Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1408/23.9PBVIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ISABEL GAIO FERREIRA DE CASTRO
Descritores: CRIME DE CONDUÇÃO DE VEÍCULO EM ESTADO DE EMBRIAGUEZ
IMPUGNAÇÃO AMPLA DA MATÉRIA DE FACTO
RECURSOS NOS PROCESSOS ESPECIAIS SUMÁRIO E ABREVIADO
DILIGÊNCIA PROBATÓRIA NECESSÁRIA PARA A DESCOBERTA DA VERDADE MATERIAL
OMISSÃO DE DILIGÊNCIA PROBATÓRIA NECESSÁRIA
NULIDADE
Data do Acordão: 06/11/2025
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU - JUÍZO LOCAL CRIMINAL DE VISEU - JUIZ 2
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 40º, N.º 2, 69.º, N.º1, ALÍNEA A), 71.º E 292.º, TODOS DO CÓDIGO PENAL; ARTIGOS 127º, 340.º, 391º, N.º 1 E 391º-G, TODOS DO CPP. ART 11º DA PORTARIA N.º 366/2023, DE 15.11
Sumário: 1 - O artigo 10º da Portaria n.º 1556/2007, de 10.12, dispunha que “Os alcoolímetros cujo modelo tenha sido objecto de autorização de uso, determinada ao abrigo da legislação anterior, poderão permanecer em utilização enquanto estiverem em bom estado de conservação e nos ensaios incorrerem em erros que não excedam os erros máximos admissíveis da verificação periódica”, contendo a Portaria n.º 366/2023, de 15.11, uma disposição transitória de idêntico teor, pelo que nada obstava à valoração da prova obtida com recurso ao alcoolímetro utilizado aquando da sua fiscalização em causa nos autos.

2 - O juízo sobre a essencialidade ou indispensabilidade de produção de determinada diligência de prova cabe ao tribunal – a quem incumbe apreciar a prova e julgar a causa – e está vinculado aos princípios da legalidade, objetividade, necessidade, adequação e viabilidade da obtenção de prova.

3 - É recorrível a decisão de indeferimento de requerimento de prova formulado em audiência ao abrigo do artigo 340º do CPP.

4 - A omissão de diligência probatória necessária para a descoberta da verdade material, haja sido ou não requerida, é suscetível de integrar nulidade relativa ou sanável, nos termos da segunda parte da alínea d) do n.º 2 do artigo 120.º do Código de Processo Penal.

5 - No âmbito dos processos especiais sumário e abreviado [como é o caso], pautados pela celeridade, simplificação e redução dos atos, só é admissível recurso da sentença ou do despacho que puser termo ao processo, nos termos previstos nos artigos 391º, n.º 1, 391º-G, do Código de Processo Penal.

6 - Sob pena de preterição das garantias de defesa, o recurso da sentença pode abranger as nulidades, os vícios de procedimento, o julgamento dos factos ou a decisão de direito.

7 - É infundado o pedido de ampliação do período de ausência da residência para trabalhar que foi autorizado, pois não resulta dos factos provados que o recorrente também trabalhava aos sábados e domingos.


(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Integral: *

*

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Coimbra:

I. - RELATÓRIO

1. - No Juízo Local Criminal de Viseu – Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Viseu, no âmbito de processo abreviado que ali corre os seus termos sob o n.º 1408/23.9PBVIS, foi realizado julgamento, com intervenção de tribunal singular, tendo sido proferida sentença mediante a qual se decidiu [transcrição[1]]:

a) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 69.º, n.º1, alínea a) e 292.º, ambos do Código Penal, na pena de 7 (sete) meses de prisão e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 13 (treze meses); descontando-se no cumprimento da pena de prisão 1 (um) dia.

b)  Determinar que a pena de 7 (sete) meses de prisão seja cumprida em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, pelo tempo de duração da pena de prisão, subordinando-se o regime de permanência na habitação ao cumprimento de regra de conduta - a fiscalizar pelos serviços de reinserção social - de realização de tratamento para o alcoolismo; desde já se autorizando o arguido a ausentar-se da residência para o exercício da sua actividade profissional (no horário compreendido entre as 07:00h e as 18:00h, de segunda a sexta-feira), devendo o arguido estar sempre contactável durante os períodos de ausência, e para aceder aos actos médicos que lhe forem prescritos, cabendo à DGRSP controlar as saídas em função das necessidades de intervenção e sem prejuízo de outras ausências que possam vir a ser autorizadas.

c) Condenar o arguido no pagamento das custas do processo, fixando-se a taxa de justiça a pagar pelo arguido em duas unidades de conta».

            2. - Não se conformando com o assim decidido, o arguido interpôs recurso, apresentando a respetiva motivação e formulando as seguintes conclusões [transcrição]:

«1- No âmbito dos presentes autos foi o arguido BB condenado pela autoria material e na forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 69.º, n.º1, alínea a) e 292.º, ambos do Código Penal, na pena de 7 (sete) meses de prisão e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 13 (treze meses) substituída a pena de 7 (sete) meses de prisão em regime de permanência na habitação, “com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, pelo tempo de duração da pena de prisão, subordinando-se o regime de permanência na habitação ao cumprimento de regra de conduta - a fiscalizar pelos serviços de reinserção social - de realização de tratamento para o alcoolismo; desde já se autorizando o arguido a ausentar-se da residência para o exercício da sua atividade profissional (no horário compreendido entre as 07:00h e as 18:00h, de segunda a sexta-feira), devendo o arguido estar sempre contactável durante os períodos de ausência, e para aceder aos actos médicos que lhe forem prescritos, cabendo à DGRSP controlar as saídas em função das necessidades de intervenção e sem prejuízo de outras ausências que possam vir a ser autorizadas.”

2- Não se conforma o arguido com tal condenação, quer porque da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento não resultou, muito menos de forma clara e manifesta, que o ora recorrido tenha ingerido bebidas alcoólicas na quantidade descrita pelo alcoolímetro o que acabou por ser descrito e dado por assente na sentença ora sindicada quer porque, e sobretudo, em consciência, sabe o arguido que não praticou os factos pelos quais foi condenado (cfr. acusação), por outro lado, a abordagem do agente autuante não foi feita na via pública, mas em parque de estacionamento, junto à Travessa .... (vide declarações do arguido disponíveis na aplicação informática em uso no Tribunal recorrido, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 15:39:09 horas e o seu termo pelas 16:27:01 horas)

3- Das quais se salienta, em resumo, que: Não aceitou a TAS constante da autuação; Não ingeriu bebidas alcoólicas em quantidade suficiente para se obter tal TAS; A sua viatura não se encontrava na via pública; Dirigiu-se ao carro para buscar a sua mochila uma vez que ia chamar um Uber para regressar a casa; Uma vez que o local de estacionamento da viatura estava em obras tenta recuar o carro para não prejudicar o mesmo acesso aos proprietários, e nessa manobra é surpreendido pela PSP, mas não na via pública; Não tinha intenção de conduzir até casa.

4- No decurso das declarações do arguido, pela DMMP foi solicitado que se efetuasse uma pesquisa de imagens de localização no google maps, foi o arguido confrontado com as imagens, tendo sido assinalado com uma cruz pela Mmª Juiz sobre o local da alegada infração, sendo ordenada a sua junção aos autos.

5- Em tal documento junto aos autos o local assinalado da alegada infração não correspondeu ao local constante do auto de notícia! (o tribunal devia ter tido em consideração na ponderação sobre a prova admitida pela contradição assinalada concluindo pela absolvição do arguido)

6- O que por si só consubstancia uma nulidade insanável, o que se deixa arguido desde já para os efeitos tido por legais e que V.as Excelências oficiosamente saberão acautelar.

7- Por outro lado, a testemunha CC, 16:41 - 00:00:02- 6:42, 16:56 - 00:14:33 no dia 07-05-2024, afirma que o Arguido se encontrava perfeitamente lúcido e o mesmo não tinha intenção de conduzir. Corrobora enfim as declarações do Arguido.

8- Na audiência final, pela defesa do arguido, foi pedida a palavra tendo no uso da mesma requerido por súmula que resulta uma contradição quanto ao local onde aconteceram os factos, pelo que requer seja solicitada informação se na data da infração existiam ou não tapumes e se havia obras naquele local. (para confronto de declarações entre arguido e autuante)

9- Este requerimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 09 horas e 36 minutos e o seu termo pelas 09 horas e 37 minutos.

10- Ainda assim, a Sra. Juiz indeferiu tal pretensão, (violando entre o mais o artigo 340.º do CPP) pois que se torna imperioso impugnar também aqui tal indeferimento de requerimento de prova, uma vez que originou prejuízo para as garantias de defesa do arguido, para a descoberta da verdade e bem assim para a boa decisão da causa.

11- Vejamos, para condenar o arguido o tribunal a quo, não foi além de aderir ao auto de notícia, não julgando sequer a arguição da nulidade da prova pericial, em clara violação de falta de pronúncia, que se suscitou nos prazos legais tanto na fase preliminar do processo e bem assim pelo que foi ditado para ata no início do Julgamento, vide áudio gravações. (requerimento gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal) - datado de 07/05/2024, 95381430, Ata de julgamento c/gravação.

12- Tal requerimento foi no sentido seguinte, em súmula:

13- “…Requer-se nos termos do art. 340.º do CPP e demais aplicável, tais como os artigos 20, nº 1, 32º nº 1 e 7 da CRP, sem esquecer os art. 79.º nº 1, 165º nº1 e 315º nº 1, 328º nº 3 al.b) e 360º nº 4, sem prejuízo dos deveres de oficio do Tribunal sempre em respeito pelo princípio da investigação. Pressupostos Um alcoolímetro é um instrumento usado para medir a concentração de etanol no sangue (TAS- Teor de Álcool no sangue) através de uma análise ao ar expirado durante um sopro. A determinação quantitativa do etanol no ar expirado (TAE- Teor de Álcool no ar Expirado) é feita, em geral, por dois métodos analíticos distintos, através de célula eletroquimica, ou por absorção de infravermelho. O princípio básico que sustenta a utilização dos alcoolímetros é o de que existe uma relação fisiológica entre a concentração de álcool no ar alveolar expirado (TAE)e a concentração presente no sangue (TAS). Assim, a concentração de álcool no ar expirado é diretamente proporcional à sua concentração no sangue, quando este passa pelos pulmões. Esta relação é função da constituição física média da população e não é idêntica em todos os países. Em Portugal, a conversão dos valores do teor de álcool no ar expirado (TAE) em teor de álcool no sangue (TAS) é baseada no princípio de que 1mg de álcool por litro de ar expirado é equivalente a 2,3 g de álcool por litro de sangue:1mg/L (TAE)=2,3 g/L (TAS). Ora, o arguido colocou em causa a fiabilidade do aparelho, pelas suas declarações neste momento em julgamento, uma vez que não aceita a taxa de alcoolémia contida na acusação, sendo a mesma relativamente próxima daquela que redunda não da incriminação, mas da contra-ordenação, inferior a 1,20g/L- TAS, a tudo se soma que o mesmo alcoolímetro se encontra fora da verificação anual obrigatória como já teve ocasião de salientar e demonstrar. Desta forma sendo necessária e essencial à boa decisão da causa e à descoberta da verdade material, deverá V. Exª ordenar perícia ao alcoolímetro dos autos a entidade competente, sob os seguintes Quesitos: 1) Qual a probabilidade de o aparelho em causa assumir um desvio sobre a margem de erro? 2) Tal desvio pode colocar em causa a fiabilidade do mesmo? 3) Que margem de desvio assume o mesmo aparelho em concreto? Espera deferimento.-“

14- Após o não deferimento de tal requerimento de prova a 26/06/2024, Ref.ª 6649004, foi suscitado o seguinte. “ Vem o arguido, sobre o v/ último despacho, expor e requerer nos termos subsequentes. De facto, havia aquele colocado em causa a fiabilidade do alcoolímetro dos autos, uma vez que não aceita a taxa de alcoolémia, sendo a mesma relativamente próxima daquela que redunda não da incriminação, mas da contra-ordenação, inferior a 1,20 g/l – TAS. Tal resulta também das suas declarações em sede de audiência de julgamento, já prestadas. Veio a ser requerida pelo arguido, perícia, em sede de audiência de julgamento ao alcoolímetro utilizado no caso dos autos, indicando os seguintes quesitos: “1. Qual a probabilidade de o aparelho em causa assumir um desvio sobre a margem de erro? 2) Tal desvio pode colocar em causa a fiabilidade do mesmo? 3) Que margem de desvio assume o mesmo aparelho em concreto.” Sucede que, a mesma não foi admitida cfr despacho. O mesmo fundamentou-se que “ resulta claro que a verificação periódica anual a realizar no ano civil de 2023, e, portanto, até ao dia 31 de Dezembro de 2023, se mostrava válida à data da prática dos factos. Neste conspecto, considerando que o aparelho DRAGER ALCOOTEST utilizado na situação dos autos foi oportunamente aprovado pelo competente Instituto Português da Qualidade, I. P. – IPQ, tendo, também, este Instituto – único competente para o controlo metrológico dos alcoolímetros – verificado periodicamente o aparelho em apreço, mostrando-se válida a verificação periódica à data da prática dos factos, e sendo certo que em sede de acusação pública se mostra deduzido o erro máximo admissível (EMA), previsto no artigo 8.º da Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro e no quadro em anexo a tal Diploma, resulta claro que a perícia requerida pelo arguido carece de qualquer pertinência e utilidade.” Nada mais errado, pelo que, não merecerá o nosso acolhimento. De facto, era necessário dar cumprimento à disposição do artigo 340.º, por se afigurar a mesma necessária para a descoberta verdade e para a boa decisão da causa. É nessa senda que se suscita a nulidade do despacho em crise por via do artigo 120.º n.º 2 alínea d) A insuficiência do inquérito ou da instrução e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade. S.M.O., o despacho antecedente (25/06/2024 com Ref.ª 95758207) que veio a não admitir diligências de prova, baseia-se numa falsa questão, que é aquela que assume e cita-se: “encontra-se o parelho dentro da verificação periódica anual”. O que, de todo, não é verdade. E, nem se diga, que o entendimento correto é aquele que se firma no limite do ano civil. (não sendo despiciendo referir que até a data dos factos em discussão se haverão de reportar muito ao fim do ano civil, cfr os autos) Reitera-se: uma vez que a TAS se encontra junto do limite contra-ordenacional, a verificação anual ultrapassada, e bem assim com as declarações do arguido de que não bebeu bebidas alcoólicas que pudessem ter dado origem àqueloutra o que foi corroborado por testemunha que jantou com o arguido nesse dia, asseverando que o mesmo estava completamente lúcido e “em perfeitas condições”, teria que até ex oficio levar o tribunal a ordenar tal perícia ou outra com o desiderato no escrupuloso cumprimento do artigo 340.º do CPP. Concluímos, Que a omissão de produção de meio de prova necessário, no sentido de essencial para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa, constitui nulidade relativa, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 120.º do CPP. Por tudo o que foi exposto deve ser julgada procedente a arguida nulidade do despacho em crise, ser o mesmo revogado e ordenada nos termos do art. 340.º do CPP e demais aplicável, tais como os artigos 20, nº 1, 32º nº 1 e 7 da CRP, sem esquecer os art. 79º nº 1, 165º nº1 e 315º nº 1, 328º nº 3 al.b) e 360.º nº 4, sem prejuízo dos deveres de oficio do Tribunal sempre em respeito pelo princípio da investigação, a mesma perícia.”

15- IN DUBIO PRO REO

16- Na verdade, tal prova, entre nós inválida, não podia ter sido valorada, naturalmente conjugada com o contexto dos factos que deviam ter sido apurados em sede de decisão, o que, para prejuízo do recorrente senão verificou.

17- O julgador e cita-se, “Não obstante reconhecer a ilicitude do comportamento de cuja prática se encontra acusado, AA refere que esta situação foi fruto de uma desadequada avaliação da situação.”, devia ter interpretado os factos de forma a que o Arguido não aceitou a taxa de alcoolémia vertida na acusação, porque o mesmo não havia ingerido uma quantidade de teor alcoólico conforme as alusões/referências das suas declarações, sem prejuízo do principio da não “auto-incriminação”.

18- Ora, o Tribunal a quo desrespeitou o princípio da descoberta da verdade material, imposto pelo artigo 340.º do Código de Processo Penal, ao não determinar o requerido em sede de audiência de julgamento pela defesa quanto a uma aferição/perícia ao Alcoolímetro em crise, diligência essa essencial para decisão a proferir nos autos, de absolvição ou condenação do arguido, caso mereçam (ou não) credibilidade as declarações a prestadas quer as do Arguido, quer as do autuante.

19- Tudo conjugado e se tal taxa de álcool fosse real, aquando da testagem, a testemunha agente autuante não teria referenciado que o arguido se encontrava colaborante. Daí todas as dúvidas se suscitarem quanto ao mesmo meio de prova, aliás, como é legitimo.

20- Decidindo, como decidiu, violou o Tribunal a quo o disposto artigos 127.º, 340.º, do CPP entre o mais.

21- Por outra via, não menos elementar, e em conjugação com a prova que devia ter sido aferida no sentido correto e não foi, sabemos que o erro existe e qual é (mas entre duas margens: mínimo e máximo), cremos que o que há a fazer é só corrigi-lo usando (porque em direito sancionatório) a certeza do erro mínimo (porque cientificamente não é possível eliminá-lo)» - cf. Ac. RP200805070810638, de 17/05/2008.

22- Deste modo, entendemos que a interpretação sistemática da própria lei impõe que, dentre os elementos a considerar para a apreciação probatória do resultado do teste quantitativo - os quais não podem ser ignorados pelo aplicador do direito - há que ponderar a margem de erro de medição que se admite que ocorra nos aparelhos de fiscalização, sendo, aliás, que essa ocorrência nem colide com a respetiva aprovação, pelo que não se considera correto o entendimento segundo o qual as regras supra enunciadas são válidas, apenas, na fase de aprovação desses aparelhos.

23- E tais normas regulamentares devem ser tomadas em consideração porque elas permitem avaliar a fiabilidade dos aparelhos de medição. De facto, são regras que têm o mesmo valor que as regras da experiência comum sobre a credibilidade de um testemunho: projectam-se sobre a reconstrução do facto (do crime) em julgamento.

24- É na construção deste juízo sempre falível que têm aplicação as regras do Cód. Proc. Penal, designadamente o princípio "in dubio pro reo". Deste princípio (enquanto corolário da presunção de inocência consagrada no art. 32º, 2 da Constituição) resulta que toda a dúvida sobre a prática do facto deve resolver-se a favor do arguido, isto é, todo o facto típico cuja verificação seja duvidosa deve dar-se como não provado - cfr. Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, acórdãos de 1-11-66 e 17-12-80, citados por MAIA GONÇALVES, Código de Processo Penal Anotado, Coimbra, 2002, pág. 338.

25- Esta conclusão não se opõe a natureza da prova produzida, relativa à taxa de álcool, que pode ser considerada documental ou pericial, mas jamais confessória.

26- O facto praticado pelo agente suscetível de confissão é tão-somentee a ingestão de álcool - ou, quando muito, essa ingestão em quantidade suficiente e adequada à produção de uma taxa de alcoolemia igual ou superior à prevista na norma incriminadora, jamais a taxa de alcoolemia.

27- É um facto sujeito a prova vinculada, na medida em que o resultado suscetível de ser usado para o preenchimento da previsão normativa carece de ser produzido por determinado tipo de aparelho, em determinadas condições.

28- Ainda que a margem de erro legalmente admissível seja levada em conta no momento da calibração do aparelho, tal facto apenas garante que o aparelho em concreto está apto a efetuar medições e que os resultados obtidos sempre se situarão dentro dos limites definidos por aquelas margens de erro.

