Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1484/21.9T8MTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ALBERTO TAVEIRA
Descritores: RECURSO SUBORDINADO
CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
RETRIBUIÇÃO
Nº do Documento: RP202310101484/21.9T8MTS.P1
Data do Acordão: 10/10/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE; DECISÃO CONFORMADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – A divergência de entendimento quanto à aplicação do Direito aos factos, não configura a nulidade da sentença por contradição entre factos e direito.
II – O recurso subordinado é de admitir em caso decaimento de uma das causas de pedir formuladas. A discordância da decisão do incidente de litigância de má fé, não pode ser fundamento de recurso subordinado.
III – O contrato de mediação imobiliária é um contrato típico e formal.
IV – É um contrato na qual está prevista uma obrigação de meios – a obrigação da mediadora como de diligenciar no sentido de conseguir interessado na realização do negócio.
V – É um contrato oneroso. A remuneração é devida estando dependente do cumprimento da prestação por parte do mediador imobiliário e bem como da ocorrência de um evento que lhe é alheio – contrato visado ou desejado. Apenas com a verificação de um “resultado útil” – a realização do negócio – da actuação do mediador, este ganha o direito à retribuição.
VI – A necessidade de um nexo entre a bem sucedida prestação do mediador e o evento de que depende a sua remuneração – normalmente a celebração do contrato desejado. A actividade do mediador deve fazer parte das causas próximas da conclusão do contrato, ou ser causa adequada à sua produção, não tendo, porém, que ser a única causa.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: PROC. N.º[1] 1484/21.9T8MTS.P1
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Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo Local Cível de Matosinhos - Juiz 2

RELAÇÃO N.º 60
Relator: Alberto Taveira
Adjuntos: Maria Graça Mira
Alexandra Pelayo
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ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO
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I - RELATÓRIO.
AS PARTES
A.: A..., Unipessoal, Lda.
R.: AA
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Pedido:
A) Ser a presente ação declarada procedente por provada e em consequência o R. ser condenado no pagamento do montante de € 13.750,00 (treze mil setecentos e cinquenta euros), correspondentes à retribuição acordada por conta da mediação imobiliária acordada, por contrato, entre as partes;
C) Ser o R. condenado no pagamento do imposto de valor acrescentado correspondente em quantia a liquidar a final;
D) Condenar o R. no pagamento dos juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento.

Para[2] sustentar o seu pedido, alegou, em síntese: que tem como atividade a mediação imobiliária, atuando sob o nome de B...; que no âmbito dessa atividade foi contactada pelo Réu que pretendia vender um imóvel que detinha em comum com a sua companheira e no qual residiam, tendo celebrado contrato com o mesmo pelo qual se obrigou a diligenciar pela angariação de interessado para a compra dessa fração pelo preço de €275.000,00, em regime de não exclusividade, mediante pagamento pelo Réu da quantia de €5% do preço pelo qual o negócio fosse concluído, acrescido de IVA à taxa legal, tendo ficado acordado que a remuneração só seria devida no caso de a mediadora conseguir interessado que concretizasse o negócio visado e que o pagamento dessa remuneração seria efetuado aquando da celebração da escritura ou conclusão do negócio visado; que esse contrato se destinava a vigorar por um período de 6 meses, renovável; que promoveu a venda on line e canais próprios de venda de imóveis; que realizou visitas ao imóvel; que conseguiu encontrar vários interessados que, quando apresentados ao Réu e companheira, não conseguiam chegar a acordo porque estes pretendiam escriturar o negócio, por valor inferior ao real; que a Autora conseguiu encontrar uma cliente verdadeiramente interessada na compra, BB; que recebeu a mesma no seu estabelecimento; que esta referiu ser conhecedora da morfologia do espaço, por ter um familiar residente no mesmo condomínio; que informou o Réu da identidade da interessada; que esta já não compareceu à reunião que havia agendado com a Autora, não mais tendo esta conseguido contactar a mesma, nem com o Réu e sua companheira; que o Réu veio a informá-la de que já vendera particularmente a fração e queria pôr fim ao contrato; que enviou missiva ao Réu advertindo-o de que a Sra BB havia sido por si angariada e solicitado o pagamento da retribuição; que o imóvel foi transmitido para a referida BB e marido, pelo preço declarado de €220.000,00, tendo as partes declarado que não existiu mediação imobiliária.

O Réu apresentou contestação impugnando parcialmente a factualidade alegada e alegou, em síntese: que a agente imobiliária da Autora sugeriu a venda por €275 000,00; que a Autora o informou que o imóvel já estava a ser publicitado sem que as fotos tivessem sido analisadas por si, contrariamente ao combinado; que o anúncio continha alguns erros e que as fotografias não favoreciam o imóvel; que as visitas nunca correram bem; que foi a própria Autora a sugerir a venda por valor inferior ao real, com o pagamento dessa parte da sua comissão em dinheiro; que a Ré nunca lhe comunicou qualquer proposta, tendo a última visita ocorrido em 26/05/2020; que uma vizinha sua teve conhecimento de que o imóvel estava à venda e promoveu a visita do mesmo pela sua irmã, BB e cunhado; que não chegaram a acordo por força do preço e que posteriormente vieram a obter esse acordo pelo valor de €220.000,00, tendo procedido à venda por esse valor; que nunca a Autora lhe falara destes interessados, não tendo havido qualquer intervenção da mesma na venda; que a Autora não tinha poderes para intermediar a venda na sua totalidade, porque só celebrou contrato consigo, pelo que só teria direito a receber 50% da comissão e que nem essa comissão é devida por a Autora não ter tido intervenção na venda; que o imóvel foi vendido por valor inferior ao proposto pela Autora, quer porque se encontrava para venda há mais de meio ano, quer porque vendendo o mesmo particularmente não havia que pagar comissão à imobiliária. Peticionou ainda a condenação da Autora como litigante de má fé em multa e indemnização de valor não inferior a €2.500,00.

A Autora respondeu alegando que promoveu a venda do imóvel na sua totalidade, uma vez que tal foi o que lhe foi solicitado pelo Réu, pelo que tem integral direito à remuneração que acordaram e que sempre o Réu poderia outorgar o contrato de mediação pela sua companheira sem qualquer procuração, como gestor de negócios, sendo que a mesma teve sempre perfeito conhecimento do contrato e esteve presente na data da sua celebração; que o Réu age em abuso de direito ao arguir a nulidade do contrato apenas quando lhe foi pedido o pagamento da remuneração e que não atuou como litigante de ma fé. Mais peticionou a condenação do Réu como litigante de má-fé em multa não inferior a 50 UCs e no pagamento de indemnização nunca inferior a €1 500,00 a título de honorários do seu mandatário e no valor de €4 000,00 a título de indenização pelos prejuízos sofridos.

