Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
| ||
Relator: | MARIA JOSÉ COSTA PINTO | ||
Descritores: | SUCESSÃO DE EMPRESAS SEGURANÇA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS OPOSIÇÃO DO TRABALHADOR PREJUÍZO SÉRIO | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 12/15/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | N | ||
Texto Parcial: | S | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A SENTENÇA | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | I – A sucessão de empresas de segurança na prestação de serviços de segurança, acompanhada da manutenção do equipamento indispensável à execução do serviço contratado essencial e da assunção pela nova empresa de alguns trabalhadores da empresa anterior, constitui transferência de estabelecimento para efeitos do artigo 285.º do Código do Trabalho. II – O exercício do direito de oposição à transmissão do contrato de trabalho depende da possibilidade de a mesma causar “prejuízo sério” ao trabalhador, exemplificando a lei com as situações de haver manifesta falta de solvabilidade ou situação financeira difícil do adquirente e de a política de organização do trabalho deste não merecer confiança, exemplos que auxiliam a tarefa do intérprete na adopção de critérios mais ou menos abertos para aferir em que consiste o “prejuízo sério”. III – A oposição mostra-se fundada se o novo prestador do serviço de vigilância recusa aos trabalhadores os direitos emergentes do contrato com a transmitente, subscrevendo com os mesmos um novo contrato a termo, o que constitui motivo bastante para que o trabalhador se confronte com a real possibilidade de perda da estabilidade laboral e dos direitos e garantias que até então lhe eram proporcionados e integra «prejuízo sério», justificando que o trabalhador não tenha confiança na política da organização da adquirente. (Elaborado pelo relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: Relatório AAA, intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum contra: - BBB - CCC No termo da sua petição inicial, o A. pediu que seja a R. CCC. condenada a: 1- Reconhecer a transmissão do A. para a R. CCC, com efeitos a partir de 1/5/2020, na posição de entidade empregadora no contrato individual de trabalho do mesmo, e consequentemente a obrigação de respeitar todos os direitos decorrentes desse contrato, incluindo a antiguidade e demais garantias; 2 - Reintegrar o A. ao seu serviço, no local de trabalho Centro …, atribuindo-lhe as funções inerentes à sua categoria profissional de vigilante, no horário que praticava; 3 - A pagar ao A. as retribuições vencidas desde Maio/2020, que se contabilizam em € 1.531,14 (765,57 x 2) e as demais que se vencerem, como se estivesse no normal exercício de funções, até à efectiva reintegração; Ou A pagar ao A. uma indemnização em substituição da reintegração, férias e subsídio de férias vencidos em Janeiro de 2020 e proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal até à presente data, no valor de €3.445,06, tendo em conta a antiguidade do A., caso não seja possível e reintegração; − €765,57 a titulo de indemnização em substituição da reintegração; − €1.531,14 a titulo de férias e subsídio de férias, vencidos em Janeiro de 2020; − €1.148,35 a título de proporcionais de férias, subsídio férias e de Natal até à presente data; 4 - A pagar ao A. os juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde o vencimento de cada prestação supra peticionada, até integral e efectivo pagamento. Se assim não se entender e subsidiariamente, deve a R. BBB ser condenada a: 1 - Reintegrar o A. ao seu serviço, no local de trabalho Centro …, atribuindo-lhe as funções inerentes à sua categoria profissional de vigilante, no horário que praticava; 2 - A pagar ao A. as retribuições vencidas desde Maio/2020, que se contabilizam em € 1.531,14 (765,57 x 2) e as demais que se vencerem, como se estivesse no normal exercício de funções, até à efectiva reintegração; Ou A pagar ao A. uma indemnização em substituição da reintegração, férias e subsídio de férias vencidos em Janeiro de 2020 e proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal até à presente data, no valor de €3.445,06, tendo em conta a antiguidade do A., caso não seja possível e reintegração; − €765,57 a titulo de indemnização em substituição da reintegração; − €1.531,14 a titulo de férias e subsídio de férias, vencidos em Janeiro de 2020; − €1.148,35 a título de proporcionais de férias, subsídio férias e de Natal até à presente data; 3 - A pagar ao A. os juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde o vencimento de cada prestação supra peticionada, até integral e efectivo pagamento. Em fundamento da respectiva pretensão, alegou, em síntese: que foi trabalhador da 1ª Ré, BBB, entre 01 de Setembro de 2019 e 30 de Abril de 2020, com a categoria profissional de Vigilante e local de trabalho no Centro …. na Amadora.; que no dia 20 de Abril de 2020, recebeu uma carta da empregadora informando-o da transmissão do estabelecimento correspondente ao cliente Centro … e da nova entidade empregadora, que seria a aqui 2ª Ré, a partir do dia 01 de Maio de2020; que aceitou ser transferido para a Ré BBB, com efeitos a partir do dia 01 de Maio de 2020, mas a Ré BBB não o deixou entrar no local de trabalho e desempenhar as suas funções, motivo porque se considera ilicitamente despedido. Realizada audiência de partes, na qual não foi possível a conciliação entre as mesmas, a R. BBB,., apresentou contestação, refutando a existência de uma transmissão de estabelecimento porquanto os serviços de vigilância e segurança não constituem uma unidade económica. Alegou também que nunca teve qualquer vínculo laboral com o A. e que não houve transmissão dos contratos de trabalho existentes na 1ª Ré para a 2ª Ré, uma vez que se verificou apenas uma sucessão de empresas a prestar aqueles serviços para aquele cliente, e que o A. se opôs expressamente à transmissão e em como desejava continuar ao serviço da 1ª Ré, ainda que em outro local de trabalho. Alega ainda que nos termos do CCT aplicável, celebrado entre a AESIRF - Associação Nacional das Empresas de Segurança e a ASSP - Associação Sindical da Segurança Privada, publicado no BTE nº 26, de 2019, a situação dos autos não se enquadra no conceito de transmissão de empresa, já que não estão verificados os necessários requisitos do conceito de unidade económica, e que não é aplicável o CCT invocado pelo A., uma vez que a AESIRF - Associação Nacional das Empresas de Segurança, de que é associada, não foi outorgante do indicado CCT. Manifesta, a final, a sua oposição à reintegração nos termos do artigo 60.º-A do CPT e defende a improcedência da acção, com a sua absolvição do pedido. Também a R. BBB apresentou contestação na qual defendeu a improcedência da ação na parte referente aos pedidos contra si deduzidos e alegou, em suma: que prestou serviços de vigilância ao cliente Centro Comercial …, local de trabalho do Autor e de outros dez vigilantes; que a partir do dia 01 de Maio de 2020 a 2.ª R. alocou ao local o mesmo número de vigilantes e prestou os serviços com os mesmos recursos logísticos até então existentes, pertencentes ao Centro Comercial …, mantendo-se o modo de exercício da atividade; que informou o A. e outros trabalhadores que passariam a ser trabalhadores da BBB; que são nulas as disposições dos CCT que consagram a posição de que a adjudicação do contrato de prestação de serviço de segurança privada a novo empresário não preenche a figura jurídica da transmissão de unidade económica, por violação de norma legal, atento o disposto nos artigos 3º, nº 3, alínea m) e 478º, nº 1, alínea d) do Código do Trabalho e artigo 294º do Código Civil; que, considerando o serviço prestado pelas Rés ao mesmo cliente, a sucessão no tempo sem que tenha ocorrido quebra de serviço e a afetação do mesmo número de vigilantes pela 2.