Decisão Texto Integral: |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:
I.
1. AA instaurou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra o INAC-Instituto Nacional de Aviação Civil, I.P.[1], pedindo a condenação deste no pagamento da quantia de € 81.291,22, a título de subsídio de isenção de horário de trabalho, acrescida de juros de mora legais e juros compulsórios.
Para tanto, alegou, em síntese, que em 23.02.2000 foi admitido ao serviço do réu, mediante contrato de trabalho, tendo, entre 02.03.2000 e 11.03.2008, exercido funções de chefia em regime de comissão de serviço e de isenção de horário de trabalho, sem ter auferido o subsídio devido por esta isenção.
2. O réu contestou, sustentando que não foram cumpridos os requisitos formais exigidos para a atribuição daquele subsídio.
3. Julgada parcialmente procedente a ação, o R. foi condenado a pagar ao A. a quantia de € 80.736,25, acrescida de juros de mora, até integral pagamento.
4. Interposto recurso de apelação pelo R., o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) negou-‑lhe provimento.
5. Mais uma vez inconformado, o R. veio interpor a presente revista excecional, que a formação prevista no n.º 3 do art. 672.º do CPC admitiu.
Essencialmente, e na parte que ora releva, sustenta o mesmo nas respetivas conclusões:
– O pessoal do INAC, e mais concretamente o seu pessoal dirigente, ficou sujeito, a partir da sua nomeação e até 01.01.2009 (data em que entra em vigor o Regime de contrato de trabalho em funções públicas) a um regime especial, enquadrado e moldado pelos seus Estatutos e Regulamentos, pelas normas de direito público de carácter imperativo constantes, designadamente, da Lei n.º 3/2004, de 15.01 [Lei-Quadro dos Institutos Públicos, artigos 6° n.ºs 1 e 2, alínea a), e 34° n.ºs 1 e 4], da Lei n.º 2/2004, de 15.01 [Estatuto do Pessoal Dirigente, cfr. art. 1°, n.º 2, e arts. 13° a 17°, relativos ao exercício de funções pelo pessoal dirigente], da Lei n.º 23/2004, de 22 de Junho [Regime jurídico do contrato individual de trabalho na administração pública, cfr. art. 6°] e, subsidiariamente, e em tudo o que não seja afastado pelo regime estatutário, regulamentar ou de direito público imperativo vigente, pelo regime do contrato individual de trabalho.
– Os art. 13.° a 17.° do Estatuto do pessoal Dirigente, aprovado pela Lei n° 2/2004, de 15.01, consagram a sujeição normativa do pessoal dirigente ao regime de isenção de horário de trabalho, sem que, por isso, lhe seja devida qualquer remuneração por trabalho prestado fora do período normal de trabalho.
– Embora no Regulamento de horário de trabalho se estabeleça que os dirigentes estão isentos de horário de trabalho, nem nele, nem no Regulamento de Carreiras e Regime Retributivo do INAC, se prevê o pagamento do subsídio de isenção de horário.
– Não há lugar à aplicação subsidiária do regime geral constante do Código do Trabalho, relativo à remuneração do Regime de Isenção de Horário, como considerou o Acórdão recorrido, dado não se estar perante uma situação não regulada e omissa nos Estatutos do INAC, e por a tal se opor o regime especial de direito público a que o seu pessoal se encontra sujeito.
– O regime legal do Código do Trabalho que prevê o pagamento do subsídio de isenção de horário não é aplicável a Instituições Públicas e depende do cumprimento de requisitos legais que não se verificam na situação em apreço, não podendo aceitar-se que os mesmos são irrelevantes (caso da não comunicação à IGT) ou se mostram ainda assim cumpridos (exigência de acordo das partes a instituir tal regime), como foi considerado.
– A convicção que sempre existiu foi a de que a isenção de horário apenas dispensava os dirigentes do cumprimento de um horário de trabalho diário, nunca tendo sido reconhecido pelo INAC, nem pelos dirigentes, que tal situação lhes conferia o direito a auferir tal suplemento remuneratório.
– Não tendo a IGT competência para exercer a sua ação junto do R. nesta matéria, por se tratar de um Instituto Público, terá que se entender que o regime de isenção de horário previsto no Código do Trabalho não lhe é aplicável, pelo que o direito ao correspondente subsídio nunca se poderia ter validamente constituído.
– No que respeita ao facto de o Recorrente ter remunerado, a esse título, duas trabalhadoras, fê-lo em momento anterior à notificação pela IGF do seu Relatório Final de Auditoria e no pressuposto erróneo de que o podia fazer.
– Os princípios da igualdade e da paridade retributiva cedem perante a constatação da ilegalidade de tal pagamento, não podendo um ato ilegal servir de precedente para que se continuem a cometer sucessivas ilegalidades.
6. O A. contra-alegou, pugnando pelo improvimento do recurso.
7. A Ex.m.ª Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se no sentido de ser concedida a revista, em parecer a que apenas respondeu o A., na linha do antes sustentado nos autos.