Foi dispensada a realização de audiência prévia.
Foi proferido despacho saneador, sem selecção de temas de prova, e designada data para audiência de julgamento.
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DA/O DESPACHO/DECISÃO RECORRIDO
Após audiência de discussão e julgamento, foi proferida SENTENÇA julgando parcialmente procedente a demanda, nos seguintes termos:
Face ao exposto, julgo a presente ação parcialmente procedente por provada e, em consequência:
1 – Condeno o Réu a pagar à Autora a quantia de €13.530,00, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, desde 06/11/2020, até efetivo e integral pagamento.
2 – Absolvo o Réu do mais que lhe foi peticionado.“.
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DAS ALEGAÇÕES
O R., vem desta decisão interpor RECURSO, acabando por pedir o seguinte:
(…) b) Declarar a sentença nula por contradição entre a matéria assente e a fundamentação, nos termos do art. 615º, nº 1 al. c) do C.P.C.
Se assim não se entender, o que só por mera hipótese de raciocínio se admite,
c) Ser revogada a douta sentença de fls…, substituindo-se a mesma por decisão que sustente as conclusões do recorrente, absolvendo o Réu do pedido.“.
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O ora recorrente apresenta as seguintes CONCLUSÕES:
“(…)
XI - Foi a acção considerada parcialmente procedente por provada e, em consequência foi o Recorrente condenado a pagar à Autora a quantia de €13.530,00 (treze mil quinhentos e trinta euros), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, desde 06/11/2020 até efetivo e integral pagamento e absolvido do mais peticionado.
XII - Em suma, a Mmo. juiz a quo fundamentou a sua decisão nos seguintes pontos: (1) “No que concerne à concretização do negócio pretendido ela mostra-se evidente, uma vez que o Réu e sua companheira venderam a BB e CC a fracção objecto do contrato de mediação, por valor não inferior a €220.000,00, valor que declararam no documento autenticado de transmissão da propriedade.” (2) “Relativamente ao nexo de causalidade entre a actividade da Autora e o negócio que veio a ser realizado, afigura-se também se verificar este requisito. Isto porque foi a Autora, através da promoção que fez ao imóvel, que informou a compradora, BB, de que a fracção do Réu se encontrava à venda e quais as condições que este pretendia para o negócio, tendo-se esta revelado muito interessada nessa aquisição.”
XIII - Ora, o Recorrente não se pode conformar com a decisão proferida, por esta errar manifestamente na apreciação da prova produzida e nas conclusões retiradas.
XIV – Versa, assim, o presente recurso sobre a decisão da matéria de facto e sobre a decisão da matéria de direito, nos termos dos artigos 639.º e 640.º do Código de Processo Civil.
XV – Assim, o Recorrente considera os factos 33) e 34) incorretamente julgados, porque a prova produzida em audiência de julgamento, impunha uma decisão diferente.
XVI – Isto é, deveria ter sido dado como Não Provado que o sr. DD tenha feito ofertas de compra a este imóvel específico e que tal, tenha sido dado conhecimento ao Réu e companheira.
XVII - Vejamos, em sede de Depoimento de parte, o Réu afirma que - Gravação nº 20211210102906_15930115_2871548 (passaremos a transcrever um excerto):
[00:41] Mandatário Autora: Senhor AA, este e-mail aqui de um senhor DD que foi enviado para uma colaboradora da B... que diz para efetuar uma proposta, uma nova proposta, que é a segunda. Estava a ver de cima para baixo. Valor de compra duzentos e setenta, valor da escritura duzentos e cinquenta mil euros. Escriturado até Julho, valor de entrada quinze mil euros. E anteriormente tinha dito: boa tarde D. EE, relativamente ao apartamento que visitamos ontem vamos fazer uma proposta. Gostamos do apartamento para continuarmos a dar o melhor à nossa filhota. A nossa grande prioridade é e será a educação da FF e o bem-estar dela e por isso vamos propor o seguinte… valor da compra dois cinco cinco, CPCV escritura até Julho e valor de entrada vinte mil euros. Adorávamos ficar com o apartamento e não desista de nós. Obrigado DD. O senhor tem ideia do que isto possa ser? A que se possa referir?
[1:31] Réu: Estou-lhe a dizer… estou realmente surpreso.
[1:38] Mandatário Autora: Não tinha conhecimento de nada? Nunca teve conhecimento de nada disto?
[1:39] Réu: Não. A dizer que me ofereciam duzentos e setenta mil pelo apartamento?
[1:45] Mandatário Autora: Sim… E seria escriturado por duzentos e cinquenta mil euros. É um bocadinho acima dos tais duzentos e vinte, não era?
[2:00] Réu: Olhe, estou completamente atónito. Nunca ouvi falar de tal coisa. Olhe, vou ser sincero, eu costumo até…. Há uma possibilidade de acedermos aos processos online e numa fase inicial fui lá para ver o processo, não é? E nunca vi nada disso…
[2:25] Mandatário Autora: A Autora nunca lhe apresentou a proposta?
[2:26] Réu: Não.
XVIII - Ou seja, daqui resulta que o Réu afirma perentoriamente que não teve conhecimento de qualquer proposta.
XIX - A que acresce, o próprio documento junto com a PI não demonstra qualquer e-mail a dar conhecimento ao Réu. Demonstra sim, um documento de onde consta uma troca de e-mails entre pessoas completamente alheias ao Réu, nomeadamente entre EE@B....pt, matosinhos@....pt, DD@gmail.com e SS@gmail.com.
XX - Ora, nenhum destes e-mail é a dar conhecimento ao Réu nem estas pessoas foram sequer testemunhas nos presentes autos, desconhecendo o Réu quem elas são, as suas funções ou mesmo a que apartamento se referiam.
XXI - Na verdade, o primeiro e-mail foi enviado de DD@gmail.com para EE@B....pt, no dia 10 de Fevereiro de 2020, e onde diz: “Boa tarde D. EE. Relativamente ao apartamento que visitamos ontem, vamos fazer uma proposta. Gostamos do apartamento para continuarmos a dar o melhor à nossa filhota. A nossa grande prioridade é e será a educação da FF e o bem-estar dela e por isso vamos propor o seguinte: Valor de compra: 255.000€. CPCV: escritura até julho e valor de entrada 20.000€. Adorávamos ficar com o apartamento. Não desista de nós. Obrigado. DD”
XXII - Após, temos um segundo e-mail de DD@gmail.com para EE@B....pt com conhecimento de SS@gmail.com, no dia 13 de Fevereiro de 2020, onde diz: “Assunto: Re: proposta de compra apartamento (...). Bom dia. Venho efetuar nova proposta. Valor de compra: 270.000€. Valor de escritura: 250.000€. CVCP: escritura até Julho e valor de entrada 15.000€. Aguardo resposta. Cpts. DD.”
XXIII - Por fim, temos o reenvio destes e-mails de EE@B....pt para matosinhos@....pt, a 16 de Abril de 2021.
XXIV - E, o reenvio destes da matosinhos@....pt para TT@adv.oa.pt, mandatário da Autora, a 16 de Abril de 2021: “Boa tarde, Segue abaixo email que tivemos com proposta ao apartamento.... Atentamente.”
XXV - Ora, desta troca de e-mails completamente alheia ao Réu, conclui-se, que em nenhum momento dos e-mails enviados pelo sr. DD para a imobiliária, identifica o imóvel ou a fracção sobre o qual faz a proposta, desconhecendo-se, assim a que imóvel se refere.
XXVI - A que acresce, em nenhum momento resulta dos e-mails os nomes do Réu, companheira, os seus contactos ou qualquer referência que permita concluir que houve algum contacto ou proposta sobre este apartamento.
XXVII - Mais, a referência ao “apartamento...” é a Autora que o escreve, a 16 de Abril de 2021, aquando do reenvio dos e-mails para o advogado.
XXVIII – É de estranhar – até, porque, muito jeito deu à Autora, o que até ali era designado como “apartamento em ...”, passou a Autora chamar “apartamento...”, para poder instaurar acção no tribunal.
XXIX - Na verdade, a Autora tentou dar uma aparência de uma proposta que em nada teve a haver com o Réu.
XXX - Aliás, embora tenham sido juntas fichas de visita ao imóvel, nenhuma dessas dizia respeito ao sr. DD, não tendo sido, assim, feita prova que este senhor tenha ido sequer visitar o imóvel.
XXXI - Por fim, espante-se, o depoimento do sr. DD foi prescindido pela Autora, pelo que, não confirmou o alegado por esta.
XXXII - Analisando tudo isto, não se percebe como resultou provado os factos 33) e 34).
XXXIII- Nestes termos, da prova testemunhal e documental produzida, dúvidas não restam que o Réu e a companheira nunca tiveram conhecimento de qualquer proposta, designadamente do sr. DD e, nesse sentido, nunca recusaram qualquer acordo.
XXXIV - Assim, o documento junto com a PI concatenadas com os depoimentos prestados, levam a uma conclusão indubitável: não houve propostas levadas ao conhecimento do Réu, designadamente a do sr. DD, pelo que, nunca houve sequer negociações para um acordo.
XXXV - Neste sentido, o Recorrente considera este facto incorretamente julgado, porque a prova produzida em audiência de julgamento, impunha uma decisão diferente, e, consequentemente, deveria ter sido dado como Não Provado que o sr. DD tenha feito ofertas de compra a este imóvel específico e que tal, tenha sido dado conhecimento ao Réu e companheira.
A que acresce,
XXXVI - Também errou a sentença ao considerar provado os pontos 40), 44) 45), 46), 47) e 48).
XXXVII - Ora, o Recorrente considera este facto incorretamente julgado, porque a prova produzida em audiência de julgamento, impunha uma decisão diferente, isto é, deveria ter sido dado como Não Provado que a Autora encontrou uma cliente verdadeiramente interessada na aquisição do imóvel, BB.
XXXVIII - Vejamos, a testemunha BB afirmou que - Gravação nº 20220408170256_15930115_2871548 (passaremos a transcrever um excerto):
[01:30] Mandatária Réu: Já disse que sabe porque está aqui. Está aqui por causa de um imóvel que adquiriu. Como é que teve conhecimento desse imóvel?
[01:37] Testemunha: Bem, a minha irmã mora no mesmo prédio, não é? No primeiro andar e nós tínhamos vendido a nossa casa e estávamos a morar na casa da minha irmã, provisoriamente, até arranjarmos outro apartamento e a minha irmã é que nos falou que tinha encontrado um vizinho e que sabia que ele ia vender e pronto… estava a vender a casa e nós decidimos falar com ele… foi o meu marido…
[02:07] Mandatária Réu: Foi então a sua irmã que lhe apresentou aqui o senhor AA?
[02:08] Testemunha: Sim, sim. Foi a minha irmã… A minha irmã já o conhecia… Já eram colegas de profissão e vizinhos e ela é que me falou… e a minha irmã perguntou-lhe se ele poderia mostrar-me a casa.
[02:19] Mandatária Réu: E depois foi ver a casa?
[02:20] Testemunha: Depois combinamos ver a casa, não é… porque a casa, supostamente, era igual à da minha irmã, mas não é, porque as casas não são todas iguais… Os acabamentos são diferentes e já andava a ver muitas casas, não é… E queria ver as condições em que a casa estava, porque nem toda a gente...
[02:37] Mandatária Réu: Em que altura foi, mais ou menos, isso? Portanto, em que ficou a saber pela sua irmã que o senhor AA tinha a casa à venda e depois foi lá fazer…
[02:44] Testemunha: Mais ou menos em… Eu acho que foi início de Julho.
[02:47] Mandatária Réu: Mais ou menos em Julho?
[02:48] Testemunha: Julho. Porque nós fomos de férias nessa altura… já estávamos em casa da minha irmã, já tinha visto a casa quando fomos de férias, por isso…
[02:53] Mandatária Réu: Mais ou menos. De que ano? Estamos em 2022…
[03:02] Testemunha: Foi em 2020.
XXXIX - A este respeito, o Réu afirmou que - Gravação nº 20211212093744_15930115_2871548 (passaremos a transcrever um excerto):
[13:51] Mma. Juíza: Pronto e então como é que venderam o imóvel?
[13:52] Réu: Olhe, estava de férias em Julho e tinha encontrado uma vizinha minha, que é enfermeira como eu, e com esta questão da pandemia encontrávamo-nos os dois e conversávamos sobre o que estava a acontecer. E um dia ela diz-me que a irmã tinha vendido o imóvel e que gostava muito de viver para perto dela e ela sabia que… o apartamento estava à venda e se a irmã podia ir lá visitar. E eu disse que sim, uma vez que tinha regime de não exclusividade com a agência imobiliária, que ela poderia ir visitar. E foram visitar, o casal foi visitar o imóvel.
XL - Também a testemunha CC afirmou - Gravação nº 20220408153858_15930115_2871548 (passaremos a transcrever um excerto):
[30:12] Mandatária Réu: Boa tarde, senhor CC. Vou fazer aqui um apelo à sua memória. Quando é que conheceu o senhor AA? Recorda-se?
[30:20] Testemunha: Eu terei conhecido o senhor AA na altura em que fui visitar o imóvel para ver as condições em que ele estava… em que o imóvel estava…
[30:31] Mandatária Réu: E isso foi através de quem? Como é que chegou? Ou seja, já referiu aqui que soube que o imóvel estava à venda pela sua cunhada…
[30:38] Testemunha: Sim.
[30:42] Mandatária Réu: Foi a sua cunhada que o apresentou ao senhor AA? Como é que foi isso?
[30:48] Testemunha: Foi isso. A minha cunhada, no fundo, estabeleceu aqui um contacto e levou-nos, então, à casa do senhor AA. Mostrou-nos onde é que era e quem era o senhor AA para nós podermos visitar o apartamento.
(…)
[32:47] Mandatária Réu: Consegue, apelo mais uma vez à sua memória, enquadrar isto? Esta visita que já referiu aqui que conheceu o senhor AA através da sua cunhada, penso que é GG, certo?
[32:56] Testemunha: Sim.
[32:57] Mandatária Réu: Se isto… Em que altura foi? Foi antes da tal visita à imobiliária ou foi depois? Se consegue…
[33:08] Testemunha: Eu diria que foi antes da ida da BB à imobiliária.
[33:18] Mandatária Réu: Portanto quando ela foi à imobiliária já tinham visto este imóvel?
[33:21] Testemunha: Já tínhamos visto este imóvel e inclusive acho que já tínhamos até estabelecido, digamos, o segundo contacto ou o contacto seguinte para perceber que valor o senhor AA estaria a pedir pelo imóvel.
[33:46] Mandatária Réu: Ok. Portanto, não tem dúvidas nenhumas que a forma como conheceu não teve nada a ver com a imobiliária?
[33:52] Testemunha: Disso não tenho qualquer dúvida. Muito sinceramente, a primeira vez que ouvi falar na imobiliária foi quando soubemos que íamos ser testemunhas neste processo.
[34:01] Mandatária Réu: Portanto, quem apresentou foi a GG. Foi a GG que estabeleceu o ponto de ligação?
[34:08] Testemunha: Exatamente
[34:08] Mandatária Réu: Estas primeiras negociações que já foi dito não chegaram à acordo nesta primeira fase foi tudo entre o sr. CC e o Sr. AA?
[34:16] Testemunha: Sim…
[34:19] Mandatária Réu: A imobiliária… referiu agora, acabou agora de dizer que não tinha conhecimento. Portanto, a imobiliária nunca participou nestas negociações? Quer dizer, esta troca de mensagens, e-mails, de chamadas telefónicas, a imobiliária nunca teve intervenção?
[34:30] Testemunha: Não, nunca teve.
XLI - Também a testemunha GG afirmou - Gravação nº 20220421091453_15930115_2871548 (passaremos a transcrever um excerto):
[01:58] Mandatária Réu: O que é que a enfermeira GG sabe sobre isso? O que é que pode dizer sobre essa venda do apartamento?
[02:05] Testemunha: Eu acho que o único motivo pelo qual eu estou aqui é para confirmar que fui eu que dei a conhecer à minha irmã, que na altura até estava a morar em minha casa que havia um vizinho que tinha posto o apartamento à venda.
[02:17] Mandatária Réu: Ela estava a morar em sua casa, porquê?
[02:19] Testemunha: Porque já tinha vendido o apartamento dela e andava à procura...
[02:24] Mandatária Réu: Andava à procura de casa. Como é que a enfª GG sabia que o apartamento estava à venda?
[02:29] Testemunha: Porque eu encontrei o AA, mais uma vez, e em conversa, se estava tudo bem, se estava tudo bem com o menino dele e ele disse: olha, vamo-nos mudar… E eu disse: ai vais? Sim, vamos para outra casa e tal... E eu disse: Já vendeste o apartamento? Não, está à venda. E foi aí que me soou…
[02:49] Mandatária Réu: Foi a enfermeira GG que falou com a sua irmã e o seu cunhado disso? Ou foram eles que viram alguma placa, como é que foi?
[02:58] Testemunha: Não, não. Fui eu que disse logo à minha irmã. Olha que eu tenho um vizinho que está a pensar vender a casa e se calhar não era má ideia falares com ele.
[03:07] Mandatária Réu: Lembra-se em que altura, mais ou menos, foram essas conversas, em que falou com a sua irmã sobre a casa?
[03:15] Testemunha: Eu o dia não sei precisar, mas foi no início de Julho. Isso eu sei, porque a minha irmã já estava lá… e até foi o meu período de férias, por isso, sei que foi no início de Julho
[03:24] Mandatária Réu: Sra. Doutora queria confrontar a testemunha com o documento 4 junto com a contestação.
[03:43] Mma. Juíza: As folhas não estão numeradas Sra. Dra. São as mensagens, é isso senhora doutora?
[03:49] Mandatária Réu: Exatamente. Enfª GG peço por favor para (impercetível) diz GG, esse número de telefone…
[04:02] Testemunha: Sim, é o meu.
[04:03] Mandatária Réu: É o seu?
[04:04] Testemunha: Sim.
[04:05] Mandatária Réu: Recorda-se desta troca de mensagens? Com quem é que foi essa troca de mensagens.
[04:08] Testemunha: Já não lembro exatamente do dia, não é…, mas sim, falei com o AA e o AA depois mandou mensagem a dizer que eles podiam ir lá só que eles ainda não tinham chegado a casa… eles nem sequer tinham o contacto deles, foi comigo.
[04:22] Mandatária Réu: Portanto, este primeiro contacto foi através da enfª GG?
[04:24] Testemunha: Comigo, sim.
XLII - Posto isto, resultou provado que, em Julho de 2020, BB e CC tiveram conhecimento através de GG, irmã daquela e vizinha do Réu, que este tinha o imóvel à venda.
XLIII - Nesta sequência, GG combinou com o Réu, apresentar-lhe a irmã e o cunhado.
XLIV - Por isso, no dia 13 de Julho de 2020, conforme doc. 4 junto com a contestação, houve a seguinte troca de mensagens entre o Réu e GG: Às 16h23: “Boa tarde GG! Já cheguei a casa. Quando quiserem podem vir. Cumprimentos.” Às 16h28: “Obrigada. O meu cunhado ainda não saiu do emprego… só mesmo às 17h.” Às 16h29: “Ok GG. Combinado.”
XLV - Esta troca de mensagens a 13 de Julho é coincidente com as declarações das testemunhas.
XLVI - Mais, após este dia onde conheceram o imóvel, marcaram novo encontro para falarem de valores, tendo o mesmo ocorrido em 20 de Julho de 2020 e originado a seguinte troca de mensagens: Às 21h04, CC envia a seguinte mensagem ao Réu: “Boa noite AA, quando quiser podemos ir.” Ao qual, o Réu respondeu: “Boa noite! Vou descer agora mesmo. Até já.”
XLVII - Assim, dúvidas não restam que foi GG que apresentou a irmã e o cunhado ao Réu.
XLVIII - Ora, erra a sentença ao considerar que, na sequência de todas diligências realizadas na segunda quinzena do mês de agosto de 2020, a Autora, encontrou uma cliente interessada na aquisição do imóvel, BB, pois nesta data já os compradores conheciam o Réu e o imóvel desde Julho de 2020.
XLIX - A este respeito referiu a testemunha BB - Gravação nº 20220408170256_15930115_2871548 (passaremos a transcrever um excerto):
[05:02] Mandatária Réu: Posteriormente a isto, qual foi… não chegaram a acordo era um bocadinho mais do que estavam dispostos a dar, o que é que aconteceu depois?
[05:13] Testemunha: Continuamos à procura de casa, não é…. Vi também imensas imobiliárias, à procura… E um dia passei nessa imobiliária, em Matosinhos, que é relativamente perto do colégio onde o meu filho anda e…
[05:26] Mandatária Réu: Em que altura foi isto, mais ou menos?
[05:30] Testemunha: Foi depois das férias de Verão. O colégio fecha os primeiros quinze dias de Agosto, por isso, tem de ter sido depois de 15 de Agosto.
[05:35] Mandatário Réu: Portanto, depois de 15 de agosto.
[05:37] Testemunha: Tem de ter sido depois de 15 de Agosto… não sei dizer o dia… sim, sim, depois de 15 de agosto. Passei nessa imobiliária e na porta tinha uma publicidade de um T2, em Matosinhos, com, não sei, 125m2, não sei precisar… O valor era razoável, não sei se eram 180 mil, ou 190 mil, também não sei precisar…
[06:01] Mandatário Réu: Viu uma casa…
[06:06] Testemunha: Vi um apartamento, um t2 que estava… sim, tinha a fotografia cá fora e entrei…
[06:07] Mama. Juíza: E era o que queria?
[06:11] Testemunha: Não, não era o que queria. Eu vi um apartamento que me chamou a atenção por ser no centro de Matosinhos por aquele valor. Eu andava à procura de uma casa, não tinha especificamente de ser um T3… não tinha especificamente de ter aquelas características…. Andava à procura… Se fosse um T2 com umas boas áreas também me poderia interessar, dependendo da localização. E entrei na imobiliária, falei com uma senhora que agora não lhe sei dizer o nome, que é de nacionalidade brasileira… falou comigo.
[06:35] Mandatária Réu: estava lá fora?
[06:36] Testemunha: estava lá fora sim.
[06:40] Mandatária Réu: Foi esta última senhora que entrou aqui antes de si?
[06:41] Testemunha: Sim… Já não sei o nome. Não sei se era HH.
[06:46] Mandatária Réu: Dona II…
[06:47] Testemunha: Pronto, e ela o que me disse foi que aquele apartamento já não estava disponível, que tinha sido vendido. Pronto, ela perguntou-me o que eu andava à procura, mais ou menos as características que eu estava à procura e ela propôs me este apartamento, que eu já tinha visto. Pronto, ela fez a proposta deste apartamento e eu disse que não, este apartamento já eu vi e pelo valor que ela me disse estava completamente fora de questão. Que já tinha visto o apartamento e ela perguntou como é que eu tinha visto, porque é que que tinha visto o apartamento e eu expliquei exatamente o que expliquei agora: a minha irmã que mora lá no prédio e falou com o vizinho… pronto, a senhora disse que ia procurar outros apartamentos e que ficaríamos ali em contacto.
(…)
[08:08] Mandatária Réu: Depois ficou de apresentar, a D. BB ficou de falar com o seu marido para apresentar uma proposta em relação a este ou nunca mais falaram deste assunto?
[08:20] Testemunha: Não ficou suposto falarmos de nada. Na altura, falamos disso, a conversa ficou por ali e a senhora disse me assim: pronto, então vamos ver, arranjar outro apartamento, não é? Tentar ver se na nossa carteira temos outros apartamentos que lhe interesse. Chegou a enviar-me, por whatsapp, outro apartamento na rua ..., ou não sei… um apartamento que tinha, um t3… chegou a enviar-me um t2 que eu já tinha visto com outras agências imobiliárias, que estava fora de questão, porque também já tinha visto. A conversa ficou por aí. Entretanto a senhora ligou-me a perguntar se eu podia, não sei exatamente quanto tempo depois, se foi uns dias depois, se foi uma semana depois, isso eu já não sei precisar, se eu podia passar na agência para falarmos. E eu disse que sim, supus eu que tivesse alguma proposta para me fazer de outro apartamento... alguma coisa.
L - Na verdade, se o imóvel se encontrava à venda no prédio da testemunha GG, enfermeira de profissão como o Réu, é perfeitamente normal ter sido através desta testemunha que se tenha estabelecido a ponte de contacto.
LI - A que acresce, o tribunal a quo esteve mal ao não ficar “convencido da veracidade da troca de mensagens constantes dos docs. nº 4 e 5 juntos com a contestação, atenta a facilidade em alterar as datas das mensagens trocadas por telemóvel”, mas já considerar os e-mails juntos pela Autora e o doc. nº 12 junto com a petição inicial.
LII - O Tribunal considera que, por um lado, os documentos do réu podem ser alterados, mas, por outro lado, os documentos da autora são fidedignos. Como se estes também não pudessem ser alterados.
LIII – Conclui-se que, na perspetiva do tribunal a quo então, sendo todos os documentos enviados por sistema informático Citius e, por isso, não sendo originais, qualquer PDF pode ser adulterado – o que é errado.
LIV - A que acresce, a respeito do doc. nº 12 junto com a petição inicial foi referido pela testemunha II que pode colocar a hora que quiser no programa informático, contudo, mesmo após estas declarações o tribunal a quo considerou o doc. nº 12 fiável.
LV - Vejamos, disse a testemunha II - Gravação nº 20220408163048_15930115_2871548 (passaremos a transcrever um excerto):
[24:16] Mma. Juíza: Então?
[24:16] Testemunha: Se o computador tem o seu horário normal, que é às oito horas…. É o horário que fica inicial no sistema. Se eu não mudar o horário…
[24:24] Mma. Juíza: Sabe que, por isso é que é um computador, não é, sabe que horas são?
[24:28] Testemunha: Sim. Se eu não mudar esse horário, vai ficar registado o horário que eu escrevi. Ou seja, se está registado oito horas e eu escrevi na qualificação que coloquei às 17h ou 16h, ele vai reconhecer esse horário. Eu tenho sistema, se eu puder posso mostrar para a doutora ver como é que fica…
[24:54] Mma. Juíza: Pode sentar.
[24:56] Mandatária Réu: Ou seja, então esse programa não é muito fidedigno, não é? Porque aparece por defeito sempre a mesma hora se vocês não alterarem?
[25:07] Testemunha: Se não alterar o horário, sim.
[25:07] Mandatária Réu: É possível, vocês alterarem a hora?
[25:09] Testemunha: Não.
[25:10] Mandatária Réu: Se não alterarem, vai aparecer sempre por defeito as 8h…
[25:14] Testemunha: Vai aparecer sempre as 08h.
[25:15] Mandatária Réu: Ou seja, é possível. Aliás, até disse que tinha de ir lá colocar a hora certa.
[25:24] Testemunha: Sim.
LVI - Assim, também neste ponto a sentença de que se recorre erra manifestamente.
LVII - Da prova testemunhal produzida, dúvidas não restam que BB e o marido tiveram conhecimento que o Réu e a companheira estavam a vender o apartamento pela GG, irmã de BB, em inícios de Julho, muito antes da ida à imobiliária.
LVIII - Na sequência, dessa comunicação, foi a testemunha GG que apresentou o vendedor aos compradores.
LIX - Nesta senda, é falso que, em agosto de 2020, a Autora tenha encontrado na BB uma cliente verdadeiramente interessada, pois a BB já conhecia o imóvel e o Réu.
LX- Pelo que, errou a sentença ao considerar provado os pontos 40), 44), 45), 46), 47) e 48), pois a prova produzida em audiência de julgamento, impunha uma decisão diferente.
LXI - Ou seja, deveria ter sido dado como Não Provado que a Autora encontrou uma cliente verdadeiramente interessada na aquisição do imóvel, BB.
Mais,
LXII - A Sentença padece de nulidade por contradição entre a matéria assente e a fundamentação, nos termos do art 615º nº 1 al. c) do CPC.
LXIII - Resulta dos próprios factos provados os pontos 70), 71), 72), 73) e 74), isto é, nunca a Autora levou ao conhecimento do Réu qualquer contacto ou interesse por parte de BB.
LXIV - Mais, quem apresentou o Réu a BB e CC, foi GG.
LXV - Quem fez a apresentação do imóvel foi o Réu e a companheira.
LXVI - Quem fez as negociações, foi o Réu e a testemunha CC.
LXVII - Nunca a imobiliária teve qualquer intervenção.
LXVIII - Perante esta matéria assente, como não pode o tribunal considerar que houve actos de mediação mobiliária neste contrato específico, pois a Autora nem sequer levou ao conhecimento do Réu qualquer proposta nem sequer lhe deu conhecimento da ida da BB à imobiliária, não apresentou as partes nem participou nas negociações.
LXIX - Ora, é notório e resulta provado que não houve actos de mediação mobiliária neste contrato de compra e venda.
LXX - Pelo que, havendo contradição entre a matéria assente e a fundamentação estamos perante uma nulidade, nos termos do art. 615º, nº 1, al. c).
LXXI - Esta nulidade ocorre quando o raciocínio do juiz aponta num sentido, contudo, decide em sentido diferente.
LXXII - No caso dos presentes autos, está em causa a estrutura lógica da sentença, isto é, a sentença proferida seguiu um caminho oposto daquele que apontava a matéria assente, pelo que, a sentença é nula, nos termos do art. 615º, nº 1, al. c) do C.P.C..
Por fim, da aplicação do direito
LXXIII - O contrato de mediação imobiliária está previsto e regulado na Lei 15/2013, de 8 de fevereiro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei 102/2017, de 23 de agosto (RJAMI).
LXXIV - Resulta do RJAMI, no art. 16º, nº 2, al. g), que o acordo de exclusividade tem de constar obrigatoriamente do contrato.
LXXV - Analisado o contrato sub judice, conclui-se, na cláusula quarta que: “O Segundo Contratante contrata a Mediadora em regime de não exclusividade.”
LXXVI - Estamos, assim, perante um contrato de mediação simples, querendo isto dizer, que a Autora não tinha de ser a única a promover o contrato desejado.
LXXVII - Podia ser promovido por outras Agências Imobiliárias, bem como pelos próprios proprietários, não havendo qualquer violação contratual.
LXXVIII – A respeito da remuneração, só existe direito à remuneração por parte da Autora se se verificar um nexo de causalidade entre a actividade da mediadora e o contrato final que vier a ser celebrado.
LXXIX - Nesta senda, vide Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 15 de Julho de 2009, relator Exmo. Sr. Juiz Desembargador Carlos Moreira (www.dgsi.pt): “Pode-se, assim, afirmar que o direito à retribuição está sujeito a condição suspensiva: a celebração do negócio. E, tal como se diz na sentença, tal remuneração apenas é devida, se se verificar uma relação causal entre a actuação do mediador e a conclusão e perfeição do contrato. (…) Pelo que, inexistindo tal nexo tal é uma fatalidade com que as empresas de mediação, que são comerciantes, que exercem uma actividade comercial numa economia de mercado, têm de viver, e é nesse pressuposto que a desempenham, sendo que as percentagens cobradas sobre o valor das vendas que ajudam a concretizar têm já em conta o risco ou álea.”
LXXX - A este respeito, vide também o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 10 de Setembro de 2019, relator Exmo. Sr. Juiz Desembargador Carlos Moreira (www.dgsi.pt): “Tem de existir um nexo de causalidade adequada entre a actividade do mediador e a celebração do negócio no sentido de que o mediador só adquire direito à comissão quando a sua actividade haja influído de forma decisiva para a conclusão do negócio visado, vg. através da aproximação do comitente com terceiros e que esta influência resulte na celebração do negócio – cfr. entre outros, Acs. RC de 09.09.2014, p. 1421/12.1TBTNV.C1 cit. na sentença, relatado pelo aqui relator e subscrito pelo aqui 1º adjunto, e de RC de 24.03.2015, p. 811/13.7TBVIS.C; e Ac. do STJ de 12.12.2013, p. 135/11.4TVPRT.G1.S1.”
LXXXI - Também nesta esteira, vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de Dezembro de 2013, relator Exmo. Sr. Juiz Conselheiro Granja da Fonseca (www.dgsi.pt): “O direito à remuneração implica a execução da prestação contratual a que o mediador se obrigou, nomeadamente a prática dos actos adequados a conseguir que seja atingido o objectivo do contrato, objectivo este que é a concretização e perfeição do negócio visado com a mediação”.
LXXXII - De facto, tem sido entendimento generalizado na jurisprudência que o mediador, no contrato de mediação imobiliária, só tem direito à remuneração convencionada com o comitente/cliente se o negócio visado tenha sido a consequência da sua actividade – exigindo-se um nexo causal entre a sua actuação e a outorga do contrato visado.
LXXXIII - Ora, analisando o caso em concreto, nunca a Autora comunicou ao Réu da visita de BB às suas instalações, apenas o tendo feito quando o Réu comunicou que tinha vendido o imóvel; nunca a Autora apresentou BB e o marido ao Réu; nunca a Autora apresentou o imóvel aos compradores; nunca a Autora levou ao conhecimento do Réu qualquer eventual proposta feita por BB e nunca a Autora participou de qualquer negociação do preço.
LXXXIV - Como supra referido, o contacto do Réu foi estabelecido directamente com GG, vizinha do Réu e irmã de BB, tendo sido esta a apresentar os futuros compradores do imóvel em Julho.
LXXXV - A visita foi marcada entre o Réu e os interessados e as negociações foram entre eles.
LXXXVI - Nunca tendo existido qualquer intervenção por parte da Autora, pelo que, não existindo, assim, nenhum nexo de causalidade entre a actuação da Autora e a compra e venda do imóvel, consequentemente, nada lhe é devido.
LXXXVII - A este respeito, vide o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12 de Outubro de 2021, Relatora Exma. Sra. Juíza Conselheira Lina Baptista (www.dgsi.pt): “As dificuldades surgem na definição da amplitude mínima deste nexo de causalidade, principalmente em casos, como o presente, em que não existe exclusividade. Nestas situações específicas, deve entender-se – tal como explica Maria de Fátima Ribeiro - que, na identificação deste nexo causal “O critério determinante deverá ser o da ligação psicológica entre a actividade do mediador e a vontade de o terceiro concluir um contrato com o comitente – e a afirmação dessa ligação não deve ser posta em causa pelo lapso temporal entretanto decorrido entre o exercício da actividade e a conclusão do contrato, bem pelos factos ocorridos nesse período de tempo, v.g., a intervenção de um novo mediador.” O determinante é, portanto, que a decisão de contratar do terceiro tenha sido determinada pela actuação do mediador. Ou, usando mais uma vez as palavras de Maria de Fátima Ribeiro, “de modo a integrar-se de forma idoneamente determinada na cadeia dos factos que lhe deram origem.”
LXXXVIII - Também o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03 de Abril de 2008, relator Exmo. Sr. Juiz Conselheiro Santos Bernardino (www.dgsi.pt) dispõe: “Para que a mediadora tenha direito à remuneração acordada não basta, no entanto, que o interessado com quem vem a ser celebrado o negócio a tenha contactado, tal como não basta que o tenha acompanhado numa visita ao imóvel, ainda que tenham sido esse contacto e essa visita que despoletaram nesse terceiro o interesse no negócio que, mais tarde, se veio a concretizar. Para que a mediadora tenha direito a tal remuneração será ainda necessário que tenha apresentado esse interessado ao seu cliente (ainda que seja pelo mero fornecimento da identificação das pessoas que a contactam e às quais proporciona uma visita ao imóvel) ou que, de qualquer forma, tenha potenciado ou facilitado o contacto entre ambos, promovendo a sua aproximação, já que é este o cerne da mediação e o conteúdo essencial da prestação a que se obrigou pelo contrato de mediação.”
LXXXIX - Continuando: “Assim, se, no âmbito de um contrato de mediação em regime de não exclusividade, o proprietário do imóvel celebra o negócio visado na mediação com um terceiro que o contacta directamente, não obstante já ter contactado a mediadora e visitado o imóvel por intermédio desta, e não tendo ficado provado que tenha sido a mediadora a apresentar – por qualquer meio – esse interessado ao seu cliente ou que a mediadora tenha informado oportunamente o seu cliente de que tal interessado a havia contactado e que, por intermédio dela, havia visitado o imóvel e não estando sequer provado que, à data da celebração do negócio, o proprietário (cliente da mediadora) tivesse conhecimento daquele contacto e visita, não estão reunidos os necessários pressupostos para que possa ser reconhecido à mediadora o direito à retribuição acordada no contrato de mediação.”
XC - Do explanado se conclui, portanto, que a Autora, não tendo tido uma intervenção cabal na concretização do negócio – no caso dos autos nem teve nenhuma intervenção – não haverá lugar a remuneração, suportando, então, o mediador o risco da sua actividade comercial.
XCI - De relembrar que a Autora nunca informou o Réu que BB tinha ido à imobiliária.
XCII – Destarte, o Réu desconhecia em absoluto esse facto até à venda do imóvel.
XCIII - Pelo que, a Autora não cumpriu com as suas obrigações contratadas, resultantes do contrato de mediação imobiliária celebrado.”, realçado nosso.
*
A A. apresentou CONTRA-ALEGAÇÕES, pugnando pela improcedência do recurso.
Apresentou as seguintes conclusões:
I - Vem o douto recurso apresentado pelo recorrido a levantar um conjunto de pontos da matéria de facto dada como provada que considera erradamente julgados, bem assim, a realçar questões de direito com as quais não concorda.
II - Não querendo a recorrida substituir-se ao douto juízo judicativo-decisório a proferir por v/ exas., antes de mais se diga, por economia processual, não assiste qualquer razão ao recorrente, seja de facto ou de direito,
III - O único momento em que a douta sentença proferida pelo tribunal a quo não é totalmente precisa é ao não condenar o recorrente como litigante de má- fé, circunstância que, v/ exas. muito doutamente irão corrigir, como desde já, nos termos do 636.º do CPC, como ampliação do âmbito do recurso se requer.
IV – A douta sentença proferida pelo tribunal a quo termina, não sem antes ordenar que: “abra vista ao ministério público com vista a aferir se, face aos indícios de fraude no valor declarado para a venda da fração, interessa a extração de certidão para procedimento criminal.”
V – Atento o principio da imediação, resultaram da convicção do tribunal a quo perante (leia-se, in loco) a prova que perante si era produzida.
VI – Muito se estranha a impugnação quanto à matéria de facto se possa conformar o recorrente com os pontos assentes 35, 36, 41, 42, 43, 50, 51 e 52 como aparentemente, se conforma.
VII – Todos estes pontos da matéria de facto dada como provado pela douta sentença proferida pelo tribunal a quo, pese embora o conteúdo do douto recurso a que se responde, não foram impugnados pela contraparte, quer isto significar que esta se conforma com essa realidade da vida materializada em juízo, de forma que não mais se pode retratar.
VIII – Visa o recorrente a impugnação dos pontos 33 e 34 da matéria de facto dada como provada.
X – Olvida, porém, o anterior enquadramento dos pontos 29 a 36 da matéria de facto dada como provada), já supra mencionado e que se aponta o enfase para os pontos 35 e 36,
X – Refere o douto acórdão proferido pelo tribunal a quo, a respeito da formação da convicção quanto a esta parte da matéria de facto, que: “no que concerne aos interessados encontrados pela autora, levou-se igualmente em conta os depoimentos das referidas testemunhas e representante legal da autora e ainda os e-mail de propostas enviado por DD junto aos autos em 05/09/2022, que revelam que quer a testemunha BB, quer o referido DD tinham efetivo interesse na aquisição do imóvel.”
XI – O tribunal a quo assentou, além do mais, a sua convicção, no documento junto pela recorrida aos autos em 05/09/2022, o qual não foi, em momento algum, impugnado pelo recorrente, o que equivale a aceitação.
XII – Como tal, haverá que improceder a impugnação dos pontos 33 e 34 da matéria de facto, o que se requer!!
XIII – Pretende o recorrente ver os pontos 40, 44, 45, 46, 47 e 48 da matéria de facto dados como não provados.
XIV – Tão grande ignomínia perante a circunstância de que, pelo menos, parte do facto 45 e parte do facto 46 resultaram da própria confissão do recorrente
XV – Porventura se haverá de questionar se tal não resulta em abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium
XVI – No seu jeito já tradicional, o recorrente questiona até a imparcialidade do tribunal a quo, apelidando-o (ao tribunal) despudoradamente de parcial
XVII – São a livre apreciação do julgador e as regras da experiência que determinam a prolação de qualquer juízo decisório.
XVIII – O princípio da livre apreciação da prova nunca atribui ao tribunal a quo o poder arbitrário de julgar os factos sem prova ou contra as provas.
XIX – A livre apreciação da prova não pode confundir-se com uma qualquer arbitrária análise dos elementos probatórios.
XX – Pelo contrário, é antes uma conscienciosa ponderação desses elementos e das circunstâncias que os envolvem e que culminaram com a prolação da douta sentença nos exatos termos em que o foi.
XXI – A atribuição de credibilidade a uma fonte de prova que se baseia numa opção assente na imediação e na oralidade, só poderá ser alvo de censura pelo tribunal ad quem se ficar demonstrado que tal opção é inadmissível face às regras da experiência comum.
XXII – Na inquirição da testemunha II, de nacionalidade brasileira e, como tal, para lá da partilha de idioma, desconhecedora de alguns conceitos técnicos (in casu, informáticos) relativamente ao funcionamento e eventual aposição de datas do sistema informático da recorrida tenta o recorrente deturpar o sentido do seu depoimento.
XXIII – Da gravação da testemunha II – gravação N.º 202204008163048_15930115_2871548, consta claramente o oposto do sentido que o recorrente quer preconizar. vejamos: 24:11 – mma. juíza: mas o computador vai pôr às cinco se são seis? 24:14 – testemunha: não. 24:15 – mma. juíza: então? 24:16 – testemunha: se o computador tem o seu horário normal, que é às oito horas… é o horário que fica inicial no sistema. se eu não mudar o horário. 24:24 – mma. juíza: sabe que por isso é que é um computador, não é, sabe que horas são? 24:27 – sim, se eu não mudar esse horário, vai ficar registado o horário que eu escrevi. ou seja, se está registado oito horas e eu escrevi na qualificação que não coloquei às 17h ou 16h, ele vai reconhecer esse horário. eu tenho sistema, se eu puder posso mostrar para a doutora ver como é que fica… (…)25:07 – mandatária réu: é possível vocês alterarem a hora? 25:09 – testemunha: não.
XXIV – Pese embora a, salvo o devido respeito, deturpação tentada, fácil é de ver ao homem comum que qualquer sistema informático (software) haverá de assumir o calendário do computador (hardware) onde se encontra instalado.
XXV - Mais se compreenderá, nem que seja por regra da experiência que qualquer programa de registo informático de atividade é idóneo a alterar a hora do dia em questão,
XXVI – Admitir essa hipótese, seria quase antever a pré-pretensão da recorrida nesta lide judicial, já como inicial escopo comercial da sua atividade…
XXVII – Haverá a impugnação requerida quanto aos pontos 40, 44, 45, 46, 47 e 48 da matéria de facto que improceder, o que muito respeitosamente se requer.
XXVIII – Invoca o recorrente ainda a nulidade da douta sentença por alegada contradição entre a matéria assente e a fundamentação através do conteúdo dos factos provados de ponto 70 a 74
XXIX – A atividade de mediação imobiliária, a bom termo, não implica, necessária e casuisticamente a apresentação das partes entre si.
XXX – Permita-se o coloquialismo, não carece o mediador de agendar um café entre as partes para que estes se conheçam e apertem polegares.
XXXI – A tarefa da angariadora imobiliária prende-se com uma obrigação de meios, a obrigação de proporcionar aquele negócio, a aproximação entre comitente e comissário.
XXXII – Não assistem duvidas na recorrida da veracidade dos pontos 70 a 74 da douta sentença, coincidem, aliás, com a própria estratégia posterior, com a qual o recorrente compactuou, de tentar eximirem-se ao pagamento da remuneração devida à agência de mediação imobiliária.
XXXIII – Não se verifica a nulidade invocada, havendo a sua arguição que improceder, o que respeitosamente se requer!!
XXXIV – Pugna o recorrente pela errada aplicação do direito por parte do tribunal a quo ao mesmo tempo que pugna por “americanismos” não constantes da lei como é o caso da tal “mediação simples”.
XXXV – Estabelece-se no artigo 19º Nº 1 e 2 da Lei Nº 15/2013, de 08/02, com as sucessivas alterações que: “1 — a remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra.
XXXVI – O Dr. Fernando Baptista de Oliveira, o contrato de mediação imobiliária na prática judicial, cej, 2016, páginas 14 e segs, refere que “agora (diferentemente, portanto, do anterior dl 211/2004) a atividade do mediador já não é definida por uma obrigação de diligenciar, mas, sim, de procurar (... destinatários para a realização de negócios). mas sendo a obrigação essencial que impende sobre a mediadora a de angariar interessado para o negócio, praticar atos isolados, tal significa que não basta que a mediadora faça diligências no sentido de aproximar os interessados na realização do negócio. se assim fosse bastar-lhe-ia simular um comprador que se mostrasse interessado e depois desistisse do negócio, mesmo que sem qualquer fundamento sério.
XXXVII – O tribunal a quo declarou improcedente o incidente de litigância de má fé arguido pela recorrida/autora, com os fundamentos constantes da sentença que por economia processual se dão por reproduzidos.
XXXVIII – Entende a recorrida que tal foi incorretamente julgado, existindo motivos por demais que possibilitem a condenação do recorrente como litigante de má-fé,
XIL - Quanto mais não seja, pelo interesse público pela justiça que este instituto visa proteger.
XL - Atentos os fundamentos já invocados em 1.ª instância, aqui por economia reproduzidos, deverá ser admitida ampliação do objeto do recurso, nos termos do n.º 1 do artigo 636.º do cpc e em consequência ser alterada a decisão proferida pelo tribunal recorrido no que concerne com a condenação do recorrente como litigante de má-fé.”
*
A M.ma Juíza pronunciou-se sobre a arguida nulidade, afirmando pela sua não verificação, sustentando a sua decisão.
*
Neste Tribunal da Relação do Porto foi a recorrida, A., devidamente notificado nos termos dos artigos 655.º, n.º 1 e 652.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil, da eventual não admissão do recurso, rejeitando-o.
Apenas o R., veio pronunciar-se.
***
*
II-FUNDAMENTAÇÃO.
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Civil

