Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1210/11.0TYVNG-C.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANABELA DIAS DA SILVA
Descritores: INSOLVÊNCIA
DIREITO DE RETENÇÃO
GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS
Nº do Documento: RP201704061210/11.0TYVNG-C.P1
Data do Acordão: 04/06/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO (LIVRO DE REGISTOS Nº 763, FLS. 81-94)
Área Temática: .
Sumário: I – O art.º 755.º, n.º 1, f), do C.Civil faz depender o reconhecimento do direito de retenção da verificação dos seguintes requisitos:
- a existência de um crédito resultante de promessa de transmissão ou constituição de um direito real;
- entrega ou tradição da coisa objecto do contrato promessa (traditio);
- e incumprimento definitivo da promessa imputável ao promitente, como fonte do crédito do retentor ;
- sendo ainda que, por força do teor do Ac. Unif. de Jurisprudência n.º 4/2014, publicado no DR, I Série, de 19.05.2014, no que toca à interpretação do art.º 755.º, n.º 1, al. f) do C.Civil, se entende que esta norma exige ainda que o beneficiário da promessa tenha de ter a qualidade de consumidor.
II - A inclusão do conceito de consumidor no supra referido Ac. Uniformizador de Jurisprudência, restringindo a amplitude e o alcance do direito de retenção preceituado na al. f) do n.º 1 do art.º 755.º do C.Civil.
III - Em sede de graduação de créditos em processo de verificação e graduação apenso a processo de insolvência, o direito de retenção prevalece sobre a hipoteca, a qual, por sua vez, goza de preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial, cfr. art.ºs 759.º n.º2 e 686.º n.º1 do C.Civil.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação
Processo n.º 1210/11.0 TYVNG-C.P1
Comarca do Porto – Vila Nova de Gaia - Instância Central – 2.ª Secção de Comércio – J3
Recorrente – B…, SA
Recorrido – C…
Relatora – Anabela Dias da Silva
Adjuntas – Desemb. Ana Lucinda Cabral
Desemb. Maria do Carmo Domingues

Acordam no Tribunal da Relação do Porto (1.ªsecção cível)

I – B…, SA requereu na Comarca do Porto – Vila Nova de Gaia - Instância Central – 2.ª Secção de Comércio a declaração de insolvência da sociedade comercial D…, Ld.ª, com sede em …, Vila Nova de Gaia.
Por sentença de 2 de Maio de 2012 foi proferida sentença que declarou a insolvência da referida sociedade comercial.
Após, foram reconhecidos pelo A.I., os seguintes créditos:
1. B…, SA – no montante global de €1.354.551,02, sendo o montante de €1.048.821,93, de natureza garantida (hipotecas voluntárias) e o remanescente de natureza comum;
2. Fazenda Pública – no montante de €4.821,41, de natureza privilegiada (privilégio imobiliário especial) - o crédito em causa diz respeito ao prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Espinho, freguesia de Espinho, com o número 1125/19960308 e às fracções autónomas designadas pelas letras “AR”, “AS”, “AT”, “AU”,
“AV”, “AY” e “AX” do prédio urbano descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, freguesia …, com o número …./……..;
3. Fazenda Pública – no montante de €37.541,47, de natureza comum;
4. Instituto da Segurança Social, I.P. – no montante de €4.084,03, de natureza comum;
5. Instituto da Segurança Social, I.P. – no montante de €31,24, de natureza subordinada; e,
6. C… – no montante de €148.042,89, de natureza comum.
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Foi cumprido o disposto no art.º 129.º n.º 4, do C.I.R.E.
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Vieram impugnar a lista de credores reconhecidos:
1. C… – pretendendo o reconhecimento do crédito no montante global de €148.042,89, garantido por direito de retenção sobre os dois apartamentos objecto dos contratos promessa celebrados com a insolvente e edificados no prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Espinho, freguesia de Espinho, com o número 1125/19960308; e,
2. B…, SA – pretendendo que seja dada sem efeito a referência feita pelo Administrador da Insolvência ao cumprimento dos contratos promessa celebrados com o credor C…, uma vez que tais contratos foram resolvidos antes da declaração de insolvência.
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A credora B…, SA respondeu, ainda, à impugnação apresentada pelo credor C….
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O A.I. respondeu à impugnação apresentada pelo credor C…, pugnando pela sua improcedência.
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Foi realizada tentativa de conciliação, onde o A.I. requereu a eliminação do ponto 7. da lista de credores reconhecidos, relativo à cumprimento dos contratos promessa. E de seguida foi determinada a rectificação da lista de credores reconhecidos em conformidade, motivo pelo qual ficou prejudicada a apreciação da impugnação apresentada pela credora B…, SA
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Foi proferido despacho saneador, identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.
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Realizou-se a audiência de discussão e julgamento e de seguida foi proferida sentença de onde consta: “Pelo exposto:
A) Julgo procedente a impugnação apresentada por C…;
Em consequência,
B) Considero reconhecidos os créditos descriminados no ponto I), bem como o crédito do credor C… pelo montante de 148.042,89 euros, acrescido de juros de mora vincendos;
C) Graduo os créditos para serem pagos da seguinte forma:
- Pelo produto da venda do prédio urbano – terreno para construção; tem em construção um edifício de cave, rés-do-chão e andar, superfície coberta de 260 m2, sito na Rua . e Rua .., descrito na Conservatória do Registo Predial de Espinho, freguesia …, com o número 1125/19960308 (verba n.º 2):
1º. O crédito da Autoridade Tributária e Aduaneira, a título de IMI;
2º. O crédito do credor C…, no montante de 148.042,89 euros;
3º. O crédito da credora B…, SA garantido por hipoteca;
4º. Os créditos comuns;
5º. Os créditos subordinados, incluindo os relativos a juros constituídos após a declaração de insolvência;
- Pelo produto da venda das fracções autónomas designadas pelas letras AR, AS, AT, AU, AV, AX e AY, do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, freguesia …, com o número 2336/19990405 (verbas n.ºs 3 a 8 e 11):
1.º O crédito da Autoridade Tributária e Aduaneira, a título de IMI;
2º. O crédito da credora B…, SA garantido por hipoteca;
3º. Os créditos comuns;
4º. Os créditos subordinados, incluindo os relativos a juros constituídos após a declaração de insolvência;
- Pelo produto da venda das fracções autónomas designadas pelas letras T e X, do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, freguesia …, com o número …./…….. (verbas n.ºs 9 e 10):
1.º O crédito da credora B…, SA garantido por hipoteca;
2º. Os créditos comuns;
3º. Os créditos subordinados, incluindo os relativos a juros constituídos após a declaração de insolvência”.
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Não se conformando com tal decisão, dela veio a credora B…, SA recorrer de apelação, pedindo que seja revogada e substituída por outra no sentido das suas alegações.
A apelante juntou aos autos as suas alegações que terminam com as seguintes e conclusões:
1. A sentença recorrida não se encontra devidamente fundamentada, pois existe uma contradição notória entre a fundamentação e a decisão, o que nos leva a invocar a nulidade desta decisão, ou a requerer a sua revogação!
2. Ora, no caso dos autos, partiu-se do pressuposto que apesar de existir uma sentença, proferida numa acção declarativa, a reconhecer um crédito, teria que ser feita prova, nestes autos, do crédito reclamado pelo recorrido, tendo, nesse seguimento, sido fixado como segundo tema de prova precisamente esta questão – prova dos pagamentos efectuados.
3. Não obstante essa prova não ter sido feita nos presentes autos, a Juíza da 1.ª instância considerou provado tal tema, por remissão para a matéria de facto dada como provada na referida sentença declarativa! O que não faz qualquer sentido, uma vez que é evidenciado na terceira página da motivação da sentença recorrida o seguinte: “Relativamente a este último ponto, temos para nós, desde logo, que a sentença referida não é oponível ao credor hipotecário, neste caso à credora B…, SA
4. Na verdade, não se compreende como é que a Juíza da 1.ª instância parte do pressuposto que a sentença proferida fora deste processo não tem força de caso julgado e a final na sentença recorrida, refira expressamente e passo a transcrever: “O tribunal, não obstante a referida inoponibilidade, atendeu aos factos dados como provados no âmbito da acção acima identificada”! – vide última frase da primeira página da motivação da sentença recorrida.
5. De notar que a sentença em causa foi proferida numa acção declarativa – e note-se que nessa acção a insolvente foi citada editalmente, ou seja, não tomou posição sobre os factos alegados!
6. Não obstante, se atentarmos na resposta à matéria de facto dada como provada na já referida acção declarativa que correu termos com o n.º 5386/09.9TBVNG, (confrontar documento n.º 1, cujo teor se dá como integralmente reproduzido), constatamos que também não foi produzida prova:
7. Mais uma vez, perante tantas contradições, não se percebe como é que a Juíza da 1.ª instância se baseia nesta resposta para reconhecer, nestes autos, qualquer montante ao credor recorrido!
