Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1615/21.9T8PNF.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: NELSON FERNANDES
Descritores: PRINCÍPIO DO PEDIDO
REMIÇÃO DE PENSÕES
PRESSUPOSTOS DA REMIÇÃO PARCIAL DE PENSÃO POR INCAPACIDADE IGUAL OU SUPERIOR A 30%
Nº do Documento: RP202402191615/21.9T8PNF.P1
Data do Acordão: 02/19/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO PROCEDENTE; REVOGADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I- A prova só pode ter por objeto factos positivos, materiais e concretos, sendo que tudo o que sejam juízos de valor, induções, conclusões, raciocínios, valorações de factos, em particular quando envolvam a aplicação do direito com relevância na causa, é atividade estranha e superior à simples atividade instrutória.
II- A retribuição do trabalho é integrada pelo conjunto de valores (pecuniários ou não) que a entidade patronal está obrigada a pagar, regular e periodicamente, ao trabalhador em razão da atividade por ele desempenhada – mais rigorosamente, da disponibilidade da força de trabalho por ele oferecida.
III- Cabe à entidade empregadora, nos termos dos artigos 344.º, n.º 1, e 350.º, n.º 1, do Código Civil (CC), provar que determinada atribuição patrimonial por ela feita ao trabalhador não integra a sua retribuição, sob pena de não lhe aproveitar a previsão do artigo 260.º e de valer a presunção estabelecida no n.º 3 do artigo 249.º do CT/2003 e 258.º do CT/2009, de que se está perante prestação com natureza retributiva.
IV- Em resposta à questão de saber quando deve ser considerada regular e periódica uma prestação, deverá atender-se à média das quantias auferidas nos doze meses que antecedem aquele em que é devido o pagamento, desde que, nesse período, tenha sido auferida tal prestação em, pelo menos, onze meses.
V- Estando previsto no contrato o pagamento de designados prémios de produtividade e qualidade, numa percentagem por referência à remuneração mensal do trabalhador, em função de critérios que deveriam ser definidos pelo empregador, sendo de imputar apenas a este último a não definição desses critérios, é devido o pagamento de tais prémios ao trabalhador e, cumpridos os critérios aludidos em IV, devem ser atendidos para efeitos de cálculo da remuneração de férias, mas já não do respetivo subsídio, pois que têm uma causa específica e individualizável diversa da remuneração do trabalho ou da disponibilidade para este.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação / Processo n.º 1615/21.9T8PNF.P1

Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este, Juízo do Trabalho de Penafiel - Juiz 1

Autores: AA e outros  

Ré: Centro Hospitalar ..., E.P.E.

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Nélson Fernandes (relator)

Teresa Sá Lopes

Rita Romeira

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I - Relatório

1. AA, BB e CC intentaram contra o Centro Hospitalar ..., E.P.E., ação declarativa comum, na qual peticionam a condenação deste a pagar: 1) ao 1º A. a quantia de € 156.687,72, a título de prémios vencidos; 2) à 2ª A. a quantia de € 156.687,72, a título de prémios vencidos; 3) à 3ª A. a quantia de € 156.687,72, a título de prémios vencidos; 4) a cada um dos AA. os prémios que entretanto se vencerem, respeitantes a cada mês após Maio de 2021, no valor de 10% sobre a retribuição mensal atualizada (prémio de qualidade) e 20% sobre a retribuição mensal atualizada (prémio de produtividade); 5) os prémios referidos em 4) vincendos, desde o trânsito em julgado e até à cessação do contrato, a ambos os AA.; 6) a cada um dos AA. juros de mora à taxa legal em vigor, desde a citação do R. na presente ação e até efetivo e integral pagamento, relativamente aos valores supra referidos.

Para tal alegaram os Autores, em síntese: terem celebrado um contrato de trabalho com o Réu, sendo o 1º e a 3ª AA. para exercerem funções correspondentes à categoria profissional de médico assistente hospitalar e a 2ª A. de assistente hospitalar de medicina interna; nos contratos de trabalho (e, no caso da 3ª A., de adenda ao mesmo) consta o abonamento de um prémio de qualidade e de um prémio de produtividade aquando da abertura e funcionamento da Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência e se verificados os critérios que integrarão adenda específica aos contratos a definir em adenda, a partir da data da referida assinatura; não foram estabelecidas adendas nem conhecidos critérios escritos relativos a estes prémios; desde Dezembro de 2009 que iniciou o funcionamento da Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência onde exercem funções, pelo que os prémios são devidos desde Janeiro de 2010; cabia ao Réu a formalização dos critérios, tendo sido interpelado diversas vezes pelos Autores para apresentação da adenda; desde 2009 foram criadas expectativas na esfera dos Autores de serem abonados com o valor dos prémios, que por isso trabalharam com a máxima qualidade e produtividade; Os 1º e 3ª Autores exerciam funções noutros locais, tendo cessado os anteriores contratos para iniciar funções junto do Réu, com custos pessoais e mediante a expectativa de auferir um rendimento superior através dos prémios em causa; a 2ª Autora, à data da celebração da adenda que previu os prémios, fazia um esforço pessoal em deslocações, com expectativa de auferir um rendimento superior através dos prémios em causa; estes prémios, têm caracter de retribuição e devem ser incluídos no subsídio de férias; a atribuição dos prémios ficou apenas sujeita a uma condição suspensiva, consistente na entrada em funcionamento da Unidade de Cuidados mencionada, o que ocorreu em dezembro de 2009, pelo que tinha o Réu a obrigação contratual de formalizar os critérios de atribuição dos prémios e seu pagamento, o que este incumpriu, tendo causado prejuízo aos Autores; sem prescindir, alegam ainda que existiu a violação pelo Réu de uma expectativa jurídica remuneratória criada aquando do estabelecimento dos prémios com os Autores, que foi essencial à formação de vontade de contratar destes e que foi violada, pelo que, também estaria o Réu obrigado a indemnizar os Autores pelos danos sofridos por via da responsabilidade pré-contratual; invocam também o disposto no artigo 227.º do Código Civil.

Realizou-se audiência de partes, na qual não foi possível a sua conciliação.

Regularmente citada, veio a Ré deduzir contestação, na qual, em síntese: aceita a existência dos contratos de trabalho, suas adendas, teor e remunerações, bem como data de início de funcionamento da Unidade de Cuidados Intermédios, a ausência da adenda e fixação dos critérios para pagamento dos prémios em questão; alega que em 21/09/2016 foi criado o Serviço de Medicina Intensiva, sendo que a Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente foi, juntamente com a Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente e Sala de Emergência, integrada naquele, o que determinou que a partir de tal data os Autores exerçam funções integrados no Serviço de Medicina Intensiva, com rotação pelas Unidades que o integram; o 1º Autor, em outubro de 2020 adquiriu o grau de assistente hospitalar de Medicina Intensiva e as demais Autoras exercem funções na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente e Sala de Emergência; das Cláusulas resulta a necessidade de definir critérios métricos de avaliação da qualidade e produtividade para determinação do pagamento dos prémios, que só se vencem após a celebração da adenda, o que não ocorreu; alega que tal omissão resulta da realidade complexa dos Centros Hospitalares integrados no SNS em constante mutação; apenas a 3ª Autora o interpelou em 2011 e depois todos eles no início do ano; a definição das métricas a utilizar tem natureza difícil e complexa, sendo impossível a redação de critérios individuais de qualidade, apenas podendo ser definidos critérios para o Serviço de Medicina Intensiva, com medição da qualidade e produtividade global daquele; impugna ainda o carácter remuneratório dos prémios.

Conclui pela improcedência da ação, por não provada, e pela sua absolvição dos pedidos.

Proferido despacho de convite ao aperfeiçoamento da petição inicial, vieram os Autores responder a tal convite, invocando, mais uma vez em síntese: que não se devem considerar critérios objetivos de avaliação da qualidade ou produtividade, sendo que a 3ª Autora, antes da assinatura do contrato, questionou a representante do Réu quanto aos critérios que iriam constar da adenda, o qual afirmou que não passariam de meras formalidades e que, no limite, seriam a ausência de queixas ou reclamações de utentes ou familiares, para preenchimento do critério de qualidade, e a manutenção da taxa de mortalidade abaixo dos 15% como critério de produtividade; só estes podem servir para avaliação; colaboraram com o Serviço de Medicina Interna na substituição de elementos desse serviço nos turnos de urgência e, após a abertura da Unidade de Cuidados intermédios o resultado de cada hora de trabalho passou a ser muito mais exigente, com grau de concentração e atenção, desgaste físico e mental maior; impugnam ainda o alegado pelo Réu quanto à falta de carácter retributivo dos prémios; invocam a litigância de má fé do Réu, por assumir um comportamento que consubstancia abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium e requerem a sua condenação em multa e indemnização, em montante que o Tribunal fixará em seu prudente arbítrio.

A Ré deduziu resposta à matéria aperfeiçoada: na qual aceita as funções alegadas pelos Autores e, quanto ao mais, alega que os critérios terão de ser objetivos, mensuráveis e avaliáveis e que o alegado pelos Autores quanto a uma mera formalidade encontra-se em oposição com o teor das cláusulas contratuais; a retribuição base estabelecida para os Autores era superior à praticada; manteve a posição já assumida quanto à natureza dos prémios; alega ainda a inexistência de litigância de má fé da sua parte, inexistindo dolo ou negligência.

Fixado o valor da causa em €470.063,16, afirmou-se de seguida a validade e regularidade da instância, após o que se identificou o objeto do litígio e se enunciaram os temas da prova.

2. Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi, por fim, proferida sentença, de cujo dispositivo consta:

“Pelo exposto, julga-se a acção procedente e, em consequência, condena-se o R. a pagar:

A) Ao 1º Autor, AA, a quantia de € 156.687,72 (cento e cinquenta e seis mil seiscentos e oitenta e sete euros e setenta e dois cêntimos), a título de prémios vencidos, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o dia seguinte ao da citação do R. até efectivo e integral pagamento;

B) À 2ª Autora, BB, a quantia de € 156.687,72 (cento e cinquenta e seis mil seiscentos e oitenta e sete euros e setenta e dois cêntimos), a título de prémios vencidos, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o dia seguinte ao da citação do R. até efectivo e integral pagamento;

C) À 3ª Autora, CC, a quantia de € 156.687,72 (cento e cinquenta e seis mil seiscentos e oitenta e sete euros e setenta e dois cêntimos), a título de prémios vencidos, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o dia seguinte ao da citação do R. até efectivo e integral pagamento;

D) Aos 1º, 2ª e 3ª Autores os prémios que, entretanto, se venceram, respeitantes a cada mês após Maio de 2021, isto é, desde a data de propositura da ação, no valor no valor de 10% sobre a retribuição mensal atualizada (prémio de qualidade) e 20% sobre a retribuição mensal atualizada (prémio de produtividade), bem como os vincendos, desde o trânsito em julgado e até à cessação do contrato de cada um dos Autores;

E) Absolve-se o R. do pedido de condenação como litigante de má fé.

Custas a cargo do R. (cfr. artigo 527º nºs. 1 e 2 do CPC).

Registe e notifique.”

2.1. Não se conformando com o assim decidido, apresentou o Réu requerimento de interposição de recurso, formulando, no final das suas alegações, as conclusões seguintes:

“I - O presente recurso decorre da mui douta sentença proferida nos autos uma vez que o ora Recorrente não se conforma, com a decisão proferida pela Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, porquanto, não interpretou nem aplicou corretamente aos factos dos autos as normas de direito que lhe eram aplicáveis, por um lado, e, por outro lado, padece de incorreto julgamento da matéria de facto, devendo, por isso, ser alterada ou anulada à luz do art.º 662.º n.º 1 e 2 al. c) do Cód. Proc. Civil (doravante CPC).

II - Por outro lado, acresce que a mesma se figura deficiente, ambígua e até contraditória na sua fundamentação, devendo, por isso, ser alterada e /ou anulada à luz, respetivamente do artigo 615.º n.º1 al. c) do CPC.

III - Nos termos do disposto no art.º 342.º, n.º 1, do Código Civil, competia aos Autores/Recorridos o ónus de alegação e de prova quanto aos factos constitutivos dos direitos que se arrogavam, porém, estes não lograram provar matéria fáctica bastante para obter sucesso na sua pretensão.

IV - Com a devida vénia, decidiu mal o Tribunal Recorrido evidenciando error in judiciando, pois que, percebe-se um total desvio da decisão proferida face à realidade factual e jurídica atentos os factos e, bem assim, uma evidente contradição e ambiguidade no que respeita aos factos provados, factos não provados e respetiva fundamentação, pelo que, a Douta Sentença deve ser alterada em conformidade, devendo ser deferido o presente recurso;

V - E, como se demonstrará não existem fundamentos para a condenação do Recorrente no pagamento a cada Autor do montante de €156.687,72 (cento e cinquenta e seis mil seiscentos e oitenta e sete e setenta e dois cêntimos);

VI - Não olvidamos que, constitui uma tarefa espinhosa, cuja complexidade radica essencialmente na dificuldade em captar, com sentido crítico e analítico, os factos controvertidos a partir da narração que é trazida, nomeadamente pela prova testemunhal produzida em audiência de julgamento, porém, nem por isso está o Julgador desonerado de a exercer norteado, como lhe compete, pela nobre tarefa de privilegiar a substância em detrimento da forma, buscando alcançar a verdade material, que não a meramente formal, ou seja, numa palavra, fazer Justiça.

VII - In casu, é notório a ocorrência de 'erro de julgamento' quando o Tribunal dá como 'provado' certo facto relativamente ao qual não foi feita prova que o alicerce, pelo contrário, a prova produzida evidencia clara contradição com o facto assente;

VII - Isto posto, face à decisão sub judice e considerando a prova concretamente elencada na mesma, da audição do registo áudio e confrontação com a prova testemunhal, sempre se dirá que pese embora o contexto da livre convicção, a Meritíssima Juiz a quo errou, de forma flagrante, no julgamento da matéria de facto em função das provas produzidas, inviabilizando deste modo um juízo de mérito.

VIII - Porquanto, verifica-se contradição insanável, inultrapassável, ainda que com recurso ao contexto da decisão no seu todo ou às regras da experiência comum, quando se deram como provados e não provados factos que se encontram em manifesta oposição com a prova testemunhal e documental carreada para os autos e, bem ainda, respetiva fundamentação, que culminou com condenação do Recorrente.

IX - Como se verá, uma das questões fulcrais na presente ação respeita à questão do pagamento do prémio peticionado, mais concretamente, se o mesmo deverá ser considerado prémio ou retribuição, uma vez que, não obstante, o peticionado pelos Autores se reconduzir ao pagamento de quantias a título de prémios, conjugando o pedido a final apresentado pelos Autores na Petição Inicial com o pedido apresentado no decorrer da PI, concluímos que as quantias peticionadas pelos Autores, são a título de retribuição e não de prémio.

X - Assim, impunha-se que a sentença do tribunal à quo, além de se pronunciar quanto ao direito ao valor pedido, que como se virá não é devido, se tivesse pronunciado quanto à sua natureza (prémio ou retribuição) de forma inequívoca e perentória, todavia, não logrou alcançar tal desiderato.

XI - Em bom rigor, quer em sede dos factos provados, quer no âmbito da motivação da decisão de facto e, ainda, na fundamentação de direito, a sentença ora em crise foi trilhando dois caminhos em simultâneo, ora considerando prémio ora retribuição, ora conjuntamente ambas as valências, para a final concluir e condenar no pagamento de prémio.

XII - Reitera-se que o contrato de trabalho estabelece, além de um prémio de assiduidade, um prémio de produtividade e de qualidade, cujos critérios se encontram pendentes de respetiva densificação, através da elaboração de adenda, e o seu pagamento dependente da sua verificação, o que de resto se logrou provar como adiante se demonstrará.

XIII - Ora, percorrendo o iter cognoscitivo da sentença, resultam provados factos contraditórios entre si, como ao diante se demonstrará, e, igualmente a motivação e fundamentação de direito se afigura ambivalente, paradoxal.

XIV – Desde logo, resulta evidente a contradição ínsita nos factos UU), BBB) e CCC), ora, o facto constante da alínea UU) confere natureza retributiva aos prémios de qualidade e de produtividade, por seu lado, as alíneas BBB) e CCC) no seguimento do expendido na alínea acima, excluem a natureza retributiva dos prémios de assiduidade conferindo-lhe, somente, a natureza de prémio, dando-se como provado que aqueles prémios de qualidade e de produtividade dependem, primeiramente, da definição de métricas a utilizar para definição de critérios (alínea BBB), que uma vez atingidos será devido o pagamento (alínea CCC).

XV - Afigura-se assim paradoxal, contraditório, a convivência do facto provado UU) com os factos provados BBB) e CCC), sendo certo que na motivação dos pontos UU) BBB) e CCC) e quanto ao facto não provado 16, os mesmos estribam-se no teor dos contratos celebrados e adendas conjugadas com as declarações dos AA, pelo que, não se compreende qual a fundamentação para dar como provado, o facto UU) e os factos BBB) e CCC) em face da total e absoluta contradição que em si encerram.

XVI - Prosseguindo, o teor das cláusulas dos contratos celebrados entre Recorrente e Recorridos, no que tange às Cláusula referentes aos prémios de qualidade e de produtividade, consta dos factos provados, para o primeiro Autor factos H) e I), para a segunda Autora J) e K), e para a terceira Autora L) e M), as quais, como se percebe, são comuns aos três Autores.

XVII - Da sua leitura escorre que ambos os prémios se encontram dependentes da abertura e efetivo funcionamento da Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência e, no que tange ao prémio de qualidade, referem ainda, que os critérios para atribuição do prémio serão posteriormente definidos em adenda, vencendo-se os ditos prémios a partir da referida adenda, existindo, assim, uma dupla condição suspensiva.

XVIII - Prevendo-se o estabelecimento de critérios em cláusulas concernentes ao pagamento de prémios, os mesmos terão de ser verificar, de outra forma não faria sentido estabelecê-los, e, nestes termos considerando a invocada teoria da impressão do destinatário, alicerçada, como se refere na sentença, na regra de que “o sentido da declaração negocial é aquele que seria apreendido por um declaratário normal, colocado na posição do declaratário real, em face do comportamento de declarante” – artigo 236 n.º 1 do Código Civil, conjugada, com o facto de estarmos perante um negócio reduzido a escrito, que impõe, nos termos do artigo 238.º n.º 1 do CC, que a declaração não possa valer num sentido que tenha não tenha o mínimo de correspondência com o texto do respetivo documento.

XIX – Nesta senda, não podia a sentença do tribunal a quo apoiar-se na mesma motivação para dar como provados dos factos UU), BBB) e CCC), tal motivação apenas servirá para os factos BBB) e CCC), não tendo qualquer conexão, correlatividade, por não corresponder ao aceite e contratado pelos outorgantes daquele contrato de trabalho quanto ao facto provado UU).

XX - A ambiguidade da sentença, mantém-se na “Fundamentação e direito”, quando chegado o momento de determinar a natureza retributiva dos prémios de qualidade e de produtividade, pois que, conclui como demonstrado que (i) as partes estipularam que os mesmos seriam pagos mensalmente, como contrapartida da atividade desenvolvida pelos Autores na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, assim que ela fosse criada e funcionasse, no período normal de trabalho de cada um; (ii) estando dependentes do preenchimento de requisitos de qualidade e de produtividade que poderiam ou não, no final do período temporal respetivo, ser alcançados.

XXI – Como se alcança, a sentença, refere na primeira parte do parágrafo que as partes estipularam que os prémios de qualidade e de produtividade seriam pagos mensalmente como contrapartida do trabalho prestado na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, portanto, que aqueles prémios teriam um cariz de retribuição; porém, seguidamente, conclui o inverso, isto é, que os referidos prémios se encontravam dependentes do preenchimento de requisitos de qualidade e de produtividade, que poderiam ou não, no final do período temporal respetivo, ser alcançados, retirando o cariz retributivo dos referidos prémios, o que é demonstrativo que estas prestações não são retribuição.

XXII – O douto aresto é, assim, anfibológico, na medida em que exprime a existência de uma plurissignificação ou de uma polissemia de sentido, pois que, ora confere cariz retributivo aos ditos prémios de qualidade e de produtividade, ora, lhes retira o seu cariz retributivo, evidente nos factos provados, perpassando posteriormente para a motivação, para a fundamentação de direito e para o dispositivo da sentença, o que a torna ininteligível.