29- Estamos perante uma incerteza balizada por normas do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, resultante das margens de erro toleradas, que o tribunal não pode ignorar sob pena de, uma vez desconsideradas, poderem levar à condenação do arguido por crime sem que a taxa real de álcool chegue a atingir o limiar que define o ilícito criminal ou, em todo o caso, com efeitos desfavoráveis ao nível da determinação da sanção» - Cf AC RP, de 23/06/2010, proc. RP20100623127/ 09.3 GARSD.Pl.

30- No caso, nem sequer o arguido, (entre nós e dissemo-lo em alegações orais), confessou os factos, naturalmente aos factos suscetíveis de aquisição processual por essa via, o Tribunal recorrido considerou como fundamento da aquisição probatória o resultado do exame junto aos autos, dando como provado que o arguido conduzia com uma taxa de alcoolemia de 1,60 g/lf, estando o aparelho fora do período de validade e verificação anual (o que é por demais evidente), o tribunal no mínimo devia ter acolhido a dúvida razoável atendendo a todo o contexto, o que não alcançou, com o devido respeito.

31- A interpretação do Tribunal colide com as garantias constitucionais vigentes.

32- Impunha-se por isso, a absolvição do Arguido.

33- Neste sentido veja-se entre outros os Ac. RP de 25-05 de 2011, Ac. RP de 09-03-2011 e Ac. RP de 09-02-2011, disponíveis em dgsi.pt, os quais podem ser localizados pelo campo Data do Acórdão e Ac. RC de 09-01-2008, cujo relator foi Orlando Gonçalves, proferido no proc. 426/04. OGTSTR. C1.

34- A sentença recorrida violou também, entre outros preceitos, os art. 292 n.º 1 do C. Penal, e art 8º da Portaria nº 1556/2007, de 10 de Dezembro e 32 n.º 2 da Constituição da República Portuguesa.

35- O presente recurso, versa sobre matéria de facto e direito, nos termos do artigo 410.º do CPP n.º1, 2 e 3.

Sem prescindir e sobre a pena concreta aplicada, vejamos:

36- Cumpriria ao tribunal proceder à determinação da espécie de pena que concretamente poderia eventualmente ser aplicada, considerando, para o efeito o princípio geral que resulta da combinação dos artigos 40.º e 70.º do Código Penal, segundo o qual deve ser dada preferência à pena de multa sempre que esta realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

37- O legislador português destaca as finalidades de prevenção especial, como fundamentadoras do movimento de luta contra as penas curtas de prisão aplicáveis à pequena e média criminalidade. Pelo que o tribunal só deverá recusar a aplicação da pena alternativa não privativa da liberdade, quando tal opção se revele inconveniente para a viabilidade e sucesso de um projeto de ressocialização, - o que não é o caso - funcionado as exigências de prevenção geral – enquanto defesa do ordenamento jurídico – como um limite mínimo à atuação das exigências de socialização.

38- Pelo que, o tribunal ao aplicar uma pena, só poderia aplicar neste caso uma pena de multa.

39- No que tange à pena acessória encontrada a mesma tem-se por excessiva, 13 (treze) meses, indo muito além da eventual culpa do agente, devendo situar-se no mínimo legal.

40- Por cautela de patrocínio,

41- E, s.m.o., a pena de prisão de 7 meses substituída por regime de permanência na habitação, também deverá ser revogada e estabelecida junto do seu mínimo legal e devendo ser estendido o período de trabalho aos dias de fim de semana, sábado e domingo, dada a natureza da profissão do arguido, que desenvolve também o seu trabalho nesses dias.

42- Nestes termos e, sobretudo naqueles que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se o douto acórdão proferido, nos termos supra expostos, com o que Vossas Excelências farão seguramente

A COSTUMADA JUSTIÇA!»


3. - O Ministério Público junto da primeira instância apresentou resposta ao recurso, na qual pugna pela improcedência do mesmo, concluindo:
«1. O arguido AA foi condenado pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 69.º, n.º1, alínea a) e 292.º, ambos do Código Penal, na pena de 7 (sete) meses de prisão e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 13 (treze meses); descontando-se no cumprimento da pena de prisão 1 (um) dia; e determinado que a pena de 7 (sete) meses de prisão seja cumprida em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, pelo tempo de duração da pena de prisão, subordinando-se o regime de permanência na habitação ao cumprimento de regra de conduta - a fiscalizar pelos serviços de reinserção social - de realização de tratamento para o alcoolismo.
2. Infere-se da respectiva motivação de recurso que o arguido discorda, no essencial, da apreciação que foi efectuada pelo Tribunal “a quo” relativamente à prova produzida em audiência de discussão e julgamento, nomeadamente no que concerne credibilidade que foi conferida à prova da acusação, em detrimento da versão do arguido.
3. No entanto, as declarações do arguido e, bem assim, as declarações da testemunha de defesa, não permitem infirmar a prova que resulta do resultado do exame de pesquisa de álcool no sangue através do ar expirado, realizada no aparelho quantitativo marca Drager, modelo 7110 MKIII P, cujo talão se encontra junto aos autos a fls. 6.
4. De facto, a determinação ou quantificação da taxa de álcool no sangue só pode ser validamente efectuada por analisador quantitativo de ar expirado ou por métodos biológicos, através de análise ao sangue, inexistindo qualquer dúvida quanto à prova que resulta da determinação de álcool presente no sangue do arguido aquando da condução, sendo irrelevante a alegação do arguido de que “se sentia bem”.
5. Se o arguido tinha dúvidas sobre essa quantificação, apenas as expressou em audiência de julgamento, já que no momento próprio em que lhe foi conferida a possibilidade de realização da contraprova, o arguido não a requereu, conformando-se com aquele resultado – cfr. fls. 12 (ponto 3).
6. No que concerne à condução em via pública, o próprio arguido declarou em audiência que não estacionou em qualquer espaço “condominial” ou “parque de estacionamento privado”, mas sim em zona com estacionamento, existente na via pública, controlado por parquímetros – o que configura uma via pública, nos termos do art. 1.º al. x) e aa) do C. Estrada.
7. As testemunhas DD e EE, agentes da PSP descreveram, de forma perentória e assertiva, as circunstâncias de tempo modo e lugar em que abordaram o arguido, tendo inclusivamente o agente da PSP EE referido ter avistado o arguido a conduzir o veículo automóvel em direcção à Rua ... e recuado a marcha, tendo logrado convencer o Tribunal quanto ao local onde ocorreram os factos, nos termos dados como provados.
8. O Tribunal indeferiu por despacho a realização da diligência de prova requerida pelo arguido destinada a apurar se, no local onde ocorreram os factos, existam tapumes e obras, estando em curso o respectivo julgamento, pelo que, a existir, estaríamos perante uma nulidade sanável nos termos previstos no artigo 120º, n.º 2, al. d) do C.P.P. e, não tendo esta sido foi arguida pelo recorrente, nos termos do artigo 120.º, n.º3, alínea a) do C.P.P., vindo a fazê-lo apenas perante o Tribunal superior, temos que considera-la sanada. Consequentemente, afigura-se-nos que o recurso interposto pelo arguido neste segmento da fundamentação, não é legalmente admissível, devendo ser rejeitado, nos termos do disposto no art. 417º/6 al. a) e 420º/1 al. b) do C. P. Penal.
9. Sem prescindir, sempre se dirá que a diligência em causa, requerida pelo arguido, se revela manifestamente dilatória e de nenhuma utilidade para a descoberta da verdade material e para a boa decisão da causa, pelo que bem andou o Tribunal ao indeferir a diligência de prova requerida pelo arguido, inexistindo qualquer fundamento na invocada violação do art. 340.º do C. P. Penal.
10.O aparelho utilizado para determinação da alcoolémia no sangue do arguido mantinha a verificação periódica válida, à data da realização do teste em causa nos autos, pelo que estava confirmada a qualidade metrológica que a operação de verificação periódica lhe assegurava, sendo a prova por ele recolhida válida.
11.É falso o alegado pelo arguido na sua motivação de recurso quando invoca que Tribunal não se pronunciou quanto à arguida nulidade da prova pericial, inexistindo qualquer nulidade por omissão de pronúncia – o Tribunal indeferiu a requerida nulidade, por despacho proferido a 01 de Dezembro de 2024 e que se encontra junto aos autos a fls. 251 – despacho que foi notificado ao arguido a 02-12-2024 – cfr. fls. 253.
12.Inexistindo qualquer fundamento, técnico científico, para colocar em causa a prova tarifada que decorre da determinação de álcool no sangue realizada ao arguido, falece igualmente qualquer tipo de fundamento para determinar a realização de perícia ao alcoolímetro.
13.A perícia requerida pelo arguido carece de qualquer pertinência e utilidade, sendo notório que se trata de uma diligência de prova requerida exclusivamente com a intenção de protelar o andamento do processo. Mais, afigura-se-nos mesmo que seria uma diligência de prova de impossível concretização, face ao lapso de tempo já decorrido desde o momento em que o arguido foi sujeito à pesquisa de álcool no sangue através do ar expirado.
14.No que concerne à margem de erro que decorre das medições efectuadas por aparelho alcoolímetro, remetemos para os factos dados como provados em 3), pelo que carece de fundamento o alegado pelo arguido neste segmento da sua motivação de recurso.
15.Inexiste qualquer dúvida que cumpra resolver em favor do arguido, com base no princípio in dubio pro reo, tendo sido possível ao Tribunal concluir, com a certeza necessária à condenação, que o arguido cometeu os factos pelos quais foi condenado.
16.Face ao teor do passado criminógeno do arguido, fácil é de compreender que não poderia ter sido outra a opção do Tribunal do que lhe aplicar pena de prisão, já que nenhuma outra pena seria capaz de acautelar as finalidades de prevenção especial que, neste caso, são substancialmente elevadas.

17.Perante a factualidade dada como provada e, ponderando a concreta taxa de álcool no sangue apresentada pelo arguido, as circunstâncias que rodearam a prática dos factos e os seus antecedentes criminais, não poderia deixar de ser outra a conclusão do Tribunal “a quo” quanto a medida da pena acessória aplicada ao arguido.

18.Entendemos que as penas aplicadas foram, face aos factos dados como provados, adequadas, proporcionais e suficientes, não assistindo qualquer razão ao recorrente quando pugna pela respectiva redução das penas principal e acessória.
19.Quanto ao modo de execução da pena, inexiste fundamento no que ora é requerido pelo arguido, tendo em consideração o relatório da DGRSP para aplicação da pena de prisão em regime de permanência na habitação, junto aos autos a fls. 278 e ss.
Em suma, afigura-se-nos que o recurso do arguido não merece provimento, devendo manter-se integralmente a douta decisão recorrida.


Porém V. Exas. Decidirão, fazendo a habitual JUSTIÇA.»

4. - Remetidos os autos a este Tribunal da Relação de Coimbra, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu fundamentado parecer, pugnando pela improcedência das pretensões formuladas no recurso.

5. - Cumprido o estatuído no artigo 417º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não houve resposta ao sobredito parecer.

6. - Colhidos os vistos e realizada a conferência, em consonância com o estatuído no artigo 419º, n.º 3, al. c), do Código de Processo Penal, resultou a presente decisão.


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            II. – FUNDAMENTAÇÃO

1. – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

Em consonância com o disposto no artigo 412º, n.º 1, do Código de Processo Penal, o objeto dos recursos está delimitado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes [cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15/04/2010: “É à luz das conclusões da motivação do recurso que este terá de apreciar-se, donde resulta que o essencial e o limite de todas as questões a apreciar e a decidir no recurso, estão contidos nas conclusões(…)”], sem prejuízo da eventual necessidade de conhecer  oficiosamente da ocorrência de qualquer dos vícios a que alude o artigo 410º do Código de Processo Penal nas decisões finais (conhecimento oficioso que resulta da jurisprudência fixada no Acórdão n.º 7/95, do Supremo Tribunal de Justiça, in DR, I Série - A, de 28/12/95).

São, assim, as conclusões da motivação que balizam o âmbito do recurso e devem, por isso, ser concisas, precisas e claras – se ficam aquém da motivação, a parte desta que não é ali resumida torna-se inútil porque o tribunal de recurso só pode considerar as conclusões e, se vão além da motivação, também não devem ser consideradas, porque são um resumo da motivação e esta é inexistente[2].

            Posto isto, no presente recurso, tendo em conta as conclusões formuladas pelo recorrente, nas quais, sem obedecer a qualquer estruturação, de forma intrincada, aborda simultaneamente diversas temáticas, dificultando a individualização das questões a apreciar, afigura-se-nos que é possível identificar as seguintes:

            - Violação do disposto no artigo 340º do Código de Processo Penal por indeferimento de diligências probatórias requeridas pelo recorrente;

            - Impugnação da matéria de facto;

            - Espécie e medida das penas.

                                               

            2. – DECISÃO RECORRIDA

            A sentença alvo de recurso tem, no essencial, o teor que ora se transcreve:

«II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICO-JURIDICA:

A) DOS FACTOS

Factos Provados

Discutida a causa resultaram provados os seguintes factos:
1. No dia 15 de novembro de 2023, cerca das 05h30, na Rua ..., em ..., o arguido conduzia o veículo automóvel, ligeiro de passageiro, marca Audi, GE, com a matrícula ..-..-AQ, pela via pública, após haver consumido bebidas alcoólicas.
2. Naquelas circunstâncias de tempo e lugar viria o arguido a ser fiscalizado por agentes das Polícia de Segurança Pública que ali se encontravam devidamente uniformizados.
3. De seguida, foi o arguido submetido ao exame de pesquisa de álcool no ar expirado, através de aparelho quantitativo, tendo revelado uma taxa de álcool no sangue (T.A.S.) de, pelo menos 1,601 g/l, correspondente à T.A.S. de 1,74 g/l registada, deduzido o erro máximo admissível e perante essa taxa de álcool no sangue que apresentou declarou que não desejava ser submetido a exame de contraprova.
4. Bem sabia o arguido, antes de iniciar a condução, que não se achava em condições de o fazer em segurança e que a qualidade e a quantidade de bebidas alcoólicas que ingeriu até momentos antes de iniciar a condução determinar-lhe-iam necessariamente uma taxa de álcool no sangue superior à legalmente permitida.
5. Não obstante tal, o arguido quis ainda assim conduzir o veículo nas referidas circunstâncias.
6. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente de que a sua conduta era proibida e punida por lei.

Mais se provou que:
7. O arguido é casado e reside com a esposa e dois filhos, maiores de idade, em casa própria, pagando do empréstimo contraído para aquisição desta uma prestação mensal de cerca de 760,00 euros. O arguido trabalha como vendedor comissionista, auferindo um rendimento mensal liquido de cerca de 1.800,00 euros e a esposa é professora, auferindo um rendimento mensal líquido de cerca de 1.600,00 euros. O arguido e a esposa despendem com fornecimento da electricidade, gás e água da habitação, o valor médio mensal global de  cerca 450,00 euros. O filho mais novo do arguido é estudante universitário, residindo durante a semana fora de ..., tendo o arguido e a esposa a seu cargo o pagamento das despesas desta habitação, no valor médio mensal global de 570,00 euros. O arguido é sócio da “A..., Unipessoal, Lda.”. A esposa do arguido é proprietária de um veículo automóvel, da marca KIA, modelo Sportage, do ano de 2016. O arguido estudou até ao 12º ano de escolaridade.
8. Por sentença proferida a 10 de Março de 2016, transitada em julgado a 18 de Abril de 2016, no âmbito dos autos que correram termos no Juízo Local Criminal do Porto, do Tribunal Judicial da Comarca do Porto (Juiz 5), sob o n.º 663/14....,  foi o arguido condenado pela prática, a 30 de Abril de 2014, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 69.º, n.º1, alínea a) e 292.º, ambos do Código Penal, na pena de 75 dias de multa, à taxa diária de 8,00€  e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 3 (três) meses e 15 (quinze) dias; penas que vieram a ser declaradas extintas pelo cumprimento, por decisões proferidas, respectivamente, a 12 de Julho de 2016 e 1 de Setembro de 2016.
9. Por sentença proferida a 8 de Julho de 2016, transitada em julgado a 6 de Março de 2017, no âmbito dos autos que correram termos neste Juízo (Juiz 2), sob o n.º 783/16....,  foi o arguido condenado pela prática, a 17 de Junho de 2016, em concurso efectivo, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 69.º, n.º1, alínea a) e 292.º, ambos do Código Penal, e de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições, previsto e punido pelo artigo 353º do Código Penal, na pena única de 9 (nove) meses de prisão suspensa na sua execução por igual período de tempo, acompanhada de regime de prova e subordinada ao cumprimento da obrigação de o arguido se submeter a consultas e tratamento médicos que lhe forem prescritos para tratamento de eventual dependência alcoólica, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 5 (cinco) meses; penas que vieram a ser declaradas extintas pelo cumprimento, por decisões proferidas, respectivamente, a 6 de Março de 2018 e 15 de Agosto de 2017.
10. Por sentença proferida a 22 de Setembro de 2016, transitada em julgado a 24 de Outubro de 2016, no âmbito dos autos que correram termos neste Juízo (Juiz 2), sob o n.º 1737/13....,  foi o arguido condenado pela prática, a 20 de Novembro de 2013, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 69.º, n.º1, alínea a) e 292.º, ambos do Código Penal, na pena de 70 dias de multa, à taxa diária de 6,00€  e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 3 (três) meses; pena principal que veio a ser declarada extinta pelo cumprimento, por decisão proferida a 17 de Novembro de 2016.
11. Por sentença proferida a 19 de Janeiro de 2018, transitada em julgado a 20 de Fevereiro de 2018, no âmbito dos autos que correram termos neste Juízo (Juiz 1), sob o n.º 1875/16...., foi o arguido condenado pela prática, a 25 de Janeiro de 2016, de um crime de falsificação ou contrafacção de documento, previsto e punido pelos artigos 256º, n.º1, alínea d), 255º, alínea a), ambos do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão substituída por 200 dias de multa, à taxa diária de 10,00€; pena que veio a ser declarada extinta pelo cumprimento, por decisão proferida a 16 de Abril de 2019.
12. Por sentença proferida a 5 de Maio de 2022, transitada em julgado a 31 de Outubro de 2022, no âmbito dos autos que correram termos neste Juízo (Juiz 2), sob o n.º. 274/22....,  foi o arguido condenado pela prática, a 4 de Março de 2022, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 69.º, n.º1, alínea a) e 292.º, ambos do Código Penal, na pena de 5 (cinco) meses de prisão suspensa na sua execução pelo período de 1 ano, acompanhada de regime de prova, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 9 (nove) meses; pena acessória que veio a ser declarada extinta, pelo cumprimento, por decisão proferida a 4 de Agosto de 2023.


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Factos Não Provados

Com interesse para a decisão da causa não se provaram quaisquer factos para além dos que, nessa qualidade, se descreveram supra.


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Motivação

O Tribunal formou a sua convicção quanto aos factos provados, conjugando e entrecruzando os vários meios de prova, designadamente, as declarações prestadas pelo arguido, o depoimento das testemunhas DD e EE, o auto de notícia de fls. 4 e seguintes, talão do alcoolímetro junto a fls. 6, certificado de verificação de fls. 13, documento de fls. 164, Certificado de Registo Criminal de fls. 217 a 224 e Relatório/Informação Prévia elaborado pela DGRSP junto aos autos com a referência n.º 6934830.

Concretizando.

Quanto ao vertido em 1. a 6. revelaram essencialmente, de forma conjugada, o declarado pelo arguido (na medida em que resultou credível, conforme infra se explanará), os depoimentos dos agentes da PSP que procederam à fiscalização na origem destes autos, o auto de notícia de fls. 4 e seguintes, talão do alcoolímetro junto a fls. 6, certificado de verificação de fls. 13.

