Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
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| Relator: | ARMANDO AZEVEDO | ||
| Descritores: | ALCOOLÍMETRO VERIFICAÇÃO PERIÓDICA PRAZO DE VALIDADE | ||
| Nº do Documento: | RG | ||
| Data do Acordão: | 09/30/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
| Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
| Indicações Eventuais: | SECÇÃO PENAL | ||
| Sumário: | Atualmente, relativamente ao prazo da verificação dos alcoolímetros, importa ter presente o nº 3 do artigo 8º e os nºs 3 e 4 do artigo 9º artigo do DL nº 29/2022, de 07 de abril, os quais remetem para a regulamentação específica aplicável, ou seja, para os artigos 7º ( primeira verificação) e 8º (verificação periódica) da Portaria nº 366/2023, de 15 de novembro, dos quais resulta serem as mesmas válidas durante um ano após a sua realização, assim ficando ultrapassadas, face à letra da lei, as divergências verificadas na jurisprudência no âmbito da lei anterior, ou seja, a propósito da interpretação dos dizeres “ A verificação periódica é anual” constante do artigo 7º, nº 2 da Portaria nº 1556/2007, de 10.12. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I- RELATÓRIO 1. No processo sumário nº 78/25.4GAVNC, do Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo Juízo de Competência Genérica de Vila Nova de Cerveira, em que em que é arguido AA, por sentença de 25.03.2025, depositada na mesma data, foi decidido condenar o arguido pela prática, em 09.03.2025, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. nos artigos 292º, n.º 1, e 69º, n.º 1, al. a), ambos do Código Penal, na pena principal de 60 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de €5,00 (cinco euros), e na pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor por 3 (três) meses [cf. artigo 69º, n.º 1, al. a), do Código Penal]. 2. Não se conformando com a mencionada decisão, dela interpôs recurso o arguido, formulando as seguintes conclusões (transcrição)[1]: 1ª) O presente recurso tem por objeto a Sentença proferida nos autos em 25-03-2025, com a qual não concorda o ora recorrente, impondo-se assim, no entender deste, e com o devido respeito, a sua revogação e substituição, nos termos de seguida devidamente expostos e fundamentados. 2ª) Os factos (bem como a respetiva fundamentação decisória), que o tribunal “a quo” veio a considerar como provados, são os constantes da sentença oralmente proferida em 25-03-2025, e que se encontram gravados na plataforma Citius, factos esses que aqui se consideram integralmente reproduzidos para os devidos efeitos processuais, e nomeadamente para os efeitos do presente recurso. 3ª) O recorrente, com o devido respeito por opinião diversa, não concorda com a sua condenação nos presentes autos, impugnando a supra descrita matéria de facto que veio a ser considerada como provada pelo tribunal, em tudo o que respeite, direta ou indiretamente, à sua responsabilização pelo crime de que vem acusado neste processo, ou seja, pela prática em autoria material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art. 292º do Código Penal. 4ª) Assim, e no que diz respeito ao alcoolímetro que foi utilizado no caso em concreto, isto é, o alcoolímetro Drager Alcotest 7510 PT (com o nº ...16), é entendimento do recorrente que tal aparelho não era passível de validação da sua utilização e dos seus resultados qualitativos à data dos factos a que se refere o auto de notícia e respetiva acusação, ocorridos em 09-03-2025, acompanhando-se aqui de muito perto o decidido em caso idêntico ao dos autos no douto ACÓRDÃO DA RELAÇÃO DO PORTO DE 19-12-2023, proferido no processo nº 216/23.1GBAND.P1, e supra transcrito no essencial para o que deverá merecer a atenção no presente recurso. 