8. Por outro lado, nos autos de que se recorre e nos quais deveria o recorrido ter feito prova do seu crédito, não pode a ora recorrente deixar de referir que a própria sentença recorrida refere expressamente, na sétima página, terceiro parágrafo que “As testemunhas ouvidas em audiência de discussão e julgamento não têm conhecimento concreto acerca dos pagamentos realizados pelo impugnante, sendo certo que no âmbito dos presentes autos, este apenas reclama a quantia em que foi condenado a insolvente na acção com o n.º 5386/09.9TBVNG.”
9. Aqui chegados, importa referir que o facto do recorrido estar munido de um título executivo não tem qualquer virtualidade na presente processo, uma vez que o credor reclamante tem que alegar e provar os factos constitutivos do seu direito nesta sede (!!), o que salvo o devido respeito não foi feito, como facilmente se comprova.
10. Senão vejamos: Se atentarmos às várias peças processuais juntas pelo recorrido: a petição inicial da acção declarativa, a reclamação de créditos, os recibos juntos e a declaração recibo, temos quatro, vários valores diferentes, o que não pode deixar de criar no julgador uma dúvida, a qual cremos só poderia ser decidida contra o recorrido, credor impugnante, que tinha o ónus da prova do alegado.
11. Assim, além da prova documental ser quase nula, a prova testemunhal não nos ajuda a descobrir quase nada, é quase inverosímil e não oferece qualquer credibilidade.
12. Em relação ao depoimento da primeira testemunha, arrolada pelo recorrido, o Sr. E…, referência: 20160303101013-6634286-2871619, aos 10:30 minutos, foi questionado pelo ilustre mandatário do recorrido da seguinte forma: “dinheiros que o Sr. C… trazia, fazia contas com o Sr. F… naquele dia e o Sr. F… aproveitava reunindo os empreiteiros e subempreiteiros para fazer contas com ele?, ao que a testemunha respondeu: “sim” O ilustre mandatário do recorrido perguntou ainda o seguinte: “Disse € 35.000,00 pelo menos do Sr. C…, o senhor recebeu? ao que a testemunha respondeu: “Sim, o meu pai recebeu sim
13. Acresce que, daqui apenas podemos perceber que o Sr. C…, o recorrido, terá ido à obra algumas vezes fazer pagamentos ao sócio gerente da insolvente, o Sr. F…, e que este num momento posterior reunia os empreiteiros e fazia pagamentos, ou seja, em nenhum momento é dito que o Sr. C… pagava directamente aos empreiteiros e subempreiteiros, pelo que, não se pode concluir que o dinheiro que o Sr. C… eventualmente entregasse era exactamente aquele que os empreiteiros recebiam, já que os pagamentos era feitos “em dinheiro vivo”, como atestou a testemunha à advogada da recorrente (vide 17:59 a 18:03 minutos)
14. Na verdade, é perfeitamente plausível que no intervalo de tempo em que o Sr. F… recebia o dinheiro do Sr. C… e fazia os pagamentos aos trabalhadores juntasse mais dinheiro seu!
15. E consequentemente, não existe nenhum indício do qual se possa concluir que quando a testemunha afirma que o seu pai recebeu €35.000,00, esse montante tenha sido entregue pelo Recorrido e a que título é que foi entregue!
16. Em suma, não foi produzida qualquer prova do montante concreto dos pagamentos que o recorrido eventualmente fez à insolvente!
17. No que diz respeito ao depoimento da segunda testemunha arrolada pelo recorrido, o Sr. G…, referência: 20160303104824- 6634286-2871619, aos 14:55 minutos, quando questionada sobre o montante recebido diz expressamente “agora não sei precisar, não tenho esses números”
18. Aliás, neste sentido, mais uma vez a testemunha o Sr. E…, referência: 20160303101013-6634286-2871619, supra referida, em resposta às questões colocadas pela ilustre mandatária da massa insolvente, diz o seguinte, aos 27:10 minutos “Agora eu não sei ao certo, eu não vi os pagamentos todos quando pagavam ao meu pai.”
19. Em suma, não existe qualquer suporte documental e nenhuma testemunha viu ou afirmou que ocorreram pagamentos de sinal, no montante que foi reconhecido na sentença recorrida, no valor de €64.999,00!
20. Assim, não ficou provado o pagamento dos sinais, o segundo tema de prova, o que por si só, faria com que a impugnação fosse julgada improcedente!
21. Sem prescindir, quanto ao terceiro tema de prova - a posse – em nosso entender, não resultou provado qualquer acto de posse, pois as testemunhas referiram-se apenas à utilização de uma garagem, ou seja, no r/c, onde alegadamente terão sido armazenados alguns bens!
22. Quanto ao quarto tema de prova, em nosso entender, também não ficou demonstrado o direito de retenção, pois o mesmo decorre de um incumprimento o qual tem que ser definitivo, e salvo o devido respeito, não foi provado.
23. Na verdade, apesar do recorrido ter dado entrada daquela acção declarativa – a qual nunca seria julgada procedente se a recorrente tivesse tido a oportunidade de se defender ou se a insolvente não tivesse sido citado por editais – não há uma única carta de interpelação, a fixar um prazo peremptório para ser agendada a escritura, pelo contrário, houve testemunhas que disseram que na pendência da acção foram visitar o andar e que até à insolvência, havia vontade do recorrido em cumprir o negócio. Em suma, nunca foi demonstrado uma perda de interesse.
24. Estamos perante apenas uma mora pelo que não existe incumprimento definitivo, do qual possa resultar uma resolução do contrato e na fixação de uma indemnização no dobro do sinal.
25. Por último, ficou claramente demonstrado que o recorrido não iria usar os apartamentos para sua habitação próprio e portanto, não é consumidor, para efeitos do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2014, pelo que deveria sempre o Tribunal a quo ter aplicado nos presentes autos aquele Acórdão Uniformizador!
*
O credor reclamante recorrido veio apresentar as suas contra-alegações onde pugna pela confirmação da decisão recorrida.

II – Da 1.ª instância chegam-nos assentes os seguintes factos:
a) B…, SA requereu, a 29 de Dezembro de 2011, a declaração de insolvência da sociedade comercial D…, Ld.ª;
b) A 2 de Maio de 2012 foi proferida sentença que declarou a insolvência da referida sociedade comercial;
c) Foram apreendidos os seguintes bens imóveis:
1. Prédio urbano – terreno para construção; tem em construção um edifício de cave, rés-do-chão e andar, superfície coberta de 260 m2, sito na Rua . e Rua .., descrito na Conservatória do Registo Predial de Espinho, freguesia …, com o número …./…….. (verba n.º 2);
2. Fracções autónomas designadas pelas letras AR, AS, AT, AU, AV, AY, T, X e AX, do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, freguesia …, com o número …./…….. (verbas n.ºs 3 a 11);
d) C… e a sociedade comercial D…, Ld.ª celebraram, a 15 de Janeiro de 2002, um acordo a que deram a designação de “contrato promessa de compra e venda”, tendo o primeiro declarado prometer comprar à segunda, que declarou prometer vender, um “apartamento de tipo T2, sito no R/C frente, Rua .., com arrumo e lugar de garagem na cave”, pelo preço de 109.736,00 euros, livre de hipotecas, ónus ou encargos, nos termos constantes do documento de fls. 134 a 136, cujo teor se dá aqui por reproduzido;
e) C… entregou à sociedade comercial D…, Ld.ª, a 15 de Janeiro de 2002, a título de sinal e princípio de pagamento do preço referido na alínea anterior, a quantia de 10.000,00 euros;
f) A restante parte do preço seria pago da seguinte forma:
- A quantia de 10.000,00 euros com a edificação da 1.ª placa do prédio;
- A quantia de 10.000,00 euros com a edificação da 2.ª placa do prédio;
- A quantia de 10.000,00 euros com o erguer da cobertura do telhado do prédio;
- A quantia de 10.000,00 euros com o assentamento da tijoleira;
- A quantia de 59.736,00 euros no dia da outorga da escritura pública de compra e venda;
g) C… e a sociedade comercial D…, Ld.ª celebraram, a 5 de Março de 2002, um acordo a que deram a designação de “contrato-promessa de compra e venda”, tendo o primeiro declarado prometer comprar à segunda, que declarou prometer vender, um “apartamento de tipo T2, sito no Primeiro frente, Rua .., com arrumo e lugar de garagem na cave”, pelo preço de 99.760,00 euros, livre de hipotecas, ónus ou encargos, nos termos constantes do documento de fls. 131 a 133, cujo teor se dá aqui por reproduzido;
h) D… entregou à sociedade comercial D…, Ld.ª, a 5 de Março de 2002, a título de sinal e princípio de pagamento do preço referido na alínea anterior, a quantia de 10.000,00 euros;
i) A restante parte do preço seria pago da seguinte forma:
- A quantia de 10.000,00 euros com a edificação da 2.ª placa do prédio;
- A quantia de 10.000,00 euros com o erguer da cobertura do telhado do prédio;
- A quantia de 10.000,00 euros com o assentamento da tijoleira;
- A quantia de 59.760,00 euros no dia da outorga da escritura pública de compra e venda;
j) Foi acordado que as escrituras públicas de compra e venda seriam outorgadas até 31 de Março de 2003;
k) C… entregou à sociedade comercial D…, Ld.ª, no âmbito dos acordos referidos nas alíneas d) a j), a título sinal e seus reforços, a quantia global de 64.999,00 euros;
l) Em momento posterior à celebração dos aludidos acordos, foram entregues a C… as chaves de ambos os “apartamentos” referidos nas alíneas d) e g);
m) C… guarda nos apartamentos bens, há mais de 3, 4 e 5 anos a esta data, à vista de todos, sem interrupção e sem oposição;
n) C…, a 25 de Maio de 2009, instaurou contra a sociedade comercial D…, Ld.ª acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a sua condenação a pagar a quantia de 114.500,00 euros e a quantia de 109.500,00 euros, bem como que fosse declarado a seu favor o direito de retenção sobre os “apartamentos” identificados nas alíneas d) e g), por força da resolução dos contratos promessa de compra e venda celebrados com a ré, com os fundamentos constantes da petição inicial junta a fls. 158 verso e seguintes, a qual correu termos pela 1.ª Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, com o número 5386/09.9TBVNG;
o) No âmbito de tal acção, a ré foi citada editalmente;
p) Após realização da audiência de discussão e julgamento, foi proferida decisão sobre a matéria de facto, nos termos que constam de fls. 156 e seguintes;
q) A 16 de Dezembro de 2010 foi proferida sentença, objecto de rectificação por despacho de 10 de Janeiro de 2011, transitada em julgado a 13 de Fevereiro de 2012, cuja certidão se mostra junta a fls. 74 e seguintes;
r) Foram dados como provados os factos elencados nas alíneas d) a m), bem como os seguintes factos:
“12) A ré ficou incumbida de proceder à marcação da escritura pública no Cartório Notarial de Espinho e de avisar o autor, com antecedência, do dia e hora da sua realização.
