Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | MÁRIO RODRIGUES DA SILVA | ||
Descritores: | ACIDENTE DE TRABALHO INCAPACIDADE PERMANENTE ABSOLUTA PARA O TRABALHO HABITUAL MOTORISTA DE VEÍCULOS PESADOS DE MERCADORIAS NÚCLEO ESSENCIAL DAS FUNÇÕES EXERCIDAS | ||
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Data do Acordão: | 05/16/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | JUÍZO DO TRABALHO DA FIGUEIRA DA FOZ DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA | ||
Texto Integral: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 139.º, N.º 7, 140.º DO CÓDIGO DE PROCESSO DE TRABALHO E 389.º DO CÓDIGO CIVIL | ||
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Sumário: | É de considerar afetado por uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH), o motorista de veículos pesados de mercadorias que, na sequência do acidente se vê impossibilitado de realizar o núcleo essencial ou fulcral das funções que vinha exercendo até à data do acidente. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | ***
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Coimbra *** RELATÓRIO O presente processo especial para efetivação de direitos resultantes de acidente de trabalho foi instaurado na sequência de participação do acidente ocorrido em 28 de Agosto de 2019, que afetou o sinistrado AA, nascido em ../../1968, quando este exercia a sua atividade profissional por conta, sob a autoridade, direção e fiscalização da entidade empregadora A..., S.A., a qual havia transferido a sua responsabilidade infortunística laboral para a B... – Companhia de Seguros, S.A. até ao montante de €12.277,51. Procedeu-se à realização de exame médico, tendo o senhor perito médico considerado o sinistrado afetado de uma incapacidade permanente parcial de 15%, desde a data da alta (data da alta: 22/4/2021) e concordado com as incapacidades temporárias atribuídas pela seguradora. Foi realizada, no dia 29/3/2022, a tentativa de conciliação. A seguradora e o sinistrado não concordaram com o resultado do exame médico, em virtude, respetivamente, considerar o sinistrado afetado com uma IPP de 8% e por se considerar portador de IPATH, respetivamente. O sinistrado veio requerer a realização de exame por Junta Médica, formulando os respetivos quesitos. Foi pedido parecer ao IEFP, tendo o mesmo sido junto aos autos. Procedeu-se à realização de exame do sinistrado por junta médica de medicina do trabalho, no dia 24/11/2022, vindo os três peritos, por unanimidade, a considerar que “o sinistrado não está afetado de IPATH para a atividade especifica de motorista de pesados, aceitando, todavia, que a sua situação sequelar é incompatível com a carga e movimentação de mercadorias, ou seja, o sinistrado pode exercer a atividade de motorista, mas não pode participar na carga e descarga de mercadorias que transporta.”. A junta médica, por unanimidade, concordou com o exame médico, posteriormente, concordou com o parecer da junta médica de medicina do trabalho. Em 12/3/2023 foi proferida sentença. Em 24/3/2023 foi interposto recurso pela seguradora, tendo, em 22/9/2023, o Tribunal da Relação de Coimbra deliberado nos seguintes termos: “Com fundamento no atrás exposto, acorda-se em julgar procedente a apelação, com a consequente anulação da sentença recorrida, nos termos do artigo 662º, nº 2, alínea c) do CPC, por forma a que: i) Se ordene a repetição da junta médica em que deve dar-se resposta fundamentada sobre a questão da IPATH do sinistrado, com a análise do relatório do IEFP. ii) Seja proferida nova sentença em que se decida fundamentadamente a questão da IPATH do sinistrado. Em cumprimento do citado acórdão foi proferido despacho em 7/12/2023, a determinar a reabertura da junta médica de especialidade de medicina do trabalho, como vista a “dar-se resposta fundamentada sobre a questão da IPATH do sinistrado, com a análise do relatório do IEFP”, tendo-se solicitado data ao IMLCF. Na sequência do deliberado pelo Tribunal da Relação de Coimbra foi repetida a junta médica no dia 22/1/2024, manteve o parecer anterior, acrescentando o seguinte: “A Junta Médica, por unanimidade, mantém o posicionamento pericial previamente assumido no sentido da situação sequelar não justificar a atribuição de IPATH para a profissão de motorista de pesados. Com efeito, e tal como já assinalado, embora tenha limitações funcionais inerentes à IPP de 15% de que é portador, muito particularmente no que se refere à movimentação de carga e descargas de mercadorias, o sinistrado pode concretizar cabalmente as funções principais da sua atividade, designadamente a de motorista podendo nas cargas e descargas ser auxiliado por equipamento ou por outros colaboradores. Note-se que o parecer do IEFP emite pronunciamento sem exame físico do sinistrado, e considerando atividades nas quais o sinistrado se pode socorrer de equipamento ou de apoio por outros funcionários. Na realidade afigura-se óbvio (apenas a título de exemplo) que o motorista não poderá pegar em pneus com peso aproximado de 150 Kg, mas poderá levantar pesos até 10 quilos auxiliando-se do outro braço”. Em 16/08/2024 foi proferida nova sentença. Em 02/09/2024, foi interposto recurso pela seguradora, tendo, em 22/11/2024, o Venerando Tribunal da Relação de Coimbra deliberado nos seguintes termos: “Com fundamento no atrás exposto, acorda-se em anular a decisão, ordenando que o “Mº Juiz a quo” se pronuncie sobre o lapso material invocado no parecer do MP e que substitua a decisão recorrida por outra que supra a nulidade, por insuficiência da matéria de facto. Custas pela apelante, porque foi a parte que tirou proveito da anulação da decisão recorrida- artigo 527º, nº 1, “parte final”, 607º, nº 6 e 663º, nº 2, todos do CPC.” Foi proferida nova sentença com o seguinte dispositivo: Face ao exposto, decide-se: 7.1.) Fixar ao Sinistrado, AA, nascido em ../../1968, a incapacidade permanente parcial (IPP) de 15% (10% x1,5 factor idade superior a 50 anos), com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH), desde 23 de Abril de 2021, dia seguinte à data da alta; 7.2.) Condenar “B...