Com efeito, os agentes da PSP supra identificados, prestando depoimento de forma serena, séria e espontânea, relataram ao tribunal as circunstâncias em que, no âmbito das suas funções de fiscalização de trânsito, interceptaram o arguido [explicando EE ter avistado o arguido a conduzir o veículo automóvel em direcção à Rua ... e que, quando o veículo já se encontrava na referida rua, por se aperceber da presença da patrulha, o arguido recuou com o veículo automóvel cerca de 10 metros] e, posteriormente, o sujeitaram aos testes ao ar expirando; sendo que do teor do auto de notícia (cujo teor foi confirmado pelas referidas testemunhas), verifica-se que o arguido foi submetido primeiramente ao teste qualitativo e depois ao teste quantitativo, sem que o arguido tenha declarado pretender realizar contraprova.

Já o arguido, ouvido em declarações, assumiu parte dos factos imputados em sede de acusação pública, afirmando, contudo, não aceitar a taxa de álcool, entendendo ser a mesma excessiva, afirmando que após ter jantado com amigos num restaurante ao que se seguiu uma ida a um bar da cidade, decidiu não regressar a casa de automóvel, pretendendo chamar um “Uber”, sendo que antes de chamar tal transporte decidiu passar pelo veículo automóvel que havia anteriormente estacionado junto à Rua ... [acabando o arguido por assumir, ao longo das suas declarações, não ter estacionado em qualquer espaço “condominial”, mas sim em zona com estacionamento controlado por parquímetros] a fim de daí retirar uma mala e, ali chegado, por temer que o veículo pudesse dificultar a execução das obras que aí se encontravam a decorrer, e por pretender estaciona-lo de outra forma, acabou por conduziu o automóvel.

Já no que concerne à TAS de que o arguido era portador, importa começar por dizer resulta do disposto no artigo 153.º do Código da Estrada que o exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito, existindo uma prova vinculada quanto à alcoolemia, dado que desta só pode ser feita prova por aparelhos aprovados e por exames de sangue, e a aprovação de alcoolímetro exige a homologação de características técnicas pelo Instituto Português da Qualidade (IPQ) e a aprovação de uso pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR).

O arguido arguiu que, à data da fiscalização, encontrava-se ultrapassado quer o prazo de validade da aprovação do aparelho quer o prazo de verificação anual do alcoolímetro quantitativo utilizado no caso dos autos, pelo que o teste realizado não poderia ser considerado meio de prova válido.

Ora, o controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição em Portugal obedece actualmente ao regime geral aprovado pelo Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de Abril, às disposições regulamentares gerais previstas no Regulamento Geral do Controlo Metrológico aprovado pela Portaria n.º 211/2022, de 23 de Agosto, e ainda às disposições constantes das portarias específicas de cada instrumento de medição.

No que concerne aos alcoolímetros quantitativos ou analisadores quantitativos, considerando a data da prática dos factos em apreço nos presentes autos (15 de Novembro de 2023), são os mesmos regulamentados pela Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro (e não pela Portaria 366/2023, de 15 de Novembro, que apenas entrou em vigor no dia 16 de Novembro de 2023).

Nos termos do disposto no artigo 5º da Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro, o controlo metrológico dos alcoolímetros é da competência do Instituto Português da Qualidade, I. P. - IPQ e compreende as seguintes operações: “a) Aprovação de modelo; b) Primeira verificação; c) Verificação periódica; d) Verificação extraordinária.”.

De notar que a aprovação de modelo é válida por 10 anos, salvo disposição em contrário no despacho de aprovação de modelo (artigo 6º, n.º3, da Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro), sendo que a aprovação de modelo é o acto que atesta a conformidade de um instrumento de medição ou de um dispositivo complementar com as especificações aplicáveis à sua categoria com vista à sua disponibilização no mercado (artigo 7º, n.º1, Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de abril).

A aprovação de modelo é requerida pelo respectivo fabricante ou mandatário e é válida por um período de 10 anos findo o qual carece de renovação (artigo 7º, n.º2, Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de abril).

Ora, o decurso do prazo de aprovação do modelo do alcoolímetro, não determina a invalidade da prova recolhida através de aparelho cujo modelo haja sido aprovado há mais de 10 anos, já que uma realidade é a aprovação do modelo outra é a capacidade de uso do aparelho em si.

Conforme impressivamente se salienta no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15 de Janeiro de 2023, disponível para consulta in www.dgsi.pt:

«(…)não obstante o legislador tenha definido um prazo de validade para a Aprovação do modelo de alcoolímetro não quis que o decurso desse prazo inviabilizasse sem mais o uso dos mesmos, antes os sujeitou a avaliações periódicas, validando o seu uso para além do prazo de Aprovação do modelo, impondo, assim às entidades responsáveis pela realização dos testes de pesquisa de álcool por ar expirado a realização das avaliações adequadas legais, as quais são da competência do Instituto Português da Qualidade».

Assim, o modelo cuja aprovação não foi renovada continua a ter aptidão para realizar medições técnicas de qualidade, desde que satisfaça as devidas operações de verificação (vide, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 23 de Novembro de 2022, disponível para consulta in www.dgsi.pt), não sendo a simples aprovação do modelo do aparelho, mas a sua submissão a operações de verificação que atesta a fiabilidade do resultado obtido.

Com efeito, resulta da conjugação das normas constantes dos artigos 10º e 11 da Portaria 1556/2007, de 10 de Dezembro, dos artigos 28º e 29º do Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de Abril e do artigo 2º, n.ºs 1, 2 e 7, do Decreto Lei 291/90, de 20 de Setembro, que o modelo cuja aprovação não foi renovada continua a ter aptidão para realizar medições técnicas de qualidade, desde que satisfaça as devidas operações de verificação.

A primeira verificação é efectuada antes da colocação do instrumento no mercado, após a sua reparação e sempre que ocorra violação do sistema de selagem, dispensando-se a verificação periódica nesse ano (artigo 7º, n.º1, da Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro).

No que à concerne à verificação periódica é anual, salvo indicação em contrário no despacho de aprovação de modelo (artigo 7º, n.º2, da Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro).

Preceitua, por seu turno, o artigo 9º do Decreto-Lei 29/2022, de 7 de Abril, o seguinte:

«1 - A verificação periódica compreende o conjunto de operações destinadas a constatar se os instrumentos de medição mantêm a qualidade metrológica dentro dos erros máximos admissíveis e restantes disposições regulamentares aplicáveis relativamente ao modelo respetivo, devendo ser requerida pelo utilizador do instrumento de medição.

2 - Nos instrumentos de medição cuja qualidade metrológica esteja dentro dos erros máximos admissíveis e restantes disposições regulamentares aplicáveis relativamente ao respetivo modelo, a marca de verificação periódica é aposta no ato da operação.

3 - A verificação periódica é válida pelo prazo constante na regulamentação específica aplicável.

4 - A verificação periódica deve ser requerida até 30 dias antes do fim da validade da última operação de controlo metrológico.».

Ora, tendo mais uma vez presente a disposição transitória constante no artigo 28º Decreto-Lei 29/2022, de 7 de Abril e atentando a que a aprovação do modelo de alcoolímetro em apreço nos presentes (“DRAGER ALCOOTEST 7110 MKIII P”), por despacho do IPQ n.º 11037/2007, de 24 de Junho (publicado do Diário da República 2º série, n.º 109, de 6 de Julho de 2007), foi concedida ao abrigo do Decreto Lei 291/90, de 20 de Setembro, importa atentar, ainda, no que tange à verificação periódica que, nos termos do disposto no artigo 4º, n.º5, do Decreto-Lei n.º 291/90 de 20 de Setembro, “a verificação periódica é válida até 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização, salvo regulamentação específica em contrário”.

No caso em apreço, o arguido AA foi submetido ao exame de pesquisa de álcool no sangue no dia 15.11.2023, através do aparelho DRAGER ALCOOTEST 7110 MKIII P, com o n.º de série ARMA-0050, sendo que o referido alcoolímetro foi sujeito a verificação periódica a 29 de Junho de 2022, pelo que, considerando o regime legal supra aludido, resulta claro que a verificação periódica anual a realizar no ano civil de 2023, e, portanto, até ao dia 31 de Dezembro de 2023, se mostrava válida à data da prática dos factos.

Assim, considerando que o aparelho DRAGER ALCOOTEST utilizado na situação dos autos foi oportunamente aprovado pelo competente Instituto Português da Qualidade, I. P. – IPQ, tendo, também, este Instituto – único competente para o controlo metrológico dos alcoolímetros – verificado periodicamente o aparelho em apreço, mostrando-se válida a verificação periódica à data da prática dos factos, e sendo certo que em sede de acusação pública se mostra deduzido o erro máximo admissível (EMA), previsto no artigo 8.º da Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro e no quadro em anexo a tal Diploma, resulta claro que o alcoolímetro em apreço nos autos mantém a qualidade metrológica que a operação de verificação periódica lhe assegura, sendo a prova por ele recolhida válida.

Com efeito, não constituindo prova pericial em sentido técnico, a prova decorrente do exame efetuado com alcoolímetro, no âmbito do disposto no artigo 153º do Código da Estrada, é prova tarifada, desde que o aparelho se encontre homologado, aprovado e com verificação periódica válida (vide, neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 16 de Maio de 2012, disponível para consulta in www.dgsi.pt).

Ora, aquilo que nos dizem as regras da experiência e o mais elementar bom senso é que, num contexto de fiscalização rodoviária como aquele a que o arguido foi sujeito é que, a ser real a surpresa de um condutor fiscalizado quando sujeito ao teste de alcoolemia, perante uma elevada taxa apresentada – porque [de acordo com o alegado pelo arguido] nem sequer se ingeriu bebidas alcoólicas ou o pouco que se ingeriu não poderia, de forma alguma, permitir uma taxa como a apresentada – o que seria natural e lógico é que esse condutor, não só logo mostrasse o seu espanto, como não abdicasse de realizar contraprova e, no caso em apreço, o arguido foi informado da possibilidade de realizar contraprova  e optou por não a realizar, conformando-se, pois, com o valor que resultou do teste realizado e que, mesmo considerando a margem de erro a ponderar, corresponde a, pelo menos, 1,601 g/l.

No que respeita ao elemento subjectivo, importa notar que, como é sabido, os elementos subjectivos do crime pertencem à vida íntima e interior do agente, sendo, contudo, possível captar a sua existência através e mediante a factualidade material que os possa inferir ou permitir divisar, ainda que por meio de presunções ligadas ao princípio da normalidade ou às regras da experiência comum (cfr., neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Outubro de 2009, disponível in www.dgsi.pt).

Ora, a taxa de alcoolemia apresentada pelo arguido é muito superior ao limiar mínimo da actual proibição legal – dado que para a generalidade dos condutores, considera-se sob influência de álcool o condutor que apresente uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,5 g/l e estando em causa condutor em regime probatório e o condutor de veículo de socorro ou de serviço urgente, de transporte coletivo de crianças e jovens até aos 16 anos, de táxi, de TVDE, de automóvel pesado de passageiros ou de mercadorias ou de transporte de mercadorias perigosas considera-se sob influência de álcool o condutor que apresente uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,2g/l – sendo que está em causa TAS que corresponde, em sede de efeitos físicos e psicológicos, a um estado de embriaguez manifesta, estado este que não podia ser ignorado pelo próprio, atentos os efeitos, nomeadamente, alteração de sensações, percepção espácio-temporal, capacidade/tempo de reacção, entre outros; sendo que resulta das declarações do próprio estar ciente de que estaria ciente de tal influência, dado que decidiu mesmo nem sequer ir a conduzir o seu veículo para a residência e bem sabendo, como sabe a generalidade dos cidadãos, que a sua conduta era proibida e punida pela lei (tanto mais que anteriormente já foi condenado por crime da mesma natureza).

De referir, por fim, que o depoimento da testemunha CC (amigo do arguido) pautou-se pela hesitação e inconsistência, já não se recordando com precisão do número de garrafas de vinho bebidas ao jantar pelo arguido e demais convivas (a testemunha e um outro individuo), não se recordando da hora a que terminou o jantar nem da hora a que foram para o bar, tendo “ideia” de que, no bar, cada um deles bebeu cerca de duas cervejas (mas “sem certeza”), concluindo a testemunha que o arguido “estava bem”, que não “estava alterado”.

Deste modo, considerando a forma como CC prestou depoimento não foi a mesma de molde a convencer o Tribunal.

Assim e em jeito de síntese interlocutória, considerando a prova produzida e analisada em sede de audiência de discussão e julgamento, não ficou o tribunal com qualquer dúvida suscetível de relevar a favor do arguido, quanto à prova dos factos vertidos em 1. a 6.

No que concerne aos antecedentes criminais do arguido relevou o CRC mais recente junto aos autos.

Relativamente à situação pessoal e económica do arguido valoraram-se as declarações do próprio as quais, porque efectuadas de forma espontânea e coerente, se revelaram credíveis, conjugadas com o teor da informação social elaborada pela DGRSP.

Quanto aos factos não provados dizer desde logo que não se produziu qualquer prova que permitisse dar como provados outros factos para além dos que nessa qualidade se consignaram, designadamente por não ter sido produzida prova por declarações credível ou testemunhal credível e distinto resultado probatório não resultar dos documentos juntos aos autos.


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B) DO DIREITO

Do enquadramento jurídico-penal:

Vem imputada ao arguido a prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 69.º, n.º1, alínea a) e 292.º, ambos do Código Penal.

O crime de condução de veículo em estado de embriaguez, de cuja prática vem acusado o arguido, encontra-se tipificado no artigo 292.º, n.º1, do Código Penal.

Em conformidade com a previsão legal do referido normativo, “Quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave não lhe couber por força de outra disposição legal”.

Através da incriminação da conduta supra descrita o legislador propõe-se conferir uma tutela ampla e adequada ao bem jurídico segurança da circulação rodoviária, reflexamente protegendo outros bens jurídicos como a vida ou a integridade física.

Da previsão típica do normativo convocado resulta que estamos perante um crime de perigo abstracto, ou seja, de um crime para cuja consumação não importa a efectiva colocação em perigo dos bens jurídicos protegidos; antes se bastando com a possibilidade de este se vir a concretizar.

            Por outro lado, da construção do tipo e da conjugação com os artigos 13.º, 14.º e 15.º, todos do Código Penal, conclui-se ainda ser este um crime cuja realização passa pela existência de negligência ou dolo por parte do agente.

Volvendo ao caso dos autos, verificamos ter resultado provado que no dia 15 de novembro de 2023, cerca das 05h30, na Rua ..., em ..., o arguido conduzia o veículo automóvel, ligeiro de passageiro, marca Audi, GE, com a matrícula ..-..-AQ, pela via pública, após haver consumido bebidas alcoólicas.

Mais se provou que, naquelas circunstâncias de tempo e lugar viria o arguido a ser fiscalizado por agentes das Polícia de Segurança Pública que ali se encontravam devidamente uniformizados.

De seguida, foi o arguido submetido ao exame de pesquisa de álcool no ar expirado, através de aparelho quantitativo, tendo revelado uma taxa de álcool no sangue (T.A.S.) de, pelo menos 1,601 g/l, correspondente à T.A.S. de 1,74 g/l registada, deduzido o erro máximo admissível e perante essa taxa de álcool no sangue que apresentou declarou que não desejava ser submetido a exame de contraprova.

Apurado, ainda, que bem sabia o arguido, antes de iniciar a condução, que não se achava em condições de o fazer em segurança e que a qualidade e a quantidade de bebidas alcoólicas que ingeriu até momentos antes de iniciar a condução determinar-lhe-iam necessariamente uma taxa de álcool no sangue superior à legalmente permitida, não obstante tal, o arguido quis ainda assim conduzir o veículo nas referidas circunstâncias, agindo de forma livre, voluntária e consciente de que a sua conduta era proibida e punida por lei.

Ora, tendo em conta a factualidade exposta, no caso dos autos não restam dúvidas em como o arguido cometeu o crime de que vem acusado, verificando-se os elementos objectivos e subjectivo do ilícito e tendo o arguido agido com dolo necessário (cfr. artigo 14.º, n.º2 do Código Penal).


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III. DA DETERMINAÇÃO DA MEDIDA DAS PENAS

A todo o facto-ilícito-típico corresponde uma reacção penal, pela qual a comunidade expressa o seu juízo de desvalor sobre os factos e a conduta realizada por quem viola os comandos legais do ordenamento penal, estando a mesma definida no respectivo tipo legal. 

O crime de condução de veículo em estado de embriaguez é punido pelo artigo 292.º, n.º1 do Código Penal, a título principal, com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias.


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Escolha da Pena Principal

Admitindo o tipo em apreço a aplicação, em alternativa, de duas penas principais, cumpre antes de mais proceder à determinação da espécie de pena que concretamente irá ser aplicada, atendendo, para o efeito ao princípio geral que resulta da combinação dos artigos 40.º e 70.º do Código Penal, segundo o qual deve ser dada preferência à pena de multa sempre que esta realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

            Assim, dado que a aplicação de penas tem por objectivo a protecção de bens jurídicos e a integração do agente na sociedade, serão sempre e apenas considerações de prevenção geral e especial, e nunca de retribuição da culpa, a decidir da possibilidade de, em cada caso concreto, preferir uma ou outra reacção criminal.

Por outro lado, de entre as finalidades preventivas, o legislador português destaca as finalidades de prevenção especial, como fundamentadoras do movimento de luta contra as penas curtas de prisão aplicáveis à pequena e média criminalidade. Pelo que o tribunal só deverá recusar a aplicação da pena alternativa não privativa da liberdade, quando tal opção se revele inconveniente para a viabilidade e sucesso de um projecto de ressocialização, funcionado as exigências de prevenção geral – enquanto defesa do ordenamento jurídico – como um limite mínimo à actuação das exigências de socialização.

Atentemos então, primeiramente, nas exigências de prevenção geral positiva que no caso se fazem sentir.

A condução de veículos em estado de embriaguez – dos crimes que mais vezes é julgado nos tribunais portugueses e relativamente aos quais são elevadíssimas as situações de reincidência - é consensualmente havida como um factor de agravamento dos riscos inerentes à actividade da condução e como um dos mais determinantes agentes de produção de acidentes de trânsito, na medida em que a embriaguez determina o entorpecimento dos sentidos, a perda dos reflexos exigidos para uma boa condução e o amortecimento da acuidade da visão e da atenção.

Acresce que, a condução sob a influência do álcool tem contribuído decisivamente para o aumento da sinistralidade estradal, sendo de todos conhecido o lugar cimeiro que Portugal ocupa nesta matéria.

Assim, atenta a cada vez maior insegurança na circulação rodoviária, impõem-se de forma acentuada as exigências comunitárias na reafirmação da validade das normas violadas pelas condutas supra descritas, sendo significativas as exigências de prevenção geral positiva, a fim de restaurar o respeito pelos bens jurídico atingidos, fortemente desconsiderados pelo arguido ao adoptar a conduta descrita, gerando insegurança na comunidade, reclamando punições dissuasoras de tais práticas e restabelecedoras da paz comunitária.

Com efeito, não obstante as sucessivas campanhas de sensibilização e apologia da prevenção em sede de sinistralidade rodoviária e boas práticas na condução, os números revelam que as exigências de prevenção geral continuam a ser elevadíssimas.

Relativamente às exigências de prevenção especial importa desde logo dizer que o arguido foi já anteriormente condenado pela prática anterior de seis crimes, sendo quatro das condenações pela prática do ilícito em causa nos autos, datando a última condenação (em pena de prisão suspensa na sua execução acompanhada de regime de prova), de 5 de Maio de 2022 e com trânsito em julgado a 31 de Outubro de 2022, e cuja penas acessória foi declarada extinta a 4 de Agosto de 2023.

Ora, da análise dos antecedentes criminais do arguido resulta claro que este não foi, como devia, suficientemente influenciado pelas penas que lhe foram sendo aplicadas, mormente as condenações em penas de prisão suspensas na sua execução, uma vez que, não obstante a sua integração social e profissional, o arguido veio a praticar os factos em causa nos autos.