ª Ré, ocorreu transmissão da sua posição de empregadora para esta, não tendo o A sido por si despedido. Foi proferido despacho saneador e dispensou-se a identificação do objecto do litígio, bem como a enunciação dos temas de prova. Foi fixado à acção o valor de € 3.445,06. Realizou-se audiência de julgamento, na qual o A. declarou optar pela indemnização no caso de procedência da acção, após o que foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo: «[…] Pelo exposto, julgando procedente, por provada, a presente ação e, em consequência: a) Declaro ilícito o despedimento do … formalizado pela Ré BBB., com efeitos a partir do dia 01.05.2020; b) Condeno a Ré CCC., a pagar ao Autor as seguintes quantias: - €2.296,71 (dois mil duzentos e noventa e seis euros e setenta e um cêntimos), a título de indemnização pelo despedimento ilícito e em substituição da reintegração, calculada por referência a 30 dias de retribui meses); - as retribuições vencidas desde 21.06.2020 até ao trânsito em julgado da presente decisão, nelas se incluindo os subsídios de férias e de Natal, por referência à retribuição base de €765,57, mas com o limite do pedido formulado de € 2.679,49 (€1.531,14 + €1.148,35), deduzindo-se as importâncias a que aludem as alíneas a) e c) do artigo 390º do CT, a apurar em sede de liquidação de sentença; - os juros de mora vencidos e vincendos, calculados à taxa legal supletiva em vigor, desde o vencimento de cada prestação, até efetivo e integral pagamento; c) absolvo do pedido a Ré BBB ….. Custas pela Ré BBB …. […]» 1.2. A R. BBB, inconformada, interpôs recurso da sentença, tendo formulado, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões: (...) 1.3. Não consta que tenham sido apresentadas contra-alegações. 1.4. O recurso foi admitido, vindo a ser-lhe fixado ulteriormente efeito suspensivo atenta a caução prestada pela recorrente. 1.5. A Exma. Procuradora-Geral Adjunta defendeu no seu douto Parecer que deve ser concedido provimento ao recurso, o que implica que venha a considerar-se procedente o pedido formulado pelo A. contra a 2.ª R. Não foi apresentada resposta a este Parecer. Colhidos os “vistos” e realizada a Conferência, cumpre decidir. 2. Objecto do recurso Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigo 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, aplicável “ex vi” do art.º 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal prendem-se com a análise: 1.ª – da impugnação da decisão da matéria de facto quanto aos factos 30., 8., 19., 21., 23. e à alínea b) dos factos “não provados”; 2.ª – de saber se a substituição da recorrente (a recorrente) pela CCC na actividade de vigilância e segurança exercida nas instalações do Centro …, na sequência do termo do contrato de prestação de serviço de segurança celebrado com a primeira e de um novo contrato de prestação de serviço firmado com a segunda, deve considerar-se uma “transmissão de empresa ou estabelecimento” para efeitos do artigo 285.º do Código do Trabalho; 3.ª – em caso afirmativo, quais as consequências desse facto no vínculo laboral do A., ora recorrido; 4.ª – da alegada inconstitucionalidade. 3. Fundamentação de facto 3.1. A recorrente impugna a decisão da matéria de facto no que concerne aos pontos 30., 8., 19., 21., 23. dos factos provados e à alínea b) dos factos “não provados”. Vejamos cada um deles. 3.1.1. O tribunal a quo considerou provado que: “30. … e … que foram trabalhadores da Ré BBB nas instalações do Centro Comercial …até 30.04.2020, celebraram com a Ré BBB contratos de trabalho a termo certo, conforme resulta do teor dos contratos juntos a fls. 150 a 158.” Alega a recorrente que a sentença não concretizou o local de trabalho e o momento (dia) de admissão nessa cessionária, invoca que do teor dos contratos e o mapa do horário de trabalho junto resulta outra realidade e defende que se considere provado que: «30. (…), (…)(…)(…)(…) que foram trabalhadores da Ré BBB nas instalações do Centro Comercial …até 30.04.2020, celebraram com a Ré BBB contratos de trabalho a termo certo, no dia 30.05.2020, dia 21.04.2020 e 21.04.2020, respetivamente, para prestar funções nas instalações do C. C. …, conforme resulta do teor dos contratos juntos a fls. 150 a 158» [conclusão g.]. Com uma metodologia pouco ortodoxa, vem depois a defender na mesma peça, a par da impugnação do facto 21. e da alínea b) dos factos “não provados”, que ao indicado facto seja conferida uma outra redacção, a saber: «30. A Ré CCC, para iniciar o serviço de segurança privada a si adjudicado pelo CC …, no dia 01.05.2020, alocou, por sua única e exclusiva decisão e opção, oito (8) trabalhadores vigilantes, entre os quais (…) , (…) (…) (…) (…) que foram trabalhadores da Ré BBB nas instalações do Centro Comercial … até 30.04.2020, celebraram com a Ré BBB contratos de trabalho a termo certo, para prestar funções nas instalações do C. C. …, conforme resulta do teor dos contratos juntos a fls. 150 a 158» [conclusão z.]. Na medida em que a matéria que se pretende ver aditada nesta segunda redacção proposta se mostra contemplada no facto 21. e na alínea b) dos factos “não provados”, também impugnados, é espúreo que o ponto 30. dos factos provados sobre a mesma verse, sob pena de redundância, pelo que se apreciará oportunamente a impugnação deduzida a propósito de tal matéria quanto àqueles pontos da decisão. Analisando os contratos escritos documentados a fls. 150 e ss. indicados pela recorrente, verifica-se que, no que respeita à data convencionada para o início da produção de efeitos de tais contratos – aliás, dados como reproduzidos no ponto 30. da decisão – o (…) foi admitido ao serviço da 2.ª R. com início a 1 de Maio de 2020 (fls. 150 verso), o (…) foi admitido ao serviço da 2.ª R. com início a 22 de Abril de 2020 (fls. 153 verso) e o (…) foi admitido ao serviço da 2.ª R. com início a 1 de Junho de 2021 (fls. 156 verso), sendo os contratos celebrados, respectivamente, em 30 de Abril de 2020 (fls. 151 verso), 21 de Abril de 2020 (fls. 154 verso) e 31 de Maio de 2021 (fls. 157 verso), o que não coincide exactamente com a pretensão formulada pela recorrente, não podendo a mesma acolher-se no que concerne à data da celebração dos contratos de trabalho a termo que, aliás, não foi alegada no seu articulado.. Todavia, resulta do depoimento da testemunha (…), Diretor de Serviços, funcionário da Ré BBB há cinco anos, que confirmou que alguns trabalhadores da Ré BBB assinaram contratos a termo com a BBB, mediante entrevista prévia, para ali prestar o seu trabalho, o que é conforme com os mapas de horário de trabalho praticados pela 2.ª R. no Centro Comercial …, Amadora – documentos que se mostram a fls. 165 e ss. e foram juntos pela 2.ª R., não tendo sido impugnados por qualquer das partes –, dos quais resulta que os indicados trabalhadores fizeram parte das escalas de turnos ao serviço da 2.ª R. no Centro ComerciaL ... a partir do dia 1 de Maio de 2020. Assim, tendo em consideração que a recorrente alegou a sua contestação que “em 01 de maio de 2020, a 2.ª Ré BBB, manteve os mesmos recursos humanos (…) do serviço contratado e prestado nas instalações do Centro Comercial …e adjudicado à 2.ª Ré” (artigo 29.º da contestação), reanalisando a prova produzida e tendo em atenção o teor dos documentos de fls. 150 a 158 e de fls. 165 e ss. (mapas de horário de trabalho), conjugados com o depoimento da testemunha …, atende-se parcialmente à pretensão do recorrente e altera-se a redacção do ponto 30. dos factos provados para a seguinte: “30. (…),(…) (…) (…) que foram trabalhadores da Ré BBB nas instalações do Centro Comercia ... até 30.04.2020, celebraram com a Ré BBB contratos de trabalho a termo certo, conforme resulta do teor dos contratos juntos a fls. 150 a 158 para prestar funções naquelas instalações, sendo escalados para o efeito a partir de 1 de Maio de 2020”. 