8. Inexistindo quaisquer outras de que se deva conhecer oficiosamente, em face das conclusões da alegação de recurso, a única questão a decidir[2] é a de saber se o recorrido tem direito à retribuição por isenção de horário, relativamente ao trabalho prestado no período compreendido entre 02.03.2000 e 11.03.2008.
E decidindo.
II.
9. A matéria de facto fixada pelas instâncias é a seguinte[3]:
1 - Em 23 de fevereiro de 2000, autor e réu subscreveram o documento intitulado Contrato Individual de Trabalho (sem termo), junto de fls. 30 a 31 (...).
2 - Em 30 de Janeiro de 2001, o conselho de administração do réu deliberou manter em vigor o regulamento de horário de trabalho da direção-geral da aviação civil publicado no diário da república, II série, n.º 183, de 9 de Agosto de 1990;
3 - Em 5 de julho de 2002, autor e réu subscreveram o documento intitulado Acordo Relativo ao Exercício de Cargos em Regime de Comissão de Serviço junto de fls. 43 a 44, (...) do qual consta, designadamente:
(…) [É] celebrado o presente acordo para o exercício de funções de órgão de estrutura, em regime de comissão de serviço, nos termos do D.L. n.º 404/91, de 16 de Outubro, aditado pela Lei n.º 118/99, de 11 de Agosto e do Capítulo III do Regulamento de Carreiras do INAC, aprovado pelo despacho conjunto n.º 38/2000, datado de 28 de Outubro de 1999 e publicado na II série do DR n.º 11 em 14 de Janeiro de 2000.
1ª O primeiro outorgante exercerá as funções correspondentes ao cargo de chefe de departamento de recursos materiais (TOE III), em regime de comissão de serviço, nos termos do Capítulo III do despacho supramencionado;
2ª A comissão de serviço produzirá os seus efeitos à data de 02/03/00 com a duração de três anos, sendo automaticamente renovável por iguais períodos, salvo se o Conselho de Administração ou o primeiro outorgante comunicar à outra parte, até 30 dias antes da data do termo da comissão de serviço, a vontade de não proceder à renovação (…);
4 - Em 17 de março de 2003, autor e réu subscreveram o documento intitulado Acordo Relativo ao Exercício de Cargos em Regime de Comissão de Serviço, junto de fls. 45 a 46 (...), do qual consta, designadamente:
(…) [É] celebrado o presente acordo para o exercício de funções de titular de órgão de estrutura, em regime de comissão de serviço, nos termos do D.L. n.º 404/91, de 16 de Outubro, aditado pela Lei n.º 118/99, de 11 de Agosto e do Capítulo III do Regulamento de Carreiras do INAC, aprovado pelo despacho conjunto n.º 38/2000, datado de 28 de Outubro de 1999 e publicado na II série do DR n.º 11 em 14 de Janeiro de 2000.
1ª O primeiro outorgante exercerá as funções correspondentes ao cargo de chefe de departamento de serviços gerais (TOE III), em regime de comissão de serviço, nos termos do Capítulo III do despacho supramencionado;
2ª A comissão de serviço produzirá os seus efeitos à data de 12/03/03 com a duração de três anos, sendo automaticamente renovável por iguais períodos, salvo se o Conselho de Administração ou o primeiro outorgante comunicar à outra parte, até 30 dias antes da data do termo da comissão de serviço, a vontade de não proceder à renovação (…);
5 - Em 14 de março de 2006, autor e réu subscreveram o documento intitulado Acordo Relativo ao Exercício de Cargos em Regime de Comissão de Serviço junto de fls. 47 a 49 (...), do qual consta, designadamente:
(…) [É] o presente acordo para o exercício de funções de órgão de estrutura, em regime de comissão de serviço, nos termos dos artigos 244º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto e do Capítulo III do Regulamento de Carreiras do INAC, aprovado pelo despacho conjunto n.º 38/2000, datado de 28 de Outubro de 1999 e publicado na II série do DR n.º 11 em 14 de Janeiro de 2000.
1ª O primeiro outorgante exercerá as funções correspondentes ao cargo de chefe de projeto de infra-estruturas tecnológicas, em regime de comissão de serviço, a partir de 12 de março de 2006, nos termos do Capítulo III do despacho acima mencionado, sendo remunerado pelo nível TOE III (…);
2ª A comissão de serviço terá a duração de um ano, sendo automaticamente renovável por iguais períodos, salvo se o Conselho de Administração ou o primeiro outorgante comunicar à outra parte, até 30 ou 60 dias antes da data do termo da comissão de serviço, conforme prestação de trabalho em regime de comissão de serviço tenha durado, respetivamente, até dois anos ou por período superior, a vontade de não proceder à renovação (…);
6 - Na sequência da subscrição dos acordos referidos em 3, 4 e 5 o autor desempenhou funções de chefe de departamento e de projeto no INAC desde 2 de março de 2000 até 11 de março de 2008;
7 - O autor desempenhou as funções referidas em 6 ininterruptamente, em regime de isenção de horário de trabalho;
8 - Desde 2 de março de 2000 até 11 de março de 2008, o autor trabalhou, em regra, mais de 7 horas diárias;
9 - (…) [O] réu não pagou ao autor quantias a título de trabalho suplementar;
10 - BB remeteu ao presidente do conselho diretivo do réu, que a recebeu, a carta datada de 4 de Maio de 2009, junta de fls. 76 a 86 (…);
11 - Em 18 de Maio de 2009, a direção-geral da administração e do emprego público (dgaep) emitiu o parecer junto de fls. 89 a 90 (…), do qual consta, designadamente:
(…) Em resposta ao ofício acima referenciado, que acompanhava um requerimento da Dra. BB, cumpre-me informar V. Exa. do seguinte:
Presumindo que a situação de isenção de horário da trabalhadora foi legalmente constituída, com observância do disposto no artigo 13º do Decreto-Lei n.º 409/71, de 27 de Setembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 398/91, de 16 de Outubro e pela Lei n.º 61/99, de 30 de Junho, esta Direção Geral considera que, até 31 de Dezembro de 2008, assiste à trabalhadora o direito à retribuição especial prevista, primeiro no art. 14º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 409/71, de 27 de Setembro e, depois, no artigo 256º, n.º 2 do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto.
Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 3º e 88º, da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, a trabalhadora requerente transitou para o regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas (RCTFP), aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, com efeitos reportados à data de entrada em vigor deste diploma (1 de Janeiro de 2009, como previsto no artigo 23º da parte preambular).
Não obstante esta transição, o direito à retribuição assiste também à trabalhadora a partir de 1 de Janeiro de 2009, como de seguida se justifica, transcrevendo entendimento já sustentado por esta Direção Geral (…);
12 - Em 28 de Julho de 2009, o chefe do departamento de recursos humanos do réu emitiu o parecer junto de fls. 91 a 94 (…), do qual consta, designadamente:
(…) Propõe-se superiormente que o INAC, I.P, proceda, a partir de Agosto/2009, ao pagamento da isenção de horário de trabalho a todos os trabalhadores que atualmente exercem funções de dirigente intermédio (1º e 2º grau) até ao final das respetivas comissões de serviço, nos termos do disposto no art. 256º, n.º 2, do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, por força do parecer da DGAEP e dado que esta norma vigorava à data da constituição das comissões de serviço (…);
13- Na sequência do parecer referido em 12, em 30 de Julho de 2009, o conselho diretivo do INAC aprovou a deliberação junta de fls. 95 a 96 (…), da qual consta, designadamente:
(…) o C. D. deliberou, por unanimidade, que, tendo em conta a interpretação contida no parecer supra mencionado e desde que se verifique a existência de disponibilidade orçamental e respetiva cabimentação, deverão ser processados, a partir do vencimento do mês de Agosto, a todos os atuais dirigentes os subsídios mensais correspondentes ao valor mínimo previsto na lei, a título de complemento remuneratório, até que sejam revistos ou extintos (…);
Quanto ao requerimento apresentado pela Dra. BB, no âmbito do qual requer a este Conselho Diretivo que lhe seja comunicada a decisão sobre o seu pedido, após ter tido conhecimento do teor do parecer da DGAEP, deliberou este Conselho Diretivo, e mais uma vez na sequência do mencionado parecer, que analisa casuisticamente o caso desta dirigente, uma vez que o seu requerimento foi remetido àquela Direcção-Geral, que tendo a mesma solicitado o pagamento dos créditos laborais que lhe são devidos, com efeitos retroativos, deverão os mesmos ser pagos nos termos solicitados, verificadas que estejam as condições de disponibilidade e de cabimento orçamental (…);
14 - Em 17 de Dezembro de 2009, o conselho diretivo do INAC aprovou a deliberação junta a fls. 98 (…), da qual consta, designadamente:
(…) Na sequência da Informação n.º …/2009, de 26 de Novembro, o C.D. tomou conhecimento do ponto de situação quanto ao apuramento dos créditos laborais reclamados pelos colaboradores do INAC, I.P, que se encontra a ser efetuado pela Direção de Gestão de Recursos/Departamento de Recursos Humanos, referente ao suplemento de isenção de horário de trabalho, tendo deliberado proceder à regularização do pagamento de suplemento de isenção de horário de trabalho a todos os atuais dirigentes do INAC, I.P. relativamente ao período de 1 de Janeiro de 2009 a 31 de Julho de 2009 (…);
15 - Na sequência da deliberação referida em 14, o réu pagou retroativos do suplemento de isenção de horário de trabalho a todos os seus dirigentes, desde o mês de janeiro de 2009 até 31 de julho de 2009;
16 - O autor remeteu ao presidente do conselho diretivo do réu, que a recebeu, a carta datada de 21 de agosto de 2009, junta a fls. 103 (…), da qual consta, designadamente:
(…) tendo tomado conhecimento que em 31 de julho de 2009, na reunião de Diretores, o Conselho Diretivo anunciou que tinha deliberado a atribuição do subsídio de isenção de horário aos dirigentes a partir de 20 de Agosto de 2009.
