Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa  | |||
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| Relator: | AMÉLIA PUNA LOUPO | ||
| Descritores: |  SUSPENSÃO DE DELIBERAÇÃO SOCIAL CADUCIDADE INAPLICABILIDADE DO ART. 139.º N.º 5 DO CPC  | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 10/23/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
| Sumário: |  Sumário: (Elaborado pelo relator e da sua inteira responsabilidade – artº 663º nº 7 do Código de Processo Civil) I - O prazo estabelecido no artº 380º nº 1 CPC não é um prazo adjectivo, mas antes substantivo e de caducidade. II - O regime do artº 139º nº 5 do CPC não é aplicável ao prazo estabelecido no artº 380º nº 1 CPC.  | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: |  Acordam as Juízes na 8ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa I – RELATÓRIO CRVSM intentou contra “Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza”, o presente procedimento cautelar especificado para suspensão de deliberações sociais, pedindo que seja ordenada a suspensão da eficácia e executoriedade da deliberação aprovada na Assembleia Geral Extraordinária da Requerida do dia …/…/2025, que aprovou a proposta de aplicação da sanção de expulsão da Requerente, apresentada pela sua Comissão Arbitral. Na sua oposição a Requerida invocou, além do mais, a caducidade do direito de propor o presente procedimento cautelar tendo em consideração o prazo contínuo de dez dias consagrado na lei e a circunstância de este se tratar de um prazo substantivo e não processual e, por isso, não sujeito à prorrogação excepcional de três dias mediante o pagamento de multa, conforme admitido no regime processual civil. Facultado à Requerente o contraditório, a mesma pugnou pela improcedência da mencionada excepção com fundamento, em suma, em que o prazo de 10 dias estabelecido no artº 380º do CPC mais não é do que um prazo processual, regulado pela lei adjectiva, sendo-lhe por isso aplicável o regime contido no artº 139º nº 5 CPC. Foi proferida decisão final que julgou o procedimento cautelar improcedente, por verificação da excepção de caducidade, e, em consequência, extinto o direito cautelar da Requerente. É dessa decisão que a Requerente interpõe o presente recurso, tendo das suas alegações extraído as seguintes Conclusões «1.ª- A requerente não esteve presente na momento em que foi votada a deliberação cuja suspensão foi requerida, e precisamente por isso, foi notificado pela requerida do seu teor, mas já em data posterior ao da propositura do presente procedimento cautelar - a carta de notificação tem data de 07 de Março de 2025 ( cfr. doc. n.º 1 );[1] 2.ª – Ainda assim, por uma questão e cautela, e porque o elevado número de documentos que teve de necessidade de reunir e ordenar para instruir o requerimento inicial não lho permitiu a propositura do procedimento cautelar até ao dia 11 de Fevereiro de 2025, data em que se concluía o prazo de 10 dias previsto no artigo 380.º do Cód. de Processo Civil, a requerente procedeu ao pagamento da multa processual prevista na al. a) do n.º 5 do referido Código por forma a poder praticar o ato no primeiro dia útil subsequente ao do fim do referido prazo; 3.ª- Pelo que o procedimento foi proposto no dia 13 de Fevereiro de 2025; 4.ª- Prevendo o artigo 380.º do C.P.C. um prazo de 10 dias para a propositura da providencia cautelar de suspensão de deliberações sociais, o referido prazo interrompe-se com a propositura da providência; 5.ª – O que mais não é do que um ato processual, cujo prazo para a sua prática está regulado numa lei adjetiva, precisamente a mesma que prevê a possibilidade da pratica dos atos num dos três dias úteis subsequentes ao termino do prazo legal, condicionado ao pagamento da multa ( artigo 139.º, n.º5) ; 6.ª – E desta forma, preceitua o artigo 139.