3.1.2. A recorrente impugna também o facto 8. da sentença, no qual se mostra provado que: “8. A Ré BBB enviou à Ré CCC, carta datada de 20.04.2020, junta fls. 89 a 102, onde identifica os trabalhadores (vigilantes) afetos ao local pertença do Centro Comercial … como sendo os trabalhadores que pretende transmitir para a ora Ré CCC.” Segundo a recorrente, o tribunal deu como provado que a recorrente comunicou à recorrida os trabalhadores objeto da transmissão da unidade económica, sem densificar ou concretizar o número concreto de trabalhadores vigilantes, mas do mapa dos trabalhadores transmitidos, anexo à comunicação junto nos presentes autos resulta uma outra realidade factual. Propõe a seguinte redação: «8. A Ré BBB enviou à Ré CCC, carta datada de 20.04.2020, junta fls. 89 a 102, onde identifica os dez (10) trabalhadores (vigilantes) afetos ao local pertença do Centro Comercial … como sendo os trabalhadores que pretende transmitir para a ora Ré CCC». Analisada a carta de fls 89 e ss., verificamos que a mesma não identifica os dez (10) trabalhadores (vigilantes) afetos ao local pertença do Centro Comercial … como sendo os trabalhadores que a ora recorrente pretendia transmitir para a 2.ª Ré, quer na própria carta, quer em qualquer anexo que, a existir, não se mostra documentado nos autos. Nada há, pois, a alterar quanto ao facto 8. 3.1.3. A recorrente impugna igualmente o facto 19. da sentença, alegando que o tribunal nele deu como provados os bens e equipamentos utilizados na execução do serviço de segurança privada nas instalações do CC … e a este pertencentes, sem que tivesse efetuado a respetiva e completa descrição, pois do depoimento das testemunhas (…) e (…) resulta a existência de um sistema de alarme de intrusão, equipamento que é indispensável. A sentença considerou provado, a este propósito, que: “19. Para o exercício destas funções a equipa de vigilância, onde o Autor estava inserido, dispunha de uma cadeira, uma secretária, um chaveiro, um telefone fixo, sistema completo de CCTV, composto por computador, monitores e câmaras de captação de imagens, uma central de incêndios (SADI) localizada no interior do Centro Comercial … e vestuário equipado com cacifos.” Resulta da alegação da recorrente, no confronto com o facto 19. considerado provado na sentença, que pretende se adite a este facto que dispunha, também, de um “sistema de alarme de intrusão”. Verifica-se que a recorrente alegou o pertinente facto no artigo 39.º da sua contestação, concretamente que dispunha nas instalações do Centro Comercial … de um “sistema de alarme de intrusão”, o que está em consonância com os depoimentos das testemunhas (…) (director de serviços da 2.ª R.) e (…) (…) (colega de trabalho do A. e vigilante ao serviço da recorrente, no período em que esta prestou serviços de vigilância e segurança naquele local), sendo certo que na motivação da sentença nada é indicado no sentido de se justificar a razão da exclusão – ou não inclusão – deste equipamento entre os elencados no facto 19. Assim, uma vez reanalisada a prova produzida, entendemos dever alterar-se o facto 19., passando o mesmo a ter a seguinte redacção: “19. Para o exercício destas funções a equipa de vigilância, onde o Autor estava inserido, dispunha de uma cadeira, uma secretária, um chaveiro, um telefone fixo, sistema completo de CCTV, composto por computador, monitores e câmaras de captação de imagens, um sistema de alarme de intrusão, uma central de incêndios (SADI) localizada no interior do Centro Comercial … e vestuário equipado com cacifos.” 3.1.4. A recorrente impugna também a decisão do tribunal a quo de considerar provado que: “21. Em 01.05.2020 e 01.07.2020, a Ré BBB outorgou com o cliente Condomínio do Centro Comercial ... os contratos de prestação de serviços de vigilância que constam a fls. 106 a 109, 111 a 113.” “23. A CCC começou a prestar funções como empresa de segurança privada nas instalações do C.C. … no dia 01/05/2020 e no dia 01/07/2020¸inicialmente com oito vigilantes, mas o número veio a ser reduzido por força da pandemia covid 19.” E de considerar “não provado” que: “b) A Ré CCC, após a adjudicação do serviço pelo Centro Comercial …, alocou, a partir do dia 01.05.2020, o mesmo número de vigilantes (11) que ali desempenhavam funções pela Ré BBB.” (…) Improcede a impugnação da decisão de facto quanto a este aspecto. 3.2. São, assim, os seguintes, os factos materiais a atender para a decisão jurídica do pleito (destacam-se a traço grosso os que foram objecto de alteração): (…) 19. Para o exercício destas funções a equipa de vigilância, onde o Autor estava inserido, dispunha de uma cadeira, uma secretária, um chaveiro, um telefone fixo, sistema completo de CCTV, composto por computador, monitores e câmaras de captação de imagens, um sistema de alarme de intrusão, uma central de incêndios (SADI) localizada no interior do Centro Comercial … e vestuário equipado com cacifos. 30. (…) (…) (…) (…) (…) (…) que foram trabalhadores da Ré BBB nas instalações do Centro Comercial … até 30.04.2020, celebraram com a Ré CCC contratos de trabalho a termo certo, conforme resulta do teor dos contratos juntos a fls. 150 a 158 para prestar funções naquelas instalações, sendo escalados para o efeito a partir de 1 de Maio de 2020. 4. Fundamentação de direito * 4.1. Tendo em consideração a data em que se verificaram os factos que integram a causa de pedir da presente acção – Junho de 2020 –, o regime jurídico a atender é o constante do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 14/2018, de 19 de Março, que alterou o regime jurídico aplicável à transmissão de empresa ou estabelecimento e entrou em vigor antes dos factos em análise no presente recurso, em 20 de Março de 2018 (artigo 4.º). Não se aplicam ao caso sub judice as alterações ao Código do Trabalho operadas pela Lei n.º 18/2021, de 08 de Abril, que estendeu o regime jurídico aplicável à transmissão de empresa ou estabelecimento “às situações de transmissão por adjudicação de fornecimento de serviços que se concretize por concurso público, ajuste directo ou qualquer outro meio” (artigo 1.º), diploma que alterou designadamente o artigo 285.º, n.º 10 do Código do Trabalho[1] e entrou em vigor no dia 9 de Abril de 2021 (artigo 4.º). Ainda que tenha estendido expressamente a aplicação das alterações introduzidas pelo diploma “igualmente, aos concursos públicos ou outros meios de seleção, no setor público e privado, em curso durante o ano de 2021, incluindo aqueles cujo ato de adjudicação se encontre concretizado” (artigo 3.º), não abarca, de modo algum, adjudicações efectuadas no ano de 2020[2]. Há, assim, que analisar o caso dos autos à luz da redacção do artigo 285.º que estava em vigor à data dos factos, a introduzida pela Lei n.º 14/2018, de 19 de Março. 4.2. Resulta dos factos provados que a 1.ª R., ora recorrente, BBB esteve incumbida do serviço de vigilância e segurança das instalações do Centro Comercial …, na Amadora – onde o A. exercia funções de vigilante ao seu serviço –, até 30 de Abril de 2020 e que, a partir de 1 de Maio de 2020, este serviço passou a ser atribuído à 2.ª R., ora recorrida, BBB, Lda. (factos 1., 2., 7. e 15. a 25.). Está em causa saber se a substituição da 1.ª R. na actividade de vigilância exercida nas instalações do Centro Comercial …, na sequência do termo do contrato de prestação de serviço de vigilância celebrado entre o condomínio deste Centro Comercial e a 1.ª R. e da vigência de um novo contrato de prestação de serviço firmado pelo condomínio do mesmo Centro Comercial com a 2.ª R., S.A., deve considerar-se uma “transmissão de empresa ou estabelecimento” para efeitos do artigo 285.º do Código do Trabalho e do artigo 1.º, n.º 1, alínea a), da Directiva 2001/23/CE, do Conselho, de 12 de Março de 2001[3]. 4.3. O artigo 285º, do Código do Trabalho, sob a epígrafe “[e]feitos de transmissão de empresa ou estabelecimento” estabelece que: «1 - Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmitem-se para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, bem como a responsabilidade pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laboral. 2 - O disposto no número anterior é igualmente aplicável à transmissão, cessão ou reversão da exploração de empresa, estabelecimento ou unidade económica, sendo solidariamente responsável, em caso de cessão ou reversão, quem imediatamente antes tenha exercido a exploração. 