Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
342/14.8GBSTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANA BACELAR
Descritores: CRIME DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
CRIME HABITUAL
ALTERAÇÃO NÃO SUBSTANCIAL DE FACTOS
Nº do Documento: RP20160420342/14.8GBSTS.P1
Data do Acordão: 04/20/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC. PENAL
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 997, FLS.149-163)
Área Temática: .
Sumário: I - O crime de violência doméstica é um crime habitual, constituindo modalidade dos crimes ou de trato sucessivo, por a realização do tipo incriminador supor que o agente pratique determinado comportamento de forma reiterada.
II - Neles é decisiva a conexão temporal que liga os vários momentos da conduta do agente.
III - Por isso a interrupção dos actos criminosos durante um determinado lapso de tempo relevante (v.g. um ano) não autoriza a sua unificação.
IV - O crime de violência domestica abrange a pratica de uma multiplicidade de condutas, reiteradas (e não sucessivas) ao longo de determinado período de tempo (e sem hiatos significativos) que se praticaram na pessoa do cônjuge ainda que de natureza diversa, desde que todas elas se tenham reportado a maus tratos físicos ou psíquicos, constituindo um estado de agressão permanente como modo de exercício de uma relação de poder ou domínio.
V - A alteração da data em que ocorreram os factos com inegável interesse para a decisão da causa, constitui alteração não substancial, a impor o cumprimento do art.º 358º 1 CPP sob pena de nulidade da sentença (art.º 379º 1 b) CPP).
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 342/14.8GBSTS.P1

Acordam, em conferência, na 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto

I. RELATÓRIO
No processo comum n.º342/14.8GBSTS, da Comarca do Porto – Vila do Conde – Instância Central – 2.ª Secção Criminal – J2, mediante acusação pública, foi pronunciado:
B…, divorciado, nascido a 5 de maio de 1982, na freguesia de …, concelho de Vila Nova de Famalicão, filho de C… e de D…, residente na Travessa …, n.º .., …, Vila Nova de Famalicão, pela prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso efectivo,
- de um crime de violência doméstica, previsto e punível pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea a), n.º 2, n.º 4 e n.º 6, do Código Penal; um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 143.º, n.º 1, 145.º, n.º 1, alínea a), e n.º 2, e 132.º, n.º 2, alínea c), todos do Código Penal;
- um crime de detenção de arma proibida, previsto e punível pelo artigo 86.º, n.º 1, alínea c), da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, por referência aos artigos 3.º, n.º 4, alínea a), 14.º e 73.º, n.º1, do mesmo diploma legal.

E…, devidamente identificada nos autos e neles constituída Assistente, pediu a condenação do Arguido a pagar-lhe a quantia de € 12 500,00 (doze mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a notificação até efetivo e integral pagamento, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

F…, devidamente identificado nos autos, pediu a condenação do Arguido a pagar-lhe a quantia de € 1 000,00 (mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a notificação até efetivo e integral pagamento, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

O Centro Hospitalar G…, E.P.E. pediu a condenação do Arguido no pagamento da quantia de € 85,91 (oitenta e cinco euros e noventa e um cêntimos), acrescida de juros, à taxa legal, desde a citação até efetivo e real pagamento, a título de reembolso dos custos com a assistência médica prestada a E….

O Arguido apresentou contestação escrita, onde nega a pratica dos factos que lhe são imputados.

Realizado o julgamento, perante Tribunal Coletivo, por acórdão proferido e depositado em 17 de dezembro de 2015, foi decidido:
«julga-se parcialmente procedente por parcialmente provada a douta pronúncia, e, os Juízes que constituem o Tribunal Colectivo decidem:
A) Absolver o arguido B… pela prática, em autoria material, de um crime de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo artº 86º, nº 1, al. c), da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro, por referência aos artºs 3º, nº 4, al. a), 14º e 73º, nº 1, do mesmo diploma legal. B) Absolver o arguido B… pela prática, em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artºs 143º, nº 1, 145º, nº 1, al. a), e nº 2, e 132º, nº 2, al. c), todos do Código Penal.
C) Condenar o arguido B…, pela prática, em autoria material e em concurso real e efectivo, de um crime de violência doméstica, previsto e punido, pelo artº 152º, nº 1, al. a), nº 2, do Código Penal e um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo art. 143º, nº 1, do Código Penal, respectivamente nas penas de 3 (três) anos e 1 (um) ano de prisão. D) Em cúmulo jurídico, vai o arguido condenado na pena única de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de prisão.
E) Decretar a suspensão da execução da pena de prisão ora aplicada por igual período de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses, nos termos do disposto no art.50º do C. Penal, sujeita a regime de prova (art. 53º, nº 1, do C.P.), designadamente mediante a imposição dos seguintes deveres e regras de conduta: - Obedecer a um plano individual de readaptação social, a elaborar pelos serviços de reinserção social; - Frequentar o “Programa para agressores de violência doméstica”, ministrado pela DGRS ou por outra entidade que venha a ser indicada para o efeito. F) Mais vai o arguido condenado no pagamento das custas processuais, fixando-se em 4 UC a taxa de justiça devida. * Outrossim, julga-se parcialmente procedente, por parcialmente provado, o pedido de indemnização civil deduzido pela demandante E… contra o demandado B… e, em consequência, condena-se este a pagar àquela, a título de compensação por danos não patrimoniais, a quantia de € 7.500,00 (sete mil e quinhentos euros), a que acrescem os correspondentes juros de mora legais, vencidos e vincendos, desde a notificação do pedido, até integral pagamento, absolvendo-se o arguido/demandado do restante pedido. Custas por demandado e demandante, na proporção do decaimento e sem prejuízo de eventuais apoios judiciários concedidos. Outrossim, julga-se parcialmente procedente, por parcialmente provado, o pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante F… contra o demandado B… e, em consequência, condena-se este a pagar àquele, a título de compensação por danos não patrimoniais, a quantia de € 1.000,00 (mil euros), a que acrescem os correspondentes juros de mora legais, vencidos e vincendos, desde a notificação do pedido, até integral pagamento. Custas pelo demandado.
Julga-se procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido pelo Centro Hospitalar G…, E.P.E. contra o demandado B… e, em consequência, condena-se este a pagar àquele, a título de danos patrimoniais, a quantia de € 85,91, acrescida de juros a contar da notificação, à taxa legal, até efectivo e real embolso.
Custas pelo demandado.»

Inconformado com tal decisão, o Arguido dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]:
«Entende o arguido que a apena aplicada é manifestamente desajustada aos factos dados como assentes por exagerada, uma vez que quer na escolha da pena, quer na medida da pena não se ponderaram factores que deviam, necessariamente, ser ponderados e, por outro lado, ponderaram-se factores que o não poderiam ser.

É entendimento do recorrente que a pena aplicada, ainda que se considere a factualidade dada como assente, é desajustada à culpa do arguido.

1- A pena aplicada ao arguido é manifestamente excessiva
2- Viola o disposto nos artigos 400 e 71º do Código Penal.
3- É entendimento do arguido que a matéria de facto foi incorrectamente julgada, e por outro lado a sentença ora recorrida encontra-se deficientemente fundamentada.
4- Pelo que entende-se que a sentença recorrida é nula por insuficiente fundamentação, violando-se o disposto no artº 374º nº 2 e 379º n.º 1 a) do Código de Processo Penal.
5- Entende o Recorrente que os pontos 2,3,5, 7 e 19 e os factos com estes conexos, se encontram incorrectamente julgados, devendo ser julgados não provados, sendo que não foram devidamente valorados factos dados como provados.
6- O Tribunal concluiu qua a arma apreendida nos autos não é aquela que supostamente o arguido detinha e por essa razão não pode o tribunal achar "seguro" e dar como provado que o arguido ameaçou E… com um objecto que poderia ser uma arma.
7- Quanto à questão das datas dos factos provados nos pontos 4 e 5 temos uma diferença temporal pois que na acusação pública é referido que esta situação aconteceu antes do casamento (29 de Junho de 2010) mas a assistente questionada referiu que esta situação aconteceu apenas depois do casamento. Pelo que poderemos estar na presença de uma alteração substancial dos factos constantes na acusação pública.
8- Para além disso e tendo em conta a norma contida no artigo 70º do Código Penal que prescreve que se ao mesmo crime forem aplicáveis, em alternativa, pena detentiva e pena não privativa da liberdade, deve o Tribunal dar preferência a esta última, desde que a mesma realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Pelo que sendo o arguido condenado pelo crime de ofensa à integridade física simples o Tribunal deveria ter dado preferência à pena de multa.
9- Assim sendo reforça-se que no caso em apreço deveria ter sido aplicado o princípio in dúbio pro reo e tudo devidamente ponderado deveria resultar numa absolvição do mesmo.

Termos em que deve ser concedido provimento ao recurso e, em consequência, ser a sentença revogado reduzindo-se a pena e condenando o arguido pelo crime de ofensa à integridade física simples condenado com pena de multa. Pois só assim se fará,
JUSTIÇA!»

O recurso foi admitido.

Respondeu a Assistente, formulando as seguintes conclusões [transcrição]:
«A– Nenhum reparo merece a sentença lavrada pelo tribunal recorrido, à qual se adere sem qualquer reserva, razão pela qual terão de improceder todas as conclusões, doutas, da recorrente.
B– A matéria de facto dada por assente encontra-se devidamente fundamentada e resulta de uma correcta apreciação da prova produzida na audiência de julgamento, conjugada com as regras da experiência.
C– Em face de tal matéria assente, o tribunal tinha de concluir como concluiu pela condenação do arguido.