Como se constata do supra exposto, as questões a decidir, são as seguintes:
A) Da nulidade da sentença por contradição entre os factos provados 70 a 74 e a fundamentação, ie, que não houve actos de mediação mobiliária no contrato de compra e venda levado a cabo pelo R..
B) Admissibilidade do recurso subordinado.
C) Alteração da decisão da matéria de facto
i) Factos provados 33 e 34, deveria ser dado como não provado que o sr. DD tenha feito ofertas de compra a este imóvel específico e que tal, tenha sido dado conhecimento ao Réu e companheira.
ii) Os factos provados em 40, 44, 45, 46, 47 e 48, devendo ser dado como não provado que a Autora encontrou uma cliente verdadeiramente interessada na aquisição do imóvel, BB.
D) Na subsunção ao Direito, em consequência da alteração da matéria de facto, análise do direito à remuneração por parte da A. e verificação de nexo de causalidade entre a actividade da A. e o contrato final.
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A)
Da nulidade da sentença por contradição entre os factos provados 70 a 74 e a fundamentação.
Argumenta o recorrente, que dos factos resulta que não foi a A. lhe apresentar os compradores (BB e CC), que não teve intervenção na negociação, ou contacto tendo à realização da alienação. Conclui que ocorrerá contradição com esta factualidade e a argumentação jurídica que aponta em sentido contrário.
Vejamos.
Dispõe o artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Civil, o seguinte:
1- É nula a sentença quando: (…)
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível“.
JOSÉ LEBRE DE FREITAS E ISABEL ALEXANDRE, in Código de Processo Civil Anotado, 3.ª ed., pág. 735 e seguintes, em anotação ao artigo 615.º, afirmam os citados autores: “Os casos das alíneas b) a e) do n.º 1 (excetuada a ininteligibilidade da parte decisória da sentença: ver o n.º 2 desta anotação) constituem, rigorosamente, situações de anulabilidade da sentença, e não de verdadeira nulidade.
Respeitam eles à estrutura ou aos limites da sentença. Respeitam à estrutura da sentença os fundamentos das alíneas b) (falta de fundamentação). c) (oposição entre os fundamentos e a decisão). Respeitam aos seus limites os das alíneas d) (omissão ou excesso de pronuncia) e e) (pronúncia ultra petitum). (…)
Entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade: mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correta, a nulidade verifica-se. A oposição entre os fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na contradição entre o pedido e a causa de pedir, geradora da ineptidão da petição inicial (art. 186-2-b).”.
Notoriamente a apontada nulidade não se encontra verificada, pois que a questão ora suscitada pelo Apelante não enferma do apontado vício.
A M.ma Juíza pronunciou-se expressamente sobre a arguida nulidade.

A sentença apresenta um discurso claro, não se vislumbrando que ocorra a apontada contradição.
A Senhora Juíza alude e bem, quer na decisão em crise, quer na sustentação da arguida nulidade, “O que se verifica é desacordo do Réu face aos comportamentos da Autora que o tribunal considerou serem suficientes para considerar que a mesma cumpriu o contrato que celebrou com o Réu e que, no entender do tribunal lhe conferem o direito a ser por este remunerada.
Tal divergência de entendimento do Réu relativamente ao decidido pelo tribunal, não consubstancia, porém, qualquer contradição entre a fundamentação da sentença, mormente dos factos provados que invocou, e a decisão.

Após apreciar a factualidade dada como provada à luz do Direito, afirma o julgador a quo de modo claro o seguinte:
Relativamente ao nexo de causalidade entre a atividade da Autora e o negócio que veio a ser realizado, afigura-se também se verificar este requisito.
Isto porque foi a Autora, através da promoção que fez ao imóvel, que informou a compradora, BB, de que a fração do Réu se encontrava à venda e quais as condições que este pretendia para o negócio, tendo-se esta revelado muito interessada nessa aquisição.
A Autora ficou à espera de resposta desta interessada.
Não chegou a conseguir fazer visita ao imóvel com a interessada, uma vez que esta, não mais contactou, nem retornou as tentativas de contacto da Autora.
Mais, conhecendo a fração, por ter uma familiar a residir no mesmo prédio, a interessada contactou diretamente os vendedores, através da mesma e negociou com eles essa aquisição, nem sequer tendo revelado que havia tomado conhecimento da intenção de vender e condições do negócio através da Autora, tendo esse negócio sido acordado, logo por volta do dia 17 de setembro de 2020, nem um mês após a última reunião que a referida interessada teve com a Autora.
Assim sendo, é inequívoco que a Autora cumpriu com todas as obrigações que assumiu para com o Réu e que foi por força da sua atuação de promoção da venda do imóvel que o negócio veio a ser concretizado com a interessada que aquela angariou.”.
Ora, não existe qualquer fundamento que esteja em contradição com um outro da mesma sentença, designadamente, entre os factos dados como provados e a fundamentação de direito.

Face a todo o exposto não se encontra verificada a apontada nulidade da sentença, pelo que improcede, nesta parte, a apelação.
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B)
Da admissibilidade do recurso subordinado.
Na suas contra-alegações A A. pretende que este Tribunal da Relação do Porto, vem pedir a ampliação do recurso, nos termos do artigo 636.º do Código de Processo Civil, a fim de conhecer do sue pedido de condenação do R. como litigante de má fé.
Vejamos.
Os requisitos da ampliação de recurso estão previstos no artigo 636.º do Código de Processo Civil.
Dispõe tal norma legal o seguinte:
Ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido
1 - No caso de pluralidade de fundamentos da ação ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respetiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação.
2 - Pode ainda o recorrido, na respetiva alegação e a título subsidiário, arguir a nulidade da sentença ou impugnar a decisão proferida sobre pontos determinados da matéria de facto, não impugnados pelo recorrente, prevenindo a hipótese de procedência das questões por este suscitadas.
3 - Na falta dos elementos de facto indispensáveis à apreciação da questão suscitada, pode o tribunal de recurso mandar baixar os autos, a fim de se proceder ao julgamento no tribunal onde a decisão foi proferida.

A recorrida nas contra-alegações vem pedir a ampliação do recurso, nos termos do artigo 636.º do Código de Processo Civil, “e em consequência ser alterada a decisão proferida pelo tribunal recorrido no que concerne com a condenação do recorrente como litigante de má-fé.”.
Não se nos afigura que o ora pedido de ampliação de recurso possa ser admitido.

