Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
19640/15.7T8PRT-D.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RODRIGUES PIRES
Descritores: RESPONSABILIDADES PARENTAIS
SUPERIOR INTERESSE DO MENOR
Nº do Documento: RP2024022019640/15.7T8PRT-D.P1
Data do Acordão: 02/20/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – No exercício das responsabilidades parentais em caso de divórcio ou de cessação de união de facto o tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor.
II – Se o progenitor com o qual o menor reside obstaculiza o cumprimento do regime de visitas, essa atitude deve ser sancionada nos termos do art. 41º, nº 1 do RGPTC, mas dela não decorre, como efeito necessário, a alteração da sua residência.
III – Não satisfaz o interesse do menor a alteração da residência de uma criança de nove anos de idade, colocando-a a residir com o pai numa diferente zona geográfica, quando sempre tem vivido com a mãe, com a qual tem uma forte relação afetiva, e se encontra devidamente integrada no sistema de ensino na área onde reside.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 19640/15.7 T8PRD-D.P1
   Comarca do Porto – Juízo de Família e Menores – Juiz 2

   Apelação

   Recorrente: AA

   Recorrida: BB

   Relator: Eduardo Rodrigues Pires

   Adjuntos: Desembargadores Fernando Vilares Ferreira e Maria da Luz Teles Menezes de Seabra

   Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto:

   RELATÓRIO  

AA, progenitor de CC, nascida em ../../2014, veio deduzir incidente de incumprimento do exercício das responsabilidades parentais contra a progenitora desta, BB, alegando o não cumprimento do regime de visitas.

Realizaram-se várias conferências de pais e também diversas tentativas de convívios da criança com o seu progenitor.

Foram solicitadas perícias psicológicas e psiquiátricas aos progenitores e à criança.

Não se logrando chegar a acordo nestes autos, as partes foram notificadas para apresentarem alegações, o que fizeram, tendo apresentado prova.

Realizou-se audiência de discussão e julgamento, durante a qual foi determinada a intervenção da Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar a sugestão da Pedopsiquiatra que acompanha a menor CC.

   Por fim, foi proferida decisão que julgou procedente o presente incidente de incumprimento e, em consequência:

   - Condenou a requerida pelo incumprimento do regime relativo ao exercício das responsabilidades parentais, na vertente das visitas, fixando a multa no montante de 2.040,00€, nos termos do art. 41º, n.º 1 do RGPTC (Regime Geral do Processo Tutelar Cível).

   - Determinou-se a continuação da intervenção da Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar na mediação dos convívios da criança CC com o seu progenitor, até estar normalmente implementado o regime de visita/convívios da CC com o seu progenitor, devendo ambos os progenitores cooperar no sentido de no mais curto espaço de tempo tais convívios serem normalizados.

   - Fixou-se a residência da criança junto da sua progenitora, no Algarve.

   - EXERCICIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS:

 As responsabilidades parentais, relativas às questões de particular importância para a vida da criança, serão exercidas conjuntamente por ambos os progenitores, nos termos do art.º 1906.º, n.º 1 do Cód. Civil (na redação da Lei n.º 61/2008, de 31/10), cabendo ao progenitor com quem a criança reside habitualmente, as decisões relativas aos atos da vida corrente, nos termos do art.º 1906.º, n.º 3 do Cód. Civil (na redação da Lei nº 61/2008, de 31/10).

   - VISITAS:

   Logo que os convívios da criança CC e do seu progenitor estejam normalizados, o que ocorrerá aquando da indicação da Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar.

   * O pai estará com a criança CC em fins de semana alternados.

   * O primeiro fim de semana terá início na semana seguinte a ter havido indicação da SPTF.

   * O pai recolherá a criança, na sua residência, na sexta feira, no final das atividades letivas, entregando-a no domingo, pelas 20 horas em casa da mesma.

* As festividades de Natal e Ano Novo serão passadas alternadamente com cada um dos progenitores, estipulando-se, desde já, que no presente ano [2023] a véspera de Natal e o dia de Natal serão passados com a mãe, e a véspera de Ano Novo e o dia de ano novo serão passados com o pai.

* Para o efeito, o pai recolherá a menor na sua residência às 10:00 da véspera de ano novo e aí a entregando no dia 2 de janeiro pelas 20 horas.

   * O pai terá direito a passar 7 dias de férias com a menor no Natal, devendo avisar a mãe qual o período para o efeito até ao final do mês de outubro, recolhendo a menor na sua residência às 10:30 do dia indicado e entregando-a às 20:00 do último dia.

   * A criança passará 15 dias das suas férias escolares de verão com cada um dos progenitores, a combinar tais períodos até ao final de abril de cada ano.

   * Em caso de sobreposição de datas, nos anos pares prevalece a data indicada pelo pai, e nos anos ímpares a data indicada pela mãe.

* No dia de aniversário da criança, a mesma tomará, alternadamente, uma das principais refeições com cada um dos progenitores, a iniciar-se no próximo ano o almoço com a progenitora e o jantar com o progenitor.

* No dia de aniversário dos progenitores, a criança passará o dia com o progenitor homenageado.

   * No dia da mãe e no dia do pai, a criança passará o dia com o progenitor homenageado.

* O pai falará com a filha às quartas-feiras, pelas 20 horas, através de videochamada por ele efectuada por WhatsApp para o telemóvel da mãe ou outro que esta vier a indicar.

* O progenitor poderá participar em todas as atividades da escola onde a criança se encontra integrada, nomeadamente as festas de Natal, Páscoa, Final de ano, dia do Pai, e outras em que a criança participe e esteja envolvida.

* A escola que a criança frequenta deverá comunicar ao progenitor todas as informações referentes à criança, e as datas dos eventos/festas/atividades em que a criança esteja envolvida, por forma a que este possa estar presente.

* No resto mantém-se o já determinado no processo apenso de RPP.

    Mais se determinou a notificação da SPTF de que foi fixada a residência da criança CC, junto da sua mãe, no Algarve e de que deverá continuar a implementar os convívios da criança com o seu progenitor, até à normalização dos mesmos, com a indicação de que o progenitor regressará a Portugal, em finais de novembro de 2023, devendo nessa altura a SPTF agendar a continuação das sessões de convívio da criança com o pai.

   Quando os convívios da criança CC com o seu pai já se encontrarem normalizados deverá, tal SPTF, dar conhecimento aos progenitores por forma a que de forma natural se inicie o cumprimento do regime de convívios determinado, na sentença proferida nesta data, em meio natural de vida.

   Determinou-se também que se dê conhecimento à Escola que a criança frequenta, de que a mesma deverá comunicar ao progenitor todas as informações (nomeadamente as informações escolares e outras) referentes à criança, e as datas dos eventos/festas/atividades em que a criança esteja envolvida, por forma a que este possa estar presente e assistir ou participar nas mesmas.

Inconformado com esta decisão dela interpôs recurso o progenitor/requerente, tendo este finalizado as suas alegações com as seguintes – e muito extensas - conclusões[1]:

   1. Vem o presente recurso interposto da sentença, com a Ref.ª 452547473, proferida nos presentes autos, nos termos do qual o Tribunal a quo determinou:

   2. “(...) a continuação da intervenção da Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar na mediação dos convívios da criança CC com o seu progenitor, até estar normalmente implementado o regime de visita/convívios da CC com o seu progenitor, devendo ambos os progenitores cooperar no sentido de no mais curto espaço de tempo tais convívios serem normalizados.

   3. - Fixa-se a residência da criança junto da sua progenitora, no Algarve.

   4. (...) As responsabilidades parentais, relativas às questões de particular importância para a vida da criança, serão exercidas conjuntamente por ambos os progenitores, nos termos do art.º 1906.º, n.º 1 C.C. (na redação da Lei n.º 61/2008, de 31/10), cabendo ao progenitor com quem a criança residem habitualmente, as decisões relativas aos atos da vida corrente, nos termos do art.º 1906.º, n.º 3 do C. C. (na redação da Lei nº 61/2008, de 31/10).

   5. (...) Logo que os convívios da criança CC e do seu progenitor estejam normalizados, o que ocorrerá aquando da indicação da Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar.”, (sic).

   6. Não pode o Requerente, aqui Recorrente, concordar com tal decisão, porquanto tratando-se, os presentes autos, de um incidente de incumprimento da Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais, deduzido pelo Progenitor contra a Progenitora da Menor, por esta não cumprir com as visitas entre a criança e o pai, entende-se que a decisão recorrida não teve em conta o superior interesse da menor CC, nomeadamente, quanto ao direito, constitucionalmente protegido, de proximidade física com o seu pai.

   7. Veio o Requerente, aqui Recorrente, aos presentes autos, aos 13.03.2018, com intenção de provar os sucessivos e reiterados incumprimentos do regime da regulação das responsabilidades parentais, por parte da Requerida.

8. Resultou de toda a prova produzida, nomeadamente documental, testemunhal e pericial, que efectivamente a Requerida incumpriu com o regime acordado entre os Progenitores e homologado pelo Tribunal a quo.

   9. Após o acordo obtido, nos autos apensos de Regulação das Responsabilidades Parentais, e devidamente homologado por sentença de 17.09.2017, a Requerida apenas cumpriu tal acordo nos fins-de-semana imediatamente a seguir, de 14 a 16 de Setembro de 2017 e de 6 a 8 de Outubro de 2017, nos quais a menor pernoitou com o pai, tendo ocorrido as pernoitas dentro da normalidade – artigos 2, 4, 11, 15, 16, 17, 32, 33, 34, 35 e 40 dos factos provados.

10. No mais, durante o período em que o Requerente e a menor não estavam juntos, foi tentada, por diversas vezes, a realização de videochamadas através do WhastApp, tendo-se realizado apenas algumas e, na maioria das vezes, com muita dificuldade, como melhor se alcança das alegações com a Ref.ª Citius 31134422, de 21.01.2022, das declarações prestadas pelo Requerente, aqui Recorrente, em sede de audiência de julgamento e dos factos provados.

11. Conforme resulta dos factos provados, ao longo dos presentes autos, a Requerida, sempre mostrou uma postura altiva e tirana que, não só não aceita, como ainda impede que o Requerente participe na vida da sua filha, mesmo em questões de particular interesse para a vida da menor – cfr. artigos 6, 8, 9, 10, 11, 12, 14, 16, 18, 19, 21, 22, 26, 27, 33, 89 a 91, 100, 116 a 120 dos factos provados.

12. Ademais, a própria Requerida confessou os diversos incumprimentos, não mostrando qualquer arrependimento, nem tão pouco a disponibilidade em promover a relação da menor CC com o Progenitor, conforme se alcança das declarações prestadas em audiência de julgamento.

   13. No que aos encontros supervisionados respeita, entre 09 de Março de 2019 e 13 de Dezembro de 2021 foram agendadas 34 (trinta e quatro) visitas: 10 (dez) no CAFAP de Silves, 2 (duas) no CAFAP de Albufeira e 22 (vinte e duas) no ISS de Portimão – cfr. resulta dos artigos 47 a 52, 56 a 88, 94 a 97, 101 a 102, 107 a 113, 116 a 120, 129 e 130 dos factos provados.

14. Nesses 34 (trinta e quatro) encontros supervisionados agendados, a menor foi levada somente a 15 (quinze) visitas e apenas conseguiu estar com o Progenitor em 22.11.2019.

   15. Conforme resulta dos factos provados, a Requerida, a sua Mandatária e as pessoas que acompanhavam a menor – amigas, funcionárias, companheiro da Mandatária da Progenitora e até a dona de um restaurante -, não transmitiam a segurança necessária para que a CC acompanhasse as Senhoras técnicas das diversas entidades envolvidas nos encontros supervisionados, por forma a estar com o pai – cfr. resulta dos relatórios referidos na sentença de que se recorre.

   16. Ficando, igualmente, provado que a CC sabe que as pessoas que a acompanham não concordam que a menor contacte com o Progenitor, ora por o revelarem verbalmente, ora pelo comportamento físico e de oposição à colaboração para com as técnicas.

  17. Declarou, a Requerida, que não fala do pai à CC e que, segundo as suas palavras, quem ocupa o lugar do pai, é o tio.

  18. Mais, declarou que não informa o pai sobre a situação escolar da menor, incumprindo, assim, o regime de regulação das responsabilidades parentais estabelecido.

   19. Ademais, ficou provado que a Requerida verbaliza, em frente da menor, que o pai é um agressor – cfr. resulta do artigo 145 dos factos provados, bem como, das declarações da testemunha Senhora Dra. DD.

20. Resultou, ainda, provado que a Requerida alterou a residência da menor sem o acordo do Progenitor, nomeadamente quando declarou que o Requerente protestou quando o informou da alteração da residência da menor do Porto para o Algarve.

   21. No mais, deu-se como provado, através das declarações da própria Requerida, bem como, dos depoimentos das testemunhas - nomeadamente da Senhora Dra. EE, psicóloga da menor, das Senhoras técnicas da EMAT, dos Senhores técnicos dos CAFAP’s e do ISS, bem como, da audição da Senhora Dra. DD, perita que avaliou a menor -, que a CC, quando não se encontra na presença da Progenitora, se apresenta mais autónoma, é comunicativa, desenvolvida, e interage facilmente com os outros e que percepciona que a Progenitora não concorda com as visitas entre a menor e o Progenitor – como resulta dos artigos 124 e 125 dos factos provados e das declarações da testemunha Dra. DD.

   22. Resultou, ainda, provado que a Requerida revela insegurança perante a menor e que apresenta dificuldade em separar-se da CC; não estimula a relação da criança com o pai – nomeadamente através das verbalizações feitas entre dentes: “Lá estamos aqui outra vez...”, “Não estamos aqui a fazer nada...”; transmite a sua ansiedade à menor, sendo que as suas expressões faciais e corporais mostram que não quer que a CC esteja com o pai sendo, portanto, uma influência negativa para a menor, com repercussões no equilíbrio sócio-afectivo da CC a vários níveis – cfr. resulta, entre outros, das declarações da Senhora Dra. FF, técnica do ISS do Porto.

   23. Esta insegurança e dificuldade de separação, foi, igualmente, atestada pelo relatório, junto aos autos principais, (com a Ref.ª Citius 12570495, de 19.10.2016) em que a Requerida apresentava uma elevada dependência relativamente ao suporte dado por outros, demonstrando uma fragilidade, instabilidade e dependência emocional.

24. As declarações e os relatórios dos diversos técnicos responsáveis pelos encontros supervisionados, comprovam que, apesar de a CC afirmar não querer ir ao pai, ou que o pai é mau porque bate, nunca evidenciou uma expressão facial que transmitisse medo, receio, angústia, ansiedade ou aparente sofrimento em ir para o pai, limitando-se, simplesmente, a negar, sem grande emoção associada e respondendo de forma mecanizada, o que comprova que a menor CC tem sido objeto de coacção moral e indução psicológica por parte da mãe, no sentido de rejeitar o pai, apresentando-se a Progenitora como um perigo para a menor.

   25. Ficou provado que a CC, na presença da mãe, se apresenta super dependente e que quando tem oportunidade de conviver com o pai, se mostra feliz, interage com o mesmo de forma salutar, apresentando o Progenitor uma relação com a filha extremamente positiva, carinhosa e dedicada.

   26. Logrou-se provar que, a Requerida não reúne as condições mínimas necessárias para assegurar um desenvolvimento saudável e harmonioso da menor, por ser incapaz de proporcionar à menor os contactos que esta deveria ter com o Progenitor, não subsistindo dúvidas de que estamos perante um claro e grave caso de manipulação.

   27. No mais, assim o entendeu este douto Tribunal, no âmbito do processo n.º 19640/15.7T8PRT-Q.P1, de 14.09.2021:

28. “(…) é manifesta a intencionalidade da ora apelante em impedir por qualquer forma os contactos entre a menor CC e o seu progenitor, o qual aliás e, durante todo este longo e penoso percurso evidenciado nos autos para ter encontros normais e salutares com a menor, nunca desistiu da sua filha, o que é louvável.

   29. Por outro lado, resulta também evidente que a menor CC está, pela intencional acção da sua mãe, ora apelante, demasiado envolvida num conflito que deveria ser apenas de adultos, sendo ainda por aquela de forma evidente manipulada, chegando ao ponto de fazer a menor sentir-se culpada por estar com o pai, tendo a mesma chegado a verbalizar que sabe que a sua mãe fica triste quando está com o pai e que não quer que tal aconteça.

   30. Do que foi possível observar, ainda que a menor CC não tenha relativamente ao seu pai a afectividade desejável, o que se entende por a mesma ter sido desde a sua mais tenra idade utilizada pela ora apelante como “um trunfo” nesta sua “guerra sem quartel” contra o pai da menor, certo é que nos poucos encontros entre pai e filha que se concretizaram, constatou-se que a interacção da menor com o pai decorreu de forma adequada e mutuamente prazerosa, existindo indícios de que, apesar de criticar o pai, acaba por conseguir relacionar-se com o mesmo de forma empática e mutuamente contingente.

