Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
512/17.7T8VFR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: NELSON FERNANDES
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
SEGURANÇA NO EMPREGO
DESPEDIMENTO
EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO
DEMONSTRAÇÃO DA IMPOSSIBILIDADE
SUBSISTÊNCIA DA RELAÇÃO LABORAL
ÓNUS DA PROVA
DESESPERO
PREOCUPAÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RP20180411512/17.7T8VFR.P1
Data do Acordão: 04/11/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÕES EM PROCESSO COMUM E ESPECIAL(2013)
Decisão: PARCIALMENTE PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ªSECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º274, FLS.20-43)
Área Temática: .
Sumário: I - Deve ser rejeitado o recurso sobre a matéria de facto por falta de cumprimento pelo recorrente dos ónus estabelecidos no artigo 640.º do Código de Processo Civil num caso em que aquele se limita a fazer uma indicação genérica da prova que na sua perspetiva justificará uma decisão diversa daquela a que chegou o tribunal recorrido, por ser de exigir, diversamente, que o mesmo tivesse concretizado quer os pontos da matéria de facto sobre os quais recai a sua discordância quer, ainda, que especificasse quais as provas produzidas que, por as ter como incorretamente apreciadas, imporiam decisão diversa, sendo que, quando esse for o meio de prova, se torna também necessário que indique com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição.
II - O princípio da segurança no emprego estabelecido no art.º 53.º da Constituição da República Portuguesa, integrando a categoria dos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, está sujeito ao regime que decorre do artigo 18.º da Constituição, sendo que, constituindo uma das restrições a tal princípio precisamente a do despedimento por causas objetivas que inviabilizem a manutenção da relação laboral, o legislador impôs na lei ordinária alguma rigidez no procedimento para essa forma de cessação da relação laboral e quanto aos requisitos substanciais e formais da sua fundamentação – assim nos artigos 367.º a 371.º, 381.º, 384.º e 387.º do Código do Trabalho (CT/2009) –, indicando, no que ao despedimento por extinção do posto de trabalho se refere, nomeadamente os motivos que o podem fundamentar (artigo 359.º, n.º 2, por remissão do artigo 367.º, n.º 2) mas impondo, também, a demonstração de determinados requisitos (artigo 368º).
III - Impendendo sobre o tribunal o dever de proceder ao controlo da veracidade dos motivos invocados em concreto pelo empregador para o despedimento e ainda de verificar se existe ou não afinal nexo de causalidade entre esses motivos e o despedimento, de tal modo que possa assim concluir, com base em juízos de razoabilidade, se esses motivos eram ou não adequados a justificar o despedimento, daí não resulta, porém, que nessa verificação se incluam as decisões técnico-económicas ou gestionárias que estejam a montante da extinção do posto de trabalho, por estarem aquelas a coberto da liberdade de iniciativa que assiste ao empregador.
IV- Incumbe nestes casos ao trabalhador alegar e provar a relação laboral e o despedimento, recaindo por sua vez sobre a entidade empregadora o ónus de alegar e provar os factos justificativos desse despedimento que se consideram suscetíveis de determinar a impossibilidade da subsistência da relação de trabalho.
V - Ainda que esteja demonstrada a veracidade dos motivos invocados pelo empregador e, ainda, a justificação para a extinção por desnecessidade do concreto posto de trabalho, sempre se imporá, ainda, como resulta da alínea b) do n.º 1 do artigo 368º, do CT/2009, um outro requisito, também esse necessário para o despedimento por extinção do posto de trabalho, assente na demonstração da impossibilidade da subsistência da relação do trabalho, ou seja, que o empregador não possuía um outro posto de trabalho com conteúdo funcional compatível ao do trabalhador (categoria interna, normativa, e não em sentido funcional).
VI - Não logrando o empregador provar que não dispunha de outro lugar compatível com a categoria do trabalhador despedido por extinção do posto de trabalho, como era seu ónus, tal determina, nos termos do artigo 384.º, alínea a), a ilicitude do despedimento que operou, do que decorrerão, por consequência, os efeitos previstos nos artigos 389.º e 390.º, do CT/2009.
VII - Estando provado que o trabalhador, face à atuação do empregador, perdeu ânimo e se sentiu discriminado, como ainda que sofreu desespero e preocupação, tais danos merecem a tutela do direito, pela gravidade que assumem, não podendo pois, como tal, deixar de ser indemnizáveis por força do preceituado nos artigos 483.º e 496.º do Código Civil.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação 512/17.7T8VFR.P1
Autora: B…
: C…, SA
Relator: Nélson Fernandes
1º Adjunto: Des. Rita Romeira
2º Adjunto: Des. Teresa Sá Lopes

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto
I - Relatório
1. B… intentou ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento contra C…, SA., peticionando que se declare a ilicitude ou a irregularidade do despedimento de que foi alvo, com as legais consequências.

1.1 Frustrada a tentativa de conciliação levada a efeito na audiência de partes, a Ré apresentou articulado motivador do despedimento, alegando que esse se ficou a dever à extinção do respetivo posto de trabalho, correspondente à categoria profissional de alimentadora, conforme já constava da comunicação que enviou à trabalhadora, face à atual conjuntura do mercado em que o setor da fabricação e comercialização de rolhas de cortiça natural foi fortemente afetado, levando a empresa a ponderar um conjunto de medidas, com vista a conseguir competir e responder às exigências do mercado, reduzindo os custos e aumentando a produtividade, com aquisição de novos equipamentos.
Conclui que não subsiste a necessidade de manutenção do posto de trabalho inerente às tarefas da Autora, tendo por essa razão decidido pela extinção do posto de trabalho, não possuindo ela outro posto de trabalho compatível ou similar com a categoria profissional da Autora.

1.2 Contestou a Autora a motivação do despedimento, começando por alegar que o procedimento com vista ao despedimento por extinção do posto de trabalho não se iniciou com a comunicação que a Ré juntou como documento nº1, mas antes com uma comunicação datada de 8.09.2016, onde eram invocados motivos estruturais e de mercado, sendo que tendo então solicitado à ACT um pedido de intervenção para verificação dos requisitos previstos nas alíneas c) e d) do nº1 e do nº 2 do artigo 368º do Código do Trabalho, dando conhecimento desse facto à Ré, na sequência do relatório da ACT, veio então a Ré apresentar uma nova comunicação da intenção de despedimento por extinção do posto de trabalho, através da missiva datada de 07.11.2016. Mais alega que, ao contrário do alegado pela Ré, o posto de trabalho correspondente à categoria de alimentadora/recebedora continua a ser necessário e a existir e as funções correspondentes a esta categoria continuam a ser exercidas por uma das cinco escolhedoras que identifica. Além disso, se a aquisição das máquinas tinha o propósito anunciado de otimizar o processo de escolha final das rolhas, impondo-se apenas uma escolha ligeira, então tal inovação teria consequências nos postos de trabalho afetos às escolhedoras e não no posto de trabalho de alimentadora/recebedora.
Conclui que o seu despedimento é ilícito, por manifesta improcedência dos motivos justificativos, peticionando em reconvenção a sua reintegração e o pagamento das retribuições intercalares e ainda o pagamento de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos, no valor de €5.000 e a quantia de €1.053,50 relativo ao crédito de horas vencidos pela não prestação de formação profissional contínua.

1.3 A Ré respondeu, concluindo pela regularidade e licitude do despedimento.

1.4 Fixado o valor da causa em €6.053,50, foi proferido despacho saneador, indicando-se o objeto de litígio e dispensando-se a fixação dos temas de prova.

1.5 Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi depois proferida sentença, de cujo dispositivo consta:
“Pelo exposto, julgo a acção de impugnação da regularidade e licitude do despedimento improcedente, por não provada e, consequentemente, absolvo a ré/Entidade Empregadora do pedido de reintegração da A. e de pagamento das retribuições que a A. deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão;
- Julgo o pedido reconvencional parcialmente procedente, por provado, e em consequência condeno a Ré a pagar à A. a quantia de €1.053,50 (mil e cinquenta e três euros e cinquenta cêntimos), relativo ao crédito de horas vencidas pela não prestação de formação profissional.
- No mais, absolvo a Ré dos pedidos.
Custas da ação a cargo da autora, sem prejuízo da isenção legal de que beneficia e da reconvenção a cargo da A. e R., na proporção do decaimento (artigo 527º, nºs 1 e 2, do CPC).
Mantém-se o valor da ação fixado no despacho saneador. Registe e notifique.
Após trânsito em julgado, deverá a Ré devolver à A. o valor da compensação que lhe é devida e que foi por esta restituída, como resulta de fls.136.

2. Não se conformando com o decidido apresentou a Autora recurso de apelação, finalizando as suas alegações com o que entendeu serem as conclusões, nos termos seguintes:
“A. A recorrente vem interpor recurso da sentença proferida pela Mmª Juíza do Juízo do Trabalho de Santa Maria da Feira – Juiz 2 – do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, no processo n.º 512/17.7T8VFR, cuja decisão foi a seguinte:
“Pelo exposto, julgo a ação de impugnação da regularidade e licitude do despedimento improcedente, por não provada e, consequentemente, absolvo a ré/Entidade Empregadora do pedido de reintegração da A. e de pagamento das retribuições que a A. deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão;
- Julgo o pedido reconvencional parcialmente procedente, por provado, e em consequência condeno a Ré a pagar à A. a quantia de €1.053,50 (mil e cinquenta e três euros e cinquenta cêntimos), relativo ao crédito de horas vencidas pela não prestação de formação profissional.
- No mais, absolvo a Ré dos pedidos. (…) (…) (…)
Após trânsito em julgado, deverá a Ré devolver à A. o valor da compensação que lhe é devida e que foi por esta restituída, como resulta de fls.136.”
B. Versando o mesmo sobre a decisão da matéria de direito e sobre a decisão da matéria de facto, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 639.º, n.º 2 e 640.º, n.ºs 1 e 2 do CPC e dos artigos 79.º al. a), 79.º-A, n.º 1, 80.º e 81.º do CPT, porquanto o Tribunal a quo incorreu em erro na apreciação da prova produzida, ignorando-a, até, e ainda, mesmo em face da matéria de facto dada por provada, é manifesto que ocorreu uma inadequada aplicação do direito aos factos, pelo que a douta sentença deveria ter considerado a ação intentada totalmente procedente, condenando a recorrida nos termos peticionados, tendo inclusive sido desconsiderada prova junta aos autos, nomeadamente o Certificado de Qualificação / Formação de Movimentação e Operação de Empilhadores, cuja junção foi pela recorrente requerida e admitida na 2.ª sessão do julgamento de 13/09/2017 (Cfr. Ata).
C. Para o que aqui importa apurar (porque serão os que a recorrente porá em crise), veio o Tribunal a quo a considerar provados os factos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 7.º, 8.º, 41.º.
D. Igualmente para o que aqui importa apurar (porque será o que a recorrente porá totalmente em crise), veio o Tribunal a quo a considerar totalmente não provado os factos n.ºs 3, 9.º e 13.º (dos factos não provados).
E. De salientar que, quanto aos factos 6.º a 8.º, 10.º a 12.º e 14.º a 16.º considerados não provados, e como decorre da motivação da matéria de facto, a A. “…não sabe, com conhecimento direto, o que ficaram a fazer cada uma das cinco escolhedoras que trabalhavam nessa secção.” mas que, só após toda a produção da prova testemunhal apresentada e produzida em julgamento, se veio a verificar como toda a secção de escolha passou a funcionar, pelo que, também, os factos 9.º e 13.º não deveriam ter in totum respostas negativas – antes deveriam ser considerados parcialmente provados.
F. Não pode, pois a recorrente concordar com dizeres e conclusões vertidos na fundamentação da matéria de facto, porquanto encontram-se os mesmos pejados de falsos pressupostos e baseados em claro erro na apreciação da prova.
G. Nesta conformidade, atentemos aos factos relevantes para a boa decisão da causa e que impunham diferente ponderação, sendo que, para tal será necessário atender aos pontos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 7.º, 8.º, 41.º, os quais correspondem a factos dados como provados e ao pontos n.º 3.º, 9.º e 13.º dos factos não provados, cujas respostas, pela descoordenação com a prova globalmente produzida e até com outros factos dados como provados, é de tal forma grave para a decisão final, que se impõe a sua imediata correção.
H. Assim, e também, para o efeito releva-se os factos provados (que a recorrente não coloca em causa) 12.º, 13.º, 19.º, 24.º, 27.º, 28.º, 29.º, 30.º, 38.º, 39.º, 42.º, 43.º, 44.º, 45.º, 46.º,47.º, 48.º, 74.º, 77.º, 78.º. e, em especial, os factos provados 32.º, 33.º, 34.º, 35.º, 36.º e 37.º definidores e esclarecedores das concretas funções exercidas pela recorrente com a categoria profissional (normativa e contratual) de alimentadora/recebedora – As concretas funções da recorrente consistiam em receber as rolhas das cinco máquinas eletrónicas de pré-escolha; recebidas pela recorrente essas rolhas, em sacos, a mesma abastecia/alimentava a tremonha/moega principal das passadeiras (tapetes) e controlava, através de um automatismo por um tapete de transporte, o enchimento das moegas/reservatórios de cada um dos tapetes de escolha, onde seguidamente eram escolhidas manualmente nos tapetes (passadeiras) existentes, onde estavam alocadas a cada tapete duas escolhedoras; as rolhas escolhidas nos tapetes caíam em alcofas; a recorrente recebia, ainda, as rolhas saídas dos tapetes (passadeiras) de escolha, após a escolha das trabalhadoras (escolhedoras) e procedia ao transporte das alcofas para a máquina contadeira, abastecendo/alimentando essa mesma máquina, através de uma moega; seguidamente a recorrente rececionava/recebia as rolhas saídas da máquina contadeira, transportava os sacos das rolhas para o local afeto ao armazenamento e ainda cosia os respetivos sacos.
I. No decorrer da produção de prova em julgamento resultaram pormenorizadas essas funções na secção, na qual a recorrente repetia por ciclos as sucessivas funções de receber (das máquinas eletrónicas de escolha), alimentar (os tapetes/passadeiras), receber (as rolhas previamente escolhidas manualmente pelas trabalhadoras escolhedoras), alimentar (a máquina contadeira através de uma moega), receber (da máquina contadeira) rolhas e coser os sacos que as embalavam, programando ainda, nesses sucessivos, repetitivos e renovados ciclos, a máquina contadeira.
J. Sucede ainda que, as testemunhas inquiridas em julgamento, bem como a recorrente em sede de declarações de parte, disseram mais (muito mais), em termos até muito diferentes e de forma muito mais global, precisa e concretizadora, do que é vertido na motivação da matéria de facto, cuja falta de consideração valorou em oposição aos interesses e direitos do trabalhador.
K. Ao definir o núcleo essencial de funções da recorrente em alimentar as passadeiras/tapetes da escolha manual e controlar através de automatismo o enchimento dessas moegas, o douto Tribunal apresenta uma injustificada e redutora visão do conceito legal/normativo e contratual de categoria profissional e de posto de trabalho da recorrente, bem como ignora as concretas e totais funções que a mesma desempenhava na secção de escolha.
L. Tal como considerar, como considerou, que o manobrador D… absorveu nas suas funções essa tarefa indiferenciada ao passar, com a ajuda do empilhador, a abastecer/alimentar as mesas/catos e que, depois de efetuada a escolha manual nestes pelas escolhedoras, procede ao transporte dos sacos das rolhas para a contadeira, o douto Tribunal embarca igualmente naquela injustificada visão e, simultaneamente, tem um entendimento deturpado do conceito legal/normativo e contratual de categoria profissional e de posto de trabalho do trabalhador D…, cuja categoria profissional é de manobrador, definindo o CCT do setor (identificado no facto provado 30.º) as funções desta categoria profissional -“É o profissional que executa os restantes serviços da indústria não especificados anteriormente e coopera nas cargas e nas descargas” – categoria manifestamente indiferenciada e residual.
M. No decorrer da produção de prova (testemunhal) o trabalhador D… foi identificado e classificado com a categoria de manobrador, tendo as testemunhas ainda dito que as funções que ele desempenha na secção de escolha não se reconduzem apenas abastecer as mesas/catos com sacos de rolhas e alimentar a contadeira com o empilhador; além destas funções apurou-se que previamente recebe em sacos as rolhas provindas das máquinas de escolha, bem como, após a escolha manual efetuada nas mesas/catos, recebe as rolhas (também em sacos), procede ao seu transporte com o empilhador até à máquina contadeira, alimentando-a e programando-a, que depois de contadas, recebe-as em sacos, armazenando-os e cosendo-os posteriormente.
N. Estas funções que o manobrador D… desempenha na secção de escolha são funções que a recorrente exercia na respetiva secção de escolha, embora agora o manobrador D… as faça em grande parte com o auxílio do empilhador.
O. O facto da escolha manual antes ser feita nos tapetes/passadeiras, e agora nos catos/mesas (também com escolha exclusivamente manual) sem a necessidade de ter alguém a abastecer tremonhas/moegas e a controlar o seu abastecimento, abastecendo- se/alimentando-se diretamente esses mesmos catos com o empilhador através de sacos previamente rececionados/recebidos das máquinas eletrónicas, não permite concluir que tenha deixado de verificar-se uma operação material de alimentação nessas mesas/catos – ela existe de facto.
P. E a montante da escolha manual continuam a ser, pelo manobrador D…, rececionadas/ recebidas em sacos as rolhas escolhidas nas máquinas de escolha eletrónicas, bem como a serem recebidas (agora em sacos) e a serem transportadas para a máquina contadeira, abastecendo-a/alimentando-a (através de uma moega) e programando-a, e depois de as rececionar/receber em sacos, procede ao transporte para armazenagem e cose-os, pelo que as várias e sucessivas operações materiais de alimentação e receção continuam a verificar-se e não é o facto de essas operações efetuarem-se com o auxílio de um empilhador que deixaram de o ser – existem de facto.
Q. O trabalhador D… passou a exercer, de facto e de direito, funções que se reconduzem à categoria de alimentador e recebedor, passando ainda a ocupar e a exercer a totalidade das tarefas/funções/operações do posto de trabalho que a recorrente ocupava, embora seja contratual e normativamente identificado e classificado com a categoria de manobrador.
R. Acresce que agora a secção de escolha é, tal como era ao tempo da recorrente, composta por seis elementos: as mesmas cinco escolhedoras que continuam a fazer escolha exclusivamente manual e o manobrador D…, alocado/afeto posteriormente a esta secção depois da cessação do contrato da recorrente; tal como, no setor em causa, e já antes da aquisição das referidas máquinas de escolher eletrónicas n.ºs 4 e 5 existiam cinco máquinas de escolha, embora aquelas (4 e 5) sejam diferentes, existindo, pelo menos, cinco máquinas de escolha na secção de escolha, funcionando as novas n.ºs 4 e 5 juntamente com as outras, pelo menos três. – factos provados 42.º e 43.º.
S. O doutro Tribunal não valorou ainda todo o processo produtivo e logístico existente na secção de escolha que, desde a receção das rolhas das máquinas eletrónicas de escolha até ao coser dos sacos, permanece/continua o mesmo ao nível de operações de alimentar e receber, tal como subsiste a necessidade de programar a máquina contadeira e o coser dos sacos, caracterizadores das atividades desenvolvidas na secção em causa.
T. O douto Tribunal referiu na sua motivação que a escolha manual antes era feita em tapetes que estavam em constante movimento (sendo necessário alimentar as moegas dessas máquinas e controlar esse abastecimento), que deixaram de existir, e passou a ser feita em mesas/catos fixos e estes, ao contrário daqueles, são alimentados através do condutor do empilhador, que aí despeja os sacos com as rolhas vindas das máquinas eletrónicas, em grandes quantidades, a fim de as escolhedoras fazerem a sua escolha manual, deixando agora de ser necessário alimentar de forma constante as moegas dos tapetes/passadeiras, embora continue a ser necessário alimentar os catos com rolhas, o que é feito pelo manobrador/empilhador, já que as quantidades de rolhas que coloca de uma só vez nas mesas/catos para serem escolhidas manualmente são muito maiores, que o faz com a ajuda do empilhador (para transportar os sacos até às mesas/catos), sendo também o empilhador que, depois de efetuada a escolha manual e cheios os sacos (que podem levar quantidades de doze mil rolhas), os transporta no empilhador para a contadeira.
U. Tal argumentação e raciocínio atenta contra as mais elementares regras da lógica e da experimentação e, até, desconsidera matéria de facto dada por provada (factos provados 32.ºa 37.º) e não considera o que se apurou em sede de inquirição de testemunhas no que tange às outras funções desempenhadas pelo manobrador D… na secção de escolha, designadamente o transporte dos sacos para a máquina contadeira, alimentação (através de uma moega) e programação da mesma, o receber as rolhas desta máquina em sacos, levá-las para outro local e ainda coser os referidos sacos.
V. Ora, também, nunca a recorrente teve de alimentar de forma constante as moegas dos tapetes/passadeiras, desde logo porque na secção de escolha, além de proceder a essa alimentação, recebia, ainda, as rolhas saídas dos tapetes /passadeiras de escolha, após a escolha das trabalhadoras (escolhedoras) e procedia ao transporte das alcofas para a máquina contadeira, abastecendo/alimentando essa mesma máquina, através de uma moega, bem como programava-a e seguidamente rececionava/recebiaem sacos as rolhas saídas da máquina contadeira, transportando-os depois para o local afeto ao armazenamento e ainda cosia os respetivos sacos.
W. E atualmente as tarefas de alimentar e receber rolhas até aumentaram, em número de operações, quantidade e volume, pois resultou ainda no decorrer da produção da prova testemunhal a introdução na secção de uma nova máquina contadeira a funcionar conjuntamente com a anterior.
X. O posto de trabalho correspondente às funções integradoras da categoria profissional (alimentadora-recebedora) que a recorrente vinha concretamente desempenhando na secção continua a ser necessário, existindo ainda, de facto e de direito, e subsistindo a necessidade da sua manutenção na secção de escolha, embora em moldes diferentes como se apontou, pois as funções correspondentes a esse concreto posto de trabalho e categoria profissional passaram a ser desempenhadas e ocupadas por um funcionário com a categoria profissional de manobrador que não integrava anteriormente essa secção e cujas funções não se reconduzem nem tem qualquer correspondência à de alimentador-recebedor.
Y. Sendo que, se a recorrida tivesse atempada e oportunamente ministrado à recorrente formação profissional/formação contínua de movimentação e operação de empilhadores, a recorrente teria todas as condições para desempenhar as funções de alimentadora e recebedora agora com o auxílio do empilhador, pois não é o facto de as operações materiais de alimentação e recebimento/receção terem passado a serem executados com a ajuda do empilhador que determinam a descaracterização de tais operações e funções, nem do posto de trabalho e da categoria profissional.
Z. Acresce que, em sede de produção da prova, foram por algumas testemunhas feitas referências à falta de capacidade da recorrente para alimentar as máquinas e movimentar sacos de 12000 rolhas com o empilhador, mas certo é outras disseram que não lhe fora dada nem ponderada formação para o efeito, embora se tenha apurado que as funções que a recorrente desempenhava na secção de escolha sejam agora efetuadas pelo manobrador D… com o auxílio de um empilhador.
AA. Na sequência desses depoimentos, tomou posição a recorrente por requerimento oral na 2.ª sessão de julgamento de 13/09/2017, requerendo a junção de Certificado de Qualificação / Formação de Movimentação e Operação de Empilhadores, o qual foi admitido por douto despacho (Cfr. Ata), não o tendo, contudo, o Tribunal considerado e valorado em momento algum como se lhe impunha e em oposição aos interesses e direitos do trabalhador.
BB. Resultou ainda da produção da prova testemunhal que a recorrente, durante o tempo em que vigorou o contrato de trabalho, foi afeta e laborou em várias secções, designadamente nas máquinas ponçadeiras e pojadeiras, embora sempre com as funções de alimentadora, o que permite concluir que na recorrida existia/existe a necessidade de alimentação (alimentadora) de determinadas máquinas e em vários setores.
CC. Mais resultou ainda da produção da prova testemunhal e das declarações que a recorrente no segundo semestre de 2016 exerceu funções no setor das lixadeiras e pulsadeiras, vigiando/controlando, desentupindo as mesmas, bem como controlando/vigiando os tapetes afetos a essas máquinas, tarefas essas não reconduzíveis objetivamente à sua categoria de alimentadora-recebedora.
DD. Motivos pelos quais, importando tais erros na apreciação das provas diferentes da decisão devem ser considerados como não provados os factos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 7.º, 8.º, 41.º, deve ser considerado como provado o facto n.º 3 (julgado não provado) e, bem assim, devem ser considerados parcialmente provados no segmento “o posto de trabalho correspondente à categoria de alimentadora/recebedora continua a ser necessário (…)” os factos julgados não provados n.ºs 9.º e 13.º, alterações essas que se requer expressamente sejam declaradas por este Venerando Tribunal.
EE. Constituindo os concretos meios probatórios para o efeito requerido supra e em cumprimento do disposto no art.º 640.º, n.º 1, al. b), os depoimentos das testemunhas E… (passagens de 19m12s a 19m24s, de 20m50s a 21m19s e de 32m30s a 33m12s – Sessão de julgamento de 11/09/2017 com início das gravações às 14:33:30 e fim às 15:08:24); F… (passagem de 18m02s a 20m07s – Sessão de julgamento de 11/09/2017 com início das gravações às 15:09:04 e fim às 15:49:32) ; G… (passagens de 13m00s a 14m13s, de 15m37s a 18m05s, de 19m10s a 21m29s e 23m42s a 23m52s – sessão de julgamento de 11/09/2017 com início das gravações às 15:50:11 e fim às 16:14:34); H… (passagens de 13m07s a 14m24s e de 17m45s a 21m33s – sessão de julgamento de 13/09/2017 com início das gravações às 14:24:56 e fim às 15:04:02); I… (passagens de 04m25s a 05m50s e de 08m09s a 08m48s – sessão de julgamento de 13/09/2017 com início das gravações às 14:24:56 e fim às 15:04:02); J… (passagens de 07m49s a 09m45s e de 13m25s a 16m25s – sessão de julgamento de 13/09/2017 com início das gravações às 14:24:56 e fim às 15:04:02); K… (passagem de 19m37s a 22m16s – sessão de julgamento de 02/10/2017 com início das gravações às14:55:59 e fim às 15:34:43) e L… (passagem de 01m35s a 05m37s – sessão de julgamento de 02/10/2017 com início das gravações às 15:35:17e fim às 15:45:26); Declarações de Parte (passagens de 06m28s a 07m33s, de 10m48s a 14m02s e de 15m10s a 16m05s – sessão de julgamento de 11/09/2017 com início das gravações às 16:15:15 e fim às 16:56:24); e o documento Certificado de Qualificação / Formação de Movimentação e Operação de Empilhadores, cuja junção foi pela recorrente requerida e admitida na 2.ª sessão do julgamento de 13/09/2017 (Cfr. Ata).
FF. No que ao presente recurso diz respeito na parte em que aqui se invoca erro na aplicação do direito aos factos, importa recordar o entendimento preconizado pelo douto Tribunal, o qual conclui pela existência de justa causa objetiva de despedimento e pela licitude do despedimento da recorrente por extinção do posto de trabalho ao considerar estarem verificados os motivos invocados pela recorrida para efeitos de extinção do posto de trabalho da recorrente, à luz do estabelecido nas disposições conjugadas dos artigos 367.º e 359.º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do CT, por entender terem ficado provados os factos invocados como fundamento para a extinção do posto de trabalho e por tais factos conferirem racionalidade à decisão de extinguir o posto de trabalho de alimentadora, pelo que, não só os motivos invocados são verdadeiros, como se mostra verificado o nexo de causalidade entre tais motivos e a decisão de extinção do posto de trabalho da recorrida, bem como ao considerar estarem igualmente verificados os requisitos cumulativos previstos nas diversas alíneas do nº1 do artigo 368º do CT, designadamente o previsto na alínea b) na medida em que é aí dito (…)que na estrutura organizativa da Ré, não existia nem existe qualquer outro posto de trabalho com conteúdo funcional igual ou equivalente à de alimentadora, que era exercido pela A., tornando também por este prisma a subsistência da relação de trabalho praticamente impossível. Além disso, também não se provou que a Ré tivesse vagas noutros postos de trabalho, designadamente no de empilhador (que passou a fazer, ainda que de forma diferente, nos moldes já explicitados, algumas das funções exercidas pela A.), posto que se apurou estarem já ocupados por outros dois funcionários da Ré.”
GG. Em sede de fundamentação da matéria de direito quanto à constatação da verificação dos requisitos estabelecidos nas disposições conjugadas dos artigos 367.º e 359.º, n.º 2, alíneas a), b) e c) e à verificação dos requisitos cumulativos previstos nas diversas alíneas do nº1 do artigo 368º, todos do CT, o douto Tribunal trouxe novamente à colação argumentos que, uma vez mais, falecem por assentarem em manifesto erro na apreciação da prova munida nestes autos, o que urge reparar.
HH. Importa, desde logo, aquilatar dos fundamentos objetivos invocados pela recorrida para o despedimento por extinção do posto de trabalho, por um lado, e a existência de um nexo causal entre tais fundamentos e o despedimento empreendido e julgado lícito.
II. Os fundamentos da recorrida quanto à decisão da extinção do posto de trabalho da recorrente assentaram no essencial na invocação de que, com aquisição de duas máquinas de escolher eletrónicas n.ºs 4 e 5, deixou de ser necessária a utilização dos tapetes/passadeiras, por as rolhas apenas necessitarem de uma escolha ligeira que passa a ser efetuada por duas mesas (catos) colocadas à saída das máquinas, deixando também de ser necessária a alimentação dos tapetes, que inicialmente previam automatizar, tendo como consequência a não subsistência da necessidade de manutenção do posto de trabalho inerente às tarefas da recorrente e à sua categoria profissional que detém.
JJ. As funções desempenhadas pela recorrente no seu posto de trabalho como alimentadora-recebedora na secção de escolha encontram-se assentes (factos provados 32.º, 33.º, 34.º, 35.º, 36.º e 37.º), tendo ainda no decorrer da produção de prova em julgamento resultado pormenorizadas essas funções na secção, na qual a recorrente repetia por ciclos as sucessivas funções de receber (das máquinas eletrónicas de escolha), alimentar (os tapetes/passadeiras), receber (as rolhas previamente escolhidas manualmente pelas trabalhadoras escolhedoras), alimentar (a máquina contadeira através de uma moega), receber (da máquina contadeira) rolhas e coser os sacos que as embalavam, programando ainda, nesses sucessivos, repetitivos e renovados ciclos, a máquina contadeira.
KK. Com a introdução das novas máquinas de escolher, as funções que o manobrador D… desempenha na secção de escolha não se reconduzem apenas a abastecer as mesas/catos com sacos de rolhas e alimentar a contadeira com o empilhador; além destas funções apurou-se em julgamento que previamente recebe em sacos as rolhas provindas das máquinas de escolha, bem como, após a escolha manual efetuada nas mesas/catos, recebe as rolhas (também em sacos), procede ao seu transporte com o empilhador até à máquina contadeira, alimentando-a e programando- a, que depois de contadas, recebe-as em sacos, armazenando-os e cosendo-os posteriormente.
LL. Existe ainda identidade de funções relativamente às que a recorrente exercia na respetiva secção de escolha, embora agora o manobrador D… as faça em grande parte com o auxílio do empilhador.
MM. E não é o facto da escolha manual antes ser feita nos tapetes/passadeiras, e agora nos catos/mesas (também com escolha exclusivamente manual!) sem a necessidade de ter alguém a abastecer tremonhas/moegas e a controlar o seu abastecimento, abastecendo-se/alimentando-se diretamente esses mesmos catos com o empilhador através de sacos previamente rececionados/recebidos das máquinas eletrónicas, que permite também concluir que tenha deixado de verificar-se uma operação material de alimentação nessas mesas/catos – ela existe de facto.
NN. Acresce que, a montante da escolha manual continuam a ser, pelo manobrador D…, rececionadas/ recebidas em sacos as rolhas escolhidas nas máquinas de escolha eletrónicas, bem como a serem recebidas (agora em sacos) e a serem transportadas para a máquina contadeira, abastecendo-a/alimentando-a (através de uma moega) e programando-a, e depois de as rececionar/receber em sacos, procede ao transporte para armazenagem e cose-os, pelo que as várias, encadeadas e cíclicas operações materiais de alimentação e receção continuam a verificar-se e não é o facto de essas operações efetuarem-se agora com o auxílio de um empilhador que deixaram de o ser – existem de facto.
OO. O posto de trabalho que a recorrente ocupava continua a existir de facto e de direito, ocupado agora pelo trabalhador D… que não integrava a secção de escolha e que detém a categoria normativa e contratual de manobrador, sendo que as tarefas que este exerce na secção de escolha reconduzem-se às funções integradoras da categoria de alimentador e recebedor, de acordo com o CCT identificado em 30.º dos factos provados, subsistindo ainda na secção em causa a necessidade de um alimentador- recebedor.
PP. Por outro lado, a secção de escolha é, tal como era ao tempo da recorrente, composta por seis elementos: as mesmas cinco escolhedoras que continuam a fazer escolha exclusivamente manual (antes nos tapetes e agora nas mesas/catos) e o manobrador D…, alocado/afeto posteriormente a esta secção depois da cessação do contrato da recorrente; tal como, no setor em causa, e já antes da aquisição das referidas máquinas de escolher eletrónicas n.ºs 4 e 5 existiam cinco máquinas de escolha, embora aquelas (4 e 5) sejam diferentes, existindo, pelo menos, cinco máquinas de escolha na secção de escolha, funcionando as novas n.ºs 4 e 5 juntamente com as outras, pelo menos três.– Factos provados 42.º e 43.º.
QQ. O posto de trabalho da recorrente não se reconduzia apenas às funções de alimentar, de forma constante, as moegas dos tapetes/ passadeiras e controlar esse abastecimento, tal como as funções exercidas pelo manobrador D… se reconduzem a abastecer/alimentar as mesas/catos com sacos de rolhas com o empilhador, ignorando o douto Tribunal todo o processo produtivo e logístico existente na secção de escolha, desde a receção das rolhas das máquinas eletrónicas de escolha até ao coser dos sacos, tal como desconsiderou as categorias profissionais normativas e contratuais totalmente distintas e sem correspondência.
RR. Apurou-se ainda, em conjugação com os factos dados como provados e em sede de produção de prova testemunhal que, com a introdução de novas máquinas eletrónicas de escolha que se juntaram às outras cinco existentes na secção, as tarefas de alimentar e receber rolhas até aumentaram, em número de operações, quantidade e volume, pois resultou ainda no decorrer da produção da prova testemunhal a introdução na secção de uma nova máquina contadeira a funcionar conjuntamente com a anterior.
SS. Posto isto, terá de concluir-se que na secção de escolha o posto de trabalho que a recorrente não foi extinto (continua a existir), que as funções correspondentes à categoria profissional de alimentador-recebedor continuam a ser aí necessárias e que o posto de trabalho é ocupado por um outro trabalhador que não é alimentador- recebedor, antes é manobrador.
TT. Pelo que, os factos (objetivamente considerados) invocados como fundamento para a extinção do posto de trabalho da recorrente não conferem racionalidade, proporcionalidade e adequação à decisão de extinguir o posto de trabalho de alimentadora-recebedora (e não só de alimentadora como é referido quer na comunicação da intenção, quer na fundamentação de direito) como não se mostra verificado o nexo de causalidade entre tais motivos e a decisão de extinção do posto de trabalho da recorrente.
UU. Mal andou o Tribunal ao concluir estarem verificados os motivos invocados pela recorrida para efeitos de extinção do posto de trabalho da recorrente, à luz do estabelecido nas disposições conjugadas dos artigos 367.º e 359.º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do CT ao considerar verificar-se o nexo de causalidade entre tais motivos e a decisão de extinção do posto de trabalho da recorrida.
Noutro plano,
VV. O despedimento por extinção pressupõe também a verificação dos requisitos cumulativos mencionados no art.º 368.º, n.º 1, do CT.
WW. O douto Tribunal igualmente considerou estarem verificados os requisitos cumulativos previstos nas diversas alíneas do nº1 do artigo 368º do CT, e quanto ao previsto na alínea b) deste normativo é aí dito (…) que na estrutura organizativa da Ré, não existia nem existe qualquer outro posto de trabalho com conteúdo funcional igual ou equivalente à de alimentadora, que era exercido pela A., tornando também por este prisma a subsistência da relação de trabalho praticamente impossível. Além disso, também não se provou que a Ré tivesse vagas noutros postos de trabalho, designadamente no de empilhador (que passou a fazer, ainda que de forma diferente, nos moldes já explicitados, algumas das funções exercidas pela A.), posto que se apurou estarem já ocupados por outros dois funcionários da Ré.”
XX. Não obstante não ter sido considerada nem valorada, resultou da produção de prova em sede de julgamento a imputação de falta de capacidade da recorrente para, através de um empilhador, alimentar máquinas e movimentar sacos de 12000 rolhas e que a as funções de movimentação e operação de empilhadores não eram exequíveis por mulheres.
YY. E que a recorrida nem sequer ponderou a possibilidade de ministrar/prestar formação profissional/formação contínua à recorrente para o efeito (movimentação e operação de empilhadores), embora se tenha apurado que as funções que a recorrente desempenhava na secção de escolha sejam agora efetuadas pelo manobrador D… com o auxílio de um empilhador.
ZZ. Nessa conformidade, tomou posição a recorrente por requerimento oral na 2.ª sessão de julgamento de 13/09/2017, requerendo a junção de Certificado de Qualificação / Formação de Movimentação e Operação de Empilhadores, o qual foi admitido por douto despacho (Cfr. Ata), não o tendo, contudo, o Tribunal considerado e valorado em momento algum da douta sentença.
AAA. Resultou ainda da produção da prova testemunhal que a recorrente, durante o tempo em que vigorou o seu contrato de trabalho, foi afeta e laborou em várias secções, como alimentadora, designadamente nas máquinas ponçadeiras e pojadeiras, o que permite concluir que na recorrida existia/existe a necessidade de alimentação (alimentadora) de determinadas máquinas em sectores não pertencentes à secção de escolha.
BBB. Mais resultou ainda da produção da prova testemunhal e das declarações que a recorrente no segundo semestre de 2016 exerceu funções no setor das lixadeiras e pulsadeiras, vigiando/controlando, desentupindo as mesmas, bem como controlando/vigiando os tapetes afetos a essas máquinas, tarefas objetivamente não reconduzíveis à sua categoria de alimentadora-recebedora.
CCC. A impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho entre a recorrente e a recorrida não decorreu de qualquer factualidade que revelasse que, extinto o posto de trabalho de alimentador-recebedor, inexistisse outro compatível com a categoria profissional que a recorrente detinha.
DDD. Ora, se a impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho foi alegada pela recorrida, o certo é que não fez prova dessa circunstância, competindo-lhe legalmente esse ónus nos termos do disposto no art.º 342.º do CC.
EEE. Acresce que, nem sequer nenhum facto foi julgado provado ou não provado que, direta ou indiretamente, fosse demonstrativo dessa impossibilidade prática da relação de trabalho, nem se vislumbra o raciocínio usado pelo douto Tribunal para tal conclusão.
FFF. O que resulta demonstrado é que a recorrida, após a cessação do contrato da recorrente – para além de não ter, sequer, tentado recolocá-la a exercer quaisquer outras funções compatíveis com a sua categoria profissional de alimentadora- recebedora – atribuiu as suas funções a pessoa com outra categoria profissional (manobrador) que já trabalhava para a recorrida e sem que tivesse, sequer, sido alegado pela recorrida ou tenha resultado da produção de prova a antiguidade desse funcionário.
GGG. Resultando ainda demonstrado que a recorrida nem sequer ponderou prestar formação profissional/formação contínua à recorrente para se adaptar à alimentação/receção que viria a ser efetuada, em grande parte, como auxílio do empilhador, também não se verifica esse requisito da impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho.
HHH. Mal também andou o Tribunal ao considerar estarem verificados os requisitos cumulativos previstos nas diversas alíneas do nº 1 do artigo 368º do CT, mais concretamente o pressuposto previsto na sua alínea b).
III. Em suma, atenta a prova desconsiderada (e a total ausência de outra que legalmente incumbia à recorrida), não se encontram preenchidos os requisitos legais exigidos para o efeito – pressupostos previstos nos artigos 367.º e 359.º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do CT ao considerar verificar-se o nexo de causalidade entre tais motivos e a decisão de extinção do posto de trabalho da recorrida e os pressuposto previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 368º do CT -, devendo pois aplicar-se, in casu, os normativos legais referentes à ilicitude do despedimento, nomeadamente, as normas previstas nos artigos 381.º, n.º 1, alínea b) e 384.º, alíneas a) e b).
JJJ. Ao decidir como decidiu violou o Tribunal a quo os artigos 18.º e 53.º da CRP, o artigo 342.º do CC e os artigos 367 e 359.º, n.º 2, alíneas a), b) e c) e o artigo 368.º, n.ºs 1 e 4, do CT.
KKK. Motivo pelo qual deve pois ser revogada a douta sentença e substituída por outra que declare a ilicitude do despedimento operada pela recorrida, com a consequente reintegração da recorrente e as demais consequências legais e, bem assim, declare a procedência total do pedido reconvencional, condenando a recorrida nos termos peticionados, o que expressamente se requer a esse Venerando Tribunal se digne declarar.
LLL. Caso assim não se entenda, requer-se a esse Venerando Tribunal se digne ordenar a reapreciação de toda a prova, concluindo-se nos exatos termos peticionados pela recorrente.
Termos em que se requer a Vossas Excelências se dignem revogar a douta sentença (à exceção do pedido reconvencional já julgado parcialmente procedente), sendo esta substituída por decisão que declare a ilicitude do despedimento operada pela recorrida, com a consequente reintegração da recorrente e as demais consequências legais e, bem assim, declare a procedência do restante pedido reconvencional, condenando a recorrida nos termos peticionados, assim se fazendo inteira e sã JUSTIÇA!”

2.1 Contra-alegou a Ré, concluindo do modo seguinte:
“- A douta sentença recorrida não violou qualquer normativo legal, máxime os invocados pelos Recorrentes;
- Esteve bem o Tribunal “ a quo” na interpretação dos factos e na sua subsunção aos normativos legais;
- A convicção do Tribunal baseou-se, corretamente, em todos os elementos existentes no processo;
- Carece, assim, de qualquer fundamento o expendido pelos Recorrentes nas suas conclusões – que mais não constituem do que uma derradeira, mas infundada, tentativa de alterar uma decisão que lhes foi desfavorável - pelo que as mesmas devem improceder.
Termos em que, deve ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se na íntegra a douta sentença proferida, por a mesma não merecer qualquer reparo, assim se fazendo, como sempre, sã e inteira JUSTIÇA!”

2.2 O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata e nos próprios autos, com efeito meramente devolutivo.

3. O Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, de facto e de direito.

3.1 Respondeu a Recorrente, mantendo a posição já por si assumida nas alegações.

4. Elaborado o projeto de acórdão, foi o mesmo remetido, acompanhado do histórico do processo, às Exmas. Adjuntas, nos termos e para os efeitos previstos no n.º 2 do artigo 657.º do Código de Processo Civil (CPC).
*
Cumpre apreciar e decidir:
II – Questões a resolver
Sendo pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso (artigos 635.º/4 e 639.º/1/2 do Código de Processo Civil (CPC) – aplicável “ex vi” do artigo 87.º/1 do Código de Processo do Trabalho (CPT) –, integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir: (1) Matéria de facto (inadmissibilidade do recurso sobre a matéria de facto e intervenção oficiosa); (2) Juízo sobre o mérito no que se refere ao despedimento (os pressupostos do despedimento, as consequências da ilicitude do despedimento e a indemnização por danos não patrimoniais).
*
III – Fundamentação
A) De facto
O tribunal recorrido deu como provados os factos seguidamente transcritos:
“1º- Da decisão comunicada à trabalhadora consta que o seu despedimento ficou a dever-se à extinção do respetivo posto de trabalho, correspondente à categoria profissional de Alimentadora.
2º- E consta dessa comunicação que lhe foi enviada que, face à atual conjuntura de mercado, o setor da fabricação e comercialização de rolhas de cortiça natural foi fortemente afetado, levando a empresa, nos últimos tempos, a ponderar um conjunto de medidas destinadas à modernização tecnológica na linha de escolha de rolhas, com vista a otimizar o processo de escolha final, que até agora vinha sendo efetuado nos tapetes de forma manual.
3º- Consta ainda que tais medidas prendem-se com a necessidade da empresa se atualizar às novas técnicas de produção que vão surgindo, a modos de conseguir responder às duras exigências da competitividade do mercado, e assim conseguir, simultaneamente, reduzir os custos e aumentar a produtividade. Imperioso se torna, sob pena de rotura ou colapso económico, conseguir a redução de custos inerentes à atividade da signatária.
4º- E mais ainda que com a recente aquisição pela empresa das duas máquinas eletrónicas de escolher nº4 e nº5, pretendeu esta administração otimizar o processo de escolha final das rolhas até agora efetuado nos tapetes, deixando de ser necessária a utilização dos mesmo, já que as rolhas apenas necessitarão de uma escolha ligeira que passará a ser efetuada por duas mesas (catos) que entretanto foram colocadas à saída das máquinas, deixando também de ser necessária a alimentação dos tapetes, que inicialmente se previa automatizar.
Neste momento, os mesmos tapetes estão já parados, tendo sido colocada no piso onde está a linha de máquinas eletrónicas duas mesas (catos) de escolha, com a afetação das escolhedoras a este posto de trabalho, pelo que não subsiste necessidade de manutenção do posto de trabalho inerente às tarefas da Req.te para com a Req.da, tendo consequentemente se decidido pela inevitabilidade da extinção do posto de trabalho correspondente à categoria que a Req.te detém.
5º- Face à atual conjuntura de mercado, o setor da fabricação e comercialização de rolhas de cortiça natural foi fortemente afetado, levando a Ré, nos últimos tempos, a ponderar um conjunto de medidas destinadas à modernização tecnológica na linha de escolha de rolhas, com vista a otimizar o processo de escolha final, que até agora vinha sendo efetuado nos tapetes de forma manual.
6º- Tais medidas prendem-se com a necessidade da empresa se atualizar às novas técnicas de produção que vão surgindo, e conseguir responder às exigências da competitividade do mercado, e assim conseguir, simultaneamente, reduzir os custos e aumentar a produtividade.
7º- Com a aquisição pela empresa das duas máquinas eletrónicas de escolher nº4 e nº5, pretendeu esta otimizar o processo de escolha final das rolhas até agora efetuado nos tapetes, deixando de ser necessária a utilização dos mesmos, já que as rolhas apenas necessitarão de uma escolha ligeira que passará a ser efetuada por duas mesas (catos), deixando de ser necessária a alimentação dos tapetes.
8º- Neste momento, os mesmos tapetes estão já parados, tendo sido colocadas duas mesas (catos) de escolha, com a afetação das escolhedoras a este posto de trabalho, não subsistindo necessidade de manter o posto de trabalho inerente às tarefas da A. para com a R., não possuindo esta outro posto de trabalho compatível ou similar com a categoria da A.
9º- Não existem na empresa contratos a termo para as tarefas correspondentes ao posto de trabalho a extinguir.
10º- A Autora esteve ininterruptamente ao serviço da Ré, trabalhando remuneradamente sob as suas ordens, orientação e autoridade.
11º- A R. era (e é) associada da APCOR (Associação Portuguesa de Cortiça).
12º- Às relações de trabalho existentes entre as partes eram (e são) aplicáveis os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho para o sector corticeiro, concretamente, o Contrato Colectivo entre a APCOR – Associação Portuguesa de Cortiça e a FEVICCOM – Federação Portuguesa dos Sindicatos da Construção, Cerâmica e Vidro e outros (pessoal fabril) – CCTV publicado no BTE, 1.ª Série, n.º 47, de 22 de Dezembro de 2004, com as alterações publicadas nos BTE’s, 1.ª SÉRIE, n.º 28 de 29 de Julho de 2005, n.º 46, de 15 de Dezembro de 2006, n.º 41, de 8 de Novembro de 2008, n.º 18 de 15 de Maio de 2010 (revisão global), n.º 1, de 8 de Janeiro de 2011, n.º 33, de 8 de Setembro de 2011, n.º 32, de 29 de Agosto de 2012, n.º 34 de 15 de Setembro de 2013 (texto consolidado), n.º 32, de 29 de Agosto de 2014, n.º 39, de 22 de Outubro de 2015 (Alteração salarial e outras) e n.º 34, de 15 de Setembro de 2016 (Alteração salarial e outras e texto consolidado).
13º- A R. classificava a A. como alimentadora/recebedora.
14º- E pagava-lhe a retribuição salarial mensal de €745,91.
15º- A Ré enviou à A. uma comunicação datada de 8/9/2016 e rececionada pela A. em 13/09/2016 com o assunto “Notificação da intenção de despedimento por extinção do posto de trabalho por motivos estruturais e de mercado, nos termos do artigo 367.º e ss. do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro e suas alterações”.
16º- Na sequência dessa comunicação da R., a A. solicitou à ACT um pedido de intervenção para verificação dos requisitos previstos nas alíneas c) e d) do n.º 1 e no n.º 2, do CT. 17º- Informou simultaneamente desse facto a R. [solicitação à ACT da verificação dos requisitos previstos nas alíneas c) e d) do n.º 1 e no n.º 2, do art.º 368.º do CT].
18º- A ACT elaborou e enviou à A. e à R. o respectivo Relatório sobre a matéria sujeita a verificação.
19º- Nesse Relatório é referido o seguinte: «No entanto, cumpre-me informar V. Exa. que, das diligências efectuadas, e atendendo ainda ao disposto no n.º 2 do Artigo 368.º do referido diploma legal, constatou-se o seguinte:
a) Na Secção da Escolha Manual laboram, à data, cinco escolhedoras e uma alimentadora/recebedora, a saber M…, J…, I…, H… e n… (Escolhedoras) e B… (Alimentadora / Recebedora);
b) No momento da visita, a trabalhadora requerente não efectuava qualquer tarefa inerente à sua categoria de alimentadora/recebedora que, consiste em abastecer a tremonha das máquinas de escolha (passadeira) de rolhas onde serão escolhidas as rolhas, nos tapetes. Após a escolha tais rolhas caiem em alcofas que, eram transportadas pela requerente para a Contadeira;
c) Tal função, à data, era exercida pela trabalhadora I… com a categoria profissional de Escolhedora;
d) Às trabalhadoras com a categoria de escolhedoras cabe escolher, por classes, rolhas podendo ainda desempenhar as funções de contadora/pesadora e apontadora e, por sua vez, às trabalhadoras com a categoria de Alimentadora/Recebedora de receber e alimentar determinadas máquinas, nos termos do CCT aplicável;
e) A trabalhadora requerente esteve de Baixa entre 06 de Junho e 26 de Julho de 2016;
f) Desde o início do contrato de trabalho da requerente, o seu posto de trabalho foi nas máquinas de escolha (passadeiras), alimentando-as e despejando as alcofas na Contadeira para contagem;
g) Segundo a trabalhadora requerente, nesse período de Baixa foi proposto pela empresa a celebração de um Acordo de Revogação que, não foi aceite pela mesma;
h) Na Secção de Escolha Manual existem três máquinas de escolha com os respectivos tapetes, dos quais uma ficou inactiva no período de baixa da requerente e se mantinha, à data da visita, estando em cada tapete duas escolhedoras;
i) Em Setembro de 2016, a Requerente foi “mudada” de posto de trabalho para as lixadeiras e Pulsadeiras;
j) Apesar de ser referido na comunicação da intenção de despedimento por extinção do posto de trabalho a alocação de equipamento adquirido em 31/08/2016, o facto é que esse equipamento não está afecto à Escolha Manual, conforme dado a verificar;
k) Segundo a requerente tal equipamento está sim alocado às lixadeiras e pulsadeiras;
l) O posto de trabalho que a empresa pretende extinguir é o de alimentadora/recebedora (ocupado, à data, por I…) sendo que a trabalhadora B… mantém-se afecta a várias secções, a exercer funções variadas;
m) Atendendo que, na Secção de Escolha Manual exercem actividade seis trabalhadoras e, que à data da comunicação, tal posto é ocupado por outra trabalhadora que não a requerente, temos que:
I. À data, não existe qualquer avaliação formal do desempenho das trabalhadoras;
II. A totalidade das trabalhadoras é do GRUPO XV-A, sendo Profissionais semiqualificados (especializados);
III. Todas as trabalhadoras exercem igual salário, correspondente a 745,91 Euros; IV. As datas de admissão das diferentes trabalhadoras foram:
1. H…, em 01/09/1978;
2. I…, em 01/05/1981;
3. J…, em 01/04/1984;
4. M…, em 01/04/1984;
5. B…, em 01/06/2009;
6. N…, em 11/06/2012;
V. Resulta, assim, estarmos perante “postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico”. Porquanto, verificou-se, por forma mediata e através das declarações dos interpelados (embora sem a necessária presencialidade/observação directa do posto de trabalho), que na secção de escolha manual as funções desempenhadas pela totalidade das trabalhadoras, embora pertencentes a categorias profissionais distintas, e sem prejuízo de melhor entendimento, parecem estar inseridas numa mesma “linha funcional”, não se podendo, assim, concluir inequivocamente pela inexistência de uma pluralidade de postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico, na secção em causa.»
20º- Posteriormente ao indicado Relatório da ACT, veio a R., através de uma missiva datada de 07/11/2016 e recebida pela A. a 08/11/2016, apresentar uma nova comunicação da “… Intenção de despedimento por extinção do posto de trabalho por motivos estruturais e de mercado, nos termos do Art.º 367.º e ss. do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro e suas alterações.”
21º- Aí é referido, nomeadamente, que “Neste sentido, foi tomada pela administração da empresa a presente decisão, que embora se mantenha a mesma no que à extinção do posto de trabalho de V. Ex.ª diz respeito, vem modificar a motivação a ela inerente, razão pela qual enviamos nova comunicação devidamente justificada.” e que “…com a presente comunicação se inicie o procedimento de despedimento de extinção do posto de trabalho.”
22º- Face ao anunciado início de um novo procedimento com vista ao despedimento por extinção do posto de trabalho, através de uma nova comunicação com “motivação modificada”, mas assente, tal como a anterior, em motivos económicos (estruturais e de mercado), a A., em 10/11/2016, solicitou à ACT um (novo) pedido de intervenção para verificação dos requisitos previstos nas alíneas c) e d) do n.º 1 e no n.º 2 , do CT.
23º- Desse facto, uma vez mais, deu conhecimento à R.
24º- E a ACT elaborou e enviou à A. e à R. o Relatório sobre a matéria sujeita a verificação, reiterando o teor do Relatório anteriormente elaborado e enviado em 28 de Setembro de 2016.
25º- A notificação/comunicação da decisão de despedimento por extinção do posto de trabalho foi enviada pela R. em 25/11/2016 e recebida pela A. em 28/11/2016.
26º- A A. esteve de baixa médica nos períodos compreendidos de 06/06/2016 a 26/07/2016 e de 26/09/2016 a 30/11/2016.
27º- Desde a sua admissão até ao seu despedimento em 31/01/2017, a A. laborou maioritariamente na Secção de Escolha Manual, como alimentadora/recebedora.
28º- Fê-lo, na maioria do tempo, juntamente com outras cinco trabalhadoras (escolhedoras), designadamente M…, J…, I…, H… e N….
29º- Laborando assim na secção de escolha manual estas cinco trabalhadoras e a A., inseridas numa mesma linha funcional.
30º- De acordo com o supra indicado CCT publicado no BTE, 1.ª série, n.º 34, de 15 de Setembro de 2016, no seu Anexo II (Definição de funções – Operário corticeiro) cabe aos trabalhadores operários corticeiros com a categoria de alimentador / recebedor (cortiça) a função de receber e alimentar determinadas máquinas não especificadas neste grupo, enquanto aos trabalhadores operários corticeiros com a categoria de escolhedores cabe a função de seleccionar rolhas e discos por classes ou padrões de qualidade, podendo ainda desempenhar as funções de contador e pesador (escolhedor de rolhas e discos) e a função de seleccionar e classificar a cortiça e aglomerados por classes ou padrões de qualidade, sendo que no caso das rolhas procede à definição dos padrões (Escolhedor de cortiça, aglomerados e padrão).
31º- Quer os escolhedores, quer os alimentadores / recebedores, são operários corticeiros que pertencem ao mesmo grupo de categorias profissionais (Grupo XIV) e auferem o mesmo vencimento.
32º- As concretas funções da A. consistiam em receber as rolhas das cinco máquinas de eletrónicas de pré-escolha.
33º- Recebidas pela A. essas rolhas, em sacos, a mesma abastecia/alimentava a tremonha/moega principal das passadeiras (tapetes) e controlava, através de um automatismo por um tapete de transporte, o enchimento das moegas/reservatórios de cada um dos tapetes de escolha, onde seguidamente eram escolhidas manualmente nos tapetes (passadeiras) existentes.
34º- Estavam alocadas a cada tapete duas escolhedoras.
35º- As rolhas escolhidas nos tapetes caíam em alcofas.
36º- A A. recebia, ainda, as rolhas saídas dos tapetes (passadeiras) de escolha, após a escolha das trabalhadoras (escolhedoras) e procedia ao transporte das alcofas para a máquina contadeira, abastecendo/alimentando essa mesma máquina, através de uma moega.
37º- Seguidamente a A. rececionava/recebia as rolhas saídas da máquina contadeira, transportava os sacos das rolhas para o local afeto ao armazenamento e ainda cosia os respectivos sacos.
38º- Em Setembro de 2016, a R. retirou a A. do seu posto de trabalho, tendo-a passado temporariamente para outra secção – máquinas pulsadeiras e lixadeiras.
39º- Nesse período, o seu posto de trabalho, na respectiva secção de escolha, passou a ser ocupado nessa data pela escolhedora I….
40º- No período em que a A. se encontrou de baixa médica, foi proposto pela R. a celebração de um acordo de revogação do contrato de trabalho, que não foi aceite por aquela.
41º- Na segunda comunicação da intenção de despedimento e a Comunicação da decisão de despedimento, além dos motivos económicos (estruturais e de mercado) invocados pela R., refere ainda que “Com a recente aquisição pela empresa das duas máquinas de escolher n.º 4 e n.º 5, pretendeu esta administração optimizar o processo de escolha final das rolhas até agora efectuado nos tapetes, deixando de ser necessária a utilização dos mesmos, já que as rolhas apenas necessitarão de uma escolha ligeira que passará a ser efectuada por duas mesas (catos) que entretanto foram colocadas à saída das máquinas, deixando também de ser necessária a alimentação dos tapetes, que inicialmente se previa automatizar.”; “Neste momento, os mesmos tapetes já estão parados, tendo sido colocada no piso onde está a linha de máquinas electrónicas duas mesas (catos) de escolha, com a afectação das escolhedoras a este posto de trabalho.”; “Pelo que não subsiste necessidade de manutenção do posto de trabalho inerente às tarefas da Req.te para com a Req.da, tendo consequentemente se decidido pela inevitabilidade da extinção do posto de trabalho correspondente à categoria que a Req.te detém.”
42º- Já antes da aquisição das referidas máquinas de escolher n.º 4 e n.º 5 existiam cinco máquinas de escolha, embora aquelas (4 e 5) sejam diferentes.
43º- Existem, pelo menos, cinco máquinas de escolha na Secção de Escolha, funcionando as novas n.º 4 e n.º 5 juntamente com as outras, pelo menos três.
44º- As rolhas não saem/caem das máquinas de escolha diretamente para as duas mesas (catos).
45º- Essas mesas (catos) são equipamentos fixos não automatizados.
46º- As rolhas que saem das máquinas eletrónicas de escolha caem para alcofas.
47º- O trabalhador que está afecto a essas máquinas electrónicas despeja as rolhas que se encontram nas alcofas para sacos.
48º- Depois de efectuada a escolha (aperfeiçoada) pelas escolhedoras alocadas às duas mesas (catos), as rolhas são postas manualmente em alcofas que se encontram imediatamente à saída dos catos.
49º- A A. encontra-se em situação de desemprego desde 31/01/2017 (data da cessação do contrato de trabalho), recebendo até à presente data o subsídio de desemprego.
50º- As cinco escolhedoras e a A. auferiam o mesmo salário de €745,91.
51º- A trabalhadora (escolhedora) N… foi admitida ao serviço da R. em 11/06/2012, posteriormente à data de admissão da A., tendo por isso menor antiguidade na R.
52º- A A. obteve em 30/07/2012 o ensino secundário - 12.º ano de escolaridade.
53º- Nenhuma das outras cinco trabalhadoras (escolhedoras) supra identificadas tem essas habilitações académicas.
54º- A A. trabalha no sector da cortiça há cerca de 30 anos, alguns dos quais como escolhedora.
55º- Trabalhou em empresa do sector da cortiça, notoriamente reconhecida nacional e internacionalmente, o Grupo O….
56º- A A. tem 46 anos de idade.
57º- A R. emprega de 10 a menos de 50 trabalhadores.
58º- A A. procedeu á entrega da totalidade da compensação, sendo que a R. efectuou o referido pagamento contra a vontade expressa da A. e oportunamente comunicada.
59º- Até à data da decisão do despedimento e do próprio despedimento, a A. tinha uma actividade profissional intensa e de que gostava o que a tornava uma pessoa preenchida e por isso mais estimulada para a vida.
60º- Em virtude do despedimento, perdeu ânimo, o orgulho, sentindo-se discriminada e ofendida, o que lhe causa permanente sofrimento pessoal e no meio social e familiar.
61º- Perdeu a única fonte de rendimento e sustento para si e para a sua família.
62º- O que lhe provoca sentimentos de desespero e preocupação.
63º- O seu agregado familiar é apenas composto por si e pelo seu filho.
64º- E o seu filho tem problemas do foro psiquiátrico, com perturbação do comportamento grave associado a importantes dificuldades de concentração e ainda com diagnósticos médicos de Perturbação do Espectro do Autismo – Síndrome de Asperger e Perturbação de Défice de Atenção e Hiperactividade.
65º- A própria A. tem problemas de saúde, tendo uma hérnia discal e sofrendo de lombalgias intensas.
66º- A A. padece de uma doença profissional já reconhecida, por tendinites, com um valor de 4%.
67º- A A. tem encargos com o mútuo bancário assumido junto da Banca para a aquisição da casa onde habita juntamente com o seu filho.
68º- A A. procedeu à devolução, juntamente com a compensação pelo despedimento, do montante imputado pela R. a título de créditos de horas por esta não ter ministrado formação profissional/contínua, no valor de 1.053,50 (mil e cinquenta e três euros e cinquenta cêntimos).
69º- A A. devolveu esse montante por lapso.
70º- A trabalhadora foi admitida ao serviço da Ré, em 1/06/2009.
71º- A tarefa de operar diretamente as máquinas eletrónicas, requer um nível elevado de formação (programação), sendo tal tarefa executada exclusivamente pela Engª G….
72º- As máquinas 4 e 5 aquando da visita inspetiva da ACT não se encontravam na Secção.
73º- A trabalhadora que está afeta às máquinas, P…, que é escolhedora, despeja depois de observada a qualidade, as rolhas em sacos que chegam a levar 12.000 rolhas.
74º- Devido ao peso e dimensão dos sacos, estes são transportados de empilhador até à zona dos catos e depois é este trabalhador que manobra o despejo dos sacos nos catos.
75º- Na altura da inspeção a trabalhadora, aqui A., recusara-se a subir escadotes, alegando não poder, conforme declaração médica que apresentou, sendo por isso que, quando era necessário subir ao escadote, o trabalho da A. era feito pela escolhedora I…, a título transitório.
76º- As escolhedoras desempenham a função de escolher, por calibres e classes, as rolhas, podendo ainda desempenhar a função de contadora/pesadora, mas a profissional com a categoria de alimentadora não pode desempenhar funções de escolhedora.
77º- Em setembro de 2016, a A. foi deslocada para outra secção que estava em fase de remodelação pois era necessária nesse período para abastecer as moegas.
78º- A alocação de equipamento adquirido em 31/08/2016 era, inicialmente, para ser alocado à secção de escolha manual, mas por decisão interna de gestão, optou-se por alocar a uma nova secção (que foi remodelada), em o que veio a originar a reformulação dos fundamentos da intenção de extinção de posto de trabalho.
79º- Uma escolhedora é uma profissional qualificada com conhecimentos adquiridos durante muitos anos de escolha visual por calibres e classes, dela dependendo a classificação em classes das rolhas.
80º- A alimentadora é uma profissional indiferenciada.”
Por sua vez, não se considerou provado o seguinte:
Com relevo para a decisão de mérito, da discussão da causa não resultou provado, designadamente que:
- a A. esteve ao serviço da Ré, desde 1 de Junho de 2006;
- os postos de trabalho destas cinco trabalhadoras e da A. são de conteúdo funcional idêntico;
- em setembro de 2016, a Ré alocou a A. a outras tarefas não inerentes à sua categoria profissional;
- era na secção de acabamentos mecânicos que se encontravam as tais máquinas que a R. havia referido adquirir em 31/08/2016 para a secção de escolha;
- aquando da primeira visita inspectiva da ACT em Setembro de 2016, na sequência do pedido de verificação dos requisitos previstos nas alíneas c) e d) do n.º 1 e no n.º 2 , do art.º 368.º do CT, as máquinas n.º 4 e n.º 5 já se encontravam nas instalações da R.;
- esse mesmo trabalhador (afeto às máquinas eletrónicas) transporta os sacos das rolhas para o local das mesas (catos);
- a escolhedora, uma daquelas cinco identificadas supra, que se encontra em pé junto às duas mesas (catos) recebe os sacos das rolhas que lhe vão chegando das máquinas de escolha e abastece/alimenta os catos, despejando-as para aí;
- e a proceder à escolha (manual) nos catos encontram-se quatro escolhedoras supra identificadas, duas por cada mesa (cato);
- o posto de trabalho correspondente à categoria de alimentadora / recebedora continua a ser necessário, sendo que as funções correspondentes a esta categoria continuam a ser exercidas por uma daquelas cinco escolhedoras supra identificadas;
- os sacos das rolhas sejam transportados manualmente;
- é a escolhedora que se encontra em pé junto aos catos, que procede ao transporte das alcofas para a máquina contadeira, abastecendo /alimentando essa mesma máquina, através de uma moega.
- seguidamente essa mesma escolhedora recepciona / recebe as rolhas saídas da máquina contadeira e transporta os sacos das rolhas para o local afecto ao armazenamento e,eventualmente, poderá ainda coser os respectivos sacos;
- o posto de trabalho correspondente à categoria de alimentadora / recebedora continua a ser necessário, sendo que as funções correspondentes a esta categoria continuam a ser exercidas por uma daquelas cinco escolhedoras supra identificadas;
- uma daquelas cinco escolhedoras identificadas exerce idênticas, senão mesmo iguais, tarefas/funções que a A. vinha exercendo e que se reconduzem às funções inerentes à categoria de alimentadora / recebedora e não de escolhedora;
- no ano de 2017, a escolha que era realizada nos tapetes (passadeiras) reiniciou o funcionamento, sendo a eles alocados algumas das cinco escolhedoras acima identificadas;
- a A. chegou, tempos antes, a operar diretamente nas máquinas eletrónicas de escolha.”
*
B) Discussão
1. Matéria de facto
1.1 Questão prévia da não admissão do recurso sobre a matéria de facto
Dispõe o n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil (CPC), que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Aí se abrangem, naturalmente, as situações em que a reapreciação da prova é suscitada por via da impugnação da decisão sobre a matéria de facto feita pelo recorrente.
Nestes casos, deve porém o recorrente observar o ónus de impugnação previsto no artigo 640.º, no qual se dispõe:
“1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2- No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”
Nas palavras de Abrantes Geraldes, “(…) a modificação da decisão da matéria de facto constitui um dever da Relação a ser exercido sempre que a reapreciação dos meios de prova (sujeitos à livre apreciação do tribunal) determine um resultado diverso daquele que foi declarado na 1.ª instância”[1]. Contudo, como também sublinha o mesmo autor, “(…) a reapreciação da matéria de facto no âmbito dos poderes conferidos pelo art. 662.º não pode confundir-se com um novo julgamento, pressupondo que o recorrente fundamente de forma concludente as razões por que discorda da decisão recorrida, aponte com precisão os elementos ou meios de prova que implicam decisão diversa da produzida e indique a resposta alternativa que pretende obter”[2].
Tendo por base os supra citados dispositivos legais, teremos de considerar que a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação, tendo que ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância – pois que só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição[3] –, muito embora não se trate de um segundo julgamento e sim de uma reponderação, não se basta com a mera alegação de que não se concorda com a decisão dada, exigindo antes da parte que pretende usar dessa faculdade, a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efetivamente, no caso, foram produzidos, sem limitar porém o segundo grau de sobre tais desconformidades, previamente apontadas pelas partes, se pronunciar, enunciando a sua própria convicção – não estando, assim, limitada por aquela primeira abordagem pois que no processo civil impera o princípio da livre apreciação da prova, artigo 607.º, nº 5 do CPC[4].
Do exposto resulta, assim, que o cumprimento do ónus de impugnação que se analisa, não se satisfazendo como se disse com a mera indicação genérica da prova que na perspetiva do recorrente justificará uma decisão diversa daquela a que chegou o tribunal recorrido, impõe que o mesmo concretize quer os pontos da matéria de facto sobre os quais recai a sua discordância quer, ainda, que especifique quais as provas produzidas que, por as ter como incorretamente apreciadas, imporiam decisão diversa, sendo que, quando esse for o meio de prova, se torna também necessário que indique “com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição”.
Discorrendo sobre a matéria, escreve-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Outubro de 2016[5] “(…) Como resulta claro do art. 640º nº 1 do CPCivil, a omissão de cumprimento dos ónus processuais aí referidos implica a rejeição da impugnação da matéria de facto. (…)”. Observa-se também no Acórdão do mesmo Tribunal de 7 de julho de 2016[6] o seguinte: “(…) para que a Relação possa apreciar a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto, tem o recorrente que satisfazer os ónus que lhe são impostos pelo artigo 640º, nº 1 do CPC, tendo assim que indicar: os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, conforme prescreve a alínea a); os concretos meios de prova que impõem decisão diversa, conforme prescrito na alínea b); e qual a decisão a proferir sobre as questões de facto que são impugnadas, conforme lhe impõe a alínea c).”[7].
Por referência ao referenciado regime, vejamos o caso que se decide.
A recorrente dirige o recurso em sede de impugnação da matéria de facto, face às conclusões que apresenta e respetivas alegações, a variados pontos da factualidade provada (1.º, 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 7.º, 8.º, 41.º) e não provada (3.º, 9.º e 13.º) pelo Tribunal recorrido.
Porém, ao longo das suas alegações e do que apresentou como sendo conclusões – que assim o considerou, pois que de modo manifesto não se traduzem em verdadeiras conclusões e sim, noutros termos, no essencial, em repetição do que referiu ao longo das alegações –, no que se refere à prova que indica para fundar a alteração que pretende essa é indicada de modo genérico, em bloco, ou seja para todo esse conjunto de factos, o que bem o demonstram as conclusões “DD” (em que indica todos os factos) e “EE” (em que, referindo que está a dar cumprimento ao disposto no artigo 640.º, n.º 1, al. b), enumera de seguida todos os depoimentos das testemunhas que diz fundarem a alteração que pretende), não concretizando pois, por referência a cada facto impugnado, quais os meios probatórios que na sua ótica, dentro dos que genericamente indicou, imporiam decisão diversa daquela que foi dada pelo Tribunal recorrido, de tal modo que este Tribunal superior, face a tais provas indicadas, procedesse à reapreciação.
Do exposto resulta, por decorrência do que se disse, que o Tribunal de recurso vê-se afinal confrontado com uma pretensão da Recorrente para que seja reapreciada genericamente a prova, em particular a que a mesma entende que serve a sua pretensão, como se de um novo julgamento se tratasse, neste caso em 2.ª instância – demonstrando-o, aliás, basta atender à conclusão “LLL”, quando refere que, “caso assim não se entenda, requer-se a esse Venerando Tribunal se digne ordenar a reapreciação de toda a prova, concluindo-se nos exatos termos peticionados pela recorrente.” Ora, não é esta a solução estabelecida na lei, pois que, como se esclareceu anteriormente, por apelo aos ensinamentos de Abrantes Geraldes, “a reapreciação da matéria de facto no âmbito dos poderes conferidos pelo art. 662.º não pode confundir-se com um novo julgamento, pressupondo que o recorrente fundamente de forma concludente as razões por que discorda da decisão recorrida, aponte com precisão os elementos ou meios de prova que implicam decisão diversa da produzida e indique a resposta alternativa que pretende obter”[8].
Daí que, voltando ao caso que nos ocupa, não possa dizer-se que a Recorrente, como se lhe impunha, tenha cumprido o ónus de impugnação aqui imposto, por não se satisfazer esse, como se referiu, com a mera indicação genérica da prova que na perspetiva do recorrente justificará uma decisão diversa daquela a que chegou o tribunal recorrido, exigindo antes, o que não ocorre no caso, que o mesmo concretize quer os pontos da matéria de facto sobre os quais recai a sua discordância quer, ainda, que especifique quais as provas produzidas que, por as ter como incorretamente apreciadas, imporiam decisão diversa, sendo que, quando esse for o meio de prova, se torna também necessário que indique “com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição”.
Deste modo, o recurso terá de ser rejeitado quanto à pretendida reapreciação da matéria de facto – esclarecendo-se que é por decorrência dessa rejeição que, não obstante a prolixidade das conclusões, o relator não formulou convite ao aperfeiçoamento das conclusões (n.º 3 do artigo 639.º do CPC).
Nos termos expostos, rejeita-se o recurso nesta parte.
1.2 Intervenção oficiosa
Dispõe o n.º 1 do artigo 662.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 87º, n.º 1 do CPT, que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Aí se abrangem, naturalmente, as situações em que a reapreciação da prova é suscitada por via da impugnação da decisão sobre a matéria de facto feita pelo recorrente, como também, do mesmo modo, aquelas em que essa intervenção de impõe oficiosamente, sendo que, como veremos seguidamente, justifica-se no caso esta intervenção.
É que, mesmo em sede de recurso, no âmbito dos poderes da Relação no que diz respeito à apreciação da matéria de facto – acentuados com a Reforma de 2013 do CPC (artigo 662.º) –, não obstante a revogação com a mesma reforma do anterior artigo 646.º (em que se previa que no julgamento da matéria de facto ter-se-ão por não escritas as respostas do tribunal sobre questões de direito, solução que como é entendimento doutrinário e jurisprudencial se aplica, por analogia, às respostas que constituam conclusões de facto, designadamente quando as mesmas têm a virtualidade de, por si só, resolverem questões de direito a que se dirigem[9]), deve continuar a entender-se, como se refere entre outros no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de setembro de 2014[10], que, constituindo a possibilidade de eliminação de factos conclusivos equiparados a questões de direito uma prerrogativa dos tribunais superiores de longa tradição doutrinal e jurisprudencial, esta pode/deve ser exercida mesmo que não esteja prevista expressamente na lei processual[11].
O que se referiu é diretamente aplicável, dentro do que o Tribunal a quo considerou como integrando a factualidade provada, aos pontos seguintes:
- 8.º, parte final, assim quando se escreveu – o que se traduz em juízo valorativo/conclusão a retirar dos factos, sendo que só estes são objeto de alegação e prova, com a particularidade de estar relacionada com a questão de direito que se decide – “não subsistindo necessidade de manter o posto de trabalho inerente às tarefas da A. para com a R., não possuindo esta outro posto de trabalho compatível ou similar com a categoria da A.” Deste modo, o referido ponto passa a comportar a redação seguinte: “8º- Neste momento, os mesmos tapetes estão já parados, tendo sido colocadas duas mesas (catos) de escolha, com a afetação das escolhedoras a este posto de trabalho.”
- 30.º, 31.º, 76.º, 79.º e 80.º, na sua totalidade, por se reportarem apenas ao que possa ou não resultar do CCT, assim sobre definição e conteúdo de categorias profissionais, respetivas funções e valores salariais naquela previstos, sendo assim o seu lugar próprio não a fixação da base factual e sim, noutros termos, o da aplicação do direito, em particular o que resulte desse CCT, a aplicar aos factos provados. Eliminam-se pois, em conformidade, estes pontos.
- 51.º, na parte em que se refere “tendo por isso menor antiguidade na R”, por se tratar de conclusão que envolve ainda juízo de direito, assim o saber-se como se conta a antiguidade, como ainda a expressão “posteriormente à data de admissão da A.”, por se traduzir, também, em conclusão, a retirar nomeadamente por referência ao ponto 70.º provado. Passa o referido ponto, assim, a ter a redação seguinte: “51º- A trabalhadora (escolhedora) N… foi admitida ao serviço da R. em 11/06/2012.”

1.3 Nos termos e pelos fundamentos antes afirmados, a base factual a atender para dizermos do direito é aquela que foi fixada pelo Tribunal a quo, com as alterações nesta sede introduzidas.
*
2. Dizendo de direito
Pugna a Autora, fundamentando essa sua pretensão, pela revogação da sentença recorrida, por entender que não se verificam os pressupostos legais do despedimento por extinção do seu posto de trabalho, violando aquela, ao ter afirmado essa verificação, os artigos 18.º e 53.º da CRP, o artigo 342.º do CC e os artigos 367 e 359.º, n.º 2, alíneas a), b) e c) e o artigo 368.º, n.ºs 1 e 4, do CT, daí decorrendo, diz, que aquela decisão deve ser substituída por outra que declare a ilicitude do despedimento, operada pela RÉ/recorrida, com a sua consequente reintegração e as demais consequências legais e, bem assim, declare a procedência total do pedido reconvencional, condenando a recorrida nos termos peticionados.
Em sentido contrário se pronuncia a Apelada, defendendo o acerto do julgado em 1.ª instância.
Vejamos, dizendo de direito, tendo por base a factualidade provada, de que lado está a razão.
2.1 Dos pressupostos do despedimento:
A recorrente ao sindicar a sentença proferida avança, no essencial, dois argumentos:
- Um primeiro, no sentido de que o posto de trabalho que ocupava continua a existir, de facto e de direito – com a introdução de novas máquinas eletrónicas de escolha que se juntaram às outras cinco existentes na secção, as tarefas de alimentar e receber rolhas até aumentaram, em número de operações, quantidade e volume –, mas ocupado agora por outro trabalhador que não integrava a secção de escolha e que detém a categoria normativa e contratual de manobrador (sendo que as tarefas que este exerce na secção de escolha reconduzem-se às funções integradoras da categoria de alimentador e recebedor, de acordo com o CCT aplicável, subsistindo ainda na secção em causa a necessidade de um alimentador- recebedor), continuando assim a secção de escolha a ser composta por seis elementos, as mesmas cinco escolhedoras que continuam a fazer escolha exclusivamente manual (antes nos tapetes e agora nas mesas/catos) e o referido manobrador, alocado/afeto posteriormente a esta secção depois da cessação do contrato da recorrente – não conferindo, diz, os factos (objetivamente considerados) invocados como fundamento para a extinção do posto de trabalho racionalidade, proporcionalidade e adequação à decisão de extinguir o posto de trabalho de alimentadora-recebedora (e não só de alimentadora como é referido quer na comunicação da intenção, quer na fundamentação de direito) como não se mostra verificado o nexo de causalidade entre tais motivos e a decisão de extinção do posto de trabalho da Recorrente, a quem não foi dada sequer formação profissional face à nova realidade, razão pela qual conclui que mal andou o Tribunal, ao concluir estarem verificados os motivos invocados pela Recorrida para efeitos de extinção do seu posto de trabalho, à luz do estabelecido nas disposições conjugadas dos artigos 367.º e 359.º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do CT – ao considerar verificar-se o nexo de causalidade entre tais motivos e a decisão de extinção do posto de trabalho; depois, num segundo plano, um segundo argumento;
- Num segundo plano, pressupondo também o despedimento por extinção pressupõe a verificação dos requisitos cumulativos mencionados no art.º 368.º, n.º 1, do CT, refere que esses se não verificam, mais concretamente o previsto na alínea b), pois que a impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho não decorreu de qualquer factualidade que revele que, extinto o posto de trabalho de alimentador-recebedor, inexistisse outro compatível com a categoria profissional que detinha, sendo que essa impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho foi alegada pela Recorrida, não logrando esta, apesar de lhe competir o ónus (artigo 342.º do Código Civil), fazer prova dessa circunstância, não se vislumbrando qual o raciocínio usado pelo Tribunal para chegar a tal conclusão.
Do exposto conclui a Apelante (conclusões III. E KKK.), por não se encontrarem na sua ótica preenchidos os requisitos legais previstos nos artigos 367.º e 359.º, n.º 2, alíneas a), b) e c), e 368º, n.º 1, alínea b), do CT -, serem aplicáveis no caso os normativos legais referentes à ilicitude do despedimento, nomeadamente as normas previstas nos artigos 381.º, n.º 1, alínea b), e 384.º, alíneas a) e b), devendo a decisão recorrida – que refere ter violado os artigos 18.º e 53.º da CRP, 342.º do CC e 367 e 359.º, n.º 2, alíneas a), b) e c), e 368.º, n.ºs 1 e 4, do CT – ser por essa razão revogada, sendo substituída por outra que declare a ilicitude do despedimento operada pela Recorrida, com a sua consequente reintegração e demais consequências legais e, bem assim, declare a procedência total do pedido reconvencional, condenando a recorrida nos termos peticionados.
Em sentido diverso se pronuncia a Ré/apelada, sustentando, como se disse, o acerto e adequação da decisão recorrida, no que é acompanhada pelo Exmo. Procurador-Geral Adjunto, no parecer que emitiu.
Cumpre pois apreciar:
2.1.1 Enquadramento teórico:
Assumindo-se o despedimento como uma declaração de vontade do empregador dirigida ao trabalhador que se destina a fazer cessar o contrato de trabalho para o futuro[12], deve ser exteriorizada de tal modo que não suscite dúvidas relevantes ao seu destinatário, o trabalhador, sobre o seu exato significado, sendo que, estando o princípio constitucional da segurança no emprego – estabelecido no art.º 53.º da Constituição da República Portuguesa (CRP)[13] – integrado na categoria dos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, está sujeito ao regime que decorre do artigo 18.º da Constituição, do que decorre que devem ser reduzidas à regra do mínimo as restrições ao conteúdo daquele princípio. E, sendo patente que uma das restrições a tal princípio é precisamente, no que ao caso importa, a do despedimento por causas objetivas – nas quais, enquanto tal, o despedimento, não sendo imputável a culpa (do trabalhador ou do empregador), decorre de uma situação que inviabiliza a manutenção da relação laboral, uma impossibilidade prática da subsistência do contrato –, não é menos certo que, embora a lei admita assim tal fundamento para o despedimentos (fundado pois em causas objetivas), o legislador sentiu a necessidade de impor, precisamente por força do mencionado princípio constitucional da segurança no emprego, alguma rigidez no procedimento para essa forma de cessação da relação laboral e sobre os requisitos substanciais da sua fundamentação[14], o que se aplica, assim, ao caso, pois que a cessação do contrato de trabalho da Autora/recorrente se insere afinal no conceito da aludida justa causa objectiva de despedimento.
Daí que, na lei ordinária, quanto à explicitação dos motivos para fundarem um despedimento por extinção do posto de trabalho, sem esquecermos a noção dada pelo artigo 359.º, n.º 2, do CT (por remissão do artigo 367.º, n.º 2) sobre cada um desses motivos – assim, que se consideram, nomeadamente: “a) Motivos de mercado - redução da actividade da empresa provocada pela diminuição previsível da procura de bens ou serviços ou impossibilidade superveniente, prática ou legal, de colocar esses bens ou serviços no mercado; b) Motivos estruturais - desequilíbrio económico-financeiro, mudança de actividade, reestruturação da organização produtiva ou substituição de produtos dominantes; c) Motivos tecnológicos - alterações nas técnicas ou processos de fabrico, automatização de instrumentos de produção, de controlo ou de movimentação de cargas, bem como informatização de serviços ou automatização de meios de comunicação.” –, se estabeleça também, nos termos do n.º 1 do artigo 368º, que o despedimento com esse fundamento só pode ter lugar desde que (cumulativamente) se verifiquem os seguintes requisitos: “a) Os motivos indicados não sejam devidos a conduta culposa do empregador ou do trabalhador; b) Seja praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho; c) Não existam, na empresa, contratos de trabalho a termo para tarefas correspondentes às do posto de trabalho extinto; d) Não seja aplicável o despedimento colectivo.”. Como importa também atender, face ao n.º 2 do mesmo dispositivo legal, que “(h)avendo na secção ou estrutura equivalente uma pluralidade de postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico, para determinação do posto de trabalho a extinguir, a decisão do empregador deve observar, por referência aos respetivos titulares, a seguinte ordem de critérios relevantes e não discriminatórios: a) Pior avaliação de desempenho, com parâmetros previamente conhecidos pelo trabalhador; b) Menores habilitações académicas e profissionais; c) Maior onerosidade pela manutenção do vínculo laboral do trabalhador para a empresa; d) Menor experiência na função; e) Menor antiguidade na empresa.” Por último, para além do mais que no caso não impõe expressa referência, como decorre do seu n.º 4, que “(p)ara efeito da alínea b) do n.º 1, uma vez extinto o posto de trabalho, considera-se que a subsistência da relação de trabalho é praticamente impossível quando o empregador não disponha de outro compatível com a categoria profissional do trabalhador.” Está ainda o despedimento por extinção do posto de trabalho sujeito ao procedimento regulado nos artigos 369.º a 371.º do CT, em que se insere, desde logo, a necessidade de cumprimento do n.º 1 do artigo 369.º – “No caso de despedimento por extinção de posto de trabalho, o empregador comunica, por escrito, à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão intersindical ou comissão sindical, ao trabalhador envolvido e ainda, caso este seja representante sindical, à associação sindical respectiva: a) A necessidade de extinguir o posto de trabalho, indicando os motivos justificativos e a secção ou unidade equivalente a que respeita; b) A necessidade de despedir o trabalhador afecto ao posto de trabalho a extinguir e a sua categoria profissional. c) Os critérios para seleção dos trabalhadores a despedir.” –, para efeitos do disposto do seu artigo 370.º[15].
Agora sobre o juízo de (i)licitude do despedimento, constando do artigo 381.º a menção às causas gerais (aplicáveis pois a todas as causas) geradoras da ilicitude do despedimento – “a) Se for devido a motivos políticos, ideológicos, étnicos ou religiosos, ainda que com invocação de motivo diverso; b) Se o motivo justificativo do despedimento for declarado improcedente; c) Se não for precedido do respetivo procedimento; d) Em caso de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante ou de trabalhador durante o gozo de licença parental inicial, em qualquer das suas modalidades, se não for solicitado o parecer prévio da entidade competente na área da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres” –, prevê ainda expressamente o artigo 384.º que o despedimento por extinção de posto de trabalho é ainda ilícito sempre que o empregador: “a) Não cumprir os requisitos do n.º 1 do artigo 368.º; b) Não respeitar os critérios de concretização de postos de trabalho a extinguir referidos no n.º 2 do artigo 368.º; c) Não tiver feito as comunicações previstas no artigo 369.º; d) Não tiver colocado à disposição do trabalhador despedido, até ao termo do prazo de aviso prévio, a compensação a que se refere o artigo 366.º por remissão do artigo 372.º e os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho”.
Face ao aludido regime, importa pois analisar, em concreto, os factos que, no caso, foram efetivamente invocados para fundamentar o despedimento da Autora, assim as exigidas causas objetivas que esse pressupõe, pois que só esses factos podem ser atendidos no juízo a formular sobre a sustentação do motivo de extinção do concreto posto de trabalho daquela, não pois já quaisquer outros motivos, os quais, ainda que porventura existam, não podem ser tidos em conta para fundamentar este concreto despedimento, por não constituírem quanto ao mesmo, ou seja o contrato de trabalho atingido, “justa causa” objetiva da sua extinção, sob pena de assim de violar – ao não existir necessidade “de correspondência estrita entre os motivos invocados para a cessação do contrato de trabalho por justa causa objetiva e o contrato de trabalho abrangido” – “frontalmente o princípio constitucional da segurança no emprego, por permitir despedimentos arbitrários”[16].
Impendendo assim sobre o tribunal o dever de proceder ao controlo da veracidade dos motivos invocados em concreto pelo empregador para o despedimento e ainda de verificar se existe ou não afinal nexo de causalidade entre esses motivos e o despedimento, de tal modo que possa assim concluir, com base em juízos de razoabilidade, se esses motivos eram ou não adequados a justificar o despedimento, daí não resulta, porém, como aliás se dá nota na decisão recorrida, que nessa verificação se incluam as decisões técnico - económicas ou gestionárias que estejam a montante da extinção do posto de trabalho, por estarem aquelas a coberto da liberdade de iniciativa que assiste ao empregador[17]. Dito de outro modo, não compete ao julgador (Tribunal), substituindo-se à entidade empregadora, envergando as vestes de gestor, impor àquela a decisão que, na sua perspetiva (seguindo os seus critérios pessoais), deveria ter sido tomada em termos empresariais, existindo antes, diversamente, sem prejuízo de se impor concluir de acordo com um juízo de equidade pela verificação de uma motivação clara e portanto sustentável – ainda, salvaguardando casos de gestão absolutamente inadmissível/grosseiramente errónea, por forma a evitar despedimentos patentemente arbitrários ou fundados em motivos manifestamente falsos ou inconsistentes –, tal como é salientado pela doutrina e jurisprudência, uma ampla margem de decisão, consentida ao empregador, que assume afinal os riscos, suportando também os encargos, da sua empresa[18]. Como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 19 de Novembro de 2015[19], com base nos ensinamentos de Monteiro Fernandes, a apreciação da justa causa incidirá “no nexo sequencial estabelecido entre a extinção do posto de trabalho e a decisão de extinguir o contrato, tendo de permeio o insucesso de diligências tendentes à recolocação do trabalhador”, sendo “em relação a esse nexo e a cada um dos seus elementos que deve fazer-se a verificação dos requisitos fundamentais do artigo 368º/1, em especial a da impossibilidade prática da subsistência da relação de trabalho”. Ou seja, em suma, como se afirma mais à frente no mesmo Aresto, “não deve o julgador, na apreciação dos factos, desrespeitar os critérios de gestão da empresa (na medida em que sejam razoáveis e consequentes), não lhe competindo substituir-se ao empregador e vir a concluir pela improcedência do despedimento, por entender que deveriam ter sido outras as medidas a tomar perante os motivos económicos invocados”, o que não invalida, como se adiante mais à frente, o dever “que incumbe ao tribunal relativamente quer ao controlo da veracidade dos motivos invocados para o despedimento, quer à verificação quanto à existência de nexo de causalidade entre os motivos invocados pelo empregador e o despedimento, de modo a que se possa concluir, segundo juízos de razoabilidade, que tais motivos são adequados a justificar a decisão de redução de pessoal.”
Importa por fim dar nota, como aliás o tem afirmado mais uma vez a jurisprudência[20], de que incumbe nestes casos ao trabalhador alegar e provar a relação laboral e o despedimento, recaindo por sua vez sobre a entidade empregadora o ónus de alegar e provar os factos justificativos desse despedimento que se consideram suscetíveis de determinar a impossibilidade da subsistência da relação de trabalho, sendo que, como nestas situações a ilicitude do despedimento é necessariamente declarada por tribunal judicial em ação intentada pelo trabalhador, nessa ação, volta a repetir-se, “o empregador apenas pode invocar factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador” (artigo 387.º n.º s 1 e 3, do CT). “Daí que, para efeito de apreciação dos fundamentos da alegada extinção do posto de trabalho, “o Tribunal esteja adstrito aos factos que foram invocados pelo empregador no procedimento como motivadores da extinção de posto de trabalho”, importando não esquecer, a propósito dos critérios estabelecidos no n.º 2 do artigo 368.º do CT[21], como resulta claramente do preceito, que os critérios de seleção são sucessivos e hierarquizados, existindo “uma ordem legal de precedência para o despedimento” ([22]), isto é, só é aplicável o critério seguinte se o anterior não se verificar ou se os trabalhadores visados reunirem os mesmos requisitos relativamente a essa regra.” [23]
2.1.1 O direito do caso
Sem esquecermos o enquadramento teórico que em súmula antes se referiu, voltando ao caso que se decide, constata-se que na decisão recorrida, na concretização do controlo jurisdicional que se impõe fazer, se fez constar o seguinte (citação):
“No caso dos autos, face à matéria factual apurada, impõe-se concluir que os motivos de mercado, estruturais e mesmo tecnológicos que motivaram a decisão de despedir se têm por verificados: de facto, a Ré adquiriu duas novas máquinas eletrónicas de escolha, para se atualizar às novas técnicas de produção e aumentar a sua produtividade, tornando-se por esta forma mais competitiva, otimizando o processo de escolha final das rolhas (até então efetuado nos tapetes), deixando de ser necessária a utilização dos mesmos, já que as rolhas apenas necessitam agora de uma escolha ligeira, que passou a ser efetuada em duas mesas (catos), razão pela qual deixou de ser necessária a alimentação desses tapetes. (As funções da A. reconduziam-se no seu núcleo essencial a abastecer a tremonha/moega principal dessa máquina de tapetes (de forma contínua) e controlar através de automatismo o enchimento dessas moegas).
Alega, contudo, a A. que o posto de trabalho não foi de facto extinto, pois o posto de trabalho correspondente à categoria de alimentadora continua a ser necessário e a existir, continuando tais funções a ser exercidas por uma das cinco escolhedoras.
Em primeiro lugar, refira-se que, ao contrário do que parece sustentar a A., afigura-se- nos que a validade da extinção do posto de trabalho, não implica necessariamente uma total cessação das funções antes desempenhadas pelo trabalhador.
De facto, como resulta da matéria de facto apurada, as mesas/catos onde agora é feita a escolha manual, continuam a ter necessidade de ser abastecidos de rolhas e os sacos, uma vez cheios, continuam a ter de ser transportados para a contadeira (tarefa que também competia à A. executar), mas a forma como tal abastecimento das mesas é feito é bem diferente da forma como a A. tinha de abastecer/alimentar as moegas das máquinas quando funcionavam os tapetes e neles era feita a escolha. De facto, agora, o condutor do empilhador despeja as rolhas (vindas das máquinas eletrónicas de escolha) em cima dos catos/mesas (não sendo necessário controlar permanentemente as rolhas existentes na moega/tremonha das máquinas, como antes sucedia), onde são escolhidas manualmente pelas cinco escolhedoras, que as despejam de novo para um saco, que leva grandes quantidades de rolhas, que é depois transportado para contadeira por aquele condutor do empilhador e com ajuda deste. O processo de escolha manual mudou de forma significativa, e não se justifica a permanência de um funcionário apenas para alimentar os catos (neles despejando as rolhas), pois que não tem de constantemente alimentar e controlar a quantidade de rolhas que aí são despejadas (como antes, com os tapetes, sucedia), e transportar os sacos quando cheios, tarefas agora assumidas pelo condutor do empilhador.
Afigura-se-nos que, no enquadramento factual apurado, pode concluir-se que a Ré deixou de carecer no seu quadro de pessoal de qualquer trabalhador para desenvolver a atividade de alimentador de máquinas, deixando de existir tal posto de trabalho na estrutura organizativa da Ré, tendo-se por certo que o núcleo essencial das funções da A., alimentar a moega das máquinas, foram afetadas com a execução da comprovada decisão de adquirir duas novas máquinas eletrónicas de escolha e com a consequente desativação dos tapetes onde antes eram escolhidas as rolhas.
Considero, pois, que se verificam os motivos invocados pela Ré para efeitos de extinção do posto de trabalho da A., à luz do estabelecido nas disposições conjugadas dos artigos 367º e 359º, nº2, alíneas a), b) e c) do CT, tendo ficado provados os factos invocados como fundamento para a extinção do posto de trabalho e por tais factos conferirem racionalidade à decisão de extinguir o posto de trabalho de alimentadora, pelo que, não só os motivos invocados são verdadeiros, como se mostra verificado o nexo de causalidade entre tais motivos e a decisão de extinção do posto de trabalho da A.
Acresce que, conforme se apurou, mostram-se igualmente verificados os requisitos cumulativos previstos nas diversas alíneas do nº1 do artigo 368º do CT, porquanto se demonstrou que, os motivos invocados não são devidos a conduta culposa do empregador ou da trabalhadora; à data da decisão de despedimento não se verifica a existência de contratos a termo para as tarefas correspondentes às do posto de trabalho da trabalhadora A. e que na estrutura organizativa da Ré, não existia nem existe qualquer outro posto de trabalho com conteúdo funcional igual ou equivalente à de alimentadora, que era exercido pela A., tornando também por este prisma a subsistência da relação de trabalho praticamente impossível. Além disso, também não se provou que a Ré tivesse vagas noutros postos de trabalho, designadamente no de empilhador (que passou a fazer, ainda que de forma diferente, nos moldes já explicitados, algumas das funções exercidas pela A.), posto que se apurou estarem já ocupados por outros dois funcionários da Ré. Também se apurou não ser aplicável o regime do despedimento coletivo.
Além disso, resulta igualmente da matéria de facto apurada, que a Ré colocou à disposição da A., até ao termo do prazo de aviso prévio, a compensação a que se refere o artigo 366º por remissão do artigo 372º e os créditos vencidos ou exigíveis com a cessação do contrato de trabalho, como exige o artigo 368º, nº5, do CT.
Conclui-se, pois, que não se verifica qualquer conduta da entidade patronal R. que possa ser considerada imprudente, arbitrária ou irrazoável, sendo patente que o despedimento da A. foi consequência lógica da alteração do processo de escolha manual de rolhas, com a consequente extinção do posto de trabalho de alimentadora.
Sustenta ainda a A. que o despimento foi ilícito, porque não foi observado, como deveria, o disposto no nº2 do artigo 368º do CT e os critérios de escolha nele previstos.
Da leitura de tal preceito legal, que já supra transcrevemos, resulta que o mesmo não se refere a funções iguais, nem a categorias profissionais iguais ou idênticas, mas sim à existência de uma pluralidade de “postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico”, o que logo pressupõe funções diferentes e distintas, mas com uma identidade de conteúdo funcional. – cfr. neste sentido Ac. TRL de 03.09.2005, in www.dgsi.pt, a propósito do anterior artigo 27º, nº2 da LCCT, mas com pertinência atual, posto que a redação deste segmento do preceito se mantém inalterada, que cita o Ac. STJ de 26.05.1999, onde a noção de conteúdo funcional idêntico para efeitos do critério de prioridade na extinção do posto de trabalho foi desenvolvida.
No caso, face à matéria apurada, verifica-se que as funções especificadamente atribuídas à A. (enquanto alimentadora das máquinas de escolha) se inserem na mesma linha funcional (de escolha manual) a que pertence tanto a A. como as cinco escolhedoras; mas o posto de trabalho da alimentadora não tem conteúdo funcional idêntico ao das escolhedoras. As tarefas que a alimentadora, por um lado, e as escolhedoras, por outro lado, desempenhavam no âmbito das suas funções, não eram tarefas comuns e indistintas, pelo contrário, cada um dos postos de trabalho em causa tinha especificidades e impunha específicos desempenhos que não tinham qualquer identidade funcional: uma alimentava as máquinas com rolhas, as outras escolhiam as rolhas de acordo com a sua qualidade/classe. As demais trabalhadoras/escolhedoras integradas na secção de escolha manual, ocupavam postos de trabalho de conteúdo funcional diferente daquele que era ocupado pela A.
Concluindo-se no sentido de que não se tratavam de postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico, como se conclui, a entidade patronal não tinha que respeitar e fazer cumprir os critérios de seleção do posto de trabalho a extinguir previstos nas diversas alíneas do nº2 do citado artigo 368º do CT.
Improcedendo os argumentos invocados pela A., conclui-se pela existência de justa causa objetiva de despedimento e pela licitude do seu despedimento por extinção de posto de trabalho.”
Por referência à citada fundamentação, tento por base os elementos do caso, bem como os critérios que anteriormente enunciámos, não acompanhamos, adiante-se desde já, salvo o devido respeito, o sentido decisório da decisão recorrida.
E não a acompanhamos por não termos desde logo por demonstrado sequer, face ao que se provou, que o posto de trabalho da Autora tenha deixado de justificar-se, sendo que, para tanto, bastará ter presente que, sendo a primeira comunicação de intenção de despedimento por extinção do posto de trabalho de 8/9/2016, resultou também provado que, tendo nesse mesmo mês a Ré retirado a Autora do seu posto de trabalho, tendo-a passado temporariamente para outra secção – máquinas pulsadeiras e lixadeiras – (facto 38.º provado), a verdade é que o seu posto de trabalho, durante esse período, na respetiva secção de escolha, passou a ser ocupado nessa data pela escolhedora I… (facto 39.º provado). Ou seja, não podendo deixar de ter-se também presente a proximidade da segunda comunicação de intenção de despedimento, em que em boa verdade acabam por ser invocados no essencial razões próximas – veja-se que a questão da aquisição das novas máquinas é mencionada em ambas as comunicações (factos 4.º e 41.º provados) –, não resulta sequer da factualidade provada que a situação anteriormente referida, assim a mencionada substituição da Autora por outra trabalhadora no posto de trabalho daquela, tenha deixado de verificar-se. Daí que se imponha perguntar da razão da necessidade de colocação de outra trabalhadora no posto de trabalho da Autora quando a Ré a passou temporariamente para outra secção – veja-se que, como resulta do n.º 3 do artigo 368.º do CT, caso o posto de trabalho a extinguir fosse porventura aquele para que foi transferida a Autora, noutra secção, assim máquinas pulsadeiras e lixadeiras, o trabalhador teria direito a ser reafectado ao posto de trabalho anterior caso ainda existisse[24].
Mas mais, acrescente-se, o que assume aqui, também, importância decisiva.
É que, ainda que porventura se pudessem ter por cumpridos pela Ré os critérios legais na extinção do posto de trabalho da Autora – ou seja, que estivesse demonstrada a veracidade dos motivos por ela invocados e, ainda, a justificação para a extinção por desnecessidade do concreto posto de trabalho da Autora, assumindo-se assim o despedimento da Autora/recorrente, nos termos antes referidos, como uma decisão gestionária coberta pela liberdade de iniciativa da Ré/recorrida –, sempre se imporia, ainda, como é reconhecidamente afirmado e resulta da alínea b) do n.º 1 do artigo 368º, um outro requisito, também esse necessário para o despedimento por extinção do posto de trabalho, assente na demonstração da impossibilidade da subsistência da relação do trabalho.
Dito de outro modo, importaria saber se a Ré possuía ou não um outro posto de trabalho com conteúdo funcional compatível.
Para Pedro Furtado Martins[25] a questão passa aqui por saber se o empregador dispõe ou não de um posto de trabalho cujo conteúdo funcional seja compatível quer com a categoria objetiva ou o género de atividade contratada, quer com a categoria normativa ou estatutária do trabalhador, esta entendida como a que corresponde à designação formal dada pela lei ou pelos instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho a um determinado conjunto de tarefas, com vista à aplicação do regime laboral previsto para essa situação. Esclarece ainda Maria do Rosário Palma Ramalho[26] que a referência à categoria deve ser entendida “como reportada à categoria interna e não à categoria funcional do trabalhador”, sendo assim de concluir que “o empregador tem o dever de oferecer ao trabalhador, cujo posto de trabalho é extinto, um outro posto de trabalho da mesma categoria se o tiver, mas não lhe é exigível criar um novo posto de trabalho para ocupar o trabalhador”.
Como se esclarece no recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de abril de 2017[27], a jurisprudência desse Tribunal “tem sido no sentido dessa categoria ser a interna, a normativa”, fazendo ainda apelo ao que consta do Acórdão de 29 de outubro de 2013, quando refere que “[a] extinção do posto de trabalho obedece à verificação cumulativa dos requisitos elencados no art.º 403.º, n.º 1, CT, nomeadamente a circunstância de ser praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho [alínea b)], dispondo o seu n.º 3 que a subsistência da relação de trabalho se torna praticamente impossível desde que, extinto o posto de trabalho, o empregador não disponha de outro que seja compatível com a categoria do trabalhador (categoria interna, normativa, e não em sentido funcional)”, estando a avaliação da impossibilidade de subsistência da relação de trabalho, por não dispor o empregador de empregador de posto de trabalho compatível com a categoria do trabalhador, “circunscrita à estrutura empresarial do empregador, ainda que esteja este inserido num grupo de empresas, a menos que se justifique o levantamento da personalidade colectiva por a mesma ter sido usada de modo ilícito ou abusivo para prejudicar terceiros”. Daí que se afirme no mesmo Aresto que “o cumprimento dos critérios legais na extinção de determinado posto de trabalho, por si só, não é suficiente para garantir a licitude do despedimento, pois é necessário, também, determinar a impossibilidade da manutenção do vínculo laboral através do cumprimento de dever que impede sobre o empregador de demonstrar a inexistência de outro posto de trabalho compatível com a categoria profissional do trabalhador” – trata-se de requisito do despedimento com este fundamento, “de acordo com o artigo 368º, n.º 1, alínea b), ser praticamente impossível a subsistência da relação laboral, cuja prova compete à empregadora” –, conceito esse “objetivado no n.º 4, do mesmo preceito, ao estabelecer que, extinto o posto de trabalho, considera-se que a subsistência da relação de trabalho é praticamente impossível quando o empregador não disponha de outro compatível com a categoria profissional do trabalhador”.
Ora, sendo como se disse a categoria a que se refere o artigo 368º, n.º 2, alínea b), do CT, a interna, contratada e normativa, e não a funcional, competia à Ré/empregadora provar, o que não logrou alcançar – a menção constante da factualidade provada enquanto conclusiva foi daquela expurgada, nos termos anteriormente decididos –, que não dispunha de outro lugar compatível com a categoria de alimentador / recebedor (cortiça), de acordo com a definição que desse é dada no CCT aplicável (publicado no BTE, 1.ª série, n.º 34, de 15 de Setembro de 2016, Anexo II, assim: “Alimentador ou recebedor (cortiça) - É o profissional que recebe e alimenta determinadas máquinas não especificadas neste grupo.” De facto, não demonstrou a Ré/entidade patronal que não dispunha, em toda a sua estrutura organizativa, de outro posto de trabalho compatível com a categoria profissional da Autora, ou que todos os postos de trabalho destinados a trabalhadores com aquela mesma categoria de alimentador ou recebedor estavam ocupados/preenchidos – veja-se que o ponto 77.º provado, referente à deslocação da Autora para outra secção que estava em fase de remodelação, dizendo-se apenas “pois era necessária nesse período para abastecer as moegas”, não permite esclarecer a razão porque assim foi e, nomeadamente, a razão porque porventura teria deixado de ser necessária a Autora –, como era seu ónus, o que determina, nos termos do artigo 384.º, alínea a), do CT, a ilicitude do despedimento que operou [28].
Nos termos expostos, procede o recurso quanto a esta questão, do que decorre a revogação da sentença na parte em que considerou lícito o despedimento da Autora/recorrente e, em conformidade, a necessidade de conhecimento, por esta Relação, do pedido reconvencional pela mesma deduzido – conhecimento que ficou prejudicado na sentença recorrida.
2.1.2 Das consequências da ilicitude do despedimento
Nos termos do disposto no artigo 389.º, do CT/2009:
“1 - Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado:
a) A indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais;
b) Na reintegração do trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, salvo nos casos previstos nos artigos 391.º e 392.º.”
Mais se dispõe no n.º 1 do artigo 390.º, do mesmo Código:
“1 - Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento.
2 - Às retribuições referidas no número anterior deduzem-se:
a) As importâncias que o trabalhador aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento;
b) A retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento;
c) O subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período referido no n.º 1, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social.”
Deste modo, assiste o direito à Autora/recorrente a ser reintegrada, como ainda a receber a retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento, como peticiona, sendo que, porque não contêm os autos os necessários elementos – desconhece-se o valor que recebeu de subsídio de desemprego –, é relegado para a fase de liquidação o apuramento montante devido, considerando ainda os juros de mora vencidos – quanto à quantia de €1.053,50, relativo ao crédito de horas vencidos pela não prestação de formação profissional/contínua, esse seguimento decisório da reconvenção não foi objeto do presente recurso.
2.1.2.1 Da indemnização por danos não patrimoniais
Pede também a Autora, em reconvenção, a condenação da Ré a pagar a quantia de €5.000,00 (cinco mil euros), a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos, acrescidos de juros de mora à taxa legal.
Apreciando, importa ter presente que, tendo a obrigação de indemnizar como resulta do disposto no artigo 483.º do Código Civil (CC) como pressupostos fundamentais a verificação de um facto ilícito e culposo do qual em termos de nexo de causalidade decorreram danos, o artigo 496.º do mesmo Código estabelece, por sua vez, que na fixação da indemnização se deve atender aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
No caso, estando já evidenciada nos termos decididos a ilicitude do facto e a culpa, importa então verificar, em respeito pela norma conformadora, se ocorreram danos decorrentes desse facto e, se for esse o caso, como o exige o artigo 496.º, se os mesmos são indemnizáveis.
Ora, a gravidade do dano, pressuposta pela citada norma, como a doutrina e a jurisprudência têm afirmado, deve medir-se, embora tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, por um padrão objetivo e não em função de fatores subjetivos, donde que os vulgares incómodos, contrariedades, transtornos ou indisposições, por não atingirem um grau suficientemente elevado, não confiram direito a indemnização. Por outras palavras, não basta a mera verificação de um qualquer dano não patrimonial para que se tenha por justificada a indemnização, impondo-se, noutros termos, que esse revista gravidade, sendo que “a gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada). Por outro lado, a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado”[29].
No caso, apreciando-se a gravidade do dano em função da tutela do direito e sem esquecermos que “o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado”[30], Deparamo-nos com uma atuação por parte da Ré que colocou fim a uma relação laboral que perdurava há alguns anos, levando a que a Autora, como se provou, perdesse o seu ânimo, o seu orgulho, sentindo-se discriminada e ofendida, o que lhe causa permanente sofrimento pessoal e no meio social e familiar, sendo que, o facto de ter perdido a única fonte de rendimento e sustento para si e para a sua família, lhe provoca sentimentos de desespero e preocupação (factos 60.º a 63.º, provados).
Por referência a tal factualidade, entendemos que ocorre fundamento bastante para afirmar que os danos provados, indesmentivelmente decorrentes da atuação da Ré em termos de causalidade adequada como decorre do artigo 563.º do CC – em que se estabelece que “a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão” –, atingem o patamar de gravidade exigido, como se referiu já, para que mereçam a tutela do direito em termos indemnizatórios por danos de natureza não patrimonial.
Estamos pois perante danos que merecem a tutela do direito, pela gravidade que assumem, não podendo pois, como tal, deixar de ser indemnizáveis por força do preceituado nos artigos 483.º e 496.º do CC.
Reiterando o há muito afirmado pela doutrina e jurisprudência a propósito da insusceptibilidade de os danos não patrimoniais poderem ser avaliados pecuniariamente, não visando assim a indemnização reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o facto danoso e sim, diversamente, compensar de alguma forma o lesado e também sancionar a conduta do lesante, é o recurso à equidade que permite, nos termos do n.º 3 do artigo 496.º do CC, fixar o quantum indemnizatório a arbitrar à Autora, de acordo com os critérios aí definidos.
Reportando-nos ao caso, tudo ponderado, julga-se adequado, porque equitativo, por referência à data em que é proferida esta decisão, fixar a indemnização devida pela Ré em €3.000,00, improcedendo o pedido no mais.
Pelo exposto, vingando as correspondentes conclusões, procede o presente recurso, nos termos e com a configuração antes afirmados.
Decaindo no recurso, a Ré suporta as respetivas custas, sendo as da ação e reconvenção na proporção do vencimento/decaimento (artigo 527.º do CPC), sem prejuízo da isenção legal de que beneficie a Autora.
***
IV - DECISÃO
Acordam os juízes que integram esta secção social do Tribunal da Relação do Porto, rejeitando o recurso quanto à reapreciação da matéria de facto, em julgar esse, quanto ao mais, parcialmente procedente, revogando-se a sentença recorrida na parte em que absolveu a Ré do pedido de reintegração da Autora e do pagamento das retribuições que esta deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão e de indemnização por danos não patrimoniais, sendo aquela substituída nesta parte por este acórdão, nos termos seguintes:
1. Declara-se a ilicitude do despedimento da Autora, condenando-se a Ré a proceder à respetiva reintegração, nos termos estabelecidos no artigo 389.º, n.º 1, alínea b), do Código de Trabalho;
2. Condena-se a Ré:
a) A pagar à Autora as retribuições que a mesma deixou de auferir desde o despedimento, até trânsito em julgado desta decisão, sem prejuízo de dedução de quaisquer quantias que a mesma tenha recebido, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 390.º do Código do Trabalho, neste caso a liquidar no incidente processual próprio;
b) A pagar à Autora, a título de indemnização por danos de natureza não patrimonial, a quantia de €3.000,00 (três mil euros).
Custas do recurso pela Ré, sendo as da ação na proporção do vencimento/decaimento, sem prejuízo de isenção legal de que beneficie a Autora.
Anexa-se sumário do presente acórdão.
Porto, 11 de abril de 2018
Nelson Fernandes
Rita Romeira
Teresa Sá Lopes
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[1] Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, Coimbra, 2013, p. 221/222
[2] Op. cit., p. 235/236
[3] cf. neste sentido o Ac. STJ de 24/09/2013, in www.dgsi.pt
[4] cf. Ac. STJ de 28 de Maio de 2009, in www.dgsi.pt
[5] www.dgsi.pt
[6] processo nº 220/13.8TTBCL.G1.S1, disponível igualmente em www.dgsi.pt
[7] no mesmo sentido, o Acórdão do mesmo Tribunal de 27 de Outubro de 2016, processo 110/08.6TTGDM.P2.S1, mais uma vez em www.dgsi.pt
[8] Op. cit., p. 235/236
[9] Ver Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2 , 605.
[10] Disponível em www.dgsi.pt.
[11] Veja-se o citado Acórdão a propósito da distinção entre matéria de facto e de direito, como ainda ao entendimento, na jurisprudência e na doutrina, no sentido de “que as respostas do julgador de facto sobre matéria qualificada como de direito consideram-se não escritas e que se equiparam às conclusões de direito, por analogia, as conclusões de facto, isto é, os juízos de valor, em si não jurídicos, emitidos a partir dos factos provados.”
[12] Declaração vinculada – porque condicionada à verificação de determinados motivos que a lei considera justificativos da cessação da relação laboral –, constitutiva – o acto de vontade do empregador tem efeitos por si mesmo – e recipienda – só é eficaz depois de ter sido recebida pelo seu destinatário (cfr. Pedro Romano Martinez, in “Direito do Trabalho”, Vol. I, págs. 511 e ss.)
[13] Que se consubstancia em síntese na proibição de despedimentos arbitrários – sem justa causa, ou por motivos políticos ou ideológicos.
[14] Como se refere no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 306/2003 de 25 de Junho – apreciando a constitucionalidade de algumas normas do Código do Trabalho de 2003, entre as garantias a observar no caso de despedimento por causas objetivas – “… estão a de determinação das causas (com suficiente concretização dos conceitos da lei), da controlabilidade das situações de impossibilidade objetiva, e do asseguramento ao trabalhador de uma indemnização”.
[15] “Que estipula o seguinte: “1 - Nos 10 dias posteriores à comunicação prevista no artigo anterior, a estrutura representativa dos trabalhadores, o trabalhador envolvido e ainda, caso este seja representante sindical, a associação sindical respetiva podem transmitir ao empregador o seu parecer fundamentado, nomeadamente sobre os motivos invocados, os requisitos previstos no n.º 1 do artigo 368.º ou os critérios a que se refere o n.º 2 do mesmo artigo, bem como as alternativas que permitam atenuar os efeitos do despedimento. 2 - Qualquer trabalhador envolvido ou entidade referida no número anterior pode, nos três dias úteis posteriores à comunicação do empregador, solicitar ao serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área do emprego a verificação dos requisitos previstos nas alíneas c) e d) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 368.º, informando simultaneamente do facto o empregador. 3 - O serviço a que se refere o número anterior elabora e envia ao requerente e ao empregador relatório sobre a matéria sujeita a verificação, no prazo de sete dias após a recepção do requerimento.”
[16] Cfr. Ac. STJ de 19 de Novembro de 2015, disponível em www.dgsi.pt, que se tem seguido de perto.
[17] Cfr. Ac. antes referenciado, citando o Ac. do mesmo Supremo Tribunal de 01.10.2008.
[18] Assim, referenciados no Acórdão STJ citado, Bernardo Xavier, “O regime dos despedimentos coletivos e as modificações introduzidas pela Lei n.º 32/99 de 18/05”, in Estudos do IDT, vol. I, Alm., pág. 409. Ainda, também naquele referenciados, Mário Pinto e Furtado Martins (“Despedimentos coletivos: liberdade de empresa e ação administrativa”, in RDES, ano XXXV, n.ºs 1-2-3-4, Jan.-Dez. 1993, págs. 38 e ss), Maria do Rosário Palma Ramalho (“Direito do Trabalho”, Parte II – Situações laborais individuais, Coimbra, 2006, p. 884) e Monteiro Fernandes (in Direito do Trabalho, 15ª edição, pás. 628-629)
[19] Anteriormente citado.
[20] Assim, entre outros, para além do Acórdão STJ citado, o Ac. do mesmo Tribunal de 31 de Maio de 2016, disponível no mesmo Sítio;
[21] Recorda-se anda que, tendo sido profundamente alterados pela Lei 23/2012 de 25/06 – passando esse n.º 2 do artigo 368º a ter a seguinte redação: “Havendo, na secção ou estrutura equivalente, uma pluralidade de postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico, para determinação do posto de trabalho a extinguir, cabe ao empregador definir, por referência aos respetivos titulares, critérios relevantes e não discriminatórios face aos objetivos subjacentes à extinção do posto de trabalho” –, tais alterações foram declaradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional no seu acórdão n.º 602/2013 de 20/09, em consequência do que a Lei 27/2014 de 8/05 alterou o preceito, passando o nº 2 a ter a seguinte redação, que se mantém (e à luz da qual se apreciará pois a questão proposta): “2 - Havendo na secção ou estrutura equivalente uma pluralidade de postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico, para determinação do posto de trabalho a extinguir, a decisão do empregador deve observar, por referência aos respetivos titulares, a seguinte ordem de critérios relevantes e não discriminatórios: a) Pior avaliação de desempenho, com parâmetros previamente conhecidos pelo trabalhador; b) Menores habilitações académicas e profissionais; c) Maior onerosidade pela manutenção do vínculo laboral do trabalhador para a empresa; d) Menor experiência na função; e) Menor antiguidade na empresa.”
[22] António Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 17ª edição, pág. 550.
[23] Cfr. Ac. STJ de 31 de Maio de 2016, citado; o mesmo se afirma no Ac. STJ, também já citado, de 19 de Novembro de 2015.
[24] Assim o entendemos sem atender, sequer, a factos que podem legitimar que se pergunte se o fundamento da extinção do contrato de trabalho da Autora não poderia porventura ser mesmo outro, pois que, como se provou (facto 40.º provado), no período em que a mesma se encontrou de baixa médica, lhe foi proposto pela Ré a celebração de um acordo de revogação do contrato de trabalho, que aquela não aceitou.
[25] Da Cessação do Contrato de Trabalho, 3ª ed. Ver. e at., pág. 295
[26] Trado do Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 6ª edição, Almedina, páginas 985/986.
[27] In www.dgsi.pt, Relator Conselheiro Ferreira Pinto, com exclusão das notas nesse inseridas.
[28] Nesse sentido Ac STJ de 06.04.2017, citado, que nesta parte se segue de perto, que cita, por sua vez, os Acs. do mesmo Tribunal de 17.10.2007, de 01.10.2008, de 07.07.2009, de 15.03.2012, de 29.05.2013, de 18.06.2014 e de 22.04.2015, todos desta 4ª Secção e Supremo Tribunal de Justiça, proferidos, respetivamente, nos processos nºs 1615/07 [Relator: Bravo Serra], 8/08 [Relator: Mário Pereira], 27/07.1TTFIG.C1.S1 [Relator: Pinto Hespanhol], 554/07.0TTMTS.P1.S1 [Relator: Fernandes da Silva], 1270/09.4TTLSB.L1.S1 [Relator: Fernandes da Silva], 5115/07.1TTLSB.L1.S1 [Relator: Fernandes da Silva] e 822/08.4TTSNT.L1.S2 [Relator: Melo Lima], todos em www.dgsi.pt/stj.
[29] Cfr. Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, volume I, 4.ª edição, Almedina, pág. 532
[30] Antunes Varela, cit., pág. 532