Nestes termos, vem o requerente a V. Exa., o pagamento dos retroativos referentes ao subsídio de isenção de horário, uma vez que foi nomeado, em regime de comissão de serviço, na reunião do Conselho de Administração, na sessão ordinária de 28 de fevereiro de 2000, Chefe de Departamento de Recursos Materiais, a partir de 2 de março de 2000 até 1 de março de 2003. Em reunião do Conselho de Administração, na sessão ordinária n.º 9/2003, de 11 de março de 2003, foi nomeado Chefe de Departamento de Serviços Gerais, a partir de 12 de março de 2003 até 11 de março de 2006. Em reunião do Conselho de Administração, na sessão ordinária n.º 8/2006, de 14 de março de 2006, foi nomeado Chefe de Projeto de Infra-Estruturas Tecnológicas, a partir de 12 de março de 2006 até 11 de março de 2008, altura em que cessou a sua comissão de serviço (…);
17 - O autor remeteu ao vice-presidente do conselho diretivo do réu, que a recebeu, a carta datada de 23 de fevereiro de 2011, junta a fls. 104 (…);
18 - BB iniciou funções de dirigente no réu, como chefe do departamento de consultoria e contencioso da direção de assuntos jurídicos, em 31 de Março de 2000;
19 - Desde 31 de Março de Março de 2000 até 31 de Julho de 2009, BB desempenhou as funções descritas em 18, em regime de isenção de horário de trabalho;
20 - Na sequência da deliberação referida em 13, em Agosto de 2009, o réu pagou a BB retroativos do suplemento de isenção de horário de trabalho referentes ao período compreendido de 31 de Março de 2000 até 31 de Julho de 2009;
21 - No âmbito do processo n.º. 1720/11.0TTLSB, do 2º Juízo, 2ª secção, (…) CC, reclamou do réu o pagamento de subsídios de isenção de horário de trabalho, correspondentes ao período compreendido entre 2 de Março de 2000 e 31 de Dezembro de 2008;
22 - CC desempenhou funções de dirigente no réu, em regime de comissão de serviço e de isenção de horário de trabalho, desde 2 de Março de 2000 até 31 de Dezembro de 2008;
23 - O processo judicial referido em 21 terminou com a prolação, em 12 de Setembro de 2011, de sentença homologatória de transação junta pelas partes;
24 - (…)
25 - No ano de 2011 o réu foi alvo de fiscalização pela Inspeção-Geral das Finanças que, entre outros assuntos, incidiu sobre o pagamento do suplemento de isenção de horário de trabalho aos titulares de cargos de chefia e direção e concluiu que: a atribuição de retroativos de isenção de horário de trabalho àquela dirigente (BB) bem como o seu pagamento aos restantes dirigentes em exercício, não tinha suporte legal, configurando-se como pagamentos sem norma legal habilitante (…);
26 - Em resposta ao relatório de auditoria referido em 25, o réu remeteu à IGF o documento junto de fls. 322 a 340.
III.
10. A Relação atribuiu ao A. as quantias em discussão nos autos, a título de subsídio de isenção de horário de trabalho, com base na seguinte fundamentação:
“(...)
O período em causa está compreendido entre 2 de Março de 2000 a 11 de Março de 2008, pelo que não cumpre aplicar ao caso em apreço, ao contrário do que defende o recorrente, a lei n.º 59/2008, de 08.09.
Conforme resulta do disposto no art. 21.º, n.º 1, dos Estatutos do recorrente anexos ao diploma que o criou [DL n.º 133/98(-), de 15.05], o recorrido estava sujeito ao regime jurídico do contrato individual do trabalho, com as especialidades previstas nos referidos Estatutos e seus regulamentos.
Os créditos reclamados pelo recorrido respeitam ao período anterior ao CT de 2003 e ao período de vigência deste diploma.
O Decreto-Lei n.º 409/71, de 27 de Setembro (na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 398/91, de 16/10 e pela lei n.º 61/99, de 30.06) estipulava sob o art. 13º:
«1- Poderão ser isentos de horário de trabalho, mediante requerimento das entidades empregadoras, os trabalhadores que se encontrem nas seguintes situações:
a)- Exercício de cargos de direção, de confiança ou de fiscalização;
b)- Execução de trabalhos preparatórios ou complementares que pela sua natureza só possam ser efectuados fora dos limites dos horários normais de trabalho;
c)- Exercício regular da atividade fora do estabelecimento, sem controlo imediato da hierarquia.
2- Os requerimentos de isenção do horário de trabalho, dirigidos ao Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, serão acompanhados da declaração de concordância dos trabalhadores, bem como dos documentos que sejam necessários para comprovar os factos alegados.
3- Aos requerimentos referidos no número anterior é aplicável o disposto nos n.ºs 5 a 7 do art. 10º.»
O art. 50.º da LCT estabelecia o direito a uma retribuição especial para os trabalhadores isentos de horário de trabalho.
Discutia-se na jurisprudência se a autorização do IGT constituía uma formalidade ad substantiam para a validade e eficácia do regime de isenção de horário de trabalho (por estarem em causa interesses de natureza pública) ou se o acordo entre as partes era vinculativo (neste sentido, Acórdão do STJ de 08.02.2001, www.dgsi.pt).
