Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3703/05.0TTLSB.L2-4
Relator: FRANCISCA MENDES
Descritores: DESPEDIMENTO POR EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO
ISENÇÃO DE HORÁRIO DE TRABALHO
RETRIBUIÇÃO
SUSPENSÃO DO DESPEDIMENTO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/24/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A DECISÃO
Sumário: 1-Tendo resultado provado que o recorrente, após ter sido nomeado “Director de Projectos Especiais”,  exerceu actividade por conta da recorrida no âmbito do projecto “Quebra” dever-se-á considerar que tal posto de trabalho tem conteúdo funcional.

         2-De acordo com um critério de razoabilidade, a extinção do posto de trabalho do recorrente, tal como as demais medidas adoptadas pela recorrida, foi determinada pela necessidade de reduzir custos perante o decréscimo de vendas cuja veracidade foi apurada.

       3-Tendo ainda resultado apurado que, à data do despedimento, a R. não dispunha de outros postos de trabalho com funções compatíveis com a categoria do A., porque os que existiam não estavam disponíveis, estando ocupados por outros trabalhadores, o despedimento dever-se-á considerar lícito.

    4-Cumprindo o trabalhador o seu horário de trabalho e estando contactável telefonicamente, dever-se-á considerar que tal situação não configura um acordo de isenção de horário de trabalho.

                   5- Embora a sentença proferida no âmbito dos autos de providência cautelar constitua título executivo no que respeita às retribuições vencidas enquanto vigorar tal providência ( art. 39º, nº2 do CPT), deverá ser esclarecido e reconhecido o carácter retributivo das prestações devidas a título de despesas de combustível e telemóvel que acarretam para o trabalhador um benefício de natureza económica com a sua utilização na sua vida privada.

         (Elaborado pela Relatora)

Decisão Texto Parcial:Acordam os juízes na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa :  

I-AA instaurou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum,  contra BB, S.A., sociedade anónima com sede na Quinta (…), Carnaxide, pedindo que seja declarado:

- a) Inexistente e ilícita a extinção do Posto de Trabalho do A. por inexistente o posto de trabalho e funções atribuídas;

- b) Violado o direito do A. de ocupação efectiva do posto de trabalho;

E no mais condenada a R.:

c) A Reintegrar o A. ou, caso este venha a optar pela indemnização, pagar a quantia de € 186.384,00;

d) A pagar ao A. a título de isenção de horário de trabalho a quantia de € 81.583,00;

e) A pagar ao A., a título de danos morais, a quantia de € 20.000,00;

f) A pagar aos A. os prémios referentes aos anos de 2001 e 2004 no valor de € 77.660,00;

g) A Pagar ao A. todas as prestações salariais que se vençam desde 1 de Agosto de 2005 até efectiva reintegração;

h) A pagar juros, sobre todas as quantias em dívida, desde a citação;

i) A título de sanção pecuniária compulsória e para a hipótese do A. optar pela reintegração, no pagamento da quantia diária de € 1000,00 (mil euros) por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação de reintegrar.

Para tanto, alegou os factos a seguir indicados.

(…)

A ré apresentou contestação.

Nesse articulado a R.  fundamenta o despedimento do A. com a extinção do seu posto de trabalho ( que se prende com a situação económica de empresa, afectada pelo  decréscimo continuado das vendas) e alegou os factos a seguir indicados.

(…)

A R. deduziu oposição à reintegração do A., alegando os factos a seguir indicados.

(…)

*

II- O A. apresentou resposta cuja não admissibilidade foi invocada pela R. e que obteve parcial provimento. O A. recorreu deste despacho.

O recurso foi admitido, sob a forma de agravo e com subida diferida.

            O despacho recorrido considerou não escritos os artigos 1º a 9º, 25º, a partir de “diferentes e distintos” até 29º e 55º a 57º da resposta ( embora tenha referido inicialmente, por manifesto lapso, os arts. 55º a 57º da petição inicial ) e condenou as partes nas custas na proporção de 50% para cada parte.

 Nas suas alegações de recurso o A. formulou as seguintes conclusões :

            (…)

Terminou, pugnando pela revogação do douto ou doutos despachos proferidos e pela substituição por outro onde seja admitida a resposta do ora Recorrente e determinado o desentranhamento dos articulados posteriores da recorrida.

Mais requereu a substituição da condenação em custas por decisão proporcional à não violação normativa que se alega.

  A R. apresentou contra-alegações e recurso subordinado que não foram admitidos ( cfr. despacho de fls. 5251).

Na apreciação do recurso, importa considerar que as conclusões delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, pelo que não serão apreciadas as questões suscitadas pelo A. que não foram objecto das indicadas conclusões.

           
  Na contestação da R., lê-se sob a epígrafe de Introdução:
«1º
A presente acção foi interposta para impugnação do despedimento do Autor por extinção do seu posto de trabalho, operada pela Ré, ao abrigo do disposto no artigo 402º do CT .

 Contudo, o Autor, na sua petição inicial, expõe, por vezes sem aparente articulação ou explicação suficiente, uma série de alegados factos relativos ao histórico da sua relação laboral que são muito anteriores ao procedimento de extinção do posto de trabalho, sem precisar em que medida os referidos factos relevam para a apreciação da legalidade daquele procedimento.

O Autor faz também  insistentes referências (v.g. artigos 56º e seguintes da Petição Inicial) a alterações verificadas na estrutura da empresarial e organização societária da Ré, que, naturalmente, apenas dizem respeito à actividade desta, nada relevando para a apreciação da legalidade do processo de extinção do posto de trabalho ocupado pelo Autor e exorbitando a competência deste.

Ora, fundando-se o despedimento em causas objectivas, é na valoração destas e, na observância das normas que o regulam, que a lei impõe que se afira da sua legalidade, aí devendo residir a sindicância jurisdicional.

 Muito embora não considere a maioria dos factos alegados pelo autor relevantes para a apreciação da legalidade do despedimento – ressalvando-se a eventual deficiente compreensão dos mesmos, atentas as referidas deficiências de exposição – e atendendo ao facto da maioria do alegado não corresponder à verdade, a Ré não deixará, por mera cautela de patrocínio, de se pronunciar sobre os mesmos.
 6º
Porém, a Ré procurará, sobretudo, deixar plenamente demonstrada a legalidade do procedimento de extinção do posto de trabalho de Director de Projectos Especiais, em função de qualquer dos vectores, infra referidos, de que a lei faz depender, o que corresponde ao objecto principal desta acção”.»
Na resposta à contestação e sobre esta matéria alega o autor, a fls. 589 e seguintes, sob a epígrafe Da Excepção de Ineptidão da PI que a R. designa pomposamente de “A  Introdução”
 « Efectivamente a Ré alegou, em processo de extinção do Posto de Trabalho, ter procedido ao despedimento do Autor com esse fundamento. Logo o pedido do Autor teria obviamente que passar pelo pedido de declaração de ilicitude desse despedimento por extinção do posto de trabalho (artigo 1º).
Porém, a Ré esquece que a ilicitude do despedimento por extinção do posto de trabalho não se baseia exclusivamente no vertido no artigo 432º do CT, mas acima e antes dessa verificação objectiva, existe o artigo 429º do CT, isto é, falta apurar os reais motivos do despedimento, alíneas b) e c) do artigo 429º (artigo 2º).
Mais ainda, necessário se torna aferir da existência do posto de trabalho a extinguir, porquanto a inexistência do Posto de Trabalho também conduz por maioria de razão à ilicitude do despedimento (artigo 3º).
Obviamente que a análise deste processo conduz o Autor à explanação de uma realidade mais complexa a que a Ré gostaria de escamotear (artigo 4º).
Finalmente o autor não faz apenas um pedido, na realidade o autor produz ao todo 10 pedidos, ou seja, os autos em apreço deverão aferir um conjunto de factos que não se prendem exclusivamente com o procedimento de extinção de um posto de trabalho produzido pela Ré (artigo 5º).
Mais ainda o próprio pedido de declaração de ilicitude da extinção do posto de trabalho é mais abrangente ocupando a
- Extinção do Posto de Trabalho de Director de Informática
e
- Extinção do Posto de trabalho de Director de Projectos Especiais,
na verdade uma única realidade e por isso um único pedido, a extinção do posto de trabalho de Director;
Esta primeira “extinção” não precedida de procedimento disciplinar e por isso violador também do artigo 429º, a) do CT (artigo 6º).
Do exposto, resulta não ser mera ingenuidade ou ignorância quando a R. afirma no artigo 3º da “Introdução”..”nada relevando para a apreciação da legalidade do processo de extinção do posto de trabalho ocupado pelo autor..”. Em primeiro lugar claramente percebeu a ré existir um outro pedido por violação da ocupação efectiva do posto de trabalho. Em segundo lugar que o posto de trabalho, “o ocupado” era de Director de Informática também extinto” (artigo 7º).
Saber se esta realidade cabe na possibilidade de “alterações verificadas na estrutura empresarial e organização societária da Ré” caberá ao Tribunal fazê-lo e o Autor nisso confia (artigo 8º).
Parca em explicações a Ré resume a incompreensão na apreciação do pedido do autor no estabelecimento, em jeito de conclusão, da restrição a uma causa única. “A extinção de Director de Projectos Especiais”. Ora a simplicidade de um tal pedido não conduziria a Ré a tal intróito e ela sabe disso (artigo 9º).»