13) Ficou ainda a ré de entregar até ao momento da outorga da escritura, a documentação necessária à outorga da escritura, mormente, a escritura de propriedade horizontal, certidão do registo da mesma e licença de habitabilidade.
(…)
17) A ré não entregou no Cartório Notarial de Espinho, até à data, os documentos referidos em 13).
18) Actualmente os apartamentos não estão concluídos faltando proceder à pintura interior dos apartamentos, à instalação das cozinhas e a alguns outros acabamentos exteriores e interiores do prédio.
19) A ré deixou de exercer a actividade de construção civil.”;
s) A sentença mencionada na alínea q), condenou a sociedade comercial D…, Ld.ª a pagar a quantia de 129.998,00 euros, acrescida de juros de mora à taxa de 4%, desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento;
t) Declarou, ainda, assistir ao autor, em relação a tal crédito, direito de retenção sobre “as fracções identificadas em 3) e 7) dos factos provados” (os “apartamentos” identificados nas alíneas d) e g));
u) C… instaurou acção executiva contra a sociedade comercial D…, Ld.ª, apresentando como título executivo a sentença referida nas alíneas q) a t), a qual correu termos pelo extinto Juízo de Execução do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia com o número 1937/11.7TBVNG, no âmbito da qual foi penhorado o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Espinho, freguesia …, com o número …./……..;
v) Tal prédio urbano não foi submetido ao regime da propriedade horizontal.

III – Como é sabido o objecto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente (art.ºs 5.º, 635.º n.º3 e 639.º n.ºs 1 e 3, do C.P.Civil), para além do que é de conhecimento oficioso, e porque os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, ele é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida.
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Ora, visto o teor das alegações da apelante são questões a apreciar no presente recurso:
- 1.ª – Da alegada nulidade da sentença recorrida.
- 2.ª - Da impugnação da decisão da matéria de facto.
- 3.ª – De Direito.
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Resulta dos autos que o credor C… deduziu impugnação à lista de créditos reconhecidos elaborada pelo A. I. e onde o seu crédito foi reconhecido como crédito comum. Por via de tal impugnação pretendia que o seu crédito, no montante global de €148.042,89, fosse considerado garantido por direito de retenção sobre os dois apartamentos objecto dos contratos promessa celebrados com a insolvente e edificados no prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Espinho, freguesia de Espinho, com o número …./……...
Ora, como se sabe, o Incidente de Verificação e Graduação de Créditos visa, no seu essencial, definir os créditos sobre a massa insolvente e a sua graduação relativa, tendo em vista o pagamento dos credores reconhecidos através do património da insolvente. Efectuadas as atinentes reclamações de créditos, cfr. art.º 128.º do CIRE, deve o A.I. apresentar uma lista dos credores por si reconhecidos e uma lista dos não reconhecidos, cfr. art.º 129.º do CIRE. Podendo qualquer interessado impugnar a lista dos credores reconhecidos, tanto com fundamento na indevida inclusão como na indevida exclusão, ou na incorrecção do montante ou na errada qualificação dos ditos créditos.
A ora apelante/credora requerente da insolvência deduziu oposição à pretensão de C… e o Tribunal de 1.ª instância, depois de produzida a prova carreada para os autos, veio a reconhecer o crédito do impugnante C… no montante de €148.042,89 euros, acrescido de juros vincendos. Mais decidiu, considerando que “in casu” houve tradição para o promitente-comprador, ou seja, para o credor impugnante, beneficiando assim o seu crédito de direito de retenção, que incidirá sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Espinho, freguesia …, com o número …./…….., e consequentemente, pelo produto da venda desse prédio urbano – terreno para construção; que tem em construção um edifício de cave, rés-do-chão e andar, superfície coberta de 260 m2, sito na Rua . e Rua .., (verba n.º 2), decidiu graduá-lo logo a seguir ao crédito da Autoridade Tributária e Aduaneira, a título de IMI e antes do crédito da ora apelante B…, SA, garantido por hipoteca.
Esta credora hipotecária insurge-se contra o assim decidido, defendendo que a impugnação deduzida pelo credor C… deverá ser julgada totalmente improcedente.
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1.ªquestão – Da alegada nulidade da sentença recorrida.
Começa a apelante por defender que a sentença recorrida enferma de nulidade, pois os fundamentos da mesma estão em oposição com a decisão, e de harmonia com o disposto na al. c), do art.º 615.º do C.P.Civil.
Para tanto diz que a sentença recorrida não se encontra devidamente fundamentada, pois não tem nenhum raciocínio lógico para alicerçar a conclusão, na qual se baseou para considerar provado o crédito de €148.042,00 ao recorrido, C…, pois que, não obstante se ter de forma categórica afirmado que a sentença proferida numa acção declarativa – alheia ao processo de insolvência – é inoponível à ora apelante, pelo que teria que ser feita prova do referido montante e do reconhecimento do crédito, a verdade, é que tal crédito veio a ser considerado como provado, remetendo-se para a matéria de facto data como provada na já referida acção declarativa.
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Vejamos.
Como é sabido, a sentença é nula, conforme o disposto no art.º 615.º n.º1 al. c) do C.P.Civil, quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Esta nulidade – oposição entre os fundamentos e a decisão, só se verifica quando, segundo o Prof. Alberto dos Reis, in “Código de Processo Civil anotado, vol. V, pág. 141, “…os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente não ao resultado expresso na decisão mas a resultado oposto”.
Dito de outra maneira, quando das premissas de facto e de direito que o julgador teve por apuradas, ele haja extraído uma oposta àquela que logicamente deveria ter extraído.
Tal nulidade refere-se, pois, a um vício estrutural da sentença, por contradição entre as suas premissas, de facto e de direito, e a conclusão, de tal modo que esta deveria seguir um resultado diverso daquele que seguiu. É uma contradição de ordem formal, que se refere aos fundamentos estabelecidos e utilizados na sentença, e não aos que resultam do processo. Pelo que tal nulidade não abrange, o chamado, erro de julgamento, seja de facto, seja de direito, e designadamente a não conformidade da decisão com o direito substantivo, isto é com a subsunção dos factos à norma jurídica e, muito menos, com o erro na interpretação desta. É que, quando o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, poderemos, sim, estar perante um erro de julgamento. Nesse caso, o juiz fundamenta a decisão, mas decide mal, resolve as questões colocadas num certo sentido porque interpretou e/ou aplicou mal o direito, cfr. Lebre de Freitas, in “CPC Anotado”, vol. 2.º, pág. 670.
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Ora vendo a sentença recorrida, é certo que nela foi julgado provado um determinado complexo factual, acima já reproduzido, e em fundamentação do mesmo pode ler-se que: “O tribunal atendeu aos documentos juntos aos autos, com relevo para as peças processuais da acção declarativa, com processo ordinário, n.º 5386/09.9TBVNG, (…). O Sr. Administrador da Insolvência, (…) reconheceu ao impugnante C…, (…), um crédito no valor de 148.042,89 (…) No entanto, não reconheceu tal crédito com natureza garantida, conforme tinha sido reclamado, por não ter sido demonstrado o direito de retenção sobre o imóvel, considerando que a sentença proferida no processo acima identificado não o vinculava.