Neste domínio concordamos com a posição perfilhada no Acórdão do STJ de 13.09.2006, www.dgsi.pt, que considerou que a autorização prévia por parte da Inspeção-geral do Trabalho configurava como uma formalidade ad substantiam para a validade e eficácia daquele regime de isenção.
No caso em apreço não resulta que tal autorização tenha sido pedida, mas tal não terá como consequência a invalidade do regime de isenção de trabalho.
Com efeito, conforme refere o Acórdão desta Tribunal da Relação de 11.09.2013 (inédito) - processo n.º 408/12.9TTLSB.L1 : «Por outro lado, não havia sujeição a autorização da IGT, nos termos do regime geral constante do art.º 13.º da LDT porquanto, de acordo com o disposto pelo art.º 2.º do DL 102/2000, de 2/6, a IGT apenas tinha competência para exercer a sua acção junto da “administração pública central, direta e indireta, e local, incluindo institutos públicos nas modalidades de serviços personalizados ou de fundos públicos”, em matéria respeitante à promoção e controle do cumprimento da legislação relativa à segurança, higiene e saúde no trabalho e a matéria de isenção de horário não se enquadra diretamente nessa previsão».
O Acórdão desta Relação de 18.06.2014 (www.dgsi.pt) perfilhou o mesmo entendimento, ao apreciar uma situação similar à dos presentes autos e ao concluir : «Ora, a ser assim, essa ausência de comunicação e autorização por parte daquele organismo estatal perde qualquer relevância jurídica na economia dos autos».
O CT de 2003 veio alterar o regime jurídico da isenção de trabalho e estabeleceu sob os arts. 177º e 178º:
(...)
Deste regime ressalta a necessidade de acordo escrito.
Ora, no caso em apreço, resulta do ponto n.º 2 dos factos provados que em 30 de Janeiro de 2001 o conselho de administração do réu deliberou manter em vigor o regulamento de horário de trabalho da direção-geral da aviação civil publicado no diário da república, II série, n.º 183, de 9 de Agosto de 1990.
Este regulamento estabelecia que ao pessoal dirigente e de chefia, embora isento de horário de trabalho, é aplicável a obrigatoriedade de prestação mínima de 35 horas de trabalho semanal ou equivalente mensal.
(...)
O recorrente manteve (...) o regulamento que estabelecia que os cargos de chefia eram exercidos em regime de isenção de horário de trabalho.
O recorrido, ao celebrar os acordos relativos ao exercício de cargo de chefia em regime de comissão de serviço, sabia que os mesmos tinham como pressuposto o regime de isenção de horário, pelo que a celebração dos referidos acordos implicou a aceitação da isenção de horário de trabalho que passou, desta forma, a integrar o contrato de trabalho, não sendo necessária, na nossa perspectiva, a menção, de novo, de tal isenção no acordo de comissão de serviço de 14 de Março de 2006 ( celebrado ao abrigo do CT de 2003).
Mesmo que se entenda que era necessária tal menção, a conduta do recorrente, ao instituir o regime de isenção de horário de trabalho que vigorou de 2 de Março de 2000 até 11 de Março de 2008, nos termos acima indicados, e ao invocar, posteriormente, a falta de acordo escrito configura uma situação de abuso de direito, nos termos previstos no art. 334º do Código Civil, por exceder manifestamente os limites impostos da boa-fé (vide Acórdão desta Relação de 18.06.2014 acima indicado).
Refere o recorrente que o Regulamento prevê que os dirigentes estão isentos de horário de trabalho, mas não prevê o pagamento do subsídio de isenção de horário.
Quanto a estes aspecto, consideramos que ao recorrido assiste o direito à retribuição por isenção de horário, ao abrigo do disposto no art. 50.º da LCT e no art. 256.º do CT de 2003.
Entendemos ainda que destes preceitos, em conjugação com os demais normativos acima indicados, resulta que o pagamento da retribuição de horário de trabalho não está em desconformidade com a lei, pelo que inexiste violação do disposto no art. 22.º, do DL n.º 155/92, de 28.07.
(...)
Concordamos ainda com o Tribunal a quo quando refere que deverá ser reposta a paridade retributiva com a trabalhadora BB.
(...)
O recorrido e BB exerciam cargos de chefia e dentro das mesmas condições de trabalho nos aspectos que ora nos ocupam: o trabalho era prestado em comissão de serviço e em regime isenção de horário de trabalho dentro do mesmo quadro normativo.
(...)”
Vejamos.
11. O Instituto Nacional de Aviação Civil (INAC) sucedeu à Direção-Geral da Aviação Civil e foi criado pelo DL n.º 133/98, de 15 de maio, diploma que também aprovou os respetivos estatutos.
Este diploma veio a ser parcialmente revogado pelo DL n.º 145/2007, de 27 de abril, tendo os Estatutos do INAC sido substituídos pelos aprovados através da Portaria n.º 543/2007, de 30 de abril.