–Companhia de Seguros, S.A.”, a pagar ao Sinistrado as seguintes prestações: 7.2.1.) Uma pensão anual no montante de €6.669,62 (seis mil seiscentos e sessenta e nove euros e sessenta e dois cêntimos), que corresponde a 88,14% da pensão fixada em €7.567,08 (sete mil quinhentos e sessenta e sete euros e oito cêntimos), devida desde 23 de Abril de 2021, actualizada para em 01.01.2022 para o valor de €6.736,32 (Portaria 6/2022, de 4 de Janeiro), em 01.01.2023 para o valor de €7.302,17 (Portaria n.º 24- A/2023, de 9 de Janeiro) e em 01.01.2024 para o valor de €7.745,52 (Portaria n.º 423/2023, de 11/12), a ser paga na proporção de 1/14 até ao 3.º dia cada mês, sendo os subsídios de férias e de Natal, na mesma proporção, pagos em Junho e em Novembro, nos termos do disposto no artigo 72.º, nºs 1 e 2 da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro; 7.2.2.) A quantia de €4.409,31 (quatro mil quatrocentos e nove euros e trinta e um cêntimos) a título de subsídio por elevada incapacidade, a pagar de uma só vez; 7.2.3.) a quantia de 25,00€ (vinte e cinco euros) a título de despesas de transporte vencida desde 30 de Março de 2022; 7.2.4.) juros de mora sobre as prestações atribuídas, vencidos e vincendos, à taxa anual de 4% (ou outra que entre em vigor), desde a data do vencimento de cada prestação até efectivo e integral pagamento. 7.3.) Condenar a Entidade Empregadora “A..., S.A.”, a pagar ao Sinistrado as seguintes prestações: 7.3.1.) indemnização pelo período de incapacidades temporárias (absoluta e parcial) no valor de €1.945,06 (mil novecentos e quarenta e cinco euros e seis cêntimos), que corresponde a 11,86% das indemnizações fixadas em €16.400,16, vencida desde 29 de Agosto de 2019; 7.3.2.) Uma pensão anual no montante de €897,46 (oitocentos e noventa e sete euros e quarenta e seis cêntimos), que corresponde a 11,86% da pensão fixada em €7.567,08 (sete mil quinhentos e sessenta e sete euros e oito cêntimos), devida desde 23 de Abril de 2021, actualizada em 01.01.2022 para o valor de €906,43 (Portaria 6/2022, de 4 de Janeiro), em 01.01.2023 para o valor de €982,57 (Portaria n.º 24-A/2023, de 9 de Janeiro) e em 01.01.2024 para o valor de €1.041,42 (Portaria n.º 423/2023, de 11/12), a ser paga na proporção de 1/14 até ao 3.º dia cada mês, sendo os subsídios de férias e de Natal, na mesma proporção, pagos em Junho e em Novembro, nos termos do disposto no artigo 72.º, nºs 1 e 2 da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro; 7.3.3.) juros de mora sobre as prestações atribuídas, vencidos e vincendos, à taxa anual de 4% (ou outra que entre em vigor), desde a data do vencimento de cada prestação até efectivo e integral pagamento. *** Custas a cargo da Seguradora e da Entidade Empregadora na proporção de 86,14% e 11,86 % respectivamente (artigo 527.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho). * Tendo em vista o disposto no artigo 90.º do Código de Processo do Trabalho, deverão a Seguradora e a Entidade Empregadora, no prazo de 30 (trinta) dias, documentar o pagamento das quantias já vencidas e ainda não pagas. Uma vez que a Seguradora pagou a mais a quantia de €1.652,50 a título de indemnização por incapacidades temporárias, poderá proceder à dedução de tal quantia no valor a pagar nos termos ordenados. * Registe e notifique (artigo 153.º, n.º 4, do Código de Processo Civil ex vi artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho).” Inconformada com o decidido, a ré B... – Companhia de Seguros, S.A. interpôs recurso, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: (…). Não foram apresentadas contra-alegações. Neste Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que a apelação deverá ser julgada improcedente. Não houve resposta este parecer. Colhidos os vistos, cumpre decidir. *** OBJETO DO RECURSO Como é sabido, o objeto do recurso é delimitado nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aplicável “ex vi” do art.º 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado. Em função destas premissas, a única questão a decidir consiste em saber se a sinistrada é ou não portadora de IPATH. *** FUNDAMENTOS DE FACTO A 1ª instância fixou a matéria de facto da seguinte forma: “5.1.1. Factos provados 5.1.1.1. No dia 28 de Agosto de 2019, o Sinistrado AA, nascido em ../../1968, exercia a sua profissão de motorista de pesados, por conta e sob a direcção e autoridade de "A..., S.A.", com sede em ..., mediante a retribuição anual de € 14.277,51, assim constituída: 705,00€ x 14= 9.870,00€ (retribuição base) + 172,00€ x 13= 2.236,00€ (outras remunerações) + €477,51 x 1 (horas extraordinárias) + €1.694,00 (€7,00x22x11), a título de subsídio de alimentação. 5.1.1.2 No referido dia, no período e no local de trabalho, o Sinistrado ao puxar uma palete pesada, sentiu um “esticão” no braço direito, tendo sofrido as lesões descritas no relatório de exame médico de fls. 82 a 84 verso dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. 5.1.1.3. À data do acidente, a Entidade Empregadora tinha a responsabilidade emergente do acidente de trabalho transferida para a seguradora “Seguradora B... – Companhia de Seguros, S.A.”, mas apenas pelo montante anual de €12.583,51 (retribuição base + outras remunerações + horas extraordinárias). 5.1.1.4. O Sinistrado teve alta definitiva em 22 de Abril de 2021, ficando afectado com sequelas ao nível do membro superior direito, concretamente “limitação dolorosa das mobilidades do ombro – abdução/anteplusão 90.