3 - Com a transmissão constante dos n.ºs 1 ou 2, os trabalhadores transmitidos ao adquirente mantêm todos os direitos contratuais e adquiridos, nomeadamente retribuição, antiguidade, categoria profissional e conteúdo funcional e benefícios sociais adquiridos. (…) 5 - Considera-se unidade económica o conjunto de meios organizados que constitua uma unidade produtiva dotada de autonomia técnico-organizativa e que mantenha identidade própria, com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória. (…)» Este preceito acolheu o âmbito de aplicação e as definições adoptadas pela Directiva 2001/23/CE, que foi transposta para a ordem jurídica interna através da Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprovou o Código do Trabalho. Do artigo 1º, n.º 1, da citada Directiva, consta o seguinte: “a) A presente directiva é aplicável à transferência para outra entidade patronal de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento, quer essa transferência resulte de uma cessão convencional quer de uma fusão. b) Sob reserva do disposto na alínea a) e das disposições seguintes do presente artigo, é considerada transferência, na acepção da presente directiva, a transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória. c) A presente directiva é aplicável a todas as empresas, públicas ou privadas, que exercem uma actividade económica, com ou sem fins lucrativos. A reorganização administrativa de instituições oficiais ou a transferência de funções administrativas entre instituições oficiais não constituem uma transferência na acepção da presente directiva”. E o seu considerando prévio 8º refere que “[p]or motivos de segurança e de transparência jurídicas, foi conveniente esclarecer o conceito jurídico de transferência à luz da jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias. Esse esclarecimento não alterou o âmbito da Directiva 77/187/CEE, tal como é interpretado pelo Tribunal de Justiça”. O que torna relevante a jurisprudência do TJUE, quer a posterior à Directiva 2001/23, quer a anterior, produzida ainda ao abrigo da Directiva 77/187, para responder à questão de saber se se desenha a figura da transmissão de uma unidade económica com a sucessão dos contratos de prestação de serviço relativos à vigilância das instalações do Centro Comercia ..., serviço que foi adjudicado à 1.ª R., ora recorrente, até 30 de Abril de 2020 e, a partir de 01 de Maio de 2020, à 2.ª R., ora recorrida. Decorre do regime traçado no artigo 285.º do Código do Trabalho – que corresponde com algumas alterações ao artigo 37º da Lei do Contrato Individual de Trabalho (LCT), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 49.408, de 24 de Novembro de 1969, e ao art.º 318º do Código do Trabalho de 2003 – que, nos casos de transmissão da titularidade do estabelecimento ou da ocorrência de quaisquer actos ou factos que envolvam a transmissão da sua exploração, não é afectada em princípio a subsistência dos contratos de trabalho, nem o respectivo conteúdo. Verificando-se uma transmissão de estabelecimento, há uma alteração subjectiva da parte que no contrato de trabalho ocupa a posição de empregador. No que diz respeito aos conceitos jurídicos de “empresa ou estabelecimento” e de “transmissão”, o artigo 285.º do Código não estabelece uma definição (ao invés do que sucede com conceitos pressupostos noutros institutos do código). Quanto ao primeiro conceito – de “empresa ou estabelecimento” –, o código limita-se a dar um contributo para a sua definição ao descrever em que consiste uma “unidade económica”. Em literal consonância com a directiva nº 2001/23/CE do Conselho, que transpõe, o artigo 285º do Código do Trabalho definiu na sua primitiva redacção a “unidade económica”, como “o conjunto de meios organizados com o objectivo de exercer uma actividade económica, principal ou acessória”, vindo a plasmar na redacção actual, resultante da Lei n.º14/2018, a exigência da manutenção da “identidade própria” da unidade económica e a acrescentar, ainda que o conjunto de meios organizador deve constituir “uma unidade produtiva dotada de autonomia técnico-organizativa” (vide o respectivo n.º 5). Quanto ao segundo conceito, a legislação codicística alargou as referências ao âmbito do fenómeno transmissivo, na medida em que qualificou como transmissão, para efeitos da sujeição àquele regime, não apenas a mudança da titularidade da empresa ou do estabelecimento, por qualquer título (isto é, uma transmissão definitiva, por efeito de trespasse, fusão, cisão ou venda judicial), mas também a transmissão, a cessão ou a reversão da exploração da empresa ou do estabelecimento, sem alteração da respectiva titularidade, isto é, uma transmissão das responsabilidades de gestão, a título temporário. Os termos que o preceito usa (como sucedia já com o artigo 37.º da LCT) para aludir à transmissão - explicitando que se pode operar “por qualquer título” (n.º 1) -, demonstram que se pretendeu consagrar um conceito amplo de transmissão do estabelecimento nele se englobando todas as situações em que se verifique a passagem da unidade económica em que o trabalhador está empregado para outrem, seja a que título fôr[4], abarcando-se até os casos de transmissão ou cessão da exploração inválidos[5] e não se exigindo, necessariamente, qualquer relação obrigacional directa entre transmitente e transmissário [6]. De acordo com a jurisprudência do TJCE, o critério fundamental para a aplicação da directiva comunitária consiste em saber se há uma entidade que desenvolve uma actividade económica de modo estável e se essa entidade, depois de mudar de titular (ainda que sem vínculo negocial entre o transmitente e o transmissário), sobreviveu e manteve a sua identidade[7]. A transmissão – que se pode operar por qualquer título e de forma indirecta, ou seja, mesmo sem relações contratuais directas entre cedente e cessionário, tal como acontece no caso vertente – deve ter por objecto uma entidade económica organizada de modo estável, ou seja, deve haver um conjunto de elementos que permitam a prossecução, de modo estável, de todas ou de parte das actividades da empresa cedente, devendo o trabalhador provar na acção em que se pretende fazer valer deste regime os factos necessários à conclusão de que existe a referida unidade económica e que a mesma mudou de titular, mantendo a sua identidade[8]. Determinar se a entidade económica subsiste, é tarefa que, como refere Júlio Gomes, em consonância com a jurisprudência constante do TJUE[9], “exige a ponderação, no caso concreto, de uma série de factores, entre os quais se contam o tipo de estabelecimento, a transmissão ou não de elementos do activo, tais como edifícios e bens corpóreos, mas também o valor dos elementos imateriais no momento da transmissão, a continuidade da clientela, a manutenção do pessoal (ou do essencial deste), o grau de semelhança entre a actividade exercida antes e depois e a duração de uma eventual interrupção da actividade”. Deve salientar-se que os critérios enunciados pelo Tribunal de Justiça mostram uma crescente independência face a critérios próprios do direito comercial, não se atendo a uma visão clássica da empresa que atribui grande importância, por ex., à transmissão de elementos do activo, designadamente bens patrimoniais que constituem o suporte do exercício de uma actividade ou bens imateriais, admitindo-se que, em sectores em que a actividade assenta essencialmente na mão-de-obra, um conjunto de trabalhadores que executa de forma duradoura uma actividade comum pode corresponder a uma entidade económica[10]. Cabe assim ponderar, em concreto, e através de uma apreciação global, o conjunto de circunstâncias de facto presentes no caso em análise e aferir o peso relativo de cada uma delas, tendo em conta o tipo de actividade desenvolvido, numa compreensão flexível do conceito de unidade económica. 4.4. Antes de prosseguir nesta análise, cremos ser relevante aludir ao Acórdão do Tribunal de Justiça de 19 de Outubro de 2017, processo C-200/16, que se pronunciou sobre um pedido de reenvio prejudicial formulado pelo Supremo Tribunal de Justiça de Portugal numa situação de sucessão de empresas de vigilância e segurança, do seguinte modo: «[…] Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) declara: 1) O artigo 1.º, n.º 1, alínea a), da Diretiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de março de 2001, relativa à aproximação das legislações dos Estados Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos, deve ser interpretado no sentido de que está abrangida pelo conceito de «transferência […] de uma empresa [ou de um] estabelecimento», na aceção desta disposição, uma situação em que um contratante resolveu o contrato de prestação de serviços de vigilância e de segurança das suas instalações celebrado com uma empresa e, em seguida, para a execução dessa prestação, celebrou um novo contrato com outra empresa, que recusa integrar os trabalhadores da primeira, quando os equipamentos indispensáveis ao exercício da referida prestação foram retomados pela segunda empresa. 2) O artigo 1.º, n.º 1, da Diretiva 2001/23 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma disposição nacional, como a que está em causa no processo principal, que prevê que não está abrangida pelo âmbito de aplicação do conceito de «transferência […] de uma empresa [ou de um] estabelecimento», na aceção deste artigo 1.º, n.º 1, a perda de cliente por parte de um operador com a adjudicação de serviço a outro operador. […]» Não pode deixar de ser atendida nestes autos a doutrina que expressa neste aresto do TJUE e as considerações que emite quando recorda as próprias orientações que tem sufragado em face da sua jurisprudência anterior. Assim, entendemos dever relevar-se deste aresto o seguinte: - para que a Directiva 2001/23 seja aplicável, não é necessário que existam relações contratuais directas entre o cedente e o cessionário, já que a cessão pode também efectuar-se por intermédio de um terceiro; - a aplicabilidade da directiva está sujeita à condição de que a transferência deve ter por objecto «uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objetivo de prosseguir uma atividade económica, seja ela essencial ou acessória» e para determinar se tal acontece, há que tomar em consideração todas as circunstâncias de facto que caracterizam a operação em causa, entre as quais figuram, designadamente, o tipo de empresa ou de estabelecimento de que se trata, a transferência ou não de elementos corpóreos, como os edifícios e os bens móveis, o valor dos elementos incorpóreos no momento da transferência, a integração ou não do essencial dos efectivos pelo novo empresário, a transferência ou não da clientela, bem como o grau de semelhança das actividades exercidas antes e depois da transferência e a duração da eventual suspensão destas actividades; - estes elementos indiciários devem ser apreciados no âmbito de uma avaliação de conjunto das circunstâncias do caso concreto e não podem ser considerados isoladamente, devendo o órgão jurisdicional nacional especialmente ter em conta o tipo de empresa ou de estabelecimento em causa pois a importância a atribuir aos diferentes critérios varia necessariamente em função da actividade exercida, ou mesmo dos métodos de produção ou de exploração utilizados na empresa, no estabelecimento ou na parte do estabelecimento em questão; - num sector em que a actividade assenta essencialmente na mão de obra, a identidade de uma entidade económica não pode ser mantida se o essencial dos seus efectivos não for integrado pelo presumido cessionário; - quando a actividade se baseia essencialmente em equipamentos, o facto de os antigos trabalhadores de uma empresa não serem integrados pelo novo empresário para o exercício dessa actividade não basta para excluir a existência de uma transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade; uma interpretação diferente iria contra o objectivo principal da directiva, que consiste em manter, mesmo contra a vontade do cessionário, os contratos de trabalho dos trabalhadores do cedente; - numa situação como a vertente, cabe ao órgão jurisdicional nacional apreciar, à luz das considerações precedentes e tendo em conta todas as circunstâncias de facto que caracterizam a operação em causa no processo principal, se esta deve ser considerada uma transferência de empresa, na acepção da Directiva 2001/23 tendo de verificar, nomeadamente: se o anterior empresário transmitiu ao actual, directa ou indirectamente, equipamentos ou elementos corpóreos ou incorpóreos, para exercer a actividade de vigilância e de segurança nas instalações em causa; se esses elementos foram sucessivamente postos à disposição dos empresários pela contratante, já que a circunstância de os elementos corpóreos indispensáveis ao exercício da actividade e retomados pelo novo empresário não pertencerem ao seu antecessor, mas terem sido simplesmente disponibilizados pelo contratante, não pode levar a excluir a existência de uma transferência de empresa ou de estabelecimento na acepção da Directiva 2001/23, devendo tomar-se em consideração apenas os equipamentos que são efectivamente utilizados – os elementos indispensáveis – para prestar os serviços de vigilância, com exclusão das instalações que são objecto desses serviços; - esta verificação deve ser feita tendo como pano de fundo que, como decidiu o TJUE, se mostra abrangida pelo conceito de transferência de uma empresa ou de um estabelecimento, na acepção da Directiva, “uma situação em que o contratante resolveu um contrato de prestação de serviços de vigilância e segurança das suas instalações, celebrado com uma empresa, e, em seguida, para a execução dessa prestação, celebrou um novo contrato com outra empresa, que recusa integrar os trabalhadores da primeira, quando os equipamentos indispensáveis ao exercício da referida prestação de serviços foram retomados pela segunda empresa” (sublinhado nosso). Situando-nos já no domínio do caso sub judice, caberá ao tribunal, à luz desta jurisprudência, sindicar a decisão da 1.ª instância verificando se a anterior prestadora de serviços, a BBB, transmitiu à BBB, directa ou indirectamente, equipamentos ou elementos corpóreos ou incorpóreos, para exercer a actividade de vigilância e de segurança nas instalações em causa, vg. se esses elementos foram postos à disposição da BBB e da BBB pelo cliente,sendo que deverá afirmar a existência de transmissão de uma unidade económica “quando os equipamentos indispensáveis ao exercício da referida prestação de serviços foram retomados pela segunda empresa”. 4.5. A sentença recorrida, depois de discorrer sobre o regime jurídico pertinente e os factos apurados, fez a seguinte apreciação final: «[…] No presente caso, é certo que os trabalhadores da BBB que asseguravam a vigilância do Centro Comercial …a, utilizavam equipamentos quer da 1ª Ré quer do cliente, e podemos concordar que a transferência para a 2ª Ré foi para exercer as mesmas funções, mas a verdade é que: - o número de efetivos contratado pelo cliente à BBB foi inferior; - não houve qualquer transferência de know-how ou informações entre as duas empresas; - não houve qualquer transferência de equipamentos ou bens de uma empresa para a outra; Não se concebe que, havendo uma redução do número de vigilantes afetos ao local por iniciativa do cliente, tivesse a Ré BBB que aceitar ficar com os 11 trabalhadores da BBB. Tal solução implicaria para a BBB o ónus de absorver mais trabalhadores do que os postos de trabalho disponíveis, e adjudicados, ficando com um excedente que, obviamente, representa custos financeiros acrescidos e que poderia redundar em indesejáveis despedimentos. Pelo exposto, entendemos que não ocorreu uma transferência de uma organização específica, com autonomia, não sendo por isso de reconhecer a transmissão da titularidade ou da exploração de uma unidade económica, para efeitos de aplicação do regime prescrito no art.º 285.º, n.º 1, do Código do Trabalho, motivo porque não pode o Autor ser investido na posição de trabalhador da Ré BBB, nos termos do nº 3 do artigo 285º do Código do Trabalho. […]» 4.6. Não escondendo a dificuldade desta análise de natureza global, podemos adiantar que nos suscita grandes dúvidas a apreciação do tribunal a quo no que concerne à inexistência de uma transmissão de estabelecimento, o que – podemos desde já adiantar – não significa que não sufraguemos o seu juízo final. Na verdade, não cremos que a factualidade apurada conforte as afirmações da sentença de que o número de efetivos “contratado pelo cliente” à BBB foi inferior, ou que tenha havido uma redução do número de vigilantes afetos ao local “por iniciativa do cliente”, sendo certo que é esta a circunstância a que a sentença confere maior relevância para negar a existência de uma organização específica e autónoma para efeitos do disposto no artigo 285.º do Código do Trabalho. Não só os factos provados se limitam a afirmar o número de vigilantes com que a 2.ª R. prestou o seu serviço de segurança, sem fazer qualquer ligação entre este número de vigilantes e os contratos celebrados com o cliente – pois ficou provado que começou a prestar funções como empresa de segurança privada nas instalações do C.C. … inicialmente com oito vigilantes, número que veio a ser reduzido por força da pandemia covid 19 (facto 23.) –, como ainda a análise dos contratos (referidos nos factos 21. e 22.) denotam que neles são contratados serviços de vigilância, imputando-se à 2.ª R. o encargo de “garantir os meios humanos necessários e convenientes à correcta e atempada vigilância e prestação do serviço nas instalações do cliente” (cláusulas 5.ªs dos convénios documentados a fls. 106 verso e 111 verso). Ou seja, a redução do número de vigilantes não resultou de decisão do cliente, nem dos contratos com ele celebrados, sendo a mesma da responsabilidade da empresa prestadora dos serviços de vigilância. Esclarecido este ponto, e lançando mão do indicado método indiciário, tudo aponta para a afirmação da existência de uma situação de transmissão de unidade económica, à luz da jurisprudência do TJUE. Com efeito: - os serviços de vigilância continuaram a ser prestados no mesmo local e para o mesmo cliente, sem qualquer hiato temporal entre a prestação sucessiva das RR.; - mantiveram-se os específicos serviços de vigilância e de segurança humana contratados pelo Centro Comercial … no referido local de trabalho, a saber: a) Controlo de entrada e saída de pessoas; b) Controlo de acessos ao condomínio; c) Monotorização através de sistema CCTV interno das imagens recolhidas a partir das câmaras distribuídas pelas instalações; d) Executar giros periódicos às instalações; e) Proceder ao controlo de acessos e registo de pessoal de limpeza; f) Abertura e fecho do Centro Comercia ...; g) Elaboração diária de relatórios de ocorrências (factos 18. e 24.); - para o exercício destas funções a equipa de vigilância da 1.ª R., onde o Autor estava inserido, dispunha de uma cadeira, uma secretária, um chaveiro, um telefone fixo, sistema completo de CCTV, composto por computador, monitores e câmaras de captação de imagens, uma central de incêndios (SADI) localizada no interior do Centro Comercial … e vestuário equipado com cacifos, sendo que quando iniciou o serviço de segurança e vigilância humana nas instalações do Centro Comercial …, no dia 01 de Maio de 2020, a 2.ª R. BBB retomou a utilização daqueles bens e equipamentos afetos ao referido serviço que eram propriedade do cliente (factos 19. 25. e 26.); - os trabalhadores da Ré BBB nas instalações do Centro Comercial ... até 30 de Abril de 2020 (…), (…)(…) e (…), celebraram com a Ré CCC contratos de trabalho a termo certo, para prestar funções naquelas instalações, sendo escalados para o efeito a partir de 1 de Maio de 2020, o que permite concluir que dos 8 vigilantes com que a 2.ª R. CCC prestou o serviço, 3 foram trabalhadores da 1.ª R. BBB (factos 16., 17., 23. e 30.). Cremos que os equipamentos pertencentes ao cliente e disponibilizados, sucessivamente, às duas prestadoras do serviço – sistema completo de CCTV, composto por computador, monitores e câmaras de captação de imagens, um sistema de alarme de intrusão, uma central de incêndios (SADI) localizada no interior do Centro Comercial ..., chaveiro, um telefone fixo e cacifos – se devem qualificar como “indispensáveis” à prestação de serviços de vigilância e segurança, sendo certo que nada nos factos provados indicia que houvesse alguma diferença nos contratos celebrados com as duas empresas sucessivas susceptível de configurar a necessidade, por parte da segunda empresa, de outros meios ou equipamentos para executar o serviço contratado além dos já anteriormente disponibilizados pelo cliente[11]. Assim, não só porque “os equipamentos indispensáveis ao exercício da referida prestação de serviços foram retomados pela segunda empresa”, como ainda porque esta assumiu parte dos efectivos da primeira, escalando-os para prestar funções a partir de 1 de Maio de 2020, quando na véspera ainda laboravam ao serviço da primeira empresa, o que necessariamente implica uma continuidade de parte do capital humano, com o seu particular modus operandi e know-how, entendemos ser possível divisar a existência de uma unidade económica autónoma face à jurisprudência do TJUE, vg. a plasmada no acórdão de 19 de Outubro de 2017. Note-se que o número de efectivos que o novo empresário assumiu – 3 – corresponde a quase metade dos que na realidade alocou – 8 – à prestação do serviço. Tendo presente o dever dos Tribunais Nacionais de cada Estado Membro de interpretarem a própria legislação nacional em conformidade com as Directivas tal como estas têm sido interpretadas pelo Tribunal de Justiça, e partindo da perspectiva acolhida por este Tribunal no acórdão proferido no processo C-200/16, é de entender que a manutenção da actividade de segurança e vigilância no Centro Comercial... (com o mesmo âmbito e características) por parte da 2.ª R., acompanhada da retoma do equipamento pertencente à entidade contratante indispensável à prossecução da prestação de serviço (que continuou a ser usado pela 2.ª R., à semelhança do que anteriormente sucedia com a 1.ª R) e da manutenção de três efectivos dos oito que a 2.ª R. afectou à prestação do serviço, constitui a manutenção de um conjunto autónomo de meios organizados com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, a que se referem a alínea b) do artigo 1.º, n.º 1, da Directiva 2001/23/CE e o n.º 5 do artigo 285.º do Código do Trabalho: a actividade de vigilância nas instalações do Centro Comercial ..., na Amadora. Pelo que é de responder afirmativamente à questão acima colocada de saber se a substituição da 1.ª R. pela 2.ª R. na actividade de vigilância exercida nas indicadas instalações, se deve considerar uma “transmissão de empresa ou estabelecimento” para efeitos do artigo 285.º, n.º1, do Código do Trabalho e do artigo 1.º, n.º 1, alínea a), da Directiva 2001/23/CE. 4.7. Seja como for, face à factualidade apurada, tal não implica no caso vertente a concomitante transmissão do contrato de trabalho do A. ora recorrido para a 2.ª R., nos termos da 2.ª parte do indicado n.º 1, do artigo 285.º do Código do Trabalho. Com efeito, ficou provado que, com data de 27 de Abril de 2020, o Autor e os seus colegas enviaram à Ré BBB a carta junta a fls. 44 a comunicar que pretendiam permanecer na Ré BBB, uma vez que a Ré CCC não pretendia assegurar-lhes os postos de trabalho e demais garantias (facto 10.), tal como a Ré CCC invocou na contestação apresentada nestes autos. Nos termos do preceituado no artigo 286.º-A, n.º 1, do Código do Trabalho, na redacção dada pela Lei n.º 14/2018[12], o “trabalhador pode exercer o direito de oposição à transmissão da posição do empregador no seu contrato de trabalho em caso de transmissão, cessão ou reversão de empresa ou estabelecimento, ou de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, nos termos dos n.ºs 1 ou 2 do artigo 285.º, quando aquela possa causar-lhe prejuízo sério, nomeadamente por manifesta falta de solvabilidade ou situação financeira difícil do adquirente ou, ainda, se a política de organização do trabalho deste não lhe merecer confiança” E de acordo com o n.º 2 do preceito, “[a] oposição do trabalhador prevista no número anterior obsta à transmissão da posição do empregador no seu contrato de trabalho, nos termos dos n.ºs 1 ou 2 do artigo 285.º, mantendo-se o vínculo ao transmitente”. Assim, ocorrendo transmissão de unidade económica no quadro do artigo 285.º, ao trabalhador é agora expressamente reconhecido o direito de oposição à transmissão da posição de empregador no contrato de trabalho, verificados que se mostrem os fundamentos estabelecidos na lei. Ensina Júlio Gomes, a propósito destes fundamentos, o seguinte: «O primeiro consiste no temor de um prejuízo sério – este ainda não se verificou, mas pode vir a ocorrer por causa da transmissão da posição de empregador. Exige-se aqui um exercício de prognose, referindo a lei alguns exemplos (“nomeadamente”) de situações em que essa prognose parece justificar-se. Trata-se, em todo o caso, nos exemplos propostos, de situações objectivamente graves como sejam a “manifesta falta de solvabilidade ou situação financeira difícil do adquirente”. Como se trata apenas de exemplos, parece-nos haver espaço para outras situações em que também se pode formular um juízo de prognose de prejuízo sério, como sucederá, por exemplo, com uma mudança significativa de local de trabalho. Mas esta exigência contrasta fortemente com a parte final do mesmo n.º 1: o trabalhador pode, no fim de contas, opor-se à transmissão da posição de empregador simplesmente por “a política de organização do trabalho deste não lhe merecer confiança”. Este último fundamento já foi classificado de subjectivo e insindicável. Com efeito, se for suficiente dizer “não confio na política de organização de trabalho” do transmissário, não se vê como é que se trata aqui de um genuíno fundamento. Dito por outras palavras de que é que adianta o trabalhador ter que referir um fundamento no escrito em que exerce o seu direito de oposição, se o fundamento em causa é totalmente incontrolável e arbitrário? No limite poderá o trabalhador “desconfiar” do que ignora por completo? Se o transmissário é, por hipótese, uma sociedade que só agora se constituiu poderá o trabalhador alegar que desconfia de uma política de organização do trabalho que ainda nem sequer existe? Perguntamo-nos, por isso, se a falta de confiança não terá que assentar em alguns indícios concretos que devam ser referidos, mencionados, tanto no caso de oposição, como no caso de resolução. Reconhecemos, no entanto, que se trata de uma questão muito delicada, tanto mais que a informação a que o trabalhador abrangido pela transmissão da unidade económica tem direito – e que lhe deve ser fornecida directamente pelo seu próprio empregador, o transmitente – não abrange, de acordo com a letra da lei, elementos sobre a política de organização de trabalho do transmissário, mas apenas sobre as medidas (que podem ser, obviamente, medidas de gestão de recursos humanos) por este planeadas.»[13] Como vem dito no Acórdão da Relação de Coimbra de 16 de Setembro de 2022, esta norma contém “um fundamento geral para o exercício do direito, o do «prejuízo sério”», e dois exemplos que não excluem outros, mas que auxiliam a tarefa do intérprete, designadamente na adopção de critérios mais ou menos abertos para o que é o relevante prejuízo sério”[14]. No caso em análise, o A. ora recorrido invocou como fundamento para se opor à transmissão e permanecer ao serviço da 1.ª R. o facto de a R. BBB não pretender assegurar-lhe o posto de trabalho e demais garantias (facto 10.), o que naturalmente é susceptível de causar prejuízo sério. Se a 2.ª R. não reconhece a transmissão dos contratos de trabalho e impõe a celebração de novos contratos para assumir os trabalhadores que antes estavam ao serviço da 1,ª R., como se viu acontecer com os trabalhadores (…)(…)(…)(…)e(…) que foram trabalhadores da Ré BBB nas instalações do Centro Comercia ... e celebraram com a Ré CCC contratos de trabalho a termo certo, conforme resulta do teor dos contratos juntos a fls. 150 a 158, para prestar funções naquelas instalações (facto 30.), não respeita efectivamente os direitos laborais emergentes dos contratos de trabalho que os trabalhadores desempenhavam ao serviço da 1.ª empresa, designadamente os decorrentes da antiguidade. Na verdade, quando a posição do empregador passa a ser assumida pelo transmissário nos termos do artigo 285.º do Código do Trabalho tal tem os seguintes dois significados: “(i) os contratos de trabalho dos trabalhadores anteriormente ao serviço do transmitente mantêm-se vigentes; (ii) os direitos e deveres derivados desses contratos mantêm-se incólumes”[15]. de trabalho Ora, como se salienta no citado Acórdão da Relação de Coimbra de 16 de Setembro de 2022, que transcrevemos, atenta a pertinência das suas observações face aos contornos do caso sub judice, por similares àquele sobre que versa: “O autor tinha, pois, todas as razões para se confrontar com uma real possibilidade de prejuízo sério. A transmitir-se a posição de empregador para a B, esta não só não lhe garantiria os direitos emergentes do seu contrato com a A, como não o aceitava ao trabalho sem que subscrevesse um novo contrato em condições seguramente mais desfavoráveis. Por outro lado, essa real possibilidade de perda da estabilidade laboral, dos direitos e garantias que até então lhe eram proporcionados, é mais do que suficiente para razoavelmente não ter confiança na política de organização de trabalho da ré B. (…) Não podemos deste modo concordar com a sentença da 1.ª instância quando defende que o autor fundou a sua pretensão na existência de problemas de política de organização do trabalho tendo por base a pretensão da ré B de não assegurar os direitos adquiridos e de o recrutar com um novo vinculo laboral, mas tal não se traduziria em qualquer problema de política de organização do trabalho. A nossa perspectiva é exactamente a contrária. Uma política de organização de trabalho é uma política de enquadramento dos trabalhadores que inclui a definição apropriada das condições dos seus contratos de trabalho e o respeito de tais condições. Uma política que não garante esse respeito é uma política que razoavelmente não suscita a confiança dos trabalhadores, gerando-lhes um prejuízo sério nos seus projectos de vida e no seu plano do trabalho digno.” No caso vertente, o trabalhador invocou que a 2.ª R. não pretendia assegurar-lhe o posto de trabalho e demais garantias, sendo certo que se mostram demonstrados factos susceptíveis de alicerçar esta sua afirmação e de justificar a vontade que manifestou de, por virtude da mesma, se opor à transmissão do contrato de trabalho e se manter vinculado à 1.ª R. Num critério objetivo e razoável, tendo em conta a perspetiva de um trabalhador médio, possuidor dos conhecimentos e na concreta situação do trabalhador em causa, compreende-se que destes factos resulte a falta de confiança na política de organização de trabalho da adquirente, devendo ser reconhecida ao trabalhador a possibilidade de não aceitar a transmissão e de não se vincular laboralmente com uma entidade em quem não confia. Assim, é de reconhecer como válido e fundado o exercício do direito potestativo do A. de oposição à mutação subjectiva operada no seu contrato de trabalho. Sendo certo que, uma vez manifestada, e tratando-se de uma declaração receptícia, operou os seus efeitos na esfera jurídica da 1.ª R. ora recorrente, sua destinatária (artigo 224.º do Código Civil), não colidindo com esta eficácia – que aliás não foi questionada por qualquer das partes – o facto d éter instaurado a presente acção, também, contra a 2.ª R. E é consequentemente de reconhecer que, apesar da transmissão da unidade económica, o vínculo laboral do A. não se transmitiu para a 2.ª R., mantendo-se a 1.ª R. BBB na posição de empregadora no âmbito do seu contrato de trabalho. * 4.7. Cabe finalmente enfrentar a questão colocada pela recorrente da violação do artigo 8.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa. Alega a recorrente que a interpretação realizada pelo tribunal a quo se traduz no afastamento liminar da figura da transmissão da unidade económica à atividade da segurança privada e não observa os critérios enunciados quanto a esta temática na nossa doutrina e jurisprudência, quer nacional quer comunitária, quanto à determinação do elemento transmissivo da unidade económica, numa perspetiva e abordagem global que admite como suficiente a retoma de bens [transmissão indireta]. Tendo em consideração que neste acórdão se considera verificada a transmissão da unidade económica na atividade da segurança privada, por apelo aos critérios enunciados quanto a esta temática na jurisprudência comunitária, quanto à determinação do elemento transmissivo da unidade económica, mostra-se prejudicada a apreciação da questão da constitucionalidade. Note-se que o recurso soçobra, com a manutenção da sentença, não porque se considere não estar verificada in casu a transmissão da unidade económica nos termos do artigo 285.º do CT, mas porque, por virtude da oposição à transferência do seu contrato de trabalho para a 2.ª R. expressa pelo trabalhador nos termos do artigo 286.º-A do CT, aquela transmissão não operou a alteração subjectiva do contrato de trabalho, mantendo-se o vínculo com o transmitente. Não merece provimento a apelação, devendo ser confirmada a sentença, ainda que por fundamento não inteiramente coincidente. * 4.8. Precise-se que se mantém a sentença recorrida na parte em que quantifica os créditos do A., por não impugnada autonomamente na apelação. * 4.9. As custas do recurso recaem sobre a recorrente que nele decaiu (artigo 527.º do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho). Mostrando-se paga a taxa de justiça e não havendo encargos a contar neste recurso que, para efeitos de custas processuais, configura um processo autónomo (artigo 1.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais), a condenação é restrita às custas de parte que haja. * 6. Decisão Em face do exposto: 6.1. concede-se parcial provimento à impugnação da decisão de facto, alterando-se os factos 19. e 30. nos termos sobreditos; 6.3. nega-se provimento ao recurso e confirma-se a decisão final constante da sentença da 1.ª instância. Condena-se a recorrente nas custas de parte que haja. * Lisboa, 15 de Dezembro de 2022 Maria José Costa Pinto Manuela Bento Fialho - Voto a decisão, salvaguardando a posição já defendida por mim no âmbito do Proc.º 9811/20.0T8SNT Alda Martins – Subscrevo o acórdão na medida em que, independentemente de haver, ou não, transmissão da unidade económica, o entendimento quanto aos efeitos da oposição do trabalhador, que sufrago, impede a transmissão do contrato de trabalho, sendo de confirmar a sentença _______________________________________________________ [1] O novo número 10 do art.º 285.º tem o seguinte teor: “10 - O disposto no presente artigo é aplicável a todas as situações de transmissão de empresa ou estabelecimento por adjudicação de contratação de serviços que se concretize por concurso público ou por outro meio de selecção, no sector público e privado, nomeadamente à adjudicação de fornecimento de serviços de vigilância, alimentação, limpeza ou transportes, produzindo efeitos no momento da adjudicação”. [2] Não foi acolhida em letra de lei uma das propostas apresentadas no processo legislativo no sentido de a norma aditada ter “natureza interpretativa, produzindo efeitos desde a entrada em vigor da Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro” (Projecto de Lei n.º 448/XIV/1.a, do PS). [3] Seguir-se-ão, no seu essencial, as considerações jurídicas de enquadramento tecidas no Acórdão da Relação de Lisboa de 18 de Dezembro de 2019, proferido no Processo n.º 2131/18.1T8 PL.L1, relatado pela ora relatora e igualmente subscrito pela Exma. Sra. Desembargadora aqui primeira adjunta, relativo também à prestação de serviços de segurança. [4] Vide, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1994.11.09, in Acórdãos Doutrinais 399º, p.365 e ss.) e de 2009.02.25, processo n.º 08S2309. [5] Vide, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1995.05.24, in Acórdãos Doutrinais 408º, p.1384 e ss. e de 2011.09.22, processo n.º 45/07.0TTLSB.L1.S1. [6] Vide os Acórdãos do TJUE de 7 de Março de 1996, Merckx e Neuhuys, C 171/94 e C 172/94, EU:C:1996:87, n.ºs 28 e 30, e de 20 de Novembro de 2003, Abler e o., C 340/01, EU:C:2003:629, n.º 39. Vide ainda Júlio Gomes, In “A Jurisprudência Recente do TJ das CE em matéria de transmissão de empresa, estabelecimento, ou parte de estabelecimento - inflexão ou continuidade?” publicado nos Estudos do Instituto do Direito do Trabalho, I, p. 515, citando jurisprudência do Tribunal de Justiça. [7] Vide o Acórdão do TJCE de 2003.11.20, publicado na Revista “Sub Judice”, Jan.- Março de 2004, a pp. 163 e ss., e a jurisprudência aí citada. [8] Vide o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 2009.05.07, Recurso n.º 3363/08 - 4.ª Secção, sumariado in www.stj.pt. [9] In estudo citado, publicado nos Estudos do Instituto do Direito do Trabalho, I, p 493. [10] Vide Júlio Vieira Gomes, in estudo citado, pp. 485 e 494 e também no seu estudo “Novas, novíssimas e não tão novas questões sobre a transmissão da unidade económica em direito do trabalho”, in Novos Estudos de Direito do Trabalho, Coimbra, 2010, p. 91.Vide também o Acórdão do TJUE de 29 de Julho de 2010, processo C-151/09. [11] Situação esta que se verificou no Acórdão da Relação de Lisboa de 14 de Setembro de 2022 (Processo n.º 11956/21.0T8LSB.L1, inédito tanto quanto nos é dado saber), que decidiu não se verificar uma situação de transmissão de unidade económica para efeitos do artigo 285.º do Código do Trabalho e da Directiva n.º 2001/23/CE do Conselho de 12 de Março de 2001, mas uma mera sucessão de prestadores de serviços, quando uma empresa deixa de prestar serviços de vigilância e segurança junto de determinado cliente, na sequência de adjudicação, por este, de tais serviços de vigilância a outra empresa, se nenhum dos trabalhadores da empresa anterior foi assumido pela actual e se a manutenção da actividade de segurança e vigilância pelo novo empresário não é acompanhada da retoma do equipamento do cliente indispensável à prossecução da prestação do serviço contratado “nos termos definidos no respectivo caderno de encargos”, a exigir equipamento não dispensado pelo cliente. [12] À data dos factos não havia entrado em vigor a redacção conferida ao preceito pela Lei n.º 18/2021, de 08/04. [13] No seu estudo “Algumas reflexões críticas sobre a Lei n.º 14/2018, de 19 de Março”, in Prontuário de Direito do Trabalho, CEJ, n.º 1/2018 [14] Processo n.º 3037/20.0T8CBR.C1, in www.dgsi.pt e www.colectaneadejurisprudencia.pt. Segundo aí é dito, não se trata de fundamentos cuja construção seja inteiramente subjectiva na livre disponibilidade de criação do trabalhador, designadamente aquele que se refere à ausência de confiança no transmissário, como parecem apontar alguns autores como Maria do Rosário Palma Ramalho (Tratado de Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 2019, págs. 694 e 695) e João Leal Amado (Transmissão da empresa e contrato de trabalho: algumas notas sobre o regime jurídico do direito de oposição, RLJ, n.º 4010, Maio-Junho de 2018, págs. 290 e segs). Vide também os acórdãos da Relação de Évora de 2021.05.27, no proc. 3951/18.2T8FAR.E1, e da Relação de Guimarães de 2020.05.07, proc. 5670/18.0T8BRG-A.G1 e da Relação do Porto de 2021.09.20, proc. 2203/20.2T8VFR.P1, todos em www.dgsi.pt. [15] Vide Milena Rouxinol, in Direito do trabalho – Relação Individual, Coimbra, 2019, p. 869, com João Leal Amado, Joana Nunes Vicente, Catarina Gomes Santos e Teresa Coelho Moreira. | ||
![]() | ![]() |
Decisão Texto Integral: |