Relativamente a este último ponto, temos para nós, desde logo, que a sentença referida não
é oponível ao credor hipotecário, neste caso, à credora “B…, S.A.”, já que esta não interveio na acção onde foi proferida a sentença que reconheceu a existência do crédito e do direito de retenção sobre o imóvel hipotecado (o credor hipotecário não é, cremos, um terceiro juridicamente indiferente, pelo que o caso julgado decorrente da sentença que reconhece o direito de retenção não é oponível ao mesmo).
(…)
O tribunal, não obstante a referida inoponibilidade, atendeu aos factos dados como provados no âmbito da acção acima identificada. Na verdade, teve lugar a audiência de discussão e julgamento, foram ouvidas testemunhas, foram tidos em consideração os documentos juntos aos autos, designadamente, os documentos agora juntos a fls. 115 e seguintes e a 129 e seguintes, e foi feita uma apreciação crítica da prova (cfr. certidão junta a fls. 155 e seguintes).
Temos, assim, como certa a celebração dos acordos em causa (cfr. documentos de fls. 131 e seguintes, cujas assinaturas foram reconhecidas notarialmente), bem como o pagamento da quantia indicada na alínea k) - é certo que o valor que foi dado como provado como correspondendo ao entregue a título de sinal e reforços é consideravelmente inferior ao alegado e peticionado na acção e ao que resultaria dos documentos juntos (cfr., a título de exemplo, documento denominado “Declaração/Recibo” junto a fls. 129); no entanto, é de atender ao valor aludido, considerando a fundamentação aduzida na resposta à matéria de facto (cfr. certidão de fls. 155 e seguintes e documentos de fls. 115 e seguintes), que aqui se dá por reproduzida (…)”.
Por outro lado, resulta da sentença recorrida que em sede de fundamentação de Direito se considerou: “(…) tendo em conta a factualidade provada, é seguro afirmar-se que o impugnante C… celebrou com a devedora, a 15 de Janeiro e a 5 de Março de 2002, dois contratos promessa de compra e venda.
(…) C… e a sociedade comercial “D…, Lda.” celebraram, a 15 de Janeiro de 2002, um acordo que denominaram como “contrato promessa de compra e venda”, tendo o primeiro declarado prometer comprar à segunda, que declarou prometer vender, um “apartamento de tipo T2, sito no R/C frente, Rua .., com arrumo e lugar de garagem na cave”, pelo preço de 109.736,00 euros, livre de hipotecas, ónus ou encargos, nos termos constantes do documento de fls. 134 a 136, cujo teor se dá aqui por reproduzido. Mais tarde, a 5 de Março de 2002, celebraram um outro acordo, que denominaram também como “contrato promessa de compra e venda”, tendo o primeiro declarado prometer comprar à segunda, que declarou prometer vender, um “apartamento de tipo T2, sito no Primeiro frente, Rua .., com arrumo e lugar de garagem na cave”, pelo preço de 99.760,00 euros, livre de hipotecas, ónus ou encargos, nos termos constantes do documento de fls. 131 a 133, cujo teor se dá aqui por reproduzido.
(…)
Por outro lado, considerando os factos provados, verifica-se uma situação de incumprimento definitivo, imputável à ora insolvente (cfr. art.ºs 804º, n.º 1, 805º, n.º 1 e n.º 2, alínea a), 808º, n.º 1, e 801º, n.º 2, do Código Civil), susceptível de desencadear o mecanismo indemnizatório previsto no art.º 442º, n.º 2, do mesmo Código.
No caso em apreço, as partes fixaram um prazo para a celebração dos contratos definitivos, até 31 de Março de 2003, o que não ocorreu nas circunstâncias descritas nas alíneas n), q), r) e s) dos factos provados.
O incumprimento definitivo ocorre quando a prestação deixou de ser executada no devido tempo e já não pode ser cumprida ou quando a prestação, sendo materialmente possível, perdeu interesse para o credor em consequência da mora ou não é realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor (cfr. art.ºs 801º, 804º e 808º do Código Civil).
Assim, há que reconhecer o crédito reclamado, correspondente ao dobro do sinal prestado, acrescido de juros de mora, nos termos definidos na sentença proferida na acção que correu termos pela 1ª Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, com o número 5386/09.9TBVNG [a questão relativa à circunstância de não terem sido apuradas as concretas quantias entregues relativamente a cada um dos contratos promessa será apreciada em sede de graduação de créditos]”.
E mais adiante considerou-se ainda que “(…) considerando o exposto e perante os factos provados [cfr. alíneas l) e m)], afigura-se-nos que houve tradição para o promitente-comprador, ou seja, para o credor impugnante, beneficiando, pois, o seu crédito de direito de retenção.
(…)
O crédito do credor C… goza, portanto, do direito de retenção e tal direito prevalece sobre a hipoteca que garante o crédito da credora “B…, S.A.”.
(…)
O direito de retenção incidirá, pois, sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Espinho, freguesia de Espinho, com o número …./…….. [reconhecer o direito de retenção sobre tal prédio, quando na reclamação de créditos se indicou sobre os “apartamentos” prometidos vender, não constitui, cremos, condenação em quantidade superior (o crédito não sofre qualquer alteração), nem em objecto diferente (o direito que se reconhece é precisamente o mesmo)”.
Finalmente, a 1.ª instância veio a decidir que: “(…)Julgo procedente a impugnação apresentada por C…;
Em consequência,
B) Considero reconhecidos os créditos (…), bem como o crédito do credor C… pelo montante de 148.042,89 euros, acrescido de juros de mora vincendos;
C) Graduo os créditos para serem pagos da seguinte forma:
- Pelo produto da venda do prédio urbano – terreno para construção; tem em construção um edifício de cave, rés-do-chão e andar, superfície coberta de 260 m2, sito na Rua . e Rua .., descrito na Conservatória do Registo Predial de Espinho, freguesia …, com o número …./…….. (verba n.º 2):
1º. (…)
2º. O crédito do credor C…, no montante de 148.042,89 euros;
3º. O crédito da credora “B…, S.A.” garantido por hipoteca;
4º. (…)”.
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Assim, é manifesto concluir-se que inexiste qualquer vício lógico na arquitectura da decisão recorrida. Na verdade, na mesma julga-se provado determinado complexo fáctico e justifica-se por que assim se decidiu, designadamente dizendo-se que, partindo-se do pressuposto de que a sentença proferida nos autos de processo ordinário n.º 5386/09.9TBVNG não era oponível à credora, ora apelante, todavia, a mesma, enquanto elemento de prova, foi valorada conjuntamente com os demais elementos de prova produzidos nestes autos. Posteriormente subsumem-se tais factos ao Direito e por conclui-se, no sentido do atrás consignado.
Logo, e sem necessidade de outros considerandos, não se verifica a nulidade da decisão recorrida invocada pela apelante, pelo que improcedem as respectivas conclusões.
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2.ªquestão – Da impugnação da decisão da matéria de facto.
Defende depois a apelante que pela prova produzida nos autos se deveria ter concluído que o apelado não logrou fazer prova da existência do crédito e dos pagamentos efectuados, assim como de qualquer acto de posse. Pede, por isso a reapreciação da prova produzida nos autos, designadamente a prova documental junta e os depoimentos das testemunhas E… e G….
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Como refere F. Amâncio Ferreira, in “Manual dos Recursos em Processo Civil”, pág. 127, resulta de tal preceito que “...o direito português segue o modelo de revisão ou reponderação…”, ainda que não em toda a sua pureza, porquanto comporta excepções, as quais se mostram referidas pelo mesmo autor na obra citada. Por isso, havendo gravação dos depoimentos prestados em audiência de julgamento, como no presente caso se verifica, temos que, nos termos do disposto no art.º 662.º n.º 1 do C.P.Civil, o Tribunal da Relação deve alterar a decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto, desde que, em função dos elementos constantes dos autos (incluindo, obviamente, a gravação), seja razoável concluir que aquela enferma de erro.
Ora, quanto ao resultado da apreciação da prova testemunhal não pode esquecer-se que, nos termos do art.º 607.º n.º 5 do C.P.Civil, “O juiz aprecia livremente as provas, segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”, mantendo o princípio da liberdade de julgamento. E, quanto à força probatória os depoimentos das testemunhas são apreciados livremente pelo Tribunal, como resulta do disposto no art.º 396.º do C.Civil.
