Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
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| Relator: | HIGINA CASTELO | ||
| Descritores: | APOIO JUDICIÁRIO DEFERIMENTO TÁCITO REVOGAÇÃO IMPLÍCITA ANULABILIDADE | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 12/14/2023 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
| Sumário: | I. O ato tácito de deferimento pressupõe: i. a iniciativa particular, ou seja, que o órgão da Administração competente seja solicitado por um interessado a pronunciar-se num caso concreto (artigo 130.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo); ii. que o órgão tenha, sobre a matéria em causa, o dever legal de decidir através de um ato administrativo (artigo 13.º do CPA); iii. que o particular não tenha sido notificado da decisão final sobre pretensão que dirigiu à Administração até ao primeiro dia útil seguinte ao termo do prazo para a decisão (CPA, artigos 128.º, n.ºs 1, 2, 3 e 4, e 130.º, n.ºs 2 e 3); e, iv. que a lei (ou um regulamento) atribua ao silêncio da Administração, decorrido dado prazo, o significado jurídico de deferimento. II. O artigo 130.º do CPA não prevê um caso geral de deferimento tácito, indicando apenas que pode existir ato tácito de deferimento quando lei ou regulamento o preveja (n.º 1), e regulando a data da sua formação (n.º 2), bem como a suspensão do prazo de produção do mesmo ato (n.º 3). III. No artigo 25.º da Lei do Acesso ao Direito e aos Tribunais encontra-se um dos (poucos) casos de deferimento tácito existentes no ordenamento, estabelecendo-se aí que, decorrido o prazo de 30 dias (seguidos, de calendário) para a conclusão do procedimento administrativo e decisão sobre o pedido de proteção jurídica, sem que tenha sido proferida uma decisão, considera-se tacitamente deferido e concedido o pedido de proteção jurídica, sendo suficiente a menção em tribunal da formação do ato tácito. IV. Não demonstrando o ISS a produção do ato expresso e a sua notificação atempada ao particular, impõe-se que o tribunal onde corre a ação para a qual o pedido de apoio foi formulado reconheça e acate o deferimento tácito. V. Como princípio geral, os atos tácitos estão sujeitos ao regime dos atos constitutivos de direitos, apenas podendo ser objeto de decisão revogatória se se verificarem os respetivos pressupostos legais, constantes do artigo 167.º do CPA. VI. O deferimento de apoio judiciário pode, ainda, ser revogado nos casos previstos no artigo 10.º da LAD, a saber: i. por alteração das circunstâncias de insuficiência económica (alíneas a) e e)); ii. pelo conhecimento superveniente, por novos documentos ou pela declaração de falsidade dos que fundamentaram a concessão do benefício, da falta de fundamento da concessão do benefício (alíneas b) e c)); e, iii. por litigância de má fé e/ou incumprimento do benefício concedido. VII. Em geral, a revogação implícita de atos administrativos (incluindo de atos tácitos) tem sido admitida – há revogação implícita quando o ato revogatório, sem fazer referência ao ato revogado, gera efeitos incompatíveis com este –, mas uma revogação implícita apenas será válida se respeitar os requisitos da revogação explícita, que se encontram no artigo 167.º do CPA (ou no caso do apoio judiciário, no artigo 10.º da LAD). VIII. Enferma do vício da violação de lei a decisão de indeferimento do pedido de apoio judiciário que implicitamente revoga o benefício tacitamente concedido, sem que se verifique qualquer das situações tipificadas na lei como pressuposto da revogação ou cancelamento do benefício. IX. A violação de lei é o vício que consiste na discrepância entre o conteúdo ou o objeto do ato e as normas jurídicas que lhes são aplicáveis; trata-se de uma ilegalidade de natureza material, pois é a própria substância do ato administrativo, a decisão em que o ato consiste, que contraria a lei. X. Os atos administrativos praticados com ofensa das normas jurídicas aplicáveis, na falta de previsão legal de outra sanção, são meramente anuláveis (n.º 1 do artigo 163.º do CPA); nulos são apenas os atos para os quais a lei comine expressamente essa forma de invalidade (n.º 1 do artigo 161.º do CPA). XI. A destruição dos efeitos do ato administrativo anulável exige a anulação do ato por decisão proferida pelos tribunais administrativos ou pela própria Administração (n.ºs 2 e 3 do artigo 163.º do CPA). XII. Diferente seria se o ato fosse nulo, pois nesse caso não produziria quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade (n.º 1 do artigo 162.º do CPA); e a nulidade seria invocável a todo o tempo por qualquer interessado e poderia, também a todo o tempo, ser conhecida por qualquer autoridade ou tribunal (e não apenas pelos tribunais administrativos ou pelos órgãos administrativos competentes para a anulação) – n.º 2 do artigo 162.º do CPA. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam os abaixo assinados juízes do Tribunal da Relação de Lisboa: I. Relatório HR deduziu embargos à execução que lhe foi movida por Banco Bic Português, juntando comprovativo do pedido de apoio judiciário feito (por intermédio da sua Il. Mand.) ao Instituto de Segurança Social, I.P., por carta registada de 02/09/2019 e recebida pelo ISS, IP em 05/09/2019. Por e-mail de 24/01/2020, o ISS, IP comunicou aos autos de embargos que tinha enviado ofício de audiência prévia nesse mesmo dia 24/01/2020, à requerente, aguardando resposta. Do ofício, dirigido à Il. Mand. da Embargante, consta, entre o mais: «apenas tem direito a apoio judiciário na modalidade de pagamento faseado da taxa de justiça e demais encargos com o processo no valor mensal de € 80,00. (…) deverá V. Exa., caso concorde com a modalidade proposta, pronunciar-se por escrito no prazo de 10 dias úteis (…) declarando expressamente que aceita (…). Na falta de resposta da parte de V. Exa., nos termos do n.º 2 do art.º 23.º da Lei de Proteção Jurídica, o requerimento será indeferido, não havendo lugar a nova notificação. A decisão final sobre o pedido de apoio judiciário é suscetível de impugnação judicial que deve ser enviada ao serviço de segurança social que apreciou o mesmo, no prazo de 15 dias.» Por e-mail de 13/05/2020, o ISS, IP comunicou aos autos que, por decisão desse mesmo dia 13 de maio, tinha indeferido o pedido. A embargante, notificada para pagar a taxa de justiça e respetiva multa, veio requerer que as mesmas fossem dadas sem efeito, nos seguintes termos: «1- A executada, e conforme consta dos autos, pediu Apoio Judiciário por carta registada com aviso de receção em 03/09/2019, sendo a missiva recebida em 04/09/2019. 2- A executada, e a fazer fé nos documentos junto aos autos, só recebeu a primeira comunicação da Segurança Social, em data posterior a 24 de Janeiro de 2020. 3- O artigo 25º, nº 1 da Lei 34/2004 de 29/07, dispõe que, decorrido o prazo de 30 dias, sem que tenha sido proferida decisão, considera-se tacitamente deferido e concedido o pedido de proteção jurídica, sendo suficiente para a formação do ato tácito a mera menção em Tribunal. 4- Constata-se nos autos, que a Segurança Social ultrapassou o prazo de 30 dias consagrado no artigo 25º da Lei 34/2004 de 29/07, o qual é contínuo, pelo que deve ser reconhecida a formação do cato tácito de deferimento da proteção jurídica de pessoa singular e, consequentemente, deve ser revogada a decisão de aplicação de multa e pagamento de taxa inicial.» Em 19/12/2022, foi proferido o despacho com o qual a embargante não se conformou e que tem o seguinte teor: «Requerimento que antecede: Indefere-se o requerido por falta de fundamento legal, uma vez que não cabe na competência deste Tribunal apreciar a formação de ato tácito e, bem assim, a Segurança Social informou que indeferiu a pretensão formulada pela executada por ato expresso proferido a 13/05/2020. Notifique. Loures, d.s.» A embargante recorreu, concluindo as suas alegações de recurso da seguinte forma: «A- A Recorrente recorre da decisão que que indeferiu o seu pedido de reconhecimento da formação de ato tácito de deferimento da proteção jurídica de pessoa singular e, consequentemente, a revogação da decisão de aplicação de multa e pagamento da taxa inicial. B-A Recorrente não se conforma com a decisão proferida nos autos. C- A decisão que é nula nos termos do artigo 615º, nº 1. alínea d), do CPC., pois o Tribunal “a quo” não conheceu questão da qual deveria tomar conhecimento. D- A executada, e conforme consta dos autos, pediu Apoio Judiciário por carta registada com aviso de receção em 03/09/2019, sendo a missiva recebida em 04/09/2019. E- A recorrente, só recebeu a primeira comunicação da Segurança Social, em data posterior a 24 de Janeiro de 2020. F- E o tribunal deveria conhecer os factos supra. G- O artigo 25º, nº 1 da Lei 34/2004 de 29/07, dispõe que, decorrido o prazo de 30 dias, sem que tenha sido proferida decisão, considera-se tacitamente deferido e concedido o pedido de proteção jurídica, sendo suficiente para a formação do ato tácito a mera menção em Tribunal. H- Constata-se nos autos, que a Segurança Social ultrapassou o prazo de 30 dias consagrado no artigo 25º da Lei 34/2004 de 29/07, o qual é contínuo, pelo que deve ser reconhecida a formação do ato tácito de deferimento da proteção jurídica de pessoa singular. I- decisão proferida não acautela devidamente o direito de acesso aos tribunais, violando o artigo 20º da CRP. Nestes termos e nos melhores de direito, deve ser dado provimento ao presente recurso, anulando-se em consequência a decisão recorrida, e substituída por outra que reconheça a formação do ato tácito, dando sem efeito a taxa e multa aplicadas. Com o que se fará a costumada Justiça!» Não foram oferecidas contra-alegações. Foram colhidos os vistos e nada obsta ao conhecimento do mérito. Objeto do recurso Sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, são as conclusões das alegações de recurso que delimitam o âmbito da apelação (artigos 635.