O Tribunal “ a quo” considerou não escritos os arts. 1º a 9º da resposta.
O recorrente veio invocar a nulidade deste despacho ao abrigo do art. 668º, nº1, d) do CPC de 1961, mas não arguiu tal nulidade no requerimento de interposição de recurso, como lhe competia ( art. 77º, nº1 do CPT), pelo que não será conhecido o invocado vício.
Quanto à invocada nulidade processual, importa referir que incumbe ao Tribunal verificar se os articulados das partes estão contidos dentro dos limites legais, o que deverá ser efectuado oficiosamente.
  No caso concreto, foi verificada a referida conformidade no que respeita à resposta à contestação e aos sucessivos requerimentos das partes.
Verificamos que não foi suscitada na contestação a excepção de ineptidão da petição inicial e na resposta também não foi formulado pelo ora recorrente ampliação do pedido, pelo que será mantida a decisão do Tribunal “ a quo” que considerou não escritos os arts. 1º a 9º da resposta.

Os artigos 55º a 57º da resposta têm o seguinte teor:
«55º - Quem actua em claro abuso de direito é a Ré que escamoteia factos, adultera outros e parece esquecer que até a sua versão dos factos atribui carácter continuado à actuação de ambas as partes.
56º - Tal continuidade implica a inexistência também nesta sede de “consolidação pelo decurso do tempo”. Consolidação que em Direito do Trabalho só opera após a cessação do vínculo laboral qualquer que seja o motivo invocado.
57º - Contrariamente ao vertido pela Ré são estes factos por anteriores e contemporâneos da “Extinção do Posto de Trabalho” contrariam esta dedução da oposição à reintegração.»
Na contestação a R. invocou, sob o art. 196º, a excepção de abuso de direito, nos seguintes termos: « (…) tendo o A. assumido e desempenhado tais funções, o seu provimento nestas encontra-se consolidado pelo decurso do tempo, pelo que qualquer pretensão de impugnação desse provimento ( que seria intempestivo) configura um abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium ( art. 334º do Código Civil)».
Verificamos, assim, que a R. invocou a excepção peremptória de abuso de direito, pelo que, nesta parte decide-se alterar a decisão do Tribunal a quo e manter os referidos artigos 55º a 57º da resposta, excepto na parte em que o A. invoca também o abuso de direito da parte contrária.
A argumentação do recorrente nos mencionados artigos 55º a 57º da resposta não introduz matéria factual que importe a anulação posterior do processado.
O Tribunal “ a quo” verificou ainda os limites legais dos requerimentos apresentados pelas partes após a resposta do autor e este nas suas conclusões não especificou, como lhe competia,  as razões da sua discordância quanto à verificação dos referidos limites e condenação em custas ( sendo certo que estas foram fixadas em termos proporcionais, de acordo com o vencimento das partes), pelo que, nesta parte, improcede também o recurso de agravo interposto pelo autor.
Não obstante não terem sido considerados não escritos os arts. 55º a 57º da resposta, o agravo não será provido, porque, conforme acima referimos, a infracção cometida não influiu no exame e decisão da causa ( art. 710º, nº2 do CPC de 1961).

III- A fls. 910 veio o A. apresentar novo articulado, com o propósito de aditar o pedido e a causa de pedir.

Alegou, em síntese, que (…)

A R. contestou a matéria do aditamento e a sua admissibilidade (…)

Foi proferido despacho que decidiu que à data da propositura da acção já o A. poderia ter peticionado o prejuízo de 4000,00 euros que em seu entender teria por ter deixado de utilizar e posteriormente adquirir um veículo no valor de 47.000,00 que já estava a ser negociado e ter que passar a utilizar e, posteriormente, adquirir um veículo no valor de 43.000,00, o mesmo sucedendo quanto ao invocado prejuízo na compra do veículo em 2007, por as regras para a aquisição terem sido alteradas, tendo que despender 24.000,00 euros em vez de 12.000,00.

Consequentemente, foi admitido o aditamento de causas de pedir e de pedidos, com excepção do relativo à reparação de danos patrimoniais no montante de 17.000,00 euros.

Elaborou-se o despacho saneador e procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e controvertida, a qual foi objecto de reclamações, parcialmente atendidas.

*

    IV- Na petição inicial, o autor requereu o depoimento de parte da Ré nos seguintes termos:

            “ Depoimento de parte

             CC e DD”

  Em 26.10.2007 foi proferido, a fls. 1080, o seguinte despacho:

            (…)

   Em 02.11.2007, a fls. 1082, o A. revogou a procuração conferida à Drª EE.

 A Drª EE foi notificada em 06.11.1007 do despacho acima indicado de 26.10.2007.

Após, foi proferido despacho com vista ao cumprimento do disposto no art. 39º do CPC, o que foi cumprido em 09.11.2007.

    Por despacho de 13.11.2007 ( fls. 1243) o A. foi notificado para constituir novo mandatário.

Em 19.11.2007 ( fls. 1310) o A. constituiu novo mandatário.

A fls. 1318 ( em 22.11.2007  ) foi proferido o seguinte despacho:

« Uma vez que o A. não indicou a que matéria de facto pretende o depoimento de parte da R., nem na petição inicial nem depois de notificado para o efeito, indefiro o depoimento de parte que requereu ( artigo 552º, nº2 do CPC)».

A fls. 1362 a R. informou que CC renunciou ao cargo que desempenhava nos órgãos sociais da R., o que foi levado ao registo. Juntou cópia da carta de renúncia e da apresentação ao registo da mesma ( fls. 1364 e 1365).

O A. reclamou , a fls. 1384 a 1386, requerendo que a notificação do despacho de 26.10.2007 na pessoa do actual mandatário do A.. Mais requereu que a R. seja notificada para indicar a pessoa que deverá prestar depoimento de parte em substituição de CC.

A fls. 1409 e 1410  foi proferido o seguinte despacho:

« A figura processual da reclamação sobre o teor de um despacho que não seja de resposta à matéria de facto ou de selecção dos factos assentes ou controvertidos não se encontra prevista na lei.

Por isso entende-se que o Autor pretende antes a rectificação ou reforma do despacho de fls. 1318 que não admitiu o depoimento de parte da Ré.

Ora tal despacho não contem qualquer lapso, erro ou omissão que justifique a sua rectificação ou reforma nos termos dos arts. 667º do C.P. Civil, pelo que se mantém tal despacho na íntegra».

Inconformado, o A. impugnou a decisão de não admissão do depoimento de parte,  por meio de recurso – fls. 1464 a 1467, recurso esse admitido como agravo, com subida diferida ( despacho de fls. 2025).

            O A. formulou as seguintes conclusões:

            (…)

A R. contra-alegou e formulou as seguintes conclusões:

            (…)

         Vejamos.

         Em primeiro lugar, cumpre referir que a substituição de CC nos quadros sociais da R. não torna o recurso inútil, uma vez que a decisão recorrida respeita ao depoimento de parte e não ao depoimento de CC em concreto.

         À data da prolação do despacho recorrido estava em vigor o Código de Processo Civil na redacção anterior à reforma operada pelo Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto.

De acordo com o disposto no art. 39º, nº2 do CPC então vigente, «os efeitos da revogação e da renúncia produzem-se a partir da notificação, sem prejuízo do disposto nos números seguintes; a renúncia é pessoalmente notificada ao mandante, com a advertência dos efeitos previstos no nº3».

Conforme sintetiza o Acórdão da Relação de Guimarães, de 30.05.2013, www.dgsi.pt, « a revogação do mandato judicial por parte da ré, em processo a decorrer, produz efeitos a partir do momento em que é notificada ao mandatário, o qual se mantém em funções até esse momento, podendo o processo prosseguir os seus termos normais ».

       Com interesse para a questão ora em apreço, importa lembrar os ensinamentos do professor Alberto dos Reis in “Código de Processo Civil anotado”, vol. I, 3ª edição- reimpressão, pág. 128 : «Não faz sentido que o advogado continue a fazer uso do mandato depois de ter sido notificado da revogação; de maneira que o advogado deve considerar-se inibido de representar o mandante logo que receba a notificação e deve, consequentemente, abster-se de praticar voluntariamente no processo qualquer acto em nome dele; mas se lhe for feita qualquer comunicação ou notificação antes de a revogação produzir efeitos no processo (…) não pode recusar-se a recebê-la».

Ora, no caso em apreço, verificou-se esta última situação, uma vez que a anterior mandatária do A. foi notificada do despacho de 26.10.2007 antes de ter sido notificada da revogação do mandato, pelo que deveria ter assegurado o mandato.

Julgamos, desta forma, improcedente  o recurso de agravo interposto pelo autor a fls. 1464 a 1467  e confirmamos a decisão recorrida.

                                                                    * 

V- Procedeu-se à realização de audiência de discussão e julgamento.

  No decurso da audiência o A. requereu a acareação entre a testemunha FF e GG.