Tendo em atenção o que preceitua o art.º 640.º n.ºs 1 e 2 do C.P.Civil, ou seja, que é ónus do apelante que pretenda impugnar a decisão sobre a matéria de facto, isto é, não basta ao apelante atacar a convicção que o julgador formou sobre cada uma ou a globalidade das provas para provocar uma alteração da decisão da matéria de facto, sendo ainda indispensável, e “sob pena de rejeição”, que:
a) - Especifique quais os concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados;
b) - Indique quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem decisão diversa da recorrida sobre cada um dos concretos pontos impugnados da matéria de facto; indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição. Devendo ainda, desenvolver a análise crítica dessas provas, por forma demonstrar que a decisão proferida sobre cada um desses concretos pontos de facto não é possível, não é plausível ou não é a mais razoável, cfr. entre outros, Acs. do STJ de 25.09.2006, de 10.05.2007 e de 30.10.2007, todos in www.dgsi.pt.
c) – Indique a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Está assim hoje legalmente consagrada o dever deste tribunal de recurso alterar a decisão de facto proferida em 1.ª instância, devendo para tal reapreciar as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo ainda em consideração o teor das alegações das partes, para o que terá de ouvir os depoimentos chamados à colação pelas partes. E assim, (re) ponderando livremente essas provas, deve, por força do disposto no art.º 662.º n.º 1 do C.P.Civil, “alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”. Ou seja, deve o Tribunal de recurso formar a sua própria convicção relativamente a cada um dos factos em causa não desconsiderando, principalmente, a ausência de imediação na produção dessa prova, e a consequente e natural limitação à formação desta convicção, o que em confronto com o decidido em 1.ª instância terá como consequência a alteração ou a manutenção dessa decisão. E isso, por se ter concluído que a decisão de facto em causa, (re) apreciada “segundo critérios de valoração racional e lógica do julgador, pressupondo o recurso a conhecimentos de ordem geral das pessoas normalmente inseridas na sociedade do seu tempo, a observância das regras da experiência e dos critérios da lógica” cf. Ac. STJ de Proc. n.º 3811/05, da 1ª Secção, citado no Ac. do mesmo Tribunal de 28.05.2009, in www.dgsi.pt., corresponde, ou não, ao decidido em 1.ª instância.
Por outro lado, deve ainda a Relação, por força do disposto no n.º2 do art.º 662.º do C.P.Civil, “mesmo oficiosamente”: a), a renovação “da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento”; b) a produção de novos meios de prova em segunda instância, “em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada”; c) a anulação da decisão da matéria de facto, mesmo oficiosamente, sempre que não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta; d) se determine que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados.
No caso em apreço, vendo o teor das alegações da apelante é para nós manifesto que a mesma cumpriu aqueles ónus de alegação, cfr. art.º 640.º do C.P.Civil.
Na verdade e vendo o arrazoado das suas alegações e conclusões verificamos que a mesma se limita a impugnar a decisão da matéria de facto relativamente a “questões” de facto – dizendo que contrariamente ao decidido em 1.ª instância, não se dez prova da “existência do crédito”, nem dos “pagamentos efectuados”, e nem de qualquer “acto de posse” - mas não especifica quais os concretos pontos de facto do vasto complexo fáctico provado nos autos que considera incorrectamente julgados, não sendo exigível a este Tribunal de recurso que analise a fundamentação de facto da decisão recorrida e nela procure quais os concretos pontos de facto que respeitam às supra referida questões, pois que para além de ser tarefa falível, traduz sem dúvidas o incumprimento do ónus de alegação que impede sobre o recorrente por força da lei.
Destarte, rejeita-se o recurso a parte em apreço.
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Todavia sempre se dirá que, a demonstração da realidade dos factos concretos e objectivos que se podem ter por integrantes das referidas questões invocadas pela apelante, podia realizar-se por qualquer meio de prova admitido por lei.
No caso em apreço o tribunal recorrido julgou provada a realidade de alguns desses factos com base no teor de um documento oportunamente junto aos autos – certidão da sentença proferida nos autos de acção ordinária n.º5386/09.9TBVNG.
Na verdade, os documentos juntos a fls. 75 a 81 e 156 a 158 dos autos no qual a Mm.ª juíza “a quo” diz ter fundado a sua convicção quanto à realidade de alguns dos factos que considerou provados, são certidões da decisão da matéria de facto e da sentença proferida no referido processo n.º º5386/09.9TBVNG.
Dúvidas não restam de que a referida sentença não pode ser invocada nos autos com o valor do caso julgado, cfr. art.ºs 619.º n.º1, 580.º e 581.º, todos do C.P.Civil, desde logo porque são diversos, numa e noutra acção, os sujeitos, a causa de pedir e o respectivo pedido.
Do que se trata é da valoração de documentos, em face da lei substantiva, do ponto de vista do direito probatório.
As certidões da decisão da matéria de facto e da sentença em causa constituem um documento autêntico, cfr. art.ºs 363.º n.º 2, 369.º e 383.º n.º1, todos do C.Civil. E como se sabe o seu valor probatório pleno, é, por força do n.º 1 do art.º 371.º do mesmo diploma, circunscrito aos factos que neles se referem como praticados pela autoridade ou oficial público e, outrossim, aos factos objecto de percepção por essa autoridade ou oficial público, sendo certo que tal força probatória não cobre a veracidade e/ou a correspondência com a realidade dos factos ou declarações das partes que integram a respectiva materialidade.
Pelo que, a matéria factual constante da referida decisão de facto e sentença transitada em julgado, não se reveste de força probatória plena, ou seja, não tem a virtualidade de documentar plenamente e em absoluto a matéria de facto que dela consta, considerada objectivamente, podendo, por isso, ser livremente contraditada nos presentes autos, ficando depois sujeita à livre apreciação do tribunal.
No caso em apreço, a apelante impugnou a realidade de tais factos, daí que os mesmos tenham sido, em sede de indicação de temas de prova, consignados como tal.
Assim, o que está aqui verdadeiramente em causa é aquilatar da razoabilidade da convicção alcançada em 1.ª instância no que respeita à decisão impugnada, tal há-de resultar da fundamentação que se deu a essa decisão.
Como se sabe a lei impõe ao julgador do dever de fundamentar não só as decisões positivas, como os factos que considera não provados, como ainda deve especificar os fundamentos decisivos para a convicção quanto a tais factos considerados como não provados e não provados.
O dever de fundamentação, resulta directamente do texto constitucional, cfr. art.º 208.º da C.R.P., “as decisões dos tribunais são fundamentadas nos casos e nos termos previstos na lei”.
Segundo o Prof. Lebre de Freitas, in “A Acção Declarativa Comum à Luz do Código Revisto”, pág. 281 - “A fundamentação exerce, pois, a dupla função de facilitar o reexame da causa pelo tribunal superior e de reforçar o auto-controlo do julgador, sendo um elemento fundamental na transparência da justiça, inerente ao acto jurisdicional”.
Como entende Remédio Marques, in “Acção Declarativa Comum à Luz do Código Revisto”, pág. 606 – “…o tribunal deve concretizar o meio de prova cuja produção gerou a sua convicção (v.g., o depoimento das testemunhas X e Y, o relatório dos peritos, o conteúdo de determinado documento). …Mas não só. Além disso, o tribunal deve ainda mencionar as razões da credibilidade ou da força probatória reconhecida a esse meio de prova, mencionando as razões justificativas da sua convicção num certo meio de prova em detrimento de outro de sinal oposto …”. Para este mestre tal imposição justifica-se por ser “justo e adequado impor ao juiz um momento de verificação e controlo crítico, bem como é justo permitir que as partes compreendam a decisão e os seus fundamentos, para o efeito da eventual impugnação por via da interposição de recurso e, outrossim, legitimar democraticamente o exercício da função jurisdicional e a concreta decisão perante a colectividade”.
No caso, vendo o teor da fundamentação da decisão de facto contida na sentença recorrida, nela consignou-se que “O tribunal, não obstante a referida inoponibilidade, atendeu aos factos dados como provados no âmbito da acção acima identificada. Na verdade, teve lugar a audiência de discussão e julgamento, foram ouvidas testemunhas, foram tidos em consideração os documentos juntos aos autos, designadamente, os documentos agora juntos a fls. 115 e seguintes e a 129 e seguintes, e foi feita uma apreciação crítica da prova (cfr. certidão junta a fls. 155 e seguintes)”. Ou seja, segundo o que podemos concluir, o teor de tais documentos, depois de apreciados criticamente, fundaram a convicção alcançada quanto aos factos respectivos.
In casu” impõe-se, mais do que sindicar a formação da convicção alcançada em 1.ª instância, que este Tribunal valore, também à luz do princípio da livre apreciação da prova, ele próprio, de forma crítica e fundada, as provas existentes nos autos, a fim de formar, quanto a elas, um juízo autónomo de valoração, a fim de se aquilatar se são ou não idóneos para comprovar certa realidade.
O ónus probatório dos factos em causa impedia sobre o credor, ora apelado.
A lei admite o valor extraprocessual das provas, ou seja, admite que os depoimentos e arbitramentos produzidos num processo, desde que aí tenham sido sujeitas ao necessário contraditório, podem ser invocados noutro processo contra a mesma parte, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do art.º 355.º do C.Civil, verificadas que sejam as demais circunstâncias previstas no art.º 421.º do C.P.Civil.
Contudo a lei não admite que os factos julgados provados num processo e contidos na respectiva sentença sejam aceites, acriticamente, num outro processo como realidade comprovada. Tal não quer dizer que se faça “tábua rasa” dessa sentença, ou que tudo se passasse como se ela não existisse. Ela como documento que é, nessa parte, apreciada à luz do princípio da livre apreciação, e como um princípio de prova, deve ser ponderada e valorada em conjugação com os demais elementos probatórios a produzir nos autos.
No caso dos autos, dúvidas não temos que a sentença em causa tem a virtualidade de princípio de prova, mas apenas isso. Todavia, e como resulta também da fundamentação de facto da decisão recorrida, a 1.ª instância, não fundou a sua convicção apenas no teor de tais documentos, pois que analisou e interpretou criticamente também as várias peças processuais da referida acção declarativa n.º 5386/09.9TBVNG; o teor do documento junto a fls. 13 – carta enviada nos termos do disposto no art.º129.º n.º 4 do CIRE pelo A.I. a declarar reconhecer a favor do apelado um crédito no valor de €148.042,89; a reclamação de créditos apresentada pelo apelado, junta a fls. 19 e seguintes; o teor dos documentos juntos a fls. 115 e seguintes; o teor dos documentos juntos a fls. 129 e seguintes; o teor dos documentos juntos a fls. 131 e seguintes; o teor dos documentos juntos a fls. 155 e seguintes e ainda os depoimentos das testemunhas E…, G… e H….
E como prova de que aquelas certidões tiveram nos presentes autos, em sede probatória, o valor de princípio de prova, veja-se o que se deixou consignado na sentença recorrida a este propósito, ou seja, que “…o valor que foi dado como provado como correspondendo ao entregue a título de sinal e reforços é consideravelmente inferior ao alegado e peticionado na acção e ao que resultaria dos documentos juntos (cfr., a título de exemplo, documento denominado "Declaração/Recibo" junto a fls. 129); no entanto, é de atender ao valor aludido, considerando a fundamentação aduzida na resposta à matéria de facto (cfr. certidão de fls. 155 e seguintes e documentos de fls. 115 e seguintes), que aqui se dá por reproduzida".
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3.ªquestão – De Direito.
Como se sabe, o Incidente de Verificação e Graduação de Créditos visa, no seu essencial, definir os créditos sobre a massa insolvente e a sua graduação relativa, tendo em vista o pagamento dos credores reconhecidos através do património da insolvente. Efectuadas as atinentes reclamações de créditos, cfr. art.º 128.º do CIRE, deve o A.I. apresentar uma lista dos credores por si reconhecidos e uma lista dos não reconhecidos, cfr. art.º 129.º do CIRE. Podendo qualquer interessado impugnar a lista dos credores reconhecidos, tanto com fundamento na indevida inclusão como na indevida exclusão, ou na incorrecção do montante ou na errada qualificação dos ditos créditos.
Em concreto, preceitua o art.º 128.º n.º 3 do CIRE que: “A verificação tem por objecto todos os créditos sobre a insolvência, qualquer que seja a sua natureza e fundamento, e mesmo o credor que tenha o seu crédito reconhecido por decisão definitiva não está dispensado de o reclamar no processo de insolvência, se nele quiser obter pagamento”. Ou seja, a verificação não se restringe aos credores que estão munidos de título, mas está aberta a todos os credores, seja qual for a natureza ou fundamento do seu crédito.
Daí que no caso em apreço nos autos, o credor, ora apelado, tenha oportunamente reclamado o seu crédito junto da insolvência, peticionando ainda que lhe fosse reconhecidos direito de retenção sobre determinado bem imóvel, não obstante estar munido de sentença transitada em julgado que lhe havia reconhecido um crédito sobre a insolvente no montante de €89.998,00, acrescido de juros vencidos e vincendos, mais lhe reconhecendo que lhe assistia, em relação a tal crédito, direito de retenção sobre determinadas fracções de um bem imóvel. Sucede que o A.I. não obstante ter reconhecido o crédito reclamado pelo apelado e fundado na referida decisão, no valor de €148.042,89, não o considerou garantido por direito de retenção. Razão pela qual o apelado deduziu a presente impugnação à referida lista de créditos reconhecidos.
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Vendo os factos provados nos autos, é manifesto que o impugnante, ora apelado, fez prova bastante da existência do seu crédito – aliás reconhecido oportunamente pelo A.I. –.
Na verdade está assente nos autos que o credor/impugnante, ora apelado, C… celebrou com a ora insolvente, nos dias 15 de Janeiro e 5 de Março, de 2002, dois contratos promessa de compra e venda, pelo quais declarou prometer comprar a esta, que lhe declarou prometer vender, um “apartamento de tipo T2, sito no R/C frente, Rua .., com arrumo e lugar de garagem na cave” e um “apartamento de tipo T2, sito no Primeiro frente, Rua .., com arrumo e lugar de garagem na cave”, o primeiro pelo preço de €109.736,00 e o segundo pelo preço de €99.760,00, ambos livre de hipotecas, ónus ou encargos, conforme teor dos documentos juntos a fls. 134 a 136 e fls. 131 a 133.
As partes contratantes fixaram um prazo para a celebração dos contratos definitivos, ou seja, até 31 de Março de 2003, o que não ocorreu, tendo o promitente-comprador procedido à resolução de tais contratos, o que veio a ser confirmado pela sentença proferida na acção declarativa de condenação, com processo ordinário, que correu termos pela 1.ª Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, com o número 5386/09.9TBVNG, por a promitente-vendedora ter incumprido os ditos contratos por não ter entregue no respectivo Cartório Notarial a documentação necessária à outorga da escritura, mormente, a escritura de propriedade horizontal, certidão do registo da mesma e licença de habitabilidade, sentença, essa, que condenou a promitente-vendedora a pagar a quantia de €129.998,00, acrescida de juros de mora à taxa de 4%, desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento e que se encontra transitada em julgado.
Ora o contrato promessa definido como a convenção pela qual alguém se obriga a, dentro de certo prazo ou verificados certos pressupostos, celebrar determinado contrato, cfr. art.º 410.º do C.Civil. O contrato-promessa cria a obrigação de contratar, ou, mais concretamente, como refere Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, vol. I, pág. 309, a obrigação de emitir a declaração de vontade correspondente ao contrato prometido. A obrigação assim assumida gera uma prestação de facto positiva. Este pode ser bilateral se se vincularem ambas as partes ou, unilateral, se apenas uma ficar vinculada. Sendo certo que à promessa de transmissão ou constituição de direitos reais sobre bens imóveis, ou bens móveis sujeitos a registo, podem as partes atribuir eficácia real, mediante declaração expressa nesse sentido e inscrição no registo, cfr. art.º 413.º n.º 1 do C.Civil.
Como se sabe, é regime geral que, na hipótese de incumprimento do contrato por uma das partes, “pode a outra (parte), na falta de convenção em contrário, obter sentença que produza os efeitos da declaração negocial do faltoso, sempre que a isso não se opuser a natureza da obrigação assumida”. E entende-se haver sinal em contrário se existir sinal ou tiver sido fixada uma pena para o caso do não cumprimento da promessa, cfr. art.º 830.º n.ºs 1 e 2 do C.Civil.
Se quem constitui o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, preconiza o n.º 2 do art.º 442.º C.Civil, tem o outro contraente a faculdade de fazer sua a coisa entregue; se o não cumprimento do contrato foi devido a este último, tem aquele a faculdade de exigir o dobro do que prestou.
Ainda que não seja pacífico, vem maioritariamente sendo entendido que a simples mora não desencadeia a aplicação das sanções previstas no art.º 442.º C.Civil, sendo para tal necessário que ocorra uma situação de incumprimento definitivo do contrato-promessa.
Por força do estipulado no n.º 1 do art.º 410.º C.Civil, que faz equiparar o contrato-promessa ao contrato prometido, neste caso, a compra e venda, o incumprimento do contrato-promessa rege-se pelas disposições dos art.ºs 790.º e segs. C.Civil.
Se o devedor, por culpa sua, não realiza a prestação no tempo devido, mas esta prestação ainda é possível, então há mora do devedor, cfr. art.º 804.º n.º 2. Ora, de acordo com o art.º 808.º C.Civil a mora pode transformar-se em incumprimento definitivo nos casos de perda de interesse do credor pela prestação e não realização desta dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor.
Enquanto o interesse do credor na prestação se mantiver e se quiser que a mora do devedor se converta em falta de cumprimento, terá ele que dar nova oportunidade ao devedor em mora para que cumpra a sua obrigação. A interpelação admonitória do devedor em mora, sob a cominação apontada no n.º 1 do art.º 808.º, como assegura Antunes Varela, in ob. cit., pág. 346, não constitui apenas um poder conferido ao credor, porque representa ao mesmo tempo um ónus que a lei lhe impõe.
Pode acontecer que a simples mora inviabilize logo a realização do contrato, como genericamente o admite o art.º 808.º, no seu n.º 1, ao preconizar que a obrigação se tem como não cumprida quando a mora faça desaparecer o interesse do credor na prestação. Nestes casos já não haverá necessidade da interpelação admonitória para resolução do contrato, embora essa perda de interesse tenha de ser apreciada objectivamente, tal como se dispõe no n.º 2 do art.º 808.º, isto é, que se revele através de dados, de comportamentos que indubitavelmente demonstrem que a perda de interesse se equipara ao não cumprimento definitivo da obrigação.