XXIII - O que vem de expor é enquadrável no conceito legal de nulidades da sentença, inscrito na 2.ª parte da alínea c), do n.º1, do art.º 615.º, do C. P. C., no qual se determina que a sentença é nula quando “os fundamentos estejam em oposição com a decisão, ou ocorra ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível”, pelo que, sendo patente a ambiguidade e a ininteligibilidade ao longo da sentença, numa das suas questões fulcrais, isto é, a que título são devidos os valores peticionados pelos Autores, Recorridos, se a título de retribuição se a título de prémio, terá a mesma que se considerar nula nos termos da 2.ª parte da alínea c), do n.º1, do art.º 615.º, do C. P. C., com todos os efeitos legais o que desde já se requer.

XXIV - O Recorrente discorda, igualmente, do tratamento fáctico-jurídico dado pelo Tribunal a quo aos factos LL), MM) e OO) que, consequentemente, devem os mesmo ser revistos de forma a passar a constar da matéria de facto não provada, isto porque, tendo em atenção que o Tribunal a quo deu como provado que no momento da celebração do contrato, o representante da R., DD, terá afirmado que quantos aos critérios de qualidade e de produtividade, que os mesmos não passariam de meras formalidades e que no limite, seriam a ausência de queixas ou reclamações de utentes ou familiares e a inexistência de uma taxa de mortalidade levada;

XXV – O certo é que, avançando na sentença, na sua matéria de facto assente, percebemos que em momento algum foram mencionados critérios diferentes, do referidos em sede de negociação, pois que, na motivação destes factos, o douto aresto atende às declarações da terceira Autora/Recorrida, conjugado com os depoimentos prestados pela DD, EE, FF, GG, sendo que, apenas a terceira Autora mencionou que os critérios de qualidade e de produtividade, não passariam de meras formalidades e que no limite, seriam a ausência de queixas ou reclamações de utentes ou familiares e a inexistência de uma taxa de mortalidade levada.

XXVI – Factos que nos permitem concluir que tal não corresponde à verdade, não têm correspondência com a prova documental junta aos autos e com a prova produzida em julgamento, sendo notória a contradição existente entre a versão apresentada pela terceira Autora CC, em sede de audiência de discussão e julgamento, e a anteriormente apresentada por esta e pelos Autores/Recorridos ao longo do tempo, e as declarações da segunda Autora BB;

XXVII - Evidência dessa contradição, são as missivas remetidas pelos Autores ao Recorrente no âmbito deste assunto, as quais referiam expressamente que ainda não se encontravam estabelecidos os critérios tendentes ao pagamento dos prémios previstos, na mesma senda, o mesmo foi alegado em sede de Petição Inicial, ipsis verbis.

XXVIII – Neste conspecto, note-se que a terceira Autora/Recorrida CC dirigiu-se ao ora Recorrente referindo que “nunca lhe foi apresentada a supra referida adenda nem nenhum critério tendente à atribuição do prémio de qualidade e de produtividade”, em clara contradição com os factos alegados em sede de Requerimento de Aperfeiçoamento da PI, LL), MM) e OO), que correspondem ao teor do depoimento da Autora Recorrida Dra. CC, e teor constante das missivas remetidas, e, bem assim o inicialmente alegado em na PI;

XXIX - Em contradição com os referidos factos LL) MM) e OO), temos ainda as Declarações da segunda autora BB, prestadas em audiência de julgamento, porquanto, expos uma versão quantos aos critérios alegadamente apresentados, completamente diferenciada da que consta nas missivas remetidas antes da propositura da ação, na PI, no Requerimento de Aperfeiçoamento à PI e da versão dada pela Autora CC.

XXX - Neste contexto, será legitimo questionar, se, apesar da alteração efetuada no seu contrato de trabalho, com a redução do valor do prémio de assiduidade e com a introdução do prémio de produtividade e de qualidade, estes dois últimos seriam, também, pagos de acordo com a assiduidade, porque é que não se alterou apenas a percentagem do prémio de assiduidade, passando esta para 40%, teria sido mais simples e corresponderia ao verbalmente acordado?!

XXXI – Repare-se que esta Autora falou sempre no plural… apresentando esta versão como sendo a apresentada também aos seus colegas Autores “não tínhamos que nos preocupar” “e que não nos preocupasse que iam ser critérios simples e tangíveis e que se baseavam na assiduidade” na sua versão dos factos, os prémios de qualidade e de produtividade seriam pagos com base na assiduidade, ergo, facilmente se alcança que os depoimentos prestados pelos Autores/Recorridos não foram coerentes entre si, contradizendo-se e, bem assim, entram com contramão com a versão inicialmente apresentada, constante das missivas enviadas ao Recorrente, com os factos inicialmente alegados em sede da PI, com o teor do ínsito nos pontos da cláusula que respeitam ao prémio de qualidade e produtividade dos próprios Contratos.

XXXII - Na verdade, considerando os factos provados, constantes das alíneas H) a M) concernente ao teor das cláusulas do prémio de qualidade e de produtividade, é absolutamente desprovido de sentido, que um contrato refira expressamente a necessidade de estabelecer critérios, quando os mesmos já foram estabelecidos entre as partes.

XXXIII – Pelo que, afigura-se mandatório dar resposta à seguinte questão: Um médico normalmente médio e esclarecido, zeloso e sagaz, não estranharia que do teor da cláusula inserta no Contrato de Trabalho apresentado, o pagamento dos prémios de Qualidade e Produtividade estivesse condicionado à fixação e preenchimento de determinados critérios mas que (alegadamente) a Representante do ora Recorrente lhe transmitisse que tal não passaria de uma mera formalidade e que, no limite, os critérios seriam a ausência de queixas ou reclamações de utentes ou familiares e a inexistência de uma taxa de mortalidade elevada?

XXXIV - Um qualquer médico, em consciência, colocado nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar não haveria de solicitar que o (supostamente) transmitido pela Representante do Recorrente estivesse em consonância com o teor das cláusulas insertas no Contrato de Trabalho apresentado? Se efetivamente fosse intenção os Autores/Recorridos e Recorrente, em sede de negociação dos contratos e da adenda contratual, não seguir mais critérios objetivos, não haveria tal intenção de encontrar o mínimo de correspondência no teor dos Contratos de Trabalho e Adenda Contratual?

XXXV – Não se olvide que, os Autores/Recorrentes, conforme resulta da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, integraram os serviços do Recorrente não por concurso, mas sim por convite, que naturalmente, se traduz numa vantagem significativa sobre outros médicos no que concerne ao poder de negociação sobre o teor das cláusulas contratuais do contrato de trabalho;

XXXVI - Além do mais, esta realidade de atribuição de prémios não era nova para os Autores/Recorrentes, atente-se ao Contrato de Trabalho da Autora/Recorrente CC, celebrado com o Hospital ..., E.E.E, junto com a PI sob DOC. 11, cláusula 7ª; de igual modo, observe-se que o Contrato de Trabalho da Autora/Recorrida BB, celebrado em 12 de julho de 2007, previa a atribuição de um prémio de assiduidade de 32%; contudo, com a celebração de Adenda ao Contrato de Trabalho, com efeitos após 3 de dezembro de 2009, o teor da cláusula em questão sofreu alterações, designadamente, no que respeita à redução do prémio de assiduidade até então pago e, também, quanto à previsão de mais 2 prémios – Qualidade e Produtividade, sendo que no momento de celebração da referida adenda tais alterações foram conversadas com a Autora/Recorrente.

XXXVII - Por último, reitera-se que a motivação da sentença, refere, para dar como provado LL), MM) e OO), atendeu não só às declarações da terceira autora, mas também às declarações do então presidente do Conselho de Administração EE, Vogal Responsável pelos Recursos Humanos DD e FF Diretor do Serviço de Urgência, porém, nenhumas destas testemunhas, mencionou que tivesse acordado com os Autores critérios para aferir da qualidade e produtividade, com vista ao pagamento dos prémios.

XXXVIII - Summo rigore, a testemunha EE, conforme se vê nas declarações acima transcritas, mencionou vários exemplos de critérios, criados para outros serviços, porém, jamais falou em critérios previamente estabelecidos, atente-se no seu depoimento, gravado em CD com a designação de 26/09/2022, às 12h06;

XXXIX - Igualmente a testemunha FF, Diretor do Serviço de Urgência à data, mencionou genericamente a existência de critérios, mas jamais referiu que tivesse definido com os Autores quaisquer critérios, atente-se no depoimento prestado, gravado em CD, com a designação 30/06/2022 às 16h09, aliás, referiu perentoriamente a necessidade de definir objetivos concretos, um modo de medir a possibilidade da atribuição do prémio, para concluir que nunca foram criados.

XL - Também a testemunha vogal de Recurso Humanos DD, mencionou a necessidade de estabelecer critérios, atente-se no seu depoimento, gravado em CD faixa de 30/06/2022, às 11h00, acima transcrito.

XLI - Nestes termos, considerando todas as contradições que se acabam de expor, e considerando o depoimento das testemunhas mencionadas, terão de se ter como não provadas as alíneas LL), MM), OO), passando as mesmas a integrar factos não provados, sem prejuízo de, também, encontrarem-se em flagrante contradição com os factos provados em BBB) e CCC), como se demonstrará.

XLII - Prosseguindo, o facto UU) dos factos provados, considerando a prova produzida, deverá igualmente considerar-se como não provado, atente-se, pois, nos depoimentos acima transcritos das testemunhas, EE, FF e DD, da sua conjugação verificamos que o pagamento do prémio de qualidade e de produtividade iria depender da verificação dos critérios a estabelecer, o que de resto encontra suporte nas cláusulas contratuais acima transcritas.

XLIII – Acresce dizer que, os Recorridos/Autores, por seu lado, reclamaram nas missivas enviadas ao Conselho, conforme documento n.º 6, 9 e 10 juntos com a PI a definição desses critérios, porquanto, apenas com a definição dos mesmos era possível medir a qualidade e produtividade de forma a verificar se o mesmo era devido no período respetivo, pelo que, os critérios relativos aos prémios de qualidade e produtividade, sempre seriam condição necessária para abono dos mesmos.

XLIV - Ao dar como provado que os prémios de qualidade e de produtividade seriam pagos como contrapartida da atividade desenvolvida na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, o tribunal à quo olvidou a prova testemunhal e documental produzida, pois que, se provou que estes prémios não estavam antecipadamente garantidos, antes dependiam da verificação mensal dos critérios a estabelecer, razão bastante para que se imponha considerar este facto como não provado.

XLVI - Volvendo ao acima referido, a sentença do Tribunal à quo deu como provado os factos constantes das alíneas LL), MM), OO) e UU), o que será dizer que entre Autores e representante da Ré, haviam sido combinados critérios de qualidade e de produtividade, que não passariam de meras formalidades e que, no limite, seriam a ausência de reclamações de utentes e familiares e a inexistência de uma taxa de mortalidade elevada;

XLVII - Mais, dá como provado, que seriam pagos mensalmente como contrapartida da atividade desenvolvida pelo Autores na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, sucede, porém, concatenando os fundamentos aduzidos nas alíneas acima, soçobram razões pelas quais não poderão ter-se como provados, sem prejuízo, de entrarem em flagrante contradição com os factos provados BBB) e CCC).

XLVIII - Recorde-se que, está provado que para operacionalizar os referidos prémios importará, primeiramente, definir métricas a utilizar na definição destes prémios, o que de resto, se encontra em consonância com a prova produzida; todavia, em seguida, está igualmente provado que os referidos prémios de qualidade e de produtividade estão dependentes do preenchimento de requisitos que, poderiam ou não, no final do período temporal respetivo ser alcançados, o que está, também, de acordo com a prova realizada.

XLIX – Ora, os factos BBB) e CCC) estabelecem que os critérios de qualidade e de produtividade não se encontravam definidos e, portanto, não podem ser entendidos como meras formalidades, pois que, não estavam antecipadamente garantidos, nem constituíam contrapartida do trabalho dos Autores na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do SU, excluindo-lhes natureza retributiva, conferindo-lhes, somente, a natureza de prémio, dependentes do alcance dos requisitos de qualidade e de produtividade, previamente definidos, para que fosse devido o seu pagamento.

L – Nesta senda, resulta evidente a contradição ínsita nestes factos e, o facto constante da alínea UU) que, conforme o referenciado, confere natureza retributiva aos prémios de qualidade e de produtividade, na medida em que os estabelece como contrapartida da atividade desenvolvida pelos Autores assim que a Unidade de Cuidados Intermédios fosse criada e entrasse em funcionamento.

LI - Destarte, afigura-se paradoxal e absolutamente contraditória, a convivência do facto provado em UU) com os factos provados BBB) e CCC), sendo, igualmente, manifestamente impossível a sua coexistência, nos factos assentes, os factos LL), MM), OO) e UU) e os factos BBB) e CCC), considerando a contradição acima apontada.

LII - Nesta circunstância, estamos perante um erro ou vício da decisão de facto, situação que encontra acolhimento na previsão do artigo 662.º do C.P.C., e que impõe a modificabilidade da decisão de facto, o que desde já se requer, e que acarretará necessariamente a exclusão dos factos provados das alíneas LL), MM), OO) e UU), os quais deverão integrar os factos não provados.

LII - Da Mihi factum, dabo tibi jus, pelo que, alterada da matéria de facto que se impõe, deverá julgar-se como indevido o pagamento dos prémios de qualidade e de produtividade, tal como configurados no douto libelo inicial e secundado no aresto em crise.

LIII - Na verdade, para efeitos de atribuição dos concretos prémios de qualidade e produtividade, atente-se ao clausulado vertido nos contratos celebrados com os Autores, já transcritos, e constantes dos factos provados nas alíneas H) a M), o que qual estabelece que o abono dos prémios em causa estaria (estará) condicionado, num primeiro plano, à abertura e funcionamento da Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência e, posteriormente, ao estabelecimento de adenda específica que contemple a definição de critérios;

LIV - Ora, no caso sub judice, o direito ao recebimento dos referidos prémios só brotaria na esfera jurídica dos Autores/Recorridos se preenchida um tríplice de condições, a saber: (i) entrasse em funcionamento a Unidade de Cuidados Intermédios do Serviço de Urgência (UCIPSU), (ii) fosse celebrada adenda ao contrato com a definição de critérios e (iii) fossem, efetivamente, verificados os referidos critérios, neste sentido, atente-se, na ampla prova testemunhal produzida acima referenciada.

LV - Conforme estabelece o artigo 270.º do Código Civil, as partes podem subordinar a um acontecimento futuro e incerto a produção dos efeitos do negócio jurídico ou a sua resolução, dispondo o artigo 135º do Código do Trabalho que, relativamente aos contratos de trabalho possam ser apostas condições ou termos suspensivos, nos termos gerais.

LVI - No que respeita ao regime de verificação e não verificação da condição, estabelece o artigo 275.º do CC que: “1. A certeza de que a condição se não pode verificar equivale à sua não verificação. 2. Se a verificação da condição for impedida, contra as regras da boa fé, por aquele a quem prejudica, tem-se por verificada; se for provocada, nos mesmos termos, por aquele a quem aproveita, considera-se como não verificada.”

LVII - Certo é que o estabelecimento dos critérios necessários para abono dos referidos prémios nunca se verificou e, por via disso, não poderá haverá lugar ao preenchimento das condições suspensivas a estes inerentes e cuja verificação permitiria o pagamento dos mesmos; mas, contrariamente ao vertido na douta sentença em crise, a ausência de fixação destes critérios não poderá ser imputável ao ora Recorrente.

LVIII – A realidade é que o Recorrente não obstou à sua fixação, contrariamente ao entendido pela Meritíssima Juiz a quo ao dar como provado o constante nas alíneas LL), MM) e OO) – seriam apenas meras formalidades sem consequência – porém, como o já sobejamente exposto tal não corresponde à verdade, recorde-se a contradição evidente entre o teor dos factos em crise e o vertido nos factos supramencionados BBB) e CCC).

LIX – O recorrente, reconhece com toda frontalidade e com a boa fé que se impõe, o manifesto retardamento na elaboração dos mesmos, no entanto, jamais obstou à sua definição, importando notar-se que o atual Conselho de Administração do Recorrente, quando interpelado pelos Autores/Recorridos, encetou de imediato diligências com vista à fixação de critérios, auscultando a responsável pelo Serviço de Cuidados Intensivos Polivalentes e Intermédios do Serviço de Urgência e, posteriormente, solicitando a pronúncia da Ordem dos Médicos.

LX – Com toda a seriedade, será de atender ao longo hiato de tempo, ao longo estado de silêncio entre as partes (desde final do ano de 2016, altura que o atual Conselho de Administração iniciou funções) até então, pois que, nunca os Autores interpelaram o ora Recorrente no sentido de serem fixados os necessários critérios.

LXI - Por apelo ao disposto no artigo 236.º n.º 1 CC, “A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.”

LXII - Consagra, pois, a lei, em termos hermenêuticos, uma conceção objetivista da interpretação da declaração negocial, o que significa que importa apurar o sentido exteriorizado ou cognoscível, atestado pelos respetivos elementos objetivos, na vertente da interpretação normativa e não meramente psicológica e, neste conspecto, segundo a teoria da impressão do destinatário consagrada no artigo 236.º, n.º 1, do Código Civil, o que interessa relevar não é a compreensão realizada pelo sujeito concreto ao qual foi dirigida a declaração, numa vertente estritamente subjetiva, mas o sentido da declaração rececionada pelo declaratário razoável colocado na posição do real declaratário.

LXIII - O que equivale a dizer que o sentido correspondente à impressão do destinatário não pode valer se não tiver um mínimo de correspondência, ainda que imperfeita, no texto do respetivo documento, conforme Acórdão do STJ de 13/10/2022, Processo 17289/20.1T8.LSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt e, na mesma esteira, António Menezes Cordeiro, in "Tratado do Direito Civil, II, Parte Geral", Almedina 2021, a página 729; Pires de Lima e Antunes Varela, in "Código Civil Anotado", Volume I, Coimbra Editora, Limitada, 1987, 4.ª edição, revista e atualizada, a página 223.

LXIV – Ergo, forçosamente se conclui que os Autores/Recorridos assinaram os seus Contratos de Trabalho e Adenda ao Contrato de Trabalho cientes, porque lhes foi transmitido, de que o abono dos prémios de Qualidade e Produtividade estaria condicionado à abertura da UCIPSU e, posteriormente, haveriam de ser fixados os necessários critérios para o efeito, só assim sendo devido o seu pagamento.

LXV - Caso assim não se entenda, o que apenas a benefício de raciocínio e por mera cautela de patrocínio se equaciona e se admite, sem prejuízo da ambiguidade que a sentença encerra, importará destrinçaras duas realidades diferenciadas, que ab initio acompanham os autos: Prémio versus Retribuição.

LXVI - Com o devido respeito que muito é, mal andou o Tribunal a quo, na qualificação da natureza dos prémios de qualidade e produtividade e, a este propósito, o estabelecido no artigo 260.º do Código do Trabalho é claro, isto é, não se consideram retribuição: “a) As importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações, novas instalações ou despesas feitas em serviço do empregador, salvo quando, sendo tais deslocações ou despesas frequentes, essas importâncias, na parte que exceda os respectivos montantes normais, tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da retribuição do trabalhador; b) As gratificações ou prestações extraordinárias concedidas pelo empregador como recompensa ou prémio dos bons resultados obtidos pela empresa; c) As prestações decorrentes de factos relacionados com o desempenho ou mérito profissionais, bem como a assiduidade do trabalhador, cujo pagamento, nos períodos de referência respectivos, não esteja antecipadamente garantido; d) A participação nos lucros da empresa, desde que ao trabalhador esteja assegurada pelo contrato uma retribuição certa, variável ou mista, adequada ao seu trabalho

LXVII - Refere a melhor doutrina, que as prestações regulares e periódicas pagas pelo empregador ao trabalhador, independentemente da designação que lhes seja atribuída no contrato ou no recibo, em princípio, serão necessariamente consideradas parte integrante da retribuição se não tiverem uma causa específica e individualizável relativamente à remuneração do trabalho, o que não acontece in casu.

LXVIII - É que, embora a lei consagre que a retribuição compreende a remuneração de base e todas as outras prestações regulares e periódicas, presumindo-se constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade patronal ao trabalhador, este critério assente na regularidade e periodicidade dos benefícios patrimoniais auferidos pelo trabalhador pode não se revelar suficiente, pois o intérprete deve ter sempre presente se a atribuição patrimonial paga ao trabalhador deriva duma causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho ou da disponibilidade deste.

LXIX – Assim, é necessário que se possa detetar uma contrapartida específica diferente da disponibilidade da força de trabalho para que se possa colocar determinada prestação do empregador à margem do salário global, sendo precisamente este o cenário vertido nos autos em crise, porquanto, os prémios de qualidade e produtividade não constituem uma contrapartida do trabalho prestado pelos Autores/Recorrentes, contrariamente ao vertido na sentença ora em crise, nem tão pouco são devidos por força dos contratos ou das normas que os regem;

LXX – Com efeito, à semelhança do que sucede com a assiduidade, os prémios de qualidade e produtividade configuram prestações decorrentes de factos relacionados com o desempenho ou mérito dos Autores/Recorrentes, cujo pagamento sempre estaria/estará condicionado à verificação de critérios, (a serem estabelecidos), não se encontrando antecipadamente garantido conforme estabelecido na alínea c) do n.º 1 do artigo 260.º do CT.

LXXI - Como se concebe, se o pagamento de prémios de qualidade e produtividade, redigidos naqueles precisos termos, sem que os seus potenciais beneficiários se sujeitassem à verificação dos seus critérios deturparia por completo a intenção e motivações que estiveram na base do convite dos Autores/Recorridos para desempenharem funções ao serviço do Recorrente.

LXXII - Acresce, que a posição assumida pelos Autores/Recorrentes ao logo de todo o período de tempo mediado, vertida em sede de Petição Inicial e, inclusivamente, a que decorre das declarações prestadas em audiência de discussão e julgamento não levanta qualquer dúvida, ou seja, a referência cabal a prémios de qualidade e produtividade e os necessários critérios de avaliação a estes subjacentes.

LXXIII - Em face do expendido, jamais de poderá considerar que os referidos prémios possuem natureza retributiva, e que por via disso deveriam ser pagos trezes vezes por ano; quando muito, à semelhança do preconizado para o prémio de assiduidade, poderiam ser devidos onze meses por ano, pois que, como se encontram dependentes da verificação de critérios, no mês relativo às férias não seria devido.

LXXIV - Neste conspecto, veja-se, in Sumários da Secção Social 2005-Julho 2021, Assessoria Social do Supremo Tribunal de Justiça Caderno Temático, Acórdão STJ de 14/05/2015, Processo 2428/09.1TTLSB: “I - Considerando a lei como retribuição (art. 258.º do Cód. Trabalho) a prestação a que o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho – nela se compreendendo, além da retribuição base, as prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie, presumindo-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador –, não cabem na dimensão normativa da previsão, mesmo na perspectiva de prestações indirectas, as contribuições feitas pelo empregador a um fundo de pensões (que, além de não serem feitas ao trabalhador, sempre teriam de assumir feição de contrapartida da prestação do trabalho). II- Não assume natureza retributiva o prémio de produtividade cuja atribuição estava dependente da avaliação da produtividade e do desempenho profissional dos trabalhadores, num ciclo temporal anual, excluída estando, em função desses factores, a antecipada garantia do direito ao seu pagamento.”

LXXV - Pacta sunt servanda, é, pois, esta a realidade do Recorrente, e neste contexto, não se escusa à concretização dos critérios de qualidade e de produtividade, o que já fez para outras especialidades, como o afirmaram as testemunhas nos depoimentos acima transcritos, sendo certo que, tal ainda não foi concretizado, em bom rigor por não ter sido indicadas métricas que concretamente e especificamente, com a justeza devida a ambas as partes, possam servir na avaliação que se impõe, a qual deverá ser autónoma e independente entre pares;

LXXVI - Igualmente, o presente processo não obstou a tal imperativo, ou seja, a realização de démarches com vista à densificação dos critérios tendentes ao pagamento dos prémios de qualidade e de produtividade aos Autores/Recorridos, não descurando, no entanto, a atual realidade do serviço;

LXXVII – Todavia, não se pode aceitar a douta decisão proferida pelo Tribunal a quo atento a ambiguidade nela ínsita que e fere de nulidade, caso assim não se entenda, igualmente não se poderá aceitar a matéria de facto nela vertida por ter olvidado a matéria a prova documental e testemunhal produzida por entender existir erro notório na apreciação da prova e consequentemente errada aplicação de direito quando concluiu pela natureza retributiva dos prémios de produtividade e assiduidade.”

Conclui, a final, pela procedência do recurso, com a consequente revogação da sentença recorrida.

2.2. Contra-alegaram os Autores, pugnado pela improcedência do recurso, de facto e de direito.

2.3. O recurso foi admitido pelo Tribunal a quo, como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

3. O Exmo. Procurador-Geral Adjunto, no parecer que emitiu, pronuncia-se no sentido de que deve improceder o recurso.

3.1. Não houve resposta ao referido parecer.


*

Corridos os vistos legais, nada obstando ao conhecimento do mérito, cumpre decidir:

II – Questões a resolver

Sendo pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso (artigos 635.º/4 e 639.º/1/2 do Código de Processo Civil (CPC) – aplicável “ex vi” do artigo 87.º/1 do Código de Processo do Trabalho (CPT) –, integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir: (1) Invocada nulidade da sentença; (2) Reapreciação da matéria de facto; (3) O direito do caso: questão de saber se os denominados prémios são devidos independentemente dos critérios não terem sido definidos; questão da natureza retributiva ou não, das prestações / sua inclusão, ou não na remuneração de férias e subsídio de férias.


***

III – Fundamentação

A) De facto

O Tribunal recorrido na pronúncia sobre a matéria de facto fez constar da sentença o seguinte (transcrição):

 “Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos:

Factos assentes por acordo:

A) O R. é uma entidade pública empresarial que se dedica ao seguinte: prestação de cuidados de saúde à população, designadamente aos beneficiários do Serviço Nacional de Saúde e aos beneficiários de subsistemas de saúde, ou de entidades externas que com ele contratualizem a prestação de cuidados de saúde, e a todos os cidadãos em geral; desenvolver atividades de investigação, formação e ensino, sendo a sua participação na formação de profissionais de saúde dependente da respetiva capacidade formativa, podendo ser objeto de contratos-programa em que se definam as respetivas formas de financiamento;

B) Sendo o R. uma entidade pública empresarial, as relações laborais regem-se pelo regime jurídico previsto no Código do Trabalho e demais legislação conexa, porquanto a relação que estabelece com os A. trata-se de uma relação de Direito Privado;

C) Mediante a celebração do contrato individual de trabalho, com início a 10/08/2009 e em vigor actualmente, obrigou-se o 1º A. a prestar trabalho ao R., exercendo funções correspondentes à categoria profissional de médico “assistente hospitalar”, nos termos constantes de fls. 26 a 34 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;

D) A 2ª A., mediante a celebração de contrato de trabalho com início a 02/06/2003 e em vigor atualmente, obrigou-se a prestar trabalho ao R., exercendo funções correspondentes à categoria profissional de médica “assistente hospitalar de medicina interna”, nos termos constantes de fls. 35 a 41 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;

E) Após a celebração do contrato de trabalho, foi celebrada entre o R. e a 2ª A. uma adenda ao contrato de trabalho em 12/07/2007, nos termos constantes de fls. 51 a 53 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas, nos termos da qual foi alterada a cláusula 4ª do contrato de trabalho, que passou a atribuir à A. um prémio de assiduidade no valor correspondente a 32% da sua retribuição base, que será válido e atribuído, “única e exclusivamente, até que se encontrem definidos pelo Conselho de Administração os incentivos ao bom desempenho de funções e os procedimentos de avaliação individual, com observância das normas legais ou regularmente aplicáveis, e comunicados tempestivamente aos profissionais do Hospipal, bastando, para tal, que se verifique a publicação dos mesmos em Boletim Informativo”;

F) E, posteriormente, em 03/12/2009, celebrou o R. e a 2ª A. nova adenda ao contrato de trabalho, nos termos constantes de fls. 54 a 56 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas, nos termos da qual foi alterada a cláusula 4ª do contrato de trabalho, no sentido de reduzir o prémio de assiduidade para 10%;

G) A 3ª A., mediante a celebração de contrato de trabalho com início a 01/09/2009 e em vigor actualmente, obrigou-se a prestar trabalho ao R., exercendo funções correspondentes à categoria profissional de médica “Assistente Hospitalar”, definidas no Decreto-Lei n.º 73/90, de 6 de março, a desempenhar na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência do R., nos termos constantes de fls. 42 a 50 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas;

H) O contrato de trabalho subscrito entre o 1º A. e o R. e identificado em C) dispõe, no seu nº 6 da cláusula terceira, cuja epígrafe é “retribuição mensal”, o seguinte: “Será ainda abonado um prémio de qualidade apenas e quando estiver definida e em funcionamento a Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, a que corresponderá um acréscimo de 10% sobre a remuneração base ilíquida, e cujos critérios serão posteriormente definidos em adenda a este Contrato, do qual faz parte integrante e desde já aceites, vencendo-se este prémio a partir da referida Adenda”;

I) E, nos termos do nº 7 da mesma cláusula: “Acordam também as partes outorgantes a atribuição de um prémio de produtividade de 20% sobre a remuneração base ilíquida a auferir pelo 2.º CONTRAENTE, apenas e aquando da abertura e efectivo funcionamento da Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, e se verificados os critérios que integrarão adenda específica a este Contrato a definir, e do qual passará a fazer parte integrante, a partir da data da referida assinatura.”;

J) Na adenda celebrada entre a 2ª A. e o R. identificada em F), designadamente na cláusula segunda, nº 6, estabeleceu-se que: “Será ainda abonado um prémio de qualidade apenas e quando estiver definida e em funcionamento a Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, a que corresponderá um acréscimo de 10% sobre a remuneração base ilíquida, e cujos critérios serão posteriormente definidos em adenda a este Contrato, do qual faz parte integrante e desde já aceites, vencendo-se este prémio a partir da referida Adenda.”;

K) Já nos termos do nº 7 da mesma cláusula: “Acordam também as partes outorgantes a atribuição de um prémio de produtividade de 20% sobre a remuneração base ilíquida a auferido pelo 2º CONTRAENTE, apenas e aquando da abertura e efectivo funcionamento da Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, e se verificados os critérios que integrarão adenda específica a este Contrato a definir, e do qual passará a fazer parte integrante, a partir da data da referida assinatura.”;

L) O contrato de trabalho subscrito entre a 3ª A. e o R. e identificado em G) dispõe, no seu nº 6 da cláusula terceira, cuja epígrafe é “retribuição mensal”, o seguinte: “Será ainda abonado um prémio de qualidade apenas e quando estiver definida e em funcionamento a Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, a que corresponderá um acréscimo de 10% sobre a remuneração base ilíquida, e cujos critérios serão posteriormente definidos em adenda a este Contrato, do qual faz parte integrante e desde já aceites, vencendo-se este prémio a partir da referida Adenda”;

M) E, nos termos do nº 7 da mesma cláusula: “Acordam também as partes outorgantes a atribuição de um prémio de produtividade de 20% sobre a remuneração base ilíquida a auferir pelo 2º CONTRAENTE, apenas e aquando da abertura e efectivo funcionamento da Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, e se verificados os critérios que integrarão adenda especifica a este Contrato a definir, e do qual passará a fazer parte integrante, a partir da data da referida assinatura”;

N) Desde a data de admissão do 1º e da 3ª AA. e da data de celebração da segunda adenda com a 2ª A. não foram estabelecidas quaisquer adendas, nem levados ao conhecimento dos AA. quaisquer critérios escritos relativos aos prémios de produtividade e de qualidade;

O) Por outro lado, desde dezembro de 2009 que iniciou o funcionamento da Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, na qual os AA. exercem desde então funções;

P) Cabia ao R. na qualidade de entidade empregadora, a formalização dos critérios indicados em N), em adenda a subscrever por ambas as partes;

Q) O 1º A. já interpelou o R. acerca do pagamento dos prémios de qualidade e de produtividade, por meio de carta datada de 01/02/2021, nos termos constantes de fls. 69 a 71 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas, sem que tenha recebido qualquer resposta;

R) Os 1º e 2º AA. enviaram também interpelação para o R. já mandatados por meio de cartas datadas de 24/03/2021, nos termos constantes de fls. 74 a 79 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas, sem que tenha recebido qualquer resposta;

S) A 3ª A., por si, primeiro em 05/01/2011, e representada pelo seu mandatário já no mês de Maio de 2021, fez chegar interpelação para o R., nos termos constantes de fls. 80 a 86 dos autos e que se dão por integralmente reproduzidas, não tendo, em nenhum dos casos, obtido qualquer resposta;

T) A partir de Maio de 2020 os AA. passaram a auferir uma retribuição base de € 3.538,58;

U) O R. nada pagou aos AA. a título de prémios de produtividade e qualidade identificados de H) a M);

V) Com base nos contratos e adenda que ora se discute, iniciaram os AA. funções em Agosto, Dezembro e Setembro de 2009 respectivamente;

W) Desde esse dia, os AA. passaram a ser retribuídos com o valor ilíquido de €3.528,00, acrescido de um prémio de assiduidade no valor de 10% da remuneração mensal ilíquida, pago até ao máximo de onze vezes por ano, se não houver ausência ao serviço no respetivo mês;

X) Durante os meses que mediaram o início de produção de efeitos dos contratos e da adenda, e a efectiva abertura da unidade, foi sempre honrado o compromisso por parte do R., e os AA. desempenharam as funções para as quais tinham sido contratados no período anterior a essa abertura;

Y) Dessas funções constava o apoio ao Director de Serviço, nas tarefas relacionadas com a organização para a abertura da referida Unidade de Cuidados Intermédios, nomeadamente na elaboração de protocolos a serem implementados nessa Unidade, a elaboração dos critérios de admissão e de alta, bem como elaboração de registos próprios para essa Unidade;

Z) Para além disso e complementarmente, durante esse mesmo período, os AA. colaboraram com o Serviço de Medicina Interna, na substituição de elementos desse Serviço nos turnos de Urgência, por dificuldades na organização da escala mensal que esse Serviço vinha a sentir;

AA) Não obstante até 31/12/2012 a Remuneração da Carreira Médica em regime de Contrato Individual de Trabalho, para a categoria de assistente graduado, ser variável e fixada caso a caso, a mesma, em regra, variava entre € 1.850,00 e os € 2.500,00;

BB) Sendo que, a partir de 01/01/2013, a remuneração para a primeira posição de assistente hospitalar foi fixada em € 2.746,24 para a primeira posição remuneratória e a última posição em € 3.158,18;

Factos demonstrados por produção de prova:

CC) Em 2009 foram criadas expectativas na esfera dos AA., no sentido de que iriam ser abonados com o valor referente aos prémios de produtividade e qualidade;

DD) O 1º A. vive na Maia desde 2008 e exercia funções em Matosinhos, tendo cessado o contrato de trabalho com a anterior entidade empregadora (Hospital 1..., em Matosinhos) para poder iniciar funções junto do R.;

EE) Ao ter tomado esta decisão, o 1º A. passou a ter que realizar um maior número de quilómetros mensal, distando de mais 80km (ida e regresso) da sua residência, o que implicou maior desgaste físico, menos tempo para a vida pessoal e maior despesa económica;

FF) Esta alteração de entidade empregadora e de local de trabalho foi assumida pelo 1º A. como um novo desafio, que lhe traria uma compensação económica pelo recebimento dos prémios de produtividade e qualidade, e que lhe permitiria colmatar o esforço adicional que sobre si se empenhava;

GG) A 2ª A., à data da celebração da adenda indicada em F), vivia na Maia e tinha que se deslocar diariamente para Penafiel;

HH) A 2ª A. aceitou a redução do prémio de assiduidade para 10% indicada em F) na plena convicção de que iria receber os dois prémios que, pela mesma adenda se estabeleceram: o prémio de qualidade e produtividade;

II) A 3ª A. vive em Gondomar, na altura da celebração do contrato identificado em G), na Estrada ..., e exercia funções no Hospital ..., no Porto, sito na mesma Estrada ..., tendo cessado o contrato de trabalho com a anterior entidade empregadora para poder iniciar funções junto do R.;

JJ) Ao ter tomado esta decisão, a 3ª A. passou a ter que realizar um maior número de quilómetros diário e mensal, distando de mais 80 km (ida e regresso) da sua residência, o que implicou maior desgaste físico, menos tempo para a vida pessoal e maior despesa económica, onde se inclui o custo com combustíveis e o custo diário em portagens;

KK) Esta alteração de entidade empregadora e de local de trabalho foi assumida pela 3ª A. como um novo desafio, que só se justificava por lhe trazer uma compensação económica que lhe permitiria colmatar o esforço adicional que sobre si se empenhava, compensando o acréscimo de despesas, o que só se verificaria com o valor dos prémios, pois, sem eles, a remuneração no R. seria inferior à auferida no Hospital ...;

LL) Quando a 3ª A. questionou a representante do R. que lhe apresentou o contrato, antes da assinatura do mesmo, quanto aos critérios de qualidade e de produtividade que iriam constar da adenda, esta descansou-a afirmando que não passariam de meras formalidades e que, no limite, seriam a ausência de queixas ou reclamações de utentes ou familiares e a inexistência de uma taxa de mortalidade elevada;

MM) Não tendo, em nenhum momento, sido mencionados critérios diferentes;

NN) No que toca a qualquer um dos índices com base em dias médios de recuperação, ou percentagens concretas de reinternamento, o trabalho desenvolvido pelos AA., inserido no resto da equipa da Unidade que integram, coloca a unidade com altos padrões esperados para um serviço, com o tempo de funcionamento que este concretamente tem, atendendo ao estado actual da arte desta disciplina da ciência médica;

OO) Em sede de negociação e elaboração dos contratos e da adenda, não foi intenção dos AA. ou do R. seguir mais critérios objetivos;

PP) A qualidade do serviço exigido aos AA. na fase indicada de X) a Z), ainda de considerável grau de especialização e complexidade, não é a mesma que se exige numa unidade de cuidados intermédios, numa unidade de cuidados intensivos, ou numa unidade de cuidados intermédios integrada numa unidade de cuidados intensivos;

QQ) Nas segundas, ao contrário da primeira, os médicos lidam permanentemente com a fronteira entre a vida e a morte, é-lhes exigida muito mais preparação, treino, conhecimento e estudo para, no limite, lidando com situações críticas, salvarem vidas;

RR) Também a produtividade exigida aos AA. durante o período que antecedeu a abertura da Unidade de Cuidados Intermédios não é a mesma que se exigiu após a abertura dessa unidade em Dezembro de 2009;

SS) Não obstante o número de horas de trabalho ser o mesmo, o resultado de cada hora de trabalho passou a ser muito mais exigente, obrigando, consequentemente, os AA. a despenderem maior esforço para atingir esses resultados;

TT) A produtividade exigível dentro de uma unidade de cuidados intermédios é substancialmente maior que a exigida fora dessas unidades, o grau de atenção e concentração necessário é muito maior, o desgaste físico e mental é muito mais acentuado, e a necessidade de repouso e descanso obriga à alocação de um maior período de tempo, necessariamente retirado ao período de dedicação à família e lazer dos AA.;

UU) Os prémios de qualidade e produtividade previstos nos contratos de trabalho de cada um dos AA. seriam pagos mensalmente, como contrapartida da actividade desenvolvida pelos mesmos na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, assim que ela fosse criada e funcionasse, no período normal de trabalho de cada um;

VV) O R. não referiu a natureza difícil e complexa da criação dos critérios para atribuição dos prémios de produtividade e qualidade quando introduziu as cláusulas nos contratos e adenda dos AA.;

WW) Em 21/09/2016 foi deliberada a criação do Serviço de Medicina Intensiva, sendo que a Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente foi integrada neste Serviço juntamente com a Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente e Sala de Emergência;

XX) As referidas Unidades e Sala de Emergência passaram a fazer parte integrante do Serviço de Medicina Intensiva e da sua orgânica única;

YY) A alteração orgânica verificada em 21/09/2016 determinou que os AA. exerçam funções, a partir desta data, integrados no Serviço de Medicina Intensiva, com rotação pelas Unidades que o integram;

ZZ) O 1º A. exerce funções na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente, na Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente e Sala de Emergência;

AAA) As 2ª e 3ª AA. exercem funções na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente e Sala de Emergência;

BBB) Primeiramente importará definir quais as métricas a utilizar na definição destes prémios;

CCC) Os referidos prémios de qualidade e de produtividade estão dependentes do preenchimento de requisitos de qualidade e de produtividade que poderiam ou não, no final do período temporal respectivo, ser alcançados.