  A fls. 1599 foi proferido em audiência de discussão e julgamento o seguinte despacho:

       « Nos termos do art. 642º do CPC, pode ter lugar a acareação entre testemunhas caso exista oposição directa nos seus depoimentos acerca de determinado facto.

         Na verdade, as testemunhas FF e GG responderam de modo diferente às questões acima identificadas pelo ilustre mandatário do Autor.

   No entanto não se pode falar de uma oposição directa e frontal, uma vez que ambas as testemunhas não se reportam na íntegra ao mesmo período temporal da vida da empresa Ré, uma vez que a testemunha FF deixou a Ré em Abril de 2004 desconhecendo por isso o que nela terá acontecido depois dessa data.

  Acresce que ambos os depoimentos foram longos e exaustivos, explicando cada uma das testemunhas a razão de ser das suas declarações, pelo que não se vê em que medida a requerida acareação poderá contribuir para esclarecer testemunhos que já se revelaram completos.

         Por outro lado, como referiu a ilustre mandatária da Ré, as matérias em causa também têm suporte documental e existem outros depoimentos que conjugados com estes dois ajudaram a formar a livre convicção do julgador.

         Por fim, como é de prever os depoimentos das testemunhas não são iguais, pois caso contrário não haveria necessidade de realizar julgamento e como também é sabido, mesmo em caso de acareação as testemunhas não alteram os seus depoimentos, até porque sabem que daí pode resultar responsabilidade criminal.

         Assim, por se afigurar inútil e dilatória, indefiro a requerida acareação».

      A fls. 1600 a 1606, o A. recorreu deste despacho e formulou as seguintes conclusões:

         (…)

         A fls. 1631 a 1650 a R. apresentou as suas contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.

                                                                    *

         Vejamos.

       O autor pretende a acareação entre as testemunhas FF e GG.

   Porém, após a interposição do recurso de agravo ora em apreço, foi proferido a fls. 2575 despacho que deu sem efeito os depoimentos das testemunhas HH e II, devido a deficiências da gravação que não foram corrigidas. Foi ainda determinada a repetição dos referidos depoimentos.

         Uma vez que o depoimento de HH inicialmente prestado foi dado sem efeito e após a audição desta testemunha não foi requerida a acareação entre a mesma e a testemunha FF, ocorre inutilidade superveniente o recurso de agravo do despacho que indeferiu a acareação entre estas testemunhas.

         Julgamos, por isso, extinta a instância de recurso quanto ao agravo interposto a fls.  1600 a 1606.

                                                        *

VI- A fls. 1785 o autor requereu a ampliação da base instrutória, com os seguintes fundamentos:

(…)

A R. deduziu oposição à ampliação da base instrutória

A fls. 2028 foi proferido o seguinte despacho:

« Fls. 1785 ( requerimento do A. de 01.07.2008):

O A. pretende a ampliação da base instrutória relativamente a factos que consubstanciam o não pagamento pela R. de despesas com combustível, lavagens de automóvel e telemóvel desde Março de 2006 a Fevereiro de 2008, ao abrigo do disposto no art. 72º, nº2 do CPT.

Sucede que a maior parte destes factos não surgiu no decurso da produção de prova mas em período anterior, que os mesmos não são relevantes para a boa decisão da causa tendo em conta a causa de pedir e os pedidos formulados na acção e que constituem o objecto desta, e que os mesmos factos não foram alvo de discussão pois esta incidiu sobre a composição da retribuição do A. ( nomeadamente se é integrada pelo direito ao uso de veículo e telemóvel e qual o seu valor) e não sobre a existência de uma dívida da R. para com o A. referente à falta de pagamento de despesas com combustível, lavagens de carro e telemóvel.

Assim, por não se verificar a previsão do art. 72º/1 e 2 do CPT, indefiro o requerido.»

O autor, não concordando com esta decisão, dela interpôs recurso pelos motivos que constam a fls 2111, recurso esse admitido como agravo, com subida diferida (fls. 2213) , nele formulando as seguintes conclusões:

(…)

Vejamos.

Estabelece o art. 72º, nº1 do CPT: « Se no decurso da produção de prova surgirem factos que, embora não articulados, o Tribunal considere relevantes para a boa decisão da causa, deve ampliar a base instrutória ou, não a havendo, tomá-los em consideração na decisão da matéria de facto, desde que sobre eles tenha incidido discussão.»

Ora, o recorrente no requerimento de fls. 1785 e seguintes invoca este preceito legal, mas não invoca o circunstancialismo que permite a ampliação da base instrutória.

No que respeita à decisão de suspensão do despedimento consta dos factos assentes da presente acção: « Na sequência do decidido pelo Acórdão do TRL proferido nos autos de procedimento cautelar e que confirmou a decisão da 1ªinstância, a R. tem vindo a pagar ao A. todos os meses a remuneração de 7. 766,00 e dispensou o A. de lhe prestar trabalho».

Constam ainda os seguintes factos assentes :

- A R. deixou de pagar ao A. qualquer importância para a compra de gasóleo ( BQ);

- A partir de Março de 2006 a R. deixou de pagar ao A. as despesas com o telemóvel ( BS).

Da Base Instrutória constam os seguintes artigos:

- A R. sempre pagou ao A. o gasóleo que este despendia para fins profissionais aos fins-de-semana e nas férias, nomeadamente nas deslocações a Espanha ? ( art. 104º)

- O A. despende mensalmente 200 euros em gasóleo em deslocações? ( art. 105º)

- A R. sempre pagou ao A. as despesas que ele efectuava com o telemóvel tanto por motivos profissionais como pessoais ? ( art. 106º)

- O A. despende 80 euros mensalmente em comunicações por telemóvel ? ( art. 107º)

A situação do autor após a suspensão do despedimento já constava, assim, dos factos assentes e a composição da sua retribuição fora objecto da base instrutória.

O A. pretendia alterar a base instrutória no que respeita às despesas de combustível e de telemóvel e apresentar novos meios de prova.

O que difere dos pressupostos de aplicação do disposto no art. 72º, nº1 do CPT.

Acresce ainda que os referidos arts. 104º a 107º da Base Instrutória ( pontos nºs 161 a 164 dos factos provados) foram considerados provados e o recorrente não impugnou a decisão sobre a matéria de facto quanto a esta factualidade. Por último, caso o Tribunal considere que as despesas com o combustível e o telemóvel integram a retribuição, tais quantias deverão ser consideradas nas prestações salariais já peticionadas.

No que respeita às despesas de lavagem do veículo automóvel, as mesmas não tinham sido peticionadas e o autor pretendia formular um novo pedido no sentido da sua integração na retribuição, o que não foi, como deveria, expressamente requerido, sendo ainda certo que já fora ultrapassada a fase do início da audiência ( cfr. art. 28º, nº2 do CPT).

Julgamos,  assim, improcedente o recurso de agravo interposto pelo autor a fls. 2111 e confirmamos a decisão recorrida.

VII- Em 17 de Novembro de 2008, o autor arguiu a nulidade da inquirição das testemunhas HH e II, porquanto os duplicados das gravações destes depoimentos continham ruídos que impediam a audição das vozes das testemunhas e dos advogados (fls. 2268), pedindo a repetição dos depoimentos.
A Ré respondeu, indicando a empresa Campo Digital – Produtores de Vídeo Unipessoal, Lda., para proceder à eliminação das deficiências da gravação, caso se viesse a entender que o registo magnético se encontrava com anomalias (fls. 2278 a 2281).
Em 26 de Novembro de 2008, o autor apresentou o requerimento de fls. 2293, com o seguinte teor :«.... O autor .., notificado para que o Tribunal adopte as diligências necessárias e adequadas à supressão de ruídos parasitas das cassetes nºs 25 a 29, vem mui respeitosamente, informar …que nada tem  a opor a tais medidas, sempre que das mesmas resultem sanados os vícios apontados em momento processual anterior».
A fls. 2301, foi proferido o seguinte despacho: «Informe a Secção se as gravações dos depoimentos das testemunhas HH e II constantes das cassetes nºs 25, 26, 27, 28, e 29, padecem ou não das deficiências apontadas pelo autor a fls. 2268».
Em 12 de Janeiro de 2009, o Sr. Escrivão de Direito, prestou a informação de fls. 2302, onde se lê: « A secção constatou que nas cassetes nºs 25, 26, 27, 28 e 29, os depoimentos das testemunhas apresentam as anomalias referidas pelo autor, no seu requerimento de fls. 2268 e ss, nomeadamente um “barulho de fundo”,  ruídos, bem como os níveis de gravação muito baixos».
Em 12.01.2009 ( fls. 2302) foi proferido o seguinte despacho: « Conforme informação que antecede, as gravações dos depoimentos das testemunhas HH e II constantes das cassetes nº 25 a 29 padecem de algumas deficiências apontadas pelo A. a fls. 2268, havendo necessidade de as corrigir.
Aproveitando a sugestão da R. de fls. 2288, que não mereceu oposição do A., remeta as ditas cassetes ( originais) à sociedade Campo Digital- Produtora de Vídeo Unipessoal, lda, a título devolutivo, a fim de eliminar aqueles vícios, tornando os depoimentos audíveis.
Prazo : 20 dias».
Em 22 de Janeiro de 2009, foi prestada pelo Sr. Funcionário Judicial, a informação de fls. 2415, onde consta o seguinte :« Tendo contactado pessoalmente, a Empresa, Campo Digital – Produtores de Vídeo Unipessoal, Lda., fui informado de que é tecnicamente possível a recuperação das 5 cassetes com deficiência, sendo o custo da mesma no valor de 700€, e o prazo para entrega de 1 semana».
Por despacho proferido em 23 de Janeiro de 2009, foi ordenada a notificação das partes da referida informação, a fim de requererem o que tivessem por conveniente quanto ao pagamento daquele custo (fls. 2415).
A Ré, notificada deste despacho, veio dizer que nada tem a opor à contratação da empresa supra referida e que está disponível para pagar dentro do prazo fixado para esse efeito, metade da despesa (350,00€), caso o tribunal entenda que a recuperação das cassetes constitui um incidente cuja responsabilidade deverá ser imputada às partes (fls. 2418).
Em  9 de Fevereiro de 2009, o A. veio dizer que não aceita o pagamento do  custo da recuperação das cassetes e não concorda com recuperação das mesmas, pelo modo indicado.
Em 5 de Março de 2009, foi proferido o despacho de fls. 2493, onde de lê: «Notifique os despachos de fls. 2301 e 2302 às partes, nada havendo a acrescentar aos mesmos, até porque o autor já havia declarado a fls. 2296 não se opor às diligências tendentes à eliminação dos ruídos parasitas das cassetes.
A fim de evitar maiores atrasos no andamento dos autos e porque o autor recusa comparticipar nas despesas de recuperação das cassetes, sendo certo que o tribunal não dispõe de verba para o efeito, notifique a Ré, para em dez dias, depositar a totalidade da quantia indicada pela empresa Campo Digital, entrando a mesma em regra de custas».
Em 23 de Março de 2009, o A. interpôs recurso de agravo, a fls. 2520  a 2525, do despacho que ordenou a remessa dos originais das cassetes nºs 25 a 29, a título devolutivo, à sociedade Campo Digital- Produtora de Vídeo Unipessoal, Lda e formulou as seguintes conclusões:
(…)
Vejamos.