º, 637.º, n.º 2, e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC). Tendo em conta o teor daquelas, colocam-se as seguintes grandes questões: a) O despacho recorrido enferma de nulidade por não ter apreciado a questão que a embargante lhe submeteu (a da formação do deferimento tácito)? b) O pedido de apoio judiciário foi tacitamente deferido, tendo sido validamente formado um ato tácito de deferimento da pretensão da requerente? c) Tal ato mantém-se eficazmente na ordem jurídica? II. Fundamentação de facto Os factos relevantes são os que constam do relatório. III. Apreciação do mérito do recurso 1. Da nulidade do despacho por omissão de pronúncia Cabe decidir, em primeiro lugar, se o despacho recorrido enferma de nulidade por não ter apreciado a questão que a embargante lhe submeteu: a da formação do deferimento tácito. Nos termos do disposto no artigo 608.º, n.º 2, do CPC, o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação. Estava em causa apenas a questão acabada de enunciar. Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, o respetivo despacho enferma de nulidade (artigo 615.º, n.º 1, al. d), do CPC). O despacho recorrido limitou-se a indeferir o requerido por alegada «falta de fundamento legal, uma vez que não cabe na competência deste Tribunal apreciar a formação de ato tácito e, bem assim, a Segurança Social informou que indeferiu a pretensão formulada pela executada por ato expresso proferido a 13/05/2020». É certo que o tribunal a quo não apreciou a questão suscitada pela recorrente, mas porque entendeu ser incompetente para tanto e dizendo que a entidade competente havia indeferido a pretensão. Implicitamente, decorre do despacho que o tribunal a quo entende que o ato tácito não se formou. Mais do que uma nulidade por omissão de pronúncia, parece-nos que estamos em presença de erro de julgamento. De todo o modo, sempre caberia a este tribunal, ao abrigo do disposto no artigo 665.º, n.º 1, do CPC, se declarasse nula a decisão, conhecer do objeto da apelação. É o que se fará. 2. Do deferimento tácito do requerimento de apoio judiciário e suas consequências 2.1. Principais normas a ter em consideração na solução do caso (reproduzem-se para facilitar a exposição) Os artigos 8.º-B, 10.º e 25.º da Lei 34/2004, de 29 de julho, na sua atual redação, lei que estabelece o regime de acesso ao direito e aos tribunais, de ora em diante Lei do Acesso ao Direito ou LAD (apresentados pela ordem em que, na discussão dos autos, assumem relevância): Artigo 25.º Prazo 1 - O prazo para a conclusão do procedimento administrativo e decisão sobre o pedido de proteção jurídica é de 30 dias, é contínuo, não se suspende durante as férias judiciais e, se terminar em dia em que os serviços da segurança social estejam encerrados, transfere-se o seu termo para o 1.º dia útil seguinte. 2 - Decorrido o prazo referido no número anterior sem que tenha sido proferida uma decisão, considera-se tacitamente deferido e concedido o pedido de proteção jurídica. 3 - No caso previsto no número anterior, é suficiente a menção em tribunal da formação do ato tácito e, quando estiver em causa um pedido de nomeação de patrono, a tramitação subsequente à formação do ato tácito obedecerá às seguintes regras: a) Quando o pedido tiver sido apresentado na pendência de ação judicial, o tribunal em que a causa está pendente solicita à Ordem dos Advogados que proceda à nomeação do patrono, nos termos da portaria referida no n.º 2 do artigo 45.º; b) Quando o pedido não tiver sido apresentado na pendência de ação judicial, incumbe ao interessado solicitar a nomeação do patrono, nos termos da portaria referida no n.º 2 do artigo 45.º 4 - O tribunal ou, no caso referido na alínea b) do número anterior, a Ordem dos Advogados deve confirmar junto dos serviços da segurança social a formação do ato tácito, devendo estes serviços responder no prazo máximo de dois dias úteis. 5 - Enquanto não for possível disponibilizar a informação de forma desmaterializada e em tempo real, os serviços da segurança social enviam mensalmente a informação relativa aos pedidos de proteção jurídica tacitamente deferidos ao Gabinete para a Resolução Alternativa de Litígios, à Ordem dos Advogados, se o pedido envolver a nomeação de patrono, e ao tribunal em que a ação se encontra, se o requerimento tiver sido apresentado na pendência de ação judicial. Artigo 8.º-B Prova da insuficiência económica 1 - A prova da insuficiência económica é feita nos termos a definir por portaria conjunta dos ministros responsáveis pelas áreas da justiça e da segurança social. 2 - Em caso de dúvida sobre a verificação de uma situação de insuficiência económica, pode ser solicitado pelo dirigente máximo do serviço de segurança social que aprecia o pedido que o requerente autorize, por escrito, o acesso a informações e documentos bancários e que estes sejam exibidos perante esse serviço e, quando tal se justifique, perante a administração tributária. 3 - Se todos os elementos necessários à prova da insuficiência económica não forem entregues com o requerimento de proteção jurídica, os serviços da segurança social notificam o interessado, com referência expressa à cominação prevista no número seguinte, para que este os apresente no prazo de 10 dias, suspendendo-se o prazo para a formação de ato tácito. 4 - No termo do prazo referido no número anterior, se o interessado não tiver procedido à apresentação de todos os elementos de prova necessários, o requerimento é indeferido, sem necessidade de proceder a nova notificação ao requerente. Artigo 10.º Cancelamento da proteção jurídica 1 - A proteção jurídica é cancelada, quer na sua totalidade quer relativamente a alguma das suas modalidades: a) Se o requerente ou o respetivo agregado familiar adquirirem meios suficientes para poder dispensá-la; b) Quando se prove por novos documentos a insubsistência das razões pelas quais foi concedida; c) Se os documentos que serviram de base à concessão forem declarados falsos por decisão com trânsito em julgado; d) Se, em recurso, for confirmada a condenação do requerente como litigante de má fé; e) Se, em ação de alimentos provisórios, for atribuída ao requerente uma quantia para custeio da demanda; f) Se o requerente a quem tiver sido concedido apoio judiciário em modalidade de pagamento faseado não proceder ao pagamento de uma prestação e mantiver esse incumprimento no termo do prazo que lhe for concedido para proceder ao pagamento em falta acrescido de multa equivalente à prestação em falta. 2 - No caso da alínea a) do número anterior, o requerente deve declarar, logo que o facto se verifique, que está em condições de dispensar a proteção jurídica em alguma ou em todas as modalidades concedidas, sob pena de ficar sujeito às sanções previstas para a litigância de má fé. 3 - A proteção jurídica pode ser cancelada oficiosamente pelos serviços da segurança social ou a requerimento do Ministério Público, da Ordem dos Advogados, da parte contrária, do patrono nomeado ou do agente de execução atribuído. 4 - O requerente de proteção jurídica é sempre ouvido. 5 - Sendo cancelada a proteção jurídica concedida, a decisão é comunicada ao tribunal competente e à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores, conforme os casos. Do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo DL 4/2015, de 7 de janeiro, alterado pela Lei 72/2020, de 16 de novembro, e pelo DL 11/2023, de 10 de fevereiro: Artigo 130.º Atos tácitos 1 - Existe deferimento tácito quando a lei ou regulamento determine que a ausência de notificação da decisão final sobre pretensão dirigida a órgão competente dentro do prazo legal tem o valor de deferimento. 2 - Considera-se que há deferimento tácito se a notificação do ato não for expedida até ao primeiro dia útil seguinte ao termo do prazo da decisão. 3 - O prazo legal de produção de deferimento tácito suspende-se se o procedimento estiver parado por motivo imputável ao interessado e só se interrompe com a notificação de decisão expressa. 4 - (…) 5 - (…) Artigo 165.º Revogação e anulação administrativas 1 - A revogação é o ato administrativo que determina a cessação dos efeitos de outro ato, por razões de mérito, conveniência ou oportunidade. 2 - A anulação administrativa é o ato administrativo que determina a destruição dos efeitos de outro ato, com fundamento em invalidade. Artigo 167.º Condicionalismos aplicáveis à revogação 1 - Os atos administrativos não podem ser revogados quando a sua irrevogabilidade resulte de vinculação legal ou quando deles resultem, para a Administração, obrigações legais ou direitos irrenunciáveis. 2 - Os atos constitutivos de direitos só podem ser revogados: a) Na parte em que sejam desfavoráveis aos interesses dos beneficiários; b) Quando todos os beneficiários manifestem a sua concordância e não estejam em causa direitos indisponíveis; c) Com fundamento na superveniência de conhecimentos técnicos e científicos ou em alteração objetiva das circunstâncias de facto, em face das quais, num ou noutro caso, não poderiam ter sido praticados; d) Com fundamento em reserva de revogação, na medida em que o quadro normativo aplicável consinta a precarização do ato em causa e se verifique o circunstancialismo específico previsto na própria cláusula. 