Importa ainda notar que, apesar de o arguido ora assumir a sua disponibilidade para realizar tratamento para o alcoolismo, resulta claro da cronologia e sequência de condenações que o consumo de bebidas alcoólicas em excesso há muito faz parte da vida do arguido, revelando-se particularmente premente, no plano da prevenção especial, a existência de uma resposta punitiva que não só consciencialize o arguido para a gravidade dos factos praticados, mas também simultaneamente previna a prática de comportamentos da mesma natureza, fazendo–lhe sentir a anti-jurisdicidade e gravidade das suas condutas, ciente da relação que existe entre estas e o abuso no consumo de bebidas alcoólicas.

Assim e em face da reiterada actuação do arguido de forma desconforme ao Direito – conduzindo sob a influência do álcool – e insensível aos bens jurídicos que se pretendem tutelar com a incriminação das suas descritas condutas, entende o Tribunal que não estão já reunidas as condições que permitam formar um juízo de prognose favorável que permita concluir pela suficiência da pena não privativa da liberdade para fazer face às exigências de prevenção especial que, in casu, se reputam elevadíssimas – não respondendo também suficiente e adequadamente às exigências de prevenção geral também bastante significativas - apenas com a escolha da pena mais gravosa se logrando alcançar as finalidades da punição no caso concreto.


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Da medida concreta da pena principal

            A pena a determinar em concreto, dentro dos limites da lei, resultará da apreciação da culpa do agente e das exigências de prevenção; tendo em consideração todas as circunstâncias que – não fazendo parte do tipo legal convocado nem tendo sido já atendidas para os efeitos de qualificação – sejam expressivas da culpa do arguido e da medida das necessidades de prevenção (cfr. artigo 71.º do Código Penal).

O mínimo legalmente previsto corresponde ao imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada e o máximo inultrapassável à medida da culpa do agente do crime.

De notar ainda que, conforme resulta expresso do disposto no n.º2 do artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa, «a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos».

Desta forma, o espaço possível de resposta às necessidades de reintegração social dos agentes é o que se define entre aquele mínimo imprescindível à prevenção geral positiva e o máximo consentido pela sua culpa, tendo sempre subjacente o princípio da necessidade, adequação e proporcionalidade da pena, consagrado no citado no n.º2 do artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa.

            O crime de condução em estado de embriaguez é punido com uma pena de prisão até 1 ano.

Relativamente às exigências de prevenção geral e especial valem aqui, mutatis mutandis, as considerações supra já tecidas.

Ora, em desfavor do arguido há que valorar o grau de ilicitude do facto – elevado (considerando a significativa TAS com que o arguido conduzia, atendendo a que o risco de envolvimento em acidente mortal aumenta rapidamente à medida que a concentração de álcool no sangue se torna mais elevada, sendo que com uma TAS de 1,20g/l o risco aumenta 16 vezes e o arguido conduziu com uma TAS de pelo menos 1,601 g/l, o veículo conduzido pelo arguido, um veículo automóvel ligeiro de passageiros que encerra em si mesmo um perigo acrescido) e a intensidade do dolo (necessário) com que o agente actuou; e, bem assim, os antecedentes criminais do arguido que, como supra explanado foi já anteriormente condenado, por quatro vezes, pela prática (anterior) do mesmo ilícito em causa nos autos.

Já em seu favor há que valorar a circunstância de o arguido se tratar de pessoa familiar e profissionalmente inserida e de manifestar vontade de se submeter a tratamento para a problemática do alcoolismo.

Sopesados todos os factores supra expostos, reputamos de suficiente e adequado aplicar ao arguido pela prática do crime de condução em estado de embriaguez, a pena de 7 (sete) meses de prisão.


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Da Pena Acessória

Nos termos do disposto no artigo 69.º, n.º1, alínea a) do Código Penal, é condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos quem for punido por crime previsto nos artigos 291.º e 292.º. do Código Penal.

            No caso dos autos, vimos já que o arguido deverá ser punido pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, cumprindo, portanto, ora aferir da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor.

            Sendo certo que a dita pena acessória não tem sempre, de forma automática, que ser aplicada, não é menos certo que, como impressivamente se sintetiza no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Janeiro de 2007: “A imprevisibilidade e a volatilidade do comportamento do condutor embriagado, pelo comprometimento da segurança na estrada que protagoniza sempre, constitui, inevitavelmente, e salvo raríssimas excepções uma grave violação das regras de trânsito rodoviário, pelo que, em regra, a prática do crime em causa implicará a aplicação daquela pena acessória” (disponível para consulta em www.dgsi.pt).

            Ora, importa desde logo atentar nas considerações tecidas supra em sede de determinação da medida da pena de prisão, bem como nas tecidas a propósito das exigências de prevenção geral e especial que in casu se fazem sentir e ainda no facto de a pena acessória ter em vista sobretudo prevenir a perigosidade do agente, patenteada no exercício da condução por um condutor alcoolizado, o que potencia o elevado índice de sinistralidade rodoviária; estando em causa agente que já foi punido pelo menos por cinco vezes com a aludida pena acessória.

         De salientar, no caso em apreço, que o arguido foi já condenado em penas acessórias pela prática de ilícitos da mesma natureza, tendo-lhe sido aplicadas as penas de 3 meses, 3 meses e 15 dias, de 5 meses e de 9 meses, e também tais penas não lograram afastar, eficazmente, o arguido da prática de crimes.

         Por tudo o exposto e por se julgar adequado e suficiente, condena-se o arguido na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 13 (treze) meses.



Das Penas de Substituição

Considerando que o processo de determinação da pena não se esgota nas operações de determinação da pena principal aplicável e de determinação do seu quantum, comportando a fase, pelo menos eventual, de escolha da espécie de pena a cumprir efectivamente; cumprirá ainda ponderar da aplicação ao arguido de uma pena de substituição da pena de 7 (sete) meses de prisão.

Nesta ponderação o Tribunal está sujeito a uma discricionariedade vinculada, já que tem o poder-dever de, atentos os pressupostos materiais e formais de que estas dependem, substituir a pena principal concretamente fixada.

Ora, as penas de substituição radicam essencialmente no movimento de política criminal adverso à aplicação de penas curtas de prisão, sendo o critério essencial que preside à substituição o da adequação da pena substitutiva às necessidades e finalidades da punição.

Não existindo uma hierarquia legal de penas de substituição, quando o Tribunal tenha ao seu dispor mais do que uma pena de substituição a realizar de forma adequada as finalidades da punição, o critério de escolha da pena a aplicar terá que assentar na avaliação das exigências de prevenção especial ou de socialização que se fazem sentir em concreto; optando-se por aquela que, atento a prognose favorável no sentido da ressocialização em liberdade e a não oposição das irrenunciáveis exigências de prevenção geral de defesa da ordem jurídica, as realiza de forma mais adequada.

Verifica-se que, no caso em apreço, estão reunidos os pressupostos formais da substituição da pena curta de prisão por multa (cfr. artigo 43.º do Código Penal), da prestação de trabalho a favor da comunidade (cfr. artigo 58.º do Código Penal), da suspensão de execução da pena de prisão (cfr. artigo 50.º do Código Penal) e da execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação (cfr. artigo 43º do Código Penal).

De salientar que a aplicação de penas não pode ser vista desligada do seu concreto destinatário e, portanto, da especificidade de cada indivíduo e das exigências de prevenção especial, mormente de ressocialização que este convoca.

No que contende com a substituição da pena curta de prisão, resulta expressamente do disposto no artigo 43.º, n.º1 do Código Penal que a pena de prisão aplicada em medida não superior a 1 ano, é substituída por pena de multa ou por outra pena não privativa de liberdade, excepto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes.

Por seu turno, a Prestação de Trabalho a Favor da Comunidade visa evitar a execução de penas de prisão de curta duração e promover a assimilação da censura do acto ilícito mediante a construção de um trabalho socialmente positivo, a favor da comunidade, assente na adesão do próprio arguido, simultaneamente apelando a um forte sentido de co-responsabilização social e de reparação simbólica.

Ora vimos já que, no caso dos autos, o arguido foi já condenado anteriormente pela prática anterior de crimes de condução de veículo em estado de embriaguez em penas de multa, não tendo, pois, as penas de multa aplicadas nas anteriores condenações logrado afastar o arguido da prática de crimes, pelo que entende o Tribunal que nova condenação em pena de multa não só não lograria responder cabalmente as exigências de prevenção geral que o caso convoca, mas sobretudo não interviria junto do agente de forma consistente.

Igualmente no que concerne à prestação de trabalho a favor da comunidade importa desde logo atentar que o arguido se encontra familiar e profissionalmente integrado, sendo entendimento do Tribunal que substituindo a pena de prisão determinada nos autos pela prestação de trabalho, ainda que com a simultânea aplicação de obrigações, não resultariam cabalmente respondidas as particulares exigentes de prevenção especial que o caso convoca.

No que respeita, por seu turno, à suspensão da execução da pena de prisão, nos termos do disposto no artigo 50º, n.º1 do Código Penal “O tribunal suspende a execução da pena de prisão não superior a 5 anos de prisão (redacção introduzida pela Lei 59/2007 de 04.09) se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.

Impõe-se, por isso, a formulação de um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do arguido, no futuro, e sobre se a suspensão realiza, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição, tendo em vista a personalidade do agente, as condições da sua vida, a sua conduta anterior e posterior ao crime, as circunstâncias do crime, tudo em função da matéria de facto provada no caso concreto.

A suspensão da execução da pena não depende, pois, de um qualquer modelo de discricionariedade, mas, antes, do exercício de um poder-dever vinculado, devendo ser decretada, na modalidade que for considerada mais conveniente, sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos legais.

Importa, por fim, notar que tratando-se de um juízo de prognose, não se impõe que tal juízo assente necessariamente numa “certeza”, bastando uma “expectativa” fundada de que a simples ameaça da pena seja suficiente para realizar as finalidades da punição e, consequentemente, a ressocialização em liberdade do arguido (cfr., neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Junho de 2003, disponível in CAJ do STJ, ano XXI, tomo II, 2003, página 221).

Ora, conforme já tivemos oportunidade de salientar supra, da mera análise do Certificado Registo Criminal do arguido resulta que este, desde há muito, que tem vindo a viver de forma desconforme ao Direito, revelando-se absolutamente insensível às sucessivas penas que lhe foram sendo aplicadas, inclusive de penas de prisão suspensas na sua execução acompanhadas de regime de prova e subordinadas ao cumprimento de obrigações, reiterando a prática de do crime de condução de veículos em estado de embriaguez, revelando pelo seu comportamento um claro desprezo pelas instâncias formais de controlo e ausência de vontade de alterar a sua vida, passando a comportar-se de forma licita, afastando-se do mundo do crime.

Com efeito, ressalta dos factos provados que nem a última condenação do arguido em pena de prisão suspensa na sua execução, acompanhada de regime de prova logrou afastar eficazmente o arguido da prática de crimes, consciencializando-o para a gravidade dos factos que praticou e ainda para a eminência de se ver efectivamente privado de liberdade.

Deste modo, entende o Tribunal que não se mostra possível efectuar um juízo de prognose favorável no sentido de que a suspensão da execução da pena de prisão ainda que acompanhada de regras de conduta será suficiente para afastá-lo da prática de novos crimes.

Por outro lado, não ignoramos que a aplicação de penas não pode ser vista desligada do seu concreto destinatário e, portanto, da especificidade de cada indivíduo e das exigências de prevenção especial, mormente de ressocialização que este convoca, sendo que, no caso em apreço, ressalta claramente dos factos provados que o arguido necessitará de acompanhamento para a problemática do alcoolismo e quando confrontado com essa possibilidade em julgamento, o arguido declarou estar disponível para se submeter a tal tratamento, estando em causa agente social e profissionalmente integrado.

            Ora, não obstante a reiteração da prática de condução de veículo sob a influência do álcool indiciar que o arguido necessita de manter acompanhamento médico em matéria de consumo abusivo de bebidas alcoólicas, a verdade é que, conforme vimos, é o próprio arguido quem, pelas suas condutas, demonstra que por via da não privação de liberdade não se consciencializou de forma efectiva para a gravidade das suas condutas e necessidade de cessar a prática de factos ilícitos, entendendo-se pois ser este um caso paradigmático em que o efeito “sharp, short, schock” da pena de prisão e, portanto, da privação da liberdade, poderá contribuir para que o arguido, finalmente, se consciencialize quanto à gravidade das suas condutas e consequências daí decorrentes - e se afaste, no futuro, da prática de novos crimes, entendendo-se, pois, que nem a pena de multa de substituição, nem a prestação de trabalho a favor da comunidade nem a simples censura do facto e a ameaça da pena de prisão seriam são já bastantes para afastar o arguido da criminalidade, outra pena que não uma pena que implique privação de liberdade satisfazendo, simultaneamente, as elevadas necessidades de prevenção do crime que o caso convoca, já que um dos vectores que compõem os fins das penas são precisamente as aludidas necessidades de prevenção geral e, portanto, a protecção dos bens jurídicos violados e naturalmente a protecção da sociedade em relação ao crime e só quando também esta finalidade se cumpra podendo existir o juízo de prognose favorável à suspensão da correspondente pena de prisão (cfr. artigo 50.º, n.º 1, do Código Penal).

Por outro lado, e conforme aludimos já, sem que tal comprometa o mencionado efeito “sharp, short, schock” da pena a aplicar, não fica o Tribunal indiferente à situação social e profissional do arguido, que não regista outras condenações em penas de efectiva privação de liberdade pela prática deste crime, encontrando-se familiar e profissionalmente integrado e tendo manifestado disponibilidade para se submeter a tratamento para o problema de alcoolismo, contexto que se é certo que não tem o condão de por si só assegurar que o arguido trilhe um percurso socialmente responsável, ainda assim poderá contribuir decisivamente e de forma positiva para que o arguido seja um elemento válido na sociedade, trabalhador e socialmente integrado.

Ora, entende o Tribunal que a pena que melhor se adequa às exigências de prevenção que o caso convoca e ao concreto destinatário em causa nos autos é precisamente o regime de permanência na habitação, previsto no artigo 43.º do Código Penal.

Com efeito, prevê-se no citado artigo 43.º do Código Penal que:

«1 - Sempre que o tribunal concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão e o condenado nisso consentir, são executadas em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância:

a) A pena de prisão efectiva não superior a dois anos;

b) A pena de prisão efectiva não superior a dois anos resultante do desconto previsto nos artigos 80.º a 82.º;

c) A pena de prisão não superior a dois anos, em caso de revogação de pena não privativa da liberdade ou de não pagamento da multa previsto no n.º 2 do artigo 45.º

2 - O regime de permanência na habitação consiste na obrigação de o condenado permanecer na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, pelo tempo de duração da pena de prisão, sem prejuízo das ausências autorizadas.

3 - O tribunal pode autorizar as ausências necessárias para a frequência de programas de ressocialização ou para actividade profissional, formação profissional ou estudos do condenado.

4 - O tribunal pode subordinar o regime de permanência na habitação ao cumprimento de regras de conduta, susceptíveis de fiscalização pelos serviços de reinserção social e destinadas a promover a reintegração do condenado na sociedade, desde que representem obrigações cujo cumprimento seja razoavelmente de exigir, nomeadamente:

a) Frequentar certos programas ou actividades;

b) Cumprir determinadas obrigações;

c) Sujeitar-se a tratamento médico ou a cura em instituição adequada, obtido o consentimento prévio do condenado;

d) Não exercer determinadas profissões;

e) Não contactar, receber ou alojar determinadas pessoas;

f) Não ter em seu poder objectos especialmente aptos à prática de crimes.

5 - Não se aplica a liberdade condicional quando a pena de prisão seja executada em regime de permanência na habitação.».

Por via da Lei n.º 94/2017, de 23 de Agosto, eliminou-se a prisão por dias livres e o regime de semi-detenção, atribuindo-se maior relevo à permanência na habitação, a qual passa a ser aplicável em todos os casos em que a prisão efectiva é fixada em medida não superior a 2 anos, estando em causa opção fundamental de política criminal restritiva da aplicação de medidas privativas de liberdade à criminalidade mais grave, privilegiando-se a aplicação de penas não privativas de liberdade para a pequena e média criminalidade, procurando evitar-se os efeitos criminógenos da privação da liberdade em contexto prisional (advindos desde logo do desenraizamento familiar, social e laboral), simultaneamente atenuando os perniciosos efeitos de uma curta detenção de cumprimento continuado, nos casos em que – como o presente - não é possível renunciar à ideia de prevenção geral, permitindo ao arguido manter os seus laços sociais, familiares e laborais.

O disposto no actual artigo 43.º do Código Penal carece de ser articulado com o disposto na Lei n.º33/2010, de 2 de Setembro – que regula a utilização de meios técnicos de controlo à distância (vigilância electrónica) – aí se regulando, além do mais, a utilização de meios técnicos de controlo à distância para fiscalização da execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação, prevista nos artigos 43.º e 44.º do Código Penal (cfr. artigo 1.º, al.)).

No que concerne à decisão a proferir, quanto à utilização de meios de vigilância electrónica, rege o artigo 7.º da Lei n.º33/2010, de 2 de Setembro, aí se prevendo que, o juiz solicita prévia informação aos serviços de reinserção social sobre a situação pessoal, familiar, laboral e social do arguido ou condenado, e da sua compatibilidade com as exigências da vigilância electrónica e os sistemas tecnológicos a utilizar (n.º2) - sendo tal decisão precedida de audição do Ministério Público, do arguido ou condenado – e tal decisão especifica os locais e os períodos de tempo em que a vigilância electrónica é exercida e o modo como é efectuada, levando em conta, nomeadamente, o tempo de permanência na habitação e as autorizações de ausência estabelecidas na decisão de aplicação da medida ou da pena; sendo que a decisão é comunicada ao arguido ou condenado e seu defensor, aos serviços de reinserção social e, quando aplicável, ao estabelecimento prisional onde aqueles se encontrem, bem como aos órgãos de polícia criminal competentes, para os efeitos previstos no n.º 3 do artigo 8.º e nos n.ºs 1 e 2 do artigo 12.º (cfr. n.º6).

No caso em apreço, mostram-se cumpridas as formalidades atinentes ao regime de permanência na habitação (cfr. relatório junto pela DGRSP).

Acresce que, não podendo a aplicação de penas ser vista desligada do seu concreto destinatário e, portanto, da especificidade de cada indivíduo e das exigências de prevenção especial, mormente de ressocialização que este convoca, no caso dos autos, atenta a factualidade dada como provada, aos ilícitos praticados pelo arguido, estará associado um problema de abuso do consumo de bebidas alcoólicas, pelo que se impõe que a aplicação do regime de permanência na habitação seja acompanhada de regra de conduta, nos termos previstos no artigo 43.º, n.º4, alínea c) do Código Penal, com realização de consulta para aferir da necessidade de tratamento para o alcoolismo e realização de tal tratamento, se considerado necessário (para tal já tendo o arguido dado o seu consentimento).

Conforme resulta expresso do disposto no artigo 43.º, n.º3 do Código Penal, o tribunal pode autorizar as ausências necessárias para a frequência de programas de ressocialização ou para actividade profissional, formação profissional ou estudos do condenado.

No caso dos autos, resulta apurado que o arguido trabalha como vendedor, pelo que se entende ser de autorizar o arguido a ausentar da residência para o exercício da sua actividade profissional, no horário compreendido entre as 07:00h e as 18:00h, de segunda a sexta-feira e para aceder aos actos médicos que lhe forem prescritos, cabendo à DGRSP controlar as saídas em função das necessidades de intervenção, devendo o arguido estar sempre contactável durante os períodos de ausência.


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Do desconto da medida processual

              Nos termos do disposto no artigo 80.º, n.º1 do Código Penal, a detenção, prisão preventiva e a obrigação de permanência na habitação sofridas pelo arguido são descontadas por inteiro na pena de prisão.

Compulsados os autos constatamos que, efectivamente, o arguido esteve sujeito à medida processual de detenção, tendo sido detido e libertado no mesmo dia (cfr. auto de notícia e auto de libertação de fls.10), assim haverá que descontar um dia no cumprimento da pena de prisão.


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Atenta a complexidade dos presentes autos, duração do julgamento e número de pessoas ouvidas, julgo adequado fixar a taxa de justiça a pagar pelo arguido em duas unidades de conta (cfr. artigos 344.º, n.º2, alínea c), 513.º e 514.º do Código de Processo Penal e artigo 8.º e Tabela III Anexa ao Regulamento das Custas Processuais).»

           

            3. - APRECIAÇÃO DO RECURSO

            3.1- Violação do disposto no artigo 340º do Código de Processo Penal por indeferimento de diligências probatórias requeridas pelo recorrente

            O arguido, ora recorrente, suscita, de forma confusa e intrincada, várias questões relativas a requerimentos visando diligências de prova que formulou no decurso da audiência de julgamento ao abrigo do disposto no artigo 340º do Código de Processo Penal, que foram indeferidos e que ora repisa.

Vejamos.

O artigo 340º do Código de Processo Penal – na redação dada pela Lei n.º 94/2021 – dispõe:

“1- O tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa.

2 - Se o tribunal considerar necessária a produção de meios de prova não constantes da acusação, da pronúncia ou da contestação, dá disso conhecimento, com a antecedência possível, aos sujeitos processuais e fá-lo constar da acta.

3 - Sem prejuízo do disposto no artigo 328.º n.º 3, os requerimentos de prova são indeferidos por despacho quando a prova ou o respectivo meio forem legalmente inadmissíveis.

4 - Os requerimentos de prova são ainda indeferidos se for notório que:

a) (Revogada.);

b) As provas requeridas são irrelevantes ou supérfluas;

c) O meio de prova é inadequado, de obtenção impossível ou muito duvidosa; ou

d) O requerimento tem finalidade meramente dilatória.”

            Conquanto o sistema processual penal português obedeça a uma estrutura essencialmente acusatória, imposta pela lei fundamental [cfr. artigo 32º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa (CRP)], é mitigado pelo princípio de investigação da verdade material.

            Como decorrência, o processo é impulsionado pelo acusador e delimitado no seu objeto pela acusação, que estabelece o thema decidendum e, reflexamente, define os poderes de cognição do julgador, sem prejuízo dos princípios da investigação da verdade material e do contraditório.

O artigo 340º constitui, precisamente, a consagração legal do princípio da investigação da verdade material ou da oficialidade[3] que deve presidir à atividade do julgador, impondo a este que persiga a verdade material dos factos sujeitos à sua apreciação, independentemente do contributo dos intervenientes processuais – o tribunal está incumbido de “esclarecer e instruir autonomamente, mesmo para além das contribuições da acusação e da defesa, o facto sujeito a julgamento, criando aquele mesmo as bases necessárias à sua decisão”[4].

A procura da verdade material, tendo em vista a realização da justiça, constitui o desiderato último do processo penal, respeitando, obviamente, os princípios imanentes a um Estado de direito democrático, entre os quais, os princípios da necessidade, da legalidade e da adequação, decorrentes da Constituição, dos instrumentos de direito internacional e do processo penal.

Trata-se de um autêntico poder-dever por parte do tribunal de indagação probatória exaustiva de “todos os factos juridicamente relevantes para a existência ou inexistência do crime, a punibilidade ou não punibilidade do arguido e a determinação da pena ou da medida de segurança aplicáveis” e, ainda, se houver pedido civil “os factos relevantes para a determinação da responsabilidade civil” [cfr. artigo 124º do Código de Processo Penal].

Essa indagação não é, porém, absoluta, comportando limites e reservas, nomeadamente os atinentes aos meios de prova, e da respetiva obtenção, proibidos [cfr. artigos 125º e 126º do Código de Processo Penal].

Destarte, como assinala Oliveira Mendes [ob. e loc. citados], «só poderão ser produzidos meios de prova não proibidos por lei (…), indispensáveis para a descoberta da verdade e boa decisão da causa e úteis, indispensabilidade e utilidade que deverão ser aferidas em função do objeto do processo».

Em suma, o juízo sobre a essencialidade ou indispensabilidade de produção de determinada diligência de prova que cabe ao tribunal – a quem incumbe apreciar a prova e julgar a causa – e está vinculado aos princípios da legalidade, objetividade, necessidade, adequação e viabilidade da obtenção de prova.

A omissão de diligência probatória necessária para a descoberta da verdade material, haja sido ou não requerida, é suscetível de integrar nulidade relativa ou sanável, nos termos da segunda parte da alínea d) do n.º 2 do artigo 120.º do Código de Processo Penal, que assim dispõe:

 “2 – Constituem nulidades dependentes de arguição, além das que forem cominadas noutras disposições legais:

    (…);   

   d) A insuficiência de inquérito ou da instrução, por não terem sido praticados atos legalmente obrigatórios, e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade”. [negrito nosso]

            O segmento normativo realçado reporta-se, especificamente, à nulidade derivada da omissão de atos processuais na fase de julgamento e de recurso, pois só pode ser esse o sentido do adjetivo “posterior” [por referência ao inquérito ou à instrução].

            Por seu turno, da expressão normativa “essenciais para a descoberta da verdade” resulta que a omissão de diligências que não revistam essa essencialidade ou indispensabilidade por referência àquele que seja o objeto do julgamento definido nos moldes supra explicitados não configurará a apontada nulidade.

            Que não estamos perante uma mera questão de semântica, mas da definição de um verdadeiro critério material de verificação da nulidade em causa, realçam-no, de forma expressiva, as palavras de Paulo Pinto de Albuquerque[5], quando refere que «A Lei n.º 48/2007, de 29.8, equipara substancialmente a prova "essencial", "indispensável", "absolutamente indispensável" e "estritamente indispensável" e diferencia-a da prova "necessária" e da prova "conveniente" para a descoberta da verdade (ver anotação ao artigo 340). Portanto, verifica-se esta nulidade quando se omite a prática de actos processuais probatórios que a lei classifica como prova "essencial", "indispensável", "absolutamente indispensável" e "estritamente indispensável" na fase de julgamento e de recurso». E, a propósito da variabilidade de conceitos utilizados pela lei processual penal para caracterizar diversos meios de prova nela dispersamente previstos, adianta e reitera, com acentuado a propósito (ob. citada, pág. 841 – notas 24. a 26. ao art. 340º) que «Esta prolixidade de expressões não favorece a segurança jurídica e encobre uma identidade substantiva dos critérios. Com efeito, a lei Portuguesa reconhece apenas três critérios materiais de admissibilidade da prova, que são:
a. A prova "essencial", "indispensável", "absolutamente indispensável" ou "estritamente indispensável",
b. A prova "necessária", "previsivelmente necessária" ou "absolutamente necessária", "útil", "de interesse", "relevante" ou "de grande interesse" (ou, na formulação negativa, a prova "inadequada", "de obtenção impossível ou muito duvidosa" ou "com finalidade meramente dilatória", "irrelevante" ou "supérflua"),

c. A prova "conveniente".

            A diferença entre estes três tipos de critérios é fundamental em termos práticos. A omissão da prova do primeiro tipo constitui uma nulidade sanável nos termos do artigo 120, n.º 2, al. d). A omissão da prova do segundo tipo constitui uma irregularidade nos termos do artigo 123º. A omissão da prova do terceiro tipo não constitui qualquer vício processual (…).

            O vício (nulidade ou irregularidade) deve ser arguido até ao final da audiência de julgamento se o sujeito processual interessado ou o seu defensor ou representante estiverem presentes na mesma (…). Mas se o sujeito processual interessado tiver requerido a diligência de prova na audiência e não tiver recorrido do despacho que indeferiu a mesma, conformou-se com a mesma e o tribunal superior não pode sindicar o indeferimento da diligência requerida».[6]

            Também a respeito do meio de reação perante o indeferimento de produção de meios de prova em audiência de julgamento, sustenta Oliveira Mendes: «A omissão de produção de meio de prova necessário, ou seja, essencial para a descoberta da verdade e boa decisão da causa, quer a sua produção haja sido ou não requerida, constitui nulidade relativa, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 120º. Quando a omissão ocorre apesar da produção da prova ter sido requerida, ou seja, quando o tribunal indefere o requerimento para a produção da prova, a impugnação deve ser feita por via de recurso. Caso contrário o interessado na produção da prova deve arguir a nulidade até ao encerramento da audiência (alínea a) do n.º 3 do artigo 120º), sob pena de sanação, sendo que no caso de não obter deferimento deve interpor recurso da respetiva decisão.»

            A jurisprudência tem, porém, registado divergência sobre o assunto, discutindo-se se o sobredito poder conferido pelo artigo 340º é discricionário ou, pelo contrário, é sindicável, questionando-se se é recorrível a decisão de indeferimento de requerimento de prova formulado em audiência ao abrigo do predito preceito legal.

            Assim, parte minoritária da jurisprudência entende que o indeferimento de requerimento de produção de meio de prova apresentado em audiência, se essencial para a descoberta da verdade, faz incorrer na nulidade prevista no artigo 120.º, n.º 2, al. d), do Código de Processo Penal, a arguir no prazo legal, não sendo, porém, suscetível de recurso direto.

            Também é residual a jurisprudência que defende que a decisão de indeferimento apenas é recorrível se o poder conferido pelo n.º 1 do artigo 340.º for exercido fora do condicionalismo legal – neste sentido, veja-se o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 27.04.2009 [processo proc. n.º 12/03.2TAFAF.G1]:

            “O exercício do poder de apreciação do condicionalismo legal inscrito no n.º1 do artigo 340º do Código de Processo Penal, isto é, o juízo de necessidade ou desnecessidade da diligência de prova requerida parece-nos insindicável por via de recurso directo: a omissão de diligências que possam reputar-se essenciais para a descoberta da verdade acarreta, antes, uma nulidade relativa (sanável) prevista no artigo 120.º, n.º2, alínea d), do CPP, a arguir “antes que o acto esteja terminado” (art. 120.º, n.º3, al. a), que servirá de eventual fundamento de recurso (cfr. art. 410.º, n.º3 do CPP).

                Contudo, se o poder conferido pela norma do n.º 1 do artigo 340.º for actuado, em sentido negativo ou positivo, fora do condicionalismo legal, isolando outro para fundamentar a decisão respectiva, então aí, na medida em que há violação da lei, a opção tomada pelo tribunal é já susceptível de recurso (cfr. neste sentido os Acs. do STJ de 4 de Dezembro de 1996, BMJ n.º 462, pág. 286 e de 9 de Outubro de 2003, proc.º n.º 1670/03-5ª, in SASTJ n.º74, 170 e o Ac. da Rel. de Lisboa de 16-12-2004, proc.º n.º 8971-4ª, rel. Ana Brito, in www.pgdlisboa.pt).”;

            No sentido da recorribilidade da decisão, posição claramente maioritária, decidiu-se, entre outros, nos seguintes acórdãos:

            - Tribunal da Relação de Coimbra, de 07.10.2015 [processo 174/13.0GAVZL.C1]:

                “1. O despacho que no decurso da audiência de discussão e julgamento indefere, na sequência de requerimento só então apresentado, expressa ou implicitamente a coberto do artigo 340.º do CPP, a audição, na qualidade de testemunha, de uma pessoa é sindicável por via de recurso – pois que corresponde ao exercício de um poder vinculado, que não discricionário, não se mostrando legalmente excluída a respetiva recorribilidade, colhendo, assim, aplicação o princípio geral enunciado no artigo 399.º do CPP - e não já por intermédio da arguição da nulidade do artigo 120.º, n.º 2, alínea d) do CPP;

                2. Se o sujeito processual interessado, na sequência de tal despacho de indeferimento, do mesmo nunca recorre, limitando-se a arguir a respectiva nulidade [artigo 120º, n.º 2, alínea d) do CPP], deixando-o transitar, por via do caso julgado, entretanto formado, fica o tribunal de recurso impedido de o sindicar; (…).”

            - Tribunal da Relação de Coimbra, de 13.11.2019 [processo 253/17.5JALRA.C1]:

            “I – O modo de o arguido reagir ao deferimento da requerida dispensa de inquirição de testemunhas arroladas, pelo Ministério Público, na acusação, é o recurso, não a reclamação/arguição de nulidade.

                II – É também o recurso o meio processual adequado para o arguido se insurgir contra decisão que, no decurso da audiência de julgamento, indefere diligência de prova, requerida, expressa ou implicitamente, ao abrigo do artigo 340.º do CPP.”

            - Tribunal da Relação de Guimarães, de 09.12.2020 [processo 200/19.0GCVRL.G1]:

            “III) A omissão de produção de meio de prova necessário, ou seja, essencial para a descoberta da verdade e boa decisão da causa, quer a sua produção haja sido ou não requerida, constitui a nulidade relativa prevista na alínea d) do n.º 2 do artigo 120º do CPP.

                IV) Quando a omissão ocorre, tendo a produção do meio de prova sido requerida e indeferida, a impugnação deve ser feita por via de recurso. Caso contrário, o interessado na produção da prova deve arguir a nulidade até ao encerramento da audiência (al. a) do n.º 3 do artigo 120º do CPP), sob pena de sanação, sendo que no caso de não obter deferimento deve interpor recurso da respetiva decisão.”

            - Tribunal da Relação de Lisboa, de 26.02.2019 [processo 906/17.8PTLSB.L1-5]:

            “Como defende o Conselheiro Oliveira Mendes (…), a decisão do tribunal de produção ou não produção de prova, “obviamente que é recorrível, designadamente com o fundamento de que foi proferida fora das condições legais, posto que a sua irrecorribilidade não está prevista - art. 399.º.”

                A omissão de produção de meio de prova necessário, no sentido de essencial para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa constitui nulidade relativa, nos termos da alínea d) do n.º2 do artigo 120.º.

                Se a produção do meio de prova não tiver sido requerida, o interessado na sua produção – que o tribunal deveria ter ordenado oficiosamente - deve arguir a nulidade até ao encerramento da audiência, nos termos do artigo 120.º, n.º 3, alínea a), sob pena de sanação. No caso de não obter deferimento, cabe recurso da decisão.

                Porém, se a produção do meio de prova tiver sido requerida e o tribunal indeferir por despacho tal requerimento, a impugnação deve ser feita por via de interposição de recurso desse despacho, não havendo razão para impor ao interessado a prévia arguição de vício.”;

            - Tribunal da Relação de Lisboa, de 19.05.2022 [processo 739/20.4JAFUN.L1-9]:

            “Da jurisprudência ora transcrita a posição defendida (que sufragamos inteiramente) distingue duas situações distintas:

                A primeira situação – a omissão de uma diligência probatória essencial para a descoberta da verdade constitui uma nulidade sanável do artigo 120º, n.º 2, al. d) do C.P.P., e não tendo a diligência de prova sido requerida, deve a nulidade ser arguida até ao final da audiência de julgamento nos termos do artigo 120.º, n.º 3, alínea a), sob pena de sanação. No caso de não obter deferimento, cabe recurso da decisão;

                A segunda situação – se o sujeito processual tiver requerido a diligência de prova na audiência nos termos do artigo 340º do C.P.P. e a mesma tiver sido indeferida, deverá o mesmo interpor recurso do respectivo despacho de indeferimento, sob pena de se ter conformado com a decisão e o tribunal superior não poder sindicar o indeferimento da diligência requerida (veja-se, no mesmo sentido, P.P. Albuquerque em Comentário do Código de Processo Penal, 4ª ed. actualizada, pág. 881 e a jurisprudência nele citada).”

            Já o Tribunal Constitucional, no acórdão n.º 171/2005[7], decidiu que “a outorga ao juiz de um poder de direção do processo, na fase de produção de prova, lhe permite rejeitar liminarmente as diligências probatórias notoriamente irrelevantes, supérfluas, inadequadas ou meramente dilatórias” – naturalmente de acordo, com a apreciação do juiz (…) sujeita a impugnação por via de recurso, não viola qualquer preceito ou princípio constitucional, “maxime o das garantias de defesa”- (…).

            Porém, no âmbito dos processos especiais sumário e abreviado [como é o caso], pautados pela celeridade, simplificação e redução dos atos, só é admissível recurso da sentença ou do despacho que puser termo ao processo, nos termos previstos nos artigos 391º, n.º 1, 391º-G, do Código de Processo Penal.

            No recurso da sentença que interpôs, o recorrente sustenta que, ao decidir como decidiu, violou o tribunal a quo o disposto nos artigos 127º e 340º do Código de Processo Penal [cfr. conclusão 20].

            Assim, considerando os termos da alegação, sob pena de preterição das garantias de defesa do recorrente[8], importa atentar nas seguintes incidências processuais que emergem dos autos:

          - Na sessão da audiência de julgamento de 07.05.2024, o recorrente formulou requerimento de perícia ao alcoolímetro com o seguinte teor:

“…Requer-se nos termos do art. 340.º do CPP e demais aplicável, tais como os artigos 20, nº 1, 32º nº 1 e 7 da CRP, sem esquecer os art. 79.º nº 1, 165º nº1 e 315º nº 1, 328º nº 3 al.b) e 360º nº 4, sem prejuízo dos deveres de oficio do Tribunal sempre em respeito pelo princípio da investigação. Pressupostos Um alcoolímetro é um instrumento usado para medir a concentração de etanol no sangue (TAS- Teor de Alcool no sangue) através de uma análise ao ar expirado durante um sopro. A determinação quantitativa do etanol no ar expirado (TAE- Teor de Alcool no ar Expirado) é feita, em geral, por dois métodos analíticos distintos, através de célula eletroquimica, ou por absorção de infravermelho. O princípio básico que sustenta a utilização dos alcoolímetros é o de que existe uma relação fisiológica entre a concentração de álcool no ar alveolar expirado (TAE)e a concentração presente no sangue (TAS). Assim, a concentração de álcool no ar expirado é diretamente proporcional à sua concentração no sangue, quando este passa pelos pulmões. Esta relação é função da constituição fisica média da população e não é identica em todos os países. Em Portugal, a conversão dos valores do teor de álcool no ar expirado (TAE) em teor de álcool no sangue (TAS) é baseada no principio de que 1mg de álcool por litro de ar expirado é equivalente a 2,3 g de álcool por litro de sangue:1mg/L (TAE)=2,3 g/L (TAS). Ora, o arguido colocou em causa a fiabilidade do aparelho, pelas suas declarações neste momento em julgamento, uma vez que não aceita a taxa de alcoolémia contida na acusação, sendo a mesma relativamente próxima daquela que redunda não da incriminação, mas da contra-ordenação, inferior a 1,20g/L- TAS, a tudo se soma que o mesmo alcoolimetro se encontra fora da verificação anual obrigatória como já teve ocasião de salientar e demonstrar. Desta forma sendo necessária e essencial à boa decisão da causa e à descoberta da verdade material, deverá V. Exª ordenar perícia ao alcoolimetro dos autos a entidade competente, sob os seguintes Quesitos: 1) Qual a probabilidade de o aparelho em causa assumir um desvio sobre a margem de erro? 2) Tal desvio pode colocar em causa a fiabilidade do mesmo? 3) Que margem de desvio assume o mesmo aparelho em concreto? Espera deferimento.-“

            - Tal requerimento foi indeferido por despacho de 23.06.2024, com o seguinte teor:

 «Da perícia requerida pelo arguido

Veio o arguido, em sede de audiência de julgamento suscitar invalidade do meio de prova por via do qual se apurou a taxa de alcoolemia de que era portador (afirmando não aceitar a taxa registada pelo aparelho, requerendo a realização de perícia ao alcoolímetro utilizado no caso dos autos, indicando os seguintes quesitos: “1. Qual a probabilidade de o aparelho em causa assumir um desvio sobre a margem de erro? 2) Tal desvio pode colocar em causa a fiabilidade do mesmo? 3) Que margem de desvio assume o mesmo aparelho em concreto.”