O n.º1 prevê o caso de haver pluralidade de fundamentos da ação (causas de pedir) ou da defesa (exceções), impondo ao tribunal de recurso que conheça do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira na sua contra-alegação, ainda que a título subsidiário, prevenindo a necessidade da sua apreciação (sobre o direito anterior a 1995, em face do silêncio da lei, veja-se CASTRO MENDES, Direito processual civil, cit., III, ps. 66 a 69, ANSELMO DE CASTRO, Direito processual civil, cit., III, ps. 409 a 411, LOPES DO REGO, Comentários cit., I, art. 684-A, n.° I, RIBEIRO MENDES, Recursos cit., p. 176 e, na jurisprudência, os acs do STJ de 14.2.95, MARTINS DA COSTA, CJ/STJ, 1995, I. p. 92, de 16.1.96, MARTINS DA COSTA, CJ/STJ, 1996, I, p. 434, e de 25.11.97, MARTINS DA COSTA, BMJ, 471, p. 329; ver também os acs. do STJ de 19.9.02, Sumários de acórdãos do STJ, proc. 5/2002, e de 25.1.07, AZEVEDO MENDES, proc. 1226/04). Pode figurar-se a situação de o autor ter pedido a anulação judicial de um contrato por si celebrado, com fundamento em dois vícios diferentes (por exemplo, erro e coação). Quando a ação haja sido julgada procedente com base num dos vícios, afastando-se o outro por não se terem provado os factos alegados, pode o autor recorrido, prevenindo a procedência do recurso, pedir, na contra-alegação, a ampliação do âmbito deste, de modo a abranger o fundamento em que decaiu. Mas o vencedor que se prevaleça desta faculdade não tem o estatuto de recorrente (AMANCIO FERREIRA, Manual cit., p. 162), dado que o objeto do recurso (a decisão final proferida) permanece idêntico (ver, porém, RIBEIRO MENDES, Recursos 2007, p. 85, admitindo tratar-se de uma espécie de recurso subsidiário, ainda que o recorrente não haja sido vencido). A semelhança do que ocorre com o recurso subordinado (art. 633-3), a ampliação requerida só será apreciada se houver pronúncia sobre o mérito do recurso, mas as questões suscitadas pelo recorrido só serão apreciadas se, em consequência do recurso interposto, for modificada a decisão recorrida (ABRANTES GERALDES, Recursos cit., n.° 5 da anotação ao art. 636).
Neste n.º 1 cabem, quer as hipóteses de causas de pedir ou fundamentos de defesa alternativos, quer a de pluralidade de causas de pedir ou fundamentos de defesa em que um é indicado como principal e o outro (ou outros) como subsidiário(s) (TEIXEIRA DE SOUSA, Estudos cit., ps. 462-463), quer ainda os casos em que, tendo o recorrido proposto a ação ou contestado com fundamento em que decaiu, o tribunal haja julgado no mesmo sentido por ele pretendido, mas com base em fundamento de que haja conhecido oficiosamente (ABRANTES GERALDES, Recursos cit., n.º 6 da anotação ao art. 636). Mas o preceito só se aplica quando o tribunal recorrido tenha efetivamente conhecido o fundamento em causa, julgando-o improcedente: a parte vencedora há de ter nele decaído. Se, ao invés, tal fundamento, invocado pela parte em 1.ª instância, não tiver chegado a ser apreciado (designadamente, por ser subsidiário e proceder o fundamento principal, ou por proceder um dos fundamentos em alternativa), o tribunal de recurso não deixará de o conhecer, sem necessidade de requerimento de ampliação, se julgar improcedente o pedido tido como procedente pelo tribunal recorrido. Por outro lado, as questões de conhecimento oficioso permanecem oficiosamente cognoscíveis: o afastamento, por exemplo, de determinado vicio gerador de nulidade do contrato, pela 1." instância, não impede a Relação de julgar o contrato nulo, independentemente de a parte vencedora, tendo ganho com fundamento em outro vício julgado verificado na comarca, mas não verificado na Relação, ter feito o requerimento exigido pelo n.º 1. Trata-se de consequências de o objeto do recurso ser a decisão e não os seus fundamentos (CASTRO MENDES, Recursos, cit., ps. 24-25; RIBEIRO MENDES, Recursos cit., ps. 175-176), sem prejuízo do caso julgado que sobre estes se constitua quando estejam na disponibilidade exclusiva da parte. Ver também o n.º 5 da presente anotação e o n.° 5 da anotação ao art. 665.”, Código de Processo Civil Anotado, JOSÉ LEBRE DE FREITAS E ISABEL ALEXANDRE, 4ª ed. 2021, págs. 73 e 74.
No mesmo sentido, ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª Ed., em anotação à norma citada (636.º do Código de Processo Civil), pág. 123, “É verdade que o mais importante para a parte que deduz uma pretensão ou que na ação exerce o direito de defesa é o resultado final condensado na conclusão da sentença, e não os fundamentos que à mesma conduziram. Não sendo impugnada a decisão que tenha acolhido a pretensão da parte vencedora, com os efeitos delimitados pelo caso julgado assim formado, é para si indiferente a eventual rejeição de algum ou mesmo de todos os fundamentos que tenha invocado para sustentar a sua posição, tal como lhe é indiferente alguma nulidade da decisão proferida.
Porém, o quadro modifica-se quando a parte vencida interpõe recurso da decisão. Nesta eventualidade, pode não ser indiferente para a contraparte (parte vencedora ou parcialmente vencedora) a resposta que o tribunal a quo tenha dado aos fundamentos de facto ou de direito por si invocados ou o facto de ocorrer alguma nulidade decisória. Na verdade, se acaso o tribunal ad quem reconhecer razão aos fundamentos invocados no recurso interposto pela parte vencida pode revelar-se importante para a defesa dos interesses do recorrido que sejam acolhidas no âmbito do mesmo recurso os fundamentos que oportunamente esgrimiu e que foram objeto de resposta desfavorável por parte do tribunal a quo. É esta a função e a utilidade da ampliação do objeto do recurso. “.

Ora, na presente instância de recurso, vem a A., pedir a ampliação do recurso, de modo a que, este Tribunal conheça do pedido de condenação como litigante de má fé por si formulado contra o R..
É manifesto que este incidente não se enquadra em nenhum dos requisitos que permitem a ampliação do recurso. O pedido de condenação como litigante de má fé do R. não configura uma qualquer causa de pedir que a A. alegou.
Mais.
Como resulta, à saciedade, o Tribunal a quo conheceu da causa de pedir da A.-, tendo-lhe dado vencimento, ainda que não na sua totalidade.
Distinto seria se a A., não se conformando com o decidido quanto ao incidente de litigância de má fé, viesse interpor recurso.
Mas, não foi essa a vontade da A.
Pelo que, nesta parte, importa decidir pela rejeição da ampliação do recurso formulado pela.
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OS FACTOS
Os factos com interesse para a decisão da causa e a ter em consideração são os constantes no relatório, e que aqui se dão por reproduzidos.
A sentença ora em crise deu como prova e não provada a seguinte factualidade.
Factos provados e não provados.
A) – Factos Provados
1 – A Autora tem como atividade essencial a mediação imobiliária – cfr. doc. nº 1 junto com a petição inicial.
2 – Sendo titular da licença de atividade ..., conferida pelo Instituto dos Mercados Públicos do Imobiliário e da Cosntrução (IMPIC) – cfr. doc. nº 2, junto com a petição inicial.
3 – A Autora atua no mercado sob o nome comercial de “B...”, designação através da qual logra a publicitação, divulgação e angariação de interessados para os móveis por si promovidos.
4 – Pese embora a sede social da empresa se situe na Rua ..., ..., na Maia, a Autora possui um outro espaço comercial aberto ao público, sito na Rua ..., ..., em Matosinhos.
5 – Local estratégico, numa rua movimentada do coração da cidade de Matosinhos, no qual, através das amplas montras envidraçadas logra a divulgação dos imóveis que integram o seu portfólio.
6 – Espaço onde reúne com os potenciais interessados, apresentando os imóveis dos quais detém a mediação, informando sobre a sua localização, caraterísticas, ónus proprietários, condições do negócio, etc.
7 – No âmbito desta atividade, a Autora foi contactada pelo Réu que pretendia vender uma fração imóvel que detinha em propriedade comum com a sua companheira, na qual ambos residiam, pelo menos desde 2011, em condições análogas às dos cônjuges,
8 – a fração autónoma designada pelas letras CA, correspondente à habitação no terceiro andar direito e garagem designada por “CA1”, na cave, sito na Avenida ... e Rua ... e ... do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal pela AP. ... de 2007/05/03, sito na Av. ..., ... e Rua ..., números ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., freguesia ..., concelho de Matosinhos, descrito na Conservatória de Registo Predial de Matosinhos, sob o número ..., da freguesia ... e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o Artigo ... da União de Freguesias ..., ... e ..., com o valor patrimonial de €129.038,45 (cento e vinte e nove mil, trinta e oito euros e quarenta e cinco cêntimos) – cfr. docs. nºs 4 e 5, juntos com a petição inicial, que aqui se dá por integralmente reproduzidos.
9 - No dia 21 de Janeiro de 2020, a Autora acordou com o Réu prestar-lhe serviços de mediação imobiliária, por escrito que intitularam de “Contrato de Mediação Imobiliária”, com a referência “Contrato n.º ......” – cfr. doc. nº 6 junto com a petição inicial, que se dá por integralmente reproduzido.
10 – Nesse acordo a Autora obrigou-se a diligenciar no sentido de conseguir interessados na compra do imóvel referido em 8, pelo preço de €275 000,00 (duzentos e setenta e cinco mil euros).
11 – Na cláusula 2ª, nº 2, de acordo ficou estabelecido que “qualquer alteração ao preço fixado no número anterior deverá ser comunicada de imediato e por escrito à mediadora”.
12 – O acordo foi celebrado em regime de não exclusividade,
13 - podendo outras mediadoras imobiliárias concorrer na promoção do imóvel e angariação de eventual interessado, o que não foi o caso.
14 – O Réu obrigou-se a pagar à Autora, a título de remuneração, a quantia correspondente a 5% do preço pelo qual o negócio fosse concluído, acrescido de IVA à taxa legal.
15 – Foi convencionado pelas partes, na cláusula 5ª, nº 1, que a remuneração apenas seria devida no caso de a mediadora “conseguir interessado que concretize o negócio visado pelo presente contrato (…)”,
16 – E, na cláusula 5ª, nº 3, que o pagamento da remuneração seria efetuado “aquando da celebração da escritura ou conclusão do negócio visado”.
17 – Mais acordaram em que o acordo vigoraria por um prazo de 6 meses contados da data da sua celebração, renovável automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não fosse denunciado por nenhuma das partes – cláusula 8ª.
18 – A renovação do acordo veio a suceder em 21/07/2020.
19 – Em face da inexistência de qualquer declaração negocial das partes em sentido oposto, sendo que neste caso, eventual termo ocorreria a 20 de janeiro de 2021.
20 – Na celebração deste acordo interveio como angariadora imobiliária uma das colaboradoras da Autora, JJ, com o Cartão de Cidadão nº ....
21 – No dia imediatamente a seguir à celebração do acordo de mediação imobiliária, em 22 de janeiro de 2020, o Réu remeteu mensagem de correio eletrónico para a referida colaboradora da Autora, cujo assunto se reporta a “Apartamento T3 no Condomínio ...”.
22 – Nesse documento o Réu remete em anexo um conjunto de documentos para a posse da Autora, nomeadamente a caderneta predial do imóvel; a ficha técnica; a planta e o respetivo certificado energético – cfr. doc. nº 7 junto com a petição inicial.
23 – E acrescenta uma descrição sumária sobre as caraterísticas que pretende destacar no imóvel, incluindo, entre outras, as divisões, as suas medidas e à referência à existência de um lugar de garagem.
24 – No âmbito do acordo firmado com o Réu a Autora encetou todas as diligências para obter interessados para a venda do imóvel referido em 8.
25 – Mormente procedeu à promoção on line no seu site eletrónico e divulgou o imóvel perante a sua lista de contactos, investidores e clientes;
26 – E em plataformas conexas relacionadas com compras/vendas de imóveis, mormente, C...; D..., E..., F... e no Facebook.
27 – Encarregou-se de reunir com os interessados, nas suas instalações, momento no qual são reveladas as condições dos negócios, caraterísticas dos imóveis e seus proprietários,
28 – De forma a que os interessados possam inteirar-se destas informações, apresentando uma proposta formal de aquisição, ou eventualmente negociando os valores fixados, como é habitual nesta atividade.
29 – E organizou visitas ao imóvel com os interessados que assim o pretendiam.
30 – Realizou, pelo menos: a visita de KK, que visitou o imóvel na presença do Réu pelas 11.00 h., do dia 29/01/2020, acompanhado da promotora/angariadora JJ;
31 – E a visita de EE e LL que visitaram o imóvel pelas 18.00 h. do dia 06/05/2020, acompanhados da promotora angariadora JJ;
32 – E a visita de MM, que visitou o imóvel na presença do Réu, pelas 16.00 h. do dia 16/05/2020, acompanhada da promotora/angariadora II.
33 – Na prossecução dessa atividade, a Autora conseguiu encontrar pelo menos dois interessados na aquisição do imóvel, tendo o Sr. DD tendo feito ofertas de compra em 10 e 13 de fevereiro de 2020, tendo a última proposta sido de valor da compra de €270.000,00, aceitando escriturar por €250.000,00.
34 - Quando apresentados os interessados ao Réu e sua companheira, nunca estes conseguiram chegar a um acordo.
35 – O Réu e sua companheira pretendiam escriturar o negócio por um valor inferior àquele pelo qual o negócio seria efetivamente realizado.
36 – Este facto dissuadia o interesse de vários interessados que mostravam interesse na aquisição
37 – Na sequência de uma reunião ocorrida entre as partes na qual foram abordadas novas estratégias na venda do imóvel, foi solicitada pelo Réu a alteração das fotografias do imóvel constantes do Website da Autora,
38 - e o Réu aceitou reduzir o preço de venda pretendido para €270.000,00, conforme proposto pela Autora.
39 - Em 01/07/2020, através de e-mail do Réu, foi remetida para o endereço da colaboradora da Autora, JJ, um conjunto de 18 fotos intituladas “Apart T3 ...”, “para que possam ser atualizadas as fotos que estão no site” – cfr. doc. 11 junto com a petição inicial.
40 – Na sequência de todas as diligências realizadas na segunda quinzena do mês de agosto de 2020, a Autora através da sua colaboradora II encontrou uma cliente verdadeiramente interessada na aquisição do imóvel, BB.
41 – Esta interessada deslocou-se ao estabelecimento da Autora, em Matosinhos, referido em 4, no dia 18 de agosto de 2020 procurando um imóvel.
42 – A referida interessada procurava um imóvel de tipologia T3 nas imediações da zona da ..., Matosinhos, até ao valor de €250.000,00.
43 – A referida colaboradora da Autora apresentou-lhe várias hipóteses de imóveis, de entre os quais a fração referida em 8.
44 – A referida colaboradora apresentou as caraterísticas desse imóvel; a sua localização e apresentou fotografias do mesmo.
45 – Este imóvel foi objeto de grande interesse da referida BB, porque, além das caraterísticas e a zona em que se encontrava serem as que pretendia, o preço era próximo do valor máximo por ela pretendido.
46 – A referida BB referiu que era conhecedora da morfologia do espaço, atento o facto de ter uma familiar residente no mesmo condomínio, facto que de per si consubstanciava esse maior interesse naquele apartamento em concreto.
47 – Face a esse interesse foi agendada uma reunião de BB com a gerente da Autora, para o dia 24 de agosto, de forma a esta lhe explicar os pormenores do negócio, mormente o referido em 35.
48 – Essa reunião foi realizada, tendo a referida interessada sido esclarecida sobre todas as condições do negócio e declarado que teria que consultar o marido quanto à apresentação de proposta por escrito, que lhe foi solicitada pela Autora e que esta ficou a aguardar.
49 – Esta interessada não mais contactou a Autora, nem atendeu ou retornou as diversas tentativas de contacto telefónico realizadas por esta.
50 – Por volta de 17/09/2020 o Réu contactou a colaboradora/angariadora da Autora, JJ, dizendo-lhe que já tinha vendido o imóvel, a pessoa que tinha uma irmã a viver no prédio.
51 – E interpelado quanto à identidade da compradora admitiu que se tratava da referida BB.
52 – Confrontado pela referida colaboradora da Autora com o facto de essa interessada ter sido angariada pela Autora, o Réu pediu-lhe, por favor, para não dizer nada, para não lhe estragar o negócio e que não se iria arrepender porque a iria compensar.
53 – Em 23/09/2020, o Réu contactou os serviços da Autora, através de mensagem de correio eletrónico destinado à colaboradora da Autora, JJ, dizendo:
“Informo que já vendi particularmente o meu apartamento (na sua empresa apresenta a referência: .... Assim devemos cessar o nosso contrato pois já não faz sentido existir.”
54 – Posteriormente, vieram os serviços da Autora a ser contactados pela advogada, Sra Dra NN, dizendo-se representante do Réu, através de e-mail datado de 29/09/2020, pelas 17.19 h., com o seguinte teor:
“(…) Fui incumbida pelo m/ Constituinte de ref.ª para comunicar a venda do referido imóvel (embora comunicado). Neste sentido, cessam os v/ serviços pela razão supra alegada. (…)” Cfr. doc. nº 14 junto com a petição inicial, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
55 – Nessa mesma data foi expedida, via CTT, carta registada, com AR, pelo mandatário da Autora, interpelação datada de 28/09/2020, dirigida ao Réu – cfr. docs. nºs 15 e 16 juntos com a petição inicial que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
56 – Nesta, para além de se advertir o Réu de que a Sra. BB foi angariada pelos serviços da Autora,
57 – é feita interpelação para o pagamento da retribuição correspondente pelos serviços de mediação imobiliária prestados.
58 – A missiva apenas foi recebida pelo Réu em 07/10/2020 – cfr. doc. nº 17 junto com a petição inicial, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
59 – O Réu não apresentou qualquer reclamação à interpelação para pagamento.
60 – Nem pagou à Autora qualquer quantia a título de retribuição pela atividade de mediação imobiliária por esta desenvolvida.
61 – Por documento particular autenticado de 5 de novembro de 2020, denominado Contrato de Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca, o Réu e a sua companheira, OO, declararam vender a fração autónoma referida em 8 a BB e marido, CC, pelo preço de €220.000,00, o que estes declaram aceitar – cfr. doc. nº 20 junto com a petição inicial, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
62 – E nessa data essa fração foi inscrita em nome dos referidos adquirentes na Conservatória do Registo Predial – cfr. doc. nº 19 junto com a petição inicial.
63 – E passou a estar inscrita na matriz predial urbana unicamente em nome de CC.
64 – As partes outorgantes no negócio referido em 61 declararam expressamente que não existiu qualquer mediação imobiliária associada a esse negócio.
65 – Ao acordar com a Autora em regime de não exclusividade, pretendia o Réu assegurar-se de que, não só outras imobiliárias poderiam concorrer na promoção do imóvel, bem como este poderia ser vendido por estas ou pelo Réu a título particular, o que era condição essencial desse negócio.
66 – Facto que era do conhecimento da Autora, que o aceitou.
67 – A colaboradora da Autora, JJ sugeriu ao Réu e companheira a venda do imóvel pelo valor de €275.000,00 por então lhe parecer exequível a venda por esse valor.
68 – Na publicitação que a Autora fez do imóvel constava que o mesmo se situava na ..., quando se situava em ..., no confinamento com a ....
69 – Algumas fotografias colocadas pela Autora nesses anúncios não favoreciam o imóvel, uma vez que demonstravam as manchas de verdete presentes nas lajes da varanda.
70 – A irmã de BB é a proprietária do imóvel sito no 1º dto do prédio no qual se situa a fração referida em 8.
71 - Tendo tido conhecimento de que o Réu e companheira pretendiam vender essa fracção a referida vizinha abordou aquele para saber se a sua irmã e cunhado, BB e CC poderiam fazer uma visita ao imóvel.
72 – BB e CC foram fazer uma visita ao imóvel estando presentes o Réu e a companheira.
73 – O Réu nunca, antes do referido em 52 teve conhecimento da ida de BB ao estabelecimento da Autora.
74 – A Autora não apresentou BB ao Réu.
75 – A companheira do Réu, tinha perfeito conhecimento da existência e termos do acordo referido em 9, e estava presente no momento da sua celebração, mas não assinou o documento junto com a petição inicial como doc. nº 6.
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B) – Factos Não Provados
a) O site da Autora é acedido diariamente por largas centenas de internautas.
b) Isto porque esbarravam na intransigência destes quanto ao referido em 34 dos factos provados.
c) Após sucessivos contactos telefónicos foi agendada reunião no dia 18 de agosto de 2020.
d) A Autora comunicou a BB quem eram os proprietários do imóvel e a morada onde estes residiam.
e) Foi solicitado à Autora que averiguasse pela disponibilidade dos Réus em realizar o negócio pelo valor pretendido pela cliente/interessada, isto é, por menos €25.000,00.
f) A reunião referida em 47 destinava-se à formalização de proposta através do pagamento de caução e outorga de documento idóneo para o efeito.
g) A Autora agiu como solicitado informando os Réus de que teria um interessado na aquisição do imóvel, e em concreto qual a sua identidade.
h) Também o Réu ou a sua companheira, desde esse momento, deixaram de se mostrar disponíveis para as diversas tentativas de contacto da Autora, ao invés do que até aí vinha a acontecer.
i) O Réu manifestou logo, telefonicamente, desagrado à Autora.
j) Mas nada foi corrigido.
k) As visitas ao imóvel nunca correram bem.
l) A visita da D.KK não foi acompanhada pela mediadora JJ, mas pelo Réu, uma vez que a colaboradora da Autora se tinha atrasado, tendo chegado no final da visita.
m) Esta senhora não fez qualquer proposta, até porque se sentiu enganada pois queria um imóvel sito na ....
n) O preço do imóvel era bastante superior ao que pretendiam a D. EE e o Sr. LL.
o) Na visita da D. MM a colaboradora da Autora, II, que acompanhou a visita promoveu algumas caraterísticas falsas, tendo sido corrigida pela companheira do Réu.
p) Nomeadamente que a cozinha tinha sido remodelada havia 3 anos.
q) Sendo patente que a referida colaboradora não conhecia as caraterísticas do imóvel, o que desagradou o Réu.
r) Além de que as agentes imobiliárias chegarem sempre atrasadas e de terem de ser os proprietários do imóvel a fazer a visita, também iam mal informadas sobre as características do imóvel.
s) Estes factos foram comunicados à Autora, quer na pessoa da sua gerente, quer a JJ, demonstrando o descontentamento do Réu.
t) Foi a Autora, através da gerente, quem sugeriu a possibilidade de vender o imóvel por um valor inferior ao escriturado.
u) O que implicaria que uma parte da comissão da Autora, correspondente ao valor não escriturado, fosse paga em dinheiro.
v) O que foi prontamente recusado pelo Réu.
w) Em 16 de junho de 2020, em reunião com JJ, nas instalações da Autora, o Réu, mais uma vez, demonstrou a sua insatisfação pelos serviços prestados, tendo manifestado o propósito de não renovação do contrato.
x) Não o fez, apenas e só porque JJ garantiu que era possível a venda do imóvel pelo preço estabelecido.
y) Apesar do referido em 37 dos factos provados nada foi atualizado.
z) A última visita, por iniciativa da Autora, ocorreu no dia 26 de maio de 2020.
aa) O referido em 71 dos factos provados ocorreu no início de julho de 2020.
bb) Nesse mesmo dia foi agendada a referida visita para o dia 13 de julho.
cc) No dia 20 de julho tiveram nova reunião onde fizeram uma proposta ao Réu.
dd) No entanto, não chegaram a acordo.
ee) Dias depois, o Réu foi novamente contactado por BB e CC porque queriam fazer nova proposta.
ff) Marcaram nova visita e chegaram a acordo da venda do imóvel pelo valor de €220 000,00.
gg) A descida do valor do preço deve-se, por um lado, ao facto de vendendo particularmente o imóvel, o Réu não ter que pagar comissão imobiliária e, por outro lado, ao facto de o imóvel já estar há mais de meio ano para venda, sem que tivesse havido qualquer proposta e haver alguma urgência em vendê-lo.“, realçado nosso.
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DE DIREITO.
C)
Alteração da decisão da matéria de facto
i) Factos provados 33 e 34, deveria ser dado como não provado que o sr. DD tenha feito ofertas de compra a este imóvel específico e que tal, tenha sido dado conhecimento ao Réu e companheira.
ii) Os factos provados em 40, 44, 45, 46, 47 e 48, devendo ser dado como não provado que a Autora encontrou uma cliente verdadeiramente interessada na aquisição do imóvel, BB.

