Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | RITA ROMEIRA | ||
Descritores: | QUESTÕES NOVAS INTRODUZIDAS NO RECURSO CASO JULGADO AUTORIDADE DO CASO JULGADO | ||
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Nº do Documento: | RP202310096263/18.8T8PRT.P1 | ||
Data do Acordão: | 10/09/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A SENTENÇA | ||
Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO (SOCIAL) | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - Os recursos, como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, em termos gerais, apenas, podem ter como objecto questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o Tribunal “ad quem” com questões novas, salvo aquelas que são de conhecimento oficioso. II – Ou seja, os recursos não visam criar e emitir decisões novas sobre questões novas (excepto se forem de conhecimento oficioso), mas impugnar, reapreciar e, eventualmente, modificar as decisões do Tribunal recorrido, sobre os pontos questionados e “dentro dos mesmos pressupostos em que se encontrava o Tribunal “a quo” no momento em que a proferiu. III - O caso julgado material cobre a decisão proferida sobre o fundo de mérito da causa e tem força obrigatória não só dentro do próprio processo em que a decisão é proferida, mas também fora dele. IV - O caso julgado exerce duas funções, uma positiva e outra negativa. Exerce a primeira quando faz valer a sua força e autoridade. Exerce a segunda através da excepção de caso julgado. V – Através da autoridade do caso julgado visa-se evitar que o órgão jurisdicional, duplicando as decisões sobre idêntico objecto processual, contrarie na decisão posterior, o conteúdo da decisão anterior. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo nº 6263/18.8T8PRT.P1 Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto - Juiz 1 Recorrente: A..., S.A. Recorrida: AA Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO A A., AA, víuva, NIF ..., residente na Rua ..., ..., 6º - Centro, ... Porto, intentou acção declarativa de condenação emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, contra A..., S.A., NIPC ..., com sede na Av. ..., ... Lisboa, pedindo que, “deve ser julgada provada e procedente a presente acção e, consequentemente: A) Ser declarado que assiste à A. o direito de receber o complemento de pensão de sobrevivência. B) Ser a R. condenada a pagar à A. a quantia mensal de € 1.785,23, a título vitalício e de complemento da pensão de sobrevivência, valor este a pagar 14 vezes por ano; C) Ser a R. condenada a pagar à A. a quantia de € 24.993,25 acrescida de juros no montante de € 360,57, a título de valores de complemento de pensão de sobrevivência já vencidos; D) Ser a R. condenada a pagar à A. os juros de mora sobre cada uma das retribuições mensais referidas em A) que venham a vencer-se após a data de apresentação da presente acção, calculados à taxa legal supletiva desde a data dos respectivos vencimentos até integral pagamento.”. Fundamenta o seu pedido alegando, em síntese, ter sido casada com BB, o qual faleceu no dia 25/Março/2017 e que exerceu funções para a aqui demandada até à data do seu óbito, detendo a categoria profissional de Consultor Sénior 4, auferindo ultimamente a título de retribuição a quantia mensal, total e ilíquida de € 4.763,09, decomposta em remuneração base, isenção de horário de trabalho, diuturnidades, B... e VV desconto e complemento de responsabilidade, pugnando a demandante no sentido de que todas estas parcelas deverão ser consideradas como remuneração mensal então auferida pelo cônjuge, entretanto falecido, da aqui A. Mais, alega que, em face de alterações introduzidas unilateralmente pela R. no valor do seu salário, o cônjuge da A. intentou acção contra a ora R., que seguiu os seus termos no J3 deste mesmo Tribunal sob o nº 9109/16.8T8PRT, a qual, entretanto e por força do seu óbito, prosseguiu com a habilitação da aqui demandante e dos seus filhos e na qual se peticiona o reconhecimento daquele montante remuneratório. Invoca ainda a A. que, por força do disposto no AE aqui aplicável, ao valor da pensão de sobrevivência liquidado pela Segurança Social auferido pela mesma, enquanto viúva do trabalhador por conta da R., acresce um complemento calculado da forma ali consignada, equivalente ao remanescente entre o valor liquidado pelos serviços sociais competentes e 80% do valor devido a título de pensão de reforma ao de cujus, o que se traduz no valor de € 1.785,25, que a R. deveria acrescer mensalmente e de forma vitalícia à aqui A., e que nunca lhe foi pago pela mesma. Indica como valor da acção € 30.000,01 (trinta mil e um). * Realizada a audiência de partes sem acordo, conforme consta da acta datada de 26.04.2018, foi a R. notificada para contestar, o que fez, por excepção e impugnação, alegando, em síntese, que o valor do complemento de pensão de sobrevivência é apurado tendo em conta o valor do adicional que resultou ou resultaria do valor do complemento de reforma, caso o trabalhador se tivesse reformado por velhice na data do falecimento, assim, como a A. não indica qual o valor do complemento de reforma que o seu cônjuge deveria ter auferido, não é possível calcular o complemento de pensão de sobrevivência que aqui peticiona.Ora, para se calcular o valor do complemento de reforma ter-se-ia de atender ao valor base de referência em que a Segurança Social se basearia para proceder a este cálculo, só apurado o valor da pensão estatutária se determinaria o valor do complemento de reforma e com base neste o valor reclamado na presente lide pela A. Conclui que, “deve a exceção invocada ser julgada procedente e a Ré ser, de imediato, absolvida dos pedidos ou quando assim se não entenda, ser a ação julgada improcedente e não provada e a Ré absolvida de todos os pedidos, com as demais consequências legais.”