         Importa mais uma vez relembrar que, após a interposição do recurso de agravo ora em apreço, foi proferido a fls. 2575 despacho que deu sem efeito os depoimentos das testemunhas HH e II, devido a deficiências da gravação que não foram corrigidas. Foi ainda determinada a repetição dos referidos depoimentos.

         As cassetes acima indicadas ( nºs 25 a 29) respeitavam aos depoimentos de HH e II.

         Uma vez que os depoimentos que constavam das referidas cassetes foram dados sem efeito, ocorre inutilidade superveniente do recurso de agravo ora em apreço.

         Julgamos, por isso, extinta a instância de recurso quanto ao agravo interposto a fls.  2520  a 2525.

                                                                    *         

VIII- Resulta do despacho de fls. 2493 que foi ordenada a notificação da ré para depositar a totalidade da quantia pedida pela Campo Digital para prestar o serviço mencionado, entrando a mesma em regra de custas.
Em 23 de Março de 2009, o A. interpôs recurso de agravo, a fls. 2512 a 2516 deste despacho e formulou as seguintes conclusões :
Terminou, defendendo a revogação do despacho recorrido.
Vejamos.
Por razões não apuradas, o registo da prova apresentou deficiências e foram determinadas diligências, com vista à eliminação do ruído das gravações.
A realização deste acto, tal como a posterior repetição da prova, não poderá ser imputada às partes.
Assim e de acordo com o critério previsto no art. 448º, nº1 do CPC, determina-se a revogação do despacho recorrido na parte em que decidiu que a quantia devida à empresa Campo Digital entraria em regra de custas, devendo este despacho ser substituído por outro que considere tal incidente não tributado.
 
IX- Após a repetição dos depoimentos das testemunhas HH e II, o A. requereu a acareação entre as testemunhas FF e II ( fls. 2640 e 2641) nos seguintes termos:
(…)

Pela mandatária da R. foi deduzida oposição ao referido requerimento nos seguintes termos:
(…)

A fls. 2641 e 2642 foi proferido o seguinte despacho: « O art. 27º da Base Instrutória contém na sua 1ª parte, desde “o motivo determinante” até “situação económica da empresa” uma conclusão que só na sentença poderá ser tirada, em face do teor da decisão da R. de extinção do posto de trabalho do A. e dos factos que se considerem provados neste julgamento. Por esse motivo, o Tribunal não pode responder a essa parte do art. 27º, razão pela qual a mesma foi omitida na resposta aos factos que já foi dada em 9 de Outubro de 2008.

Deste modo, a única parte do artigo em questão a ter em conta é aquela em que se pergunta se desde 2001 a R. se confronta com o decréscimo de vendas, sendo certo que as expressões “acentuado” e “persistente” também encerram em si conclusões, as quais foram concretizadas nessa mesma resposta aos factos, com os valores constantes dos documentos analisados na audiência de julgamento.

Ora, quanto a esse decréscimo de vendas, a única questão que é factual e que importa, tanto a testemunha FF como a testemunha GG afirmaram que existiu esse decréscimo, dizendo a testemunha FF que o mesmo foi intencional e planeado. No entanto, a causa do decréscimo de vendas não faz parte do que é perguntado no referido art. 27º da Base Instrutória.

Assim, não existindo oposição directa entre os aludidos depoimentos, pelo contrário, os mesmos coincidem nessa parte, não existe fundamento para a requerida acareação, pelo que se indefere a mesma».

A fls. 2652 a 2658 o A. recorreu e formulou as seguintes conclusões:
(…)

Vejamos.

O art. 27º da Base Instrutória tem o seguinte teor:

« O motivo determinante da extinção do posto de trabalho do A. prende-se com a actual situação económica da empresa que desde 2001 se confronta com o acentuado e persistente decréscimo de vendas?»

 A esta questão o Tribunal a quo respondeu: « Provado apenas  que desde 2001 que se verifica o decréscimo das vendas da R., as quais foram no valor de € 637.962.819,00 em 2001, de € 629.521.943,00 em 2002, de € 586.582.011,81 em 2003 e de € 552.090.207,00 em 2004».

O A. pretendia que o Tribunal considerasse não provado que o motivo da extinção do seu posto de trabalho foi o decréscimo de vendas.

Ora, relativamente a esta matéria, o Tribunal a quo não respondeu de forma positiva e apenas em sede de fundamentação de direito da sentença emitiu o seu juízo.

O que significa que, em sede de decisão sobre a matéria de facto, não ocorre prejuízo para a pretensão do autor ( na parte em que pretendia que fosse dada resposta negativa à pergunta se o motivo da extinção do seu posto de trabalho foi o decréscimo de vendas).

Acresce ainda que a divergência entre os depoimentos de FF e II prende-se com as causas do decréscimo das vendas ( o que não constitui matéria objecto do referido artigo da base instrutória) e as expressões “acentuado” e “persistente”  decréscimo de vendas têm natureza conclusiva.

As razões do decréscimo das vendas estão referidas no art. 28º da base instrutória que tem o seguinte teor:

«Esta situação tem raízes no actual quadro macroeconómico recessivo que se vive no nosso país, desde alguns anos e que tem implicado uma redução significativa do consumo privado?»

Pelo Tribunal a quo foi dada a seguinte resposta a este artigo da Base Instrutória:

«Provado apenas que esta situação tem raízes, em parte, no actual quadro macroeconómico recessivo que se vive no nosso país, desde alguns anos e que tem implicado uma redução significativa do consumo privado».

As testemunhas FF e II apresentaram respostas não coincidentes sobre esta matéria. A primeira testemunha referiu que o consumo privado crescia a taxas muito baixas. A segunda testemunha referiu que o decréscimo das vendas foi devido sobretudo ao aumento da concorrência e a um decréscimo do mercado que não conseguiu precisar.

A testemunha FF exerceu funções na R. apenas até Abril de 2004 e a testemunha II ainda laborava por conta da R. à data da sua inquirição, pelo que o seu conhecimento dos factos não respeita ao mesmo período temporal.

Assim e considerando que a testemunha II apenas aludiu de forma vaga ao “decréscimo do mercado”, consideramos que não se justifica a pretendida acareação.

Julgamos, por isso, improcedente o recurso de agravo da decisão que indeferiu a acareação entre Luís Valentim e António Pinheiro e confirmamos a decisão recorrida.

                                               * 

X- Pelo Tribunal a quo foram considerados provados os seguintes factos na sentença:

(…)

Com base nestes factos, o Tribunal a quo absolveu a R. de todos os pedidos formulados pelo A..

O A. recorreu e formulou as seguintes conclusões:

(…)

A R. contra-alegou e formulou as seguintes conclusões:

(…)

                                                *

XI- Importa solucionar as seguintes questões no âmbito do recurso de apelação interposto pelo autor da sentença final:

a)– Se a sentença padece do vício de nulidade;

b)- Se deve ser alterada a decisão sobre a matéria de facto;

c)- Se o despedimento do A. foi ilícito;

d)- Se o autor tem direito aos créditos laborais peticionados;

e)- Apreciar os fundamentos da não reintegração do autor ( em caso de procedência da acção).

Na apreciação destas questões a área de intervenção do Tribunal ad quem  está delimitada pelas conclusões das alegações, com ressalva das questões do conhecimento oficioso.

                                               *

XII- Apreciação do recurso da sentença

A) Vejamos, em primeiro lugar, o invocado vício de nulidade da sentença.

A sentença em apreço foi proferida em 21.02.2011

O recorrente defende que a sentença é nula « nos termos e para os efeitos do disposto no art. 668º, nº1, alínea b) e d) do C.P.C., pelo facto de não ter especificado, quanto aos pedidos das alíneas d) e) e f) da petição inicial do A., a decisão e os fundamentos de direito que importaram a improcedência de tais pedidos, em violação do disposto no art. 659º, nº1 e 2 do C.P.C»-

Mais defendeu que « a decisão proferida pelo Tribunal a quo é nula nos termos do disposto no art. 668º, nº1, alínea b) e d) do C.P.C., porquanto não foi proferida nenhuma decisão e respectiva fundamentação de direito, sobre os pedidos efectuados no aditamento à causa de pedir de fls. 910 e segts., em manifesta violação do disposto nos arts. 653º, nº2, 659º, nº2 e 3, 660, nº1 e 2, todos do C.P.C.».

Os pedidos formulados sob as alíneas d), e) e f) da petição inicial respeitam, respectivamente, aos invocados créditos por isenção de horário de trabalho, a indemnização por danos morais e a prémios referentes aos anos 2001 e 2004.

Os pedidos cujo o aditamento foi admitido a fls. 977 respeitam a danos morais, despesas de telemóvel, despesas de gasóleo e descontos de funcionários não efectuados.

Uma vez que a sentença recorrida absolveu a R. de todos os pedidos não ocorre o vício de omissão de pronúncia previsto no art. 668º, nº1, d) do CPC de 1961.              

Porém, não foram indicados os fundamentos de direito que justificam a decisão de absolvição de todos os pedidos formulados pelo autor, pelo que a sentença é nula ( art. 668º, nº1, b) do CPC de 1961), o que se declara.

De acordo com o disposto no art. 715º, nº1 do CPC de 1961, o Tribunal ad quem conhecerá infra das questões acima indicadas ( em substituição do Tribunal recorrido).

                                                           *

Defende ainda o recorrente que « a decisão proferida pelo Tribunal a quo é nula nos termos e para os efeitos do disposto no art. 668º, nº1, alínea c) do C.P.C., porquanto os fundamentos da decisão de facto estão em contradição com os fundamentos da decisão de direito, designadamente, no que se refere aos pontos 1, 7, 11, 12, 17, 18, 59, 69, 81, 83, 121, 169 e 170, os quais face ao disposto nos arts. 403º, nº2 e 432º, alínea b) do CT impunham decisão diversa daquela que foi proferida, nomeadamente, que fosse declarada a ilicitude do despedimento do A..

Vejamos.

Conforme refere o prof. Alberto dos Reis in “ Código de Processo Civil anotado”, vol. V, pág. 141 : « Quando os fundamentos estão em oposição com a decisão, a sentença enferma de vício lógico que a compromete. A lei quer que o juiz justifique a sua decisão. Como pode considera-se justificada uma decisão que colide com os fundamentos em que ostensivamente se apoia?»

Na nossa perspectiva, não ocorre, no caso concreto, nulidade nesta parte da sentença.

Com efeito, não ocorre a apontada contradição, dado que a sentença recorrida fez uma valoração dos factos provados e decidiu em conformidade com a argumentação que expôs.

Poder-se-á discordar da posição adoptada pelo Tribunal a quo ( o que será infra apreciado), mas não ocorre vício de raciocínio entre as premissas e a decisão.

Improcede, desta forma, a nulidade arguida ao abrigo do disposto no art. 668º, nº1, c) do CPC de 1961.

B)-Vejamos, agora, os factos provados.

(…)

                                               *

Passemos, de seguida, à apreciação do recurso interposto pelo autor quanto à decisão sobre a matéria de facto.

(…)

C) Os factos provados, são, assim os seguintes

(…)

                                               *

D)- Passemos, de seguida, à apreciação da licitude do despedimento.

Defende o recorrente que é ilícita extinção do posto de trabalho, por se mostrar inexistente o posto de trabalho e funções atribuídas.

Resulta dos factos provados que até Maio de 2003 o recorrente desempenhou as funções de Director de Informática.

A R. extinguiu o cargo de Director de Informática em 2003.

Em Junho de 2003 foi-lhe atribuída a categoria de “Director de Projectos Especiais”

O A., por várias vezes, requereu à R. que lhe fossem atribuídas as funções de Director de Informática.

O departamento IM e IT continuou a desenvolver parte do trabalho que era desenvolvido antes do A. ter cessado funções como Director de Informática, passando, com a reestruturação, a verificar-se maior centralismo na tomada de decisões no departamento de IT, uma vez que os procedimentos para fazer investimentos e a aprovação de tais investimentos passaram a ser feitos na Alemanha.

Ocorrerem negociações entre as partes com vista à atribuição ao A. do cargo de Director de Segurança. Tais negociações não surtiram efeito.

A comunicação ( em 16.03.2005)  acima referida sob 48 dos factos provados foi efectuada na sequência das referidas negociações. A referência sob 3 do referido ponto 48 dos factos provados ao cargo de Director de Projectos Especiais respeitava ao passado, uma vez que este cargo foi atribuído ao ora recorrente em Junho de 2003.

Por carta datada de 23 de Maio de 2005 foi comunicado pela recorrida ao recorrente a extinção do posto de trabalho do segundo.

Atenta a data do despedimento e o disposto no art. 7º, nº1 da lei nº 7/2009, de 12.02, na apreciação da licitude do referido despedimento deverá ser considerado o Código do Trabalho de 2003.

Defende o recorrente que o posto de trabalho de “Director de Projectos Especiais” era inexistente.

Resultou, contudo, apurado que foram atribuídas ao recorrente funções especificas relacionadas com o “Projecto X”.

Com efeito, foi apurada a seguinte factualidade com interesse para a apreciação das funções que o recorrente desenvolveu na qualidade de “Director de Projectos  Especiais”:

- No âmbito da atribuição das funções de Director de Projectos Especiais foi solicitado ao A. que ficasse responsável pelo desenvolvimento do Projecto X (129);

-Tal Projecto visava, por via da centralização de informação, estudos e análise, aumentar a coordenação e eficácia na resolução de problemas de quebra, uma vez que o trabalho desenvolvido a este nível em cada loja se revelava insuficiente, impossibilitando, inclusivamente, a homogeneidade de procedimentos pretendida (130);

- Este Projecto era constituído por diversas vertentes, designadamente a análise e diagnóstico de causas, o estudo, proposta e acompanhamento de soluções, a definição e experimentação de métodos e processos a implementar (131);

-Atentos os objectivos do Projecto, o A. fez, em 19 de Maio de 2004, uma apresentação ao Board, na qual referiu o plano de acção a adoptar (132);

- O A. ficou adstrito a visitar as lojas da R. para proceder a uma análise detalhada das seguintes razões subjacentes à quebra verificada nas mesmas: identificar as fontes de quebra de uma forma exaustiva; encontrar nas diversas lojas soluções que pudessem ser posteriormente adoptadas em toda a companhia/empresa; reunir com os respectivos responsáveis (133);

- Ficou definido que a loja de Palmela seria a loja-padrão e, por isso, a primeira a ser visitada pelo A., tendo o mesmo, em 4 de Junho de 2004, apresentou o seu primeiro relatório sobre a evolução do seu trabalho referente ao Projecto X (134);

- O A. ficou de proceder à verificação dos motivos de quebra noutras lojas pertencentes à R. e de encontrar possíveis soluções para o problema (135);

- O A. desenvolveu, até à data da extinção, trabalho relacionado com o Projecto X (136).

Dos factos enunciados resulta que o posto de trabalho de “Director de Projectos Especiais” não constituía um “posto de trabalho” inexistente.

Importa também referir que o recorrente, embora tenha requerido à R. que lhe fossem atribuídas as funções de Director de Informática, não pediu a declaração de ilicitude da extinção deste posto de trabalho ( verificada em 2003) e passou a exercer as funções de Director de Projectos Especiais.

Vejamos, então, se a extinção do posto de trabalho de “Director de Projectos Especiais” foi lícita.

O art. 402º do CT de 2003 estabelecia: « A extinção do posto de trabalho determina o despedimento justificado por motivos económicos, tanto de mercado como estruturais ou tecnológicos, relativos à empresa, nos termos previstos para o despedimento colectivo».

No caso concreto foram invocados motivos de mercado para a extinção do posto de trabalho do recorrente.

De acordo com o disposto no art. 397º, nº2, a) do CT de 2003, consideram-se, nomeadamente, motivos de mercado a « redução da actividade da empresa provocada pela diminuição previsível da procura de bens ou serviços  ou impossibilidade superveniente, prática ou legal, de colocar esses bens ou serviços no mercado».