Nestes termos e nos melhores de direito deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente por acerto da sentença recorrida e, por via disso, ser confirmada a sentença recorrida, como é de DIREITO E JUSTIÇA!»

Junto do Tribunal recorrido, respondeu também o Ministério Público, formulando as seguintes conclusões [transcrição]:
«1. O arguido B… foi condenado nestes autos em autoria material e em concurso real e efetivo, de um crime de violência doméstica, previsto e punido, pelo artº 152º, nº 1, al, a), nº 2, do Código Penal e um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo art. 143º, nº 1, do Código Penal, respetivamente nas penas de 3 (três) anos e 1 (um) ano de prisão e em cúmulo jurídico na pena única de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, nos termos do disposto no art.50º do C. Penal, sujeita a regime de prova (art. 53º, nº1, do C.P.), designadamente mediante a imposição dos seguintes deveres e regras de conduta: obedecer a um plano individual de readaptação social, a elaborar pelos serviços de reinserção social; frequentar o "Programa para agressores de violência doméstica", ministrado pela DGRS ou por outra entidade que venha a ser indicada para o efeito.
2. A retificação do ano de "2009" para o ano de "2010" não se trata duma alteração substancial nem não substancial dos factos, porque a retificação do ano não atinge a densificação normativa de alteração não substancial dos factos com relevo para ser comunicada nos termos do artº 358º Código de Processo Penal.
3. O tribunal a quo na fundamentação da matéria de facto reproduziu de forma exaustiva o que o arguido declarou em audiência e de forma detalhada todo o depoimento da assistente. Basta ouvir as declarações do arguido e o depoimento da assistente para se perceber que foram "transcritos" para o douto acórdão.
4. O tribunal elenca ainda todos os documentos que teve em consideração na decisão do caso para depois chegar à fase da valoração da prova. Nesta, o coletivo, em decorrência da exigência de total transparência, descreveu de forma clara mas exaustiva as razões porque valorou o depoimento da assistente em detrimento da versão apresentada pelo arguido, explicando o processo de formação da convicção tomada e qualquer pessoa que leia a decisão percebe exatamente por que razão o tribunal fez tal valoração. Não se trata de palpites ou caprichos.
5. A nulidade da sentença por falta de fundamentação só ocorre quando não existir o exame crítico sobre as provas, o que como se pode verificar não é o caso. Da fundamentação da matéria de facto o coletivo de juízes explicitou de forma clara o iter da decisão e as razões da valoração pessoal que referencia e analisa de forma racional, lógica e crítica, indicando de forma clara a formação da convicção do Tribunal.
6. O contexto fáctico e o período em que o arguido atuou, a ilicitude e o grau de culpa são elevadíssimos e não poderiam permitir outra opção diferente da pena de prisão. Atente-se que o recorrente não confessou os factos, não se mostrou arrependido e revelou uma total incapacidade de auto-responsabilização e de avaliar criticamente os seus comportamentos delituosos.
7. Ponderados os fundamentos exarados no douto acórdão, a pena de 3 anos e 4 meses de prisão, suspensa com regime de prova, mostra-se adequada aos critérios que presidem à determinação da pena concreta, os previstos nos artigos 40° e 71°, do Código Penal, razão pela qual entendemos que se deve manter.
Em face do exposto, julgando improcedente o recurso interposto pelo arguido, farão Vªs Exas, como sempre, JUSTIÇA
*
Enviados os autos a este Tribunal da Relação, o Senhor Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da nulidade do acórdão, por incumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 358.º do Código de Processo Penal.

Observou-se o disposto no artigo 417.º, nº 2, do Código de Processo Penal.
Na resposta que apresentou, o Arguido, aderindo ao parecer do Senhor Procurador Geral Adjunto, corrigiu posição anteriormente assumida no processo – a alteração que ocorre é não substancial de factos.

Efetuado o exame preliminar, determinou-se que o recurso fosse julgado em conferência.
Colhidos os vistos legais e tendo o processo ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO
De acordo com o disposto no artigo 412.º do Código de Processo Penal e com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19 de outubro de 1995[1], o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito –, por obstativas da apreciação de mérito, como são os vícios da sentença previstos no n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal, ou alguma das causas de nulidade dessa decisão, consagradas no n.º 1 do artigo 379.º do mesmo diploma legal.[2]

Posto isto, e vistas as conclusões dos recursos, a esta Instância são colocadas as questões:
- da incorreta valoração da prova produzida em julgamento;
- da violação do princípio in dubio pro reo;
- da deficiente fundamentação da matéria de facto;
- da alteração não comunicada de factos;
- da desadequação, por excesso, da pena imposta.
*
No acórdão recorrido foram considerados como provados os seguintes factos [transcrição]:
«1) O arguido B… e a E… casaram no dia 29 de agosto de 2009, depois de terem vivido em condições análogas às dos cônjuges durante um período não concretamente determinado, e têm um filho menor em comum.
2) A relação entre o casal pautou-se, desde cedo, por constantes injúrias e ameaças do arguido para com a E…, as quais, por vezes, ocorriam na presença do filho menor do casal, agora com 5 anos de idade.
3) No próprio dia do casamento o arguido injuriou a ofendida e mandou-a "para o caralho".
4) Antes mesmo de terem contraído casamento, no dia 29 de Junho de 2010, na residência do casal, sita na Rua …, nº …, Vila Nova de Famalicão, já depois de o filho de ambos estar a dormir, o arguido desferiu estalos e empurrões na ofendida, puxou-lhe o cabelo e apertou-lhe com força o braço esquerdo e os dedos da mão, causando-lhe uma equimose no braço.
5) Naquele mesmo dia 29 de Junho de 2010, na residência do casal, na sequência de uma discussão, o arguido ameaçou a ofendida que a matava enquanto empunhava um objecto que aparentava ser uma arma de fogo.
6) No dia 31 de Março de 2014, pela 1h30m, na residência do casal, o arguido mordeu a E… nas costas.
7) Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar o arguido apelidou a ofendida de "puta" e disse-lhe, em tom sério e intimidatório, "se sei que me enganas, mato-te" enquanto empunhava o mesmo objecto que aparentava ser uma arma de fogo.
8) Como consequência directa e necessária da agressão ocorrida no dia 31 de Março de 2014 a ofendida sofreu dores e a lesão melhor descrita no relatório de avaliação do dano corporal de fls. 8 a 10 do apenso B, cujo teor se dá por reproduzido para os devidos efeitos legais, designadamente, área de eritema na região torácica posterior esquerda, plana, ovalada, de 2 x 4 cm de maiores dimensões.
9) Tal lesão terá demandado 3 dias para a cura, sem afectação da capacidade de trabalho geral e da capacidade de trabalho profissional.
10) O arguido e a ofendida separam-se de facto em Abril de 2014, encontrando-se esta a residir com os seus pais na Travessa …, em …, área desta comarca, encontrando-se actualmente divorciados.
11) Desde então o arguido vem importunando a ofendida com o envio de mensagens escritas (SMS).
12) No dia 30 de Setembro de 2014, pelas 18h30m, quando a ofendida se deslocou à antiga residência do casal para ir buscar alguns pertences, o arguido dirigiu-se à mesma dizendo "sua vaca, sua puta, tiraste-me tudo, roubaste-me".
13) No dia 9 de Dezembro de 2014, pelas 15h01m, por causa da regulação do exercício das responsabilidades parentais, o arguido enviou à ofendida as seguintes mensagens: "Se quiseres ir para tribunal é um favor que me fazes, não mamas à minha pala, gasta menos que o dinheiro é para ele não é para ti". A brincar estiveste tu até agora comigo e com o meu dinheiro. Arranja um gajo para mamares dele que de mim já não mamas mais. Não tenho medo.".
14) No dia 18 de Dezembro de 2014, pelas 18h40m, na Travessa …, em …, quando se preparava para abandonar o local ao volante do veículo de matrícula "..-..-TF", após ter deixado o filho menor do casal entregue à avó materna, e ao avistar a E… e o seu pai, F…, que seguiam apeados na mesma artéria, o arguido acelerou o veículo automóvel na direcção dos mesmos com intenção de os atingir, quase acertando o corpo dos ofendidos com o espelho retrovisor lateral, o que só não conseguiu porque estes se encostaram completamente ao muro ali existente.
15) Ato contínuo o arguido parou a viatura alguns metros adiante, saiu da mesma, correu em direcção aos ofendidos, atirou ao chão o F…, colocou-lhe um joelho em cima e desferiu-lhe vários murros na face e na cabeça.
16) O ofendido F… tinha, à data dos factos, 64 anos de idade.
17) Como consequência directa e necessária da agressão, o ofendido F… sofreu dores e as lesões melhor descritas no relatório de avaliação do dano corporal de fls. 7 a 9 do apenso A, cujo teor se dá por reproduzido para os devidos efeitos legais, designadamente, contusão do couro cabeludo, na região parietal esquerda, com ligeiro edema e dos à palpação, com 4 por 3 cm de maiores dimensões.
18) Tais lesões terão demandado 7 dias para a cura, sem afectação da capacidade de trabalho geral e da capacidade de trabalho profissional.
19) Durante o período em que viveu maritalmente com a ofendida e até ao dia 31 de Março de 2014 o arguido foi detentor de um objecto que aparentava ser uma arma de fogo.
20) A arma apreendida nos autos é uma arma da classe Bl, cujo manifesto é obrigatório.
21) Com o comportamento supra descrito o arguido molestou a ofendida E…, sua mulher, na sua integridade física e saúde, bem como lhe causou sofrimento psíquico, mercê da humilhação, medo, nervosismo e constrangimento a que a expôs, atento o seu comportamento e o teor das expressões que lhe dirigiu, agindo com o propósito, concretizado, de lesar a sua integridade física e psíquica, a sua integridade moral e dignidade pessoal.
22) Com a sua conduta quis ainda o arguido molestar o ofendido F…, seu sogro, na sua integridade física e saúde, o que conseguiu.
23) O arguido agiu sempre de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

Mais se provou, quanto ao pedido cível do Centro Hospitalar G…, E.P.E., que:
24) Em consequência da actuação do demandado/arguido, prestou assistência hospitalar a E…, em 31/03/2014.
25) Da assistência prestada resultaram despesas que ascendem a € 85,91, conforme factura n° …….., de 22/12/2014, que se junta e aqui se dá por integralmente reproduzida, para todos os efeitos legais - doe. n° 1 (fls. 101).
26) Até à data, o arguido não a pagou nem jamais manifestou vontade de a pagar.