. * A A. veio responder, reiterando que ao contrário do referido pela R., acrescerá sempre o complemento de pensão de sobrevivência à pensão de sobrevivência fixada pela Segurança Social, nos termos do fixado no ponto 2. do ponto I (Princípio Geral) do Anexo VIII do Acordo de Colectivo celebrado entre a C..., S.A. e outras e o SINDETELCO – Sindicato Democrático dos Trabalhadores das Comunicações e dos Média e outros, publicado no BTE n.º 22, de 15/06/2008, com a revisão global publicada no BTE nº 41, de 8/11/2016, que ressalvou que se mantinha em vigor o referido Anexo VIII (designadamente nos arts. 103º, 104º e Anexo IX, al. b)).Mais, defende que da leitura do ponto 2. do ponto I (Princípio Geral) do Anexo VIII do Acordo de Colectivo transcrito pela R. no artigo 4º da sua Contestação, não resulta que as percentagens do regime de pensões de sobrevivência se aplicam sobre o valor do complemento de reforma. De tal artigo apenas resulta que, nos casos da pensão de sobrevivência, se aplicam as mesmas percentagens que se aplicam nos casos em que o trabalhador se reformou por velhice ou invalidez. Termina que “deve improceder a defesa da R., concluindo-se como na Petição Inicial.”. * Após a realização das diligências tidas por convenientes, oportunamente, foi fixado como valor da presente acção o indicado na petição inicial, proferido saneador tabelar e dispensada a selecção da base instrutória, dado a matéria de facto alegada pelas partes nos seus articulados não se revestir de particular complexidade.* Em sede de audiência de julgamento, nos termos documentados na acta de 20.01.2022, a Mª Juíza “a quo” proferiu: “defere-se a suspensão da instância pelo período de 10 dias e tornando-se dispensável a realização da presente diligência por terem sido prescindidos os meios de prova aqui a apresentar, determinou que findo aquele prazo se não tiver sido apresentado o acordo entre as partes, fosse aberta conclusão para elaboração da decisão de mérito”. Oportunamente, foram os autos conclusos e proferida sentença que terminou com a seguinte DECISÃO: “Tudo visto e nos termos expostos, julga-se a presente acção parcialmente procedente por provada e em consequência declara-se que a A. tem direito a complemento de pensão de sobrevivência fixada no montante ilíquido de € 261,04/mês (duzentos e sessenta e um euros e quatro cêntimos), desde Abril de 2017, montante esse que calculado até à presente data à razão de 14 vezes por ano (já que integra o subsídio de férias e o subsídio de Natal), condenando-se a R. a pagar à A. o montante total de € 18.272.80 (dezoito mil duzentos e setenta e dois euros e oitenta cêntimos), acrescido dos respectivos juros de mora vencidos à taxa legal desde a citação e dos vincendos até integral pagamento. Custas por ambas as partes na proporção do respectivo decaimento. Registe e notifique.”. * Inconformada com esta, a R. apresentou recurso, nos termos das alegações juntas, que finalizou com as seguintes “CONCLUSÕES1. A Douta Decisão em crise, salvo melhor, não é totalmente conforme à lei e ao direito. 2. Incluindo até, na matéria de facto, realidades que não consubstanciam verdadeiro conteúdo fático, antes veicularem juízos conclusivos ou subjetivamente valorativos, como é o caso da expressão, sem referência numérica ou alfa numérica: Tendo o último vencimento mensal ilíquido do marido da A. o valor de (pelo menos) € 4.763,09, 80% desse valor corresponde a €3.810,47. 3. Que por isso deverá ser expurgada dos factos assentes, pois além de encerrar um verdadeiro juízo conclusivo, in casu, até antecipa a resposta à questão de fundo, como constitui entendimento jurisprudencial. 4. Acresce ter a Decisão em crise considerado, para efeitos do apuramento do montante do complemento de reforma que seria devido ao marido da Demandante, que no último vencimento ilíquido do mesmo se compreende, além da sua remuneração base e diuturnidades, também o valor do Subsídio de Isenção de Horário de Trabalho, do Complemento de Responsabilidade e do “Desconto B... e VV”. 5. Aliás, quanto a esta rúbrica, a Decisão nem atentou que se tratava de um Desconto, como se colhe do respectivo recibo de vencimento. 6. Acontece que a Sentença em apreço, desvirtuou por completo, a interpretação do conceito de retribuição constante, por exemplo, do nº 2, da cláusula 58ª do AE de 1995 (publicado no BTE nº 3, de 22 de janeiro de 1995, “… a retribuição mensal do trabalhador compreende as diuturnidades e os abonos com carácter regular e periódico que expressamente se determine como integrante daquela retribuição.” 7. E cujo teor se manteve inalterado nas normas constantes dos IRCT´s publicados em 1996 e seguintes, que estipularam, tal como os anteriores, que embora se integrem na retribuição mensal, os abonos percebidos com regularidade e periodicidade, consignou-se, sem margem para dúvida, que só assim será se previsto de forma expressa. 8. Daí que, como dão nota os Acordãos supra citados, por nunca ter existido qualquer norma convencional que determinasse, de forma expressa, que abonos percebidos com caracter regular e periódico, faziam parte da retribuição, concluíram que remuneração para esse efeito, se circunscrevia a remuneração base e diuturnidades. 9. Tudo de acordo com a prevalência que o legislador de 2003 atribuiu às normas convencionais (exceto quando estivessem em causa normas imperativas). 10. De resto, o recente Acordão da Relação de Lisboa de 23 de fevereiro (que se desconhece se está publicado) confirmou a sentença proferida no âmbito do processo 15.883/19.2T8LSB, que decidiu que “…a compensação por isenção de horário de trabalho e o complemento de responsabilidade não fazem, assim, parte do «vencimento liquido» para efeitos do A.E. e, nomeadamente, para efeitos do cálculo do complemento de reforma…”. 11. Transpondo este entendimento para a situação em apreço, o último vencimento ilíquido do marido da Demandante era de 3.627,29€, resultante da soma de 3.424,57€, a titulo de remuneração base e de 202,72€, a título de diuturnidades. 12. Considerando que o valor máximo do seu complemento de reforma corresponderia a 80% dessa sua última remuneração ilíquida, ou seja, a 2.901,83€ (3.627,29€x80%), nada lhe seria devido a titulo de complemento de reforma, em virtude do montante da sua reforma - 3.375,40€ - ser superior ao valor do complemento que lhe era contratualmente devido. 13. Como o complemento de pensão sobrevivência corresponde a 60% do montante do complemento de reforma, nada é devido à Demandante, uma vez que ao seu marido também nada seria devido a título de complemento de reforma. 14. Resulta deste modo manifesto que a Douta Decisão proferida é, merecedora de objetiva censura, por ter infringido o disposto no artigo 258º, do Cód. do Trabalho, devendo, por isso, ser revogada e substituída por outra que dando provimento ao presente recurso, julgue a ação improcedente e absolva a Ré de todos os pedidos, doutra forma não se fará rigorosa aplicação da lei e haverá fundado motivo para se afirmar não ter sido feita J U S T I Ç A !”. * A A., respondeu nos termos das contra-alegações juntas, que finalizou com as seguintes “CONCLUSÕES:1) O recurso apresentado foca-se em uma única questão: a de saber qual o valor do vencimento mensal ilíquido do marido da ora recorrida para efeitos de cálculo do complemento da pensão de sobrevivência a pagar pela recorrente à recorrida. 2) Sucede que a questão de saber qual o valor do último vencimento mensal ilíquido do marido da ora recorrida nunca esteve em estudo nos presentes autos uma vez que correu termos contra a recorrida o processo 9109/16.8T8PRT, no qual foi proferida decisão de acordo com a qual o seu vencimento mensal ilíquido é constituído pelas seguintes “parcelas”: - “Remuneração-base”; - “Isenção de horário de trabalho”; - “Diuturnidades Empresa”; - “B... e VV - Desconto”; e, - “Complemento de Responsabilidade”. 3) Por ter resultado provado naqueles autos que tais “parcelas” se tratavam de prestações regulares e periódicas, que foram pagas durante anos e anos, em contrapartida da actividade prestada pelo marido da recorrida. 4) Daí que a sentença ora recorrida tenha tido em consideração como vencimento mensal ilíquido do marido da recorrida o valor de € 4.763,09, correspondente ao seguinte: - “Remuneração-base” no valor de € 3.424,57; - “Isenção de horário de trabalho” no valor de € 765,80, correspondente a cerca de 21% da “Remuneração-base” e “Diuturnidades”; - “Diuturnidades Empresa” no valor de € 202,72; - “B... e VV - Desconto” no valor médio de € 300,00; - “Complemento de Responsabilidade” no valor de € 70,00. 5) Motivo pelo qual o tribunal de 1ª instância não tinha outra hipótese se não considerar, para efeitos de cálculo neste processo, como parte do vencimento mensal ilíquido do marida da recorrida, a totalidade das parcelas atrás referidas. 6) Pelo que, tudo o demais referido pela recorrente nas suas alegações relativamente às convenções colectivas aplicáveis - que em alguns casos poderiam eventualmente excluir para efeitos de cálculo do complemento de pensão de sobrevivência outras prestações pagas ao trabalhador para além da remuneração base -, não se aplica ao caso em concreto! 7) Assim, a condenação no âmbito da sentença recorrida resumiu-se à realização de meros cálculos aritméticos, cuja “fórmula”, baseada na lei, não é colocada em questão pela ora recorrente, pelo que o valor do complemento de pensão de sobrevivência devido à recorrida será inquestionavelmente de € 261,04 mensais. 8) Deve assim, em consequência, manter-se na íntegra a sentença recorrida. Termos em que e nos mais que Vossas Excelências doutamente se dignarem suprir dentro do Vosso Mais Alto Saber e Critério, deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se a decisão proferida pelo tribunal de primeira instância. Assim se fará JUSTIÇA.”. * Admitido o recurso como apelação e com efeito meramente devolutivo foi ordenada a subida dos autos a esta Relação.* O Ex.mo Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, nos termos do art. 87º nº 3, do CPT, no sentido de que deverá ser mantida parcialmente a sentença recorrida e provido parcialmente o recurso, com os seguintes argumentos: “Do que se depreende das conclusões formuladas, afigura-se-nos que não assiste razão à recorrente no modo como impugna a sentença sub iudice, salvo no que diz respeito à impugnação da matéria de facto, devendo tal ponto ser eliminado por se integrar matéria de direito que constitui o “thema decidendum” - cfr. Ac. deste TRP. de 13-03-2013 e TRLX. de 18-11-2021. No mais, atento o objecto dos presentes autos, considerando a douta sentença, nenhum outro reparo ou censura há que lhe ser feito, a qual, deverá ser integralmente confirmada, ante o rigor e a justeza argumentativa nela expresso. Com efeito, a Mma. Juíza “a quo” em função dos factos dados como provados, fez deles correcta subsunção ao direito aplicável, por revelador do “iter” tomado para a decisão que foi proferida a final, sem divergência que haja de ser conhecida e o que afasta que qualquer vício ou erro de julgamento de direito em matéria de direito. O tribunal “a quo” utilizou argumentos de carácter teleológico, que orientaram a sua tarefa interpretativa, com aplicação devida de critério legalmente previsto para deferir parcialmente a pretensão da recorrida e na esteira anterior decisão deste TRP. Em processo em que foi autor o marido da aqui recorrida. Resulta da factualidade apurada, que as prestações em causa foram recebidas pelo então marido da recorrida com regularidade e periodicidade, constituindo retribuição, que tinha uma componente mensal certa e fixa, a par de quatro outras prestações. Haverá aqui que atender ao que foi decidido no invocado Proc. Nº. 9109/16.8T8PRT.P1, com respeito pela autoridade do caso julgado que nele haja sido formado - cfr. Ac. deste TRP. de 11-10-2018. Daí que seja notório que a argumentação da alegação da recorrente não possa subsistir em confronto com a criteriosa fundamentação doutamente expendida na decisão sob recurso.Como tal, a ilustre julgadora “a quo” estava habilitada a pronunciar-se sobre o mérito da causa no modo como decidiu. Procedem, pois, as conclusões formuladas sob os nº.s 2 e 3.”. Notificadas deste, apenas a R. veio pronunciar-se, dizendo o seguinte: “1. No seu Douto Parecer, sustenta o Senhor Procurador Geral Adjunto que deve ser respeitada a decisão proferida no âmbito do proc. nº 9109/16.8T8PRT.P1, que qualificou como retribuição as prestações recebidas pelo marido da Autora a titulo de IHT e de Complemento de Responsabilidade. 2. Não poderíamos estar mais de acordo. 3. Sucede, porém, que objecto da questão não é esse e daí o presente reparo. 4. Com efeito, o que está em causa é pura e simplesmente saber se para efeitos do apuramento do valor de complemento de reforma, apenas se atende à retribuição (base) ou também ao valor do IHT e do Complemento de Responsabilidade. 5. Dado como sublinha, e bem, a Senhora Desembargadora Paula Leal de Carvalho, no recentíssimo Acordão de 12 do corrente “… uma coisa é a retribuição base e, outra diferente, os complementos que tendo embora natureza retributiva, mas uma outra causa específica de atribuição, integram a retribuição em sentido amplo, mas já não a retribuição base, esta correspondente ao período normal de trabalho”. 6. No caso dos autos a situação é clara e cristalina, uma vez que tendo o marido da Autora passado à reforma, na situação de activo, último vencimento mensal ilíquido segundo a norma convencional, só pode corresponder ao valor da respectiva retribuição base e a nada mais. 7. Dado não ser de convocar a jurisprudência desta Relação a propósito do complemento de reforma, uma vez que todas, sublinha-se, todas as Decisões proferidas versaram a situação de trabalhadores que, no momento que precedeu a reforma, se encontravam na situação de pré-reforma. 8. Momento em que não auferiam retribuição, mas uma prestação de pré-reforma, questão que não releva para estes autos mas que certamente o Supremo Tribunal de Justiça irá esclarecer, dada a prolação do Acordão da Formação de 8 de junho de 2021, proferido no âmbito do processo 4067/17.4T8VNG.P2-A.S1.” * Cumpridos os vistos, há que apreciar e decidir.* É sabido que, salvo as matérias de conhecimento oficioso, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, não sendo lícito a este Tribunal “ad quem” conhecer de matérias nelas não incluídas (cfr. art.s 635º, nº 4, 639º, nº 1 e 608º nº 2, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável “ex vi” do art. 1º, nº 2, al. a), do CPT aprovado pelo DL 295/2009, de 13.10).Assim, as questões suscitadas e a apreciar consistem em saber: - Se o item da matéria de facto (Tendo o último vencimento mensal ilíquido do marido da A. o valor de (pelo menos) € 4.763,09, 80% desse valor corresponde a € 3.810,47) deve ser eliminado por conter a solução de direito ora em discussão nos presentes autos. - O que deve entender-se por “último vencimento ilíquido do trabalhador” para efeitos de cálculo do complemento de pensão de sobrevivência. - Se a decisão proferida no processo 9109/16.8T8PRT.P2.S1 se impõe pela autoridade do caso julgado. * II – FUNDAMENTAÇÃOA) OS FACTOS: A 1ª instância considerou, os seguintes factos como provados: “- A A. é viúva de BB, o qual faleceu no dia 25/Março/2017. - À data da morte do marido da A., entre este e a R., vigorava um contrato de trabalho, o qual foi celebrado - e teve início – em 01/Fevereiro/1979 com a D... (D...), a que sucedeu a E..., S.A. e depois a A... S.A., sendo que o mesmo contrato vigorou até 25/Março/2017, data da morte do mesmo. - A R. dedica-se, nomeadamente, à concepção, construção, gestão, exploração e construção de redes e infra-estruturas de comunicações electrónicas, à prestação de serviços de comunicações electrónicas, de transporte e difusão de sinal de telecomunicações de difusão e actividade de televisão, e o cônjuge da A. era licenciado em engenharia eletrotécnica. - À data da cessação do contrato celebrado entre o marido da A. e a R. (25/Março/2017), o marido da A. tinha a categoria de “Consultor Sénior 4”, sendo que teve inicialmente a Categoria de “Técnico Superior Licenciado”. - O marido da A. sempre executou as funções acima referidas por conta, sob as ordens, instruções e direcção da R., por exemplo, quanto a projectos e tarefas a executar, clientes da R. e prazos, salvaguardada a autonomia técnica. - Nos termos acordados entre o marido da A. e a R., o local de trabalho deste sempre foi fixo nas instalações da R. no Porto. Os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pelo marido da A. sempre foram pertença da R., entre outros, computador, papel, impressora, tinteiros, telemóvel, etc. Relativamente ao tempo e horário de trabalho era o que resulta da lei, sendo que qualquer alteração de horário teria de merecer o acordo prévio do marido da A. e que o marido da A. sempre prestou trabalho desde o início do seu contrato até à cessação do mesmo, para além dos limites legais de acordo com as necessidades de trabalho e ordens da R.. - À data da sua morte, em contrapartida da actividade prestada pelo marido da A. à R., nos termos acordados entre este e a R., este tinha direito a várias prestações a título de retribuição. - Pelo menos a partir de cerca de 1995, a título de retribuição, o marido da A. auferia uma quantia mensal certa e fixa, que, única e exclusivamente por conveniência e imposição da R., para efeitos de contabilidade da R., nomeadamente recibos de vencimento, surgia decomposta em quatro prestações: “Remuneração-base”, “Isenção de horário de trabalho”, “Diuturnidades Empresa”, “B... e VV - Desconto” (esta última prestação era inicialmente paga em senhas de gasolina e contra entrega de recibo de portagens) e “Complemento de Responsabilidade”. - O valor dessas prestações foi aumentando, sendo que, à data da morte do marido da A., o valor global mensal dessas prestações era de € 4.763,09, correspondente ao somatório do seguinte: a) “Remuneração-base” no valor de € 3.424,57; b) “Isenção de horário de trabalho” no valor de € 765,80, correspondente a cerca de 21% da “Remuneração-base” e “Diuturnidades”; c) “Diuturnidades Empresa” no valor de € 202,72; d) “B... e VV - Desconto” no valor médio de € 300,00; e) “Complemento de Responsabilidade” no valor de € 70,00. - Quanto à prestação designada por “isenção de horário de trabalho”, que foi paga pelo menos desde Novembro/1994 até Fevereiro/2016, mensalmente, 12 vezes por ano, não decorria de nenhum regime de tempo ou horário de trabalho específicos, sendo que tanto antes do marido da A. passar a auferir esta quantia como depois de tal quantia lhe ter deixado de ser paga, o tempo e horário de trabalho do marido da A. não sofreram alterações nem corresponderam a nenhuma alteração de funções, mas, sim, conforme foi transmitido pela R. ao marido da A., quando tal quantia lhe passou a ser paga, a atribuição dessa quantia consistiu num aumento salarial, há mais de 20 anos, mas que por conveniência da R. teve esse tratamento. - Em suma, todas as prestações atrás referidas são prestações às quais o marido da A. tinha direito em contrapartida do seu trabalho, sem que haja qualquer outra causa para as mesmas, estando em causa prestações regulares e periódicas, permanentes e estáveis, feitas directamente em dinheiro. - O marido da A. intentou uma acção judicial contra a R. que correu os seus termos sob o nº 9109/16.8T8PRT, no J3 deste Juízo de Trabalho, cuja decisão final proferida pelo STJ corresponde ao teor do documento junto aos autos com o requerimento refª 29250221, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido. - O contrato celebrado entre o marido da A. e a R. vigorou durante 38 anos (desde 01/Fevereiro/1979 até 25/Março/2017), pelo que a percentagem a ter em consideração será o limite máximo de 80% (38 x 2,2 = 83,60%). - Tendo o último vencimento mensal ilíquido do marido da A. o valor de (pelo menos) € 4.763,09, 80% desse valor corresponde a € 3.810,47. (Eliminado). - A pensão de sobrevivência fixada pela Segurança Social à A. tem o valor ilíquido de € 2.025,24. - Tal complemento de pensão de sobrevivência não foi pago até ao momento pela R. à A.”. * B) - O DIREITOAtravés do presente recurso, insurge-se a recorrente, contra a decisão recorrida, pretendendo a sua substituição por outra que a absolva de todos os pedidos e julgue a acção improcedente. Que deva ser desse modo, discordam a recorrida e o Ex.mo Procurador. Analisemos, então. Comecemos, por analisar se deve ser eliminado o item da decisão de facto - “Tendo o último vencimento mensal ilíquido do marido da A. o valor de (pelo menos) € 4.763,09, 80% desse valor corresponde a € 3.810,47)”. Ora, desde logo, há que dizer que, quaisquer considerações a este propósito importa, antes de tudo que se atenda à seguinte matéria de facto (não impugnada): “O valor dessas prestações foi aumentando, sendo que, à data da morte do marido da A., o valor global mensal dessas prestações era de € 4.763,09, correspondente ao somatório do seguinte: a) “Remuneração-base” no valor de € 3.424,57; b) “Isenção de horário de trabalho” no valor de € 765,80, correspondente a cerca de 21% da “Remuneração-base” e “Diuturnidades”; c) “Diuturnidades Empresa” no valor de € 202,72; d) “B... e VV - Desconto” no valor médio de € 300,00; e) “Complemento de Responsabilidade” no valor de € 70,00.”. E, analisando, consideramos que aquele item (objeto de impugnação pela Ré) é a repetição do que ficou dado como assente no item que acabamos de transcrever e que não foi objeto de impugnação por parte da Ré. Apenas, com uma pequena diferença. No item impugnado, o Tribunal “a quo” acrescentou o termo “Ilíquido”, o que se nos afigura de todo desnecessário por, no caso, estarmos a discutir o que deve integrar o vencimento ilíquido, o que resulta daquele referido item «O valor dessas prestações foi aumentando, sendo que, à data da morte do marido da A., o valor global mensal dessas prestações era de € 4.763,09, correspondente ao somatório do seguinte: a) “Remuneração-base” no valor de € 3.424,57; b) “Isenção de horário de trabalho” no valor de € 765,80, correspondente a cerca de 21% da “Remuneração-base” e “Diuturnidades”; c) “Diuturnidades Empresa” no valor de € 202,72; d) “B... e VV - Desconto” no valor médio de € 300,00; e) “Complemento de Responsabilidade” no valor de € 70,00», sendo que a parte final desse item (o impugnado pela Ré) se traduz, tão só, numa operação aritmética, resultante do determinado no AE. Face a isso, sem necessidade de outras considerações, elimina-se o item “Tendo o último vencimento mensal ilíquido do marido da A. o valor de (pelo menos) € 4.763,09, 80% desse valor corresponde a € 3.810,47)”. * Passemos, agora, à questão de saber o que deve entender-se por “último vencimento ilíquido do trabalhador” para efeitos de cálculo do complemento de pensão de sobrevivência A norma convencional que regula a atribuição do complemento de reforma (No Anexo VIII “Regime previsto no capítulo XI do AE”, publicado no BTE, 1ª série, nº 22, de 15 de Junho de 2008) sob a epígrafe, “I — Princípio geral”, determina o seguinte: “A C..., S. A., e os trabalhadores dos ex- -D... ao seu serviço contribuirão para a respectiva Caixa de Previdência, nos termos legais. 1 — Complemento de pensões de reforma. — A empresa concederá complementos para as pensões de reforma por velhice ou invalidez, nos termos seguintes: 1.1 — O adicional suportado pela empresa será igual à diferença entre (2,2 × A) % até ao limite de 80 % do seu último vencimento mensal ilíquido à data da cessação da actividade profissional na empresa e a pensão atribuída pela Caixa de Previdência do Pessoal dos D... (Caixa de Previdência) à data da reforma, sendo A o número de anos de serviço (tempo de serviço). (…) 2 — Complemento de pensões de sobrevivência. — Nos casos em que haja lugar a pagamento de pensão de sobrevivência pela Caixa de Previdência, a empresa complementará esta pensão, aplicando as percentagens do regime de pensões de sobrevivência ao adicional que resultou ou resultaria da aplicação do que se estipula no n.º 1 se o trabalhador se tivesse reformado por velhice ou invalidez na data do falecimento. (…)”. Por outro lado, o nº2 da clª 58ª do AE de 1995, publicado no BTE nº3, de 22.01.1995 preceitua que, “… a retribuição mensal do trabalhador compreende as diuturnidades e os abonos com carácter regular e periódico que expressamente se determine como integrante daquela retribuição.”. A Ré defende, no presente recurso, que do teor da referida cláusula (que não sofreu alterações nos sucessivos AE) resulta que o vencimento ilíquido a atender, para efeitos do cálculo do complemento de pensão de sobrevivência, será o constituído pela retribuição base e diuturnidades, posto que os sucessivos AE não consagraram expressamente que as outras prestações/abonos, que são atribuídas pelo AE ao trabalhador (para além da retribuição base e diuturnidades), são parte integrante da sua retribuição. Contudo, como se verifica, só agora, em sede de recurso, apresentou tais fundamentos. Na verdade, a Ré nunca, antes, colocou, na presente acção, à apreciação do Tribunal, a questão da interpretação da expressão “ultimo vencimento ilíquido do trabalhador” para efeitos de cálculo do complemento de pensão de sobrevivência, conjugado com o teor no nº2 da clª58ª do AE. Na presente acção a questão de saber se as prestações complementares auferidas pelo trabalhador, marido da Autora, faziam parte da sua retribuição stricto sensu (e como tal não poderiam ser suprimidas pela Ré) foi analisada à luz do CT/2003 e CT/2009, sem nunca ter sido suscitada a questão da aplicação das disposições constantes dos sucessivos AE. Como sabemos, os recursos não se destinam a apreciar “novas” questões mas antes a reapreciar as questões apreciadas pela 1ª instância, a não ser, as de conhecimento oficioso, o que não é o caso. Pois, o direito ao recurso não visa conceder à parte um segundo julgamento da causa, mas, apenas permitir a discussão sobre determinados pontos concretos, que na perspectiva do recorrente foram incorrectamente mal julgados, para tanto sendo necessário que alegue os fundamentos que sustentam esse entendimento, devendo os mesmos consistir na enunciação de verdadeiras questões de direito, que lhe compete indicar e sustentar, cujas respostas sejam susceptíveis de conduzir à alteração da decisão recorrida. Ou seja, o recorrente deve expor ao Tribunal “ad quem” as razões da sua discordância, procurando convencer da sua pertinência, a fim de que este Tribunal se debruce sobre elas e, analisando-as, decida se procedem ou não. O que, obviamente, não pode acontecer no caso, como já dissemos, porque o Tribunal “a quo” não se pronunciou quanto à questão agora trazida, nem tinha de o fazer porque não lhe foi colocada. E, como é sabido, os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais (cfr. art. 627º do CPC), através dos quais se visa reapreciar e modificar decisões já proferidas que incidam sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, e não criá‑las sobre matéria nova, não podendo confrontar-se o Tribunal ad quem com questões novas, salvo quanto às questões de conhecimento oficioso o que, como deixámos já dito, não é o caso. “Com efeito, em sede recursória o que se põe em causa e se pretende alterar é o teor da decisão recorrida e os fundamentos desta. A sua reapreciação e julgamento terão de ser feitos no seio do mesmo quadro fáctico e condicionalismo do qual emergiu a sentença proferida e posta em crise”, como se lê, no (Ac. do STJ de 17.11.2016, Proc. nº 861/13.3TTVIS.C1.S2 in www.dgsi.pt). Em suma, não tendo o Tribunal “a quo” sido confrontado com a questão, estamos perante uma questão nova e, por essa razão, não pode este Tribunal de recurso dela conhecer, como tem sido entendimento corrente da doutrina e da jurisprudência. Apenas, nos casos expressamente previstos, conforme art.s 665º nº 2 e 608º, nº 2, parte final, do CPC, pode este Tribunal “ad quem” substituir-se ao Tribunal que proferiu a decisão recorrida. Razão pela qual se nega a apreciação da questão acima enunciada. * Mas se assim não se entender cumpre, então, passar para a análise da última questão, ou seja, saber, se a decisão proferida no processo 9109/16.8T8PRT.P2.S1 se impõe pela autoridade do caso julgadoA respeito desta questão, dispõe sob a epígrafe, “Valor da sentença transitada em julgado” o art. 619º, nº 1 do CPC que, “Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580º e 581º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696º a 702º”. E, sobre a epígrafe “Alcance do caso julgado” determina o art. 621º do mesmo código, que, “A sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga…”. Como é sabido, o caso julgado só se forma, em princípio, sobre a decisão contida na sentença. É esse o ensinamento dos Professores (Manuel de Andrade in Noções Elementares de Processo Civil, pág. 318; Antunes Varela in Manual de Processo Civil, 1985, pág.s 714/715 e Anselmo de Castro in Direito Processual Civil Declaratório, vol. 3, pág. 392). No entanto, estes mesmos autores, ensinam que, aquele princípio não é absoluto, não é de excluir que se possa e deva recorrer à parte motivatória da sentença para interpretar a decisão, para reconstruir e fixar o seu verdadeiro conteúdo, conforme refere, (M. Andrade, na pág. e obra citadas) e (A. Varela, a pág 715, da obra citada), onde se lê. “Embora se aceite que a eficácia do caso julgado não se estende aos motivos da decisão, é ponto assente na doutrina que os fundamentos da sentença podem e devem ser utilizados para fixar o sentido e alcance da decisão contida na parte final da sentença, coberta pelo caso julgado”. Igual posição é sustentada por (Jacinto Bastos in notas ao CPC, pág.s 230/231), referindo “ser de concluir que embora as premissas de decisão não adquira, em regra, força de caso julgado, deve reconhecer-se-lhe essa natureza, quer quando a parte decisória a elas se referir de modo expresso, quer quando constituírem antecedente lógico, necessário e imprescindível, da decisão final”. E, também, por (Jorge Augusto Pais de Amaral, in Direito Processual Civil, 9ª ed., pág. 436), quando refere, “Crê-se que a posição predominante actual é favorável a uma mitigação do conceito de caso julgado no sentido de, considerando embora o caso julgado restrito à parte dispositiva do julgamento, alargar a sua força obrigatória à resolução das questões que a sentença tenha necessidade de resolver como premissa da conclusão formada” Igualmente, a jurisprudência tem acolhido tal posição, como decorre do (Ac. do STJ de 12.11.2015, Proc. 3681/12.9TTLSB.S1 in www.dgsi.pt), relativamente à discussão da antiguidade de um trabalhador, já decidida, entre as mesmas partes, noutra acção. Referindo-se na motivação do mesmo, na parte que, ao caso, interessa, o seguinte: “(…) Questiona, contudo, o A., no recurso subordinado interposto, a sua antiguidade, declarada na sentença recorrida. Acontece, porém, que o saneador-sentença atribuiu força de caso julgado ao que anteriormente fora decidido na outra acção que correu termos e que fixou ao A. uma antiguidade diversa da que veio invocar na presente acção. Assim sendo, entendemos que, também nesta parte, deve ser mantida a decisão recorrida, pois que, na verdade, não faz sentido, voltar a reapreciar uma questão que já foi discutida entre as mesmas partes, na primeira acção, em que a antiguidade foi invocada para sustentar a indemnização devida por despedimento individual. É verdade que não existe uma total identidade de acções, na medida em que na primeira acção a indemnização era sustentada em despedimento individual ilícito, ao passo que na presente acção se parte do pressuposto de que é um despedimento colectivo. Porém, tal não afasta a extensão da autoridade do caso julgado ao presente processo, pois que não faria sentido que entre as mesmas partes não houvesse coincidência quanto a este ponto fulcral para a quantificação da indemnização devida por despedimento. Efectivamente, o que se visa, através do instituto do caso julgado, é evitar que, em novo processo, o juiz possa validamente estatuir, de modo diverso, sobre o direito, situação ou posição jurídicas concretas definidas por uma anterior decisão, com desconhecimento pelo que se mostra já juridicamente reconhecido e tutelado. O caso julgado pretende, sobretudo, obstar a decisões concretamente incompatíveis, impedindo que o órgão jurisdicional duplique decisões sobre o mesmo objecto processual, contrarie na decisão posterior o sentido da decisão anterior ou seja colocado na alternativa não só de contradizer, mas também de reproduzir uma decisão posterior, com um sentido diferente, conforme ressalta das normas conjugadas dos art.s.580º, nº 2, e 619º, ambos do Novo CPC. O que, a acontecer, poria em crise a certeza e a segurança jurídicas indispensáveis à aplicação do direito e ao prestígio dos Tribunais (…).”. Revertendo ao caso, verifica-se que, no processo 9109/16.8T8PRT.P2.S1 foi proferido acórdão já transitado em julgado. Nesse processo foram partes o marido da Autora e, após a morte deste, a Autora e a aqui Ré, sendo o pedido o seguinte: condenação da Ré a pagar-lhe o montante global de € 39 902,99, acrescido de juros de mora, à taxa legal, até efetivo e integral pagamento. E, o fundamento desta acção foi o facto de a Ré ter deixado de pagar ao marido da Autora o pacote de comunicações, a totalidade das prestações referentes à isenção de horário de trabalho e ao complemento de responsabilidade, bem como a totalidade da prestação denominada B... e VV – Desconto. Para além de não mais ter disponibilizado a referida viatura, quando todas estas prestações fazem parte da sua retribuição e como tal não poderiam ser retiradas. Nela, a sentença da 1ª instância, confirmada pelo STJ, o seu dispositivo é do seguinte teor: “Pelo exposto, julgo a presente ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência: a) condeno a R., A..., S.A., a pagar aos habilitados, BB, CC e DD, a quantia global de € 36 841,65 (trinta e seis mil oitocentos e quarenta e um euros e sessenta e cinco cêntimos), à qual deverão acrescer juros de mora, à taxa legal, contados desde o vencimento de cada uma das prestações que integram aquele valor, até efetivo e integral pagamento; b) mais condeno a R. a pagar aos habilitados a quantia que se vier a liquidar em sede de execução de sentença e referente às prestações denominadas viatura de utilização permanente, pacote de comunicações, e subsídios de férias e de Natal do ano de 2004, estes relativos à prestação apelidada de isenção de horário de trabalho; c) ainda condeno os habilitados e a R. nas custas do processo, na proporção de quinze por cento para os primeiros e de oitenta e cinco por cento para a segunda.” Na presente acção, como se deixou dito, o pedido é: “A) Ser declarado que assiste à A. o direito de receber o complemento de pensão de sobrevivência. B) Ser a R. condenada a pagar à A. a quantia mensal de € 1.785,23, a título vitalício e de complemento da pensão de sobrevivência, valor este a pagar 14 vezes por ano; C) Ser a R. condenada a pagar à A. a quantia de € 24.993,25 acrescida de juros no montante de € 360,57, a título de valores de complemento de pensão de sobrevivência já vencidos; D) Ser a R. condenada a pagar à A. os juros de mora sobre cada uma das retribuições mensais referidas em A) que venham a vencer-se após a data de apresentação da presente acção, calculados à taxa legal supletiva desde a data dos respectivos vencimentos até integral pagamento.”. O seu fundamento é, o montante do salário do marido da Autora foi o de 4.763,09 constituído pela remuneração base, isenção de horário de trabalho, diuturnidades, B... e VV desconto e complemento de responsabilidade. E, nesta, o Tribunal “a quo”, teve em conta o decidido no anterior processo, com o nº9109/16.8T8PRT, como decorre do seguinte extrato da sentença “Nos presentes autos a aqui demandada não veio apresentar qualquer meio de prova que pudesse impugnar a factualidade invocada pela A. sendo certo que quanto ao valor da remuneração mensal auferida pelo cônjuge da demandante, o Tribunal considerou o montante definido no âmbito dos autos com o nº 9109/16.8T8PRT acima indicados, pelo que partindo desta factualidade cumpre, então, determinar da procedência do pedido formulado pela A”. Em suma, em ambas as acções (a presente e a com o nº 9109/16.8T8PRT) discutiu-se quais os complementos salariais, para além das diuturnidades, que faziam parte da retribuição stricto sensu do marido da Autora. E se assim é, o Acórdão do STJ, proferido no processo nº9109/16 (e que mereceu acolhimento na presente acção) decidiu definitivamente o sentido e alcance da questão de se saber qual era o vencimento ilíquido do marido da Autora, fundamento do pedido de pagamento do complemento de pensão de sobrevivência na presente acção, a significar que nesta parte o referido acórdão tem autoridade de caso julgado, cfr. art. 621º do CPC. Como se sabe, o caso julgado tem uma dupla função: vale como excepção, actualmente dilatória, através da qual se alcança o efeito negativo da inadmissibilidade de uma segunda acção e ainda, como autoridade, pela qual se alcança o seu efeito positivo, que é o de impor uma decisão como pressuposto indiscutível de uma segunda decisão, assentando por isso numa relação de prejudicialidade. O objecto da primeira decisão de mérito constitui pressuposto necessário da decisão de mérito a proferir na segunda acção, não podendo a decisão de determinada questão voltar a ser discutida, tal como decorre do disposto no artigo 621.º do CPCicil A excepção do caso julgado não se confunde pois com a autoridade do caso julgado. Nas palavras de (Teixeira de Sousa in “O Objecto da Sentença e o Caso Julgado Material”, BMJ 325, pág. 171) “a autoridade do caso julgado visa evitar que o órgão jurisdicional, duplicando as decisões sobre idêntico objecto processual, contrarie na decisão posterior, o conteúdo da decisão anterior: a excepção do caso julgado garante não só a impossibilidade de o Tribunal decidir sobre o mesmo objecto duas vezes de maneira diferente, mas também a inviabilidade do Tribunal decidir sobre o mesmo objecto de maneira idêntica. Já quando vigora a autoridade do caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspecto positivo de proibição de contradição da decisão transitada”. Com a autoridade do caso julgado, os Tribunais ficam vinculados às decisões uns dos outros, quanto a questões essenciais. Isto, justificado pela necessidade de evitar que um Tribunal possa definir uma concreta situação controvertida de forma válida, de modo contraditório e incompatível com outra anterior transitada em julgado. Nas palavras do (Professor Manuel de Andrade, in obra citada, pág. 321), a definição dada pela sentença à situação ou relação material controvertida que estiver em causa, deve ser respeitada para todos os efeitos em qualquer novo processo, tendo este novo processo de ter por assente que a mesma situação já existia ou subsistia a esse tempo tal como a sentença a definiu. Sendo que, vem sendo entendimento dos tribunais superiores (cfr. entre outros, Ac. desta Relação de 23.01.2023, Proc. nº 19179/21.1T8PRT.P1 in www.dgsi.pt e demais, nele citados) e da doutrina, que a imposição da autoridade do caso julgado não exige a coexistência da tríplice identidade prevista no art. 581º do CPC. Por isso, aos subscritores do presente acórdão – por força da autoridade do caso julgado, e pela imposição de não contradição com o, douto, acórdão proferido no processo 9109/16, transitado em julgado –, também, não lhes seria e não é lícito conhecer do objecto da apelação. Assim, face a ambas as razões, questão nova e autoridade de caso julgado, improcede totalmente a apelação. * III - DECISÃONestes termos, acorda-se nesta Secção, da Relação do Porto, em julgar parcialmente procedente o recurso (em termos de matéria de facto) e, atento o carácter vinculante do caso julgado constituído no Processo nº 9109/16, confirma-se a sentença recorrida, porque conforme com o decidido nesse Processo. * Custas a cargo da Ré.* Porto, 9 de Outubro de 2023* Rita RomeiraO presente acórdão é assinado electronicamente pelos respectivos, Teresa Sá Lopes António Luís Carvalhão |