5ª) De modo idêntico ao decidido naquele ACÓRDÃO DA RELAÇÃO DO PORTO DE 19-12-2023, no presente caso, unicamente tendo em conta naturalmente as diferentes datas dos factos da acusação, estamos perante um caso de prova ilegal no que diz respeito ao resultado obtido de taxa de álcool no sangue do recorrente, não sendo válido o resultado obtido através do aparelho em questão bem como o valor probatório respetivo, ou seja: como o aparelho (alcoolímetro) a que se reporta o presente processo foi utilizado para além da data de 31-12-2024, sem que tivesse havido outro controlo metrológico, a taxa de álcool no sangue de que vem acusado o arguido e que foi tomada em consideração na sentença constitui prova ilegal proibida. 6ª) O que, no entender do recorrente, deverá, pois, conduzir inevitavelmente à sua absolvição nos presentes autos. 7ª) Cabendo, ainda, por fim, invocar aqui o princípio da presunção de inocência constante do artigo 32.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, bem como ainda do princípio “in dúbio pro reo” (correlato processual daquele princípio da presunção de inocência), o qual estabelece que na decisão de factos incertos a dúvida favorece o arguido, ou seja, o julgador deve valorar sempre em favor do arguido um “non liquet”, o que deverá, precisamente, suceder no presente caso, conduzindo à absolvição do arguido dos factos que lhe são imputados. 8ª) A douta sentença recorrida violou, pois, no entender do recorrente, o disposto no artigo 32º/2 da Constituição, bem como ainda no artigo 292º do Código Penal, e nos artigos 153º e 158º do Código da Estrada. 9ª) Consequentemente, deverá ser revogada a mencionada sentença proferida, sendo a mesma substituída por outra que declare a absolvição do arguido, com o que se fará JUSTIÇA! 3. A Exma. Senhora Procuradora da República, na primeira instância, respondeu ao recurso interposto pelo arguido, sem formular conclusões, pugnando no sentido de que o mesmo seja julgado improcedente. 4. Nesta instância, a Exma. Senhora Procuradora - Geral Adjunta emitiu parecer, tendo concluído, aduzindo que (transcrição): “(…) no referido cenário legal e tendo em conta a concreta factualidade provada, inexistiria qualquer impedimento à valoração da prova pericial questionada pelo recorrente. Como sublinhado, os documentos comprovam, de forma inequívoca, que não só o aparelho teste medidor da alcoolemia a que foi sujeito o recorrente fora devidamente aprovado, como regista a primeira verificação em 18 de Novembro de 2024, válida por um ano. Por fim, como também emerge da douta decisão recorrida, o Tribunal não assinalou a existência de qualquer dúvida, nem o arguido/recorrente, ao longo dos autos e até à apresentação do presente recurso, contestou – por inexistirem razões para tal – as condições de medição do aparelho, nem os termos referentes á sua aprovação/verificação, pois os mesmos mostravam-se claros e definidos no expediente elaborado referente à medição feita. Pelo que não faria sentido, como não faz, o apelo ao principio “ in dúbio pro reo”. * Por tudo o exposto, o nosso parecer é no sentido do não provimento do recurso.”5. Cumprido que foi o disposto no artigo 417º nº2 do CPP, não foi apresentada qualquer resposta. 6. Após ter sido efetuado exame preliminar, foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência. II- FUNDAMENTAÇÃO 1- Objeto do recurso O âmbito do recurso, conforme jurisprudência corrente, é delimitado pelas suas conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, sem prejuízo naturalmente das questões de conhecimento oficioso[2] do tribunal, cfr. artigos 402º, 403º e 412º, nº 1, todos do CPP. Assim, considerando o teor das conclusões do recurso interposto no sentido acabado de referir, as questões a decidir reconduzem-se ao seguinte: - Saber se ocorre erro de julgamento por se ter valorado prova ilegal quanto aos factos provados que conduziram à condenação do recorrente; - Se foi violado o principio “in dubio pro reo”. 