º, não consegue levar a mão à nuca nem à região lombar e leva com muita dificuldade ao ombro oposto, com défice de força muscular, ligeira amiotrofia da cinturar escapular, 5 cicatrizes no ombro com 1,5 cm de comprimento”, que se traduz numa incapacidade parcial permanente (IPP) de 15% (10% x factor 1,5 por idade superior a 50 anos à data da alta), com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH) de motorista (tendo presente as funções exercidas e as capacidades exigidas nos termos exarados infra nos pontos 5.1.1.8 e 5.1.1.12), tendo estado afectado de incapacidade temporária absoluta (ITA) num total de 575 dias, de incapacidade temporária parcial (ITP) de 25% num total de 15 dias e de incapacidade temporária parcial (ITP) de 40% num total de 13 dias. 5.1.1.5. A Seguradora pagou a indemnização devida pelas incapacidades temporárias no que respeita à remuneração aludida em 5.1.1.3 no valor total de €16.105,52, tendo aceite pagar os valores ainda em divida em sede de tentativa de conciliação (realizada em 22/2/2022) e tendo a entidade empregadora aceite, em sede de tentativa de conciliação, pagar a indemnização respeitante às incapacidades temporárias, em função da retribuição não transferida. 5.1.1.6. O Sinistrado gastou €40,00 em transportes por deslocações obrigatórias ao Tribunal e ao Gabinete Médico-Legal, que a Seguradora aceitou pagar em sede de tentativa de conciliação. 5.1.1.7 AA foi admitido a trabalhar, como motorista, sob autoridade e direcção da “A..., Lda.”, em 1 de Fevereiro de 2012, conforme fls. 98 a 100, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; 5.1.1.8 Faz parte da categoria profissional do Sinistrado, de acordo com o contrato de trabalho referido em 5.1.1.7, as seguintes funções: “entrega aos clientes mercadorias conduzindo veículos de transporte, ligeiros ou pesados, após assegurar-se do bom funcionamento dos veículos que conduz, efectua auto-venda, venda por telefone (televendas) ou cobranças, bem como elabora pedidos de abastecimento de maquinas de vending, abastece-as e acompanha a sua manutenção, de modo a garantir o bom funcionamento da área e o cumprimento dos objectivos definidos; efectua as acções necessárias para que a viatura que conduz se encontre em bom estado de funcionamento, assegurando a sua manutenção mecânica, conservação e limpeza; recebe e verifica as rotas estipuladas para a entrega dos produtos aos clientes; acompanha o carregamento do veículo; conduz o veículo de acordo com as rotas anteriormente estipuladas; efectua o descarregamento dos produtos no cliente e procede ao carregamento do vasilhame; procede à cobrança dos valores facturados ao cliente; após o regresso à empresa procede ao descarregamento do vasilhame; presta contas no escritório sobre as cobranças efectuadas aos clientes e as quantidades de vasilhame recebidas.” 5.1.1.9 No âmbito das funções levadas a cabo por um motorista de veículos pesados de mercadorias (médio curso), o IEFP conclui que estão em causa as seguintes tarefas: De uma forma genérica - Conduz veículos pesados, articulados, com reboque, de transporte de mercadorias; - Observa os percursos definidos, nacionais, respeitando as normas e regras de condução e circulação rodoviária; - Assegura o acondicionamento e segurança das cargas; - Providencia no sentido de garantir o transporte da mercadoria em condições de segurança; - Procede à carga e à descarga das mercadorias a transportar/transportadas, quando necessário; Com mais pormenor, tendo, nomeadamente, em conta o posto de trabalho ocupado - Recebe instruções dos seus superiores hierárquicos acerca dos destinos, quantidades e tipo de carga a transportar; - Providencia, diariamente, condições para o bom estado de funcionamento do veículo com que opera regularmente (um camião pesado de mercadorias), zelando pela sua manutenção - controlando o seu estado de lubrificação, nível da água e pressão dos pneus, e relatando superiormente, eventuais anomalias para uma intervenção técnica mais especializada; - Colabora na carga/descarga de mercadorias do camião posicionando-o, de modo adequado, nos locais apropriados, utilizando a força de braços para carregamentos diversos e outros meios auxiliares de movimentação de cargas, tais como porta-paletes; - Ajusta, acondiciona e acomoda cargas diversas, algumas vezes sem ajuda de terceiros, na posição de pé, curvado e agachado, com a utilização de ambos braços/mãos, exercendo, por vezes a um nível intenso, força muscular, praticamente, do corpo todo; - Controla, várias vezes por dia, durante todo o período de viagem, fazendo uma inspecção visual pormenorizada, as condições de segurança da carga transportada nomeadamente verificando se se encontra nas devidas condições, e fazendo reajustes sempre que necessário; -Conduz, diariamente, acompanhado de ajudante, zelando pela viatura e salvaguardando a mercadoria transportada, durante percursos que podem atingir várias centenas de quilómetros, dentro do país, durante o dia, e no inverno, à noite, um veículo pesado de mercadorias sendo que, para tal: - Utiliza, sempre que necessário, através das mãos e dos pés, os comandos adequados; - Manobra o camião, utilizando, nomeadamente, o volante, conforme os trajetos e percursos a fazer; - Regula a velocidade, utilizando, nomeadamente, com ambos os pés, o acelerador, a embraiagem e os travões, tendo em conta o estado da via, o tipo de carga transportada, as condições atmosféricas, a circulação de outros veículos e peões, assim como observando e cumprindo as diferentes regras e sinais de trânsito. - Elabora, com alguma regularidade, relatórios escritos ou procede ao preenchimento de formulários específicos, com menção do serviço efectuado, eventuais ocorrências, anomalias no funcionamento da viatura utilizada, regista elementos identificativos em dispositivos digitais (tacógrafo), conforme consignado na lei. - Procede regularmente à limpeza dos veículos que conduz (interior da cabine). 5.1.1.10 De acordo com o parecer do IEFP, para que o trabalhador possa exercer o tipo de funções acima descrito, de modo produtivo, com qualidade e segurança, é necessário que seja capaz de responder aos seguintes requisitos: Condições de execução do trabalho: O trabalhador deve ser capaz de trabalhar tanto em espaço fechado (condução na cabine do veículo), como em espaços ao ar livre, nas tarefas inerentes ao carregamento e descarregamento da carga do veículo, estando o trabalhador sujeito às diversas condições atmosféricas (chuva, frio, neve, calor); Exigências físicas, posição de trabalho, locomoção, tipo e intensidade de esforço - O trabalhador deve conseguir adoptar a posição de sentado, no interior da viatura - O trabalhador deve conseguir adoptar as posições ortostática, curvado e agachado, durante as operações de preparação para o carregamento/ descarregamento, sendo que, muitas vezes, tem de subir e descer ao topo da carga do camião ou nas situações em que necessita de efectuar a limpeza do veículo; - O trabalhador deve poder efectuar flexões frontais do tronco e do pescoço, torções laterais do tronco e do pescoço, movimentos de extensão do pescoço, bem como trabalhar com os braços acima do nível dos ombros, sobretudo nas operações de carga e descarga do veículo; - O trabalhador deve poder levantar e baixar, manualmente, ainda que com a ajuda de meios mecânicos, mercadorias na ordem de várias dezenas de quilos; deslocar e levantar pesos, com os braços e mãos, pegar em pneus com um peso aproximado de 150 quilos, sempre que necessário; - O trabalhador deve ser capaz de efectuar subidas/descidas com bastante frequência, dado que entra e sai do camião, bem como da plataforma de carga do veículo, frequentemente; Exigências Sensoriais/Psicomotoras/Cognitivas - O trabalhador deve ser detentor de acuidade visual ao longe, adequada visão crepuscular, campo visual, percepção da profundidade, visão estereoscópica e resistência ao deslumbramento, sobretudo nos períodos de condução nocturna e sob condições atmosféricas adversas; -O trabalhador deve possuir uma adequada coordenação mão-mão, pé-pé, óculomanual-pedal, rapidez de reação; deve possuir um adequado nível de coordenação motora, nomeadamente no que diz respeito à coordenação mão-mão, mão-braço, braços- troncopernas, tanto nas tarefas de condução como nos momentos de carga e descarga das mercadorias transportadas; 5.1.1.11 É parecer do IEFP que “Tendo em conta o perfil de exigências do posto de trabalho analisado, o qual exige uma adequada destreza física, com adequadas condições de todo o corpo, nomeadamente de ambos os braços, parece-nos (sendo, simplesmente, um elemento que poderá ajudar a uma decisão médica e do Tribunal) que o trabalhador se encontra impossibilitado de exercer as tarefas fundamentais da sua actividade profissional ou de outras que exijam íntegras condições dos membros superiores.”. 5.1.1.12 O posto de trabalho do Sinistrado, à data do acidente, implicava destreza de ambos os membros superiores (incluindo do membro direito, que é o membro dominante, e no qual o Sinistrado tem as sequelas acima mencionadas), implicando a condução de veículos de transporte, ligeiros ou pesados, com segurança, bem como, se necessário, a carga/descarga da mercadoria transportada. * 5.1.2. Factos não provados: 5.1.2.1 Que o Sinistrado não esteja afectado de incapacidade permanente para o trabalho habitual (IPATH). 5.1.2.2 O Sinistrado voltou à sua actividade profissional de motorista de pesados, retomando o seu posto de trabalho. * 5.1.3. Motivação da matéria de facto (…).”. *** FUNDAMENTOS DE DIREITO A recorrente alega que a atribuição de IPATH apenas tem por base o parecer do IEFP não tendo tomado em linha de conta o decidido pela junta médica. Ora, como é sabido, a perícia médica constitui um meio de prova sujeito à livre apreciação do tribunal, do que resulta que o juiz não está vinculado ao resultado da perícia singular ou da perícia colegial, sendo que na fixação da incapacidade deverá ponderar e valorar, segundo o seu prudente juízo, todos os elementos constantes dos autos que permitam determinar a incapacidade de que é portador o sinistrado. A determinação da existência, ou não, de IPATH nem sempre é fácil, sendo certo que, por vezes, poderá ser ténue a fronteira entre esta e uma mera IPP, impondo-se a avaliação da repercussão desta na (in)capacidade para o sinistrado continuar a desempenhar o seu trabalho habitual. Tratando-se embora a fixação de incapacidade de matéria sobre a qual o juiz não dispõe dos necessários conhecimentos técnico-científicos, o laudo pericial (seja do exame médico singular, seja do exame por junta médica), não tem, todavia, força vinculativa obrigatória, estando sujeito à livre apreciação do julgador (arts. 389º do Cód. Civil e 489º do CPC/2013), devendo, no entanto, a eventual divergência ser devidamente fundamentada em outros elementos probatórios que, por si ou conjugadamente com as regras da experiência comum, levem a conclusão contrária. Na decisão final, a proferir nos termos do art.º 140º do Código de Processo de Trabalho, cabe ao juiz fixar a natureza e o grau de desvalorização. E nessa decisão o juiz deve lançar mão dos pareceres dos peritos médicos existentes nos autos (seja em exame singular, seja em junta médica, ou mesmo de exames e pareceres complementares (art.º 139º nº 7 do CPT), sendo certo que a força probatória desses pareceres é fixada livremente pelo tribunal - art.º 389º do C. Civil. Por outro lado, o parecer do IEFP, na medida em que constitui um exame pericial, naturalmente que também está sujeito à livre apreciação do Tribunal. Como refere Carlos Alegre[1], a propósito da incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH), “trata-se de uma incapacidade de 100% para a execução do trabalho habitual do sinistrado, no desempenho da sua específica função, actividade ou profissão, mas que deixa uma capacidade residual para o exercício de outra actividade, laboral compatível, permitindo-lhe alguma capacidade de ganho, todavia, uma capacidade de ganho, em princípio diminuta”. Contudo daqui não resulta só ser de atribuir IPATH quando o sinistrado não poder executar nenhuma das tarefas que anteriormente desempenhava no seu posto de trabalho, ao invés significa apenas que o sinistrado deixou de poder executar pelo menos o núcleo essencial das tarefas que anteriormente exercia. Conforme se refere a este propósito no Ac. do TRG, de 24-10-2019[2] “A incapacidade absoluta para o trabalho habitual não implica uma impossibilidade de execução da totalidade das tarefas incluídas na categoria. O que releva no caso é o núcleo essencial dessas funções, as tarefas que dão corpo à categoria, o núcleo das tarefas que eram executadas. O STJ no acórdão uniformizador de 28/5/2014[3], A expressão “se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho” contida na alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho ou Doenças Profissionais, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, refere-se às situações em que o sinistrado, por virtude das lesões sofridas, não pode retomar o exercício das funções correspondentes ao concreto posto de trabalho que ocupava antes do acidente”; Consta ainda do acórdão “A reconversão em relação ao posto de trabalho prevista naquela norma materializa-se no regresso do sinistrado ao desempenho das funções que tinha quando ocorreu o acidente, apesar das limitações em termos de capacidade que trabalho que do mesmo decorreram. Pode, assim, afirmar-se que um trabalhador que foi vítima de um acidente de trabalho é reconvertido em relação ao posto de trabalho que tinha antes do acidente quando o pode retomar, apesar das limitações funcionais de que seja portador em consequência do acidente sofrido. Quando esse regresso não seja possível, quando essa retoma não seja possível, o trabalhador não é susceptível de reconversão nesse posto de trabalho”. Importa assim que o trabalhador retome ou possa retomar o essencial das suas anteriores tarefas, ainda que com esforço acrescido e eventualmente com algumas modificações técnicas ou outras, que visam precisamente adaptar o local ou a forma de prestação, de modo permitir a execução dessas tarefas em função das limitações funcionais adquiridas. Como acertadamente se refere no Ac. do TRL, de 7-3-2018[4]: “I–Não só quando o sinistrado não pode executar nenhuma das tarefas que anteriormente desempenhava no seu posto de trabalho é que se está perante uma IPATH. II– Se o sinistrado deixou de poder executar todas as anteriores tarefas ou, pelo menos, o seu conjunto fundamental, a incapacidade para o trabalho habitual é considerada total. III–Não se pode falar em IPATH se o sinistrado retoma, pelo menos, o conjunto fundamental das suas funções, embora com limitações decorrentes das lesões sofridas no acidente. IV–Se o sinistrado não as consegue retomar, não é reconvertível em relação ao seu posto de trabalho e, em consequência, está afectado de IPATH.” Tratando-se embora a fixação de incapacidade de matéria sobre a qual o juiz não dispõe dos necessários conhecimentos técnico-científicos, o laudo pericial (seja do exame médico singular, seja do exame por junta médica), não tem, todavia, força vinculativa obrigatória, estando sujeito à livre apreciação do julgador (arts. 389º do Cód. Civil e 489º do CPC/2013), devendo, no entanto, a eventual divergência ser devidamente fundamentada em outros elementos probatórios que, por si ou conjugadamente com as regras da experiência comum, levem a conclusão contrária. Na decisão final, a proferir nos termos do art.º 140º do Código de Processo de Trabalho, cabe ao juiz fixar a natureza e o grau de desvalorização. E nessa decisão o juiz deve lançar mão dos pareceres dos peritos médicos existentes nos autos (seja em exame singular, seja em junta médica, ou mesmo de exames e pareceres complementares (art.º 139º nº 7 do CPT), sendo certo que a força probatória desses pareceres é fixada livremente pelo tribunal - art.º 389º do C. Civil. Por outro lado, o parecer do IEFP, na medida em que constitui um exame pericial, naturalmente que também está sujeito à livre apreciação do Tribunal E o que nos dizem os autos sobre a situação do sinistrado? 5.1.1.4. O Sinistrado teve alta definitiva em 22 de Abril de 2021, ficando afectado com sequelas ao nível do membro superior direito, concretamente “limitação dolorosa das mobilidades do ombro – abdução/anteplusão 90.º, não consegue levar a mão à nuca nem à região lombar e leva com muita dificuldade ao ombro oposto, com défice de força muscular, ligeira amiotrofia da cinturar escapular, 5 cicatrizes no ombro com 1,5 cm de comprimento”, que se traduz numa incapacidade parcial permanente (IPP) de 15% (10% x factor 1,5 por idade superior a 50 anos à data da alta), com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH) de motorista (tendo presente as funções exercidas e as capacidades exigidas nos termos exarados infra nos pontos 5.1.1.8 e 5.1.1.12), tendo estado afectado de incapacidade temporária absoluta (ITA) num total de 575 dias, de incapacidade temporária parcial (ITP) de 25% num total de 15 dias e de incapacidade temporária parcial (ITP) de 40% num total de 13 dias. 5.1.1.8. Faz parte da categoria profissional do Sinistrado, de acordo com o contrato de trabalho referido em 5.1.1.7, as seguintes funções: conduzindo veículos de transporte, ligeiros ou pesados, após assegurar-se do bom funcionamento dos veículos que conduz, efectua auto-venda, venda por telefone (televendas) ou cobranças, bem como elabora pedidos de abastecimento de maquinas de vending, abastece-as e acompanha a sua manutenção, de modo a garantir o bom funcionamento da área e o cumprimento dos objectivos definidos; efectua as acções necessárias para que a viatura que conduz se encontre em bom estado de funcionamento, assegurando a sua manutenção mecânica, conservação e limpeza; recebe e verifica as rotas estipuladas para a entrega dos produtos aos clientes; acompanha o carregamento do veículo; conduz o veículo de acordo com as rotas anteriormente estipuladas; efectua o descarregamento dos produtos no cliente e procede ao carregamento do vasilhame; procede à cobrança dos valores facturados ao cliente; após o regresso à empresa procede ao descarregamento do vasilhame; presta contas no escritório sobre as cobranças efectuadas aos clientes e as quantidades de vasilhame recebidas.” 