O Ministério Público pronunciou-se, pugnando, em suma, pelo indeferimento da perícia requerida.

Apreciando.

O controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição em Portugal obedece actualmente ao regime geral aprovado pelo Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de Abril, às disposições regulamentares gerais previstas no Regulamento Geral do Controlo Metrológico aprovado pela Portaria n.º 211/2022, de 23 de Agosto, e ainda às disposições constantes das portarias específicas de cada instrumento de medição.

No que concerne aos alcoolímetros quantitativos ou analisadores quantitativos, considerando a data da prática dos factos em apreço nos presentes autos (15 de Novembro de 2023), são os mesmos regulamentados pela Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro (e não pela Portaria 366/2023, de 15 de Novembro, que apenas entrou em vigor no dia 16 de Novembro de 2023).

Nos termos do disposto no artigo 5º da Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro, o controlo metrológico dos alcoolímetros é da competência do Instituto Português da Qualidade, I. P. - IPQ e compreende as seguintes operações: “a) Aprovação de modelo; b) Primeira verificação; c) Verificação periódica; d) Verificação extraordinária.”.

 De notar que a aprovação de modelo é válida por 10 anos, salvo disposição em contrário no despacho de aprovação de modelo (artigo 6º, n.º3, da Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro).

Com efeito, a aprovação de modelo é o acto que atesta a conformidade de um instrumento de medição ou de um dispositivo complementar com as especificações aplicáveis à sua categoria com vista à sua disponibilização no mercado (artigo 7º, n.º1, Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de abril)

A aprovação de modelo é requerida pelo respectivo fabricante ou mandatário e é válida por um período de 10 anos findo o qual carece de renovação (artigo 7º, n.º2, Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de abril).

De salientar no que a este propósito concerne que o modelo cuja aprovação não foi renovada continua a ter aptidão para realizar medições técnicas de qualidade, desde que satisfaça as devidas operações de verificação (vide, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 23 de Novembro de 2022, disponível para consulta in www.dgsipt).

Com efeito, resulta da conjugação das normas constantes dos artigos 10º e 11 da Portaria 1556/2007, de 10 de Dezembro, dos artigos 28º e 29º do Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de Abril e do artigo 2º, n.ºs 1, 2 e 7, do Decreto Lei 291/90, de 20 de Setembro, que o modelo cuja aprovação não foi renovada continua a ter aptidão para realizar medições técnicas de qualidade, desde que satisfaça as devidas operações de verificação.

A primeira verificação é efectuada antes da colocação do instrumento no mercado, após a sua reparação e sempre que ocorra violação do sistema de selagem, dispensando-se a verificação periódica nesse ano (artigo 7º, n.º1, da Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro).

No que à concerne à verificação periódica é anual, salvo indicação em contrário no despacho de aprovação de modelo (artigo 7º, n.º2, da Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro).

Preceitua, por seu turno, o artigo 9º do Decreto-Lei 29/2022, de 7 de Abril, o seguinte:

“1 - A verificação periódica compreende o conjunto de operações destinadas a constatar se os instrumentos de medição mantêm a qualidade metrológica dentro dos erros máximos admissíveis e restantes disposições regulamentares aplicáveis relativamente ao modelo respetivo, devendo ser requerida pelo utilizador do instrumento de medição.

2 - Nos instrumentos de medição cuja qualidade metrológica esteja dentro dos erros máximos admissíveis e restantes disposições regulamentares aplicáveis relativamente ao respetivo modelo, a marca de verificação periódica é aposta no ato da operação.

3 - A verificação periódica é válida pelo prazo constante na regulamentação específica aplicável.

4 - A verificação periódica deve ser requerida até 30 dias antes do fim da validade da última operação de controlo metrológico.”

Ora, tendo mais uma vez presente a disposição transitória constante no artigo 28º Decreto-Lei 29/2022, de 7 de Abril e atentando a que a aprovação do modelo de alcoolímetro em apreço nos presentes (“DRAGER ALCOOTEST 7110 MKIII P” foi aprovado por despacho do IPQ n.º 11037/2007, de 24 de Junho, publicado do Diário da República 2º série, n.º 109, de 6 de Julho de 2007) foi concedida ao abrigo do Decreto Lei 291/90, de 20 de Setembro, importa atentar, ainda, no que tange à verificação periódica que, nos termos do disposto no artigo 4º, n.º5, do Decreto-Lei n.º 291/90 de 20 de Setembro, “a verificação periódica é válida até 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização, salvo regulamentação específica em contrário”.

Percorridos os autos, verificamos que o arguido AA foi submetido ao exame de pesquisa de álcool no sangue no dia 15.11.2023, através do aparelho DRAGER ALCOOTEST 7110 MKIII P, com o n.º de série ARMA-0050.

Mais se verifica que o referido alcoolímetro foi sujeito a verificação periódica a 29 de Junho de 2022.

Deste modo, e fazendo apelo às considerações de direito supra expendidas, resulta claro que a verificação periódica anual a realizar no ano civil de 2023, e, portanto, até ao dia 31 de Dezembro de 2023, se mostrava válida à data da prática dos factos.

Neste conspecto, considerando que o aparelho DRAGER ALCOOTEST utilizado na situação dos autos foi oportunamente aprovado pelo competente Instituto Português da Qualidade, I. P. – IPQ, tendo, também, este Instituto – único competente para o controlo metrológico dos alcoolímetros – verificado periodicamente o aparelho em apreço, mostrando-se válida a verificação periódica à data da prática dos factos, e sendo certo que em sede de acusação pública se mostra deduzido o erro máximo admissível (EMA), previsto no artigo 8.º da Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro e no quadro em anexo a tal Diploma, resulta claro que a perícia requerida pelo arguido carece de qualquer pertinência e utilidade.

Nestes termos, e de harmonia com o disposto no artigo 340º, n.º1, a contrario, do Código de Processo Penal, por não se afigurar a mesma necessária para a descoberta da verdade nem para a boa decisão da causa, indefiro a realização da perícia requerida pelo arguido.

Notifique.

(…)»

          - Por requerimento de 26.06.2024, o recorrente arguiu nulidade nos seguintes termos:

 «Vem o arguido, sobre o v/ último despacho, expor e requerer nos termos subsequentes. De facto, havia aquele colocado em causa a fiabilidade do alcoolímetro dos autos, uma vez que não aceita a taxa de alcoolémia, sendo a mesma relativamente próxima daquela que redunda não da incriminação, mas da contra-ordenação, inferior a 1,20 g/l – TAS. Tal resulta também das suas declarações em sede de audiência de julgamento, já prestadas. Veio a ser requerida pelo arguido, perícia, em sede de audiência de julgamento ao alcoolímetro utilizado no caso dos autos, indicando os seguintes quesitos: “1. Qual a probabilidade de o aparelho em causa assumir um desvio sobre a margem de erro? 2) Tal desvio pode colocar em causa a fiabilidade do mesmo? 3) Que margem de desvio assume o mesmo aparelho em concreto.” Sucede que, a mesma não foi admitida cfr despacho. O mesmo fundamentou-se que “ resulta claro que a verificação periódica anual a realizar no ano civil de 2023, e, portanto, até ao dia 31 de Dezembro de 2023, se mostrava válida à data da prática dos factos. Neste conspecto, considerando que o aparelho DRAGER ALCOOTEST utilizado na situação dos autos foi oportunamente aprovado pelo competente Instituto Português da Qualidade, I. P. – IPQ, tendo, também, este Instituto – único competente para o controlo metrológico dos alcoolímetros – verificado periodicamente o aparelho em apreço, mostrando-se válida a verificação periódica à data da prática dos factos, e sendo certo que em sede de acusação pública se mostra deduzido o erro máximo admissível (EMA), previsto no artigo 8.º da Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro e no quadro em anexo a tal Diploma, resulta claro que a perícia requerida pelo arguido carece de qualquer pertinência e utilidade.” Nada mais errado, pelo que, não merecerá o nosso acolhimento. De facto, era necessário dar cumprimento à disposição do artigo 340.º, por se afigurar a mesma necessária para a descoberta verdade e para a boa decisão da causa. É nessa senda que se suscita a nulidade do despacho em crise por via do artigo 120.º n.º 2 alínea d) A insuficiência do inquérito ou da instrução e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade. S.M.O., o despacho antecedente (25/06/2024 com Ref.ª 95758207) que veio a não admitir diligências de prova, baseia-se numa falsa questão, que é aquela que assume e cita-se: “encontra-se o parelho dentro da verificação periódica anual”. O que, de todo, não é verdade. E, nem se diga, que o entendimento correto é aquele que se firma no limite do ano civil. (não sendo despiciendo referir que até a data dos factos em discussão se haverão de reportar muito ao fim do ano civil, cfr os autos) Reitera-se: uma vez que a TAS se encontra junto do limite contra-ordenacional, a verificação anual ultrapassada, e bem assim com as declarações do arguido de que não bebeu bebidas alcoólicas que pudessem ter dado origem àqueloutra o que foi corroborado por testemunha que jantou com o arguido nesse dia, asseverando que o mesmo estava completamente lúcido e “em perfeitas condições”, teria que até ex oficio levar o tribunal a ordenar tal perícia ou outra com o desiderato no escrupuloso cumprimento do artigo 340.º do CPP. Concluímos, Que a omissão de produção de meio de prova necessário, no sentido de essencial para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa, constitui nulidade relativa, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 120.º do CPP. Por tudo o que foi exposto deve ser julgada procedente a arguida nulidade do despacho em crise, ser o mesmo revogado e ordenada nos termos do art. 340.º do CPP e demais aplicável, tais como os artigos 20, nº 1, 32º nº 1 e 7 da CRP, sem esquecer os art. 79º nº 1, 165º nº1 e 315º nº 1, 328º nº 3 al.b) e 360.º nº 4, sem prejuízo dos deveres de oficio do Tribunal sempre em respeito pelo princípio da investigação, a mesma perícia.”

          - Por despacho de 26.11.2024, foi indeferida a arguição de nulidade nos seguintes termos:

«Requerimento com a referência n.º 6649004:

Considerando os fundamentos vertidos no despacho proferido a 23 de Junho de 2024 – e que, brevitatis causa, aqui damos integralmente por reproduzidos – inexiste qualquer nulidade, pelo que se mantém o despacho proferido, indeferindo-se o requerido.

Notifique.»

          - Tal despacho foi notificado ao arguido por ofício datado de 02.12.2024, com a referência 96767196;

          - Na sessão da audiência de julgamento de 12.12.2024, o recorrente formulou requerimento no sentido de ser «solicitada informação se na data da infração existiam, ou não, tapumes e se havia obras naquele local»;

          - Por despacho proferido de seguida foi decidido:

«Percorridos os depoimentos dos dois agentes da PSP ouvidos na última sessão de audiência de julgamento e as declarações prestadas pelo arguido na primeira sessão de audiência de julgamento verifica-se, desde logo, inexistir qualquer contradição no que respeita ao local da prática dos factos (veja-se, designadamente, que a testemunha EE relatou ter avistado o arguido a conduzir o veículo automóvel em direcção à Rua ... e que, quando o veículo já se encontrava na referida rua, por se aperceber da presença da patrulha, o arguido recuou com o veículo automóvel cerca de 10 metros; tendo o arguido afirmado, por seu turno, ter decidido não regressar a casa de automóvel, pretendendo chamar um “Uber”, sendo que antes de chamar tal transporte decidiu passar pelo veículo automóvel que havia anteriormente estacionado junto à Rua ... [acabando o arguido por assumir, ao longo das suas declarações, não ter estacionado em qualquer espaço “condominial”, mas sim em zona com estacionamento controlado por parquímetros] a fim de daí retirar uma mala e, ali chegado, por temer que o veículo pudesse dificultar a execução das obras que aí se encontravam a decorrer, e por pretender estacioná-lo de outra forma, acabou por conduziu o automóvel, alguns metros).

Ademais, considerando o objecto dos presentes autos, resulta claro que a diligência ora pretendida não se afigura necessária nem à descoberta da verdade nem à boa decisão da causa, sendo a prova requerida irrelevante e assumindo o requerimento em apreciação finalidade meramente dilatória.

Nestes termos, e nos termos do disposto no artigo 340º, n.º1, a contrario e nº 4, alíneas b) e d), do Código de Processo Penal, indefiro o ora requerido pelo arguido.»

           - O arguido não reagiu, então, a esse despacho.

          Como ressuma da síntese do processado ora efetuada, ao invés do alegado pelo recorrente [cfr. conclusão 11], não há omissão de pronúncia relativamente à arguição de nulidade, tendo-se o tribunal a quo pronunciado expressamente sobre a mesma mediante o despacho de 26.11.2024.

          Relativamente à decisão de indeferimento, nos termos do artigo 340º, n.º 1, a contrario, do Código de Processo Penal, da requerida perícia ao alcoolímetro, mostra-se a mesma profusamente fundamentada, revelando-se absolutamente assertiva a conclusão de que não era necessária para a descoberta da verdade nem para a boa decisão da causa.

          Ademais, ainda que assim se não entendesse, como assinala o Ministério Público na resposta ao recurso, seria uma diligência de prova de impossível concretização, face ao lapso de tempo já decorrido desde o momento em que o recorrente foi sujeito à pesquisa de álcool no sangue através do ar expirado. Com efeito, o aparelho alcoolímetro em causa, decorridos quase dois anos desde a prática dos factos, já não estará nas mesmas condições, sendo notório que qualquer perícia é insuscetível de recriar as condições mecânicas ou técnicas do mesmo à data da pesquisa de álcool, pelo que o resultado da mesma jamais poderia infirmar a prova que decorre da determinação qualitativa e quantitativa anteriormente efetuada.

            No que tange ao requerimento de diligência destinada a apurar se, no local onde ocorreram os factos, existiam tapumes e obras, o recorrente nem sequer esclarece qual a pertinência da informação pretendida para o apuramento dos factos que lhe são imputados, resultando, porém, do teor do despacho que visaria confirmar a sua versão quanto ao motivo pelo qual conduziu o veículo automóvel durante alguns metros.

          Todavia, considerando o objeto do processo e a factualidade imputada ao recorrente e tendo este admitido ter conduzido o veículo, efetivamente, como bem explicitado foi no despacho que indeferiu tal pretensão probatória, esta não se afigurava necessária à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, revestindo natureza dilatória, razão pela qual não foi admitida, nos termos do disposto no artigo 340º, n.ºs 1, a contrario, e 4, als. b) e d), do Código de Processo Penal .

          Bem andou, pois, o tribunal a quo ao indeferir os requerimentos probatórios formulados pelo ora recorrente, por entender que os mesmos não eram necessários à descoberta da verdade e à boa decisão da causa.

O tribunal a quo fundamentou devidamente essa convicção tendo em perspetiva os sobreditos pressupostos de indispensabilidade e utilidade das diligências probatórias requeridas aferidos em função do objeto do processo, em termos que nos merecem plena concordância, pelo que de forma alguma foi violado o preceituado nos artigos 127º e 340º do Código de Processo Penal.

          Improcede, pois, esta primeira questão.

            3.2- Impugnação da matéria de facto

            O recorrente não se conforma com a matéria de facto dada como provada, decorrendo da alegação recursiva que pretende impugnar parte da mesma.

            A impugnação, em sede de recurso, da decisão da matéria de facto pode processar-se por uma de duas vias: mediante a arguição de vício de texto prevista no artigo 410º, n.º 2, do Código de Processo Penal – dispositivo que consagra uma forma de reexame da matéria de facto mais restrita, comummente designada de revista alargada – ou através de recurso amplo ou recurso efetivo da matéria de facto, previsto no artigo 412º, n.ºs 3, 4 e 6, do mesmo diploma, a denominada a impugnação ampla da decisão da matéria de facto.

            Na primeira hipótese, a discordância do recorrente traduz-se na invocação de vício(s) da decisão recorrida contemplado(s) no artigo 410º, n.º 2, e este recurso é considerado como sendo ainda em matéria de direito; optando pela segunda hipótese, o recorrente terá de socorrer-se de provas contidas nos autos e examinadas em audiência, que deverá especificar nos moldes prescritos no artigo 412º, n.ºs 3 e 4.

            Concretizando melhor:

Estatui o artigo 410º, n.º 2, do Código de Processo Penal que «[m]esmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso à matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida por si ou conjugada com as regras da experiência comum:

a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;

b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão;

c) Erro notório na apreciação da prova.»

Os elencados vícios constituem defeitos estruturais e intrínsecos da decisão, razão pela qual a lei exige que a sua demonstração resulte patenteada pelo respetivo texto, por si só ou em conjugação com as regras da experiência comum, estando, por isso, excluída a possibilidade de consideração de outros elementos extrínsecos ou exógenos, ainda que constem do processo, emergentes de prova constituída ou advinda do próprio julgamento[9].

No âmbito da análise dos vícios decisórios, contrariamente ao que sucede com a impugnação ampla da matéria de facto, o tribunal de recurso não aprecia a matéria de facto – no sentido da reapreciação da prova –, limitando a sua atuação, num exercício de exegese hermenêutica, à deteção dos vícios que a decisão recorrida evidencia e, não sendo possível saná-los, determina a remessa do processo para novo julgamento, em consonância com o preceituado no artigo 426º do Código de Processo Penal.

A matéria de facto que padeça dos sobreditos vícios está «(…) ostensivamente divorciada da realidade das coisas, quer por ser insuficiente, quer por ser contraditória, quer por erroneamente apreciada»[10], razão pela qual, ainda que não sejam invocados, são de conhecimento oficioso – cfr. acórdão de fixação de jurisprudência n.º 7/95[11].

Por seu turno, dispõe o artigo 412º, n.ºs 3 e 4, do Código de Processo Penal:

“3 - Quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;

c) As provas que devem ser renovadas.

4 - Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na ata, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 364.º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação.”

Trata-se de mecanismo adequado a tentar reverter o erro de julgamento e obter a modificação da decisão sobre a matéria de facto nos termos consentidos pelo artigo 431º, al. b), do Código de Processo Penal. É a denominada impugnação ampla, visando uma reapreciação autónoma sobre a razoabilidade da convicção formada pelo tribunal a quo relativamente aos concretos “pontos de facto” que o recorrente considera incorretamente julgados, através da (re)avaliação das provas que, em seu entender, imponham decisão diversa da recorrida.

O recurso interposto com esse desiderato poderá ter como fundamento:

- A atribuição, pelo tribunal recorrido, aos meios de prova convocados como suporte da decisão, de conteúdo diverso daquele que efetivamente têm ou daquele que foi realmente produzido em audiência; ou

- A violação de critérios legais de valoração e apreciação da prova (incorporada nos autos ou produzida oralmente em audiência): pela valoração de meios de prova ilegais ou nulos; pela violação de critérios de apreciação da prova vinculada (vg. prova documental e pericial); pela violação de princípios gerais de apreciação da prova, designadamente o princípio da livre apreciação previsto no artigo 127º do Código de Processo Penal e o princípio in dubio pro reo[12].

Contudo, cumpre sublinhar que, como vem reiteradamente assinalando a doutrina[13] e a jurisprudência[14], nos casos de impugnação ampla, o recurso da matéria de facto não visa a realização de um novo julgamento sobre a matéria impugnada, antes constituindo um mero remédio jurídico que se destina a despistar e corrigir, cirurgicamente, erros in judicando ou in procedendo que o recorrente deverá expressamente indicar.

Por isso, recai sobre o recorrente o ónus de proceder a uma tríplice especificação conforme estipulado no artigo 412º, n.º 3, do Código de Processo Penal: os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados [al. a)]; as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida [al. b)]; as provas que devem ser renovadas [al. c)].

A especificação dos “concretos pontos de facto” traduz-se na indicação dos factos individualizados que constam na sentença recorrida e que se consideram incorretamente julgados.

Por seu turno, a especificação das “concretas provas” só se satisfaz com a indicação do conteúdo específico do meio de prova ou de obtenção de prova e com a explicitação da razão pela qual essas “provas” impõem decisão diversa da recorrida. Exige-se, pois, que o recorrente refira o que é que nesses meios de prova não sustenta o facto dado por provado ou como não provado, de forma a relacionar o seu conteúdo específico, que impõe decisão diversa da recorrida, com o facto individualizado que se considera incorretamente julgado[15].

Finalmente, a especificação das provas que devem ser renovadas implica a indicação dos meios de prova produzidos na audiência de julgamento em 1ª instância cuja renovação se pretenda, dos vícios previstos no artigo 410º, n.º 2, do Código de Processo Penal e das razões para crer que aquela permitirá evitar o reenvio do processo (cfr. artigo 430º do mesmo diploma).

Havendo gravação das provas, essas especificações devem ser feitas com referência ao consignado na ata, devendo aquele indicar concretamente as passagens [das gravações] em que se funda a impugnação, pois são essas que devem ser ouvidas ou visualizadas pelo tribunal, sem prejuízo de outras relevantes, em consonância com o estabelecido nos nºs 4 e 6 do artigo 412º do Código de Processo Penal. Na ausência de consignação na ata do início e termo das declarações, bastará, de acordo com a jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão n.º 3/2012[16], «a referência às concretas passagens/excertos das declarações que, no entendimento do recorrente, imponham decisão diversa da assumida, desde que transcritas pelo recorrente».

            Atentando no caso dos autos, lida a motivação do recurso e as conclusões desta extraídas, constata-se que o recorrente não explicita por que via de recurso pretende enveredar, limitando-se a afirmar que «o presente recurso versa sobre matéria de facto e direito, nos termos do artigo 410º do CPP n.º 1, 2 e 3».

            Pese embora a referência a tal preceito legal nos remeta para a revista alargada, por via da apreciação dos vícios decisórios previstos nas alíneas do n.º 2 do artigo 410º, o recorrente não identifica quais os vícios em causa, não apela ao texto da sentença e não pugna pela normal consequência da verificação daqueles – o reenvio do processo para novo julgamento.

            Por outra banda, conquanto o recorrente não aluda em momento algum ao artigo 412º do Código de Processo Penal ou à via de impugnação ampla neste consagrada, é inquestionável que discorda da avaliação da prova efetuada pelo tribunal a quo e consequente fixação da factualidade provada no que tange, pelo menos, à essencialidade dos factos que lhe são imputados.

            Na realidade, decorre da alegação recursiva que o recorrente dissente, pelas razões que aí aduz, da apreciação que o tribunal a quo efetuou da prova contida nos autos e produzida em audiência, que considera insuficiente, pelas razões que aduz – nomeadamente, a ausência das sobreditas diligências probatórias que requereu e que foram indeferidas e invalidade da prova resultante da utilização do aparelho de alcoolímetro–, o que nos remete para a impugnação ampla da matéria de facto.

O recorrente alega, em muito apertada síntese, que inexiste prova de que tenha ingerido bebidas alcoólicas em quantidade que tenha determinado a taxa de álcool no sangue apurada no alcoolímetro e que tenha conduzido o veículo automóvel na via pública, baseando-se nas suas declarações e no depoimento da testemunha que indicou, que, na sua ótica, contrariam o relato dos eventos efetuado pelos agentes da PSP que procederam à ação de fiscalização e o resultado do aparelho de exame de pesquisa de álcool no sangue, que é inválido.

Todavia, deparamo-nos com uma contingência inultrapassável – o incumprimento do ónus de impugnação especificada nos sobreditos moldes.

Com efeito, o recorrente nem sequer especifica, desde logo, quais os concretos pontos da matéria de facto que pretende impugnar, em conformidade com o exigido pelo artigo 412º, n.º 3, al. a), do Código de Processo Penal, limitando-se a afirmar, na motivação, que foi condenado pelos factos descritos nos pontos 1, 2 e 3 da factualidade provada – que transcreve –, nem esclarece se entende que devem ser considerados totalmente não provados ou provados apenas parcialmente – sendo certo que emerge da globalidade da alegação que não discorda da integralidade do conteúdo daqueles três pontos de facto, mas apenas do local (via pública) e da taxa de álcool no sangue ali referidos.

Todavia, como é óbvio, não pode ser este tribunal ad quem a inferir da alegação recursiva quais os concretos factos impugnados – tem que ser o recorrente a indicá-los de forma clara, expressa e inequívoca.

Outrossim, o recorrente não indica quais as concretas provas que impõem – não apenas permitem ou aconselham – decisão diversa por referência a cada facto individualizado de que discorda, em obediência ao estatuído no artigo 412º, n.º 3, al. b), e, tratando-se de provas gravadas, ao preceituado no n.º 4 do mesmo preceito.

Com efeito, no que tange à prova oral, o recorrente convoca o teor das suas próprias declarações, mas ao invés de indicar as concretas passagens da gravação que sustentam a sua versão dos eventos em discussão, indica apenas o início [15:39:09] e o termo da gravação [16:27:01], com a duração de aproximadamente uma hora!

Ora, não interessa a integralidade das declarações do recorrente, pois não é da realização de um segundo julgamento que ora se trata – sendo certo que, refira-se, en passant, em apoio da sua versão, o recorrente convoca apenas escassos excertos do depoimento da testemunha CC, ignorando por completo os depoimentos das testemunhas que são agentes da PSP que efetuaram a fiscalização. Como se assinalou no acórdão do STJ de 24/10/2002, proferido no processo n.º 2124/2002, «(...) o labor do Tribunal da 2.ª instância num recurso de matéria de facto não é uma indiscriminada expedição destinada a repetir toda a prova (por leitura e/ou audição), mas sim um trabalho de reexame da apreciação da prova (e eventualmente a partir dos) nos pontos incorrectamente julgados, segundo o recorrente, a partir das provas que, no mesmo entender, impõem decisão diversa da recorrida [art. 412.º, n.º 3, als. a) e b) do CPP].

Se o recorrente não cumpre aqueles deveres não é exigível ao Tribunal Superior que se lhe substitua e tudo reexamine, quando o que lhe é pedido é que sindique erros de julgamento que lhe sejam devidamente apontados com referência às provas e respectivos suportes».

Apenas relevam os segmentos das declarações do recorrente de que resultará aquilo que sintetizou na conclusão 3 que, na sua ótica, impunha decisão diversa da adotada.

Ora, a gravação na aplicação informática Citius Media Studio contém a indicação da data e hora do início e do termo das declarações, bem como do andamento das mesmas, ao segundo, podendo, por isso, ser facilmente identificada, com indicação da hora, minuto e segundo do início e do termo, cada parte da gravação que, na perspetiva do recorrente, demonstra o que alega.

Como escreve Paulo Pinto de Albuquerque[17], a Lei n.º 48/2007, de 29.08, mudou profundamente o regime de impugnação da matéria de facto. O legislador tem dois objetivos: tornar mais exigente a especificação dos pontos de facto impugnados e das provas que impõem decisão diversa da recorrida no recurso da decisão sobre a matéria de facto e pôr cobro ao dever de transcrição dos registos gravados. O novo regime articula-se com as regras novas sobre a documentação das declarações prestadas na audiência e o acesso dos sujeitos processuais a esta documentação. A especificação das concretas provas só se satisfaz com a indicação do conteúdo específico do meio de prova ou de obtenção de prova que impõe decisão diversa da recorrida. O grau acrescido de concretização exigido pela Lei n.º 48/2007, de 29.08, visa precisamente impor ao recorrente que relacione o conteúdo específico do meio de prova que impõe decisão diversa da recorrida com o facto individualizado que considera incorretamente julgado.

O incumprimento dos referidos ónus inviabiliza a apreciação da impugnação ampla da matéria de facto e este tribunal ad quem não pode suprir esta imperfeição, porquanto não foi, sequer, efetuada a indispensável especificação dos factos que o recorrente pretende impugnar e, muito menos, a indicação das provas e a relacionação do específico conteúdo probatório com cada um dos pontos da matéria de facto, ou parte(s) destes, que pretenderia impugnar.

A situação descrita configura, salvo melhor opinião, incumprimento do ónus de especificação legalmente exigida previsto no artigo 412º, n.ºs 3, als. a) e b), e 4, do Código de Processo Penal, nos termos supra assinalados, insuscetível de correção ou aperfeiçoamento, razão pela qual não se convidou o recorrente para o efeito.

Efetivamente, como vem sendo entendimento pacífico da jurisprudência, apenas nas situações em que as sobreditas especificações não são vertidas nas conclusões, mas constam da motivação do recurso, pode haver lugar ao convite ao aperfeiçoamento. Não contendo também o corpo das motivações as preditas especificações legalmente exigidas – como sucede in casu –, não estamos apenas perante uma situação de insuficiência das conclusões, mas antes de deficiência substancial da motivação ou de insuficiência do próprio recurso, insuscetível de aperfeiçoamento, com a consequência de o mesmo, nessa parte assim afetada, não poder ser conhecido[18].

Assim, não poderá a impugnação ampla da matéria de facto deduzida pelo recorrente, ancorada pela prova das suas declarações e o que com estas se conexiona – nomeadamente, a indicação que aquele fez do local onde terão ocorrido os factos na imagem do google maps impressa, que assinalou com uma cruz, e que alegadamente será diverso do constante do auto de notícia – ser conhecida. Ainda que assim não se entendesse, cumpre esclarecer que a desconsideração, pelo tribunal a quo, daquele documento jamais consubstanciaria “nulidade insanável”, como o recorrente alega [cfr. conclusão 6], mas cujo suporte legal não fundamenta, pela simples razão de não existir. Na realidade tal desconsideração prende-se, obviamente, com a credibilidade que o tribunal a quo, no âmbito da sua livre convicção, de acordo com o princípio basilar no artigo 127º do Código de Processo Penal, atribuiu às declarações do ora recorrente no confronto com os demais elementos de prova. E o tribunal a quo não é obrigado a mencionar todos os meios de prova, mas tão somente aqueles que contribuíram para a formação da sua convicção e sobre aqueles que não pode valorar por serem proibidos.

Outrossim não se pode conhecer da insólita tentativa do recorrente de fazer valer a sua perspetiva empírica de que a quantidade de bebidas alcoólicas que ingeriu nunca poderia determinar a taxa de álcool no sangue apurada, mas antes uma bem inferior, próximo do limiar da tipicidade criminal, com base nas suas próprias declarações e no depoimento da testemunha de defesa que indicou, isto apesar de admitir que se trata de «facto sujeito a prova vinculada» [cfr. conclusão 27].

Contudo, o recorrente coloca em crise o resultado do teste de pesquisa de álcool no sangue, alegando, de forma lapidar, que o aparelho utilizado para o efeito estava «fora do período de validade e verificação anual», questão que já havia suscitado na contestação e que foi apreciada na sentença.

A este respeito exarou o tribunal a quo o seguinte:

«(..) importa começar por dizer resulta do disposto no artigo 153.º do Código da Estrada que o exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito, existindo uma prova vinculada quanto à alcoolemia, dado que desta só pode ser feita prova por aparelhos aprovados e por exames de sangue, e a aprovação de alcoolímetro exige a homologação de características técnicas pelo Instituto Português da Qualidade (IPQ) e a aprovação de uso pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR).

O arguido arguiu que, à data da fiscalização, encontrava-se ultrapassado quer o prazo de validade da aprovação do aparelho quer o prazo de verificação anual do alcoolímetro quantitativo utilizado no caso dos autos, pelo que o teste realizado não poderia ser considerado meio de prova válido.

Ora, o controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição em Portugal obedece actualmente ao regime geral aprovado pelo Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de Abril, às disposições regulamentares gerais previstas no Regulamento Geral do Controlo Metrológico aprovado pela Portaria n.º 211/2022, de 23 de Agosto, e ainda às disposições constantes das portarias específicas de cada instrumento de medição.

No que concerne aos alcoolímetros quantitativos ou analisadores quantitativos, considerando a data da prática dos factos em apreço nos presentes autos (15 de Novembro de 2023), são os mesmos regulamentados pela Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro (e não pela Portaria 366/2023, de 15 de Novembro, que apenas entrou em vigor no dia 16 de Novembro de 2023).

Nos termos do disposto no artigo 5º da Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro, o controlo metrológico dos alcoolímetros é da competência do Instituto Português da Qualidade, I. P. - IPQ e compreende as seguintes operações: “a) Aprovação de modelo; b) Primeira verificação; c) Verificação periódica; d) Verificação extraordinária.”.

De notar que a aprovação de modelo é válida por 10 anos, salvo disposição em contrário no despacho de aprovação de modelo (artigo 6º, n.º3, da Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro), sendo que a aprovação de modelo é o acto que atesta a conformidade de um instrumento de medição ou de um dispositivo complementar com as especificações aplicáveis à sua categoria com vista à sua disponibilização no mercado (artigo 7º, n.º1, Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de abril).

A aprovação de modelo é requerida pelo respectivo fabricante ou mandatário e é válida por um período de 10 anos findo o qual carece de renovação (artigo 7º, n.º2, Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de abril).

Ora, o decurso do prazo de aprovação do modelo do alcoolímetro, não determina a invalidade da prova recolhida através de aparelho cujo modelo haja sido aprovado há mais de 10 anos, já que uma realidade é a aprovação do modelo outra é a capacidade de uso do aparelho em si.

Conforme impressivamente se salienta no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15 de Janeiro de 2023, disponível para consulta in www.dgsi.pt:

«(…)não obstante o legislador tenha definido um prazo de validade para a Aprovação do modelo de alcoolímetro não quis que o decurso desse prazo inviabilizasse sem mais o uso dos mesmos, antes os sujeitou a avaliações periódicas, validando o seu uso para além do prazo de Aprovação do modelo, impondo, assim às entidades responsáveis pela realização dos testes de pesquisa de álcool por ar expirado a realização das avaliações adequadas legais, as quais são da competência do Instituto Português da Qualidade».

Assim, o modelo cuja aprovação não foi renovada continua a ter aptidão para realizar medições técnicas de qualidade, desde que satisfaça as devidas operações de verificação (vide, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 23 de Novembro de 2022, disponível para consulta in www.dgsi.pt), não sendo a simples aprovação do modelo do aparelho, mas a sua submissão a operações de verificação que atesta a fiabilidade do resultado obtido.

Com efeito, resulta da conjugação das normas constantes dos artigos 10º e 11 da Portaria 1556/2007, de 10 de Dezembro, dos artigos 28º e 29º do Decreto-Lei n.º 29/2022, de 7 de Abril e do artigo 2º, n.ºs 1, 2 e 7, do Decreto Lei 291/90, de 20 de Setembro, que o modelo cuja aprovação não foi renovada continua a ter aptidão para realizar medições técnicas de qualidade, desde que satisfaça as devidas operações de verificação.

A primeira verificação é efectuada antes da colocação do instrumento no mercado, após a sua reparação e sempre que ocorra violação do sistema de selagem, dispensando-se a verificação periódica nesse ano (artigo 7º, n.º1, da Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro).

No que à concerne à verificação periódica é anual, salvo indicação em contrário no despacho de aprovação de modelo (artigo 7º, n.º 2, da Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro).

Preceitua, por seu turno, o artigo 9º do Decreto-Lei 29/2022, de 7 de Abril, o seguinte:

«1 - A verificação periódica compreende o conjunto de operações destinadas a constatar se os instrumentos de medição mantêm a qualidade metrológica dentro dos erros máximos admissíveis e restantes disposições regulamentares aplicáveis relativamente ao modelo respetivo, devendo ser requerida pelo utilizador do instrumento de medição.

2 - Nos instrumentos de medição cuja qualidade metrológica esteja dentro dos erros máximos admissíveis e restantes disposições regulamentares aplicáveis relativamente ao respetivo modelo, a marca de verificação periódica é aposta no ato da operação.

3 - A verificação periódica é válida pelo prazo constante na regulamentação específica aplicável.

4 - A verificação periódica deve ser requerida até 30 dias antes do fim da validade da última operação de controlo metrológico.».

Ora, tendo mais uma vez presente a disposição transitória constante no artigo 28º Decreto-Lei 29/2022, de 7 de Abril e atentando a que a aprovação do modelo de alcoolímetro em apreço nos presentes (“DRAGER ALCOOTEST 7110 MKIII P”), por despacho do IPQ n.º 11037/2007, de 24 de Junho (publicado do Diário da República 2º série, n.º 109, de 6 de Julho de 2007), foi concedida ao abrigo do Decreto Lei 291/90, de 20 de Setembro, importa atentar, ainda, no que tange à verificação periódica que, nos termos do disposto no artigo 4º, n.º5, do Decreto-Lei n.º 291/90 de 20 de Setembro, “a verificação periódica é válida até 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização, salvo regulamentação específica em contrário”.

No caso em apreço, o arguido AA foi submetido ao exame de pesquisa de álcool no sangue no dia 15.11.2023, através do aparelho DRAGER ALCOOTEST 7110 MKIII P, com o n.º de série ARMA-0050, sendo que o referido alcoolímetro foi sujeito a verificação periódica a 29 de Junho de 2022, pelo que, considerando o regime legal supra aludido, resulta claro que a verificação periódica anual a realizar no ano civil de 2023, e, portanto, até ao dia 31 de Dezembro de 2023, se mostrava válida à data da prática dos factos.

Assim, considerando que o aparelho DRAGER ALCOOTEST utilizado na situação dos autos foi oportunamente aprovado pelo competente Instituto Português da Qualidade, I. P. – IPQ, tendo, também, este Instituto – único competente para o controlo metrológico dos alcoolímetros – verificado periodicamente o aparelho em apreço, mostrando-se válida a verificação periódica à data da prática dos factos, e sendo certo que em sede de acusação pública se mostra deduzido o erro máximo admissível (EMA), previsto no artigo 8.º da Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro e no quadro em anexo a tal Diploma, resulta claro que o alcoolímetro em apreço nos autos mantém a qualidade metrológica que a operação de verificação periódica lhe assegura, sendo a prova por ele recolhida válida.

Com efeito, não constituindo prova pericial em sentido técnico, a prova decorrente do exame efetuado com alcoolímetro, no âmbito do disposto no artigo 153º do Código da Estrada, é prova tarifada, desde que o aparelho se encontre homologado, aprovado e com verificação periódica válida (vide, neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 16 de Maio de 2012, disponível para consulta in www.dgsi.pt).»

Como sobressai de forma clara do excerto transcrito, o tribunal a quo apreciou a questão de forma aprofundada e assertiva, com base na legislação pertinente atenta a temporalidade dos factos e com apoio na jurisprudência sobre a matéria.

Em reforço do expendido, faz-se apenas notar que a Portaria n.º 366/2023, de 15.11 – que entrou em vigor no dia seguinte à sua publicação e, portanto, aos factos em apreço nos autos –  contém no artigo 11º uma disposição transitória que esclarece que “Os alcoolímetros em uso poderão permanecer em utilização enquanto estiverem em bom estado de conservação e nos ensaios de verificação metrológica incorrerem em erros que não excedam os erros máximos admissíveis”, ou seja, semelhante à citada na sentença [artigo 10º da Portaria n.º 1556/2007, de 10.12], que dispunha que “Os alcoolímetros cujo modelo tenha sido objecto de autorização de uso, determinada ao abrigo da legislação anterior, poderão permanecer em utilização enquanto estiverem em bom estado de conservação e nos ensaios incorrerem em erros que não excedam os erros máximos admissíveis da verificação periódica”.

Assim sendo, concordando-se com a análise efetuada e conclusão alcançada pelo tribunal a quo, nada obstava à valoração da prova obtida com recurso ao alcoolímetro utilizado aquando da sua fiscalização em causa nos autos.

