| Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
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| Nº Convencional: | JTRC | ||
| Relator: | LUÍS MIGUEL CALDAS | ||
| Descritores: | IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO VENDEDOR/CONSTRUTOR CONTRATO DE EMPREITADA DEFEITOS DA OBRA RESPONSABILIDADE CONTRATUAL DENÚNCIA CADUCIDADE | ||
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| Data do Acordão: | 09/30/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU – VISEU – JUÍZO LOCAL CÍVEL – JUIZ 1 | ||
| Texto Integral: | S | ||
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| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA | ||
| Legislação Nacional: | ARTIGOS 298.º, 2, 303.º, 328.º, 329.º, 331.º, 333.º, 406.º, N.º 1, 473.º, E 762.º, N.º 1, 762.º, N.º 2, 763.º, 1207.º, 1208.º, 1221.º, 1222.º, 1225.º, DO CÓDIGO CIVIL ARTIGOS 640.º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL | ||
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| Sumário: | 1. Mesmo que o recorrente, na impugnação da matéria de facto, não respeite escrupulosamente os ónus enunciados no artigo 640.º do Código de Processo Civil, estes devem ser flexibilizados, segundo um critério de adequação, proporcionalidade e razoabilidade, desde que o recorrido demonstre ter compreendido aquela impugnação e esteja garantida uma adequada inteligibilidade do fim e do objecto da mesma, por parte do tribunal ad quem, não sendo motivo de rejeição do recurso da matéria de facto. 2. A responsabilidade contratual pelo prejuízo causado ao comprador de um imóvel, pelos defeitos e vícios da obra, é aplicável à vendedora que tenha sido a construtora, não sendo relevante que esta tenha desenvolvido toda a actividade de construção, mas sim que tenha tido o domínio da empreitada. 3. Tendo ficado provado que a vendedora/empreiteira deslocou-se à loja da adquirente de um imóvel, em determinada data, assumindo o compromisso de reparar os defeitos que então se verificavam e a obrigação de substituição parcial do soalho, esse facto tem um efeito impeditivo do decurso do prazo de caducidade para a instauração da acção destinada a exigir, após a denúncia, a eliminação dos defeitos. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
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| Decisão Texto Integral: | * Acordam na 3.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra,[1] 
 A..., Lda., instaurou acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra B..., Lda. (1.ª ré), e C..., Unipessoal, Lda. (2.ª ré), todas com os sinais nos autos, pedindo que a acção seja julgada provada e procedente e, consequentemente: a) As 1.ª e 2.ª rés sejam condenadas a reconhecer a autora como dona e legítima proprietária da fracção identificada no artigo 4.º da petição inicial; b) Seja declarado o incumprimento definitivo das 1.ª e 2.ª rés na eliminação dos defeitos e, nessa medida, as 1.ª e 2.ª rés sejam condenadas a indemnizar a autora: – na quantia de € 8 085,00 (oito mil e oitenta e cinco euros), acrescida de IVA à taxa legal, a título de danos patrimoniais, acrescido de juros de mora a calcular à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento; – na quantia que em sede de liquidação de sentença se vier a apurar, a título de despesas com o fornecimento de energia eléctrica, água e limpeza do espaço. – na quantia de € 2 500,00, a título de danos não patrimoniais, a que devem acrescer juros de mora a calcular à taxa legal desde a data da sentença que vier a ser proferida, com as legais consequências. * Para tanto alegou que celebrou com a 1.ª ré um contrato-promessa e, posteriormente, de compra e venda de uma fracção destinada a instalar a sua actividade, no qual a vendedora/construtora (1.ª ré) se obrigava a fornecer e colocar o soalho até determinado preço. Embora de preço superior, a ré apresentou à autora e sugeriu-lhe a colocação de um determinado material, o que foi aceite. Sucede que, após abertas as instalações ao público, o soalho começou a levantar, apresentando diversos riscos, defeitos e anomalias, que descreve, o que lhe causou danos patrimoniais e não patrimoniais. Após denúncia, quer a 1.ª quer a 2.ª ré reconheceram os defeitos e comprometeram-se, ambas, a reparar a situação, o que não veio a suceder. * Regularmente citadas contestaram ambas as rés: – A 1.ª ré aludiu, em síntese, que foi a autora quem escolheu e ordenou a aplicação daquele material para o soalho, tendo a ré sugerido que não optasse por essa solução, conselho que a autora não quis seguir. Não foi a 1.ª ré quem vendeu à autora ou aplicou o pavimento, mas sim a 2.ª ré, limitando-se a 1.ª a suportar o valor até ao limite previsto no CPCV. A autora pagou diretamente à 2.ª ré a diferença de preço acordado entre autora e 1.ª ré. O vendedor e aplicador directo do material foi a 2.ª ré e apenas esta poderá responder por quaisquer defeitos no material vendido. Para além disso, em Dezembro de 2019 houve uma inundação, provocada pela tempestade “Elsa” na loja da autora, como causa dos alegados defeitos das juntas elevadas e dilatadas e obstrução da mina. Quanto ao desgaste do pavimento, culpa a autora pelo mau uso e a inexistência de tapetes, sendo que se prontificou a substituir o pavimento, naquela zona, mas já não todo o pavimento. Refutou a sua responsabilidade, invocado a caducidade e suscitando a litigância de má fé da autora. – A 2.ª ré aduziu que nada contratou com a autora, nem produziu/fabricou o material de soalho em causa, nunca tendo reconhecido ou assumido o que quer que fosse. Aceita que, a pedido da 1.ª ré, se deslocou, em Setembro de 2019, à fracção em causa, aí tendo constatado, apenas e tão só, que as zonas do flutuante onde se situavam as cadeiras das secretárias apresentavam alguns riscos. Tal facto era apenas imputável à autora, que permitia que os apoios das secretárias fossem arrastados pelo flutuante, sem curar de colocar qualquer resguardo, nomeadamente, os tapetes em PVC que existem para o efeito. Ainda assim, não obstante considerar que a existência de tais riscos se devia a mau uso por parte da autora, em homenagem ao relacionamento comercial com a 1.ª ré, transmitiu a esta que procederia à substituição do flutuante nessas zonas, o que a autora não aceitou, porque queria a substituição de todo o pavimento. No mais, contestou o alegado e invocou a excepção de caducidade. * A autora respondeu à excepção de caducidade alegando que verificou e denunciou os defeitos em Agosto de 2019 e que, no mês seguinte, as rés os reconheceram e obrigaram-se a repará-los, só não o tendo feito porque em Março de 2020 foi decretado o estado de emergência devido ao Covid 19. Para além disto, a autora tem de ser vista como consumidora, porque adquiriu a fracção para a sua actividade comercial e não para revenda. Respondeu a 1ª ré refutando qualquer reconhecimento e assunção de reparação, e ainda assim reiterando a caducidade por não ter sido interposta a acção no prazo legal, bem como contestando a qualidade de consumidora da autora. * Realizada audiência final foi proferida sentença, em 18-11-2024, na qual se decidiu julgar a acção parcialmente provada e procedente e consequentemente: “a) Absolver a segunda Ré “C... Unipessoal Lda.” de todos os pedidos contra si formulados. b) Julgar improcedente a exceção de caducidade e, por conseguinte c) Condenar a primeira Ré “B... Lda.” nos pedidos a) e b) da p.i. e no que concerne ao pedido em c) condená-la a pagar à A. a quantia global de, 6.875€, acrescida de juros de mora desde a sua citação até efetivo e integral pagamento, absolvendo-a do demais aí peticionar d) Absolver A. e RR de quaisquer pedidos de condenação como litigantes de má fé”. * Inconformada com a decisão, recorreu a 1.ª ré e, nas suas alegações de recurso, formulou as seguintes conclusões: “1. O tribunal a quo deu como provados, entre outros, os seguintes “7 - E nos termos da alínea d) da cláusula 4ª do Contrato de Promessa de Compra e Venda, a 1ª Ré obrigou-se a terminar a construção, entre outras, com a aplicação do “pavimento de ambos os pisos (…)”. “11 - No cumprimento das cláusulas 3.ª e 4.ª do Contrato Promessa de Compra e Venda, a 1.ª Ré forneceu à Autora as várias opções por si pré-selecionadas de pavimento em flutuante vinílico a aplicar no piso da fração prometida, com os respetivos preços de cada opção.” “12 - A Autora escolheu um dos pavimentos, em flutuante vinílico Medium Grey.” “13 - Tendo-lhe sido exibidas amostras pela 1ª Ré, com distintas cores, que a A. escolheu.” “14 - Após o que, foi acordado entre as partes o fornecimento e aplicação do pavimento em flutuante vinílico a Medium Grey e tela flutuante vinil melhor identificado na fatura n.º 685/2018 de 09/10/2018, pela 1ª Ré.” “18 - Durante a execução da obra verificou a A. que a cor do chão não havia sido a escolhida, o que de imediato foi comunicado e resolvido pelas RR.” mais defeitos no que concerne ao piso flutuante vinílico aplicado. “23 - Efetivamente, o flutuante aplicado pelas Rés cedeu, sobretudo nas zonas em que existiam mesas e cadeiras, mas também noutras zonas do estabelecimento comercial da A. onde recebia os seus clientes.” “26 - A Autora voltou a denunciar toda esta situação à 1.ª Ré, verbalmente, em agosto de 2019.” “31 - A 1ª Ré comprometeu-se a arranjar uma solução e a substituir o soalho, mas apenas na zona das cadeiras.” “33 - Mas que não afetaram a zona do escritório que aqui se discute.” “38 - Por carta datada de 25 de Maio de 2020 a Autora remeteu à 1ª Ré uma carta registada com AR denunciando por escrito os defeitos do piso de flutuante vinílico da loja, devido à falta de qualidade do material ou da sua aplicação e exigindo a sua eliminação como antes se haviam obrigado, sob pena de recurso à via judicial.” 2. Factos dados como não provados, entre outros “E) A 1ª Ré advertiu a A. de que esse material não era o adequado para a obra em causa e para a atividade que prosseguia/ fins a que se destinava.” “G) Que a 2ª Ré se tenha comprometido ou assumido, perante a A. a reparar qualquer tipo de defeito.” 3. A Recorrente entende que, atenta a prova produzida, a matéria de facto dada como provada em 7, 11 a 14, 18, 23, 26, 31, 33 e 38 não poderia ser dada como provada nos termos em que o foi, bem como os factos dados como não provados em e) e g) deveriam ser dados como provados. 4. Decidia-se nos presentes autos, para o que aqui releva, se alguma das Rés, ou ambas, incumpriram o contrato celebrado com a A. e, por via disso, se a deverão indemnizar, em que quantia e por que tipo de danos e se a A. exerceu o direito de exigir esse direito no prazo legal, ou se o mesmo caducou. 5. A Recorrente celebrou um contrato de compra e venda com a Recorrida, pelo qual lhe prometida vender uma fração cuja construção estava a ser terminada, sendo dada a possibilidade à promitente compradora de escolha de alguns acabamentos diferentes dos previstos aplicar. 6. Quanto ao pavimento da fração, estava previsto aplicar mosaico, até €10,00/m2 (conforme alínea e) da cláusula 4.ª do contrato promessa de compra e venda), sendo que era dada a possibilidade à promitente compradora, no caso a Recorrida, de escolher outro pavimento cujo valor fosse até aquele limite, €10,00/m2, conforme alínea d) do dito contrato(só o mosaico está dentro deste valor, podendo varias a cor, acabamento, etc). 7. A Recorrente nunca se comprometeu a fornecer ou pré-selecionar tipos de pavimentos ou cores, nem a fornecer e aplicar material diferente de mosaico e de valor acima de 10,00/m2, nem tal resulta do contrato promessa. 8. A Recorrida optou por um outro tipo de pavimento - flutuante vinílico - com um valor bem acima do ali estipulado - €25,00/m2, sendo a aquisição e aplicação de tal material contratada com a 2.ª Ré e alheia à Recorrente, que só interveio a jusante, ao suportar o correspondente €10,00/m2, cfr. fatura emitida pela 2.ª Ré à Recorrente. 9. Das declarações de parte da Recorrente resultou claro todo o circunstancialismo que envolveu a escolha e colocação do pavimento na fração prometida vender à Recorrida, nas quais a Recorrente não teve intervenção, cfr. depoimento do Legal Representante da Ré, prestado no dia 22/04/2024, com início às 10:54 e termo às 11:29, passagem de 03:08 a 05:20, passagem 17:30 a 20:09, passagem 20:20 a 23:04, passagem de 23:10 a 23:23. 10. Em depoimento de parte, o Legal Representante da Recorrida, confessou que já tinha decidido que queria flutuante no pavimento do piso que ocuparia, ao contrário do inquilino do sobre piso, que seguiu a indicação da Recorrente, não tendo tido qualquer problema, cfr passagem de 10:56 a 11:33 e passagem de 28:05 a 28:55. 11. Foi a Recorrida que escolheu ambos os pavimentos, decidindo que no piso que ia ocupar o pavimento seria em flutuante vinílico, adquirido e mandado aplicar pela 2.ª Ré por contrato celebrado entre esta e a Recorrida. 12. Sendo que no sobre piso fez a vontade ao inquilino, manteve o previsto no contrato promessa de compra e venda e deixou aplicar mosaico, o que foi diligenciado pela Recorrente, sem qualquer defeito até hoje. 13. Assim, devem ser alterados os factos provados em 7, de 11 a 14, 18 e 23 nos seguintes termos: 7. E nos termos da cláusula 4ª do Contrato de Promessa de Compra e Venda, a 1ª Ré obrigou-se a terminar a construção, entre outras, com a aplicação do “pavimento de ambos os pisos em mosaico até um valor máximo de €10,00/m2 (alínea e), podendo a Autora escolher o pavimento (tipo de mosaico), até um valor máximo de €10,00/m2 (alínea d). 11. No cumprimento das cláusulas 3.º e 4.º do Contrato Promessa de Compra e Venda, Autora contactou a Ré C... para escolher o tipo de pavimento e a cor a aplicar no piso da fração prometida. 12. A Autora escolheu um dos pavimentos comercializados pela Ré C..., em flutuante vinílico Medium Grey. 13. Tendo-lhe sido exibidas amostras pela 2ª Ré, com distintas cores, que a A. escolheu. 14. Após o que, foi acordado entre a Autora e a 2.ª Ré o fornecimento e aplicação do pavimento em flutuante vinílico a Medium Grey e tela flutuante vinil melhor identificado na fatura n.º 685/2018 de 09/10/2018, pela 2ª Ré – vide doc. 5 da p.i, confissão e demais prova produzida. 18. Durante a execução da obra verificou a A. que a cor do chão não havia sido a escolhida, o que de imediato foi comunicado e resolvido pela 2.ª R. 23. Efetivamente, o flutuante aplicado pela 2.ª Ré cedeu, sobretudo nas zonas em que existiam mesas e cadeiras, mas também noutras zonas do estabelecimento comercial da A. onde recebia os seus clientes – prova pericial em conjugação com a documental e testemunhal.” 14. E dado como provado o facto não provado em e) nos seguintes termos: 43. A 1.ª Ré advertiu a A. de que a resistência desse material era substancialmente inferior ao mosaico que estava inicialmente previsto para o pavimento da fração.” 15. A Recorrida denunciou os defeitos em Março (facto provado em 21.º), voltou a denunciar em Agosto de 2019 (facto provado em 26.º), reiterou em Maio de 2020 (facto provado em 38.º) e voltou a reiterar em Novembro de 2020 (facto provado em 41.º). 16. Não pode a Recorrida fazer várias denúncias sempre dos mesmos defeitos, de modo a ir prorrogando o prazo para intentar a ação judicial, o que, isso sim, constituiria um abuso de direito. 17. A Recorrida confessa que denunciou os defeitos à Recorrente em Março de 2019, cfr depoimento do legal representante da Recorrida, na passagem de 13:53 a 15:18, o que inclusive foi assente como facto provado pelo tribunal a quo. 18. Ora, a denúncia dos defeitos tem de considerar-se a partir de Março de 2019. 19. Assim não se entendendo, terá de considerar-se a denúncia em Agosto de 2019, quando se reuniram os legais representantes de todas as partes na fração, onde foram demonstrados todos os defeitos no pavimento e onde foi informada a Recorrida que, por cortesia comercial, a 2.ª Ré iria substituir o pavimento nas zonas específicas onde se verificavam os defeitos e apenas nessas, cfr depoimento do legal representante da Recorrida, na passagem de 15:16 a 17:08, depoimento da mulher do legal representante da Recorrida, AA, na passagem 07:56 a 08:14, cfr depoimento do legal representante da 2.ª Ré, passagem de 01:23 a 02:43, cfr depoimento do Legal Representante da Recorrente passagem de 08:27 a 10:49, cfr depoimento do administrativo da Recorrida BB, passagem 04:37 a 05:35. 20. A denúncia de todos os defeitos ocorreu em Agosto de 2019, tanto que o legal representante da Recorrente e o legal representante da 2.ª Ré se reuniram com o legal representante da Recorrida na fração para verificar os defeitos e comunicar a sua posição à Recorrida. 21. Assim, deve alterar-se o facto provado em 38. nos seguintes termos: “38. A 25 de Maio de 2020 a Autora remeteu à 1ª Ré uma carta registada com AR reiterando a denúncia feita anteriormente, desta vez por escrito, dos defeitos do piso de flutuante vinílico da loja, devido à falta de qualidade do material ou da sua aplicação e exigindo a sua eliminação como antes se haviam obrigado, sob pena de recurso à via judicial – doc. 14 da P.I de fls 65. 
 22. Relativamente à obrigação assumida pelas Rés aquando da ida à loja da Recorrida após a denúncia dos defeitos, a Agosto de 2019, resulta do depoimento do legal representante da Recorrida que se deslocaram à loja quer o legal representante da Recorrida, quer o legal representante da 2.ª Ré, e que ambos assumiram reparar. 23. Não foi a Recorrente que vendeu e aplicou o soalho à Recorrida pelo que nunca poderia este comprometer-se a substituir o soalho. 24. Conforme depoimento do legal representante da Recorrente na passagem de 14:00 a 16:50, este foi informado pelo legal representante da 2.ª Ré de que, atenta a postura do Legal Representante da Recorrida não ia substituir o soalho, nas zonas danificadas, o que a Recorrente transmitiu à Recorrida apenas e só porque recebeu um email por parte da Recorrida em Maio de 2020 relativo a tal assunto. 25. Ora, se a Recorrente se tivesse comprometido, perante a recusa da 2.º Ré sempre a Recorrente contrataria outra empresa do ramo. 26. Pelo que deve alterar-se o facto provado em 31.º nos seguintes termos: 31. A 2.ª Ré, por cortesia comercial para com a Recorrida e para com a Recorrente, comprometeu-se a arranjar uma solução e a substituir o soalho, mas apenas na zona das cadeiras.” 27. E dar-se como provado o facto g) da matéria de facto não provada, nos seguintes termos: 44. A 2.ª Ré comprometeu-se perante a Autora a substituir o pavimento na zona das cadeiras por baixo das secretárias. 28. Atenta a alteração da matéria de facto provada e não provada, entende a Recorrente que também na aplicação do direito andou mal o Tribunal a quo. 29. Entre a Recorrida e a 2.ª Ré foi celebrado um contrato de compra e venda do pavimento em flutuante vinílico cor Medium Grey e tela flutuante vinil e aplicação do mesmo. 30. Ora, não pode ser a Recorrente responsável por quaisquer defeitos de materiais que não vendeu à Recorrida e/ou má aplicação de pavimento que não aplicou. 31. Como decorre da perícia, facto provado em 35.º, bem como das declarações do perito quando ouvido em audiência, nas passagens 01:20 a 03:55, os defeitos resultam da má ligação entre o material e a sua aplicação, por se tratar de todo um sistema o material e a sua aplicação/execução que requer um tipo de base (ou cama) específica que não existe para o material aplicado. 32. Ora, quem vendeu aquele tipo de pavimento e tela flutuante vinil e quem colocou aquela determinada manta foi a 2.ª Ré, a solicitação da Recorrida, cabendo a esta, 2.ª Ré, verificar a base sobre que aplicou o pavimento e garantir que a mesma se adequava ao tipo e espessura daquele concreto material, que vendeu à Recorrida. 33. O pavimento que a Recorrente colocou, mosaico no sobre piso da loja da Recorrida, não teve qualquer problema, como o legal representante da Recorrida confessou, “está em ordem”, ou seja, na obra executada pela Recorrente não existe qualquer defeito. 34. Assim, quem incumpriu o contrato firmado com a Recorrida foi a 2.ª Ré, ao não garantir a adequação da tela ao tipo de pavimento que aplicou, pelo que deveria a Recorrente ser absolvida da instância. 35. Assim não se entendendo, sempre estaria verificada a caducidade do direito da Recorrida. 36. O tribunal a quo ficcionou a denúncia dos defeitos ocorreu a 25 de Maio de 2020. 37. Nenhuma das partes considerou que tenha sido feita em 25 de Maio de 2020, mas sim em Agosto de 2019, aliás, para a Recorrida a primeira denuncia até foi em Março de 2019. 38. De todo o modo, todas as partes, tal como depoimentos prestados em audiência, entenderam que a denúncia ocorreu em Agosto de 2019 quando se deslocaram à fração e lhes foram denunciados os defeitos pela Recorrida, tendo a 2.ª Ré se comprometido a reparar as zonas das cadeiras, o que a Recorrida nunca quis pois pretendia a substituição total do pavimento. 39. É a própria Recorrida a confessar (e a mulher do gerente corrobora) que para si a denúncia ocorreu a Agosto de 20019 e não em Maio de 2020, quando por aconselhamento jurídico enviou uma carta à Recorrente. 40. Ou seja, aquando da denúncia em Agosto de 2019 teve logo a Recorrida conhecimento da posição da Recorrente – alheia a qualquer substituição – e da 2.ª Ré – ia substituir determinadas zonas do pavimento –, posições que não eram coincidentes com a sua pretensão – substituição total do pavimento. 41. Assim, deve considerar-se Agosto de 2019 a data a partir da qual a Recorrida tinha um ano para intentar a ação judicial para exigir a reparação dos defeitos, atenta a posição das Rés. 42. Partindo do dia 31 de Agosto de 2019 como o dia em que a denúncia dos defeitos tenha sido feita, até à primeira suspensão dos prazos, a 9 de Março de 2020, decorreram 190 dias. 43. De 3 de Junho de 2020 a 25 de Novembro de 2020 decorreram os restantes 176 dias, de modo a completar 366 dias, ou seja, 1 ano para intentar a ação judicial. 44. Assim, o prazo para intentar a presente ação terminou a 26 de Novembro de 2020. 45. A ação deu entrada em Fevereiro de 2021, já muito após a caducidade do direito da Recorrida se verificar. 46. Pelo que, ainda que de outro modo não fosse, deveria a ação ser improcedente por se verificar a caducidade do direito da Recorrida. 47. Em última instância, mantendo-se a responsabilidade da Recorrente, tem de ser limitada ao valor estipulado no contrato promessa de compra e venda firmado com a Recorrida para aquisição do novo pavimento a aplicar na fração. 48. Não pode ser exigido à Recorrente que suporte o valor excedente a 10,00/m2 do novo pavimento a aplicar na fração, sob pena de enriquecimento sem causa da Recorrida, às custas da Recorrente. 49. Há ainda, salvo melhor entendimento, um erro no cálculo efetuado pelo tribunal a quo, na indemnização a pagar pela Recorrente, pois 5.500€ mais IVA, resulta na quantia de €6.765,00 e não €6.875,00. 50. Ademais, a Recorrida é uma sociedade comercial, sujeito passivo de IVA, que poderá deduzir o IVA da obra que venha a efetuar, pelo que, o valor de tal imposto não deve ser considerado para efeitos de indemnização. Assim, deve o recurso ser admitido e procedente, alterando-se a sentença proferida pelo tribunal a quo, absolvendo-se a recorrente por não se verificar o incumprimento do contrato firmado com a recorrida e, de todo o modo, por caducidade do direito da recorrida. Assim não se entendendo, deverá limitar-se a indemnização a pagar à recorrida na percentagem correspondente à prevista no contrato promessa de compra e venda a €10,00/m2 do pavimento e correspondente valor de aplicação. Em última instância, mantendo-se a obrigação de indemnizar, deve o valor ser corrigido e retirado valor do IVA.” * A autora/recorrida contra-alegou, concluindo nos seguintes termos: “1ª - O recurso a que se responde está votado ao insucesso, como se demonstrará, pelo que, deve ser o mesmo julgado improcedente por não provado, e ser confirmada a douta decisão recorrida com as legais consequências. 2ª - A Recorrente recorre de matéria de facto e de direito, contudo quanto à impugnação da matéria de direito não cumpre na alínea b) do n.º 1 e alínea b) do n.º 2 do artigo 640.º do CPC, pelo que, deve ser rejeitado o do recurso quanto à impugnação da matéria de facto, não se procedendo à reapreciação da matéria de facto. 3ª - a Recorrente não indica nas suas alegações, nem nas suas conclusões de recurso os concretos meios probatórios que impugnam alteração de cada um dos pontos da decisão de facto que impugna, ao invés faz uma indicação e análise geral da prova produzida e limita-se depois a dizer que tal na sua ótica impõe que a redação dos factos provados em 7, de 11 a 14, 18 a 23, 31 e 38 dos factos provados seja alterada para a redacção constante na conclusão 13, 21, 23. 4ª - Mesmo no corpo das suas alegações, a referência da impugnação da matéria de facto pela Recorrente é também feita em bloco - cfr. ponto 3, 33, 34, 51, 59 e 60 da motivação de recurso. 5ª - Ora, quer nas alegações, quer nas conclusões, a Recorrente não procede à indicação dos meios de prova [testemunhal (objecto de gravação) e documental] relativamente a cada um dos concretos factos impugnados. 6ª - Ao invés, fá-lo relativamente a um grupo de factos - provados em 7, de 11 a 14, 18 a 23, 31 e 38 dos factos provados seja alterada para a redacção constante na conclusão 1, 2, 3, 13, 21 e 26 E ser dado como provado o facto dado como não provado em e) e g) – cfr. conclusão 14 e 27. 7ª - Também no corpo das suas alegações a referência da impugnação é também feita em bloco cfr. ponto 3, 33, 34, 51, 59 e 60 da motivação de recurso. 8ª - Omitindo desta forma a Recorrente a indicação relativamente a cada um dos concretos factos cuja decisão impugna, ou seja, individualizadamente, deve ser rejeitada a impugnação, não se procedendo à reapreciação da matéria de facto, com as legais consequências, neste sentido Acórdão STJ de 20.12.2017, Processo 299/13.2TTVRL.G1.S2 e o Acórdão do STJ de 05.09.2018 Processo n.º 1578/15.8T8PRT.P1.S2 in www.dgsi.pt. 9ª - Caso assim não se entenda, o que não se aceita, mas apenas se admite por mera hipótese académica, sempre se dirá que nenhuma critica merece a douta decisão recorrida quanto à redacção conferida nos pontos 7, de 11 a 14, 18 e 23, 38 e 31 dos factos provados, nem os pontos e) e g) dos factos dados como provados deve ser alterada para provados. 10ª - A redacção conferida no ponto 7 dos factos provados “7) E nos termos da alínea d) da cláusula 4ª do Contrato de Promessa de Compra e Venda, a 1ª Ré obrigou-se a terminar a construção, entre outras, com a aplicação do “pavimento de ambos os pisos (…)”.” na douta Sentença impõe que se mantenha inalterável por força: 11ª - Do promessa de compra e venda firmado entre Recorrente e Recorrida, sendo que o teor das 3.ª e 4.ª Cláusulas junto sob documento n.º 5 com a PI, do qual resulta que a Recorrente enquanto promitente vendedor obrigou-se a entregar à Recorrida a “fração autónoma “E”, correspondente ao rés-do-chão direito, destinado a comércio, serviços ou restauração, tendo na cave um compartimento amplo destinado a garagem” – clausula 3.ª – com “ pavimentos de ambos os pisos será à escolha do Promitente comprador até um valor máximo de €10,00/m2 (Dez euros o metro quadrado).” – cláusula 4.ª, alínea d). 12ª - A redacção conferida no ponto 11 dos factos provados “11) No cumprimento das cláusulas 3.º e 4.º do Contrato Promessa de Compra e Venda, a 1.ª Ré forneceu à Autora as várias opções por si pré-selecionadas de pavimento em flutuante vinílico a aplicar no piso da fração prometida, com os respetivos preços de cada opção” na douta Sentença impõe que se mantenha inalterável por força do depoimento da testemunha AA – inquirida no dia 22/04/2024 testemunho gravado no sistema habilus media studio com início pelas 10:07h e termo pelas 10:28h com duração de 00:20:39 - minutos 00:03:50 a 00:08:50 e por força do contrato promessa de compra e venda junto sob o documento n.º 5 do PI, no qual resulta que o pavimento era escolhido pelo promitente comprador, neste caso pela Recorrida, e que à semelhança do anterior gabinete onde tinha as suas instalações, escolheu pavimento flutuante/vinil, o que foi aceite da Recorrente, porque se tinha obrigado a aplicar o chão/pavimento como acabamento. 13ª - E como é prática, o empreiteiro, promitente vendedor, (Sr CC) mostrou as amostras do pavimento pretendido, ao cliente, que neste caso escolheu apenas a cor, e aplicou-o, sendo que o remanescente do valor sobre os 10€/m2, tinham de ser suportados pelo promitente comprador/ Recorrida. 14ª - Na verdade, nenhuma prova foi feita que Autora/Recorrida, contactou a Ré C... para escolher o tipo de pavimento e a cor a aplicar no piso da fração prometida e, que a Recorrida se substituía, derrogando a responsabilidade do empreiteiro / vendedor. Diga-se que nem o legal representante da Ré C... corroborou esta versão que a Recorrente que seja dada como provada! 15ª - A redacção conferida no ponto 12, 13 e 14 dos factos provados “12) A Autora escolheu um dos pavimentos, em flutuante vinílico Medium Grey 13) Tendo-lhe sido exibidas amostras pela 1ª Ré, com distintas cores, que a A. escolheu. 14) Após o que, foi acordado entre as partes o fornecimento e aplicação do pavimento em flutuante vinílico a Medium Grey e tela flutuante vinil melhor identificado na fatura n.º 685/2018 de 09/10/2018, pela 1ª Ré – vide doc. 5 da p.i, confissão e demais prova produzida “na douta Sentença deve manter-se inalterável.” 16ª - Por força do contrato promessa de compra e venda firmado entre Recorrente e Recorrida, junto sob o documento n.º 5 junto com a PI que a Recorrente enquanto promitente vendedor obrigou-se a entregar à Recorrida a “fração autónoma “E”, correspondente ao rés-do-chão direito, destinado a comércio, serviços ou restauração, tendo na cave um compartimento amplo destinado a garagem” – clausula 3.ª – com “ pavimentos de ambos os pisos será à escolha do Promitente comprador até um valor máximo de €10,00/m2 (Dez euros o metro quadrado).” – cláusula 4.ª, alínea d); dos factos dados como provados em 1, 2, 3, 4, 5, 6, 8, 10; da testemunha AA – inquirida no dia 22/04/2024 testemunho gravado no sistema habilus media studio com início pelas 10:07h e termo pelas 10:28h com duração de 00:20:39 - minutos 00:03:50 a 00:08:50 e 00:18:12 a 00:20:30. 17ª - A redacção conferida no ponto 18 e 24 dos factos provados “18) Durante a execução da obra verificou a A. que a cor do chão não havia sido a escolhida, o que de imediato foi comunicado e resolvido pelas RR (…) 23) Efetivamente, o flutuante aplicado pelas Rés cedeu, sobretudo nas zonas em que existiam mesas e cadeiras, mas também noutras zonas do estabelecimento comercial da A. onde recebia os seus clientes – prova pericial em conjugação com a documental e testemunhal (…) 31) A 1ª Ré comprometeu-se a arranjar uma solução e a substituir o soalho, mas apenas na zona das cadeiras – confessado em depoimento de parte.(…) 38) Por carte datada de 25 de Maio de 2020 a Autora remeteu à 1ª Ré uma carta registada com AR denunciando por escrito os defeitos do piso de flutuante vinílico da loja, devido à falta de qualidade do material ou da sua aplicação e exigindo a sua eliminação como antes se haviam obrigado, sob pena de recurso à via judicial – doc. 14 da p.i de fls 65” na douta Sentença deve manter-se inalterável, por força: 18ª - Da carta junta sob o documento n.º 14 da P.I de fls 65; o relatório pericial Resulta do relatório pericial; da testemunha BB – inquirida no dia 22/04/2024 testemunho gravado no sistema habilus media studio com início pelas 10:28h e termo pelas 10:54h com duração de 00:22:47 - . minutos 00:01.00 a 00:05:50 e 00:06.05 a 00:07:50. 19ª - Na verdade, pretende a Ré/Recorrente que o douto Tribunal ignore o conteúdo do contrato de promessa que a Ré/Recorrente assinou e se obrigou de que a obrigação de fornecimento do pavimento e aplicação do mesmo era sua, que foi este que forneceu as amostras para a escolha da cor, como resultou de forma unanime de toda produzida, e não podia ser de outra forma, por força do contrato de promessa de compra e venda, aliás, nem o Recorrente fez prova da redução do preço, que não houve, por redução de qualquer obrigação que sobre si impedida por força daquele contrato, 20ª - Não colhe o argumento que não sendo fornecedor de pavimento de vinil, está liberto da obrigação de garantia pelo chão por si aplicado e com que equipou o imóvel que vendeu à Autora Recorrida, pois que, também é fornecedora de mosaico! 21ª - É irrelevante se o chão fornecido e com que equipou a fracção vendida é de mosaico ou vinil, pois sobre si impende a obrigação de garantia da qualidade do pavimento que colocou na fração vendida, enquanto construtor vendedor. 22ª - Pretende a Ré Recorrente que os pontos e) e g) dos factos não provados “e) A 1ª Ré advertiu a A. de que esse material não era o adequado para a obra em causa e para a atividade que prosseguia/ fins a que se destinava. (…) g) Que a 2ª Ré se tenha comprometido ou assumido, perante a A. a reparar qualquer tipo de defeito.” Sejam dados como provados, contudo sem razão. 23ª - Ora, também aqui pretende a Ré Recorrente que o douto Tribunal assuma a sua versão dos factos, com base nas declarações de parte do seu Legal Representante, e contrariando a demais prova produzida em julgamento, 24ª - Nenhuma prova foi produzida no sentido que a Ré Recorrente tenha advertido a Autora Recorrida que o pavimento material não era o adequado para a obra em causa e para a atividade que prosseguia/ fins a que se destinava, mormente considerando o mosaico. 25ª - Na verdade, o que resultou provado, e como resulta das passagens das testemunhas supra transcritas e como melhor é explicado na douta fundamentação da Sentença recorrida, foi que a Ré Recorrente que forneceu as amostras à Autora Recorrida, para apenas escolher a cor, e garantiu, como tinha de garantir enquanto construtor vendedor que o material era apto ao desenvolvimento da actividade da Autora , até porque, caso assim, não entendesse, nem sequer devia ter mostrado aquelas amostras à Autora, para escolher a cor. 26ª - Também resulta do depoimento da testemunha BB – inquirida no dia 22/04/2024 testemunho gravado no sistema habilus media studio com início pelas 10:28h e termo pelas 10:54h com duração de 00:22:47 - minutos 00:01.00 a 00:05:50 e minutos 00:06.05 a 00:07:50 que a 1.ª Ré Recorrente se deslocou ao imóvel que viu os defeitos que os assumiu e se obrigou à sua reparação. 27ª - Ora, a 2.ª Ré apenas se deslocou às instalações da Autora Recorrida para acompanhar o Ré Recorrente, por ter sido contratado pela Recorrente para o fornecimento e aplicação do pavimento. 28ª - Ou seja, a relação contratual entre as Rés (1.ª e 2.ª) é alheia à Autora, sendo certo que, a Ré Recorrente se comprometeu com a Autora eliminar os defeitos, e pelo que, resultou do testemunho de BB tais trabalhos iam ser realizados pela 2.ª Ré. 29ª - Contudo daí, não se pode extrair a conclusão pretendida pela Ré Recorrente que os pontos e) e g) dos factos dados como não provados sejam dados como provados. 30ª - Ou seja, que a Recorrente não tinha responsabilidade com a Autora para a eliminação dos defeitos. 31ª - Assim devem aqueles dois pontos manter-se como não provados. 32ª - Alega a Ré Recorrente que se verifica a caducidade do direito da Recorrida, por entender que os defeitos ocorreram em Agosto de 2019 quando a Recorrente se deslocou à fração e lhes foram denunciados os defeitos pela Recorrida. 33ª - Contudo, omite que a Ré Recorrente que assumiu e comprometeu-se a reparar os defeitos que àquela data já se verificavam, tentando afirmar que apenas “…a 2.ª Ré se comprometido a reparar as zonas das cadeiras, o que a Recorrida nunca quis pois pretendia a substituição total do pavimento.” 34ª - Ora, resultou claro do depoimento da testemunha BB – inquirida no dia 22/04/2024 testemunho gravado no sistema habilus media studio com início pelas 10:28h e termo pelas 10:54h com duração de 00:22:47 – minutos 00:01.00 a 00:05:50 e 00:06.05 a 00:07:50 35ª - Resulta do exposto que houve da parte da Ré Recorrente reconhecimento dos mencionados defeitos, reconhecimento traduzido na assunção da obrigação de substituição do soalho e, por isso, ele tem um efeito impeditivo do decurso de um prazo de caducidade para a instauração da acção destinada a exigir, após a denúncia, a eliminação dos defeitos: neste sentido: Ac. do S.T.J. de 8.3.2007, proc. 372/07 – 7ª secção (Alberto Sobrinho), Ac. do S.T.J. de 9.12.2008,proc. n.º 3507/08 – 1ª secção (Moreira Alves) Ac. do S.T.J. de 19.3.2009, proc. 09A0334 (Fonseca Ramos), Ac. do S.T.J. de 28.4.2009, proc.s n.º 3604/08 e 08B3604 – 7ª secção (Maria dos Prazeres Beleza), Ac. do S.T.J. de 14.5.2009, n.º 1905/04.5TBGDM.S1. – 6ª secção (Sousa Leite). 36ª - Contudo, ainda assim não se entendesse, o que não se aceita mas só por mera hipótese académica se admite, sempre se dirá e como bem explica a douta Sentença recorrida, também não se verificava a caducidade do direito da Autora, 37ª - De facto, demostra-se que a Ré se deslocou à obra em Agosto 2019 e Setembro de 2019 e procurou arranjar uma solução, comprometendo-se a reparar o pavimento, mas apenas na área por baixo das secretárias e não no piso todo. 38ª - Nada tendo sido feito, os defeitos foram novamente comunicados em 25 de maio de 2020, por escrito. 39ª - O prazo de um ano para a denuncia do defeito, a que se refere o artigoº 1225º nº 2 do CC, mostra-se cumprido, dentro do prazo. 40ª - Entendemos, como refere a douta Sentença recorrida que, não deve ser iniciado a contagem do prazo de caducidade agosto de 2019, já que, nessa data, houve, por parte da Ré Rercorrente, manifestação de resolver e reparar os defeitos, ainda que parcialmente. 41ª - Esta postura e compromisso impediu a Autora Recorrida de agir, de boa fé, pelo que constituiria abuso do direito, se direito houvesse, considerar como início de prazo para agir em juízo a referida data. 42ª - Pelo que, nada tendo sido feito pela Ré, o prazo para intentar a ação judicial terminaria, em termos de normalidade (sem suspensão de prazos Covid), no dia 24 de maio de 2021, (01 ano após a denuncia escrita dos defeitos por carta de 25 de maio de 2020) 43ª - A presente ação entrou em juízo em 10/02/2021 e a Ré Recorrida foi citada em 17/02/2021, antes do decurso do prazo de um ano. 44ª - Ainda que assim não se entendesse, ainda que o prazo de denúncia se tivesse iniciado em Agosto de 2019, como defende a Ré Recorrente nas suas conclusões 37 e 38, não se teria verificado a caducidade, por força da suspensão dos prazos da COVID-19, pois que entre agosto de 2019 a agosto de 2020, por força da suspensão dos prazos, decorreram 263 dias. 45ª - Sendo que, somando os 246 de suspensão, tendo a ação sido instaurada e a Ré Recorrente citada em fevereiro de 2021, não se verifica a exceção de caducidade, razão pela qual também por esta via foi a mesma julgada improcedente por não provada a exceção da caducidade, como bem explica a douta Sentença recorrida que fez uma correta contagem dos prazos e aplicação da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, Lei n.º 4-B/2021, de 01 de fevereiro e do artigo 6.º-B da Lei n.º 1/2020, de 19 de março Lei n.º 13- B/2021, de 5 e concluiu “Entre agosto de 2019 a agosto de 2020 decorreram 263 dias. Somando os 246 de suspensão é evidente que, tendo a ação sido instaurada e a Ré citada em fevereiro de 2021, não se verifica a exceção de caducidade, que assim se julga improcedente” 46ª - Por tudo o exposto, nenhuma critica merece o douto Tribunal a quo, pelo deve o presente recurso a que se responde ser julgado improcedente por não provado, com as legais consequências. Nestes termos e sempre com o V. Mui douto suprimento de V.Exas., Venerandos Senhores Doutores Juízes Desembargadores deve o recurso a que se responde ser negado provimento e julgado totalmente improcedente, pois desta feita V. Exas farão a Costumada Justiça!”. * Colhidos os vistos legais, cumpre decidir, sendo as seguintes as questões a dirimir: 1. Impugnação da matéria de facto (conclusões 3 a 27): 1-a) Alteração das respostas dadas à matéria de facto pelo tribunal a quo sob os números 7, 11, 12, 13, 14, 18, 23, 26, 31, 33 e 38 dos factos provados[2]; 1-b) Consideração da matéria de facto não provada sob as alíneas e) e g) como provada. 2. Julgamento da matéria de direito (conclusões 28 a 50): 2-a) Se a 1.ª ré/recorrente devia ter sido absolvida da instância (conclusões 29 a 34); 2-b) Se se verifica caducidade do direito da autora/recorrente ((conclusões 35 a 46): 2-c) Se existindo responsabilidade da recorrente a mesma tem de ser limitada ao valor estipulado no contrato-promessa (conclusões 47 e 48); 2-d) Se há erro de cálculo no valor da indemnização a pagar pela recorrente e o valor do IVA não deve ser considerado para efeitos de indemnização (conclusões 49 e 50). * A. Fundamentação de facto. Na sentença sob recurso foram considerados provados os seguintes factos: 1) A Autora é uma sociedade comercial que se dedica à actividade de mediação de seguros – certidão de registo junta sob doc.1 da p.i 2) A 1ª Ré é uma sociedade comercial que se dedica à actividade de compra e venda de bens imobiliários e à realização de actividades especializadas de construção civil, remodelação de edifícios e outras – conforme informação do registo comercial junta sob doc. nº 2 da p.i. 3) A 2ª Ré é uma sociedade comercial que se dedica à actividade de comércio por grosso e retalho, importação e exportação de madeiras, sua aplicação e transformação, aplicação e fabrico de pavimentos, roupeiros e forros, fabrico, importação, exportação e comercialização por grosso e a retalho de mobiliário; conforme certidão do registo comercial junta sob do. 3 da p.i. 4) Em 06 de Novembro de 2017, a Autora e a 1ª Ré celebraram um contrato de promessa de compra e venda de imóvel segundo o qual a 1ª Ré obrigou-se a vender à Autora e esta a comprar à 1ª Ré, livre de ónus e encargos a fracção autónoma designada pela letra E, do prédio urbano da freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...16 e inscrito na respetiva matriz sob o artigo urbano ...33 da mesma freguesia e concelho – doc. 4 da p.i. 5) Tendo aí ficado a constar, na cláusula 2ª do Contrato de Promessa de Compra e Venda, a 1ª Ré “(…) encontrava-se a finalizar a construção do edifício (…)”, onde se localizava a fração prometida. 6) Nos termos da cláusula 3ª do Contrato de Promessa de Compra e Venda, a fração prometida destinava-se “(…) a comércio, serviços ou restauração (…)” – doc.4 7) E nos termos da alínea d) da cláusula 4ª do Contrato de Promessa de Compra e Venda, a 1ª Ré obrigou-se a terminar a construção, entre outras, com a aplicação do “pavimento de ambos os pisos (…)”. 8) Sendo que, a Autora pretendia instalar, como veio a acontecer, na fração prometida vender e comprar, os seus serviços, ou seja, a prestação de serviços de mediação de seguros. 9) Para aí laborarem os seus funcionários e receber os seus clientes. 10) Facto do conhecimento da 1ª Ré. (tudo tendo resultado de todos os meios de prova e não sendo sequer, controvertido) 11) No cumprimento das cláusulas 3.º e 4.º do Contrato Promessa de Compra e Venda, a 1.ª Ré forneceu à Autora as várias opções por si pré-selecionadas de pavimento em flutuante vinílico a aplicar no piso da fração prometida, com os respetivos preços de cada opção 12) A Autora escolheu um dos pavimentos, em flutuante vinílico Medium Grey 13) Tendo-lhe sido exibidas amostras pela 1ª Ré, com distintas cores, que a A. escolheu. 14) Após o que, foi acordado entre as partes o fornecimento e aplicação do pavimento em flutuante vinílico a Medium Grey e tela flutuante vinil melhor identificado na fatura n.º 685/2018 de 09/10/2018, pela 1ª Ré – vide doc. 5 da p.i, confissão e demais prova produzida. 15) Conforme Contrato Promessa de Compra e Venda junto sob o doc n.º 4 da p.i, a Autora apenas suportou a diferença entre o preço do limite previsto na clausula 4.ª do contrato promessa e o preço do pavimento aplicado, no valor de 2.267,20 euros, cfr. Doc, n.º 5. 16) Tendo pago à 2º Ré a quantia de € 2.267,20€, que a si lhe foi faturado - doc. 5 da contestação da 1ª Ré (fls 193) e confessado 17) Cumpridas as formalidades atinentes ao cumprimento do Contrato Promessa de Compra e Venda pelas partes, a respetiva escritura pública foi outorgada a 03 de Dezembro de 2018 – doc. 6, 7 e 8 p.i. 18) Durante a execução da obra verificou a A. que a cor do chão não havia sido a escolhida, o que de imediato foi comunicado e resolvido pelas RR. 19) A A Autora tomou posse da dita fração em dezembro de 2018 – confessado. 20) Muito embora só em janeiro tivesse aberto ao público. 21) Em março de 2019 começou a verificar algumas anomalias no piso, o que denunciou à 1ª Ré – confessado pela A. 22) Por volta de agosto de 2019 o piso da sua fração autónoma apresentava mais defeitos no que concerne ao piso flutuante vinílico aplicado. – prova por declarações, testemunhas e regras da experiência comum. 23) Efetivamente, o flutuante aplicado pelas Rés cedeu, sobretudo nas zonas em que existiam mesas e cadeiras, mas também noutras zonas do estabelecimento comercial da A. onde recebia os seus clientes – prova pericial em conjugação com a documental e testemunhal. 24) Começou o pavimento a apresentar cedências de diversos tipos, designadamente, riscos, juntas elevadas e dilatadas, relevos anormais, etc num espaço pouco superior a meio ano. – vide fotografias juntas, prova pericial em conjugação com a demais produzida. 25) E sobretudo nas zonas das secretárias e cadeiras, revelando não ser adequado para este equipamento mas que é o normal e usual para a atividade da Autora – idem e regras da normalidade e experiência comum. 26) A Autora voltou a denunciar toda esta situação à 1.ª Ré, verbalmente, em agosto de 2019. 27) Ambas as Rés se deslocaram à loja da A. em agosto de 2019.- confessado em depoimentos / declarações de partes 28) Tendo verificado que na zona das cadeiras das secretárias o piso apresentava desgaste.- confessado (artigoº 30º da contestação e artigoºs 10º e 11º das contestações).) 29) A primeira Ré deslocou-se à loja também em setembro de 2019. – confessado na sua contestação (artigoº 29) 30) A segunda Ré deslocou-se à loja da A. em setembro de 2019 tendo aí constatado que as zonas do flutuante onde se situavam as cadeiras apresentavam riscos - confessado pela 2ª Ré 31) A 1ª Ré comprometeu-se a arranjar uma solução e a substituir o soalho, mas apenas na zona das cadeiras – confessado em depoimento de parte. 32) Em dezembro de 2019 o prédio da A. sofreu uma inundação, tendo a água entrada em determinadas zonas da fração – doc junto à contestação, documentos juntos a fls 267 e segs e demais prova produzida. 33) Mas que não afetaram a zona do escritório que aqui se discute. 34) Na fração que foi prometida vender à A. foi criado um sobre piso, que foi arrendado pela A. a um terceiro, onde foi instalado um gabinete de contabilidade, tendo este terceiro escolhido um piso em mosaico – confessado. 35) Os vários tipos de defeitos do piso resultam de má ligação entre o material e a sua aplicação, por se tratar de todo um sistema o material e a sua aplicação / execução, que requer um tipo de base (ou cama) específica que não existe para o material aplicado. 36) Para reparação dos defeitos é necessário retirar todo o soalho, verificar-se a base existente e repará-la se necessário, ou aplicar, por cima da existente, outro tipo de material.- prova pericial. 37) O que poderá ascender, já com custos imprevistos de eletricidade transportes, comunicações. etc a 5.500€ mais IVA, ou seja 6.765€ - esclarecimentos escritos ao relatório pericial de fls 255. 38) Por carte datada de 25 de Maio de 2020 a Autora remeteu à 1ª Ré uma carta registada com AR denunciando por escrito os defeitos do piso de flutuante vinílico da loja, devido à falta de qualidade do material ou da sua aplicação e exigindo a sua eliminação como antes se haviam obrigado, sob pena de recurso à via judicial – doc. 14 da p.i de fls 65 39) Com essa carta enviou fotografias do piso. 40) A A. solicitou orçamento para remover todo os móveis e equipamento e colocação de novo chão em flutuante vinílico que, em 25/09/2020 importava o custo de valor de € 8.085,00 (oito mil e oitenta e cinco euros) acrescido de IVA – doc nº 15 da p.i 41) Orçamento esse que a A. enviou à primeira Ré por carta com AR de 16/11/2020,através da Il Mandatária . – doc 16. 42) E na qual a mesma insiste para a eliminação dos defeitos e que, caso nada fosse feito em 10 dias, iria mandar reparar a outrem as anomalias a expensas da Ré – doc. 16. E foram considerados não provados os seguintes factos: a) Os defeitos encontrados no pavimento foram causados, tiveram origem ou de alguma forma estiveram relacionados com a inundação ocorrida em dezembro de 2019 - vide docs de fls 267 e segs em conjugação com a restante prova b) Os defeitos relatados e referidos nos factos provados no piso deveram-se a mau uso da A., fosse pela escolha do material ou pela não aquisição de tapetes próprios. c) Quem sugeriu a quem a aplicação do tipo de produto para o soalho em causa. d) O material aplicado no pavimento padece de qualquer anomalia. e) A 1ª Ré advertiu a A. de que esse material não era o adequado para a obra em causa e para a atividade que prosseguia/ fins a que se destinava. f) Que algumas das Rés se tenha comprometido a substituir todo o pavimento. g) Que a 2ª Ré se tenha comprometido ou assumido, perante a A. a reparar qualquer tipo de defeito. h) Qualquer tipo de danos não patrimoniais sofridos pela A., aliás não alegados, mas nomeadamente que “a entristece” receber clientes com o piso naquele estado. i) A 1ª Ré comprometeu-se com a Autora iniciar os trabalhos ainda esse mês de janeiro, ou mais tardar, em fevereiro de 2020. j) Em finais de fevereiro, a 1ª e 2ª Ré deslocaram-se à fração com funcionários para iniciar os trabalhos, k) Fizeram um levantamento e planeamento dos trabalhos a realizar; l) Nomeadamente, transmitiram ao funcionário que se fizeram acompanhar, o plano de execução dos trabalhos, n) Sendo que, a 1ª e 2ª Rés transmitiram à Autora que devido a esse motivo não poderiam iniciar a execução dos trabalhos, conforme estava previsto o) Comprometendo-se a iniciar os mesmos assim que o Estado de Emergência cessasse. m) De modo a ser executada em secções, por forma a permitir a continuidade da laboração da Autora no local, só não o tendo feito porque em março de 2020 foi decretado o Estado de Emergência devido à pandemia da Covid-19. * B. Fundamentação de Direito. 1. Impugnação da matéria de facto (conclusões 3 a 27). A recorrida considera que a recorrente “não indica nas suas alegações, nem nas suas conclusões de recurso os concretos meios probatórios que impunham alteração de cada um dos pontos da decisão de facto que impugna, ao invés faz uma indicação e análise geral da prova produzida e limita-se depois a dizer que tal na sua ótica impõe que a redação dos factos provados em 7, de 11 a 14, 18 a 23, 31 e 38” (sic) e entende que, por esse motivo, deve ser rejeitada a impugnação da matéria de facto, não devendo o tribunal ad quem à sua reapreciação. Como é sabido, a interposição de um recurso judicial exerce-se através de requerimento que contenha a fundamentação e o pedido, de modo a delimitar o objecto da impugnação, elucidando o n.º 2 do artigo 637.º do Código de Processo Civil (CPC), que “o requerimento de interposição do recurso contém obrigatoriamente a alegação do recorrente, em cujas conclusões deve ser indicado o fundamento específico da recorribilidade” e impondo o n.º 1 do artigo 639.º, ao recorrente, o dever de “apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos porque pede a alteração ou anulação da decisão”. No que toca ao recurso que incida sobre a matéria de facto o n.º 1 do artigo 640.º do CPC estabelece que “deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”. E acrescenta a alínea a) do n.º 2 deste normativo que, na eventualidade de terem sido invocados meios probatórios gravados como fundamento do erro na apreciação das provas, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens gravadas em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes. Ora, o recurso em análise, no que à impugnação da matéria de facto respeita, não está escrupulosamente conforme aos ditames legais aplicáveis, uma vez que a apelante, nem nas alegações, nem nas conclusões, refere ou indica, de modo claro, especificado e isento de dúvidas, em relação a cada ponto de facto que impugna, quais os concretos meios probatórios, insertos no processo ou vertidos na gravação da prova, que impunham decisão diversa. Não obstante o aludido, tem-se afirmado, sobretudo na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, uma corrente mais recente que sustenta que, segundo um critério de proporcionalidade e da razoabilidade, os ónus enunciados no artigo 640.º do CPC devem ser flexibilizados, desde que se garanta uma adequada inteligibilidade do fim e do objecto do recurso. Tal como se consignou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 14-05-2024, Proc. n.º 1408/17.8T8OLH-H.E1.S1: “Constitui entendimento firme e consolidado no Supremo Tribunal de Justiça o de que a análise quanto à exigência do cumprimento dos requisitos constantes do artigo 640º do Código de Processo Civil obedece desde logo aos princípios gerais da proporcionalidade, adequação e razoabilidade, com o primado da substância sobre a forma, em termos de afastar a solução da imediata rejeição da impugnação de facto no caso de as deficiências, estritamente formais, no cumprimento dos requisitos estabelecidos no artigo 640º do Código de Processo Civil permitirem, não obstante, compreender e alcançar o seu exacto sentido, sendo assim perfeitamente possível ao julgador, sem especiais dificuldades ou acrescidos esforços, aquilatar em toda a sua amplitude e com toda a segurança do respectivo mérito, o que está em consonância com os princípios gerais consagrados nos artigos 18º, nº 2 e 3 e 20º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa que prevêem a garantia da tutela da jurisdição efectiva e do direito fundamental a um processo judicial equitativo e justo”. [3] Em consonância com o exposto, mostrando-se cumpridos de forma minimamente perceptível os pressupostos legais referenciados, passar-se-á, seguidamente, à análise dos fundamentos concretos do recurso de facto que estão invocados – e que, ademais, a recorrida acabou por compreender ao refutar especificadamente a impugnação apresentada pela recorrente. Posto, analisemos as questões recursivas alusivas à impugnação da matéria de facto. 1-a) Alteração das respostas dadas à matéria de facto pelo tribunal a quo sob os números 7, 11, 12, 13, 14, 18, 23, 26, 31, 33 e 38 dos factos provados. (i) Pretende a recorrente, em 1.º lugar, que se altere a redacção dos factos provados n.ºs 7, 11, 12, 13, 14, 18 e 23 (conclusões 4 a 13). Segundo o estatuído no artigo 662.º, n.º 1, do CPC: “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”. O normativo citado abrange quer as situações de aplicação de regras vinculativas extraídas do direito probatório material – v.g., regras substantivas atinentes ao ónus de prova, admissibilidade dos meios de prova e sua força probatória –, quer, evidentemente, as situações em que a reapreciação da prova é suscitada por via da impugnação da decisão sobre a matéria de facto. A recorrente defende, em síntese, que “nunca se comprometeu a fornecer ou pré-selecionar tipos de pavimentos ou cores, nem a fornecer e aplicar material diferente de mosaico e de valor acima de 10,00/m2, nem tal resulta do contrato promessa” e que “a Recorrida optou por um outro tipo de pavimento – flutuante vinílico – com um valor bem acima do ali estipulado – €25,00/m2 –, sendo a aquisição e aplicação de tal material contratada com a 2.ª Ré e alheia à Recorrente, que só interveio a jusante, ao suportar o correspondente €10,00/m2, cfr. fatura emitida pela 2.ª Ré à Recorrente”. Ampara que “foi a Recorrida que escolheu ambos os pavimentos, decidindo que no piso que ia ocupar o pavimento seria em flutuante vinílico, adquirido e mandado aplicar pela 2.ª Ré por contrato celebrado entre esta e a Recorrida”, “sendo que no sobre piso fez a vontade ao inquilino, manteve o previsto no contrato promessa de compra e venda e deixou aplicar mosaico, o que foi diligenciado pela Recorrente, sem qualquer defeito até hoje” (sic). Especificamente, para alterar a redacção dos factos em causa – n.ºs 7, 11, 12, 13, 14, 18 e 23 – a recorrente indica os seguintes meios de prova: as declarações de parte do legal representante da 1.ª ré (prestado no dia 22/04/2024, com início às 10:54 e termo às 11:29, passagem de 03:08 a 05:20, passagem 17:30 a 20:09, passagem 20:20 a 23:04, passagem de 23:10 a 23:23), do qual “resultou claro todo o circunstancialismo que envolveu a escolha e colocação do pavimento na fração prometida vender à Recorrida, nas quais a Recorrente não teve intervenção” e o depoimento de parte do legal representante da recorrida (passagem de 10:56 a 11:33 e passagem de 28:05 a 28:55), “confessou que já tinha decidido que queria flutuante no pavimento do piso que ocuparia, ao contrário do inquilino do sobre piso, que seguiu a indicação da Recorrente, não tendo tido qualquer problema”. Pugna, por isso, que os factos provados pelo tribunal a quo acima indicados, passem a ter a redacção que a seguir se aponta e cuja prova se irá analisar: Refere a recorrente que este facto deve passar a ter a seguinte redacção: E nos termos da cláusula 4ª do Contrato de Promessa de Compra e Venda, a 1ª Ré obrigou-se a terminar a construção, entre outras, com a aplicação do “pavimento de ambos os pisos em mosaico até um valor máximo de €10,00/m2 (alínea e), podendo a Autora escolher o pavimento (tipo de mosaico), até um valor máximo de €10,00/m2 (alínea d). Contrapõe a recorrida que a redacção conferida a este facto pelo tribunal a quo – 7) E nos termos da alínea d) da cláusula 4ª do Contrato de Promessa de Compra e Venda, a 1ª Ré obrigou-se a terminar a construção, entre outras, com a aplicação do “pavimento de ambos os pisos (…)” – deve permanecer inalterável, com base na análise do contrato promessa de compra e venda. A questão afigura-se bastante simples e emerge da leitura e exame do contrato promessa, mormente do teor da cláusula 4.ª, alínea d) – cf. documento n.º 4 junto com a petição inicial – que o tribunal a quo não reproduziu na íntegra. Por conseguinte, a redacção do facto provado n.º 7 passará a ser: E nos termos da alínea d) da cláusula 4ª do Contrato de Promessa de Compra e Venda, a 1ª Ré obrigou-se a terminar a construção, entre outras, com a aplicação do “pavimento de ambos os pisos (…) à escolha do promitente comprador até um valor máximo de € 10,00/M2 (Dez euros o metro quadrado)”. Diz a recorrente que este facto deve passar a ter a seguinte redacção: No cumprimento das cláusulas 3.º e 4.º do Contrato Promessa de Compra e Venda, Autora contactou a Ré C... para escolher o tipo de pavimento e a cor a aplicar no piso da fração prometida. Contrapõe a recorrida que a redacção conferida pelo tribunal ao facto n.º 11 dos factos provados – “No cumprimento das cláusulas 3.º e 4.º do Contrato Promessa de Compra e Venda, a 1.ª Ré forneceu à Autora as várias opções por si pré-selecionadas de pavimento em flutuante vinílico a aplicar no piso da fração prometida, com os respetivos preços de cada opção” – deve permanecer inalterada. Invoca, para tal, o depoimento da testemunha AA (inquirida no dia 22/04/2024 testemunho gravado no sistema habilus media studio com início pelas 10:07h e termo pelas 10:28h com duração de 00:20:39 – minutos 00:03:50 a 00:08:50) e o teor do contrato promessa de compra e venda, do qual resulta que o pavimento era escolhido pela promitente compradora, a recorrida, e que à, semelhança do anterior gabinete onde tinha as suas instalações, escolheu pavimento flutuante/vinil, o que foi aceite pela recorrente, porque se tinha obrigado a aplicar o chão/pavimento como acabamento. Aduz, igualmente, que “como é prática, o empreiteiro, promitente vendedor, (Sr CC) mostrou as amostras do pavimento pretendido, ao cliente, que neste caso escolheu apenas a cor, e aplicou-o, sendo que o remanescente do valor sobre os 10€/m2, tinham de ser suportados pelo promitente comprador/ Recorrida” e conclui que: “Na verdade, nenhuma prova foi feita que Autora/Recorrida, contactou a Ré C... para escolher o tipo de pavimento e a cor a aplicar no piso da fração prometida e, que a Recorrida se substituía, derrogando a responsabilidade do empreiteiro / vendedor. Diga-se que nem o legal representante da Ré C... corroborou esta versão que a Recorrente que seja dada como provada” (sic). Vejamos este ponto fulcral do recurso. A autonomia decisória do Tribunal da Relação, no julgamento da matéria de facto, mediante a reapreciação dos meios de prova constantes do processo – sem prejuízo dos temas de conhecimento oficioso – está confinada, no que toca à identificação da matéria objecto de discordância, à observância do princípio do dispositivo, acrescendo que essa sindicância não tem como objectivo efectuar um segundo julgamento da causa, mas sim proceder à reapreciação dos juízos de facto impugnados – cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 07-09-2017, Proc. n.º 959/09.2TVLSB.L1.S1.[4] Procedendo à audição integral da prova regista-se que as versões sobre quem contactou a C... (2.ª ré) e quem escolheu o tipo e a cor do pavimento são contraditórias: o legal representante da autora e as suas testemunhas afirmam que apenas escolheram a cor a partir de amostras fornecidas pelo legal representante da 1.ª ré, aqui recorrente, CC, enquanto este último afirma que foi a autora quem tratou directamente dessa questão com a C.... Concretamente o legal representante da autora, DD, afirmou que nunca negociou com a C... e que todos os contactos foram realizados com o Sr. CC, gerente da 1.ª ré, tendo referido que somente escolheu a cor do material vinílico, que foi aconselhado pelo Sr. CC. Foi este quem levou amostras à loja antiga da autora para que o legal representante e a sua mulher escolhessem a cor, negando ter-se deslocado à loja da C... ou qualquer outro local para escolher o material aplicar no pavimento Aliás, a sua mulher, a testemunha AA, assertou, também, que apenas foi escolhida a cor, tendo relatado que o Sr. CC foi ao escritório antigo da autora com uma palete de amostras de várias cores para que fizessem a escolha, enfatizando que nunca trataram nada diretamente com a C.... O legal representante da recorrente (1.ª ré), como antes se sublinhou, apresentou uma versão oposta, e pouco credível, afirmando que a autora tratou directamente da escolha do pavimento com a C..., tendo suportado que o legal representante da autora é que apareceu na obra com amostras de flutuante vinílico que teria ido buscar a uma empresa concorrente da C... e que, nessa sequência, a 1.ª ré lhe sugeriu que ele se deslocasse a esta empresa por ser o seu fornecedor habitual, para comparar preços e materiais. Em consonância, sustentou que o negócio foi tratado entre a autora e a C..., tendo a autora pago directamente a esta empresa o valor diferencial do pavimento, e depois a C... faturou à recorrente apenas o valor que estava previsto no contrato-promessa (10 €/m²). Ora, para que se altere a decisão da matéria de facto da 1ª Instância não basta divergir da leitura que esta fez da factualidade, ao considerar determinados factos provados e outros não provados, impondo-se demonstrar que ocorreu erro (manifesto) que contrarie, de forma evidente, as regras da ciência da lógica e da experiência, apontando, de modo inequívoco, para o julgamento do facto num sentido diverso. Relembre-se que o artigo 607.º, n.º 5, do CPC, em linha com o estatuído pelo artigo 205.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, consagra o princípio da liberdade de julgamento (ou da livre convicção), segundo o qual o Tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização – exceptuando os limites que se reportam à prova tarifada ou legal –, fixando a matéria de facto em sintonia com a sua prudente convicção firmada acerca de cada facto controvertido, em conformidade racional com a prova produzida e segundo as regras da lógica e as máximas da experiência. Para tal o Juiz tem, necessariamente, de fazer uma análise crítica e integrada das declarações e/ou dos depoimentos produzidos, com os documentos e outros meios de prova oportunamente contraditados, insertos nos autos ou que lhe sejam oferecidos.[5] Não se olvide, igualmente, que, por força da imediação, da oralidade e da concentração que caracterizam a produção da prova perante o Juiz a quo, este está numa posição privilegiada para valorar os meios probatórios, designadamente para surpreender, no comportamento das testemunhas e das partes, elementos relevantes para aferir a espontaneidade e a credibilidade dos seus depoimentos, que frequentemente não transparecem na gravação. Como se escreveu no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 11-02-2025, Proc. n.º 1435/22.3T8VFR.C1: “Considerando que, afinal, quem aprecia e julga é o juiz e não a parte, a censura sobre a convicção do julgador em sede de apreciação da prova, apenas pode ser concedida – máxime perante prova pessoal e considerando os benefícios da imediação e da oralidade – se tal convicção se revelar manifestamente desconforme à prova invocada”. Explica Ana Luísa Geraldes, Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, “Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas”, Volume I, 2013, p. 591:“O Tribunal ao expressar a sua convicção, deve indicar os fundamentos suficientes que a determinaram, para que através das regras da lógica e da experiência se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento dos factos provados e não provados, permitindo aferir das razões que motivaram o julgador a concluir num sentido ou noutro (…), de modo a possibilitar a reapreciação da respectiva decisão da matéria de facto pelo Tribunal de 2ª Instância”. A mesma autora destaca que, em caso de dúvida, “face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte” – op. cit., p. 609. É, pois, ostensivo que perante as versões diversas apresentadas pelo legal representante da autora e sua mulher e pelo legal representante da 1.ª ré, fica-se na dúvida sobre a realidade deste facto que a recorrente pretendia demonstrar – a Autora contactou a Ré C... para escolher o tipo de pavimento e a cor a aplicar no piso da fração prometida –, havendo, assim, que recorrer à norma do artigo 414.º do CPC, segundo a qual a dúvida sobre a realidade de um facto se resolve contra a parte a quem esse facto aproveita, o que significa que a parte quem a prova do facto lhe é favorável terá de arcar com o risco da incerteza se o facto não for comprovado. De resto, o que aqui se consigna vale para a subsequente reavaliação da prova em relação à demais factualidade. Por conseguinte, mantém-se a redacção provado n.º 11. Quer a recorrente que estes factos passem a ter a seguinte redacção: 12. A Autora escolheu um dos pavimentos comercializados pela Ré C..., em flutuante vinílico Medium Grey. 13. Tendo-lhe sido exibidas amostras pela 2ª Ré, com distintas cores, que a A. escolheu. 14. Após o que, foi acordado entre a Autora e a 2.ª Ré o fornecimento e aplicação do pavimento em flutuante vinílico a Medium Grey e tela flutuante vinil melhor identificado na fatura n.º 685/2018 de 09/10/2018, pela 2ª Ré – vide doc. 5 da p.i, confissão e demais prova produzida. Contrapõe a recorrida que a redacção conferida aos factos provados pelo tribunal a quo – i.e., 12) A Autora escolheu um dos pavimentos, em flutuante vinílico Medium Grey / 13) Tendo-lhe sido exibidas amostras pela 1ª Ré, com distintas cores, que a A. escolheu. /14) Após o que, foi acordado entre as partes o fornecimento e aplicação do pavimento em flutuante vinílico a Medium Grey e tela flutuante vinil melhor identificado na fatura n.º 685/2018 de 09/10/2018, pela 1ª Ré – vide doc. 5 da p.i, confissão e demais prova produzida – se deve manter. Aduz, para tal, que essa factualidade emerge “do contrato promessa de compra e venda firmado entre Recorrente e Recorrida, junto sob o documento n.º 5 junto com a PI que a Recorrente enquanto promitente vendedor obrigou-se a entregar à Recorrida a “fração autónoma “E”, correspondente ao rés-do-chão direito, destinado a comércio, serviços ou restauração, tendo na cave um compartimento amplo destinado a garagem” – clausula 3.ª – com “ pavimentos de ambos os pisos será à escolha do Promitente comprador até um valor máximo de €10,00/m2 (Dez euros o metro quadrado).” – cláusula 4.ª, alínea d); dos factos dados como provados em 1, 2, 3, 4, 5, 6, 8, 10; da testemunha AA – inquirida no dia 22/04/2024 testemunho gravado no sistema habilus media studio com início pelas 10:07h e termo pelas 10:28h com duração de 00:20:39 - minutos 00:03:50 a 00:08:50 e 00:18:12 a 00:20:30” (sic). Procedendo, de novo, à audição da prova, regista-se, uma vez mais, que as versões sobre a escolha, o fornecimento e a aplicação do pavimento são contraditórias. O legal representante legal da autora, como antes se disse, afirmou que a escolha se cingiu apenas à cor do material e refutou ter escolhido o tipo de pavimento ou ter discutido qualquer assunto directamente com a C..., tendo concretizado que as amostras de pavimento lhe foram exibidas pelo legal representante da construtora, 1.ª ré, que as terá levado (as amostras) ao escritório antigo da autora para que escolhessem a cor. A testemunha AA, cônjuge do legal representante da autora, corroborou esta versão, afirmando que apenas escolheram a cor a partir de uma palete de amostras que o Sr. CC levou ao escritório e foi categórica ao afirmar: “Nós nunca tratamos nada diretamente com a C.... Temos a certeza absoluta”. Por outro lado, no que se refere ao alegado acordo para fornecimento e aplicação pela 2.ª ré (C...), o legal representante da autora iterou que nunca negociou ou contratou nada directamente com aquela sociedade, tendo frisado que celebrou um contrato “chave na mão”, com a recorrente, e que era com a 1.ª ré que tratava de tudo. Deste modo, o pagamento do valor diferencial do pavimento, feito directamente à C..., terá sido uma sugestão do legal representante da 1.ª ré “por uma questão de facilidade”, não configurando uma qualquer relação comercial entre a autora e a C..., uma vez que a encomenda foi toda feita pela 1.ª ré, negando o legal representante da autora ter ido à loja da C... ou a qualquer outra para escolher o material. Neste conspecto, não nos parecem convincentes as declarações de parte do legal representante da 1.ª ré de que teria sido a autora a aparecer na obra com amostras de flutuante vinílico e que apenas sugeriu à autora que fosse à C... – que era o fornecedor habitual da 1.ª ré –, e que teria sido o legal representante da autora a tratar desse negócio com aquela empresa, designadamente escolhendo o material. No fundo a 1.ª ré/recorrente ignora o conteúdo do contrato promessa que foi assinado entre as partes, sendo inequívoco que a mesma assumiu a obrigação de fornecimento do pavimento e aplicação do mesmo, tendo sido ela que forneceu as amostras para a escolha da cor, não colhendo o argumento de não ter sido o fornecedor de pavimento de vinil, pois sobre si impendia a obrigação de garantia da qualidade do pavimento que colocou na fracção vendida, enquanto construtor vendedor. Por esse motivo, mantém-se a redacção dos factos provados n.ºs 12, 13 e 14. Pretende a recorrente que estes factos fiquem com a seguinte redacção: 18. Durante a execução da obra verificou a A. que a cor do chão não havia sido a escolhida, o que de imediato foi comunicado e resolvido pela 2.ª R. 23. Efetivamente, o flutuante aplicado pela 2.ª Ré cedeu, sobretudo nas zonas em que existiam mesas e cadeiras, mas também noutras zonas do estabelecimento comercial da A. onde recebia os seus clientes.” A recorrente estriba-se na prova pericial em conjugação com a documental e testemunhal. Contrapõe a recorrida que a redacção conferida aos factos provados pelo tribunal a quo aos factos 18 e 23 se deve manter – 18) Durante a execução da obra verificou a A. que a cor do chão não havia sido a escolhida, o que de imediato foi comunicado e resolvido pelas RR /23) Efetivamente, o flutuante aplicado pelas Rés cedeu, sobretudo nas zonas em que existiam mesas e cadeiras, mas também noutras zonas do estabelecimento comercial da A. onde recebia os seus clientes” –, expondo que os mesmos emergem da prova pericial em conjugação com a documental e testemunhal. Relativamente ao facto provado n.º 18, uma vez mais, é patente da audição da prova gravada a discrepância de versões. O representante da 1.ª ré, CC, afirmou que a autora verificou que a cor estava errada e tratou do assunto com a C... (2.ª ré), sem a intervenção da 1.ª ré, para resolver a questão, mencionando que desconhecia a cor que tinha sido escolhida pela autora. Diversamente, a mulher do legal representante da autora, a testemunha AA, asseverou que o incidente com a cor errada ocorreu, mas negou veementemente que a comunicação e a resolução do problema tenham sido feitas através da 2.ª ré, porquanto, segundo disse e manteve ao longo do testemunho, todos os contactos eram feitos apenas e através da 1.ª ré. Confirmou que os funcionários da C... estavam a meio da aplicação do piso flutuante quando foi detectado que a cor não era a correcta, explicando que falaram com esses funcionários, que estavam na loja a aplicar o chão. No entanto, foi categórica ao garantir que a comunicação formal do problema foi feita ao legal representante da 1.ª ré, tendo o seu marido ligado para o mesmo “a dizer que a cor que não era a que nós escolhemos”, enfatizando, depois, que “nunca tratámos nada directamente com a C.... Temos a certeza absoluta”. Ou seja, ambas as partes concordam que, durante a aplicação, foi detectado que a cor do pavimento era errada e que a situação foi resolvida com a substituição do material; no entanto, enquanto que o legal represente da 1.ª ré sustentou que a autora comunicou e resolveu o problema directamente com a C... (a 2.ª ré), a mulher do legal representante da autora asseverou que, apesar de ter falado com os aplicadores no local, a reclamação foi dirigida a CC, negando qualquer relação comercial com a C.... Por conseguinte, nada há a alterar à redacção do facto provado n.º 18. Relativamente ao facto provado n.º 23, regista-se da audição da prova que há múltiplos relatos que indicam que o pavimento flutuante aplicado apresentou defeitos significativos, principalmente nas zonas de maior utilização, como debaixo das mesas e cadeiras, mas também noutras áreas do estabelecimento, sendo as descrições dos problemas e a sua localização são consistentes nos depoimentos das testemunhas indicadas pela autora e também na prova pericial. Com efeito: DD, legal representante da autora, confirmou que os problemas não se limitavam às zonas das cadeiras com rodas, referindo que, para além do desgaste junto às cadeiras, as juntas estavam abertas e algumas ripas partidas, enfatizando que o escritório tem um movimento diário e acentuado de pessoas, o que causa desgaste para além da zona das cadeiras; AA, mulher do legal representante da autora, descreveu os problemas como "lascas", "aberturas", "desnivelamento" e "uns altos", confirmando que os problemas eram mais visíveis e o chão estava mais partido "por baixo das cadeiras e das mesas"; BB, funcionário da autora, relatou que, pouco tempo após a mudança de instalações, o pavimento começou a apresentar "irregularidades, alguns ressaltos", ranhuras e as juntas "mais abertas", especificando que por baixo da sua cadeira de trabalho o chão estava a ficar "cada vez mais degradado, a desfazer-se". Realçou que quase todo o pavimento estava com irregularidades, indicando que os problemas não eram exclusivos das zonas das cadeiras; EE disse que foi ao local, observando que o pavimento estava partido "onde andam as cadeiras", sendo a zona mais visível a de um funcionário que se senta à esquerda de quem entra. Apenas CC, em contraponto com os depoimentos citados, afiançou que, quando foi ao local, em Agosto/Setembro de 2019, verificou que o problema era de desgaste e estava localizado apenas nas zonas “onde estavam as rodas” das cadeiras, não havendo problemas noutros locais, atribuindo a degradação ao uso das cadeiras com rodas sem a proteção de tapetes adequados. O relatório pericial, aliás, identificou vários tipos diferentes de defeitos e mapeou os locais onde ocorriam. O perito foi claro ao afirmar que os defeitos não se encontravam apenas na zona das cadeiras. Quando confrontado com a sugestão de que os danos ocorriam apenas junto às secretárias, o perito respondeu que, na altura da peritagem, efectivamente viu mais danos e que estes apareciam "ao longo do pavimento", não apenas na zona das secretárias. Em suma, embora a 1.ª ré limite os danos às zonas das cadeiras, as declarações do legal representante da autora e das suas testemunhas e, fundamentalmente, as conclusões do perito, confirmam que o pavimento cedeu e apresentou vários tipos de defeitos tanto nas zonas de maior desgaste (mesas e cadeiras) como noutras áreas do estabelecimento comercial. Porém, esclarecido este aspecto, embora a aplicação do pavimento tenha sido por funcionários da empresa C..., Lda., a questão de quem a contratou para o fazer é, igualmente, um dos pontos centrais de discórdia no processo. Assim, o legal representante da autora e as suas testemunhas corroboraram que a 2.ª ré foi subcontratada pela construtora, a B..., Lda., no âmbito de um contrato "chave na mão". Especificamente, DD afirmou que nunca negociou com a 2.ª ré e que a mesma apenas foi aplicar o pavimento "a mando do Sr. CC", aclarando que a 1.ª ré subcontratava os vários trabalhos, tais como electricista e canalizador, sendo a C... uma das empresas subcontratadas. AA, embora tenha dito que foram funcionários da 2.ª ré que aplicaram o pavimento, negou qualquer contacto com a C..., reforçando que a responsabilidade era da 1.ª ré. Isoladamente, apenas o legal representante da 1.ª ré, CC, sustentou que foi a autora quem contratou a C..., tanto para o fornecimento do material como para a sua aplicação. Em conformidade, considera-se que a redacção do facto provado n.º 23 não deve ser alterada. (ii) Pretende a recorrente que se altere a redacção do facto provado n.º 38 (conclusões 15 a 21). O tribunal a quo deu por provado que “38) Por carta datada de 25 de Maio de 2020 a Autora remeteu à 1ª Ré uma carta registada com AR denunciando por escrito os defeitos do piso de flutuante vinílico da loja, devido à falta de qualidade do material ou da sua aplicação e exigindo a sua eliminação como antes se haviam obrigado, sob pena de recurso à via judicial – doc. 14 da p.i de fls 65” Sustém a recorrente que “a Recorrida denunciou os defeitos em Março (facto provado em 21.º), voltou a denunciar em Agosto de 2019 (facto provado em 26.º), reiterou em Maio de 2020 (facto provado em 38.º) e voltou a reiterar em Novembro de 2020 (facto provado em 41.º)” e que a mesma “não pode (…) fazer várias denúncias sempre dos mesmos defeitos, de modo a ir prorrogando o prazo para intentar a ação judicial, o que, isso sim, constituiria um abuso de direito”. Aduz que “a Recorrida confessa que denunciou os defeitos à Recorrente em Março de 2019, cfr depoimento do legal representante da Recorrida, na passagem de 13:53 a 15:18, o que inclusive foi assente como facto provado pelo tribunal a quo” e que “a denúncia dos defeitos tem de considerar-se a partir de Março de 2019”. E prossegue: “Assim não se entendendo, terá de considerar-se a denúncia em Agosto de 2019, quando se reuniram os legais representantes de todas as partes na fração, onde foram demonstrados todos os defeitos no pavimento e onde foi informada a Recorrida que, por cortesia comercial, a 2.ª Ré iria substituir o pavimento nas zonas específicas onde se verificavam os defeitos e apenas nessas”, concluindo: “A denúncia de todos os defeitos ocorreu em Agosto de 2019, tanto que o legal representante da Recorrente e o legal representante da 2.ª Ré se reuniram com o legal representante da Recorrida na fração para verificar os defeitos e comunicar a sua posição à Recorrida” A recorrente invoca os seguintes meios de prova: depoimento do legal representante da recorrida (passagem de 15:16 a 17:08), depoimento da mulher do legal representante da recorrida, AA (passagem 07:56 a 08:14), do legal representante da 2.ª ré (passagem de 01:23 a 02:43), do legal representante da recorrente (passagem de 08:27 a 10:49) e da testemunha da BB (passagem 04:37 a 05:35). Pretende, em consonância, que o facto provado n.º 38 passe a ter a seguinte redacção: A 25 de Maio de 2020 a Autora remeteu à 1ª Ré uma carta registada com AR reiterando a denúncia feita anteriormente, desta vez por escrito, dos defeitos do piso de flutuante vinílico da loja, devido à falta de qualidade do material ou da sua aplicação e exigindo a sua eliminação como antes se haviam obrigado, sob pena de recurso à via judicial – doc. 14 da P.I de fls 65. Contrapõe a recorrida que o facto provado n.º 38 deve manter-se inalterável “ por força (…) da carta junta sob o documento n.º 14 da P.I de fls 65; o relatório pericial Resulta do relatório pericial; da testemunha BB – inquirida no dia 22/04/2024 testemunho gravado no sistema habilus media studio com início pelas 10:28h e termo pelas 10:54h com duração de 00:22:47 - . minutos 00:01.00 a 00:05:50 e 00:06.05 a 00:07:50” (sic). Com base na audição integral da prova, regista-se o seguinte: DD, legal representante da autora, confirmou que a primeira denúncia por escrito dos defeitos foi feita através de uma carta datada de 25 de Maio de 2020, tendo justificado o envio desta carta com o facto de o tempo estar a passar sem uma solução, apesar das promessas verbais de reparação que tinham sido feitas anteriormente. Essa acção foi tomada após várias interpelações verbais e visitas ao local que não resultaram na reparação prometida do pavimento; AA, embora não se recordasse da data exacta, confirmou que foi enviada uma carta para a qual a autora nunca obteve resposta. Disse que o seu marido enviou várias missivas que eram sempre devolvidas e nunca entregues, confirmando que, após as visitas dos representantes das rés e a falta de uma solução, falaram com uma advogada para redigir uma carta; CC, legal representante da 1.ª, confirmou ter recebido um e-mail da autora em Maio de 2020 e em resposta a esse e-mail, comunicou à autora que a reparação só seria feita se fosse paga, comunicando a sua recusa em assumir a responsabilidade pela reparação gratuita que tinha sido anteriormente discutida por cortesia comercial. Tendo em atenção o que está vertido nos factos provados n.ºs 21 e 26 – 21) Em março de 2019 começou a verificar algumas anomalias no piso, o que denunciou à 1ª Ré – confessado pela A. 26) A Autora voltou a denunciar toda esta situação à 1.ª Ré, verbalmente, em agosto de 2019 –, e atendendo ao teor objectivo da carta que constitui o documento n.º 14 da petição inicial, não se vê qualquer motivo para alterar a redacção deste facto (n.º 38) que se mantém. (iii) Pretende a recorrente que se altere a redacção do facto provado n.º 31 (conclusões 22 a 26). O tribunal a quo deu por provado que: “A 1ª Ré comprometeu-se a arranjar uma solução e a substituir o soalho, mas apenas na zona das cadeiras – confessado em depoimento de parte”. Sustenta a recorrente que “relativamente à obrigação assumida pelas Rés aquando da ida à loja da Recorrida após a denúncia dos defeitos, a Agosto de 2019, resulta do depoimento do legal representante da Recorrida que se deslocaram à loja quer o legal representante da Recorrida, quer o legal representante da 2.ª Ré, e que ambos assumiram reparar” e que “não foi a Recorrente que vendeu e aplicou o soalho à Recorrida pelo que nunca poderia este comprometer-se a substituir o soalho”, acrescentando “se a Recorrente se tivesse comprometido, perante a recusa da 2.º Ré sempre a Recorrente contrataria outra empresa do ramo”. E acrescenta que o seu legal representante “foi informado pelo legal representante da 2.ª Ré de que, atenta a postura do Legal Representante da Recorrida não ia substituir o soalho, nas zonas danificadas, o que a Recorrente transmitiu à Recorrida apenas e só porque recebeu um email por parte da Recorrida em Maio de 2020 relativo a tal assunto” (sic). A recorrente invoca o seguinte meio de prova o depoimento do legal representante da recorrente (passagem de 14:00 a 16:50). Pretende, em consonância, que o facto provado n.º 31 passe a ter a seguinte redacção: 31. A 2.ª Ré, por cortesia comercial para com a Recorrida e para com a Recorrente, comprometeu-se a arranjar uma solução e a substituir o soalho, mas apenas na zona das cadeiras.” Uma vez mais, procedendo à reapreciação da prova gravada, regista-se no depoimento de parte de CC, legal representante da B..., 1.ª ré, que este confirmou que se comprometeu a reparar o pavimento, tentando contextualizar essa promessa como uma mera “cortesia comercial”: afirmou que, quando foi ao local com o Sr. FF, da C..., em Agosto/Setembro de 2019, ambos entenderam que o problema era o desgaste causado pelo uso de cadeiras com rodas sem tapetes de proteção, e não um defeito. Não obstante, apesar de não considerar haver defeito, comprometeu-se, juntamente com o Sr. FF, a reparar o pavimento como um gesto de boa vontade para com um cliente insatisfeito. Concretizou que a promessa se limitava a reparar as zonas danificadas, que, segundo ele, eram exclusivamente aquelas onde estavam as rodas das cadeiras, afirmando que não havia problemas em mais lado nenhum. Aditou que, durante a visita, teria alertado a autora que o problema voltaria a acontecer se não protegessem o pavimento com tapetes adequados. Diversamente, o legal da autora e as suas testemunhas confirmaram que houve um compromisso por parte das rés para resolver o problema: DD referenciou que, após a visita dos Srs. CC e FF, estes disseram que assumiam a substituição do pavimento e que se comprometeram a “substituí-lo todo, até porque aquele o chão não tinha qualidade para estar naquele sítio”; AA confirmou que, na visita de Agosto de 2019, os representantes das rés tomaram contacto com a situação e comprometeram-se a resolver a mesma, demonstrando boa fé; BB, que também esteve presente na visita, atestou que os representantes das rés verificaram que o piso tinha problemas e empenharam-se em tentar arranjar uma data para solucionar o problema. Quando questionado se falaram em substituir apenas algumas peças do pavimento por cortesia, ele negou, insistindo que se comprometeram a solucionar o problema na sua totalidade. Em suma, o facto que o tribunal a quo deu como provado de que “a 1ª Ré comprometeu-se a arranjar uma solução e a substituir o soalho, mas apenas na zona das cadeiras” corresponde, fundamentalmente, à versão apresentada pelo representante legal da 1ª ré, sendo de notar que esta versão foi contestada pela autora e pelas suas testemunhas, que afirmaram que o compromisso foi mais abrangente, visando a solução do problema ou mesmo a substituição total do pavimento, sem a ressalva de ser por cortesia comercial. Deste modo, mantém-se a redacção do facto provado n.º 31. (iv) Anota-se que, nas conclusões do recurso, a recorrente nada refere relativamente à alteração dos factos provados n.ºs 26 e 33. Sabido que o objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões da recorrente, conforme resulta do disposto nos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, nada há que decidir a respeito da pretendida alteração destes factos, que a recorrente apenas deixou subentendida na conclusão 3.ª ao mencionar, genericamente: “A Recorrente entende que, atenta a prova produzida, a matéria de facto dada como provada em 7, 11 a 14, 18, 23, 26, 31, 33 e 38 não poderia ser dada como provada nos termos em que o foi, bem como os factos dados como não provados em e) e g) deveriam ser dados como provados” (sic). Chamado recentemente a pronunciar-se, o Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 148/2025, de 18-02-2025[6], decidiu “Não julgar inconstitucional o artigo 640.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, quando interpretado no sentido de que ao recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto se impõe o ónus suplementar de, no tocante à especificação dos pontos de facto que considera mal julgados, referenciar cada um com o correspondente meio de prova que se indica para o evidenciar”. 1-b) Consideração da matéria de facto não provada sob as alíneas e) e g) como provada. Pretende a recorrente, outrossim, que os indicados factos não provados passem para a integrar matéria de facto provada, nos seguintes termos: – Dar como provado o facto não provado em e), com a seguinte redacção: A 1.ª Ré advertiu a A. de que a resistência desse material era substancialmente inferior ao mosaico que estava inicialmente previsto para o pavimento da fração. – Dar como provado o facto não provado em g), com a seguinte redacção: A 2.ª Ré comprometeu-se perante a Autora a substituir o pavimento na zona das cadeiras por baixo das secretárias. Comecemos por verificar se o facto não provado sob a alínea e) deve ser dado por provado. Procedendo à audição da prova relevante, as versões sobre se a 1.ª ré advertiu a autora sobre a resistência inferior do pavimento vinílico são completamente contraditórias: segundo o representante legal da B..., CC, ele advertiu a autora de que a resistência do pavimento vinílico era substancialmente inferior à do mosaico. Já o legal representante da autora consignou que nunca foi feita qualquer advertência e que, pelo contrário, foi a 1.ª ré quem aconselhou o vinil, apresentando-o como um material vantajoso, tendo inclusive dito que o legal representante da 1ª ré lhe comunicou que o vinil “era um bom material mais resistente e que era lavável”. Quando confrontado directamente com a alegação de que a 1.ª ré o desaconselhou a usar o vinil, foi peremptório e respondeu: “Não, nada disso. Foi ele que o aconselhou”. Em resumo, há duas narrativas opostas: de um lado, o legal representante da 1.ª ré que sustentou que alertou a autora para a menor resistência do material escolhido; de outra banda, as declarações do legal representante da autora que sustentou que nunca recebeu essa advertência e que, na verdade, foi a 1.ª ré quem recomendou o vinil, elogiando as suas qualidades e resistência. Mantém-se assim a matéria não provada sob a alínea e). Por fim, verifiquemos se deve ser dada como provada a matéria da alínea g) Com base audição da prova, uma vez mais, regista-se que as versões sobre o invocado compromisso da 2.ª ré (C...) para substituir o pavimento são contraditórias: enquanto a autora e as suas testemunhas afirmam que houve um compromisso conjunto das duas rés para solucionar o problema de forma geral, a 1.ª ré aludiu, como antes sublinhado, a um compromisso, por “cortesia comercial”, mas limitado à zona das cadeiras e o legal representante da 2.ª ré negou qualquer compromisso posterior. Vejamos melhor este ponto da matéria de facto. Quer o legal representante da autora quer as testemunhas por si arroladas relataram que os representantes de ambas as rés – o Sr. CC, da B... e o Sr. FF, da C... – visitaram o estabelecimento da autora e, tendo constatado os problemas, comprometeram-se a resolver a situação de forma abrangente, sem limitar a intervenção à zona das cadeiras. DD asseverou que, após a visita, ambos disseram que assumiam a substituição do pavimento, detalhando que se comprometeram a substituí-lo todo porque o chão não tinha qualidade. AA, como já antes se frisou, confirmou aquela deslocação, no mês de Agosto de 2019, e o compromisso assumido pelas rés para a resolução da situação, o que ela entendeu como um gesto de boa fé. BB, que presenciou a visita de Agosto de 2019, atestou que ambos os representantes verificaram os problemas no piso e comprometeram-se em tentar arranjar uma data para solucionar o problema, frisando que não se tratou, apenas, da substituição de algumas peças por cortesia, insistindo que o compromisso era resolver o problema do piso sua totalidade. No polo oposto, o legal representante da 1.ª ré relatou que, na visita com o Sr. FF, ambos entenderam que o problema era desgaste por uso e não um defeito de material ou aplicação e que, apesar disso, e por “cortesia comercial”, acederam a reparar as zonas danificadas que eram, exclusivamente, aquelas onde estavam as rodas das cadeiras, condicionando, porém, o sucesso dessa reparação à utilização futura de tapetes de protecção pela autora para evitar que o problema voltasse a acontecer. Por sua vez, o legal representante da C..., FF, confirmou a visita inicial em Agosto de 2019, com o Sr. CC, mas negou qualquer tipo de compromisso posterior ou visitas subsequentes: assim, quando questionado se voltou lá posteriormente, designadamente em Janeiro de 2020, para se comprometer com a reparação, negou esse facto categoricamente referindo que nunca mais voltou ao estabelecimento da autora. Deste modo a versão da 1.ª ré (B...) sobre o que foi acordado conjuntamente com a 2.ª ré, por “cortesia comercial” – A 2.ª Ré comprometeu-se perante a Autora a substituir o pavimento na zona das cadeiras por baixo das secretárias – não tem sustentação na prova produzia e avaliada, sendo certo que o próprio representante da 2.ª ré negou qualquer compromisso de reparação após a visita inicial de Agosto. Em consonância, mantém-se o facto não provado sob a alínea e). * Nestes termos, considerando a reapreciação da prova realizada em sede de recurso, mantém-se a decisão de facto da 1.ª Instância, alterando-se, parcialmente, o texto do facto provado n.º 7: E nos termos da alínea d) da cláusula 4ª do Contrato de Promessa de Compra e Venda, a 1ª Ré obrigou-se a terminar a construção, entre outras, com a aplicação do “pavimento de ambos os pisos (…) à escolha do promitente comprador até um valor máximo de € 10,00/m2 (Dez euros o metro quadrado)”. * 2. Julgamento da matéria de direito (conclusões 28 a 50): Como antes expresso, nas conclusões de recurso, suscitam-se as seguintes questões de direito: 2-a) se a 1.ª ré/recorrente devia ter sido absolvida da instância (conclusões 29 a 34); 2-b) se se verifica caducidade do direito da autora/recorrente ((conclusões 35 a 46): 2-c) se existindo responsabilidade da recorrente a mesma tem de ser limitada ao valor estipulado no contrato-promessa (conclusões 47 e 48); 2-d) se há erro de cálculo no valor da indemnização a pagar pela recorrente e o valor do IVA não deve ser considerado para efeitos de indemnização (conclusões 49 e 50). Façamos a sua análise. 2-a) Relativamente à questão da legitimidade da 1.ª ré é ostensivo que não há qualquer fundamento para a mesma ser absolvida da instância, sendo óbvio que a conclusão da recorrente, segundo a qual “quem incumpriu o contrato firmado com a Recorrida foi a 2.ª Ré, ao não garantir a adequação da tela ao tipo de pavimento que aplicou, pelo que deveria a Recorrente ser absolvida da instância” não tem qualquer tipo de suporte, em face da matéria de facto provada nos autos. Está-se perante uma situação de responsabilidade civil contratual, decorrente da celebração de um contrato-promessa de compra e venda (CPCV) e ulterior outorga de contrato definitivo de compra e venda de um imóvel, relacionada com a aplicação de material na obra executada – anomalias do pavimento flutuante vinílico –, e cuja responsabilidade recai, como bem decidiu a 1.ª Instância, sob o construtor/vendedor. Se não vejamos: A 06-11-2017, a autora e a 1ª ré celebraram um CPCV segundo o qual esta obrigou-se a vender à autora e esta a comprar àquela, livre de ónus e encargos, a fracção autónoma designada pela letra E, do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...16, emergindo da cláusula 2.ª do CPCV que a 1ª ré “(…) encontrava-se a finalizar a construção do edifício (…)”, onde se localizava a fracção prometida vender, a qual, nos termos da cláusula 3ª, destinava-se “(…) a comércio, serviços ou restauração (…)”, tendo-se a 1ª ré obrigado a terminar a construção, entre outras, com a aplicação do “pavimento de ambos os pisos (…)” – alínea d) da cláusula 4ª do CPCV. A autora pretendia instalar naquela fracção, como veio a acontecer, os seus serviços de prestação de serviços de mediação de seguros, para aí laborarem os seus funcionários e receber os seus clientes o que era do conhecimento da 1ª ré. No cumprimento das cláusulas 3.º e 4.º do CPCV, a 1.ª ré forneceu à autora várias opções por si pré-selecionadas de pavimento em flutuante vinílico, a aplicar no piso da fracção, com os respectivos preços de cada opção, tendo a autora escolhido, das várias amostras exibidas pela 1.ª ré, com distintas cores, um dos pavimentos, em flutuante vinílico Medium Grey Foi acordado o fornecimento e a aplicação do pavimento em flutuante vinílico Medium Grey e tela flutuante vinil, e, conforme o CPCV, a autora suportou a diferença entre o preço do limite previsto na cláusula 4.ª desse contrato e o preço do pavimento aplicado, no valor de € 2267,20, tendo pago à 2.ª ré essa quantia, que a si lhe foi facturada. Cumpridas as formalidades atinentes ao cumprimento do CPCV, a escritura pública de compra e venda foi outorgada, entre a autora e a 1.ª ré, a 03-12-2018. Durante a execução da obra a autora verificou que a cor do chão não havia sido a escolhida, o que de imediato foi comunicado e resolvido pelas rés, tendo a autora tomado posse da fracção em Dezembro de 2018 e aberto ao público em Janeiro de 2019, começando a verificar anomalias no piso, em Março de 2019, que denunciou à 1.ª ré. Por volta de Agosto de 2019 o piso da fracção autónoma apresentava mais defeitos no que concerne ao piso flutuante vinílico aplicado, o qual cedeu, sobretudo nas zonas em que existiam mesas e cadeiras, mas também noutras zonas do estabelecimento comercial onde a autora recebia os seus clientes, começando o pavimento a apresentar cedências de diversos tipos, designadamente, riscos, juntas elevadas e dilatadas, relevos anormais, etc., num espaço pouco superior a meio ano, revelando não ser o adequado para este equipamento mas que é o normal e usual para a actividade da autora. A autora voltou a denunciar toda esta situação à 1.ª ré, verbalmente, em Agosto de 2019, e ambas as rés deslocaram-se à sua loja em Agosto de 2019, tendo verificado que na zona das cadeiras das secretárias o piso apresentava desgaste. A 1.ª ré deslocou-se à loja também em Setembro de 2019, tal como a 2.ª ré, tendo aí constatado que as zonas do flutuante onde se situavam as cadeiras apresentavam riscos, tendo-se a 1ª ré comprometido a arranjar uma solução e a substituir o soalho, mas apenas na zona das cadeiras. Os vários tipos de defeitos do piso resultam de má ligação entre o material e a sua aplicação, por se tratar de todo um sistema, o material e a sua aplicação/execução, que requer um tipo de base (ou cama) específica que não existe para o material aplicado, sendo necessário, para reparação dos defeitos, retirar todo o soalho e verificar a base existente e repará-la se necessário, ou aplicar, por cima da existente, outro tipo de material, o que poderá ascender, já com custos imprevistos de electricidade, transportes, comunicações, etc., a € 5500,00 mais IVA, ou seja € 6765,00. Em 25 de Maio de 2020 a autora remeteu à 1ª ré uma carta registada com AR denunciando por escrito os defeitos do piso de flutuante vinílico da loja, devido à falta de qualidade do material ou da sua aplicação, exigindo a sua eliminação como antes se havia obrigado, sob pena de recurso à via judicial, juntando fotografias do piso. A autora solicitou orçamento para remover todo os móveis e equipamento e colocação de novo chão em flutuante vinílico que, em 25-09-2020 importava o custo de valor de € 8085,00 (oito mil e oitenta e cinco euros) acrescido de IVA, tendo enviado esse orçamento à 1.ª ré, por carta com AR de 16-11-2020, através da Il Mandatária, insistindo para a eliminação dos defeitos e que, caso nada fosse feito em 10 dias, iria mandar reparar a outrem as anomalias a expensas da ré. Emerge do supra exposto, que relação contratual provada nos autos foi estabelecida, inequivocamente, entre a autora e a 1.ª ré, não tendo existido qualquer contrato entre a autora e a 2.ª ré, apesar de terem sido funcionários desta a intervir na aplicação material do pavimento flutuante vinílico. Não há dúvidas que a 1.ª ré, no exercício da sua actividade comercial, se comprometeu a vender e a fornecer e a aplicar/montar material de construção num imóvel da autora, mediante um preço. Como estipula o artigo 1207.º do Código Civil, a empreitada “é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço”, podendo tratar-se de uma construção nova, de uma obra de reparação ou de modificação de obra, esta móvel ou imóvel. De acordo com o disposto no artigo 1208.º do Código Civil, “[o] empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato”, e, segundo o estatuído no artigo 762.º do Código Civil: “No cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé.” O vendedor/construtor, na qualidade de empreiteiro, deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o seu valor, ou aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato, o que não é senão o corolário a que qualquer devedor está vinculado no cumprimento das suas obrigações, quais sejam – a prestação deve ser pontualmente cumprida – artigos 406.º, n.º 1, e 762.º, n.º 1, do Código Civil, o solvens deve agir nos termos impostos pela boa-fé – artigo 762.º, n.º 2, do Código Civil e a prestação deve ser efectuada integralmente – artigo 763.º do Código Civil – cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 15-11-2016, Porc. n.º 518/08.7TBANS.C1. São correctas, pois, as considerações da 1.ª Instância quando salienta: “O que sucedeu, aqui, foi que a 1ª Ré, enquanto empreiteira/vendedora, solicitou que o cumprimento parcial do contrato celebrado com a A. fosse feito a terceiro. Explicitando: acordaram que o remanescente do preço do material contratado entre ambas para aplicar na empreitada seria pago e faturado entre a A. e o fornecedor. Ou seja, estamos perante um contrato em que o pagamento é, parcialmente, feito a terceiro, como o permite o artigo 770º a) do C.Civil. Mas ainda que se pudesse desenhar algum tipo de contrato de compra e venda entre a A. e a 2ª Ré, não está em causa o seu incumprimento, de todo. Já que nunca foi demonstrada a má qualidade do material fornecido pela 2ª Ré. O problema está, como resulta da peritagem, no mau “casamento” desse material com a base ou cama executada pela 1ª Ré para o aplicar, que não era a adequada. Também não se demonstra que a 2ª Ré tenha assumido qualquer responsabilidade e a prestar qualquer facto de reparação”. Como se exarou no Acórdão Supremo Tribunal de Justiça, de 13-05-2021, Proc. n.º 1237/15.3T8PVZ.P1.S1[7]: “Uma vez que nos encontramos perante um contrato-promessa de venda de um imóvel em que o promitente vendedor é também o seu construtor, o regime da responsabilidade contratual pelos defeitos da obra no contrato de empreitada é aqui aplicável, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 1225.º, n.º 4, e 410.º, n.º 1, do Código Civil [João Cura Mariano, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, 7.ª ed., Almedina, 2020, pág. 207, Pedro De Albuquerque/Miguel Assis Raimundo, Direito das Obrigações, Contratos em Especial. Contrato de Empreitada, Almedina, vol. II, 2012, pág. 464, e João Serras de Sousa, Código Civil Anotado, vol. I, Almedina, 2017, pág. 1524.]. O facto do contrato-promessa de compra e venda não assegurar ainda a transmissão do direito de propriedade sobre o imóvel não impede a responsabilização do construtor pelos defeitos nele existentes. O promitente-vendedor, com a celebração do contrato-promessa, fica vinculado a abster-se de quaisquer comportamentos que possam comprometer a viabilidade do contrato prometido, tal como fica adstrito à prática dos atos necessários ao cumprimento pontual da sua obrigação de contratar. Daí que a construção defeituosa do imóvel prometido vender, se traduza já num incumprimento a estes deveres acessórios do promitente-vendedor, o que justifica a aplicação do regime previsto para a venda de coisas defeituosas, atento o mencionado princípio da equiparação do regime do contrato prometido ao respetivo contrato-promessa. Com a celebração do contrato-promessa o promitente-vendedor fica vinculado a futuramente transmitir o direito de propriedade sobre um determinado imóvel com as características prometidas. Se, no momento em que deve ocorrer essa transmissão, o imóvel revela vícios ou desconformidades face ao prometido, não salvaguarda os interesses de ambas as partes que o promitente-comprador fique numa posição de escolha entre a resolução do contrato-promessa, frustrando-se o negócio mutuamente desejado por ambas as partes, e a aquisição de um imóvel com defeitos. Não faz sentido ser necessário esperar que se concretize o negócio prometido para que se acionem os mecanismos de harmonização de interesses previstos para a venda de coisas defeituosas, pelo que, aplicando o princípio da equiparação do regime do contrato prometido ao respetivo contrato-promessa, pode o promitente-comprador de imóvel construído pelo próprio vendedor exercer os direitos previstos nos artigoº 1221.º e seg. do C.C., antes da outorga da escritura de compra e venda. Verificando-se a existência de defeitos no imóvel prometido vender pelo seu construtor, pode o promitente-comprador, antes da outorga do contrato de compra e venda, denunciá-los e solicitar a sua eliminação, ou a realização de nova obra, nos termos dos artigos 1221.º e 1225.º do C.C. [João Cura Mariano, ob. cit., pág. 207-209].” No mesmo sentido, propugna-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 05-03-2020, Proc. n.º 3490/14.0TBCSC.L1-2: “A responsabilidade perante o adquirente/comprador de imóvel, pelos defeitos/vícios resultantes da construção, prevista no artigo 1225.º, n.º 4, do CC, é aplicável ao empreiteiro que actua apenas como construtor ou também como construtor vendedor, bem como ao vendedor que tenha sido o seu construtor – no sentido de ter tido o domínio da construção; O conceito de vendedor/construtor não deve ser interpretado num contexto puramente literal, não sendo assim relevante ter materialmente desenvolvido a actividade de construção, mas sim ter o domínio da construção do imóvel, domínio esse desenvolvido no âmbito profissional, pois, só esta amplitude conferida ao conceito de vendedor/construtor permite uma eficaz a protecção do consumidor/adquirente do imóvel, pretendida conferir pelo legislador através do D.L.267/94, nas alterações que introduziu no artº 1225º do Cód. Civil; Deste modo, o que releva não é saber se a Ré desenvolveu materialmente a actividade de construção, mas antes se teve o domínio da construção, se a desenvolveu no âmbito profissional, caso em que responde como construtor, pois adopta-se um conceito amplo de construtor na previsão do nº. 4, do artº. 1225º. A qual tanto abrange o construtor directo, como o que profissionalmente constrói directamente ou mediante contratos com terceiros para vender a adquirentes.” Ou seja, a responsabilidade contratual pelo prejuízo causado ao comprador de um imóvel, pelos defeitos e vícios da obra, é aplicável à vendedora que tenha sido a construtora do imóvel, não sendo relevante que materialmente esta tenha desenvolvido toda a actividade de construção, mas sim que tenha tido o domínio da empreitada. No caso, tendo a 1.ª ré, no âmbito da sua actividade profissional de empreiteira/vendedora, o domínio da construção relativa ao imóvel que edificou e à fracção prometida vender, e que ulteriormente alinenou à autora, é ela a responsável pelo ressarcimento dos danos sofridos por esta, em consequência dos defeitos apresentados pelo piso aplicado. Destarte, existindo defeitos, é a 1.ª ré a única responsável contratual pela sua correcção, sendo certo que não tendo sido posta em causa a possibilidade de a autora peticionar uma quantia pecuniária para esse efeito – como se verá –, apenas há que debater a questão da caducidade. 2-b) Se se verifica caducidade do direito da autora/recorrente ((conclusões 35 a 46). Sustenta a recorrente que, in casu, sempre estaria verificada a caducidade do direito da autora/recorrida, dado que, “aquando da denúncia em Agosto de 2019 teve logo a Recorrida conhecimento da posição da Recorrente – alheia a qualquer substituição – e da 2.ª Ré – ia substituir determinadas zonas do pavimento –, posições que não eram coincidentes com a sua pretensão – substituição total do pavimento. Assim, deve considerar-se Agosto de 2019 a data a partir da qual a Recorrida tinha um ano para intentar a ação judicial para exigir a reparação dos defeitos, atenta a posição das Rés. Partindo do dia 31 de Agosto de 2019 como o dia em que a denúncia dos defeitos tenha sido feita, até à primeira suspensão dos prazos, a 9 de Março de 2020, decorreram 190 dias. De 3 de Junho de 2020 a 25 de Novembro de 2020 decorreram os restantes 176 dias, de modo a completar 366 dias, ou seja, 1 ano para intentar a ação judicial. Assim, o prazo para intentar a presente ação terminou a 26 de Novembro de 2020. A ação deu entrada em Fevereiro de 2021, já muito após a caducidade do direito da Recorrida se verificar” – conclusões 39.ª a 45 (sic). A respeito desta questão a 1.ª Instância teceu as seguintes considerações, após aludir ao regime do artigo 1225.º do Código Civil, que se reproduzem: “Após o aparecimento dos defeitos dentro desse prazo de 5 anos, o dono da obra tem um ano após a sua deteção (e não sobre a entrega da obra) para os denunciar (cfr. º 2 do art. 1225º do Código Civil) e tem o prazo de um ano para pedir judicialmente a sua eliminação e indemnização. Ora, embora em março de 2019 tenham começado a surgir os primeiros problemas, logo denunciados, foi no verão de 2019, mais concretamente em agosto que se verificou a grande parte das anomalias/defeitos no piso. Demonstra-se que a Ré se deslocou à obra em agosto e setembro e procurou arranjar uma solução, comprometendo-se a reparar o pavimento, mas apenas na área por baixo das secretárias e não no piso todo. Nada tendo sido feito – ou tal prova não foi feita – os defeitos foram novamente comunicados em 25 de maio de 2020, por escrito. Assim, o prazo de um ano para a denuncia do defeito, a que se refere o art.º 1225º nº 2 do CC, mostra-se cumprido, dentro do prazo. Nada tendo sido feito pela Ré, o prazo para intentar a ação judicial terminaria, em termos de normalidade (sem suspensão de prazos Covid) no dia 24 de maio de 2021. A presente ação entrou em juízo em 10/02/2021 e a Ré foi citada em 17/02/2021, antes do decurso do prazo de um ano. Entendemos não ser de considerar como inicio de prazo de caducidade agosto de 2019, já que, nessa data, houve, por parte da Ré, manifestação de resolver e reparar os defeitos, ainda que parcialmente. Ora, esse compromisso impediu a A. de agir, de boa fé, pelo que constituiria abuso do direito, se direito houvesse, considerar como início de prazo para agir em juízo a referida data.” Concorda-se, inteiramente, com esta posição, sendo inequívoco que tendo ficado provado que quando a 1.ª ré/recorrente se deslocou à loja da autora, em Agosto de 2019, assumiu e comprometeu-se a reparar os defeitos que àquela data já se verificavam, reconhecimento traduzido na assunção da obrigação de substituição do soalho (embora apenas na zona das cadeiras) esse facto tem um efeito impeditivo do decurso do prazo de caducidade para a instauração da acção destinada a exigir, após a denúncia, a eliminação dos defeitos. Na verdade, quando se verifiquem defeitos na obra, deverá o dono de obra acautelar diversos prazos para exercer os seus direitos, sob pena da sua preclusão, bem como exigir cabalmente o meio idóneo a salvaguardar os seus interesses. De frisar que os prazos e a hierarquia de soluções passíveis de aplicar em face de incumprimentos ou defeitos de obra nas empreitadas de imóveis destinados a longa duração variarão essencialmente consoante o dono de obra seja ou não um consumidor. Assim, caso o dono da obra não seja um consumidor, tal como ocorreu na situação vertente, e na eventualidade de os defeitos apenas terem sido conhecidos posteriormente, deverão ser considerados os seguintes prazos, inscritos no Código Civil: a) O dono da obra deve denunciar os defeitos da obra no prazo máximo de um ano após os detectar, e no prazo de cinco anos após a entrega da obra (ou naquele que for convencionado entre as partes) – artigo 1225.º, n.ºs 1 e 2; b) O dono da obra deve, em 1.º lugar, exigir a eliminação dos defeitos/desconformidades – artigo 1221.º, n.º 1; c) Se a eliminação dos defeitos não for possível, o dono da obra pode exigir uma nova construção – artigo 1221.º, n.º 1, in fine; d) Caso não se verifique nenhuma das possibilidades que antecedem, o dono da obra tem direito à redução do preço, em termos proporcionais, e nos termos previstos para os contratos de compra e venda – artigo 1222.º, n.ºs 1 e 2; e) Por fim, se os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que se destina, o dono da obra pode exigir a resolução do contrato – artigo 1222.º, n.º 1, in fine. O exercício destes direitos, pela ordem indicada, deverá ocorrer no prazo de um ano a partir da denúncia, não precludindo o direito do dono da obra a ser indemnizado, conforme expressamente prevê o artigo 1223.º, devendo exercer esse direito igualmente no ano seguinte à denúncia nos termos do artigo 1225.º, n.º 2, in fine. E deverá ocorrer pela ordem acima indicada, sem prejuízo de, como se entendeu na sentença recorrida, havendo incumprimento definitivo, o dono da obra não ser obrigado a percorrer a hierarquia supra referida, o que, in casu, a 1.ª Instância considerou justificado e não foi questionado pela recorrente. Relativamente aos prazos assinalados, prescreve o n.º 2 do artigo 298.º do Código Civil, acerca da caducidade, que “quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição”. A caducidade configura-se como a extinção do direito pelo seu não exercício durante certo tempo, tendo por base exigências de certeza jurídica e consubstancia uma excepção peremptória – cf., artigo 576º, nºs. 1 e 3, do CPC – e, o seu conhecimento depende da invocação da parte a quem aproveita – cf., artigo 579.º do CPC. O prazo de caducidade “não se suspende nem se interrompe, senão nos casos em que a lei o determine”, começando “a correr no momento em que o direito puder legalmente ser exercido” e só a impede “a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do acto a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo”, a não ser que se trate de “prazo fixado por contrato ou disposição legal relativa a direito disponível”, na qual impede igualmente “a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deva ser exercido” – cf., artigos 298.º, n.º 2, 328.º, 329.º e 331.º, todos do Código Civil. Estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes, “a caducidade é apreciada oficiosamente pelo tribunal e pode ser alegada em qualquer fase do processo”, e sendo “estabelecida em matéria não excluída da disponibilidade das partes”, são-lhe aplicáveis as regras da prescrição, ou seja, não pode ser conhecida oficiosamente, carecendo, para que se opere a sua eficácia, “de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita” – cf., artigos 333.º e 303.º ambos do Código Civil. Por conseguinte, quando autora/recorrida instaurou a acção não se mostrava transcorrido, como bem decidiu a 1.ª Instância, o prazo de caducidade. Contudo, mesmo que assim não se entendesse, tendo-se a 1.ª ré deslocado à obra em Agosto 2019 e Setembro de 2019, e verdade é que procurou arranjar uma solução, comprometendo-se a reparar parcialmente o pavimento – na área por baixo das secretárias – e nada tendo sido feito, os defeitos foram novamente comunicados em 25 de Maio de 2020, por escrito, pelo que o prazo de um ano para a denuncia do defeito, a que alude o artigo 1225.º n.º 2, do Código Civil, mostra-se tempestivamente cumprido. Com efeito, não se deve dar por iniciada a contagem do prazo de caducidade em Agosto de 2019, já que, nessa data, houve, por parte da 1.ª ré, a manifestação de vontade de resolver e reparar os defeitos, ainda que parcialmente, e essa conduta da 1.ª ré impediu a autora/recorrida de agir, razão pela qual constituiria um verdadeiro abuso do direito considerar como início de prazo para agir em juízo a referida data. Em consonância, nada tendo sido feito pela 1.ª ré, o prazo para intentar a acção judicial terminaria, em termos de normalidade – sem suspensão de prazos Covid –, no dia 24-05-2021, i.e., um após a denuncia escrita dos defeitos por carta de 25-05-2020, e, como tal, tendo a acção entrado em juízo em 10-02-2021 e a 1.ª ré sido citada em 17-02-2021, ainda não tinha decorrido o prazo de um ano. Por fim, ainda que o prazo de denúncia se tivesse iniciado em Agosto de 2019, como defende a 1.ª ré/recorrente (cf. conclusões 37.ª e 38.ª), não se teria verificado a caducidade, por força da suspensão dos prazos da Covid-19, que, conforme explicado na sentença recorrida, alargou o prazo de caducidade pelo período de tempo correspondente àquele em que a contagem dos prazos estiveram suspensos – cf., em especial, Lei n.º 1-A/2020, de 19-03, Lei n.º 16/2020, de 29-05, Lei n.º 4-B/2021, de 01-02 – motivo pela qual, tendo a acção sido instaurada no mês de Fevereiro de 2021 e a ré citada nesse mesmo mês, não se verifica a excepção de caducidade, que assim se julga improcedente. 2-c) Se existindo responsabilidade da recorrente a mesma tem de ser limitada ao valor estipulado no contrato-promessa (conclusões 47 e 48); Considera a recorrente que mantendo-se a sua responsabilidade, tem de ser limitada ao valor estipulado no contrato promessa de compra e venda firmado com a recorrida para aquisição do novo pavimento a aplicar na fracção, não podendo ser exigido à recorrente que suporte o valor excedente a € 10,00/m2 do novo pavimento a aplicar na fracção, sob pena de enriquecimento sem causa da recorrida, às custas da recorrente. Salvo o devido respeito não assiste razão à recorrente. O artigo 473.º do Código Civil prescreve: “1. Aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou. 2. A obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou.” In casu, o valor que a 1.ª Instância arbitrou a favor da autora/recorrida, de € 6875,00 (seis mil oitocentos e setenta e cinco euros), acrescida de juros de mora desde a sua citação até efectivo e integral pagamento, foi justificado de forma satisfatória e que não merece reparo, nos seguintes termos: “Após a deslocação à obra, e parcial reconhecimento ou melhor, promessa de reparação, a 1ª Ré nada fez. Foi interpelada uma vez por escrito, em maio de 2020 para eliminar os defeitos sob pena de ação para realização coativa por via judicial e indemnização pelos prejuízos. Nada tendo feito, foi feita a interpelação final admonitória, através de Il Advogada, dizendo que se os defeitos não fossem reparados em 10 dias, a obra seria efetuada por outrem, conforme orçamento junto e pedido judicialmente esse valor. Daqui decorre que a A., através desta interpelação, converteu a mora em incumprimento definitivo, o que lhe assiste o direito de o ver reconhecido – que é o mesmo de pedir o reconhecimento da resolução do contrato. Logo, pode a A. exigir da 1ª Ré indemnização pelo prejuízo, em vez do pedido de reparação, face ao incumprimento definitivo do contrato, imputável a esta. Não há qualquer abuso de direito em reclamar esta indemnização, nem vemos como nem onde pode assentar, dando aqui por reproduzido, também a este propósito, o douto aresto acima referido. A A. vem pedir o valor de 8.085,00€ mais IVA, alicerçada no orçamento junto aos autos. Salvo erro de visualização, percorrendo o processo, não vemos que tenha sido junta fatura / recibo neste valor. E de acordo com a peritagem é aceitável, para os trabalhos necessários para a recolocação de novo piso, o valor de 5.500€ mais IVA, ou seja, 6.875€ Neste valor já se incluem os alegados custos de transportes, eletricidade, etc. Consideramos, por isso, ser o dano patrimonial sofrido pela A, que a Ré deve ser condenada, sem outros danos a liquidar em execução de sentença. Não se demostram danos não patrimoniais da A., indo este pedido improcedente.” (sic). Aderindo a estes argumentos, mantém-se, assim, o valor da indemnização que foi arbitrado pelo tribunal a quo, em € 5500 mais IVA à taxa legal, julgando-se improcedente esta questão do recurso. 2-d) Se há erro de cálculo no valor da indemnização a pagar pela recorrente e o valor do IVA não deve ser considerado para efeitos de indemnização (conclusões 49 e 50). A finalizar, sustenta a recorrente que há um erro no cálculo efectuado pelo tribunal a quo, na indemnização a pagar pela recorrente, pois € 5500,00 mais IVA, resulta na quantia de € 6765,00 e não € 6875,00, e que sendo a recorrida uma sociedade comercial, sujeito passivo de IVA, que poderá deduzir o IVA da obra que venha a efectuar, o valor de tal imposto não deve ser considerado para efeitos de indemnização. No que tange ao cálculo do montante de IVA trata-se de uma operação meramente contabilística a realizar com base na taxa legalmente aplicável. Por conseguinte, considerando o IVA de 23%, o valor correcto será € 6765,00. No mais, não assiste razão à recorrente. Tal como se expendeu no Acórdão do Tribunal da Relação de Porto, de 17-05-2022, Proc. n.º 5631/18.0T8PRT.P1: “O IVA não pode ser exigido sem prévia emissão e apresentação da respetiva fatura, de tal modo que a emissão obrigatória da fatura surge como condição de exigibilidade e vencimento de toda a dívida – remuneração do serviço prestado e IVA correspondente. Enquanto a fatura não for preenchida a obrigação não se pode considerar vencida e exigível e, por isso, não há lugar ao pagamento de juros, impondo-se, por outro lado, a aplicação do disposto no art. 610º, nº 1 do Cód. de Proc. Civil, donde decorre que o pagamento da obrigação se efetuará apenas contra a emissão e apresentação da competente fatura.” Mais recentemente, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04-04-2024, Proc. n.º 2079/19.2T8VRL.G1.S2, com extensa fundamentação e referência à jurisprudência existente, concluiu-se: “(…) II – O imposto sobre o valor acrescentado, com génese na transmissão de bens ou prestação de serviços, tem por único sujeito passivo, a quem onera o vínculo de o pagar à administração fiscal, o transmitente dos bens ou o prestador dos serviços; III – Ao repercutir-se na retribuição que é necessário despender para conseguir, mediante a aquisição de algum bem ou a execução de tarefa, repor ou restaurar a esfera patrimonial lesada, o IVA integra o encargo global devido sem o qual a reposição ou restauração patrimoniais não são atingidas”. Ter-se-á, pois, de considerar o valor total indemnizatório de € 5500 mais IVA à taxa legal, acrescido de juros de mora desde a sua citação até efectivo e integral pagamento. Termos em que se julga o recurso totalmente improcedente. As custas processuais recaem sobre a apelante ex vi arts. 527.º, 607.º, n.º 6, e 663.º, n.º 2, todos do CPC. * Sumário (artigo 663.º, n.º 7, do CPC): (…). Decisão: Em face do exposto, decidem os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação mantendo a condenação da 1.ª ré/recorrente a pagar à autora/recorrida o valor (corrigido) de € 6765,00 (seis mil setecentos e sessenta e cinco euros), acrescidos de juros de mora desde a sua citação até efectivo e integral pagamento. Custas a cargo da apelante 
 Coimbra, 30 de Setembro de 2025 
 Luís Miguel Caldas Hugo Meireles Cristina Neves 
 
 
 [1] Juiz Desembargador relator: Luís Miguel Caldas /Juízes Desembargadores adjuntos: Dr. Hugo Meireles e Dra. Cristina Neves. [2] Como se verá, a recorrente omitiu qualquer outra referência, nas conclusões, à impugnação dos factos provados 26 e 33, que apenas mencionou na conclusão 3.ª [3] Publicado em http://www.dgsi.pt, tal como os demais que se mencionarem nesta decisão. [4] Sumaria-se nesse aresto: “O nosso regime de sindicância da decisão de facto pela 2.ª instância tem em vista não um segundo julgamento latitudinário da causa, mas sim a reapreciação dos juízos de facto parcelares impugnados, na perspetiva de erros de julgamento específicos, o que requer, por banda do impugnante, uma argumentação probatória que, no limite, os configure”. [5] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Volume I – Parte Geral e Processo de Declaração, 2019, p. 720, mencionam que o juiz deve “expor a análise crítica das provas que foram produzidas, quer quando se trate de prova vinculada, em que a margem de liberdade é inexistente, quer quando se trate de provas submetidas à sua livre apreciação, envolvendo os motivos que o determinaram a formular o juízo probatório relativamente aos factos considerados provados e não provados”. [6] Acessível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20250148.html. |