5.1.1.9. O âmbito das funções levadas a cabo por um motorista de veículos pesados de mercadorias (médio curso), o IEFP conclui que estão em causa as seguintes tarefas: De uma forma genérica -Conduz veículos pesados, articulados, com reboque, de transporte de mercadorias; -Observa os percursos definidos, nacionais, respeitando as normas e regras de condução e circulação rodoviária; -Assegura o acondicionamento e segurança das cargas; -Providencia no sentido de garantir o transporte da mercadoria em condições de segurança; -Procede à carga e à descarga das mercadorias a transportar/transportadas, quando necessário; Com mais pormenor, tendo, nomeadamente, em conta o posto de trabalho ocupado -Recebe instruções dos seus superiores hierárquicos acerca dos destinos, quantidades e tipo de carga a transportar; -Providencia, diariamente, condições para o bom estado de funcionamento do veículo com que opera regularmente (um camião pesado de mercadorias), zelando pela sua manutenção - controlando o seu estado de lubrificação, nível da água e pressão dos pneus, e relatando superiormente, eventuais anomalias para uma intervenção técnica mais especializada; -Colabora na carga/descarga de mercadorias do camião posicionando-o, de modo adequado, nos locais apropriados, utilizando a força de braços para carregamentos diversos e outros meios auxiliares de movimentação de cargas, tais como porta-paletes; -Ajusta, acondiciona e acomoda cargas diversas, algumas vezes sem ajuda de terceiros, na posição de pé, curvado e agachado, com a utilização de ambos braços/mãos, exercendo, por vezes a um nível intenso, força muscular, praticamente, do corpo todo; -Controla, várias vezes por dia, durante todo o período de viagem, fazendo uma inspecção visual pormenorizada, as condições de segurança da carga transportada, nomeadamente verificando se se encontra nas devidas condições, e fazendo reajustes sempre que necessário; -Conduz, diariamente, acompanhado de ajudante, zelando pela viatura e salvaguardando a mercadoria transportada, durante percursos que podem atingir várias centenas de quilómetros, dentro do país, durante o dia, e no inverno, à noite, um veículo pesado de mercadorias sendo que, para tal: -Utiliza, sempre que necessário, através das mãos e dos pés, os comandos adequados; -Manobra o camião, utilizando, nomeadamente, o volante, conforme os trajetos e percursos a fazer; -Regula a velocidade, utilizando, nomeadamente, com ambos os pés, o acelerador, a embraiagem e os travões, tendo em conta o estado da via, o tipo de carga transportada, as condições atmosféricas, a circulação de outros veículos e peões, assim como observando e cumprindo as diferentes regras e sinais de trânsito. -Elabora, com alguma regularidade, relatórios escritos ou procede ao preenchimento de formulários específicos, com menção do serviço efectuado, eventuais ocorrências, anomalias no funcionamento da viatura utilizada, regista elementos identificativos em dispositivos digitais (tacógrafo), conforme consignado na lei. -Procede regularmente à limpeza dos veículos que conduz (interior da cabine). 5.1.1.10. De acordo com o parecer do IEFP, para que o trabalhador possa exercer o tipo de funções acima descrito, de modo produtivo, com qualidade e segurança, é necessário que seja capaz de responder aos seguintes requisitos: Condições de execução do trabalho: O trabalhador deve ser capaz de trabalhar tanto em espaço fechado (condução na cabine do veículo), como em espaços ao ar livre, nas tarefas inerentes ao carregamento e descarregamento da carga do veículo, estando o trabalhador sujeito às diversas condições atmosféricas (chuva, frio, neve, calor); Exigências físicas, posição de trabalho, locomoção, tipo e intensidade de esforço -O trabalhador deve conseguir adoptar a posição de sentado, no interior da viatura; -O trabalhador deve conseguir adoptar as posições ortostática, curvado e agachado, durante as operações de preparação para o carregamento/ descarregamento, sendo que, muitas vezes, tem de subir e descer ao topo da carga do camião ou nas situações em que necessita de efectuar a limpeza do veículo; -O trabalhador deve poder efectuar flexões frontais do tronco e do pescoço, torções laterais do tronco e do pescoço, movimentos de extensão do pescoço, bem como trabalhar com os braços acima do nível dos ombros, sobretudo nas operações de carga e descarga do veículo; - O trabalhador deve poder levantar e baixar, manualmente, ainda que com a ajuda de meios mecânicos, mercadorias na ordem de várias dezenas de quilos; deslocar e levantar pesos, com os braços e mãos, pegar em pneus com um peso aproximado de 150 quilos, sempre que necessário; - O trabalhador deve ser capaz de efectuar subidas/descidas com bastante frequência, dado que entra e sai do camião, bem como da plataforma de carga do veículo, frequentemente; Exigências Sensoriais/Psicomotoras/Cognitivas -O trabalhador deve ser detentor de acuidade visual ao longe, adequada visão crepuscular, campo visual, percepção da profundidade, visão estereoscópica e resistência ao deslumbramento, sobretudo nos períodos de condução nocturna e sob condições atmosféricas adversas; -O trabalhador deve possuir uma adequada coordenação mão-mão, pé-pé, óculomanual-pedal, rapidez de reação; deve possuir um adequado nível de coordenação motora, nomeadamente no que diz respeito à coordenação mão-mão, mão-braço, braços troncopernas, tanto nas tarefas de condução como nos momentos de carga e descarga das mercadorias transportadas; 5.1.1.11. É parecer do IEFP que “tendo em conta o perfil de exigências do posto de trabalho analisado, o qual exige uma adequada destreza física, com adequadas condições de todo o corpo, nomeadamente de ambos os braços, parece-nos (sendo, simplesmente, um elemento que poderá ajudar a uma decisão médica e do Tribunal) que o trabalhador se encontra impossibilitado de exercer as tarefas fundamentais da sua actividade profissional ou de outras que exijam íntegras condições dos membros superiores”. No caso vertente, a Srª Juíza de 1ª Instância deixou consignados os fundamentos e razões pelas quais decidiu pela atribuição de IPATH, referindo que o fez com base no parecer do IEFP. Este parecer está muito bem fundamentado, fazendo a análise das funções que o sinistrado desempenhava enquanto motorista. Justifica a Srª Juíza a quo atribuição da IPATH, da seguinte forma: “Ora, as limitações funcionais do ombro direito (lado dominante) que o Sinistrado apresenta, para além da impossibilidade de efectuar cargas e descargas, como individuo saudável (de notar que o Sinistrado poderá fazer esse trabalho sozinho e sem qualquer ajuda e não tem de necessariamente ser auxiliado por maquinaria ou por outros colegas, conforme referem os senhores peritos), considero também que as sequelas acarretarem limitações funcionais na condução que, em circunstâncias imprevisíveis de grande exigência em termos funcionais a nível do ombro direito e não possíveis de executar, poderão com elevada probabilidade levar à ocorrência de acidentes rodoviários, quiçá de consequências de gravidade imprevisível. Objectivamente o examinando poderá até estar limitado para realizar manobras com apelo a movimentos repetidos dos membros superiores, tais como a condução em rotundas, estradas sinuosas, comprometendo pelas limitações funcionais a condução adequada e em segurança (do exame pericial realizado na fase conciliatória e reiterado por todas as juntas médicas, o Sinistrado apresenta como sequelas: membro superior direito – “limitação dolorosa das mobilidades do ombro – abdução/anteplusão 90.º, não consegue levar a mão à nuca nem à região lombar e leva com muita dificuldade ao ombro oposto, com défice de força muscular, ligeira amiotrofia da cinturar escapular, 5 cicatrizes no ombro com 1,5 cm de comprimento”. O entendimento ora (e anteriormente) sufragado está também em sintonia com as regas da experiência comuns, para além de que, quer a limitação física apresentada, quer a repercussão a nível de dores consequentes em situações de esforço decorrente da condução em circunstâncias mais exigentes, e é também susceptível de comprometer a concentração necessária à condução em condições de segurança. Não basta, pois, que o Sinistrado possa conduzir, ainda que com limitações, pois que, tendo em conta a concreta actividade profissional do Sinistrado, é necessário que o faça em condições de segurança rodoviária. Mas não só. Todos os peritos aceitam e entendem que as limitações funcionais daquele impedem a execução de actividades de cargas e descargas e salienta-se que também as tarefas de acondicionamento da carga, que envolve a necessidade de a prender através da colocação de cintas de segurança ou cabos de aço [e apertá-las(os)], deve ser executada de modo adequado e em condições de segurança rodoviária, o qua exige igualmente uma boa funcionalidade, força e destreza do braço direito, para além de que tal é igualmente exigido para que o Sinistrado, em segurança, suba e desça de cima da carga. Em suma, tendo em conta a actividade do Sinistrado, de motorista de veículos pesados de mercadorias, e as exigências físicas necessárias ao exercício das funções essenciais de tal actividade em condições de segurança, entendemos que o mesmo, em consequência das lesões/sequelas decorrentes do acidente de trabalho de que foi vítima, se encontra afectado de incapacidade permanente absoluta para o seu trabalho habitual.” O exercício da condução, mormente de veículos pesados de mercadorias, é uma atividade exigente, perigosa e que tem que se pautar por rigorosos critérios de segurança rodoviária, segurança essa que se impõe quer para o próprio condutor, quer para terceiros e que exigem uma boa aptidão e agilidade físicas, como aliás também decorre das “exigências sensoriais/psicomotoras” referidas no estudo do posto de trabalho levado a cabo pelo IEFP, que alude à necessidade de “agilidade física e coordenação motora (…)mão-braço(…)” e de “elevada capacidade de atenção concentrada e distribuída na execução das tarefas de condução dos veículos, sobretudo em períodos longos e em locais de espaço exíguo ou de muito trânsito. Acresce ser inviável ao sinistrado, motorista de veículos pesados - que faz transporte de mercadorias, exigindo esforços violentos com os membros superiores e faculdades especiais de equilíbrio para subir e descer da cabine - com as limitações que tem ao nível do membro superior direito, executar as atividades de cargas e descargas e as tarefas de acondicionamento da carga, que envolve a necessidade de a prender através da colocação de cintas de segurança ou cabos de aço. Mas, importa também referi-lo, definidas e enquadradas que sejam, na TNI, as lesões que o sinistrado apresente (questão esta de cariz essencialmente técnico/médico), o juízo a fazer quanto à questão de saber se as mesmas determinam, ou não, IPATH passa também pela apreciação de diversos outros aspetos, como o tipo de tarefas concretas que o trabalho habitual do sinistrado envolve, conjugado, se for o caso, com outros elementos probatórios e com as regras do conhecimento e experiência comuns, o que extravasa um juízo puramente técnico-científico. Na situação em apreço, sendo a actividade do A. a de motorista de veículos pesados de mercadorias, relevam essencialmente as tarefas de condução e de carregamento, acondicionamento e descarregamento de mercadorias do camião. A posição que sustenta a inexistência de IPATH não tem um valor vinculativo e/ou de tal forma convincente que nos leve à sua adoção. Os peritos que a sustentam, nada dizem ou esclarecem quanto à repercussão das limitações na qualidade e segurança da condução, sendo que a possibilidade do exercício das funções não pode ser vista descontextualizada das concretas condições do exercício da atividade. E, também não podemos esquecer, que não ficou demonstrado nos autos que o sinistrado, após a alta médica, tenha voltado à sua atividade profissional de motorista de pesados, retomando o seu posto de trabalho (vide ponto 5.1.2.2 dos factos não provados), o que seria claramente demonstrativo de que o mesmo é suscetível de reconversão nesse posto de trabalho. Ao aderir a este parecer a Srª Juíza da 1º Instância expressou bem as razões pelas quais dentro do seu poder de livre apreciação dos pareceres juntos aos autos decidiu pela atribuição de IPATH, nada havendo a objetar a esta decisão. Mas, importa também referi-lo, definidas e enquadradas que sejam, na TNI, as lesões que o sinistrado apresente (questão esta de cariz essencialmente técnico/médico), o juízo a fazer quanto à questão de saber se as mesmas determinam, ou não, IPATH passa também pela apreciação de diversos outros aspetos, como o tipo de tarefas concretas que o trabalho habitual do sinistrado envolve, conjugado, se for o caso, com outros elementos probatórios e com as regras do conhecimento e experiência comuns, o que extravasa um juízo puramente técnico-científico. Na situação em apreço, sendo a atividade do A. a de motorista de veículos pesados de mercadorias, relevam essencialmente as tarefas de condução e de carregamento, acondicionamento e descarregamento de mercadorias do camião A propósito de situações similares que envolvem motoristas, passemos a citar o acórdão do TRP, de 4-02-2019[5]: “I- Sendo a actividade do A. a de motorista de veículos pesados de mercadorias, relevam essencialmente, para a apreciação da atribuição, ou não, de IPATH, as tarefas de condução e de carregamento, acondicionamento e descarregamento de mercadorias do camião, não devendo a possibilidade do exercício das funções ser apreciada descontextualizada das concretas condições do exercício da actividade em condições de segurança, designadamente em matéria de segurança rodoviária e do carregamento e adequado acondicionamento da carga. II- Apresentando o A. “Limitação conjugada da mobilidade (conjunto das articulações do ombro e cotovelo)” de Grau II [TNI – Cap. I.3.2.7.3 b)], com um coeficiente de desvalorização de 7%,, tendo em conta o parecer emitido pelo Centro D… no sentido, pelas razões que aduz, de que as lesões apresentadas pelo A. determinam IPATH e, no mesmo sentido, pronunciando-se o exame médico singular e o parecer do perito médico apresentado pelo A. que interveio na junta médica, bem como as exigências físicas necessárias ao exercício das funções essenciais de actividade de motorista de veículos pesados de mercadorias em condições de segurança, deve ao A. ser atribuída IPATH para o exercício de tal profissão.” A posição que sustenta a inexistência de IPATH não tem um valor vinculativo e/ou de tal forma convincente que nos leve à sua adoção. Os peritos médicos que a sustentam, limitam-se a dizer que o sinistrado não está afetado de IPATH para a atividade especifica de motorista de pesados, aceitando, todavia, que a sua situação sequelar é incompatível com a carga e movimentação de mercadorias, ou seja, o sinistrado pode exercer a atividade de motorista, mas não pode participar na carga e descarga de mercadorias que transporta.”. Mas nada dizem ou esclarecem quanto à repercussão de limitações na qualidade e segurança da condução, sendo que a possibilidade do exercício das funções não pode ser vista descontextualizada das concretas condições do exercício da atividade. Em suma, tendo em conta a atividade do sinistrado, de motorista de veículos pesados de mercadorias, e as exigências físicas necessárias ao exercício das funções essenciais de tal atividade em condições de segurança, entendemos que o mesmo, em consequência das lesões/sequelas decorrentes do acidente de trabalho de que foi vítima, se encontra afetado para o seu trabalho habitual. Ou seja, por outras palavras, resultando dos autos que o sinistrado está impossibilitado de realizar o núcleo essencial ou fulcral das funções que vinha exercendo até à data do acidente é de atribuir-se-lhe IPATH. Improcedem as conclusões do recurso e confirma-se a sentença recorrida. *** DECISÃO Com fundamento no atrás exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se, em consequência, a sentença recorrida. Custas pela apelante, atendendo ao seu vencimento- artigos 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº 6 e 663º, nº 2, todos do CPC. Coimbra, 16 de maio de 2025 Mário Rodrigues da Silva- relator Paula Maria Roberto Felizardo Paiva *** Sumário (artigo 663º, nº 7, do CPC): (…). Texto redigido com aplicação da grafia do (novo) Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, respeitando-se, no entanto, em caso de transcrição, a grafia do texto original
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