Invoca, ainda, o recorrente, ao longo da sua motivação e recurso, que a dúvida suscitada pelas suas declarações e pelo depoimento da testemunha e pela ausência de prova fidedigna relativamente à taxa de álcool no sangue com que conduzia apenas poderão ser resolvidas a seu favor, dando-se tal factualidade como não provada e absolvendo-se da prática do crime.

O princípio in dubio pro reo, como decorrência do princípio constitucional da presunção da inocência, consagrado no artigo 32º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, constitui um limite normativo do princípio da livre apreciação da prova, na medida em que impõe orientação vinculativa para os casos de dúvida sobre a veracidade dos factos, ou seja, impõe ao julgador que, quando confrontado com a dúvida, razoável e fundada, em matéria de prova, resolva tal dúvida em sentido favorável ao arguido.

Como vem sendo entendimento jurisprudencial pacificamente aceite, o tribunal de recurso apenas pode concluir pela violação do princípio in dubio pro reo e da presunção de inocência se do texto da decisão recorrida resultar notoriamente – em termos idênticos aos que vigoram para os vícios da sentença, no âmbito da revista alargada – que o tribunal a quo chegou a um estado de dúvida insanável e que, perante essa dúvida, optou por decidir em sentido desfavorável ao arguido, ou se, apreciando a impugnação ampla da matéria de facto, por erro de julgamento, concluir que, em face da prova produzida, essa dúvida – razoável e fundada – deveria ter-se suscitado no espírito do julgador, impondo-se que a resolvesse em sentido favorável ao arguido.

O recorrente não ancora a violação do princípio in dubio pro reo no texto da sentença, maxime, na motivação da decisão sobre a matéria de facto. Ademais, desta não ressuma que o tribunal a quo se tivesse deparado com qualquer dúvida, antes pelo contrário, ali se asseverando, até, que «considerando a prova produzida e analisada em sede de audiência de discussão e julgamento, não ficou o tribunal com qualquer dúvida suscetível de relevar a favor do arguido, quanto à prova dos factos vertidos em 1. a 6.»

Por outro lado, na parte em que foi possível a este tribunal ad quem conhecer da impugnação ampla da matéria de facto não se detetou que alguma dúvida, séria, fundada e intransponível deveria ter-se suscitado ao tribunal a quo.

Carece, pois, de fundamento a alegação do recorrente nesta parte.

Ante o exposto, conclui-se pela total improcedência da impugnação da matéria de facto, que permanece, assim, inalterada.

Como decorrência, soçobra a pretensão do recorrente de absolvição do crime que lhe vinha imputado, ancorada exclusivamente na visada modificação da matéria de facto.

            3.3 – Espécie e medida das penas

            O recorrente insurge-se contra as penas [principal e acessória] que lhe foram irrogadas de forma ambígua, formulando as seguintes conclusões:

«36- Cumpriria ao tribunal proceder à determinação da espécie de pena que concretamente poderia eventualmente ser aplicada, considerando, para o efeito o princípio geral que resulta da combinação dos artigos 40.º e 70.º do Código Penal, segundo o qual deve ser dada preferência à pena de multa sempre que esta realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

37- O legislador português destaca as finalidades de prevenção especial, como fundamentadoras do movimento de luta contra as penas curtas de prisão aplicáveis à pequena e média criminalidade. Pelo que o tribunal só deverá recusar a aplicação da pena alternativa não privativa da liberdade, quando tal opção se revele inconveniente para a viabilidade e sucesso de um projeto de ressocialização, - o que não é o caso - funcionado as exigências de prevenção geral – enquanto defesa do ordenamento jurídico – como um limite mínimo à atuação das exigências de socialização.

38- Pelo que, o tribunal ao aplicar uma pena, só poderia aplicar neste caso uma pena de multa.

39- No que tange à pena acessória encontrada a mesma tem-se por excessiva, 13 (treze) meses, indo muito além da eventual culpa do agente, devendo situar-se no mínimo legal.

40- Por cautela de patrocínio,

41- E, s.m.o., a pena de prisão de 7 meses substituída por regime de permanência na habitação, também deverá ser revogada e estabelecida junto do seu mínimo legal e devendo ser estendido o período de trabalho aos dias de fim de semana, sábado e domingo, dada a natureza da profissão do arguido, que desenvolve também o seu trabalho nesses dias.»

            Como transparece das conclusões ora transcritas, o recorrente formula, de forma sucessiva, mas subsidiária, várias pretensões – no que concerne à pena principal, pugna pela aplicação de pena de multa, se assim não se entender pela redução da pena de prisão substituída por regime de permanência na habitação e pela ampliação do período de ausência da residência para trabalhar que foi autorizado; relativamente à pena acessória, pugna pela redução da sua duração.

            Vejamos.

            O exercício de determinação concreta da pena compreende, em regra, três fases distintas; primeiramente, há que apurar a moldura penal abstratamente aplicável ao crime em questão e aferir da existência de circunstâncias modificativas, agravantes ou atenuantes, suscetíveis de atuarem sobre a mesma; num segundo momento, há que proceder à escolha da pena a aplicar, na eventualidade de ao crime serem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, em consonância com o disposto no artigo 70.º do Código Penal; subsequentemente, há que determinar a pena concreta dentro dessa moldura, atendendo ao vertido nos artigos 40º, n.º 2, e 71.º do Código Penal, ou seja, a medida concreta da pena é fixada em função das categorias da culpa e da prevenção (especial e geral), sendo nomeadamente as circunstâncias mencionadas no n.º 2 desse normativo importantes para a determinação quer da culpa, quer das exigências de prevenção; consoante a espécie e a medida da pena fixada, poderá haver uma quarta fase, de ponderação da substituição por outras penas menos gravosas admissíveis no caso.

            Atentemos no alinhamento recursivo:

            O primeiro motivo de discordância do recorrente prende-se com a opção do tribunal a quo pela pena privativa da liberdade em detrimento da pena de multa, questão que se inscreve na sobredita segunda fase.

            O crime de condução em estado de embriaguez previsto no artigo 292º, n.º 1, do Código Penal é punido com pena de prisão de um mês a 1 ano (cfr. art. 41.º, n.º 1, do Código Penal) ou com pena de multa de 10 a 120 dias (cfr. art. 47.º, n.º 1, do Código Penal).

            Tratando-se de um crime punível com pena abstrata compósita alternativa (prisão ou multa), importa, efetivamente, desde logo, proceder à escolha da sanção a aplicar, em obediência ao estatuído no artigo 70.º do Código Penal, nos termos do qual “se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.

            De acordo com o disposto no artigo 40º, n.º 1, do Código Penal, a aplicação de penas e de medidas de segurança tem como finalidade a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.

            As finalidades da aplicação de uma pena residem, assim, primordialmente na tutela de bens jurídicos e na reinserção do agente na comunidade, prevenindo-se a prática de futuros crimes.

A proteção de bens jurídicos consubstancia-se na denominada prevenção geral, enquanto a reintegração do agente na sociedade, ou seja, o seu regresso à comunidade lesada pela sua atuação, se reporta à denominada prevenção especial.

Como refere Maria João Antunes[19], «São finalidade exclusivamente preventivas, de prevenção geral e de prevenção especial (artigos 70º e 40º, nº 1, do CP), que justificam e impõem a preferência por uma pena não privativa da liberdade (pena alternativa ou de substituição). Não é, por conseguinte, uma qualquer finalidade de compensação da culpa. Se a culpa é limite da pena (artigo 40º, nº 2 do CP), desempenha esta função estritamente ao nível da determinação da medida concreta da pena principal ou da pena de substituição que venha a ser aplicada (artigo 71º, nº 1, do CP).

A afirmação de que são finalidades exclusivamente preventivas as que justificam e impõem a preferência por uma pena não privativa da liberdade, não invalida que a finalidade preventiva primordial seja a de proteção de bens jurídicos. A defesa da ordem jurídica e da paz social – o conteúdo mínimo de prevenção geral positiva – atua como limite às exigências de prevenção especial. Em caso de conflito, prevalecerá o conteúdo mínimo da prevenção geral positiva. Ainda que a escolha da pena não privativa da liberdade seja compatível com a reintegração do agente na sociedade, o tribunal não dará preferência a tal pena, se esta não realizar de forma adequada e suficiente a finalidade de proteção do bem jurídico violado com a prática do crime.»

Neste conspecto, como deflui da fundamentação da sentença no que se refere à escolha da pena principal, o tribunal a quo, depois de enunciar, assertivamente, os princípios e normativos com relevo nesta fase, justificou profusamente o afastamento da pena de multa, em função das intensíssimas exigências de prevenção geral e especial que se fazem sentir no caso concreto. Refira-se que a circunstância de o recorrente ostentar já a condenação pela prática de seis crimes, quatro deles da mesma natureza do aqui em causa, em penas de multa e de prisão suspensa na sua execução que não o dissuadiram de continuar a delinquir, per se, são reveladoras de que a pena de multa é manifestamente insuficiente para satisfazer as anteditas finalidades preponderantes da punição.

Ademais, o recorrente nada alega que contrarie a ponderação efetuada pelo tribunal a quo e a conclusão por este alcançada, que se mostra inteiramente acertada.

Posto isto, confirmando-se a opção pela pena de prisão, ainda que substituída por regime de permanência na habitação – que o recorrente não põe em causa –, há que aferir da justeza da respetiva medida, uma vez que aquele pugna pela sua redução.

            Vejamos.

            Quando o artigo 71º, n.º 1, do Código Penal estabelece que a “determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”, não o podemos dissociar do preceituado no artigo 40º do mesmo diploma. Assim, as exigências de prevenção geral definirão o limite mínimo da pena e a culpa o limite máximo, criando, assim, a moldura dentro da qual se hão de fazer sentir as exigências de prevenção especial ou de ressocialização. Porém, em consonância com o preceituado no n.º 2 do citado artigo 71º do Código Penal, na determinação da medida concreta da pena deverão considerar-se, ainda, todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo legal de crime – sob pena de ocorrer dupla valoração –, deponham a favor do agente ou contra ele, nomeadamente as ali elencadas de forma exemplificativa: o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente [alínea a)]; a intensidade do dolo ou da negligência [alínea b)];  os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram [alínea c)]; as condições pessoais do agente e a sua situação económica [alínea d)];  a conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime [alínea e)]; a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena [alínea f)].

            Em suma, se as finalidades da aplicação de uma pena residem, primordialmente, na tutela dos bens jurídicos e, na medida do possível, na reinserção do agente na comunidade, então o processo de determinação da pena concreta a aplicar refletirá, de um modo geral, a seguinte lógica: «a partir da moldura penal abstrata procurar-se-á encontrar uma sub-moldura para o caso concreto, que terá como limite superior a medida ótima de tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias e, como limite inferior, o quantum abaixo do qual ´já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem por irremediavelmente em causa a sua função tutelar´; será dentro dos limites consentidos pela prevenção geral positiva que deverão atuar os pontos de vista de reinserção social. Quanto à culpa, para além de suporte axiológico normativo de toda e qualquer repressão penal, compete-lhe estabelecer o limite inultrapassável da medida da pena a aplicar»[20].

Como emerge da fundamentação da sentença, também neste âmbito o tribunal a quo sopesou, de forma acertada, com base na factualidade que resultou efetivamente provada, todas as circunstâncias pertinentes para a determinação da medida concreta da pena, nada mais havendo a acrescentar, por redundante.

Atenta a moldura penal abstrata – prisão de 1 mês a 1 ano –, a fixação da pena em 7 (sete) meses, ou seja, a meio daquela, surge, até, como benevolente, sobretudo tendo em conta o extenso rol de condenações, em que pontuam quatro crimes por condução em estado de embriaguez.

Refira-se, desde já, que também a pena acessória foi fixada de forma benevolente.

Com efeito, a pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor traduz-se numa censura adicional pelo crime praticado. Tem subjacente a concreta necessidade de política criminal que se perfila em face da elevada sinistralidade rodoviária que o nosso país regista, com custos humanos e materiais incomensuráveis, devida, em parte significativa, à condução perigosa de veículos rodoviários, à condução sob o efeito álcool e de substâncias psicotrópicas e outras condutas que põem em causa a segurança nas estradas.

Conquanto radiquem em pressupostos distintos, quer a pena principal, quer a acessória, assentam num juízo de censura global pelo crime praticado. E, pese embora a pena acessória tenha uma função preventiva adjuvante da pena principal, cuja finalidade não se esgota na intimidação da generalidade das pessoas, mas dirige-se, também, ao menos em alguma medida, à perigosidade do agente, reforçando e diversificando o conteúdo penal sancionatório da condenação, a determinação da sua medida é ainda feita por recurso aos critérios gerais constantes dos artigos 40º e 71º do Código Penal.

Maria João Antunes[21] refere a este respeito: «As penas acessórias aplicam-se por referência ao conteúdo do ilícito típico; ligam-se, necessariamente, à culpa do agente, que é seu pressuposto e limite; justificam-se de um ponto de vista preventivo; e são determinadas concretamente em função dos critérios gerais de determinação da medida da pena previstos no artigo 71º do CP, a partir de uma moldura que estabelece os seus limites (mínimo e máximo) de duração».

Assim, no caso em apreço, atenta a moldura de 3 meses a 3 anos, prevista no artigo 69.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, a fixação dentro da pena em 13 (treze) meses, ou seja, do primeiro terço daquela moldura é, à luz dos princípios e vetores analisados, claramente benevolente.

De resto também neste particular o recorrente não avança qualquer argumento concreto, alegando apenas, de forma conclusiva, que a duração da pena é excessiva, indo além da culpa, devendo situar-se no mínimo legal!

            Não assiste, pois, razão ao recorrente também quanto à pretendida redução da duração das penas [principal e acessória].

            Atentemos, por último, na pretensão do recorrente de que seja autorizada também a sua ausência da residência para trabalhar ao sábado e ao domingo, alegando que, dada a natureza da sua profissão, desenvolve também trabalho nesses dias.

            Neste conspecto, o tribunal a quo exarou o seguinte:

            «Conforme resulta expresso do disposto no artigo 43.º, n.º3 do Código Penal, o tribunal pode autorizar as ausências necessárias para a frequência de programas de ressocialização ou para actividade profissional, formação profissional ou estudos do condenado.

                No caso dos autos, resulta apurado que o arguido trabalha como vendedor, pelo que se entende ser de autorizar o arguido a ausentar da residência para o exercício da sua actividade profissional, no horário compreendido entre as 07:00h e as 18:00h, de segunda a sexta-feira e para aceder aos actos médicos que lhe forem prescritos, cabendo à DGRSP controlar as saídas em função das necessidades de intervenção, devendo o arguido estar sempre contactável durante os períodos de ausência.»

            A alegação do arguido de que desenvolve a sua atividade também ao sábado e ao domingo não tem ressonância na factualidade provada nem se revela consentânea com as regras da experiência comum, tanto mais que aquele tem família constituída, sendo tais dias, normalmente destinados ao descanso e à convivência familiar e social.

            Além disso, resulta do relatório da DGRSP para aplicação da pena de prisão em regime de permanência na habitação, junto aos autos a fls. 278 e ss., e que se baseou, além do mais, na entrevista realizada ao recorrente e aos seus familiares, que este “admite a possibilidade de restringir a sua actividade em termos de distância no horário compreendido entre as 07.00h e as 18.00, de segunda a sexta-feira”.

            Inexiste, pois, fundamento para o pretendido alargamento do período de ausência autorizada da residência, que se afigura, até, abusivo.

            Improcede, pois, totalmente esta última questão.


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            III. – DISPOSITIVO

Nos termos e pelos fundamentos supra expostos, acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Coimbra em julgar o recurso interposto pelo arguido totalmente improcedente e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.

            Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça na quantia correspondente a 4 (quatro) unidades de conta [artigos 513º, n.º 1, do Código de Processo Penal, e 8º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III anexa a este último diploma].


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(Elaborado e revisto pela relatora, sendo assinado eletronicamente pelas signatárias – artigo 94º, n.ºs 2 e 3, do Código de Processo Penal)
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Coimbra, 11 de junho de 2025

 Isabel Gaio Ferreira de Castro

[Relatora]

Cândida Martinho

[1.ª Adjunta]

Maria Teresa Coimbra

 [2.ª Adjunta]


[1] Todas as transcrições a seguir efetuadas estão em conformidade com o texto original, ressalvando-se a correção de erros de escrita e as alterações da formatação do texto, da responsabilidade da relatora.


[2] Neste sentido, Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português, Vol. 3, 2015, págs. 335 e 336.
[3] Vide Oliveira Mendes, in Código de Processo Penal Comentado, 4.ª Edição Revista, pág. 1070 e ss.
[4] Figueiredo Dias, “Direito Processual Penal”, Coimbra, 1974, pág. 148
[5] In “Comentário do Código de Processo Penal à luz da CRP e da CHDH”, ed. 2007, a pág. 314 (nota 8. ao artigo 120º.
[6] Cfr. o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 08.02.2023, processo 1195/19.5PAPVZ.P1, disponível para consulta em http://www.dgsi.pt
[7] DR, II Série, de 06.05.2005
[8] No acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 22.02.2013, processo 12/12.1GCASL.E1, decidiu-se que, atenta a regra do artigo 391º do Código de Processo Penal, «o recurso pode abranger as nulidades, os vícios de procedimento, o julgamento dos factos ou a decisão de direito».
[9] Neste sentido, cfr. Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 15.ª edição, página 822; Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, vol. III, 2.ª edição, Editorial Verbo, página 339; e Leal-Henriques e Simas Santos, Recursos em Processo Penal, 6.ª edição, 2007, Rei dos Livros, página 77.
[10] Cfr. Conselheiro Pereira Madeira, in Código de Processo Penal Comentado, Almedina, págs. 1356.
[11] Publicado no DR, I-A, de 28 de dezembro de 1995
[12] Cfr. o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 19.03.2014, processo 811/12.4JACBR.C1, acessível em http://www.dgsi.pt
[13] Cfr., entre outros, Damião Cunha, «O caso Julgado Parcial», 2002, pág. 37; Paulo Saragoça da Matta, A Livre Apreciação da Prova e o Dever de Fundamentação da Sentença - Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais - pág. 253.
[14] Vide, neste sentido, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 15-12-2005 e de 09-03-2006, acessíveis em www.dgsi.pt
[15] Cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 11.07.2017, disponível para consulta no sítio da internet http://www.dgsi.pt
[16] In D.R. n.º 77, Série I, de 18-04-2012
[17] In Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Edição da Universidade Católica, a págs. 1134/5
[18] Neste sentido vem decidindo o STJ [cfr. Acórdãos de 31-10-2007 (processo n.º 07P3218), de 03-12-2009 (processo n.º 760/04.0TAEVR.E1.S1), de 28-10-2009 (processo n.º 121/07.9PBPTM.E1.S1), de 10-01-2007 (processo n.º 3518/06), de 04-01-2007 (processo n.º 4093/06) e de 04-10-2006 (processo n.º 812/06)] e os Tribunais da Relação [a título exemplificativo, vejam-se os acórdãos do Tribunal da Relação de Guimarães de 15.04.2020 e do Tribunal da Relação de Évora de 09.01.2018] todos disponíveis para consulta no sítio da internet http://www.dgsi.pt, e também o Tribunal Constitucional [cfr., entre outros, o acórdão n.º 140/2004, disponível em http://www.tribunalconstitcional.pt]
[18] A título exemplificativo, vejam-se os acórdãos do Tribunal da Relação de Guimarães de 15.04.2020 e do Tribunal da Relação de Évora de 09.01.2018, disponíveis para consulta no sítio da internet http://www.dgsi.pt

[19] In Penas e Medidas de Segurança, Almedina, 2017, pág. 76 e seguintes.
[20] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20.09.2007 (processo 06p4544), citado por Miguez Garcia e Castela Rio, in Código Penal Parte geral e especial, 2014, Almedina, pág. 290
[21] [21] In Penas e Medidas de Segurança, 2ª edição, pág. 43