Mais se provou, quanto ao pedido cível do ofendido F…, que:
27) Em consequência da actuação do demandado/arguido, sofreu dor física, medo, inquietação, humilhação e vergonha.
28) Sentiu e sente muito medo do arguido, tendo dificuldades em adormecer, tendo passado de uma pessoa alegre e bem disposta a uma pessoa triste, fechada em si mesmo e revoltada, após a agressão perpetrada pelo arguido.

Mais se apurou, quanto às condições pessoais do arguido:
29) Que B… é o mais velho de 2 irmãos, proveniente de um agregado familiar de remediada condição sócio-económica. O seu processo de crescimento/desenvolvimento decorreu sem referência a incidentes de relevo, num contexto familiar referenciado como equilibrado e de coesão.
Em idade própria ingressou no sistema de ensino, tendo-se habilitado com o 9° ano de escolaridade. Frequentou ainda o 10° ano, todavia a manifesta vontade de autonomia económica e desmotivação para estudar determinaram o abandono e a sua inserção na vida activa.
Aos 18 anos começou a trabalhar numa pastelaria em regime nocturno, actividade que manteve 1 ano. Empregou-se de imediato no ramo têxtil, com funções de motorista, trabalho que desempenhou até 2009, ano em que se habilitou com a carta de pesados e, iniciou uma carreira como motorista profissional de longo curso até inicio de 2014, data em que ficou desempregado. Após um período de inactividade, em 2015 retomou o mesmo tipo de funções na empresa" H…", à qual se encontra vinculado e aufere um salário médio de 1000 euros/mês.
Viveu 2 anos em união de facto com a ofendida e, casaram em Agosto/2009. Desta união existe um filho, no presente com 6 anos de idade e, a viver com a progenitora.
B… descreveu esta relação como inicialmente gratificante, porém gradualmente alterada e deteriorada por um crescendo de divergências/desentendimentos entre o casal, alegadamente após o nascimento do filho, a resultar na separação e, presente envolvimento judicial.
Está divorciado da assistente E… desde meados de 2015.
Enquanto arguido este constituirá o seu segundo contacto com o sistema da justiça penal, por crime de diferente natureza. Do 1º resultou condenação em pena de multa, já regularizada.
À data a que se reportam os factos, B…, já separado, integrava o agregado de origem, ao qual havia regressado em Junho de 2014. Deste faziam parte os progenitores, o pai laboralmente activo e, a mãe, reformada.
Residiam no rés-do-chão de uma moradia, propriedade dos pais por herança, com adequadas condições de habitabilidade.
Desempregado, subsistia do subsídio auferido e do auxílio destes familiares, nomeadamente no alojamento e alimentação. Como despesas fixas quantificou as tidas com o credito à habitação da casa de morada de família, que entretanto referiu ter cessado, manutenção do condomínio e prestação de alimentos ao menor, de € 125 /mês.
Relatou à data uma situação financeira a carecer de alguma limitação.
O relacionamento entre as partes foi, à ocasião, aferido como instável e de conturbação.
Um crescendo de desentendimentos entre o casal, a motivar discussões e episódios de tensão relacional, resultaram na separação em Abril de 2014, data em que a ofendida abandonou a habitação, com o filho. Não obstante, posteriores divergências/discórdias quanto à assunção das responsabilidades parentais, designadamente o regime de visitas, potenciaram picos de conflito entre as partes, a culminar no presente processo judicial penal.
Actualmente, B… mantém inalterado o seu enquadramento sócio-familiar e habitacional. A viver com pais e já empregado, referiu receber um salário de 1000 euros mensais que disse destinar a garantir alguns encargos com a manutenção da casa de morada de família (apartamento de tipologia 3) e, cujo pagamento pretende retomar após renegociação com a entidade bancária. Mantém o pagamento da prestação de alimentos e o restante é orientado para as suas despesas pessoais. Refira-se que após o divórcio (meados de 2015) teve necessidade de recorrer a apoio médico especializado na área da Psiquiatria, que mantém, com suporte medicamentoso associado.
Os seus tempos de lazer são essencialmente centrados no convívio com os familiares mais próximos, o filho e a actual namorada.
Comunitariamente, regista uma inserção social favorável.
Em conclusão, estamos perante um indivíduo, que até ao presente contacto com o sistema de justiça, apresentou um percurso globalmente adequado.
Em termos conjugais manteve uma relação de 5 anos, inicialmente descrita como satisfatória, todavia, nos últimos 2/3 anos caracterizada pela instabilidade, a culminar na separação e, no presente processo judicial penal.
Profissionalmente activo, a beneficiar do apoio/suporte dos progenitores e adequadamente inserido no meio de residência.
30) O arguido apresenta os seguintes antecedentes criminais:
Por decisão datada de 20/03/2013, foi o arguido condenado pela prática de um crime de falsificação de notação técnica, p. e p. pelo art. 258º, nº 1, als. a) e c) do C.P., na pena de 50 dias de multa, à taxa diária de € 7,00, num total, pois, de € 350,00 - P. n° 76/12.8GTVRL (Abreviado), do 1° Juízo do Tribunal Judicial de Chaves

Relativamente a factos não provados, consta do acórdão que [transcrição]:
«Após produção da prova, não resultaram provados, os seguintes factos descritos na acusação pública:
A) Que desde a separação de facto do arguido e da assistente, em Abril de 2014, o arguido vem dirigindo injúrias a esta sempre que se desloca a casa dos pais dela para visitar o filho menor do casal.
B) Que o objecto que aparentava ser uma arma de fogo, que o arguido deteve consigo durante o período em que viveu maritalmente com a ofendida e até ao dia 31 de Março de 2014, e que, designadamente usou no âmbito da factualidade descrita nos pontos 5) e 7) dos factos provados, foi a pistola de marca "Star", de calibre 6,35 mm, bem como das respectivas munições, apreendidas nos autos.
C) Que a arma apreendida nos autos pertencia ao arguido.

Por decorrência dos factos não provados descritos nas als. B) e C), necessariamente resultam não provados os factos atinentes ao elemento subjectivo do tipo que lhes corresponde, ou seja:
D) Que o arguido quis deter a referida arma, não obstante estar ciente das suas características e saber que nessas circunstâncias não a podia deter.

E) Que o ofendido F… se encontrava debilitado em virtude da idade ou que padeça de doença cardíaca que o debilite, ao ponto de o tornar particularmente indefeso, o que era do conhecimento do arguido.

Mais resultaram não provados os seguintes factos invocados em contestação penal escrita do arguido:
F) Que a ofendida sofreu uma depressão pós-parto, o que se revelava quer na relação que tinha com o filho, quer com o marido, aqui arguido, estando a ofendida descontente com a vida que levava e tudo era motivo para discutir.
G) Que, em 18/12/2014, o ofendido F… dirigiu ao arguido graves provocações e ameaças e estando munido de um paralelo, o arguido, apenas visando defender a sua própria integridade física e para pôr fim à agressão eminente por parte daquele, viu-se forçado a agir em legítima defesa e procurar defender-se, agredindo-o, porém, num cenário de agressões e lesões mútuas.
H) Que o arguido desconhecesse que o ofendido F… sofre de doença cardíaca.

Com utilidade para a boa decisão da causa, não se provaram quaisquer outros factos que não estejam já em oposição ou não s encontrem já prejudicados pelos que foram dados como provados e não provados