2- A decisão recorrida 1. Na sentença recorrida, proferida oralmente, foram considerados provados os seguintes factos extraídos da gravação: 1. No dia 09/03/2025, pelas 17H33, o arguido conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-RI na Estrada Municipal ...33, em ...; 2. Naquelas circunstâncias de tempo e lugar, o arguido conduziu o referido veículo após ter ingerido bebidas alcoólicas, o que fazia com uma TAS de 1,245 g/l, correspondente à TAS registada de 1,31 g/l, deduzido o erro máximo admissível; 3. O arguido bem sabia que a quantidade e qualidade das bebidas alcoólicas que ingeriu antes de encetar o exercício da condução lhe iriam determinar uma TAS superior a 1,2 g/l, não se abstendo, ainda assim, de conduzir o referido veículo na via pública, o que quis e efetivamente fez; 4. Agiu o arguido de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei e criminalmente punida. 5. Vive com os pais em casa própria destes, onde também vive uma sua irmã, com 18 anos de idade, que trabalha num restaurante localizados dentro das muralhas de ..., e contribui, quando pode, para a despesas da casa com a quantia de 300,00 euros; não tem filhos; e encontra-se a pagar uma dívida de 350,00 euros à Segurança Social em prestações de 50,00 euros por mês. 3. Apreciação do recurso 3.1- A discordância do recorrente relativamente à matéria de facto provada na sentença recorrida tem que ver, no essencial, segundo refere, com o seguinte: “O recorrente, com o devido respeito por opinião diversa, não concorda com a sua condenação nos presentes autos, impugnando a supra descrita matéria de facto que veio a ser considerada como provada pelo tribunal, em tudo o que respeite, direta ou indiretamente, à sua responsabilização pelo crime de que vem acusado neste processo, ou seja, pela prática em autoria material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art. 292º do Código Penal” (Conclusão 3ª). “Assim, e no que diz respeito ao alcoolímetro que foi utilizado no caso em concreto, isto é, o alcoolímetro Drager Alcotest 7510 PT (com o nº ...16), é entendimento do recorrente que tal aparelho não era passível de validação da sua utilização e dos seus resultados qualitativos à data dos factos a que se refere o auto de notícia e respetiva acusação, ocorridos em 09-03-2025, acompanhando-se aqui de muito perto o decidido em caso idêntico ao dos autos no douto ACÓRDÃO DA RELAÇÃO DO PORTO DE 19-12-2023, proferido no processo nº 216/23.1GBAND.P1, e supra transcrito no essencial para o que deverá merecer a atenção no presente recurso” (Conclusão 4ª). “De modo idêntico ao decidido naquele ACÓRDÃO DA RELAÇÃO DO PORTO DE 19-12-2023, no presente caso, unicamente tendo em conta naturalmente as diferentes datas dos factos da acusação, estamos perante um caso de prova ilegal no que diz respeito ao resultado obtido de taxa de álcool no sangue do recorrente, não sendo válido o resultado obtido através do aparelho em questão bem como o valor probatório respetivo, ou seja: como o aparelho (alcoolímetro) a que se reporta o presente processo foi utilizado para além da data de 31-12-2024, sem que tivesse havido outro controlo metrológico, a taxa de álcool no sangue de que vem acusado o arguido e que foi tomada em consideração na sentença constitui prova ilegal proibida” (conclusão5ª) . “O que, no entender do recorrente, deverá, pois, conduzir inevitavelmente à sua absolvição nos presentes autos” (conclusão 6ª). Porém, não se vislumbra que assista razão ao recorrente, porquanto o arresto invocado refere-se a um modelo de aparelho diverso daquele a que se reporta os presentes autos, pelo que a sua aprovação e verificação são diversas, estando, pois, em causa realidades diferentes, para além naturalmente das respetivas datas. A fiscalização da condução sob influência de álcool encontra-se regulada no artigo 153º do C. da Estrada, o qual dispõe, no seu nº 1 que, “O exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito.” A Lei nº 18/2007, de 17.05 aprovou o Regulamento de Fiscalização da Condução sob influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas. Este Regulamento prevê no seu artigo 1º, as modalidades admissíveis de deteção e quantificação da taxa de álcool. Assim, nos termos do seu nº 1, a presença de álcool no sangue é indiciada através de teste ao ar expirado, efetuado com analisador qualitativo. Nos termos do seu nº 2, a quantificação da taxa de álcool no sangue é feita através de teste ao ar expirado, efetuado em analisador quantitativo, ou por análise ao sangue, sendo que esta, nos termos do nº 3, só terá lugar nos casos de impossibilidade de realização do teste em analisador quantitativo. Nos testes quantitativos do álcool no ar expirado só podem ser utilizados analisadores que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária. Aprovação esta que é precedida de homologação de modelo pelo IPQ, nos termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, cfr. artigo 14º, nºs 1 e 2 do mencionado Regulamento. Assim, no que para o caso releva, a medição da taxa de álcool no sangue foi efetuada através de um aparelho específico, ou seja, de um analisador quantitativo. O aludido exame, não sendo prova pericial, traduz-se numa prova de natureza técnico-científica, legalmente estabelecida, à qual deve ser reconhecida força vinculativa equiparável àquela (artigo 163º do Código de Processo Penal). No caso vertente, vem questionado a validade do aparelho através do qual foi realizado o teste quantitativo, em virtude de ter expirado o prazo de aprovação do respetivo modelo Ora, o regime geral do controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição encontra-se previsto no DL nº 29/2022, de 7 de abril, que revogou o DL nº 291/90, de 20.09. No que se refere a cada tipo de instrumento de medição, importa considerar a portaria específica. De forma que, no que aos alcoolímetros quantitativos ou analisadores quantitativos respeita, o regime do citado DL 29/2022, de 07 de abril encontra-se regulamentado pela Portaria 366/2023, de 15.11, que revogou a Portaria nº 1556/2007, de 10.12. Segundo o DL 29/2022, de 07 de abril , o controlo metrológico faz-se através de: aprovação do modelo; primeira verificação; verificação periódica; e verificação extraordinária, cfr. artigo 5º. No que concerne à aprovação de modelo, o artigo 7º do DL 29/2022, de 07 de abril dispõe que “1 – Aprovação de modelo é o ato que atesta a conformidade de um instrumento de medição ou de um dispositivo complementar com as especificações aplicáveis à sua categoria com vista à sua disponibilização no mercado. 2 - A aprovação de modelo é requerida pelo respetivo fabricante ou mandatário e é válida por um período de 10 anos findo o qual carece de renovação.” Acresce que o nº 7 do referido preceito legal esclarece que “os instrumentos de medição em utilização, cuja aprovação de modelo não seja renovada ou tenha sido revogada, podem permanecer em utilização desde que satisfaçam as operações de verificação aplicáveis”. Ao regular a questão da aprovação de modelo dos instrumentos de mediação, o artigo 7º do DL n.º 29/2022, de 07.04, não só prevê que essa aprovação tem a validade de dez anos (n.º 2), como regula expressamente as consequências do esgotamento do seu prazo (n.º 7). Deste último normativo resulta que o esgotamento do prazo de validade da aprovação técnica, sem que tenha havido lugar à sua renovação, não acarreta, por si só, que os alcoolímetros do modelo em causa deixem de poder ser utilizados, podendo sê-lo desde que satisfaçam as operações de verificação a que tenham de ser sujeitos, de acordo com as regras aplicáveis, ou seja, através das verificações periódicas e extraordinárias previstas nos artigos 8º e 9º do DL n.º 29/2022, de 07.04. A aprovação do modelo não é, contudo, suficiente para garantir a fiabilidade do aparelho, como decorre do artigo 8º, nº 1 do DL nº 29/2022, de 07 de abril, o qual referindo-se à primeira verificação do aparelho define esta operação como sendo “…o conjunto de operações destinadas a constatar a conformidade da qualidade metrológica dos instrumentos de medição novos ou reparados, com a dos respetivos modelos aprovados e com as disposições regulamentares aplicáveis…” A verificação periódica encontra-se definida no artigo 9º, nº 1 do DL nº 29/2022, de 07.04, como o conjunto de operações destinadas a constatar se os instrumentos de medição mantêm a qualidade metrológica dentro das tolerâncias admissíveis relativamente ao modelo respetivo, devendo ser requerida pelo utilizador do instrumento de medição. Assim, uma vez homologado o modelo do aparelho, são as operações de verificação que garantem a sua fiabilidade. Não é pelo simples facto de ter sido ultrapassado o prazo de 10 anos de aprovação do respetivo modelo que determina a perda da sua fiabilidade. Desde que o dito aparelho esteja em bom estado de conservação e passe nos testes de verificação periódica legalmente obrigatórios fica garantida a sua fiabilidade[3]. No que se refere ainda especificamente ao prazo da verificação dos alcoolímetros, importa ter presente o nº 3 do artigo 8º e os nºs 3 e 4 do artigo 9º artigo do DL nº 29/2022, de 07 de abril, os quais remetem para a regulamentação específica aplicável, ou seja, para os artigos 7º ( primeira verificação) e 8º (verificação periódica) da Portaria nº 366/2023, de 15 de novembro, dos quais resulta serem as mesmas válidas durante um ano após a sua realização, assim ficando ultrapassadas, face à letra da lei, as divergências verificadas na jurisprudência no âmbito da lei anterior, ou seja, a propósito da interpretação dos dizeres ““ A verificação periódica é anual” constante do artigo 7º, nº 2 da Portaria nº 1556/2007, de 10.12. Neste sentido vide, v.g., Ac. RP de 02.07.2025, processo nº 31/25.8GAPVZ.P1, disponível em www.dgsi.pt, com o seguinte sumário: “I – Os métodos de pesquisa de álcool no sangue constituem prova técnico-científica, sendo no patamar da prova pericial que tem de enquadrar-se a prova obtida através de alcoolímetro, para o que constitui condição indispensável ter o modelo sido previamente aprovado e sujeito a verificação, nos termos legais. II – Além da aprovação do modelo de alcoolímetro, a lei estabelece a necessidade da verificação regular da sua aptidão, sendo a primeira verificação e a verificação periódica válidas pelo prazo constante na regulamentação específica aplicável, tal como estabelece o Decreto-Lei n.º 29/2022, de 07-04, concretamente nos seus artigos 5.º, 8.º e 9.º. III – Essa regulamentação específica consta agora da Portaria n.º 366/2023, de 15-09, que contém em Anexo o Regulamento do Controlo Metrológico Legal dos Alcoolímetros, em vigor deste 16-09-2023 (art. 3.º), a qual dispõe que a verificação periódica “tem uma periodicidade anual e é válida durante um ano após a sua realização” (n.º 1 do art. 8.º). IV – Com a publicação desta Portaria n.º 366/2023, a qual revogou a Portaria n.º 1556/2007, de 10-12 (art. 2.º), o legislador teve intenção de clarificar a questão da periodicidade da verificação, tornando-a obrigatória a, pelo menos, cada período de um ano (365 dias), por forma a manter a fiabilidade dos resultados obtidos através do alcoolímetro. V – A mesma periodicidade aplica-se após a primeira verificação, atento o disposto no n.º 1 do artigo 7.º da mesma Portaria n.º 366/2023, especificamente a sua parte final, ao estabelecer que tem “o mesmo prazo de validade”, ou seja, o prazo de validade da inspeção periódica - um ano após a sua realização. VI – Somente os modelos homologados e os aparelhos que tenham sido sujeitos a verificação, a primeira ou a periódica, nos termos legais, têm aptidão para testar e quantificar a taxa de álcool no sangue, pois se assim não suceder os resultados obtidos não podem ter-se por válidos para fundamentar a convicção probatória do Tribunal.” 3.2- Em face do exposto, revertendo tudo o que ficou dito para o caso vertente, temos que, na data da realização do teste de pesquisa de álcool no sangue efetuado ao recorrente – que teve lugar em 09.03.2025 - não tinha decorrido o prazo de 10 anos sobre a data da aprovação pelo IPQ, do modelo do alcoolímetro usado, ou seja, o aparelho Drager modelo ALCOTEST 7510 PT, nº ...16, nem o prazo previsto no despacho de aprovação para a sua validade Na verdade, quanto ao referido aparelho utilizado para aferir da taxa de alcoolemia do recorrente verifica-se que: O IPQ, I. P., no âmbito do regime do controlo metrológico: 1- Aprovou, através do Despacho n.º 8219/2019, de 17 de setembro (aprovação de modelo n.º ...6), o equipamento alcoolímetro quantitativo da marca ..., modelo ... ..., válida por 3 anos a contar da referida data de publicação no Diário da República; 2. Aprovou complementarmente, através do Despacho n.º 9378/2021, de 24 de setembro (aprovação complementar de modelo n.º ...4), tal equipamento; 3. Renovou a aprovação, através do Despacho n.º 4941/2022, de 27 de abril (renovação da aprovação de modelo n.º ...0), igualmente o referido equipamento, válida por 3 anos a contar da referida data de publicação no Diário da República; 4. Aprovou complementarmente, através do Despacho n.º 4761/2023, de 20 de abril (aprovação complementar de modelo n.º ...3), esse mesmo equipamento, publicado no DR n.º 78/2023, Série II de 2023-04-20, decorrendo do seu n.º 3 que “ A validade desta aprovação é a que consta no Despacho 4941/2022, publicado na 2.ª série do Diário da República n.º 81, de 27 de abril de 2022 “, validade essa que, foi renovada por 3 anos a contar da referida data de publicação no Diário da República ( cfr. art.º 4.º deste despacho). E, por seu lado, relativamente ao mesmo aparelho, a ANSR, para uso no controlo e fiscalização do trânsito: 1. Aprovou, através do Despacho n.º 9911/2019, de 14 de outubro, o supra identificado equipamento; 2. Aprovou complementarmente, através do Despacho n.º 4497/2022, de 19 de abril, esse mesmo equipamento. 3. Aprovou complementarmente, através do Despacho n.º 10916/2023, de 26.10, DR, II Série. Para além disso, a prova realizada através do mencionado alcoolímetro é valida, porquanto o aparelho havia sido submetido a operação de primeira verificação pelo IPQ em 18.11.2024, a qual é válida por um ano após a sua realização, ou seja, até 18.11.2025, cfr. artigos 7º e 8 da Portaria nº 366/2023, de 15.11. Nesta conformidade, impõe-se concluir no sentido de que não assiste razão ao recorrente. 3.2- No que concerne à alegada violação do princípio da presunção de inocência do arguido e do in dubio pro reo temos também que a mesma carece de sentido. O aludido princípio da presunção de inocência do arguido encontra-se previsto no artigo 32º, nº 2 2ª parte da CRP, sendo o in dubio pro reo seu corolário, tem o significado de que o juiz quando não tiver a certeza sobre a ocorrência de factos relevantes que prejudiquem o arguido, e subsistir a dúvida, deverá decidir em favor do arguido[4]. Mas, nesse caso, terá de ser uma dúvida razoável, inultrapassável, que impeça a convicção do tribunal[5]. Como é sabido, em processo penal não existe um ónus da prova que impenda sobre os sujeitos processuais, devendo o tribunal investigar autonomamente o caso submetido a julgamento. Nas palavras de Figueiredo Dias[6] “À luz do princípio da investigação, bem se compreende, efetivamente, que todos os factos relevantes para a decisão (…) que, apesar de toda a prova recolhida, não possam ser subtraídos à «dúvida razoável» do tribunal, também não possam considerar-se como «provados». E se, por outro lado, aquele mesmo princípio obriga em último termo o tribunal a reunir todas as provas necessárias à decisão, logo se compreende que a falta delas não possa, de modo algum, desfavorecer a posição do arguido: um non liquet na questão da prova (…) tem de ser sempre valorado a favor do arguido”. A violação do in dubio pro reo pode ocorrer tanto no caso de o tribunal não ter tido dúvidas, quando deveria tê-las[7], ocorrendo neste caso um vício na formação da convicção do tribunal, como no caso de, tendo ficado com dúvidas sobre factos relevantes, mesmo assim, tenha decidido contra o arguido. No caso, resulta da sentença que a convicção do tribunal recorrido resultou do depoimento efetuado pelo militar da GNR, BB, do qual resultou que nas circunstâncias de tempo, modo e lugar descritas na acusação, sendo fiscalizado na condução do veículo aí identificado, o recorrente foi sujeito ao teste de pesquisa de álcool no sangue n.