Da discussão da causa não resultaram provados os seguintes factos:

1) As expectativas indicadas em CC) dos factos provados foram mantidas até 2020;

2) Foi em virtude do descrito em CC) dos factos provados que os AA. trabalharam com a máxima qualidade e produtividade, sempre ambicionando e calculando preencher qualquer requisito que lhes permitisse enquadrar-se no nível máximo;

3) O esforço pessoal que a 2ª R. fazia relativamente às deslocações, era-lhe alimentado também com a expectativa de auferir os prémios de qualidade e produtividade a que o R. se vinculou com a 2ª A.;

4) A 3ª A. passou a ter um aumento das despesas com a manutenção da sua viatura e respectiva desvalorização da mesma;

5) A representante do R. que apresentou o contrato à 3ª R. referiu como critério para atribuição dos prémios a manutenção da taxa de mortalidade abaixo dos 15%;

6) Exactamente por este aumento de qualidade exigida, e principalmente pelo aumento da produtividade que se impunha aos AA. com a abertura da Unidade, acordaram, AA. e R., a inserção nos contratos e na adenda, do incremento salarial motivado por esses dois motivos, tendo-lhes chamado Prémio de Qualidade e Prémio de Produtividade;

7) O 1º A., em Outubro de 2020, adquiriu o grau de Assistente Hospitalar de Medicina Intensiva;

8) A não celebração da adenda decorre da realidade complexa vivida nos Centros Hospitalares integrados no SNS, onde se assiste a uma renovação amiúde de quadros que determina, por vezes, a delonga na análise de determinados assuntos;

9) Apenas a 3ª A. interpelou em 2011 o R. quanto à presente questão;

10) Apenas no início de 2021 o tema foi novamente colocado por todos os AA.;

11) No seguimento da colocação da questão dos prémios de produtividade e de qualidade foram colhidas informações nos diversos Serviços intervenientes com vista à resolução do presente dissídio;

12) Coligir toda a informação necessária tendente a uma tomada de decisão demora o seu tempo, o que determinou que os AA. não obtivessem uma resposta no tempo desejado;

13) A definição das métricas a utilizar na definição destes prémios reveste-se de natureza difícil e complexa, porque a redacção de critérios individuais de qualidade e de produtividade se afigura impossível;

14) Apenas poderão ser definidos critérios para o Serviço de Medicina Intensiva – Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência;

15) O que significa que a qualidade e produtividade global daquele, será medida pela acção colectiva de todos profissionais afectos, a qual interferirá directa e inevitavelmente na avaliação individual a realizar a cada um dos AA.;

16) E no máximo, caso mensalmente sejam atingidos os referidos requisitos, os AA. receberão o respectivo valor onze meses por ano, à semelhança do prémio de assiduidade.”


*

B) Discussão

1. Nulidade da sentença

Começa a Recorrente por invocar que a sentença “se figura deficiente, ambígua e até contraditória na sua fundamentação, devendo, por isso, ser alterada e /ou anulada à luz, respetivamente do artigo 615.º n.º1 al. c) do CPC” (conclusão 2.ª), sendo que, se bem se percebe, desde logo na consideração do que fez constar de outras conclusões, que vislumbra a ocorrência de tal vício, por um lado, na pronúncia do Tribunal sobre a matéria de facto (em particular contradições quer entre esses, quer com a motivação avançada), e, por outro, na pronúncia no âmbito do direito, neste caso, nomeadamente, a respeito da natureza retributiva / não retributiva dos prémios, tudo como melhor se constata quando invoca o seguinte:

- a sentença desvia-se da “realidade factual e jurídica atentos os factos e, bem assim, uma evidente contradição e ambiguidade no que respeita aos factos provados, factos não provados e respetiva fundamentação” (4.ª conclusão);

- “é notório a ocorrência de 'erro de julgamento' quando o Tribunal dá como 'provado' certo facto relativamente ao qual não foi feita prova que o alicerce, pelo contrário, a prova produzida evidencia clara contradição com o facto assente” (7.ª conclusão);

- “percorrendo o iter cognoscitivo da sentença, resultam provados factos contraditórios entre si, como ao diante se demonstrará, e, igualmente a motivação e fundamentação de direito se afigura ambivalente, paradoxal”, desde logo “resulta evidente a contradição ínsita nos factos UU), BBB) e CCC)” (“o facto constante da alínea UU) confere natureza retributiva aos prémios de qualidade e de produtividade, por seu lado, as alíneas BBB) e CCC) no seguimento do expendido na alínea acima, excluem a natureza retributiva dos prémios de assiduidade conferindo-lhe, somente, a natureza de prémio, dando-se como provado que aqueles prémios de qualidade e de produtividade dependem, primeiramente, da definição de métricas a utilizar para definição de critérios (alínea BBB), que uma vez atingidos será devido o pagamento (alínea CCC)”, pelo que se afigura “assim paradoxal, contraditório, a convivência do facto provado UU) com os factos provados BBB) e CCC), sendo certo que na motivação dos pontos UU) BBB) e CCC) e quanto ao facto não provado 16, os mesmos estribam-se no teor dos contratos celebrados e adendas conjugadas com as declarações dos AA, pelo que, não se compreende qual a fundamentação para dar como provado, o facto UU) e os factos BBB) e CCC) em face da total e absoluta contradição que em si encerram” (13.ª a 15.ª conclusões);

- “a ambiguidade da sentença, mantém-se na “Fundamentação e direito”, apresentando-se como anfibológica, “na medida em que exprime a existência de uma plurissignificação ou de uma polissemia de sentido, pois que, ora confere cariz retributivo aos ditos prémios de qualidade e de produtividade, ora, lhes retira o seu cariz retributivo, evidente nos factos provados, perpassando posteriormente para a motivação, para a fundamentação de direito e para o dispositivo da sentença, o que a torna ininteligível”, o que “é enquadrável no conceito legal de nulidades da sentença, inscrito na 2.ª parte da alínea c), do n.º1, do art.º 615.º, do C. P. C.”, “pelo que, sendo patente a ambiguidade e a ininteligibilidade ao longo da sentença, numa das suas questões fulcrais, isto é, a que título são devidos os valores peticionados pelos Autores, Recorridos, se a título de retribuição se a título de prémio, terá a mesma que se considerar nula nos termos da 2.ª parte da alínea c), do n.º1, do art.º 615.º, do C. P. C., com todos os efeitos legais o que desde já se requer. (20.ª a 23.ª conclusões);

- “afigura-se paradoxal e absolutamente contraditória, a convivência do facto provado em UU) com os factos provados BBB) e CCC), sendo, igualmente, manifestamente impossível a sua coexistência, nos factos assentes, os factos LL), MM), OO) e UU) e os factos BBB) e CCC), considerando a contradição acima apontada”, estando-se neste caso “perante um erro ou vício da decisão de facto, situação que encontra acolhimento na previsão do artigo 662.º do C.P.C., e que impõe a modificabilidade da decisão de facto, o que desde já se requer, e que acarretará necessariamente a exclusão dos factos provados das alíneas LL), MM), OO) e UU), os quais deverão integrar os factos não provados” (51.ª e 52.ª conclusões);

Pronunciando-se os Apelados no sentido da não ocorrência dos invocados vícios, importando pronúncia da nossa parte, importa desde já, dado o modo como são invocados os invocados vícios, que façamos algumas considerações a respeito do que deve ser tido como enquadrável, por um lado, em erro de julgamento (quanto à pronúncia de facto ou de direito) e, por outro, em vício de nulidade da sentença a que se reporta o artigo 615.º do CPC[1], no sentido de distinguirmos os dois tipos de nulidade.

Avançando então com tal objetivo, importa lembrar que, conhecendo das pretensões das partes – pedido e causa de pedir –, é através da sentença que o juiz dita o direito para o caso concreto – nesse sentido, já há muito Anselmo de Castro acentuava a importância da sentença, por representar “conceitual e historicamente o ato jurisdicional por excelência, aquele em que se traduz na sua forma mais característica a essência da jurisdictio: o ato de julgar.”[2]

Sendo, pois, esse o objetivo perseguido pela sentença, pode no entanto essa estar viciada em termos que obstem à eficácia ou validade do pretendido dizer do direito, assim por um lado nos casos em que ocorra erro no julgamento dos factos e do direito, do que decorrerá como consequência a sua revogação, e, por outro, enquanto ato jurisdicional que é, se atentar contra as regras próprias da sua elaboração e estruturação, ou ainda contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada, caso este em que se torna, então sim, passível do vício da nulidade nos termos do artigo 615.º do CPC. No fundo, trata-se do sancionamento das normas prescritivas que disciplinam no mesmo Código o ato de elaboração da sentença, assim nos artigos 131.º, n.º 3, 2.ª parte, 154.º, n.º 1, e 607.º, n.º 3 e 4, do CPC, respeitantes à clareza, especificação e coerência da fundamentação e, ainda, no caso do n.º 2 do artigo 608.º, em contraponto, o dever e a proibição de pronúncia, atentos o objeto do litígio e o princípio do dispositivo.

Conforme se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) de 17 de outubro de 2017[3], “As causas de nulidade de sentença (ou de outra decisão), taxativamente enumeradas nesse artigo 615º, visam o erro na construção do silogismo judiciário e não o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, ou a não conformidade dela com o direito aplicável, nada tendo a ver com qualquer de tais vícios a adequação aos princípios jurídicos aplicáveis da fundamentação utilizada para julgar a pretensão formulada: não são razões de fundo as que subjazem aos vícios imputados, sendo coisas distintas a nulidade da sentença e o erro de julgamento, que se traduz numa apreciação da questão em desconformidade com a lei.”[4]

Em face do que antes referimos, voltando então ao caso, importa desde já dizer que parte considerável do que é invocado pela Recorrente se enquadra, então, a ocorrer, em erro de julgamento, seja no âmbito da aplicação do direito, seja a respeito da pronúncia do Tribunal em sede de matéria de facto, neste último caso se incluindo, diga-se, também as eventuais contradições que invoca entre factos, ou mesmo a respeito da motivação, que devem ser enquadradas no recurso que seja interposto dirigido à impugnação da matéria de facto, a que se reporta já o artigo 662.º do CPC, norma esta que, esclareça-se, prevê, para além do mais, também, expressamente a possibilidade de anulação com base em tais fundamentos, não se enquadrando, pois, propriamente na previsão do artigo 615.º do mesmo Código. Ou seja, o eventual erro na apreciação da matéria de facto deve ser conhecido nos termos do art. 662º do CPC, nomeadamente do seu nº 2, al. c) – “Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta” –, e não, pois, como nulidade da sentença.

Já, porém, nesta parte no âmbito da aplicação do direito, poderá configurar nulidade da sentença, integrada na previsão da alínea c) do n.º 1 do mencionado artigo 615.º – Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível –, a eventual ocorrência do que é invocado enquanto ambiguidade da sentença na fundamentação do direito, vício esse que, lembrando Alberto dos Reis[5], acontece quando se patenteia que a sentença enferma de vício lógico que a compromete. Ou seja, o juiz, escrevendo o que realmente quis escrever, fez todavia uma construção viciosa, já que os fundamentos que invocou conduziriam logicamente, não ao resultado expresso, mas ao oposto. A respeito do mesmo vício refere-se no acórdão do STJ de 26 de janeiro de 2021[6] que o mesmo “implica, por um lado, que haja uma contradição lógica no Aresto, o que significa, para a sua ocorrência, que a fundamentação siga um determinado caminho e a decisão opte por uma conclusão completamente diversa, e, por outro, que tal fundamentação inculque sentidos diversos e/ou seja pouco clara ou impercetível.”

Aplicando então ao caso o indicado enquadramento, no que se refere aos argumentos avançados referentes à matéria de facto, os mesmos não configuram, como dito, o vício de nulidade da sentença que agora se analisa, sendo que, a ser esse o caso, deverão ser apreciados no momento em que se conhecerá, cumpridos que estejam os ónus legais estabelecidos, do recurso dirigido à impugnação da matéria de facto.

Por sua vez, sendo os demais dirigidos à aplicação do direito e enquanto tais apreciados infra quando nesse âmbitos nos pronunciarmos, no que se refere à invocada nulidade assente na imputada ambiguidade ou eventual contradição em que tenha incorrido a sentença na fundamentação do direito, não se nos afigura, com salvaguarda do respeito devido, que seja esse o caso, pois que, e desde logo, a afirmação da Recorrente de que a sentença  exprima a “existência de uma plurissignificação ou de uma polissemia de sentido”, por conferir cariz retributivo aos ditos prémios de qualidade e de produtividade e depois lhes retirar esse cariz retributivo, tornando-a assim ininteligível, não encontra adequado suporte no que resulta da sentença.

Na verdade a Recorrente faz tal imputação tendo por base apenas o que se fez constar da sentença como sendo o que se considerou que ficou demonstrado nos factos, em particular o que as partes estipularam a respeito do pagamento dos prémios em causa – assim citando-se: “a este respeito, ficou demonstrado que as partes estipularam que os mesmos seriam pagos mensalmente, como contrapartida da actividade desenvolvida pelos mesmos na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, assim que ela fosse criada e funcionasse, no período normal de trabalho de cada um, estando dependentes do preenchimento de requisitos de qualidade e de produtividade que poderiam ou não, no final do período temporal respectivo, ser alcançados” –, desconsiderando, porém, tudo a mais que se refere de seguida, ou seja, então sim, referente à pronúncia do Tribunal recorrido que teve em vista (mal ou bem, pois que essa é questão que só apreciaremos quando nos pronunciarmos no âmbito do mérito e não, pois, neste momento, em que apenas apreciamos o analisado vício) o enquadramento, depois de citar aliás o que resulta do artigo 258.º do Código do Trabalho (CT) que lhes deve ser dado, assim afirmando que no caso “verifica-se que os prémios de qualidade e de produtividade em discussão se mostram já devidos por força dos contratos de trabalho celebrados pelo R. com os AA., que não só prevê a sua atribuição mediante a indicação de uma percentagem fixa para cada um, calculada sobre a retribuição mensal ilíquida), como refere o direito ao mesmo com a abertura e funcionamento da UCI, uma vez que são reportadas a um determinado período de referência e são também uma contrapartida do trabalho prestado pelos AA. (neste sentido, cfr., entre outros, Acórdão do STJ de 06/05/2020, proc. 14746/18.3T8LSB.L1.S1), para além de terem uma periodicidade mensal, conforme já explicitado supra na fundamentação de facto, pelo que constituem retribuição nos termos previstos no artigo 260º nº 3 alínea a) do CT e, com tal, devem ser integrados no subsídio de férias”.

Como bem se percebe, o que resulta da citada pronúncia não exprime, assim o entendemos, qualquer “plurissignificação ou polissemia de sentido, desde logo porque não confere, diversamente do que se invoca, cariz retributivo aos ditos prémios de qualidade e de produtividade e depois lhes retira esse cariz retributivo. Dito de outro modo, sendo legítimo que se discorde do enquadramento dado na sentença no âmbito da aplicação do direito aos mencionados “prémios”, no caso claramente considerados como integrantes da retribuição, não se verifica, na pronúncia constante da sentença, que essa inculque sentidos diversos e/ou seja pouco clara ou impercetível, nos termos antes apontados para a verificação do analisado vício.

Não ocorre, pois, por decorrência do exposto, o vício de nulidade que é imputado à sentença.

2. Recurso sobre a matéria de facto

2.1. Critérios de admissibilidade

Nas palavras de Abrantes Geraldes, “(…) a modificação da decisão da matéria de facto constitui um dever da Relação a ser exercido sempre que a reapreciação dos meios de prova (sujeitos à livre apreciação do tribunal) determine um resultado diverso daquele que foi declarado na 1.ª instância”[7]. Contudo, como também sublinha, “(..) a reapreciação da matéria de facto no âmbito dos poderes conferidos pelo art. 662.º não pode confundir-se com um novo julgamento, pressupondo que o recorrente fundamente de forma concludente as razões por que discorda da decisão recorrida, aponte com precisão os elementos ou meios de prova que implicam decisão diversa da produzida e indique a resposta alternativa que pretende obter”.

A respeito do cumprimento do ónus estabelecido na citada alínea c) do n.º 1, se pronunciou, muito recentemente, o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 17 de outubro de 2023[8], uniformizando a Jurisprudência nos seguintes termos: “Nos termos da alínea c), do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida, desde que a mesma resulte, de forma inequívoca, das alegações”.

Muito embora apenas tenha sido fixada jurisprudência a respeito da referida alínea, resultam, porém, do mesmo Acórdão, assim da sua fundamentação, considerações que temos como claramente relevantes quanto às demais exigências que resultarão do mesmo preceito, nos termos que seguidamente se transcrevem:

«(…) Desse modo, impõe-se a respetiva harmonização com os mais ditames no que concerne à admissibilidade do recurso, legitimidade para recorrer, prazos para tanto, bem como as regras no que concerne ao modo de interposição, no que para aqui releva, os recursos interpõem-se por meio de requerimento, devendo conter obrigatoriamente a alegação do recorrente, em cujas conclusões deve ser indicado o fundamento específico da recorribilidade, artigo 637, n.º 1 e n.º 2, especificando o n.º 1, do artigo 639, que o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão, artigo 639, n.º 1, preceito legal de cariz genérico, reportando-se assim aos recursos onde sejam apenas suscitadas questões de direito, mas também se pretenda impugnar a decisão sobre a matéria de facto(57), procedendo à delimitação do objeto do recurso, como avulta do previsto no artigo 635, n.º 3 e 4.

Em conformidade, não surpreende que no artigo 640 não se faça qualquer referência aos aspetos formais, antes enunciados, relevando sim, que sejam dadas essencialmente as indicações previstas na alínea a), na medida em que as mesmas delimitam a atividade de reapreciação junto do Tribunal da Relação, do julgado quanto à matéria de facto.

4 - Não pode, no entanto, ser esquecida a ratio legis, no atendimento dos princípios já enunciados na abordagem do histórico do preceito, que seria despiciendo repisar, mas também, e com eles necessariamente relacionados, os hodiernos vertidos no vigente Código de Processo Civil, caso do princípio da cooperação, enquanto responsabilidade conjunta de todos os intervenientes processuais, numa visão instrumental do processo para a obtenção da solução justa e atempada do litígio, bem como, com as devidas adaptações, o dever da gestão processual na vertente da respetiva adequação, sublinhando a prevalência da matéria em relação à forma, sempre pautados pelo dever de boa-fé, não esquecendo o ónus de alegação, numa pretendida colaboração ativa para a apreciação a realizar pelo Tribunal, inculcada com a inclusão do apontamento da decisão alternativa, e tendo presente a imprescindível consideração da proporcionalidade e razoabilidade que para a causa em concreto seja atendível e se justifique.

Da articulação dos vários elementos interpretativos, com cabimento na letra da lei, resulta que em termos de ónus a cumprir pelo recorrente quando pretende impugnar a decisão sobre a matéria de facto, sempre terá de ser alegada e levada para as conclusões, a indicação dos concretos pontos facto que considera incorretamente julgados, na definição do objeto do recurso.

Quando aos dois outros itens, caso da decisão alternativa proposta, não podendo deixar de ser vertida no corpo das alegações, se o for de forma inequívoca, isto é, de maneira a que não haja dúvidas quanto ao seu sentido, para não ser só exercido cabalmente o contraditório, mas também apreendidos em termos claros pelo julgador(58), chamando à colação os princípios da proporcionalidade e razoabilidade instrumentais em relação a cada situação concreta, a sua não inclusão nas conclusões não determina a rejeição do recurso(59), conforme o n.º 1, alínea c) (60) do artigo 640, apresentando algumas divergências ou em sentido não totalmente coincidente, vejam-se os Autores, Henrique Antunes(61), Rui Pinto(62), Abílio Neto(63).

5 - Em síntese, decorre do artigo 640, n.º 1, que sobre o impugnante impende o dever de especificar, obrigatoriamente, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera julgados de modo incorreto, os concretos meios de probatórios constantes do processo, de registo ou de gravação nele realizado, que imponham decisão diversa da recorrida, bem como aludir a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

Tais exigências, traduzidas num ónus tripartido sobre o recorrente, estribam-se nos princípios da cooperação, adequação, ónus de alegação e boa-fé processuais, garantindo a seriedade do recurso, num efetivo segundo grau de jurisdição quanto à matéria de facto, necessariamente avaliado de modo rigoroso, mas sem deixar de ter em vista a adequada proporcionalidade e razoabilidade, de modo a que não seja sacrificado um direito das partes em função de um rigorismo formal, desconsiderando aspetos substanciais das alegações, numa prevalência da formalidade sobre a substância que se pretende arredada. (…)»

Do que nos afigura resultar da citada fundamentação, afigura-se-nos adequado, em face do que resulta da lei, o entendimento de que, para cumprir os ónus legais, o recorrente sempre terá de alegar e levar para as conclusões, sob pena de rejeição do recurso, a indicação dos concretos pontos facto que considera incorretamente julgados, como estabelecido na alínea a) do n.º 1 do preceito citado, enquanto definição do objeto do recurso, sendo que, noutros termos, já quanto ao cumprimento do disposto nas alíneas b) e c) do mesmo número, desde que vertido no corpo das alegações, a respetiva não inclusão nas conclusões não determina tal rejeição do recurso.

Neste último âmbito, diga-se, na consideração de que a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação, tendo que ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância – pois que só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição[9] –, muito embora não se trate de um segundo julgamento e sim de uma reponderação, se incluirá, então, a exigência de que a impugnação que é feita não se deva bastar com a mera alegação de que não concorda com a decisão dada, exigindo antes, da parte que pretende usar dessa faculdade, a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efetivamente, no caso, foram produzidos – sem limitar porém o segundo grau de sobre tais desconformidades, previamente apontadas pelas partes, se pronunciar, enunciando a sua própria convicção – não estando, assim, limitada por aquela primeira abordagem pois que no processo civil impera o princípio da livre apreciação da prova[10] , artigo 607.º, nº 5 do CPCivil[11].

Do exposto resulta, assim, que o cumprimento do ónus de impugnação que se analisa, não se satisfazendo como se disse com a mera indicação genérica da prova que na perspetiva do recorrente justificará uma decisão diversa daquela a que chegou o tribunal recorrido, impõe ao recorrente que concretize nas conclusões os pontos da matéria de facto sobre os quais recai a sua discordância quer, ainda, neste caso nas alegações, que indique a redação alternativa a dar aos factos impugnados e, ainda, que especifique quais as provas produzidas que, por as ter como incorretamente apreciadas, imporiam decisão diversa, sendo que, quando esse for o meio de prova, se torna também necessário que indique “com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição”. De resto, como resulta do Acórdão STJ de 5 de Setembro de 2018[12], a “alínea b), do nº 1, do art. 640º do CPC, ao exigir que o recorrente especifique “[o]s concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida”, impõe que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respectivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens de cada um dos depoimentos”, sendo que “não cumpre aquele ónus o apelante que, nas alegações e nas conclusões, divide a matéria de facto impugnada em três “blocos distintos de factos” e indica os meios de prova relativamente a cada um desses blocos, mas omitindo-os relativamente a cada um dos concretos factos cuja decisão impugna”.

Tendo pois em consideração os critérios antes indicados, de seguida procederemos à verificação, incluindo pois, desde logo, quanto ao respetivo cumprimento no caso.

2.2. Apreciação:

2.2.1. Alíneas UU), BBB) e CCC), constantes da factualidade provada

Estas alíneas têm a redação seguinte:

- UU) Os prémios de qualidade e produtividade previstos nos contratos de trabalho de cada um dos AA. seriam pagos mensalmente, como contrapartida da actividade desenvolvida pelos mesmos na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, assim que ela fosse criada e funcionasse, no período normal de trabalho de cada um;

- BBB) Primeiramente importará definir quais as métricas a utilizar na definição destes prémios;

- CCC) Os referidos prémios de qualidade e de produtividade estão dependentes do preenchimento de requisitos de qualidade e de produtividade que poderiam ou não, no final do período temporal respectivo, ser alcançados.

Nas conclusões XIII a XIX, invoca a Recorrente que:

- ocorre contradição nos factos UU), BBB) e CCC), pois que, diz, o primeiro confere natureza retributiva aos prémios de qualidade e de produtividade e, por seu lado, as alíneas BBB) e CCC) excluem tal natureza, “conferindo-lhe, somente, a natureza de prémio, dando-se como provado que aqueles prémios de qualidade e de produtividade dependem, primeiramente, da definição de métricas a utilizar para definição de critérios (alínea BBB), que uma vez atingidos será devido o pagamento (alínea CCC)”;

- afigura-se como contraditória a convivência do facto provado UU) com os factos provados BBB) e CCC), sendo certo que na motivação dos pontos UU) BBB) e CCC) e quanto ao facto não provado 16, os mesmos estribam-se no teor dos contratos celebrados e adendas conjugadas com as declarações dos AA, pelo que, não se compreende qual a fundamentação para dar como provado, o facto UU) e os factos BBB) e CCC) em face da total e absoluta contradição que em si encerram;

- o teor das cláusulas dos contratos celebrados entre Recorrente e Recorridos, no que tange às Cláusula referentes aos prémios de qualidade e de produtividade, consta dos factos provados, para o primeiro Autor factos H) e I), para a segunda Autora J) e K), e para a terceira Autora L) e M), as quais, como se percebe, são comuns aos três Autores, sendo que da sua leitura escorre que ambos os prémios se encontram dependentes da abertura e efetivo funcionamento da Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência e, no que tange ao prémio de qualidade, referem ainda, que os critérios para atribuição do prémio serão posteriormente definidos em adenda, vencendo-se os ditos prémios a partir da referida adenda, existindo, assim, uma dupla condição suspensiva;

- não podia a sentença do tribunal a quo apoiar-se na mesma motivação para dar como provados dos factos UU), BBB) e CCC), tal motivação apenas servirá para os factos BBB) e CCC), não tendo qualquer conexão, correlatividade, por não corresponder ao aceite e contratado pelos outorgantes daquele contrato de trabalho quanto ao facto provado UU).

Se bem se percebe, muito embora o não refira expressamente, pretenderá a Recorrente que sejam eliminadas, no todo ou em parte, as alíneas UU), BBB) e CCC).

Por sua vez, pronunciam-se os Apelados pela improcedência do recurso nesta parte.

Da motivação constante da sentença fez-se constar o seguinte (transcrição):

“Os pontos UU), BBB) e CCC) resultaram demonstrados e o ponto 16) não provado com base no teor dos contratos de trabalho e adendas juntos a fls. 26 a 57 dos autos, conjugadas com as declarações dos AA.. Com efeito, estes, como já supra referido, apenas tinham interesse em exercer funções nesta unidade do R. mediante o pagamento de tais prémios que consideraram mensais. Por outro lado, das cláusulas 3ª dos contratos de trabalho celebrados entre os 1º e 3ª AA. e o R., bem como na cláusula 4ª da adenda celebrada entre a 2ª A. e o R. em 03/12/2009, referentes à retribuição mensal de cada um dos AA. consta apenas nos seus nºs. 6 e 7 que será abonado um prémio de qualidade e atribuído um prémio de produtividade sobre a remuneração base ilíquida (remuneração essa que em tais documentos se mostra apenas definida no nº 1 das citadas cláusulas como retribuição mensal) apenas e aquando da abertura e efectivo funcionamento da Unidade de Cuidados Intermédios, nada sendo referido quanto à sua periodicidade. Ora, em matéria de interpretação das declarações negociais rege no nosso direito a denominada teoria da impressão do destinatário, alicerçada na regra de que “o sentido da declaração negocial é aquele que seria apreendido por um declaratário normal, isto é, um declaratário medianamente instruído e diligente, colocado na posição do declaratário real, em face do comportamento do declarante”, como resulta do disposto no artigo 236º nº 1 do CCivil. “Releva, assim, o sentido que seria considerado por uma pessoa normalmente diligente, sagaz e experiente em face dos termos da declaração e de todas as circunstâncias situadas dentro do horizonte concreto do declaratário” (cfr. Acórdão do STJ de 02/02/2006, proc. nº 05B3578, disp. in www.dgsi.pt). Por outro lado, atento o facto de estarmos perante um negócio reduzido a escrito e, portanto, formal, a interpretação da vontade das partes haverá que fazer-se, não só de acordo com a doutrina da impressão do destinatário, mas também de acordo com a regra plasmada no artigo 238º nº 1 do CCivil, nos termos do qual a declaração não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento. Ora, no caso em apreço, a previsão dos referidos prémios encontra-se mencionada explicitamente nos contratos de trabalho dos 1º e 3ª AA. e na adenda datada de 03/12/2009 da 2ª A. tão somente na cláusula referente à retribuição mensal (no caso da 2ª A. a cláusula 4ª não apresenta título mas resulta desde o início da relação laboral, tanto no contrato de trabalho de fls. 35 e ss. como nas duas adendas, de fls. 51 e ss. e 54 e ss., logo no seu nº 1, a referência imediata à retribuição mensal ilíquida, pelo que se considera também esta cláusula como referente à retribuição mensal), pelo que, se atendermos não só ao sentido que um declaratário normal, medianamente instruído e diligente, colocado na posição do declaratário real, em face do teor destas declarações negociais em apreciação, apreenderia desta declaração negocial, como o texto dos respectivos contratos e adenda, só pode o tribunal concluir que os prémios aqui em questão tinham uma periodicidade mensal, sendo que, para além disso, e face à situação laboral anterior de cada um dos AA., só desse modo teriam estes interesse em celebrar tais contratos e adenda, de modo a auferir uma retribuição superior à que tinham. No entanto, o contrato, e contrariamente ao que sucede com o prémio de assiduidade, não menciona que estes prémios apenas seriam pagos 11 meses por ano, pelo que não se pode afirmar que estava tal contratualmente definido, atento o já supra exposto, motivo pelo qual não se provou o ponto 16), sendo que estaremos perante uma questão jurídica em função da natureza retributiva ou não destes prémios. Já a contrapartida de tais prémios e como os mesmos se intitulam, estavam relacionados com a qualidade e produtividade da unidade de cuidados intermédios polivalente do serviço de urgência, como aliás foi referido pelas testemunhas EE, DD, GG, FF, e pelos AA., de acordo com critérios a definir, o que motivou a prova dos pontos BBB) e CCC).”

Cumprindo-nos pronúncia, não poderemos desde já deixar de reconhecer que a expressão constante da alínea UU “como contrapartida da actividade desenvolvida pelos mesmos”, ligada como está imediatamente antes aos “prémios de qualidade e produtividade”, podendo assumir efetiva relevância no âmbito da aplicação do direito, assim a respeito de se poder considerar que assumirão tais “prémios” natureza retributiva em face do disposto na lei, poderá de algum modo ser entendida como que em colisão, pelo menos aparentemente, a ser esse o caso, assim de depender mais uma vez da aplicação da lei e do direito aos factos, com o que se fez constar das alíneas BBB) (Primeiramente importará definir quais as métricas a utilizar na definição destes prémios) e CCC) (Os referidos prémios de qualidade e de produtividade estão dependentes do preenchimento de requisitos de qualidade e de produtividade que poderiam ou não, no final do período temporal respectivo, ser alcançados), pois que, dizendo-se nomeadamente nestes últimos que “estão dependentes do preenchimento de requisitos de qualidade e de produtividade que poderiam ou não, no final do período temporal respectivo, ser alcançados”.

Ora, sendo verdade que resulta, como antes já o dissemos, da previsão da alínea c) do n.º 2 do artigo 662º do CPC, que pode o tribunal da relação anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, afigura-se-nos, porém, mesmo que fosse de admitir tal contradição, que a questão não assume no caso relevância efetiva, pelas razões que diremos de seguida.

Mais uma vez se bem se percebe, a respeito da utilização de expressões nas alíneas analisadas que podem assumir efetiva relevância no âmbito da aplicação do direito, constata-se, bastando para tal atender ao que o Tribunal recorrido fez constar da motivação, que esse Tribunal fez mesmo apelo expresso ao que, na sua ótica, resultará, mas já em termos que na nossa perspetiva envolve afinal também já a aplicação das regras legais, ao que diz resultar da interpretação que deve ser dada ao que se fez constar dos contratos e respetivas adendas, tarefa que, salvo o devido respeito, como já o dissemos, entendemos não dever ter lugar propriamente neste momento da pronúncia de facto e sim, diversamente, mais tarde, precisamente aquando da aplicação do direito.

Melhor se esclarecendo, aqui faremos apelo, neste momento, por entendermos que os seus ensinamentos continuam ainda hoje plenamente válidos, a Alberto dos Reis, quando ensinava que a prova “só pode ter por objeto factos positivos, materiais e concretos; tudo o que sejam juízos de valor, induções, conclusões, raciocínios, valorações de factos, é atividade estranha e superior à simples atividade instrutória”[13]. Manuel de Andrade, por sua vez, sem deixar de afastar o Direito – ou dizer, juízos de direito – não deixava também de considerar como passível de constituir objeto de prova “tanto os factos do mundo exterior, como os da vida psíquica”, “tanto os factos reais (….) como os chamados factos hipotéticos (lucros cessantes; vontade hipotética ou conjetural das partes, para efeitos, v.g., de redução ou de conversão de negócios jurídicos, etc)», «Tanto os factos nus e crus (….) como os juízos de facto (….)”[14]. Também Anselmo de Castro referia, por sua vez, que “toda a norma pressupõe uma situação da vida que se destina a reger, mas que não define senão tipicamente nos seus caracteres mais gerais”, como ainda que “a aplicação da norma pressupõe, assim, primeiro, a averiguação dos factos concretos, dos acontecimentos realmente ocorridos, que possam enquadrar-se na hipótese legal”, sendo “esses factos e a averiguação da sua existência ou não existência” que “constituem, respetivamente, o facto e o juízo de facto – juízo histórico dirigido apenas ao ser ou não ser do facto” – acrescentando de seguida: “E, segundo, um juízo destinado a determinar se os factos em concreto averiguados cabem ou não efetivamente na situação querida pela norma, típica e abstratamente nela descrita pelos seus caracteres gerais – juízo este já jurídico (o chamado juízo de qualificação ou subsunção), visto pressupor necessariamente interpretação da lei, isto é, do âmbito ou alcance da previsão normativa. Só por este seu diverso conteúdo, facto e direito, juízo de facto e de direito, se distinguem, pois não diferem em estrutura. Para o efeito é indiferente a natureza do facto: são factos não só os acontecimentos externos, como os internos ou psíquicos, e tanto os factos reais, como os simplesmente hipotéticos. Do conteúdo que deve revestir decidirá apenas a norma legal. Igualmente indiferente é a via de acesso ao conhecimento do facto, isto é, que a ele possa ou não chegar-se diretamente, ou somente através de regras gerais e abstratas, ou seja, por meio de juízos empíricos (as chamadas regras da experiência). Raros, aliás, são os casos em que o conhecimento do facto dispense esses juízos e possa fazer-se apenas na base de puras perceções.”[15] Não obstante, como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de fevereiro de 2015[16], importará esclarecer que “A meio caminho entre os puros factos e as questões de direito situam-se os juízos de valor sobre matéria de facto, nos quais deverá distinguir-se entre aqueles para cuja formulação se há-de recorrer a simples critérios próprios do bom pai de família, do homo prudens, e aqueles cuja emissão apela essencialmente para a sensibilidade ou intuição do jurista”.

O regime que antes referimos, aplicado ao que agora se aprecia, permite-nos dizer que, traduzindo o que se fez constar das analisadas alíneas desde logo na formulação de juízos a respeito da interpretação que deverá (ou não) ser feita do que se fez constar expressamente dos contratos e respetivas adendas, então, o âmbito do facto circunscreve-se ao conteúdo desses documentos, que deverá por essa razão, enquanto tal, fazer-se constar da factualidade provada, sendo que, por sua vez, precisamente por extravasarem o que deve integrar a pronúncia de facto, já não devem fazer-se constar, no referido âmbito, socorrendo-nos de novo dos ensinamentos de Alberto dos Reis, “tudo o que sejam juízos de valor, induções, conclusões, raciocínios, valorações de factos”, por serem estranhas à simples atividade instrutória sobre factos. Coisa diversa, então sim já no momento certo, assim o da aplicação do direito, será o que deve resultar precisamente dessa aplicação, em que se inclui, diga-se, a ser o caso, a aplicação das regras legais de interpretação da declaração.

Sendo deste modo, constatando-se que o teor dos contratos e adendas, ou seja o que se assume com a natureza de facto, já consta afinal de outras alíneas da matéria de facto provada, assim as alíneas C) a M), traduzindo-se assim o que consta das alíneas UU), BBB) e CCC) agora reanalisadas que possa assumir a natureza de facto em mera repetição, não se justifica a sua manutenção e, por essa razão, atendendo no mais ao antes exposto, devem ser eliminadas da pronúncia sobre a matéria de facto, o que se determina.

2.2.2. Alíneas LL), MM) e OO), da factualidade provada

Estas alíneas têm a redação seguinte:

- LL) Quando a 3ª A. questionou a representante do R. que lhe apresentou o contrato, antes da assinatura do mesmo, quanto aos critérios de qualidade e de produtividade que iriam constar da adenda, esta descansou-a afirmando que não passariam de meras formalidades e que, no limite, seriam a ausência de queixas ou reclamações de utentes ou familiares e a inexistência de uma taxa de mortalidade elevada;

- MM) Não tendo, em nenhum momento, sido mencionados critérios diferentes;

- OO) Em sede de negociação e elaboração dos contratos e da adenda, não foi intenção dos AA. ou do R. seguir mais critérios objetivos;

Sustenta a Recorrente que estas alíneas devem ser retiradas da factualidade provada:

- na matéria de facto provada não resulta que em momento algum foram mencionados critérios diferentes, do referidos em sede de negociação, pois que, na motivação destes factos, a sentença atende às declarações da terceira Autora/Recorrida, conjugado com os depoimentos prestados pela DD, EE, FF, GG, sendo que, apenas a terceira Autora mencionou que os critérios de qualidade e de produtividade não passariam de meras formalidades e que no limite, seriam a ausência de queixas ou reclamações de utentes ou familiares e a inexistência de uma taxa de mortalidade levada, o que nos permite concluir que tal não corresponde à verdade, não tendo correspondência com a prova documental junta aos autos e com a prova produzida em julgamento, sendo notória a contradição existente entre a versão apresentada pela terceira Autora CC, em sede de audiência de discussão e julgamento, e a anteriormente apresentada por esta e pelos Autores/ Recorridos ao longo do tempo, e as declarações da segunda Autora BB – evidência dessa contradição são as missivas remetidas pelos Autores ao Recorrente no âmbito deste assunto, as quais referiam expressamente que ainda não se encontravam estabelecidos os critérios tendentes ao pagamento dos prémios previstos, na mesma senda, o mesmo foi alegado em sede de Petição Inicial, ipsis verbis (note-se que a terceira Autora/Recorrida CC dirigiu-se ao ora Recorrente referindo que “nunca lhe foi apresentada a supra referida adenda nem nenhum critério tendente à atribuição do prémio de qualidade e de produtividade”, em clara contradição com os factos alegados em sede de Requerimento de Aperfeiçoamento da PI, LL), MM) e OO), que correspondem ao teor do depoimento da Autora Recorrida Dra. CC, e teor constante das missivas remetidas, e, bem assim o inicialmente alegado em na PI);

- em contradição com os referidos factos LL) MM) e OO), temos ainda as Declarações da segunda autora BB, prestadas em audiência de julgamento, porquanto expos uma versão quantos aos critérios alegadamente apresentados, completamente diferenciada da que consta nas missivas remetidas antes da propositura da ação, na PI, no Requerimento de Aperfeiçoamento à PI e da versão dada pela Autora CC – esta Autora falou sempre no plural… apresentando esta versão como sendo a apresentada também aos seus colegas Autores “não tínhamos que nos preocupar” “e que não nos preocupasse que iam ser critérios simples e tangíveis e que se baseavam na assiduidade” na sua versão dos factos, os prémios de qualidade e de produtividade seriam pagos com base na assiduidade, ergo, facilmente se alcançando que os depoimentos prestados pelos Autores/Recorridos não foram coerentes entre si, contradizendo-se e, bem assim, entram com contramão com a versão inicialmente apresentada, constante das missivas enviadas ao Recorrente, com os factos inicialmente alegados em sede da PI, com o teor do ínsito nos pontos da cláusula que respeitam ao prémio de qualidade e produtividade dos próprios Contratos;

- considerando os factos provados, constantes das alíneas H) a M) concernente ao teor das cláusulas do prémio de qualidade e de produtividade, é absolutamente desprovido de sentido, que um contrato refira expressamente a necessidade de estabelecer critérios, quando os mesmos já foram estabelecidos entre as partes;

- a motivação da sentença, para dar como provado LL), MM) e OO), refere que se atendeu não só às declarações da terceira autora, mas também às declarações do então presidente do Conselho de Administração EE, Vogal Responsável pelos Recursos Humanos DD e FF Diretor do Serviço de Urgência, mas, porém, nenhumas destas testemunhas mencionou que tivesse acordado com os Autores critérios para aferir da qualidade e produtividade, com vista ao pagamento dos prémios.

Socorrendo-nos do corpo das alegações, no que à prova gravada diz respeito, contata-se que transcreve, com localização do respetivo registo, o que se percebe tratar-se de transcrições das declarações prestadas pela Autora BB e dos depoimentos das testemunhas EE, FF e DD.

Pronunciam-se os Apelados, mais uma vez, pela improcedência do recurso, desde logo invocando que não ocorre a contradição a que alude a Recorrente, como ainda que a prova produzida – indicando e localizando passagens da gravação dos depoimentos – não dá sustentação à alteração que é pretendida, sendo antes conforme à convicção firmada em 1.ª instância.

Tendo em vista a apreciação, constata-se que da motivação constante da sentença se fez constar o seguinte:

“Ficaram demonstrados os pontos LL) a OO) com base, desde logo, nas declarações da 3ª A., que identificou a representante do R. como sendo DD e confirmou de modo claro, circunstanciado e firme o que lhe foi afirmado por esta nos termos dados como provados. Esclareceu ainda que foi convidada para trabalhar no R. nas funções para as quais foi contratada por FF e GG, àquela data director do serviço de urgência e director do departamento, respectivamente, mas que estes apenas falaram com ela sobre logística, não tendo falado sobre a remuneração, sendo que esta apenas lhe foi apresentada por DD. DD, por seu lado, confirmou que estas contratações foram propostas pelo director clínico e pelo director de serviço. Demonstrou não se recordar com certeza se reuniu com os AA., admitindo que sim, mas sem saber afirmar com certeza se estavam todos presentes. Esta testemunha referiu que as condições de contratação foram apresentadas pelo director de serviço, FF e que os prémios aqui em questão já estavam definidos. No entanto, nesta parte, não se considerou este depoimento credível, pois como a mesma afirmou, era DD a responsável pela supervisão da área de urgência, da qual era vogal do Conselho de Administração do R., não sendo assim minimamente plausível que a mesma fosse alheia às condições de contratação, principalmente na área remuneratória, cuja responsabilidade é imputada ao Conselho de Administração. Para além disso, EE, que em 2009 exercia funções de Presidente do Conselho de Administração do R., afirmou peremptoriamente que o custo destes prémios foi estudado e que no momento da assinatura dos contratos contava pagar estes prémios, o que comprova que o Conselho de Administração estava não só a par destes prémios como também estudou atempadamente a sua viabilidade económica, tendo até este tipo de prémios sido criados no serviço de urgência e aprovados em Conselho de Administração de acordo com critérios por quantidade, pelo que não se pode referir que eram os Directores de Departamento e de Serviço os responsáveis pela criação dos mesmos e seus termos. DD declarou não se recordar se reuniu com a 3ª A., pelo que, face a esta ausência de memória, deve considerar-se credível a versão apresentada pela 3ª A. quanto à realização da reunião e que aí lhe foi afirmado, que não foi posta em causa. Consequentemente, não se provou o ponto 5). FF confirmou que procedeu ao convite dos AA. juntamente com GG para integrarem o novo serviço de cuidados intermédios a criar no R., mas desconhecendo os termos dos valores remuneratórios. Referiu apenas os seus próprios e que consistia na retribuição base e prémio de assiduidade. Classificava esta unidade como boa, sem dúvidas de que tinha qualidade e era produtiva. GG confirmou ter criado esta unidade de cuidados intermédios no serviço de urgência do R., que a questão contratual, nomeadamente a remuneração dos AA., não passou pela testemunha e que os AA. eram elementos de excelência, sendo que a unidade funcionava com elevado grau de qualidade, baseando-se no relacionamento intergrupal, competências técnicas dos profissionais (que eram a maior mais valia) e liderança activa. A exigência neste serviço era elevada, muito acima do normal. HH, actual Presidente do Conselho de Administração do R., confirmou que a unidade de cuidados intermédios tem apresentado resultados positivos (o que foi também confirmado por EE) e é uma unidade reputada. II, médico de medicina interna que trabalhou no R. entre 2005 e 2016 e trabalhou nesta unidade de cuidados intermédios, afirmou que os níveis da unidade eram bons, com muitos internamentos, grande rotatividade e muitas patologias diferentes; que os resultados da unidade eram bons e que é a sala de urgência com mais pacientes do Norte; o tempo de internamento e taxa de mortalidade não eram muito elevados para o tipo de complexidade dos doentes e todo o tipo de patologias inerentes. Face a todos estes depoimentos e declarações, é assim possível concluir que não existiam outros critérios definidos que não os mencionados à 3ª A., o que evidencia a ausência de intenção das partes na definição de outros critérios, até porque, como foi já supra referido e indicado por EE, o objectivo do R. era criar a unidade e assegurar que estes profissionais iriam trabalhar para o R., pelo que, obviamente, tinham de os aliciar com melhores condições remuneratórias e não ser muito exigentes na atribuição dos prémios. Por outro lado, resultou ainda demonstrado que esta unidade era produtiva, tinha qualidade e é uma unidade de referência.”

Em face da citada motivação, deixando-se consignado que se procedeu à audição dos registos de gravação no que à prova indicada se referem, como ainda o que resulta do mais que é invocado, desde já adiantamos que, com a natural salvaguarda do respeito devido, não encontramos fundamento bastante para divergirmos da convicção que foi firmada em 1.ª instância, substituindo-a, como pretende a Recorrente, pela que esta defende no recurso.

Desde logo, e em primeiro lugar, não se vislumbra que possa existir propriamente contradição entre o que teria sido referido pelos Autores anteriormente, incluindo nas cartas que foram enviadas à Ré, como ainda em face do que foi alegado na petição inicial e depois na resposta ao convite de concretização de factos que foi formulado pelo Tribunal, com o que, por fim, resultou do que referiram nas declarações que foram prestadas em audiência de julgamento, pois que, salvo o devido respeito, não há que confundir-se a questão da não definição dos critérios do modo como ficou mencionado nos contratos, com a questão, já diversa, do que teria ou não sido referido, designadamente à 3.ª Autora, pela representante da Ré, nas circunstâncias que se fizeram constar da alínea LL), ou de que, como se fez constar da alínea MM), não foram em nenhum momento sido referidos critérios diferentes dos então mencionados, como ainda, por fim, quanto à alínea OO), de que, em sede de negociação e elaboração dos contratos e da adenda, não foi intenção dos Autores e da Ré seguir mais critérios objetivos. É que, afinal, uma coisa será invocar / alegar que não foram fixados os critérios do modo como formalmente se fez constar dos contratos e adendas, percebendo-se que as interpelações dos Autores (e ainda alegações na petição inicial) a tal seriam dirigidas e outra, diversa, o que lhes teria sido ou não transmitido verbalmente a respeito de quais seriam esses critérios, ou de qual teria sido então a intenção evidenciada pelas partes, matéria esta que está afinal em causa nas alíneas agora reanalisadas. Na verdade, mesmo apelando-se às regras da experiência comum, estando prevista nos contratos essa definição através de adenda, ou seja a respetiva formalização em documento, torna-se aceitável, sendo até natural, que os visados, independentemente do que lhes fora ou não dito ou de qual fosse a intenção, pudessem questionar a falta de concretização daquela formalização em documento, ainda que porventura se tratasse apenas de verem formalizados, do modo como ficara mencionado nos contratos / adendas, os critérios que, se fosse esse o caso, com maior ou menor concretização, haviam sido de algum modo anunciados, ou pelo menos indiciados.

Não ocorrem, pois, as invocadas contradições.

Avançando-se então na apreciação, agora na consideração do que se pode extrair dos depoimentos indicados (por Recorrente, Recorridos e ainda na motivação antes transcrita), cujos registos de gravação, esclareça-se, ouvimos nesta sede recursiva, ressalta para nós à evidência, diversamente do que defende a Recorrente, adequado suporte para a convicção que veio a ser firmada em 1.ª instância, sem que se detete, diga-se ainda, seja contradição entre depoimentos, seja também com o que antes fora transmitido / alegado (como o esclarecemos antes), sendo que, pelo contrário, o que resulta desses depoimentos dá afinal suficiente suporte – mesmo que se atendesse, para o efeito, apenas às passagens que são transcritas nas alegações e contra-alegações –, à convicção que veio a ser extraída pelo Tribunal recorrido, a que acresce, por outro lado, que sequer é indicada prova, em particular a que é mencionada pela Recorrente, que, objetivamente, infirmando tal convicção, permita dar adequado suporte a convicção diversa, assim a que é indicada pela mesma Recorrente.

Neste contexto, sendo legítimo que se possa discordar da decisão proferida, assim por se considerar que outra deveria ter sido a decisão, tal não se confunde com a demonstração, que terá de ter adequado suporte na prova, devidamente ponderada e analisada de modo crítico, de que efetivamente se opte por esta última. Na verdade, utilizando as palavras de Lebre de Freitas[17], importa ter presente que “o princípio da livre apreciação da prova significa que o julgador deve decidir sobre a matéria de facto da causa segundo a sua íntima convicção, formada no confronto com os vários meios de prova”[18], sendo que, na sua aplicação ao caso, como antes o dissemos, não encontramos razões para não considerarmos que a decisão recorrida motivou e analisou, de forma ponderada, a globalidade da prova produzida, não padecendo, ainda, de desconformidade com os elementos probatórios disponíveis, não resultando, por outro lado, a nosso ver infirmada tal decisão na alegação da Recorrente. 

Assim o relembramos pois que, tendo por base o regime legal aplicável, a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação, tendo de ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância – pois que só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição[19] –, muito embora não se trate de um segundo julgamento e sim de uma reponderação, não se basta com a mera alegação de que não se concorda com a decisão proferida em 1.ª instância, exigindo antes da parte processual que pretende usar dessa faculdade, a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efetivamente, no caso, foram produzidos – sem limitar, porém, o segundo grau, ou seja o tribunal de recurso, de sobre tais desconformidades, previamente apontadas pelas partes, se pronunciar, enunciando a sua própria convicção (não estando, assim, limitada por aquela primeira abordagem pois que no processo civil impera o princípio da livre apreciação da prova, artigo 607.º, nº 5 do CPC[20]).

Por decorrência do exposto, improcede o recurso nesta parte.

2.3. Nos termos expostos, a factualidade a atender, para a apreciação do recurso no âmbito da aplicação do Direito é a que enquanto tal foi considerada pelo Tribunal recorrido, mas com exclusão das alíneas UU), BBB) e CCC).


***

3. O direito do caso

A Apelante, em face do que resulta das conclusões que formulou, que como antes o dissemos, salvo questões de conhecimento oficioso, delimitam o objeto do recurso, invoca nomeadamente como argumentos, no âmbito da aplicação do direito, o seguinte:

- para efeitos de atribuição dos concretos prémios de qualidade e produtividade, atentando-se ao clausulado vertido nos contratos celebrados com os Autores, já transcritos, e constantes dos factos provados nas alíneas H) a M), o abono dos prémios estaria (estará) condicionado, num primeiro plano, à abertura e funcionamento da Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência e, posteriormente, ao estabelecimento de adenda específica que contemple a definição de critérios, pelo que, diz, o direito ao recebimento dos referidos prémios só brotaria na esfera jurídica dos Autores/Recorridos se preenchida um tríplice de condições, a saber: (i) entrasse em funcionamento a Unidade de Cuidados Intermédios do Serviço de Urgência (UCIPSU), (ii) fosse celebrada adenda ao contrato com a definição de critérios e (iii) fossem, efetivamente, verificados os referidos critérios, neste sentido, atente-se, na ampla prova testemunhal produzida acima referenciada;

- conforme estabelece o artigo 270.º do Código Civil, as partes podem subordinar a um acontecimento futuro e incerto a produção dos efeitos do negócio jurídico ou a sua resolução, dispondo o artigo 135.º do Código do Trabalho que, relativamente aos contratos de trabalho, possam ser apostas condições ou termos suspensivos, nos termos gerais, sendo que, no que respeita ao regime de verificação e não verificação da condição, estabelece o artigo 275.º do CC que: “1. A certeza de que a condição se não pode verificar equivale à sua não verificação. 2. Se a verificação da condição for impedida, contra as regras da boa fé, por aquele a quem prejudica, tem-se por verificada; se for provocada, nos mesmos termos, por aquele a quem aproveita, considera-se como não verificada.”

- o estabelecimento dos critérios necessários para abono dos referidos prémios nunca se verificou e, por via disso, não poderá haverá lugar ao preenchimento das condições suspensivas a estes inerentes e cuja verificação permitiria o pagamento dos mesmos, sendo que, contrariamente ao vertido na sentença, a ausência de fixação destes critérios não lhe poderá ser imputável – apesar de reconhecer o manifesto retardamento na elaboração dos mesmos, no entanto, jamais obstou à sua definição, importando notar-se que o atual Conselho de Administração do Recorrente, quando interpelado pelos Autores/Recorridos, encetou de imediato diligências com vista à fixação de critérios, auscultando a responsável pelo Serviço de Cuidados Intensivos Polivalentes e Intermédios do Serviço de Urgência e, posteriormente, solicitando a pronúncia da Ordem dos Médicos, sendo ainda de atender ao longo hiato de tempo, ao longo estado de silêncio entre as partes (desde final do ano de 2016, altura que o atual Conselho de Administração iniciou funções) até então, pois que, nunca os Autores a interpelaram no sentido de serem fixados os necessários critérios;

- por apelo aos critérios interpretativos previstos no artigo 236.º, do Código Civil, forçosamente se conclui que os Autores/Recorridos assinaram os seus contratos de trabalho e adendas cientes, porque lhes foi transmitido, de que o abono dos prémios de Qualidade e Produtividade estaria condicionado à abertura da UCIPSU e, posteriormente, haveriam de ser fixados os necessários critérios para o efeito, só assim sendo devido o seu pagamento;

- mal andou o Tribunal na qualificação da natureza dos prémios de qualidade e produtividade, em face do disposto no artigo 260.º do Código do Trabalho, pois que, diz, embora a lei consagre que a retribuição compreende a remuneração de base e todas as outras prestações regulares e periódicas, presumindo-se constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade patronal ao trabalhador, no entanto este critério, assente na regularidade e periodicidade dos benefícios patrimoniais auferidos pelo trabalhador, pode não se revelar suficiente, pois o intérprete deve ter sempre presente se a atribuição patrimonial paga ao trabalhador deriva duma causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho ou da disponibilidade deste, sendo que, diz, sendo assim necessário que se possa detetar uma contrapartida específica diferente da disponibilidade da força de trabalho para que se possa colocar determinada prestação do empregador à margem do salário global, é precisamente este o cenário vertido nos autos, porquanto os prémios de qualidade e produtividade não constituem uma contrapartida do trabalho prestado pelos Autores/Recorrentes, contrariamente ao vertido na sentença ora em crise, nem tão pouco são devidos por força dos contratos ou das normas que os regem – à semelhança do que sucede com a assiduidade, os prémios de qualidade e produtividade configuram prestações decorrentes de factos relacionados com o desempenho ou mérito dos Autores/Recorrentes, cujo pagamento sempre estaria/estará condicionado à verificação de critérios (a serem estabelecidos), não se encontrando antecipadamente garantido, conforme estabelecido na alínea c) do n.º 1 do artigo 260.º do CT;

- não se pode considerar que os referidos prémios possuem natureza retributiva, e que por via disso deveriam ser pagos treze vezes por ano, quando muito, à semelhança do preconizado para o prémio de assiduidade, poderiam ser devidos onze meses por ano, pois que, como se encontram dependentes da verificação de critérios, no mês relativo às férias não seriam devidos;

Conclui, a final, pela procedência do recurso, com a consequente revogação da sentença recorrida.

Defendem os Apelados, por sua vez, o julgado, no que são acompanhados pelo Ministério Público junto deste Tribunal da Relação.

Cumprindo-nos pronúncia, centrando-se desde já a nossa análise, constata-se que são no essencial duas as questões que são levantadas, que se prendem, respetivamente: por um lado, com o que pode ou não resultar da circunstância de as prestações objeto da ação (designados “prémios”), que se fizeram constar, no que agora importa, referindo-se cujos critérios seriam posteriormente definidos em adenda, vencendo-se a partir da referida adenda”, defendendo a Recorrente que, como o estabelecimento desses critérios, necessários para abono dos referidos prémios nunca se verificou – não havendo lugar, por via disso, ao preenchimento das condições suspensivas a estes inerentes e cuja verificação permitiria o pagamento dos mesmos –, na ausência de culpa sua (contrariamente ao vertido na sentença), esses não são devidos; por outro lado, entendendo-se diversamente, que então, não poderá considerar-se que esses prémios possuem natureza retributiva (e que por via disso deveriam ser pagos treze vezes por ano), sustentando que, quando muito, à semelhança do preconizado para o prémio de assiduidade, poderiam ser devidos onze meses por ano, pois que, como se encontram dependentes da verificação de critérios, no mês relativo às férias não seriam devidos.

Pela referida ordem, de seguida procederemos à apreciação.

3.1. Análise da 1.ª questão: saber se os denominados prémios são devidos independentemente dos critérios não terem sido definidos

Resulta da sentença recorrida, a propósito desta questão o seguinte (transcrição):

«(…) O contrato de trabalho, de acordo com a noção prevista no artigo 11º do CT e, como qualquer outro contrato, constitui o resultado de, pelo menos, duas declarações negociais convergentes, uma consubstanciada na formulação de uma determinada proposta por um dos contratantes e a outra consubstanciada na aceitação dessa proposta por parte do outro contratante. Para além disso, tem natureza sinalagmática, dele emergindo direitos e obrigações para ambas as partes, e é um negócio de execução continuada, protelando os seus efeitos no tempo.

Sendo que tal proposta deverá conter os elementos essenciais do contrato que, no caso do contrato de trabalho, serão os que respeitam às prestações principais das partes contratantes: o trabalho a efectuar e a retribuição a auferir, para além da indicação do local da prestação do trabalho e período durante o qual este será prestado.

Como em qualquer contrato, também nestes casos é exigida a a boa fé contratual pois, como se estabelece no artigo 102º do CT, “Quem negoceia com outrem para a conclusão de um contrato de trabalho deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé, sob pena de responder pelos danos culposamente causados”.

“No âmbito do princípio da autonomia privada, consagrado no art. 405.º do CC, as partes podem inserir no negócio jurídico uma cláusula condicional, no sentido, designadamente, da eficácia do negócio ficar dependente da verificação de um evento futuro e incerto (art. 270.º do CC). Verificando-se o evento, o negócio jurídico produzirá os seus efeitos, caso contrário não produzirá. Trata-se, pois, da denominada condição suspensiva, que se contrapõe à condição resolutiva, e que, diferentemente daquela, importa a destruição dos efeitos negociais (MOTA PINTO, Teoria Geral do Direito Civil, 4.ª edição, por A. PINTO MONTEIRO e PAULO MOTA PINTO, 2005, pág. 565)” (cfr. Acórdão do TRLisboa de 20/11/2011, proc. 156246/08.2YIPRT.L1-6, disp. in www.dgsi.pt).

Com efeito, estabelece o artigo 270º do CCivil que as partes podem subordinar a um acontecimento futuro e incerto a produção dos efeitos do negócio jurídico ou a sua resolução: no primeiro caso, diz-se suspensiva a condição; no segundo, resolutiva.

No caso dos contratos de trabalho, o CT prevê no seu artigo 135º que a este pode ser aposta, por escrito, condição ou termo suspensivo, nos termos gerais, ou seja, de acordo com o regime previsto no CCivil. Já quanto a uma condição ou termo resolutivo é o CT omisso em geral, sendo discutida na doutrina e jurisprudência a sua admissibilidade.

Ora, de acordo com o regime jurídico previsto para a condição e termo nos artigos 270º e ss. do CCivil, estipula-se no seu artigo 275º o regime da verificação e não vericação da condição, o seguinte:

“1 - A certeza de que a condição se não pode verificar equivale à sua não verificação.

2 - Se a verificação da condição for impedida, contra as regras da boa fé, por aquele a quem prejudica, tem-se por verificada; se for provocada, nos mesmos termos, por aquele a quem aproveita, considera-se como não verificada”.

Quanto aos efeitos do preenchimento da condição, estabelece o artigo 276º do CCivil que estes retroagem à data da conclusão do negócio, a não ser que, pela vontade das partes ou pela natureza do acto, hajam de ser reportados a outro momento.

Já quanto ao não cumprimento dos termos do contrato, estabelece o artigo 790º do CCivil, referente à impossibilidade objectiva do cumprimento não imputável ao credor que

“1. A obrigação extingue-se quando a prestação se torna impossível por causa não imputável ao devedor. 2. Quando o negócio do qual a obrigação procede houver sido feito sob condição ou a termo, e a prestação for possível na data da conclusão do negócio, mas se tornar impossível antes da verificação da condição ou do vencimento do termo, é a impossibilidade considerada superveniente e não afecta a validade do negócio”.

No que se refere à falta de cumprimento e mora imputáveis ao devedor, encontra-se o regime legal previsto nos artigos 798º e ss. do CCivil, nos termos do qual o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação se torna responsável pelo prejuízo que causa ao credor, incumbindo ao devedor provar que a falta de cumprimento não procede de culpa sua. Quanto à mora, esta constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor e o devedor considera-se constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada no tempo devido.

Já no que se refere aos contratos de trabalho, prevê o artigo 323º do CT os efeitos gerais do seu incumprimento, no sentido de que a parte que faltar culposamente ao cumprimento dos seus deveres é responsável pelo prejuízo causado à contraparte, sendo quanto ao não pagamento de retribuição, tais prejuízos considerados em juros de mora.

 Ora, no caso em apreço é incontroverso que os AA. celebraram com o R. contratos de trabalho, o que foi aceite pelas partes.

No caso dos 1º e 3ª AA., foram estes admitidos para exercer funções equivalentes à categoria profissional de Assistente Hospitalar, a desempenhar na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência do R.. No caso da 2ª A., foi esta inicialmente contratada para exercer funções equivalentes à categoria profissional de Assistente Hospitalar de Medicina Interna em todos os sectores em que tal se torne necessário, sendo que por adenda de 03/12/2009 foi tal contratação alterada para o exercício de funções equivalentes à categoria profissional de Assistente Hospitalar, a desempenhar na Unidade de Cuidados Intermédios do Serviço de Urgência e Cuidados Intensivos do Departamento de Emergência e Cuidados Intensivos e Anestesiologia.

Em causa nos presentes autos está a atribuição dos prémios de qualidade e produtividade previstos nos contratos dos 1º e 3ª AA. e adenda da 2ª A..

Tais documentos estipulam, a este respeito, o seguinte:

- Será ainda abonado um prémio de qualidade apenas e quando estiver definida e em funcionamento a Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, a que corresponderá um acréscimo de 10% sobre a remuneração base ilíquida, e cujos critérios serão posteriormente definidos em adenda a este Contrato, do qual faz parte integrante e desde já aceites, vencendo-se este prémio a partir da referida Adenda”;

- “Acordam também as partes outorgantes a atribuição de um prémio de produtividade de 20% sobre a remuneração base ilíquida a auferir pelo 2.º CONTRAENTE, apenas e aquando da abertura e efectivo funcionamento da Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, e se verificados os critérios que integrarão adenda específica a este Contrato a definir, e do qual passará a fazer parte integrante, a partir da data da referida assinatura.” (cfr. pontos H a M, provados).

Alegam os AA. que a atribuição destes prémios ficou apenas sujeita a uma condição suspensiva: a entrada em funcionamento da Unidade de Cuidados Intermédios (doravante, UCI), que se verificou em Dezembro de 2009. E que, verificada a condição, era obrigação do R. cumprir com o estipulado quanto à formalização de critérios de atribuição de prémios e seu pagamento.

Já o R. considera que o vencimento dos prémios apenas ocorrerá com a formalização da adenda de fixação de critérios e alega que tal, em termos de critérios individuais, se mostra impossível, apenas podendo ser definidos critérios para o Serviço respectivo. 

Importa, desde logo, analisar o texto das cláusulas contratuais que fixam cada um destes contratos. Sendo que, quanto à sua interpretação, reitera-se o já supra explanado:

Em matéria de interpretação das declarações negociais rege no nosso direito a denominada teoria da impressão do destinatário, alicerçada na regra de que “o sentido da declaração negocial é aquele que seria apreendido por um declaratário normal, isto é, um declaratário medianamente instruído e diligente, colocado na posição do declaratário real, em face do comportamento do declarante”, como resulta do disposto no artigo 236º nº 1 do CCivil. “Releva, assim, o sentido que seria considerado por uma pessoa normalmente diligente, sagaz e experiente em face dos termos da declaração e de todas as circunstâncias situadas dentro do horizonte concreto do declaratário” (cfr. Acórdão do STJ de 02/02/2006, proc. nº 05B3578, disp. in www.dgsi.pt). Por outro lado, atento o facto de estarmos perante um negócio reduzido a escrito e, portanto, formal, a interpretação da vontade das partes haverá que fazer-se, não só de acordo com a doutrina da impressão do destinatário, mas também de acordo com a regra plasmada no artigo 238º nº 1 do CCivil, nos termos do qual a declaração não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento.

Posto isto, vejamos o teor das cláusulas contratuais a este respeito.

Relativamente à atribuição de ambos os prémios, são as duas cláusulas coincidentes no sentido de estes apenas serem atribuídos (em percentagens fixadas no próprio contrato) quando estiver definida e em funcionamento a Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência.

Logo, e como referem os AA., temos aqui efectivamente uma condição suspensiva de atribuição dos prémios. Condição esta que se verificou efectivamente com a abertura da UCI, em Dezembro de 2009 (cfr. ponto O dos factos provados).

No entanto, no caso do prémio de qualidade, refere-se ainda que os critérios para atribuição do prémio serão posteriormente definidos em adenda, vencendo-se este prémio a partir da referida Adenda. Ou seja, estamos perante uma segunda condição suspensiva para efeitos de vencimento deste prémio (o que é distinto do momento de atribuição do mesmo).

Já quanto ao prémio de produtividade, prevê a cláusula contratual que a atribuição do mesmo está ainda sujeita à verificação dos critérios que integrarão adenda especifica ao Contrato a definir, e do qual passará a fazer parte integrante, a partir da data da referida assinatura. Esta redacção é ligeiramente diferente da anterior quanto ao prémio de qualidade, pois aqui não se fala do momento de vencimento do prémio, mas sim do direito à sua atribuição. Pelo que, também aqui, estamos perante uma segunda condição suspensiva, mas neste caso para constituição do direito de atribuição do prémio.

O sentido negocial referido corresponde, efectivamente, ao sentido normal que um destinatário razoável, normalmente esclarecido, zeloso e sagaz, colocado na posição concreta do real destinatário, atribuiria às declarações constantes das cláusulas mencionadas. Tal interpretação está, por isso, em conformidade com os comandos normativos que regulam a respectiva matéria, nomeadamente os previstos nos artigos 236º nº 1 e 238º nº 1, ambos do CCivil. 

Defende o R. que não foi possível a elaboração de tal adenda até ao presente momento devido às contingências inerentes a diversas alterações de quadros do R. e, bem assim, dificuldade de fixação de critérios, alegando mesmo a impossibilidade de fixação de critérios individuais. Ou seja, pretende o R. invocar a impossibilidade de verificação destas condições e consequente ausência de direito dos AA. aos prémios previstos nos contratos de trabalho respectivos.

No entanto, não se pode concordar com a posição assumida pelo R..

Com efeito, cabia ao R. demonstrar a impossibilidade de verificação destas condições, ou seja, a impossibilidade de fixação de critérios, o que não logrou fazer. Desde logo, porque os contratos são totalmente omissos quanto à fixação de critérios individuais, referindo apenas genericamente a fixação de critérios, sendo que nas cláusulas respectivas para atribuição de prémios apenas é feita menção à definição e funcionamento da UCI, pelo que um destinatário razoável, normalmente esclarecido, zeloso e sagaz, colocado na posição concreta dos ora AA., interpretaria estes critérios como referentes à Unidade e não aos próprios AA. em termos individuais. 

Até porque, em termos de obrigações de desempenho dos AA., se constata que nos contratos celebrados com os 1º e 3ª AA. se mostra já consagrado nas cláusulas 12ª e 13ª (e no caso da 2ª A., nas Cláusulas 13ª e 14ª) as obrigações de desempenho com zelo e diligência por parte dos AA. e respectiva responsabilidade disciplinar.

Mas ainda que assim não se entendesse, resulta da matéria de facto provada que o R. não logrou demonstrar a impossibilidade de redacção de critérios individuais de qualidade e de produtividade ou a natureza difícil e complexa da definição das métricas a utilizar na definição destes prémios. Aliás, tendo o R. alegado, para justificar tais factos, ter solicitado informações ao Bastonário da Ordem dos Médicos e não ter recebido resposta (quando o deveria ter feito ao respectivo Colégio da Especialidade, para quem está, aliás, obrigado a remeter anualmente critérios de cada unidade/serviço), interpelado o Colégio da Especialidade pelo Tribunal, respondeu o mesmo a fls. 474 dos autos, mediante emissão de Parecer que dá resposta ao modo de avaliação dos deveres deontológicos de cada médico e do serviço e, também, aos critérios a atender para a sua avaliação profissional, como devendo ser definidos pelo R., não fazendo qualquer menção à sua impossibilidade e dificuldade. A que acresce o facto de, como resulta da fundamentação de facto, o R. já possuir em 2009, noutros serviços, aplicações informáticas que permitiam avaliar os médicos e o serviço, sendo que foi o Conselho de Administração quem recusou a transferência das mesmas para o serviço de cuidados intermédios, pelo que era perfeitamente possível ao R., caso tivesse tomado a necessária iniciativa que se lhe impunha enquanto devedor perante os AA., ter atempadamente fixado os critérios necessários. Sendo que também resultou da prova produzida que existem critérios de cada unidade/serviço e que estes têm de ser enviados anualmente pelo R. ao Colégio da Ordem dos Médicos, por causa dos internatos, e que poderiam ter sido utilizados para este efeito contratual.

Ou seja, demonstrado que ficou que a UCI iniciou a funcionar em Dezembro de 2009, mostra-se verificada a primeira condição suspensiva.

Por outro lado, e quanto à segunda condição suspensiva, o que se constata é que o R., desde a celebração dos contratos de trabalho com os 1º e 3ª AA. e adenda com a 2ª A., em 2009 (!), não elaborou critérios nem celebrou a adenda a que então se vinculou, não obstante decorridos mais de 11 anos até à propositura da presente acção.

Assim, não se demonstrou que a segunda condição a que o R. se obrigou não se pode realizar, pelo que é inaplicável o disposto no artigo 275º nº 1 do CCivil.

Acresce que, sendo o R. o responsável contratualmente pela elaboração dos critérios e celebração da adenda, com a qual se vinculou, constata-se que, de facto, e de acordo com as regras da boa fé a que se encontra adstrito por força do disposto no artigo 762º nº 2 do CCivil, o R. impediu a verificação desta condição. Com efeito, de acordo com esta norma, no âmbito dos princípios da boa fé, importa “apurar, dentro do contexto da lei ou da convenção donde emerge a obrigação, os critérios gerais objectivos decorrentes do dever de leal cooperação das partes, na realização cabal do interesse do credor com o menos sacrifício possível dos interesses do devedor, para a resolução de qualquer dúvida que fundadamente se levante, quer acerca dos deveres de prestação (forma, prazo, lugar, objecto, etc.), quer seja a propósito dos deveres acessórios de conduta de uma ou outra das partes” (cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, reimpressão da 7ª edição, Almedina, pág. 13).

E a este respeito, o que se pode afirmar é que o R., não obstante ter desde o início meios informáticos para proceder à avaliação dos médicos e da própria UCI, como afirmou o Director Clínico à data da abertura deste Serviço, optou por não o fazer, não permitindo a transferência da aplicação informática em causa para a UCI, para além de apenas em 2021 ter solicitado informação ao Bastonário da Ordem dos Médicos, pelo que só se pode afirmar que o R. violou claramente o princípio da boa fé contratual e impediu a verificação em tempo útil da condição em causa. Consequentemente, é aplicável o disposto no artigo 275º nº 2, primeira parte, do CCivil e tem-se esta condição suspensiva por verificada. Resultado a que também se chegaria por aplicação do disposto no artigo 799º do CCivil e presunção aí estabelecida.

Sendo que, por força do disposto no artigo 276º do CCivil, conjugado com a análise do contratado entre as partes, os efeitos do preenchimento desta condição suspensiva retroagem à data de início de funcionamento da UCI, uma vez que foi este o momento fixado nas cláusulas contratuais para os prémios aqui em causa.

Têm assim os AA. direito ao pagamento destes prémios de qualidade e de produtividade desde Dezembro de 2009.

E isto porque, não tendo o R. fixado atempadamente os critérios por meio de adenda, não pode o mesmo invocar tal falta ou seu incumprimento pelos AA. para efeitos de não atribuição dos prémios, já que lhe competia, nesse caso, alegar que os AA. não cumpriram sequer com os requisitos mínimos exigidos para o serviço, o que não só não alegou como não provou. Antes pelo contrário, ficou demonstrado que, no que toca a qualquer um dos índices com base em dias médios de recuperação, ou percentagens concretas de reinternamento, o trabalho desenvolvido pelos AA., inserido no resto da equipa da Unidade que integram, coloca a unidade com altos padrões esperados para um serviço, com o tempo de funcionamento que este concretamente tem, atendendo ao estado actual da arte desta disciplina da ciência médica.

Por último, refira-se ainda que a demonstração de que, a partir de 21/09/2016, os AA. passaram a exercer funções integrados no Serviço de Medicina Intensiva, com rotação pelas Unidades que o integram, sendo o 1º A. na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente, na Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente e Sala de Emergência e as 2ª e 3ª AA. na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente e Sala de Emergência em nada influencia o direito aos prémios contratualmente fixados, já que todos mantêm exercício de funções na UCI e, como se pode verificar da adenda celebrada com a 2ª A., já no momento da contratualização destes prémios foram as funções desta fixadas na UCI, no Departamento de Emergência e Cuidados Intensivos, pelo que daqui se retira claramente a desnecessidade de vinculação exclusiva à UCI para atribuição destes prémios.

Atento o incumprimento verificado por parte do R., têm os AA. direito a juros de mora sobre tais prémios desde o dia seguinte ao da citação do R. nos presentes autos.»

Em face da citada fundamentação, desde já diremos, não obstante não acompanharmos as referências dessa constantes a elementos que não resultam da factualidade provada[21], que acompanhamos o entendimento a que chegou o Tribunal recorrido a respeito da questão agora analisada, para o que releva, nomeadamente, quer a interpretação que deve ser feita das declarações das partes constantes dos contratos e adendas – interpretação essa que se nos afigura correta, desde logo a respeito de resultar do texto que deveriam ser pagos mensalmente[22] –, quer ainda, a propósito da verificação das condições e em particular a respeito da culpa a imputar claramente à Ré / aqui recorrente na não verificação do facto, assim a definição dos critérios que se fizeram constar e que aqui estão em causa.

Na verdade, remetendo-se no mais para a citada fundamentação, por entendermos que dispensa outras considerações da nossa parte para justificar o julgado nesta parte, diversamente do que defende a Recorrente, consideramos que, estando-se claramente perante preenchimento de condições apostas nos documentos cuja efetivação só dela dependeria, sem esquecermos aliás que resulta da factualidade provada que os Autores ficaram afinal também nessa clara expetativa, a mesma não demonstrou, tratando-se de ónus que sobre ela impendia, que não o pudesse ter feito, ou seja, que sem culpa sua, a concretização desses critérios não tivesse sido possível. De resto, importa referi-lo, os argumentos apresentados pela Recorrente, com salvaguarda do respeito devido, sequer encontram apoio na factualidade provada, quando deve ser esta, como o temos dito em outros arestos, que deve dar adequado suporte aos argumentos jurídicos que dela estejam dependentes.

Deste modo, sem necessidade de outras considerações, improcedem as conclusões da Recorrente a respeito da questão que se analisou.

3.2. Análise da 2.ª questão: saber da natureza retributiva ou não, das prestações / sua inclusão, ou não na remuneração de férias e subsídio de férias

Para efeitos da apreciação desta questão, levantada subsidiariamente pela Recorrente, resulta da sentença, a seu respeito, o seguinte:

«Posto isto, torna-se agora necessário determinar da natureza retributiva destes prémios de qualidade e produtividade.

A este respeito, ficou demonstrado que as partes estipularam que os mesmos seriam pagos mensalmente, como contrapartida da actividade desenvolvida pelos mesmos na Unidade de Cuidados Intermédios Polivalente do Serviço de Urgência, assim que ela fosse criada e funcionasse, no período normal de trabalho de cada um, estando dependentes do preenchimento de requisitos de qualidade e de produtividade que poderiam ou não, no final do período temporal respectivo, ser alcançados.

Estabelece o artigo 258º do CT que:

(…)

Acrescentando o artigo 260º do mesmo diploma que:

(…)

No caso em apreço, verifica-se que os prémios de qualidade e de produtividade em discussão se mostram já devidos por força dos contratos de trabalho celebrados pelo R. com os AA., que não só prevê a sua atribuição mediante a indicação de uma percentagem fixa para cada um, calculada sobre a retribuição mensal ilíquida), como refere o direito ao mesmo com a abertura e funcionamento da UCI, uma vez que são reportadas a um determinado período de referência e são também uma contrapartida do trabalho prestado pelos AA. (neste sentido, cfr., entre outros, Acórdão do STJ de 06/05/2020, proc. 14746/18.3T8LSB.L1.S1), para além de terem uma periodicidade mensal, conforme já explicitado supra na fundamentação de facto, pelo que constituem retribuição nos termos previstos no artigo 260º nº 3 alínea a) do CT e, como tal, devem ser integrados no subsídio de férias. (…)»

Ora, a Apelante levanta questões relacionadas diretamente com o deverem ou não ser  consideradas, as prestações aqui em análise, como integrantes da retribuição dos Autores, sendo que, se bem se percebe, ao fazer referência a onze meses, estará a defender que tais prestações não deverão relevar para efeitos de cálculo da retribuição de férias e subsídio de férias, questões essas que justificam uma análise conjunta, o que passaremos a fazer seguidamente.

Por referência ao período temporal que releva no caso, não sendo invocadas normas convencionais, quanto ao regime legal aplicável, como aliás resulta da pronúncia do Tribunal a quo na sentença recorrida, constata-se que será de aplicar o que resulta do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12/02.

Dentro pois do citado quadro normativo, em resposta sobre o que há de entender-se por retribuição, importa ter presente que o Código vigente não introduziu alterações quanto a esse regime, agora consagrado nos artigos 258.º a 269.º, em particular sobre o do que se dispunha nos artigos 249.º e 258.º do CT de 2003, em que se estipulava, no primeiro, nos seus n.º s 1 a 3, que “só se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho” (n.º 1), incluindo-se na contrapartida do trabalho “a retribuição base e todas as prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie” (n.º 2), sendo que, e “até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador” (n.º 3). Ou seja, tendo em conta os princípios de repartição do ónus da prova, especificadamente o disposto no n.º 1 do artigo 344.º do Cód. Civil, é sobre o empregador que impende o ónus de provar que certa prestação que o mesmo fez ao seu trabalhador não tem a natureza de retribuição.

Em jeito de introdução, acompanhando-se o que se escreveu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Outubro de 2012[23], diremos também que a retribuição representava “a contrapartida, por parte do empregador, da prestação de trabalho efectuada pelo trabalhador, sendo que o carácter retributivo de uma certa prestação exigia regularidade e periodicidade no seu pagamento, o que tem um duplo sentido: por um lado, apoia a presunção da existência de uma vinculação prévia do empregador; por outro lado, assinala a medida das expectativas de ganho do trabalhador.”

Assim, devendo entender-se por regularidade da prestação que essa não é arbitrária, mas sim constante, a periodicidade determina que essa seja paga em períodos certos ou tendencialmente certos no tempo, assumindo-se assim esta ideia de periodicidade como típica do contrato de trabalho.

Do exposto resulta que, sendo em primeira linha a retribuição determinada diretamente pelo clausulado do contrato e pelos usos laborais – sem esquecermos, naturalmente, o que resulta ainda de certos critérios normativos, como o sejam o salário mínimo, a igualdade retributiva, etc. –, já num segundo momento, porém, lhe poderão acrescer certas prestações que preencham os aludidos requisitos de periodicidade e regularidade.

Sublinhando o primeiro critério a ideia de correspetividade ou contrapartida negocial – é retribuição tudo o que as partes contratarem (ou resultar dos usos ou da lei para o tipo de relação laboral em causa) como contrapartida da disponibilidade da força de trabalho –, já o segundo, por sua vez, assenta numa presunção – considera-se que as prestações que sejam realizadas regular e periodicamente pressupõem uma vinculação prévia do empregador e suscitam uma expetativa de ganho por parte do trabalhador, ainda que tais prestações se não encontrem expressamente consignadas no contrato[24].

Assim o tem afirmado a doutrina e a jurisprudência, que nos têm dado, também, critérios para que seja encontrada a solução, caso a caso.

Em suma, pode dizer-se que a retribuição do trabalho se assumirá como “o conjunto de valores (pecuniários ou não) que a entidade patronal está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em razão da atividade por ele desempenhada (ou, mais rigorosamente, da disponibilidade da força de trabalho por ele oferecida)”[25], sendo a mesma integrada não só pela remuneração de base como ainda por outras prestações regulares e periódicas, feitas direta ou indiretamente, incluindo as remunerações por trabalho extraordinário, quando as mesmas, sendo de carácter regular e periódico, criem no trabalhador a convicção de que elas constituem um complemento do seu salário[26].

Nada se dizendo também na sentença a este respeito, importa esclarecer que, nos termos afirmados no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 14/2015, de 1 de outubro de 2015[27], com valor ampliado de revista[28], deve atender-se à média das quantias auferidas nos doze meses que antecedem aquele em que é devido o seu pagamento, desde que, nesse período, tenha auferido tal prestação em, pelo menos, onze meses[29][30].

Avançando-se então na análise, estando em causa na presente ação eventuais diferenças, a partir de dezembro de 2009, relativas à remuneração de férias e ao subsídio de férias impõe-se ainda atender ao quadro legal aplicável nesse âmbito ao longo do período em causa.

Quanto ao direito a férias pagas, tendo esse, como sabemos, também consagração constitucional (artigo 59.º da CRP), mostra-se igualmente consagrado no Código do Trabalho (atualmente artigo 264.º do Código de 2009).

Em traços genéricos, e como primeira abordagem, poderemos partir do pressuposto, que temos por incontroverso, de que, vigorando entre as partes um contrato de trabalho, o trabalhador teria direito, em cada ano civil, ao gozo de férias retribuídas – sem prejuízo, ainda, diga-se, do direito ao subsídio de férias ([31]) –, que se vencem em 1 de janeiro e que em regra se reportam ao trabalho prestado no ano anterior, sendo gozadas, também por regra, no ano civil em que se vencem – o direito a férias, também por imposição legal, é irrenunciável e não pode ser substituído, ainda que com o acordo do trabalhador, por qualquer compensação, económica ou outra, quanto a um período mínimo de 20 dias ([32]). Também como resulta de lei, o período de férias é marcado em princípio por acordo entre empregador e trabalhador, estabelecendo a mesma lei, na ausência desse acordo, regras para a sua marcação pelo empregador ([33]), como ainda, de resto, para a alteração do período de férias, seja por motivo relativo à empresa seja por motivo relativo ao trabalhador ([34]) – ainda, mais uma vez em face do disposto na lei, assim do artigo 245.º do CT/2009, são estabelecidos os efeitos da cessação do contrato de trabalho no direito a férias, aí se estabelecendo, nomeadamente, o direito ao recebimento da retribuição de férias e respetivo subsídio, correspondentes a férias vencidas e não gozadas, bem como aos proporcionais ao tempo de serviço prestado no ano da cessação ([35]).

Por sua vez, a respeito do direito a subsídio de férias, que já passara a estar previsto no CT/2003 – assim desde logo no n.º 2 do seu artigo 255.º, aí se estabelecendo que, “[a]lém da retribuição mencionada no número anterior, o trabalhador tem direito a um subsídio de férias cujo montante compreende a retribuição base e as demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho” –, resulta do CT/2009 (que manteve nessa matéria regulamentação idêntica à do CT/2003), assim do seu artigo 264.º, n.º 2, que “[a]lém da retribuição mencionada no número anterior, o trabalhador tem direito a subsídio de férias, compreendendo a retribuição base e outras prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho, correspondentes à duração mínima das férias, não contando para este efeito o disposto no nº 3 do artigo 238º”.

Citando a propósito o Acórdão desta Relação de 20 de Novembro de 2017[36], “como logo se constata pelo confronto das normas, com o CT/03 o legislador veio introduzir uma alteração significativa no que respeita ao subsídio de férias, solução que foi mantida no CT/09. Com efeito, enquanto a retribuição a pagar pelo período de férias equivale à que o trabalhador normalmente aufere, na totalidade, já o subsídio de férias «tem um processo de cálculo próprio: é constituído pela retribuição base – definida no art.º 250.º/2-a) – e pelas “demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho” (art.º 255.º/2). Esta enigmática formulação legal, proveniente do Código de 2003, permite, apesar de tudo, alcançar algum resultado aplicativo: pelo menos as “anuidades” e “diuturnidades” que correspondem à antiguidade de serviço, estão seguramente excluídas; o mesmo acontecerá com diversos subsídios (de transporte, de estudos, de refeição, etc.) que, tendo carácter retributivo, não se relacionam com o “modo específico” de prestação de trabalho» [Monteiro Fernandes, Op. cit., p. 437].”

O que se referiu anteriormente visa salientar, aspeto que aliás assume relevância para o caso que apreciamos, que não são propriamente coincidentes os critérios legais referentes ao que deve integrar a remuneração de férias do trabalhador, por um lado, e, por outro, o respetivo subsídio de férias.

Na verdade, se quanto à primeira deve corresponder à retribuição que o trabalhador receberia se estivesse em serviço efetivo[37], essa cujos critérios estão definidos a propósito do que deve ter-se em geral como retribuição do trabalho[38] – podendo essa, esclareça-se, ainda por apelo à lei, ser certa, variável ou mista[39] –, podendo pois dizer-se que essa não deverá ser inferior àquela que o trabalhador receberia se estivesse em serviço efetivo, já o subsídio de férias, por seu turno, tem um processo de cálculo próprio, diverso daquele, pois que apenas é constituído pela retribuição base[40] e pelas “demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho” (artigo 264.º, n.º 2), formulação esta que, pelo menos, permite excluir do seu âmbito, em termos práticos, as “anuidades” e as “diuturnidades” que correspondem à antiguidade de serviço, como, ainda, diversos subsídios (de transporte, de estudos, de refeição, etc.) que, tendo carácter retributivo, não se relacionam com o “modo específico” de prestação de trabalho[41].

Deixou assim de existir a equiparação, para efeitos de cálculo, entre o subsídio de férias e a retribuição de férias, pois que importa agora averiguar, quanto ao primeiro, quais as prestações que são contrapartida do modo específico da execução do trabalho, sendo que, com tal objetivo, dúvidas não existirão quanto a entender-se que essas prestações, ligadas diretamente às específicas condições da execução do trabalho, se relacionarão então desde logo com a penosidade, o trabalho suplementar e noturno, mas já não, por não consubstanciam aquele modo específico, as prestações que respeitam ao trabalhador e respetivo desempenho, como o são os prémios e gratificações.

De facto, as fórmulas adotadas pelos CT/2003 e CT/2009 para o cálculo do subsídio de férias, ao aludir às prestações que são contrapartida do modo específico da execução do trabalho, parece evidenciar uma opção do legislador, de entre os diferentes nexos de correspetividade que caracterizam as várias componentes da retribuição, por aqueles que se reportam à própria prestação do trabalho em si mesma, assim às específicas contingências que a rodeiam, ou seja, dizendo de outro modo, “ao seu condicionalismo externo (penosidade, isolamento, toxicidade, trabalho suplementar, trabalho nocturno, turnos rotativos), em detrimento daqueles que pressuponham a efetiva prestação da atividade, quer respeitem ao próprio trabalhador e ao seu desempenho (prémios, gratificações, comissões), quer consistam na assunção pelo empregador de despesas em que incorreria o trabalhador por causa da prestação do trabalho (subsídios de refeição e de transporte)”[42]. No mesmo sentido Romano Martinez, quando defende, a propósito do artigo 264º, n.º 2, do CT/2009, que “O legislador determina, agora, que apenas devem ser incluídos no subsídio de férias os complementos ‘…que se referem à própria prestação do trabalho, i.e., às específicas contingências que a rodeiam (…), ao seu condicionalismo externo, em detrimento daqueles que pressupunham a efectiva prestação de actividade.”[43]

3.2.1. Impondo-se ter presente as considerações anteriores, sendo verdade que, por regra, em face do regime legal, a retribuição é a contrapartida pela prestação de trabalho efetuada pelo trabalhador, com carácter regular e periódico, daí resultando uma legítima expetativa do trabalhador ao seu recebimento, no entanto, no caso que se discute, não se podendo dizer que as prestações aqui em discussão foram efetivamente pagas aos Autores, a verdade é que, como antes o considerámos, o deveriam ter sido, pelo que, para efeitos de aplicação do critério antes mencionado de regularidade e periodicidade, com as inerentes adaptações, se deve considerar, tendo presente esta última circunstância, que se verificam, ainda assim, preenchidos tais critérios, ou seja, do pagamento em, pelo menos, em onze meses, como considerado no Acórdão STJ a que antes nos referimos.

E, sendo desse modo, serão também devidas as referidas prestações, nos termos que afirmámos antes, no período de férias dos Autores, pois que, como aí dito, a retribuição a pagar pelo período de férias deve equivaler à que o trabalhador normalmente deveria auferir na totalidade, sendo que, como já visto, aquelas prestações deveriam ter sido também pagas.

Restando, por último, verificar se devem ou não integrar tais prestações o subsídio de férias, chamando mais uma vez à aplicação os critérios também antes enunciados, apenas sabemos que estamos perante designados prémios, respetivamente, de “qualidade” (10%) e de “produtividade” (20%) calculados obre a remuneração base ilíquida, sendo que, não obstante serem devidos os seus pagamentos pelas razões que antes mencionámos, ou seja, por ser de imputar à Ré / recorrente a culpa pela não definição atempada dos critérios de que de acordo com os contratos / adendas dependeria a sua atribuição, tal circunstância, com salvaguarda do respeito devido por diverso entendimento, não nos permite dizer, como se imporia para que devam ser pagos no subsídio de férias, que estejamos perante prestações que se reportem à própria prestação do trabalho em si mesma, assim às específicas contingências que a rodeiam –ao seu condicionalismo externo (como sejam: penosidade, isolamento, toxicidade, trabalho suplementar, trabalho noturno, turnos rotativos) –, caindo antes, assim se nos afigura, naquelas prestações que pressupõem a efetiva prestação da atividade, no caso respeitantes ao próprio trabalhador e ao seu desempenho (prémios, gratificações, comissões, etc.).

Em face do exposto, procede o recurso apenas nesta parte.


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Por decorrência do antes decidido, não devendo, como dito, as analisadas prestações ser incluídas nos subsídios de férias, impõe-se, por essa razão, alterar a sentença nessa parte, pelo que, em conformidade, tendo por referência os períodos a que se atendeu na sentença, que se atenderão neste acórdão, até porque não questionados no recurso, efetuados os necessários cálculos:

- ao 1.º Autor é devido um montante global de €145.042,14 (e não o de €156.687,72, a que se chegou da sentença), decorrente do seguinte: entre janeiro de 2010 e abril de 2020, tendo por referência a retribuição mensal base ilíquida de €3.528,00, um total de €131.241,60 (€1058,4 x 124 meses); entre maio de 2020 e maio de 2021 (data de propositura da presente ação), tendo por referência a retribuição mensal base ilíquida de €3.538,58, um total de €13.800,54;

- à 2.ª Autora é devido um montante global de €145.042,14 (e não o de €156.687,72, a que se chegou da sentença), decorrente do seguinte: entre janeiro de 2010 e abril de 2020, tendo por referência a retribuição mensal base ilíquida de €3.528,00, um total de €131.241,60 (€1058,4 x 124 meses); entre maio de 2020 e maio de 2021 (data de propositura da presente ação), tendo por referência a retribuição mensal base ilíquida de €3.538,58, um total de €13.800,54.

- à 3.ª Autora é devido um montante global de €145.042,14 (e não o de €156.687,72, a que se chegou da sentença), decorrente do seguinte: entre janeiro de 2010 e abril de 2020, tendo por referência a retribuição mensal base ilíquida de €3.528,00, um total de €131.241,60 (€1058,4 x 124 meses); entre maio de 2020 e maio de 2021 (data de propositura da presente ação), tendo por referência a retribuição mensal base ilíquida de €3.538,58, um total de €13.800,54.


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No que se refere a custas, as da ação, bem como do presente recurso, impendem sobre Autoras / apeladas e Ré  / recorrente na proporção exata de vencimento/ decaimento (artigo 527.º do CPC).

Nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do CPC, segue-se o sumário do presente acórdão, da responsabilidade exclusiva do relator:

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IV - DECISÃO

Acordam os juízes que integram esta Secção social do Tribunal da Relação do Porto, improcedendo no mais, na sua procedência parcial quer na parte dirigida à impugnação da matéria de facto nos termos constantes do ponto 2.3. do presente acórdão, quer no âmbito da aplicação do direito, mantendo-se a sentença recorrida no mais, em essa alterar no que se refere às suas alíneas A), B) e C), que passarão a ter a redação seguinte:

A) Ao 1º Autor, AA, a quantia de €145.042,14 (cento e quarenta e cinco mil, quarenta e dois euros e catorze cêntimos), a título de prémios vencidos, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o dia seguinte ao da citação da Ré até efetivo e integral pagamento;

B) À 2ª Autora, BB, a quantia de €145.042,14 (cento e quarenta e cinco mil, quarenta e dois euros e catorze cêntimos), a título de prémios vencidos, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o dia seguinte ao da citação da Ré até efetivo e integral pagamento;

C) À 3ª Autora, CC, a quantia de €145.042,14 (cento e quarenta e cinco mil, quarenta e dois euros e catorze cêntimos), a título de prémios vencidos, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o dia seguinte ao da citação da Ré até efetivo e integral pagamento.

No que se refere às custas, da ação e do presente recurso, são da responsabilidade de Autoras e Ré, na proporção de vencimento/decaimento.


Porto, 19 de fevereiro de 2024

(acórdão assinado digitalmente)
Nelson Fernandes
Teresa Sá Lopes
Rita Romeira
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[1] Em que se dispõe: “É nula a sentença quando: a) Não contenha a assinatura do juiz; b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.”
[2] Cf. Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, pág. 92/93
[3] processo 1204/12.9TVLSB.L1.S1, acessível em www.dgsi.pt.
[4] No mesmo sentido o acórdão do mesmo Supremo Tribunal de 3 de Outubro de 2017, processo 2200/10.6TVLSB.P1.S1, ainda acessível em www.dgsi.pt.
[5] Código de Processo Civil Anotado, 5º, pág. 143.
[6] processo 2350/17.8T8PRT.P1.S2, acessível em www.dgsi.pt
[7] Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, Coimbra, 2013, p. 221/222
[8] Relatora Conselheira Ana Resende – Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 12/2023, Processo n.º 8344/17.6T8STB.E1-A.S1 (Recurso para Uniformização de Jurisprudência), publicado no Diário da República n.º 220/2023, Série I de 2023-11-14, páginas 44 - 65
[9] Cf. neste sentido o Ac. STJ de 24/09/2013, in www.dgsi.pt
[10] artigo 607.º, nº 5 do CPC
[11] Cf. Ac. STJ de 28 de Maio de 2009, in www.dgsi.pt
[12] Relator Conselheiro Gonçalves Rocha, também em www.dgsi.pt.
[13] CPC ANOTADO, III, pág. 212
[14] Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora Lda, 1993, pág.194.
[15] Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, Almedina, Coimbra – 1982; pág. 268
[16] Relator Conselheiro Melo Lima, in www.dgsi.pt.
[17] em “Introdução ao Processo Civil, 3.ª edição, p. 196
[18] “Compreende-se como este princípio se situa na linha lógica dos anteriores: é porque há imediação, oralidade e concentração que ao julgador cabe, depois da prova produzida, tirar as suas conclusões, em conformidade com as impressões recém colhidas e com a convicção que através delas se foi gerando no seu espírito, de acordo com as máximas da experiência que forem aplicáveis”.
[19] cf. neste sentido o Ac. STJ de 24/09/2013, in www.dgsi.pt
[20] cf. Ac. STJ de 28 de Maio de 2009, in www.dgsi.pt
[21] Referimo-nos às referências que se fazem, nomeadamente: quando se alude à interpelação do tribunal ao Colégio da Especialidade e o que teria resultado / fls. 474 dos autos; ao que se diz resultar da fundamentação de facto, dizendo-se a Ré já possuir em 2009, noutros serviços, aplicações informáticas que permitiam avaliar os médicos e o serviço, sendo que foi o Conselho de Administração quem recusou a transferência das mesmas para o serviço de cuidados intermédios; que também resultou da prova produzida que existem critérios de cada unidade/serviço e que estes têm de ser enviados anualmente pelo R. ao Colégio da Ordem dos Médicos, por causa dos internatos, e que poderiam ter sido utilizados para este efeito contratual; ao que afirmou ou não “o Director Clínico” à data da abertura do Serviço.
[22] Tendo por base apenas o que resulta da factualidade provada após a nossa intervenção´ no recurso, designadamente o teor dos contratos / adendas, não assumindo neste âmbito qualquer relevância a circunstância de se terem excluído as alíneas UU), BBB) e CCC)
[23] Relator Conselheiro Pinto Hespanhol, in www.dgsi.pt.
[24] Vide, Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, págs. 440-441
[25] Cf. Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, pág. 439.
[26] Neste sentido, Monteiro Fernandes, ob. cit., pág. 449; Bernardo Lobo Xavier in Curso de Direito do Trabalho, 2.ª ed., pág. 382
[27] Proferido no Processo 4156/10.6TTLSB.L1.S1 – publicado no DR 1ª série, de 29.10.2015.
[28] Artigos 186.º do CPT e 686.º, n.º 1, do CPC.
[29] Apesar de se reportar à interpretação de cláusula constante de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que não é aplicável ao caso dos autos, afigura-se-nos, face ao valor reforçado desse Acórdão e à uniformização de jurisprudência que dele decorre e à similitude de situações a demandar tratamento análogo, que não poderá deixar de ser aplicada no caso a doutrina que decorre da interpretação sufragada em tal aresto pois que, tal como no caso, o que aí estava em causa era afinal a mesma questão jurídica, qual seja a interpretação do conceito de retribuição previsto na lei geral, conceito este que tem natureza indeterminada e sendo as considerações nele tecidas transponíveis para o caso.
[30] Esta Secção do Tribunal da Relação do Porto tem seguido de modo uniforme o entendimento sufragado no citado Acórdão.
[31] Cfr artigo 263.º, do Código do Trabalho de 2009 (CT).
[32] Cfr. artigos 237.º, n.ºs 1, 2 e 3, 238.º, n.ºs 1 e 5, e 240.º, do CT.
[33] Cfr. artigos 241.º e 242.º do CT.
[34] Cfr. artigos 243.º e 244.º, do CT.
[35] Alíneas a) e b) do seu n.º 1.
[36] Relator Jerónimo Freitas, com intervenção como adjunto do aqui relator, disponível em www.dgsi.pt.
[37] Artigo 264.º, do CT/2009 (artigo 255.º, do CT de 2003).
[38] Nos termos anteriormente por nós já analisados, integrando pois a mesma não só a remuneração de base como ainda outras prestações regulares e periódicas, feitas direta ou indiretamente (artigos 249.º, do CT de 2003 e 258.º, do CT de 2009), presumindo-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador (n.º 3, do artigo 258.º, do C.T.)
[39] Sendo esta constituída por uma parte certa e outra variável - artigo 261.º, do CT de 2009 (artigos 251.º e 252.º, do CT de 2003).
[40] Esta definida na alínea a) do n.º 2 do artigo 250.º
[41] Cfr. Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 13.ª edição, Almedina, pág. 418.
[42] Sónia Kietzmann Lopes, A retribuição e outras atribuições patrimoniais, in RETRIBUIÇÃO E OUTRAS ATRIBUIÇÕES PATRIMONIAIS, e-book do CEJ, Maio de 2013, pp. 24 e 25. Ai se refere, ainda, citando que “em relação a certas prestações retributivas, como a retribuição por trabalho suplementar, o subsídio de turno, o acréscimo devido pelo trabalho nocturno, o subsídio de risco ou de isolamento, podemos afirmar, com alguma segurança, que são contrapartida do modo específico da execução do trabalho. Já o mesmo não parece suceder com as comissões, os prémios, as gratificações e alguns subsídios.”
[43] Direito do Trabalho, 2010, pág. 632.