A convicção do Tribunal recorrido, quanto à matéria de facto, encontra-se fundamentada nos seguintes termos [transcrição]:
«Como dispõe o art.127º do C.P.P., a prova é apreciada “segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente”.
Significa este princípio que o julgador tem a liberdade de formar a sua convicção sobre os factos submetidos a julgamento com base no juízo que se fundamenta no mérito objectivamente concreto do caso, na sua individualidade histórica, tal como ele foi exposto e adquirido representativamente no processo.
Cumpre, pois, proceder a um exame crítico das provas, nos termos do art. 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
Tal exame reconduz-se, num primeiro momento, ao compulsar das provas produzidas, o seu acervo global e, num segundo momento, a uma tomada de consciência sobre o seu valor, equacionando-o com o thema decidendum, finalizando com a emissão de um juízo de valor, conducente à opção, ante o acervo probatório que se nos apresenta, por certas provas em detrimento de outras.
Comecemos, pois, por fazer uma breve e resumida exposição da prova que foi produzida nos autos.
No caso dos autos, o arguido, em declarações, negou a prática dos factos e crimes por que vem acusado. Negou que alguma vez tivesse injuriado a assistente. Ao contrário, alegou que era injuriado por aquela. Negou que alguma vez tenha agredido a assistente. Ao contrário, alegou que foi agredido diversas vezes por aquela. Relativamente à factualidade ocorrida em 31/03/2014, referiu que efectivamente deu-se uma discussão entre si e a assistente, quando estavam na cama e esta, a dada altura, deu-lhe pontapés e estalos, tendo, então, o arguido, num “acto irreflectido” mordido a assistente nas costas, mas referindo que não o fez directamente na pele, tendo sido sobre o cobertor que estava a cobrir aquela.
Quanto à factualidade datada de 18/12/2014, o arguido relatou o factualismo ocorrido de forma contrária à que consta do texto acusatório, referindo que, quando passava junto à assistente e ao pai dela, o ofendido F…, este chamou-lhe de “filho da puta” e “cabrão”, pegando, em seguida, num paralelo, que lhe mostrou, com intenção de lho atirar, embora acabando por não o fazer e deu um murro na cabeça do arguido. Por isso, o arguido também lhe desferiu murros, mas apenas em defesa.
Quanto à arma apreendida nos autos, nega que alguma vez tenha tido aquela arma na sua posse, dizendo que esta sempre foi do seu avô, que deixou de herança ao seu pai.
Alegou que nunca usou arma.
De seguida, o tribunal ouviu, em declarações, a assistente. Num discurso emocionado e sofrido, confirmou ao tribunal o período de casamento que viveu com o arguido, bem como o que o antecedeu e o sucedeu, conforme descrito na acusação pública.
Confirmou, assim, que a sua relação com o arguido pautou-se, desde cedo, por constantes injúrias e ameaças do arguido para com ela, as quais, por vezes, ocorriam na presença do filho menor do casal, agora com 5 anos de idade.
Afirmou que o arguido a apelidava de “puta”, “vaca”, “cabra”, “demente”, “és uma doente”, no seguimento de discussões constantes.
Questionada sobre a eventual existência de um motivo recorrente para tal tratamento, respondeu que era sempre que ela não concordava com ele, nas mais pequenas coisas do dia-a-dia, não havendo um motivo específico. Sempre que ele não concordava com ela, ele mandava-a “foder”, “vai para o caralho”, “vai para a puta que te pariu”, dizendo-o muitas vezes e muitas delas com o filho presente. Referiu que o filho, nessas situações, chorava muito, ficava desesperado, ia a correr para os braços da mãe, mas que a presença do menino não inibia o arguido de dizer os palavrões.
Relatou uma situação em que iam os três no carro, quando o arguido começou a dirigir tais palavrões, aos gritos, à assistente, acelerando o carro e o filho assustou-se muito. Referiu que, enquanto aquilo decorria, ela pedia muito ao arguido para parar, até porque o menino estava muito assustado, mas ele continuava.
No que concerne ao factualismo descrito no ponto 4) dos factos provados, a assistente rectificou a data, para 29 de Junho de 2010, confirmando, no resto, tudo o ali descrito.
Assim, nas condições de tempo (rectificado), lugar e modo, ali descrito, o arguido agrediu-a fisicamente, na sequência de mais uma discussão de não concordância dele sobre algo que não se lembrou concretamente, tantas foram as vezes em que tal aconteceu.
Relatou uma situação em que estava ela grávida, estavam ambos de carro e ele discutiu com ela, até que, a dada altura, ele deixou-a num sítio longe, ao pé de uma estação de comboios, numa rua e foi embora.
A assistente afirmou, de forma muito emotiva, que acreditava que o amor dela, dedicação e que a vinda do filho contribuiriam para a paz entre o casal, daí ter casado com ele, mesmo tendo-lhe ele já também, no período que antecedeu o casamento, dirigido muitos palavrões (a assistente ficou grávida antes de casarem).
Relatou (muito emocionada) que, no dia em que veio da maternidade, ela chegou a casa, estava nervosa e ansiosa, com muitas dores (estava com uma mastite) e ele levantou-lhe a mão, fazendo o gesto de lhe querer dar um murro. Nesse dia ela quis ir embora, pois “não queria aquela vida” para ela, mas acabou por ficar. Acrescentou que quando lhe dizia que ia embora, ele colocava o objecto que era considerava uma arma dentro da boca e dizia que se matava se ela o deixasse.
Questionada, referiu que não teve uma depressão pós-parto, apenas teve uma mastite muito dolorosa.
Referiu que, no próprio dia do casamento (tinha o filho de ambos 4 meses), estavam a acordar de manhã, atrasados para a cerimónia e ele queria ter relações sexuais, o que ela recusou, precisamente por estarem atrasados, o que deixou o arguido furioso, tendo-a mandado “para o caralho”.
Questionada, assegurou que nunca chamou palavrões ao arguido, referindo que a sua educação não lhe permitia.
A assistente referiu que o arguido tinha uma arma em casa, tendo-a adquirido já mesmo antes de casarem. Referiu que o arguido comprou a arma quando iniciou a sua actividade de motorista profissional e que a usava na sua vida quotidiana. Acrescentou que o arguido comprou um cofre para guardar a arma lá dentro e que o colocou num armário do quarto do casal.
Ele chegou-lhe a dizer directamente que tinha comprado aquele cofre para ali guardar a arma, mas muitas vezes ele colocava a arma debaixo da mesinha da cabeceira e ela tinha medo porque o filho andava pela casa e ele respondeu-lhe que o filho jamais conseguiria disparar a arma, que estava travada.
No que concerne ao factualismo descrito no ponto 5) dos factos provados, a assistente rectificou a data, para 29 de Junho de 2010, confirmando, no resto, tudo o ali descrito.
A assistente referiu que, nas condições de tempo (rectificado), lugar e modo descritas no ponto 5) dos factos provados, o arguido estava furioso com ela porque ela lhe tinha dito que se ia embora. Ele dirigiu-lhe, então, diversos impropérios, como “sua puta”, “sua vaca”, “eu mato-te”, enquanto lhe exibia a arma.
Ela ficou com muito medo e ligou aos pais, fechando-se no quarto com o filho à espera que eles chegassem. Quando os pais chegaram, levaram-na ao hospital.
Referiu que depois deste episódio, acabou por voltar para casa, perdoando-o, pois gostava muito dele e queriam continuar a ser uma família. Quis dar-lhe uma segunda oportunidade e ele prometeu que ia mudar, mas não aconteceu.
No que respeita à factualidade descrita no ponto 6) dos factos provados, a assistente referiu que, durante o fim de semana anterior, não se tinham falado, porque não estavam de acordo com uma suposta emigração com um casal, que ele queria e ela não queria. No domingo, por volta da 1h30m, ela estava a dormir e ele acordou-a, pois queria falar com ela. Ele deu-lhe um pontapé e puxou a roupa da cama para trás e deu-lhe uma mordidela nas costas (e não no tórax, como se refere no texto acusatório). Questionada assegurou que não estava com um cobertor em cima dela, no momento da mordidela, que foi, assim, feita, directamente na pele dela.
Ele dirigiu-lhe, ainda, os mais variados impropérios, como “puta” e disse-lhe, em tom sério e intimidatório, “se sei que me enganas, mato-te” enquanto empunhava a mesma arma de fogo (confirmando a factualidade vertida no ponto 7). O filho ficou aos berros, apavorado e ela foi buscá-lo ao quarto e deixou-o ficar consigo para ele se acalmar. O arguido ficou a dormir na sala. Deixou-o sair porque ia viajar para fora do país e saiu de casa (foi no dia 2 de Abril) e nunca mais voltou, tendo ido com o filho para casa dos pais.
Referiu que foi ao hospital no dia a seguir.
Ficaram, assim, separados de facto desde Abril de 2014.
A assistente referiu que, desde então, o arguido vem-na importunando com o envio de mensagens escritas (SMS).
Confirmou que, no dia 30 de Setembro de 2014, pelas 18h30m, quando ela se deslocou à antiga residência do casal para ir buscar alguns pertences, o arguido dirigiu-se à mesma dizendo “sua vaca, sua puta, tiraste-me tudo, roubaste-me”.
Confirmou também que, no dia 9 de Dezembro de 2014, pelas 15h01m, por causa da regulação do exercício das responsabilidades parentais, o arguido enviou-lhe as seguintes mensagens: “Se quiseres ir para tribunal é um favor que me fazes, não mamas à minha pala, gasta menos que o dinheiro é para ele não é para ti”. A brincar estiveste tu até agora comigo e com o meu dinheiro. Arranja um gajo para mamares dele que de mim já não mamas mais. Não tenho medo.”.
Igualmente descreveu a factualidade descrita nos pontos 14) a 18) dos factos provados, nos exactos termos ali mencionados.
Confrontada com a versão do arguido, nas suas declarações em audiência, a assistente assegurou que o seu pai não chamou quaisquer nomes ao arguido, não o agrediu nem pegou em qualquer paralelo, exibindo-o ao arguido, sendo totalmente falsa esta versão relatada por este. Sublinhou que o seu pai é um homem de idade, que ficou logo desfalecido no chão, depois de ser agredido pelo arguido. Acrescentou mesmo que só pensava que o pai ia morrer. A salvação foi que chegou um carro e o arguido fugiu.
A assistente referiu que o seu pai levou muitos murros, pelo que, nem em sua defesa conseguiu agredir o arguido.
Acrescentou que o seu pai tem problemas cardíacos e que o arguido sabia disso, e que em consequência da agressão do arguido, o pai ficou com as próteses dentárias partidas.
Referiu que quando chegou a casa, com o pai muito agredido, a sangrar, o filho estava lá e mais uma vez viu o estado da mãe e do avô e ficou em pânico.
Afirmou que até hoje o pai dela não compreende esta agressão, pois acha que fez pelo arguido o que um pai faz por um filho. Ficou muito triste, muito transtornado, sofrido. O seu pai é uma pessoa muito amiga, sociável, querida por todos, não é dado a conflitos.
A assistente referiu que, durante o período em que viveu maritalmente com o arguido e até ao dia 31 de Março de 2014, este foi detentor de uma arma.
Acrescentou que, quando saiu de casa, com medo por ele ter uma arma, pediu para o pai dela levar a arma a casa dos pais dele, para a aguardarem em segurança, o que o pai fez.
Perguntada, referiu que a arma que o arguido detinha não era nova e que foi um colega que lhe arranjou, por € 200 ou € 250. Referiu que ele a comprou em 2007 ou 2008, não se recorda muito bem. Quanto ao estojo onde a arma estava guardada, o mesmo foi feito pelo próprio arguido, sendo de pele nova.
Mais se ouviram os depoimentos testemunhais prestados em audiência.
Assim, começou por ouvir-se o demandante cível F…, pai da assistente.
Relativamente aos factos datados de 18/12/2014, descritos na acusação pública, o demandante confirmou os mesmos.
Referiu que naquele dia tinha ido esperar a filha ao trabalho e quando vinham os dois, apeados, numa rua, passou o arguido com o neto e foi levar o menino a casa deles. Quando voltou para trás, cruzou-se com eles, vindo de frente, e passou o carro mesmo junto deles, assustando-os. Referiu que o arguido estava furioso.
O arguido parou o carro, saiu e agrediu-o logo. A salvação dele foi que passou um carro e o arguido fugiu.
Confrontado com a versão do arguido, o demandante negou-a totalmente, afirmando que não dirigiu àquele quaisquer expressões insultuosas.
Referiu que, quando saiu do carro, o arguido foi logo a correr directamente a ele, tendo ele ficado em pânico. Levou um pontapé no peito, caindo logo ao chão, tendo o arguido posto um joelho no seu peito e deu-lhe vários murros, partindo-lhe as próteses dentárias. Perguntado se haveria algum motivo que explicasse tal agressão, o demandante referiu que apenas pode ter sido o facto de, em 2 de Dezembro de 2014 ter pedido ao arguido, por sms, a devolução do dinheiro que lhe tinha emprestado (que o arguido lhe tinha pedido para comprar um carro). Referiu que, se não for esse, não vê qualquer outro motivo que possa ter levado o arguido a agredi-lo daquela forma.
Mais referiu que a assistente, sua filha, foi para casa dele e da sua esposa, em 2 de Abril de 2014. A dada altura, a filha pediu-lhe para ele ir ver um cofre que estava aberto e ver o que estava lá. Ele pegou na arma que estava dentro do cofre e levou-a aos pais dele e pediu-lhes para eles a guardarem antes que o arguido fizesse asneira.
Confrontado com a foto de fls. 60 do apenso B, referiu que a arma não está bem visível, não conseguindo confirmar que fosse aquela que o arguido tinha em casa e que ele entregou aos pais deste.
Referiu que é doente cardíaco, embora apenas tome o medicamento habitual para a hipertensão e acha que o arguido sabia disso.
Mostrou-se muito afectado com toda esta situação, maxime em relação à agressão de que foi alvo, afirmando que foi sempre muito amigo dele.
Referiu que, no dia em que foram levantar umas coisas da antiga casa, o arguido chamou à sua filha, na frente dele, “puta” e “vaca”.
Questionado, referiu que quando o arguido e a sua filha, durante o casamento, iam a casa dele, ele não gostava da forma como o arguido falava para a sua filha, sendo muito agressivo. Disse que qualquer coisa que ele não gostasse, dizia logo à sua filha "vai para o caralho". Ele ficava incomodado, mas procurava não se meter...
Afirmou que o arguido é muito violento, agressivo e não se arrepende do que faz ou diz.
Referiu que vive com medo, até evita andar na estrada, tendo ficado muito triste, envergonhado e traumatizado com a agressão de que foi alvo.
Mais se ouviu o depoimento testemunhal prestado por O…, reformada, trabalhava numa fábrica de têxtil, mãe da assistente. A testemunha referiu que muitas coisas a filha poupava-a, mas coração de mãe não se engana...
Referiu que “aquilo” começou desde que veio o menino da maternidade (referindo-se aos maus tratos do arguido sobre a sua filha).
Referiu que a sua filha teve três mastites, sofreu muito e sozinha, não tendo sequer o arguido deixado que ela fosse, naquele período, para casa dos pais, para ela poder ajudar a filha. A testemunha afirmou que o arguido foi desumano.
Viu a filha com sinais de ter sido agressiva, a 29/06/2010, tendo pedido socorro aos pais, dizendo que tinha sido agredida e que estava fechada no quarto com o menino.
Foram lá, chamaram os pais dele, que também lá foram.
Os pais estavam a segurá-lo, pois ele estava muito nervoso.
Referiu que uma vez viu-a com um braço todo pisado e viu a mordedura nas costas da filha.
Quanto ao marido, referiu que este foi agredido pelo arguido, ele vinha todo ensanguentado, com a boca toda a deitar sangue, tendo-lhe o arguido partido a prótese dentária e tinha a cabeça toda marcada.
Negou que tivesse ocorrido algum episódio, depois da separação, em que o arguido tivesse dirigido palavrões à filha quando foi buscar o menino para visitas, pois eles evitavam que fosse ela a entregar o menino.
Referiu que a sua filha sofreu muito com tudo isto, ficou muito envergonhada e com muito medo.