º 69 através do aparelho Drager Alcotest 7510 PT (com o nº ...16), apresentando o resultado de 1.31 g/l TAS, do qual, após dedução do erro máximo admissível (EMA), resulta o valor final de 1,24 g/l. Ora, tendo em conta tudo quanto dissemos sobre a validade do exame, não tendo sido questionado o depoimento efetuado pelo militar da GNR referido, não se vislumbra que o tribunal a quo tenha tido dúvidas e, mesmo assim, tenha decidido contra o arguido e muito menos que as devesse ter tido, donde resulta não ter sido violado o princípio invocado. Em suma, o recurso improcede na sua totalidade. III- DISPOSITIVO Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes que constituem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente o recurso interposto pelo arguido e, em consequência, manter a sentença recorrida. Custas pelo arguido, com taxa de justiça que se fixa em 3 Ucs – artigos 513º, nº 1 e 514º, nº 1 do C.P.P. e artigo 8º, nº 9 do R.C.P. e tabela III anexa a este último diploma legal. Texto integralmente elaborado pelo seu relator e revisto pelos seus signatários – artigo 94º, nº 2 do CPP, encontrando-se assinado eletronicamente na 1ª página, nos termos do disposto no artigo 19º da Portaria nº 280/2013, de 26.08, revista pela Portaria nº 267/2018, de 20.09. Notifique. Guimarães, 30 de setembro de 2025 Armando Azevedo – Relator Fátima Furtado – 1ª Adjunta Anabela Varizo Martins– 2ª Adjunta [1] Nas transcrições das peças processuais irá reproduzir-se a ortografia segundo o texto original, sem prejuízo da correção de erros ou lapsos manifestos, bem assim da formatação do texto, da responsabilidade do relator. [2] De entre as questões de conhecimento oficioso do tribunal estão os vícios da sentença do nº 2 do artigo 410º do C.P.P., cfr. Ac. do STJ nº 7/95, de 19.10, in DR, I-A, de 28.12.1995, as nulidades da sentença do artigo 379º, nº 1 e nº 2 do CPP, irregularidades no caso no nº 2 do artigo 123º do CPP e as nulidades insanáveis do artigo 119º do C.P.P.. [3] Relativamente a este ponto a jurisprudência é consensual. Assim, vide, v.g, Ac RP de 18.12.2018, processo 294/18.5PFMTS.P1, e Ac RC de 27.06.2018, processo 1358/17.8PBCBR.C1, proferidos no âmbito da legislação anterior, acessíveis em www.dgsi.pt; e, face à legislação atualmente em vigor, entre outros, Ac. RP de 28.02.2024, processo 266/23.8GBAND.P1 e Ac. RP de 02.07.2025, processo nº 31/25.8GAPVZ.P1, também acessíveis em www.dgsi.pt [4] Este princípio restringe-se ao domínio da apreciação da prova, constituindo um limite ao princípio da livre apreciação da prova, cfr. Ac STJ de 27.05.2010, processo 18/07.2GAAMT.P1.S1, relator Raúl Borges; e Ac. STJ de 12.03.2009, processo 07P1769, relator Soreto de Barros, ambos acessíveis em www.dgsi.pt [5] A dúvida que leva o tribunal a decidir “pro reo” tem de ser uma dúvida positiva, uma dúvida racional que ilida a certeza contrária. Por outras palavras ainda uma dúvida que impeça a convicção do tribunal, cfr. Cristina Líbano Monteiro, Boletim da Faculdade de Direito, Coimbra Editora, 1997, pág. 51. [6] In Direito Processual Penal, Coimbra Editora, 2004, pág. 213. [7] Note-se que, neste caso, trata-se de uma questão de facto que não cabe num recurso restrito à matéria de direito, mesmo que de revista alargada. Neste sentido vide Ac STJ de 12.03.2009, processo 07P1769, relator Soreto de Barros, disponível em www.dgsi.pt |