Conforme refere o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.09.2009 : « Ao tribunal apenas compete verificar a veracidade dos motivos estruturais, tecnológicos ou conjunturais que foram invocados pelo empregador e a existência de um nexo causal entre esse motivos e o despedimento, por forma a que, segundo juízos de razoabilidade, se possa concluir que tais motivos eram idóneos a justificar o despedimento colectivo».

Ao tratar do tema do  despedimento colectivo ( mas cujos ensinamentos também se aplicam à situação vertente de extinção de posto de trabalho) refere o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01.02.2001 : « O despedimento colectivo assenta em bases economicistas, pelo que não depende da verificação da impossibilidade de outra medida para a viabilização da empresa. (…)  Ao tribunal não compete substituir-se à entidade patronal no sentido de ser outra a medida da viabilidade da empresa».

Com relevo para apreciação desta questão resultaram assentes os seguintes factos:

- Desde 2001 que se verifica o decréscimo das vendas da R., as quais foram no valor de € 637.962.819,00 em 2001, de € 629.521.943,00 em 2002, de € 586.582.011,81 em 2003 e de € 552.090.207,00 em 2004 (93);

- Esta situação tem raízes, em parte, no actual quadro macroeconómico recessivo que se vive no nosso país, desde alguns anos, e que tem implicado uma redução do consumo privado ( 94);

- Esta redução do consumo privado tem efeitos imediatos de redução das vendas das empresas dedicadas à distribuição em grande superfície (cash & carry), quer do ramo retalhista quer do ramo grossista em livre serviço, como é o caso da R. (95);

- Acresce que a partir de 2001 se verificou um acréscimo da concorrência no referido sector de actividade, quer pelo aumento da oferta disponível quer pelas próprias estratégias comerciais adoptadas pelas empresas em consequência da redução das vendas (96).

Verifica-se, assim, uma diminuição da procura de bens da qual resulta uma diminuição da actividade da recorrida.

Perante a disparidade entre o resultado líquido do exercício de 2004 constante da decisão de despedimento -fls. 99 do processo apenso para extinção de posto de trabalho ( - 2 803 452) e o indicado no relatórios de contas a fls. 1324 ( 3 296 391) deverá prevalecer este último documento. Importa, porém, atender ao facto de o fundamento principal do despedimento respeitar ao invocado decréscimo de vendas.

De acordo com um critério de razoabilidade, a extinção do posto de trabalho do recorrente, tal como as demais medidas indicadas sob 98, 99 e 102, foi determinada pela necessidade de reduzir custos perante o decréscimo de vendas cuja veracidade foi apurada.

Resultou ainda assente que as funções desempenhadas pelo recorrente poderiam ser efectuadas com eventual recurso a processos de auditoria externa ( ponto nº 176).

Não resulta, porém, dos factos assentes que essas funções de auditoria  tenham passado a ser exercidas, de modo permanente, por serviços externos ( o que colocaria em causa a impossibilidade de subsistência da relação laboral invocada pela recorrida).

Alegou o recorrente que face « aos pontos nºs  1, 7, 11, 12, 17, 18, 59, 69, 81, 83, 121, 169 e 170 da matéria de facto dada como provada na douta sentença recorrida, impunha-se que, nos termos dos arts. 403º, nº2 e 432º, alínea b) do CT, fosse declarada a ilicitude do despedimento do A».

O ponto nº 121 dos factos provados foi considerado não escrito.

Estabelece o art. 403º, nº2 do CT de 2003 : « Havendo na secção ou estrutura equivalente uma pluralidade de postos de trabalho de conteúdo funcional idêntico, o empregador, na concretização de postos de trabalho a extinguir, deve observar, por referência aos respectivos titulares, os critérios a seguir indicados, pela ordem estabelecida :

1º Menor antiguidade no posto de trabalho;

2º Menor antiguidade na categoria profissional;

3º Categoria profissional de classe inferior;

4º Menor antiguidade na empresa».

Enquanto a prova dos requisitos do despedimento colectivo previstos no art. 403º, nº1 do CT de 2003 incumbe ao empregador, a violação dos referidos critérios de selecção, constitui, ao contrário do defendido pelo recorrente, um facto impeditivo do direito ao despedimento. O ónus da prova da violação destes critérios incumbe, assim, ao trabalhador ( art. 342º, nº2 do Código Civil), o que não foi efectuado.

No caso em apreço, verificamos ainda que os pontos nºs 1, 7, 11, 12, 17, 18, 59, 69, 81, 83 e 170 respeitam ao anterior posto de trabalho do recorrente ( Director de Informática) e não ao posto de trabalho cuja apreciação de licitude constitui objecto de apreciação.

No que respeita ao ponto nº 169, importa referir que o recorrente era o único trabalhador da Direcção de Projectos Especiais ( ponto 68), pelo que não ocorreu violação dos critérios de selecção a que alude o art. 403º n º2 do CT.. 

Constitui uma questão diversa apurar se a entidade empregadora não dispunha de outro posto de trabalho compatível com a categoria do trabalhador.

Conforme resulta do disposto no art. 403º, nº1, b) do CT de 2003, o despedimento por extinção de posto de trabalho só pode ter lugar desde que seja praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.

E de acordo com o nº3 deste preceito legal: « A subsistência da relação de trabalho torna-se praticamente impossível desde que, extinto o posto de trabalho, o empregador não disponha de outro que seja compatível com a categoria do trabalhador».

Estamos perante uma facto constitutivo do direito ao despedimento por extinção de posto de trabalho, pelo que o ónus da alegação e da prova incumbe à entidade empregadora.

Conforme refere Pedro Furtado Martins in “Cessação do Contrato de Trabalho”, 3ª edição,  pág. 295, no CT de 2003, « o que releva é saber se o empregador dispõe de um posto de trabalho cujo o conteúdo funcional seja compatível quer com a categoria objectiva ou género de actividade contratada, quer com a categoria normativa ou estatutária do trabalhador».

Ora, quanto a este requisito resultou provado sob 152 : Em Maio de 2005 a R. não dispunha de outros postos de trabalho com funções compatíveis com a categoria do A., porque os que existiam não estavam disponíveis, estando ocupados por outros trabalhadores.

Ocorreram negociações anteriores com vista à atribuição ao ora recorrente do cargo de Director de Segurança, mas a proposta da recorrida não foi aceite pelo trabalhador( ponto 46 dos factos provados) .

É certo que o recorrente efectuou uma contraproposta, mas a mesma não foi aceite ( conforme resulta do ponto 139 dos factos provados que está concretizado sob 140 a 145).

Alega o recorrente que, face à factualidade dada como provada sob os nºs 27, 58, 86 e 87, nunca o Tribunal a quo poderia ter julgado como lícito o despedimento do A., muito menos com fundamento na necessidade de reduzir custos, pelo que se entende que, também neste aspecto, a sentença impugnada violou o disposto nos arts. 402º e 403º, nº1 alínea a) e b) do CT.

Já acima citámos ao art. 403º, nº1, b) do CT de 2003.

Estabelece o art. 403º, nº1 a) do mesmo diploma legal, o despedimento por extinção de posto de trabalho só pode ter lugar desde que os motivos indicados não sejam devidos a uma actuação culposa do empregador ou do trabalhador.

Os invocados pontos nºs 27, 58, 86 e 87 prendem-se, respectivamente, com os custos da Direcção de Projectos Especiais, a construção de uma nova sede e remodelação de lojas, o custo da nova sede central ( 5,5 milhões de euros) e os custos da remodelação de lojas ( 16 milhões de euros).

Consideramos que destes factos não resulta a possibilidade de subsistência da relação de trabalho e uma actuação culposa da entidade empregadora na criação dos motivos da extinção do posto de trabalho.

A construção de uma nova sede e a remodelação das lojas respeitam à estratégia empresarial da recorrida que indicou os objectivos visados com tais actos ( pontos nºs 105, 106 e 109).

Invoca ainda o recorrente a actuação culposa da recorrida, com base nos factos acima indicados sob 167 e 168 que têm o seguinte teor:

- O volume das notas de débito não cobertas por acordos com fornecedores traduziu -se em números que no ano de 2002 ultrapassaram os 10 milhões de Euros (167);

- Os efeitos desta política, que obrigou a BB a repor dinheiro aos seus fornecedores, traduziram-se num prejuízo no ano de 2002 de cerca de 9.8 milhões de Euros, prejuízo suportado pela R., com repercussão nas contas do grupo (…), que já tinha apresentado os resultados aos seus accionistas (168).

Consideramos estes factos insuficientes para qualificarmos a conduta da recorrida como culposa. Estamos perante factos referentes a uma determinado período temporal que devem ser valorados com os demais factos acima indicados e de tais factos não resulta o nexo causal entre a emissão de notas de débito e os motivos da extinção do posto de trabalho.

A aquisição de várias viaturas de gama elevada para funcionários da empresa a exercer cargos superiores, os aumentos salariais e as obras de remodelação nas lojas da recorrida não permitem ao Tribunal concluir que era possível manter a relação de trabalho entre as partes. Tais aspectos respeitam, conforme acima referimos, à estratégia empresarial da entidade empregadora e não respeitam ao decréscimo de vendas.