   31. Em suma, desses poucos encontros que foram possíveis realizar entre a menor e o seu pai, inferiu-se que o contacto da filha com o pai é positivo, demonstrando-se haver uma relação afectiva mútua significativa.

   32. Certo é que a 1.ª instância e todos os técnicos de que o tribunal se socorreu até ao momento para que se concretizassem, em termos salutares, serenos e profícuos para a menor CC os encontros desta com o seu progenitor, apenas tiverem como objectivo a defesa dos superiores interesses da menor e manter e desenvolver de forma positiva os vínculos afectivos com o seu pai. Muitos dos encontros agendados foram pura e simplesmente impedidos ou obstaculizados por acção ou omissão deliberada da mãe da menor, de onde decorre ser primordial objectivo da mãe da menor o de impedir, obstaculizar ou destruir os actuais vínculos afectivos da menor para com o seu progenitor, afastando-a definitivamente da vida do seu pai.” (…).

33. Resultando, assim, ser fundamental a alteração da residência da menor CC, como meio de salvaguardar o seu superior interesse, considerando que é o Requerente o único Progenitor capaz de assegurar o saudável desenvolvimento da menor, que como, e bem, refere o supra-citado Acórdão do Tribunal da Relação do Porto:

   34. “(…) segundo entendemos, defenderá melhor o interesse do menor o progenitor que ofereça mais garantias de poder vir a promover o desenvolvimento físico, intelectual, moral e afectivo do menor; que revele maior capacidade e disponibilidade para satisfazer as necessidades do menor, incluindo a muito importante disponibilidade para manter com o progenitor não guardião uma sã e natural relação em prol do bem-estar do seu filho, promovendo, estimulando e incentivando os contactos do menor com o progenitor não guardião e com a demais família alargada deste, sem ressentimentos, sem acusações, sem quaisquer recriminações pessoais que possam intervir no bem-estar do seu filho.” (…).

   35. Ainda neste sentido, considerou-se, no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 19.10.2017, que “(…) a alienação parental, não tendo sido cientificamente reconhecida como uma síndroma, consubstancia uma prática social de afastamento emocional do filho face a um dos Progenitores, por ação intencional, injustificada e censurável do outro, nomeadamente porque determinada por interesse egoístas e frívolos próprios, e não pelo «superior interesse» do filho (…).” (…).

   36. No mais, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 09.07.2014, entendeu-se que “(…) a denominada Síndroma de Alienação Parental (SAP) caracteriza-se pela interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, levada a cabo ou induzida por um dos Progenitores, outros familiares ou mesmo terceiros que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância, no sentido de provocar uma quebra ou dano relevante nos vínculos afetivos próprios da filiação existentes até então entre o filho e o Progenitor visado, sem que para tal haja uma justificação moral ou socialmente aceitável (…)” (…), e esclarece-se que, apesar de a Síndroma de Alienação Parental não se tratar de uma doença, esta existe como fenómeno social e traduz-se numa interferência na formação psicológica do menor que constitui um abuso moral que é qualificável como maus-tratos.

   37. Neste mesmo sentido, o Tribunal da Relação de Guimarães, no Acórdão de 04.12.20126, anuiu à aplicação do conceito de alienação parental, considerando que “(…) em matéria de regulação do exercício das responsabilidades parentais em caso de divórcio e/ou separação judicial de pessoas e bens, é o nº 7, do artigo 1906º, do Código Civil, bastante claro e incisivo ao determinar que «(…) o Tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois Progenitores (…).”(…).

38. Nesta decisão, entendeu-se, igualmente, que o direito de visita “(…) consubstancia também ele um direito-dever, um direito-função, ou seja, um direito a ser exercido não no interesse exclusivo do seu titular (não é ele um direito subjetivo stricto sensu), mas, sobretudo, no interesse do menor (cf. artigo 1906º, n.º 5, do Código Civil). É que, importa não olvidar, fundamental é atentar que o menor necessita [para que em sede de crescimento físico e mental venha a granjear e a estruturar uma personalidade e um equilíbrio psíquico e mental harmonioso e saudável] “ igualmente do pai e da mãe e que, por natureza, nenhum deles pode preencher a função que ao outro cabe“ e daí que, essencial seja que o relacionamento do menor com o Progenitor a quem não “(…) esteja confiado se processe normalmente e sem resistências ou dificuldades, seja por parte do Progenitor a quem caiba a sua guarda, seja, em segunda linha, por parte do próprio menor (…)”, argumentando-se, ainda, que “(…) essencial é salvaguardar a satisfação da necessidade básica da criança de continuidade das suas relações afetivas sob pena de se criarem graves sentimentos de insegurança e ser afetado o seu normal desenvolvimento (…)”, posto o que, “(…) a negação ou supressão do direito de visita do Progenitor sem a guarda dos filhos apenas poderá justificar-se – e como última “ratio” – no quadro de um conflito extremo entre o interesse da criança e o direito do Progenitor (…)”, alertando-se o Tribunal de 1ª Instância, cuja decisão se revogou, para o facto de a Alienação Parental nem sempre ser obtida por meios ativos, “(…) sendo por vezes levada a cabo de um modo silencioso, o que sucede v.g. quando o cônjuge titular da guarda, diante da injustificada resistência do filho em ir ao encontro do outro Progenitor, se limita a não interferir, dificultando/impedindo o cumprimento de um acordo homologado por sentença, ou seja, uma decisão judicial (…).”(…).

  39. Pelo exposto e de toda a prova assente, dúvidas não restam de a Requerida não reúne condições que permitam garantir que a menor desenvolva uma relação saudável com ambos os Progenitores, uma vez que, é facto notório que a mãe nunca permitirá que menor e Requerente convivam como pai e filha, preferindo utilizar todos os expedientes, lícitos e ilícitos, para manter o afastamento da menor e do Progenitor!

  40. Face ao que abundantemente resulta dos presentes autos, quando a menor se encontra com o Progenitor, sem qualquer interferência da Progenitora, demonstra relacionar-se com o pai de forma empática e prazerosa,

  41. Pelo que, mais não resta concluir que, enquanto a menor residir com a Progenitora nunca conseguirá ter um saudável relacionamento com o seu Pai!

  42. Não se podendo concordar com a decisão do Tribunal a quo, que ao decidir manter a residência da menor CC com a Requerida, mesmo tendo-se provado nos presentes autos que a Progenitora é incapaz de promover uma relação saudável entre a menor e o seu pai, impedindo-a de forma culposa e grave, independentemente de qualquer entidade que medeie os encontros entre menor e Progenitor, não está a atender ao superior interesse da menor.

  43. Provou-se, por demais, que a Progenitora é incapaz de alterar a sua percepção quanto ao saudável desenvolvimento da filha menor, transmitindo que a CC não necessita de pai na sua vida, fazendo de tudo para denegrir a imagem que a menor tem do Progenitor.

  44. Logrou-se provar que, a menor CC, quando convive com o Progenitor sem qualquer interferência da Progenitora e dos adultos que a rodeiam, se apresenta alegre, bem-disposta, feliz.

   45. Conforme aconteceu no dia 31.05.2019, em que a menor CC esteve mais de quatro horas a conviver com o pai no gabinete do Tribunal a quo, na presença da Senhora Dra. FF, técnica do ISS do Porto, que descreveu – no relatório com a Ref.ª Citius 22710182, de 04.06.2019 -, que neste encontro “Pai e filha permaneceram no Gabinete sensivelmente das 14h00 às 18h15, com a presença da Técnica, uma vez que os restantes intervenientes se ausentaram para realização da Conferência.

  46. O convívio decorreu sem interrupções, verificando-se uma fácil, espontânea e contínua interação entre pai e filha.

   47. O pai recorreu ao material lúdico existente na sala, mantendo diálogo com CC, jogando e brincando com esta. CC mostrou-se disponível em todas as brincadeiras do pai, envolvendo-se de forma ativa nas mesmas, manifestando alegria e boa disposição, propondo, também ela, brincadeiras e jogos ao pai.

   48. Durante todo o convívio, o pai brincou e dialogou com a filha, perguntando-lhe (recorrendo aos jogos e livros disponíveis) acerca das suas vivências na escola, na família, nomeadamente as relações de amizade, as rotinas, as comidas que agora prefere, os animais de estimação que tem. CC respondeu sempre ao pai, divertida e disponível, acrescentando espontaneamente observações suas.

   49. Nestes mesmos moldes, o pai foi falando com CC acerca de vivências em comum (o quotidiano, as rotinas, os locais que visitaram, etc). Face a algumas alusões que foram sendo efetuadas pelo pai quanto a brinquedos que tinha em casa deste ou atividades que fizeram em conjunto, CC respondia de imediato que a mãe também já lhe tinha dado um igual ou levado ao mesmo sítio. Contudo, passada essa reação inicial, respondia ao pai com agrado e curiosidade, partilhando com o pai algumas das suas memórias.

  50. A interação entre pai e filha pautou-se sempre pela cumplicidade, numa dinâmica de afeto, sendo o pai responsivo e acompanhando o ritmo de CC, nunca tendo esta perguntado pela mãe ou solicitado a sua presença, nem a intervenção da Técnica presente, estando centrada na interação com o pai.

   51. CC acedeu favoravelmente à perspetiva de estar novamente com o pai no CAFAP, no dia seguinte, tendo combinado com este levar uma caderneta de cromos que este lhe havia oferecido, para ambos verem os que faltavam para completar a coleção.” (…).

   52. E este encontro que se vem de referir, entre filha e pai, apenas aconteceu porque a Requerida desconhecia que o mesmo ia suceder, julgando estar a levar a menor ao gabinete do Tribunal a quo para ser ouvida pela Magistrada judicial do processo e da técnica do ISS do Porto!

  53. Resulta dos factos provados que o Requerente, aqui Recorrente, reúne todas as condições e competências parentais para estar com a filha, sem ser em contexto de supervisão – cfr. referiu o Senhor Dr. GG, do CAFAP do Porto; a Senhora Dra. FF, da EMAT do Porto; a Senhora Dra. HH (psicóloga que acompanhou a menor de Julho a Setembro de 2018); a Senhora Dra. II, da EMAT de Lisboa e a Senhora Dra. JJ, psicoterapeuta do Requerente – artigos 131, 137, 139 dos factos provados.

  54. Reunindo, igualmente, as necessárias condições habitacionais e económicas para receber a menor – de acordo com a técnica da EMAT de Lisboa, Senhora Dra. II.

  55. Logrou-se provar que, o Requerente apresenta um adequado ajustamento psicossocial em geral, apesar de se denotar cansaço mental, como reacção à impossibilidade de estabelecer uma relação com a sua filha, por imposição da Requerida, cfr. resulta das declarações do Senhor Dr. KK, que realizou a perícia psicológica.

  56. Resultou deveras provado que, a Requerida demonstrou sempre acentuada incapacidade de cumprimento das decisões que não lhe são favoráveis, comportando-se como “dona e senhora” da filha, tendo inclusive mantido a menor CC escondida durante três meses (entre 30.04.2018 e 17.07.2018), tendo apenas cumprido a ordem judicial após a emissão de mandado de entrega da criança – cfr. artigos 42, 43 e 44 dos factos provados.

  57. Ademais, provou-se ao longo destes penosos autos, que a Requerida manipula a menor CC, assim como, todas as pessoas com que se relaciona verbalizam e demonstram à CC que não pretendem que tenha uma relação com o Pai.

  58. De referir que, ao longo dos últimos anos, demonstrou a Requerida extrema incapacidade em cumprir os diversos acordos e as decisões do Tribunal a quo, utilizando as mais variadas estratégias dilatórias com o único propósito de impedir o saudável relacionamento entre a menor e o Progenitor.

  59. Toda esta conduta irrazoável, incumpridora, desrespeitadora, manipuladora e apenas orientada para coactar o direito fundamental da menor CC em ter uma relação com o seu pai, adoptada ao longo deste extenso processo pela Requerida, repercute-se negativamente no desenvolvimento da CC, como afirmaram os vários técnicos ouvidos pelo Tribunal a quo, cfr. resulta dos factos provados.

  60. No mais, ficou provado o incumprimento culposo por parte da Requerida, que comprovadamente irá continuar a incumprir qualquer acordo ou decisão judicial!

  61. Foi por demais demonstrado, até pela postura da Requerida no decorrer dos presente autos e da audiência de julgamento, que não existe qualquer vontade por parte da Progenitora em que a menor tenha qualquer tipo de contacto ou relação com o pai, cfr. melhor se alcança dos factos provados, bem como, das declarações da própria Requerida e das testemunhas, nomeadamente, da Senhora Dra. EE, da Senhora Dra. FF, da Senhora Dra. LL, da Senhora Dra. DD, entre outras.

  62. Saliente-se que foi a própria Senhora psicóloga da criança, Dra. EE, que referiu, em sede de audiência de julgamento, a dificuldade latente que a Progenitora tem em se separar da menor, não sendo a sua vontade que esta esteja com o pai, o que se traduz nas expressões faciais da Requerida, sendo esta que inviabiliza os convívios.

  63. Pelo que, a relação de fidelidade com a mãe, afasta a menor CC do pai, que percebe que a mãe se encontra em conflito com o pai, pelo comportamento físico que apresenta.

64. Neste contexto, não se pode concordar com a decisão do Tribunal a quo, no sentido de a menor continuar a residir com a Progenitora, considerando que resultou provado não ser esta capaz de assegurar o superior interesse da menor CC.

   65. Aliás, já este douto Tribunal entendeu, em sede de recurso intentado pela Requerida, no âmbito do processo n.º 19640/15.7T8PRT-Q.P1, de 14.09.2021:

   “(…) segundo entendemos, defenderá melhor o interesse do menor o progenitor que ofereça mais garantias de poder vir a promover o desenvolvimento físico, intelectual, moral e afectivo do menor; que revele maior capacidade e disponibilidade para satisfazer as necessidades do menor, incluindo a muito importante disponibilidade para manter com o progenitor não guardião uma sã e natural relação em prol do bem-estar do seu filho, promovendo, estimulando e incentivando os contactos do menor com o progenitor não guardião e com a demais família alargada deste, sem ressentimentos, sem acusações, sem quaisquer recriminações pessoais que possam intervir no bem-estar do seu filho.” (sic).

   66. O mesmo entendimento teve o Exmo. Senhor Procurador da República, na sua Promoção com a Ref.ª Citius 430941838, de 02.12.2021:

    “É fundamental que a CC deixe de estar sujeita ao stress e ambivalência afectiva provocados pelas constantes tentativas de convívios com o pai, sendo que, ao mesmo tempo que rejeita o pai, aparentemente quando está com ele, gosta da sua presença.

   67. É notório que esta ambivalência de sentires gera instabilidade emocional na CC.

68. A "obrigatoriedade" destes convívios momentâneos, planeados antecipadamente, coloca a CC no centro da guerra que se instalou entre os seus pais, num clima em que o amor cede o seu lugar ao ódio, e em que esta acaba por tomar um dos partidos, situação que não é minimamente desejável.

   69. Por outro lado, também não se pode ignorar as informações disponíveis e já acima referidas, nomeadamente da observação da intenção do pai com a menor no tribunal do Porto, onde se percebe que o contacto da filha com o pai é positivo, demonstrando haver uma relação afetiva mútua significativa.

70. É fundamental que a CC possa sentir que o afeto por cada um dos progenitores não constitui um conflito ou ataque agressivo ao outro progenitor, situação que ambos os progenitores têm que salvaguardar. (…)

71. Os progenitores devem, a todo o custo, zelar pelo harmonioso desenvolvimento da CC, no sentido de evitar que suceda um potencial conflito de lealdade por parte da CC perante qualquer um dos progenitores, separando o que são questões pessoais e conjugais, da esfera da parentalidade.

   72. Em resumo, mesmo que a CC não tenha relativamente ao seu pai a afetividade desejável, constatando-se nela alguma reserva em relação à figura paterna, impõe-se que o relacionamento entre os dois se mantenha e seja até incentivado.

73. No entanto, é nosso parecer que a medida de convívios supervisionados é ineficaz, em nada contribuindo para a aproximação entre a pai e a criança, perpetuando a situação de afastamento afetivo e emocional entre ambos, ao mesmo tempo que claramente compromete o bem-estar emocional da CC. (…)

74. Trata-se de uma situação que já se arrasta há cerca de 3 anos, sem que se obtenha sucesso na realização dos convívios com o pai e a CC, acabando estes por raramente acontecer, independentemente dos técnicos intervenientes.

   75. Tentou-se, inclusivamente, nesta última tentativa para efetivar estes convívios, envolver a psicóloga que acompanha a criança, pessoa com quem a menina tem relação de confiança, no entanto, mesmo com a presença desta profissional, o convívio foi mais uma vez frustrado, não tendo a mãe comparecido no local agendado nem dado qualquer justificação, isto apesar de ter sido atempadamente avisada.

76. Consideramos, efetivamente, que independentemente dos motivos que a levam a tal, é clara a indisponibilidade da mãe para promover a relação da CC com o pai e, logo, seja de forma intencional ou não, promover o vinculo entre ambos, acabando por perpetuar-se o vai e vem de visitas supervisionadas que, até ao momento, não trouxeram nada de positivo à relação da CC com o pai.

77. Assim, sendo de realçar que, tendo a criança estado no Tribunal, no dia 31-5-2019, a conviver com o pai durante quatro horas, no final estava feliz e que, não obstante, logo no dia seguinte, não se logrou efetuar o convívio que esteve marcado para esse dia no CAFAP de Silves e a partir daí, apesar das diligências efetuadas, o progenitor, que nunca desistiu da filha, não conseguiu as mais das vezes estar com esta, não tendo sido encontrados elementos do foro clínico ou criminal que impeçam a CC e o pai de terem vivências adequadas e normativas, no presente caso, é lícito, segundo cremos, concluir que estamos perante o que o Procurador da República JM Nogueira da Costa e a Juiz de Direito, Sandra Almeida Simões, in Sebenta e Breve Formulário de Família e Menores, ed. de 24-1-2019, chamam de “transformação do conflito conjugal num conflito parental, com perturbação da convivência familiar”, no qual a progenitora da criança vê o progenitor desta como “adversário” ou seja, situação de síndrome de alienação parental (SAP).

78. Como se refere na ob. citada, “a «alienação parental» constitui um abuso moral, um maltrato. E, por isso, processos em que tal exista devem ser tramitados como muito urgentes, posto que o tempo da criança não é igual ao tempo do adulto. E sempre com o cuidado de não deixar que a intervenção em rede ou o recurso a perícias ou mesmo a produção de prova seja instrumentalizada pelo progenitor "abusador/maltratante".

   79. “Uma vez desencadeado um processo de SAP, nenhuma tendência de cura se observa, pelo contrário, a maioria dos casos entregues a si próprios evolui de forma grave (...), (sendo que) contrariamente ao que o bom senso parece indicar, o tempo é um inimigo implacável nestes casos, para além de que a noção de temporalidade da criança é diferente da do adulto (...) (requerendo) a SAP (...) um diagnóstico rápido e medidas simples e eficazes (...) (e sendo que) em certos casos de abusos deste tipo é necessário mudar terapeutas, quando o resultado não é adequado”.

   80. E, mais adiante, “a alienação parental é abuso emocional, privar os filhos a convívio saudável é clinicamente patológico (e) a SAP desenvolve um vínculo psicológico de carácter patológico entre o menor e o progenitor alienador, baseado no dogmatismo, na adesão mais férrea e na ausência de reflexão”, sendo que “em casos mais graves, o tribunal deve decidir a transferência da custódia e/ou limitação do contacto com o progenitor alienador, sujeitando-o a uma intervenção psicológica” (…).

81. Na tentativa de encontrar soluções referem os referidos autores na obra citada, o seguinte:

   82. “Ponto 1. Relativamente ao progenitor-vítima, é de extrema importância o convívio diário e integral deste com o menor, designadamente quando possui ótimas condições psicológicas que poderão permitir que o menor "apague" memórias infundadas, relativize um bom pai, melhore os níveis educacionais, aumente a autoestima e diminua os níveis de ansiedade.

83. Ponto 2. Será importante a realização simultânea de Psicoterapia Cognitivo Comportamental ao menor de forma a fazer um "reset” à memória e restabelecer o bem-estar psicológico, como Terapia Familiar para progenitor-menor junto de psicólogo clínico.

   84. Ponto 3. A intervenção pedopsiquiátrica e psiquiátrica poderá ter de ser equacionada, designadamente quando o privar o filho do convívio saudável se revela já como clinicamente patológico, não sendo, todavia, suficiente no contexto processual em que estaremos esta intervenção.

   85. Ponto 4. Não se mostrará nunca possível um progressivo e profícuo estreitar das relações pai/mãe filhos, mesmo num contexto de intervenção psicológica ou pedopsiquiátrica/psiquiátrica se estes continuarem num convívio diário com quem destrói a imagem do progenitor-vítima, pelo que, em casos mais graves, o tribunal deve decidir a transferência da custódia e/ou limitação do contacto com o progenitor alienador, sujeitando-o a uma intervenção psicológica ou mesmo psiquiátrica” (…).

86. Sendo que, como na obra citada também se refere, “em casos de alienação parental o primeiro passo é a desconstrução eficaz do "abuso", como se decidiu no douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, ali mencionado, proferido no dia 9-7-2014, no âmbito do processo nº 1020/12.8TBVRL.P1 e disponível da internet, base de dados da DGSI:- I - A denominada Síndrome de Alienação Parental (SAP) caracteriza-se pela interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, levada a cabo ou induzida por um dos progenitores, outros familiares ou mesmo terceiros que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância, no sentido de provocar uma quebra ou dano relevante nos vínculos afetivos próprios da filiação existentes até então entre o filho e o progenitor visado, sem que para tal haja uma justificação moral ou socialmente aceitável.

87. II - Não se trata de uma doença, mas existe como fenómeno social.

88. III - Esta interferência na formação psicológica do menor constitui abuso moral e é qualificável como maus-tratos.

  89. IV - Em caso de separação de facto do casal, o interesse dos filhos a que alude o n.º 7 do artigo 1906.º do Código Civil e o n.º 1 do artigo 180.º da Lei Tutelar de Menores, aponta no sentido da decisão judicial sobre a guarda dos filhos coincidir com aquela que promova uma relação que construa, preserve e fortaleça os vínculos afetivos positivos existentes entre ambos os pais e os filhos e afaste uns e outros de um ambiente destrutivo de tais vínculos (…).

   90. E manteve, o Senhor Procurador da República, a mesma posição nas alegações apresentadas em sede de audiência de julgamento, de 03.10.2023.

  91. Provou-se, ainda que, é o Requerente, aqui Recorrente, quem apresenta as capacidades para promover e assegurar o saudável desenvolvimento e bem-estar da menor CC, cfr. resulta do relatório social realizado aos Progenitores - junto aos autos aos 29.06.2021, com a Ref.ª Citius 29338619:

92. “Todas as divisões se encontravam arrumadas, organizadas, investidas (tanto ao nível do mobiliário como da decoração), arejadas e luminosas, com sinais de hábitos de higiene doméstica regular. Esta observação é coerente com a visita efetuada pela EMAT Lisboa em 2018, âmbito no qual a técnica subscritora esteve presente, indicando que se trata de um padrão de competência do progenitor.”,

93. Mostrando, o Requerente, possuir “estratégias e competências para apoiar a integração da filha caso a mesma venha a ocorrer, como por exemplo, ele próprio ter uma postura pacificadora e paciente; assegurar apoio psicológico de continuidade (eventualmente com a psicóloga que a acompanhou em Lisboa, conforme consta da Informação sobre Audição Técnica Especializada enviada pela EMAT de Lisboa em 2018); permitir ter um animal de estimação, entre outros.

   94. (…) Face ao exposto, considerou a equipa do SATT de Lisboa que o Sr. AA detém competências parentais, condições habitacionais e socioeconómicas para receber a filha CC, encontrando-se essa equipa disponível para concretizar uma visita domiciliária aquando da eventual presença da criança na residência paterna, seja em sede de convívios, seja aquando da fixação de residência junto deste.

   95. Acrescentamos ainda que foi verbalizado pela técnica que aquando da situação em que a CC esteve a residir com o pai durante cerca de um mês, esta observou a criança na presença do pai, estando esta bem integrada e aparentemente feliz.” (…).

96. Ao passo que, quanto à Requerida, “existem dados relativamente à situação socio económica da mãe que gostaríamos de ter percebido melhor. No entanto, apesar das varias chamadas feitas para a mãe com o intuito de solicitar alguma informação adicional, a mãe não atende o telefone, nem devolve a chamada.

97. Assim, em relação à mãe, sabemos que, no ano transato, a CC residia com a mãe a com a avó, desconhecendo-se, no entanto, se esta situação se mantem. Ao que apuramos através do SISS, a morada mantem-se a mesma, nomeadamente Rua ... – ... .... (…)

   98. Da nossa parte, o que observamos foi que a mãe tem efetivamente muita dificuldade em garantir segurança á CC quando se desloca para os convívios com o pai, tendendo a mostrar-se ansiosa e claramente incomodada com os mesmos, perante a CC.

   99. Apresenta uma atitude muito defensiva para com as técnicas, tendendo a considerar que estão contra si, situação que potencializa uma menor adesão aos convívios entre a CC e o pai. Esta atitude potencializa também uma maior facilidade em se descontrolar quando as coisas não são como idealizaria que fossem.” (…).

   100. Assim, entendemos que urge assegurar o superior interesse da menor CC, quanto ao direito, liberdade e garantia pessoal - nuclear nas responsabilidades parentais -, que é a proximidade física com o seu pai, cfr. plasmado no art.º 36.º, n.º 6, da Constituição da República Portuguesa.

   101. Não se podendo mais permitir a continuidade da negação e supressão deste direito fundamental, cfr. aconteceu ao longo dos presentes autos, pois se se o fizer estar-se-á a compactuar com a Progenitora, que desde 2016 incumpre com todas as decisões do Tribunal.

   102. Motivo pelo qual, entende-se ser de atribuir a residência da menor CC ao Progenitor, aqui Recorrente, com o único objectivo de salvaguardar o superior interesse da menor, fazendo cessar (e ainda é tempo…) este imenso calvário que a criança tem vindo a viver nestes seus primeiros, mas tão importantes, anos de vida.

   103. Pois que, se provou ser o Recorrente o único Progenitor capaz de satisfazer as necessidades da menor CC, designadamente a fundamental disponibilidade para manter com a Progenitora uma sã e natural relação em prol do bem-estar da sua filha, comprovando, ao longos dos autos, ser totalmente capaz de promover, estimular e incentivar os contactos da menor com a Progenitora e com a demais família alargada desta, sem ressentimentos, sem acusações, sem quaisquer recriminações pessoais que possam interferir no bem-estar da CC – cfr. resulta, entre outros, das declarações da Senhora Dra. MM, psicóloga clinica, da Senhora Dra. NN, psicóloga e psicoterapêutica do Progenitor, do Senhor Dr. GG, psicólogo no CAFAP Porto, da Senhora Dra. FF, psicóloga no CDSS do Porto, da Senhora Dra. OO, psicóloga no CAFAP de Silves, da Senhora Dra. HH, psicóloga, da Senhora Dra. II, Técnica Superior, licenciada em psicologia EMAT de Lisboa, do Senhor Dr. PP Psicólogo no INML de Lisboa, bem como, dos relatórios juntos aos autos, cfr. referidos na sentença da qual se recorre.

   Ao decidir conforme a decisão recorrida violou, o Tribunal a quo, os artigos 36.º, n.º 6, da Constituição da República Portuguesa, 1906.º, n.º 7, do Código Civil e os artigos 40.º e 42.º, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível.

   Nestes termos e nos mais de direito, e sempre no superior interesse da menor CC, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, em consequência, revogar a decisão recorrida, substituindo por outra que:

   a) fixe a residência da menor com o Progenitor, aqui Recorrente, ordenando-se a entrega da menor ao Requerente,

   b) altere, consequentemente, o regime fixado quanto à pensão de alimentos, substituindo-o por um que determine o pagamento de uma quantia mensal pela Requerida ao Requerente e

   c) determine um novo regime de visitas, supervisionadas, entre a menor e a Progenitora.

  O Min. Público apresentou contra-alegações nas quais emitiu parecer no sentido de que o recurso apresentado merece provimento.

   O recurso foi admitido como apelação, a subir imediatamente e nos próprios autos.

   Cumpre então apreciar e decidir.


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   FUNDAMENTAÇÃO

   O âmbito do recurso, sempre ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, encontra-se delimitado pelas conclusões que nele foram apresentadas e que atrás se transcreveram – cfr. arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do Cód. do Proc. Civil.


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   A questão a decidir é a seguinte:

  Apurar se deve ser alterado o regime de exercício das responsabilidades parentais definido na decisão recorrida, fixando-se a residência da menor com o progenitor.


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   É a seguinte a factualidade dada como provada na sentença recorrida:

   1 - Consta do acordo obtido, nos autos apensos de RPP, e devidamente homologado por sentença em 17/09/2017, além do mais, o seguinte:

   -“ O pai estará com a menor em fins de semana alternados”.

   - “ Até a menor ingressar em estabelecimento de ensino, o pai recolherá a menor à sexta-feira, às 19:30, na sua residência, onde a entregará no domingo às 20:00”.

-“Decorrido 1 (um) mês sobre o ingresso da menor em estabelecimento de ensino, o pai recolherá a menor, na sua residência, no sábado, às 10:30, entregando-a na segunda-feira, no horário de entrada, no estabelecimento de ensino que a menor frequentar.”

-“As festividades de Natal e Ano Novo serão passadas alternadamente com cada um dos progenitores, estipulando-se, desde já, que no presente ano [2017] a véspera de Natal e o dia de Ano Novo serão passados com a mãe, e o dia de Natal e a véspera de Ano Novo serão passados com o pai. Para o efeito, o pai recolherá a menor na sua residência às 11:30 do dia 25/12/2017, aí entregando às 20:00; no dia 31/12/2017, o pai recolherá a menor na sua residência às 16:00, aí a entregando no dia 01/01/2018, às 11:30.”

   -“O pai terá direito a passar 5 dias (3 dias uteis), um sábado e um domingo) de férias com a menor no Natal, devendo avisar a mãe qual o período para o efeito até ao final do mês de outubro, estipulando-se, desde já, que no ano em curso [2017] o pai passará férias com a menor de 16 de dezembro a 20 de dezembro, recolhendo a menor na sua residência às 10:30 do dia 16 e entregando-a às 20:00 do dia 20.”

   -“O pai falará com a filha às quartas ou às quintas-feiras, através de videochamada por ele efectuada por whatsapp para o telemóvel da mãe ou outro que esta vier a indiciar.”

2 - Quanto ao regime de visitas estipulado no acordo homologado, foi cumprido o fim-de-semana imediatamente a seguir, de 14 a 16 de setembro de 2017, e o de 6 a 8 de outubro de 2017, nos quais a menor pernoitou com o pai, tendo ocorrido as pernoitas dentro da normalidade.

3 - No fim-de-semana de 29 de setembro a 01 de outubro de 2017, por razões profissionais, o Requerente pediu à Requerida que se procedesse a uma troca desse fim-de-semana com o seguinte, ao que aquela acedeu.

   4 - A menor passou o fim-de-semana, de 06 a 08 de outubro de 2017, com o Requerente, tendo apresentado uma postura alegre, confiante e tranquila, tendo pai e filha passeado e brincado.

5 - Durante o período em que o Requerente e a menor não estiveram juntos, foi tentada, por diversas vezes, a realização de videochamadas através do WhastApp, tendo, em algumas ocasiões, as mesmas se concretizado.

   6 - No dia 13.10.2017, fim-de-semana que a menor passaria com o Progenitor, quando o Requerente foi buscar a menor, esta apareceu no colo da Requerida que, acompanhada pela mãe e uma amiga, repetiu por mais do que uma vez: “Não queres ir com o papá, pois não?”.

   7 - O Requerente sugeriu à Requerida que a menor fosse vista por um psicólogo, por forma a avaliar o seu estado emocional.

   8 - A Requerida disse “não quero nada nem ninguém que venha do teu lado”.

   9 - A 24.10.2017, o Requerente enviou à Requerida, via e-mail, uma listagem de escolas, previamente consultadas pelo Progenitor, com vagas e valores acessíveis, bem como disponibilidades de visita, por forma a colaborar no processo de escolha do estabelecimento de ensino que a menor iria frequentar.

10 - A Requerida respondeu a este email aos 29.10.2017, dizendo o seguinte: “… comentei e expliquei que fosse por motivos relacionados com a CC, fosse por razões pessoais, familiares e profissionais, a entrada da CC numa escola, nunca seria exequível no início do mês de novembro de 2017, facto que ficou bem claro e estabelecido entre nós, assim sendo não entendo o teor e finalidade deste e-mail. No entanto reafirmo o que também te disse, que estou a tratar do assunto, a gerir tudo para que a CC comece o quanto antes a escola e que vamos comunicando sobre o assunto.”

11 - Quando o Requerente foi buscar a menor, no dia 03.11.2017, pelas 19:30, a Requerida apresentou-se com a menor ao colo, segurando-a bem contra o seu peito e dizendo: “Não queres ir com o papá, pois não?”, não tendo a menor querido acompanhar o Progenitor.

12 - O Requerente ainda tentou cativar a atenção da menor com alguns bonecos, o que se tornou inviável considerando que a menor se encontrava no colo da Requerida.

13 - O Requerente acabou por entregar os bonecos à menor e foi embora.

14 - Ainda no mês de novembro, a Requerida comunicou ao Requerente que se encontrava no Algarve, mais precisamente em ....

  15 - A menor deveria passar o fim-de-semana de 25 a 26 de novembro de 2017 com o Progenitor, o que não veio a suceder.

  16 - No dia 7 de dezembro de 2017 a requerida enviou ao requerente um email, dizendo: “…perante a rejeição da CC em estar contigo, parece-me desajustado o que propões, até porque não estava combinado conforme referes, o que se falou foi que esperaríamos por ajuda técnica/apoio psicológico do SNS, para se conseguir uma reaproximação vossa sem mais traumas para a CC…”.

“Nos últimos 2 dias tentei fazer vídeo chamada por WhatsApp o que é impossível, já que a CC fica em pânico, começa a chorar e a fazer xixi pelas pernas abaixo, deixa de dormir e fica muito alterada e refere sempre que não quer falar ou estar com o pai.”

  17 - Nesse fim-de-semana, face ao teor do e-mail referido, o Requerente não se deslocou ao Algarve para a visita, tendo sido a Requerida disso informada, via e-mail, aos 08.12.2017.

   18 - E foi nesse sentido, que o Requerente sugeriu, na comunicação supra mencionada: “… tentar outras abordagens de forma a permitir os meus contactos com a CC, abordagens essas que poderemos ter nos próximos fins de semana. Abordagens mais simples, uns minutos no jardim, umas brincadeiras no parque infantil, uma corrida na praia com um pôr do sol, seguramente milhares de alternativas positivas seriam de pensar e tentar…”.

   19 - Aos 18.12.2017, a Requerida informou o Requerente que a menor já se encontrava inscrita na escola ....

   20 - Foi combinado entre requerente e requerida um encontro, dia 23 de dezembro de 2017, por forma a que o requerente pudesse conviver com a filha CC.

   21 - O encontro realizou-se em ..., junto ao mercado municipal, onde se encontravam animações de Natal e uma bola gigante de neve.

   22 - O Requerente perguntou à menor se queria entrar na bola, mas, a Requerida, passando a mão pelo rosto da menor disse: “A CC não vai andar na bola neste momento, principalmente agora com estes medos que ela tem”.

   23 - A menor assumiu uma postura passiva, pelo que o Requerente propôs outras brincadeiras, como “salvar bolas de esferovite”, jogar à apanhada, que foram muito bem aceites pela menor.

   24 - Durante este período a menor mostrou-se uma criança alegre e feliz, não demonstrando qualquer comportamento de rejeição.

   25 - A visita durou mais de uma hora.

   26 - Enquanto a menor brincava com o Progenitor, a Requerida, por mais do que uma vez, interrompeu a brincadeira e, ao mesmo tempo que colocava a mão na testa da menor, disse “vamos fazer o teste da temperatura da cabeça”.

   27 - Passados uns minutos, colocando o dedo sobre os lábios da menor “vamos fazer o teste da temperatura no lábio”.

   28 - Durante todo o período em que a menor esteve com o Requerente, no dia 23.12.2017, a menor brincou, andou no colo do Requerente, abraçou-o, beijou-o, sem que, em momento algum, tivesse sido forçada a fazê-lo.

   29 - O Requerente entregou o presente de Natal à menor, despediu-se e regressou a Lisboa.

   30 - A menor passaria o fim-de-semana de 06 a 07 de janeiro de 2018 com o Requerente, no entanto, o Progenitor teve de adiar a sua ida ao Algarve por estar com uma forte gripe, situação que foi comunicada.

   31 - Em 19.01.2018, o Requerente enviou um e-mail à Requerida com o seguinte teor: “Olá BB, na minha visita no Natal, não senti nem vi qualquer sintoma de rejeição por parte da CC relação a mim. Assim, venho informar-te que, conforme acordado em tribunal e, visto a CC já frequentar a escola, estarei amanhã às 10:30 no local onde tu te encontras neste momento para ir buscar a CC e, assim ficar com ela durante este fim-de-semana, o qual terminará segunda feira com a entrega da CC na escola na parte da manha. Agradeço que envies a morada da escola da CC e a hora de entrada, a qual pela informação que tenho de tua parte é a de .... Qualquer informação que vejas pertinente para este fim-de-semana, nomeadamente para a situação da escola, envia por favor.”

   32 - No dia em causa, o Requerente, antes de chegar a casa da Requerida, informou-a através de mensagem escrita que estava a chegar.

   33 - A Requerida apareceu à porta, apresentando-se alterada, dizendo ao Requerente para se afastar dela, para nunca mais voltar a casa dela e que a menor não iria sair dali.

   34 - No dia 02.02.2018, tratando-se do fim-de-semana que a menor passaria com o Progenitor, enviou o Requerente e-mail à Requerida com o seguinte teor: “Olá BB, visto ser este o fim-de-semana em que, conforme acordado pelo tribunal, eu e a CC devemos estar juntos, peço que me indiques qual a morada onde devo entregar a CC na segunda feira. Agradeço que me informes se este fim-de-semana conseguirei estar com a CC, conforme estipulado pelo tribunal, sem a tua presença ou supervisão, ou se vais manter a atitude adoptada na última visita, em que me impediste de ver a CC. Tudo isto, por forma a evitar viagens desnecessárias ao Algarve, que como sabes, são dispendiosas, e a minha condição financeira não me permite ir ao Algarve para não estar com a CC.”.

   35 - No mesmo dia, a Requerida respondeu, informando que a menor se encontrava doente, com febre e garganta inflamada.

   36 - O requerente aceitou que a visita não se realizasse nesse fim-de-semana, solicitando à Requerida que o mantivesse informado sobre a evolução do estado de saúde da menor.

   37 - A Requerida respondeu, informando que a menor estava melhor.

   38 - Aos 09.02.2018, o Requerente informou a Requerida, via e-mail, que era sua intenção pedir a troca do fim-de-semana, mas perante a informação prestada, iria aguardar pela recuperação total da menor e passariam juntos o fim-de-semana seguinte.

   39 - Em 14 de fevereiro de 2018, o Requerente, enviou um e-mail à Requerida, informando-a que face à ausência de informação, presumia que a menor já havia recuperado na totalidade, e como tal, questionou a Requerida se iria ser possível estar com a menor no fim-de-semana (17 a 18.02.2018).

   40 - Aos 16.02.2018, o Requerente recebeu um e-mail da Requerida, insistindo na rejeição da menor em relação ao Requerente.

   41 - Tal e-mail termina com a Requerida a informar que a consulta de apoio à CC deveria ocorrer na semana seguinte e que comunicaria quando a mesma estivesse definida.

   42 - Foi fixado, na conferência de pais ocorrida aos 17.04.2018 no âmbito do apenso E (Alteração da Regulação das responsabilidades Parentais), o regime provisório no qual “(…) A CC ficará a residir com o pai, cabendo o exercício das responsabilidades parentais, nas questões de particular importância na vida da criança, a ambos os Progenitores (…)”.

   43 - Em 30.04.2018, o Tribunal, no âmbito do apenso E, concluiu “(...) que esta Progenitora mantém a postura assumida já nos autos em apenso, onde de forma repetida demonstra incapacidade de cumprimento das decisões que não são favoráveis, comportando-se como “dona e senhora” da filha, sujeito autónomo de direitos, e que não é propriedade nem do pai, nem da mãe.”

   44 - Emitiu, o Tribunal, no âmbito do apenso E, mandado de entrega da criança, que se manteve em parte incerta até 17.07.2018, data em que a Progenitora finalmente cumpriu o mandado.

   45 - A menor residiu com o Progenitor até 17.09.2018, data em que, após recurso interposto pela Requerida no TRP, que foi julgado procedente, a menor voltou a residir com a mesma, tendo o tribunal fixado um regime de visitas com pernoita ao pai.

  46 - Na conferência de pais de 26.02.2019, realizada no âmbito deste apenso, obteve-se um acordo provisório, no sentido de se retomarem os contactos do pai com a CC, nos seguintes termos:

  “(…) Durante os próximos 3 meses, o Progenitor poderá estar com a criança aos sábados, de 15 em 15 dias, ocorrendo tais visitas no CAFAP de Silves. As visitas serão supervisionadas pelas Técnicas do CAFAP, devendo estas analisar a situação, e proceder da forma que entenderem mais adequada às circunstâncias, nomeadamente, o Progenitor ausentar-se do local com a criança, devendo o mesmo, caso tal aconteça, entregá-la nas horas indicadas pelas Técnicas nesse mesmo local, com início no dia 09 de março de 2019.”

  47 - No dia 09.03.2019, o Requerente dirigiu-se, de Lisboa, ao CAFAP de Silves por forma a retomar os contactos com a menor CC, tendo sido informado, pela Sra. Psicóloga do CAFAP, de que a CC teria dito que “não queria estar com o pai, porque lhe batia”, pelo que o Progenitor não viu a sua filha nessa data.

  48 - Foi agendada visita supervisionada para o dia 23.03.2019, que não se realizou, cfr. descrito no requerimento com a Ref.ª Citius 22012491, de 26.03.2019.

  49 - Posteriormente, foi marcado convívio entre menor e progenitor para o dia 29.03.2019, tendo a Requerida informado o CAFAP de Silves de que não iria comparecer com a menor - cfr. requerimento com a Ref.ª n.º 31982572, de 27.03.2019.

  50 - Foi necessária a intervenção deste Tribunal para a marcação de nova visita para o dia 30.03.2019, não tendo, porém, nesse dia, uma vez mais, o Requerente visto a menor, tudo cfr. descrito no requerimento com a Ref.ª 32027024.

  51 - No encontro marcado para o dia 04.05.2019, voltou o Requerente a não ver a menor.

  52 - No dia 18.05.2019, não se logrou realizar o encontro da criança com o pai, de acordo com o descrito no relatório do CAFAP de Silves, de 20.05.2019, com a Ref.ª 22552058 (de 21.05.2019).

  53 - No dia 31.05.2019, data da conferência de pais, e nas instalações do tribunal de família e menores do Porto e por intervenção do Tribunal, conseguiu, o Requerente estar com a sua filha, tendo convivido durante mais de 4 horas com a sua filha, na presença de uma técnica do ISS. (relatório junto a fls.294 e segs. destes autos; gravação de vídeo realizada do início do convívio).

  54 - O convívio foi descrito pela Exª técnica do ISS da seguinte forma:

  Neste encontro, “Pai e filha permaneceram no Gabinete sensivelmente das 14h00 às 18h15, com a presença da Técnica, uma vez que os restantes intervenientes se ausentaram para realização da Conferência.

   O convívio decorreu sem interrupções, verificando-se uma fácil, espontânea e contínua interação entre pai e filha.

   O pai recorreu ao material lúdico existente na sala, mantendo diálogo com CC, jogando e brincando com esta. CC mostrou-se disponível em todas as brincadeiras do pai, envolvendo-se de forma ativa nas mesmas, manifestando alegria e boa disposição, propondo, também ela, brincadeiras e jogos ao pai.

   Durante todo o convívio, o pai brincou e dialogou com a filha, perguntando-lhe (recorrendo aos jogos e livros disponíveis) acerca das suas vivências na escola, na família, nomeadamente as relações de amizade, as rotinas, as comidas que agora prefere, os animais de estimação que tem. CC respondeu sempre ao pai, divertida e disponível, acrescentando espontaneamente observações suas.

   Nestes mesmos moldes, o pai foi falando com CC acerca de vivências em comum (o quotidiano, as rotinas, os locais que visitaram, etc). Face a algumas alusões que foram sendo efetuadas pelo pai quanto a brinquedos que tinha em casa deste ou atividades que fizeram em conjunto, CC respondia de imediato que a mãe também já lhe tinha dado um igual ou levado ao mesmo sítio. Contudo, passada essa reação inicial, respondia ao pai com agrado e curiosidade, partilhando com o pai algumas das suas memórias.

   A interação entre pai e filha pautou-se sempre pela cumplicidade, numa dinâmica de afeto, sendo o pai responsivo e acompanhando o ritmo de CC, nunca tendo esta perguntado pela mãe ou solicitado a sua presença, nem a intervenção da Técnica presente, estando centrada na interação com o pai.

   CC favoravelmente à perspetiva de estar novamente com o pai no CAFAP, no dia seguinte, tendo combinado com este levar uma caderneta de cromos que este lhe havia oferecido, para ambos verem os que faltavam para completar a coleção.”

   55 - Foi a progenitora que, no dia referido nos artigos 58º e 59º conduziu a criança CC ao gabinete do tribunal, não sabendo, contudo, que o progenitor iria estar presente em tal gabinete.

   56 - No dia 01.06.2019, a Requerida levou a menor ao CAFAP de Silves, juntamente com a sua Mandatária e uma Senhora que, de acordo com o relatório das técnicas do CAFAP, “se apresentou como sendo a pessoa que come as cerejas à CC”, sendo que após o envio de mensagens através do telemóvel, da Mandatária da Requerida para o telemóvel do CAFAP, chegadas ao local, foi solicitado à Técnica que fosse “(...) até ao carro para retirar a CC do mesmo visto que ninguém que estava no carro conseguiu fazê-lo. (...)”.

    57 - À tentativa de conversa e brincadeira por parte da Técnica, a CC “(...) só diz não, não, não e foge para um lado e para o outro no banco de trás.”, procurando a sua mãe, que se encontrava no pátio do CAFAP, atrás de um pilar, mas visível pela menor, pelo que a Técnica lhe solicitou que se ausentasse.

   58 - Não conseguindo que a CC a acompanhasse até às instalações do centro, a Técnica chamou o Requerente no sentido de tentar levar a criança a sair da viatura, tendo este se dirigido à filha que, mais uma vez, repetiu “(...) não, não, não.”

   59 - A Mandatária da Requerida dirigiu-se ao Requerido[2], “(...) com um tom alto: “arranque-a, leve-a, tire-a à força AA”, pelo que a “(...) a CC começa a chorar compulsivamente e bem alto, a mandatária tira-a do carro dizendo que não consegue ver isto e pede para a Técnica terminar, “não posso mais ver este sofrimento, acabe com este sofrimento Dra. BB” (...)”, pelo que a Sra. Técnica, conclui: “Questionamo-nos porque é a mandatária quem fica para a entrega da CC e não a progenitora, será este um fator ansiogénico?

  60 - Aos 12.06.2019, o Requerente, não tinha sido, ainda, contactado, pelas Técnicas do CAFAP de Silves, no sentido de confirmar o encontro familiar do Sábado seguinte (15.06.2019), telefonou, este, para o centro, tendo a Sra. Dra. OO lhe comunicado que não se encontrava programado qualquer encontro, na medida em que, os três (3) meses para os quais foram oficiadas as visitas, em finais de fevereiro de 2019, já teriam terminado.

  61 - Decidiu, este Tribunal que “(...) mostra-se, no superior interesse da mesma (criança), conveniente e mesmo imprescindível dar continuidade ao “trabalho” no sentido da reaproximação da CC ao progenitor. Qualquer quebra, neste momento, mostra-se prejudicial nos convívios com o mesmo. Assim sendo, mantem-se o já determinado a fls. 77 vs, relativamente às vistas supervisionadas no CAFAP de Silves. Devendo a próxima visita ser realizada, conforme já agendada”.

  62 - Em 13.06.2019, determinou-se, por despacho, que “(...) a intervenção do CAFAP de Silves não deverá cessar, pelo menos para já. (...)”, ao que o CAFAP respondeu que não se encontrava agendado qualquer “(...) encontro familiar para o sábado de 15.06.2019, devido há existência de outros compromissos profissionais já assumidos por parte do Centro (...).”

  63 - No que respeita ao encontro seguinte, que se deveria ter realizado no dia 28.06.2019, foi o Requerente contactado via sms, apenas na véspera da visita, confirmando a marcação do encontro para as 12:30 do dia seguinte, pelo que, encontrando-se o Progenitor, nesse dia, em Madrid a título profissional, teve que organizar muito rapidamente a viagem até Lisboa e, de seguida, até ....

  64 - O Requerente chegou ao CAFAP, sensivelmente à hora marcada, tendo aguardado junto das Técnicas presentes que a Requerida chegasse com a CC.

  65 - Tendo em conta o atraso da requerida, solicitou o Requerente às Sras. Técnicas que contactassem com a Requerida, no sentido de averiguarem o motivo pelo qual esta ainda não se tinha dirigido ao Centro, ao que estas responderam que lhe enviaram a mesma SMS (que enviaram para o Progenitor) e que foi recebida.

  66 - O encontro familiar entre o Requerente e a filha não se realizou.

  67 - O CAFAP efetuou relatório em que se diz que, no dia do encontro, foi rececionada uma SMS da Progenitora, pelas 15:43, ou seja, quase 3 horas depois da hora marcada para o início do encontro familiar, “(...) justificando a não comparência no Encontro Familiar.”, sem referirem qual o motivo justificativo dessa não comparência.

  68 - Atenta a animosidade gerada pela Requerida e sua Mandatária junto do CAFAP de Silves, veio este centro pedir o seu afastamento do processo, passando o acompanhamento a ser garantido pelo CAFAP de Albufeira.

   69 - Este CAFAP (de Albufeira) marcou um atendimento com a Requerida para 18.07.2019 – não tendo esta comparecido - e a primeira visita, que foi agendada para 30.08.2019, voltou a frustrar-se, como melhor se alcança do teor do requerimento com a Ref.ª n.º 33342590, de 10.09.2019.

   70 - Na sequência da informação, transmitida pela Mandatária da Requerida ao CAFAP de Albufeira, vertida na informação com a Ref.ª Citius 23551332, de 16.09.2019, consta que a Mandatária da Progenitora lhes terá referido que – “(…) antes de realizar qualquer ponto de encontro familiar tínhamos que pedir informações à psicóloga bem como à pedopsiquiatra referindo que ficou em despacho contudo já reli o despacho e não contem tal informação.”, não voltou o CAFAP de Albufeira a agendar novo encontro familiar, aguardando “ (…) novas diretrizes sobre os pontos de encontro familiares visto haver todos estes constrangimentos.”

   71 - Veio a Requerida requerer que tais encontros se realizassem numa outra localidade.

   72 - Em 22.10.2019 determinou-se, por despacho, considerando “… ser vontade da menor CC, que as visitas continuem a ser acompanhadas e mantendo-se a frequência atual, solicite a intervenção ao ISS de Portimão, no sentido de serem efetuadas visitas do progenitor à referida menor, com elaboração do plano respetivo”.

   73 - Foi marcado um primeiro encontro, nos serviços da Segurança Social, em Portimão, para o dia 22.11.2019.

   74 - Nesse encontro a menor foi levada por uma Senhora que tanto o Requerente, como as Técnicas da Segurança Social desconheciam, que dizia à menor: “Não queres ir, pois não CC?”.

    75 - Após algum diálogo positivo, a menor dirigiu-se ao colo do Requerente até à sala dos serviços em questão, onde Pai e filha conviveram, sob a supervisão das Sras. Técnicas, desde cerca das 16:00 até às 17:30, combinando encontrarem-se 15 dias depois.

   76 - No segundo encontro, aos 06.12.2019, a menor foi levada por um casal – pessoas igualmente desconhecidas do Requerente e das Sras. Técnicas - encontrando-se a CC dentro de um automóvel, sentada no colo da referida Senhora, que a "segurava” com os braços, enquanto o Senhor se encontrava na parte exterior do automóvel.

   77 - Uma vez que a Sra. Técnica não conseguiu ter um contacto mais próximo com a menor, solicitou ao Requerente que se dirigisse à menor, tendo a CC apresentado uma feição sorridente quando viu o pai, no entanto, notava-se o seu mal-estar, provocado pelo casal que a acompanhava, nomeadamente, pelo facto de a referida desconhecida afirmar, que "A CC só vai se ela disser sim!" e dirigir-se à menor, dizendo: "Queres ir CC? Se não quiseres ir não vais!”

   78 - O Requerente solicitou, à Senhora supra referida, se poderia colocar a menor na sua cadeira, uma vez que a continuava a agarrar, tendo esta respondido, uma vez mais: "A CC só vai se disser que sim! Queres ir CC?".

   79 - A menor abanou a cabeça, em sentido negativo, pelo que o Requerente, de modo a evitar mais perturbações, despediu-se da filha e afastou-se do interior do carro, tendo, nesse contexto, a Sra. Técnica dado por terminada a visita.

   80 - Foi marcada nova visita supervisionada, no ISS de Portimão, para o dia 20.12.2019, tendo a menor - que se encontrava a chorar -, sido levada pela Mandatária da Requerida, pelo que uma das Técnicas a levou ao colo para outra sala, de modo a tranquilizá-la, mantendo-se a Mandatária junto de outra Técnica e do Requerente.

81 - Apesar dos vários pedidos da Sra. Técnica para que a Mandatária aguardasse noutro local, esta sempre recusou e afirmou, entre outras coisas, que "(…) não saio daqui enquanto a CC não deixar de chorar (…)", encontrando-se referido no relatório do ISS de 26/12/2019 : “ a ansiedade na criança e nos adultos que a acompanham é notória…”.

   82 - Mais uma vez a visita não se concretizou.

   83 - Consta da informação das Técnicas do ISS de Portimão, de 18.12.2019:

   “Face ao quadro atrás descrito parece-nos que até à data, as pessoas que tem acompanhado a CC, não se encontram preparadas para ajudarem a criança. Não se encontram elucidadas de que estas visitas não foram acordadas para se perguntar à criança se o deseja ou não e por outro lado, não estão abertas às explicações das técnicas no sentido de que deixar tal decisão em cima de uma criança de 5 anos é algo extremamente inadequado e ambivalente no que diz respeito aos seus sentimentos de lealdade para com ambos os progenitores.

   Por outro lado, é óbvio que a CC sabe que as pessoas que a acompanham não concordam que ela vá para as visitas, até porque o revelam verbalmente, pelo comportamento físico e de oposição à colaboração para com as técnicas.

   Esta criança precisa de ser apoiada e securizada por parte de todos os elementos que envolvem o processo e de preferência por alguém regular e constante, parecendo-nos que este elemento deverá ser a progenitora. O acordo em conferência de pais, foi entre progenitores e compete aos mesmos viabilizarem o que é o direito da filha de forma assertiva e securizante.

   A entrega da criança deverá ser feita, de acordo com o combinado inicialmente, ou seja, na porta dos nossos serviços, de forma clara e saudável. Questionar constantemente esta criança se quer ou não quer a visita, por parte de alguém adulto que se mostra contra a situação, é um factor destabilizador com repercussões no equilíbrio sócio afectivo da CC a vários níveis (…)”.

    84 - Já na informação de 23.12.2019 -, afirmam as Técnicas:

   “(…) parece-nos que para ser concretizável o que ficou definido, ou seja, visitas/convívios entre pai e filha, terá que existir uma atitude consertada junto da criança, onde a mesma possa sentir segurança de que nada lhe acontece nesses períodos (à imagem da 1ª visita supervisionada, onde a interação entre progenitor e descendente decorreu na normalidade). Por conseguinte, a não ser que venha a existir uma mudança por parte dos adultos na forma como a criança é orientada e conduzida, a próxima visita irá decorrer nos mesmos moldes que estas duas últimas.

    A ansiedade na criança e nos adultos que a acompanham é notória, dando azo a que toda esta reaproximação ao pai resulte inviabilizada e coloque a criança numa situação de enorme tensão emocional e psicológica.”

   85 - Foi marcado novo encontro para o dia 03.01.2020, que voltou a frustrar-se pelo facto de a Requerida/progenitora ter solicitado às Técnicas do ISS de Portimão que retirassem a menor da viatura onde se encontrava, uma vez que a mesma não o iria fazer, tendo as Técnicas informado a requerida que deveria ser a mesma a encaminhar a menor para o convívio com o Progenitor.

  86 - Veio o Tribunal, aos 07.01.2020, ordenar, por despacho com a Ref.ª 410804408 os moldes em que a criança deveria ser entregue - :

   “(…) a progenitora (…) deverá entregar a criança CC, às técnicas competentes, na porta dos serviços o ISS, no dia 17 de janeiro de 2020, na hora designada, e igualmente em todas as outras visitas que virem a ser agendadas de ora em diante, devendo ausentar-se do local de imediato.

    É natural que a criança chore, no momento dessa entrega, atendendo a todos os antecedentes constantes dos relatórios dos autos. Deverão, as Exªs Técnicas, receber a criança, levá-la para o interior do ISS, e aí, sem a presença da progenitora ou de qualquer outro representante da mesma, atuar em conformidade com as boas práticas, e sempre no superior interesse da criança, CC.” e que “Compete à progenitora, sendo da sua inteira responsabilidade, preparar a criança para a visita supervisionada, devendo a mesma fazê-lo de forma assertiva e calma, por forma a que a entrega da criança às Exªs Técnicas se realize de forma serena. Deverá a progenitora criar na criança a necessária segurança e orientação do que vai suceder, por forma a que não existam receios na menor.”

   87 - A Requerida não cumpriu o determinado, não entregando a menor às Técnicas do ISS, questionando a menor quanto à vontade de ir ou não visitar o pai, sem a preparar para os encontros com o Requerente, o que sucedeu, na visita de 17.01.2020.

   88 - Aos 28.01.2020, vêm as Técnicas do ISS de Portimão responder ao ordenado por despacho de 23.01.2020, quanto “à melhor estratégia para salvaguardar o superior interesse da criança CC, e propor ao tribunal vias alternativas para cumprir tal objetivo”, sugerindo que os convívios entre menor e progenitor ocorressem no Jardim de Infância frequentado pela menor, “uma vez que se trata de um espaço conhecido da criança e com adultos de referência, com quem a CC estabelece relações de confiança, evitando-se em igual circunstância as situações ocorridas nas anteriores tentativas de visitas, salvaguardando-se desta forma o seu superior interesse.”

    89 - Em 29.01.2020, por despacho proferido, determinou-se:

   “(…) deverá o ISS implementar de imediato tal regime de convívios, conforme vem proposto. Notifique o Equipamento Educativo, para a morada indicada no relatório que antecede, do teor da presente decisão e de que deverão colaborar com o ISS, na concretização dos convívios em causa. Notifique a progenitora de que no dia agendado pelo ISS para os convívios com o progenitor, deverá deixar a criança, como habitualmente o faz, no Equipamento Infantil que a criança frequenta, ausentando-se de imediato do local em causa. Desde já se adianta que não são admitidas qualquer tipo de desculpas para a criança em tal dia não ser entregue no equipamento educativo.”

   90 - A Requerida teve conhecimento de tal decisão, tendo junto ao equipamento educativo e aos encarregados de educação das crianças que frequentam o Equipamento Infantil da ..., do Centro de Assistência Social ... (...), tendo feito circular informações negativas sobre o Requerente.

91 - Em 13.02.2020, vieram as técnicas do ISS de Portimão comunicar que, na sequência das “(…) dificuldades já anteriormente reportadas ao processo que estavam a colocar a criança em situação de grande vulnerabilidade emocional, foi indicada como sugestão alternativa o Jardim de Infância frequentado pela CC para se ultrapassar o principal constrangimento que era a entrega da criança por adultos que não ajudavam a promover uma transição securizante, por eles próprios não considerarem adequado que as visitas ao pai ocorressem. Perante a indicação de local alternativo, Jardim de Infância, e porque a mãe, através da sua Mandatária, já tinha feito chegar ao referido estabelecimento a sua discordância perante tal decisão, da qual também demos conhecimento a esse Douto Tribunal, informamos que foi-nos ontem participado que a Encarregada de Educação de outra criança que frequenta o mesmo Jardim de Infância, enviou comunicação referindo-se ao pai da CC como ‘…uma pessoa que está a ser investigada por abusos sexuais…’, o que está a provocar uma situação de alarmismo no espaço escolar de gravidade considerável.”

   92 - Na comunicação dos serviços do ISS de Portimão que se vem de referir, concluem as técnicas que:

   “(…) Em face do exposto cumpre-nos informar que, frustradas todas as tentativas de convívio da filha com o pai, já anteriormente intentadas também pelo CAFAP de Silves e CAFAP de Albufeira, consideramos que se encontram esgotados os nossos recursos de intervenção pelo que a situação foi sinalizada à CPCJ da área de residência da progenitora por se considerar que toda a situação a que a criança tem vindo a ser exposta desde a separação dos pais está a lesar gravemente o seu equilíbrio emocional.”

   93 - Em 06.04.2021, por despacho com a Ref.ª 423242056, designou-se o dia 18.05.2021 “para a realização uma conferência de progenitores com presença da criança e de técnico do ISS para acompanhar a mesma.”, ordenando-se a notificação do “ISS da zona de residência da criança CC para, no prazo de 10 dias, darem conhecimento nestes autos de local e forma de se retomarem, de imediato, os contactos da criança CC com o progenitor”.

   94 - Nessa sequência, veio o ISS de Portimão, aos 15.04.2021, informar: “que os pais já foram contactados, tendo ambos aceitado o dia e a hora sugeridos pela técnica para a retoma dos convívios.

95 - Determinando-se que os convívios irão decorrer nas instalações do Serviço Local de Atendimento da Segurança Social em Portimão, sita na Av. ..., estando já agendado o primeiro convívio para esta segunda feira, dia 19 de abril de 2021, pelas 16h00.

  96 -No contacto efetuado junto da mãe, para informar da necessidade de eventual alteração, esta verbalizou que antes da data do primeiro convívio (já segunda-feira dia 19/04/2021), que a sua advogada iria entrar em contacto com a Técnica, para falar em relação a essa situação. A mãe não acrescentou mais nada, pelo que se aguarda o contato da mandatária da mesma.”

   97 - Veio o ISS de Portimão informar: “o SATT2 foi contactado pela advogada da mãe, tendo a mesma informado que, apesar da mãe não se opor à retoma dos convívios entre a CC e o pai, apenas o irá fazer após a avaliação da menor por parte da psicóloga que a acompanha e da pedopsiquiatra que a acompanha, também.

    Mais refere a advogada que, tem conhecimento de nova perícia realizada à menor, no passado dia 23.12.20, sem que tenha qualquer conhecimento do teor da mesma, considerando como fundamental o acesso ao referido documento.

   Refere ainda a advogada que, do seu entendimento, a retoma dos convívios com o pai não é para acontecer de imediato, mas apenas após a audiência de pais, que já está agendada para maio.”

   98 - Por despacho com a Ref.ª 423950882, ordenou-se a notificação do ISS e dos progenitores “de que o ISS deverá articular, de imediato, tais visitas, de acordo com a disponibilidade dos serviços e dos intervenientes.” considerando “Mostrar-se premente o reinício das visitas da criança com o pai.”

   99 - Tais visitas não se reiniciaram devido ao alegado isolamento profiláctico da menor, cfr. informação de 28.04.2021, tendo o ISS de Portimão informado os progenitores de que “os convívios iniciariam logo após essa data [07.05.2021], nomeadamente no dia 10.05.2021, segunda feira, às 16.30. Ficou agendado que os convívios irão manter-se todas as segundas feiras, às 16.30, nas instalações da segurança social.”

  100 - Em 30.04.2021, vieram as Técnicas do ISS de Portimão juntar comunicação - via email -, da Mandatária da Requerida em que, cfr. vem fazendo ao longo dos presentes autos: “Lamento o atraso, mas tinha esperança que o assunto estivesse parado. (…) Peço-lhe que comunique à vossa instituição que a CC não irá a visita agendada sem que as terapeutas da menor sejam ouvidas em sede de conferência de pais. Mais informo que consideramos o Tribunal incompetente e que o apenso D que corre os seus termos no Tribunal do Porto já foi arquivado pelo que todos os termos que têm sido processados são nulos.”

  101 - O Tribunal, aos 03.05.2021, renovou o despacho de 22.04.2021 supra referido e, aos 05.05.2021, por despacho com a Ref.ª 424392614, ordenou:

   “As visitas da criança CC com o pai deverão ser retomadas de imediato, respetivamente, antes da diligência agendada nestes autos.

    Desta feita, deverá o ISS, urgentemente, agendar a visita em causa, tudo devendo fazer para que a mesma se concretize, nomeadamente com o recurso aos meios tidos por convenientes para tal.

    Notifique o ISS, os progenitores e as Exªs Advogadas dos progenitores, pela forma mais expedita, nomeadamente via telefone ou email.”

   102 - Foi, assim, agendado encontro supervisionado entre menor e progenitor para o dia 12.05.2021, que ocorreu da seguinte forma, descrito pelas técnicas em Relatório:

   “- Às 16h30, recebemos uma chamada da mãe, verbalizando que tinha chegado ao Serviço Local, mas que a CC não queria sair do carro, tendo transmitido que a criança se tinha urinado pelas pernas abaixo.

    As Técnicas do SATT2 foram ter com a CC e com a mãe ao carro, ao que na viatura se encontrava a criança, a mãe e mais duas pessoas do sexo feminino, que foram identificadas pela mãe como os pilares da sua vida (sic).

    A CC encontrava-se dentro do carro, no banco de trás e assim que as técnicas se aproximaram, a menor referiu de forma perentória “Eu não entro no edifício” . A CC não estava a chorar, nem evidenciava uma expressão facial que transmitisse medo ou angústia. Estava efetivamente molhada, mas não se sentiu odor a urina.

   Tentou-se conversar com a CC, mas independentemente do que lhe era transmitido a criança respondia sempre, de forma até um pouco “mecanizada” “Eu não entro no edifício”.

   A dada altura solicitou-se ajuda à mãe, para que esta transmitisse segurança à CC, de forma a que a mesma acedesse a sair do carro. A mãe respondeu que não iria mentir à filha e que essa seria a função dos Técnicos e não a sua.

   A mãe comunicou sentir-se cansada desta situação e desta imposição por parte do Tribunal, de que a CC tenha contato com o pai. Acrescenta que a filha fica muito alterada com estes convívios e que apresenta regressões a vários níveis. Voltou a insistir que a psicóloga que acompanha a CC não é de acordo com estes convívios com o pai.

   A dada altura e face às inúmeras tentativas por parte das Técnicas para que a CC as acompanhasse e saísse da viatura, a mãe olhou para a filha e perguntou-lhe porquê é que esta não quer estar com o pai (sic), tendo a criança respondido “Porque o pai é mau” (sic). De seguida a mãe pergunta “Explica porquê é que tu achas que o pai é mau”, ao que nesta altura a CC responde “É mau porque me fecha nos armários e bate” (sic).

   Perante a resistência da CC, em não querer sair da viatura e entrar no Serviço Local, não se conseguiu, mais uma vez, promover o convívio entre pai e filha, situação que aliás se vem repetindo há já alguns anos e que acaba por não ser benéfica para ninguém, mas principalmente, para a CC que se vê colocada nesta situação de stress.”.

   103 - O parecer das Técnicas do ISS foi no sentido de se adiar o convívio agendado para o dia 17.05.2021, tendo em conta a “oposição da CC em entrar no edifício da Segurança Social de Portimão (…) e uma vez que estava agendada conferência de pais para o dia 18.05.21, (…) aguardando-se pela audiência para melhor se perceber qual forma de, em primeiro lugar, salvaguardar os direitos da CC, e, posteriormente, os do pai e da mãe.”

   104 - Neste sentido, aos 14.05.2021, ordenou-se: “aguardem os autos a diligência agendada nestes autos, notificando-se o ISS no sentido de ser dado sem efeito o encontro agendado para o dia 17 de maio.”

   105 - No dia da conferência de pais que se vem de referir, tendo sido ordenada a audição da menor, a mesma decorreu como melhor se alcança da ata, com a Ref.ª 424945904.

   106 - Não se logrou, nesse dia, ouvir a criança, conforme decorre da ata referida no artº 105.

   107 - Foi então determinado, “Atentas as sugestões das ilustres médicas e técnicas ora ouvidas, determina-se que o próximo encontro supervisionado da criança com o seu pai, se realize no dia 31 de maio de 2021, pelas 16:30 horas no Tribunal de Portimão.

    Tal visita deverá ser supervisionada pela Dr.ª EE, psicóloga da criança e pela Exm.ª Senhora Técnica do CDSS de Faro, Dr.ª LL. Concorda-se com a sugestão das ilustres técnicas no sentido de, em tal dia, a criança CC dever ser conduzida ao Tribunal pela sua mãe, não devendo ir acompanhada de mais ninguém. Não deverão, igualmente, as ilustres mandatárias de ambos os progenitores estarem presentes em tal entrega. A progenitora deverá entregar a criança às ilustres técnicas no exterior do Tribunal e tudo fazer para que a criança acompanhe as mesmas, devendo atuar assim de forma a que tal entrega se concretize.

   Atendendo também à sugestão da ilustre pedopsiquiatra da criança, Dr.ª QQ, com a qual se concorda na íntegra, determina-se que os progenitores integrem o serviço de mediação familiar sugerido pela ilustre pedopsiquiatra, por forma a ser trabalhadas as questões referentes à parentalidade, nomeadamente com o objetivo de obter estratégias parentais concertadas, sempre no superior interesse da criança.”

   108 - Foram agendadas duas sessões, para os dias 24 e 31 de maio de 2021, com a Dra. EE e a Dra. LL, antes do convívio agendado com o pai “(…) de forma a salvaguardar o superior interesse da CC e reduzir ao máximo a sua angústia e ansiedade (…) de forma a realizar a sensibilização da CC ao contacto com as duas técnicas.” (sic), tendo a Requerida comparecido com a menor apenas à primeira sessão.

   109 - A Requerida não compareceu com a menor “(…) sem dar qualquer tipo de justificação”, ao encontro agendado para o dia 07.06.2021.

   110 - O convívio previsto para o dia 14.06.2021 foi desmarcado pelo facto de a Sra. “Dra. EE, por razões familiares, não estar ao serviço, encontrando-se ausente do território continental.”

   111 - Na visita supervisionada agendada para o dia 28.06.2021, uma vez mais se comprovou “(…) a dificuldade da CC em despegar-se da figura materna.”.

    112 - O convívio marcado para o dia 05.07.2021, mais uma vez, se frustrou já que a progenitora, apesar de levar a menor até à entrada das instalações do Tribunal de Portimão, “(…) verbalizou, (conforme referido pelas técnicas presentes) inclusive, na presença da CC, que iria tirar os óculos e a máscara para que todos pudessem ver que ela não estava a chorar, num movimento que entendemos (de forma correta ou não) como provocatório.”;

  113 - Os encontros marcados para os dias 19.07.2021 e 26.07.2021, voltaram a frustrar-se, uma vez que, as Sras. Técnicas do ISS optaram por perguntar à menor se queria ver o Pai, ao que aquela respondeu negativamente, dando por terminada a intervenção.

  114 - Consta do relatório junto aos autos, aos 06.08.2021, que “(…) mantém a CC a postura de verbalizar não querer o contacto com o pai. Tal como já referimos anteriormente, a CC não faz esta recusa com angústia ou com aparente sofrimento, limitando-se, simplesmente, a negar, sem grande emoção associada, o contacto com o progenitor. (…)”.

  115 - Nessa mesma data, vieram as Sras. Técnicas do ISS informar que “(…) a técnica gestora de processo se encontra em isolamento profilático até dia 12 de agosto. A partir de 16 de agosto, a Dr.ª EE irá iniciar férias que se irão prolongar até ao dia 27 do mesmo mês. Atendendo às férias dos Técnicos neste período de agosto/setembro, o SATT2 não apresenta capacidade ao nível de RH para realizar todas as segundas-feiras esta diligência, aguardando-se por uma resolução, mui respeitosamente, por parte do douto tribunal em relação à situação entre pai e filha.”

  116 - Seguidamente, os encontros de 30.8.2021 e 06.09.2021 não se realizaram, como, se retira da informação do ISS de 03.09.2021.

  117 - A Requerida desmarcou, aos 02.09.2021 o encontro de 06.09.2021, “com a justificação de que, por motivos de saúde, a menor não poderia estar presente.”

  118 - Alegou que as tentativas de convívio apenas poderiam ser retomadas a 20.09.2021, uma vez que a técnica gestora do processo, Dr.ª LL, se encontrava em período de férias.

  119 - Aos 14.09.2021, veio o Progenitor requerer a notificação da Requerida para juntar, aos autos, comprovativos dos alegados motivos de impossibilidade de comparência aos encontros supervisionados dos dias 30.08.2021 e 06.09.2021.

  120 - A Requerida notificada do despacho, nunca cumpriu com o ordenado pelo Tribunal.

  121 - Aos 21.09.2021, vieram as Sras. Técnicas do ISS de Portimão juntar informação em que referem que “no período da manhã [do dia 20.9.2021], o convívio entre o pai e a CC foi, uma vez mais, cancelado, através de contacto telefónico realizado pela mãe, e posteriormente por email enviado pela mandatária da mesma.

   A justificação anexada remete para atestado pedopsiquiátrico, tendo a médica referido que “estão contraindicadas estas visitas pelo agravamento clínico verificado nas anteriores tentativas”, sublinhando que a CC não poderá comparecer nos convívios programadas a partir de 20 de Setembro de 2021.

   Neste contexto solicitamos, mui respeitosamente, que sejam dadas orientações por parte do tribunal no que concerne à continuidade, ou não, dos convívios entre a menor e o pai.”

  122 - Do teor do relatório junto aos autos, aos 21.02.2020 -, da Senhora Dra. QQ, Pedopsiquiatra da menor, resulta que a CC, no dia 9 de janeiro de 2020, “(…) entrou agarrada à mãe, profundamente triste que não tinha expressão facial, parecia não ter forças, tinha grandes olheiras, (…) quase não falou e alheou-se da minha presença. (…)”.

  123 - A menor foi consultada pela Sra. Pedopsiquiatra aos 21.11.2019, aos 09.01.2020 e aos 13.02.2020, logo, com um desfasamento de 7 e 5 semanas entre consultas, respetivamente.

  124 - A Dra. DD, pedopsiquiatra que avaliou a CC, concluiu:

   “Quando a questiono sobre a reação da mãe quando há visitas com o pai a CC refere que a mãe fica triste e preocupada”.

  125 - Consta do relatório da perícia Médico-Legal, que a CC é uma menina “(…) bem-disposta, sem sinais evidentes de psicopatologia e apresentando um desenvolvimento adequado à idade. (…) [que] aparentou ter um desenvolvimento psico-afectivo dentro do esperado para a idade. Não revelou sinais evidentes de psicopatologia activa (…).”

    Do mesmo relatório consta que, “(…) Quando a questiono sobre a reação da mãe quando há visitas com o pai a CC refere que a mãe fica triste e preocupada.”, sendo “(…) notória a tensão em relação ao tema do contacto com o pai e dos conflitos entre os pais.”

    Mas, muito pelo contrário, “(…) A CC escolheu brincar com figuras humanas que organizou numa família (pai, mãe e 3 filhos). No jogo que estruturou os pais estavam separados e em conflito, havendo situações em que os filhos estavam com a mãe e com o pai. Neste jogo simbólico, construído pela CC, ambos os Progenitores tinham ações adequadas com os filhos, mas havia uma tensão e conflitos constantes entre as figuras adultas.”

    Quando lhe é questionado se as visitas com o pai, na presença das Técnicas, eram difíceis, “(…) responde que não eram difíceis e que “é melhor assim”.

   126 - Em 29.10.2021, veio a Sra. Dra. EE, psicóloga que vem acompanhando a menor, juntar informação aos autos, em que conclui que “Perante a gravidade e o prolongar da situação [a impossibilidade de concretizar a observação da interação entre pai e filha], e atendendo ao V/o pedido, depois de uma reflexão ponderada em equipa GASMI, decidiu-se pela colaboração da psicóloga da CC nas visitas supervisionadas. Embora tenha sido colocada a hipótese de que a sua presença pudesse constituir-se como facilitador do processo das visitas do progenitor à menor, o mesmo não se verificou, não havendo evolução da situação. (…) perante a inexistência de resultados, considera-se que não existem condições que justifiquem o comprometimento da relação terapêutica estabelecida, bem como a continuidade da intervenção.” Informando da cessação da sua colaboração nas visitas.

  127 - Aos 05.11.2021 vieram as Sras. Técnicas do ISS informar que rececionaram “à data de hoje e-mail da mandatária da progenitora a comunicar que “a menor CC não poderá comparecer na visita por razões médicas (…)” sem juntar, uma vez mais, qualquer comprovativo.

  128 - Por despacho de 03.12.2021 foi dada “(…) uma última oportunidade à progenitora da criança de cumprir e concretizar as visitas supervisionadas, devendo para isso o ISS marcar tal visita, na presença da psicóloga da criança.”

  129 - Tendo sido marcado novo encontro supervisionado para o dia 13.12.2021, sem a presença da Psicóloga da menor, “(…) que mantém a posição de que a sua intervenção neste processo terminou, considerando que a continuidade da sua intervenção é extremamente prejudicial para a relação terapêutica com a CC, conforme já informado o tribunal.”

  130 - Mais uma vez a visita não aconteceu.

  131 - Consta do relatório psicológico do progenitor datado de 13 de setembro de 2021, e em conclusões: “Em relação às competências parentais, o examinado demonstra dispor de recursos internos adequados e de competências parentais para que possa identificar, responder e satisfazer às diversas necessidades básicas e psicoafectivas da sua filha, observando-se a presença de um investimento afetivo significativo para com a sua filha. Assim o examinado revela atitudes parentais positivas que sugerem que este tenderá a funcionar num estilo parental democrático, no qual tentará integrar os afetos, as regras e os limites de forma tendencialmente adequada, com uma dinâmica comunicacional assertiva e funcionante, sem indicadores da presença de qualquer risco de comportamentos de alguma forma abusiva na relação com a filha”.

  132 - Consta do relatório psicológico da progenitora datado de 26 de outubro de 2021, e em conclusões: “ … O perito é da opinião que a examinada será capaz de executar as competências parentais necessárias para garantir a segurança, estimulação e práticas educativas ajustadas ao superior interesse da menor, com tem, aliás, vindo a suceder. Como fatores de risco, importa ter presente o conflito entre progenitores, que poderá influenciar negativamente o relacionamento com a menor”.

  133 - A Exmª Pedopsiquiatra da criança CC pronunciou-se no sentido de ser importante para a resolução dos convívios da criança com o progenitor, que os progenitores integrassem um programa de terapia/mediação familiar, tendo sugerido a Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar.

  134 - Ambos os progenitores aceitaram a intervenção de tal entidade, tendo a mesma, ao longo do decorrer deste julgamento, vindo a desenvolver uma intervenção, que se encontra plasmada nos relatórios que constam destes autos.

  135 - O progenitor foi condenado, em 12/07/2018, pelo crime de violência doméstica, p. e p. pelo artº 152º nº 1 ali.b) e nº 2 do C.P., na pena de dois anos e dois meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos e 2 meses, subordinada à frequência pelo arguido de um curso para agressores de violência doméstica a indicar pela DGRS.

  136 - O progenitor já cumpriu a pena em que foi condenado.

  137 - O progenitor, desde 2017, beneficia de apoio psicoterapêutico, com boa adesão ao processo terapêutico, ao nível das aptidões relacionais e na gestão de emoções.

  138 - Foi apresentada pela progenitora, contra o progenitor, queixas crime, por agressão física e sexual da menor, queixas essas que foram todas arquivadas.

  139 - O progenitor é chefe de cozinha, no ” A...” auferindo €700,00 mensais de vencimento, mais direito a casa, comida água e luz pagas pela empresa. Vive sozinho num andar no centro de Lisboa.

  140 - A progenitora é gestora de propriedades, gestão de casas para férias, na empresa “ B...”, auferindo €800,00 mensais de vencimento. Vive em casa arrendada, com a filha, pagando €130,00 mensais de renda.

  141 - A criança CC frequenta uma escola pública, primeiro ciclo, 4º ano, do Centro Escolar ..., tendo como atividades extracurriculares a zumba e a natação, com um custo de €10,00 a zumba e €20,00 por aula a natação.

  142 - A criança CC tem uma relação de grande proximidade com a sua mãe.

  143 - A criança CC encontra-se bem integrada na escola que frequenta, Centro Escolar ..., é uma menina alegre, interessada, boa aluna e dá-se bem com os seus colegas e professora.

  144 - A Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar deu início à sua intervenção nestes autos em novembro de 2022, com o acordo de ambos os progenitores.

  145 - Por email de 03/03/2023 a SPTF informou o seguinte: “ Na sequência do mail anterior, temos a informar, que face à sessão que estava agendada para o passado dia 28, com ambos os progenitores, eles estiveram efetivamente presentes! Acontece que a BB se negou a estar na mesma sala que o pai da filha alegando, presencialmente, que não se sentia segura no mesmo espaço que o ex companheiro, tendo até trazido uma amiga consigo (que o AA reconheceu como sendo a sua advogada). Voltou a afirmar que já tinha sido agredida, ameaçada (ela e a filha) e que recusava definitivamente qualquer contacto”.

  146 - A progenitora foi notificada de decisão, de 06 de março de 2023, proferida por este tribunal nos seguintes termos:” notifique, igualmente, a Progenitora de que deverá aderir ao proposto pela Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar, quanto às soluções propostas, sob pena de inviabilizar qualquer intervenção de tal sociedade.

    Tal intervenção, da Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar, foi sugerida pela Ilustre Pedopsiquiatra da criança, como sendo imprescindível para que a situação relativamente à criança CC se resolva. A posição da progenitora, que se apresentou no dia referido na informação que antecede, acompanhada pela Ilustre Mandatária, é de todo incompreensível. A progenitora afirmou concordar com a intervenção da Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar, contudo inviabiliza tal intervenção.

   O que se pretende acautelar é o superior interesse da criança CC, no sentido de se reatarem os convívios com o seu pai. Se a progenitora inviabiliza também esta solução, está a ir contra o superior interesse da filha CC”.

  147 - A Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar sugeriu:” para uma melhor compreensão do processo e eventual parecer mais consistente, seria importante conhecermos e procedermos a uma avaliação individual da menina”.

  148 - Foi determinado por despacho de 06 de março de 2023 que a Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar proceda a tal avaliação individual da criança CC, solicitando-se que a mesma seja realizada com nota de muito urgente, por forma a que este tribunal possa decidir quanto aos convívios da criança com o pai.

   149 -Após avaliação da SPTF, foi emitido parecer psicológico da criança CC, junto aos autos a 21/06/2023, com a seguinte conclusão: “Posto isto, parece-nos não existir nada impeditivo duma reaproximação entre a CC e o pai.

    Todavia, a menina não vê o pai há muito tempo e possui uma imagem construída e eventualmente apreendida, ao longo de todo este processo, que não lhe permitirá espontaneamente querer estar com o pai, pelo que esta reaproximação deve ser promovida de forma gradual e segurizante”.

   150 - Foi proferido despacho datado de 22/06/2023 do seguinte teor: “Tendo em conta o supra referido, e concordando com o mesmo, entende este tribunal que a reaproximação ao progenitor deverá ser iniciada, de imediato, com a intervenção da SMF. Assim sendo, notifique tal SMF para, no mais curto espaço de tempo, dar início a tal intervenção, tendo sempre em mente o superior interesse da criança CC”.

   151 - A SPTF juntou relatório aos autos, em 15/09/2023, informando, em síntese, o seguinte: “ … foi marcada uma sessão em julho com o pai e a CC, com o compromisso da mãe que traria a menina e assim fez! Todavia, quando chamada para entrar na sala onde já estaria o pai ela recusou-se, agarrou-se à mãe e foi aumentando o nível de ansiedade sempre que lhe era explicado que tudo ia correr bem e em segurança. Ainda assim, conversou com as terapeutas, que lhe mostraram uma gravação do pai para ela (da sala onde se encontrava) e recebeu um presente (livro) que este também lhe levou! Consideramos que foi uma boa forma de aproximação (que sabíamos que não seria fácil) e combinamos que após o período de férias voltaríamos a chamá-los.

  Acolhemos o desânimo do pai, que trazia obviamente a expectativa de ver a sua filha e contratamos com a mãe a responsabilidade de ir facilitando este caminho com a CC, que ela aceitou, comprometendo-se connosco e com a filha.

   Neste momento, após término do período de férias e com objetivo de retomar este processo temos tentado contactar os pais da CC, mas nenhum deles nos atende ou devolve a chamada!”.

   152 - Perante o relatório supra referido o tribunal proferiu despacho, além do mais, no sentido dos progenitores contactarem, no prazo de 24h a SPTF, para que os contactos da criança com o progenitor possam continuar a ser trabalhados/mediados por tal entidade.

   153 - Foi proferido despacho, em ata datada de 18/09/2023, designando-se o dia 26/09/2023, pelas 18h30, para a continuação da intervenção da SPTF de mediação de contactos da criança CC com o seu progenitor.

   154 - O progenitor apresentou requerimento, por escrito, datado de 18/09/2023 informando que “irá estar ausente do país a partir do dia 20/09/2023, previsivelmente até ao final de novembro, por motivos profissionais. Motivo pelo qual, não poderá comparecer à sessão agendada para dia 26/09/2023”

  155 - Tendo em conta o requerimento do progenitor, foi dada sem efeito a sessão agendada para dia 26/09/2023.


*

    Os factos não provados são os seguintes:

   a. Um regime de visitas presencial entre a menor e o pai é causador de danos à estabilidade emocional da criança.

    b. Que existe relação entre o retrocesso cognitivo da menor e a submissão ao regime de visitas ao pai.

    c. Que o progenitor tenha desinteresse com o desenvolvimento da menor e dos seus problemas.

    d. Que a pendência do atual processo se deve a erro no sistema Citius.

    e. Que o progenitor apresenta dificuldades em assegurar os cuidados necessários a crianças da idade da sua filha.

    f. Que o progenitor em situações de maior tensão poderá exibir dificuldades na gestão de afetos.

    g. Que o progenitor apresenta frágeis recursos para o adequado desenvolvimento cognitivo, social e emocional da criança.

   h. Que o tribunal não tenha permitido o depoimento das terapeutas que acompanhavam a menor.

    i. Que a menor não tem interesse em estar com o pai.

j. Que o pai nunca se “incomodou” em ligar para a escola da filha, para ter conhecimento do seu desenvolvimento.

k. Que o pai nunca tentou perceber junto das técnicas dos problemas reais da menor.

    l. Que no dia 21 de maio de 2021, à entrada do tribunal o pai não olhou para a filha e não tirou as mãos dos bolsos.

m. Que os dois meses que a criança viveu com o pai tenham causado stress pós-traumático.

   n. Que a menor se queixa de que o pai lhe batia, dava murros na cabeça e que o pai lhe enfiava os dedos na vagina e que a fechava em armários no escuro.

  o. Que nos períodos nos períodos de aproximação ao pai, a menor passa a urinar na cama, fica apática, nervosa, com tiques de abrir a boca, passa a não brincar na escola, recusando-se mesmo s ficar na escola.

p. Sempre que foram tentadas visitas entre pai e menor esta entra em pânico e chora, fica num estado de ansiedade e instabilidade emocional que altera toda a sua maneira de ser na escola e em casa.

   q. Que a criança teve um comportamento estável que se alterou quando as visitas recomeçaram.

r. Que foi por incapacidade das técnicas que a criança não ficava num mesmo espaço com o pai.

    s. Que a criança tivesse regredido o seu comportamento, tendo passado a chuchar no dedo, a fazer xixi nas cuecas, com as tentativas de convívios com o pai.

t. Que as tentativas de visitas ao pai sejam causadoras de danos à estabilidade emocional da menor.

u. Que a mão sempre cuidou de fazer o que lhe era recomendado pelo tribunal.

    v. Que a criança nunca se adaptou à presença do pai.

    w. Que a progenitora tenha demonstrado uma postura ativa em prol do interesse da sua filha menor.

    x. Que desde cedo tenha havido um comportamento de rejeição da menor ao pai.

   y. Que a mãe manteve um esforço no sentido da filha manter contacto com o pai.

    z. Que inexistam laços afetivos entre pai e filha.

  aa. Que a mãe da menor nunca demonstrou incompatibilidade com o progenitor.

    bb. Que não há interesse da menor em estar com o pai.

cc. Que nunca existiu qualquer esforço para a menor ter contactos com avós, tios e primos do progenitor.

    dd. Que a menor goza de bom ambiente em casa.

                                                                   


*

   Passemos à apreciação do mérito do recurso.

   1. O progenitor/requerente, discordando da decisão recorrida, através de uma longa alegação recursiva, que reproduziu praticamente na íntegra nas respetivas conclusões, insurge-se contra o regime de exercício das responsabilidades parentais aí fixado, pretendendo que a residência da menor seja fixada junto dele e que esta lhe seja entregue.

   Mais pretende que se altere o regime fixado quanto a alimentos, substituindo-o por um outro que determine o pagamento de uma quantia mensal pela requerida ao requerente e que seja também determinado um novo regime de visitas, supervisionadas, entre a menor e a progenitora.

   Vejamos então.

   2. Na decisão recorrida a Mmª Juíza “a quo” entendeu ter havido incumprimento por parte da progenitora do regime relativo ao exercício das responsabilidades parentais, no segmento respeitante às visitas, tendo salientado a atitude de total desinteresse desta no que toca ao convívio da menor com o progenitor.

   Considerou-se assim a progenitora a grande responsável pelo insucesso das inúmeras diligências que foram tentadas com vista a possibilitar um são convívio entre o progenitor e a sua filha, motivo pelo qual lhe foi aplicada a multa de 20 UCs (2.040,00€), ao abrigo do art. 41º, nº 1 do RGPTC.

   Porém, apesar deste censurável comportamento, decidiu-se que a menor CC devia continuar a residir com a progenitora e, apesar desta decisão se poder revelar algo contraditória, ela mostra-se, a nosso ver, acertada.

  Com efeito, não se pode ignorar que no exercício das responsabilidades parentais em caso de divórcio ou de cessação de união de facto o tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles – cfr. arts. 1906º, nº 7 e 1911º, nº 2 do Cód. Civil.

   De resto, no próprio art. 3º, nº 1 da Convenção sobre os Direitos da Criança[3] estabelece-se que «todas as decisões relativas a crianças, adotadas por instituições públicas ou privadas de proteção social, por tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, terão primacialmente em conta o interesse superior da criança

   O superior interesse do menor surge como um conceito jurídico indeterminado que, apesar de não ser definível, “é dotado de uma especial expressividade, uma «noção mágica», de força apelativa e tendência humanizante”, não sendo suscetível de uma definição em abstrato que valha para todos os casos. E só adquire eficácia quando referido ao interesse de cada criança, “pois há tantos interesses da criança como crianças”.[4]

   Por outro lado, este conceito está intimamente dependente de um determinado projeto de sociedade, de um projeto educativo preciso. Trata-se de uma noção cultural intimamente ligada a um sistema de referências vigentes em cada momento, em cada sociedade, sobre a pessoa do menor, sobre as suas necessidades, as condições adequadas ao seu bom desenvolvimento e ao seu bem-estar cultural e moral.[5]

   Por isso, o julgador deve conhecer a sociedade em que está inserido e um conjunto de regras gerais e científicas sobre o desenvolvimento das crianças e as suas necessidades específicas em cada estádio de desenvolvimento, donde decorre que o legislador não remeteu, nesta matéria, o juiz para critérios de oportunidade do caso concreto, nem lhe conferiu poderes discricionários.[6]      

    3. Na decisão recorrida, a Mmª Juíza “a quo” salientou que a menor CC residiu com o pai entre julho e setembro de 2018, na sequência de uma decisão proferida no apenso E dos presentes autos, em 17.4.2018, a qual viria a ser revertida pelo Tribunal da Relação do Porto que determinou a sua entrega novamente à progenitora.

    Desde essa ocasião que as visitas ao progenitor não mais se lograram realizar de forma regular, mesmo intervindo em sede de mediação diversas entidades devidamente preparadas para esse efeito, sendo evidente a resistência da menor a estar com o seu pai, embora tal resistência tenha sido potenciada pelos adultos que a acompanharam em diversas visitas, nomeadamente pela mãe ou pelos adultos que esta indicou.

    O conflito de fidelidade surgido na criança em virtude da atitude que os adultos assumiam perante ela, colocando-lhe em cima o ónus da decisão de querer estar com o pai, é referido pela Mmª Juíza “a quo” como causa de desconforto para a menor.

   Por isso, se concluiu – e bem – na decisão recorrida que existe uma enorme responsabilidade da progenitora ao longo destes anos na não concretização do regime de visitas que havia sido determinado, tanto mais que é um direito da menor ter um pai presente na sua vida e é certo que este se tem empenhado em estar com a sua filha.

    No entanto, a Mmª Juíza “a quo” decidiu-se pela manutenção da residência da menor com a progenitora, desatendendo assim a pretensão do progenitor que sustentava que a menor deveria passar a residir consigo.

    O núcleo da sua argumentação, nesse sentido, é o seguinte:

    “ (…) Na verdade, a progenitora tem demonstrado uma atitude de total desinteresse em que a criança conviva com o progenitor, sendo, a nosso ver, a grande responsável, pelas inúmeras tentativas frustradas da criança conviver com o progenitor de forma saudável, tal como já supra foi referido e se encontra plasmado nos factos dados como provados.

    Cumpre, contudo, ter-se em atenção que a criança está com a progenitora há vários anos a viver no Algarve, nomeadamente desde 2017. Está devidamente integrada em estabelecimento de ensino. Tendo a sua vida organizada em tal local, e mantem com a progenitora um bom relacionamento, e uma grande relação afetiva.

   Entendemos que a criança tem de ser priorizada, evitando mudanças bruscas na sua vida, nomeadamente como aconteceu em 2018, que poderiam pôr em causa a sua estabilidade e equilíbrio emocional, atenta a sua idade.

    Entende este tribunal que são os adultos que têm de se adequar e alterar os seus comportamentos, nomeadamente a progenitora que se tem vindo a recusar [a] estar com o progenitor, em sede de mediação familiar, e na presença de técnicas responsáveis, tal como foi sugerido pela Ilustre Pedopsiquiatra da criança, Drª QQ e pela psicóloga da criança, Drª EE.

   Estas Ilustres médicas foram claras quando referiram que se mostra necessário um processo de mediação familiar, por forma a que os adultos entendam que os problemas que ocorreram entre eles no passado não se podem refletir negativamente na relação pai/filha.

    Nomeadamente, a progenitora tem de entender que, tendo em conta a importância que tem na vida da filha, a sua atitude perante o progenitor, quer pelo que diz, faz ou reflete na sua postura e atitudes, tem vindo a ser altamente prejudicial para a sua filha. E não se está a dizer que a criança CC é uma menina desestruturada. O que se está a dizer é que a mesma será muito mais feliz, se sentir que pode estar com o seu pai sem qualquer recriminação, infelicidade ou oposição daqueles que mais ama, nomeadamente da sua mãe.

   Encontra-se, neste momento, em curso processo de aproximação da criança ao pai, conforme relatório junto aos autos pela SPTF.

    É o tempo e local próprio, para se dar uma inversão da situação que tem vindo a ocorrer ao longo destes autos, sem termos de tomar medidas mais drásticas, que poriam, com certeza, em causa o equilíbrio emocional da criança CC, podendo desestabilizar a vida da mesma.

   Cumpre desde já reforçar, que não se está a premiar a progenitora pelos comportamentos altamente censuráveis, muito pelo contrário, está-se a tentar estabilizar uma situação de alto conflito parental, com reflexos numa criança que ao longo destes anos tem vindo a sofrer sem qualquer sentido.

    De maneira a estabilizar, por ora, a residência da criança, e por forma que a mesma vá para os contactos/convívios com o progenitor, em sede de SPTF, de forma mais segura, e por esta ser uma das questões que, segundo as técnicas que acompanham a criança, têm desestabilizado a mesma, fixa-se a sua residência junto da sua progenitora, no Algarve.

    (…)”

    4. Sucede que o progenitor/recorrente veio-se insurgir contra esta decisão e sustentar que a residência da menor CC deve ser fixada junto de si, apelando para a verificação de um quadro factual integrativo de uma situação de “alienação parental” provocada pela progenitora, no que em larga medida se socorreu da posição tomada pelo Min. Público nos autos em 2.12.2021.

    Nesta promoção, o Sr. Procurador da República pronunciou-se no sentido da residência da menor CC ser fixada, a título provisório, com o respetivo progenitor, o aqui recorrente AA, fundamentando essa sua posição pela seguinte forma[7]:

    “(…)

   É fundamental que a CC deixe de estar sujeita ao stress e ambivalência afectiva provocados pelas constantes tentativas de convívios com o pai, sendo que, ao mesmo tempo que rejeita o pai, aparentemente quando está com ele, gosta da sua presença.

   É notório que esta ambivalência de sentires gera instabilidade emocional na CC.

    A "obrigatoriedade" destes convívios momentâneos, planeados antecipadamente, coloca a CC no centro da guerra que se instalou entre os seus pais, num clima em que o amor cede o seu lugar ao ódio, e em que esta acaba por tomar um dos partidos, situação que não é minimamente desejável.

   Por outro lado, também não se pode ignorar as informações disponíveis e já acima referidas, nomeadamente da observação da intenção do pai com a menor no tribunal do Porto, onde se percebe que o contacto da filha com o pai é positivo, demonstrando haver uma relação afetiva mútua significativa.

   É fundamental que a CC possa sentir que o afeto por cada um dos progenitores não constitui um conflito ou ataque agressivo ao outro progenitor, situação que ambos os progenitores têm que salvaguardar.

   Por estas dimensões estarem afetadas considera-se FUNDAMENTAL a possibilidade referida pela pedopsiquiatra que acompanha a CC, de que ambos os progenitores devem usufruir de mediação familiar.

   É preciso acautelar que, sem prejuízo das vivências que possam ter caracterizado a relação vivida entre os progenitores, estes devem promover reciprocamente uma imagem positiva junto da filha, não tornando permeáveis para a menor as divergências do relacionamento que mantiveram, discernindo e relevando os focos de conflito intrínsecos à relação conjugal passada, procurando preservar o bem-estar emocional e psicológico da criança.

    Os progenitores devem, a todo o custo, zelar pelo harmonioso desenvolvimento da CC, no sentido de evitar que suceda um potencial conflito de lealdade por parte da CC perante qualquer um dos progenitores, separando o que são questões pessoais e conjugais, da esfera da parentalidade.

    Em resumo, mesmo que a CC não tenha relativamente ao seu pai a afetividade desejável, constatando-se nela alguma reserva em relação à figura paterna, impõe-se que o relacionamento entre os dois se mantenha e seja até incentivado.

   No entanto, é nosso parecer que a medida de convívios supervisionados é ineficaz, em nada contribuindo para a aproximação entre a pai e a criança, perpetuando a situação de afastamento afetivo e emocional entre ambos, ao mesmo tempo que claramente compromete o bem-estar emocional da CC.

    Trata-se de uma situação que já se arrasta há cerca de 3 anos, sem que se obtenha sucesso na realização dos convívios com o pai e a CC, acabando estes por raramente acontecer, independentemente dos técnicos intervenientes.

   Tentou-se, inclusivamente, nesta última tentativa para efetivar estes convívios, envolver a psicóloga que acompanha a criança, pessoa com quem a menina tem relação de confiança, no entanto, mesmo com a presença desta profissional, o convívio foi mais uma vez frustrado, não tendo a mãe comparecido no local agendado nem dado qualquer justificação, isto apesar de ter sido atempadamente avisada.

   Consideramos, efetivamente, que independentemente dos motivos que a levam a tal, é clara a indisponibilidade da mãe para promover a relação da CC com o pai e, logo, seja de forma intencional ou não, promover o vínculo entre ambos, acabando por perpetuar-se o vai e vem de visitas supervisionadas que, até ao momento, não trouxeram nada de positivo à relação da CC com o pai.


*

                                                                         

   Assim, sendo de realçar que, tendo a criança estado no Tribunal, no dia 31-5-2019, a conviver com o pai durante quatro horas, no final estava feliz e que, não obstante, logo no dia seguinte, não se logrou efetuar o convívio que esteve marcado para esse dia no CAFAP de Silves e a partir daí, apesar das diligências efetuadas, o progenitor, que nunca desistiu da filha, não conseguiu as mais das vezes estar com esta, não tendo sido encontrados elementos do foro clínico ou criminal que impeçam a CC e o pai de terem vivências adequadas e normativas, no presente caso, é lícito, segundo cremos, concluir que estamos perante o que o Procurador da República JM Nogueira da Costa e a Juiz de Direito, Sandra Almeida Simões, in Sebenta e Breve Formulário de Família e Menores, ed. de 24-1-2019, chamam de “transformação do conflito conjugal num conflito parental, com perturbação da convivência familiar”, no qual a progenitora da criança vê o progenitor desta como “adversário” ou seja, situação de síndrome de alienação parental (SAP).

    Como se refere na ob. citada, “a «alienação parental» constitui um abuso moral, um maltrato. E, por isso, processos em que tal exista devem ser tramitados como muito urgentes, posto que o tempo da criança não é igual ao tempo do adulto. E sempre com o cuidado de não deixar que a intervenção em rede ou o recurso a perícias ou mesmo a produção de prova seja instrumentalizada pelo progenitor "abusador/maltratante".

   “Uma vez desencadeado um processo de SAP, nenhuma tendência de cura se observa, pelo contrário, a maioria dos casos entregues a si próprios evolui de forma grave (…), (sendo que) contrariamente ao que o bom senso parece indicar, o tempo é um inimigo implacável nestes casos, para além de que a noção de temporalidade da criança é diferente da do adulto (…) (requerendo) a SAP (…) um diagnóstico rápido e medidas simples e eficazes (…) (e sendo que) em certos casos de abusos deste tipo é necessário mudar terapeutas, quando o resultado não é adequado”.

    E, mais adiante, “a alienação parental é abuso emocional, privar os filhos a convívio saudável é clinicamente patológico (e) a SAP desenvolve um vínculo psicológico de carácter patológico entre o menor e o progenitor alienador, baseado no dogmatismo, na adesão mais férrea e na ausência de reflexão”, sendo que “em casos mais graves, o tribunal deve decidir a transferência da custódia e/ou limitação do contacto com o progenitor alienador, sujeitando-o a uma intervenção psicológica”.

    Na tentativa de encontrar soluções referem os referidos autores na obra citada, o seguinte:

   “Ponto 1. Relativamente ao progenitor-vítima, é de extrema importância o convívio diário e integral deste com o menor, designadamente quando possui ótimas condições psicológicas que poderão permitir que o menor "apague" memórias infundadas, relativize um bom pai, melhore os níveis educacionais, aumente a autoestima e diminua os níveis de ansiedade.

    Ponto 2. Será importante a realização simultânea de Psicoterapia Cognitivo Comportamental ao menor de forma a fazer um "reset” à memória e restabelecer o bem-estar psicológico, como Terapia Familiar para progenitor-menor junto de psicólogo clínico.

   Ponto 3. A intervenção pedopsiquiátrica e psiquiátrica poderá ter de ser equacionada, designadamente quando o privar o filho do convívio saudável se revela já como clinicamente patológico, não sendo, todavia, suficiente no contexto processual em que [teremos] esta intervenção.

   Ponto 4. Não se mostrará nunca possível um progressivo e profícuo estreitar das relações pai/mãe filhos, mesmo num contexto de intervenção psicológica ou pedopsiquiátrica/psiquiátrica se estes continuarem num convívio diário com quem destrói a imagem do progenitor-vítima, pelo que, em casos mais graves, o tribunal deve decidir a transferência da custódia e/ou limitação do contacto com o progenitor alienador, sujeitando-o a uma intervenção psicológica ou mesmo psiquiátrica”.

    Sendo que, como na obra citada também se refere, “em casos de alienação parental o primeiro passo é a desconstrução eficaz do "abuso", como se decidiu no douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, ali mencionado, proferido no dia 9-7-2014, no âmbito do processo nº 1020/12.8TBVRL.P1 e disponível da internet, base de dados da DGSI:

   - I - A denominada Síndrome de Alienação Parental (SAP) caracteriza-se pela interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, levada a cabo ou induzida por um dos progenitores, outros familiares ou mesmo terceiros que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância, no sentido de provocar uma quebra ou dano relevante nos vínculos afetivos próprios da filiação existentes até então entre o filho e o progenitor visado, sem que para tal haja uma justificação moral ou socialmente aceitável.

     II - Não se trata de uma doença, mas existe como fenómeno social.

     III - Esta interferência na formação psicológica do menor constitui abuso moral e é qualificável como maus-tratos.

     IV - Em caso de separação de facto do casal, o interesse dos filhos a que alude o n.º 7 do artigo 1906.º do Código Civil e o n.º 1 do artigo 180.º da Lei Tutelar de Menores, aponta no sentido da decisão judicial sobre a guarda dos filhos coincidir com aquela que promova uma relação que construa, preserve e fortaleça os vínculos afetivos positivos existentes entre ambos os pais e os filhos e afaste uns e outros de um ambiente destrutivo de tais vínculos.

     (…)”.      


    5. A síndrome de alienação parental (SAP) foi descrita pelo seu criador – Richard Gardner – como uma perturbação de infância que aparece quando a criança recusa relacionar-se com o progenitor sem a guarda, no contexto do divórcio e das disputas sobre guarda e visitas. É definida como uma campanha sistemática e intencional, levada a cabo por um dos pais, para denegrir o outro progenitor, acompanhada de uma lavagem ao cérebro da criança com o objetivo de destruição do vínculo afetivo ao outro progenitor. Na síndrome de alienação parental, de acordo com Gardner, verifica-se um contributo da criança na campanha feita pelo progenitor alienante para denegrir o outro. Nestes processos, devem estar presentes, segundo Gardner, os seguintes factos ou critérios, indiciadores de SAP[8]: 1) Campanha para denegrir a pessoa do outro progenitor junto da criança; 2) Razões frágeis, absurdas ou frívolas para a rejeição do progenitor; 3) Falta de ambivalência; 4) O fenómeno do pensador independente; 5) Apoio automático da criança ao progenitor alienador; 6) Ausência de sentimentos de culpa em relação à crueldade e/ou exploração do progenitor alienado; 7) Presença de encenações encomendadas; 8) Propagação de animosidade aos amigos e/ou família alargada do progenitor alienado – cfr. MARIA CLARA SOTTOMAYOR, “Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais nos casos de Divórcio”, 8.ª ed., 2022, pág. 202.

  Há, porém, uma significativa controvérsia relativamente à validade científica da síndrome de alienação parental, para o que nos alerta esta ilustre Juíza Conselheira (in ob. cit., págs. 203/204) referindo que “o termo SAP não é aceite em sistemas de classificação atuais, nem consta da Classificação de DSM-IV (Manual de Estatística e Diagnóstico da Academia Americana de Psiquiatria), nem da CID-10 (Classificação Internacional de Doenças da Organização Mundial de Saúde), não sendo também reconhecida pela Associação Psiquiátrica Americana nem pela Associação Médica Americana.”

  É “(…) um constructo sociológico operacional, que escapa à ciência jurídica e à ciência médico-psicológica e não goza de qualquer [aura] científica nem miraculosa na resolução dos conflitos parentais.”[9]

   6. Colocadas estas reservas à aceitação da figura da síndrome de alienação parental, frequentemente fonte de incómodo tanto para os profissionais da área médico-psicológica como da área jurídica, há que regressar ao caso dos autos, em que face à factualidade dada como provada – que não foi impugnada em via recursiva - se terá de concluir haver da parte da progenitora uma atitude de manifesto desinteresse em que a menor possa conviver com o progenitor.

   É a mãe que, com a sua atuação, tem inviabilizado as diligências que têm vindo a ser feitas no sentido da criança poder conviver de forma saudável com o seu pai, tendo essa atitude levado à sua condenação na multa de 20 Uc`s por incumprimento do regime de visitas.

   Mas será que esta atitude obstrutiva da mãe constitui justificação para que a residência da menor seja fixada daqui em diante com o progenitor, tal como este pretende em via recursiva?

   Em sintonia com a decisão recorrida entendemos que não.

   Não se pode ignorar que a menor CC, que presentemente tem nove anos de idade, sempre tem vivido com a sua mãe, com exceção de um curto período de dois meses no ano de 2018.

   Está a viver no Algarve, na ..., onde se encontra devidamente integrada no sistema de ensino, sendo uma menina alegre, interessada e boa aluna, com bom relacionamento com colegas e professores.

   Acresce que a progenitora tem a vida pessoal e profissional centrada e organizada na ... e não cabem dúvidas de que entre a criança e a sua mãe existe um bom relacionamento e uma forte relação afetiva.

   Sucede que toda e qualquer decisão nesta área tem que tomar como referencial o interesse da menor, conforme dispõe o art. 1906º, nº 7 do Cód. Civil, e este só poderá ser eficazmente prosseguido se a criança continuar a residir com a sua progenitora.

   Uma mudança brusca na sua vida, passando a residir com o progenitor, o que envolveria inclusive uma alteração da área geográfica da sua residência, seria fator que seguramente poria em causa a estabilidade da sua vida e o seu equilíbrio emocional, tanto mais que conta apenas nove anos de idade.       

  E, neste ponto, por se adequar por inteiro ao presente caso citaremos aqui uma passagem do Acórdão da Relação do Porto de 7.12.2018[10] (proc. 23186/15.5 T8PRT-B.P1, relatora MARIA CECÍLIA AGANTE, disponível in www.dgsi.pt.):

   “É lamentável uma mudança drástica da residência habitual e das rotinas de vida de uma criança de nove anos de idade apenas porque os seus progenitores não foram capazes de separar a sua rutura conjugal das suas responsabilidades parentais e, por isso, não podemos deixar de apelar ao bom senso e razoabilidade de ambos no sentido de preservar o seu filho do grau de conflitualidade a que tem sido sujeito. Nessa senda, esperamos que o amor que a mãe nutre pelo seu filho a faça rever os seus padrões de comportamento e a motive a estimular e propiciar o relacionamento do menino com o pai. O fim de um casamento ou de uma relação afetiva não acaba com os laços de filiação e a mãe só será feliz se, no futuro, tiver a seu lado um adolescente, um jovem, um adulto mentalmente saudável, equilibrado e que a ame, mas que ame também o seu pai (…). Deve, por isso, aceitar essa realidade e desenvolver um exercício regular e harmonioso da sua parentalidade, cooperando nas visitas do menino ao pai.”

   A melhor solução para o presente caso – sabendo-se que numa área tão sensível como é a de família e menores dificilmente se atingem soluções óptimas – passa pela continuação da residência da menor com a progenitora, sendo que esta paralelamente deverá alterar o seu comportamento em relação ao progenitor, passando a colaborar de forma ativa na aproximação da menor ao pai.

   A progenitora, tal como se argumenta na decisão recorrida, até pela importância que tem na vida da sua filha, terá de perceber que a sua atitude relativamente ao progenitor, quer pelo diz, quer pelo que faz ou reflete, na sua postura e atitudes, se vem revelando altamente prejudicial para esta.

   A menor CC seria certamente mais feliz se sentisse que pode estar com o pai sem qualquer recriminação ou oposição da parte daqueles que mais ama, em particular de sua mãe.

   Neste ponto, volta-se a citar o já referido Acórdão da Relação do Porto de 7.12.2018 onde se escreve o seguinte:

   “É axiomática a importância do pai na educação de uma criança. A ausência da figura masculina pode produzir conflitos no desenvolvimento psicológico e cognitivo da criança e acarretar distúrbios de comportamento. É na interação com o pai que a criança aumenta a segurança, pois ele gera confiança e independência e ajuda ao desenvolvimento saudável da identidade do filho, bem como ao seu crescimento emocional equilibrado.”

    Porém, apesar de se reconhecer que a progenitora em todo este processo assumiu um comportamento censurável, aliás já devidamente assinalado pelo tribunal “a quo” em termos sancionatórios, haverá sempre que ter em consideração que a decisão a tomar se deverá reger por um princípio nuclear – o do superior interesse do menor.

    E este, de acordo com o que se tem vindo a expor, ficará melhor acautelado se a menor CC continuar a residir com a sua mãe, devendo, todavia, caminhar-se, com a colaboração ativa desta, no sentido de uma efetiva concretização do regime de visitas, o que possibilitará o desejável convívio com o seu pai, sempre salutar para o desenvolvimento equilibrado e harmonioso da menor.

   A real implementação do regime de visitas, no que, tal como definido pela 1ª Instância, terá intervenção a Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar, implicará uma significativa mudança de atitude da mãe, até porque o clima de conflitualidade existente entre os progenitores não deve contaminar a relação de parentalidade existente entre a menor e o seu pai, que se impõe seja estimulada e desenvolvida.

  De resto, os agravos que a progenitora, mesmo que fundadamente possa sentir em relação ao progenitor[11], não podem levar a que esta inviabilize qualquer tipo de relacionamento entre o pai e a filha, pois a um marido ou companheiro problemático não corresponde, como efeito necessário, um mau pai.

   Há sempre que distinguir o plano de conjugalidade do plano da parentalidade.

   Neste contexto, consideramos que a decisão recorrida que fixou a residência da menor junto da sua progenitora, definindo também um regime de visitas, de forma a possibilitar o convívio entre a menor e o seu progenitor, no que terá intervenção a Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar, é a que melhor realiza o interesse da criança, razão pela qual deve ser mantida.

   Por conseguinte, o recurso interposto pelo progenitor será julgado improcedente.


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    Sumário (da responsabilidade do relator – art. 663º, nº 7 do Cód. de Proc. Civil):

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    DECISÃO                          

   Nos termos expostos, acordam os juízes que constituem este Tribunal em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pelo progenitor AA e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida.

    Custas a cargo do recorrente, sem prejuízo de apoio judiciário.

    Porto, 20.2.2024
Rodrigues Pires
Fernando Vilares Ferreira
Maria da Luz Seabra

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[1] De qualquer modo não se considerou processualmente oportuno o convite à sua sintetização nos termos do art. 639º, nº 3 do Cód. de Proc. Civil.
[2] Trata-se de manifesto lapso, pois é “…ao requerente.”
[3] Adotada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) em 20.11.1989 e ratificada por Portugal em 21.9.1990.
[4] Cfr. MARIA CLARA SOTTOMAYOR, “Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais nos casos de Divórcio”, 8.ª ed., págs. 59/60.
[5] Cfr. “Poder Paternal e Responsabilidades Parentais”, Quid Juris, 2ª ed., págs. 64 e 65 [obra colectiva de Helena Melo, João Raposo, Luís Carvalho, Manuel Bargado, Ana Leal e Felicidade Oliveira].
[6] Cfr. MARIA CLARA SOTTOMAYOR, ob. cit., pág. 60.  
[7] Importa referir que o Min. Público não interpôs recurso, mas veio acompanhar, em sede de resposta, a posição do progenitor/recorrente, remetendo nomeadamente para a sua promoção de 12.12.2021. 
[8] “Parental Alienation Syndrome vs. Parental Alienation: Which Diagnosis Should Evaluators Use in-Child-Custody Disputes?, The American Journal of Family Therapy, 2002, p. 97
[9] Cfr. também PEDRO CINTRA et alii, “Síndrome de alienação parental: realidade médico-psicológica ou jurídica?”, Revista Julgar, nº 7, 2009, págs. 198 e 203.
[10] Que o presente relator subscreveu na qualidade de segundo adjunto. 
[11] Convém aqui lembrar, mesmo que não releve diretamente para a solução do presente caso, que o progenitor foi condenado, em 12.7.2018, pelo crime de violência doméstica, p. e p. pelo artº 152º nº 1 al. b) e nº 2 do Cód. Penal., na pena de dois anos e dois meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período também de 2 anos e 2 meses, subordinada à frequência de um curso para agressores de violência doméstica a indicar pela DGRS, pena esta que já se mostra cumprida.