Dispõe o artigo 640.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil, com a epígrafe, “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, o seguinte:
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. (…)“.
A Doutrina tem vindo a expor, de modo repetido e claro, quais os requisitos que o recurso de apelação, na sua vertente de impugnação da decisão sobre a matéria de facto, terá de preencher para que possa ocorrer uma nova decisão de matéria de facto.

Ponderando e apreciando a instância de recurso quanto à impugnação da decisão da matéria de facto, o recorrente, preenche claramente os apontados requisitos, pelo que se impõe o seu conhecimento.

Em sede de reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, a Relação tem, efectivamente, poderes de reapreciação da matéria de facto, procedendo a julgamento sobre a factualidade, assim garantindo um verdadeiro duplo grau de jurisdição.
Quanto ao âmbito da intervenção deste Tribunal, tal matéria encontra-se regulada no artigo 662.º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe “modificabilidade da decisão de facto”, que preceitua no seu n.º 1 que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
No âmbito dessa apreciação, incumbe ao Tribunal da Relação formar a seu próprio juízo probatório sobre cada um dos factos julgados em 1.ª instância e objeto de impugnação, de acordo com as provas produzidas constantes dos autos e à luz do critério da sua livre e prudente convicção, nos termos do artigo 607.º, n.º 5, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do CPC, em ordem a verificar a ocorrência do invocado erro de julgamento.
Não se ignora o papel relevante da imediação na formação da convicção do julgador e que essa imediação está mais presente no tribunal da 1.ª instância. Todavia, ainda assim, o resultado dessa imediação deve ser objetivado em argumento probatório, suscetível de discussão racional, além do mais, para evitar os riscos da arbitrariedade“, in Ac. Supremo Tribunal de Justiça, 62/09.5TBLGS.E1.S1, de 02.11.2017, relatado pelo Cons. TOMÉ GOMES, in dgsi.pt.

Importa ter presente que a prova produzida deve ser conjugada, harmonizada e ponderada no seu conjunto enquanto base da convicção formulada pelo Tribunal, não sendo legítimo valorizar meios probatórios isolados em relação a outros, sopesando os critérios de valoração, numa perspectiva racional, de harmonia com as regras de normalidade e verosimilhança, mas sempre com referência às pessoas em concreto e à especificidade dos factos em apreciação.
Com vista a este Tribunal ficar habilitado a conhecer dos factos em discussão, e deste modo formar a sua convicção autónoma, própria e fundamentada, teve de analisar todos os meios de prova produzidos em 1.ª instância.
Deste modo, este Tribunal ponderou a prova documental junta aos autos e citada na sentença em crise e que aqui se dá por reproduzido.
De seguida, procedeu-se à audição integral e completa das gravações da sessão de audiência de julgamento, depoimentos e declarações de parte e das testemunhas.

Para se considerarem provados factos não basta que as partes ou as testemunhas chamadas a depor se pronunciem sobre as questões num determinado sentido, para que o juiz necessariamente aceite esse sentido ou versão. Por isso, a actividade judicatória, na valoração dos depoimentos, há-de atender a uma multiplicidade de factores, que têm a ver com as garantias de imparcialidade, as razões de ciência, a espontaneidade dos depoimentos, a verosimilhança, a seriedade, o raciocínio, as lacunas, as hesitações, a linguagem, o tom de voz, o comportamento, os tempos de resposta, as coincidências, as contradições, o acessório, as circunstâncias, o tempo decorrido, o contexto sociocultural, a linguagem gestual (inclusive, os olhares) e até saber interpretar as pausas e os silêncios dos depoentes, para poder perceber e aquilatar quem estará a falar a linguagem da verdade e até que ponto é que, consciente ou inconscientemente, poderá a mesma estar a ser distorcida, ainda que, muitas vezes, não intencionalmente.
Isto é, a percepção dos depoimentos só é perfeitamente conseguida com a imediação das provas, sendo certo que, não raras vezes, o julgamento da matéria de facto não tem correspondência directa nos depoimentos concretos, resultando antes da conjugação lógica de outros elementos probatórios, que tenham merecido a confiança do tribunal.

O princípio básico do nosso ordenamento jurídico é o da livre apreciação da prova – artigo 607.º, n.º 5 do Código de Processo Civil.
Vigora, entre nós, um sistema hibrido ou misto. Consagra, com efeito, o citado preceito o princípio da «liberdade de julgamento» («o juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção» acerca de cada facto»). Apenas com a exceção de a lei exigir para a existência ou prova do facto qualquer formalidade especial, a qual não poderá ser dispensada" (cfr. o art. 607, n° 5, 2º segmento).
Assiste, pois, ao julgador o poder de livremente decidir - depois de ponderada apreciação e avaliação - os diversos pontos da matéria de facto (reportados às questões constantes do elenco dos temas de prova) segundo a sua prudente e intima convicção. Convicção esta alicerçada em regras técnicas ou em máximas da experiência, bem como em conhecimentos pessoais de ordem lógico-dedutiva sobre as realidades da vida e da convivência social. Elementos esses conducentes à prova direta do facto controvertido ou à ilação (dedução lógica) da realidade ou verosimilhança desse facto, através da prova de um facto indiciário (instrumental), nesta segunda hipótese se fundando a prova numa presunção natural ou judicial (arts. 351º do CC e 607°, nº 4). Poder que se exerce, não apenas no que respeita à admissibilidade dos meios de prova propostos ou requeridos pelas partes, como também no que se refere à determinação do seu valor probatório. E tudo por reporte ao material probatório carreado pelas partes ou recolhido oficiosamente para o processo, quiçá mesmo face à conduta processual por elas concretamente adotada.”, in Direito Processual Civil, FRANCISCO MANUEL FERREIRA DE ALMEIDA, Vol I, 2ª ed, pág 109.
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i) Factos provados 33 e 34, deveria ser dado como não provado que o sr. DD tenha feito ofertas de compra a este imóvel específico e que tal, tenha sido dado conhecimento ao Réu e companheira.
Os factos em discussão são os seguintes:
33 – Na prossecução dessa atividade, a Autora conseguiu encontrar pelo menos dois interessados na aquisição do imóvel, tendo o Sr. DD tendo feito ofertas de compra em 10 e 13 de fevereiro de 2020, tendo a última proposta sido de valor da compra de €270 000,00, aceitando escriturar por €250.000,00.
34 - Quando apresentados os interessados ao Réu e sua companheira, nunca estes conseguiram chegar a um acordo.

Sustenta o recorrente que tal factualidade deverá ser dada como não provada, com base no depoimento de parte do R., devidamente conjugado com a ausência de prova documental – correio electrónico entre o R. e a agência ou alguém em nome da mesma.
A prova documental, troca de correio electrónico entre os endereços aí indicados – documentos juntos por requerimento 05.09.2022, e efectivamente junto a 29.05.2021, tal como se reproduz de seguida.


Das declarações e depoimento de arte do R. AA, podemos surpreender uma versão factual igual ou semelhante ao reproduzido nos seus articulados. O seu discurso aparenta rigidez, com falta de espontaneidade, sendo que por vezes apresenta uma versão fáctica com pouca adesão à normalidade da vida e às regras da lógica, designadamente, na identificação dos intervenientes no negócio aqui em causa, e bem como à versão apresentada quanto a exigências de pagamento em dinheiro “vivo”.
Destes dois meios de prova, tal qual os mesmos se nos apresentam, não poderemos aderir às razões e fundamentos do recorrente.
Não basta que um interveniente, parte ou testemunha, relate uma certa versão factual, para que a mesma seja apreciada e declarada como a verdadeira ou a mais próxima da verdade – leia-se verdade processualmente adquirida de acordo com as regras processuais. A mesma – versão factual – deverá passar pelo crivo da apreciação processual que o julgador deverá fazer, usando de todo o seu saber jurídico e de experiência de vida e de normalidade. Caso a versão seja desconforme com tais critérios deverá ser apreciada de modo a declarar como não provada tal factualidade.
A nossa jurisprudência tem expressado como critérios de apreciação do depoimento no sentido da sua credibilização:
- a segurança, clareza e coerência reveladas nos depoimentos;
- a serenidade, objetividade, desinteresse, imparcialidade a forma escorreita e sincera como depõem;
- a naturalidade e fluidez do discurso;
- a preocupação em responder apenas aquilo que viu e ouviu;
- a objetividade, caráter direto, isenção, consistência e pormenorização.
Em sentido oposto, têm sido considerados como fatores desabotatórios da credibilidade a emprestar aos depoimentos:
- a pouca firmeza, a insegurança e vagueza; um depoimento vago e abstrato, nada esclarecedor sobre as circunstâncias concretas de uma determinada operação de crédito;
- a ambiguidade e o pouco conhecimento dos factos;
- o assentamento do depoimento em convicções, opiniões ou conjeturas, sem concretização do tempo, modo e lugar do conhecimento dos factos que a testemunha pretende transmitir.”, LUÍS PIRES DE SOUSA, in Prova Testemunhal, 2016, pág. 319.

A primeira instância fundamentou a sua decisão do seguinte modo, quanto à factualidade em questão:
No que concerne aos interessados encontrados pela Autora, levou-se igualmente em conta os depoimentos das referidas testemunhas e representante legal da Autora e ainda os e-mail de propostas enviado por DD junto aos autos em 05/09/2022, que revelam que quer a testemunha BB, quer o referido DD tinham efectivo interesse na aquisição do imóvel.
Relativamente à dificuldade de os interessados concordarem com as propostas que a Autora conseguia e ao interesse logo manifestado pelo Réu em conseguir comprador que aceitasse escriturar o negócio por preço inferior ao real, e à necessidade de a Autora triar antecipadamente os interessados de forma a expor o Réu o menos possível, o tribunal, pelo modo muito pormenorizado e espontâneo como foram prestados, fez fé nos depoimentos da representante legal da Autora e de JJ e ainda no depoimento de PP.”

Entendemos que de modo acertado a Senhora Juíza fez a devida apreciação dos diversos meios de prova, sempre de acordo com as regras do direito probatório.
Efectivamente, a apontada testemunha, JJ, apresentou um depoimento escorreito, espontâneo e devidamente sustentado nos demais meios de prova, designadamente, do depoimento de parte da A., QQ, e das testemunhas PP e II. Da prova documental junta, mormente elementos documentais retirados do sistema informático da A. e “fichas de visitas”, tem o seu depoimento a devida sustentação. Apreciado o seu depoimento, conjugado com os demais, a decisão quanto à matéria de facto é a correcta.
Tal credibilidade não é inquinada com eventual valoração do depoimento e declarações de parte do R., AA. As suas declarações estão eivadas de parcialidade, de rigidez e agarrada a uma versão factual. Em certos trechos do seu depoimento, denota-se falta de espontaneidade. A versão factual tem pouca adesão à normalidade, designadamente quando questionado e confrontado quanto à identificação de pessoas intervenientes ao longo da relação contratual.
Por fim, será de atender à argumentação apresentada pela recorrida, A., ao apontar inconsistência no recurso do R., quando ataca a decisão relativamente a estes concretos pontos factuais e se conforma com outros, designadamente, pontos 28 a 32, 35 a 39, 41 a 43 e 50 a 52. A versão factual constante de tais pontos, que não foi atacada pelo recorrente R., é mais consentânea com a versão dos apontados pontos 33 e 34, no seu todo.

Deste modo, terá que improceder, nesta parte, o recurso.
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ii) Os factos provados em 40, 44, 45, 46, 47 e 48, devendo ser dado como não provado que a Autora encontrou uma cliente verdadeiramente interessada na aquisição do imóvel, BB.
Os factos são os seguintes:
40 – Na sequência de todas as diligências realizadas na segunda quinzena do mês de agosto de 2020, a Autora através da sua colaboradora II encontrou uma cliente verdadeiramente interessada na aquisição do imóvel, BB.
44 – A referida colaboradora apresentou as caraterísticas desse imóvel; a sua localização e apresentou fotografias do mesmo.
45 – Este imóvel foi objeto de grande interesse da referida BB, porque, além das caraterísticas e a zona em que se encontrava serem as que pretendia, o preço era próximo do valor máximo por ela pretendido.
46 – A referida BB referiu que era conhecedora da morfologia do espaço, atento o facto de ter uma familiar residente no mesmo condomínio, facto que de per si consubstanciava esse maior interesse naquele apartamento em concreto.
47 – Face a esse interesse foi agendada uma reunião de BB com a gerente da Autora, para o dia 24 de agosto, de forma a esta lhe explicar os pormenores do negócio, mormente o referido em 35.
48 – Essa reunião foi realizada, tendo a referida interessada sido esclarecida sobre todas as condições do negócio e declarado que teria que consultar o marido quanto à apresentação de proposta por escrito, que lhe foi solicitada pela Autora e que esta ficou a aguardar.

Recompilando as considerações feitas no anterior ponto B), i), apreciemos a pretensão do recorrente.
Argumenta o recorrente, R., que tal factualidade foi mal apreciada, colocando em crise que a A. tenha encontrado interessada na pessoa de BB. Sustenta que do depoimento das testemunhas BB e CC – compradores do apartamento em causa –, resulta que foi a irmã desta que “apresentou” o apartamento.
O tribunal a quo fundamentou do seguinte modo:
Os factos que se deram como provados sob os pontos 20, 1ª parte; 24; 25, 1º parte; 29; 41; e primeira parte do 43; parte do 45; parte do 46 foram confessados pelo Réu. (…)
Relativamente às diligências que a Autora fez para promover a venda do imóvel, para além da factualidade que foi confessada pelo Réu, o tribunal levou em conta as declarações prestadas pela representante legal a Ré, QQ, que esclareceu esses factos e de PP; II, colaboradoras da Autora e, sobretudo de JJ, que acompanhou diretamente este caso, depondo de forma muito pormenorizada, tendo os referidos depoimentos, não contrariados por nenhum outro meio de prova, logrado convencer o tribunal. Levou-se ainda em conta as fichas de visita ao imóvel juntas como docs. nºs 8, 9 e 10 com a petição inicial. (…)
Relativamente ao modo como a Autora foi contactada pela interessada BB; manifestou que caraterísticas pretendia no imóvel a adquirir; ficou a saber de que o imóvel do Réu estava para venda e do preço a que estava a ser vendido pela imobiliária; e veio a reunir com a representante legal da Autora, onde lhe foram esclarecidas todas as condições do negócio impostas pelo Réu, o que sucedeu em agosto de 2020, o tribunal fez fé nas declarações da representante legal da Autora e ainda das suas colaboradoras que se encontravam presentes no momento desses contactos, PP e II, tendo todas deposto de forma que se afigurou muito espontânea, direta e detalhada, esclarecendo os pormenores que lhes foram solicitados, logrando convencer o tribunal. Levou-se ainda em conta o doc. nº 12 junto com a petição inicial, que é cópia de ficha do sistema informático da Autora, que confirma o contacto de BB com a Autora em agosto de 2020 e que aí lhe foi apresentado o apartamento do Réu. O tribunal levou ainda em conta o depoimento da testemunha JJ, que veio a ter posteriormente conhecimento destes factos, por lhe terem sido transmitidos pelas representante legal da Autora e as suas referidas colegas.
Não ficou, assim, o tribunal convencido da versão dos factos relatada pela testemunha BB e seu marido, CC, na medida em que contrariaram os referidos depoimentos que se afiguraram muito mais espontâneos e credíveis, afigurando-se a testemunha BB nervosa e não conseguindo explicar de forma credível a razão de ser de se ter deslocado uma segunda vez à agência da Autora e de nunca mais ter respondido às tentativas de contacto da Autora.
Desde logo, nas reuniões tidas com a Autora em agosto de 2020, nunca BB referiu já ter conhecimento da venda do imóvel; nem de que já o tinha visitado; nem de que lhe fora pedido preço inferior pelo próprio proprietário; nem de que não estivesse interessada na compra desse imóvel por o preço pedido ser excessivamente elevado, o que se afigura totalmente contra todas as regras da experiência comum e do normal decorrer das coisas.
Pelo contrário, conforme relatado pela representante legal da Autora e suas colaboradoras, a testemunha BB mostrou-se muito interessada no negócio, mesmo com o preço que lhe foi apresentado, e indicou que estava disposta a despender €250.000,00, o que até ficou a constar na ficha que a Autora fez desta cliente – doc. nº 12 junto com a petição inicial – valor que no seu depoimento disse ter-lhe sido pedido logo em julho diretamente pelo Réu – o que referiu também a testemunha CC – e consideraram elevado.
Se o valor que o Réu então lhe terá pedido era igual ao que em agosto referiu à Autora estar disposta a oferecer, porque razão não fizeram logo o negócio e em agosto de 2020, BB andava a procurar outro apartamento com as mesmas caraterísticas na mesma zona?
O tribunal ficou efetivamente convencido de que BB e marido, CC, tendo ficado a saber pela atividade da Autora, quer do interesse do Réu em vender a sua casa, quer das condições do negócio, o contactaram diretamente por intermédio da irmã daquela, GG, sem lhe dizer que já haviam tido conhecimento da sua intenção de vender e contornos do negócio pela Autora, vindo a visitar o imóvel com os vendedores, conforme se considerou provado nos pontos 70, 71 e 72 e foi confirmado, quer pelo Réu, quer pela sua companheira RR.
Não ficou o tribunal convencido da veracidade da troca de mensagens constantes dos docs. nº 4 e 5 juntos com a contestação, atenta a facilidade em alterar as datas das mensagens trocadas por telemóvel, nem que a segunda mensagem tenha qualquer relação com o assunto em apreço.
Nem sequer ficou o tribunal convencido de que em julho de 2020 BB e CC estivessem já a residir em casa da irmã daquela, sendo que a morada que indicaram no documento autenticado de compra e venda que celebraram em 05/11/2020, junto como doc. nº 20 com a petição inicial é ainda a da casa que disseram em tribunal ter vendido antes de julho de 2020, o que não é compreensível caso efetivamente a respectiva venda tivesse sido já realizada quando o declararam nos seus depoimentos.
Tão pouco conseguiram as referidas testemunhas e o Réu esclarecer, de forma credível, a razão pela qual a venda foi efetivamente titulada pelo valor de €220.000,00, muito abaixo do pretendido pelo Réu e muito abaixo também do que aquelas testemunhas estava dispostas a pagar, e que indicia claramente que terão pago dinheiro para além do que ficou titulado no título de transmissão, conforme desde o início pretendiam o Réu e a sua companheira, conforme claramente explicado pela testemunha JJ, dispondo os compradores de dinheiro próprio para esse efeito em consequência da venda da sua anterior casa, como referiu a testemunha CC, e tendo-lhes sido concedido mútuo bancário para a aquisição, da nova casa, no valor de €140.000,00.
Sobre esta questão, a testemunha GG, mostrou-se muito mais contida, afigurando-se ao tribunal que não disse tudo o que sabia, apesar de ter sido questionada sobre pormenores dessa primeira negociação, que seria normal que conhecesse, face à relação de família e alegada vivência em comum nessa época, ao que esta disse não conhecer, afigurando-se ao tribunal não se pretender comprometer, o que retirou espontaneidade e credibilidade ao seu depoimento, bem como à versão dos factos apresentada pelo Réu; BB e CC.
No que concerne à conversa entre o Réu e a testemunha JJ em meados de setembro de 2020, e à convicção com que esta testemunha ficou de que o Réu desconhecia até então que BB tinha contactado com a Autora, antes de contactar com o mesmo, conforme se considerou provado nos pontos 50 a 52, o tribunal fez fé no depoimento desta testemunha, que se revelou muito espontâneo, natural e pormenorizado, logrando convencer o tribunal. Tal desconhecimento foi ainda confirmado pelo Réu e RR, do que o tribunal ficou convencido. “.

Tendo presente todo o acervo probatório a que este Tribunal tem acesso, aqui incluindo a audição de toda a prova produzida em audiência de julgamento, não se dissente da conclusão a que o Tribunal a quo chegou – fundamentação da decisão da matéria de facto.
Tal como se deixou afirmado, a força probatória dos depoimentos de BB e de CC não é de modo a retirar credibilidade ao depoimento das testemunhas PP e II, pessoas que trabalhavam junto da A. e que tiveram contacto com a BB, tendo, precisamente, como objecto o apartamento aludido nos autos. Como afirmamos supra, o depoimento e declarações de parte do R., AA, dado que as mesmas “estão eivadas de parcialidade, de rigidez e agarrada a uma versão factual”, não mereceram por parte deste Tribunal, tal como pelo Tribunal a quo, credibilidade bastante para que a versão factual por si relatada tivesse sido dada como provada.

Pelo exposto, improcede, igualmente, por esta via o recurso.
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D)
Na subsunção ao Direito, em consequência da alteração da matéria de facto, análise do direito à remuneração por parte da A. e verificação de nexo de causalidade entre a actividade da A. e o contrato final.

Não tendo tido vencimento a pretensão de alteração da matéria de facto, apreciemos a decisão proferida pela M.ma Juíza quanto à operação jurídica de integração da factualidade dada como provada ao DIREITO.

A causa de pedir nesta acção, tal como vem configurada pela A. e assim aceite pelo R., consiste na realização de um contrato de mediação imobiliária.
O seu regime está plasmado em letra de Lei, na Lei n.º 15/2003 de 08.02.
O contrato de mediação imobiliária (tipificado no diploma) é definido como aquele pelo qual uma empresa de mediação imobiliária procura destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta ou o arrendamento dos mesmos, o trespasse ou a cessão de posição em contratos que tenham por objecto bens imóveis, mediante remuneração devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação.
Estamos perante um contrato típico e formal – artigos 2.º, 16.º, 17.º e 19.º, do citado diploma legal.
De acordo com tal definição, estamos perante um contrato na qual está prevista uma obrigação de meios – a obrigação da mediadora como de diligenciar no sentido de conseguir interessado na realização do negócio.
Neste sentido Ac desta secção do Tribunal da Relação do Porto, proferido em 22.05.2019 no processo nº 84412/17.9YIPRT.P1, relatora Des LINA BAPTISTA, em dgsi.pt, “o contrato de mediação é uma modalidade do contrato de prestação de serviços, actualmente regulado pela Lei n.º 15/2013, de 08/02. Aqui se define, sob o art.º 2.º, que a actividade de mediação imobiliária consiste na “procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objecto bens imóveis.”
Neste particular, acompanhamos de perto a posição de Higina Orvalho Castelo, ao defender que esta Lei deixa em aberto a intensidade de vinculação da mediadora ao exercício da actividade.
Como esta refere: “A actual Lei (2013) abandona a referência a uma obrigação da mediadora de efectuar dadas diligências e descreve simplesmente a actividade na perspectiva da sua execução fáctica, como a procura de destinatários, sem fazer corresponder essa procura a uma obrigação contratual. Só por via da interpretação dos concretos contratos de mediação imobiliária, se poderá aferir se a mediadora assumiu uma obrigação jurídica e, se sim, qual a sua extensão. A Lei actual, ao não classificar a actividade que a mediadora desenvolve no âmbito do contrato e por causa dele como obrigação, permite que o modelo legalmente típico inclua contratos em que mediadora se vincula ao exercício da actividade e outros em que não se vincula.”
Assim, a actividade concreta a desenvolver pela mediadora terá que ser casuisticamente definida pelas partes nos respectivos contratos, ao abrigo do princípio geral da liberdade contratual, consagrado no art.º 405.º do Código Civil.

Nos presentes autos, A. e R., convencionaram:
7 – No âmbito desta atividade, a Autora foi contactada pelo Réu que pretendia vender uma fração imóvel que detinha em propriedade comum com a sua companheira, na qual ambos residiam, pelo menos desde 2011, em condições análogas às dos cônjuges
9 - No dia 21 de Janeiro de 2020, a Autora acordou com o Réu prestar-lhe serviços de mediação imobiliária, por escrito que intitularam de “Contrato de Mediação Imobiliária”, com a referência “Contrato n.º ......” – cfr. doc. nº 6 junto com a petição inicial, que se dá por integralmente reproduzido.
10 – Nesse acordo a Autora obrigou-se a diligenciar no sentido de conseguir interessados na compra do imóvel referido em 8, pelo preço de €275 000,00 (duzentos e setenta e cinco mil euros).
11 – Na cláusula 2ª, nº 2, de acordo ficou estabelecido que “qualquer alteração ao preço fixado no número anterior deverá ser comunicada de imediato e por escrito à mediadora”.
12 – O acordo foi celebrado em regime de não exclusividade,
13 - podendo outras mediadoras imobiliárias concorrer na promoção do imóvel e angariação de eventual interessado, o que não foi o caso.
14 – O Réu obrigou-se a pagar à Autora, a título de remuneração, a quantia correspondente a 5% do preço pelo qual o negócio fosse concluído, acrescido de IVA à taxa legal.
15 – Foi convencionado pelas partes, na cláusula 5ª, nº 1, que a remuneração apenas seria devida no caso de a mediadora “conseguir interessado que concretize o negócio visado pelo presente contrato (…)”,
16 – E, na cláusula 5ª, nº 3, que o pagamento da remuneração seria efetuado “aquando da celebração da escritura ou conclusão do negócio visado”.”.
Deste modo, terá que se classificar como obrigação de meios a prestação da mediadora, aqui A.., ie, tudo fazer para lograr fazer com que consiga obter um interessado na venda do apartamento por aquele preço.

Mais é de afirmar que o contrato é oneroso – artigo 16.º, n.º 2, alínea c), do citado diploma legal. As condições de remuneração, nomeadamente montante ou percentagem e forma de pagamento, com indicação da taxa de IVA aplicável, têm de constar obrigatoriamente do contrato (sujeito à forma escrita), sob pena de nulidade (ainda que não invocável pela empresa de mediação) – conjuguem-se as disposições do art. 16, n.º 2, c), e n.º 5, do citado diploma legal. A remuneração é, portanto, uma prestação contratual, devida por quem contrata os serviços de mediação. Daqui resulta a necessária onerosidade deste contrato, concordante com o tipo social de mediação geral.
Por regra, incumbe à parte que contratou a empresa de mediação imobiliária a obrigação de pagamento da remuneração devida, podendo, conforme o convencionado recair sobre a outra parte do contrato desejado.
A fixação do quantum da remuneração, por regra é fixada por percentagem do valor do contrato desejado. Por regra, ie, sem prejuízo de acordo em contrário, a este montante não acresce pagamento de despesas – LACERDA BARATA, «Contrato de mediação», p. 207; MARIA DE FÁTIMA RIBEIRO, «O contrato de mediação e o direito do mediador à remuneração», pp. 99-100; MANUEL SALVADOR, Contrato de mediação, p. 112.

A remuneração é devida estando dependente do cumprimento da prestação por parte do mediador imobiliário e bem como da ocorrência de um evento que lhe é alheio – contrato visado ou desejado. Apenas com a verificação de um “resultado útil” – a realização do negócio – da actuação do mediador, este ganha o direito à retribuição. Está em causa mais do que a mera exigibilidade; é da própria constituição do direito que se trata - artigo 19.º, n.º 1, sob a epígrafe, Remuneração da empresa 1 - A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato -promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra.

Nos autos, o que importa decidir é aferir do nexo entre a actividade de mediação, da aqui A., e a ocorrência de que depende o direito à remuneração – a realização da escritura pública de compra e venda levada a cabo pelo R..
A necessidade de um nexo entre a bem sucedida prestação do mediador e o evento de que depende a sua remuneração – normalmente a celebração do contrato desejado – tem sido consistentemente afirmada pela doutrina e pela jurisprudência. A actividade do mediador deve fazer parte das causas próximas da conclusão do contrato, ou ser causa adequada à sua produção, não tendo, porém, que ser a única causa.
Ainda que o contrato de mediação cesse, ocorrendo tal nexo de causalidade, a remuneração é devida.
Isto é, estando comprovada a actividade principal do mediador, ou seja, a actividade que o mediador desenvolve no âmbito do contrato e por causa dele, apta a resultar na satisfação do interesse contratual do cliente, interesse que consiste na obtenção de um interessado no contrato desejado. Esta actividade materializa-se num conjunto de actos, maioritariamente, de publicitação e promoção do objecto mediato do contrato que o cliente deseja celebrar, bem como de divulgação das condições pretendidas. No plano dos factos, para conseguir tais desideratos, o mediador pratica actos muito diversificados (visitas, mostras, afixação de placas publicitárias, contratação de anúncios, recolha de informações e de documentos, prestação de informações, entrevistas e reuniões, entre outros), todos eles a montante do contrato que o cliente pretende celebrar.

Da factualidade dada como provada, mormente do clausulado, a mediadora tem direito à remuneração decorrente deste contrato se em consequência da actividade levada a cabo por si na promoção de venda e encontrar um comprador por aquele preço.
Os factos dizem-nos que a escritura pública ocorrida a 05.1.2020, entre R. e terceiros compradores (as aqui testemunhas BB e CC) ocorreu em consequência da actividade levada a cabo pela A., ie, ocorre um nexo causal entre a actuação da A. e o evento da escritura pública.
As dificuldades surgem na definição da amplitude mínima deste nexo de causalidade, principalmente em casos, como o presente, em que não existe exclusividade e em que ocorreu a intervenção de um terceiro.
Com efeito, tipicamente a prestação da mediadora pode ser simples ou com a estipulação de cláusula de exclusividade.
Neste caso, as partes definiram o contrato por si celebrado como um contrato de mediação imobiliária simples: assim, os Réus podiam validamente – como fizeram – celebrar contratos de mediação imobiliária simultaneamente com várias empresas mediadoras, podendo ainda celebrar autonomamente o contrato pretendido.
Há diversas teses sobre esta questão.
A menos exigente, defende que a contribuição da mediadora não necessita de ser única, sendo suficiente que a sua contribuição tenha, de algum modo, influído na celebração do negócio[9]. Por seu turno, a mais exigente defende que a mediadora tem que encontrar um interessado para o negócio e intervir em todas as fases negociais e na celebração do próprio contrato.
Em nosso entendimento, a definição desta amplitude mínima do nexo de causalidade terá que assentar na análise do próprio objecto do contrato.
Tendo as partes definido que a mediadora deveria diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra, a perspectiva a considerar deverá ser a do cumprimento, ou não, desse desiderato.
Neste sentido, Maria de Fátima Ribeiro adianta que, na identificação deste nexo causal, “O critério determinante deverá ser o da ligação psicológica entre a actividade do mediador e a vontade de o terceiro concluir um contrato com o comitente – e a afirmação dessa ligação não deve ser posta em causa pelo lapso temporal entretanto decorrido entre o exercício da actividade e a conclusão do contrato, bem pelos factos ocorridos nesse período de tempo, v.g., a intervenção de um novo mediador.”
O determinante é, portanto, que a decisão de contratar do terceiro tenha sido determinada pela actuação do mediador. Ou, usando mais uma vez as palavras de Maria de Fátima Ribeiro, “de modo a integrar-se de forma idoneamente determinada na cadeia dos factos que lhe deram origem “, Ac citado.
Vejamos
A A. anunciou o apartamento;
A A. encontrou os compradores;
A A. levou os compradores a estar interessados e a visitar o apartamento;
Por vicissitudes não apuradas, foram estes mesmos visitantes/compradores que a 05.11.2020 celebram escritura pública com o R. após o contacto com a A. em Agosto de 2020, sendo que este negócio já estava acertado em Setembro de 2020.

Afirma-se na decisão recorrida o seguinte:
As referidas obrigações assumidas entre ambas as partes são típicas do contrato de mediação imobiliária, pelo que é inequívoco que a Autora e o Réu celebraram um contrato dessa natureza, plasmado no referido documento.
Importa, assim, aferir se assiste à Autora o direito a receber a remuneração acordada, conforme peticionado.
Face à atual definição da atividade de mediação consagrada no art. 2º, nºs 1 e 2, da Lei nº 15/2013, de 08/02, a prestação a cargo do mediador consiste, não apenas em diligenciar no sentido de conseguir interessado na realização do negócio, como referiam os D.L. nºs 211/2004 e 77/99, mas antes na procura de destinatário para a realização do negócio pretendido. Essa obrigação não inclui, porém, encontrar interessado que leve a cabo o negócio visado, nem garantir a realização do negócio visado, uma vez que tal não depende da vontade da empresa mediadora, mas das vontades do cliente e do interessado encontrado. (…)
A doutrina e a jurisprudência têm ainda pacificamente entendido que o direito à remuneração depende ainda da existência de um nexo causal entre a atividade da mediadora e o contrato final celebrado.
Já a amplitude desse nexo causal é mais discutida.
Tem sido entendimento da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, com a qual se concorda, que “o juízo positivo a formular sobre a relação de causa e efeito deve assentar na verificação de um nexo de causalidade adequada: o mediador tem direito à comissão quando, embora não sendo a sua actividade a única determinante na cadeia de factos que deram lugar ao negócio pretendido pelo comitente, contribuiu para ele” – neste sentido vide Ac. R.L. de 30/06/2020, proc. nº 2450/18.7T8TUD.L1-7 e abundante jurisprudência aí citada.
Como refere Higina Castelo, ob cit. pág. 100 e101: “(…) segundo a que me parece ser a melhor posição, afirma-se que a contribuição da mediadora não tem que ter sido única, sendo suficiente ter-se limitado a dar o nome ou a ter posto em contacto (desde que isso tenha influído de algum modo do negócio)”
A cláusula de exclusividade introduz alterações na disciplina da remuneração. Tal sucede, nomeadamente no caso citado, previsto no nº 2, do art. 19º, em que é cliente da mediadora o proprietário do imóvel ou o arrendatário trespassante e o contrato visado não se concretiza por causa imputável ao cliente do mediador, caso em que a mediadora tem direito à remuneração independentemente da concretização do negócio visado.
Verifica-se igualmente quando o cliente da mediadora celebra o contrato visado com interessado que chegou a si por intermédio de outra mediadora, ou pelo próprio cliente em caso de exclusividade absoluta. Nesses casos a mediadora exclusiva tem direito à remuneração, mesmo que não tenha contribuído para a realização do contrato, uma vez que o cliente torna impossível à mediadora o cumprimento do mesmo – Vide Higina Orvalho Castelo, ob cit., págs 11 a 13.
Posto isto importa aplicar os referidos critérios ao caso em apreço.
Como se deixou dito, a Autora celebrou com o Réu um contrato de mediação imobiliária, pelo qual a Autora se comprometeu a angariar interessado na compra do imóvel de que o Réu era comproprietário, pelo preço de €275.000,00.
O contrato foi celebrado pelo prazo de 6 meses, renovando-se automaticamente por iguais períodos caso não fosse denunciado por qualquer uma das partes – cláusula 8ª. (…)
Posto isto, importa aferir se se encontram verificados os dois requisitos de que depende a remuneração da Autora.
No que concerne à concretização do negócio pretendido ela mostra-se evidente, uma vez que o Réu e sua companheira venderam a BB e CC a fracção objeto do contrato de mediação, por valor não inferior a €220.000,00, valor que declararam no documento autenticado de transmissão da propriedade.
Embora esse preço não tenha sido o fixado para a mediação, certo é que o Réu e a sua comproprietária acordaram com o mesmo, desconhecendo o tribunal se foi pago valor superior, não constante do título de transmissão, conforme era pretensão do Réu transmitida à Autora.
Relativamente ao nexo de causalidade entre a atividade da Autora e o negócio que veio a ser realizado, afigura-se também se verificar este requisito.
Isto porque foi a Autora, através da promoção que fez ao imóvel, que informou a compradora, BB, de que a fração do Réu se encontrava à venda e quais as condições que este pretendia para o negócio, tendo-se esta revelado muito interessada nessa aquisição.
A Autora ficou à espera de resposta desta interessada.
Não chegou a conseguir fazer visita ao imóvel com a interessada, uma vez que esta, não mais contactou, nem retornou as tentativas de contacto da Autora.
Mais, conhecendo a fração, por ter uma familiar a residir no mesmo prédio, a interessada contactou diretamente os vendedores, através da mesma e negociou com eles essa aquisição, nem sequer tendo revelado que havia tomado conhecimento da intenção de vender e condições do negócio através da Autora, tendo esse negócio sido acordado, logo por volta do dia 17 de setembro de 2020, nem um mês após a última reunião que a referida interessada teve com a Autora.
Assim sendo, é inequívoco que a Autora cumpriu com todas as obrigações que assumiu para com o Réu e que foi por força da sua atuação de promoção da venda do imóvel que o negócio veio a ser concretizado com a interessada que aquela angariou.
É, deste modo, destituída de qualquer fundamento a resolução do contrato que o Réu comunicou à Autora, pelo que não pode a mesma produzir quaisquer efeitos.
Mostram-se, assim, verificados os pressupostos do direito de remuneração da Autora.”.

o caso, a A. mediadora cumpriu o ónus que sobre si recaía, de fazer prova de tal nexo, pois que é requisito de haver para si a remuneração devida.
Isso mesmo se afirma lapidarmente no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, 9934/03.0TVLSB.L1.S1, de 27.05.2010:, relatado pelo Cons HÉLDER ROQUE, dgsi.pt, “No contrato de mediação imobiliária, a contraprestação a pagar pelo comitente à entidade mediadora depende da conclusão e perfeição do negócio a celebrar com aquele e o terceiro angariado, como consequência adequada/causal da actividade desenvolvida pela entidade mediadora.
Seguindo o entendimento do Ac deste Tribunal da Relação do Porto, supra citado, e aplicando-o ao caso, conclui-se que a actividade levada a cabo pela A. foi determinante e causal para a concretização do negócio, escritura pública.
Face ao exposto, nada mais resta do que confirmar o decidido pelo Tribunal a quo.
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III DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação do Porto, em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pelo R. (confrontar artigo 527.º do Código de Processo Civil).
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Sumário nos termos do artigo 663.º, n.º 7 do Código de Processo Civil.
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Porto, 10 de Outubro de 2023
Alberto Taveira
Maria Graça Mira
Alexandra Pelayo
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[1] O relator escreve de acordo com a “antiga ortografia”, sendo que as partes em itálico são transcrições cuja opção pela “antiga ortografia” ou pelo “Acordo Ortográfico” depende da respectiva autoria.
[2] Seguimos de perto o relatório elaborado pelo Exmo. Senhor Juiz.