º, nº 5 a possibilidade de o ato ser praticado num dos primeiros três dias uteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a validade do ato dependente do pagamento imediato de uma multa; 7.ª – A lei não distingue entre os atos processuais destinados a interromper prazo substantivos ou processuais; 8.ª – De resto, apenas condiciona a validade do ato à sua prática dentro daqueles três dias com a condição de ser paga a multa de imediato; 9.ª – Posto isto, salvo melhor opinião, tendo o requerente – em função da vastidão dos factos e dos elementos de prova documental que houve necessidade de compilar - sentido necessidade de fazer uso da possibilidade previstos na al. a) do n.º 5 do referido artigo e diploma legal, e tendo pago a multa de imediato, não vemos que haja razão para que a propositura do procedimento cautelar no dia 12.02.2025 não deva ser considerada interruptiva do prazo de caducidade do direito consagrado no mencionado artigo 380.º do C.P.C.; Termos em que se requer a revogação da sentença recorrida e a sua substituição por outra decisão que considere tempestivamente interrompido o prazo de caducidade previstos no artigo 380.º do C.P.C. com a propositura do presente procedimento cautelar.» A Requerida contra-alegou pugnando pela confirmação do julgado, alinhando as seguintes Conclusões «A) No artigo 2 das alegações de recurso, vem a Recorrente invocar, pela primeira vez, que não esteve presente no momento em que foi votada a deliberação cuja suspensão foi requerida e, precisamente por isso, foi notificada pela Requerida do seu teor, mas já em data posterior ao da propositura do procedimento cautelar, alegando ainda, também pela primeira vez, no artigo 3, que teve necessidade de reunir e ordenar um elevado número de documentos para instruir o requerimento inicial. B) Acontece que, tendo em conta teor das alegacões da Recorrente, e na ausência de qualquer prova do alegado, só se pode concluir que os factos supra mencionados ocorreram e foram conhecidos pela Recorrente em momento prévio ao encerramento da discussão no Tribunal de Primeira Instância, configurando-se, por conseguinte, como novos factos alegados em sede de recurso, mas pré-existentes à decisão de que se recorre. C) Relativamente a estes “novos” factos só agora alegados em sede de recurso, valem as regras sobre preclusões processuais, decorrentes do princípio da estabilidade da instância, da concentração da defesa e da preclusão, que determinam a sua inalegabilidade em recurso, pelo que, os factos constitutivos, impeditivos, modificativos ou extintivos que a Recorrente já teve oportunidade de invocar no processo, nomeadamente aquando do requerimento inicial ou eventual contraditório às exceções invocadas pela Recorrida, encontram-se processualmente precludidos por não terem sido alegados nos momentos processuais estabelecidos para o efeito. D) Face ao exposto, requer-se que seja julgada inadmissível a alegação dos factos invocados nos artigos 2 e 3 nas alegações de recurso, por serem factos ocorridos e conhecidos pela Recorrente em momento anterior ao encerramento da discussão em Primeira Instância, devendo os mesmos serem desconsiderados. E) Subsidiariamente e sem conceder, caso se entenda que os factos alegados nos artigos 2 e 3 do recurso devem ser configurados como “factos supervenientes” – o que não se aceita, mas que se equaciona por mera cautela e dever de patrocínio –, sempre se diga que a interposição de um recurso apenas desencadeia a reapreciação do decidido, ou seja, o Tribunal de recurso vai reponderar a decisão tal como foi proferida, não comportando ele o ius novarum, ou seja, a criação de decisão sobre matéria que não tenha sido submetida (no momento e lugar adequado) à apreciação do Tribunal a quo (nova, portanto) – vide Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 16/05/2019, Processo n.