Quanto ao marido, referiu que ele ficou diferente depois disto, muito triste e com muita vergonha perante os vizinhos. Disse que ele “apanhou” uma grande depressão, não entendendo como aquilo pode ter acontecido pois tinha sido tão amigo dele. Isso criou-lhe também revolta e angústia.
Questionada, afirmou que nunca foi diagnosticada depressão pós-parto à filha.
Referiu que ela teve que ir ao psiquiatra mas foi na sequência do que sofreu com o arguido... (não foi logo a seguir ao parto, talvez uns 8 meses depois...) e, antes nunca tinha tido essa necessidade. Mais se ouviu o depoimento testemunhal prestado por I…, operário químico, irmão da assistente.
Referiu que foi a casa da irmã no episódio datado de 29/6/2010.
Quando chegou a casa da irmã, o arguido estava em tronco nu, com os pais ao lado dele, estando o arguido sempre a insultar a irmã, com expressões como “sua puta”, “sua vaca”, “eu mato-te”, etc.
A testemunha referiu que, naquela altura, perante aquele cenário, disse ao arguido que ele era um cobarde e o arguido quis lançar-se a ele, dizendo-lhe que lhe dava um tiro, mas os pais não deixaram. A sua irmã gritou-lhe, então, para ele ter cuidado que o arguido tinha uma arma.
Questionado, referiu que já antes daquele episódio, a irmã tinha comentado com ele que o arguido tinha uma arma (mas nunca a viu).
A testemunha referiu que todos da família, naquela altura, viviam em estado de terror.
Questionado, referiu que viu a irmã mordida nas costas.
Assegurou que a irmã temia pela própria vida dela e da família.
Questionado, referiu que considera o arguido muito violento e vingativo, acrescentando que a irmã ainda hoje tem medo de andar sozinha na rua.
Julga que os problemas entre o casal surgiram “mal o menino nasceu”.
No que respeita ao pai, referiu que, depois da agressão do arguido, nunca mais foi a mesma pessoa, ficou revoltado e tem muito medo de andar na rua.
Mais se ouviu o depoimento testemunhal prestado por J…, administrativa, amiga da assistente.
Só viu o arguido, uma ou duas vezes e nunca falou com ele.
Afirmou que a assistente não era feliz no trabalho, no início era muito reservada, depois começou a dizer que tinha alguns problemas em casa, com alguma frequência. Quando o marido ia chegar de viagens, notava-se que ela ficava mais nervosa. Quando ele estava fora, notava-se mais tranquilidade nela.
Referiu que a assistente teve mesmo que procurar ajuda a um psicólogo. Afirmou que a assistente acreditava que ainda podia fazer uma família feliz com o marido e o filho, mas não conseguiu.
Ela tinha muito medo, temor mesmo, pânico, do marido e andava em constante sobressalto.
Acrescentou que ela tinha sempre muito medo que o filho presenciasse as discussões, tentava resguardá-lo.
Mais se ouviu o depoimento testemunhal prestado por K…, escriturária e amiga da assistente.
Só conhece o arguido de vista.
Referiu que a assistente era muito reservada, mas depois acabou por lhe dizer que tinha problemas graves no casamento.
Afirmou que chegou a ver marcas de agressão no corpo da assistente, exemplificando com uma marca grande num braço, no dia seguinte a um dia que a assistente lhe disse que tinha sido agredida.
A assistente queixou-se que ele agredia-a verbalmente e fisicamente.
Mais se ouviu o depoimento testemunhal prestado por L…, reformado, era segurança privado.
Referiu ser vizinho da assistente e que não conhece o arguido.
Depôs relativamente à factualidade descrita na acusação pública, datada de 18/12/2014.
Referiu que, naquela altura, passou e viu um carro a parar no meio da rua, saindo dele alguém a correr. Parou mais à frente e viu o sr. F… ensanguentado.
Uns dias depois falou com ele e ele queixava-se de dores.
Mais se ouviu o depoimento testemunhal (de defesa) prestado por M…, professor, que referiu que era vizinho dos dois, arguido e assistente.
Nunca assistiu a desavenças entre o casal Referiu que uma vez foi levar o lixo à rua, tendo passado pelo meio do arguido, da assistente, do pai desta, e outros, tendo ouvido o pai da assistente a chamar nomes ao arguido e que este estava ao telefone.
Nada mais soube dizer, de relevante.
Mais se ouviu o depoimento testemunhal prestado por N…, empregada de balcão, namorada do arguido há cerca de 8 meses.
Referiu que não conhece pessoalmente a ofendida, nem o pai dela,
Referiu que em finais de 2014, altura em que ainda não namorava com o arguido, assistiu a uma situação, próximo da casa dos pais da assistente.
Afirmou que estava em casa, quando o arguido lhe ligou, a dizer que ia levar o menino a casa dos avós e pediu-lhe para ela o acompanhar, pois andava a ser insultado várias vezes pelo ex-sogro.
Ela foi no carro dela, atrás do carro dele.
Quando o arguido entregou o menino na casa dos avós, ela parou o carro mais à frente, não conseguindo ver o arguido, do sítio onde parou o carro.
Depois o arguido voltou para trás, passando pelo ex-sogro e pela ex-mulher. O ex-sogro pôs os braços no ar e pegou num paralelo. O B… estava no carro, parou e saiu e impediu-o de lhe mandar com o paralelo, acabando por se agredirem os dois.
Questionada, referiu que passou um carro perto deles e seguiu sempre.
Disse que estava a uma distância de 6 ou 7 metros, estava noite, mas havia iluminação na estrada.
Referiu que depois daquilo, o arguido parou mais à frente e disse-lhe que ia ao hospital.
Questionada quanto ao motivo porque a testemunha não acompanhou o arguido no próprio carro deste, antes tendo ido atrás dele, no seu próprio carro, a testemunha respondeu “porque não calhou...”, não conseguindo dar uma explicação para tal situação.
Questionada quanto ao motivo de o arguido não ter passado pelo ex-sogro e ex-mulher sem parar, a testemunha não conseguiu explicar. Questionado quanto ao motivo porque não saiu do carro e foi ter com as pessoas, quando se deu a contenda entre o arguido e o ex-sogro, a testemunha respondeu que estava lá apenas para “servir de testemunha”, que “não tinha que se meter com eles”.
No entanto, questionada, referiu que não tirou fotos ou filmou com o seu telemóvel, apesar de o ter consigo, naquela altura.
Referiu que o ex-sogro do arguido com um braço segurava um paralelo e com o outro deu um murro ao arguido.
Eles enroscaram-se um no outro e caíram no chão os dois, mas só viu o ex-sogro a dar um soco no arguido, não tendo visto este a agredir aquele, apenas a defender-se.
Referiu que o ex-sogro chegou mesmo a atirar o paralelo na direcção do arguido, só não lhe acertando por acaso.
Questionado, referiu que não se lembra da cor da camisola do arguido, mas recorda-se da cor do carro que passou por eles naquela altura (cinzento)
Mais se considerou a seguinte prova documental:
- Toda a dos autos, designadamente, autos de denúncia de fls. 3 e 4 do processo principal, 3 e 3 verso do apenso A, 2 a 4 do apenso B, aditamentos de fls. 14 do apenso A e 14 a 19 do apenso B, certidão de fls. 47 e 48, autos de busca e apreensão de fls. 52 a 62 do apenso B, informações de fls. 93 e 105 a 107 do apenso B, registos clínicos de fls. 147 e 147 verso do apenso B, e CRC de fls. 142 a 144.
Mais se considerou a factura de fls. 101, quanto ao pedido cível do Centro Hospitalar do G….
Mais se considerou a seguinte prova pericial:
- Relatórios de perícia de avaliação do dano corporal de fls. 7 a 9 do apenso A e 8 a 10 do apenso B; e Exame de fls. 94 e 94 verso do apenso B.
Quanto aos antecedentes criminais do arguido, o Tribunal valorou o seu C.R.C. junto a fls. 298 e ss. No que respeita às suas condições sócio-económicas, atendeu-se ao respectivo relatório social junto aos autos, a fls. 379 e ss.. Aqui chegados, cumpre, ora, proceder à análise valorativa da prova produzida em audiência de julgamento, explicando o processo de formação da convicção do tribunal.
Desde logo e antes de qualquer outra análise, impõe-se valorar a postura e a qualidade declarativa prestada pelo arguido.
Ora, em audiência, o arguido, que adoptou, durante todo o julgamento, uma postura rígida, de semblante frio, insensível e distante, prestou as suas declarações de forma absolutamente inidónea a criar qualquer credibilidade, apresentando uma versão inverosímil, desapoiada, aliás e não terá sido certamente por acaso, de qualquer prova que sustentasse a mesma, insistindo numa versão em que surgia como bom marido e bom pai, injustiçado por todos e vítima de todos.
Sublinha-se que a única testemunha que sustentou a versão do arguido e, mesmo assim, “inadvertidamente” caindo em algumas contradições em relação a ele, foi a sua namorada, a testemunha N…. Ora, o depoimento desta testemunha foi considerado pelo tribunal como totalmente incredível, falso, claramente “de favor” ao arguido, sendo desconcertante assistir a situações como esta em que testemunhas ainda se prestam a estes lamentáveis papéis, olvidando o seu dever cívico e legal de respeito pela verdade, em nome de paixões (amores ou ódios).
A convicção criada ao tribunal é que esta testemunha não esteve no local, mentindo despudoradamente, em nome da sua relação de namoro com o arguido, razão porque não lhe foi atribuída qualquer credibilidade.
A versão apresentada pelo arguido ao tribunal, já por si não convincente nem credível, colidiu frontalmente com as declarações da assistente, essas sim, no entender do tribunal, verdadeiras e credíveis, além de sustentadas por demais prova (testemunhal, documental e pericial).
A assistente, com um semblante de tristeza visível na sua expressão e de forma muito emotiva, prestou as suas declarações de forma que reputamos de verdadeiras e sinceras. Relatou ao tribunal com bastante clarividência, não obstante a emoção com que o fez, o que só o acrescentou em credibilidade, relatando genericamente como viveu a sua vida, ao lado do arguido, como sua mulher, tendo elucidado o tribunal relativamente aos factos por que o arguido vem acusado e que foram carreados à factualidade apurada. A credibilidade atribuída à assistente, saiu ainda mais reforçada pelos depoimentos dos seus pais, irmão e colegas de trabalho, em audiência, as quais espelharam, na proporção dos respectivos conhecimentos (nos moldes já acima explanados) a vida sofrida que a assistente tinha ao lado do arguido, com constantes agressões físicas e verbais, vivendo a assistente com medo do arguido, por si e pelos seus.
Por outro lado, regista-se que nenhuma das testemunhas de defesa logrou infirmar a credibilidade atribuída à versão da assistente, sendo certo que nenhuma conviveu com o casal ou assistiu a qualquer episódio ocorrido envolvendo o arguido e a assistente.
Por tudo o que ficou dito, valorada a prova produzida, nos moldes atrás expostos, maxime com base nas declarações da assistente, que se nos afiguraram inequivocamente sinceras, rigorosas e verdadeiras e numa análise estribada no bom senso e na experiência da vida, temperados pela capacidade crítica de distanciamento e ponderação, conclui-se, de forma certa e segura, que o arguido praticou os factos por que vem acusado, nos moldes que foram carreados aos factos provados.
No que concerne aos factos provados descritos nos pontos 5), 7) e 19), não obstante a assistente e o seu pai terem sempre falado de “arma”, certo é que a mesma não foi apreendida nos autos (não se provou que a que foi apreendida foi a usada pelo arguido). Assim, o tribunal considerou ser apenas seguro dar como provado que o arguido, naquelas circunstâncias, detinha e exibiu um objecto que aparentava ser uma arma de fogo.
Relativamente aos factos que o tribunal considerou provados e que são estritamente subjectivos (intenções, motivações), estes, porque são apenas percepcionáveis pelo próprio sujeito e, por isso mesmo, designados “subjectivos”, resultam da análise dos factos objectivos.
Com efeito, porque as intenções ou motivações do agente, não são, por natureza, susceptíveis de prova directa, é possível inferi-las dos aspectos objectivos em que se materializa a acção, através do significado que tais actos têm na respectiva comunidade social.
Ora, in casu, os factos que consubstanciam o elemento subjectivo dos crimes imputados ao arguido, resultam de forma clara, evidente e manifesta, dos factos que integram os elementos objectivos típicos dos mesmos.
*
2.4. Motivação dos factos não provados
A factualidade vertida na alínea A) dos factos não provados decorre de falência de prova no seu sentido.
Com efeito, a assistente, questionada quanto à factualidade descrita na alínea A) dos factos não provados, referiu que, por norma, o contacto foi evitado ao máximo, tendo sido sempre atendido pela sua mãe, quando se deslocava a casa dos seus pais, para visitar o filho. Negou, assim, tal factualidade.
O mesmo foi referido pela mãe da assistente, O…, que também negou tal factualidade.
A factualidade vertida nas alíneas B) e C) dos factos não provados decorre igualmente de falência de prova no seu sentido.
Com efeito, a assistente, confrontada com a foto da arma apreendida nos autos, constante de fls. 60 do anexo B, não se mostrou segura quanto ao reconhecimento da mesma, não tendo afirmado, com segurança e certeza, que aquela era a arma do arguido e utilizada por ele nas situações em que a assistente o referiu.
Também o demandante cível F…, confrontado com a foto de fls. 60 do apenso B, referiu que a arma não está bem visível, não conseguindo confirmar que fosse aquela a arma que o arguido tinha em casa e que ele entregou aos pais deste.
A factualidade vertida na alínea D) dos factos não provados, como já acima se aludiu, decorre necessariamente dos factos não provados descritos nas als. B) e C), sendo a vertente subjectiva do tipo legal que lhes corresponde.
A factualidade vertida na alínea E) dos factos não provados decorre de falta de mobilização probatória no seu sentido. Na verdade, não obstante a assistente e o seu pai, o ofendido F…, terem feito referência a doença cardíaca, por parte deste último, certo é que não foi feita alusão a um qualquer diagnóstico de doença cardíaca com especial gravidade, para além da que é comum a grande número de pessoas da idade do ofendido, decorrentes de hipertensão. Veja-se que o próprio ofendido afirmou que apenas toma o medicamento habitual para a hipertensão, achando que o arguido sabia disso. O ofendido não mostrou em audiência que sofresse de qualquer debilidade especial, quer em razão da sua idade, quer em razão de doença. A factualidade vertida nas alíneas F), G) e H) dos factos não provados decorre igualmente de falência de prova no seu sentido. Sublinha-se que esta factualidade foi invocada pelo arguido, na sua contestação escrita. Porém, o arguido, tal como já fizemos alusão aquando da motivação dos factos provados e para onde aqui nos permitimos remeter, para evitar repetições, não logrou convencer o tribunal da veracidade das suas afirmações, antes se revelando titubeante e inverosímil, nas explicações dadas ao tribunal. Ao contrário, o tribunal alicerçou a sua convicção nas declarações prestadas pela assistente E… e pelo demandante F…, não só por si, já que os consideramos sinceros, verdadeiros e, por isso credíveis, como também porque suportada em demais prova apresentada, testemunhal, documental e pericial.
Especificamente no tocante ao facto vertido na al. H), regista-se que o próprio arguido, nas suas declarações, admitiu saber que o seu ex-sogro tinha problemas cardíacos, mas referiu também que, não obstante isso, era “muito energético”.
Diferente é a circunstância de o arguido ter conhecimento que tal doença era debilitante ao ponto de o tornar particularmente indefeso o, como vimos, na al. E) dos factos não provados, tal facto, bem como o conhecimento do mesmo por parte do arguido, foi dado como não provado.»
*
Conhecendo.
Desde logo, das causas de nulidade da sentença, pelos efeitos que podem acarretar, a verificarem-se.
E em função das consequências que a lei prevê, o conhecimento da nulidade decorrente do incumprimento do artigo 358.º do Código de Processo Penal deve preceder o da que decorre da insuficiente falta de fundamentação da matéria de facto selecionada.