A extinção do posto de trabalho de Director de Informática e a organização da área de informática em duas áreas foi operada no âmbito de um processo de reestruturação da recorrida e        não foi pedida a declaração de ilicitude da extinção deste posto de trabalho ( verificada em 2003).

Pelas razões enunciadas, concluímos que a extinção do posto de trabalho de Director de Projectos Especiais foi lícita.

                                               *

E) Passemos, agora, à análise dos créditos laborais que não foram objecto de fundamentação de direito em sede de sentença.

Os pedidos formulados sob as alíneas d), e) e f) da petição inicial respeitam, respectivamente, aos invocados créditos por isenção de horário de trabalho, a indemnização por danos morais e a prémios referentes aos anos 2001 e 2004.

Os pedidos cujo o aditamento foi admitido a fls. 977 respeitam a danos morais, despesas de telemóvel, despesas de gasóleo e descontos de funcionários não efectuados.

Vejamos, em primeiro lugar, o pedido formulado sob a alínea d) da petição inicial.

Sob alínea d) do referido articulado o ora recorrente pediu que a entidade empregadora seja condenada no pagamento da quantia de €81 583,00 a título de isenção de horário de trabalho.

A quantia peticionada respeita ao período de Maio de 2000 a Abril de 2003.

Atenta a data dos créditos peticionados, a título de isenção de horário de trabalho, dever-se-á aplicar o regime anterior ao CT de 2003.        

O Decreto-Lei nº 409/71, de 27 de Setembro ( na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 398/91, de 16/10 e pela lei nº 61/99, de 30.06) estipulava sob o art. 13º:

« 1- Poderão ser isentos de horário de trabalho, mediante requerimento das entidades empregadoras, os trabalhadores que se encontrem nas seguintes situações:

a)- Exercício de cargos de direcção, de confiança ou de fiscalização;

b)- Execução de trabalhos preparatórios ou complementares que pela sua natureza só possam ser efectuados fora dos limites dos horários normais de trabalho;

c)- Exercício regular da actividade fora do estabelecimento, sem controlo imediato da hierarquia.

2- Os requerimentos de isenção do horário de trabalho, dirigidos ao Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, serão acompanhados da declaração de concordância dos trabalhadores, bem como dos documentos que sejam necessários para comprovar os factos alegados.

3- Aos requerimentos referidos no número anterior é  aplicável o disposto nos nºs 5 a 7 do art. 10º.»

O art. 50º da LCT estabelecia o direito a uma retribuição especial para os trabalhadores isentos de horário de trabalho.

Discutia-se na jurisprudência se a autorização do IGT constituía uma formalidade ad substantiam para a validade e eficácia do regime de isenção de horário de trabalho ( por estarem em causa interesses de natureza pública) ou se o acordo entre as partes era vinculativo ( neste sentido, Acórdão do STJ de 08.02.2001, www.dgsi.pt).

Neste domínio concordamos com a posição perfilhada no Acórdão do STJ de 13.09.2006, www.dgsi.pt que dizia: «Refira-se que os apontados incisos do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 409/71, estatuíam que «[o] pedido de redução ou dispensa de intervalo de descanso considera-se tacitamente deferido se a Inspecção-Geral do Trabalho não proferir decisão final, dentro do prazo de 15 dias a contar da apresentação do requerimento» (n.º 5), que «[o] prazo referido no número anterior suspende-se se a Inspecção-Geral do Trabalho solicitar a prestação de informações ou a apresentação de documentos e recomeça logo que as informações ou os documentos forem entregues» (n.º 6) e que «[o] período do prazo posteriormente à entrega das informações ou dos documentos não pode ser inferior a cinco dias» (n.º 7).
Da conjugação dos normativos enunciados decorre que a autorização para o regime de isenção de horário de trabalho era concedida pela Inspecção-Geral do Trabalho mediante requerimento do empregador, com a prévia concordância do trabalhador, para além da comprovação documental dos factos alegados, sendo que os requerimentos de isenção de horário de trabalho deviam ser decididos no prazo de 15 dias, sob pena de deferimento tácito, o que aponta, decisivamente, no sentido de que a prestação de trabalho em regime de isenção de horário de trabalho só era legalmente admissível se, para além do interesse manifestado pelo empregador e pelo trabalhador, houvesse autorização prévia por parte da Inspecção-Geral do Trabalho, autorização que se configurava como uma formalidade ad substantiam para a validade e eficácia daquele regime de isenção». 

No caso concreto resultou apurado que a R. não requereu à IGT a admissibilidade da prestação de trabalho no regime de isenção de horário ( ponto 52).

Mas, mesmo que assim não se entendesse, apenas resultaram provados os seguintes factos: 

-O A. como Director necessitava de estar contactável telefonicamente para acompanhar a empresa fora do seu horário normal, 09h - 18h de Segunda a Sexta (88);

- O que a R. conhecia e com o que concordava (89);

-O A. enquanto Director de Informática tinha que estar contactável telefonicamente no período nocturno, altura em que corre o " Light-Run"( sistema informático de apuramento dos resultados das lojas (90);

-O eventual surgimento de um problema obrigava o A. a estar contactável telefonicamente e, por vezes, a deslocar-se ao seu habitual local de trabalho, sede da empresa da R (91);

- Ao A. foi atribuído um horário de trabalho das 9 horas às 18 horas de Segunda a Sexta- feira ( ponto 71 dos factos provados).

Consideramos os factos apurados insuficientes para concluirmos que foi acordada entre as partes a isenção de horário de trabalho.

Acerca da isenção do horário de trabalho dizia o professor Monteiro Fernandes in “ Direito do Trabalho”, vol. I, 6ª edição : « Resulta claramente do regime legal da isenção que esta se traduz na possibilidade ( para o empregador) de utilização dos serviços do trabalhador, não só à margem de um definido esquema cronológico de prestação ( horário), mas também independentemente dos limites máximos dos períodos normais de trabalho».

Conforme refere o Acórdão da Relação de Coimbra de 30.09.2004- www.dgsi.pt « afigurar-se-nos poder/dever concluir-se que o A. – cumprindo o seu horário normal de trabalho, mas disponibilizando-se a seguir para... – não estaria propriamente numa situação enquadrável nas legalmente previstas de isenção de horário de trabalho».

Improcede, desta forma, o pedido formulado sob a alínea d) da petição inicial.

                                                           *

Importa, agora, apreciar o pedido formulado sob a alínea e) da petição inicial.

Sob esta alínea o ora recorrente pediu a condenação da entidade empregadora no pagamento de €20 000, a título de danos morais.

Para fundamentar esta pretensão o ora recorrente invocou a violação do seu direito de se ocupar dentro da sua função, a retirada de gabinete próprio e da sua secretária pessoal, a suspensão verificada em Junho de 2003 e o despedimento.

Mais referiu que sentiu-se perseguido, maltratado e mais tarde ansioso e deprimido, tendo recorrido a ajuda médica.

Alegou ainda o ora recorrente na petição inicial que sentiu-se desacreditado perante os seus congéneres perante a política xenófoba da entidade empregadora.

Após a realização da audiência de discussão e julgamento, apurou-se o seguinte sob o ponto nº 92:

-O facto de a R. ter retirado ao A. o gabinete onde exercia funções como Director de Informática, ter-lhe retirado a sua secretária pessoal e tê-lo suspenso em Junho de 2003 por não dispor de espaço onde o colocar, determinou que o A. se sentisse perseguido e mal tratado e andasse cabisbaixo.

Consideramos estes factos insuficientes para atribuição de uma indemnização a título de danos não patrimoniais, pelas razões que iremos indicar.

Conforme supra referimos, o posto de trabalho de Director de Informática foi extinto e o recorrente não requereu a apreciação da licitude da extinção deste posto de trabalho, mas sim a apreciação da licitude da extinção do posto de trabalho de Director de Projectos Especiais, por considerar este posto de trabalho inexistente.

Verificamos, contudo, que o recorrente passou a exercer as funções de Director de Projectos Especiais e apenas reagiu judicialmente quando este posto de trabalho foi extinto.

A retirada da secretária pessoal e o gabinete onde exercia funções de Director de Projectos Especiais surgem como uma consequência da extinção do posto de trabalho de Director de Informática.

Consideramos que o posto de trabalho de Director de Projectos Especiais tinha conteúdo funcional, tendo o autor desenvolvido trabalho no âmbito do “Projecto Quebra”.

Na nossa perspectiva, não foi demonstrada a violação do dever de ocupação efectiva e apenas foi considerado assente sob os pontos nºs 137  e 138 :

- A R. suspendeu temporariamente a prestação de trabalho do A. de 26.05 a 12 de Junho de 2003, uma vez que, à data, o gabinete que viria posteriormente a ser atribuído ao A. encontrava-se em obras de remodelação;

- A desocupação do A. ocorreu em virtude da atribuição ao A. das funções de Director de Projectos Especiais com vista a evitar o seu despedimento com fundamento na extinção do posto de trabalho de Director de Informática e pelo facto do gabinete que viria a ser ocupado pelo A. ter sido sujeito a obras de remodelação.

A suspensão do exercício de funções no período indicado surge, neste contexto, justificada. 

Improcede, desta forma, o pedido de condenação da entidade empregadora no pagamento de uma indemnização a título de danos morais.

                                                           *

Na alínea f) da petição inicial, o recorrente pediu a condenação da entidade empregadora no pagamento dos prémios referentes aos anos de 2001 e 2004 no valor de € 77 660.

Sob o ponto nº 111 dos factos provados consta: A atribuição de bónus aos trabalhadores integra a política remuneratória da R., com o fim de aumentar a produtividade e a motivação dos seus trabalhadores.

Resulta do ponto nº 151 dos factos provados que a R. pagou ao A. o prémio anual correspondente ao ano 2001.

Em 2004  a R. não pagou bónus ao A. ( ponto nº22).

Verificamos, contudo, que a R. não impôs ao A. quaisquer objectivos subjacentes à atribuição do prémio anual relativo a 2004 (ponto nº 159 dos factos provados) e não pagou a qualquer trabalhador os prémios relativos ao ano de 2004 atentas as condições estabelecidas para a sua atribuição (ponto nº 181 dos factos provados).

Não foram apurados os pressupostos da atribuição do referido prémio.

Assim e considerando os factos apurados, verificamos que o prémio de 2001 foi pago e  inexistem elementos que permitam atribuir o prémio referente ao ano 2004.

Improcede, por isso, o pedido de condenação da entidade empregadora no pagamento dos peticionados prémios.

                                                           *

Por último, importa apreciar os pedidos cujo o aditamento foi admitido a fls. 977.

O despacho de fls. 977 foi proferido na sequência do requerimento de fls. 910 a 916, onde o recorrente alegou que a recorrida lhe moveu dois processos crime e um processo disciplinar com base na violação de confidencialidade de documentos. Mais referiu o recorrente que sentiu desgosto e quebra de auto-confiança pelo afastamento forçado do seu meio profissional e peticionou o pagamento de uma indemnização no montante de € 50 000, a título de danos morais.

Na parte admitida, no referido requerimento o recorrente peticionou ainda o pagamento das despesas de telemóvel, despesas de gasóleo e descontos de funcionários não efectuados.

No mencionado requerimento o recorrente alegou que em 04.12.2006 foi danificado o pára-choques traseiro do veículo, tendo a recorrida recusado pagar a reparação do veículo, pelo que o recorrente tem andado com referido veículo sem apresentação, o que causa dano irreparável na imagem.

Relativamente a este último aspecto, verificamos que resultou apurado que a manutenção da viatura atribuída ao autor sempre foi um custo assegurado pela R. ( ponto nº 185). Sob o ponto nº 66 foi apurado que a R. não procedeu à reparação do veículo do A. que sofreu danos no pára-choques.

O recorrente não peticionou o pagamento do custo da reparação ( o que seria considerado improcedente, uma vez que o despedimento foi considerado lícito) e apenas aludiu ao “dano de imagem” que não foi enquadrado na matéria de facto assente.

Improcede, nesta parte, a pretensão do recorrente.

O mesmo não sucede, na nossa perspectiva, com o pedido de pagamento das despesas com gasóleo e telemóvel.

Quanto a estes aspectos, resultou apurado:

- A R. pagava ao A. o seguinte:

- Retribuição-base = € 7.766,00;

- Subsídio de alimentação = € 102,00, e atribuiu-lhe;

- Carro da empresa para uso total ( 29);

- O A. intentou Providencia Cautelar de Suspensão do despedimento que veio a ser decretada a 14 de Julho de 2005, ainda antes de ocorrer a extinção do seu posto de trabalho ( 30);

- Na sequência do decidido pelo Acórdão do TRL proferido nos autos de procedimento cautelar e que confirmou a decisão da 1ª instância, a R. tem vindo a pagar ao A. todos os meses a remuneração de 7.766,00 e dispensou o A. de lhe prestar trabalho (57);

- A R. deixou de pagar ao A. qualquer importância para compra de gasóleo (65);

- A partir de Março de 2006 a R. deixou de pagar ao A. as despesas com o telemóvel. (67);

- A R. sempre pagou ao A. o gasóleo que este despendia para fins profissionais aos fins-de-semana e nas férias, nomeadamente, nas deslocações a Espanha (161);

- O A. despende mensalmente 200 euros em gasóleo em deslocações (162);

- A R. sempre pagou ao A. as despesas que ele efectuava com o telemóvel tanto por motivos profissionais como pessoais (163);

- O A. despende 80,00 euros mensalmente em comunicações por telemóvel (164);

- A R. pagava ao A.: Gasolina, telemóvel ( com todo o custo de chamadas suportado pela R.)  e Seguro de saúde abrangendo todo o agregado familiar (173);

-A R. pagava de leasing do carro da empresa atribuído ao A. a quantia mensal de 890,00 euros, de seguro de saúde a quantia mensal de € 154,50 e de seguro de acidentes pessoais a quantia mensal de € 50,00 (174);

-Na sequência da decisão do Tribunal da Relação de Lisboa que confirmou a providência cautelar de suspensão de despedimento, a R. entendeu dispensar o A. da prestação efectiva de trabalho, tendo este deixado desde então de efectuar quaisquer despesas ao serviço da R. (183);

- O pressuposto da atribuição do veículo é suportar principalmente os custos com a utilização funcional e, acessória ou residualmente, os custos relativos à utilização privada (184);

- O pressuposto da atribuição do telemóvel é suportar principalmente os custos com a utilização funcional e, acessória ou residualmente, os custos relativos à utilização privada (186).

Resulta dos factos provados que o recorrente manteve a posse do veículo que lhe foi atribuído pela recorrida ( ponto nº 74).

Decorre ainda dos factos assentes que a recorrida suportava as despesas privadas do recorrente com combustível e com telemóvel.

 O conceito de retribuição está consagrado no art. 249º do CT de 2003 e no art. 258º do CT de 2009.

A jurisprudência tem entendido que a utilização de veículo automóvel e de telefone na vida privada do trabalhador deve integrar a retribuição quando acarrete para o trabalhador um benefício de natureza económica com a sua utilização na sua vida privada ( vide, entre outros, Acórdão do STJ de  8.11.2006- www.dgsi.pt e Acórdão da Relação de Lisboa de 22.11.2006, Colectânea de Jurisprudência, 2006, tomo V, pág. 153).

Estamos perante prestações de natureza periódica, das quais resulta a atribuição de um valor pecuniário ao trabalhador, pelo que os referidos valores mensais ( €200- quanto ao combustível - e € 80- quanto ao telemóvel) deverão integrar a retribuição.

O despedimento foi considerado ilícito e o pedido de pagamento das despesas com combustível e telemóvel reporta-se a data posterior ao despedimento, mas enquanto perdurarem os efeitos da providência cautelar, a recorrida deverá assegurar o pagamento ao recorrente de todas as componentes retributivas.

A entidade patronal tem vindo a pagar ao recorrente todos os meses a remuneração de 7.766,00 e dispensou o mesmo de lhe prestar trabalho.

Embora a sentença proferida no âmbito dos autos de providência cautelar constitua título executivo no que respeita às retribuições vencidas enquanto vigorar tal providência ( art. 39º, nº2 do CPT), entendemos que nos presentes autos deverá ser esclarecido e reconhecido o carácter retributivo das prestações acima indicadas ( referentes às despesas com combustível e telemóvel).

 Resultaram ainda provados os seguintes factos:

-A partir de Fevereiro de 2006, a R. interditou o acesso do A. às lojas BB, impossibilitando-o de efectuar compras nessas lojas com o recurso ao cartão BB que confere 8% de desconto sobre as compras( 64);

- O A. com o recurso ao cartão BB efectuava mensalmente compras nas lojas BB (160).

Consideramos que os descontos atribuídos ao trabalhador na qualidade de funcionário com vista à aquisição de bens da entidade empregadora não integram a retribuição.

Estamos perante um benefício que tem natureza aleatória, que não é previsível no contexto em que, em concreto, é executado o contrato de trabalho ( vide Acórdão da Relação de Coimbra de 02.03.2011- www.dgsi.pt ).

A atribuição do referido benefício ao recorrente, tal como aos demais trabalhadores da recorrida, apenas se justificava antes do despedimento que veio a ser considerado lícito.

                                                           *

XIII- Em face do exposto, acorda-se em julgar improcedente o recurso de apelação e confirma-se a sentença recorrida, excepto na parte em que absolveu a recorrida do reconhecimento da natureza retributiva das quantias devidas ao recorrente a título de combustível e de telemóvel e decide-se condenar a entidade empregadora a reconhecer que as quantias de € 200 ( duzentos) euros por mês e €80 ( oitenta) euros por mês, a título, respectivamente, de despesas de combustível e telemóvel, integram a retribuição do trabalhador.

                                                           *

XIV- Custas  da acção e do recurso de apelação na proporção do decaimento.

Custas dos agravos não providos acima indicados sob II, IV, VI e IX e dos agravos cuja instância foi julgada extinta ( acima indicados sob V e VII) pelo recorrente.             

            Sem custas o recurso de agravo indicado sob VIII.

            Registe e notifique.

Lisboa, 24 de Setembro de  2014

Francisca Mendes

Maria Celina de J. de Nóbrega

Alda Martins

Decisão Texto Integral: