fls. 562 que o cliente está ativo. Contudo, não há informação de suporte e é razoável admitir que tendo apresentado uma nova denúncia em 03.05.2013 que foi aceite, conforme se refere nessa informação, o serviço tenha sido desligado no final do mês.
276. Quanto aos factos relativos ao cliente MEM... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 517 a 524 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto à data da denúncia e do desligamento (cf. artigo 172 do recurso).
277. Quanto aos factos relativos ao cliente JXT... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 508 a 511 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto à data da denúncia e do desligamento (cf. artigo 173 do recurso).
278. Quanto aos factos relativos ao cliente FBP... foram extraídos do auto de diligência referido, do anexo de fls. 456, dos documentos de fls. 475 a 477 e da informação de fls. 562, que apenas foi tida em consideração porquanto coincide com a alegação da Recorrente quanto do desligamento (cf. artigo 174 do recurso). Não há coincidência exata quanto à data da entrada do pedido, mas a diferença é irrelevante, tendo-se acolhido a versão da NOS.
279. Quanto aos factos referentes aos procedimentos adotados pela NOS em relação à correspondência recebida no Apartado de P..., os mesmos resultaram do auto de diligência de fls. 448, que se reporta à deslocação de Técnicos da ANACOM aos CTT, dos documentos anexos de fls. 449 a 451, e do auto de diligência de fls. 453-454.
280. Relativamente ao teor das condições gerais, os factos respetivos constam a fls. 406 dos autos, especificamente fls. 414, cláusula 10.3..
281. Mais ficou provado que em relação a vinte e dois dos vinte e oito clientes supra indicados, a Recorrente fez produzir os efeitos das denúncias remetidas para o Apartado de P... à data em que as mesmas foram ali recebidas, com base no depoimento de AE..., prestado em audiência de julgamento. É certo que a Recorrente não apresentou qualquer evidência documental de suporte. Contudo, não tendo sido instada a proceder à sua junção não se pode concluir que tal facto é demonstrativo de que os documentos não existem ou de que os factos em análise não são exatos. Por conseguinte, não há razões para afastar a credibilidade da testemunha nesta parte. Impõe-se apenas esclarecer que AE... não identificou os casos, razão pela qual apenas se pode dar como provado que foram vinte e dois dos vinte oito clientes individualizados.
282. A decisão impugnada alude ainda, na fundamentação de direito, a 1516 denúncias em relação às quais terá sido observado o mesmo procedimento, com base na informação prestada na diligência realizada no dia 19 de junho de 2013 na sede da NOS (cf. fls. 455) – cf. pp. 50 a 54 da decisão e fls. 1187 a 1191. AE... confirmou, em audiência de julgamento, este facto. Contudo, em primeiro lugar, a decisão não assume esse dado como uma imputação fática, pois não lhe é efetuada qualquer referência na matéria de facto provada. Para além disso, a alusão a 1516 denúncias surge na fundamentação da decisão, por três razões.
283. Em primeiro lugar, para sustentar, em termos probatórios e enquanto elementos instrumental ou adicional, os 28 casos identificados, face à alegação da Recorrente, na defesa escrita, de que não existia prova, no processo, de que tais pedidos tenham sido remetidos para o Apartado de P... (cf. pp. 50 e 51 da decisão, fls. 1187-1188 dos autos).
284. Em segundo lugar, a referência aos 1516 casos surge como resposta à crítica da Recorrente que se relaciona com o artigo 14.º da acusação constava que “De acordo com as regras da experiência, é crível que a conduta da Arguida concretamente apurada nos referidos 28 (vinte e oito) casos tenha sido repercutida em todas as situações em que os seus clientes lhe apresentaram denúncias contratuais na morada Apartado ..., EC P..., 2...-9.. P...” (cf. fls. 842).
285. Sucede que esta asserção – e bem – não foi retomada na matéria de facto provada da decisão impugnada. E, para além disso, a própria ANACOM esclarece, na decisão impugnada, que “não foram retiradas na acusação consequências dessa ilação [1516 casos] (cfr., designadamente, o capítulo da conduta da Arguida e do benefício económico – a fls. 862 a 867 dos autos – e a imputação formulada à Arguida a esse propósito, que apenas integra os 28 casos descritos – a fls. 870)” (pp. 52-53 da decisão impugnada e fls. 189-1190 dos autos).
286. Em terceiro lugar, tal elemento é referido para sustentar a imputação a título doloso, conforme se extrai do segundo parágrafo da p. 53 da decisão impugnada, fls. 1190 dos autos.
287. Em face do exposto, conclui-se, sem qualquer dúvida, que nem a acusação, nem a decisão final, imputaram à Recorrente, em termos factuais, as 1516 denúncias, tendo feito referência a este elemento apenas para efeitos de fundamentação da matéria de facto. Também se tem por afastada qualquer possibilidade de incluir, neste momento, tal elemento por via de uma alteração não substancial de factos, entre outras razões, porque se trata de uma imputação genérica, sujeita às mesmas objeções expostas a propósito das infrações relativa à violação dos pontos 2.3.2., 2.4.4. e 2.4.5..
288. Por fim, quanto ao elemento subjetivo, a ANACOM considerou, no artigo 195.º da acusação, que a NOS optou deliberada e conscientemente por apenas aceitar e tratar os pedidos de denúncia contratual enviados para a morada Apartado ... EC C... 1... 5.. L... – tal como descrito nos artigos 18.º a 30.º supra –, quando sabe que no seu sítio na Internet disponibiliza outras moradas para contacto, e isto apesar de conhecer a previsão da Decisão quanto a esta matéria, ou seja que a Recorrente agiu com dolo direto. O principal fundamento desta asserção radica no teor do Relatório de Consulta Pública, que é bastante claro quanto ao sentido da Decisão nesta parte (cf. p. 53 da decisão, fls. 1190 dos autos), na ausência de qualquer crítica da parte da Recorrente a esta solução no procedimento de consulta (cf. p. 54 da decisão e fls. 1191 dos autos) e sobretudo na seguinte ordem de razões, assentes em parâmetros de normalidade e razoabilidade: “Na verdade, este tipo de conduta apenas é adotado se pensado, se deliberado e se querido”.
289. Nas suas alegações, a ANACOM, fazendo apelo às 1516 denúncias, reforça este último argumento, afirmando o seguinte: “Conforme resulta do expressivo número de destinatários sobre que recaiu, não se tratou de uma qualquer conduta isolada, mas sim de um comportamento massificado, que denuncia uma orientação pré-definida com vista a um determinado resultado, e que afasta, por si só, a possibilidade de se poder equacionar tratar-se da mera violação de um dever de cuidado” (artigo 67.º das alegações).
290. Por sua vez, sustenta a Recorrente que não agiu com dolo, invocando o seguinte: a criação de um apartado próprio para a receção de denúncias não significa que a Arguida tivesse instituído internamente que deixaria de considerar e tratar denúncias recebidas noutras caixas postais suas. O que Arguida decidiu foi, apenas, que se criaria um apartado específico (o Apartado do C...) para a receção e tratamento de denúncias. Nada mais do que isto. Nomeadamente, a Arguida não decidiu que denúncias recebidas noutros endereços seriam rejeitadas. Essa actuação (de rejeição de denúncias apresentadas no Apartado de P...) não foi algo que tenha sido querido e pensado pelos responsáveis da Arguida, designadamente pelo seu Conselho de Administração. Com efeito, verifica-se que as instruções dadas no sentido da criação e utilização de um apartado específico para a recepção e tratamento de denúncias visavam promover uma correcta implementação da Deliberação. No entanto, o que se veio a verificar foi uma errada execução dessa directriz superior, que se consubstanciou em considerar como incorrectamente enviadas as denúncias apresentadas noutro endereço da Arguida. A actuação que a Arguida efectivamente veio a ter, sendo contrária ao pensado e querido pelos seus responsáveis, designadamente pelo seu Conselho de Administração, configura aquilo a que a doutrina se refere como mera culpa por defeito organizacional. O exposto vale por dizer que a actuação da Arguida ocorre num quadro de negligência organizacional – a Arguida, enquanto pessoa colectiva que actua reflexamente através dos seus representantes, pensou e quis implementar um procedimento que era conforme às normas aplicáveis, mas não foi capaz de evitar uma deficiente implementação desse procedimento (artigos 183.º a 191.º do recurso).
291. A testemunha AE..., em audiência de julgamento, confirmou a parte factual desta alegação, tendo referido que foi o serviço de atendimento ao cliente da Recorrente quem implementou o procedimento.
292. Analisados os argumentos expostos e a prova produzida atinge-se um ponto inultrapassável e que se traduz numa ideia muito simples: não existem razões contundentes, nomeadamente no plano das regras da experiência comum e parâmetros de normalidade e razoabilidade, para afastar a tese da Recorrente, reproduzida pela referida testemunha.
293. É certo que a tese da Recorrente suscita alguns fatores de estranheza. Assim, é estranho que não tenha sido identificada a pessoa, no departamento de atendimento ao cliente, que tenha delineado o procedimento (facto afirmado por AE...). É igualmente estranho um comportamento dicotómico e descoordenado dentro da mesma empresa e que o serviço de atendimento ao cliente da Recorrente tenha assumido este procedimento sem se articular com o departamento de regulação e concorrência para aferir se o mesmo era correto ou a questão não tenha sido colocada ao Conselho de Administração.
294. Não obstante estes fatores de estranheza não se pode concluir que seja de todo impossível, até porque não é assumido como um procedimento que a NOS quisesse manter.
295. É certo que a não receção das denúncias e a sua devolução foi um procedimento pensado e querido por quem executou os factos. Não estamos evidentemente perante atos que escapam à representação e vontade conscientes de quem (pessoas singulares) os praticou. Contudo, o problema está na possibilidade – que tem de ser aceite como razoável e, nessa medida, possível – dessa representação e vontade não se mostrarem acompanhadas da noção de que esse procedimento estava a violar uma ordem da ANACOM, uma vez que a informação relativa ao conteúdo da Decisão – essencial para uma correta apreensão do ilícito e que, nessa medida, é suscetível de afastar o dolo – era detida por outro departamento da Recorrente.
296. Por conseguinte, não havendo razões para afastar a tese da Recorrente, aceita-se a mesma como válida e conclui-se que a Arguida, ao decidir criar o apartado do C..., não pretendeu que denúncias recebidas noutros endereços fossem rejeitadas. Contudo, não evitou, o que era capaz, uma deficiente implementação desse procedimento dentro da sua estrutura organizativa. Efetivamente, não era difícil antecipar que ao criar-se um endereço específico para as denúncias pudessem ocorrer situações desta natureza, pelo que estava ao alcance do departamento responsável pela instituição do procedimento dar instruções mais exatas, esclarecendo que, em qualquer caso, nenhuma denúncia podia ser devolvida pelo facto de ter sido endereçada para o Apartado errado. E ao concluir-se, nestes termos, não se está a sair fora da alegação (subsidiária) da própria Recorrente (cf. artigos 183.º a 192.º do recurso), pelo que a alteração efetuada não carece de lhe ser comunicada.
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297. Dos documentos ilegíveis:
298. Antes de incidir sobre cada cliente identificado há algumas considerações gerais relativamente a estes casos, que estão relacionados com a legibilidade ou ilegibilidade dos documentos que acompanharam as denúncias.
299. Em primeiro lugar, os factos relativos a este tema incluem três tipologias de situações distintas: por um lado, casos em que os Técnicos da ANACOM, que recolheram os elementos, consideraram que os documentos que visualizaram no sistema da NOS se encontravam legíveis, tendo a Recorrente considerado que eram ilegíveis. Neste caso, os elementos probatórios estribam-se nas cópias retiradas do sistema da NOS. Por outro lado, há casos em que os Técnicos da ANACOM consideraram os documentos visualizados no sistema da NOS ilegíveis (correspondem às situações identificadas como erros de digitalização) e solicitaram cópias dos originais para confirmar. Isto resultou do depoimento de MRM..., Técnica da ANACOM que procedeu à recolha da informação, em conjugação com a informação que está documentada no auto de diligência de fls. 155 (deslocação à sede da NOS em 25 de fevereiro de 2013). Por fim, há casos decorrentes de reclamações efetuadas por clientes junto da ANACOM.
300. Em segundo lugar, uma vez que os casos rejeitados pela NOS devido a ilegibilidade deram origem a segundos ou terceiros pedidos de denúncia, coloca-se a questão de saber se as cópias que a Recorrente remeteu a pedido dos Técnicos da ANACOM seriam aquelas que acompanhavam o primeiro pedido ou o segundo/terceiro. Não se duvida de que foram as primeiras, tendo em conta que no pedido efetuado pela ANACOM, tal como consta a fls. 155, é indicada a data do pedido de denúncia.
301. Em terceiro lugar, no que respeita aos documentos visualizados pelos Técnicos da ANACOM, o processo, nesta parte, apresentava deficiências em termos de organização da prova uma vez que a ANACOM optou pela não impressão de todos os documentos nos quais se fundaram os factos e pela remissão para ficheiros informáticos que constam no suporte de fls. 19 e que incluem muitos outros documentos que não se relacionam com os factos, o que necessariamente dificulta a apreensão do suporte probatório de cada um dos factos. Por esta razão, a ANACOM foi notificada para juntar, em relação a cada um dos clientes identificados, os elementos probatórios respetivos (cf. ata de fls. 1476 e ss.), o que veio a efetuar através do requerimento com a ref.ª 29487, fls. 1484 e ss.. Por conseguinte, será com base nos esclarecimentos prestados pela ANACOM, nos documentos juntos pela mesma e nos documentos dos autos para os quais remete, únicos que permitiram um exercício efetivo do direito ao contraditório, que se irá averiguar da demonstração ou não dos factos em análise, sendo certo que a Recorrente impugnou os factos respetivos (cf. artigo 211.º do recurso).
302. Em quarto lugar, a legibilidade ou ilegibilidade dos documentos não pode ser mediada pela apreciação efetuada pelos Técnicos da ANACOM que analisaram os documentos, tendo ser aferida diretamente, pelo que as tabelas de fls. 240 e 244-245 não consubstanciam, quanto a este facto, um meio de prova suficiente.
303. Em quinto lugar, não há razões para concluir que as cópias juntas aos autos tenham uma qualidade diversa daquelas que se encontram arquivadas pela Recorrente.
304. Em sexto lugar, importa definir previamente o que se considera um documento legível e para isso é necessário atender à finalidade dos documentos em questão. O que se retira dos pontos respetivos da Decisão sobre esta matéria é que os documentos que devem acompanhar a denúncia devem ser de molde a não suscitar dúvidas razoáveis no sentido de que a pessoa que a apresenta é quem afirma ser. A junção de um documento de identificação é apta a afastar essas dúvidas, por via da comparação de assinaturas (assinatura da denúncia e assinatura do documento de identificação) e porquanto, em regra, os documentos dessa natureza estão na posse do respetivo titular. Por conseguinte, um documento de identificação deverá ser considerado legível quando permitir, por um lado, identificar o tipo de documento (designadamente se é o cartão de cidadão) e, por outro lado, a leitura e reconhecimento dos elementos que nele constam relativos ao seu titular.
305. Analisemos, então, cada um dos casos concretos.
306. Da denúncia de PS...:
307. Este caso corresponde à primeira tipologia referida. Os factos provados resultaram dos documentos de fls. 1541 a 1543. Relativamente ao facto do cliente não ter ficado prejudicado, aceita-se a alegação da Recorrente, uma vez que é convergente com a informação apurada pelos Técnicos da ANACOM (cf. fls. 240). No que respeita à legibilidade do documento, que consta a fls. 1541 verso, considera-se que não é legível, uma vez que: a fotografia do cliente é pouco percetível, não permitindo o seu reconhecimento; os números do cartão do cidadão e dos demais documentos referidos no verso também não são suficientemente claros; e os números que constam no verso, na parte final também não são percetíveis. Por conseguinte, terá de se concluir que o documento é ilegível.
308. Da denúncia de CM...:
309. Também esta situação corresponde à primeira tipologia supra identificada. Os factos provados resultaram dos documentos de fls. 1545 a 1548. No que respeita à legibilidade dos documentos, que constam a fls. 1545 verso e 1546 verso, considera-se que o primeiro não é legível, uma vez que não permite a leitura clara da data de nascimento, da data de validade, do número do cartão de cidadão e dos números que constam no verso do cartão l. Também a fotografia e a assinatura são pouco percetíveis. Quanto ao segundo, também não é legível, uma vez que o número do cartão de cidadão não é totalmente percetível e apresenta as mesmas deficiências quanto à fotografia e à assinatura.
310. Da denúncia de ACT...:
311. Este caso corresponde à segunda tipologia, de erro de digitalização. Os factos provados resultaram dos documentos de fls. 1550 a 1554. Adicionalmente, consta do auto de fls. 155 que foi solicitada a cópia do documento apresentado em 12.10.2012 (número do cliente – C829…). Por conseguinte e face à informação de fls. 1485 verso, o documento de fls. 1550v-1551 corresponde à digitalização, sendo claramente ilegível. Por sua vez, os documentos arquivados constam a fls. 185 e 187 dos autos, face à informação de fls. 1485v e também ao teor da carta de fls. 1552v, que alude ao reenvio de cópia dos mesmos documentos enviados com a primeira denúncia, sendo legíveis, uma vez que se consegue perceber o tipo de documentos, assim como ler e reconhecer os elementos de identificação.
312. Da denúncia de MAM...:
313. Este caso corresponde à segunda tipologia, de erro de digitalização. Os factos provados resultaram dos documentos de fls. 1557 a 1565. Adicionalmente, consta do auto de fls. 155 que foi solicitada a cópia do documento apresentado em 12.10.2012 (número do cliente – C825…). Por conseguinte e face à informação de fls. 1485 verso, o documento de fls. 1557v-1558 e verso corresponde à digitalização, sendo claramente ilegível. Por sua vez, os documentos arquivados constam a fls. 193 a 196 dos autos, face à informação de fls. 1485v e também ao teor da carta de fls. 1560v, que alude ao reenvio de cópia dos mesmos documentos enviados com a primeira denúncia, sendo legíveis, uma vez que se consegue perceber o tipo de documentos, assim como ler e reconhecer os elementos de identificação.
314. Da denúncia de APM...:
315. Este caso corresponde à segunda tipologia, de erro de digitalização. Os factos provados resultaram dos documentos de fls. 1576 a 1580. Adicionalmente, consta do auto de fls. 155 que foi solicitada a cópia do documento apresentado em 12.10.2012 (número do cliente – C237...). Por conseguinte e face à informação de fls. 1486, o documento de fls. 1567v-1558 e verso corresponde à digitalização, sendo claramente ilegível. Por sua vez, o documento arquivado consta a fls. 199 e 200 dos autos, face à informação de fls. 1486, sendo o bilhete de identidade não legível, uma vez que a fotografia está demasiado escura para permitir um reconhecimento seguro.
316. Da denúncia de PMG...:
317. Este caso, segundo a decisão, corresponde à segunda tipologia supra identificada. Os factos provados resultaram dos documentos de fls. 1576 a 1580. O documento apresentado com a primeira denúncia, considerado legível pelos Técnicos da ANACOM (cf. fls. 1486), consta, segundo a informação de fls. 1486, a fls. 1576v e claramente não é legível, na medida em que a fotografia não é inteiramente reconhecível. Note-se que o cliente usa óculos (conforme resulta da fotografia de fls. 1578 verso), mas isso não se percebe na fotografia de fls. 1576 verso. A ANACOM, a fls. 1486, também alude ao documento de fls. 1578, verso, como sendo legível. Contudo, este documento está anexo à segunda denúncia.
318. Da denúncia apresentada por JFR...:
319. Este caso também corresponde à segunda tipologia. Os factos provados resultaram dos documentos de fls. 1582 a 1587. Adicionalmente, consta do auto de fls. 155 que foi solicitada a cópia dos documentos apresentados em 22.10.2012 e 29.10.2012 (número do cliente – C33...). Por conseguinte e face à informação de fls. 1486 e verso, o documento de fls. 1583 e verso e 1584 corresponde à digitalização, sendo claramente ilegível. Por sua vez, os documentos arquivados constam a fls. 204 a 206 dos autos, face à informação de fls. 1486, sendo não legíveis, os de fls. 208 porque não permitem a leitura e reconhecimento dos elementos constantes nos documentos de identificação remetidos e os de fls. 203 a 206, porque a própria denúncia não é totalmente percetível.
320. Da denúncia de ARG...:
321. Este caso, segundo a decisão, corresponde à segunda tipologia supra identificada. Os factos provados resultaram dos documentos de fls. 1589 a 1590. O documento apresentado com as denúncias, considerado legível pelos Técnicos da ANACOM (cf. fls. 1486 v), consta, segundo a informação de fls. 1486, a fls. 1589v e claramente não é legível, uma vez que a data de nascimento não é inteiramente percetível, assim como os números do cartão de cidadão, a assinatura e a fotografia.
322. Da denúncia de PTL...:
323. Este caso corresponde à segunda tipologia identificada. Os factos provados resultaram dos documentos de fls. 1592 a 1594. Adicionalmente, consta do auto de fls. 155 que foi solicitada a cópia do documento apresentado em 12.10.2012 (número do cliente – C6618...). Por conseguinte e face à informação de fls. 1486v, o documento de fls. 1592v-1593 corresponde à digitalização, sendo claramente ilegível. Por sua vez, o documento arquivado consta a fls. 190 e 191 dos autos, face à informação de fls. 1486v, não sendo legível uma vez que nem a fotografia, nem a assinatura são reconhecíveis.
324. Da denúncia de CAB...:
325. Este caso corresponde à segunda tipologia, de erro de digitalização. Os factos provados resultaram dos documentos de fls. 1596 a 1600. Adicionalmente, consta do auto de fls. 155 que foi solicitada a cópia do documento apresentado em 29.10.2012 (número do cliente – C8286...). Por conseguinte e face à informação de fls. 1487, o documento de fls. 1596v-1597 corresponde à digitalização, sendo claramente ilegível. Por sua vez, os documentos arquivados constam a fls. 177 e 179 dos autos, face à informação de fls. 1487, concluindo-se pela sua legibilidade, uma vez que ainda que um pouco escuros em relação ao cartão de cidadão, permitem a leitura e o reconhecimento dos elementos de identificação.
326. Da denúncia de LCS...:
327. Este caso corresponde à segunda tipologia, de erro de digitalização. Os factos provados resultaram dos documentos de fls. 1602 a 1604. Adicionalmente, consta do auto de fls. 155 que foi solicitada a cópia do documento apresentado em 04.10.2012 (número do cliente – C263...). Por conseguinte e face à informação de fls. 1487, o documento de fls. 1602v-1603 corresponde à digitalização, sendo claramente ilegível. Por sua vez, os documentos arquivados constam a fls. 210-212 dos autos, face à informação de fls. 1487, concluindo-se pela sua legibilidade, uma vez que permitem a leitura e o reconhecimento dos elementos de identificação. Dos quadros de fls. 1604 e verso não se consegue retirar a data do desligamento do serviço.
328. Da denúncia de NMC...:
329. Este caso corresponde à segunda tipologia, de erro de digitalização. Os factos provados resultaram dos documentos de fls. 1606 a 1609. Adicionalmente, consta do auto de fls. 155 que foi solicitada a cópia do documento apresentado em 15.11.2012 (número do cliente – C2527...). Por conseguinte e face à informação de fls. 1487 e verso, o documento de fls. 1607v e 1608 corresponde à digitalização, sendo claramente ilegível. Por sua vez, os documentos arquivados constam a fls. 214-216 dos autos, face à informação de fls. 1487 e verso, é legível, uma vez que, permitem a leitura e o reconhecimento dos elementos de identificação.
330. Da denúncia de JPG...:
331. Os factos relativos a este cliente resultaram dos documentos de fls. 594 a 605, sendo evidente que os documentos de fls. 599 e 600 não são legíveis.
332. Da denúncia de MCN...:
333. Os factos relativos a esta cliente resultaram dos documentos de fls. 698 a 719. Não se deu como provada a informação alegadamente prestada pelo call-center da Recorrente, na medida em que a denúncia foi recebida pela Arguida a 17.09.2013, pelo que, face às condições gerais, o desligamento seria efetuado no mês seguinte. Nesta medida, não se pode concluir que a emissão da fatura do mês de outubro seja incorreta e, consequentemente, que a cliente tenha recebido tal informação por parte da Recorrente.
334. Da denúncia de MCB...: 
335. Os factos relativos a esta cliente resultaram dos documentos de fls. 687 a 694 e de fls. 738, 740 e 741. No que respeita aos factos não provados, ficaram por demonstrar uma vez que a cópia da denúncia junta pela reclamante a fls. 694 não contém a data. Nesta medida não se pode concluir que a factualidade relativa à denúncia descrita por MCB... corresponda à verdade. Acresce ainda que a nota de crédito não refere a que serviços e meses se reporta e a NOS pode ter procedido nesses termos por razões comerciais ou para evitar litígios, face à reclamação apresentada pela cliente.
336. Da denúncia de AFA...: 
337. Os factos relativos a este cliente fundaram-se nos documentos de fls. 707, 718 a 721.
338. Do procedimento interno de gestão documental adotado pela Arguida:
339. A factualidade em análise não é controvertida, aceitando a Recorrente a generalidade dos factos (cf. artigos 217.º a 226.º do recurso), que resultam da prova testemunhal produzida na fase organicamente administrativa e referida pela ANACOM, designadamente os depoimentos de AE..., de JTC... e de RL....
340. Quanto ao elemento subjetivo, a ANACOM considerou o seguinte: “Verificando ilegibilidades nos documentos digitais (quer pela sua qualidade, quer pela sua validade) que instruíam os pedidos de denúncia – e ainda que os documentos originais se encontrassem legíveis –, a Arguida decidiu solicitar aos seus clientes que reenviassem esses mesmos documentos – (o que resulta de todo o procedimento acima descrito, em conjugação com a conduta da Arguida relativamente a cada um dos clientes referidos no presente ponto da matéria de facto provada e como decorre dos depoimentos prestados pelas testemunhas referidas nos artigos anteriores)” (artigo 164.º); “Apesar de saber haver falhas no procedimento de digitalização que tornam documentos que instruem os pedidos de denúncia contratual originariamente legíveis em documento digitais ilegíveis, a Arguida optou, de forma deliberada e consciente, por manter o mesmo procedimento e atuação, conformando-se com os resultados antijurídicos assim obtidos” (artigo 196.º); “E solicitando a esses clientes que lhe reenviassem a documentação, sob pena de desconsiderar os pedidos de denúncia já validamente apresentados, com as consequências daí advenientes” (artigo 197.º). Ou seja, a ANACOM entendeu que a Recorrente agiu com dolo.
341. Em larga medida, este entendimento sustenta-se no facto da NOS ter conhecimento, através dos seus colaboradores das áreas de gestão documental e de back office, de que havia falhas no processo de digitalização, sendo este o ponto de partida para a ANACOM concluir que a Recorrente optou por devolver ao assinante a necessidade de reenviar a documentação em causa, quando podia ter dado instruções para suprir as falhas, mediante consulta do original – cf. p. 65 da decisão, fls. 1202 dos autos.
342. Por sua vez, alega a Recorrente que não agiu com dolo, porquanto nos 12 casos identificados, “ao tempo em que foi solicitado o reenvio da informação aos clientes, a Arguida não tinha conhecimento e consciência de que a falha fosse do seu procedimento de gestão documental (e não do documento originalmente remetido pelo cliente)” (artigo 227.º do recurso).
343. Analisada a prova produzida, considera-se que a Recorrente, na pessoa dos seus colaboradores da área de back office agiu, pelo menos, com dolo eventual. Efetivamente, não resulta da prova testemunhal a existência de instruções expressas e claras no sentido de que, perante uma digitalização inelegível, tinha de ser sempre pedido o documento ao arquivo, mas apenas o que consta no § 164, concluindo-se, por isso, que os colaboradores de back office, responsáveis pela análise das denúncias, agiam com autonomia quanto ao procedimento a adotar. Adicionalmente, conclui-se que os casos de legibilidade identificados não podiam ter sido identificados pela área de gestão documental como originariamente “maus” (cf. § 162), uma vez que a diferença entre as digitalizações e os originais é flagrante. Nesta medida, não é plausível que os colaboradores de back office que os analisaram não tenham, pelo menos, colocado a possibilidade de ter existido um erro de digitalização, não se admitindo a hipótese de terem solicitado as cópias em papel arquivadas, uma vez que as mesmas não suscitam dúvidas quanto à sua legibilidade. Por conseguinte, considera-se que assiste razão à ANACOM quando conclui que os referidos colaboradores da NOS optaram por solicitar o reenvio dos documentos, revelando nessa medida que se conformaram com a possibilidade referida. A consciência da ilicitude é evidente, considerando as funções em causa e na medida em que as mesmas implicam o conhecimento necessário das obrigações decorrentes da Decisão da ANACOM.
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344. Do procedimento relativo ao período de fidelização:
345. A factualidade relativa a esta matéria não é controvertida, não questionando a Recorrente os factos imputados (cf. artigos 230 a 242), pelo que se considera a mesma sustentada nos meios de prova indicados pela ANACOM na decisão impugnada, designadamente: (i) quanto aos procedimentos gerais, os depoimentos das testemunhas inquiridas na fase organicamente administrativa; (ii) quanto à denúncia de TCA..., os documentos de fls. 357, em conjugação com a informação gravada no ficheiro (em formato Word), com a epígrafe “Participações_ANACOM_05022013”, que está inserido na pasta “Participações_ANACOM_05022013_v2”, incluída, por sua vez, na pasta “2013-02-04e05_diligencia”, que por sua vez está inserida na pasta “Anexo 5”, com a informação gravada no ficheiro (em formato tif), com a epígrafe “C82...”, inserido nas pastas: “D:\anexo5\2013-02-25_diligencia\Anacom_Documentos_v2_25022013 e com a informação constante no quadro C82..., da p. 2 do documento (em formato word), com a epígrafe Anacom_Documentos_v2_25022013 e inserido nas seguintes pastas “D:\anexo5\2013-02-25_diligencia\Anacom_Documentos_v2_25022013”; (iii) em relação à denúncia de AF..., os documentos de fls. 347 a 355, 1365-1366; (iv) quanto ao elemento subjetivo, conclui-se nos termos constantes nos factos provados, uma vez que a Recorrente não impugna os factos, nem resulta da prova produzida que essa ausência de impugnação se tenha devido a lapso da defesa apresentada. Para além disso, os procedimentos automáticos adotados por defeito para todos os casos podem, em regra, ser minimizados com introdução de mecanismos de controlo adicionais em relação a situações que não correspondem ao padrão. Esta asserção geral, que radica em padrões de normalidade e razoabilidade, não foi afastada pela prova produzida. Acresce não ser plausível (atenta a inexistência de prova nesse sentido) que tais mecanismos não estivessem ao alcance da Recorrente, face à sua dimensão e recursos.
346. Note-se, por fim, que se fez uso dos meios de prova constantes no suporte informático de fls. 19, uma vez que são factos não objeto de controvérsia.
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347. Outros factos relevantes:
348. As características da Recorrente são factos do conhecimento necessário da ANACOM, enquanto Regulador do setor, pelo que a não impugnação destes elementos factuais se considera suficiente para a sua demonstração.
349. A notificação da Decisão à Recorrente está documentada a fls. 563 a 567 e a sua participação no processo de consulta pública está documentada no endereço eletrónico indicado nos factos provados.
350. No que respeita ao benefício económico, conclui-se que a Recorrente beneficiou economicamente com os seis casos de denúncias remetidas para P..., em relação aos quais os efeitos não foram retroagidos, uma vez que a testemunha AE... referiu que o procedimento aqui adotado foi diverso por um lapso de análise dos serviços centrais, inferindo-se de tais afirmações que os efeitos, nestes casos, não foram retroagidos. Também se conclui que a Recorrente, em relação aos clientes AT..., MAM..., CB..., LS... e ..., beneficiou economicamente, porquanto o desligamento foi efetuado mais tarde do aquele que deveria ser, pelo que, fazendo apelo a parâmetros de normalidade e razoabilidade, que não foram afastados pela prova produzida, se conclui que os clientes foram faturados por montantes que não eram devidos.
351. Quanto à situação económico-financeira da Recorrente, relativa ao ano de 2012, levou-se em conta a informação constante na decisão, uma vez que o Regulador tem conhecimento de tais dados e não foi invocada nenhuma inexatidão, e, quando ao ano de 2016, foi tida em consideração a declaração de IRC de fls. 1439 a 1452.
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Fundamentação de direito
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352. Contraordenações relativas à violação dos pontos 2.3.2., 2.4.4. e 2.4.5.:
353. À Recorrente foi imputada a prática, a título doloso: (i) de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE, em conjugação com o ponto 2.3.2. da Decisão de 09.03.2012; (ii) de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE, em conjugação com o ponto 2.4.4. da Decisão de 09.03.2012; (iii) e de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE, em conjugação com o ponto 2.4.5. da Decisão de 09.03.2012
354. Vejamos o teor destas normas.
355. Estipula o artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE, que constitui uma contraordenação o incumprimento de ordens ou mandados legítimos da ARN regularmente comunicados aos seus destinatários.
356. Por sua vez, preceitua o ponto 2.3.2. da referida Decisão o seguinte: “Quando disponibilizem um serviço de atendimento telefónico dotado com um sistema de validação de utilizador, as empresas devem aceitar as declarações de denúncia que sejam comunicadas por essa via e que cumpram os requisitos previstos no número 2.1.”.
357. O teor do ponto 2.4.4. é o seguinte: “Da comunicação prevista no número 2.4.1. deve ainda constar a indicação da data efetiva de cessação do(s) serviço(s) ou do contrato e, quando aplicável, a indicação, com carácter concreto, dos direitos e obrigações do assinante emergentes da denúncia, incluindo a obrigação de pagamento de eventuais encargos daí decorrentes, nomeadamente aqueles associados ao incumprimento de períodos contratuais mínimos e à não devolução de equipamentos”.
358. Conexo com este, importa esclarecer que o ponto 2.4.1. estipula o seguinte: “Recebida uma declaração de denúncia nos termos previstos nos números 2.3. e sempre que a mesma cumpra os requisitos fixados nos números 2.1. e 2.2., as empresas devem, no prazo de cinco dias úteis a contar da data da sua receção, confirmar a denúncia do(s) serviço(s) ou do contrato”.
359. O ponto 2.4.5. preceitua o seguinte: “A comunicação prevista no número 2.4.2. deve fixar um prazo de trinta dias úteis para o envio da informação ou da documentação em falta e informar o assinante que, em caso de não cumprimento desse prazo, a declaração de denúncia considerar-se-á caducada”.
360.     Por fim, o teor do ponto 2.4.2. é o seguinte: “Recebida uma declaração de denúncia nos termos previstos no número 2.3. e sempre que a mesma não cumpra os requisitos fixados nos números 2.1. e 2.2., as empresas devem, no prazo de três dias úteis a contar da data da sua receção, solicitar ao assinante o envio da informação ou documentação em falta”.
361. Considera a ANACOM que a Recorrente praticou a primeira contraordenação (violação do ponto 2.3.2.), porquanto não aceita denúncias por telefone, significando esta formulação e conforme já esclarecido que a NOS decidiu e transmitiu aos seus colaboradores que não são aceites denúncias por telefone. Mais acrescenta que os pedidos de esclarecimentos formulados pelos Técnicos da ANACOM às quatro lojas identificadas nos factos provados equivalem a pedidos de denúncia concretos.
362. Mais entende a ANACOM que a Recorrente praticou a segunda e a terceira contraordenações porque não comunica, quanto ao ponto 2.4.4. e por escrito, os encargos associados ao incumprimento de períodos contratuais mínimos e, relativamente ao ponto 2.4.5., o prazo de trinta dias úteis para a apresentação dos documentos em falta, sob pena de caducidade. Defende a ANACOM que a Decisão “enquadra um modus operandi abstrato” ou o “procedimento adotado pelo operador (enquanto realidade genérica)”. Sustenta ainda que a admissão da Arguida de que tem essa prática “é suficiente para a constatação de que houve assinantes a quem foram enviadas SMS com o conteúdo descrito”.
363. Por sua vez, sustenta a Recorrente, entre o mais, que não pode ser condenada pela prática desta infração, uma vez que a ANACOM não demonstrou que determinado(s) cliente(s) da NOS (ZON, à data dos factos) foi(ram) alvo dessas supostas condutas, resultando a imputação de um procedimento abstrato da Arguida. Acrescenta que a própria ANACOM, em decisão recente – proferida no âmbito do Processo de Contraordenação n.º 972411 – AH029842/2015 –, entendeu absolver a NOS de vinte infrações à Deliberação que lhe vinham imputadas, por não ter sido verificada a concretização de diversos procedimentos que, em abstrato, reputava de ilegais.
364. Nas suas alegações, a ANACOM refuta este entendimento com base, em síntese, nos seguintes argumentos (alguns dos quais já constavam na decisão): a infração traduz-se nos procedimentos implementados, consubstanciando, nessa medida, uma infração de perigo abstrato, o que implica que não seja necessário que haja um concreto resultado e que não exige a identificação de casos concretos; a decisão proferida no processo de contraordenação n.º 972411 absolveu a Recorrente porque não se provou que os procedimentos adotados pelas lojas tenham sido definido e determinados pela NOS ou resultavam unicamente da iniciativa de cada ponto de venda.
365. Não assiste razão à ANACOM, conforme já se deixou antever.
366. Em primeiro lugar, uma infração pode ser de mera atividade, como é o caso, e ainda assim ser uma infração de dano, ou seja, pode implicar uma lesão efetiva do bem jurídico protegido, mas sem exigir a verificação de um efeito espácio-temporalmente distinto da ação . Isto para esclarecer que o facto das infrações em análise não exigirem um resultado não significa que sejam necessariamente infrações de perigo.
367. Por outro lado, o facto de serem infrações de perigo também não significa que se bastem, na sua estrutura típica, com procedimentos gerais ou com um objeto de ação indiferenciado ou indeterminado. Vejamos porquê.
368. Já se referiu, no que respeita ao bem jurídico protegido, que a contraordenação imputada assume uma feição complexa, uma vez que visa tutelar quer a autoridade da ANACOM, por via dos elementos definidos no artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), quer os interesses dos consumidores, através do teor concreto da deliberação da ANACOM vertida na Decisão supra identificada. Quanto àquilo em que consiste especificamente os interesses dos consumidores, protegido por esta infração, considera-se que está em causa a mobilidade dos utilizadores finais de redes e serviços de comunicações eletrónicas, conforme se refere no Preâmbulo do diploma e, enquanto, refração dos direitos previstos no artigo 60.º, n.º 1, da Constituição.
369. Definido o interesse protegido conclui-se que a infração é uma infração de dano no que respeita à autoridade da ANACOM, pois, qualquer que seja a tese adotada (a da ANACOM ou a da Recorrente), a mesma pressupõe sempre o incumprimento de uma ordem desta entidade.
370. Já quanto ao interesse do consumidor, na vertente referida, a infração é uma infração de perigo, também considerando as duas teses defendidas, pois a prática da contraordenação não implica uma lesão do bem jurídico, na medida em que o consumidor, podendo não conseguir efetuar a denúncia do contrato por telefone, pode conseguir efetivá-la por outra via. Dir-se-á, mas terá incómodos ou custos acrescidos. É possível. Contudo, o interesse na mobilidade não é atingido. O bem jurídico protegido só seria ofendido ou lesionado se a NOS não aceitasse pura e simplesmente uma denúncia do cliente qualquer que fosse a forma adotada ou se a não aceitação da denúncia por telefone levasse o consumidor a desistir. Contudo, nem a infração pune os operadores pela não aceitação pura e simples de denúncias – hipótese que corresponderia a uma infração de mera atividade e de dano –, nem a infração exige que o consumidor desista – hipótese que corresponderia a uma infração de resultado e de dano.
371. Chegados a este ponto, conclui-se que a configuração da infração como uma infração de perigo, no que respeita especificamente ao bem jurídico que se traduz no interesse do consumidor é compatível quer com a tese da ANACOM, quer com a tese da Recorrente, não sendo um argumento decisivo. A diferença é que a tese da NOS pressupõe uma situação de maior intranquilidade para o bem jurídico protegido, aproximando-se mais da sua lesão e pressupõe um interesse protegido individual. A tese da ANACOM corresponde a uma tutela mais recuada e pressupõe um bem jurídico supra-individual.
372. Qual das duas é a melhor ou mais correta é evidentemente uma ponderação vedada neste domínio da aplicação da lei. O que se impõe é, por via interpretativa e sem sair fora das significações possíveis  das palavras da ANACOM, definir aquela que assumiu expressão no tipo de ilícito objetivo.
373. Neste plano, a razão está do lado da Recorrente, pois o texto da Decisão é claro, em relação a qualquer um dos pontos em análise, no sentido que se reportam a denúncias concretas. Efetivamente, o texto da decisão não refere decisões sobre a forma de proceder perante denúncias ou decisões e a implementação de todos os atos necessários para a sua execução. O texto da norma fala em denúncias que sejam comunicadas (cf. ponto 2.3.2.) e denúncia recebida (cf. pontos 2.4.4. e 2.4.5., em conjugação com os pontos 2.4.1. e 2.4.2.).
374. O facto do preâmbulo da Decisão aludir a “procedimentos” não refuta este entendimento, pois procedimento significa um modo de atuar e a atuação relativamente a uma denúncia concreta é também um modo de atuar ou a expressão de um procedimento. O que a Decisão já não refere é procedimentos gerais ou qualquer formulação equivalente que conduzisse à conclusão de que a conduta sancionada se reporta a um “modus operandi abstrato” ou a um “procedimento adotado pelo operador (enquanto realidade genérica)”, ou seja, que se visa uma tutela ainda mais antecipada dos interesses dos consumidores.
375. Por conseguinte, não temos dúvidas em concluir que a prática das contraordenações não se basta com procedimentos gerais – ou seja, com a decisão e com a implementação de atos para a sua execução que contrariem o disposto nos pontos em análise –, mas exige a demonstração do procedimento adotado perante denúncias de consumidores.
376. E, tal como se esclareceu na fundamentação da matéria de facto, têm de ser denúncias de consumidores individualizados, não sendo suficiente uma imputação genérica e indiferenciada, sendo de acrescentar que os pedidos de esclarecimentos solicitados pelos Técnicos da ANACOM nas quatro lojas identificadas nos factos provados não cumprem esse requisito porque não são denúncias por telefone.
377. Importa, por fim, equacionar a possibilidade de punição por tentativa, que está genericamente prevista no artigo 113.º, n.º 12, da LCE. A questão que aqui se coloca é se a mera demonstração de que a NOS decidiu e implementou os procedimentos gerais em causa é suficiente para preencher os elementos típicos da tentativa? Considera-se que mesmo que se admitisse a compatibilidade das infrações em análise com a  punição por tentativa ainda assim se afasta esta possibilidade em concreto, porquanto o preenchimento das hipóteses previstas no artigo 22.º, n.º 2, alíneas b) e c), do CP, ex vi artigo 32.º, do RGCO, implicaria a identificação de denúncias concretas. Efetivamente, só perante denúncias concretas é que se poderia estabelecer o nexo de perigo iminente pressuposto pelos parâmetros legais referidos, pois só aí é que se poderia concluir que a conduta da Recorrente penetrou no âmbito de proteção típico da norma , que pressupõe um objeto de ação individualizado, enquanto expressão, no plano tangível, de um interesse de um consumidor concreto.
378. Poder-se-iam alcançar conclusões diferentes se, por exemplo, a ANACOM ordenasse à NOS que alterasse os seus procedimentos gerais e a Recorrente violasse esta ordem. Contudo, não é isto que se discute nos autos, mas a violação da Decisão de 09.03.2012.
379. Em face de todo o exposto, impõe-se a absolvição da Recorrente quanto a estas contraordenações.
*
380. Da contraordenação por violação do ponto 2.31., alínea a), da Decisão:
381. Mais imputa a ANACOM à Recorrente a prática, a título doloso, de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE, em conjugação com o ponto 2.3.1., alínea a), da Decisão.
382. Estipula o ponto 2.3.1. o seguinte: “As empresas devem aceitar as declarações de denúncia que, cumprindo os requisitos previstos nos números anteriores, sejam comunicadas: a) por via postal ou eletrónica, nomeadamente por telecópia ou correio electrónico, para qualquer um dos contactos divulgados no contrato ou em qualquer outro suporte informativo dirigido ao público”.
383. Entende a ANACOM que a NOS violou estes normativos, porquanto não aceitou denúncias remetidas por via postal para um contacto (Apartado de P...) divulgado ao público através das condições gerais do contrato que constavam na sua página da internet.
384. Por sua vez, pugna a Recorrente pela sua absolvição, alegando que a imputação que lhe é feita enferma de uma relevante incorrecção: não se pode dizer que a Arguida não tenha aceitado as denúncias remetidas para o Apartado de P..., porque ao contrário do que lhe vem imputado, nos casos assinalados na Decisão, a Arguida fez retroagir os efeitos do desligamento dos clientes à data em que os seus pedidos haviam sido recebidos naquele apartado (cf. artigos 143.º a 178.º da decisão impugnada).
385. Nas suas alegações, a ANACOM, refere a propósito deste tema, que: “a circunstância de a Arguida/Recorrente ter alegado que, em 22 daqueles casos, fez produzir os efeitos das denúncias às datas em que foram recebidas no mencionado “Apartado ..., EC P..., 2... ... P...”, não afasta a ilicitude objetiva da sua conduta, pois o que impõe a mencionada determinação é a obrigatoriedade de aceitação de declarações de denúncia que sejam comunicadas, (no caso) por via postal, para qualquer um dos contactos divulgados no contrato ou em qualquer outro suporte informativo dirigido ao público, o que sucedia com o referido Apartado” (artigo 157.º das alegações).
386. Em resposta à comunicação da alteração da qualificação jurídica, a Recorrente veio acrescentar que a deliberação está redigida seguindo a sequência lógica de um procedimento regular de denúncia. No ponto 2.3.1. está previsto o dever de aceitar denúncias regularmente comunicadas. Já nos pontos 2.4.1. e 2.4.2. estão previstos deveres posteriores à aceitação da denúncia, especificamente, o dever de receção e de informar da falta de documentos necessários ao subsequente processamento do pedido.
387. Nesta medida, os deveres constantes do ponto 2.4., por serem posteriores à receção da denúncia, apenas poderão ser violados, em abstrato, se a denúncia tiver sido aceite.
388. Ou seja, só poderá haver um dever de confirmação da receção se esta tiver sido aceite, pois, sem essa aceitação, não haveria nada a confirmar, logo o dever de confirmação não se constitui antes da aceitação do pedido.
389. De outra forma, a violação do ponto 2.3.1. implicaria sempre e necessariamente uma violação dos deveres associados à tramitação subsequente do pedido, o que levaria a uma hipotética violação de um único dever de cuidado na primeira fase do procedimento redundasse na violação automática de uma cascata de deveres que não poderia ser antecipada.
390. Os deveres cuja violação o Tribunal agora imputa à Recorrente pressupõem que não tenha sido violado o dever de aceitação das denúncias, ou seja, precisamente o dever que a Recorrente foi acusada, durante todo o processo, de ter violado.
391. Vejamos.
392. Lida a Decisão de 09.03.2012 há que distinguir três planos: (i) a receção da denúncia; (ii) a aceitação da denúncia; (iii) e a determinação do momento de produção dos efeitos da denúncia.
393. Todos estes planos são tutelados, por via da definição de obrigações específicas e consubstanciam estádios sucessivos de proteção do bem jurídico protegido, traduzido no interesse do consumidor.
394. Assim, resulta da conjugação dos pontos 2.4.1. e 2.4.2, em conjugação com o ponto 2.3.1. que a primeira obrigação do operador é a receção da denúncia remetida por um dos meios de comunicação legalmente previstos e não a aceitação, pois a aceitação pressupõe o cumprimento dos requisitos definidos pelos pontos 2.1. e 2.2... E a sua receção significa que não pode ser devolvida ao consumidor, sendo que, caso a denúncia não cumpra os requisitos definidos nos pontos 2.1.e 2.2., deve ser efetuada a comunicação a que alude o ponto 2.4.2.. Por conseguinte, a devolução da denúncia apresentada por um dos meios de comunicação previstos no ponto 2.3.1. consubstancia uma violação desta ordem contida na Decisão, que resulta dos pontos 2.4.1. e 2.4.2., em conjugação com o ponto 2.3.1..
395. Dir-se-á, mas a violação dos pontos 2.4.1. e 2.4.2. pressupõe o não envio das comunicações aí previstas e a violação do ponto 2.3.1. pressupõe a não aceitação de uma denúncia que cumpra os requisitos plasmados nos pontos 2.1. e 2.2., pelo que a simples devolução da denúncia não é punida.
396. Discorda-se, pois a obrigação de receção resulta claramente dos pontos 2.4.1. e 2.4.2, sendo necessário fazer referência aos dois – sem que daí resulte qualquer imputação alternativa ou dubitativa inconciliável com o direito sancionatório – na medida em que os dois pontos demonstram que, qualquer que seja o estado da denúncia, ou seja, cumpra ou não os requisitos exigidos, deve ser rececionada. Por sua vez, o apelo ao artigo 2.3.1. surge como necessário, porque a apresentação da denúncia por um dos meios aí previstos é o único requisito exigido para o cumprimento da obrigação de receção e também da obrigação subsequente de aceitação.
397. No segundo momento, ao contrário do que alega a Recorrente, surge a obrigação de aceitar a denúncia. A aceitação da denúncia pressupõe não só a apresentação por um meio de comunicação válido, como também o preenchimento dos requisitos previstos nos pontos 2.1. e 2.2. e a sua não aceitação faz o operador incorrer na violação do ponto 2.4.1., da qual também resulta a obrigação de aceitação.
398. No terceiro momento, o operador é obrigado a determinar e aplicar os efeitos da denúncia nos termos previstos no ponto 2.4.6..
399. Nesta medida, a mera não receção da denúncia consuma, de imediato, uma violação da referida obrigação de receção e, nessa medida, uma contraordenação, independentemente de, em momento posterior, o cliente remeter nova denúncia e a operadora fazer retroagir os efeitos à data da primeira. Consequentemente, esta infração, que resulta da conjugação do artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE, com os referidos pontos da Decisão, consubstancia, assim, uma infração de perigo abstrato, cuja consumação não pressupõe a efetiva lesão do interesse do consumidor.
400. Esclarecidos estes parâmetros, conclui-se que, em relação aos vinte e oito casos identificados nos factos provados, a Recorrente violou a referida obrigação de receção, uma vez que as denúncias foram remetidas para um contacto divulgado pela Recorrente nas Condições Gerais disponíveis no seu sítio da Internet.
401. No plano subjetivo, a contraordenação em análise é punida a título de dolo (cf. artigo 8.º, n.º 1, do RGCO) e a título negligente (cf. artigo 113.º, n.º 11, da LCE, na redação vigente à data dos factos, correspondente ao atual artigo 113.º, n.º 12, da LCE).
402. No caso ficou demonstrado que a Recorrente foi negligente, uma vez que os factos ocorreram devido a uma deficiente implementação do procedimento destinado à concentração das denúncias no Apartado de C..., o que é admitido pela própria no recurso de impugnação (cf. artigos 188 a 192 do recurso).
403. A Recorrente, enquanto pessoa coletiva, é responsável por tais factos por força do artigo 3.º, n.ºs 1 e 2, do RQCSC, uma vez que são factos que, pela sua natureza, não poderiam deixar de ter sido praticados por pessoas funcionalmente vinculadas à NOS, no exercício das suas funções e em seu nome.
404. Não se verifica qualquer causa de justificação ou de exclusão da culpa.
405. Quanto ao número de contraordenações praticadas, considera-se, em primeiro lugar, que, face à regra da proibição da reformatio in pejus, prevista no artigo 72.º-A, n.º 1, do RGCO, terá de se aceitar a existência de uma única contraordenação pela violação, nos termos considerados pela ANACOM, uma vez que a determinação de coimas parcelares implicaria cúmulos parcelares, que não estão legalmente previstos.
406. Em face de todo o exposto, conclui-se que a Recorrente praticou, a título negligente, uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) e n.º 11, da LCE, na redação vigente à data dos factos, por violação da obrigação de receção que resulta dos pontos 2.4.1. e 2.4.2, em conjugação com o ponto 2.3.1., alínea a), todos da Decisão da ANACOM de 09.03.2012.
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407. Contraordenação decorrente da violação do ponto 2.4.6. da Decisão, em conjugação com o artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE:
408. Mais imputou a ANACOM à Recorrente a prática de uma contraordenação, a título doloso, por violação do artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE, em conjugação com o ponto 2.4.6. da Decisão, porquanto não aceitou denúncias, por inelegibilidade dos elementos necessários, sendo tal pressuposto errado.
409. Estipula este ponto: “2.4.6. A declaração de denúncia considera-se efetuada na data da sua receção, sempre que cumpra os requisitos previstos nos números 2.1. e 2.2. ou, em caso de falta de informação ou documentação, na data de receção da mesma dentro do prazo previsto no número anterior”.
410. A ANACOM reconduziu esta infração a dezasseis casos individuais, que considerou consubstanciarem uma única contraordenação, e devido ao facto de, em todos eles, a Recorrente não ter aceitado denúncias com fundamento na ilegibilidade dos documentos, pressuposto que não correspondia à verdade.
411. Por sua vez, a Recorrente começa por sustentar, em primeiro lugar, não compreender como é que vem condenada por 16 (dezasseis) casos, quando a Decisão apenas descreve 12 (doze)! Mais acrescenta que se trata, obviamente, de um lapso da ANACOM, que deve ser sindicado por este Tribunal – na realidade, estamos perante 12 (doze) situações, descritas nos factos 31 a 116 (clientes identificados como A a L).
412. Em segundo lugar, defende que a imputação que lhe é feita enferma de uma relevante incorreção: não se pode dizer que a Arguida não tenha aceitado as denúncias remetidas pelos 12 (não 16!) assinantes identificados. De facto, em diversos casos assinalados na Decisão, como resulta da mesma, os assinantes obtiveram o desligamento dos serviços exactamente na data em que tal se verificaria considerando a data do primeiro pedido No caso dos clientes PS... (cf. facto provado 37), JFR... (cf. facto provado 79) e NMC... (cf. facto provado 116), a própria ANACOM reconhece que os clientes não foram prejudicados, tendo sido os seus serviços desligados exactamente na data em que o deveriam ser, considerando as datas em que foram apresentados os seus pedidos de denúncia. Não se vê, nestes casos, qualquer infracção, pois, ao contrário do que se afirma na Decisão, os pedidos de denúncia foram considerados pela Arguida e os serviços daqueles 3 (três) clientes foram desligados em conformidade. Mais assinala o caso do cliente ARG..., cuja facturação indevida foi posteriormente anulada, o que significa que também este cliente não sofreu qualquer prejuízo – cf. facto provado n.º 91. Pelo que, materialmente, após análise, a Arguida considerou válido o pedido de denúncia inicialmente apresentado por aquele cliente. Conclui estarmos perante 4 (quatro) situações que carecem de relevância típica e não chegam sequer a atingir os interesses que a norma visa proteger.
413. Defende a ANACOM, nas alegações, que a Decisão impugnada não incorreu em qualquer erro. Mais acrescenta que é “irrelevante para o preenchimento do tipo objetivo do ilícito que, em alguns daqueles casos, os clientes tivessem obtido o desligamento dos serviços na data em que tal se verificaria se fosse considerado o primeiro pedido de denúncia apresentado, já que o ilícito por que foi condenada, decorrente da conjugação das previsões da alínea bbb) do n.º 3 do artigo 113.º da LCE e do ponto 2.4.6. da Deliberação de 09..03.2012, consubstancia um tipo de perigo abstrato , o que significa que, para a sua verificação objetiva, se torna irrelevante a consumação de determinado resultados (in casu, o prejuízo causado ao assinante), sendo o tipo preenchido através da conduta que consista na mera ação ou omissão do agente que se revele apta a fazer perigar o bem jurídico protegido (não fazendo esse perigo, contudo, parte do elemento do tipo)”.
414. Vejamos.
415. Quanto ao lapso, não há efetivamente nenhum erro. O que se verifica é que, em relação a quatro casos (o de JPG..., MN..., MCB... e AA...) foi imputada à Recorrente não só a violação do ponto em discussão, como também dos pontos 2.4.1. e 2.4.2. por não ter sido enviada qualquer mensagem, sendo que esta segunda imputação não foi confirmada na decisão final. Contudo, manteve-se a primeira.
416. Em relação ao segundo argumento invocado pela Recorrente, resulta das asserções tecidas na análise da contraordenação precedente, que o ponto 2.4.6. reporta-se aos efeitos da denúncia, ou seja, ao terceiro estádio de proteção. A sua violação ocorre quando a operadora recebe a denúncia, aceita a denúncia, mas atribui-lhe efeitos tendo por referência uma data diversa daquela que resulta da aplicação deste ponto.
417. Caso essa atribuição de efeitos resulte do facto de não ter recebido ou aceitado indevidamente uma primeira denúncia, então a operadora, antes mesmo de estar a violar o ponto 2.4.6., está a violar também as obrigações de receção ou de aceitação. Pode igualmente suceder a operadora violar estas obrigações de receção ou de aceitação, mas não violar a obrigação de determinação dos efeitos se, apresentada uma segunda denúncia, os efeitos atribuídos não forem diferentes daqueles que se aplicavam à primeira denúncia.
418. Vejamos o que se verifica em relação aos factos provados.
419. Quanto a …, …, …, …, …, …, …, ..., ficou demonstrado que os documentos apresentados eram ilegíveis, pelo que não se pode concluir pela violação de nenhuma das obrigações referidas.
420. Já relativamente a AT... e MAM..., retira-se dos factos provados que a Recorrente violou efetivamente o ponto 2.4.6. da Decisão, pois os efeitos atribuídos à denúncia associados ao desligamento do serviço ocorreram em 31.12.2012, quando à luz das condições gerais do contrato e da Decisão deveriam ter ocorrido, no máximo, em 31.10.2012. Para além disso, também há violação de obrigação de aceitação, designadamente do ponto 24.1., pois a Recorrente não aceitou, de imediato, a denúncia. É certo que os factos provados não dizem que não foi enviada esta comunicação, mas referência à não aceitação levado implicado este facto.
421. O mesmo se verificou em relação a …, porquanto o desligamento foi efetuado em 31.12.2012, quando deveria ter sido efetuado em 30.11.2012, se a primeira denúncia tivesse sido aceite de imediato.
422. Relativamente ao cliente LS... não se apurou a data do desligamento, pelo que não se pode concluir pela violação do ponto 2.4.6.. Contudo, há violação do ponto 2.4.1., pois a Recorrente não cumpriu a obrigação de aceitação pressuposta pela norma.
423.  No que respeita ao cliente ..., não se mostra violado o ponto 2.4.6., uma vez que os efeitos da denúncia foram os mesmos que teriam sido aplicados caso a primeira denúncia tivesse sido aceite. Contudo, há, neste caso, violação do ponto 2.4.1., ou seja, violação da obrigação de aceitação que está subjacente a este ponto.
424. Relativamente à cliente MN..., a denúncia foi recebida no dia 17.09.2012, pelo que a emissão da fatura de outubro, tendo em conta as condições gerais do contrato, não se mostra incorreta. Nesta medida, não se considera demonstrada a violação do ponto 2.4.6..
425. Quanto à cliente MCB... também não se pode concluir pela violação do ponto 2.4.6., uma vez que não ficou provada a efetivação da denúncia.
426. Por fim, em relação ao cliente AA... o que se pode concluir, face aos factos provados, é apenas que há violação do dever de aceitação. Contudo, quanto a este cliente não há elemento subjetivo, uma vez que a ANACOM construiu o elemento subjetivo nesta parte apenas tomando por referência os casos de inelegibilidades associados aos problemas de digitalização – cf. artigos 196.º e 197.º da decisão impugnada.
427. O aditamento do elemento subjetivo consubstanciaria, neste momento, uma alteração substancial, porquanto transformaria uma factualidade inócua numa contraordenação, sendo evidente, face ao teor da impugnação e sem necessidade de formalidades ociosas, que a Recorrente não aceita que o processo prossiga com a inclusão de tais factos, que não são autonomizáveis dos factos objetivos a que respeitam (cf. artigo 359.º, n.ºs 1 a 3, do Código de Processo Penal, ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO).
428. Em face das asserções precedentes, conclui-se que a Recorrente violou os pontos 2.4.6. e 2.4.1. em relação aos consumidores supra identificados e nos termos referidos.
429. Mais ficou provado que agiu com dolo eventual e com consciência da ilicitude da sua conduta.
430. A Recorrente, enquanto pessoa coletiva, é responsável por tais factos por força do artigo 3.º, n.ºs 1 e 2, do RQCSC, uma vez que são factos que, pela sua natureza, não poderiam deixar de ter sido praticados por pessoas funcionalmente vinculadas à NOS, no exercício das suas funções e em seu nome.
431. Não se verifica qualquer causa de justificação ou de exclusão da culpa.
432. Quanto ao número de contraordenações praticadas, considera-se, em primeiro lugar, que, face à regra da proibição da reformatio in pejus, prevista no artigo 72.º-A, n.º 1, do RGCO, terá de se aceitar a existência de uma única contraordenação pela violação, nos termos considerados pela ANACOM, uma vez que a determinação de coimas parcelares implicaria cúmulos parcelares, que não estão legalmente previstos.
433. Em face de todo o exposto, conclui-se que a Recorrente praticou, a título doloso, uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) e n.º 11, da LCE, na redação vigente à data dos factos, por violação da obrigação de aceitação e de determinação dos efeitos da denúncia que resulta dos pontos 2.4.1. e 2.4.6, todos da Decisão da ANACOM de 09.03.2012.
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434. Da contraordenação por violação da alínea u), do n.º 2, do artigo 113.º, da LCE, na redação em vigor à data dos factos, por violação da alínea g), do n,º 1 e do n.º 2, do artigo 48.º, do mesmo diploma legal:
435. A Anacom imputou esta infração à Recorrente porquanto, em relação a dois clientes (TCA... e …), não informou os clientes do período de fidelização.
436. A Recorrente não impugna a prática destas infrações.
437. Vejamos.
438. Estipula o artigo 113.º, n.º 2, alínea u), da LCE, na redação vigente à data dos factos (que corresponde na redação dada pela Lei n.º 15/2016 e no que ao caso importa à alínea x), que constitui contraordenação o incumprimento, entre o mais, das obrigações previstas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 48.º.
439. À data dos factos e atualmente, estipulava e continua a estipular o artigo 48.º, n.º 1, alínea g), da LCE, o seguinte: sem prejuízo da legislação aplicável à defesa do consumidor, a oferta de redes de comunicações públicas ou serviços de comunicações electrónicas acessíveis ao público é objecto de contrato, do qual devem obrigatoriamente constar, de forma clara, exaustiva e facilmente acessível, os seguintes elementos: a duração do contrato, as condições de renovação, de suspensão e de cessação dos serviços e do contrato.
440. Por sua vez, preceituava o artigo 48.º, n.º 2, na redação vigente à data dos factos, o seguinte: a informação relativa à duração dos contratos deve incluir indicação da existência de períodos contratuais mínimos associados, designadamente, à oferta de condições promocionais, à subsidiação do custo de equipamentos terminais ou ao pagamento de encargos decorrentes da portabilidade de números e outros identificadores, bem como indicar eventuais encargos decorrentes da cessação antecipada do contrato por iniciativa do assinante, nomeadamente em consequência da recuperação de custos associados à subsidiação de equipamentos terminais.
441. Atualmente e mercê da Lei n.º 15/2016, o artigo 48.º, n.º 2, da LCE, tem o seguinte teor: 2 - A informação relativa à duração dos contratos, incluindo as condições da sua renovação e cessação, deve ser clara, percetível, disponibilizada em suporte duradouro e incluir as seguintes indicações: a) Eventual período de fidelização, cuja existência depende da atribuição de qualquer vantagem ao consumidor, identificada e quantificada, associada à subsidiação de equipamentos terminais, à instalação e ativação do serviço ou a outras condições promocionais; b) Eventuais encargos decorrentes da portabilidade dos números e outros identificadores; c) Eventuais encargos decorrentes da cessação antecipada do contrato durante o período de fidelização, por iniciativa do assinante, nomeadamente em consequência da recuperação de custos associados à subsidiação de equipamentos terminais, à instalação e ativação do serviço ou a outras condições promocionais. Relativamente ao período de fidelização não há alteração da identidade típico-normativa entre as duas redações que se sucederam no tempo.
442. A indicação destas especificações no contrato é um direito do assinante, nos termos do artigo 39.º, n.º 3, alínea g), da LCE.
443. Não obstante a Recorrente não impugnar a prática destas infrações considera-se que a factualidade apurada não preenche os elementos típicos da contraordenação imputada. Vejamos porquê.
444. A informação relativa à existência de períodos contratuais mínimos associados só deve ser transmitida se for acordada e nos termos em que for acordada, porque, caso não tenha sido acordada, simplesmente não existe, pois para ter existência jurídica tem de existir convergência entre as declarações de vontade do operador e do consumidor, na medida em que a lei não impõe a existência de períodos mínimos de contratação e é uma condição que não pode ser imposta unilateralmente.
445. Dito isto, verifica-se, quanto a TCA..., que não foi celebrado qualquer contrato de adesão para a alteração contratual e não se retira dos factos provados que tenha sido acordado, por qualquer outra forma nomeadamente verbal, um qualquer período de fidelização. Nesta medida, não tinha de ser transmitida qualquer informação sobre o mesmo. É certo que a NOS mais tarde invocou um período de fidelização, mas isso não significa que tenha sido contratualizado, porque não foi, nem a NOS podia definir essa condição contratual unilateralmente.
446. Quanto a AF… foi acordado um período de fidelização de 12 meses, não se conseguindo retirar dos factos provados que o contrato celebrado estipulasse um período superior. É certo que a NOS invocou mais tarde um período de 24 meses, mas isso não significa que fosse o período que tivesse sido acordado e que tinha de ser objeto de informação.
447. Nesta medida, não há violação do artigo 48.º, n.º 1, alínea g) e n.º 2, da LCE, porque não é a NOS que define unilateralmente os períodos de fidelização, tendo de existir convergência de vontades. Por conseguinte, a exigência pela Recorrente de períodos de fidelização não acordados ou acordados em moldes diferentes não viola o disposto no citado preceito, que se destina a garantir o esclarecimento das obrigações assumidas pelos dois contraentes e não protege o consumidor de todos os comportamentos que o operador vem a adotar, no futuro, em violação unilateral do que foi contratado.
448. Na verdade, o que se verifica é a violação do disposto no artigo 7.º, n.º 1, do DL n.º 57/2008, de 26.03, que também consubstancia uma contraordenação por força do artigo 21.º, n.º 1, ambos do DL n.º 57/2008.
449. Assim, estipula o artigo 21.º, n.º 1, no que ao caso importa, que a violação do artigo 7.º, n.º 1, do diploma, é punida com coima.
450. Por sua vez, preceitua o artigo 7.º, n.º 1, que é enganosa a prática comercial que contenha informações falsas ou que, mesmo sendo factualmente correctas, por qualquer razão, nomeadamente a sua apresentação geral, induza ou seja susceptível de induzir em erro o consumidor em relação a um ou mais dos elementos a seguir enumerados e que, em ambos os casos, conduz ou é susceptível de conduzir o consumidor a tomar uma decisão de transacção que este não teria tomado de outro modo.
451. O diploma sofreu alterações em 2015, introduzidas pelo DL n.º 205/2015, de 23.09, mas que não modificaram os preceitos indicados.
452. O corpo do artigo 7.º, n.º 1, prevê duas condutas distintas: informações falsas, por um lado; e informações que induzam ou sejam suscetíveis de induzir em erro, por outro lado.
453. Em relação às informações falsas, a conduta exige os seguintes elementos objetivos típicos: (i) prática comercial, que, nos termos do artigo 3.º, alínea d), inclui qualquer acção, omissão, conduta ou afirmação de um profissional, incluindo a publicidade e a promoção comercial, em relação directa com a promoção, a venda ou o fornecimento de um bem ou serviço ao consumidor; (ii) que contenha informações falsas; (iii) e que conduz ou é suscetível de conduzir o consumidor a tomar uma decisão de transação que este não teria tomado de outro modo.
454. A decisão de transação consiste, nos termos do artigo 3.º, alínea l), do diploma, na decisão tomada por um consumidor sobre a questão de saber se, como e em que condições adquirir, pagar integral ou parcialmente, conservar ou alienar um produto ou exercer outro direito contratual em relação ao produto, independentemente de o consumidor decidir agir ou abster-se de agir.
455. A infração não exige que a informação falsa incida sobre um dos elementos enumerados no artigo 7.º, n.º 1, elementos esses que apenas se aplicam ao segundo tipo de conduta referido. E conclui-se, nestes termos, com base no elemento literal, no elemento teleológico e no elemento histórico de interpretação, não resultando dos elementos sistemático e da unidade do ordenamento jurídico nenhum argumento em sentido contrário.
456. Assim, quanto ao elemento literal, o preceito é inequívoco quanto à consagração de duas condutas distintas, ao utilizar a conjugação “ou” e ao fazer uso, quanto ao último elemento típico, da expressão “em ambos os casos”. Para além disso, a referência aos elementos enumerados nas várias alíneas do artigo 7.º, n.º 1, do DL n.º 57/2008, consubstanciam o verbo e o complemento direto da segunda oração, relativa às informações factualmente corretas, sem relação sintática com o verbo e o complemento direto da primeira oração, que se reporta às informações falsas. Por fim, a última oração introduz o único elemento comum às duas primeiras por via da referida expressão “em ambos os casos”. Conclui-se, assim, não só que o elemento literal conduz à interpretação sufragada, como também que esta interpretação é o único sentido com o mínimo de correspondência com a letra da lei.
457. No que respeita ao elemento teleológico, compreende-se a distinção, em termos de tipicidade, entre as informações falsas e as informações factualmente corretas que induzem ou sejam suscetíveis de induzir em erro, uma vez que as primeiras comportam um potencial de dano mais elevado, do que as segundas. Razão pela qual se exige, quando a estas, que o erro incida sobre determinados elementos.
458. Quanto ao elemento histórico, o preceito segue a estrutura da norma da Diretiva n.º 2005/29/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, que lhe deu origem (cf. artigo 6.º, n.º 1, corpo).
459. Ainda em complemento dos elementos típicos objetivos da conduta, importa referir que consumidor é, nos termos do artigo 3.º, alínea a), do diploma, qualquer pessoa singular que, nas práticas comerciais abrangidas pelo presente decreto-lei, atue com fins que não se incluam no âmbito da sua atividade comercial, industrial, artesanal ou profissional. Por fim, a suscetibilidade de indução do consumidor em erro deve ser aferida, à luz do critério previsto no artigo 5.º, n.º 2, ou seja, utilizando-se como referência o consumidor médio, ou o membro médio de um grupo, quando a prática comercial for destinada a um determinado grupo de consumidores.
460. No plano subjetivo, a infração em análise é punida a título de dolo, nos termos gerais do artigo 8.º, n.º 1, do RGCO, e 14.º, do Código Penal (CP), ex vi artigo 32.º, do RGCO, ou a título de negligência, em conformidade com o artigo 21.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 57/2008.
461. Nos casos identificados, considera-se que o envio de faturas a reclamar quantias pela cessação do contrato, referente a incumprimento contratual, era suscetível de levar os consumidores a manter os contratos, tal como a qualquer consumidor médio, pois a solicitação do pagamento por escrito induz seriedade no propósito de cobrança e os encargos de cessação de um contrato, em valores não desprezíveis como é o caso, são relevantes ou podem determinar a decisão de o manter ou cessar. Acresce ainda que poderiam levar os consumidores a pagar as quantias solicitadas.
462. Mais ficou demonstrado que a Recorrente agiu com negligência, ainda que inconsciente, pois não agiu de modo a assegurar que, em todos os casos, a informação concretamente prestada aos clientes acerca do período contratual mínimo coincidia com aquela constante do seu sistema, gerada automaticamente, considerando-se afirmada a capacidade para proceder de outra forma face, entre o mais, à não impugnação da imputação negligente.
463. A Recorrente, enquanto pessoa coletiva, é responsável pela prática da infração por força do artigo 7.º, do RGCO.
464. Quanto ao número de infrações praticadas e levando em conta o disposto no art. 30º, n.º 1, do CP, aplicável ao ilícito de mera ordenação social por força do art. 32º, do RGCO , conclui-se que a Recorrente violou duas vezes o disposto no artigo 7.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 57/2008, não existindo um único sentido autónomo de ilicitude, porquanto, não obstante as infrações partilharem o facto de terem resultado da violação do mesmo dever objetivo de cuidado, a sua conduta atingiu consumidores distintos e cada consumidor assume, no âmbito de proteção assegurado pelo Decreto-Lei n.º 57/2008, um sentido de ilícito autónomo.
465. Em face do exposto, conclui-se que a Recorrente praticou, a título negligente e em concurso efetivo, duas contraordenações previstas e punidas pelos artigos 7.º, n.º 1, e 21.º, n.º 1 e 4, ambos do Decreto-Lei n.º 57/2008.
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Sanções
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466. A coima funciona como uma “mera «admonição», como mandato ou especial advertência conducente à observância de certas proibições ou imposições legislativas” . Por conseguinte, devem ser estranhas à aplicação e determinação da medida da coima exigências de “retribuição ou expiação de uma culpa ética” , bem como de ressocialização do agente , pelo que esta sanção “desempenha uma função geral negativa e de prevenção especial negativa” .
467. A coima funciona como uma “mera «admonição», como mandato ou especial advertência conducente à observância de certas proibições ou imposições legislativas” . Por conseguinte, devem ser estranhas à aplicação e determinação da medida da coima exigências de “retribuição ou expiação de uma culpa ética” , bem como de ressocialização do agente , pelo que esta sanção “desempenha uma função geral negativa e de prevenção especial negativa” .
468. Estes fins devem ser alcançados, quanto às contraordenações previstas no DL n.º 57/2008, à luz dos critérios previstos no artigo 18.º, do RGCO, e quanto às contraordenações previstas na LCE, em função adicionalmente dos critérios enunciados no art. 5º, da Lei nº 99/2009, ex vi art. 1º/3, al j), deste diploma, designadamente a ilicitude concreta do facto, a culpa do agente, os benefícios obtidos com a prática da contraordenação e das exigências de prevenção, tendo ainda em conta a natureza singular ou coletiva do agente. Na determinação da ilicitude concreta do facto e da culpa das pessoas coletivas deve-se atender, entre outras, às seguintes circunstâncias: ao perigo ou ao dano causados;  ao carácter ocasional ou reiterado da infração;  a existência de atos de ocultação tendentes a dificultar a descoberta da infração;  a existência de atos do agente destinados a, por sua iniciativa, reparar os danos ou obviar aos perigos causados pela infração.
469. Ainda, quanto à culpa, entendida no ilícito de mera ordenação social como “uma imputação do facto à responsabilidade social do seu autor”  e não como “uma censura ética, dirigida à pessoa do agente e à sua atitude interna” , deve-se atender à medida da responsabilidade exigível à arguida.
470. Relevam também a situação económica e a conduta anterior do agente – cfr. arts. 18º/1, do RGCO, e 5º/4, da Lei nº 99/2009.
471. São ainda de considerar todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo, deponham a favor ou contra o arguido, nos termos previstos no art. 71º/2, do CP, ex vi art. 32º, do RGCO.
472. Importa ainda reiterar que o Tribunal está vinculado ao princípio da proibição da reformatio in pejus – cf. art. 72º-A/1, do RGCO.
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473. No que respeita à contraordenação relativa à não receção de denúncias remetidas para o Apartado de P..., a moldura legal abstrata é de € 10.000 a € 2.500.000 – cf. artigo 113.º, n.º 8, alínea e), da LCE na redação vigente à data dos factos, correspondente ao atual artigo 113.º, n.º 9, alínea e), da LCE, e artigos 4.º e 7.º, n.º 6, alínea d), ambos do RQCSC (considerando não existirem razões para crer que os fatores verificados em 2012 se tenham modificado de forma relevante para este efeito).
474. Uma coima de € 50.000 é adequada, necessária e suficiente. Assim, é proporcional à gravidade dos factos, tendo em conta, em primeiro lugar, que incide sobre a criação de obstáculos à denúncia dos contratos, destinando-se as normas respetivas a salvaguardar interesses jurídicos protegidos muito relevantes, porque associados com a mobilidade dos consumidores e, nessa medida e reflexamente, com a concorrência, que é uma garantia de maior qualidade e melhores preços. Em segundo lugar, a conduta incluiu 28 denúncias concretas, sendo cada consumidor importante para efeitos de definição do sentido de ilicitude.
475. A coima referida é também compatível com a culpa da Recorrente, que se enquadra na negligência grosseira, pois revela deficiência na definição de procedimentos minimamente eficazes.
476. É também necessária do ponto de vista das exigências de prevenção geral e especial, tendo em conta, por um lado, a notoriedade da Recorrente o seu posicionamento no mercado e, por outro lado, a sua dimensão e o potencial de afetação do interesse protegido, face ao seu universo de clientes.
477. Por fim, a coima é significativamente próxima do limite mínimo e, nessa medida, reflete todos os fatores que lhe são favoráveis, designadamente: o benefício económico obtido terá sido diminuto, uma vez que a maioria dos clientes logrou obter a aceitação das suas denúncias, com efeitos à data da primeira; e não ficou demonstrada a intenção de causar danos, nem tentativas de ocultação dos factos. 
478. Mostra-se igualmente compatível com a sua situação económica.
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479. No que respeita à contraordenação relativa às denúncias não ilegíveis, a moldura legal abstrata é de € 20.000 a € 5.000.000 – cf. artigo 113.º, n.º 8, alínea e), da LCE na redação vigente à data dos factos, correspondente ao atual artigo 113.º, n.º 9, alínea e), da LCE, e artigos 4.º e 7.º, n.º 6, alínea d), ambos do RQCSC (considerando não existirem razões para crer que os fatores verificados em 2012 se tenham modificado de forma relevante para este efeito).
480. Uma coima de € 50.000 é adequada, necessária e suficiente. Assim, é proporcional à gravidade dos factos e compatível com a culpa da Recorrente, tendo em conta, tal como referido a propósito da primeira contraordenação, que incide sobre a criação de obstáculos à denúncia dos contratos e, pese embora incida sobre menos casos que a anterior infração, a Recorrente agiu com dolo eventual. O que se reflete também nas exigências de prevenção especial, impondo-se que a Recorrente institua procedimentos internos estritos no sentido da aferição sempre e em todos os casos da digitalização com os originais arquivados, sempre que os documentos digitalizados sejam ilegíveis.
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481.     Por fim, quanto às contraordenações por violação do artigo 7.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 57/2008, a moldura legal a considerar é de € 1.500 a € 22.445,91 (cf. artigo 21.º, n.ºs 1 e 4, do mesmo diploma).
482.     Considera-se necessária, adequada e suficiente uma coima de € 3.500 relativamente a cada uma das infrações. Tal montante, sendo bastante mais próximo do limite mínimo do que do limite máximo reflete os fatores favoráveis à Recorrente, designadamente: o facto dos clientes não terem efetivamente tomado uma decisão de transação; a inexistência de benefício económico; e a circunstância das quantias peticionadas não serem muito elevadas. Em contrapartida, impõe-se uma coima com algum distanciamento em relação ao montante mínimo e com potencial intimidatório, pelas seguintes razões: as informações falsas ao incidirem sobre quantias a pagar, que é um dos fatores que mais condiciona a vontade contratual, e relacionadas com a cessação do contrato e com os interesses jurídicos referidos revelam um grau de ilicitude não despiciendo, razão pela qual as coimas são proporcionais à gravidade dos factos; no plano da culpa, é significativa, pois é empresa de grande dimensão, com um universo de clientes muito elevado e falhas a este nível têm um potencial de dano significativo, pelo que as coimas aplicadas são suportadas pela sua culpa; por fim, sendo a Recorrente uma empresa com forte implantação no mercado, as exigências de prevenção geral e especial são expressivas. Por fim, as coimas aplicadas ajustam-se à sua situação económico-financeira.
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483. Apuradas as sanções concretas, importa proceder ao cúmulo nos termos previstos no art. 19º, do RGCO, ou seja, a moldura legal abstrata não pode ser inferior a € 50,000 (cfr. art. 19º/3, do RGCO), nem pode ser superior a € 107.000,00 (cfr. art. 19º/1, do RGCO).
484. Na determinação da coima única deve-se atender à “apreciação conjunta dos factos e da responsabilidade social-adscritiva do agente” . Considerando que os factos estão relacionados com a criação de obstáculos às denúncias contratuais, que protegem um interesse muito relevante, entende-se adequada uma coima mais próxima do limite máximo, designadamente € 90.000,00.
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Dispositivo
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Em face de todo o exposto, julgo o recurso parcialmente procedente nos seguintes termos:
I. Julgo improcedente a questão prévia invocada pela Recorrente;
II. Absolvo a Recorrente pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da Lei das Comunicações Eletrónicas (LCE), pela não aceitação de pedidos de denúncia contratual por telefone, apesar de dispor de um sistema de validação do utilizador.
III. Absolvo a Recorrente pela prática de uma contraordenação pela violação dolosa do estatuído no ponto 2.4.5. da DECISÃO, em conjugação com o disposto no artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, relativa ao envio de SMS aos clientes que lhe apresentam pedidos de denúncia incorretamente instruídos, não indicar o prazo de 30 dias úteis para o envio da documentação em falta, sob pena de caducidade da declaração de denúncia.
IV. Absolvo a recorrente pela prática de uma contraordenação pela violação dolosa do estatuído no ponto 2.4.5. da DECISÃO em conjugação com o disposto no artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, resultante do facto de o SMS que envia aos clientes que denunciaram os contratos não os informar, com caráter concreto, das obrigações emergentes da denúncia.
V. Condeno a Recorrente numa coima no valor de 50.000,00 euros (cinquenta mil euros), pela prática, a título negligente, da contraordenação prevista e punida no artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, em conjugação com os pontos 2.4.1. e 2.4.2., e estes com o ponto 2.3.1. a) da DECISÃO DA ANACOM DE 09.03.2012 por não ter recebido pedidos de denúncia apresentados num endereço por si divulgado ao público.
VI. Numa coima no valor de 50.000,00 euros (cinquenta mil euros), pela prática, a título doloso, de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, em conjugação com os pontos 2.4.1. e 2.4.6. da Decisão da ANACOM de 09.03.2012, ao não ter aceitado e/ou determinado os seus efeitos nas datas em que as recebeu, denúncias contratuais legíveis, corretamente instruídas e remetidas nos termos da Decisão.
VII. Em duas coimas no valor de 3.500,00 euros (três mil e quinhentos euros) cada pela prática, em concurso efetivo e a título negligente, de duas contraordenações previstas e punidas pelos artigos 7.º, n.º 1, e 21.º, n.º 1 e 4, ambos do Decreto-Lei n.º  57/2008, de 26.03, por não ter informado dois clientes acerca dos períodos contratuais mínimos a que os mesmos, segundo ela, estariam vinculados.
VIII. Na coima única de 90.000,00 euros (noventa mil euros).
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Custas pela arguida, fixando-se a taxa de justiça em quatro e meia (4,5) unidades de conta – cf. arts. 8º/7, e tabela III anexa ao Regulamento das Custas Processuais e arts. 93º/3 e 94º/3, ambos do RGCO.
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Importa analisar, agora, cada um dos fundamentos suscitados pelas recorrentes, sabendo-se, porém, que nos termos do Art.º 75.º, n.º 1, do DL 433/82 de 27/10 (RGCOA), em sede contra-ordenacional esta instância conhece, em regra, da matéria de direito e, salvo os casos previstos no Art.º 410.º, n.º 2, do Código do Processo Penal, está vedado a este Tribunal sindicar o julgamento em matéria de facto, pelo que deve ater-se à que se mostra assente na decisão impugnada.
(i) Da aventada nulidade da sentença impugnada, nos termos do Art.º 379.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal (CPPenal), ex vi Art.º 41.º, n.º 1, do Regulamento Geral das Contra-Ordenações (RGCO), por alteração da qualificação jurídica e alteração substancial de factos (alteração do enquadramento jurídico realizada pelo tribunal a quo, relativa aos factos sobre a não aceitação de denúncias no Apartado de P...) e eventual inconstitucionalidade da interpretação do Art.º 358.º, n.º 3, do CPPenal, por violação dos direitos de defesa e do princípio da estrutura acusatória do processo penal – Art.º 32.º, n.ºs 1 e 5, da Constituição da República Portuguesa (CRPortuguesa) [NOS – Comunicações].
Na sua motivação de recurso e nas conclusões que o finalizam, a arguida NOS – Comunicações defende que a alteração da qualificação jurídica da contra-ordenação referente à devolução das denúncias remetidas para P... modifica o sentido problemático do caso e prejudica gravemente os direitos de defesa da arguida, que pautou toda a estratégia processual de acordo com uma determinada narrativa acusatória. Mais alegando que a estratégia da defesa foi inequivocamente afectada ao ser-lhe imputada a violação de novos deveres. Nessa senda, refere que o tribunal a quo alterou, ou pelo menos reconfigurou, a base factual pela qual a arguida vinha condenada, e, condenou a mesma, com base nessa nova realidade factual, pela prática de um ilícito contra-ordenacional que resulta, não apenas da conjugação do ponto 2.3.1. a) da Deliberação com o Art.º 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE, mas ainda da conjugação daquele ponto da Deliberação com os pontos 2.4.1. e 2.4.2. da mesma. Pelo que, nesse entendimento, a referida alteração corresponde a uma alteração substancial dos factos, o que implica a nulidade da sentença, nos termos do Art.º 379.º n.º 1 al. b) do Código de Processo Penal (CPP), ex vi art. 41.º n.º 1 do Regime Geral das Contra-Ordenações (RGCO). E, ainda que assim não se entenda, defende mais ainda, é insofismável que a alteração em apreço representa uma violação dos direitos de defesa da arguida e da estrutura acusatória do processo sancionatório. Na verdade, face a essa posição, defende esta recorrente que tal interpretação normativa do Art.º 358.º n.º 3 do CPP, no sentido de que o Tribunal pode modificar de forma ilimitada o sentido de ilicitude dos factos constantes da acusação, seria materialmente inconstitucional por violação dos direitos de defesa do arguido e do princípio da estrutura acusatória do processo penal, consagrados, respectivamente, no Art.º 32.º n.º 1 e n.º 5 da Constituição da República Portuguesa (CRP). Alega, assim, em conclusão, que acresce que os novos factos pelos quais a arguida vem agora condenada – não recepção de denúncias -, são factos atípicos, i.e., não são puníveis ao abrigo das disposições da Deliberação, designadamente ao abrigo do novo ilícito contra-ordenacional construído pelo tribunal a quo, que resulta da conjugação dos pontos 2.3.1. a), 2.4.1. e 2.4.2. da Deliberação com o Art.º 113.º n.º 3 al. bbb) e n.º 11 da LCE.
Cumpre apreciar, fazendo primeiro recurso à diversa configuração dos factos e do direito face à decisão final administrativa e à sentença recorrida.
A factualidade dada como provada na decisão condenatória da ANACOM referente à devolução das denúncias contratuais remetidas para o Apartado de P... – e que consta dos factos provados 18.º a 30.º, 195.º e 203.º (fls. 1146-1149, 1166 e 1168) -, corresponde à factualidade dada como provada na sentença recorrida, nos pontos 47. a 62. e 206 (fls. 1655-1660 e 1674), com as seguintes excepções:
(i) enquanto a ANACOM imputou a infracção à arguida a título de dolo directo (facto provado 195, fls. 1166), o tribunal a quo imputou-o a título de negligência inconsciente (ponto 62, fls. 1660), acolhendo em parte o sustentado pela defesa.
(ii) o tribunal a quo deu como provado que, em relação a 22 dos 28 clientes, a arguida fez produzir os efeitos das denúncias remetidas para o Apartado de P... à data em que as mesmas foram ali recebidas (cfr. ponto 61, fls. 1660), acolhendo aí também o sustentado pela defesa.
Quer na decisão final administrativa quer na sentença recorrida é dado como provado que:
- “Pelo menos até 03.06.2013, a Arguida divulgou aos seus clientes, através das Condições Gerais disponíveis no seu sítio da Internet, o Apartado de P... como morada para recepção de quaisquer comunicações escritas”, correspondendo ao facto provado 18.º da decisão administrativa, a fls. 1146, e, ao ponto 48 da sentença, a fls. 1655.
- “a Arguida não aceitou as denúncias remetidas para a morada Apartado ..., EC P..., 2...-9.. P...” (o sublinhado é da signatária), correspondendo ao facto provado 22.º da decisão administrativa, parte final, a fls. 1149, e, ao ponto 52 da sentença, a fls. 1656.
- “Nos 28 (vinte e oito) casos acima elencados, a Arguida informou os respectivos clientes que as denúncias deveriam ser remetidas para a morada Apartado ... EC C... 1... 5.. L...”, correspondendo ao facto provado 24.º da decisão administrativa, a fls. 1149, e, ao ponto 54 da sentença, a fls. 1659.
- “A Arguida não iniciou os 28 (vinte e oito) procedimentos de denúncia que lhe foram comunicados para a morada Apartado ..., EC P..., 2...-9.. P...” (o sublinhado é da signatária), correspondendo ao facto provado 25.º da decisão administrativa, a fls. 1149, e, ao ponto 55. da sentença, a fls. 1659.
 Resulta do exposto, por isso, que não ocorreu qualquer alteração substancial dos factos descritos na decisão administrativa da ANACOM.
Com base na mesma factualidade (com as excepções supra referidas):
1) a ANACOM imputou à arguida o ilícito contra-ordenacional previsto no ponto 2.3.1. a) da Deliberação em conjugação com o Art.º 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE;
2) o tribunal a quo imputou à arguida um ilícito contra-ordenacional resultante da conjugação do previsto nos pontos 2.3.1. a), 2.4.1. e 2.4.2. da Deliberação com o Art.º 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE.
Dispõem os referidos pontos da Deliberação o seguinte:
“2.3.1. As empresas devem aceitar as declarações de denúncia que, cumprindo os requisitos previstos nos números anteriores, sejam comunicadas: a) por via postal (…) para qualquer um dos contactos divulgados no contrato ou em qualquer outro suporte informativo dirigido ao público (…)”.
“2.4.1. Recebida uma declaração de denúncia nos termos previstos nos números 2.3. e sempre que a mesma cumpra os requisitos fixados nos números 2.1. e 2.2., as empresas devem, no prazo de cinco dias úteis a contar da data da sua receção, confirmar a denúncia do(s) serviço(s) ou do contrato”.
“2.4.2. Recebida uma declaração de denúncia nos termos previstos no número 2.3. e sempre que a mesma não cumpra os requisitos fixados nos números 2.1. e 2.2., as empresas devem, no prazo de três dias úteis a contar da data da sua receção, solicitar ao assinante o envio da informação ou documentação em falta”.
Concorda-se com a arguida/recorrente NOS – Comunicações, quando a mesma declara que o enquadramento jurídico correcto dos factos em apreço é o efectuado pela ANACOM (vd. conclusão p) do recurso da arguida, a fls. 1801), concretamente na parte em que tal autoridade administrativa reconduz os factos apenas e tão só à violação do ponto 2.3.1. a) da Deliberação. Sendo que essa apreciação também será realizada no ponto (iii) à frente em análise.
A mesma recorrente/arguida NOS - Comunicações deveria ter aceitado as 28 denúncias contratuais enviadas pelos seus clientes, por via postal, para a morada “Apartado ..., EC P..., 2...-9.. P...”, pois que a mesma constava do sítio da Internet da arguida como morada para recepção de quaisquer comunicações escritas.
Ao ter procedido à devolução das 28 denúncias aos respectivos clientes, informando-os que as denúncias deveriam ser remetidas para outra morada, a arguida NOS não aceitou pois as denúncias remetidas para o Apartado de P....
Nessa apreciação linear, cremos que o enquadramento jurídico dos factos em análise deverá ser mais simples do que o sustentado na sentença recorrida. Do que se retirarão as devidas conclusões no ponto (iii) seguinte.
No ponto 2.3.1. al. a) prevê-se o dever de aceitar denúncias regularmente comunicadas para um contacto divulgado pelo operador, e, nos pontos 2.4.1. e 2.4.2. prevêem-se deveres posteriores à aceitação, concretamente, o dever de confirmar a denúncia dos serviços ou do contrato (caso a denúncia esteja correctamente instruída) e o dever de solicitar ao cliente o envio de informação ou documentação em falta (caso a denúncia não esteja correctamente instruída).
Todavia, ao contrário do que sustenta a mesma arguida/recorrente NOS - Comunicações, o enquadramento jurídico/a construção jurídica do tribunal a quo não alterou ou reconfigurou a base factual de que a arguida vinha condenada, pois que não foi feito constar da factualidade dada como provada que em relação a determinado número dessas 28 denúncias a arguida deveria, no prazo de cinco dias úteis a contar da sua recepção, ter confirmado essas denúncias, nem foi feito constar que relativamente a determinado número dessas 28 denúncias deveria, no prazo de três dias úteis a contar da sua recepção, ter solicitado aos clientes o envio da informação ou documentação em falta.
Admite-se que o enquadramento jurídico do tribunal a quo seja indutor da conclusão de que a arguida terá violado três distintos deveres invés de apenas um, contudo, dado que tal enquadramento jurídico não encontra correspondência na factualidade dada como provada, o que está aqui em causa não é uma alteração substancial de factos mas uma mera incorrecta aplicação do direito ao caso concreto que será oportunamente corrigida por esta instância de recurso.
Não constando da factualidade dada como provada factos novos que sustentem a violação concreta do dever de confirmar a denúncia ou a violação concreta do dever de solicitar ao cliente o envio de elementos em falta, inexistem factos que a defesa não tenha tido oportunidade de refutar. Não ocorreu pois qualquer violação dos direitos de defesa da arguida ou da estrutura acusatória do processo sancionatório na fase judicial.
O Art.º 1.º do CPPenal, aqui aplicável em termos subsidiários (Art.º 41.º, n.º 1, do RGCO), contém na sua alínea f) a definição do que se entende por alteração substancial dos factos.
Alteração substancial dos factos é “aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis”.
Daqui resulta que, qualquer alteração dos factos que não implique a imputação de crime (leia-se contra-ordenação) diverso(a) ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis, é uma alteração não substancial dos factos.
Estatui o Art.º 358.º do CPPenal, relativo à alteração não substancial de factos descritos na acusação ou na pronúncia, o seguinte:
 «1. Se no decurso da audiência se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, com relevo para a decisão da causa, o presidente, oficiosamente ou a requerimento, comunica a alteração ao arguido e concede-lhe, se ele o requerer, o tempo estritamente para a preparação da defesa.
2. Ressalva-se do disposto no número anterior o caso de a alteração ter derivado de factos alegados pela defesa.
3. O disposto no nº 1 é correspondentemente aplicável quando o tribunal alterar a qualificação jurídica dos factos descritos na acusação ou na pronúncia.»
O Art.º 359.º reporta-se, por seu turno, à alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, tendo sofrido relevantes alterações com a revisão introduzida pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, estabelecendo a distinção entre factos novos autonomizáveis e não autonomizáveis.
A questão fundamental em causa no âmbito da alteração dos factos (e da qualificação jurídica) é, ainda, a afirmação da estrutura acusatória do processo que deve ter o seu objecto balizado pela acusação ou pela pronúncia, quando a houver.
Quer isto dizer que a acusação (ou a pronúncia) define e delimita o objecto do processo, fixando o thema decidendum, sendo o elemento estruturante de definição desse objecto, não podendo o tribunal promovê-lo para além dos limites daquela, nem condenar para além desses limites, o que constitui uma consequência da estrutura acusatória do processo penal.
No entanto, como refere Germano Marques da Silva, «por razões de economia processual, mas também no próprio interesse da paz do arguido, a lei admite geralmente que o tribunal atenda a factos ou circunstâncias que não foram objecto da acusação, desde que daí não resulte insuportavelmente afectada a defesa, enquanto o núcleo essencial da acusação se mantém o mesmo», (cfr. Curso de Processo Penal, Lisboa, Verbo, III, 2.ª edição, p. 273).
Tem sido, pela jurisprudência considerado que não existe uma alteração dos factos integradora do Art.º 358.º, quando a factualidade dada como provada no acórdão condenatório consiste numa mera redução daquela que foi indicada na acusação ou da pronúncia, por não se terem dado como assentes todos os factos aí descritos (cfr. Ac. Tribunal Constitucional n.º 330/97 in DR II 1997/Jul./03).
O mesmo sucede quando apenas existam alterações de factos relativos a aspectos não essenciais, manifestamente irrelevantes para a verificação da factualidade típica ou da ocorrência de circunstâncias agravantes – cfr. Ac. STJ de 1991//Abr./03, 1992/Nov./11 e 1995/Out./16  in BMJ 406/287, 421/309, www.dgsi.pt.
Também tal não ocorrerá quando se tratar de uma simples descrição do contexto temporal e do ambiente físico em que a acção do arguido se desencadeou, quando o mesmo não é mais do que a reafirmação ou a ilação explícita de factos que sinteticamente já se encontravam narrados na acusação ou na pronúncia – assim, no Ac. TC n.º 387/2005, de 2005/Jul./13, in DR II 2005/Out./19.
Não se poderá falar, do mesmo modo, de alteração dos factos com relevo para a decisão, quando a decisão condenatória se sustenta «exclusivamente nos factos constantes da acusação e da contestação e o recorrente não foi surpreendido com os factos, dadas as considerações que precedem (cfr. o Acórdão do STJ de 23/6/2005, processo n.º 1301/05, Colectânea de Jurisprudência, 184, Tomo 2, /2005).
Daí que se possa dizer, que “só constitui alteração substancial dos factos a modificação que se reporte a factos constitutivos do crime e a factos que tenham o efeito de imputação de um crime punível com uma pena abstracta mais grave. A modificação dos restantes factos que constem da acusação ou da pronúncia constitui alteração não substancial dos factos, desde que sejam relevantes para a decisão da causa” e que “(…) não há crime diverso em face da mera alteração das circunstâncias da execução do crime (incluindo o dia, hora, local, modo de execução e instrumento do crime), desde que essas circunstâncias não constituam elementos do tipo legal, nem constituam um outro facto histórico unitário” – assim, Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Lisboa: Universidade Católica Portuguesa, 2007, pp. 41).
E no que respeita à alteração da qualificação jurídica, é hoje claro que à face do Art.º 358.º, n.º 3, do CPPenal, conforme se diz no Ac. da Relação de Coimbra de 17-09-2008, «a evolução interpretativa a que se foi procedendo, tanto no plano constitucional como na jurisprudência do nosso mais alto Tribunal, aportaram a necessidade de consolidar a ideia cardeal de no uso do instituto da alteração substancial dos factos se consolidar a plenitude de garantias de defesa exigidas pelo artigo 32.º, n.º 1, do texto constitucional, tornando clarividente que do ponto de vista que ao direito importa é a referência dos acontecimentos às normas jurídicas, e ao processo, os comportamentos humanos que pela lei são declarados passíveis de sancionamento. Neste contexto o direito de defesa tem de ser configurado também em função da consequência jurídica decorrente do concreto substrato factológico imputado ao arguido».
Efectuadas estas considerações importa referir que no presente caso, tal como advoga o Ministério Público na sua resposta ao recurso, que não só não ocorreu efectivamente alteração dos factos constantes da acusação, nem uma real qualificação jurídica diversa, estando em causa apenas um erro na aplicação do direito, pelo que impõe a conclusão de que não se verifica a nulidade prevista no Art.º 379.º n.º 1 al. b) do CPP.
Por esse mesmo motivo, aliás alicerçados na mesma exposição dos fundamentos pelo quais o tribunal a quo afastou ambas as questões prévias da nulidade da acusação e da própria sentença, com citação abundante da jurisprudência constitucional acerca do invocado direito de audição prévia do arguido sobre matéria inovadora e da estrutura acusatória do processo contra-ordenacional e do sancionatório em geral.
Assim, da alteração da qualificação jurídica efectuada, mesmo antes da sua correcção, não resulta a imputação de mais contra-ordenações do que aquelas pelas quais foi condenada pela recorrente, tal como já se disse.
Depois, não se trata de estabelecer conexões entre ilícitos diferentes, nem de imputar um acontecimento histórico diferente daquele que individualiza o objecto do processo, pois não há qualquer alteração de factos. Do que se tratou apenas foi a recondução dos factos imputados a disposições da Deliberação diversas daquelas que foram identificadas pela ANACOM. A identificação desses três deveres, matéria que irá ser objecto de melhor apreciação na impugnação jurídica, isto é, de um dever de recepção, de um dever de aceitação e um dever de determinar o momento da produção dos efeitos da denúncia é uma decorrência dessa qualificação jurídica e uma pura tarefa de interpretação jurídica dos dispositivos legais aplicáveis.
Por fim, não existiria violação da reformatio in pejus, porquanto da alteração não resulta qualquer agravamento das sanções aplicáveis. Também inexiste violação do Art.º 50.º, do RGCO, nem do princípio do acusatório, na medida em que foi concedida à Recorrente a possibilidade de reorientar a sua estratégia de defesa.
Em consequência, a alteração efectuada e a interpretação do artigo 358.º, n.º 3, do CPP, ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, interpretada no sentido de permitir a modificação realizada não viola os normativos constitucionais invocados pela recorrente, não sendo materialmente inconstitucional.
Pelo que julga improcedente este primeiro grupo de fundamentos do recurso, apresentado pela NOS – Comunicações.
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(ii) Da impugnação estrita da matéria de facto, por erro notório na apreciação da prova ao não considerar verificado o nexo de imputação subjectiva a título doloso dos factos provados descritos nos §§ 47 a 62, o que se imporia face à prova indiciária, por presunções ou circunstancial [ANACOM].
Por seu turno, a ANACOM, no seu recurso, advoga que o tribunal a quo não extrai do facto 35 as consequências necessárias, pois que se é dado como provado que a arguida NOS não aceita pedidos de denúncia contratual por telefone desde Agosto de 2012, dever-se-ia concluir que existiram pedidos de denúncia contratual por telefone e que foram recusados. E, ainda que nada constasse do elenco da factualidade provada, a recusa de pedidos de denúncia contratual por telefone resultaria necessariamente das regras da experiência comum e de parâmetros de normalidade e razoabilidade. Por outro lado, conclui a mesma recorrente, a factualidade dada como provada no ponto 62 da sentença recorrida resulta de um erro notório na apreciação da prova. Deveria ter sido dado como provado, segundo a mesma entidade recorrente, que a arguida agiu livre e conscientemente ao recusar as denúncias remetidas para outros endereços que não o Apartado do C....
Cumpre apreciar deste outro grupo de questões.
 A dimensão normativa estabelecida no processo penal, aqui aplicável, relativa ao recurso sobre a matéria de facto, assume duas dimensões:
a) a possibilidade de recurso que resulta da restrita aplicação estabelecida no Art.º 410.º, n.º 2, do CPPenal, referente à correcção dos vícios aí referenciados por simples referência ao texto da decisão recorrida;
b) a que resulta da ampla possibilidade concedida à impugnação da matéria de facto resultante de erros de julgamento, por invocação de prova produzida e erroneamente apreciada pelo tribunal recorrido que se alude no Art.º 412.º, n.º 3, do mesmo Código.
No que respeita ao conhecimento do recurso a que se refere o Art.º 410.º, n.º 2, importa referir que aqueles vícios, em todas as suas alíneas (insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão) têm que resultar da própria decisão/sentença, como documento único, embora essa conjugação possa ser referente às regras da experiência.
Assim a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, a que se alude no Art.º 410.º, n.º 2, alínea b), e o erro notório na apreciação da prova, consubstanciam, respectivamente, a inexistência de factos provados suficientes, a incompatibilidade, insusceptível de ser ultrapassada através da própria decisão recorrida, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação e a decisão e o erro notório da apreciação da prova efectuada pelo tribunal. Tudo isto, repete-se, desde que resulte do próprio texto da sentença, por si só ou conjugada com as regras da experiência.
Ora, no que respeita à alegação da ANACOM, se é verdade que existe a altíssima probabilidade de, desde Agosto de 2012, a NOS ter recusado pedidos de denúncia contratual por telefone, contudo, impunha-se a identificação dos concretos clientes e das concretas situações. As imputações genéricas, sem qualquer especificação das condutas ou do tempo e lugar em que ocorreram, por não serem passíveis de um efectivo contraditório e, portanto, do direito de defesa constitucionalmente consagrado no Art.º 32.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), não podem servir de suporte à condenação da arguida. Só uma individualização/concretização das recusas de denúncias contratuais por telefone permite uma adequada organização da defesa, designadamente, contraditando provas e oferecendo provas, e, permite aferir da verificação ou da não verificação da prescrição do procedimento contra-ordenacional.
No que respeita ao conhecimento do recurso a que se refere o Art.º 410.º, n.º 2, importa referir que aqueles vícios, em todas as suas alíneas (insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão) têm que resultar da própria decisão/sentença, como documento único, embora essa conjugação possa ser referente às regras da experiência.
O erro notório faz alusão a uma muito deficiente apreciação dos factos, isto é, um erro notório da apreciação da prova efectuada pelo tribunal, resultante do próprio texto da sentença, por si só ou conjugada com as regras da experiência. O erro notório na apreciação da prova é o erro manifesto, evidente, ostensivo, patente, o erro que não escapa ao cidadão comum, ao homem de formação média.
O erro notório tem sido considerado como aquele em que se incorre numa apreciação dos factos que contrarie o senso comum, por ser contrário com os factos históricos do conhecimento geral, com as leis da lógica ou da natureza ou que se considere que exista uma ofensa dos conhecimentos criminológicos e vitimológicos.
Ora, cotejando os factos provados e não provados, e também na sua fundamentação fáctica, nada vamos encontrar na sentença que se encontre em contradição ou em divergência com as regras da experiência comum e os parâmetros de normalidade e razoabilidade.
Recorde-se que se verifica o erro notório quando um homem médio, perante o teor da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta que o tribunal violou as regras da experiência ou de que efectuou uma apreciação manifestamente incorrecta, desadequada, baseada em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios. O apontado vício é aquele que é evidente, que não escapa ao homem comum, de que um observador médio se apercebe com facilidade, que é patente, só podendo relevar se for ostensivo, inquestionável e perceptível pelo comum dos observadores ou pelas faculdades de apreciação do “homem médio”. O vício existe quando se dão por provados factos que, face às regras de experiência comum e à lógica corrente, do homem médio, não se teriam podido verificar ou são contraditados por documentos que fazem prova plena e que não tenham sido arguidos de falsos.
O art. 127.º do Código de Processo Penal (CPP), aplicável ex vi art. 41.º n.º 1 do RGCO, dispõe que, salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.
Contudo, e salvo melhor opinião, considera-se que a apreciação efectuada pelo Tribunal recorrido não padece de erro notório na apreciação da prova e que a convicção do Tribunal não é arbitrária, estando devidamente motivada e explicada.
A sentença recorrida, no seu ponto 295, enuncia.
“295. É certo que a não receção das denúncias e a sua devolução foi um procedimento pensado e querido por quem executou os factos. Não estamos evidentemente perante atos que escapam à representação e vontade conscientes de quem (pessoas singulares) os praticou. Contudo, o problema está na possibilidade – que tem de ser aceite como razoável e, nessa medida, possível – dessa representação e vontade não se mostrarem acompanhadas da noção de que esse procedimento estava a violar uma ordem da ANACOM (…)”.
Como parece resultar do ponto 295 desta sentença recorrida, o tribunal a quo, ao analisar a prova produzida nesta parte, chegou a um estado de dúvida insanável sobre a imputação dolosa do ilícito à arguida, o que o levou imputar o ilícito à arguida a título negligente.
Em suma, a discricionariedade do tribunal recorrido na apreciação da prova referente ao elemento subjectivo do ilícito em questão é reconduzível a critérios objectivos.
Razões pelas quais se considera improcedente este outro grupo de fundamentos de recurso, agora apresentado pela entidade administrativa ANACOM, também recorrente.
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(iii) Da impugnação de direito, isto porque a sentença terá errado ao considerar que a Deliberação da ANACOM visou estabelecer algum código de procedimentos a adoptar uniformemente por todas as empresas e não que existia uma obrigação que dolosamente foi violada de implementar procedimentos (ilícito de perigo abstracto) [ANACOM], ou porque deveriam considerar-se atípicos os factos novos pelas quais a recorrente NOS – Comunicações foi condenada, em resultado da alteração (substancial de factos) acima referida, isto é, a não recepção de denúncias são factos atípicos à luz da Deliberação ANACOM, isto porque a mesma recorrente NOS – Comunicações, aceitou efectivamente as denúncias, tal como ficou demonstrado na sentença [NOS – Comunicações].
Neste outro grupo de fundamentos de recurso, passam-se a analisar as questões suscitadas pela entidade administrativa ANACOM e pela arguida NOS – Comunicações.
No seu recurso, a ANACOM sustenta que os três ilícitos em causa são de perigo abstracto, e, que tal implica que não seja necessário um concreto resultado, bastando que o procedimento definido pela empresa desrespeite aquelas determinações. Mais advoga que as três infracções resultam da violação pela empresa da sua obrigação de implementar procedimentos que a Deliberação afirma serem necessários e que integrem as suas regras, as quais constituem limites. Defende, ainda, que o ilícito previsto pelo Art.º 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE conjugado com o ponto 2.3.2 da Deliberação, o ilícito previsto pelo Art.º 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE conjugado com o ponto 2.4.5 da Deliberação, e, o ilícito previsto pelo Art.º 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE conjugado com o ponto 2.4.4. da Deliberação são de perigo abstracto, o que implica que não seja necessário um concreto resultado, bastando que o procedimento definido pela empresa desrespeite aquelas determinações; as três infracções em causa resultam da violação pela empresa da sua obrigação de implementar procedimentos que a Deliberação afirma serem necessários e que integrem aquelas regras, sendo estas últimas qualificadas pela própria Deliberação como limites.
Por seu turno, a arguida NOS – Comunicações, no seu recurso, defende que os novos factos pelos quais vem agora condenada – não recepção de denúncias -, são factos atípicos, i.e., não são puníveis ao abrigo das disposições da Deliberação, designadamente ao abrigo do novo ilícito contra-ordenacional construído pelo tribunal a quo, que resulta da conjugação dos pontos 2.3.1. a), 2.4.1. e 2.4.2. da Deliberação com o Art.º 113.º n.º 3 al. bbb) e n.º 11 da LCE. Deve, pois, concluir-se que o enquadramento jurídico dado pela ANACOM aos factos em apreço estava correcto. Sucede, porém, que a arguida logrou demonstrar – e tal como consta dos factos provados da sentença recorrida -, que, relativamente a 22 dos 28 casos referidos na decisão da ANACOM, a arguida aceitou as denúncias em causa, uma vez que, não obstante ter devolvido essas mesmas denúncias, solicitando que as mesmas fossem enviadas para o Apartado do C..., fez retroagir os efeitos dessas denúncias à data em que as mesmas foram recepcionadas no Apartado de P.... Pelo que, no entendimento da mesma arguida/recorrente, a arguida ao ter feito retroagir os efeitos das denúncias à data da recepção das mesmas no Apartado de P..., aceitou, para efeitos do disposto nos pontos 2.3.1., 2.4.1. e 2.4.6. da Deliberação, as denúncias enviadas para esse Apartado, não obstante ter, erradamente, procedido à sua devolução e solicitado aos clientes que enviassem as denúncias para o Apartado de C.... Em consequência, defende a mesma arguida, deve-se absolver aquela da prática do ilícito contra-ordenacional em causa.
Cumpre apreciar de ambas as impugnações jurídicas.
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No que respeita à impugnação de direito realizada pela ANACOM.
À arguida NOS – Comunicações foi imputada a prática, a título doloso: (i) de uma contraordenação prevista e punida pelo Art.º 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE, em conjugação com o ponto 2.3.2. da Decisão de 09.03.2012; (ii) de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE, em conjugação com o ponto 2.4.4. da Decisão de 09.03.2012; (iii) e de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE, em conjugação com o ponto 2.4.5. da Decisão de 09.03.2012.
Pelo tribunal a quo foi decidido afastar a imputação dolosa de alguns desses ilícitos, e considerar que a arguida praticou, algumas a título doloso, outras a título negligente, as seguintes contra-ordenações:
. contra-ordenação prevista e punida no Art.º 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, em conjugação com os pontos 2.4.1. e 2.4.2., e estes com o ponto 2.3.1. a) da Decisão da ANACOM de 09.03.2012, a título negligente, por não ter recebido pedidos de denúncia apresentados num endereço por si divulgado ao público;
. contra-ordenação prevista e punida pelo Art.º 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, em conjugação com os pontos 2.4.1. e 2.4.6. da Decisão da ANACOM de 09.03.2012, a título doloso, ao não ter aceitado e/ou determinado os seus efeitos nas datas em que as recebeu, denúncias contratuais legíveis, correctamente instruídas e remetidas nos termos da Decisão; e
. duas contra-ordenações, em concurso efectivo e a título negligente, previstas e punidas pelos Art.ºs 7.º, n.º 1, e 21.º, n.º 1 e 4, ambos do Decreto-Lei n.º  57/2008, de 26.03, por não ter informado dois clientes acerca dos períodos contratuais mínimos a que os mesmos, segundo ela, estariam vinculados.
Vejamos o teor destas normas.
Estipula o Art.º 113.º, n.º 3, alínea bbb), da LCE, que constitui uma contra-ordenação o incumprimento de ordens ou mandados legítimos da ARN regularmente comunicados aos seus destinatários.
Por sua vez, preceitua o ponto 2.3.2. da mencionada Decisão ANACOM (Deliberação sobre Procedimentos exigíveis para a cessação de contratos…) o seguinte: “Quando disponibilizem um serviço de atendimento telefónico dotado com um sistema de validação de utilizador, as empresas devem aceitar as declarações de denúncia que sejam comunicadas por essa via e que cumpram os requisitos previstos no número 2.1.”.
O teor do ponto 2.4.4. da mesma Decisão ANACOM é o seguinte: “Da comunicação prevista no número 2.4.1. deve ainda constar a indicação da data efetiva de cessação do(s) serviço(s) ou do contrato e, quando aplicável, a indicação, com carácter concreto, dos direitos e obrigações do assinante emergentes da denúncia, incluindo a obrigação de pagamento de eventuais encargos daí decorrentes, nomeadamente aqueles associados ao incumprimento de períodos contratuais mínimos e à não devolução de equipamentos”.
Conexo com este, importa esclarecer que o ponto 2.4.1. da mesma Decisão estipula o seguinte: “Recebida uma declaração de denúncia nos termos previstos nos números 2.3. e sempre que a mesma cumpra os requisitos fixados nos números 2.1. e 2.2., as empresas devem, no prazo de cinco dias úteis a contar da data da sua receção, confirmar a denúncia do(s) serviço(s) ou do contrato”.
O ponto 2.4.5., sempre da mesma Decisão ANACOM, preceitua o seguinte: “A comunicação prevista no número 2.4.2. deve fixar um prazo de trinta dias úteis para o envio da informação ou da documentação em falta e informar o assinante que, em caso de não cumprimento desse prazo, a declaração de denúncia considerar-se-á caducada”.
Por fim, o teor do ponto 2.4.2. é o seguinte: “Recebida uma declaração de denúncia nos termos previstos no número 2.3. e sempre que a mesma não cumpra os requisitos fixados nos números 2.1. e 2.2., as empresas devem, no prazo de três dias úteis a contar da data da sua receção, solicitar ao assinante o envio da informação ou documentação em falta”.
Por outra via, estipula o Art.º 21.º, n.º 1, do DL n.º 57/2008, de 26/3, que a violação do Art.º 7.º, n.º 1, do mesmo diploma, é punida com coima.
Preceitua esse Art.º 7.º, n.º 1, que é enganosa a prática comercial que contenha informações falsas ou que, mesmo sendo factualmente correctas, por qualquer razão, nomeadamente a sua apresentação geral, induza ou seja susceptível de induzir em erro o consumidor em relação a um ou mais dos elementos a seguir enumerados e que, em ambos os casos, conduz ou é susceptível de conduzir o consumidor a tomar uma decisão de transacção que este não teria tomado de outro modo.
Quanto às mencionadas infracções à lei das comunicações electrónicas (LCE), tenha-se em consideração que o seu tipo se decompõe em três elementos distintos, a saber:
- a existência de uma ordem ou mandado legítimos emanados da Autoridade Reguladora Nacional (ICP - ANACOM);
- a regular comunicação dessa ordem ou desse mandado ao destinatário; e
- a falta de cumprimento pelo destinatário.
A doutrina e a jurisprudência estão de acordo em aceitar algum paralelismo entre os diversos direitos públicos sancionatórios. O direito contra-ordenacional é direito sancionatório público onde impera o princípio da legalidade, da não retroactividade e da tipicidade.
Sendo que as “normas sancionatórias em branco” são aceitáveis desde que garantam um mínimo de determinabilidade, definindo o núcleo essencial da proibição penal, e que o elemento mutável do tipo de ilícito esteja directamente dependente de critérios de natureza técnica (assim, ver acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 299/92, 427/95, 534/98, 115/08 e 635/2011).
Se coincidem na mesma norma – lei formal - a ameaça penal e o cerne da exigência comportamental, um dever de fazer concretizável e quantificável em “objectivos de desempenho”, e apenas estes objectivos técnicos - o conteúdo do dever de fazer - é deixado à “norma sancionadora em branco”, isso não torna o tipo contra-ordenacional incaracterístico, não implica o recurso a critérios autónomos novos de ilicitude, nem imprime “carácter inovador relativamente à norma sancionadora” (acórdão do TC n.º 427/95).
Não dificulta o seu conhecimento pelos destinatários a circunstância de a norma que encerra o conteúdo útil desse dever ser uma deliberação da própria entidade reguladora se tais poderes lhe foram conferidos por lei em função das necessidades de Regulação e Supervisão e pela própria norma incriminadora.
Uma entidade reguladora nacional emitir deliberações para entidades reguladas não é o mesmo que dirigi-las ao comum cidadão. Por isso que se não revele problemática a fonte normativa de definição do “dever de fazer” concretizado numa deliberação de que a regulada teve possibilidade de conhecer por aquela ter recebido a devida publicidade on-line, forma de publicidade prevista na lei.
A doutrina e jurisprudência relativos ao concurso de crimes e ao crime continuado são aplicáveis às contra-ordenações.
Tratando-se de um dever de prestação de serviços de uma pessoa colectiva a existência de continuação é afastada se houver uma disposição interior – dos próprios serviços – para o não cumprimento do dever. Se é a deficiente actividade desenvolvida pela pessoa colectiva a causa da reiteração da conduta (ou seja, a “personalidade da arguida”) esse é um factor endógeno que não revela uma diminuição da culpa do agente, bem pelo contrário, revela um acentuar da sua culpa.
No direito contra-ordenacional as ponderações permissivas de uma maior responsabilização das pessoas colectivas têm que se considerar justificadas.
Assim, o Art.º 7.º, n.º 2 do RGCO tem que ser lido numa acepção de alargamento dos conceitos de “órgãos” e de “no exercício de funções”, para abranger quem quer que actue em nome e em proveito da pessoa colectiva incluindo, portanto, os membros dos órgãos directivos, trabalhadores e quem quer que tenha um dever de vigilância e fiscalização.
No ilícito de mera ordenação social das comunicações – ao menos - a responsabilidade das pessoas colectivas só é excluída quando o agente actue contra ordens ou instruções expressas daquela e a invalidade e a ineficácia jurídicas dos actos em que se funde a relação entre o agente individual e o ente colectivo não obstam a que seja aplicado o amplo regime sancionatório.
Concretiza-se no campo contra-ordenacional das Comunicações a vocação do ilícito de mera ordenação social para a punibilidade das pessoas jurídicas e a consagração legal do conceito amplo de autoria, no sentido de que é autor de uma contra-ordenação todo o agente que tiver contribuído causal ou co-causalmente para a realização do tipo, ou seja, que haja colocado uma causa para a sua realização ou que haja promovido, com a sua acção ou omissão, o facto ilícito, podendo isso ocorrer de qualquer forma – inclusive por o titular do dever de garante «não ter evitado, não ter dificultado ou não ter criado as condições em que seria mais arriscado para o autor material cometer o ilícito» ou não ter exercido a devida fiscalização.
Existem diferenças de subjacentes à qualificação de condutas enquanto crimes ou enquanto contraordenações a nível dos bens jurídicos em causa que permitem um tratamento diferente em sede de participação que está plasmado nas diferenças nos textos dos preceitos legais que definem a participação do agente nas condutas ilícitas no direito penal (Art.ºs 26.º e 27.º do CP) e no direito contraordenacional (Art.º 16.º do RGCO).
É isso que resulta do chamado “conceito extensivo de autor” segundo o qual, como referem os juízes conselheiros Oliveira Mendes e Santos Cabral, “(…) a cada um dos comparticipantes imputa-se o ilícito contra-ordenacional e não apenas a parcela correspondente ao seu contributo ou envolvimento no facto (como acontece no conceito restritivo de autor) (...) isto é, qualquer contributo causal para o facto da parte de uma pluralidade de agentes faz com que cada um dele incorra em responsabilidade por contra-ordenação (teoria da causalidade) (...) Ou seja, o que se exige (...) é, que esse agente tenha um contributo causal ou co-causal para o facto, que pode inclusivamente consistir numa acção ou omissão” – assim, António Jorge de Oliveira Mendes e José António Henriques dos Santos Cabral, Notas ao Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, 3ª ed., Almedina: Coimbra, 2009, pp. 56.
Não se trata de uma teoria de autoria ultrapassada ou desenquadrado constitucionalmente, quando o Tribunal Constitucional vem reiteradamente aplicando esse conceito de autoria (cfr. Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 99/2009, n.º 405/2009, n.º 643/2009, n.º 87/2010 e n.º 198/2010), sem levantar qualquer questão de constitucionalidade.
Aliás, é entendimento pacífico que mencionado Art.º 16.º, n.º 1, do RGCO postula um conceito extensivo de autor – assim, António Manuel de Almeida Costa, “A Propósito do Novo Código do Trabalho: Bem jurídico e Pluralidade de Infracções no âmbito das Contra-ordenações Relativas ao Trabalho Suplementar. Subsídio para uma Dogmática do Direito de Mera Ordenação Social Laboral”, in Manuel da Costa Andrade et all. (org.), Liber Disciplinorum para Jorge de Figueiredo Dias, Coimbra: Coimbra Editora, 2003, pp. 1041; e João Soares Ribeiro, Contra-Ordenações Laborais, Regime Jurídico Anotado, Fevereiro 2000, Coimbra: Almedina, pp. 100. No mesmo sentido, alguma jurisprudência existente no âmbito do Direito dos valores mobiliários: cf. Sentença do TPIC, 1.º Juízo, 3.ª Secção, de 2 de Junho de 1997 e Sentença do TPIC, 1.º Juízo, 3.ª Secção, de 24 de Maio de 2000.
Refere a este título Maria Mascarenhas que “Figueiredo Dias sustenta uma concepção lata e unitária de autoria no regime geral das contra-ordenações, considerando suficiente para a imputação do facto aos agentes a simples identificação de um nexo causal entre a conduta deste e o facto previsto no tipo de ilícito contra-ordenacional (conceito extensivo de autor)” (“Imputação dos Ilícitos Contra-ordenacionais aos Participantes”, in Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, n.º 12, Dezembro de 2001, p. 288).
A consideração de uma “culpabilidade de organização” parece-nos ser hoje uma exigência e não temos dúvida da sua justificação no actual direito de mera ordenação social português, a exigência pragmática de um societas delinquere potest.
A conceptualização da negligência penal não pode ser mecanicamente transposta – até em termos de exigência factual – para o direito contra-ordenacional, pois que aqui, imperando deveres de cuidado de cariz social, a negligência concretiza-se na violação de um desses deveres a que o agente se encontrasse vinculado, tendo ele a capacidade de o cumprir e o circunstancialismo o permitisse cumprir. O que reconduz, reconheça-se, a uma maior amplitude da punibilidade da negligência neste direito sancionatório.
E no caso concreto a circunstância de o ilícito contra-ordenacional se fundar numa negligente violação de um dever quantificável torna a questão meramente académica. O resultado não alcançado torna evidente o não cumprimento do dever de fazer e a culpa funcional.
Para elucidação destes pressupostos essenciais no tratamento desta matéria contra-ordenacional (comunicações electrónicas), consultem-se os Acs. da RL de 24/9/2008, processo n.º7290/2008-3, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/-/7B4DA472A304418D802574F0005A787A; e da RE de 11/7/2013, processo n.º 82/12.2YQSTR.E1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/dbce2a8389f4aeba80257de10056fc4f?OpenDocument.
Recorde-se que nos termos do Art.º 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE, constitui contra-ordenação muito grave o “incumprimento de ordens ou mandados legítimos da ARN [ANACOM] regularmente comunicados aos seus destinatários”.
Dispõe o ponto 2.3.2. da Decisão ANACOM que “Quando disponibilizem um serviço de atendimento telefónico dotado com um sistema de validação de utilizador, as empresas devem aceitar as declarações de denúncia que sejam comunicadas por essa via e que cumpram os requisitos previstos no número 2.1.”
Estipula o ponto 2.4.4. dessa Decisão que “Da comunicação prevista no número 2.4.1. deve ainda constar a indicação da data efetiva de cessação do(s) serviço(s) ou do contrato e, quando aplicável, a indicação, com carácter concreto, dos direitos e obrigações do assinante emergentes da denúncia, incluindo a obrigação de pagamento de eventuais encargos daí decorrentes, nomeadamente aqueles associados ao incumprimento de períodos contratuais mínimos e à não devolução de equipamentos”.
Preceitua o ponto 2.4.5. da mesma Decisão que “A comunicação prevista no número 2.4.2. deve fixar um prazo de trinta dias úteis para o envio da informação ou da documentação em falta e informar o assinante que, em caso de não cumprimento desse prazo, a declaração de denúncia considerar-se-á caducada”.
Como se disse, o tribunal a quo absolveu a arguida NOS da prática das contra-ordenações relativas à violação dos pontos 2.3.2., 2.4.4. e 2.4.5. dessa Deliberação ANACOM por, na decisão condenatória da ANACOM, não se ter identificado qualquer cliente da arguida que tenha visto recusado um pedido de denúncia contratual por telefone e por não ter sido identificado qualquer cliente da arguida que tenha recebido as SMS´s desconformes com o exigido nos referidos pontos 2.4.4. e 2.4.5.
O mesmo tribunal a quo afastou ainda a possibilidade de punição por tentativa, por considerar que a decisão da NOS de adoptar os três procedimentos gerais em causa (contrários aos pontos 2.3.2., 2.4.4. e 2.4.5. da Deliberação) e de os transmitir aos seus colaboradores para serem seguidos pelos mesmos não constituírem ainda actos de execução (vd. ponto 377 da sentença, fls. 1711).
Na análise das três infracções em causa, o mesmo tribunal recorrido considerou que todas elas são de mera actividade, e, que visam tutelar simultaneamente a autoridade da ANACOM e os interesses dos consumidores em mudarem de prestador de redes de comunicações públicas e de serviços de comunicações electrónicas acessíveis ao público sem entraves injustificados. E, concluiu que as três infracções em causa são: (i) infracções de dano no que respeita à autoridade da ANACOM; e (ii) infracções de perigo concreto no que respeita aos interesses dos consumidores.
Ao invés, no seu recurso, a ANACOM sustenta que os três ilícitos em causa são de perigo abstracto, e, que tal implica que não seja necessário um concreto resultado, bastando que o procedimento definido pela empresa desrespeite aquelas determinações. Que as três infracções resultam da violação pela empresa da sua obrigação de implementar procedimentos que a Deliberação afirma serem necessários e que integrem as suas regras, as quais constituem limites.
Entende-se, no entanto, que assiste razão ao tribunal recorrido quando sustenta que cada um dos três ilícitos em questão tutela dois bens jurídicos distintos – sendo, pois, ilícitos contra-ordenacionais complexos -, e, que são ilícitos de mera actividade ou formais, ou seja, a sua consumação ocorre pela mera execução de um comportamento humano, bastando assim a mera recusa de uma denúncia contratual por telefone apesar de se dispor de um sistema de validação do utilizador ou o mero envio de SMS´s que não observem o disposto nos pontos 2.4.4. e 2.4.5. da Deliberação.
Diversamente do que sucede com os ilícitos de resultado ou materiais, a consumação dos ilícitos de mera actividade não depende da verificação de um certo resultado ou como se refere na douta sentença recorrida, citando-se Figueiredo Dias, não depende da verificação de um “efeito sobre o objecto da acção e desta distinto espácio-temporalmente".
Concorda-se ainda que as três infracções em causa são infracções de dano no que respeita à autoridade da ANACOM, ou seja, que a violação de algum dos pontos da Deliberação da ANACOM implica uma lesão efectiva de um dos bens jurídicos protegidos: a referida autoridade da ANACOM. Tal como sucede com o crime de desobediência p. e p. pelo Art.º 348.º do Código Penal, está-se perante casos de ilícitos que são simultaneamente de mera actividade e de dano, bastando a mera execução da acção para se lesar o bem jurídico protegido.
Para além da definição do perigo concreto, podemos ainda definir o perigo abstracto-concreto (na acepção de Schroeder), pela exigência da prova da idoneidade da acção realizada para criar perigo para o bem jurídico protegido (perigo abstracto-concreto). O perigo é inerente à acção, decorre com ela. É a acção que é genericamente perigosa, mas é preciso provar que pela forma de utilização desses meios eles se afiguram na acção como perigosos. No caso de perigo concreto, exigir-se-ia a prova da causalidade relativamente ao perigo real de uma concreta conduta para o bem jurídico protegido.
Para elucidação destas classificações destes tipos de ilícitos de perigo, consulte-se Figueiredo Dias, Direito Penal – Parte Geral, Tomo I, 2.ª edição, 2007, Coimbra: Coimbra Editora, pp. 310-311.
Em ambos os tipos de perigo concreto e abstracto-concreto, para além de um nexo de imputação objectiva entre a acção e o perigo, será necessário concluir-se por um nexo de imputação potencial entre o perigo e o dano potencial. É preciso saber se a criação do perigo podia ou não dar lugar ao dano. Se não se causou grande insegurança para o bem jurídico não haverá imputação, pois não há perigosidade.
Certo é que se exige que sejam conhecidos alguns “limites-padrão” ou “valores limite” que possam qualificar as situações lesivas dos valores e dos bens jurídicos subjacentes. Essa definição sempre terá que existir como forma de estruturar a acção administrativa e de garantir a legalidade da sua actuação.
Onde estão os limites do tolerável e do ilícito contra-ordenacional? Porquê uma contra-ordenação e não a prática de um crime? Sabendo-se que aqui a padronização desse perigo comum não nos é dada por uma qualquer desobediência (ilícito culposo normativizado) a padrões estipulados ou prescritos por autoridades competentes em conformidade com disposições legais ou regulamentares e sob cominação de aplicação das sanções respectivas.
Por isso, sem que com isso se possa contrariar o sentido da sentença recorrida, já não se pode porém concordar que os três ilícitos, no que respeita aos interesses dos consumidores, sejam de perigo concreto.
Os ilícitos de perigo concreto, como vimos, são sempre de resultado, e, os respectivos tipos incluem a colocação em perigo do bem jurídico, recorrendo o legislador a expressões típicas dessa causalidade, como “colocar em perigo” (vd. Art.º 138.º n.º 1 do Código Penal), “criarem, desse modo, um perigo” (vd. Art.º 150.º n.º 2 do Código Penal), “pondo em perigo” (vd. Art.º 250.º n.º 3 e n.º 4 do Código Penal), “criar deste modo perigo” (vd. Art.ºs. 272.º n.º 1, 277.º n.º 1, 281.º n.º 1, 282.º n.º 1, 283.º n.º 1, 289.º n.º 1, 291.º n.º 1, todos do Código Penal), “criar perigo” (vd. Art.º 280.º do Código Penal) ou “pondo desse modo em perigo” (vd. Art. 388.º do Código Penal).
Nos três ilícitos em causa, a punição não depende da comprovação de que a conduta do agente colocou em perigo efectivo a mudança do consumidor para outro prestador de redes de comunicações públicas e de serviços de comunicações electrónicas. O legislador presumiu que a violação dos pontos 2.3.2., 2.4.4. e 2.4.5. da Deliberação constitui um perigo potencial para a mudança de prestador por parte do consumidor; em face de entraves injustificados, presume-se que há o perigo de o consumidor desistir de mudar de operador.
Contudo, entende-se que os tipos de ilícito em questão só se consumam por referência a um concreto cliente. Por outras palavras, considera-se que um dos elementos objectivos dos tipos em causa é que a conduta do agente se dirija a um concreto cliente/assinante/consumidor. Aí está a exigência da prova da idoneidade da acção realizada para criar perigo para o bem jurídico protegido (perigo abstracto-concreto).
Adere-se pois ao que consta dos pontos 373 a 376 da douta sentença recorrida, na parte em que se declara que “(…) o texto da Decisão é claro, em relação a qualquer um dos pontos em análise, no sentido que se reportam a denúncias concretas. Efetivamente, o texto da Decisão não refere decisões sobre a forma de proceder perante denúncias ou decisões e a implementação de todos os atos necessários para a sua execução. O texto da norma fala em denúncias que sejam comunicadas (cf. ponto 2.3.2.) e denúncia recebida (cf. pontos 2.4.4. e 2.4.5., em conjugação com os pontos 2.4.1. e 2.4.2.).
O facto do preâmbulo da mesma Decisão aludir a “procedimentos” não refuta este entendimento, pois procedimento significa um modo de actuar e a actuação relativamente a uma denúncia concreta é também um modo de actuar ou a expressão de um procedimento. O que a Decisão já não refere é procedimentos gerais ou qualquer formulação equivalente que conduzisse à conclusão de que a conduta sancionada se reporta a um “modus operandi abstracto” ou a um “procedimento adoptado pelo operador (enquanto realidade genérica)”, ou seja, que se visa uma tutela ainda mais antecipada dos interesses dos consumidores.
Por conseguinte, não temos dúvidas em concluir que a prática destas contra-ordenações não se basta com procedimentos gerais – ou seja, com a decisão e com a implementação de actos para a sua execução que contrariem o disposto nos pontos em análise –, mas exige a demonstração do procedimento adoptado perante denúncias de consumidores.
E, tal como se esclareceu na fundamentação da matéria de facto, têm de ser denúncias de consumidores individualizados, não sendo suficiente uma imputação genérica e indiferenciada”.
A mera decisão do agente de criar procedimentos contrários à Deliberação e bem assim a emissão de orientações desse mesmo agente aos seus colaboradores no sentido de observarem tais procedimentos nas situações que lhes venham a surgir não integram a prática – consumada ou mesmo tentada - dos três ilícitos em causa.
Importa desde logo salientar que a “mera decisão de realização de um tipo de ilícito objectivo, independente de um começo de realização efectiva, não é punível. A esta conclusão conduz o princípio indiscutido cogitationes paenam nemo patitur” . A mera ideia ou intenção de praticar um ilícito não são puníveis.
E, na verdade, a emissão de orientações desse mesmo agente aos seus colaboradores no sentido de observarem tais procedimentos nas situações que lhes venham a surgir não constitui ainda um acto de execução, mas sim um acto preparatório.
Recorde-se que o Art.º 12.º do Regime Geral das Contra-Ordenações (RGCO), com a epígrafe “Tentativa”, define o que são actos de execução de forma exactamente igual à do Art.º 22.º do Código Penal:
“1 - Há tentativa quando o agente pratica actos de execução de uma contra-ordenação que decidiu cometer sem que esta chegue a consumar-se.
2 - São actos de execução:
a) Os que preenchem um elemento constitutivo de um tipo de contra-ordenação;
b) Os que são idóneos a produzir o resultado típico;
c)  Os que, segundo a experiência comum e salvo circunstâncias imprevisíveis, são de natureza a fazer esperar que se lhes sigam actos das espécies indicadas nas alíneas anteriores”.
Pressuposta a (sempre) necessária decisão de cometer o facto, a caracterização do acto só pode ser objectiva – embora na base do “plano do agente” -, enquanto critérios subjectivos relacionados com as características da vontade surgem como irrelevantes. Ora – e com isto nos aproximamos definitivamente do nosso direito positivo legislado -, o Art.º 22.º-2 (…) consagra clara e terminantemente as teorias objectivas.
Atenta a formulação da al. c) do n.º 2 do Art.º 12.º do RGCO, poder-se-ia ser tentado a considerar que a emissão de orientações de um agente aos seus colaboradores no sentido de observarem procedimentos contrários aos pontos 2.3.2., 2.4.4. e 2.4.5. da Deliberação é já um acto executivo.
Contudo, e fazendo apelo aos dois critérios cumulativos concretizadores enunciados – conexão de perigo e conexão típica -, há que concluir que não tendo sido identificados concretos clientes/assinantes/consumidores:
(i) e, portanto, não tendo sido identificados casos concretos temporalmente situados, não é possível afirmar que entre a emissão das orientações pela NOS e a realização típica dos ilícitos em causa há uma relação de iminente implicação; só existe conexão de perigo quando “entre o último acto parcial questionado e a realização típica se verifica, segundo o lapso temporal mas também de acordo com o sentido, uma relação de iminente implicação;
(ii) e, estando em causa um bem jurídico individual (o interesse de cada um dos consumidores em mudar de prestador), as três condutas da NOS em causa não se intrometem ainda na esfera de qualquer consumidor.
Só existe conexão típica “quando o acto penetra já no âmbito de protecção do tipo de crime (…). Esta intervenção verificar-se-á (…) sempre que o acto se intrometa na esfera da vítima; isto é só porém sinal de intromissão o âmbito de protecção do tipo quando este tutela bens jurídicos individuais ou de titularidade supra individual individualizada (v.g., o Estado ou uma comunidade local); podendo tal todavia não suceder – em particular , nos tipos que protegem bens verdadeiramente colectivos -, melhor será fazer apelo, de forma abrangente, ao âmbito de protecção do tipo e chamar a esta conexão “conexão típica””
Tendo por referência o primeiro dos três ilícitos em causa, estar-se-ia perante um acto de execução quando um concreto cliente telefonasse para a NOS para denunciar o seu contrato e o colaborador da NOS que o atendesse começasse por dizer que não aceitavam denúncias de contrato por telefone (e, claro, só existiria tentativa - e não já consumação - se, por algum motivo, o tal colaborador acabasse por aceitar a denúncia contratual).
Entende-se ainda que existirão tantos ilícitos de cada tipo quanto o número de vezes que o prestador de serviço violar cada um dos pontos da Deliberação em análise, por força dos princípios acima enunciados quanto ao concurso de ilícitos e ao ilícito continuado.
Se o prestador recusa a 10 clientes a denúncia contratual realizada por telefone, não obstante dispor de um sistema de validação do utilizador, cometerá 10 ilícitos.
O entendimento da ANACOM de considerar que os ilícitos em causa resultam da violação pela empresa da sua obrigação de implementar procedimentos que a Deliberação afirma serem necessários levaria a que, independentemente da existência e do número de clientes que, no futuro, se vissem confrontados com uma recusa indevida de denúncia contratual por telefone ou com uma das SMS´s em causa, já não se pudesse agir contra-ordenacionalmente contra a NOS por força do princípio ne bis in idem.
Importa ainda referir que, após a data dos factos em causa, a Lei n.º 15/2016 de 17/06 veio introduzir alterações ao Art.º 113.º do LCE, as quais permitem que actualmente se puna actos preparatórios idênticos aos aqui em questão.
Com efeito, lê-se no actual n.º 6 do referido artigo que “Constitui contraordenação a adoção pelas empresas que oferecem redes e ou serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público de comportamentos habituais ou padronizados, bem como a emissão de orientações, recomendações ou instruções aos trabalhadores, agentes ou parceiros de negócios, cuja aplicação seja suscetível de conduzir à violação de regras legais ou de determinações da ARN, contraordenação que é muito grave sempre que daqueles atos resulte ou possa resultar infração muito grave ou grave, sendo grave nos restantes casos”.
Razões pelas quais consideram improcedentes os fundamentos aqui suscitados pela recorrente ANACOM.
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Quanto à impugnação de direito realizada pela NOS – Comunicações.
A factualidade dada como provada na decisão administrativa da ANACOM referente à devolução das denúncias contratuais remetidas para o Apartado de P... – e que consta dos factos provados 18.º a 30.º, 195.º e 203.º (fls. 1146-1149, 1166 e 1168) -, corresponde à factualidade dada como provada na sentença recorrida, nos pontos 47. a 62. e 206 (fls. 1655-1660 e 1674), com as seguintes excepções:
(i) enquanto a ANACOM imputou a infracção à arguida a título de dolo directo (facto provado 195, fls. 1166), o tribunal a quo imputou-o a título de negligência inconsciente (ponto 62, fls. 1660), acolhendo o sustentado pela defesa; e
(ii) o tribunal a quo deu como provado que, em relação a 22 dos 28 clientes, a arguida fez produzir os efeitos das denúncias remetidas para o Apartado de P... à data em que as mesmas foram ali recebidas (cfr. ponto 61, fls. 1660), acolhendo o sustentado pela defesa.
Quer na decisão final administrativa quer na sentença recorrida é dado como provado que:
- “pelo menos até 3/6/2013, a arguida divulgou aos seus clientes, através das Condições Gerais disponíveis no seu sítio da internet, o Apartado de P... como morada para recepção de quaisquer comunicações escritas”, correspondendo ao facto provado 18.º da decisão administrativa, a fls. 1146, e, ao ponto 48 da sentença, a fls. 1655;
- “a arguida não aceitou as denúncias remetidas para a morada Apartado ..., EC P..., 2...-9.. P...”, correspondendo ao facto provado 22.º da decisão administrativa, parte final, a fls. 1149, e, ao ponto 52 da sentença, a fls. 1656;
- “nos 28 (vinte e oito) casos acima elencados, a arguida informou os respectivos clientes que as denúncias deveriam ser remetidas para a morada Apartado ... EC C... 1... 5.. L...”, correspondendo ao facto provado 24.º da decisão administrativa, a fls. 1149, e, ao ponto 54 da sentença, a fls. 1659; e
- “a arguida não iniciou os 28 (vinte e oito) procedimentos de denúncia que lhe foram comunicados para a morada Apartado ..., EC P..., 2...-9.. P...”, correspondendo ao facto provado 25.º da decisão administrativa, a fls. 1149, e, ao ponto 55. da sentença, a fls. 1659.
Com base na mesma factualidade (com as excepções supra referidas):
1) a ANACOM imputou à arguida o ilícito contra-ordenacional previsto no ponto 2.3.1. a) da Deliberação em conjugação com o Art.º 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE;
2) o tribunal a quo imputou à arguida um ilícito contra-ordenacional resultante da conjugação do previsto nos pontos 2.3.1. a), 2.4.1. e 2.4.2. da Deliberação com o Art.º 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE.
Dispõem os referidos pontos da Deliberação o seguinte:
“2.3.1. As empresas devem aceitar as declarações de denúncia que, cumprindo os requisitos previstos nos números anteriores, sejam comunicadas: a) por via postal (…) para qualquer um dos contactos divulgados no contrato ou em qualquer outro suporte informativo dirigido ao público (…)”.
“2.4.1. Recebida uma declaração de denúncia nos termos previstos nos números 2.3. e sempre que a mesma cumpra os requisitos fixados nos números 2.1. e 2.2., as empresas devem, no prazo de cinco dias úteis a contar da data da sua receção, confirmar a denúncia do(s) serviço(s) ou do contrato”.
“2.4.2. Recebida uma declaração de denúncia nos termos previstos no número 2.3. e sempre que a mesma não cumpra os requisitos fixados nos números 2.1. e 2.2., as empresas devem, no prazo de três dias úteis a contar da data da sua receção, solicitar ao assinante o envio da informação ou documentação em falta”.
Aqui, concorda-se com a recorrente NOS quando a mesma declara que o enquadramento jurídico correcto dos factos em apreço é o efectuado pela ANACOM (vd. conclusão p) do recurso da arguida, a fls. 1801), concretamente na parte em que tal autoridade administrativa reconduz os factos apenas e tão só à violação do ponto 2.3.1. a) da Deliberação.
A arguida NOS deveria ter aceitado as 28 denúncias contratuais enviadas pelos seus clientes, por via postal, para a morada “Apartado ..., EC P..., 2...-9.. P...”, pois que a mesma constava do sítio da Internet da arguida como morada para recepção de quaisquer comunicações escritas.
Ao ter procedido à devolução das 28 denúncias aos respectivos clientes, informando-os que as denúncias deveriam ser remetidas para outra morada, a arguida NOS não aceitou pois as denúncias remetidas para o Apartado de P....
Assim, tal como já se tinha anteriormente antecipado, o correcto enquadramento jurídico dos factos em análise é mais linear do que o sustentado na sentença recorrida.
 No ponto 2.3.1. al. a) prevê-se o dever de aceitar denúncias regularmente comunicadas para um contacto divulgado pelo operador, e, nos pontos 2.4.1. e 2.4.2. prevêem-se deveres posteriores à aceitação, concretamente, o dever de confirmar a denúncia dos serviços ou do contrato (caso a denúncia esteja correctamente instruída) e o dever de solicitar ao cliente o envio de informação ou documentação em falta (caso a denúncia não esteja correctamente instruída).
Este enquadramento jurídico do tribunal a quo, ao invés do sustentado pela arguida/recorrente, não só não alterou ou reconfigurou a base factual de que a arguida vinha condenada, como também não pode fazer concluir que a arguida terá violado três distintos deveres invés de apenas um, pois tal enquadramento jurídico não encontra correspondência na factualidade dada como provada.
Nos pontos 55. e 61. da sentença recorrida foi dado como provado que a arguida só procedeu ao tratamento das denúncias “depois e nos casos em que os clientes entregar[a]m novamente os pedidos de denúncia na morada Apartado ... EC C... 1... 5.. L... ou em loja”, e, que, em relação a 22 dos 28 clientes, a arguida “fez produzir os efeitos das denúncias remetidas para o Apartado  de P... à data em que as mesmas foram ali recebidas” (fls. 1659-1660).
Sustenta a arguida que, ao ter feito retroagir os efeitos das denúncias à data da recepção das mesmas no Apartado de P..., aceitou, para efeitos do disposto na Deliberação, as denúncias enviadas para esse Apartado, e, que, em consequência, deve ser absolvida da prática do ilícito contra-ordenacional em causa.
Esta pretensão da arguida não pode também proceder, pela seguinte ordem de razões.
Ainda que se reconhecesse validade à tese da arguida acerca das consequências absolutórias resultantes da retroacção dos efeitos das denúncias, ainda assim subsistiriam 6 casos em que não ocorreu tal retroacção dos efeitos.
Por outro lado, nem a letra da lei nem o seu espírito permitem concluir que o ponto 2.3.1. al. a) da Deliberação equipara às situações de aceitação de denúncias as situações de rejeição de denúncias seguidas de aceitação com retroacção dos efeitos.
Como atrás se deixou caracterizado, o ilícito em questão é de mera actividade ou formal, ou seja, a sua consumação ocorre pela mera execução de um comportamento humano, não exigindo a verificação de um efeito espácio-temporalmente distinto da acção; concretamente, a infracção consuma-se com a simples não-aceitação de uma denúncia regularmente comunicada/remetida para um contacto divulgado pelo prestador.
O mesmo ilícito, no que respeita aos interesses dos consumidores, é ainda de perigo abstracto (ou melhor, abstracto-concreto), pelo que a sua punição não depende nem da efectiva lesão do bem jurídico (lesão essa que só ocorrerá se, por causa da conduta do agente, o consumidor não mudar de prestador) nem da comprovação de que a conduta do agente colocou em perigo efectivo a mudança do consumidor para outro prestador.
Assim, caso o prestador faça posteriormente retroagir os efeitos da denúncia à data da sua recepção, tal apenas relevará em sede de determinação da medida da sanção, não tendo qualquer efeito sobre a consumação ou a punição da infracção.
Não existe a norma que exclua a punibilidade da rejeição de denúncias regularmente comunicadas para um contacto divulgado pelo prestador nas situações em que esse mesmo prestador faça posteriormente retroagir os efeitos dessas denúncias à data da sua recepção.
Pelo que é de refutar a defesa da tese da arguida NOS – Comunicações, ao dizer que existem novos factos pelos quais foi condenada e que os mesmos sempre seriam atípicos à luz da mencionada Deliberação ANACOM.
Pelo que improcedem aqui estes fundamentos de recurso conexionados com a impugnação de direito, de ambas as recorrentes.
Havendo, no entanto, que rectificar-se a sentença recorrida, de acordo com a fundamentação antecedente, neste domínio, em três pontos:
. no ponto V, deverá condenar-se a arguida pela prática negligente da contra-ordenação prevista no Art.º 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE em conjugação com o ponto 2.3.1. al. a) (tão-somente) da Deliberação ANACOM;
. no ponto II. do dispositivo da sentença recorrida deverá ser indicado o ponto 2.3.2. da Decisão da ANACOM de 9/3/2012 (vd. fls. 93 da sentença); e
. no ponto IV. do dispositivo da sentença recorrida foi indicado o ponto 2.4.5., quando se quereria fazer referência ao ponto 2.4.4. da Decisão da ANACOM de 09/03/2012 (vd. fls. 94 da sentença).
Pelo que o dispositivo da mesma sentença recorrida deverá ser corrigido para os seguintes moldes:
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Dispositivo
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Em face de todo o exposto, julgo o recurso parcialmente procedente nos seguintes termos:
I. Julgo improcedente a questão prévia invocada pela Recorrente;
II. Absolvo a Recorrente pela prática de uma contraordenação pela violação dolosa do estatuído no ponto 2.3.2. da DECISÃO, prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da Lei das Comunicações Eletrónicas (LCE), pela não aceitação de pedidos de denúncia contratual por telefone, apesar de dispor de um sistema de validação do utilizador.
III. Absolvo a Recorrente pela prática de uma contraordenação pela violação dolosa do estatuído no ponto 2.4.5. da DECISÃO, em conjugação com o disposto no artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, relativa ao envio de SMS aos clientes que lhe apresentam pedidos de denúncia incorretamente instruídos, não indicar o prazo de 30 dias úteis para o envio da documentação em falta, sob pena de caducidade da declaração de denúncia.
IV. Absolvo a recorrente pela prática de uma contraordenação pela violação dolosa do estatuído no ponto 2.4.4. da DECISÃO em conjugação com o disposto no artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, resultante do facto de o SMS que envia aos clientes que denunciaram os contratos não os informar, com caráter concreto, das obrigações emergentes da denúncia.
V. Condeno a Recorrente numa coima no valor de 50.000,00 euros (cinquenta mil euros), pela prática, a título negligente, da contraordenação prevista e punida no artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, em conjugação com o ponto 2.3.1. a) da DECISÃO DA ANACOM DE 09.03.2012 por não ter recebido pedidos de denúncia apresentados num endereço por si divulgado ao público.
VI. Numa coima no valor de 50.000,00 euros (cinquenta mil euros), pela prática, a título doloso, de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, em conjugação com os pontos 2.4.1. e 2.4.6. da Decisão da ANACOM de 09.03.2012, ao não ter aceitado e/ou determinado os seus efeitos nas datas em que as recebeu, denúncias contratuais legíveis, corretamente instruídas e remetidas nos termos da Decisão.
VII. Em duas coimas no valor de 3.500,00 euros (três mil e quinhentos euros) cada pela prática, em concurso efetivo e a título negligente, de duas contraordenações previstas e punidas pelos artigos 7.º, n.º 1, e 21.º, n.º 1 e 4, ambos do Decreto-Lei n.º  57/2008, de 26.03, por não ter informado dois clientes acerca dos períodos contratuais mínimos a que os mesmos, segundo ela, estariam vinculados.
VIII.   Na coima única de 90.000,00 euros (noventa mil euros).
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(iv) Da escolha e medida das coimas aplicadas pelo tribunal a quo, por decorrência dos demais fundamentos de recurso [ANACOM e NOS - Comunicações] e da violação da proibição da reformatio in pejus na sua compreensão lata e materialmente orientada (cfr. Art.º 72.º-A, n.º 1, do RGCO, ex vi Art.º 36.º do Regime Quadro das Contra-Ordenações do Sector das Comunicações (RQCOC), ou do disposto no Art.º 5.º, n.º 1, do mesmo RQCOC, por não atender à diminuição da ilicitude na determinação da medida da coima (coimas parcelares e coima única resultante do cúmulo) [NOS – Comunicações].
A recorrente ANACOM, dizendo que os fundamentos do seu recurso são procedentes, defende que a arguida NOS deveria ter sido condenada, com a confirmação da decisão administrativa, (i) numa coima de 100.000 € pelo ilícito previsto pelo art. 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE conjugado com o ponto 2.3.2 da Deliberação; (ii) numa coima de 40.000 € pelo ilícito previsto pelo art. 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE conjugado com o ponto 2.4.5 da Deliberação; (iii) numa coima de 50.000 € pelo ilícito previsto pelo art. 113.º n.º 1 al. bbb) da LCE conjugado com o ponto 2.4.4. da Deliberação; (iv) a título doloso pelo ilícito previsto pelo art. 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE conjugado com o ponto 2.3.1. a) da Deliberação, numa coima de 200.000 €; (v) numa coima única de 300.000 €.
Por seu turno, a arguida NOS, na suposição de que os demais fundamentos não eram procedentes e que seria condenada de acordo com os pressupostos jurídicos da sentença recorrida, ainda assim defende que a coima de 50.000 € aplicada pela prática da contra-ordenação prevista no ponto 2.4.6. da Deliberação em conjugação com o Art.º 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE viola o Art.º 5.º n.º 1 do Regime Quadro das Contra-Ordenações do Sector das Comunicações (RQCOSC) pois não atende à diminuição da ilicitude resultante da redução do número de ocorrências. E, viola ainda o princípio da proibição da reformatio in pejus por representar um agravamento virtual da coima aplicada face aos factos apurados. Deve a coima em causa ser reduzida para 23.437,50 €. Mais defende, ainda, que a coima única foi determinada em desconformidade aos critérios de determinação da medida da coima, consagrados no Art. 5.º do RQCOSC. Assim, para a mesma recorrente,    a alteração do elemento subjectivo do tipo da contra-ordenação por violação do ponto 2.3.1. al. a) da Deliberação, e, a diminuição do número de ocorrências na base da violação do ponto 2.4.6. da mesma Deliberação representam, respectivamente, uma diminuição da culpa da arguida e da ilicitude do facto, face à imputação da ANACOM. Pelo que, na acepção desta recorrente, tais circunstâncias abonatórias deveriam ter influído na determinação da medida concreta da coima única, afastando-a do limiar máximo do cúmulo jurídico: a coima única nunca poderia exceder o limite máximo de 80.437,50 €. Mais defende que a valoração in malam partem das circunstâncias que contribuíram para a determinação da medida da coima aplicada pela ANACOM consubstancia uma violação material do princípio da proibição da reformatio in pejus. Termina dizendo que deverá ser fixada uma coima única nunca superior de 56.467,13 €, correspondente a 70,2% do limite máximo de 80.437,50 €.
Quanto aos demais fundamentos do recurso da ANACOM.
Mantendo-se as três absolvições referentes aos pontos 2.3.2, 2.4.4. e 2.4.5 da Deliberação e a imputação a título negligente do ilícito referente ao ponto 2.3.1. a) da Deliberação, não procedem os fundamentos invocados por esta recorrente, apenas havendo que apreciar se as coimas individuais e a coima única de 90.000 € são adequadas e proporcionais, na análise dos demais fundamentos do recurso da NOS – Comunicações.
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Quanto aos demais fundamentos do recurso apresentado pela arguida NOS – Comunicações.
Como verificámos, nos termos do art. 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE, constitui contra-ordenação muito grave o “incumprimento de ordens ou mandados legítimos da ARN [ANACOM] regularmente comunicados aos seus destinatários”.
Dispõe o ponto 2.4.6. da Deliberação que “A declaração de denúncia considera-se efectuada na data da sua receção, sempre que cumpra os requisitos previstos nos números 2.1. e 2.2., ou, em caso de falta de informação ou documentação, na data da receção da mesma dentro do prazo previsto no número anterior”.

Na sua decisão final, a ANACOM condenou a arguida numa coima de 75.000 € pela prática, a título de dolo eventual, da contra-ordenação prevista no art. 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE em conjugação com o ponto 2.4.6. da Deliberação, por não ter considerado, nas datas em que as recepcionou, 16 denúncias contratuais legíveis e devidamente instruídas.
Depois, o tribunal a quo só veio a considerar provadas cinco situações de denúncias contratuais legíveis e devidamente instruídas que não foram consideradas nas respectivas datas de recepção, e, condenou a arguida numa coima de 50.000 € pela prática, a título de dolo eventual, do ilícito em causa.
Alega a arguida NOS - Comunicações que a coima de 50.000 € aplicada pela prática da contra-ordenação prevista no ponto 2.4.6. da Deliberação em conjugação com o Art.º 113.º n.º 3 al. bbb) da LCE viola o Art.º 5.º n.º 1 do RQCOSC pois não atende à diminuição da ilicitude resultante da redução do número de ocorrências. Que a mesma coima viola ainda o princípio da proibição da reformatio in pejus por representar um agravamento virtual da coima aplicada face aos factos apurados. E, que deve a coima em causa ser reduzida para 23.437,50 €.
No que respeita à determinação concreta das específicas sanções, lê-se na sentença recorrida o seguinte:
Sanções
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485. A coima funciona como uma “mera «admonição», como mandato ou especial advertência conducente à observância de certas proibições ou imposições legislativas” . Por conseguinte, devem ser estranhas à aplicação e determinação da medida da coima exigências de “retribuição ou expiação de uma culpa ética” , bem como de ressocialização do agente , pelo que esta sanção “desempenha uma função geral negativa e de prevenção especial negativa” .
486. A coima funciona como uma “mera «admonição», como mandato ou especial advertência conducente à observância de certas proibições ou imposições legislativas” . Por conseguinte, devem ser estranhas à aplicação e determinação da medida da coima exigências de “retribuição ou expiação de uma culpa ética” , bem como de ressocialização do agente , pelo que esta sanção “desempenha uma função geral negativa e de prevenção especial negativa” .
487. Estes fins devem ser alcançados, quanto às contraordenações previstas no DL n.º 57/2008, à luz dos critérios previstos no artigo 18.º, do RGCO, e quanto às contraordenações previstas na LCE, em função adicionalmente dos critérios enunciados no art. 5º, da Lei nº 99/2009, ex vi art. 1º/3, al j), deste diploma, designadamente a ilicitude concreta do facto, a culpa do agente, os benefícios obtidos com a prática da contraordenação e das exigências de prevenção, tendo ainda em conta a natureza singular ou coletiva do agente. Na determinação da ilicitude concreta do facto e da culpa das pessoas coletivas deve-se atender, entre outras, às seguintes circunstâncias: ao perigo ou ao dano causados;  ao carácter ocasional ou reiterado da infração;  a existência de atos de ocultação tendentes a dificultar a descoberta da infração;  a existência de atos do agente destinados a, por sua iniciativa, reparar os danos ou obviar aos perigos causados pela infração.
488. Ainda, quanto à culpa, entendida no ilícito de mera ordenação social como “uma imputação do facto à responsabilidade social do seu autor”  e não como “uma censura ética, dirigida à pessoa do agente e à sua atitude interna” , deve-se atender à medida da responsabilidade exigível à arguida.
489. Relevam também a situação económica e a conduta anterior do agente – cfr. arts. 18º/1, do RGCO, e 5º/4, da Lei nº 99/2009.
490. São ainda de considerar todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo, deponham a favor ou contra o arguido, nos termos previstos no art. 71º/2, do CP, ex vi art. 32º, do RGCO.
491. Importa ainda reiterar que o Tribunal está vinculado ao princípio da proibição da reformatio in pejus – cf. art. 72º-A/1, do RGCO.
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492. No que respeita à contraordenação relativa à não receção de denúncias remetidas para o Apartado de P..., a moldura legal abstrata é de € 10.000 a € 2.500.000 – cf. artigo 113.º, n.º 8, alínea e), da LCE na redação vigente à data dos factos, correspondente ao atual artigo 113.º, n.º 9, alínea e), da LCE, e artigos 4.º e 7.º, n.º 6, alínea d), ambos do RQCSC (considerando não existirem razões para crer que os fatores verificados em 2012 se tenham modificado de forma relevante para este efeito).
493. Uma coima de € 50.000 é adequada, necessária e suficiente. Assim, é proporcional à gravidade dos factos, tendo em conta, em primeiro lugar, que incide sobre a criação de obstáculos à denúncia dos contratos, destinando-se as normas respetivas a salvaguardar interesses jurídicos protegidos muito relevantes, porque associados com a mobilidade dos consumidores e, nessa medida e reflexamente, com a concorrência, que é uma garantia de maior qualidade e melhores preços. Em segundo lugar, a conduta incluiu 28 denúncias concretas, sendo cada consumidor importante para efeitos de definição do sentido de ilicitude.
494. A coima referida é também compatível com a culpa da Recorrente, que se enquadra na negligência grosseira, pois revela deficiência na definição de procedimentos minimamente eficazes.
495. É também necessária do ponto de vista das exigências de prevenção geral e especial, tendo em conta, por um lado, a notoriedade da Recorrente o seu posicionamento no mercado e, por outro lado, a sua dimensão e o potencial de afetação do interesse protegido, face ao seu universo de clientes.
496. Por fim, a coima é significativamente próxima do limite mínimo e, nessa medida, reflete todos os fatores que lhe são favoráveis, designadamente: o benefício económico obtido terá sido diminuto, uma vez que a maioria dos clientes logrou obter a aceitação das suas denúncias, com efeitos à data da primeira; e não ficou demonstrada a intenção de causar danos, nem tentativas de ocultação dos factos. 
497. Mostra-se igualmente compatível com a sua situação económica.
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498. No que respeita à contraordenação relativa às denúncias não ilegíveis, a moldura legal abstrata é de € 20.000 a € 5.000.000 – cf. artigo 113.º, n.º 8, alínea e), da LCE na redação vigente à data dos factos, correspondente ao atual artigo 113.º, n.º 9, alínea e), da LCE, e artigos 4.º e 7.º, n.º 6, alínea d), ambos do RQCSC (considerando não existirem razões para crer que os fatores verificados em 2012 se tenham modificado de forma relevante para este efeito).
499. Uma coima de € 50.000 é adequada, necessária e suficiente. Assim, é proporcional à gravidade dos factos e compatível com a culpa da Recorrente, tendo em conta, tal como referido a propósito da primeira contraordenação, que incide sobre a criação de obstáculos à denúncia dos contratos e, pese embora incida sobre menos casos que a anterior infração, a Recorrente agiu com dolo eventual. O que se reflete também nas exigências de prevenção especial, impondo-se que a Recorrente institua procedimentos internos estritos no sentido da aferição sempre e em todos os casos da digitalização com os originais arquivados, sempre que os documentos digitalizados sejam ilegíveis.
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500. Por fim, quanto às contraordenações por violação do artigo 7.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 57/2008, a moldura legal a considerar é de € 1.500 a € 22.445,91 (cf. artigo 21.º, n.ºs 1 e 4, do mesmo diploma).
501. Considera-se necessária, adequada e suficiente uma coima de € 3.500 relativamente a cada uma das infrações. Tal montante, sendo bastante mais próximo do limite mínimo do que do limite máximo reflete os fatores favoráveis à Recorrente, designadamente: o facto dos clientes não terem efetivamente tomado uma decisão de transação; a inexistência de benefício económico; e a circunstância das quantias peticionadas não serem muito elevadas. Em contrapartida, impõe-se uma coima com algum distanciamento em relação ao montante mínimo e com potencial intimidatório, pelas seguintes razões: as informações falsas ao incidirem sobre quantias a pagar, que é um dos fatores que mais condiciona a vontade contratual, e relacionadas com a cessação do contrato e com os interesses jurídicos referidos revelam um grau de ilicitude não despiciendo, razão pela qual as coimas são proporcionais à gravidade dos factos; no plano da culpa, é significativa, pois é empresa de grande dimensão, com um universo de clientes muito elevado e falhas a este nível têm um potencial de dano significativo, pelo que as coimas aplicadas são suportadas pela sua culpa; por fim, sendo a Recorrente uma empresa com forte implantação no mercado, as exigências de prevenção geral e especial são expressivas. Por fim, as coimas aplicadas ajustam-se à sua situação económico-financeira.
A coima funciona como uma mera “admonição”, como mandato ou especial advertência conducente à observância de certas proibições ou imposições legislativas. Por conseguinte, devem ser estranhas à aplicação e determinação da medida da coima exigências de retribuição ou expiação de uma culpa ética, bem como de ressocialização do agente, pelo que esta sanção desempenha uma função geral negativa e de prevenção especial negativa.
O alcance destes fins deve ser conseguido em função dos critérios enunciados no Art.º 18.º, n.º 1, do RGCO, designadamente a gravidade da contra-ordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da prática da contra-ordenação, bem como todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo, deponham a favor ou contra a arguida, nos termos previstos no Art.º 71.º, n.º 2, do Código Penal, ex vi Art.º 32.º, do RGCO.
Na aferição da gravidade concreta da infracção deve-se atender aos seguintes elementos: (i) ao bem ou interesse jurídico violado; (ii) ao modo de execução da conduta (desvalor da acção); (iii) às consequências (desvalor de resultado); (iv) ao grau de intensidade do dolo; e (v) em geral, a todas as circunstâncias que antecederam, envolveram e se seguiram ao cometimento da infracção.
Quanto à culpa, entendida no ilícito de mera ordenação social como uma imputação do facto à responsabilidade social do seu autor e não como uma censura ética, dirigida à pessoa do agente e à sua atitude interna, deve-se atender à medida da responsabilidade exigível à arguida.
A estes parâmetros acresce, nesta específica fase de impugnação judicial, os limites impostos pelo princípio da reformatio in pejus consagrado no Art.º 72.º-A, n.º 1, do RGCO, aditado pelo DL n.º 244/95, ex vi Art.º 52.º, da Lei n.º 25/2008.
Não existe padrão legal que do ponto de vista material, sem descurar os limites legais à frente apontados, condicione o tribunal a quo à valoração dos factos efectuada pela ANACOM na fixação das sanções. Por isso entende-se que o tribunal a quo era livre de fazer a sua própria valoração, tendo apenas por limites os critérios legais de determinação das coimas e o princípio da proibição da reformatio in pejus. É com estes critérios e princípio que se deve aferir da justeza e da legalidade das coimas parcelares e do cúmulo jurídico fixados por esse mesmo tribunal e não por recurso a cálculos matemáticos efectuados por referência ao número de casos dados como provados pela ANACOM e à valoração realizada pela mesma.
Saliente-se, em primeiro lugar, que, na verdade, não foi apenas a arguida NOS – Comunicações que recorreu para este Tribunal de recurso da decisão judicial que incidiu sobre a impugnação da decisão da autoridade administrativa.
Da sentença do tribunal a quo, recorreram a arguida NOS - Comunicações e também a própria autoridade administrativa, que pugnou também por um agravamento das medidas das coimas em conformidade com os demais fundamentos do seu recurso.
Certo que aqui nos devemos centrar, não procedendo os motivos do recurso da autoridade administrativa, nas condições e na própria estrutura condenatória da sentença judicial aqui impugnada.
Mas a verdade é que não estamos no domínio do funcionamento em pleno da proibição da reformatio in pejus, como parece querer inferir a arguida na argumentação expendida na sua motivação de recurso a propósito da determinação das coimas aplicáveis.
Por outro lado, ao invés do que se pretende inferir, nos casos tratados pelos Acs. do STJ de 13/2/2003, processo n.º 03P158, e da RE de 18/5/2004, processo n.º 59/04-1, disponível em https://blook.pt/caselaw/PT/TRE/180866/ (este último também citado em Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Regime Geral das Contra-Ordenações à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 2011, Lisboa: Universidade Católica Editora, em anotação 5. ao Art.º 72.º-A, pp. 296), à desqualificação jurídica de conduta dolosa para a conduta negligente sucedeu uma diminuição da coima aplicada pelo tribunal a quo.
Havendo que apurar se a estrutura dessa diminuição, em face da chamada compreensão lata e materialmente orientada da reformatio in pejus, não veio a deixar neutralizados, de forma significativa, os efeitos benéficos daquelas alterações (desqualificação para as contra-ordenações negligentes). Mesmo tendo em conta as regras do cúmulo jurídico para o concurso de contra-ordenações.
Embora se saiba que no domínio das contra-ordenações esta proibição da reformatio in pejus, para além de doutrinalmente controversa, não viola qualquer norma ou princípio constitucional, designadamente, o direito à tutela jurisdicional efectiva, consagrado no Art.º 20.º da CRPortuguesa, na modalidade de impugnação ou recurso das decisões condenatórias das autoridades administrativas, prevista no Art.º 268.º, n.º 4, o direito de defesa do arguido, previsto no Art.º 32.º, n.º 10, nem o princípio da igualdade consagrado no Art.º 13.º, todos da mesma Constituição, como decidiu o Ac. do TC n.º 373/2015, DR n.º 186/2015, II.ª Série de 23/9/2015, pp. 27428-27438 (que não julgou inconstitucional a norma do Art.º 416.º, n.º 8, do Código dos Valores Mobiliários, interpretada no sentido de que pode ser agravada a coima em sede de impugnação judicial interposta pelo arguido em sua defesa, sem correspondente alteração e/ou agravamento dos factos, elementos e circunstâncias da decisão administrativa condenatória).
Ora, o mesmo tribunal a quo teve bem presentes os critérios legais do Art.º 5.º n.º 1 do RQCOSC e não violou tal preceito legal, sendo a coima efectivamente “adequada, necessária e suficiente”.
Diz-nos o mesmo Art.º 5.º do RQCOC:
“Artigo 5.º
Determinação da sanção aplicável
1 - A determinação da medida da coima e a decisão relativa à aplicação de sanções acessórias são feitas em função da ilicitude concreta do facto, da culpa do agente, dos benefícios obtidos com a prática da contra-ordenação e das exigências de prevenção, tendo ainda em conta a natureza singular ou colectiva do agente.
2 - Na determinação da ilicitude concreta do facto e da culpa das pessoas colectivas e entidades equiparadas atende-se, entre outras, às seguintes circunstâncias:
a) Ao perigo ou ao dano causados;
b) Ao carácter ocasional ou reiterado da infracção;
c) À existência de actos de ocultação tendentes a dificultar a descoberta da infracção;
d) À existência de actos do agente destinados a, por sua iniciativa, reparar os danos ou obviar aos perigos causados pela infracção.
3 - Na determinação da ilicitude concreta do facto e da culpa das pessoas singulares, atende-se, além das referidas no número anterior, às seguintes circunstâncias:
a) Intenção de obter, para si ou para outrem, um benefício ilegítimo ou de causar danos;
b) Especial dever de não cometer a infracção.
4 - Na determinação da sanção aplicável são ainda tomadas em conta a situação económica e a conduta do agente.”
Salienta-se que foi dado como provado que a arguida tinha (e tem) instituído um procedimento interno de gestão documental em que “Os colaboradores da Arguida que analisam os pedidos de denúncia contratual não têm acesso aos documentos físicos, acedendo à sua versão digital em sistema” (ponto 169 da sentença, fls. 1670), que “A arguida sabia existirem falhas no processo de digitalização” (ponto 176 da sentença, fls. 1670), e, que “Verificando ilegibilidades nos documentos digitais (quer pela sua qualidade, quer pela sua validade) que instruíam os pedidos de denúncia de CG..., AT..., MAM..., de LS... e de ..., a Arguida, na pessoa dos seus colaboradores de back office, decidiu, de forma consciente, solicitar aos seus clientes que reenviassem esses mesmos documentos, colocando a possibilidade dos documentos originais remetidos pelos clientes e arquivados serem legíveis e conformando-se com essa possibilidade, tendo consciência da ilicitude da sua conduta” (ponto 177 da sentença, fls. 1671).
Tais decisões da arguida levaram a que denúncias contratuais legíveis e devidamente instruídas não fossem consideradas nas datas em que foram recepcionadas, e, onerou os clientes com a “necessidade desnecessária” de remeterem novas denúncias.
Uma vez que os casos detectados resultaram de uma opção da arguida de “devolver ao assinante a necessidade de reenviar a documentação em causa, quando podia ter dado instruções para suprir as falhas, mediante consulta do original” (ponto 341 da sentença, fls. 1702), e, que “não resulta da prova testemunhal a existência de instruções expressas e claras no sentido de que, perante uma digitalização inelegível [leia-se ilegível], tinha de ser sempre pedido o documento ao arquivo” (ponto 343 da sentença, fls. 1703), há o risco sério de - mantendo-se o procedimento interno de gestão documental e mantendo-se a ausência das referidas instruções expressas - voltarem a ocorrer outros casos similares aos dos autos. São pois elevadas as necessidades de prevenção especial.
Antes de mais, nem na decisão administrativa nem na douta sentença recorrida é estabelecido um valor unitário por cada caso, nem o poderia ter sido, face ao mencionado Art. 5.º RQCOC, devendo o perigo ou danos causados (incluindo aqui o número de casos) ser tido em conta na determinação da ilicitude concreta do facto e da culpa, entre outros mais factores, designadamente, ao carácter ocasional ou reiterado da infracção; à existência de actos de ocultação tendentes a dificultar a descoberta da infracção; e à existência de actos do agente destinados a, por sua iniciativa, reparar os danos ou obviar aos perigos causados pela infracção.
Ora, havendo vários critérios, e devendo ser todos valorados, é absolutamente seguro que, mantendo-se todos os demais invariáveis, como parece resultar da motivação de recurso da arguida e das suas conclusões, à variação de um só não poderá corresponder igual variação da medida da coima que é determinada pela conjugação de mais que um factor pelo que o raciocínio da recorrente parece errado, uma vez que havendo, por hipótese, dois factores a ponderar com igual peso, a redução de um deles em 50% corresponderia a uma redução de 25% do total e se fossem 3 factores, a mesma redução reflectir-se-ia em 16,5%; se fossem 4 factores com o mesmo peso à redução de um em metade corresponderia uma redução no total de 12,5%  e assim sucessivamente.
O segundo erro resulta do facto da medida abstracta da coima não começar do zero, pelo que a redução nunca poderia ser equivalente mas ter em conta o limite mínimo como o valor fixo para um só caso.
No que respeita a esta contra-ordenação a moldura legal abstracta é de € 20.000 a € 5.000.000 – cf. artigo 113.º, n.º 8, alínea e), da LCE na redacção vigente à data dos factos, pelo que se um caso devesse ser sancionado por 20.000 euros, e 16 casos por 75.000 euros, a 5 casos não iriam corresponder 23.475,50 Euros.
Naturalmente, a diminuição do número de casos deveria ter sido tida em conta na determinação da medida da coima, mas foi isso que sucedeu, uma vez que, por causa desse único critério, esta foi diminuída de 75.000,00 euros para 50.000,00 euros.
A medida da diminuição está extensamente fundamentada na sentença impugnada.
Dado que a coima parcelar fixada pelo tribunal a quo não é superior à fixada pela ANACOM, tendo inclusivamente ocorrido uma redução de 25.000 €, também o princípio da proibição da reformatio in pejus não foi violado, tanto no seu alcance directo como indirecto.
Em suma, deve manter-se a coima parcelar de 50.000 € pela contra-ordenação em causa.
Mas alega também a arguida NOS – Comunicações, que também a coima única foi determinada em desconformidade aos critérios de determinação da medida da coima, consagrados no art. 5.º do RQCOSC, e, que a valoração in malam partem efectuada pelo tribunal a quo das circunstâncias que contribuíram para a determinação da medida da coima aplicada pela ANACOM consubstancia uma violação material do mesmo princípio da proibição da reformatio in pejus.
Pugna a arguida pela aplicação de uma coima única correspondente a 70,2% do limite máximo do cúmulo jurídico, pois que é tal percentagem que se verifica entre a coima única aplicada pela ANACOM (de 347.500 €) e o então limite máximo do cúmulo (495.000 €).
Uma vez que a arguida pugnou para que a coima parcelar referente à violação do ponto 2.4.6. fosse fixada em 23.437,50 €, calculou o limite máximo do cúmulo jurídico em 80.437,50 € (invés de 107.000 €), e, considerou que a coima única nunca poderá ser superior a 56.467,13 € (correspondente a 70,2% do alegado limite máximo de 80.437,50 €).
Relembre-se aqui o determinado pelo tribunal a quo no que respeita a este cúmulo jurídico:
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502. Apuradas as sanções concretas, importa proceder ao cúmulo nos termos previstos no art. 19º, do RGCO, ou seja, a moldura legal abstrata não pode ser inferior a € 50,000 (cfr. art. 19º/3, do RGCO), nem pode ser superior a € 107.000,00 (cfr. art. 19º/1, do RGCO).
503. Na determinação da coima única deve-se atender à “apreciação conjunta dos factos e da responsabilidade social-adscritiva do agente” . Considerando que os factos estão relacionados com a criação de obstáculos às denúncias contratuais, que protegem um interesse muito relevante, entende-se adequada uma coima mais próxima do limite máximo, designadamente € 90.000,00.
Em primeiro lugar, importa frisar que a coima única é fixada em função da “apreciação conjunta dos factos e da responsabilidade social-adstritiva do agente”, como referido na sentença recorrida (citando-se Paulo Pinto de Albuquerque) e não em função dos critérios de determinação da medida da coima, consagrados no Art.º 5.º do RQCOSC, pois que tal levaria a uma dupla valoração das mesmas circunstâncias, e, consequentemente à violação do princípio da proibição da dupla valoração.
Em segundo lugar, reitera-se que o tribunal a quo não estava condicionado à valoração dos factos efectuada pela ANACOM na fixação das sanções, designadamente da coima única. Era livre de fazer a sua própria valoração, tendo apenas por limites os critérios legais de determinação da coima única e o princípio da proibição da reformatio in pejus.
Em terceiro lugar, a coima única de 90.000 € respeita os limites legais constantes dos n.ºs 1, 2 e 3 do Art.º 19.º do RGCO, e, é inferior à aplicada pela ANACOM, pelo que também não é infringido o princípio da proibição da reformatio in pejus.
Em quarto lugar, ponderando-se a globalidade dos factos provados e a responsabilidade social da arguida, a coima única é também ela adequada, necessária e suficiente.
Como se declara na sentença recorrida, “os factos estão relacionados com a criação de obstáculos às denúncias contratuais, que protegem um interesse muito relevante”. E, em face da dimensão da arguida e da sua capacidade económica (vd. pontos 207 e 208 da sentença recorrida, a fls. 1674), era/é muito elevada a responsabilidade social da arguida em respeitar os bens jurídicos protegidos pelas normas violadas.
Na medida da coima única a recorrente NOS faz exactamente o mesmo raciocínio em que ignora também a existência de limites mínimos (a medida da pena mais elevada – Art.º 77.º do Código Penal) e entrando em conta com os cálculos supra-referidos, que também são errados, pelo que pelas razões já acima expostas e que seria impertinente repetir, o seu raciocínio, em que o limite mínimo é zero, se apresenta errado.
E por isso não existe fundamento para a sua alegação de violação da reformatio in pejus, que supôs ter demonstrado com a aplicação de regras aritméticas básicas a limites máximos ignorando que a fixação das coimas, quer as coimas parcelares quer mesmo o cúmulo (repete o mesmo erro duas vezes) se não faz entre zero e o limite máximo, como o calcula, mas entre um limite máximo e um limite mínimo que, no caso presente, é o limite mais próximo das coimas que lhe foram aplicadas.
Em síntese, deve manter-se a coima única de 90.000 €.
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Em face de tudo o exposto, não se verifica qualquer das nulidades invocadas ou dos vícios de sentença suscitados, improcedendo todos os demais fundamentos dos recursos, mantém-se a sentença recorrida condenatória, sobre a qual incidirão apenas as correcções acima apontadas no ponto (iii) e que serão reflectidas na parte dispositiva deste acórdão.
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IV. DECISÃO
Pelo exposto acordam os Juízes desta Relação em:
1. corrigir a sentença de acordo com o acima fundamentado em (iii), passando a constar da parte dispositiva dessa sentença o seguinte -  
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Dispositivo
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Em face de todo o exposto, julgo o recurso parcialmente procedente nos seguintes termos:
I. Julgo improcedente a questão prévia invocada pela Recorrente;
II. Absolvo a Recorrente pela prática de uma contraordenação pela violação dolosa do estatuído no ponto 2.3.2. da DECISÃO, prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da Lei das Comunicações Eletrónicas (LCE), pela não aceitação de pedidos de denúncia contratual por telefone, apesar de dispor de um sistema de validação do utilizador.
III. Absolvo a Recorrente pela prática de uma contraordenação pela violação dolosa do estatuído no ponto 2.4.5. da DECISÃO, em conjugação com o disposto no artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, relativa ao envio de SMS aos clientes que lhe apresentam pedidos de denúncia incorretamente instruídos, não indicar o prazo de 30 dias úteis para o envio da documentação em falta, sob pena de caducidade da declaração de denúncia.
IV. Absolvo a recorrente pela prática de uma contraordenação pela violação dolosa do estatuído no ponto 2.4.4. da DECISÃO em conjugação com o disposto no artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, resultante do facto de o SMS que envia aos clientes que denunciaram os contratos não os informar, com caráter concreto, das obrigações emergentes da denúncia.
V. Condeno a Recorrente numa coima no valor de 50.000,00 euros (cinquenta mil euros), pela prática, a título negligente, da contraordenação prevista e punida no artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, em conjugação com o ponto 2.3.1. a) da DECISÃO DA ANACOM DE 09.03.2012 por não ter recebido pedidos de denúncia apresentados num endereço por si divulgado ao público.
VI. Numa coima no valor de 50.000,00 euros (cinquenta mil euros), pela prática, a título doloso, de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, em conjugação com os pontos 2.4.1. e 2.4.6. da Decisão da ANACOM de 09.03.2012, ao não ter aceitado e/ou determinado os seus efeitos nas datas em que as recebeu, denúncias contratuais legíveis, corretamente instruídas e remetidas nos termos da Decisão.
VII. Em duas coimas no valor de 3.500,00 euros (três mil e quinhentos euros) cada pela prática, em concurso efetivo e a título negligente, de duas contraordenações previstas e punidas pelos artigos 7.º, n.º 1, e 21.º, n.º 1 e 4, ambos do Decreto-Lei n.º  57/2008, de 26.03, por não ter informado dois clientes acerca dos períodos contratuais mínimos a que os mesmos, segundo ela, estariam vinculados.
VIII.  Na coima única de 90.000,00 euros (noventa mil euros).”
2. julgar não providos os recursos interpostos pela arguida/recorrente, “NOS – Comunicações, SA.”, e pela autoridade administrativa “ANACOM – Autoridade Nacional de Comunicações”, confirmando-se a sentença recorrida do tribunal a quo, com o seu dispositivo corrigido nos moldes acima transcritos, mantendo-se, no mais, a mesma decisão.
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Fixa-se a taxa de justiça devida pelas recorrentes em 5 (cinco) UC’s.
Notifique-se.
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Processado por computador e revisto pelo primeiro signatário (cfr. Art.º 94.º, n.º 2, do CPPenal).

Lisboa, 4 de Abril de 2018

Nuno Coelho
Ana Paula Grandvaux