O incumprimento definitivo da obrigação pressupõe uma situação de mora de uma das partes e ocorre quando haja perda de interesse do credor na prestação, apreciada em termos objectivos, ou pelo incumprimento do devedor dentro de prazo razoável fixado e comunicado pelo credor, notificação admonitória a que se reporta o art.º 808.º C.Civil.
Perante tais ensinamentos e vendo os factos assentes nos autos, há que reconhecer o crédito reclamado pelo ora apelado, correspondente ao dobro do sinal prestado, acrescido de juros de mora, nos termos definidos na referida sentença, no montante de €148.042,89.
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O credor impugnante reclama que seja reconhecido que esse seu crédito está garantido por direito de retenção sobre os imóveis em causa (dois apartamentos acima identificados).
Ora, o direito de retenção é um direito real de garantia, cfr. art.ºs 754.º, 758.º e 759.º, todos do C.Civil, e atribui a possibilidade ao seu titular de se pagar, com preferência aos demais credores, sobre o valor da coisa retida, constituindo também uma causa legítima de incumprimento de obrigação de responsabilidade. E sendo um direito real de garantia, o mesmo faz com que o credor possa recusar a entrega do imóvel até que seja satisfeito o seu crédito.
A lei prevê ainda alguns casos específicos em que este direito é concedido. Temos, desde logo, aquele a que se alude na al. f) do n.º 1 do art.º 755.º do C.Civil, segundo o qual goza do direito de retenção o beneficiário da promessa de transmissão ou constituição do direito real que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do artigo 442.º.
Ou seja, no caso de contrato-promessa de compra e venda de imóvel, é legalmente concedido o direito real de garantia ao promitente-comprador (beneficiário da promessa de transmissão) que obteve a transmissão da coisa, pelo crédito decorrente do não cumprimento imputável à outra parte. A concessão deste específico direito de garantia pressupõe a existência de um contrato-promessa, a tradição da coisa objecto do contrato prometido (traditio) e o incumprimento definitivo daquele contrato pelo promitente vendedor. Sendo que este direito nasce na esfera jurídica do promitente-comprador quando este entra na posse da coisa prometida vender, na sequência do contrato-promessa celebrado e a partir desse momento o direito mantém-se, garantindo ao seu titular a preferência sobre os outros credores, sendo que a sua eficácia não depende de declaração, decorrendo directamente da lei e é válido erga omnes.
E assim sendo, o art.º 755.º, n.º 1, f), do C.Civil faz depender o reconhecimento do direito de retenção da verificação dos seguintes requisitos:
- a existência de um crédito resultante de promessa de transmissão ou constituição de um direito real;
- entrega ou tradição da coisa objecto do contrato promessa (traditio);
- e incumprimento definitivo da promessa imputável ao promitente, como fonte do crédito do retentor;
- sendo ainda que, por força do teor do Ac. Unif. de Jurisprudência n.º 4/2014, publicado no DR, I Série, de 19.05.2014, no que toca à interpretação do art.º 755.º, n.º 1, al. f) do C.Civil, se entende que esta norma exige ainda que o beneficiário da promessa tenha de ter a qualidade de consumidor.
Sendo manifesto que incumbia ao credor/reclamante/impugnante a alegação e prova dos supra referidos requisitos ou factos constitutivos do direito de retenção a que se arrogava, cabendo à A.I. e à ora apelante a alegação e prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos desse mesmo direito.
Como se deixou já consignado, o reclamante/impugnante, ora apelado, titular de crédito resultante do incumprimento definitivo dos contratos promessas que celebrou com a ora insolvente e por banda desta, correspondente ao dobro do sinal prestado, acrescido de juros de mora, no montante de €148.042,89.
Ele beneficiou da traditio dos apartamentos em causa, pois como resultou provado posteriormente à celebração dos referidos contratos promessa, foram-lhe entregues pela promitente vendedora, as chaves de ambos os “apartamentos”, sendo que o mesmo, há mais de 3, 4 e 5 anos a esta data, à vista de todos, sem interrupção e sem oposição de ninguém, aí guarda bens próprios.
Como é sabido, a traditio que não é um elemento essencial do contrato-promessa, contudo, aparece muitas vezes a acompanhar a celebração deste contrato, ou seja, da transferência da coisa objecto do contrato. Mas devido à natureza do contrato promessa, a detenção da coisa por força do contrato não poderá originar uma situação de pura posse, com a presença e amplitude de todos os seus elementos (corpus e animus). O promitente-comprador não exerce, normalmente, uma verdadeira posse, mas apenas a mera detenção ou posse precária da coisa. Na verdade, o direito pessoal de gozo que a traditio confere ao promitente-comprador assenta na expectativa da alienação prometida e está, evidentemente, limitado por essa situação. Todavia, nada impede que o promitente-comprador se comporte como se dono da coisa, objecto do contrato, fosse, considerando segura a celebração do contrato prometido, e assim pratique actos possessórios em nome próprio sobre a coisa.
Perante tudo isto, nenhuma censura nos merece a decisão alcançada em 1.ª instância, no sentido de que o crédito reconhecido ao credor, ora apelado, beneficia de
direito de retenção. E uma vez que o prédio urbano onde se situam os bens prometidos vender, ou seja, o “apartamento de tipo T2, sito no R/C frente, Rua .., com arrumo e lugar de garagem na cave” e o “apartamento de tipo T2, sito no Primeiro frente, Rua .., com arrumo e lugar de garagem na cave”, descrito na Conservatória do Registo Predial de Espinho, freguesia …, com o número …./…….., não foi nem se encontra submetido ao regime da propriedade horizontal, não estando, por isso, autonomizadas as diversas fracções, o referido direito de retenção terá de incidir sobre todo o prédio urbano.
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Como resulta dos autos, o direito de crédito reconhecido à ora apelante encontra-se garantido, além do mais, por hipoteca voluntária constituída sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Espinho, freguesia …, com o número …./……...
Pelo que a questão primordial dos autos coloca-se em saber qual a prevalência relativa destas duas garantias – direito de retenção e hipoteca voluntária – incidentes sobre o mesmo bem imóvel e beneficiando, por um lado, o reclamante/impugnante, ora apelado, e por outro, o reclamante, ora apelante.
A apelante começa por defender que não se provou que o ora apelado tem a qualidade de consumidor, o que é elemento constitutivo do direito de retenção.
Relativamente a esta questão, a 1.ª instância refere que: “(…) a questão relativa ao facto de o impugnante ser ou não consumidor, considerando a jurisprudência uniformizada pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de Março de 2014 (Acórdão 4/2014, publicado no DR, I Série, de 19 de Maio de 2014), não pode, cremos, ser apreciada no âmbito dos presentes autos, tendo em conta, desde logo, que nenhum facto foi alegado que permita concluir ou não pela qualidade de consumidor do credor impugnante [o não reconhecimento do direito de retenção por parte do Sr. Administrador da Insolvência não se baseia no facto de o impugnante não ser consumidor e, por outro lado, na resposta à impugnação tal facto não é alegado]. Para além disso, o referido Acórdão foi proferido em 2014 e as reclamações de créditos foram apresentadas em 2012, não se podendo afirmar, cremos, que fosse exigível a alegação (ao menos eventual) e prova da qualidade de consumidor. O credor impugnante não pode, nesse sentido, ser agora responsabilizado pelas consequências da sua não alegação.
Assim sendo, afigura-se-nos que deve ser reconhecido ao credor C… o direito de retenção”.
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Como se sabe o Acórdão do STJ de 20.03.2014 - Acórdão n.º 4/2014, publicado no DR, I Série, de 19.05.2014 que uniformizou jurisprudência da seguinte forma: -“No âmbito da graduação de créditos em insolvência o consumidor promitente-comprador em contrato, ainda que com eficácia meramente obrigacional com traditio, devidamente sinalizado, que não obteve o cumprimento do negócio por parte do administrador da insolvência, goza do direito de retenção nos termos do estatuído no artigo 755.º n.º 1 alínea f) do Código Civil”.
Ora, como se vê, a definição do conceito de consumidor não foi expressamente incluído no segmento uniformizador do referido Ac.. Todavia, na nota de rodapé n.º 10, do mesmo, pode ler-se que “...o promitente-comprador é, in casu, um consumidor no sentido de ser um utilizador final, com o significado comum do termo, que utiliza os andares para seu uso próprio e não com escopo de revenda”.
Este entendimento expressa a noção de consumidor em sentido estrito, que de acordo com a grande maioria, se não a totalidade da Doutrina, é a adoptada no nosso ordenamento jurídico, cfr. Calvão da Silva, in “Vendas de Bens de Consumo, Comentário, pág. 44, para quem consumidor é a “pessoa que adquire um bem ou um serviço para uso privado – uso pessoal, familiar ou doméstico...mas não já aquele que obtém ou utiliza bens e serviços para satisfação das necessidades da sua profissão ou empresa”, Carlos Ferreira de Almeida, in “Direito do Consumo”, pág. 50, segundo o qual: “... parece, em princípio, mais ajustado que, quando se adopte um conceito genérico e supletivo de consumidor, ele se contenha em limites restritos, relacionados apenas com o uso pessoal ou familiar de bens fornecidos (ou disponíveis para fornecer) por quem exerça uma actividade profissional”.
Também a Lei n.º 24/96 - (Lei de Defesa dos Consumidores), define no n.º1 do seu art.º 2.º que consumidor é “todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma actividade económica que vise a obtenção de benefícios.” E finalmente, o DL n.º 24/2014, de 14.02, que transpôs a Directiva n.º 2011/83/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25.10.2011, relativa aos direitos dos consumidores, e define, por seu turno, consumidor, para efeitos desta norma, como “a pessoa singular que actue com fins que não se integrem no âmbito da sua actividade comercial, industrial, artesanal ou profissional.
A inclusão do conceito de consumidor no supra referido Ac. Uniformizador de Jurisprudência, restringindo a amplitude e o alcance do direito de retenção preceituado na al. f) do n.º 1 do art.º 755.º do C.Civil, fundou-se, como se infere da respectiva da fundamentação, nos ensinamentos do Prof. Pestana de Vasconcelos, in “Direito das Garantias”, pág. 374 e “Cadernos de Direito Privado” n.º 33, págs. 8 e 9, segundo o qual
É “consumidor a pessoa singular que actue para a prossecução de fins alheios ao âmbito da sua actividade profissional, através do estabelecimento de relações jurídicas com quem, pessoa singular ou colectiva, se apresenta como profissional”, se mostra “ponderada e equilibrada”, devendo “orientar o intérprete na concretização do consumidor para este efeito, dando inteiro cumprimento, no caso concreto, à ratio da disposição, o que vale dizer, só tutelando quem efectivamente é carente de tutela”, dizendo ainda que o art.º 755.º n.º 1, al. f), do C.Civil, é “…materialmente uma norma de tutela do consumidor” e que “…embora a letra da lei não faça essa precisão, o recurso aos outros elementos hermenêuticos permite reconstruir a ratio – que é, claro, o aspecto decisivo – e restringir, nessa medida, o alcance da norma: o direito de retenção do art.º 755.º, n.º 1, al. f) só beneficia o consumidor. Nos outros casos, ou seja, quando o promitente-adquirente não seja um consumidor, não há qualquer tutela particular”.
Não ignoramos que a “vexata quaestio” que se põe no direito do consumo é a própria noção de consumidor, a qual não se reduz a um único conceito, isto quer a nível do Direito Europeu, do Direito Nacional, da nossa Doutrina e, muito menos, da nossa Jurisprudência. Sendo que segundo a orientação jurisprudencial fixada no Ac. UJ n.º4/2014 de 20.03.2014, a qualidade de consumidor refere-se ao conceito restrito e funcional, segundo o qual o consumidor é a pessoa singular, destinatária final do bem transacionado, sendo-lhe alheio qualquer propósito de revenda lucrativa. No mesmo sentido, igualmente, os Acs STJ de 17.11.2015, no qual se considerou, além do mais que “O conceito de consumidor que o referido AUJ acolheu foi o conceito restrito, funcional, segundo o qual consumidor é a pessoa singular, destinatário final do bem transaccionado, ou do serviço adquirido, sendo-lhe alheio qualquer propósito de revenda lucrativa”; de 16.02.2016; de 24.05.2016 e de 5.07.2016, todos in www.dgsi.pt. Sendo que, em geral, a Jurisprudência do nosso Supremo Tribunal tem vindo a concluir que “a noção de consumidor até agora adoptada neste Supremo Tribunal acentua a qualidade de sujeito final na transacção do bem, excluindo apenas os comerciantes e aqueles que destinam o imóvel a revenda para obtenção de lucro”, cfr. Acs. do STJ de 16.02.2016 e 24.05.2016.
Não se ignora que “Apesar de não ter força obrigatória geral, como tinham os anteriores assentos (com a revogação do art.º 2.º do CC), nem natureza vinculativa para os outros tribunais, o acórdão de uniformização constitui um precedente qualificado, de carácter persuasivo, a merecer especial ponderação, que se julgou suficiente para assegurar a desejável unidade da jurisprudência. Daí que os tribunais só devam afastar-se da jurisprudência uniformizada em decisões fundamentadas que ponham convincentemente em causa a doutrina fixada”. Ou, como se refere no Ac. do STJ de 14.05.2009, in www.dgsi.pt “a decisão uniformizada, não sendo estrita e rigorosamente vinculativa, cria uma jurisprudência qualificada, mais persuasiva e, portanto, a merecer uma maior ponderação”.
Daí que para nós a noção de consumidor se reporta e salienta a qualidade e os objectivos do sujeito final na transacção do bem, excluindo-se, assim, desse conceito apenas os comerciantes e todos aqueles que destinem o imóvel a revenda visando, com isso, a obtenção de lucro.
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Vejamos então o caso dos presentes autos.
O ora apelado deduziu a impugnação à lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos, elaborada pelo A.I., nos termos do CIRE, em Agosto de 2012, ou seja, em data anterior à prolação do supra referido Ac. Unif. de Jurisprudência. Por tal razão nem o credor/impugnante alegou o que quer que fosse relativamente a essa temática, assim como também a ora apelante, em sede de resposta à impugnação, nada referiu quanto à mesma. Por outro lado, também, como se pode ver pela respectiva lista, o A.I. não reconheceu direito de retenção ao crédito do apelado, por razões diversas do facto do mesmo ser ou não ser consumidor.
Assim e em conclusão, a questão da qualidade de consumidor se verificar ou não no apelado não pode ser conhecida nos autos, pois que ao respectivo thema decidendum não foi trazida pelas partes. Por outro lado, à data da impugnação em apreço e da respectiva resposta, a questão não se colocava, como facto constitutivo do direito de retenção, logo não pode ser exigível agora conhecer da mesma, ou ainda mais grave, prejudicar o impugnante pela sua não alegação, e consequentemente, não prova.
Finalmente sempre se dirá que nem sequer se indicia, pelo menos, ostensivamente, dos autos, que o ora apelado, tenha a qualidade de comerciante ou que destinasse aqueles apartamentos a revenda visando, com isso, a obtenção de lucro.
Destarte, nenhum obstáculo se vê à decisão de se considerar reconhecido ao crédito do impugnante, ora apelado, a garantia de direito de direito de retenção incidente sobre todo o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Espinho, freguesia …, com o número …./……...
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Como já acima se referiu, o direito de crédito reconhecido à ora apelante encontra-se garantido, além do mais, por hipoteca voluntária constituída sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Espinho, freguesia …, com o número …./……...
A hipoteca confere ao credor reclamante o direito de ser pago pelo produto da venda do imóvel apreendido com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo e pelo montante máximo garantido pela mesma, cfr. art.º 686.º n.º1 do C.Civil.
Em sede de graduação de créditos em processo de verificação e graduação apenso a processo de insolvência, o direito de retenção prevalece sobre a hipoteca, a qual, por sua vez, goza de preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial, cfr. art.ºs 759.º n.º2 e 686.º n.º1 do C.Civil. Pelo que “in casu” o crédito do ora apelado goza do direito de retenção e tal direito prevalece sobre a hipoteca que garante o crédito da ora apelante, tudo relativamente ao produto da venda do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Espinho, freguesia …, com o número …./……...
Pelo que, sem necessidade de outros considerandos, improcedem as demais conclusões da apelante.

Sumário: I – O art.º 755.º, n.º 1, f), do C.Civil faz depender o reconhecimento do direito de retenção da verificação dos seguintes requisitos:
- a existência de um crédito resultante de promessa de transmissão ou constituição de um direito real;
- entrega ou tradição da coisa objecto do contrato promessa (traditio);
- e incumprimento definitivo da promessa imputável ao promitente, como fonte do crédito do retentor ;
- sendo ainda que, por força do teor do Ac. Unif. de Jurisprudência n.º 4/2014, publicado no DR, I Série, de 19.05.2014, no que toca à interpretação do art.º 755.º, n.º 1, al. f) do C.Civil, se entende que esta norma exige ainda que o beneficiário da promessa tenha de ter a qualidade de consumidor.
II - A inclusão do conceito de consumidor no supra referido Ac. Uniformizador de Jurisprudência, restringindo a amplitude e o alcance do direito de retenção preceituado na al. f) do n.º 1 do art.º 755.º do C.Civil.
III - Em sede de graduação de créditos em processo de verificação e graduação apenso a processo de insolvência, o direito de retenção prevalece sobre a hipoteca, a qual, por sua vez, goza de preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial, cfr. art.ºs 759.º n.º2 e 686.º n.º1 do C.Civil.

IV – Pelo exposto acordam os Juízes desta secção cível em julgar a presente apelação improcedente e em confirmar a decisão recorrida.
Custas pela apelante.

Porto, 2017.04.06
Anabela Dias da Silva
Ana Lucinda Cabral
Maria do Carmo Domingues