A lei processual penal impõe conteúdos obrigatórios à acusação e à pronúncia – nos seus artigos 283.º, n.º 3, e 308.º, n.º 2.
Exigência que deriva das finalidades que se reconhecem a tais peças processuais, entre as quais se destaca a delimitação do objeto do processo e a garantia de possibilidade de exercício efetivo, por banda do arguido, de todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para defender a sua posição e contrariar a acusação.

A estrutura acusatória do nosso processo penal, consagrada no n.º 5 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa[3], significa, desde logo, que é pela acusação [ou pela pronúncia, havendo-a] que se define o objeto do processo [thema decidendum].
Segundo Gomes Canotilho e Vital Moreira[4], «O princípio acusatório (…) é um dos princípios estruturantes da constituição processual penal. Essencialmente, ele significa que só se pode ser julgado por um crime precedendo acusação por esse crime por parte de um órgão distinto do julgador, sendo a acusação condição e limite do julgamento. Trata-se de uma garantia essencial do julgamento independente e imparcial. Cabe ao tribunal julgar os factos constantes da acusação e não conduzir oficiosamente a investigação da responsabilidade penal do arguido (princípio do inquisitório).»
Esta vinculação temática do Juiz do julgamento – à matéria constante da acusação – constitui para o arguido uma garantia de defesa, na qual se inclui claramente o princípio do contraditório, que traduz[5] «o dever e o direito de o juiz ouvir as razões das partes (da acusação e da defesa) em relação a assuntos sobre os quais tenha de proferir uma decisão; o direito de audiência de todos os sujeitos processuais que possam vir a ser afectados pela decisão, de forma a garantir-lhes uma influência efectiva no desenvolvimento do processo; em particular, direito do arguido de intervir no processo e de pronunciar e contraditar todos os testemunhos, depoimentos ou outros elementos de prova ou argumentos jurídicos trazidos ao processo, o que impõe designadamente que ele seja o último a intervir no processo; a proibição por crime diferente do da acusação, sem o arguido ter podido contraditar os respectivos fundamentos.»