º 1829/16.3T8VRL.G1, disponível em www.dgsi.pt F) Face ao exposto, requer-se, subsidiariamente e sem conceder, que seja julgada inadmissível a alegação dos factos invocados nos artigos 2 e 3 das alegações de recurso, por serem factos supervenientes que o Tribunal de recurso não pode conhecer, devendo os mesmos serem desconsiderados. G) Por sua vez, importa referir que o artigo 380.º, n.º 3 do CPC prevê que o prazo de 10 dias fixado para o requerimento da suspensão se conta da data da assembleia em que as deliberações foram tomadas ou, se o requerente não tiver sido regularmente convocado para a assembleia, da data em que ele teve conhecimento das deliberações, ou seja, “a lei fixa como relevante para o início da contagem daquele prazo, a data do efetivo conhecimento, pelo sócio, do teor da deliberação (quando aquele não haja sido regularmente convocado para a assembleia) ou a data da própria deliberação, nos casos em que o sócio foi regularmente convocado pressupondo a lei que o sócio teve ou poderia ter tido conhecimento do teor das deliberações.” – vide Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 11/01/2024, Processo n.º 882/23.8T8OLH.E1. H) Ora, a Recorrente não coloca em causa que a deliberação foi tomada na Assembleia Geral que ocorreu no dia 1 de fevereiro de 2025, não invoca qualquer irregularidade na sua convocação, nem alega que não esteve presente na referida Assembleia Geral, sendo certo, sublinhe-se, que esta esteve presente na referida Assembleia e tomou imediato conhecimento da deliberação que fora tomada. I) Tanto assim é que a sentença da Primeira Instância deu como provado que “a Requerente esteve presente na referida Assembleia, de forma virtual, tendo intervindo ativamente na mesma, nomeadamente tendo tomado a palavra – cfr. doc. 2 com a oposição” (vide facto provado 2 da sentença), sendo que, os factos dados como indiciariamente demonstrados na sentença resultaram dos documentos juntos e da matéria admitida por acordo, conforme referido na própria sentença. J) Nesta conformidade, em face dos elementos constantes do processo e do disposto no artigo 380.º, n.º 3 do CPC, o referido prazo de 10 dias iniciou-se no dia 2 de fevereiro de 2025 (ou seja, no dia imediatamente a seguir à data da Assembleia de 1 de fevereiro) e terminou no dia 11 de fevereiro de 2025, “estando fora de dúvidas que o presente procedimento cautelar foi proposto ao 12º dia seguinte ao da realização da Assembleia Extraordinária (cf. artigo 279º do Código Civil) (…)” (conforme referido na sentença). K) Acresce que a Recorrente vem defender que a faculdade prevista no n.º 5 do artigo 139.º do CPC é aplicável ao prazo previsto no artigo 380.º, n.º 3 do CPC, pois a lei não distingue entre os atos processuais destinados a interromper prazos substantivos ou processuais, concluindo que a propositura do procedimento cautelar interrompeu o prazo de caducidade do direito consagrado no mencionado artigo. L) Acontece que não assiste qualquer razão à Recorrente, pois tem sido entendimento unânime na jurisprudência dos Tribunais Superiores que o prazo para pedir a suspensão de deliberações sociais previsto no artigo 380.º, n.º 1 do CPC é um prazo de caducidade e não um prazo processual, pelo que não há a possibilidade de praticar o ato nos três dias úteis seguintes ao termo do prazo de propositura da ação mediante o pagamento de multa – neste sentido, veja-se: o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 28/10/2004, Processo n.º 6927/2004-6, o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 11/04/2019, Processo n.º 2251/18, e, mais recentemente, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 16/01/2024, Processo n.º 385/23.0T8AMT-C.P1, todos disponíveis em www.dgsi.pt: - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 28/10/2004, Processo n.º 6927/2004-6: É pacífico o entendimento de que se trata de um prazo de caducidade, que é de direito substantivo [cfr. Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, vol. 2º, pág. 92, e Acs. da RL de 22.2.96 e de 2.3.99 in CJ 1996, tomo I, pág. 124, e CJ 1999, tomo II, pág. 13], não obstante a sua previsão conste da lei adjectiva e na sua contagem devam seguir-se os critérios estabelecidos nos nºs. 1 a 3 do artigo 144º por força do estatuído no seu nº 4. Tem, assim, aplicação ao caso a regra da continuidade dos prazos prevista neste normativo, os quais, por princípio, apenas se suspendem durante as férias judiciais. Esta suspensão em período de férias judiciais não se verifica, porém, nos procedimentos cautelares por revestirem sempre carácter urgente, como o determina o nº 1 do artigo 382º.» [actual artigo 363º do Código de Processo Civil]. - Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 11/04/2019, Processo n.º 2251/18: I. O prazo de 10 dias previsto no n.º 1 do artigo 380º do Código de Processo Civil tem natureza civil ou substantiva e é um prazo de caducidade, ao qual, são aplicáveis as regras dos n.ºs 1 a 3 do artigo 138º do Código de Processo Civil, por força do estatuído no n.º 4 deste artigo. II. Ao referido prazo não é aplicável a regra prevista no n.º 5 do artigo 139º do Código de Processo Civil. (…) Como acima se referiu – e é entendimento unânime da jurisprudência dos Tribunais Superiores – está em causa um prazo de caducidade, um prazo substantivo, a que não se aplica o disposto no artigo 139º, n.º 5, do Código de Processo Civil. (…). - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 16/01/2024, Processo n.º 385/23.0T8AMT-C.P1, que destaca o ensinamento sustentado por Abrantes Geraldes: “O mesmo sustenta A. Abrantes Geraldes, de que “a providência deve ser requerida no prazo de 10 dias a partir da data da realização da assembleia, se o sócio tiver sido regularmente convocado, ou a contar do conhecimento da deliberação. Trata-se de um prazo de caducidade dirigido especialmente ao direito de ação na sua vertente cautelar que, por isso, não se confunde com o prazo de caducidade do direito (quando esteja previsto, como ocorre com a anulação) a exercitar através da ação principal.” M) Por fim, importa destacar o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 10/07/2025, proferido no procedimento cautelar n.º 4216/25.9T8LSB.L1, intentado por outro associado da Requerida, com o mesmo pedido e causa de pedir do processo dos autos, em que estava em causa exatamente a mesma factualidade e a mesma questão de direito, que se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos, no qual se decidiu o seguinte: “ (…) É a seguinte a questão a decidir: - da aplicação do art. 139º nº 5 do C.P.C. ao prazo previsto no art. 380º nº 1 do C.P.C. Na decisão recorrida, foram dados como provados os seguintes factos: «1. O Requerente é associado da Associação “Quercus” com o n.º 17314. 2. No dia 1 de Fevereiro de 2025 realizou-se Assembleia Geral Extraordinária da Requerida, em formato híbrido, presencial e virtual, com início pelas 14h30m. 3. O Requerente esteve presente na referida Assembleia, de forma virtual, tendo intervindo na mesma, tomando a palavra. 4. Na referida Assembleia foi aprovada sanção de expulsão do Requerente como associado da Requerida. 5. O requerimento inicial do presente procedimento cautelar foi remetido a juízo, via Citius, no dia 12 de Fevereiro de 2025. 6. Com o requerimento, o Requerente juntou comprovativo de autoliquidação de multa (artigo 139.º do CPC) no montante de €30,60.» * Nos termos do art. 380º nº 1 do C.P.C., “se alguma associação ou sociedade, seja qual for a sua espécie, tomar deliberações contrárias à lei, aos estatutos ou ao contrato, qualquer sócio pode requerer, no prazo de 10 dias, que a execução dessas deliberações seja suspensa, justificando a qualidade de sócio e mostrando que essa execução pode causar dano apreciável”. O referido prazo de 10 dias, apesar de previsto no Código de Processo Civil, não é um prazo processual. «O prazo judicial pressupõe necessariamente que já está proposta a acção, que já existe um determinado processo, e destina-se ou a marcar o período de tempo dentro do qual há-de praticar-se um determinado acto processual (prazo peremptório), ou a fixar a duração duma certa pausa, duma certa dilação que o processo tem de sofrer (prazo dilatório). É evidente que não está nestas condições o prazo legal de propositura duma acção» (Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. 2º, pág. 57). O prazo previsto no art. 380º nº 1 do C.P.C. é, pois, um prazo substantivo. Por força do art. 298º nº 2 do C.C., “quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição”, pelo que o prazo previsto no art. 380º nº 1 do C.P.C. é um prazo de caducidade. Conforme disposto no nº 3 do art. 380º do C.P.C., “o prazo fixado para o requerimento da suspensão conta-se da data da assembleia em que as deliberações foram tomadas ou, se o requerente não tiver sido regularmente convocado para a assembleia, da data em que ele teve conhecimento das deliberações”. Resulta da matéria de facto provado que “no dia 1 de Fevereiro de 2025 realizou-se Assembleia Geral Extraordinária da Requerida, em formato híbrido, presencial e virtual, com início pelas 14h30m”. O requerente não alegou que não foi regularmente convocado para a assembleia, sendo de salientar que consta da matéria de facto provada que “o Requerente esteve presente na referida Assembleia, de forma virtual”. Assim, o prazo para requerer a suspensão da deliberação terminou no dia 11 de fevereiro, sendo certo que, por força do art. 138º nº 4 do C.P.C., “os prazos para a propositura de ações previstos neste Código seguem o regime dos números anteriores”. Resulta da matéria de facto provado que “o requerimento inicial do presente procedimento cautelar foi remetido a juízo, via Citius, no dia 12 de Fevereiro de 2025” e que, “com o requerimento, o Requerente juntou comprovativo de autoliquidação de multa (artigo 139.º do CPC) no montante de €30,60”. Ao proceder ao pagamento da multa, o requerente admitiu que o prazo terminou no dia 11 de fevereiro de 2005 e que o requerimento inicial deu entrada no 1º dia útil subsequente ao termo do prazo. Acresce dizer que, na 2ª conclusão recursiva, o recorrente reconheceu que o dia 11 de Fevereiro de 2025 era a “data em que se concluía o prazo de 10 dias previsto no artigo 380.º do Cód. de Processo Civil”. A questão que importa decidir é a de saber se ao prazo previsto no art. 380º nº 1 do C.P.C. é ou não aplicável o art. 139º nº 5 do C.P.C., segundo o qual “pode o ato ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento imediato de uma multa”. O tribunal recorrido entendeu que não e, em apoio da posição seguida, o tribunal recorrido invocou o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora proferido a 11 de abril de 2019, no processo 2251/18.2T8PTM-A.E1, acessível em www.dgsi.pt. Tendo em conta o atrás exposto quanto à natureza do prazo previsto no art. 380º nº 1 do C.P.C., seguimos a mesma posição. As regras previstas para os prazos processuais só podem ser aplicadas a prazos de caducidade previstos no Código de Processo Civil se a lei determinar tal aplicação. O regime previsto no art. 138º nºs 1, 2 e 3 do C.P.C. é aplicável aos prazos para a propositura de ações previstos no Código Processo Civil por força do nº 4 desse artigo. Inexiste norma que determine a aplicação a tais prazos do regime previsto no art. 139º nº 5 a 7 do C.P.C. É de salientar que, nos termos do art. 328º do C.C., “o prazo de caducidade não… se interrompe senão nos casos em que a lei o determine” * Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar a apelação improcedente, mantendo a decisão recorrida. (…)” N) Face ao exposto, andou bem o Tribunal da Primeira Instância ao decidir que: “Conforme salienta a Requerida, crê-se ser entendimento unânime (e pacífico) na nossa jurisprudência que o prazo, para promover a suspensão de deliberações sociais, previsto no âmbito da providência cautelar nominada cujo regime está contemplado nos artigos 380º e seguintes do C.P.C., é um prazo de caducidade – por isso, substantivo, destinado ao exercício de um direito – e não um prazo meramente processual (aí sim, sujeito ao regime excepcional do artigo 139º do C.P.C.). (…) Ora, apesar da sua inserção sistemática poder inculcar uma interpretação diversa, não havendo qualquer dúvida de que o prazo em questão é de natureza substantiva, não cabe a aplicação de um regime de natureza processual como é, por excelência, aquele constante do artigo 139º do C.P.C., consabidamente destinado a regular a prática de actos em juízo. Como bem resume o Acórdão da Relação de Évora de 11.04.2019 (aliás, também citado pela Requerida): «E tanto assim é, que no nº 4 do artigo 138º do C.P.C. se refere que os prazos para a propositura de acções previstos no código seguem o regime dos números anteriores, não remetendo, por conseguinte, para o artigo 139º do C.P.C.». Isto basta para se dever concluir, necessariamente, que o direito de suspender a deliberação em questão já se mostrava precludido à data da propositura do procedimento cautelar, por verificação do prazo de caducidade do direito de acção. E isto é quanto basta para julgar o presente procedimento cautelar totalmente improcedente, sem necessidade de apreciação da factualidade alegada no requerimento inicial nem decisão da demais matéria de excepção invocada na oposição.” – vide páginas 5 e 6 da sentença. O) A sentença proferida pelo Tribunal a quo afigura-se fundamentada, quer de facto, quer de direito, de modo claro, completo, congruente e lógico, não merecendo, por conseguinte, qualquer censura, pelo que se requer que seja julgado totalmente improcedente o recurso apresentado pela Recorrente e seja mantida a decisão proferida pelo Tribunal de Primeira Instância. Nestes termos e nos mais de Direito, que V. Exas. doutamente suprirão, requer-se: a) Que seja julgada inadmissível a alegação dos factos invocados nos artigos 2 e 3 nas alegações de recurso, por serem factos ocorridos e conhecidos pela Recorrente em momento anterior ao encerramento da discussão em Primeira Instância, devendo os mesmos serem desconsiderados; b) Subsidiariamente e sem conceder, caso assim não se entenda, que seja julgada inadmissível a alegação dos factos invocados nos artigos 2 e 3 nas alegações de recurso, por serem factos supervenientes que o Tribunal de recurso não pode conhecer, devendo os mesmos serem desconsiderados; c) Que seja julgado totalmente improcedente o recurso apresentado e mantida a decisão proferida pelo Tribunal de Primeira Instância, pelos motivos supra expostos, Assim se fazendo a tão costumada JUSTIÇA!» * Colhidos os vistos, importa apreciar e decidir. ** Nos termos dos artºs 635º nº 4 e 639º nº 1 do Código de Processo Civil são as conclusões que definem o objecto e delimitam o âmbito do recurso, seja quanto à pretensão dos recorrentes, seja quanto às questões de facto e de Direito que colocam, exercendo as mesmas função equivalente à do pedido (neste sentido cfr. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil” 5ª Ed., Almedina, 2018, pp. 114-117), certo que esta limitação dos poderes de cognição do Tribunal da Relação não se verifica quanto à qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cfr. artº 5º nº 3 do CPC). Ressalvadas matérias que sejam de conhecimento oficioso, não pode, no entanto, este Tribunal conhecer de questões (de facto ou de Direito), muito embora suscitadas no recurso, que não tenham sido postas à apreciação do Tribunal a quo e que não tenham sido objecto da decisão recorrida (cfr. resulta das disposições conjugadas dos artºs 627º nº 1, 635º nºs 2 e 4 e 608º nº 2 do CPC; na jurisprudência cfr., a titulo de exemplo, Acórdãos do STJ de 08/10/2020 (Rel. Ilídio Sacarrão Martins) de 18/03/2021 (Rel. Oliveira Abreu), de 23/02/2021 (Rel. José Raínho) e de 15/12/2023 (Rel. Maria da Graça Trigo), porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas sobre questões subordinadas ao julgamento em 1º grau (cfr. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª Ed., Almedina, 2018, p. 119). Assim, no caso, a questão a decidir é a de saber se o artº 139º nº 5 do CPC é aplicável ao prazo estabelecido no artº 380º nº 1 do mesmo Código. II – FUNDAMENTAÇÃO A) DE FACTO Com fundamento nos documentos juntos e considerando a matéria admitida por acordo, na decisão sob recurso foi considerada a seguinte a factualidade: «1. A Assembleia Geral Extraordinária da Requerida, cuja deliberação está em causa nos presentes autos de procedimento cautelar, realizou-se no dia 1 de Fevereiro de 2025, em formato híbrido – presencial e virtual – com início pelas 14H30 e com a seguinte ordem de trabalhos, cf. doc. 1 com a oposição: «Ponto Um – Designação de Presidente da Comissão Arbitral; Ponto Dois – Apresentação, discussão e votação da sanção de expulsão no âmbito do procedimento disciplinar de AMGP, associada n.º …; Ponto Três – Apresentação, discussão e votação da sanção de expulsão no âmbito do procedimento disciplinar de CRVSM, associada n.º …; Ponto Quatro – Apresentação, discussão e votação da sanção de expulsão no âmbito do procedimento disciplinar de JFFB, associado n.º …; Ponto Cinco – Apresentação, discussão e votação da sanção de expulsão no âmbito do procedimento disciplinar de PEMM, associado n.º ….» 2. A Requerente esteve presente na referida Assembleia, de forma virtual, tendo intervindo activamente na mesma, nomeadamente tendo tomado a palavra – cfr. doc. 2 com a oposição. 3. O presente procedimento cautelar foi proposto em 13.02.2025.» * B) DE DIREITO Os presentes autos respeitam a procedimento cautelar para suspensão de deliberações sociais, dispondo a respeito dos seus pressupostos e formalidades o artº 380º CPC, cujo nº 1 estabelece que “Se alguma associação ou sociedade, seja qual for a sua espécie, tomar deliberações contrárias à lei, aos estatutos ou ao contrato, qualquer sócio pode requerer, no prazo de 10 dias, que a execução dessas deliberações seja suspensa, justificando a qualidade de sócio e mostrando que essa execução pode causar dano apreciável.”, mais estabelecendo o seu nº 3 que “O prazo fixado para o requerimento da suspensão conta-se da data da assembleia em que as deliberações foram tomadas ou, se o requerente não tiver sido regularmente convocado para a assembleia, da data em que ele teve conhecimento das deliberações.” A Assembleia em que foi tomada a deliberação posta em crise realizou-se no dia 01/02/2025, em formato híbrido – presencial e virtual (cfr. facto 1), a Requerente não alegou em momento algum que não foi regularmente convocada para essa Assembleia, e da matéria de facto provada consta que a Requerente esteve presente na referida Assembleia, de forma virtual, tendo intervindo activamente na mesma, nomeadamente tendo tomado a palavra (cfr. facto 2), daqui decorrendo pacificamente que será a partir da data da assembleia que se contará o prazo de 10 dias fixado no artº 380º nº 1 CPC. A este propósito diga-se, tendo em vista o teor da conclusão 1ª da Requerente e ora Recorrente, que a alegação de que “não esteve presente na momento em que foi votada a deliberação”, apenas agora feita em sede de recurso, consiste na invocação de um novo facto que a mesma, nos momentos processuais próprios [requerimento inicial e resposta às excepções], não introduziu na discussão, não o subordinando à apreciação e julgamento do Tribunal de 1ª instância, pelo que não pode agora ser considerado, pois não sofre controvérsia que do artº 627º nº 1 do CPC decorre que os recursos visam o reexame, por parte do Tribunal superior, de questões de facto ou de Direito anteriormente colocadas à apreciação e decididas pelo Tribunal recorrido, e não a pronúncia sobre questões novas (cfr. neste sentido, entre outros, e apenas a título de exemplo, o Acórdão do TRL de 14-02-2013, no proc. 285482/11.6YIPRT.L1-2 in www.dgsi.pt). Acresce que a matéria de facto provada, designadamente o citado facto 2, se tem por consolidada por não ter sido objecto de qualquer impugnação. Não pode, contudo, deixar de se vislumbrar um sofisma naquela afirmação da Recorrente remetendo para a presença física na Assembleia, quando tal irreleva perante a sua participação nela por meios electrónicos, ditos virtuais. Está, pois, definido que é da data da Assembleia, realizada em 01/02/2025, que se conta o prazo de 10 dias fixado no artº 380º nº 1 CPC. Como se menciona no Acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa, de 10/07/2025 (procº 4216/25.9T8LSB.L1) destacado pela Recorrida, aliás proferido nesta mesma secção do Tribunal, citando Alberto dos Reis (in Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. 2º, pág. 57), “O prazo judicial pressupõe necessariamente que já está proposta a acção, que já existe um determinado processo, e destina-se ou a marcar o período de tempo dentro do qual há-de praticar-se um determinado acto processual (prazo peremptório), ou a fixar a duração duma certa pausa, duma certa dilação que o processo tem de sofrer (prazo dilatório). É evidente que não está nestas condições o prazo legal de propositura duma acção.”. Diz o mesmo Mestre que “O prazo dentro do qual há-de ser proposta uma determinada acção é um elemento integrante do regime jurídico da respectiva relação de direito substantivo ou material.” (mesma obra, a pág. 56). Assim se vê que o prazo de 10 dias estabelecido no artº 380º nº 1, embora previsto no Código do Processo Civil, não é um prazo processual mas, antes, um prazo substantivo. De outra banda, dispondo o artº 298º nº 2 do CCivil que “Quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição”, há que concluir que o prazo previsto no artº 380º nº 1 do CPC é um prazo de caducidade. Aqui chegados, tendo em consideração que o prazo se conta a partir de 01/02/2025 (data da Assembleia), ressalta que o termo do prazo para a interposição do procedimento cautelar ocorreu em 11/02/2025, o que a Recorrente, aliás, não põe em causa, pois expressamente o afirma, designadamente, da conclusão 2ª das suas alegações. Todavia, o presente procedimento cautelar foi proposto em 13/02/2025 (cfr. facto 3), defendendo a Recorrente que não ocorreu a caducidade por ter praticado o acto, com o pagamento da multa respectiva, a coberto do artº 139º nº 5 CPC. E esta é a essência do presente recurso. Como a Recorrida deu nota nas suas contra-alegações, com bastas citações de Acórdãos, a jurisprudência, que cremos unânime, entende que o regime do artº 139º nº 5 do CPC não é aplicável ao prazo estabelecido no artº 380º nº 1 CPC pela seguinte ordem de razões: este não é um prazo adjectivo, mas antes substantivo e de caducidade; se aos prazos para propositura de acções é aplicável o regime previsto no artº 138º nºs 1, 2 e 3 do CPC, por força do nº 4 desse artigo, não existe norma que determine a aplicação a tais prazos do regime previsto no artº 139º nºs 5 a 7 do CPC; as regras previstas para os prazos processuais só podem ser aplicadas a prazos de caducidade previstos no Código de Processo Civil se a lei determinar tal aplicação; por sua vez, o artº 328º do CCivil estipula que o prazo de caducidade não se interrompe senão nos casos em que a lei o determine. Posição que perfilhamos, remetendo para a leitura dos Acórdãos citados pela Recorrida, sem necessidade da invocação de quaisquer outros. Posição que foi seguida pelo Tribunal a quo. A decisão recorrida, não merece, portanto, reparo, devendo o recurso improceder. III - DECISÃO Nestes termos e pelos fundamentos supra expostos, acorda-se em julgar a apelação improcedente, mantendo-se a sentença de 1ª instância. Custas a cargo da Recorrente. Notifique. Lisboa, 23/10/2025 Amélia Puna Loupo Margarida de Menezes Leitão Carla Matos _______________________________________________________ [1] Não tendo, porém, junto qualquer documento.  |