3 - Para efeitos do disposto na presente secção, consideram-se constitutivos de direitos os atos administrativos que atribuam ou reconheçam situações jurídicas de vantagem ou eliminem ou limitem deveres, ónus, encargos ou sujeições, salvo quando a sua precariedade decorra da lei ou da natureza do ato. 4 - A revogação prevista na alínea c) do n.º 2 deve ser proferida no prazo de um ano, a contar da data do conhecimento da superveniência ou da alteração das circunstâncias, podendo esse prazo ser prorrogado, por mais dois anos, por razões fundamentadas. 5 - Na situação prevista na alínea c) do n.º 2, os beneficiários de boa-fé do ato revogado têm direito a ser indemnizados, nos termos do regime geral aplicável às situações de indemnização pelo sacrifício, mas quando a afetação do direito, pela sua gravidade ou intensidade, elimine ou restrinja o conteúdo essencial desse direito, o beneficiário de boa-fé do ato revogado tem direito a uma indemnização correspondente ao valor económico do direito eliminado ou da parte do direito que tiver sido restringida. 6 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se de boa-fé os beneficiários que, à data da prática do ato revogado, desconheciam sem culpa a existência de fundamentos passíveis de determinar a revogação do ato. Artigo 168.º Condicionalismos aplicáveis à anulação administrativa 1 - Os atos administrativos podem ser objeto de anulação administrativa no prazo de seis meses, a contar da data do conhecimento pelo órgão competente da causa de invalidade, ou, nos casos de invalidade resultante de erro do agente, desde o momento da cessação do erro, em qualquer dos casos desde que não tenham decorrido cinco anos, a contar da respetiva emissão. 2 - Salvo nos casos previstos nos números seguintes, os atos constitutivos de direitos só podem ser objeto de anulação administrativa dentro do prazo de um ano, a contar da data da respetiva emissão. 3 - Quando o ato tenha sido objeto de impugnação jurisdicional, a anulação administrativa só pode ter lugar até ao encerramento da discussão. 4 - Salvo se a lei ou o direito da União Europeia prescreverem prazo diferente, os atos constitutivos de direitos podem ser objeto de anulação administrativa no prazo de cinco anos, a contar da data da respetiva emissão, nas seguintes circunstâncias: a) Quando o respetivo beneficiário tenha utilizado artifício fraudulento com vista à obtenção da sua prática; b) Apenas com eficácia para o futuro, quando se trate de atos constitutivos de direitos à obtenção de prestações periódicas, no âmbito de uma relação continuada; c) Quando se trate de atos constitutivos de direitos de conteúdo pecuniário cuja legalidade, nos termos da legislação aplicável, possa ser objeto de fiscalização administrativa para além do prazo de um ano, com imposição do dever de restituição das quantias indevidamente auferidas. 5 - Quando, nos casos previstos nos n.ºs 1 e 4, o ato se tenha tornado inimpugnável por via jurisdicional, o mesmo só pode ser objeto de anulação administrativa oficiosa. 6 - A anulação administrativa de atos constitutivos de direitos constitui os beneficiários que desconhecessem sem culpa a existência da invalidade e tenham auferido, tirado partido ou feito uso da posição de vantagem em que o ato os colocava, no direito de serem indemnizados pelos danos anormais que sofram em consequência da anulação. 7 - Desde que ainda o possa fazer, a Administração tem o dever de anular o ato administrativo que tenha sido julgado válido por sentença transitada em julgado, proferida por um tribunal administrativo com base na interpretação do direito da União Europeia, invocando para o efeito nova interpretação desse direito em sentença posterior, transitada em julgado, proferida por um tribunal administrativo que, julgando em última instância, tenha dado execução a uma sentença de um tribunal da União Europeia vinculativa para o Estado português. 2.2. O ato tácito em geral, no ordenamento jurídico vigente: o conceito Da leitura do conjunto de normas relevante, percebe-se que o artigo 25.º da LAD prevê e regula um ato tácito de deferimento, sendo uma das concretizações existentes no ordenamento da figura do ato tácito previsto no artigo no artigo 130.º do CPA. A cabal compreensão, apreciação e decisão do caso sub judice demanda o aprofundamento destas normas e conceitos, começando pelo ato tácito em geral. Na falta de melhores palavras, vamos reproduzir um par de páginas de Diogo Freitas do Amaral (Curso de Direito Administrativo, vol. II, 3.ª ed., com colaboração de Pedro Machete e Lino Torgal, Almedina, 2016, pp. 300-302), que se ajustam com muita propriedade nesta parte inicial do raciocínio. Após afirmar em que há situações em que a lei atribui ao silêncio da Administração determinado significado, com efeitos jurídicos, escreve: «As situações de inércia ou de silêncio da Administração perante pretensões concretas apresentadas por interessados aos órgãos competentes eram muito frequentes e constituíam “uma das mais insidiosas formas de desrespeito pelas regras estabelecidas e pelo princípio da legalidade, tal como devem ser entendidos e aplicados num autêntico Estado de Direito” [citação de Armando M. Marques Guedes, em O Processo Burocrático, Lisboa: Centro de Estudos Fiscais, 1969, p. 60]. Acresce que, e como bem se compreende, tais situações deixavam os particulares completamente desarmados, num sistema jurídico que organizava a proteção dos cidadãos sobretudo na base do recurso contencioso de anulação — o que pressupunha a prática de um ato administrativo de que se pudesse recorrer. Como reagir contra “a política de braços cruzados, por parte da Administração”? A maneira mais frequente de resolver o problema consistia, dantes, em a lei atribuir ao silêncio da Administração o significado de ato tácito negativo: decorrido o prazo legal sem que o pedido formulado pelo particular ao órgão competente e obrigado a decidir tivesse resposta, a lei determinava que se considerasse tal pedido como “indeferido”. Presumia-se, nestes casos, que havia ali uma vontade tácita da Administração no sentido de recusar introduzir alterações na ordem jurídica, pelo que a pretensão do particular se considerava indeferida: daí o ato tácito negativo, ou indeferimento tácito. Qual era a vantagem para o particular desta figura do ato tácito negativo? É que — repare-se bem —, se não fosse assim, dificilmente haveria uma decisão que o interessado pudesse impugnar em tribunal: quando a Administração recusasse os pedidos dos particulares, ou o fazia por forma expressa, e os interessados podiam atacar contenciosamente tal decisão, ou limitava-se a nada responder, e com isso impedia os particulares de lançar mão da via contenciosa e de, portanto, ver o seu caso discutido e julgado num tribunal. Ora, com a figura do ato tácito negativo, o facto de a lei mandar interpretar o silêncio da Administração como ato administrativo de indeferimento permitia ao particular recorrer a tribunal, impugnando o indeferimento (tácito) da sua pretensão. Esta garantia dos particulares — o direito de recurso contencioso do indeferimento tácito — foi considerada nos inícios do século XX como muito importante. Hoje, porém, ganhou-se consciência de que ela não é uma garantia muito forte e não é satisfatória: primeiro, porque a nossa jurisprudência raramente considerava verificado um ato tácito negativo (por ser demasiado exigente quanto aos requisitos de produção do ato tácito); segundo, porque o recurso de anulação do indeferimento tácito levava muito tempo a julgar; e terceiro, porque a utilidade prática desse recurso, em sede de execução da sentença anulatória do indeferimento tácito, era bastante problemática e aleatória. Assim, vários países evoluíram para a aceitação, em lugar do recurso do ato tácito, de uma ação contra as omissões indevidas da Administração, em que esta possa ser condenada pelo tribunal administrativo a praticar os atos legalmente devidos. É esse o caso, por exemplo, do mandamus no direito inglês (ordem dada a uma autoridade, que se recusa a cumprir um dever, para que o cumpra) e da Verpflichtungsklage no direito alemão (ação de condenação à prática de um ato devido). E também entre nós foi, desde a revisão constitucional de 1997, aberta essa possibilidade. Como vimos, passou a dispor-se, no artigo 268.º, n.º 4, da Constituição que “é garantido aos administrados tutela jurisdicional efetiva dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, (...) a determinação da prática dos atos administrativos legalmente devidos”. Esta possibilidade veio a ser concretizada mediante a consagração legal da ação administrativa especial de condenação à prática do ato devido, no artigo 66.º e seguintes do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Deixou, portanto, de se justificar a previsão do indeferimento tácito: perante a inércia da Administração, pode o interessado acioná-la em tribunal, pedindo a sua condenação à prática, dentro de determinado prazo, do ato administrativo ilegalmente omitido. Solução atual. — A regra no nosso Direito hoje é, pois, a de que só há ato tácito positivo e este só existe nos casos expressamente previstos por lei: “existe deferimento tácito quando a lei ou regulamento determine que a ausência de notificação da decisão final sobre pretensão dirigida a órgão competente dentro do prazo legal tem o valor de deferimento” (CPA, art.º 130.º, n.º 1). Infelizmente, porém, o Código apenas disciplina a produção de deferimento tácito nas relações interorgânicas: “quando a prática de um ato administrativo dependa de autorização prévia ou um ato esteja sujeito à aprovação de um órgão da Administração Pública ou de outra entidade no exercício de poderes públicos, prescinde-se da autorização prévia ou da aprovação desde que o órgão que as solicitou tenha interpelado o órgão competente para as emitir”, uma vez decorridos dez dias sobre o termo do prazo para a autorização ou aprovação, devendo o órgão competente, nesse caso, emiti-las no prazo de vinte dias” (CPA, art.º 130.º, n.º 4 e 5).» O ato tácito no CPA vigente, de 2015, é, pois, diferente do ato tácito no revogado CPA, o de 1991. Pode dizer-se que, no CPA de 1991, o ato tácito era, em regra, de indeferimento. Dispunha o n.º 1 do artigo 109.º do revogado Código que, «[s] em prejuízo do disposto no artigo anterior, a falta, no prazo fixado para a sua emissão, de decisão final sobre a pretensão dirigida a órgão administrativo competente confere ao interessado, salvo disposição em contrário, a faculdade de presumir indeferida essa pretensão, para poder exercer o respetivo meio legal de impugnação». No CPC de 2015 o ato tácito de indeferimento desapareceu. Com outros aplausos, além do decorrente da citação supra: «O deferimento tácito sempre foi uma coisa totalmente diferente: nunca pertenceu ao mesmo mundo “hipócrita” do indeferimento tácito, criação subtil e sofisticada mas, bem vistas as coisas, vocacionada para dar cobertura aos desmandos de uma Administração incapaz de respeitar os direitos dos particulares» - João Caupers e Vera Eiró, Introdução ao Direito Administrativo, 12.ª ed., Âncora, 2016, p. 369. Ainda os mesmos Autores: «A formulação do n.º 1 do artigo 130.º do CPC (…) não estabelece uma regra geral sobre a formação daquele, limitando-se a esclarecer que cada caso de deferimento tácito depende de específica previsão legal» - idem, idem. Não há, portanto, um ato tácito, genericamente previsto e regulado; pode haver, e há, vários, dependendo sempre de lei ou regulamento que atribua o significado de deferimento a determinadas omissões da Administração. O regime de cada deferimento tácito não é necessariamente igual ao de todos os outros. Aprofundando, na mesma linha de pensamento, as características do novo deferimento tácito, escreve Luiz S. Cabral de Moncada, Código do Procedimento Administrativo Anotado, 4.ª ed. Revista e Atualizada, Quid Juris, 2022, pp.458-459: «O Código apresenta uma nova noção de ato tácito de deferimento. Uma noção diferente da que vigorava até então. A partir de agora o ato tácito corresponde ao facto jurídico da ausência de notificação do interessado no prazo legal da decisão administrativa expressa, como se verá. É um silêncio que toma por referência a (falta da) notificação. Por sua vez, a ausência da notificação da decisão tomada tanto pode ficar a dever-se ao facto jurídico do puro e simples silêncio da Administração, hipótese que esgotava o ato tácito de deferimento (nos casos em que a lei o admitia) face ao anterior Código, como à falta de notificação no prazo legal de uma decisão expressa. O ato tácito de deferimento é agora compatível com uma decisão expressa não notificada e isto é que é novo. O ato tácito ou silente (ou presumido) de deferimento pressupõe em qualquer dos casos um requerimento dirigido pelo interessado à Administração. É uma figura típica dos procedimentos de heteroiniciativa e não dos de iniciativa oficiosa. Pressupõe ainda o incumprimento do dever de decidir, ou seja, a ilegalidade da Administração, o qual incumprimento, bem vistas as coisas, tanto é consequência do silêncio como da falta de notificação da decisão expressa no prazo legal de 60 dias. Sucede que a lei em vez de remeter o interessado para a tutela contenciosa que lhe caberia, avança com a solução vantajosa da atribuição de efeitos positivos à falta da notificação no prazo legal tanto faz se devida ou não ao silêncio ou seja, resolve a questão favoravelmente ao interessado pela via procedimental em vez de pela via jurisdicional. O exercício dos direitos ou interesses do requerente fica descondicionado a partir da verificação do ato tácito positivo tudo se passando como se a Administração tivesse deferido a pretensão. É por isso que o ato tácito positivo é um verdadeiro ato que substitui aquele que a Administração omitiu. O ato administrativo tácito de efeitos positivos é sempre uma ficção legal. Na realidade, o que ocorreu foi o facto jurídico da ausência da notificação no prazo legal mesmo que o ato expresso tenha sido praticado ou em virtude do puro e simples silêncio, a que a lei ligou efeitos positivos equivalentes aos do deferimento expresso da pretensão do interessado. E hoje o único ato ficto que o CPA admite. É nesta perspetiva que se nos afigura mais correto ligar o ato tácito de deferimento ao puro e simples facto do silêncio com o qual o legislador quis beneficiar o requerente em vez de ficcionar que ele corresponde ao preenchimento dos pressupostos legais valendo como se fora ato expresso de deferimento. Há que retirar do silêncio todas as suas consequências em vez de (continuar) a ficcionar que o ato tácito substitui o ato expresso de deferimento. É preciso acabar de vez com as ficções. O acto tácito positivo verifica-se relativamente a procedimentos de iniciativa particular e também nas relações interadministrativas e interorgânicas. E verifica-se também relativamente a requerimentos e a petições como indica o termo genérico pretensão utilizado pelo n.º 1» (ênfases acrescentadas). No que respeita à natureza do ato tácito em geral, têm-se manifestado, em Portugal, sobretudo duas conceções: - O ato tácito é um ato administrativo voluntário, com manifestação tácita de vontade, ou relativamente ao qual a lei presume a existência de uma vontade da administração – perspetiva tradicional exposta por Marcelo Caetano, Manual de Direito Administrativo, I, 1.ª ed., Almedina, pp. 474 e ss.; - O deferimento tácito traduz uma ficção legal de ato administrativo, ao qual é aplicado o regime jurídico dos atos administrativos – trata-se da posição maioritária por ser também aquela que vai ao encontro das disposições da lei – neste sentido, Freitas do Amaral, ob. e loc. cit., Cabral de Moncada, ob. e loc. cit., João Tiago Silveira, O deferimento tácito, Coimbra Editora, 2004, pp. 94-102, e por outros autores citados nas mesmas obras. Avançando uma noção, João Tiago Silveira escreve que «[o] deferimento tácito é o ato ficcionado através do qual se concede ao particular, nos casos e condições legalmente previstas, o correspondente à sua pretensão, na sequência do decurso de um lapso temporal sem que a Administração se tenha pronunciado sobre a mesma. (…) não será um verdadeiro ato administrativo, mas antes um facto jurídico [o silêncio] ao qual, por meio de uma ficção legal, é aplicado o regime jurídico desse ato administrativo» (ob. cit., p. 101). Quer se entenda de um modo ou do outro, o ato tácito produz-se desde que se verifiquem os pressupostos que a lei indica. Escrevia Marcelo Caetano, ob. cit., p. 475: «O silêncio, quando não haja a possibilidade física de expressão ou o dever legal de declaração da vontade em certo prazo, não é relevante em Direito Administrativo. Para que o silêncio, por conseguinte, origine um ato administrativo é necessário: 1.º que o órgão administrativo seja solicitado a pronunciar-se, num caso concreto; 2.º que a pretensão apresentada verse matéria da competência desse órgão; 3.º que o órgão tenha o dever legal de resolver em certo prazo o caso apresentado, mediante a prática de um ato definitivo, o que quer dizer que o poder de decidir deve ser vinculado quanto à oportunidade do seu exercício; 4.º que a lei atribua à abstenção de resolução dentro do prazo legal um significado determinado.» À luz do atual CPA, escreve Freitas do Amaral (ob. cit., p. 303): «São as seguintes as condições da produção do ato tácito: - que o órgão da Administração competente seja legalmente solicitado por um interessado a pronunciar-se num caso concreto (CPA, art.º 130.º, n.º 1); - que o órgão tenha, sobre a matéria em causa, o dever legal de decidir através de um ato administrativo (v. n.º 2 do art.º 13.º do CPA); - que tenha decorrido o prazo legal (contado nos termos do art.º 87.º do CPA*) sem que haja sido tomada uma decisão expressa sobre o pedido (CPA, art.ºs 128.º, n.ºs 1, 2, 3 e 4, e 130.º, n.ºs 2 e 3); - e que a lei (ou um regulamento) atribua ao silêncio da Administração, durante esse prazo, o significado jurídico de deferimento.» * Em relação ao trecho «contado nos termos do art.º 87.º do CPA» é de dizer que assim será, sem prejuízo de determinação da lei em contrário. No caso sub judice, aplica-se a LAD que exceciona a contagem do prazo nos termos do artigo 87.º do CPA, dizendo expressamente que «[o] prazo para a conclusão do procedimento administrativo e decisão sobre o pedido de proteção jurídica é de 30 dias, é contínuo, não se suspende durante as férias judiciais» (artigo 25.º, n.º 1, da LAD). 2.3. Relacionando as normas com o caso – a formação do deferimento tácito no caso concreto Relembremos o caso: - A recorrente deduziu pedido de apoio judiciário por carta registada expedida em 02/09/2019 e recebida pelo ISS, IP em 05/09/2019; - Por e-mail de 24/01/2020, o ISS, IP comunicou aos autos de embargos que tinha enviado ofício de audiência prévia nesse mesmo dia 24/01/2020, à requerente, aguardando resposta; - Por e-mail de 13/05/2020, o ISS, IP comunicou aos autos que, por decisão desse mesmo dia 13 de maio, tinha indeferido o pedido; - Notificada a embargante para pagar a taxa de justiça e respetiva multa, veio a mesma requerer que fossem dadas sem efeito, uma vez que o pedido de apoio judiciário tinha sido tacitamente deferido; - Em 19/12/2022, foi proferido o despacho de indeferimento do requerimento para que a exigência de taxa de justiça e multa fosse dada sem efeito, despacho ora objeto de recurso. O prazo para a conclusão do procedimento administrativo e decisão sobre o pedido de proteção jurídica é de 30 dias, é contínuo, não se suspende durante as férias judiciais e, se terminar em dia em que os serviços da segurança social estejam encerrados, transfere-se o seu termo para o 1.º dia útil seguinte – assim o estabelece o n.º 1 do artigo 25.º da LAD. Tendo o procedimento de proteção jurídica tido início em 05/09/2019, o prazo de conclusão do procedimento administrativo e decisão sobre o pedido de proteção terminou na segunda-feira, dia 7/10/2019 (o trigésimo dia tinha sido um sábado). Decorrido o prazo sem que tenha sido proferida uma decisão, considera-se tacitamente deferido e concedido o pedido de proteção jurídica – assim o impõe o n.º 2 do artigo 25.º da LAD. Nos termos do disposto no artigo 130.º, n.º 2, do Código do Procedimento Administrativo (CPA), considera-se que há deferimento tácito se a notificação do ato não for expedida até ao primeiro dia útil seguinte ao termo do prazo da decisão. Logo, o ato tácito formou-se, válida e eficazmente, em 8/10/2019. O único caso de suspensão do prazo de 30 dias para a formação do ato tácito de deferimento de apoio judiciário expressamente previsto na LAD é o do artigo 8.º-B, n.º 3: «Se todos os elementos necessários à prova da insuficiência económica não forem entregues com o requerimento de proteção jurídica, os serviços da segurança social notificam o interessado, com referência expressa à cominação prevista no número seguinte, para que este os apresente no prazo de 10 dias, suspendendo-se o prazo para a formação de ato tácito». Trata-se de uma concretização do estabelecido no artigo 130.º, n.º 3, do CPA: «O prazo legal de produção de deferimento tácito suspende-se se o procedimento estiver parado por motivo imputável ao interessado». Claro que esta notificação pelo ISS apenas pode ser feita dentro do prazo de 30 dias, após o requerimento do benefício, sendo esta norma bem reveladora da força que a lei, a LAD, conferiu ao deferimento tácito do apoio judiciário. Norma que só por si impede que a posteriori se faça tábua rasa do ato tácito em causa, indeferindo diretamente o requerimento de apoio, como se o benefício não tivesse sido deferido (tacitamente). Sobre esta questão e no mesmo sentido, o Ac. do TRP de 15/04/2010, proc. 2001/06.6TBPRD-A.P1, disponível em www.dgsi.pt (como todos os adiante citados, sem indicação de outra proveniência), com o sumário: «O disposto nos art.ºs 8.º-B, n.º 4 e 23.º, n.º 2 da Lei n.º 34/04, de 29.07, só tem aplicação dentro do prazo de 30 dias em que o art.º 25.º, n.º 1 manda concluir e decidir o procedimento administrativo, pressupondo o indeferimento a que se reportam aqueles primeiros artigos que ainda não tenha ocorrido deferimento (expresso ou tácito)». O n.º 3 do artigo 25.º da LAD estabelece que é suficiente a menção em tribunal da formação do ato tácito, ou seja, mencionando a embargante a formação do ato, e não provando o ISS ter atempadamente decidido e notificado a decisão à requerente, está deferido o apoio judiciário na modalidade requerida pela embargante. Nos termos do disposto no n.º 5 do mesmo artigo e diploma, a segurança social tem o dever de disponibilizar a informação de forma desmaterializada e em tempo real sobre a formação de atos tácitos, ou, “se isso não for possível” de enviar informação relativa ao pedido de proteção jurídica tacitamente deferido ao tribunal em que a ação se encontra, se o requerimento tiver sido apresentado na pendência de ação judicial, como foi. Esta é, sem dúvida, mais uma norma que evidencia que o deferimento tácito da LAD se forma com o decurso do respetivo prazo e é para ser levado muito a sério, não podendo a segurança social ulteriormente pronunciar-se sobre o requerimento de apoio como se não o tivesse feito antes, tacitamente. O não cumprimento das normas do n.º 5 do artigo 25.º da LAD pelo ISS não pode trazer qualquer prejuízo ao particular. A LAD diz como deve o tribunal proceder quando o ISS não cumpre com o referido dever de informação por nenhuma das formas estabelecidas no n.º 5: o tribunal deve confirmar junto dos serviços da segurança social a formação do ato tácito, devendo estes serviços responder no prazo máximo de dois dias úteis (assim o impõe o n.º 4 do artigo 25.º da LAD). Quer isto dizer que, se o ISS tiver decidido dentro do prazo legal de 30 dias (contado conforme determina o artigo 25.º da LAD) e expedido a notificação do ato até ao primeiro dia útil seguinte ao termo do prazo da decisão (artigo 130.º, n.º 2, do CPA), eventualmente acrescido da suspensão a que alude o n.º 3 do artigo 8.º-B, da LAD, o ISS terá oportunidade de informar o tribunal e de fazer valer a sua decisão expressa. Se ela não tiver existido e/ou não tiver sido comunicada nos termos da lei, formou-se o deferimento tácito. O que é que devia o tribunal a quo ter feito após o decurso do prazo de formação do ato tácito? Oficiar ao ISS para que este informasse e provasse a decisão expressa e a sua notificação atempada à embargada e/ou que, eventualmente, informasse e provasse a suspensão do prazo de formação do deferimento tácito e a duração da suspensão (suspensão que, por definição e por força da lei, nomeadamente dos artigos 8.º-B, n.º 3, da LAD, 130.º, n.º 3, do CPA, apenas pode iniciar-se dentro do prazo inicial). Ora, não demonstrando o ISS a produção do ato expresso e da sua notificação atempada, tinha o tribunal a quo de, em obediência às normas da LAD sobre a formação do deferimento tácito, reconhecer a sua formação. Da mesma forma que teria de reconhecer e acatar o ato expresso de deferimento de apoio judiciário, sendo desconcertante a afirmação do tribunal a quo no despacho recorrido de que «não cabe na competência deste Tribunal apreciar a formação de ato tácito». Sabemos que há jurisprudência de apoio a esta ideia, mas que a tem afirmado de forma mais ou menos tabelar, sem convincente discussão das normas do ordenamento que têm de ser convocadas para o efeito. O deferimento tácito da LAD é uma das várias concretizações, existentes no ordenamento jurídico, do ato tácito previsto no artigo 130.º do CPA: existe deferimento tácito quando a lei ou regulamento determine que a ausência de notificação da decisão final sobre pretensão dirigida a órgão competente dentro do prazo legal tem o valor de deferimento (n.º 1 do artigo 130.º do CPA, ênfases acrescentadas). Lê-se no n.º 2 do mesmo artigo do CPA, que se considera que há deferimento tácito se a notificação do ato não for expedida até ao primeiro dia útil seguinte ao termo do prazo da decisão. O prazo legal de produção de deferimento tácito apenas se suspende se o procedimento estiver parado por motivo imputável ao interessado e só se interrompe com a notificação de decisão expressa (n.º 3 do artigo 130.º do CPA). No caso de requerimento de apoio judiciário, se não forem entregues com o requerimento de proteção jurídica todos os elementos necessários à prova da insuficiência económica, os serviços da segurança social notificam o interessado para que este os apresente no prazo de 10 dias, suspendendo-se o prazo para a formação de ato tácito (n.º 3 do artigo 8.º-B da LAD). No caso, o prazo decorreu totalmente sem causas de suspensão ou interrupção. O ato tácito de deferimento do apoio judiciário requerido pela embargante formou-se, pois, válida e eficazmente na ordem jurídica. Questão que em seguida se suscita é a de saber se o dito deferimento tácito de apoio judiciário se tornou ineficaz com a decisão de indeferimento expresso que o ISS veio a produzir meses depois – na sequência de, também meses depois da formação do deferimento tácito, ter notificado a embargante para apresentar outros meios de prova. Adiantando, desde já, que essa decisão foi proferida, não em revogação ou cancelamento do benefício concedido por deferimento tácito (cf. artigo 167.º do CPA e artigo 10.º da LAD), mas em pronúncia direta sobre o requerimento inicial, como se não tivesse existido deferimento tácito ou, o que vem a dar no mesmo, como se as leis que determinam a formação e as consequências do deferimento tácito, não existissem. Para responder a esta sequente questão é importante ter presente os regimes que permitem a destruição dos efeitos dos atos administrativos. 3. Da subsistência do deferimento tácito dos autos na ordem jurídica 3.1. Destruição dos efeitos dos atos administrativos em geral: anulação e revogação Quer se entenda o deferimento tácito como ato administrativo voluntário ou como ficção legal, aplicam-se-lhe as normas do ato expresso (ressalvadas aquelas que se tornam de aplicação impossível, como as relativas à forma, formalidades e consequências da falta de observância das mesmas) que permitem a sua revogação ou anulação. Com já tivemos ocasião de referir, o regime dos atos tácitos não é único. No ordenamento vigente (que já não contempla atos tácitos de indeferimento, ao contrário do que sucedia no CPA de 1991), preveem-se dois tipos de atos tácitos: - Os deferimentos tácitos, previstos nos primeiros três números do artigo 130.º do CPA; e - As autorizações prévias ou aprovações interorgânicas (n.ºs 4 e 5 do artigo 130.º do CPA), de entidades em exercício de poderes públicos, para que uma outra entidade pratique um ato administrativo. Estas últimas são atos tácitos que produzem efeitos (pelo menos diretos) sobre entidades administrativas, e não sobre particulares. Relativamente a estas últimas, o CPA é suficientemente denso no seu regime. Lembramos a propósito as palavras de Freitas do Amaral (ob. cit., p. 302): «Infelizmente, porém, o Código apenas disciplina a produção de deferimento tácito nas relações interorgânicas: “quando a prática de um ato administrativo dependa de autorização prévia ou um ato esteja sujeito à aprovação de um órgão da Administração Pública ou de outra entidade no exercício de poderes públicos, prescinde-se da autorização prévia ou da aprovação desde que o órgão que as solicitou tenha interpelado o órgão competente para as emitir”, uma vez decorridos dez dias sobre o termo do prazo para a autorização ou aprovação, devendo o órgão competente, nesse caso, emiti-las no prazo de vinte dias” (CPA, art.º 130.º, n.ºs 4 e 5).» No que respeita aos deferimentos tácitos, o CPA não é tão denso, havendo que procurar nas leis que atribuem significado ao silêncio/inércia da Administração o respetivo regime. Debalde se encontra no CPA um regime aplicável a todos os deferimentos tácitos além dos aspetos constantes dos n.ºs 2 e 3 do artigo 130.º do CPA, relativos ao dia da formação do ato e à suspensão e interrupção do prazo legal de produção do deferimento tácito. O lamento do Autor (ou Autores, pois trata-se de obra com colaboração de outros dois administrativistas), no parágrafo transcrito que se inicia com «Infelizmente», é bem certo no que se refere ao ato tácito em geral, previsto no CPA. Depois, leis há que disciplinam a produção do deferimento tácito nas situações típicas a que se reportam, sendo esse o caso da LAD, que expressamente regula a força e o modo como opera o deferimento tácito do requerimento de apoio judiciário. Dentro do universo dos atos tácitos do ordenamento vigente apenas nos interessam os deferimentos tácitos de requerimentos submetidos por particulares à entidade pública competente para os decidir. Após explicitar as condições de produção do ato tácito, escreve Freitas do Amaral (ob. cit., p. 303): «Como princípio geral, estes atos estão sujeitos ao regime dos atos constitutivos de direitos, que adiante teremos oportunidade de analisar com o devido desenvolvimento» (ênfases acrescentadas). Os deferimentos tácitos podem ser objeto de uma decisão de revogação desde que se verifiquem os respetivos pressupostos legais, constantes do artigo 167.º do CPA. A revogação é o ato administrativo que determina a cessação dos efeitos de outro ato, por razões de mérito, conveniência ou oportunidade (artigo 165.º, n.º 1, do CPA). Nesta matéria, verificou-se alteração terminológica do CPA de 1991 para o CPA de 2015 – antes, nos artigos 140.º e 141.º, dispunha-se sobre «revogabilidade dos atos válidos» (correspondente à revogação do artigo 167.º do CPA de 2015) e sobre «revogabilidade dos atos inválidos» (correspondente à anulação administrativa do atual artigo 168.º do CPA de 2015), que a doutrina também designava por «revogação anulatória». Antes como agora, no universo dos atos válidos era relevante a contraposição entre atos administrativos constitutivos de direitos (ou interesses legalmente protegidos) – atos que são favoráveis aos interessados e tendem a consolidar na esfera jurídica destes situações de vantagem – aos atos administrativos não constitutivos de direitos, e os primeiros, antes como agora, apenas podiam ser revogados em circunstâncias muito limitadas (sobre o tema, à luz do CPA de 1991, João Caupers, «O regime de revogação no CPA: uma revisão conveniente», Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 82, jul.-ag. de 2010, pp. 69-73). Relembramos que, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 167.º do CPA, os atos constitutivos de direitos só podem ser revogados: «a) Na parte em que sejam desfavoráveis aos interesses dos beneficiários; b) Quando todos os beneficiários manifestem a sua concordância e não estejam em causa direitos indisponíveis; c) Com fundamento na superveniência de conhecimentos técnicos e científicos ou em alteração objetiva das circunstâncias de facto, em face das quais, num ou noutro caso, não poderiam ter sido praticados; d) Com fundamento em reserva de revogação, na medida em que o quadro normativo aplicável consinta a precarização do ato em causa e se verifique o circunstancialismo específico previsto na própria cláusula». O elenco deste n.º 2 é taxativo (Fernando Gonçalves et al., Novo Código do Procedimento Administrativo Anotado e Comentado, 8.ª ed., Almedina, 2023, p. 470; Cabral de Moncada, Código do Procedimento Administrativo Anotado, cit., pp. 621). O ato tácito que se formou no caso sub judice é um ato constitutivo de direitos totalmente favorável à interessada, ora recorrente. Conforme refere Freitas do Amaral, ob. cit., p. 387-393, «o legislador considera que são de revogação condicionada – isto é, só possível dentro de certas condições – os “atos constitutivos de direitos”». Prossegue (p. 388): «Para este efeito, consideram-se «constitutivos de direitos» os atos administrativos que atribuam ou reconheçam situações jurídicas de vantagem ou eliminem ou limitem deveres, ónus, encargos as sujeições, salvo quando a sua precariedade decorra da lei ou da natureza do ato (CPA, art.º 167.º, n.º 3). Assim, de acordo com a lei, esses atos atribuíram posições jurídicas subjetivas de vantagem a particulares (direitos subjetivos ou interesses legalmente protegidos). A partir desse momento, as pessoas a quem tais posições jurídicas foram conferidas têm o direito de poder confiar na palavra dada pelos órgãos administrativos e têm o poder de desenvolver a sua vida jurídica com base nas posições jurídicas de que são legitimamente titulares. Efetivamente, e como sublinha Gomes Canotilho, o princípio da confiança (que se filia, em última análise, no princípio do Estado de Direito, consagrado, genericamente no art.º 2.º da Constituição de 1976), postula que os cidadãos têm o direito de poder confiar em que às decisões públicas incidentes sobre os seus direitos ou posições jurídicas, alicerçadas em normas jurídicas vigentes e válidas, se ligam os efeitos jurídicos previstos e prescritos por essas normas». Idêntica doutrina, que se nos afigura clara e totalmente consentânea com a lei aplicável ao caso dos autos, está bem explicada por Luiz S. Cabral de Moncada, Código do Procedimento Administrativo Anotado, cit., pp. 617-627 (os parágrafos a seguir citados são das pp. 619 a 622): «Contrariamente ao que sucedia no anterior Código, o novo fornece-nos pela primeira vez uma noção de actos constitutivos de direitos, bandeira da irrevogabilidade. Assim é que para efeitos de revogação e de anulação administrativas, versadas na Secção IV em análise, actos constitutivos de direitos são, de acordo com o n.° 3, os que atribuam ou reconheçam situações jurídicas de vantagem ou eliminem ou limitem deveres, ónus, encargos ou sujeições. Compreendem três situações; as que atribuem um direito novo, as que ampliam um direito preexistente e as que libertam o particular de uma restrição. A noção é ampla compreendendo actos vinculados e discricionários com fonte legislativa ou equiparada, de natureza constitutiva ou meramente declarativa, o que é muito importante pois que leva em consideração os efeitos vantajosos que dos actos com esta última natureza decorrem e não apenas dos de natureza constitutiva propriamente dita. Claro está que o acto constitutivo não se limita ao subsídio ou subvenção oriundo de fundos europeus ou nacionais; é muito mais lato. Graças ao acto constitutivo o seu beneficiário fica constituído numa situação jurídica activa que pode ser ou não um direito. Se estiver de boa-fé pode ainda contar com a respectiva estabilidade. (…) 2.2. A noção de actos constitutivos de direitos é um limite à revogação. É um directo reflexo da protecção constitucional e legislativa dos direitos dos interessados. Os actos constitutivos de direitos são todos aqueles que constituíram a título adequado (que pode ser qualquer elemento do bloco da legalidade vinculativo, de acordo com o amplo critério germânico da «norma de protecção») uma situação de vantagem, como se viu. A eliminação da irrevogabilidade dos actos constitutivos de interesses legalmente protegidos, que constava do anterior Código, só pode ser assim interpretada, porque o contrário seria retirar da zona da irrevogabilidade mais actos favoráveis aos particulares e aos interessados em geral do que aqueles que o código anterior previa, o que não faz sentido. Não pode, portanto, a Administração portuguesa deleitar-se com a convicção que agora pode revogar mais actos favoráveis aos particulares do que aqueles que lhe era possível revogar anteriormente só porque a lei não prevê expressamente a irrevogabilidade dos actos constitutivos de interesses legalmente protegidos. 2.3. Em que circunstâncias ou melhor, sob que condicionalismos, é que a Administração pode revogar actos constitutivos de direitos? Note-se que falamos só dos actos constitutivos que foram gizados ao abrigo de poderes discricionários porque se o foram ao abrigo de poderes vinculados a respectiva irrevogabilidade é uma consequência do n.° 1 do artigo em análise. A lei prevê e com alcance taxativo 4 casos de revogabilidade. O primeiro consta da alínea a) do n.º 2 e é o dos actos (constitutivos) na parte em que que sejam desfavoráveis aos interesses dos beneficiários, como constava do anterior Código. A norma admite claramente que o acto constitutivo de direitos seja parcialmente favorável ao interessado mas que apresente, parcialmente também, conteúdo desfavorável, um ónus resultante de um modo, p. ex. Nesta parte é livremente revogável. Naturalmente que o interessado pode requerer à Administração a revogação da parte do acto que o prejudica. Seguem-se os termos normais do procedimento de iniciativa particular. O segundo consta da alínea b). Trata-se dos actos administrativos constitutivos de direitos a cuja revogação os beneficiários deram em concreto a sua concordância e, cumulativamente, não estejam em causa direitos por eles indisponíveis. Vale aqui a regra volenti non fit iniuria. Naturalmente que o interessado só concordará com a revogação se não ficar prejudicado. Mas podia o legislador ter ido mais longe e prever a hipótese de uma indemnização para o caso em que o interessado ficou prejudicado, apesar de concordar, o que revelaria sensibilidade para a situação em que o interessado está frequentemente colocado de se ver compelido a aceitar actos parcialmente prejudiciais tal é sua dependência da decisão. Quer num caso que no outro a Administração pode e deve levar em conta na decisão de revogação não apenas os interesses dos directamente visados pelo acto constitutivo mas também os dos contrainteressados. Note-se que os directamente interessados na revogação e os contrainteressados não dispõem de um direito à revogação do acto administrativo constitutivo naquelas condições. Esta releva dos poderes discricionários da Administração como resulta do termo podem constante do n.º 2. Em caso de não revogação a tutela contenciosa não é impossível nem deslocada mas não parece muito votada ao sucesso. O terceiro caso de revogabilidade de acto constitutivo é novo e consta da alínea c). A Administração pode discricionariamente revogar com dois novos fundamentos que do anterior Código não constavam; superveniência de conhecimentos técnicos e científicos e alteração objectiva das circunstâncias de facto, desde que, em ambos os casos, se hoje tais conhecimentos e circunstâncias estivessem presentes, a prática do acto não seria possível. A interpretação desta norma retirada do direito estrangeiro é muito complexa. Com efeito, a revogação do acto nestes casos assenta mais em objectivos considerandos técnicos e na alteração das circunstâncias do que em razões de simples conveniência. Simples razões de mérito não chegam para a revogação. (…) Por último, o quarto caso de revogabilidade do acto constitutivo de direitos é o da alínea d) e compreende a revogação com fundamento em reserva de revogação, desde que o quadro normativo aplicável consinta a precarização do ato em causa e se verifique o circunstancialismo especifico previsto na própria cláusula. Mais um caso em que a lei prevê expressamente a natureza precária do acto constitutivo. O regime respectivo, dada a sua complexidade, será abordado à parte. Neste caso a revogação pode ter ou não natureza sancionatória. (…)». O ato tácito de deferimento de apoio judiciário em causa nos autos não apenas se formou, válida e eficazmente, mas também não foi alvo de um ato (expresso) de revogação, nem tão-pouco se verificam os requisitos do CPA necessários à sua revogação. 3.2. Da revogação ou cancelamento do apoio judiciário nos termos da LAD A LAD contém regras especiais para a revogação da proteção jurídica, que se encontram nos artigos 10.º e 13.º. Nos termos do disposto no artigo 10.º, n.º 1, da LAD, a proteção jurídica é cancelada, quer na sua totalidade quer relativamente a alguma das suas modalidades: a) Se o requerente ou o respetivo agregado familiar adquirirem meios suficientes para poder dispensá-la; b) Quando se prove por novos documentos a insubsistência das razões pelas quais foi concedida; c) Se os documentos que serviram de base à concessão forem declarados falsos por decisão com trânsito em julgado; d) Se, em recurso, for confirmada a condenação do requerente como litigante de má fé; e) Se, em ação de alimentos provisórios, for atribuída ao requerente uma quantia para custeio da demanda; f) Se o requerente a quem tiver sido concedido apoio judiciário em modalidade de pagamento faseado não proceder ao pagamento de uma prestação e mantiver esse incumprimento no termo do prazo que lhe for concedido para proceder ao pagamento em falta acrescido de multa equivalente à prestação em falta. As referidas causas de «cancelamento» podem agrupar-se da seguinte forma: - Alteração das circunstâncias (de insuficiência económica) que fundamentaram a concessão do benefício (alíneas a) e e)); - Conhecimento superveniente, por novos documentos ou pela declaração de falsidade dos que fundamentaram a concessão do benefício, da falta de fundamento (insuficiência económica) da concessão do benefício (alíneas b) e c)); - Razões externas ao fundamento de concessão do benefício (insuficiência económica), relacionadas com ato censurável do beneficiário (litigância de má fé e incumprimento do benefício concedido). O cancelamento é um incidente do procedimento de proteção jurídica, competindo, como tal, aos serviços da segurança social que atribuíram o benefício (Salvador da Costa, Apoio Judiciário, 10.ª ed., Almedina, 2021, p. 42 - «O artigo em analise versa sobre um incidente cujo objeto é a revogação da proteção jurídica…»). Pode ser determinado oficiosamente ou por requerimento do Ministério Público, da Ordem dos Advogados, da parte contrária, do patrono nomeado ou do agente de execução atribuído (n.º 3 do artigo 10.º da LAD); o requerente de proteção jurídica é sempre ouvido (n.º 4 do mesmo artigo e diploma). Claramente, a concessão de apoio judiciário por deferimento tácito do respetivo requerimento não foi (expressamente) alvo de cancelamento, nem havia fundamento para o ser, pois o indeferimento de apoio judiciário dos autos não se enquadra em nenhuma das alíneas do n.º 1 do artigo 10.º. A latere, lembramos que, mesmo que o apoio judiciário se mantenha durante todo o processo, se se vier a verificar que o requerente de proteção jurídica possuía, à data do pedido, ou adquiriu no decurso da causa ou no prazo de quatro anos após o seu termo, meios económicos suficientes para pagar honorários, despesas, custas, imposto, emolumentos, taxas e quaisquer outros encargos de cujo pagamento haja sido declarado isento, o Ministério Público deve instaurar ação para cobrança das respetivas importâncias (o que pode também ser feito por qualquer outro interessado) – cf. artigo 13.º, n.º 1, da LAD. 3.3. Da revogabilidade implícita de atos tácitos, em geral, e do cancelamento implícito do apoio judiciário tacitamente deferido, em especial Em geral, a revogação implícita de atos administrativos é uma possibilidade; há revogação implícita quando o ato revogatório, não fazendo referência ao ato revogado, gera efeitos incompatíveis com este. A revogação implícita de atos tácitos positivos, está prevista e estudada na literatura da especialidade (v.g., Cabral Moncada, ob. cit., p. 611; José Osvaldo Gomes, Revogação implícita de actos tácitos positivos, Lisboa, Sep. BMJ 294, 1980, do mesmo autor, «Acto Tácito de Deferimento - Revogação Implícita», Revista da Ordem dos Advogados, A. 46, I, abril 1986). Já a anulação administrativa é o ato administrativo que determina a destruição dos efeitos de outro ato, com fundamento em invalidade (artigo 165.º, n.º 2, do CPA); os seus pressupostos constam do artigo 168.º do CPA. Para que essa anulação se produza, tem necessariamente de se apreciar o ato a anular, pelo que dificilmente se concebe uma «anulação implícita». Sobre a anulação, Marco Caldeira, «A figura da “Anulação Administrativa” no novo Código do Procedimento Administrativo de 2015» (in Comentários ao Novo Código do Procedimento Administrativo, II, Carla Amado Gomes, Ana F. Neves e Tiago Serrão (coord.), AAFDL Editora, pp. 641-678), sem que neste estudo haja qualquer referência à possibilidade de anulação implícita. Não obstante, no Ac. do TCAS de 05/07/2017, proc. 10240/13.7BCLSB-A, o ato expresso de indeferimento de apoio judiciário – que não apreciou da validade do deferimento tácito, tendo apenas ignorado a sua existência –, foi qualificado como de anulação do deferimento tácito do mesmo apoio, tendo o TCAS admitido a validade do novo ato expresso por estarem verificados os pressupostos da anulação, nomeadamente o prazo em que ela deve processar-se. Apesar dessa qualificação, na fundamentação do mesmo acórdão lê-se (sublinhado nosso): «A revogação implícita é admitida na doutrina [cfr. Marcello Caetano, cit., págs. 531 e 552, Robin de Andrade, A Revogação dos Actos Administrativos, 2.ª ed., 1985, págs. 37 a 40, Mário Esteves de Oliveira, Direito Administrativo, Vol. I, 2.ª reimp., 1984, págs. 614-615, Osvaldo Gomes, Revogação Implícita dos Actos Tácitos Positivos, Separata do BMJ n.º 294 (onde claramente admite que a revogação implícita possa abranger os atos tácitos positivos), e Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, cit., págs. 667 a 669] e largamente aceite na jurisprudência (…)». Concentremo-nos, pois, na revogação. No ordenamento vigente, uma revogação implícita apenas será válida se respeitar os requisitos da revogação explícita, que se encontram no artigo 167.º do CPA – e assim será por maioria de razão. Os tribunais administrativos têm aceitado a revogação implícita de atos tácitos positivos, desde que se verifiquem os respetivos pressupostos (da revogação); ocasionalmente qualificou-se o ato expresso contrário ao anterior deferimento tácito como anulação implícita, exigindo-se nesse caso os pressupostos da anulação. Ou seja, para que o ato tácito se considere implicitamente revogado (ou implicitamente anulado), sempre terão de se verificar os respetivos pressupostos. Alguns exemplos: Ø Ac. do TCAS de 21/01/2021, proc. 1512/20.5BELSB, tendo no caso persistido o ato tácito, por inexistência dos pressupostos da revogação, extratando-se do seu sumário: «IV – O indeferimento expresso do pedido de proteção internacional após a formação de um deferimento tácito relativamente à admissibilidade do pedido de proteção internacional constitui uma revogação implícita daquele ato anterior; V- O deferimento tácito relativamente à admissibilidade do pedido de proteção internacional constitui um ato constitutivo de direitos cuja revogação deve cumprir os pressupostos do art.º 167.º, n.º 2, do CPA». => Ac. do TCAN, de 07/05/2021, proc. 00643/17.3BEPNF, com o sumário: «I- A anulação administrativa é o ato que determina a destruição do efeitos jurídicos de outro ato administrativo anterior, com fundamento na sua invalidade; II- A anulação administrativa só será legal e terá condições de se consolidar na ordem jurídica se observar os condicionalismos temporais previstos no art. 168º do CPA de 2015; III- Assumindo o ato expresso um conteúdo incompatível com o conteúdo do ato tácito anterior, tem de se considerar que aquele procedeu implicitamente à destruição dos efeitos do ato tácito com fundamento em invalidade.» => Ac. do STA de 04/10/2017, lendo-se no ponto IV do sumário: «IV - A circunstância de o ato expresso de indeferimento do pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais ter sido emitido depois do seu deferimento tácito, confere-lhe uma dimensão revogatória implícita, por substituição, pelo que o prazo para essa revogação é de um ano contado da data em que se formou o deferimento tácito, em conformidade com o disposto nos art.ºs 140.º e 141.º do CPA, subsidiariamente aplicáveis por força do preceituado nos art.ºs 2.º, alínea c), da LGT e 2.º, alínea d), do CPPT, em conjugação com o disposto no art.º 58.º do CPTA.» => Ac. do STA de 17/02/1998, proc. 042176, de cujo sumário se extrata: «II - A revogação implícita, decorrente da incompatibilidade que existe entre a nova regulamentação jurídica de um caso concreto e os efeitos de direito que resultam de um ato anterior é admissível e suscetível de abranger os atos tácitos positivos. III - O prazo para a revogação de atos constitutivos de direito, mesmo no âmbito da legislação anterior ao CPA, era o de um ano, correspondente ao prazo que o M.P. dispunha para a interposição do recurso contencioso.» Transpondo esta doutrina e jurisprudência para o deferimento tácito do apoio judiciário, diremos que tal ato tácito pode ser cancelado/revogado, mesmo implicitamente (ou seja, por decisão de indeferimento do apoio judiciário que recai diretamente sobre o requerimento inicial, como se não existisse deferimento tácito), desde que se verifique algum dos pressupostos do cancelamento. A jurisprudência publicada dos tribunais judiciais superiores sobre o deferimento tácito do apoio judiciário tem, em geral, admitido a sua revogação implícita. Também assim Salvador da Costa (Apoio Judiciário, cit., p. 89): «essa ficção em que se traduz o deferimento tácito do pedido de proteção jurídica não se sobrepõe em regra, à concreta decisão dos serviços de segurança social no sentido do seu indeferimento». Ora, tal «concreta decisão», como vimos, apenas deveria existir em revogação/cancelamento do ato tácito, se se verificassem os seus pressupostos e, no caso em apreço, não se verificam. 3.4. Da invalidade do indeferimento expresso de apoio judiciário dos autos e suas consequências Aqui chegados, e como fomos dizendo, impõe-se concluir que o ato (expresso) de indeferimento do pedido de apoio judiciário, que implicitamente revogou o benefício tacitamente concedido (pois, sobre o mesmo requerimento, produziu uma decisão contrária), sem que se verificasse qualquer das situações tipificadas na lei como pressuposto da revogação ou cancelamento, viola a lei. A violação de lei é «o vício que consiste na discrepância entre o conteúdo ou o objeto do ato e as normas jurídicas que lhes são aplicáveis»; «configura uma ilegalidade de natureza material: neste caso, é a própria substância do ato administrativo, é a decisão em que o ato consiste, que contraria a lei»; falta «correspondência entre a situação abstratamente delineada na norma e os pressupostos de facto e de direito que integram a situação concreta sobre a qual a Administração age» (Freitas do Amaral, Manual…, cit., pp. 345-346). Sucede, porém, que os atos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou outras normas jurídicas aplicáveis, para cuja violação se não preveja outra sanção, são anuláveis (assim o estabelece o n.º 1 do artigo 163.º do CPA). Os atos nulos são apenas aqueles para os quais a lei comine expressamente essa forma de invalidade (n.º 1 do artigo 161.º do CPA). O n.º 2 do artigo 161.º contém a seguinte lista de atos nulos: a) Os atos viciados de usurpação de poder; b) Os atos estranhos às atribuições dos ministérios, ou das pessoas coletivas referidas no artigo 2.º, em que o seu autor se integre; c) Os atos cujo objeto ou conteúdo seja impossível, ininteligível ou constitua ou seja determinado pela prática de um crime; d) Os atos que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental; e) Os atos praticados com desvio de poder para fins de interesse privado; f) Os atos praticados sob coação física ou sob coação moral; g) Os atos que careçam em absoluto de forma legal; h) As deliberações de órgãos colegiais tomadas tumultuosamente ou com inobservância do quórum ou da maioria legalmente exigidos; i) Os atos que ofendam os casos julgados; j) Os atos certificativos de factos inverídicos ou inexistentes; k) Os atos que criem obrigações pecuniárias não previstas na lei; l) Os atos praticados, salvo em estado de necessidade, com preterição total do procedimento legalmente exigido. Não conseguimos, em rigor, subsumir o ato de indeferimento (claramente ilegal, por tudo quanto acima ficou expresso), que implicitamente revogou o deferimento tácito, em nenhuma dos descritos casos de nulidade. Tão-pouco encontramos outra norma que comine o referido ato com nulidade. Em Direito Administrativo, por força do disposto nos artigos 161.º e 163.º do CPA, o ato contrário às normas jurídicas aplicáveis é, em regra, meramente anulável; «a regra no Direito Administrativo português é de que um ato administrativo inválido é anulável; só excecionalmente – isto é, nos casos expressamente previstos na lei – é que o ato inválido é nulo»; «se ao fim de um certo prazo ninguém pedir a sua anulação, nem o mesmo for anulado por iniciativa da própria Administração, ele converte-se num ato válido, isto é, fica sanado» (Freitas do Amaral, Manual…, cit., pp. 360). A destruição dos efeitos do ato administrativo anulável exige a anulação do ato por decisão proferida pelos tribunais administrativos ou pela própria Administração, na sequência de impugnação perante a própria Administração ou perante o tribunal administrativo competente, dentro dos prazos legalmente estabelecidos (sem prejuízo da possibilidade de anulação oficiosa pela Administração) – n.ºs 2 e 3 do artigo 163.º do CPA. Sendo o ato anulável, o mesmo produz efeitos jurídicos como se fosse válido até ao momento em que seja anulado; a anulabilidade é sanável; o ato anulável é obrigatório enquanto não for anulado; apenas pode ser impugnado dentro de certo prazo, normalmente curto; o pedido de anulação só pode ser feito perante um tribunal administrativo (Freitas do Amaral, Manual…, cit., pp. 358-359). Diferente seria se o ato fosse nulo, pois nesse caso não produziria quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade (n.º 1 do artigo 162.º do CPA); e a nulidade seria invocável a todo o tempo por qualquer interessado e poderia, também a todo o tempo, ser conhecida por qualquer autoridade ou tribunal (e não apenas pelos tribunais administrativos ou pelos órgãos administrativos competentes para a anulação) – n.º 2 do artigo 162.º do CPA. Quando conhecido por qualquer autoridade ou tribunal, «está em causa um conhecimento incidental da nulidade do ato, que tem como consequência a desconsideração dos seus efeitos numa dada situação e apenas com referência a essa situação» (Freitas do Amaral, Manual…, cit., pp. 357). Porquanto dissemos, o ato era meramente anulável, pelo que a sua anulação teria exigido que a ora recorrente o tivesse impugnado (concretamente nos termos previstos nos artigos 27.º e 28.º da LAD, também aplicáveis à decisão de cancelamento, por via do artigo 12.º da mesma lei). A necessidade de impugnação do ato expresso em casos análogos tem sido maioritariamente afirmada pela jurisprudência (v.g.: Acórdãos do TRP de 09/04/2013, proc. 934/11.7TBMTS-C.P1, TRE de 30/06/2015, proc. 169/13.4PAOLH-A.E1, TRL de 19/04/2016, proc. 47718/15.0YIPRT-A.L1-7, TRP de 13/07/2016, proc. 1829/15.0T8PNF (este disponível em https://outrosacordaostrp.com), TRG de 14/11/2019, proc. 185/19.2T8VCT-A.G1, TRL de 27/10/2020, proc. 1320/12.7TBMTA.L1-1, e TRL de 31/03/2022, proc. 6908/18.0T8SNT-A.L1). No sentido da prescindibilidade da ação de impugnação, os Acórdãos do TRL de 21/06/2011, proc. 6650/07.7TDLSB.L1-5, e do TRG de 18/06/2013, proc. 351/11.9TBGMR-B.G1, com os quais não concordamos apenas porque o ato expresso de indeferimento do apoio judiciário, com revogação implícita do deferimento tácito existente, sem que se verifiquem os pressupostos legais da revogação, é meramente anulável e não nulo. IV. Decisão Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, mantendo a decisão recorrida, ainda que com outros fundamentos. Custas pela recorrente. Lisboa, 14/12/2023 Higina Castelo Inês Moura Laurinda Gemas |