Todavia, as preocupações de justiça subjacentes ao processo penal fazem com que tal estrutura acusatória não tenha sido consagrada de forma absoluta.
Efetivamente, como decorre do disposto no artigo 124.º e do n.º 4 do artigo 339.º, em julgamento devem ser apresentados todos os factos invocados pela acusação, pela defesa, e pelo demandante civil, quando o haja, produzidas e examinadas todas as provas e explanados todos os argumentos, para que o Tribunal possa alcançar a verdade histórica e decidir justamente a causa.
Por outro lado, relativamente ao thema decidendum, o legislador não colocou quem julga na total dependência dos intervenientes processuais. Neste domínio, surgem as possibilidades de alteração factual – alteração não substancial e substancial – consagradas nos artigos 358.º e 359.º do Código de Processo Penal.

Mas estas questões «hão-de ser resolvidas com o recurso ao conceito de identidade do facto processual (ou, do objecto do processo), dentro dos parâmetros estabelecidos pelos princípios da legalidade, da acusação (nas vertentes de garantia de independência e imparcialidade do julgador e no domínio dos direitos de defesa, impedindo que o arguido seja surpreendido “…com novos factos ou com novas perspectivas sobre os mesmos factos para os quais não estruturou a defesa”) e do princípio da proibição da rejormatio in pejus que, deste modo, funcionam como limites inultrapassáveis de garantia da posição do arguido.»[6]

A importância desta matéria, pela sua abrangência e forma como tem sido interpretada, deu já origem, e por diversas vezes, à intervenção do Supremo Tribunal Justiça para fixação de jurisprudência obrigatória – Assento n.º 2/1993, de 27 de janeiro de 1993 [publicado no Diário da República, I Série, de 10 de março de 1993] [7], Assento n.º 3/2000, de 15 de dezembro de 1999 [publicado no Diário da República I Série–A, de 11 de fevereiro de 2000] [8], Acórdão Uniformizador n.º 7/2008, de 25 de junho de 2008 [publicado no Diário da República, 1ª Série, n.º 146, de 30 de julho de 2008] [9], Acórdão Uniformizador n.º 11/2013, de 11 de junho de 2013 [publicado no Diário da República, 1.ª Série, n.º 138, de 19 de julho de 2013] [10] e Acórdão Uniformizador n.º 1/2015, de 20 de novembro de 2014 [publicado no Diário da República, 1.ª Série, n.º 18, de 27 de janeiro de 2015].[11]

Ao Arguido, ora Recorrente, é imputada a prática de um crime de violência doméstica.
Os factos que integram a prática desse crime, tal como se encontram descritos na pronúncia, ocorreram no dia do casamento do Arguido com a Assistente – 29 de agosto de 2009 –, antes de terem contraído casamento – concretamente, no dia 29 de junho de 2009 –, e ainda nos dias 29 de março de 2014, 31 de março de 2014, 30 de setembro de 2014, 9 de dezembro de 2014 e 18 de dezembro de 2014.

Nos pontos 4 e 5 dos factos considerados como provados do acórdão recorrido, considerou-se terem ocorrido no dia 29 de junho de 2010 as agressões que a pronúncia situa como terem acontecido nos dias 29 de junho de 2009 e 29 de março de 2014.
Trata-se, pois, de ocasião não indicada na pronúncia – a de 29 de junho de 2010 – e cuja fixação o Tribunal recorrido justifica como tendo sido data que resulta corrigida do depoimento prestado pela Assistente.
Alteração temporal que não foi comunicada ao Arguido antes da prolação do acórdão.

Considerando o lapso temporal que medeia as datas acabadas de referir, a fixação do dia 29 de junho de 2010, não pode deixar de ser considerada alteração que exige comunicação prévia ao Arguido, com o propósito de lhe permitir defesa. Dito de outra forma, só com a comunicação prévia ao Arguido de alteração relacionada com a ocasião em que ocorreram factos que lhe são imputados e integram a prática de crime se lhe permite um efetivo exercício do seu direito de defesa.

Ao que acresce não ser aceitável – tal como pretende o Ministério Público na 1.ª Instância – que «a retificação do ano não atinge a densificação normativa de alteração não substancial dos factos com relevo para ser comunicada nos termos do artº 358º do Código de Processo Penal.»
Bem pelo contrário.
Atente-se que, de forma pacífica, o crime de violência doméstica tem sido doutrinalmente definido como crime habitual.
«Crimes habituais são aqueles em que a realização do tipo incriminador supõe que o agente pratique determinado comportamento de forma reiterada, até ao ponto de ela poder dizer se habitual».[12]
«O crime habitual, no sentido que à expressão confere a actual legislação, é um crime em que a consumação se protrai no tempo (dura) por força da prática de uma multiplicidade de actos “reiterados". Que a persistência temporal na consumação se não dá mediante a prática de um só acto, mas de uma multiplicidade deles - eis o que distingue o crime habitual do crime permanente; que os actos que vão consumando o crime são, não sucessivos, mas reiterados - eis o que distingue o crime habitual do crime contínuo. O ponto central da definição do crime habitual é, por isso, o que deve entender-se por "actos reiterados". (...) Apenas se pode admitir a "consumação por actos reiterados" (um crime habitual) em casos especiais – o mesmo é dizer, nos casos e termos em que isso é expressamente possibilitado pelo tipo de crime. (...) Como a doutrina indica, os crimes "habituais" (seja qual for o entendimento a dar à "habitualidade" do crime, o mesmo é dizer, à "reiteração" dos actos de que se compõe) correspondem a casos especiais em que a estrutura do facto criminoso se apresenta ou, pelo menos, pode apresentar mais complexa do que habitualmente sucede e se desdobra numa multiplicidade de actos semelhantes que se vão praticando ao longo do tempo, mediante intervalos entre eles.»[13]

A tutela do direito penal, face ao disposto no n.º 1 do artigo 30.º do respetivo compêndio, reporta-se, por regra, a atos isolados, dando origem a que cada ato configure um crime autónomo.
Situações ocorrem, no entanto, em que se impõe prevenir acontecimentos distintos. Para o que se configuraram, doutrinariamente, construções tendentes a punir num mesmo crime variados atos de execução de um ou de distintos tipos consagrados na lei.
No artigo 119.º do Código Penal, que se reporta ao início do prazo de prescrição do procedimento criminal, acolheram-se algumas das referidas construções – as do crime permanente [na alínea a) do seu n.º 2], do crime continuado [na alínea b) do seu n.º 2], do crime habitual [na alínea b) do seu n.º 2]. E no n.º 3 do artigo 19.º do Código de Processo Penal reconhecem-se os crimes que se consumam por atos sucessivos ou reiterados, também designados por crimes prolongados, de trato sucessivo ou exauridos.

Os crimes habituais não podem deixar de se considerar como “modalidade” dos crimes prolongados, protelados, protraídos, exauridos ou de trato sucessivo.
E em crimes desta natureza, a incidência do tempo na unidade resolutiva que os caracteriza «não pode deixar de se tomar em apreço, e até comprometê-la mesmo, se decorrer um largo hiato de tempo entre as múltiplas condutas (…).
É decisiva a conexão temporal que liga os vários momentos da conduta do agente e que funda o critério de definição da unidade ou pluralidade de infracções, escreve o Prof. Eduardo Correia, in Unidade e Pluralidade de Infracções, pág.96.
A pluralidade de actos, prossegue aquele penalista, in op. cit., pág. 97, só não determina uma pluralidade de acções típicas na medida em que cada uma delas exprime um puro explodir ou “ déclancher “, mais ou menos automático, da carga volitiva correspondente ao projecto criminoso inicial, ensinando as regras da psicologia que se entre os factos medeia um largo espaço de tempo os últimos da cadeia respectiva já não são a mera descarga dos primeiros, exigindo um novo processo deliberativo.»[14]
Neste mesmo sentido, e mais recentemente se pronunciou o Supremo Tribunal de Justiça[15], ao considerar que «a interrupção dos atos criminosos durante um ano não autoriza a sua unificação».

Posto isto, e quanto aos crimes prolongados, protelados, protraídos, exauridos ou de trato sucessivo,
- é seu requisito processual que o tipo incriminador suponha ou preveja a reiteração e que esta revele uma persistência da resolução criminosa, encerrando uma culpa agravada, que será medida de acordo com o número de condutas e respetiva ilicitude;
- são seus requisitos substantivos positivos a homogeneidade da conduta do agente, a sua repetição no tempo, a violação do mesmo tipo de crime ou de tipos que protegem o mesmo bem jurídico e, em caso de crimes contra as pessoas, a identidade da vítima;
- é seu requisito substantivo negativo a ocorrência de hiato ou hiatos significativos de tempo entre as diversas condutas, de tal forma que coloquem em crise, no âmbito da apreciação dos factos, que a repetição das condutas se deva a uma efetiva tendência ou hábito de vontade criminosa do agente.

Em síntese conclusiva, quanto ao crime de violência doméstica – na sua vertente de ofensas dirigidas ao cônjuge –, não resta senão concluir que, enquanto crime de reiteração, abrange a prática de uma multiplicidade de condutas, reiteradas (e não sucessivas) ao longo de determinado período de tempo (sem hiatos significativos), que se praticaram na pessoa do cônjuge, ainda que de natureza diversa, desde que todas elas se tenham reportado a maus tratos, físicos ou psíquicos.
Com o que se pretende acentuar, convocando as palavras de Plácido Conde Fernandes que «É o estado de agressão permanente que permite concluir pelo exercício de uma relação de domínio ou de poder, proporcionada pelo âmbito familiar ou quase-familiar, deixando a vítima sem defesa numa situação humanamente degradante.»[16]

Porque assim é, a alteração da data em que ocorreram factos com inegável interesse para a decisão da causa, não pode deixar de considerar como alteração não substancial de factos – artigo 1.º, alínea f), do Código de Processo Penal, a contrario.
E que deve ser comunicada ao Arguido, nos termos e para os efeitos prevenidos no artigo 358.º, n.º 1, do Código de Processo Penal.

Deste modo, constituindo tais factos [os descritos nos pontos 4 e 5 dos provados, relativamente à ocasião em que ocorreram] alteração não substancial dos descritos na pronúncia[17], com relevo para a decisão da causa, sem que tivesse sido cumprido o formalismo exigido pelo n.º 1 do artigo 358.º do Código de Processo Penal, ocorre a nulidade da sentença prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 379º, do Código de Processo Penal e a necessidade do seu suprimento.

O que acarreta que fique prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas pelo Recorrente.


III. DECISÃO
Em face do exposto e concluindo, dando parcial provimento ao recurso, decide-se declarar a nulidade do acórdão proferido e determinar que, nos termos e para os efeitos acima referidos, seja dado cumprimento ao disposto no artigo 358.º, n.º 1 do Código de Processo Penal.

Sem tributação.
*
Porto, 2016 abril 20

(certificando-se que o acórdão foi elaborado pela relatora e revisto, integralmente, pelos seus signatários)

Ana Bacelar
Nuno Ribeiro Coelho
__________
[1] Publicado no Diário da República de 28 de dezembro de 1995, na 1ª Série A.
[2] Neste sentido, que constitui jurisprudência dominante, podem consultar-se, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de setembro de 2007, proferido no processo n.º 07P2583, acessível em HYPERLINK "http://www.dgsi.pt/" HYPERLINK "http://www.dgsi.pt/"www.dgsi.pt [que se indica pela exposição da evolução legislativa, doutrinária e jurisprudencial nesta matéria].
[3] «O processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar subordinados ao princípio do contraditório
[4] In “Constituição da República Portuguesa Anotada”, Volume I, Coimbra Editora, 2007, a página 522.
[5] Gomes Canotilho e Vital Moreira, obra citada, a página 523.
[6] Código de Processo Penal – Comentários e Notas Práticas, dos Magistrados do Ministério Público do Distrito Judicial do Porto, página 717.
[7] «Para fins dos artigos 1.º, alínea f), 120.º, 284.º, n.º 1, 303.º, n.º 4, 309.º, n.º 2, 359.º, nºs 1 e 3, e 379.º, alínea b), do Código de Processo Penal, não constitui alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia a simples alteração da respetiva qualificação jurídica ou convolação, ainda que se traduza na submissão de tais factos a uma figura criminal mais grave.»
[8] «Na vigência do regime dos Códigos de Processo Penal de1987 e de 1995, o tribunal, ao enquadrar juridicamente os factos constantes da acusação ou da pronúncia, quando esta existisse, podia proceder a uma alteração do correspondente enquadramento, ainda que em figura criminal mais grave, desde que previamente desse conhecimento e, se requerido, prazo ao arguido da possibilidade de tal ocorrência, para que o mesmo pudesse organizar a respetiva defesa»
[9]«Em processo por crime de condução perigosa de veículo ou por crime de condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, não constando da acusação ou da pronúncia a indicação, entre as disposições legais aplicáveis, do n.º 1 do artigo 69.º do Código Penal, não pode ser aplicada a pena acessória de proibição de conduzir ali prevista, sem que ao arguido seja comunicada, nos termos dos nºs 1 e 3 do artigo 358.º do Código de Processo Penal, a alteração da qualificação jurídica dos factos daí resultante, sob pena de a sentença incorrer na nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 379.º deste último diploma legal»
[10] «A alteração, em audiência de discussão e julgamento, da qualificação jurídica dos factos constantes da acusação, ou da pronúncia, não pode ocorrer sem que haja produção de prova, de harmonia com o disposto no artº 358º nºs 1 e 3 do CPP».
[11] «A falta de descrição, na acusação, dos elementos subjectivos do crime, nomeadamente dos que se traduzem no conhecimento, representação ou previsão de todas as circunstâncias da factualidade típica, na livre determinação do agente e na vontade de praticar o facto com o sentido do correspondente desvalor, não pode ser integrada, em julgamento, por recurso ao mecanismo previsto no art. 358.º do Código de Processo Penal.»
[12] Jorge de Figueiredo Dias, in Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2.ª Edição, Coimbra Editora, página 314
[13] Lobo Moutinho, in “Da unidade à pluralidade dos crimes no direito penal português”, página 620, nota 1854.
[14] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de julho de 2006 – Relator: Armindo Monteiro – processo 06P1709, acessível em www.dgsi.pt/jstj
[15] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 29 de novembro de 2012 – Relator: Santos Carvalho – processo n.º 862/11.6TAPFR.S1 – acessível em www.dgsi.pt/jstj
[16] In “Violência doméstica – novo quadro penal e processual penal” – Revista do CEJ, n.º 8, 1,º semestre, página 307.
[17] Cujo conceito não é objeto de definição legal expressa, mas que se alcança por contraposição com a definição de alteração substancial de factos constante da alínea f) do artigo 1.º do Código de Processo Penal – não substancial será a alteração dos factos que não implica a imputação de crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis.