Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
21668/21.9T8LSB.L1-1
Relator: FÁTIMA REIS SILVA
Descritores: PEAP
REGRAS PROCEDIMENTAIS
CREDITO TRIBUTÁRIO
SITUAÇÃO MAIS FAVORÁVEL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/09/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1 –  Para os efeitos previstos nos arts. 222º-F nº5 e 215º do CIRE apenas será não negligenciável a violação que se traduza numa lesão de tal modo grave dos interesses protegidos ou a proteger – nomeadamente de tutela da posição dos credores e do devedor - que, em concreto, mesmo ponderando o interesse da recuperação/reequilíbrio financeiro do devedor, o juiz não possa deixar de recusar-se a homologar o plano, inviabilizando com isso a recuperação.
2 –  O processo especial para acordo de pagamento (PEAP) tem uma natureza hibrida, judicial e extrajudicial sendo que os vícios de procedimento relativos ao processo negocial relevarão apenas no momento do juízo de homologação, dado que todo o processo negocial decorre extrajudicialmente.
3 – A jurisprudência tem identificado a contagem de votos emitidos por credores titulares de créditos não modificados pela parte dispositiva do plano como integrando violação procedimental não negligenciável, atribuindo ao conjunto de normas que fixam quóruns constitutivos e deliberativos indispensáveis para que uma deliberação se considere aprovada, incluindo as regras relativas à votação e à definição de direitos de voto, o caráter de ‘normas procedimentais cuja violação não será negligenciável’.
4 – Para saber se um crédito tributário foi modificado pela parte dispositiva do plano, analisam-se as diferenças entre as condições deste e as que preexistiam ao acordo, ou seja, delineando quanto deviam e como deviam pagar os devedores antes da aprovação deste plano e depois.
5 – A comparação a fazer é sempre entre a posição do devedor antes e depois da aprovação do plano de pagamento e não com o resultado de plano de recuperação homologado a outra entidade, ainda que a mesma seja a devedora principal dos créditos de que os devedores são responsáveis subsidiários, já objeto de reversão.
6 - Os elementos do art. 195º do CIRE que excedem a finalidade e descrição das medidas são elementos relevantes para efeitos da sua aprovação pelos credores, sendo assim, e apesar da epígrafe do preceito, elementos que devem acompanhar o mesmo. A sua falta gerará, não violação de regras aplicáveis ao conteúdo do plano, mas antes violação de regras procedimentais.
7 – Sendo indicada a forma de obtenção dos rendimentos necessários para liquidar todas as prestações propostas, não existe qualquer vício de procedimento, sendo que a aferição de se o plano proposto é viável ou fazível é já uma apreciação de mérito que, em PEAP, não cabe ao tribunal por não previsto no art. 215º do CIRE, mas aos credores com vista a determinar o respetivo sentido de voto.
8 - A diferente natureza dos créditos tributários e o seu carater indisponível previsto por lei justifica o tratamento diferenciado que lhes é dado, cabendo apenas perguntar se justifica o tratamento dado aos demais créditos. Uma desproporção entre um cumprimento de 100%, em prestações, de forma subsidiária e o pagamento de 75% da dívida consolidada, incluindo juros, para os créditos garantidos e de 60% da dívida consolidada para os demais créditos comuns não é uma desproporção merecedora de censura e que viole o princípio da igualdade.
9 – Para os efeitos previstos no art. 216º do CIRE, impõe-se um pré-juízo, dada a natureza pré-insolvencial do procedimento. O cenário de liquidação é conatural na previsão do art. 216º do CIRE porque tratamos de um devedor que já está declarado insolvente. Mas em procedimento preventivo a que um devedor tem acesso em situação económica difícil ou em situação de insolvência iminente, a probabilidade de, findo o procedimento, o devedor já estar insolvente e ser mais provável que se lhe siga a declaração de insolvência e a liquidação universal convive com a hipótese de o devedor, mesmo sem obter a aprovação do acordo, não estar em situação de insolvência atual.
10 – O credor que requer a não homologação do acordo de pagamento com o fundamento no disposto na al. a) do nº1 do art. 216º do CIRE tem o ónus de demonstrar, em termos plausíveis, que na ausência de plano ficaria em situação mais favorável de acordo com o cenário mais provável.
(Pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam as Juízas da 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa

1. Relatório
JA e MA intentaram o presente processo especial para acordo de pagamento.
Foi nomeado Administrador Judicial Provisório e efetuadas as publicações previstas no nº5 do art. 222º-C do CIRE.
Foram reclamados créditos, nos termos do nº2 do art. 222º-D do CIRE, vindo o Administrador Judicial Provisório a apresentar lista provisória de credores, a qual foi impugnada pelos devedores quanto aos créditos reconhecidos a CM, HF SA, PAJ, SA, NB, SA e CD, SA, e pelo credor ISS, IP, as quais foram decididas por despacho que julgou as impugnações deduzidas pelo devedor parcialmente procedentes (quanto aos créditos reconhecidos a CM, HF e PAJ) e a impugnação deduzida pelo ISS, IP, procedente.
Foi apresentada proposta de acordo de pagamento pelo devedor.
BLM veio, informando ter votado desfavoravelmente o plano, pedir a não homologação do mesmo, alegando, para os efeitos do art. 215º do CIRE,  que a aprovação do plano está sujeita ao voto de duas entidades (Segurança Social e Fazenda  Pública) cujo pagamento está condicionado ao incumprimento de PER de outra entidade, em relação ao qual não há qualquer modificação do crédito, não dispondo assim aqueles credores de direito de voto, que os rendimentos dos devedores não são suficientes para liquidar todas as prestações propostas, não se indicando como serão obtidos os rendimentos em falta e, para os efeitos do art. 216º do CIRE, que a sua situação ao abrigo do plano é previsivelmente menos favorável que na ausência de qualquer plano por estarem em curso dois processos executivos para pagamento dos créditos hipotecários, ambos em fase de venda dos imóveis penhorados.
O Sr. Administrador Judicial Provisório juntou aos autos o resultado da votação do plano, nos termos da qual o acordo de pagamento foi aprovado com os votos favoráveis de 60,22% dos créditos com direito de voto, correspondendo todos a créditos não subordinados, nos termos da al. b) do nº3 do art. 222º-F do CIRE.
Em 18/02/2022 foi proferida a seguinte decisão:
“Pelo exposto:
Homologo por sentença, nos termos do 222º-F nº5 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa, o acordo de pagamento apresentado por JA, titular do número de identificação fiscal …, e MA, titular do número de identificação fiscal …, casados entre si e ambos residentes na Alameda …, n.º x, Lisboa.
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A presente decisão vincula todos os credores, mesmo que não hajam participado nas negociações – art. 222º-F, nº8 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
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Custas pelos requerentes com taxa de justiça reduzida a ¼ - arts. 222-F, nº 9 e 302º nº 1, ambos do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas - sendo o valor da acção para efeitos de custas equivalente ao da alçada da Relação, nos termos do art. 301º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
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Registe, notifique e publicite.”
Inconformada apelou BLM, pedindo a revogação da decisão e a sua substituição por outra que recuse a homologação do acordo de pagamentos apresentado e formulando as seguintes conclusões:
“1. No seguimento do pedido de não homologação apresentado pela aqui Recorrente, ao abrigo do disposto no artigo 222.º-F, n.º 2 do CIRE, entendeu o Tribunal a quo que o acordo de pagamento, diversamente do suscitado pela Recorrente, “envolve uma modificação dos créditos dos devedores para com a Fazenda Nacional e o Instituto da Segurança Social” e que, por isso, estes Credores têm direito de voto e, bem assim, que não foram violadas quaisquer regras procedimentais ou de conteúdo do plano de pagamento que impeçam a respetiva homologação.
2. Não pode a Recorrente conformar-se com o teor da Decisão Recorrida nem com os respetivos fundamentos, a qual reputa de ilegal, violando o disposto nos artigos 222.º-F, n.º 5, 215.º e 216.º, todos do CIRE, devendo a mesma ser revogada e substituída por outra que, a final, recuse a homologação do acordo de pagamento.
Senão vejamos:
3. Apresentaram-se os ora Devedores a processo especial para acordo de pagamento (“PEAP”) com fundamento na situação económica difícil em que se encontram.
4. No âmbito da relação provisória de credores, elaborada pelo Sr. Administrador Judicial foram reconhecidos créditos privilegiados à Fazenda Nacional e ao Instituto de Segurança Social, os quais, em conjunto totalizam 52,25% dos créditos reconhecidos.
5. Resulta provado nos autos que os créditos aqui reconhecidos à Segurança Social e à Fazenda Pública emergem de dívidas originariamente tituladas pela empresa LF, Lda, a qual se encontra a cumprir o Plano de Revitalização aprovado, cujas medidas se encontram sujeitos os créditos da Segurança Social e da Fazenda Nacional reconhecidos, também, nos presentes autos.
6. Considerou o douto Tribunal que “De acordo com a lista definitiva de créditos (ou seja, após o conhecimento das impugnações) a Fazenda Nacional tem um crédito no valor global de €210.927,51 e a Segurança Social um crédito no valor de €4.447.580,05, nenhum dos quais sujeito a condições. (…) A comparação (que permite concluir pela modificação ou não dos créditos) tem de ser feita entre a obrigação dos devedores para com as entidades públicas – obrigação de pagamento total e imediato – e a obrigação de pagamento à luz do acordo de pagamento – pagamento nas condições estabelecidas no PER e apenas depois do incumprimento da sociedade LF, já que o PER não tem efeitos relativamente aos aqui devedores sem a aprovação do acordo de pagamento – cfr. art.217º, n.º4 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (sublinhado nosso). Neste contexto é para nós manifesto que o acordo de pagamento envolve uma modificação dos créditos dos devedores para com a Fazenda Nacional e o Instituto da Segurança Social e, nessa medida, assistia direito de voto a estes credores, que o exerceram validamente.”
7. O plano apresentado e agora homologado pelo douto Tribunal a quo não prevê qualquer modificação ao plano de pagamentos em vigor no âmbito do PER da LF, na medida em que prevê que, no caso de incumprimento do PER pela sociedade LF, os créditos das referidas entidades públicas permaneçam sujeitos às mesmas medidas – ou seja, ao mesmo plano de pagamentos -, porém, na esfera dos Devedores.
8. Os referidos créditos não são considerados em termos diversos / distintos daqueles que atualmente revestem à luz do PER da LF, quer quanto a quantia quer quanto a termos e condições de pagamento e/ ou garantias de que beneficiam.
9. Salvo melhor entendimento, não andou bem o Tribunal a quo quando interpretou a norma constante do artigo 212º CIRE que visa, apenas e tão-só, obstar a que credores que não veem a sua situação atual alterada possam interferir no recebimento dos créditos dos demais credores, esses sim realmente afectados pelo plano.
10. A aprovação do plano encontra-se sujeita ao voto de duas entidades (Segurança Social e Fazenda Pública) cujo pagamento se encontra condicionado ao incumprimento do PER de outra entidade e relativamente à qual não se verifica qualquer modificação das condições, comprometendo, assim, o voto dos credores realmente interessados na aprovação ou não do presente PEAP.
11. O plano de pagamentos previsto para os credores Segurança Social e Fazenda Pública não completa qualquer modificação aos seus créditos, uma vez que mantém todas as condições de pagamento previstas no PER aprovado, prevendo o pagamento total dos créditos reconhecidos, bem como, manutenção de todas as garantias.
12. Assim, foi fácil colher os votos favoráveis da Segurança Social e da Fazenda Pública ao presente acordo quando os seus créditos, que estão a ser pagos, não sofrem qualquer alteração e/ ou redução (cfr. Acórdão da Relação de Lisboa, da Relatora Rosa Ribeiro Coelho, no âmbito do processo 23094/15.0T8SNT.L1-7).
13. Carecendo este processo de falta de transparência e de justiça entre os credores, susceptível de violar a regra conditio par creditorum.
14. E não poderá dizer-se, como entendeu o douto Tribunal a quo, que a modificação dos créditos se verifica no facto de a Segurança Social e a Fazenda Nacional, ao aceitarem o presente plano, não receberam o pagamento total e imediato dos seus créditos.
15. O referido entendimento leva-nos a raciocínios forçados, rebuscados e injustos, totalmente à margem do que foi a intenção do legislador.
16. Porquanto, a empresa LF é gerida pelos aqui Devedores, os quais procedem, mensalmente, aos pagamentos devidos nos termos do PER.
17. Os créditos da Segurança Social e da Fazenda Nacional materializaram-se, até ao eventual incumprimento, naquilo que se encontra previsto no plano de revitalização aprovado e até por aqui estes créditos não sofrem qualquer modificação, na medida em que a reversão das respetivas dívidas contra os aqui Devedores – na qualidade de gerentes da LF – apenas se efetivaria no caso de incumprimento por parte do devedor principal (a LF).
18. Para as entidades públicas a aprovação deste PEAP não é mais do que uma segurança adicional que o plano por estas já aprovado não será incumprido, mantendo todas as condições e garantias já aceites – sendo que sempre obteriam o mesmo resultado em consequência da possibilidade de reversão das dívidas contra os aqui Devedores.
19. Deve, assim, aqui aplicar-se a mesma lógica que ao financiamento bancário que não vê alteradas as suas prestações mensais. Consubstanciando um crédito que não vê, na sua génese, qualquer modificação (cfr. Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do processo 26506/15.9T8SNT-A.L1-7, cuja Relatora foi Cristina Coelho, datado de 20.09.2016).
20. Com a homologação do acordo, permite-se, assim, que a Segurança Social e a Fazenda Nacional aprovem um plano de recuperação que assegura manutenção dos seus créditos, o pagamento total do crédito reclamado, com as condições por si já anteriormente aceites!
21. Resulta evidente, ao contrário do que consta da douta decisão ora recorrida, que o acordo de pagamento proposto apresenta um plano de pagamento da totalidade dos créditos reclamados pela Segurança Social e Fazenda Nacional, não estando previsto qualquer perdão e/ou carência para o pagamento dos mesmos.
22. Ao contrário do que sucede que os restantes créditos reconhecidos no âmbito do presente processo, relativamente aos quais o acordo proposto prevê, para além de um período de carência de dois anos, perdão de, pelo menos, 25% do valor da divida reconhecida.
23. Considerando o peso que os dois credores públicos representam para a aprovação do referido acordo, parece-nos evidente concluir que as condições propostas aos mesmos não passam de uma derradeira tentativa de aprovação forçada do plano, em sacrifício dos demais credores e em detrimento dos princípios da igualdade e justiça entre todos.
24. Reitera-se que a aprovação do presente acordo ficou dependente do voto favorável de dois credores, cujos créditos estão a ser pagos através de outro plano e cujas condições e montantes se mantiveram inalterados.
25. Os demais credores, que veem os seus créditos reduzidos de forma abrupta, apenas poderão considerar qualquer tipo de pagamento dos seus créditos, no melhor dos cenários, findo o período carência de dois anos!
26. A decisão ora recorrida, salvo melhor entendimento, ignorou as diferenças de tratamento dadas a cada um dos credores, que desrespeitam os comandos legais aplicáveis, designadamente porque as mesmas acarretam um tratamento excessivo, desproporcionado e irrazoável entre os mesmos. (cfr. Acórdão da Relação de Coimbra, proferido no âmbito do processo 1097/21.5T8LRA.C1,de 12.10.2021).
27. O Tribunal a quo mal andou quando desconsiderou e ignorou a utilização estratégia gritante que foram os créditos reclamados pelas entidades públicas, como meio de aprovação de um plano que a estes, por ora, em nada afecta.
28. Em face do exposto, e nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 212.º, n.º 2 alínea a) do CIRE, salvo melhor entendimento, as entidades públicas não gozam de direito de voto.
29. Termos em que, deve a Decisão recorrida ser revogada, na medida em que o acordo não acolheu a maioria dos votos favoráveis para a sua aprovação e consequente homologação, e substituída por outra que recuse a homologação do acordo de pagamento nos presentes autos.
30. A ora Recorrente requereu a não homologação do acordo com fundamento no disposto no artigo 215.º do CIRE por considerar que, no que ao conteúdo do plano diz respeito, o acordo proposto viola de forma não negligenciável as normas aplicáveis.
31. Não lograram demonstrar os devedores quais os meios de obtenção dos rendimentos suficientes para honrarem todos os pagamentos propostos nos presentes autos.
32. Contudo, considerou o Tribunal a quo que o pedido de não homologação da ora Credora (aqui Recorrente) seria improcedente na medida em que, alegadamente, “não se vislumbra a falta de indicação de como serão obtidos os rendimentos necessários para liquidar todas as prestações propostas”.
33. Tal entendimento assenta no facto de terem sido juntas todas as declarações de IRS dos últimos 4 anos.
34. Acrescenta o douto Tribunal que “Questão diversa é a de saber se o plano de pagamento proposto é suficiente para a liquidação de todas as responsabilidades, mas esta é uma questão de conteúdo e não de violação das regras procedimentais.”
35. Não se alcança o entendimento do douto Tribunal, no que à análise do plano proposto diz respeito, por ser evidente a falta de demonstração da obtenção dos rendimentos necessários ao cumprimento do mesmo.
36. Porquanto, quando o devedor propõe um acordo de pagamento das suas dívidas, tem de o fazer de forma transparente e com segurança para os credores de que o plano é viável e fazível com os rendimentos a que tem acesso.
37. Não bastando para isso indicar o montante das prestações e o número de prestações a efetuar se, na prática, tal não se coaduna com a realidade financeira dos Devedores.
38. Refere o douto Tribunal que “(…) o plano contém a indicação da forma de pagamento, pois prevê o número de prestações, indica quais os rendimentos dos devedores actuais e previsíveis e qual a parcela afecta aos pagamentos e ainda qual o património dos devedores.” E conclui com isto que “não se vislumbra a falta de indicação de como serão obtidos os rendimentos necessários para liquidar todas as prestações propostas” - Tal elação carece, como já demonstrado pela Recorrente, em absoluto, de fundamento!
39. No cenário apresentado pelos devedores no qual o PER da LF é incumprido e os Devedores têm de manter o plano por si, propõem estes pagar anualmente cerca de € 600.000,00 (seiscentos mil euros).
40. Os rendimentos anuais dos devedores, sem dedução das despesas, rondam € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros).
41. Não informam os Devedores como pretendem garantir o pagamento de tais prestações, não se podendo, contudo, recorrer à lista de ativos indicados pelos Devedores porquanto, o valor de mercado ali indicado, na sua totalidade, ascende a € 976.763,99 e as dividas ora em crise ascendem, na presente data, a € 4.639.364,37 (veja-se o disposto no Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, no âmbito do processo 4066/20.9T8CBR-B.C1)
42. Os Devedores não alegam nem demonstram como serão obtidos os rendimentos necessários para cumprir o acordo de pagamento a que se propõem. Sendo evidente que não dispõem de rendimentos para o fazer, acresce o facto de nem sequer o demonstrarem no acordo apresentado.
43. Sempre se dirá que, caso o incumprimento do PER se verifique, os Devedores estão numa verdadeira situação de insolvência, uma vez que estão impossibilitados de cumprir as suas obrigações vencidas, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 3.º, n.º 1 do CIRE.
44. Ainda que se ignore o cenário de incumprimento do PER por parte da LF, e conforme consta na página 11 do plano apresentado, os Devedores apenas demonstram a sua capacidade financeira para liquidação do plano proposto entre 2021 e 2030, o que corresponde apenas a 31% do plano, deixando os restantes anos numa única coluna.
45. No último ano apresentado, i.e. 2030, ainda faltarão liquidar cerca de € 1.959.828,00, correspondente a capital e juros.
46. Ora, tal demonstração apenas é mais uma evidência da inviabilidade do plano proposto: A capacidade financeira dos devedores é de € 135.786,00 por ano e o capital em dívida no âmbito do PEAP é de € 2.509.596,00, após o perdão de capital e juros e, bem assim, desconsiderando a dívida da Segurança Social e Fazenda Nacional;
47. Pelo que, para o pagamento da prestação 174, prevista para o ano 2038, verifica-se um saldo negativo de € 352.658,00 (trezentos e cinquenta e dois mil, seiscentos e cinquenta e oito euros).
48. A capacidade financeira demonstrada evidencia que o plano demoraria 18,5 anos a ser pago, em 222 prestações mensais e não 174, conforme ali mencionado, o que se traduz em mais 6 anos do que o indicado pelos Devedores.
49. Acresce que, o cálculo acima mencionado não considera os juros previstos no plano, que acrescerão aos montantes referidos.
50. Nos termos do plano, e no que aos créditos Garantidos relacionado com as instituições de crédito e financeiras diz respeito, aplica os seguintes termos: (i) “sobre o capital em dívida vencer-se-ão juros contados, a partir da data da sentença de homologação do plano, calculados a uma taxa fixa de 1,0%”; (ii) “Pagamento dos juros vincendos, em prestações mensais, vencendo-se a primeira 30 (trinta) dias após a data do trânsito em julgado da sentença de homologação do plano.”
51. Se considerarmos capital e juros, cabe adicionar € 201.945,24 (duzentos e um mil, novecentos e quarenta e cinco euros e vinte e quatro cêntimos), aumentando assim o montante em divida para € 2.711.540,85 (dois milhões, setecentos e onze mil, quinhentos e quarenta euros e oitenta e cinco cêntimos).
52. O plano ora em crise demorará cerca de 22 anos a ser pago, acrescido dos dois anos de carência previstos, o que se traduz em 240 prestações mensais e que corresponde a quase o dobro do tempo indicado pelos devedores (que é de 12,5 anos).
53. Todos estes montantes e cenários têm por base que o PER é integralmente cumprido pela LF e que os Devedores não terão de assumir qualquer pagamento relativamente aos créditos detidos pela Segurança Social e Fazenda Nacional.
54. Não é indicado em qualquer momento do plano qual a alternativa dos Devedores por forma a obter os rendimentos em falta para liquidar o montante total das prestações propostas, conforme já supra mencionado.
55. Em face do exposto, dúvidas não restam que a capacidade financeira dos Devedores não é suficiente para fazer face ao plano de pagamento por si proposto, não se afigurando minimamente realista o cenário de o mesmo vir a ser integralmente cumprido – ainda que desconsiderando o pagamento dos créditos da Segurança Social e da Fazenda Nacional.
56. Termos em que, ao abrigo do disposto no artigo 215.º CIRE, mal andou o Tribunal a quo quando considerou que não se verifica qualquer violação de normas que implique a não homologação do plano.
57. O mesmo é dizer-se que o acordo de pagamento, nos termos em que se encontra gizado, mais não consubstancia do que uma moratória de que os Devedores pretendem beneficiar sem que confira aos seus credores qualquer grau de segurança e/ ou certeza mínimo de que os sacríficos que lhe são impostos terão como contrapartida o benefício da recuperação dos créditos nos termos previstos no acordo de pagamento,
58. Prorrogando no tempo o recebimento dos créditos e ampliando o risco de não recuperação, em detrimento dos credores.
59. Pelo que, deve a Decisão Recorrida ora recorrida ser revogada e substituída por decisão de não homologação do acordo apresentado.
60. A aqui Recorrente requereu a não homologação do acordo de pagamento apresentado nos autos com fundamento no disposto no artigo 216.º, n.º 1 alínea a) CIRE, por considerar ser evidente que, com a aprovação do PEAP, a Credora ficaria numa situação menos favorável do que sem qualquer plano, causando sérios prejuízos.
61. Considerou o douto Tribunal na decisão aqui em causa que “No caso, a requerente não cumpre este ónus, pois compara a situação à luz do plano de pagamento com a situação em que estaria caso as execuções em que alegadamente reclamou créditos prosseguissem. E ainda assim, não demonstrou qual o estado dessas execuções, mormente que ali reclamou créditos, que os mesmos foram graduados como créditos garantidos para serem pagos em primeiro lugar, nem que ali foram apreendidos quaisquer bens, os seus valores e que a venda estaria para breve. Por conseguinte, em face do argumentado pela credora requerente não podemos concluir que a respectiva situação, de acordo com o plano de pagamento, seria menos favorável do que aquela em que estaria caso o plano não fosse aprovado e a insolvência dos devedores fosse decretada.”
62. Ora, salvo o devido respeito, não merece acolhimento o entendimento do Tribunal a quo, porquanto resulta inequívoco nos autos que a situação da ora Recorrente, seja por via da insolvência dos devedores, seja por via das execuções já em curso, seria francamente mais vantajosa quando comparada com o cenário de aprovação do PEAP.
63. Reitera-se assim que, a ora Credora reclamou, a título de créditos garantidos, o montante global de € 3.054.775,13 (três milhões, cinquenta e quatro mil, setecentos e setenta e cinco euros e treze cêntimos);
64. Os referidos créditos encontram fundamento no seguinte em i) livrança subscrita pelos Devedores, no valor facial de € 1.134.346,73 (um milhão, cento e trinta e quatro mil, trezentos e quarenta e seis euros e setenta e três cêntimos) e com data de vencimento em 01.03.2019, garantida por hipoteca voluntária. A livrança ora em crise foi dada à execução no âmbito do processo que corre termos sob o n.º 12413/19.0T8LSB no Juiz 7 do Juízo de Execução de Lisboa e ii) livrança subscrita pelos Devedores, no valor facial de € 1.605.821,15 (um milhão seiscentos e cinco mil oitocentos e vinte e um euros e quinze cêntimos) e com data de vencimento em 01.03.2019, garantida por hipoteca voluntária. A livrança ora em crise foi dada à execução no âmbito do processo que corre termos sob o n.º 11791/19.5T8LSB no Juiz 4 do Juízo de Execução de Lisboa.
65. O processo melhor identificado no ponto i) encontra-se suspenso, após embargos e recursos, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 222.º-E, n.º 1 do CIRE.
66. Sem prejuízo de todas os embargos utilizados para obstar ao bom prosseguimento dos autos, ambos os processos se encontram em fase de venda, estando a Credora está finalmente em situação de concretizar as vendas dos imóveis hipotecados e receber o produto das mesmas, num curto espaço de tempo.
67. Claramente, a aprovação do PEAP colocaria a ora Credora numa posição francamente mais gravosa do que aquela em que se encontraria se o mesmo não fosse aprovado (cfr. Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, no âmbito do processo 362/21.6T8AVR.P1, datado de 04.10.2021, cuja relatora foi Fernanda Almeida)
68. Nos termos do acordo homologado, a ora Recorrente, apenas receberia qualquer pagamento após 24 meses de carência, sendo que o pagamento integral apenas ocorreria em 20 anos!
69. Ora, sem prejuízo de o imóvel ainda não estar vendido – porquanto a pendência dos presentes autos assim o determina -, é certo que a ora Credora conseguirá receber o produto da venda durante o corrente ano civil ou no seguinte.
70. Considerando a eventual insolvência dos Executados, a qual se verifica, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 3.º, n.º 1 do CIRE na eventualidade de a Segurança Social e a Fazenda Nacional deixarem de ser pagas por via do PER, sempre se dirá que a situação da ora Recorrente é francamente mais vantajosa.
71. A liquidação do património dos Devedores, através dos ativos por estes indicados onde se inclui o imóvel hipotecado, permite o pagamento imediato do valor do imóvel através da sua venda.
72. A hipoteca constituída a favor da ora Credora é de primeiro grau, não se perspetivando, atenta a lista de credores reconhecidos, a existência de créditos com prioridade no pagamento face à mesma.
73. Tal pagamento, imediato e certo, salvaguarda os interesses e direitos da credora hipotecária que, seguramente, verá o seu crédito pago através da venda do imóvel dado em garantia.
74. A venda imediata permite maximizar o valor de mercado do mesmo que, neste momento, ainda garante o pagamento de uma parte significativa do crédito hipotecário, uma vez que a espera pelo cumprimento ou incumprimento do plano, considerando também a idade dos Devedores, parece acarretar um custo ainda mais elevado para a Credora, pela perda de valor dos ativos dados em garantia.
75. No cenário de homologação do PEAP, a credora, que não recebe qualquer pagamento por parte dos Devedores desde 2019 terá de aguardar mais 2 anos para que qualquer pagamento eventualmente se inicie e aguardar mais 20 anos para receber a totalidade do valor do seu crédito, com o perdão previsto.
76. Assim, dúvidas não restam que a declaração de insolvência dos Devedores ou a manutenção os processos executivos já em curso e em fase de venda se mostra manifestamente mais vantajosa.
77. Neste sentido, forçoso será concluir pela ilegalidade da decisão ora recorrida, devendo a mesma ser substituída por decisão que recuse a homologação do acordo de pagamentos.”
O Ministério Público apresentou resposta ao recurso, sustentando a manutenção da decisão recorrida.
Os devedores apresentaram resposta ao recurso, pedindo a confirmação da sentença recorrida e formulando as seguintes conclusões:
“I. A questão levantada pela Recorrente reside no suposto erro na aplicação do direito pelo Tribunal a quo, por violação do disposto nos artigos 222.º-F, n.º 5, 215.º e 216.º, todos do CIRE, uma vez que o plano apresentado e homologado pelo Tribunal a quo não prevê modificação do plano de pagamentos para os credores Autoridade Tributária e Aduaneira e Segurança Social e, nessa medida, comporta um tratamento desigual entre os credores.
II. Alega ainda a Recorrente que o acordo proposto viola de forma não negligenciável as normas aplicáveis, porquanto, alegadamente, os devedores não lograram demonstrar os meios de obtenção dos rendimentos suficientes para procederem aos pagamentos.
III. Por último, a Recorrente alega ainda que, com a aprovação do acordo de pagamento, a mesma fica numa situação menos favorável do que sem qualquer plano, causando sérios prejuízos.
IV. Contudo, considerando o teor do acordo de pagamentos aprovado e homologado, a tramitação dos presentes autos e atenta a fundamentação jurídica aduzida pelo Tribunal a quo, jamais se poderá concordar com o alegado pela Recorrente.
V. No âmbito do presente processo especial para acordo de pagamento, foram reconhecidos créditos privilegiados à Fazenda Nacional e ao Instituto de Segurança Social, créditos estes, que não foram impugnados por nenhum dos intervenientes dos autos, concretamente pela Recorrente.
VI. Com efeito, de acordo com a lista definitiva de créditos, a Fazenda Nacional tem um crédito no valor global de € 210.927,51 e a Segurança Social um crédito no valor de € 4.447.580,05, nenhum dos quais sujeito a condições, o que totaliza 52,25% dos créditos reconhecidos.
VII. Ora, conforme resulta da douta Sentença, “da análise dos votos juntos resulta que foram expressos votos favoráveis computados em € 4.673.368,75 e votos contra computados em € 3.075.253,42 (num total de credores que representam créditos no valor de € 8.897.324,30)”, pelo que votaram favoravelmente o acordo de pagamento em crise credores que representam mais de metade da totalidade dos credores.
VIII. Posto isto, impõe-se considerar que o acordo de pagamento aprovado e homologado prevê, em rubricas autónomas, as condições de pagamento para os credores privilegiados Fazenda Pública e Segurança Social.
IX. Com efeito, no que em especial respeita aos créditos privilegiados da Fazenda Nacional e da Segurança Social, o acordo de pagamento submetido à votação observa todos os requisitos legalmente exigidos pela Lei Geral Tributária e Código de Processo e Procedimento Tributário, nomeadamente o disposto nos artigos 85.º, 196.º e 199.º do CPPT e artigo 30.º da LGT.
X. Quer isto, portanto, significar que as condições de pagamento propostas e aceites pelos referidos credores privilegiados correspondem à liquidação das dívidas através de pagamento prestacional, a liquidar pelos aqui Recorridos em caso de incumprimento das condições previstas no plano de revitalização da devedora originária.
XI. Na verdade, o acordo de pagamento ora aprovado e homologado modifica os créditos privilegiados da Fazenda Nacional e da Segurança Social, na medida em que os mesmos só serão exigíveis aos Recorridos em caso de incumprimento pela devedora originária.
XII. Pelo que, estando em causa créditos em Reversão e apesar de a devedora originária se ter submetido a processo especial de revitalização, tal não obsta a que a Fazenda Nacional e a Segurança Social prossigam com os processos de execução fiscal contra os aqui Recorridos, na qualidade de revertidos, considerando que conforme decorre do disposto no n.º 4 do artigo 217.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, o plano de revitalização da devedora originária não produz efeitos relativamente aos aqui Recorridos.
XIII. Ora, sempre se impunha, tal como sucedeu nos presentes autos, que o acordo de pagamento aprovado e homologado versasse acerca dos créditos privilegiados da Fazenda Nacional e da Segurança Social reclamados no âmbito dos presentes autos, estabelecendo-se condições de pagamento aplicáveis aos aqui Recorridos.
XIV. Por outro lado, conforme resulta devidamente explanado na douta Sentença em crise, a comparação que permite concluir pela modificação dos créditos só pode ser efetuada por referência à obrigação dos ora Recorridos para com a Fazenda Nacional e Segurança Social e não por referência ao plano de revitalização da devedora originária, o qual, conforme supra se alegou, não produz efeitos na esfera jurídica dos aqui Recorridos.
XV. Nessa medida, dúvidas não poderão subsistir de que os créditos privilegiados em crise sofrem modificação no acordo de pagamento ora aprovado e homologado, pelo que aos credores Fazenda Nacional e Segurança assistia direito de voto, os quais o exerceram validamente.
XVI. Acresce que, contrariamente ao que alega a Recorrente, o acordo de pagamentos aprovado e homologado não viola o princípio da igualdade dos credores, uma vez que a diferenciação apontada pela Recorrente respeita à alegação inexistência de modificação dos créditos privilegiados da Fazenda Nacional e da Segurança Social, o que, alegadamente, importava um sacrifício desproporcional e excessivo aos demais credores.
XVII. Em face de tudo o quanto exposto, andou bem o Tribunal a quo ao apreciar e decidir que o acordo de pagamento em crise nos autos foi aprovado pelos credores nos termos legais, por verificação dos pressupostos da alínea a) do n.º 3 do artigo 222.º-F do CIRE.
XVIII. Alega ainda a Recorrente que o conteúdo do acordo de pagamento aprovado e homologado viola de forma não negligenciável as normas aplicáveis, porquanto “não lograram demonstrar os devedores quais os meios de obtenção de rendimentos suficientes para honrarem todos os pagamentos propostos nos presentes autos”.
XIX. Ora, no que em concreto respeita aos rendimentos a obter pelos devedores, aqui Recorridos, sempre se impõe relevar a parte V do acordo de pagamento a qual respeita à análise económica e financeira efetuada, na qual se evidenciam, além do mais, os rendimentos atuais e previsíveis, afirmando-se a manutenção dos rendimentos dos aqui Recorridos.
XX. Nessa medida, andou bem o Tribunal a quo ao pugnar pelo entendimento de que “o plano contém a indicação da forma de pagamento, pois prevê o número de prestações, indica quais os rendimentos dos devedores atuais e previsíveis e qual a parcela afeta aos pagamentos e ainda indica qual o património dos devedores”.
XXI. Prossegue o Tribunal a quo que “não se vislumbra a falta de indicação de como serão obtidos os rendimentos necessários para liquidar todas as prestações propostas. Questão diversa é a de saber se o plano de pagamento proposto é suficiente para a liquidação de todas as responsabilidades, mas esta é uma questão de conteúdo e já não de observância de regras procedimentais”.
XXII. Com efeito, o acordo de pagamento aprovado e homologado contém todos os elementos atinentes à situação económico-financeira dos Recorridos, descrevendo a situação patrimonial dos devedores, indicando o seu ativo e o seu passivo, bem como a atividade profissional por eles desenvolvida.
XXIII. O acordo de pagamento também indica o modo pelo qual serão obtidos os rendimentos para a satisfação dos credores: serão os rendimentos que os devedores venham a auferir pelo seu trabalho e pelas suas pensões de reforma, pelo que o acordo de pagamento não deixa de fornecer, no essencial, os elementos relevantes para efeitos da sua aprovação pelos credores.
XXIV. No que concerne à alegada inviabilidade do acordo de pagamento em crise alegada pela Recorrente, sempre se impõe esclarecer que, tal como doutamente refere o Tribunal a quo, trata-se de uma questão de conteúdo, a qual é apenas avaliada e ponderada pelos credores para efeitos de darem ou não a sua adesão ao acordo de pagamento proposto.
XXV. Com efeito, ainda que caiba ao juiz o poder/dever de controlar a legalidade do processo e do plano de recuperação (seja nos seus aspetos formais, seja nos seus aspetos materiais ou substanciais), já não cabe ao juiz avaliar a credibilidade e viabilidade do plano apresentado.
XXVI. Na verdade, se a maioria dos credores entenderam aceitar o acordo e relevando que nada existe nos autos que aponte para o facto de a sua vontade ter sido viciada por qualquer erro, impõe-se concluir que os elementos que lhes foram fornecidos (expressos ou não no plano) foram suficientes para confiar na viabilidade e credibilidade do plano que lhes foi apresentado e para formar a sua vontade e decisão de contratar nos termos em que o fizeram.
XXVII. Pelo que, perante o texto da decisão em crise, considerado na sua globalidade, não se vê qualquer razão para discordar da forma como o Tribunal a quo fundamentou a sua convicção, pelo que andou bem o Tribunal a quo improceder o pedido da Recorrente.
XXVIII. A Recorrente sustenta nas suas alegações de recurso que “resulta inequívoco nos autos que a situação da ora Recorrente, seja por via da insolvência dos devedores, seja por via das execuções já em curso, seria francamente mais vantajosa quando comparada com o cenário de aprovação do PEAP”. – Cfr. Ponto 62 das Alegações de recurso.
XXIX. No entendimento da Recorrente, está em crise a violação do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 216.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
XXX. No caso dos autos e salvo o devido respeito por opinião contrária, a Recorrente limitou-se a enunciar a sua própria convicção, não aduzindo factos concretos, alegando que a prossecução das ações executivas pendentes lhe confere uma situação mais vantajosa do que a aprovação e homologação do acordo de pagamento em crise nos autos.
XXXI. Porém, ainda que (e existindo apenas a possibilidade do acordo de pagamentos não ser cumprido, e não a certeza desse facto) em sede de eventual insolvência, a Recorrente poderá não lograr o pagamento total do seu crédito garantido, se o imóvel hipotecado for insuficiente para o efeito, e dificilmente obterá o pagamento de qualquer parcela do seu crédito comum.
XXXII. No caso sub judice, não resulta demonstrado que a homologação do acordo de pagamentos dos Recorridos comporte para a Recorrente um resultado mais desfavorável do que o que resultaria da liquidação do ativo dos devedores.
XXXIII. Ora, nos termos gerais, ao credor que requer a não homologação do acordo que incumbe alegar e provar que a sua situação ao abrigo do mesmo é previsivelmente menos favorável do que a que para si adviria na sua ausência., pois ao mesmo incumbe ainda a obrigação de especificar e demonstrar, através de factos concretos, como chegou a essa previsão.
XXXIV. No caso dos autos, a Recorrente não logrou realizar tal demonstração, pois, como doutamente considerou o Tribunal a quo, a Recorrente “não demonstrou qual o estado dessas execuções, mormente que ali reclamou créditos, que os mesmos foram graduados como créditos garantidos para serem pagos em primeiro lugar, nem que ali foram apreendidos quaisquer bens, os seus valores e que a venda estaria para breve”. –
XXXV. Por tudo o quanto se vêm expondo, não vislumbram os Recorridos qualquer razão para discordar da forma como, no essencial, o Tribunal a quo decidiu, sendo que a fundamentação jurídica que serviu de suporte a tal convicção foi criteriosa e detalhadamente ponderada.
XXXVI. Ora, a decisão não podia, pois, ser outra que não homologar o acordo de pagamento aprovado, nos termos e para os efeitos do n.º 5 do artigo 222.º-F do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, pelo que deverá improceder totalmente o recurso da Recorrente.”
O recurso foi admitido por despacho de 23/05/2022 (ref.ª 416060877).
Foram colhidos os vistos.
Cumpre apreciar.
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2. Objeto do recurso
Como resulta do disposto nos arts. 608º, n.º 2, aplicável ex vi art. 663º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4, 639.º n.ºs 1 a 3 e 641.º n.º 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil, sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio e daquelas cuja solução fique prejudicada pela solução dada a outras, este Tribunal só poderá conhecer das que constem nas conclusões que, assim, definem e delimitam o objeto do recurso. Frisa-se, porém, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito –  art.º 5º, nº3 do mesmo diploma.
Consideradas as conclusões acima transcritas a única questão a decidir é a de se se estão reunidos os requisitos para a homologação da proposta de plano de pagamentos apresentada pelo devedor, o que passa pela apreciação de:
- se no procedimento e no conteúdo do acordo ocorreu violação não negligenciável de regras procedimentais;
- idêntica aferição quanto a violação não negligenciável de normas aplicáveis ao conteúdo do plano;
- se, relativamente ao credor recorrente, a sua situação ao abrigo do acordo é previsivelmente menos favorável que a que interviria na ausência de qualquer plano, para os efeitos da al. a) do nº1 do art. 216º do CIRE.
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3. Fundamentos de facto
Com relevância para a decisão do recurso mostram-se assentes os factos constantes do relatório e ainda os seguintes, resultantes dos termos dos autos:
1 – Com o requerimento inicial os devedores informaram estarem pendentes contra si doze execuções tributárias, que discriminaram, e execução intentada por BLM, no valor de € 1.622.336,13, pendente no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa sob o nº 11791/19.158LSB.
2 – Juntaram ainda declarações de rendimentos relativas aos anos de 2020, 2019 e 2018, da última das quais consta terem obtido rendimentos brutos de trabalho dependente e de pensões de € 215.962,74.
3 – Foram indicados os seguintes bens:
- Fração autónoma designada pela letra .., sita na Alameda … Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o registo n.º … e inscrito na matriz predial urbana sob o n.º …;
- Fração autónoma designada pela letra …, sita na Rua … Torres Vedras, inscrito na matriz predial urbana sob o n.º …;
- Prédio rústico, correspondente a terra de cultura, pinhal, pastagem com vinho em cordão, sito na freguesia de …, Seia, inscrito na respetiva matriz sob o n.º …;
- Prédio rústico, correspondente a terra de cultura, pinhal e pastagem com macieiras, pereira e vinha em cordão, sito na freguesia de …, concelho de Seia, inscrito na respetiva matriz sob o n.º …;
- Prédio rústico, correspondente a terra de mato, sito …., concelho de Seia, inscrito na respetiva matriz sob o n.º …;
- Prédio rústico designado por …, sito na freguesia de …., concelho de Torres Vedras, inscrito na respetiva matriz sob o n.º …;
- Motociclo com a matrícula …., de marca …, com cilindrada de 124cc.
4 – Após decisão das impugnações da lista provisória de créditos, a lista definitiva de créditos ficou composta pela seguinte forma:
- BLM € 3.840.435,50; sendo € 1.790.058,21 garantidos por hipoteca sobre sobre o prédio urbano, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o nº ..., registada pela AP. 1160 de 2009/06/22 até ao montante máximo assegurado de 1.820.211,40€; € 1.264.716,92 garantidos por hipotecas sobre a fração autónoma designada pela letra … do prédio urbano, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o …, registadas pelas AP. 64 de 2004/05/19 até ao montante máximo assegurado de 344.897,96€ e AP. 276 de 2010/02/19 até ao montante máximo assegurado de 1.370.000,00€; e  demais comum sob condição;
- CD, SA – € 117.875,68 - crédito comum;
- Estado – Fazenda Nacional – € 209.945,70, sendo € 209.471,76 crédito comum e € 473,94 garantido por privilégio imobiliário especial;
- Instituto da Segurança Social – € 4.447.580,05 – crédito comum;
- NB, SA – € 87.366,55 – crédito comum, sendo € 77.171,30 sob condição;
- PAJ, SA – € 167.827,94 – crédito garantido por hipoteca sobre a fração autónoma designada pela letra … do prédio urbano, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa …, registada pela AP. 39 de 2005/02/23 até ao montante máximo assegurado de 74.140,00€.;
- PIE, Lda – € 15.843,00 – crédito comum;
- UFC, SA – € 10.283,04 – crédito comum.
5 – Apresentado acordo de pagamento e submetido a votação, não foi atribuído qualquer direito de voto aos créditos condicionais, tendo o plano sido votado nos seguintes termos:
- BLM – contra;
- Estado – Fazenda Nacional – a favor;
- Instituto da Segurança Social, IP – a favor;
- NB, SA – contra;
- PIE, Lda – a favor;
- UFC, SA – contra.
6 – O acordo de pagamento apresenta o seguinte teor:
“IV. Meio de recuperação proposto
Analisando a situação financeira, constata-se que, nos termos do disposto do artigo 222.º-B do CIRE, os devedores se encontram numa situação económica difícil, sendo evidente a dificuldade séria para cumprir pontualmente as suas obrigações, designadamente por falta de liquidez e por não conseguirem obter crédito. Condição esta, que precipitou os devedores a recorrerem ao Processo Especial para Acordo de Pagamento (PEAP), como meio para obterem a sua recuperação.
Da análise dos dados previsionais depreende-se que, com a execução do plano, os devedores revelam capacidade para o cumprimento das suas obrigações.
Desta forma, os devedores revelam fortes probabilidades de se recuperar, quer em termos económicos, quer em termos financeiros.
Nesse sentido, para a viabilização e recuperação dos devedores são necessárias medidas com incidência no seu passivo, nomeadamente a modificação do passivo de curto prazo para passivo de médio e longo prazo, com a introdução de um plano de pagamentos, discriminado na secção seguinte, a realizar ao longo de um período máximo de 12 anos e meio, para o pagamento dos créditos reconhecidos.
Estas providências visam dotar os devedores da capacidade financeira necessária, para cumprimento do plano de pagamentos proposto.
Releva-se a necessidade de os devedores manterem o equilíbrio financeiro durante a execução do plano de recuperação, condição esta fundamental para o cumprimento do plano de pagamentos.
Plano Pagamentos
- Estado – Fazenda Pública
Pagamento da totalidade da dívida reconhecida do Estado – Fazenda Pública, no âmbito do PEAP, nos seguintes termos:
- Consolidação da dívida, à data da reclamação de créditos deduzida pela AT no processo;
- Taxa anual de juros legalmente aplicável;
- Pagamento da totalidade do valor do crédito reconhecido, nos termos do plano aprovado pelo credor, no âmbito do Processo Especial de Revitalização n.º27898/19.6T8LSB, da sociedade LF, nos termos do artigo 196º do CPPT, não havendo assim qualquer moratória;
- Não se verifica a redução dos créditos, por redução de coimas e custas, nem de juros de mora;
- Manutenção das garantias existentes, nos termos do art.º 199º do CPPT.
- Instituto da Segurança Social, IP
Pagamento da totalidade da dívida reconhecida à Segurança Social, no âmbito do PEAP, nos seguintes termos:
- Consolidação da dívida, à data da reclamação de créditos deduzida pela Segurança Social no processo;
- Taxa anual de juros legalmente aplicável;
- Pagamento da totalidade do valor do crédito reconhecido, nos termos do plano aprovado pelo credor, no âmbito do Processo Especial de Revitalização n.º27898/19.6T8LSB, da sociedade LF, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo de Comércio de Lisboa - Juiz 4, sendo que, em caso de incumprimento do devedor originário, no pagamento de alguma prestação do plano de pagamentos já aprovado, os devedores substituem a LF, procedendo de imediato ao pagamento da prestação em falta, nos termos do artigo 196º do CPPT, não havendo assim qualquer moratória;
- O plano de pagamentos aprovado no PER do devedor originário contempla o pagamento das dívidas ao Instituto da Segurança Social em 150 prestações, tendo iniciado na data de agosto de 2020 e com termo a fevereiro de 2033;
- No capítulo V é demonstrada a capacidade financeira dos devedores para substituírem o devedor originário, LF, no pagamento imediato das prestações em falta;
- As ações executivas pendentes para cobrança de dívidas à Segurança Social, no âmbito das quais será implementado o plano prestacional, não são extintas mantendo-se suspensas após aprovação e homologação do plano de revitalização até integral cumprimento do plano de pagamentos autorizado.
- Manutenção das garantias existentes, nos termos do art.º 199º do CPPT.
- Instituições Financeiras e de Crédito
Pagamento dos créditos com Privilégios Creditórios ou Garantidos, relacionados às instituições de crédito e financeiras, nos seguintes termos:
- Consolidação total do valor em dívida consolidado com os juros vencidos até à data do trânsito em julgado da sentença de homologação do plano;
- Perdão de 25% do valor em dívida consolidado;
- Pagamento de 75% do valor em dívida consolidado, em 174 (cento e setenta e quatro) prestações mensais, vencendo-se a primeira decorridos 24 (vinte e quatro) meses, após a data do trânsito em julgado da sentença de homologação do plano, sendo que:
- o pagamento de 50% deste valor será pago em 149 (cento e quarenta e nove) prestações mensais;
- o pagamento do remanescente será liquidado numa única prestação, na última prestação;
- Sobre o capital em dívida vencer-se-ão juros contados, a partir da data da sentença de homologação do plano, calculados a uma taxa fixa de 1,0%;
- Pagamento dos juros vincendos, em prestações mensais, vencendo-se a primeira 30 (trinta) dias após a data do trânsito em julgado da sentença de homologação do plano.
Pagamento dos créditos Comuns, relacionados às instituições de crédito e financeiras, nos seguintes termos:
- Consolidação total do valor em dívida consolidado com os juros vencidos até à data do trânsito em julgado da sentença de homologação do plano;
- Perdão de 40% do valor em dívida consolidado;
- Pagamento de 60% do valor em dívida consolidado, em 174 (cento e setenta e quatro) prestações mensais, vencendo-se a primeira decorridos 24 (vinte e quatro) meses, após a data do trânsito em julgado da sentença de homologação do plano, sendo que:
- o pagamento de 50% deste valor será pago em 150 (cento e cinquenta) prestações mensais;
- o pagamento do remanescente será liquidado numa única prestação, na última prestação.
- Créditos comuns
Fornecedores, prestadores de serviços, entre outros credores comuns não referidos nos pontos anteriores:
- Consolidação total do valor em dívida consolidado à data do trânsito em julgado da sentença de homologação do plano;
- Perdão de 40% do valor em dívida consolidado;
- Pagamento de 60% do valor em dívida consolidado, em 174 (cento e setenta e quatro) prestações mensais, vencendo-se a primeira decorridos 24 (vinte e quatro) meses, após a data do trânsito em julgado da sentença de homologação do plano, sendo que:
- o pagamento de 50% deste valor será pago em 150 (cento e cinquenta) prestações mensais;
- o pagamento do remanescente será liquidado numa única prestação, na última prestação;
- Perdão dos juros vencidos e vincendos;
- Isenção de custas e outras quantias desta natureza (indemnizações, comissões, despesas, custas, imposto de selo, etc.), relacionadas com créditos, constituídas ou vencidas até à data do depósito do acordo de reestruturação.
- Créditos sob condição
Verificando-se, a condição a que estão sujeitos, serão pagos nos termos previstos nos pontos anteriores, de acordo com a categoria e natureza onde se inserem.

7 -  Do mesmo acordo consta a seguinte situação patrimonial e financeira dos devedores:
“Situação patrimonial
Consultando o Portal da Autoridade Tributária e Aduaneira e a Conservatória de Registo Predial, conclui-se que, os devedores são proprietários dos seguintes bens:
1. Fração autónoma designada pela letra .., sita na Alameda … Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o …;
2. Fração autónoma designada pela letra …, sita na Rua … Torres Vedras, inscrito na matriz predial urbana sob o n.º ..;
3. Prédio rústico, correspondente a terra de cultura, pinhal, pastagem com vinho em cordão, sito na freguesia de …, concelho de Seia, inscrito na respetiva matriz sob o n.º ….;
4. Prédio rústico, correspondente a terra de cultura, pinhal e pastagem com macieiras, pereira e vinha em cordão, sito na freguesia de …, concelho de Seia, inscrito na respetiva matriz sob o n.º …;
5. Prédio rústico, correspondente a terra de mato, sito …, concelho de Seia, inscrito na respetiva matriz sob o n.º …;
6. Prédio rústico designado por …, sito na freguesia de …. Torres Vedras, inscrito na respetiva matriz sob o n.º …;
7. Motociclo com a matrícula …, de marca …, com cilindrada de 124cc.”
“Rendimentos
A devedora é reformada, auferindo uma retribuição mensal de € 5.062,32, recebendo também a título de prestação de serviços, um rendimento bruto anual de € 25.000,00.
O devedor, JA, aufere uma retribuição bruta mensal de € 9.751,61, a título de pensão e um rendimento anual bruto no valor de € 7.000,00, oriundo de um seguro de vida, da Tranquilidade.
Desta forma, estima-se que em 2021 o casal tenha auferido como rendimentos líquidos, o total correspondente a € 152.705,72.”
8 – Do acordo consta ainda:
“V. Análise económico-financeira
Demonstração de Rendimentos e Despesas Previsionais
Considerando o descrito na situação financeira dos devedores estima-se que, em 2021, o casal tenha auferido como rendimentos líquidos, o total de € 152.705,72.
Analisando as declarações de IRS de 2018, 2019, 2020 e 2021, perspetiva-se que os devedores irão manter o seu nível rendimento, prevendo-se um total de rendimentos líquidos, na ordem dos € 152.705,72, para os anos subsequentes.

Quanto ao valor das despesas, determina-se que a quantia correspondente a 2 (dois) salários mínimos nacionais mensais é suficiente para fazer face às despesas e garantir um nível de vida condigno aos devedores. Considerando que, o salário mínimo nacional atual corresponde ao valor de € 705,00, o valor anual das despesas corresponde um total de € 16.920,00.
Os encargos financeiros dos devedores foram calculados em função do plano de pagamentos proposto.
Demonstração da Capacidade Financeira
De forma a comprovar a capacidade financeira dos devedores para o cumprimento integral do plano de pagamentos proposto é apresentado de seguida a previsão da sua capacidade financeiras nos próximos anos.
Da análise da mesma verifica-se que os devedores revelam capacidade financeira para cumprir com o plano de pagamento proposto.
Ressalva-se que, relativamente ao pagamento do crédito da Autoridade Tributária e Aduaneira e do Instituto da Segurança Social, IP, o mesmo só se verificará caso a sociedade LF, Lda, não liquide a prestação prevista no plano de pagamentos, aprovado e homologado por douta sentença já transitada em julgado. Nessa circunstância, os devedores assumem o pagamento da prestação em falta.
Por forma a garantir que os devedores são capazes de garantir o pagamento da prestação em falta, prevê-se um saldo disponível, melhor discriminado na tabela seguinte. Desta forma, pode-se verificar que caso a devedora originária, LF, não cumpra com o plano de pagamentos da Autoridade Tributária e Aduaneira e do Instituto da Segurança Social, IP, os devedores têm capacidade para garantir o pagamento imediato das prestações por liquidar.

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4. Fundamentos do recurso
O processo especial para acordo de pagamento (PEAP) é um dos processos especialíssimos previstos no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (doravante CIRE), introduzido pelo Decreto-Lei n.º 79/2017 de 30 de junho.
Este diploma, concretizando o denominado Programa Capitalizar[1] que elegia como uma das medidas “Reservar o recurso ao PER a pessoas coletivas”[2], criou um novo regime pré-insolvencial para devedores em cuja titularidade não se encontre uma empresa, declarando no seu preâmbulo “Apostou-se na credibilização do processo especial de revitalização (PER) enquanto instrumento de recuperação, reforçou-se a transparência e a credibilização do regime e desenhou-se um PER dirigido às empresas, sem abandonar o formato para as pessoas singulares não titulares de empresa ou comerciantes.”
Ao tempo a jurisprudência divergia sobre a possibilidade de o PER poder ser usado por pessoas singulares, vindo claramente a pender para a respetiva inadmissibilidade, como resulta da jurisprudência do STJ nesta matéria, que decidiu, de forma uniforme, no sentido de inaplicabilidade às pessoas singulares, não comerciantes, não empresários, do processo especial de revitalização[3].
O Decreto-Lei n.º 79/2017 “criou” o novo PEAP por decalque do antigo PER[4] aplicando algumas medidas do PER atual (no essencial a suspensão dos prazos de prescrição e caducidade oponíveis pelo devedor, a proibição de suspensão de prestação de serviços públicos essenciais, o efeito parcialmente suspensivo da sentença do recurso de não homologação e o regime de encerramento e de cessação de funções do administrador judicial provisório), e diferenciando-o pelos respetivos sujeitos – pessoas jurídicas e singulares não titulares de empresas e por uma particularidade relativa aos devedores singulares, em caso de não aprovação, com a obrigatoriedade de concessão de oportunidade para apresentação tempestiva de plano de pagamentos ou requerimento de exoneração do passivo restante.
Tal tem a vantagem, para o intérprete-aplicador, de ter já presentes e, em muitos casos discutidos e trabalhados, os aspetos essenciais deste novo regime, como é, claramente o caso dos pressupostos de homologação do plano de pagamento aprovado, previstos no nº5 do art. 222º-F do CIRE, em termos que eram essencialmente similares, ressalvadas as devidas diferenças, à previsão do art. 17º-F nº 7 do mesmo diploma: depois de prescrever, no nº2 do preceito que qualquer interessado pode solicitar a não homologação do plano, nos termos e para os efeitos previstos nos arts. 215º e 216º, com as devidas adaptações, o nº5 do art. 222º-F prescreve:
«O juiz decide se deve homologar o acordo de pagamento ou recusar a sua homologação (…) aplicando, com as necessárias adaptações, as regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no título IX, em especial o disposto nos artigos 215º e 216º.»
Trata-se de norma não alterada pela Lei nº 9/2022, de 11 de janeiro, que entrou em vigor em 11 de abril deste ano[5], diploma que introduziu profundas alterações no regime do PER, deixando porém, com modificações pontuais, essencialmente incólume o regime do PEAP tal como delineado pela lei nº 79/2017.
A decisão recorrida compõe-se de duas partes distintas: a primeira verificou a aprovação do plano apresentado pelos devedores analisando a questão da modificação dos créditos da Segurança Social e do Estado; e a segunda considerou não ocorrer violação não negligenciável de normas aplicáveis, dado o plano conter a indicação da forma de pagamento, considerando ser questão diversa a de saber se o plano proposto é suficiente para a liquidação de todas as responsabilidades, e julgando não demonstrada a situação menos favorável da credora ora recorrente em cenário de aprovação, em consequência, homologou o acordo de pagamento.
O recurso interposto argumenta que:
- o plano ora apresentado e homologado não prevê qualquer modificação ao plano de pagamentos em vigor no PER da LF, dado que prevê que no caso de incumprimento do PER pela LF, os créditos destas entidades permaneçam sujeitos às mesmas medidas, ou seja, ao mesmo plano de pagamentos, mas agora na esfera dos devedores; entende que o 212º nº1, al. a) do CIRE visa somente obstar a que credores que não vêm a sua situação atual alterada possam interferir no recebimento doa créditos dos demais credores, afetados pelo plano;
- não pode afirmar-se que a modificação dos créditos se verifica no facto de os credores públicos não receberem de imediato o pagamento dos seus créditos, dado que a LF é gerida pelos devedores que procedem mensalmente ao pagamento devido nos termos do PER; aliás a reversão destas dívidas só se efetivaria no caso de incumprimento da LF, sendo o plano aqui aprovado apenas uma segurança adicional para os credores públicos,
- a aprovação do presente acordo ficou dependente do voto favorável de dois credores, cujos créditos estão a ser pagos através de outro plano e cujas condições e montantes se mantiveram inalterados e os demais credores veem os seus créditos reduzidos e apenas começarão a receber findo o período carência de dois anos;
- há assim diferenças de tratamento dadas a cada um dos credores, que acarretam um tratamento excessivo, desproporcionado e irrazoável entre os mesmos;
- os devedores não demonstraram quais os meios de obtenção de rendimentos suficientes para honrarem todos os pagamentos previstos nos autos, sendo necessário quando o devedor propõe um acordo de pagamento das suas dívidas, que o faça de forma transparente e com segurança para os credores de que o plano é viável e fazível com os rendimentos a que tem acesso, o que não sucede, sendo evidente que não dispõem de rendimentos para os pagamentos que propõem: se o PER for incumprido estão em situação de insolvência; se esse cenário for ignorado só foi demonstrada capacidade financeira para 31% do plano (até 2030), o que demonstra a inviabilidade do plano;
- quanto ao disposto no art. 216º nº1, al. a) do CIRE, defende que o entendimento da sentença recorrida não merece acolhimento porque é inequívoco, seja por via da insolvência, seja pelo prosseguimento das execuções, que o seu crédito garantido por hipoteca de 1º grau sempre seria imediatamente pago, ao invés de em mais de 20 anos após uma moratória de 2 anos.
Considera, assim a recorrente, que a decisão recorrida violou o disposto nos arts. 194º, 215º e 216º nº1, al. a) do CIRE e 30º nºs 2 e 3 da LGT.
Importa, pois, conhecer os fundamentos do recurso, verificando, em primeiro lugar se o plano foi aprovado, e pela ordem por que estão previstos na lei, os motivos de recusa de homologação: violação não negligenciável de normas procedimentais, violação não negligenciável de normas aplicáveis ao conteúdo do acordo, e previsibilidade, para o credor recorrente, de que a sua situação ao abrigo do plano é previsivelmente menos favorável do que a que interviria na ausência de qualquer plano, nos termos dos arts. 222º-F, nº5, 215º, 194º, 195º e 216º do CIRE.
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4.1. Violação não negligenciável de normas procedimentais
A determinação do que seja uma violação não negligenciável tem sido trabalhada desde a entrada em vigor do CIRE, constituindo mais um dos conceitos indeterminados cujo preenchimento cabe ao julgador, face aos dados concretos, seguindo certos parâmetros ou linhas orientadoras.
Como escreve Menezes Cordeiro in Manual de Direito de Trabalho, pg. 819, a propósito do conceito de justa causa de despedimento, “os conceitos indeterminados põem em crise o método da subsunção: a sua aplicação nunca pode ser automática, antes requerendo decisões dinâmicas e criativas que facultem o seu preenchimento com valorações. A concretização de um conceito indeterminado como o de justa causa obriga a uma ponderação dos valores vocacionados para intervir, perante o caso concreto.”
Continuando a citar o mesmo autor, este tipo de regulamentação remete o intérprete-aplicador para casuísmos os quais, devidamente ordenados, permitem repensar a fórmula indeterminada inicial. E conclui que “os conceitos indeterminados viabilizam fórmulas concretizadoras que, depois, devem ser confrontadas com o próprio conceito básico.”
Violação não negligenciável será “apenas aquela que importe uma lesão grave de valores ou interesses juridicamente tutelados, isto é, uma lesão de tal modo grave que nem em atenção ao princípio da recuperação e aos interesses associados a este, o juiz pode deixar de recusar-se a homologar o plano, inviabilizando com isso a recuperação. Está implícito na norma o dever de o juiz proceder a uma ponderação entre o interesse da recuperação e os interesses que sejam, em concreto, visados pela norma violada com vista a decidir se, em homenagem ao primeiro a violação pode ser negligenciada.”[6]
Carvalho Fernandes e João Labareda apontam como critérios de aferição de negligenciabilidade, sempre em concreto, numa primeira linha, a distinção entre as violações que atinjam apenas regras de tutela particular, que podem ser afastadas com o consentimento do titular da proteção e as que acarretem a produção de um resultado não autorizado por lei[7] e, de forma mais vasta, acolhendo o critério geral previsto no art. 195º do CPC, isto é, a relevância da nulidade para a boa decisão da causa, “o que significa se interfere ou não com a justa salvaguarda dos interesses protegidos ou a proteger – nomeadamente no que respeita à tutela devida à posição dos credores e do devedor nos diversos domínios em que se manifesta…”, posição que merece anotação concordante de Nuno Salazar Casanova e David Sequeira Dinis[8], frisando tratar-se sempre de uma decisão casuística.
Trata-se de posição maioritariamente acolhida na jurisprudência[9] como resulta, em amostra aleatória, dos Acs. TRP de 16/12/2015 (Inês Moura), TRP de 08/07/2015 (Manuel Domingos Fernandes), TRC de 11/10/2017 (Maria Catarina Gonçalves), TRC de 27/06/17 (Isaías Pádua), TRC de 16/03/2016 (Maria Domingas Simões), TRG de 25/05/17 (Fernando Fernandes Freitas) e TRL de 03/12/2020 (Paula Cardoso).
No caso, sendo arguida a violação de regras procedimentais, importa igualmente esclarecer o âmbito destas normas. O PEAP, tal como o PER, é um processo hibrido, decorrendo parte em tribunal, o qual intervém em momentos chave (na admissão, na decisão da impugnação da lista de créditos, na homologação do plano aprovado ou sua recusa) e parte entre o devedor e os seus credores, com a coordenação do administrador judicial provisório. Os vícios de procedimento tanto podem referir-se ao processo judicial – onde poderão inclusive cair sob a alçada das regras processuais civis, aplicáveis por via do disposto nos arts. 222º-A nº3 e 17º nº1 do CIRE – como ao processo negocial. Enquanto que os primeiros serão tratados no processo judicial nos termos “clássicos”, de arguição, contraditório e decisão, os segundos relevam apenas no momento do juízo de homologação, dado que todo o processo negocial decorreu extrajudicialmente.
“Muito embora a lei não o defina, deve entender-se que as “regras procedimentais” são aquelas que visam regular a forma como deverá desenrolar-se o processo, enquanto que as segundas (as normas de conteúdo) se reportarão ao dispositivo do plano de revitalização, bem como aos princípios que lhe devam estar subjacentes. Ou seja, as primeiras são todas aquelas que regem a atuação a desenvolver no processo, que incluem os passos procedimentais que nele devem ser dados até que os credores decidam sobre as propostas que lhes foram apresentadas – incluindo, assim, as regras que disciplinam as negociações a encetar entre os credores e o devedor e as regras que regulam a aprovação e votação do plano – e, bem assim, as relativas ao modo como o plano deve ser elaborado e apresentado, enquanto que as segundas (as normas de conteúdo) serão todas as respeitantes à parte dispositiva do plano, mas além delas, ainda aquelas que fixam os princípios a que ele deve obedecer imperativamente.”[10]
No caso concreto, as regras procedimentais em causa são as regras que regem a aprovação do plano, especificamente as regras que regem os quóruns deliberativos e constitutivos e que regulam o direito de voto.
Estabelecem os nºs 3 a 5 do art. 222º-F do CIRE:
«3 - Sem prejuízo de o juiz poder computar no cálculo das maiorias os créditos que tenham sido impugnados se entender que há probabilidade séria de estes serem reconhecidos, considera-se aprovado o acordo de pagamento que:
a) Sendo votado por credores cujos créditos representem, pelo menos, um terço do total dos créditos relacionados com direito de voto, contidos na lista de créditos a que se referem os n.os 3 e 4 do artigo 222.º-D, não se considerando as abstenções, recolha cumulativamente:
i) O voto favorável de mais de dois terços da totalidade dos votos emitidos;
ii) O voto favorável de mais de 50 /prct. dos votos emitidos correspondentes a créditos não subordinados relacionados com direito de voto contidos na lista de créditos a que se referem os n.os 3 e 4 do artigo 222.º-D; ou
b) Recolha cumulativamente, não se considerando as abstenções:
i) O voto favorável de credores cujos créditos representem mais de 50 /prct. da totalidade dos créditos relacionados com direito de voto, contidos na lista de créditos a que se referem os n.os 3 e 4 do artigo 222.º-D;
ii) O voto favorável de mais de 50 /prct. dos votos emitidos correspondentes a créditos não subordinados relacionados com direito de voto contidos na lista de créditos a que se referem os n.os 3 e 4 do artigo 222.º-D.
4 - A votação efetua-se por escrito, aplicando-se-lhe o disposto no artigo 211.º com as necessárias adaptações e sendo os votos remetidos ao administrador judicial provisório, que os abre em conjunto com o devedor e elabora um documento com o resultado da votação, que remete de imediato ao tribunal.
5 - O juiz decide se deve homologar o acordo de pagamento ou recusar a sua homologação, nos 10 dias seguintes à receção da documentação mencionada nos números anteriores, aplicando, com as necessárias adaptações, as regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no título IX, em especial o disposto nos artigos 215.º e 216.º»
Uma das regras apontadas como aplicável é a regra do art. 212º nº2, al. a) do CIRE, onde se prevê que, em matéria de aprovação de plano de insolvência não conferem direitos de voto Os créditos que não sejam modificados pela parte dispositiva do plano.
A jurisprudência tem sido unânime no sentido da aplicação desta regra ao PEAP, tal como essencialmente já o era em relação ao PER[11], e em essência, com os mesmos argumentos: o facto de o art. 212º não constar da enumeração expressa do nº5, não o exclui, dada a remissão genérica para as normas do Título IX e a menção expressa aos créditos “com direito de voto”, sendo as razões de ser da aplicabilidade válidas – pretende-se evitar que o plano seja imposto aos credores afetados por aqueles que o não são. Neste sentido entre muitos outros, os Acs. STJ de 09/03/2021 (Henrique Araújo)[12], TRP de 08/02/2022 (João Ramos Lopes), de 13/01/2022 (Ana Vieira) e também de 13/01/2022 (Paulo Duarte Teixeira), 15/12/2021 (Eugénia Cunha), de 25/01/2021 (Fernanda Almeida), de 03/12/2020 (Freitas Vieira), TRL de 11/10/2018 (Maria de Deus Correia) e de 07/06/2018 (Pedro Martins), TRC de 18/05/2020 e de 19/12/2018 (Barateiro Martins), de 22/01/2019 (Arlindo Oliveira), TRG de 17/03/2022 (José Alberto Moreira Dias), de 24/05/2018 (Alexandra Rolim Mendes), TRE de 12/07/2018 (Vítor Sequinho), de 07/06/2018 (Francisco Xavier) e de 24/05/2018 (Tomé de Carvalho).
 Carvalho Fernandes e João Labareda, em anotação ao art. 212º, ponderando a regra do nº1 do art. 91º do CIRE[13] respondiam à questão de qual o sentido da norma nos seguintes termos: “o sentido do texto só pode ser o de haver como afectados apenas os créditos que se proponha venham a ser considerados em termos distintos daqueles que revestiam à data da declaração de insolvência, seja pelo montante, condições de pagamento, garantias ou outros aspectos.”
A jurisprudência cedo identificou como não modificados, para este efeito, créditos que sofriam pequenas alterações como forma de tornear a regra e assim defraudar a lei[14]. Trata-se, com clareza, estritamente de evitar fraude à lei, sendo a regra a supra enunciada: têm direito a voto todos os créditos alterados pela parte dispositiva do plano.
A jurisprudência tem também identificado esta questão como integrando violação procedimental não negligenciável, atribuindo ao conjunto de normas que fixam quóruns constitutivos e deliberativos indispensáveis para que uma deliberação se considere aprovada, incluindo as regras relativas à votação e à definição de direitos de voto, o caráter de ‘normas procedimentais cuja violação não será negligenciável’[15].
No caso concreto, foram reconhecidos no procedimento créditos comuns e incondicionais do Estado e da Segurança Social sobre os devedores (não impugnados) resultantes de reversão de dívidas de sociedade de que o devedor marido é gerente (e de que a devedora já foi igualmente gerente), a LF, Lda, sociedade que já viu um plano de recuperação aprovado em PER.
Em síntese, nos presentes autos, as condições de pagamento destes créditos foram as seguintes:
- pagamento da totalidade da dívida reconhecida, quer ao Estado, quer à Segurança Social nos termos do plano aprovado no âmbito do Processo Especial de Revitalização n.º27898/19.6T8LSB, da sociedade LF, nos termos do artigo 196º do CPPT;
- em caso de incumprimento do devedor principal, no pagamento de alguma prestação do plano de pagamentos já aprovado, os devedores substituem a LF, procedendo de imediato ao pagamento da prestação em falta, nos termos do artigo 196º do CPPT, não havendo assim qualquer moratória;
- As ações executivas pendentes não se extinguem, mantendo-se suspensas após aprovação e homologação do plano de revitalização até integral cumprimento do plano de pagamentos autorizado;
- Manutenção das garantias existentes, nos termos do art.º 199º do CPPT.
Atenta a letra do preceito, temos por certo que a interpretação proposta pela credora recorrente não é de acolher. As modificações relevantes são as modificações operadas nos créditos sobre os devedores comparando a situação antes e depois do acordo.
Não se podendo eleger o momento da declaração da insolvência como critério temporal para a comparação – e inexistindo, quer em PER, quer em PEAP, um momento processualmente equivalente à declaração de insolvência – a aplicação do preceito exige este esforço interpretativo: para saber se um crédito sofreu uma alteração nos termos do plano, analisam-se as diferenças entre as condições deste e as preexistentes ao acordo.
No caso estamos ante créditos não contratuais, tratando-se de créditos tributários, pelo que a comparação a fazer é de quanto deviam e como deviam pagar os devedores antes da aprovação deste plano e depois.
O facto de este plano de pagamentos não fazer qualquer alteração às condições de pagamento dos mesmos créditos constantes do plano de recuperação da devedora originária do crédito, a sociedade LF, no respetivo processo especial de revitalização não releva como critério para aferir a modificação, nem mesmo sendo um dos devedores o respetivo gerente. Não se comparam as condições de pagamento de um crédito tributário de um devedor com as condições de pagamento de outro devedor para saber se determinado plano alterou esse crédito.
O art. 212º nº2, al. a) do CIRE, quando regula os créditos que não conferem direito de voto, refere-se exclusivamente aos créditos sobre a insolvência, nos termos do art. 194º nº1 do CIRE[16]. Aliás, os titulares do direito de voto são apenas os credores da insolvência – cfr. arts. 72º e 73º do CIRE.
Credores da insolvência são «todos os titulares de créditos de natureza patrimonial sobre o insolvente, ou garantidos por bens integrantes da massa insolvente, cujo fundamento seja anterior à data dessa declaração.» (sublinhado nosso) cfr. art. 47º nº1 do CIRE.
Assim, a comparação a fazer será sempre entre as condições do mesmo crédito, sobre o mesmo devedor.
Não se pode postergar por completo a letra da lei com fundamento na não modificação de créditos entre devedores diferentes, tomando como perspetiva apenas a situação do credor e relevando apenas que irá receber o seu crédito, obliterando que, em relação a estes devedores, pessoas singulares, os créditos sofrem modificações.
Face à circunstância de os créditos públicos aqui reconhecidos terem como génese responsabilidade tributária, teremos que analisar se tal altera os dados da questão.
A responsabilidade tributária encontra-se genericamente prevista no art. 22º da LGT e, respeitando a dívidas de outrem, é sempre subsidiária.
Estamos ante créditos por reversão, nos termos do disposto no art. 24º da Lei Geral Tributária, onde, sob a epígrafe “Responsabilidade dos membros de corpos sociais e responsáveis técnicos”, se estabelece.
« 1 - Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.
(…).»
Como refere Vânia Patrícia Magalhães[17] a responsabilidade tributária surge quando o devedor principal do imposto não cumpriu a respetiva obrigação “e por essa razão vão ser chamados a responder terceiros que, uma vez verificados os respectivos pressupostos, se transformam em sujeitos passivos, nos termos do art. 18.º da LGT.”
Sendo responsabilidade subsidiária, tal justifica que, neste plano de pagamentos, em respeito por essa subsidiariedade, apenas se preveja o pagamento destes créditos caso a devedora principal, a empresa, não cumpra o plano prestacional acordado.
Posto isto, sabemos que os aqui devedores são já sujeitos passivos desta relação tributária – só tendo já ocorrido reversão podem correr contra eles execuções fiscais, como referido no ponto 1 da matéria de facto provada e poderiam os credores públicos aqui ter reclamado créditos comuns e incondicionais.
Mais uma vez citando Vânia Patrícia Magalhães “Indiscutível é que só quando é instaurado um processo de execução contra a sociedade, sujeito passivo da relação jurídica tributária, é que poderá instaurar-se um processo de execução fiscal contra o devedor subsidiário, e só nessa medida é que o responsável subsidiário poderá vir a responder tributariamente, como resulta do n.º 1 do art. 23.º da LGT: “a responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal”.
Tal, por sua vez, implica que, nos termos do nº2 do art. 23º da LGT, havia já sido constatada a «fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal».
O plano aprovado em PER da LF permitiu o pagamento pela devedora principal nos termos do art. 196º do CIRE.
No entanto, tal plano nada regulou quanto à responsabilidade subsidiária dos aqui devedores, já estabelecida por reversão, nem o podia fazer, já que o PER apenas respeitava à empresa.
Neste ponto temos que fazer uma nota dando conta de que o que aqui apreciamos se afasta da questão da oportunidade da reversão fiscal antes da penhora e venda de todos os bens do devedor principal – o tema do artigo de Vânia Patrícia Magalhães que vimos citando, que a jurisprudência tem vindo a decidir como possível[18]. A reversão foi já efetuada e não compete a este tribunal verificar a respetiva legalidade (nem tal lhe foi pedido).
No caso que nos ocupa, se o devedor principal incumprir o respetivo plano, os devedores destes autos terão que proceder ao respetivo pagamento, sob pena de prosseguimento das execuções. O que este plano modifica aos créditos em causa é que, nesse circunstancialismo, o pagamento será em prestações, nos mesmos termos já acordados com o devedor principal.
Se este plano não contivesse as cláusulas acimas transcritas quanto aos credores públicos, os créditos tributários da LF seriam devidos de imediato e por inteiro pelos aqui devedores (o que certamente perturbaria o pagamento dos demais créditos e frustraria o fito do PEAP – evitar a insolvência dos devedores).
A consagração da não exigibilidade daqueles créditos enquanto a devedora principal estiver a cumprir é consequência direta da natureza subsidiária desta responsabilidade tributária, não relevando, por esse exato motivo, como “não modificação” dos créditos.
Concluímos, assim, que os credores em causa, cujos créditos foram modificados pela parte dispositiva do plano por tal forma que, em caso de incumprimento do devedor principal, não poderão exigir de imediato o respetivo pagamento integral aos aqui devedores, têm direito de voto à luz da regra da alínea a) do nº2 do art. 212º do CIRE, não se verificando, na consideração deste plano como aprovado, qualquer violação procedimental.
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4.1.2. Demonstração dos meios de obtenção dos rendimentos necessários ao cumprimento do plano proposto
Nos termos do art. 195º do CIRE, aplicável  ex vi art. 222º-F nº5 do mesmo diploma, com as devidas adaptações, atento o disposto no nº3 do art. 222º-A, sempre do CIRE[19]:
«1 - O plano de insolvência deve indicar claramente as alterações dele decorrentes para as posições jurídicas dos credores da insolvência.
2 - O plano de insolvência deve indicar a sua finalidade, descreve as medidas necessárias à sua execução, já realizadas ou ainda a executar, e contém todos os elementos relevantes para efeitos da sua aprovação pelos credores e homologação pelo juiz, nomeadamente:
a) A descrição da situação patrimonial, financeira e reditícia do devedor;
b) A indicação sobre se os meios de satisfação dos credores serão obtidos através de liquidação da massa insolvente, de recuperação do titular da empresa ou da transmissão da empresa a outra entidade;
c) No caso de se prever a manutenção em actividade da empresa, na titularidade do devedor ou de terceiro, e pagamentos aos credores à custa dos respectivos rendimentos, plano de investimentos, conta de exploração previsional e demonstração previsional de fluxos de caixa pelo período de ocorrência daqueles pagamentos, e balanço pró-forma, em que os elementos do activo e do passivo, tal como resultantes da homologação do plano de insolvência, são inscritos pelos respectivos valores;
d) O impacte expectável das alterações propostas, por comparação com a situação que se verificaria na ausência de qualquer plano de insolvência;
e) A indicação dos preceitos legais derrogados e do âmbito dessa derrogação.»
A recorrente aponta que os devedores não demonstraram quais os meios de obtenção dos rendimentos suficientes para honrarem todos os pagamentos propostos, argumentando que quando um devedor propõe um acordo de pagamento das suas dívidas tem que o fazer de forma transparente dando aos credores a segurança de que o plano é viável e fazível com os rendimentos a que tem acesso.
No caso, alega, no cenário no qual o PER da LF é incumprido, os devedores terão que pagar anualmente € 600.000,00, tendo rendimentos anuais de cerca de 150.000,00 euros, sendo que os ativos indicados ascendem a € 976.763,99 e as dívidas a € 4.639.364,37. Ignorando-se o cenário de incumprimento da LF a proposta dos devedores, entre 2021 e 2030, corresponde a 31% do plano, tendo os restantes anos sido deixados numa única coluna, faltando então liquidar € 1.959.828,00. Projetando, o plano será pago em 222 prestações mensais e não 174, demorando a ser pago mais 6 anos que o prazo indicado. Se adicionarmos os juros, previstos, o plano demorará 22 anos a ser pago.
Assim a capacidade financeira dos devedores não é suficiente para fazer face ao plano proposto o que consubstancia violação não negligenciável de norma imperativa aplicável ao conteúdo do plano.
O Ministério Público respondeu que o acordo de pagamento contém a indicação da forma de pagamento (pois prevê o número de prestações); indica quais os rendimentos dos devedores atuais e previsíveis e qual a parcela afeta aos pagamentos, e indica qual o património dos devedores, pelo que inexiste falta de indicação de como serão obtidos os rendimentos necessários para liquidar todas as prestações propostas nem se vislumbram violações de qualquer norma imperativa que acarrete a produção de um resultado que a lei não autoriza, mas antes se enquadra no âmbito da autonomia privada.
Os recorridos contra-alegaram que o plano contém todos os elementos necessários, designadamente a indicação de que os rendimentos para a satisfação dos credores serão os rendimentos de trabalho e pensões de reforma auferidos pelos devedores, sendo a inviabilidade do acordo proposto uma questão de conteúdo, a avaliar e ponderar pelos credores para o efeito de darem ou não a sua adesão ao plano proposto, não cabendo ao juiz avaliar a credibilidade e a viabilidade do plano apresentado.
Apreciando, dir-se-á que, de forma muito clara, as alíneas a), b) e c) do nº2 do art. 194º, com as adaptações devidas para o facto de estarmos ante devedores singulares e não de empresas[20] foram, no essencial, cumpridas.
Importa recortar alguns conceitos: os elementos do art. 195º que excedem a finalidade e descrição das medidas são elementos relevantes para efeitos da sua aprovação pelos credores, sendo assim, e apesar da epígrafe do preceito, elementos que devem acompanhar o mesmo. A sua falta gerará, não violação de regras aplicáveis ao conteúdo do plano, mas antes uma violação de regras procedimentais[21].
É essa também, claramente a visão do tribunal recorrido, que, ao conhecer desta questão, declarou que a falta de indicação de como serão obtidos os rendimentos necessários para liquidar todas as prestações propostas consubstanciaria uma violação procedimental e que considerou que inexistia falta de indicação e que saber se o plano de pagamentos proposto é suficiente para a liquidação de todas as responsabilidades já é uma questão de conteúdo e não de observância das regras procedimentais.
Discordamos, assim, do douto Ac. TRC de 10/12/2020[22] (Maria João Areias), exclusivamente quanto à qualificação da falta de indicação de obtenção dos rendimentos para cumprimento do proposto como violação de norma relativa ao conteúdo do plano, pese embora nos pareça que o caso ali tratado era mais de inexequibilidade do plano, pura e simples (e essa é uma violação relativa ao conteúdo do plano), dado que, diferentemente do caso que nos ocupa, ali os devedores propunham-se pagar mensalmente um valor muito superior aos rendimentos que descreviam.
Não é o caso aqui. Como referido pelo tribunal recorrido, o plano contém a descrição dos rendimentos e do ativo dos devedores e o plano proposto contempla, até 2030, o pagamento de prestações inferiores aos rendimentos expetáveis, tendo mesmo sido analisado o cenário de incumprimento pela LF e o pagamento das prestações devidas por aquela a efetuar pelos devedores.
Exatamente como se escreveu na sentença recorrida:
“Atento o enquadramento antecedente, também aqui entendemos que não assiste razão à credora na medida em que na parte V do plano de pagamento – Análise económica-financeira – se refere “Analisando as declarações de IRS de 2018, 2019, 2020 e 2021, perspetiva-se que os devedores irão manter o seu nível rendimento, prevendo-se um total de rendimentos líquidos, na ordem dos €152.705,72, para os anos subsequentes.”
Portanto, o plano contém a indicação da forma de pagamento, pois prevê o número de prestações, indica quais os rendimentos dos devedores actuais e previsíveis e qual a parcela afecta aos pagamentos e ainda indica qual o património dos devedores.
Logo, não se vislumbra a falta de indicação de como serão obtidos os rendimentos necessários para liquidar todas as prestações propostas.
Questão diversa é a de saber se o plano de pagamentos proposto é suficiente para a liquidação de todas as responsabilidades, mas esta é uma questão de conteúdo e já não de observância de regras procedimentais.
E ainda que o referido art. 215º também habilite o juiz a recusar a homologação caso se verifique a violação não negligenciável de normas aplicáveis ao conteúdo do plano, como decorre do que antes se deixou expresso, a questão apontada pela credora requerente não envolve a violações de qualquer norma imperativa que acarrete a produção de um resultado que a lei não autoriza, mas antes se enquadra no âmbito da autonomia privada.”
É certo que o plano apresentado apenas contempla o pagamento até 2030, mas o plano prevê as prestações subsequentes e o seu número – para a recorrente 174 prestações, sendo as primeiras 24 apenas de juros, as seguintes 149 de 50% do capital e a última do remanescente. Tendo em conta que há dívidas de montantes muito diversos e que se prevê que os rendimentos se mantenham estáveis, à medida que alguns dos créditos sejam pagos o esforço dos devedores centra-se nas demais, pelo que os cálculos não podem ser efetuados com a linearidade exposta nas alegações.
A forma de obtenção dos rendimentos dos devedores – cerca de € 150.000,00 por ano, suficientes para o pagamento das prestações previstas – está documentada pela junção do IRS dos últimos três anos, que permite concluir pela estabilidade dos rendimentos.
É a própria recorrente que alega que o plano proposto tem que o ser de forma transparente para que os credores alcancem que o plano é viável e fazível. Ou seja, não se trata exatamente do conteúdo do plano proposto mas sim da demonstração da respetiva viabilidade.
Essa é matéria que, excluída inexequibilidade pura e simples, não compete ao tribunal sindicar. A viabilidade e a aptidão do plano para evitar a situação de insolvência dos devedores, em PEAP (única finalidade possível, dada a natureza dos devedores, pessoas físicas) são a ponderar pelos credores para saber se votam favorável ou desfavoravelmente o plano.
Tal está ainda mais claro desde que o legislador incluiu o juízo de mérito do plano de recuperação na avaliação a efetuar pelo juiz, na sequência da transposição da Diretiva 2019/1023, do Parlamento Europeu e do Conselho, apenas em PER.
A introdução da nova regra do art. 17º-F, al. g) do CIRE[23] deixou muito claro que a apreciação de se o plano apresenta perspetivas razoáveis de evitar a insolvência da empresa (perspetiva financeira) ou de garantir a viabilidade da mesma (perspetiva económica) é um novo juízo que não estava – e continua a não estar – compreendido na ponderação exigida pelo art. 215º do CIRE.
Como se disse já a propósito do tema[24]: “Este juízo de mérito é um juízo direto sobre a potencialidade do plano enquanto instrumento de recuperação – se o plano tem a capacidade de evitar a insolvência ou se garante a viabilidade da empresa (controlo técnico e económico). Note-se que, pese embora o uso da disjuntiva “ou”, ambos os aspetos têm necessariamente que ser avaliados.
No direito português (e não só) este juízo sempre foi cometido aos credores, desde que há instrumentos legais de recuperação. No nosso direito atual a lei comete ao juiz uma larga franja de recusa oficiosa de homologação (cfr. art. 215.º do CIRE) mas que não passa por um juízo técnico deste tipo, exceto quando atinja a inexequibilidade pura e notória.
Mesmo que os juízes sejam devidamente assessorados nesta tarefa, no fim do dia será sempre uma decisão do juiz, o mesmo juiz que no direito societário está limitado pela business judgement rule, por não ser considerado a pessoa mais bem colocada para avaliar decisões (passadas) de gestão. E que agora recebe o encargo de avaliar, rigorosamente, o futuro.”
No mesmo sentido – de que no regime do CIRE anterior não se previa esta análise de viabilidade – se pronunciou Catarina Serra[25], analisando o regime do Processo Especial de Viabilização de Empresas (PEVE), introduzido pela Lei nº 75/2020 de 27/11 e referindo que[26] “Esta é a primeira vez que a lei portuguesa dá ao tribunal o poder/dever de verificar a viabilidade do plano.”
Ora se assim era para o PER, dada a opção do legislador de não introduzir regra similar no regime do PEAP, assim continua a ser para o PEAP, no qual, à parte a inexequibilidade pura e notória, o juiz não controlava e não controla o mérito do plano.
Assim, estando cumpridas as regras procedimentais e não sendo a viabilidade e fazibilidade do plano um dos requisitos da sua aprovação, improcedem as conclusões da recorrente neste particular, sendo de manter a decisão sob recurso.
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4.2. Violação de normas imperativas aplicáveis ao conteúdo do plano
4.2.1. Violação do princípio da igualdade
Uma das regras aplicável nos termos do disposto no nº5 do art. 222º-F do CIRE é o disposto no art. 194º do mesmo diploma, no qual se estabelece:
«1 - O plano de insolvência obedece ao princípio da igualdade dos credores da insolvência, sem prejuízo das diferenciações justificadas por razões objectivas.
2 - O tratamento mais desfavorável relativamente a outros credores em idêntica situação depende do consentimento do credor afectado, o qual se considera tacitamente prestado no caso de voto favorável.
3 - É nulo qualquer acordo em que o administrador da insolvência, o devedor ou outrem confira vantagens a um credor não incluídas no plano de insolvência em contrapartida de determinado comportamento no âmbito do processo de insolvência, nomeadamente quanto ao exercício do direito de voto.»
O princípio da igualdade arranca do tratamento, por princípio, de todos os credores por igual, permitindo, porém, diferenciações justificadas por razões objetivas.
Esta dimensão material do princípio – devem ser tratadas por igual situações iguais e de forma distinta, situações distintas -, corporiza uma das mais importantes e convocadas regras aplicáveis ao conteúdo do plano ou do acordo, e tem sido tratado pela jurisprudência como uma regra imperativa, que arranca diretamente do tecido constitucional, cuja violação é, por regra, não negligenciável[27].
Perpassa quer na jurisprudência do Supremo, quer das Relações, que, exceção feita aos créditos tributários, as razões objetivas diferenciadoras têm que constar do plano. Será essa a única forma de controlo do cumprimento do princípio.
São em geral aceites noções como credores estratégicos (não no sentido das necessidades de aprovação, mas das necessidades dos devedores), como por exemplo no Ac. TRC de 17/03/15; e, em geral, a diferenciação baseada na diferente classificação de créditos é permitida (Ac. TRE de 17/03/16 e de 10/09/15; Ac. TRP de 07/04/16; Ac. TRL de 28/01/16); ainda assim, quando baseadas na diferente classificação de créditos, a jurisprudência não tem deixado de censurar excessos: como no caso do Ac. TRE de 21/04/16, no qual todos os créditos eram perdoados à exceção do credor hipotecário, ou no caso do Ac. TRG de 25/02/16, em cujo plano o credor hipotecário recebia integralmente o seu crédito, enquanto os demais se viam reduzidos a 15%, apontando-se que a revitalização estava a ser integralmente suportada por estes últimos credores.
No caso dos autos, a diferenciação apontada como excessiva e desproporcionada é a provisão no acordo de pagamento de 100% do crédito devido à Autoridade Tributária e à Segurança Social e o pagamento aos demais credores que, como verificamos do plano têm um tratamento diferenciado em relação àqueles, dado que os credores garantidos vêm a dívida consolidada e é aplicado um perdão de 25% e nos comuns a dívida é consolidada e são perdoados 40% da mesma.
Nada mais é adiantado senão que existe uma diferença de tratamento excessiva, desproporcionada e irrazoável, com citações de doutrina e jurisprudência.
Trata-se de matéria que não foi conhecida na decisão recorrida, dado que ali nada foi arguido neste sentido, também o tribunal a quo não tendo, oficiosamente, considerado a existência de violação do princípio da igualdade.
Há um ponto que temos que frisar. Os créditos tributários são créditos comuns, no que toca aos aqui devedores – e como tal foram reclamados e listados – mas são ainda créditos tributários, cuja especial natureza não depende do carater garantido, privilegiado ou comum. Os devedores são responsáveis subsidiários, mas a sua responsabilidade, como já vimos, é tributária e eles são já sujeitos passivos nesta relação com o Estado.
Nos termos do art. 30º nº2 da LGT o crédito tributário é indisponível só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e legalidade tributária.
A Lei nº 55-A/2010 de 31/12 aditou a este preceito um nº3 estabelecendo que o disposto no nº2 prevalece sobre qualquer legislação especial, em clara tomada de posição quanto à jurisprudência uniforme que se havia formado desde a entrada em vigor do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Temos, assim, uma regra clara no sentido da indisponibilidade do crédito tributário e como únicas exceções a esta regra os princípios da igualdade e legalidade tributária.
O facto de os créditos tributários serem a única exceção identificada pela jurisprudência à necessidade de fazer constar do plano ou do acordo as razões objetivas que justificam um tratamento diferenciado, não tem impedido a discussão destes créditos à luz do princípio da igualdade, que, como princípio fundamental que é, se aplica a todos os créditos, públicos e privados.
É assim que encontramos, precisamente à luz do princípio da igualdade, no Ac. STJ de 25/03/14 (relator Fonseca Ramos)[28] uma extensa análise do diferente tratamento dado aos créditos tributários à luz do princípio da igualdade, na vertente do princípio da proporcionalidade e da adequada ponderação de interesses, tendo por referência o tratamento dado, no mesmo plano, a créditos laborais. Foi considerado que os créditos tributários visam a implementação de um sistema previdencial, situando-se num patamar diferente, supra individual, o que objetivamente justifica a diferença de tratamento.
De facto, o princípio da igualdade não está arredado na análise comparativa entre o tratamento dado aos créditos tributários e o tratamento dado aos demais créditos. É ainda o princípio da igualdade que explica o regime dos créditos tributários, concorde-se ou não com a extensão da tutela. Mas a análise do excesso ou desproporção é comparativa e engloba o tratamento dado a estes créditos e aos demais.
Dado o regime legal aplicável, a previsão do pagamento de 100% dos créditos tributários não é, por si revelador de excesso ou desproporção, havendo, porém, que comparar o nível de pagamento dos demais credores (em relação aos quais a lei não consagra a indisponibilidade) e verificar se há, na necessária diferença violação do princípio da igualdade.  
A diferente natureza dos créditos justifica o tratamento dado aos créditos tributários, cabendo apenas perguntar se justifica o tratamento dado aos demais créditos.
E neste caso concreto a desproporção entre um cumprimento de 100%, em prestações, de forma subsidiária e o pagamento de 75% da dívida consolidada, incluindo juros, para os créditos garantidos e de 60% da dívida consolidada para os demais créditos comuns não nos parece uma desproporção merecedora de censura.
Os casos tratados pela jurisprudência retratam casos em que a distância ronda mais uma diferença de 80 a 90 %, ou em que créditos não tributários comuns são tratados em pé de igualdade com créditos não subordinados – cfr. o caso citado nas alegações, tratado no Ac. TRC de 12/10/2021 (Arlindo Oliveira), de contornos nada similares ao presente.
No caso presente, na impossibilidade de perdão nos créditos tributários – não permitido por lei, nos termos já explicitados – é de evidência a constatação de que terá que haver perdão por parte dos demais credores. Nota-se desde logo como positiva a consolidação da dívida (no sentido de que não se prevê um perdão total de juros vencidos) e o perdão incidindo sobre esse total, bem como a previsão de juros vincendos para os créditos garantidos.
O pagamento em percentagem superior aos credores garantidos surge justificado pela diferente classificação dos créditos e não se trata de uma disparidade de tal forma grande entre as percentagens previstas de satisfação dos créditos que permita concluir por uma manifesta desproporção não justificada pela diferente natureza (tributária) dos créditos mais favoravelmente tratados.
Não surpreendemos, assim, qualquer violação não negligenciável do disposto no art. 194º do CIRE que justifique a não homologação da proposta de acordo de pagamento, nos termos dos arts. 215º e 222º-F nº5 do mesmo diploma.
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4.3. Não homologação a solicitação dos interessados, ao abrigo do disposto no art. 216º, nº1, al. a) do CIRE
Passemos à análise de se a situação do credor que requereu a não homologação com este fundamento ao abrigo deste plano é previsivelmente menos favorável do que a que teria na ausência de qualquer plano.
Estabelece o art. 216º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, na versão aplicável aos autos:
«1. O juiz recusa ainda a homologação se tal lhe for solicitado pelo devedor, caso este não seja o proponente e tiver manifestado nos autos a sua oposição, anteriormente à aprovação do plano de insolvência, ou por algum credor ou sócio, associado ou membro do devedor cuja oposição lhe haja sido comunicada nos mesmos termos, contanto que o requerente demonstre, em termos plausíveis, em alternativa que:
a) A sua situação ao abrigo do plano é previsivelmente menos favorável do que a que interviria na ausência de qualquer plano, designadamente face à situação resultante de acordo já celebrado em procedimento extrajudicial de regularização de dívidas;
b) O plano proporciona a algum credor um valor económico superior ao montante nominal dos seus créditos sobre a insolvência, acrescido do valor das eventuais contribuições que ele deva prestar.
(…).»
Como escrevem João Labareda e Carvalho Fernandes[29]  “O modo como se acha formulada a alínea a) - (…) – implica que na prova da situação nele referenciada se procede a um exercício intelectual de prognose, frequentes vezes complexo, que se traduz em comparar o que se antevê resultar da homologação do plano, para o reclamante, com aquilo que aconteceria na ausência dele.
Relativamente aos credores, isto reconduz-se a cotejar quanto recebem com o plano e quanto se estima receberiam sem ele.”
A adaptação desta norma quer ao PER, quer ao PEAP, que deve ser feita com as devidas adaptações, impõe desde logo, como refere Catarina Serra[30] excluir do universo de potenciais interessados legitimados para formular este pedido, o próprio devedor, já que a proposta foi necessariamente apresentada por ele (o que pode não suceder em processo de insolvência). Também resulta do cotejo do regime legal respetivo com o da aprovação de plano de insolvência que bastará, como manifestação de oposição ao plano ou proposta de acordo, o voto desfavorável dirigido ao Administrador Judicial Provisório[31] - circunstâncias não postas em crise na presente apelação.
Mas a adaptação mais importante a fazer será a de imposição de um outro pré-juízo, dada a natureza pré-insolvencial do procedimento. O cenário de liquidação é conatural na previsão do art. 216º do CIRE porque tratamos de um devedor que já está declarado insolvente. Mas em procedimento preventivo a que um devedor tem acesso em situação económica difícil ou em situação de insolvência iminente, a probabilidade de, findo o procedimento, o devedor já estar insolvente e ser mais provável que se lhe siga a declaração de insolvência e a liquidação universal convive com a hipótese de o devedor, mesmo sem obter a aprovação do acordo, não estar em situação de insolvência atual[32].
Assim sendo, o credor que requer a não homologação com este fundamento deve, no mínimo, alegar a indiferença das duas possibilidades e, em caso de distinção, as consequências num e noutro cenário, não nos parecendo exigível a alegação (e muito menos a demonstração) que um dos cenários é mais provável que outro.
Analisemos ora os elementos do caso concreto.
O despacho recorrido indicou ser o cenário o da insolvência do devedor e a liquidação do seu património. Fê-lo de forma assertiva, considerando ser o único cenário possível, no que não concordamos como princípio, embora concordemos que, no caso concreto, o cenário de insolvência, de acordo com os dados do ativo e do passivo e, em especial, da liquidez disponível para o pagamento total e imediato do passivo vencido, é esse, de facto, o cenário mais provável.
Apontou seguidamente o tribunal que o credor não fez a comparação com a situação de liquidação, apontando como cenário o prosseguimento das execuções e que, ainda que assim se não considerasse, não demonstrou o estado das execuções, que ali reclamou créditos, que tais créditos foram graduados como garantidos para serem pagos em 1º lugar, nem que ali foram apreendidos quaisquer bens ou valores, ou sequer que a venda estivesse para breve. Sendo o ónus da prova dos factos em causa do credor discordante, concluiu pela improcedência do argumento.
A apelante alega agora, depois de no pedido de não homologação ter aludido apenas ao prosseguimento das execuções, que, seja por via da insolvência dos devedores, seja por via das execuções já em curso, a sua situação sempre seria mais vantajosa do que comparada com o da aprovação do PEAP. Alega, sem ter junto qualquer elemento de prova nesse sentido, a pendência de execuções, a respetiva fase e uma possível diminuição do valor de mercado dos imóveis. Defende que a venda imediata permitirá satisfazer parte substancial do seu crédito e que no cenário de homologação terá que aguardar dois anos sem receber qualquer pagamento e mais 20 anos para receber a totalidade do seu crédito já com perdão.
Os devedores apontam que, em cenário de insolvência, a credora poderá lograr receber parte do seu crédito garantido, mas não o seu crédito comum remanescente e que com o acordo, receberá a médio prazo. A recorrente não cumpriu o seu ónus probatório pelo que não pode ser recusada a homologação cm este fundamento.
Como já referimos, o cenário do prosseguimento das execuções, na sequência da não homologação do plano de apagamento, neste caso concreto, não se afigura o mais provável.
Mesmo tomando por certa a existência de crédito da recorrente garantido por hipoteca de 1º grau (porque não surgiu outro credor hipotecário a reclamar créditos e porque a hipoteca foi reconhecida sobre um dos imóveis relacionado como propriedade dos devedores) em relação a um dos imóveis referido[33], sobre o outro[34] não temos rigorosamente qualquer elemento[35].
Reclamado um crédito de mais de 3 milhões de euros, temos documentação (as cadernetas prediais) que demonstram que, quanto a um dos prédios, que garantirá cerca de 1 milhão e setecentos mil euros, tem um valor patrimonial de cerca de € 251 mil euros. Mesmo que valorize muito, não é credível que permita o pagamento do respetivo crédito garantido, remanescendo o demais como comum.
Num cenário de aprovação do plano a credora recebe apenas juros durante 24 meses e esperará cerca de 15 anos para receber o seu crédito, já com o perdão aplicado. Não há qualquer razão para definir o prazo de recebimento como de 20 anos (nem sequer corresponde aos cálculos da recorrente).
A outra parte do crédito terá garantia sobre bem de terceiro nada tendo sido demonstrado que permita concluir pela veracidade do alegado.
O ónus da demonstração, em termos de verosimilhança, pertence ao interessado que requer a não homologação. Este não é um fundamento de não homologação oficioso como os que vimos analisando, estando dependente de arguição pelo interessado e de demonstração por este, em termos plausíveis[36], considerando o contexto e prazos aplicáveis, de que a sua situação é previsivelmente menos favorável que a que interviria na ausência de qualquer plano[37].
O único elemento certo, neste momento, são os rendimentos dos devedores e a possibilidade de desconto nos mesmos ou, em cenário de exoneração do passivo restante, o que exceda o montante mínimo de sobrevivência que venha a ser fixado pelo tribunal. No tocante ao património dos devedores que serve de garantia só temos apurado o valor patrimonial, que é de cerca de um sétimo do valor garantido.
O pressuposto de que estes devedores e os terceiros garantes têm um património valioso prestes a ser vendido em execução ou que apreendido em processo de insolvência permitiria melhor recuperação do crédito que este plano prestacional não está, de todo confirmado ou demonstrado, o que nos deixa num non liquet quanto ao juízo exigido pela alínea a) do nº1 do art. 216º do CIRE.
O que implica que esta questão terá que ser decidida contra o credor que requereu a não homologação da proposta de acordo de pagamento apresentada pelos devedores, dado que sobre eles recaía o ónus da demonstração de previsibilidade de que a sua situação é menos favorável ao abrigo do acordo que na ausência deste.
Improcede, assim, o fundamento de recusa de homologação previsto no art. 216º, nº1, al. a) do CIRE.
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Improcedem, assim, todas as conclusões da recorrente bem como, consequentemente, a apelação.
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A apelante, porque vencida, suportará integralmente as custas do presente recurso que, in casu se traduzem apenas nas custas de parte devidas, porquanto se mostra paga a taxa de justiça devida pelo impulso processual do recurso e este não envolveu diligências geradoras de despesas – arts. 663.º, n.º 2, 607.º, n.º 6, 527.º, n.º 1 e 2, 529.º e 533.º, todos do Código de Processo Civil[38].
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5. Decisão
Pelo exposto, acordam as juízas desta Relação em julgar integralmente improcedente a apelação, decidindo-se manter a sentença recorrida.
Custas de parte na presente instância recursiva pela recorrente.
Notifique.
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Lisboa, 6 de setembro de 2022
Fátima Reis Silva
Amélia Sofia Rebelo
Manuela Espadaneira Lopes
_______________________________________________________
[1] Aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 42/2016, de 14/07/2016, publicado no DR. n.º 158/2016, Série I de 2016-08-18.
[2] Medida 25 do eixo de reestruturação empresarial.
[3] Acs. de 10/12/15 (relator Pinto de Almeida), de 05/04/16 (relator José Rainho), de 12/04/16 (relator Salreta Pereira), de 21/06/16 (relatora Ana Paula Boularot) e de 27/10/16 (relator Fernandes do Vale).
[4] Ver Catarina Serra em Lições de Direito da Insolvência, Almedina, 2018, pgs. 582 e 583.
[5] Cfr. art. 12º da referida Lei.
[6] Catarina Serra em Lições…, pg. 474.
[7] Carvalho Fernandes e João Labareda em Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 3ª edição, Quid Juria, 2015, pg. 782.
[8] Em O Processo Especial de Revitalização – Comentário aos artigos 17º-A a 17º-I do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas, Coimbra Editora, Março de 2014, pg. 143.
[9] Todos os arestos disponíveis em www.dgsi.pt.
[10] Ac. TRC de 27/06/17 (Isaías Pádua).
[11] Questão (a aplicabilidade) que apenas se tornará necessário abordar se concluirmos que os créditos públicos aqui invocados não foram modificados em concreto pela parte dispositiva do plano que foi aprovado e homologado.
[12] Disponível, como os demais citados sem referência, em www.dgsi.pt.
[13] Onde se estabelece «1 - A declaração de insolvência determina o vencimento de todas as obrigações do insolvente não subordinadas a uma condição suspensiva.» levantando a interrogação de se teriam que considerar sempre modificados todos os créditos em relação aos quais s enão previsse o pagamento total de imediato.
[14] Veja-se, como exemplo, o caso tratado no Ac. STJ de 09/03/2021, já citado, ou no Ac. TRP de 08/02/2022, também citado.
[15] Neste exato sentido Rosário Epifânio em Manual de Direito da Insolvência, 8ª edição, 2022, pg. 504, Ac. TRC de 01/04/2014 (Henrique Antunes), Ac. TRC de 18/05/2020 (Barateiro Martins) e Ac. TRP de 08/02/2022 (João Ramos Lopes), todos disponíveis e www.dgsi.pt.
[16] Onde se estabelece que “O pagamento dos créditos sobre a insolvência, a liquidação da massa insolvente e a sua repartição pelos titulares daqueles créditos e pelo devedor, (…), podem ser regulados num plano de insolvência em derrogação das normas do presente Código.”
[17] Em O (des)privilégio do beneficium excussionis do responsável tributário subsidiário, Revista da Ordem dos Advogados, Ano de 2007, Ano 67, Vol. III, Dez. 2007, disponível em https://portal.oa.pt/publicacoes/revista-da-ordem-dos-advogados-roa/ano-2007/ano-67-vol-iii-dez-2007/doutrina/vania-patricia-filipe-magalhaes-o-des-privilegio-do-beneficium-excussionis-do-responsavel-tributario-subsidiario/.
[18] Cfr., além dos arestos citados por Vânia Patrícia Magalhães o Ac. STA de 12/10/2016 (Isabel Marques da Silva), disponível em www.dgsi.pt.
[19] Todos os preceitos na redação em vigor à data da prolação da decisão recorrida.
[20] Em análise da adaptação do art. 194º do CIRE às pessoas singulares, efetuada antes da entrada em vigor do Decreto Lei nº 79/2017 e na perspetiva de que o PER se aplicava a pessoas singulares, a aqui relatora defendeu, em Paralelismos e Diferenças entre o PER e o processo de insolvência, RDI nº0, pgs. 141 e 142, a desnecessidade de junção dos elementos das alíneas b) e d) do nº2.
[21] No mesmo sentido já a relatora se pronunciou no local citado na nota anterior, pg. 142.
[22] E não de 12/10/2020, como indicado nas alegações da recorrente.
[23] Efetuada pela Lei nº 9/2022 de 11 de janeiro, que entrou em vigor em 11 de abril de 2022.
[24] Em Proposta de Lei 115/XIV/3.ª – na versão da proposta conjunta do GPPSD e GPPS - Lei n.º 9/2022, de 11 de janeiro - A visão de um juiz nacional, Em “Conferência “O Plano de Recuperação e Resiliência para a Justiça Económica e a transposição da Diretiva 2019/1023, do Parlamento Europeu e do Conselho – e-book publicado pelo Ministério da Justiça em março de 2022, disponível em
https://justica.gov.pt/Portals/0/Ficheiros/Organismos/JUSTICA/E-bookCONF-PRR-VF2.pdf.
[25] Em PoLaR Portuguese Law Review - vol. 5 - n.º 1, Almedina, 2021, “The Extraordinary Proceedings for the Economic Sustainability of Businesses: The Viability or Feasibility Test”, pgs. 13 e 14.
[26] Em tradução livre.
[27] Neste sentido, entre outros, os Acs. TRC de 17/03/15 (Henrique Antunes); TRP de 08/07/15 (Manuel Domingos Fernandes); TRL de 09/06/16 (Ondina Carmo Alves); TRL de 28/04/2020 (Paula Cardoso).
[28] Também disponível em www.dgsi.pt.
[29] em Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, já citado, em anotação ao preceito transcrito, pg.
[30] Em Lições, pg. 475.
[31] Neste sentido Nuno Salazar Casanova e David Sequeira Dinis, O Processo Especial de Revitalização…, pg. 146.
[32] Referindo a temática Nuno Salazar Casanova e David Sequeira Dinis, O Processo Especial de Revitalização…, pg. 147 e ss. e a aqui relatora em Processo Especial de Revitalização – Notas Práticas e Jurisprudência Recente, Porto Editora, 2014, pg. 65.
[33] A fração ...
[34] Prédio urbano sito na Rua …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º  …. da freguesia dos … e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ….º de ….
[35] A credora, no final do pedido de não homologação, referiu juntar três documentos, não relacionados com os factos alegados – juntou a sua declaração de voto e dois quadros de previsão de pagamento do PEAP.
[36] A expressão é de Catarina Serra, em Lições…, pg. 476.
[37] Neste sentido, entre outros, ver os Acs. Ac. TRP de 11/10/2018 (José Manuel de Araújo Barros), TRP de 12/07/17 (Carlos Portela), TRP de 07/04/2016 (Carlos Querido), TRG de 27/09/2018 (Paulo Reis), TRE de 22/02/2018 (Ana Margarida Leite) e Ac. TRL de 15/10/2019 (Isabel Fonseca).
[38] Vide neste sentido Salvador da Costa in Responsabilidade das partes pelo pagamento das custas nas ações e nos recursos, disponível em https://blogippc.blogspot.com/.