Entretanto, foi publicada a Lei n.º 67/2013, de 28 de agosto, que aprovou a Lei-quadro das entidades administrativas independentes com funções de regulação da atividade económica dos sectores privado, público e cooperativo, a qual veio redenominar o INAC, que passou a designar-se Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC), reconhecendo-‑lhe a natureza jurídica de entidade reguladora independente.
Nessa sequência, veio a ser aprovado o DL n.º 40/2015, de 16 de março, diploma que aprovou os estatutos da ANAC e revogou o DL n.º 145/2007, de 27 de abril, e a Portaria n.º 543/2007, de 27 de abril.
12. No caso dos autos, está provado que, em 23 de fevereiro de 2000, o então INAC e o Autor celebraram um contrato individual de trabalho (sem termo), reivindicando o Autor o direito à retribuição por isenção de horário de trabalho relativa ao trabalho prestado no período compreendido entre 02.03.2000 e 11.03.2008.
Em face do regime jurídico em vigor neste período, constata-se que o INAC assumia a natureza de um instituto público dotado de personalidade jurídica, autonomia administrativa e financeira e património próprio, sujeito à tutela e superintendência do Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, regendo-se pelo disposto nos respetivos estatutos, por quaisquer outras normas legais e regulamentares aplicáveis aos institutos públicos e, subsidiariamente, pelas normas de direito privado, salvo relativamente a atos de autoridade ou cuja natureza exija recurso a normas de direito público.
O pessoal do INAC já então estava sujeito ao regime jurídico do contrato individual de trabalho, embora com as especialidades previstas na lei e nos respetivos estatutos e regulamentos, pelo que nos encontramos perante relações laborais (sui generis) não exclusivamente reguladas pelo direito privado.
Concretizando:
Os regulamentos de carreiras e disciplinar, bem como o regime retributivo do pessoal do INAC, foram aprovados por Despacho conjunto n.º 38/2000, publicado no DR n.º 11, II Série, de 14 de janeiro de 2000, prevendo o art. 4.º, n.º 2, deste último regime (retributivo) que “Nos casos omissos, o regime retributivo aplicável será o decorrente do regime legal do contrato individual de trabalho”.
Do conjunto de normas legais aplicáveis aos institutos públicos, e logo também ao INAC, há ainda a destacar:
- A Lei-Quadro dos Institutos Públicos, aprovada pela Lei n.º 3/2004, de 14.01;
- O Estatuto do Pessoal Dirigente dos Serviços e Organismos da Administração Pública, aprovado pela Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro;
- O Regime jurídico do contrato individual na administração pública, aprovado pela Lei n.º 23/2004, de 22 de junho (entretanto revogado e substituído pelo Regime do contrato de trabalho em funções públicas, aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, por sua vez entretanto também já revogado pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho).
De acordo com o art. 34.º, da Lei n.º 3/2004 (preceito legal entretanto revogado pela Lei n.º 64-‑A/2008 de 31.12, mas em vigor à data dos factos sob análise), os institutos públicos podiam adotar o regime do contrato individual de trabalho em relação à totalidade ou a parte do respetivo pessoal, sem prejuízo de, quando tal se justificasse, adotarem o regime jurídico da função pública (n.º 1), sendo que o pessoal dos institutos públicos estabelecia uma relação jurídica de emprego com o respetivo instituto (n.º 2).
O n.º 4 do referido preceito dispunha, por seu turno, que “Nos termos do artigo 269.º da Constituição, a adoção do regime da relação individual de trabalho não dispensa os requisitos e limitações decorrentes da prossecução do interesse público, nomeadamente respeitantes a acumulações e incompatibilidades legalmente estabelecidas para os funcionários e agentes administrativos”.
O art. 13º, da Lei n.º 2/2004, aplicável aos institutos públicos (art. 1º, n.º 2) prevê que “o pessoal dirigente está isento de horário de trabalho, não lhe sendo, por isso, devida qualquer remuneração por trabalho prestado fora do período normal de trabalho”.
Por sua vez, o art. 2.º da Lei n.º 23/2004, diploma vigente até 31.12.2008, estatuía que “aos contratos de trabalho celebrados por pessoas coletivas públicas é aplicável o regime do Contrato de Trabalho e respetiva legislação especial, com as especificidades constantes da presente lei”, dispondo o art. 6.º que “As pessoas coletivas públicas cujas estruturas tenham funções dirigentes em regime de contrato de trabalho apenas podem contratar pessoal para as referidas funções em regime de comissão de serviço prevista no Código do Trabalho” (n.º 1), bem como que “Os trabalhadores que exerçam funções em regime de comissão de serviço nos termos do número anterior estão sujeitos ao mesmo regime de incompatibilidades, bem como aos deveres específicos do pessoal dirigente da Administração Pública” (n.º 2).
13. No caso dos autos, está provado que o Autor desempenhou funções de chefe de departamento e de projeto no INAC entre 2 de março de 2000 e 11 de março de 2008, em regime de isenção de horário de trabalho.
Nem nos estatutos do INAC, nem nos supra mencionados regulamentos (aprovados por Despacho conjunto n.º 38/2000), se prevê matéria referente a horário de trabalho, isenção de horário ou subsídio de isenção, embora, em 30 de janeiro de 2001, o conselho de administração do INAC tenha deliberado manter em vigor o regulamento de horário de trabalho da Direção-Geral da Aviação Civil, publicado no Diário da República, II série, n.º 183, de 9 de agosto de 1990, regulamento este que estabelecia que ao pessoal dirigente e de chefia, embora isento de horário de trabalho, era aplicável a obrigatoriedade de prestação mínima de 35 horas de trabalho semanal ou equivalente mensal.
A partir de 01.01.2009, a questão de saber se quem exercia cargos de direção e de chefia tinha direito a um suplemento remuneratório, ficou expressamente resolvida pela negativa (art. 209.º, da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro[4], e art. 164.º, da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho[5]), ao contrário do que acontecia até então.
Na verdade, nenhum dos diplomas acima enunciados (designadamente os estatutos do INAC e o regime retributivo do seu pessoal) previa a atribuição de um suplemento remuneratório a quem exercesse funções de dirigente/chefia no seio do INAC.
14. Lançando mão do regime da relação individual de trabalho previsto na LCT (art. 50.º) e no CT/2003 (art. 256.º), as instâncias concluíram que o Autor tinha direito a ser remunerado pelo exercício – em regime de isenção de horário de trabalho – das funções de chefe de departamento e de projeto no INAC, no aludido período compreendido entre 2 de março de 2000 e 11 de março de 2008.
No entanto – e desde já se assinalando que o art. 50.º, da LCT, apenas conferia aos trabalhadores isentos de horário de trabalho direito a retribuição especial “nos casos e condições a estabelecer na respetiva legislação” (n.º 1) –, afigura-se-nos que se impõe concluir em sentido contrário, pelas razões que se passam a expor.
15. Como já se referiu, os cargos de chefia eram exercidos no INAC em regime de isenção de horário de trabalho, o que se retira do acima citado regulamento de horário de trabalho da Direção-Geral da Aviação Civil, publicado no Diário da República, II série, n.º 183, de 9 de agosto de 1990, e que em 30 de janeiro de 2001 o conselho de administração do INAC deliberou manter em vigor.
No mesmo instituto, os cargos de chefia são considerados órgãos de estrutura e o exercício da respetiva titularidade ocorre em regime de comissão de serviço, cabendo-‑lhes níveis de retribuição mais elevados (cfr. artigos 31.º e 32.º do regulamento de carreiras e art. 2.º do regime retributivo do pessoal do INAC aprovados por Despacho conjunto n.º 38/2000, publicado no DR n.º 11, II Série, de 14 de Janeiro de 2000).
Assim, constituindo a isenção de horário de trabalho o regime em regra correspondente ao exercício de funções dirigentes, tudo aponta para que a compensação correspondentemente devida esteja já incluída na remuneração (mais elevada) fixada para os cargos de direção/chefia, sem que por isso seja devido qualquer suplemento remuneratório específico.
16. Por outro lado, nos termos das disposições conjugados dos acima citados arts. 2.º e 6.º da Lei n.º 23/2004, diploma vigente até 31.12.2008, os trabalhadores que, no seio de pessoas coletivas públicas, exercessem funções dirigentes em regime de contrato de trabalho, não deixavam de estar sujeitos aos deveres específicos do pessoal dirigente da Administração Pública, realidade que nos remete para a Lei n.º 2/2004, aplicável aos institutos públicos (art. 1º, n.º 2).
Ora, não podendo deixar de reputar-se o cargo de chefe de departamento exercido pelo Autor como um cargo de dirigente, para efeitos de aplicação da referida Lei n.º 2/2004 (cfr. o seu art. 2.º) e considerando, como já se referiu, que segundo o art. 13º, do mesmo diploma “o pessoal dirigente está isento de horário de trabalho, não lhe sendo, por isso, devida qualquer remuneração por trabalho prestado fora do período normal de trabalho”, mais se consolida a ideia de que a isenção de horário constituía, já no período em causa, o regime normal de prestação do trabalho do pessoal dirigente, sem que daí adviesse o direito a qualquer suplemento remuneratório.
Como bem nota a Ex.m.ª Procuradora-Geral Adjunta, no seu douto parecer, “o Regulamento de Carreiras, Regulamento Disciplinar e Regime Retributivo do INAC (...) não previu a atribuição de qualquer subsídio remuneratório devido por isenção de horário de trabalho e, não o prevendo, considerando-se que outros subsídios foram previstos e atribuídos, não poderá tal circunstância considerar-se lacuna a integrar pelo regime geral do contrato individual de trabalho”, sendo ainda certo que “o corpo da legislação de 2004 (...) relativo às relações de trabalho na administração pública, com especial relevância para o Estatuto do Pessoal Dirigente (Lei n.º 2/2004), previu expressamente – artigo 13.º -, que o pessoal dirigente está isento de horário de trabalho, mas que não lhe é devida qualquer remuneração pelo trabalho prestado fora do período normal de trabalho, sendo certo que a aplicabilidade desta norma ao Réu será indiscutível por força do disposto no art. 1.º, n.º 2, da mesma Lei”.
17. Por fim, uma derradeira razão aponta determinantemente no sentido da improcedência da ação.
Os institutos públicos integram a administração indireta do Estado, sendo o INAC um instituto público sujeito à tutela governamental.
A aprovação do respetivo regime retributivo está dependente dos Ministros da tutela e das Finanças (artigos 1.º e 2º, dos estatutos do INAC aprovados pela Lei 133/98).
Do mesmo modo, a autorização das despesas do INAC (que são todas as que forem necessárias à prossecução das suas atribuições, ao funcionamento dos seus serviços e à gestão dos bens que lhe estão confiados) depende de adequada inscrição no orçamento do INAC (art. 27.º, dos estatutos do INAC aprovados pela Lei 133/98), carecendo igualmente este orçamento de aprovação do membro do Governo da tutela (art. 41.º, n.º 1 e 2, a), da Lei n.º 3/2004).
Também o art. 22.º, do DL 155/92, de 28.07, que contém as normas legais de desenvolvimento do regime de administração financeira do Estado, prevê que a autorização de despesas está sujeita aos requisitos da conformidade legal (prévia existência de lei que autorize a despesa) e da regularidade financeira (inscrição orçamental, correspondente cabimento e adequada classificação da despesa), regime que é aplicável aos organismos autónomos, ex vi do art.52.º do mesmo diploma.
Reportando-nos à situação em apreço, o suplemento remuneratório em causa não pode deixar de ser considerado como uma despesa referente ao funcionamento dos serviços do INAC, despesa que sempre dependeria de lei que a autorizasse, de aprovação governamental e ainda da respetiva inscrição e cabimento orçamental, pressupostos que, no caso vertente, não se mostram verificados.
18. Coadjuvantemente, invoca a decisão recorrida que não terão sido observados o princípio da igualdade e da paridade retributiva, em virtude de à trabalhadora BB ter sido pago o subsídio peticionado pelo A., encontrando-se os dois na mesma situação laboral.
Não sufragamos este entendimento, uma vez que, como se viu, nos encontramos no plano da administração indireta do Estado, área em que qualquer despesa se encontra balizada por normas imperativas de direito público, sendo ilegal o pagamento reclamado pelo A.
Na verdade, como se refere no Ac. do STA de 04.09.2014, P. n.º 1117/13, in www.dgsi.pt, que apela ao “respeito pela exigível coerência da própria ordem jurídica”, a propósito de relações de trabalho em regime de direito público, mas em termos aplicáveis a qualquer situação sujeita a requisitos e limitações decorrentes da prossecução do interesse público (cfr. o já citado n.º 4 do art. 34.º, da Lei n.º 3/2004), «o princípio da igualdade, na sua vertente de ”trabalho igual, salário igual”, não poderá servir de fonte à ilegalidade, tal a de atribuir um subsídio de função a quem não tem direito a ele apenas porque a ilegalidade se estende a outros. O princípio da igualdade (...) “não garante a igualdade ao não direito” (J. J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional, Teoria da Constituição, 7ª edição, página 427)».
Sem necessidade de mais considerações, procede, pois, a revista.
IV.
19. Em face do exposto, concedendo a revista, acorda-se em revogar o acórdão recorrido e, consequentemente, em absolver o R. de tudo o peticionado nos autos.
Custas da revista, bem como nas instâncias, a cargo do A.
Anexa-se sumário do acórdão.
Lisboa, 14 de janeiro de 2016
Mário Belo Morgado (Relator)
Ana Luísa Geraldes
António Ribeiro Cardoso
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[1] Atualmente designado Autoridade Nacional da Aviação Civil.
[2] O tribunal deve conhecer de todas as questões suscitadas nas conclusões das alegações apresentadas pelo recorrente (cfr. arts. 608.º, n.º 2, 635.º e 639.º, n.º 1, e 679º, do CPC), questões que, como é sabido, não se confundem nem compreendem o dever de responder a todos os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, os quais nem sequer vinculam o tribunal, como decorre do disposto no art. 5.º, n.º 3, do mesmo diploma.
[3] Transcrição expurgada dos segmentos destituídos de relevância para a decisão do recurso de revista.
[4] Sob a epígrafe “Isenção de horário de trabalho” era a seguinte a redação deste preceito:
“1 - O trabalhador isento de horário de trabalho nas modalidades previstas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 140.º tem direito a um suplemento remuneratório, nos termos fixados por lei ou por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.
2 - O disposto no número anterior não se aplica a carreiras especiais e a cargos, designadamente a cargos dirigentes, bem como a chefes de equipas multidisciplinares, em que o regime de isenção de horário de trabalho constitua o regime normal de prestação do trabalho”.
[5]Sob a epígrafe “Isenção de horário de trabalho” é a seguinte a redação deste preceito, atualmente m vigor:
“1 - O trabalhador isento de horário de trabalho nas modalidades previstas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 118.º tem direito a um suplemento remuneratório, nos termos fixados por lei ou por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.
2 - O disposto no número anterior pode não se aplicar a carreiras especiais e a cargos em que o regime de isenção de horário de trabalho constitua o regime normal de prestação do trabalho.”
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