Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
946/20.0T8CSC.L1-8
Relator: RUI MANUEL PINHEIRO DE OLIVEIRA
Descritores: TELEVISÃO
REPORTAGEM TELEVISIVA
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
LIBERDADE DE IMPRENSA
OFENSA DO DIREITO À HONRA E DO BOM NOME
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/18/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I - Os direitos à honra, ao bom nome, à reputação e à imagem, por um lado, e os direitos à liberdade de expressão e de imprensa, por outro lado, têm idêntica dignidade constitucional (arts. 26.º, 37.º e 38.º da CRP), não podendo estabelecer-se, em abstracto, qualquer hierarquização desses direitos ou o primado de um sobre o outro;
II - Em caso de conflito desses direitos, a prevalência de um sobre o outro tem que ser apreciada e valorada perante o caso concreto, devendo prevalecer o que se mostre mais relevante e digno de maior protecção jurídica;
III - Face a uma notícia que, objectivamente, seja considerada ofensiva da honra e do bom nome de determinada pessoa e violadora da sua imagem e da reserva da sua vida privada, deve ponderar-se, nomeadamente: se a notícia prossegue um interesse legítimo e se insere dentro dos fins ético-sociais do direito de informar, digno de proteção jurídica; se as imputações são verdadeiras ou, não o sendo, se são verosímeis, no sentido de revestirem uma aparência de veracidade susceptível de convencerem o homem normal e assentarem numa base factual minimamente satisfatória e em fontes idóneas; se decorrem de uma investigação séria e cumpridora das regras deontológicas e dos cuidados que as concretas circunstâncias do caso, razoavelmente, exigiam;
IV – Nessa ponderação, deve fazer-se um juízo de prognose sobre a hipotética decisão que o TEDH adoptaria se o caso lhe tivesse sido submetido, no sentido de se verificar se é de admitir como muito provável que, sendo a questão colocada ao TEDH, tal órgão jurisdicional entenderia que foram extravasados os limites toleráveis do exercício da liberdade de expressão e informação;
V - Em caso afirmativo, impõe-se concluir que foram excedidos os limites da liberdade de expressão e de imprensa e que a violação dos direitos de personalidade não tem causa justificativa, o que dá lugar a responsabilidade civil delitual e à consequente obrigação de indemnizar;
VI - O art.º 34.º, n.º 4 da Lei de Imprensa, relativo à publicação de decisões judiciais,  não é aplicável à actividade televisiva, quer porque não se verificam, exactamente, as mesmas razões justificativas, quer atendendo à natureza excepcional da norma em causa, decorrente do seu carácter, indirectamente, sancionatório e das restrições que acarreta à liberdade de imprensa (art.º 11.º do CC), não havendo lugar, por isso, a publicação em televisão de uma sentença condenatória proferida em acção cível de efectivação de responsabilidade civil (à qual é aplicável o art.º 91.º da Lei da Televisão).
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes na 8.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:


I – RELATÓRIO
1.1. J intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra TELEVISÃO…., S.A.”, …., SGPS, S.A., A e C, pedindo a sua condenação a «pagar ao Autor, a quantia de 150.000,00€ a titulo de danos morais e ainda o valor que a título de danos patrimoniais se vier a apurar até à liquidação da sentença, que deverá ser, publicitada, em lugar de destaque, na estação televisiva … em horário nobre e nos exatos termos da reportagem por esta exibida a 12.02.2020, e novamente exibida na …., no dia 14 de Março pelas 22.30 horas e novamente no dia 15 de Março pelas 8.30 minutos».
Pretendia efectivar a responsabilidade civil extracontratual das RR. pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que lhe causaram com a transmissão, nas estações televisivas … e …, ambas detidas pela ….SGPS, S.A.,, de uma reportagem/debate, intitulada de “Burlas por Gestor do Banco”, da autoria da jornalista C e com a coordenação da jornalista A, lesiva dos seus direitos de personalidade.
1.2. As 1.ª, 3.ª e 4.ª RR. contestaram conjuntamente, impugnando parte da factualidade alegada pelo A. e defendendo, em suma,  a inexistência de qualquer facto ilícito praticado ou dano que mereça a tutela invocada e o ressarcimento peticionado, atendendo à realidade do que foi retratado na reportagem referida, à sua relevância jornalística, ao interesse público na sua divulgação, ao cumprimento das regras jornalísticas e ao comportamento público do A., tendo as RR. agido no âmbito do exercício da liberdade de expressão, prevista no art.º 37.º da Constituição da República Portuguesa, sem exceder os limites que têm vindo a ser definidos para o exercício de tal liberdade.
1.3. A 2.ª R. também contestou, arguindo a excepção dilatória da sua ilegitimidade passiva (por o seu objecto social se circunscrever à gestão de participações sociais noutras sociedades, sem que tenha qualquer intervenção ou ingerência nos conteúdos jornalísticos) e impugnando toda a matéria de facto alegada, por desconhecimento, defendendo que, no caso dos autos, se está perante o concreto e legítimo exercício dos direitos à liberdade de imprensa e de expressão, em que se incluem os direitos e o dever de informar e o direito a ser informado.
1.4. O A. pronunciou-se, por escrito, sobre a alegada excepção dilatória, propugnando pela sua improcedência, por, em suma, a 1.ª R. exercer e controlar a actividade de comunicação social, nomeadamente da ….
1.5. Com dispensa da audiência prévia, foi proferido despacho saneador, que julgou improcedente a excepção dilatória da ilegitimidade passiva da 1.ª R., tendo sido fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova, sem reclamações.
1.6. O A. apresentou, entretanto, articulado superveniente, através do qual alegou factos supervenientes relativos a alterações na sua situação profissional, imputáveis à reportagem em causa, com consequentes diminuição de rendimentos e aumento de despesas, bem como ao arquivamento de um processo crime contra si instaurado, demonstrativo da sua inocência, articulado esse que foi admitido, tendo as 1.ª, 3.ª e 4.ª RR. respondido, impugnando parcialmente os factos alegados e concluindo como na contestação.
1.7. Realizou-se a audiência final, após o que foi proferida sentença, que culminou com o seguinte dispositivo:
«julgo parcialmente procedente por parcialmente provada a presente acção, e consequentemente:
V.1-Condeno as Rés “.... TELEVISÃO, S.A”, ….SGPS, SA, A, e C solidariamente a pagar ao A. J a quantia de €100.000,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais.
V.2.Condeno as 1.ª e 2.ª RR. após trânsito, a publicar a presente sentença, em lugar de destaque, na estação televisiva ..., em horário nobre nos termos do Artigo 34.º da Lei de Imprensa.
V.3.Absolvo as RR. do demais peticionado.
*
Custas cargo do Autor e das Rés na proporção do decaimento, nos termos do art.º 527º, n.º 1 e 2, do C.P.C.».
1.8. Inconformadas apelaram, conjuntamente, as quatro RR., pedindo que tal sentença seja revogada e substituída por decisão que declare a improcedência da acção, formulando para tanto as seguintes conclusões:
«A) As Recorrentes não podem de forma alguma conformar-se com a douta sentença sob recurso e entendem que a mesma julgou incorretamente a matéria de facto, fazendo uma errada interpretação da lei e da ponderação do conflito de direitos existente entre os direitos alegados pelo autor e o dos Rés jornalistas aqui Recorrentes, que resultou numa condenação injusta, na atribuição ao autor de quantia indemnizatória ilegal, absurda e desproporcional e numa decisão de publicação da sentença ilegal e fundada em legislação inaplicável ao caso.
B) A douta sentença faz uma errada interpretação e aplicação do disposto nos art.ºs 8.º, 16.º, 18.º, 26.º, 37.º e 38.º da Constituição da República Portuguesa, do art.º19.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, do art.º 19.º do Pacto Internacional relativo aos Direitos Civis e Políticos e do art.º 10.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem;
C) Revela uma errada interpretação e aplicação do disposto nos art.ºs 335.º, 483.º, 484.º , 487.º, 494.º e 496.º do Código Civil, e faz também uma errada interpretação e aplicação do disposto no art.º 34.º, n.º 1 e 4, da Lei n.º 2/99, de 13/01(Lei de Imprensa), e bem assim do disposto nos art.ºs 1.º, 71.º, n.º 4 e 91.º, da Lei 27/2007 de 30/07 (Lei da Televisão e dos Serviços Audiovisuais a Pedido)
D) Não pode deixar de se dizer que os Recorrentes entendem que o Tribunal a quo andou muito mal na apreciação da matéria de facto, tendo aderido acriticamente a uma versão vertida na petição inicial, cuja transcrição é evidente, longa e excessiva, que não tem suporte probatório e desafia os mais elementares raciocínios de lógica e da razão.
E) A fundamentação e motivação da matéria de facto, apesar de extensa e meramente descritiva, é incapaz de efetuar qualquer valoração efetiva e critica dos depoimentos e da prova, sendo absolutamente insuficiente para se perceber que depoimentos e documentos foram valorados e porquê.
F) De acordo com os meios de prova disponíveis, mas também fruto da acrítica cópia da Petição Inicial, é possível concluir que, pelo menos, os factos identificados sobre os n.ºs 64, 67, 73, 80, 81, 83, 84 da douta decisão devem ser corrigidos, quando não eliminados, já que não se encontram minimamente suportados pelo conjunto da prova junta ao processo, não decorrem de qualquer confissão ou contém ínsitas conclusões que não decorrem e/ou contrariam a prova produzida nos autos.
G) E notório pela transcrição da reportagem no facto provado 50, que a jornalista afirmou expressamente que: “(…) foi notícia o caso da acompanhante de Luxo que acusava um bancário de …. a tinha enganado… a relação terminara em 2016… com o bancário a exigir o apartamento de volta…a acompanhante chegou a processar J por burla…J contestou … depois da notícia as partes chegaram a acordo… com processo arquivado em Abril de 2018(…)”.
H) O facto provado 64 ser retirado da matéria de fato dada como provada, pois não corresponde à prova constante dos autos e é contraditório com facto provado 50, ou, pelo menos ser corrigido e passar a ser afirmativo, com a seguinte redação: foi mencionado na reportagem a extinção do processo crime, onde era queixosa a referida “acompanhante de Luxo” de nome E.
I) Da prova constante dos autos e da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, não podem resultar provados os factos n.º 67 e 73, uma vez que a prova produzida em audiência é manifestamente contrária sobre tais factos, não permitindo a sua fixação, que para mais são conclusivos e contraditórios com outros factos provados.
J) não só os dois identificados factos provados repetem essencialmente a mesma factualidade, o que necessariamente sempre imporia a sua correção, como as declarações da Ré C são suficientes para desmistificar a ideia de que o autor não foi contactado e que não teve oportunidade de expor a sua versão
K) Porque é essencialmente isso que a Mma. Juíza a quo pretende erradamente extrair destes dois repetidos factos provados
L) As declarações da Ré C, que se encontram gravadas através do sistema integrado de gravação digital da sessão de julgamento de 11/10/2022, com a referência 20221011103118, dos 2 minutos e 55 segundos, até aos 8 minutos e 20 segundo, impõem decisão diversa sobre esses factos
M) As declarações prestadas de forma credível, espontânea e serena, conclui-se que a jornalista tentou ouvir a versão do autor, entendeu que a melhor forma de o fazer era dirigir à assessoria de imprensa do banco um pedido para o seu contacto, que foi especificamente rejeitado, ficando a jornalista com a sensação de que não existia a vontade de esclarecer a questão.
N) Não existindo qualquer motivo ou prova que contrarie a sua versão dos factos e sendo para mais evidente – cfr. factos provado 37 e 37 – que enviou ao Banco um pedido de esclarecimentos que incluía especificamente o pedido de contato do Autor, que também especificamente rejeitou prestar esclarecimentos, assim sendo clara que pretendeu ouvir a sua versão e lhe concedeu oportunidade para isso.
O) Devem por isso ser completamente eliminados da matéria de facto provada os aludidos factos n.º 67 e 73, até por, para mais, comportam em si mesmos a visão jurídica que a Mma. Juíza tinha reservado para os presentes autos e que também já é patente das sucessivas e orientadas interrupções do depoimento da jornalista e que se podem verificar na audição do trecho supra salientado.
P) Da mesma forma, os factos 80 e 81, em que o Mma. Juiz a quo fixa que a jornalista poderia ter informado a mandatária do autor e que esta alegou que tinha prova documental da sua inocência, não têm sustentação na prova e, para mais são em grande medida conclusivos.
Q) as únicas declarações sobre o conteúdo dos factos 80 e 81, de pessoas que estiveram presentes, são as da Jornalista Ré, C cujas declarações se encontram gravadas através do sistema integrado de gravação digital da sessão de julgamento de 11/10/2022, com a referência 20221011103118, dos 14 minutos e 40 segundos, até aos 17 minutos e 21 segundo
R) Destas declarações e do testemunho do N, cujas declarações se encontram gravadas através do sistema integrado de gravação digital da sessão de julgamento de 19/12/2022, com a referência 20221219141204, não é possível extrair todo o conteúdo fáctico incluído pela Mma. Juíza nos identificados factos provados 80 e 81, designadamente não é suficiente para fixar que a jornalista C se recusou a informara a mandatária do autor e que esta tinha prova documental da inocência do autor.
S) Devendo por consequência tais factos serem corrigido, passado a ter a seguinte redação: A Ré C quando esteve no escritório da mandatária do Autor não informou que este era o visado da reportagem a exibir porque ainda não tinha terminado o trabalho de investigação da notícia.
T) Acresce que, com facto 83 sucede o mesmo do que com os identificados factos 64 e 50, mas desta vez a contradição é com o facto provado 51.
U) Deve por isso o facto provado 83 ser retirado da matéria de fato dada como provada, pois não corresponde à prova constante dos autos e é contraditório com facto provado 51, ou, pelo menos ser corrigido e passar a ser afirmativo, com a seguinte redação: Na aludida reportagem foi mencionado que o processo de investigação tinha sido indeferido pelo Banco, não sendo mencionado o processo disciplinar instaurado pelo Banco ao Autor e que tinha sido objecto de decisão de arquivamento.
V) Por outro lado, entendem os Recorrentes que existe um conjunto de factualidade que, tendo sido por estes alegada na contestação, em função da prova dos autos e que por não ter sido posta em crise, deveria ter sido dada como provada.
W) Designadamente, tendo em atenção o depoimento da jornalista C e da testemunha N era exigível e possível fixar a seguinte matéria de facto:
- A jornalista e o repórter de imagem que a acompanhou, ouviram vários testemunhos idênticos e credíveis de outros lesados pelo Autor, que não quiseram dar a cara, mas que foram determinantes na consolidação reportagem.
- O recorte de jornal Correio da Manhã, que foi exibido na reportagem, foi fornecido à jornalista por outra das fontes que não tendo participado na reportagem, relatou à jornalista e ao seu repórter de imagem um esquema em tudo idêntico
X) É claro o que a Jornalista Ré, C, cujas declarações se encontram gravadas através do sistema integrado de gravação digital da sessão de julgamento de 11/10/2022, com a referência 20221011103118, dos 25 minutos e 50 segundos, até aos 28 minutos e 40 segundo, diz sobre esta matéria.
Y) Tal como é o testemunho do N, cujas declarações se encontram gravadas através do sistema integrado de gravação digital da sessão de julgamento de 19/12/2022, com a referência 20221219141204, a partir do minuto 11 e até ao minuto 19.
Z) O que sobre estes factos consta destas declarações é esclarecedor, coerente e credível, não tendo sido de qualquer forma posto em causa no decurso dos depoimentos de outras testemunhas ou por qualquer outra forma, nem pelo Tribunal, nem pelo autor, devendo ser dados como provados os identificados factos.
AA) Por outro lado, é convicção dos Recorrentes que o Tribunal a quo efetuou uma errada ponderação dos interesses em jogo no conflito de direitos entre os direitos do autor e os dos aqui Recorrentes, especialmente o das Rés jornalistas.
BB) Os Recorrentes, no caso concreto, agiram no âmbito do exercício da liberdade de expressão, prevista no art.º 37.º e 38.º da Constituição da República Portuguesa, e não decorre dos autos, que tenham sido excedidos os limites que têm vindo a ser definidos para o exercício de tal liberdade. Até muito pelo contrário.
CC) Destaca-se aqui, sobretudo, a liberdade de publicação, difusão ou de divulgação, a qual, nos termos das referidas disposições, se traduz na inexistência de impedimentos, discriminações, de censura, de autorização, caução ou habilitação prévia, apreensão ou embaraço ilegal de composição, impressão, distribuição e livre circulação de quaisquer publicações.
DD) O douto Tribunal a quo entendeu de forma diversa, mas fê-lo adotando uma errada ponderação dos factos e fazendo uma errada aplicação do direito e dos preceitos constitucionais que está em claro desuso e minoria na doutrina e na jurisprudência, claramente afirmando o primado do direito ao bom nome e à imagem sobre a liberdade de expressão e informação.
EE) Ao contrário do que sustenta a Mma. Juíza a quo, a jurisprudência mais recente não sustenta, nem defende, a tese segundo a qual o direito ao bom nome é prevalecente ou tem igual dignidade que a liberdade de expressão e informação e a jurisprudência nacional tem adotado e sedimentado consistentemente a jurisprudência do TEDH, mais liberal e permissiva do que a jurisprudência nacional, entendendo o TEDH que, a haver alguma hierarquia abstrata entre tais direitos, deve tender-se a dar prevalência à liberdade de expressão.
FF) O TEDH tem consistentemente afirmado, que a liberdade de expressão vale não somente para as “informações” ou “ideias” favoráveis, inofensivas ou indiferentes, mas também para aquelas que ofendem, chocam ou inquietam, e exige uma interpretação restritiva das exceções ou condicionamentos à liberdade de expressão previstos no nº2 do art.º 10º da Convenção Europeia, sustentando que a ingerência litigiosa que configure um condicionamento deve corresponder a uma necessidade social imperiosa e ser proporcional ao objetivo legítimo pretendido.
GG) Progressivamente, o nosso Supremo Tribunal de Justiça foi assumindo os parâmetros valorativos adotados pelo TEDH, reconhecendo que a Constituição da República Portuguesa não estabelece qualquer hierarquia entre o direito ao bom nome e à vida privada e o direito à liberdade de expressão e informação, admitindo claramente que quando em colisão, devem tais direitos considerar-se como princípios suscetíveis de ponderação ou balanceamento nos casos concretos, afastando-se qualquer ideia de supra ou infravaloração abstrata.
HH) Atualmente, as decisões do STJ sobre esta matéria radicam essencialmente nos parâmetros preconizados pelo TEDH.
II) Tendo presente que o direito ao bom nome e à reputação não gozam de garantia autónoma por parte da CEDH, o processo decisório deverá centrar-se unidireccionalmente em controlar se a ingerência, enquanto restrição à liberdade de expressão, encontra justificação pelos critérios fixados no n.º 2 do artigo 10.º, do CEDH.
JJ) De acordo com esta perspetiva, só são admitidas restrições ao exercício da liberdade de expressão que constituam providências necessárias, numa sociedade democrática à realização da proteção da honra ou dos direitos de outrem.
KK) Na doutrina civil não suscita controvérsia que o exercício de um direito consubstancia uma causa de exclusão da ilicitude, sublinhando-se que o art.º 483.º, n.º 1, do Código Civil pressupõe a possibilidade de violação lícita de direitos de outrem ou de normas dirigidas a proteger interesses alheios, a que corresponde uma causa justificativa.
LL) No plano jurídico-legal, há que fazer também menção ao regime de tutela da honra no âmbito penal do art.º 180.º do Código Penal, que tipifica como crime de difamação a conduta de quem, dirigindo-se a terceiro, imputar a outra pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, um facto, ou formular sobre ela um juízo, ofensivos da sua honra ou consideração, e estabelece no seu n.º 2, que a conduta não é punível quando “a) A imputação for feita para realizar interesses legítimos; e b) O agente provar a verdade da mesma imputação ou tiver tido fundamento sério para, em boa fé, a reputar verdadeira.”
MM) E ao que dispõe o especifico regime jurídico aplicável á atividade televisiva, a Lei n.º 27/2007, de 30/07, a Lei da Televisão, que no seu art.º 71.º, n.º 4, estabelece como causa de exclusão da ilicitude que: “Tratando-se de declarações corretamente reproduzidas ou de intervenções de opinião, prestadas por pessoas devidamente identificadas, só estas podem ser responsabilizadas, salvo quando o seu teor constitua incitamento ao ódio racial, religioso, político ou gerado pela cor, origem étnica ou nacional, pelo sexo ou pela orientação sexual, ou à prática de um crime, e a sua transmissão não possa ser justificada por critérios jornalísticos.
NN) Se é obvio que o respeito pela dignidade da pessoa humana exige uma resposta adequada em termos de proteção dos direitos de personalidade inerentes à condição humana, mas não menos carecido de proteção, encontra-se a necessidade de assegurar a liberdade de expressão e de informação, e o princípio da liberdade de imprensa, essencial à formação de uma esclarecida opinião pública, como é exigência do nosso estado de direito democrático.
OO) Entre os direitos consagrados nos artigos. 26.º e 37.º da CRP, direito à ao bom nome e a liberdade de expressão, não é possível estabelecer qualquer relação de hierarquia, pois, ambos se revestem de idêntica dignidade constitucional, a avaliar quer pela respetiva inserção sistemática, no capítulo da Lei Fundamental dedicado aos “Direitos, liberdades e garantias pessoais”, quer pela sua submissão ao regime especial de proteção conferido pelo art.º 18.º da CRP.
PP) A nossa Constituição, no seu art.º 37.º, rejeita por completo a submissão do exercício da liberdade de expressão e de informação a qualquer forma de censura, apenas admitindo limites ao seu exercício, reconhecendo que as infrações cometidas no seu exercício ficam sujeitas aos princípios gerais de direito criminal e do ilícito de mera ordenação social.
QQ) Do que se acabou de referir não obsta a que o julgador, em face da necessidade de otimização dos direitos fundamentais e a partir da ponderação dos interesses que o caso concreto envolve, tente harmonizá-los ou mesmo estabelecer qual o valor que deverá prevalecer na situação concreta, pois só colocados perante a mesma, em concreto, é possível resolver o conflito.
RR) Compete ao julgador ponderar os valores e interesses envolvidos, avaliando a eventual medida da restrição, em face da necessidade prática de aplicar os dois direitos em conflito, definindo qual o que deverá ceder no caso concreto de acordo com o princípio da proporcionalidade consagrado no art.18.º, n.º 2, da CRP
SS) É o que para este efeito dispõe o art.º 335.º do Código Civil, considerado como materialmente constitucional, que concede ao intérprete um critério para a resolução prática do conflito de direitos, regulando que “(…) devem os titulares ceder na medida do necessário para que todos produzam igualmente o seu efeito, sem maior detrimento para qualquer das partes.”
TT) Por esta via se chega facilmente à conclusão de que não há lugar a qualquer responsabilidade por parte dos Recorrentes, já que não foi nunca ultrapassada a fronteira da licitude do direito de informar, sendo esse o único e exclusivo desiderato das jornalistas Rés.
UU) No caso em apreço, as Rés jornalistas com a emissão da aludida reportagem em 12 de fevereiro de 2020, pretenderam apenas e só cumprir a sua função pública de informar, de esclarecer e avisar a opinião pública sobre um tema de incontornável interesse e significado para o público português em geral, fornecendo toda a informação que para isso possa ser relevante, quer ela seja coincidente com a versão defendida por uns, ou oposta à versão defendida por outros.
VV) Os factos supra descritos na reportagem, nomeadamente os atinentes à gravidade das denuncias efetuadas pela sociedade Principal Prioridade e as suas consequências na confiança no sistema financeiro e bancário português, impõem inclusivamente que se determine que não existe qualquer conflito de direito, já que o direito das Rés à liberdade de expressão sempre deverá prevalecer sobre o direito do autor
WW) Ainda que assim não se entenda, o que apenas se admite por cautela de patrocínio, sem conceder, sempre se dirá que em sede de apreciação da concordância prática entre os direitos do autor e os dos Recorrente se deve determinar a prevalência do direito de liberdade de expressão de que beneficiam as Rés enquanto órgão de comunicação social e jornalistas, pois atuaram unicamente no cumprimento de um dever, bem como no exercício do seu direito legítimo de radiodifundir um conteúdo jornalístico, tendo-o feito de forma adequada e proporcional, apenas pretendendo a informação e o esclarecimento da opinião pública num caso de evidente e manifesto interesse publico e jornalístico.
XX) O que foi referido e mencionado na reportagem, resulta desde logo das declarações dos identificados responsáveis da empresa PP Lda., que de forma clara e evidente assumiram as denuncias que fizeram contra o comportamento profissional do autor quer junto do Banco, quer juntos das autoridades judiciais, com a apresentação de uma queixa crime.
YY) Para além disso a Ré jornalista, por forma a aquilatar da credibilidade das denuncias confrontou e cruzou diversas outras fontes testemunhais e documentais, que confirmaram os factos relatados pelos responsáveis da PP.
ZZ) E foi dada oportunidade de audição do autor – que recusou através da sua entidade empregadora exercer o contraditório que lhe foi proporcionado.
AAA) Motivo pelo qual tinha e tem a jornalista C – e por consequência todas a Rés - todas as razões para, de boa-fé, considerar como absolutamente credíveis os factos relatados pelos denunciantes, e divulgados na referida reportagem.
BBB) O único interesse e motivação das Rés jornalistas na investigação, tratamento e elaboração da reportagem sobre o tema referido nos autos foi exatamente o de cumprir com a sua função de jornalistas, denunciando uma situação de claro interesse publico e comunitário e que mais uma vez demonstra as fragilidades e as possibilidades de manipulação do sistema financeiro e bancário português.
CCC) Servindo também de alerta e de chamada de atenção para a muitas vezes injustificada confiança que particulares e empresas depositam nos seus gestores de contas bancárias e outros funcionários dos bancos e que tem resultado em inúmeras e incontáveis fraudes e burlas, com reflexos graves na vida económica de particulares e empresas.
DDD) A avaliação operada pela Mma. Juíza a quo na sentença sob recurso está completamente errada e viciada nos seus pressupostos elementares.
EEE) A jornalista cumpriu os seus deveres deontológicos. Despendeu horas a cruzar informação com fontes, escalpelizou todos os documentos para perceber a história e eliminar “pontas soltas”, ouviu testemunhas, requereu a consulta e consultou dois processos judiciais que ninguém, nem mesmo o Banco, tomou a iniciativa de consultar.
FFF) Por outro lado, a Jornalista Ré reproduziu corretamente as denuncias de pessoas devidamente identificadas que assumiram serem vítimas da ação do autor e que descreviam pormenorizadamente as razões das denuncias. História que foi corroborada por outros lesados.
GGG) É por isso completamente falso que a jornalista que investigou e elaborou a reportagem tenha assumido qualquer comportamento suscetível de promover a lesão da dignidade pessoal ou da privacidade de quem quer que seja, explorando uma situação para a qual não tinha provas, como se alega na sentença sob recurso.
HHH) A identificação do autor na reportagem emitida pela .... – pelo seu nome e imagem – era absolutamente necessária, indispensável e proporcional quer em função da gravidade dos factos relatados na reportagem, quer pela necessidade de evitar confusão com os demais funcionários bancários da mesma instituição que não eram de todo visados pelas denuncias da já referida sociedade comercial.
III) Para as Recorrentes jornalistas, do que se trata, é apenas e só de esclarecer a opinião pública, fornecendo toda a informação que para isso possa ser relevante, quer ela seja coincidente com a versão defendida por uns, ou oposta à versão defendida por outros. JJJ) Impõe-se por isso que em sede de apreciação da concordância prática entre os direitos do autor e os dos Recorrentes, se determine a prevalência do direito de liberdade de expressão de todos os Recorrentes, pois atuaram unicamente no cumprimento de um dever, bem como no exercício do seu direito legítimo de radiodifundir uma reportagem informativa, e fizeram-no de forma adequada e proporcional, apenas pretendendo o esclarecimento da opinião pública, pela difusão das duas principais versões dos acontecimentos em conflito.
KKK) Ao decidir como consta da douta decisão, o Mmo. Juiz a quo, violou o disposto nos art.ºs 17.º, 18.º 26.º, 37.º e 38.º da Constituição da República Portuguesa, art.º 10º da Convenção Europeia dos Direitos de Homem e nos art.ºs 70.º e 335.º do Código Civil, e o art.º 71.º, n.º 4 da Lei da Televisão.
LLL) Tendo também efetuado uma errada interpretação e aplicação do disposto nos art.ºs 483.º, 487.º, 494.º e 496.º do Código Civil.
MMM) Encontrando-se a atuação dos ora Recorrentes enquadrada no exercício de um direito – o direito de informar – cujos limites, como vimos, não foram excedidos, não se pode preencher o pressuposto da ilicitude, conditio sine qua non da responsabilidade civil e consequente dever de indemnizar invocado pelo autor.
NNN) Foi demonstrada e desenvolvida supra a intenção dos Réus ao proceder à elaboração e à difusão da notícia dos autos, que não vai além do lícito e estrito exercício do dever de informar, feito em termos puramente objetivos, limitando-se a narrar a realidade tal como ela se apresentava aos seus olhos.
OOO) Está também totalmente ausente o requisito da culpa na produção de qualquer prejuízo ao autor na medida em que a culpa deve ser apreciada segundo o critério de um bom pai de família, nos termos do disposto no art.º 487.º, n.º 2, do Código Civil.
PPP) Nenhum facto dado como provado sustenta a decisão do douto Tribunal a quo, que entendeu que os Recorrentes agiram com culpa na divulgação das reportagens.
QQQ) Não sendo ilícita nem culposa a conduta dos Recorrentes afastada fica a responsabilidade civil extracontratual de todos, pois sem esses pressupostos inexiste obrigação de indemnizar.
RRR) Mas ainda que se verificasse o requisito da ilicitude ainda seria discutível o dever de indemnizar a título de danos não patrimoniais. Nos termos do art.º 496.º do C. Civil, na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, em montante a fixar equitativamente pelo tribunal, tendo em conta as circunstâncias referidas no art.º 494º, ou seja, grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem.
SSS) A gravidade dos danos não patrimoniais não deve medir-se por padrões subjetivos, cabendo ao tribunal, em cada caso, se o dano, face à sua gravidade, merece ou não a tutela do direito
TTT) Não cremos que se possa concluir que o autor tenha sofrido danos da natureza não patrimonial que justifiquem a tutela do direito, tendo em consideração tudo o que foi aqui referido e a motivação da presente ação.
UUU) Sustentam por isso os Recorrentes que, seja como for, a publicação da notícia não ocasionou quaisquer danos não patrimoniais a ressarcir, pois não ficou provado a existência de concretos danos decorrentes da suposta lesão da vida privada do autor e que pela sua gravidade e persistência mereçam ser indemnizados.
VVV) Por outro lado, a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado.
WWW) Caso assim se não entenda, sem conceder, deve o montante da indemnização fixado na Sentença recorrida ser reduzido, atento o disposto no art.º 494° do Código Civil.
XXX) A quantia que o tribunal a quo entendeu considerar justa reparação é manifestamente ilegal, absurda, excessiva e desproporcional, por inobservância e violação do disposto nos artigos 483.º, 487.º e 496.º do Código Civil que deverá ser, em última instância, objeto de reapreciação.
YYY) Também andou e fundamentou mal o Tribunal a quo quando decidiu condenar “(…) as 1.º e 2.º RR, após trânsito em julgado, a publicar a presente sentença, em lugar de destaque, na estação televisiva ..., em horário nobre nos termos do artigo 34.º da Lei de Imprensa.
ZZZ) O referido art.º 34.º da Lei de Imprensa (Lei n.º 2/99 de 13/01) é inaplicável ao presente caso.
AAAA) Nenhum dos Recorrentes exerce a atividade de Imprensa, mas sim a atividade televisiva, a noticia em causa nos autos não foi distribuída via publicação escrita, via emissão televisiva e por isso a legislação especificamente aplicável à atividade é a Lei n.º 27/2007, de 30/07, a Lei da Televisão e dos Serviços Audiovisuais a Pedido, que para o efeito de publicação de decisões judiciais, tem uma norma posterior especifica, com um conteúdo e abrangência normativo diverso e mais restritivo, o seu art.º 91.º, sob a epigrafe Difusão das Decisões.
BBBB) No confronto dos dois normativos, no caso da atividade televisiva, a possibilidade de requerimento da difusão de sentenças condenatórias apenas se restringe a decisões referentes a crimes “cometidos através da televisão”, circunscreve-se à sua “parte decisória” e não é aplicável, como no caso Lei da Imprensa “em ações de efetivação de responsabilidade civil.”
CCCC) A legislação aplicável à atividade das Rés é a Lei da Televisão, a Lei n.º 27/2007, de 30/07, que regula especifica e detalhadamente o regime jurídico da difusão de sentenças judiciais no seu art.º 91.º, e, portanto, a decisão da Mma. Juiza de “publicar a presente sentença, em lugar de destaque, na estação televisiva ..., em horário nobre nos termos do artigo 34.º da Lei de Imprensa” é manifestamente ilegal, resulta de dispositivo legal inaplicável ao caso concreto, devendo ser revogada e substituída por outro que não dê provimento a esse específico pedido do autor.
DDDD) Ao decidir como consta da douta decisão, o tribunal a quo, violou o disposto nos artigos, os artigos, 483.º, 487.º e 496.º do Código Civil os artigos 17.º, 18.º, 26.º, 37.º e 38.º da Constituição da República Portuguesa, o artigo 10.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos e o artigo 335.º do Código Civil, e o art.º 91.º, da Lei da Televisão, devendo, por isso, ser proferida nova sentença que absolva integralmente os Réus».

1.9. O A. contra-alegou, defendendo a manutenção da decisão recorrida, sem, contudo, sintetizar as suas alegações em conclusões.
1.10. Colhidos os vistos, cumpre decidir.
II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
Decorre do disposto nos arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1 do CPC, que as conclusões delimitam a esfera de actuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial (cfr., neste sentido, Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2017, pág. 105 a 106).
Assim, atendendo às conclusões supra transcritas, as questões essenciais a decidir consistem em saber:
a) se deve ser alterada a matéria de facto;
b) se a sentença recorrida fez correcta aplicação e interpretação dos arts. 8.º, 16.º, 18.º, 26.º, 37.º e 38.º da Constituição da República Portuguesa, do art.º 19.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, do art.º 19.º do Pacto Internacional relativo aos Direitos Civis e Políticos, do art.º 10.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, dos arts. 335.º, 483.º, 484.º, 487.º, 494.º e 496.º do Código Civil, do art.º 34.º, n.ºs 1 e 4, da Lei n.º 2/99, de 13.01 (Lei de Imprensa), e dos arts. 1.º, 71.º, n.º 4, e 91.º da Lei n.º 27/2007, de 30.07 (Lei da Televisão e dos Serviços Audiovisuais a Pedido).
III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
3.1. A sentença sob recurso considerou provada a seguinte matéria de facto:
«1. O Autor J é casado com F desde 31/10/2016, na altura deste casamento o A. tinha 45 anos.
2. Tem 4 filhos, 3 nascidos do anterior casamento com S,
3. É bancário de profissão, admitido no banco x, em 24/07/1995, desempenhando a sua atividade no Banco desde 04/04/2011, por aquisição do banco x, com as funções de Gestor de Cliente Empresas na DCEI – Centro de Empresas de …...
4. No Banco o A. desde 04/04/2011 até 12 de Fevereiro de 2020 exerceu funções enquanto Gestor de Cliente de Empresa na DCEI – Centro de Empresas de ….
5. A sociedade por Quotas PP, Lda. foi constituída em 18/11/2010 tendo como objecto a indústria de construção civil e empreitadas de obras públicas. Actividades de promoção imobiliária. Compra e venda de bens imóveis e revenda dos mesmos adquiridos. Exploração de serralharia civil, designadamente fabrico e comércio de artigos em metal e respectiva colocação em obra, tendo como gerente J. M é esposa de J, exercendo a sua actividade profissional na PP, Lda., auxiliando igualmente o marido na gerência da empresa.
6. A PP, Lda. a partir de Maio de 2017 começou a apresentar dificuldades económicas, tendo acabado por ser declarada insolvente por dívidas no montante não inferior a 4 milhões de euros.
7. O A. foi gestor de cliente da sociedade PP, Lda. no Banco onde aquela sociedade tinha conta bancária aberta no Banco, sediada no Centro de Empresas de ….
8. J é o gerente da sociedade PP. Lda. desde a sua constituição em 18/01/2010.
9. J e M são representantes legais das sociedades “A. Lda.” e “S., Lda.”.
10. A Ré … SGPS, SA detém a Televisão, SA com os seus canais .... e à data .... tendo apresentado o relatório anual junto como doc. 1 com o requerimento 35339041 nos autos de procedimento cautelar apenso cujo teor aqui se dá por reproduzido.
11. No dia 18/05/2018, a sociedade “PP, Lda.” através do mandatário …, mandatado para o efeito por J, seu gerente apresentou uma queixa no gabinete de Provedoria do Cliente da Instituição Bancária ... Banco, pelos factos divulgados na reportagem que ao diante se refere- cfr.doc.1 junto com a PI.
12. Na aludida reclamação alegou que, por dificuldades de tesouraria e pelo uso de emissão de cheques pós-datados desde, pelo menos, Maio de 2017, que ocorreu a devolução de cheques por falta de provisão.
Com efeito, e por forma a solucionar/justificar incidente bancário da devolução de cheques que foram ocorrendo até final do ano 2017, pelo menos o Dr. J de clientes do balcão do Banco sediado no centro de empresas de …-dada a relação de cordialidade e confiança com os representantes legais daquela sociedade, prontificou-se a colaborar na resolução daqueles incidentes bancários.
Para esse efeito, solicitou ao longo dos meses a entrega de cheques em branco, quanto ao valor e beneficiário, quer desta empresa, quer de outras pertencentes ao mesmo grupo, nomeadamente as sociedades “S, Lda” e “A, Lda”… bem como a ordem de levantamento em qualquer daquelas contas DO, com a ordem expressa daquele Dr. J de levantamento a descoberto, e consequentemente entrega do numerário ao mesmo, tudo isto quer pelos legais representantes daquelas sociedades quer por funcionários das mesmas…
Na posse das quantias em dinheiro e da movimentação dos cheques entregues em branco, aquele Dr. J comunicava que tinha procedido ao cativo do valor dos cheques que, entretanto, haviam sido devolvidos por falta de provisão e sequencialmente comunicou, via esse banco, a justificação desses incidentes ao Banco de Portugal.
… da totalidade das quantias entregues quer através dos cheques em branco e posteriormente sacados dos respectivas contas os valores, bem como das quantias entregues em dinheiro, existe um saldo já apurado, mas não fechado, na quantia de €234.623,58 que nunca entrou nas contas da sociedade PP e/ou nas contas das demais sociedades acima identificadas.
Ou seja, aquela sociedade está desapossada, pelo menos, daquela quantia que entregou ao funcionário Dr. J, sempre nas instalações do balcão do centro de empresas da … e que apesar das várias insistências junto do mesmo para que justifique documentalmente o destino de tais quantias, a verdade é que até à presente data nunca o fez.
13. E mais referiram que, também no ano de 2017, aquele Dr. J solicitou aos responsáveis da PP que sacassem uma letra, no valor de 15.000,00€ em que era aceitante …, tendo o Autor levantado aquela quantia em numerário e que apesar da reforma daquela letra, nunca procederam ao pagamento do valor das reformas nem do valor integral daquela letra ficando a PP desapossada daquela quantia.
Por outro lado, também no ano 2013 aquele Dr. J propôs à sociedade PP a execução dos trabalhos de remodelação de uma loja no Centro Comercial Colombo, em Lisboa, em que parte do preço na quantia de €35.244,68 foi titulada por uma letra de câmbio descontada na conta DO acima identificada e domiciliada nesse banco.
Apesar de terem feito algumas reformas, a verdade é que a ali aceitante nunca pagou, quer o valor das reformas, quer o valor da letra, tendo sido sempre paga por desconto na conta DO da sociedade.
Sendo certo que apesar dos factos acima relatados quer a letra inicial, quer as letras de reforma nunca foram entregues à PP e sacadora, não obstante interpelação escrita para o efeito.
Em face de tudo quanto acima exposto queiram V. Exas … proceder à averiguação dos factos acima relatados, de forma a que a sociedade minha representada seja imediatamente ressarcida de todas as quantias que lhe foram indevidamente retiradas/desviadas por aquele Dr. J e que … são objectivamente da responsabilidade dessa instituição bancária… comunicando … que estamos na posse de todos os documentos comprovativos da factualidade … descrita…”
14. Esta queixa que no dia 18.05.2018, o Sr. Dr. ….., Mandatário da sociedade “PP, Lda”, apresentou no Gabinete de Provedoria do Cliente (GPC), foi remetida, no dia 21.05.2018, via Portal de Sistema de Gestão Reclamações e Sugestões – “”SGRS”, para o Departamento de Inspeção e Fraudes (DAI), que abriu um Processo de Averiguações com o n.º 135/18 (processo n.º 154/18).
15. No dia 18.07.2018 o Sr. J, legal representante da PP, Lda dirigiu carta ao Presidente do Conselho de Administração do Banco ….com as mesmas acusações, agora por si subscritas, como resulta do doc. 2.
16. Lê-se nessa carta o seguinte:
Exmo. Sr. Presidente,
Os nossos melhores cumprimentos
Esta sociedade PP, Lda, com o número de matrícula de pessoa colectiva 50914092, com sede na Zona Industrial 1, …, freguesia de …, concelho de … vem expor o requerer como segue:
A sociedade é cliente dessa instituição desde 2010 e é titular da conta DO … domiciliada no Centro de Empresas de ... e da conta DO … de emissão de cheques pós-datado desde pelo, menos Maio de 2017 que ocorreu devolução de cheques por falta de provisão 2962-1 domiciliada no balcão de ….
Por dificuldades de tesouraria e pelo uso de emissão de cheques pós-datados desde pelo menos Maio de 2017, que ocorreu devolução de cheques por falta de provisão.
Com efeito, e por forma a solucionar/justificar incidente bancário da devolução de cheques que foram ocorrendo até final do ano 2017, pelo menos o Dr. J - Gestor de clientes do balcão do Banco sediado no centro de empresas de ... - dada a relação de cordialidade e confiança com os representantes legais daquela sociedade, prontificou-se a colaborar na resolução daqueles incidentes bancários.
Para esse efeito, solicitou ao longo dos meses a entrega de cheques em branco, quanto ao valor e beneficiário, quer desta empresa, quer de outras pertencentes ao mesmo grupo, nomeadamente as sociedades “S, Lda”… e “A, Lda”… bem como a ordem de levantamento em qualquer daquelas contas DO, com a ordem expressa daquele Dr. J de levantamento a descoberto, e consequentemente entrega do numerário ao mesmo, tudo isto quer pelos legais representantes daquelas sociedades quer por funcionários das mesmas…
Na posse das quantias em dinheiro e da movimentação dos cheques entregues em branco, aquele Dr. J comunicava que tinha procedido ao cativo do valor dos cheques que, entretanto, haviam sido devolvidos por falta de provisão e sequencialmente comunicou, via esse banco, a justificação desses incidentes ao Banco de Portugal.
Aqui chegados, veio-se a constatar que da totalidade das quantias entregues quer através dos cheques em branco e posteriormente sacados das respectivas contas os valores, bem como das quantias entregues em dinheiro, existe um saldo já apurado mas não fechado, na quantia de €234.623,58 que nunca entrou nas contas da sociedade PP e/ou nas contas das demais sociedades acima identificadas.
Ou seja, aquela sociedade está desapossada, pelo menos, daquela quantia que entregou ao funcionário Dr. J, sempre nas instalações do balcão do centro de empresas da ....e que apesar das várias insistências junto do mesmo para que justifique documentalmente o destino de tais quantias, a verdade é que até à presente data nunca o fez… também no ano de 2017, aquele Dr. J solicitou aos responsáveis da PP que sacassem uma letra, no valor de 15.000,00 € em que era aceitante …., tendo o Autor levantado aquela quantia em numerário e que apesar da reforma daquela letra, nunca procederam ao pagamento do valor das reformas nem do valor integral daquela letra ficando a PP desapossada daquela quantia.
Por outro lado, também no ano 2013 aquele Dr. J propôs à sociedade PP a execução dos trabalhos de remodelação de uma loja no Centro Comercial Colombo, em Lisboa, em que parte do preço na quantia de €35.244,68 foi titulada por uma letra de câmbio descontada na conta DO acima identificada e domiciliada nesse banco
Apesar de terem feito algumas reformas, a verdade é que a ali aceitante nunca pagou, quer o valor das reformas, quer o valor da letra, tendo sido sempre paga por desconto na conta DO da sociedade.
Sendo certo que apesar dos factos acima relatados quer a letra inicial, quer as letras de reforma nunca foram entregues à PP e sacadora, não obstante interpelação escrita para o efeito, impossibilitando a cobrança judicial daquela importância.
Em face de tudo quanto acima exposto e porque estes factos foram comunicados em 18 de Mio do corrente ano, por correio eletrónico, à Provedoria do Cliente dessa instituição que apesar do tempo decorrido e da gravidade dos factos e actos descritos a realidade é que até à presente data não foi comunicada qualquer situação e/ou resultado… A realidade é que , em consequência dos factos descritos e de factores exógenos, esta sociedade está com sérios constrangimentos de tesouraria pelo que, solicitamos a V. Exa. Co a maior celeridade e com toda a urgência, ordene a realização de averiguação dos factos acima relatados para que a sociedade seja imediatamente ressarcida de todas as quantias que lhe foram indevidamente retiradas/desviadas por aquele Dr. J… e que … são objectivamente da responsabilidade dessa instituição bancária… comunicando … que estamos na posse de todos os documentos comprovativos da factualidade … descrita…
Apesar da entrega e apresentação de todos os elementos documentais da sociedade, dos bens que constituiriam garantias e da relação de obras adjudicadas, o tempo decorreu e, apear da promessas, a verdade é que nada de essencial foi concedido e, … no presente esta sociedade está com elevado valor de cheques devolvidos e não pagos, para além das consequências ao nível bancário… está impossibilitada de pagar aos subempreiteiros e fornecedores e assim a continuação da sociedade está seriamente comprometida…
De modo a resolver a situação financeira desta sociedade e, com isso, permitir a continuação da sua actividade… esta sociedade necessita do apoio dessa instituição, quer na rápida resolução dos factos que acarretaram o desapossamento da elevada quantia acima identificada e sua rápida reposição, quer através da concessão de linhas de crédito e a celebração de outros instrumentos financeiros… aguardamos no mais breve tempo possível da marcação de reunião…”.
17. Devido à reclamação/ acusação, apresentada por parte da sociedade, subscrita pelos Dr. e J, o Autor foi suspenso das suas funções do banco por parte da Administração pelo período de seis meses, que lhe interpôs um processo disciplinar, na sequência da proposta apresentada em 04/02/2019 pela Direção de Recursos Humanos – cfr. doc.3 junto com a PI
18. No dia 28.12.2018 o Departamento de Inspeção e Fraudes (DAI) do Banco elaborou o Relatório de Averiguações n.º 138/188 (Proc. n.º 154/18) junto como doc.4 com a PI.
19. Resultou do relatório de averiguações realizado pela DAI o seguinte– cfr. doc.4:
1.Que seja indeferida a pretensão suscitada por Sr. Mandatário da sociedade “PP, Lda.” de reembolso da quantia de 234.623,58€, porquanto não se reuniram evidências no sentido da alegada apropriação daquela quantia, ou qualquer outra pelo colaborador visado na reclamação, ou qualquer Colaborador, destinada a ser creditada nas relações ativas domiciliadas na .... e tituladas pela mesma empresa ou pelas sociedades “S, Lda.” e “A Engenharia, Lda.”
2.que igualmente seja indefira a pretensão suscitada de reembolso da quantia de 15.000,00€, porquanto não se identificou evidência de apropriação ilegítima pelo Colaborador visado ou outro, no âmbito de operatória de Desconto de Letra Comercial, apresentada na …. e sobre a qual foi emitida carta de Aviso de Crédito – Desconto de Efeitos, com data de movimento de 2017/05/12, dirigida à morada da sociedade “PP, Lda.”. Acresce que do crédito de operatória de Desconto, no valor de 14.682,84€ resultou um saldo de 35.267,17€ imediata e automaticamente absorvido por cobrança de prestações vendidas dos contratos n.ºs … e …, titulados pela mesma sociedade.
3.que relativamente à alegação de não disponibilização de letra, apresentada a Desconto pelo valor de 35.244,68€ em 2013/09/11 sacada pela sociedade “PP, Lda” onde foi aceitante a sociedade “I, Lda, a mesma foi dirigida à morda da Aceitante, representada por terceiros, alheios à presente reclamação.
3.Que seja enviada a súmula das conclusões do presente relatório e do teor dos pontos 1, 2 e 3 ao Gabinete de Provedoria do Cliente, para resposta no âmbito do Processo SGRS n.º 1769/18/R.
4.Que, sem prejuízo, seja enviada a cópia do presente Relatório à Direcção de Recursos Humanos para apreciação da eventual matéria de natureza disciplinar face a conduta do Gestor de Cliente Empresa, Sr. J (n.º…), com colocação na DCEI – Centro de ...., no que aos pontos 3.13 e seguintes, deste Relatório, respeita, devendo prever-se que a presente problemática já foi comunicada á Exma. Comissão Executiva por esta DAI, para efeitos de indeferimento da pretensão da Cliente empresa “PP”
20. Consta das Conclusões, além do mais, 1.1 O presente Processo de Averiguações resultou de reclamação suscitada em 2018/05/18, subscrita pelo Mandatário da Sociedade “PP, Lda”, Sr. Dr. …. Foi igualmente dirigida carta ao Conselho de Administração, datada de 2018/07/18, subscrita por um dos sócios-gerentes, Sr. J. O segundo sócio gerente, Sr. C não surge como reclamante. O objecto da reclamação assenta:
1.2 Sobre a primeira alegação esta DAI… analisou a totalidade dos 20 cheques elencados na reclamação (ponto 2.6.1) tendo concluído da inexistência de má prática bancária no processamento dos vinte pagamentos correspondentes por colaboradores colocados nos 3 diferentes balcões intervenientes: balcões … e ....
1.3 (…)
1.4 (…)
1.5 Mais, cada um dos vinte cheques regista regularidade das assinaturas de saque.
Assim:
a) na alegada apropriação ilegítima do total de 234.623,58€ pelo Gestor de Cliente Empresa colocado na DCEI – Centro de Empresas de ..., Sr. Dr. J (n.º …) valor aquele que havia sido supostamente entregue em numerário e mediante 20 cheques .... elencados em documentação anexa a reclamação, ao mesmo Gestor, por representantes da sociedade “PP”, “S” ou A” ou funcionários destas;
b) Na alegada apropriação ilegítima da quantia de 15.000,00€ pelo mesmo Colaborador, no âmbito de suposta irregularidade de Desconto de Letra comercial, em que foi aceitante …;
c)No alegado não recebimento de Letra, apresentada a desconto e na qual foi Aceitante a sociedade “I” e sacadora, a sociedade reclamante “PP” e sucessivas Reformas.
1.6 Também daquele universo de 20 cheques reclamados, identificámos que pese embora somente 4 cheques estejas nominados, isto é, com identificação expressa da beneficiária “L” funcionária da “PP, Lda.” (cliente n.º 3789605) esta mesma beneficiária assinou os cheques no verso (pagos ao Balcão), os restantes 16 cheques, têm aposta no verso, as assinaturas dos Srs. J e D. M, na qualidade de apresentantes. No total, os 20 cheques estão assinados no verso por um cliente da Instituição sacada, … (J; M; L). Daqui Extrai-se:
- Em nenhum dos 20 cheques se evidenciou que houvesse sido beneficiário, o Colaborador, Sr. Dr. J;
- Os cheques não foram submetidos a endosso;
- Cada apresentante assinou no verso;
- A regularidade nos pagamentos dos 20 cheques, em 3 balcões diferentes.
1.7. Ainda que circunstancial não é despiciendo atentar que 2 dos 3 balcões onde foram processados 8 dos 20 cheques são sitos em … e … que distam cerca de 15 e 10 km de ..., respectivamente, sendo que a supervisão remota para o pagamento dos cheque foi processada pelo Sr. Dr. J… nas instalações da DCEI Centro de Empresas de … (…)
1.8 quanto ao suposto numerário que terá sido entregue em mãos ao Sr. Dr. J… inexistem elementos probatórios.
1.9 Quanto à segunda alegação foi apurado por esta DAI (…) do crédito de operatória de Desconto, no valor de 14.682,84€ resultou um saldo de 35.267,17€ imediata e automaticamente absorvido por cobrança de prestações vendidas dos contratos n.ºs … e ………, titulados pela mesma sociedade.
Trata-se de desconto comercial onde surge como aceitante …. Aquela cobrança aproveitou à empresa.
1.12- (…) b a letra foi, por tal, e conforme informação prestada pelo responsável da USP- Núcleo de Documentação e Arquivo, enviada à morada da Aceitante. Tratando-se de uma empresa onde não intervém o reclamante, o Sr. J (…).
2.6.1-Nas contas tituladas pelas empresas “PP, Lda” S, Lda” e “A, LD, foram pagos 20 cheques, por levantamento em numerário em balcão, que integram o objecto da reclamação e que adiante, cronologicamente, se explanam (…)”
21. O Gabinete de Provedoria do Cliente Banco enviou à PP, Lda. em 01/02/2019 uma carta onde comunica o resultado do processo de averiguações: “Em resultado das averiguações realizadas, informamos que:
1.Foi indeferido o pedido de reembolso da quantia de 234.623,58€, porquanto não se reuniram evidências no sentido da alegada apropriação daquela quantia, ou qualquer outra pelo colaborador visado na reclamação, ou qualquer Colaborador, destinada a ser creditada nas relações ativas domiciliadas na …. e tituladas pela mesma empresa ou pelas sociedades “S, Lda.” e “A, Lda.”
2. .Foi indeferido o pedido de reembolso da quantia de 15.000,00€, uma vez que não se identificou evidência de apropriação ilegítima pelo Colaborador visado ou outro, no âmbito de operatória de Desconto de Letra Comercial, apresentada na … e sobre a qual foi emitida carta de Aviso de Crédito – Desconto de Efeitos, com data de movimento de 2017/05/12, dirigida à morada da sociedade “PP, Lda.”.
3.Quanto à alegação de não disponibilização de letra, apresentada a Desconto pelo valor de 35.244,68€ em 2013/09/11 sacada pela sociedade “PP, Lda.” confirma-se que a mesma foi dirigida à morda da Aceitante, representada por terceiros, alheios à presente reclamação.
22. No dia 6 de Fevereiro de 2019 pela Comissão Executiva da Caixa Económica Banco, … foi lavrada Ata n.º 12/2019 relativa à deliberação de Instauração de Procedimento Disciplinar contra o A., onde, além do mais, se lê:
(…) A Comissão Executiva tomou conhecimento do Relatório de Averiguações da DAI n.º 135/18-Processo n.º 154/18 sobre a conduta do trabalhador J (…), Gestor de Clientes Empresa, colocado, à data dos factos na DCEI-Centro De ....e que terá procedido, em sistema transacional, á justificação de um conjunto de 9 cheques sem provisão, sem que constem do arquivo os elementos que permitem comprovar a regularização dos cheques sem provisão. Tal actuação foi manifestamente grave por ter conduzido à anulação da convenção de cheques sem que a .... possa comprovar, designadamente junto do Banco de Portugal, que a anulação foi feita com respeito pelo disposto no artigo 1.º A do Decreto Lei n.º 454/91 de 28 de Dezembro, factos que podem constituir um ilícito contraordenacional.
Considerando que a conduta do trabalhador indicia a violação, de forma grave e também no âmbito da responsabilidade contra-ordenacional dos deveres de respeito, zelo e diligência, obediência e lealdade, a Comissão Executiva deliberou aprovar a instauração de procedimento disciplinar ao trabalhador J, com intenção de despedimento com justa causa e sem direito a qualquer indemnização ou compensação, verificando-se a sua suspensão preventiva no decurso do procedimento disciplinar, sem perda de antiguidade e retribuição(…)” (doc. 3).
23. O Autor foi submetido a processo disciplinar instaurado pela Comissão Executiva da …, tendo sido despendidas muitas horas, na análise de documentos, extratos, inquirição de diversas testemunhas.
24. A Comissão Executiva do Banco … decidiu em 18/09/2019 o arquivamento do processo disciplinar – cfr. doc. 5 junto com a PI.
25. Na decisão de arquivamento é, além do mais, referido que “Analisado o processo disciplinar, verifica-se que resultou da prova produzida e da ponderação dos factos apurados na instrução que não pode ser imputada ao trabalhador Arguido a violação da norma de procedimento relativa ao arquivo, nem tão pouco a prática de qualquer ilícito contra-ordenacional, pois que que não foi possível provar a culpa- imputável ao ora trabalhador Arguido mesmo que a título de negligência- no que respeita à alegada não localização no arquivo da DCEI de ....de 9 cheques justificados com o motivo de “inutilizado/destruído pelo Balcão”, tendo resultado ainda do processo disciplinar, que os factos de que o Trabalhador Arguido foi acusado na nota de culpa e referenciados nos pontos 2 e 4 da Alínea A) do Relatório Final, estão prescritos e, quanto ao ponto 3. Da alínea A) do Relatório Final, verifica-se não ter existido, por parte do Trabalhador Arguido qualquer violação do normativo ali invocado. Ora, não poderá de facto ser imputável ao trabalhador Arguido o alegado incumprimento do dever de arquivo, designadamente dos 9 cheques referenciados na nota de culpa, pois o arquivo dos cheques aquando da sua “justificação” pode ter sido efectuado também pela Assistente do ora Trabalhador Arguido, acrescendo ainda que a não localização dos 9 cheques identificados ocorreu devido ao estado desorganizado em que se encontrava o arquivo da DCEI e não incumbia ao ora Trabalhador Arguido a responsabilidade pela organização e boa conservação dos documentos no arquivo local. Assim, a Comissão Executiva da …, decide pelo arquivamento do processo disciplinar instaurado contra o Trabalhador J sem aplicação de qualquer sanção.”.
26. Após o despacho de arquivamento do processo de averiguações e do processo disciplinar o A. regressou às suas funções no Centro de Empresas de ... no final de setembro de 2018.
27. A sociedade PP, Lda através do seu representante Legal J apresentou uma participação criminal contra J em 27/09/2018 no DIAP de ..., na qual imputava ao A. a prática de um crime de burla qualificada, previsto e punido pelo artigo 217.º, n.º1 e 218.º, n.º2, al. b) por referência ao artigo 202.º, alínea b) ou de um crime de abuso de confiança qualificada previsto e punido pelo artigo 205.º, n.ºs 1 e 4 alínea b) do Código penal, cujo inquérito teve o número 3064/18.7T9VFR que correu termos na 1.ª secção do DIAP de ….
28. Nesses autos foi proferido pelo Ministério Público despacho de arquivamento em 27-02-2022, onde além do mais, de lê:
“Foi produzida prova testemunhal com vista a apurar a factualidade participada, nomeadamente a inquirição de Dr. …, contabilista da participante e L, escriturária na participante.
Os factos aqui participados foram também comunicados pela participante à caixa económica Banco, em 18.07.2018 que indeferiu o pedido após averiguações.
Foram juntas aos autos cópias dos cheques referenciados na participação criminal, das quais constam assinaturas de pessoas ligadas às sociedades, não tendo sido levantada qualquer suspeita sobre a autenticidade das mesmas.
Nos presentes autos foi realizada uma perícia financeira e contabilística e da análise dos extractos bancários juntos das contas bancárias constituídas no Banco em nome das três sociedades supra referenciadas, conclui-se pela existência de lançamentos relacionados com transferências entre contas destas sociedades e frequentes movimentos com uso de cheque, sendo que muitos desses movimentos com uso de cheque, sendo que muitos desses movimentos, essencialmente a partir de 2017, eram efectuados com a conta a negativo, o que confirma a existência de abertura por parte do Banco para esse efeito, seja pela via do factoring, seja pela facilidade do cliente manter a gestão da conta e uso de cheque, mesmo estando a conta a negativo…
…os elementos fácticos que os autos suficientemente indiciam (acima elencados) não nos revelam minimamente a existência de erro ou engano provocado astuciosamente pelo arguido, que tenha sido determinante da prática pelos legais representantes da sociedade PP, Lda. de um acto qualquer lesivo do património da mesma.
O mesmo sucede quanto aos elementos objectivos do crime de abuso de confiança, pois face à prova produzida, nomeadamente à perícia contabilística e financeira dos extractos das contas bancárias da sociedade participante e dos cheques aludidos na participação criminal, concluímos que não resulta indiciado que o arguido se apropriou de alguma quantia existente nas contas bancárias da participante ou outra sociedade do grupo, sem o conhecimento ou autorização dos respectivos representantes legais.
Com efeito, da prova documental e testemunhal produzida designadamente das declarações prestadas pelas testemunhas L e Dr. … resulta indiciado que entre os representantes legais da PP, Lda., S, Lda. e A, Lda. e o arguido havia uma antiga relação pessoal e de confiança que permitiu facilitar muitas situações, dificuldades de tesouraria da participante, problemas bancários e financeiros desta.
Resulta ainda, sobretudo das declarações prestadas pelas testemunhas L e Dr. …, contabilista da participante, que quem definia as operações bancárias a realizar eram os legais representantes das sociedades e não o arguido (cfr. declarações prestadas pela testemunha L) e que o conflito que gerou a apresentação da participação criminal que deu origem a este processo iniciou-se sobretudo, quando a participante não conseguiu a aprovação, pelo Banco, de um financiamento adicional na ordem dos 500.000$00 vindo esta instituição bancária a beneficiar de garantias reais que havia constituído sobre diversos bens, aproveitando hipotecas anteriores.
(…)
Como ficou supra referido, nos presentes autos não foi possível produzir qualquer prova que permita corroborar, de algum modo, que o arguido se apropriou de quantias pertencentes à participante, ou às sociedades S, Lda. e A, Lda.” (negrito e sublinhado nossos).
29. Em data não concretamente apurada, mas após terem sido proferidos os despacho de arquivamento do processo de averiguações e do processo disciplinar, J e M contactaram o Canal televisivo “...” e “...”, com o objectivo de propor a feitura de uma reportagem para o programa “A” visando o A. e a factualidade descrita na reclamação e na carta mencionadas supra em 11 a 15.
30. As então jornalistas do programa “A” A e J interessaram-se pelo assunto, tendo decidido que a jornalista C acompanhada pelo repórter de imagem N se deslocariam em 04/02/2020 a ... a fim de entrevistar os referidos J e M.
31. Os mesmos em entrevista à jornalista C no dia 04/02/2020 apresentaram e descreveram a factualidade constante da reclamação e exposição efetuadas junto do Banco e referidas em 11 a 15 bem como a participação criminal da mesma sociedade constante do inquérito 3064/18.7T9VFR referida em 27.
32. J e M facultaram à jornalista C teor do despacho de arquivamento do processo de averiguações proferido pelo Departamento de Inspecção e Fraude do Banco Caixa Económica Banco ao A. que foi comunicado à PP pela carta referida em 21..
33. Foi então realizada para o programa “A” a reportagem intitulada “Burlas por Gestor do Banco” da autoria da Jornalista C com a coordenação da Jornalista A, RR. nos autos.
34. Para realizar a reportagem fotográfica a mesma jornalista acompanhada do jornalista e repórter de imagem N, deslocou-se junto do local de trabalho do A. sito no Banco-Centro de Empresas de ... e ainda ao balcão do Banco de …. bem como junto à residência do A. tendo-o filmado a sair da sua habitação. Filmaram-no ainda quando conduzia o seu veículo automóvel na autoestrada.
35. A jornalista C chegou a ouvir L que foi funcionária da mesma empresa sobre a factualidade descrita na reclamação e na carta mencionadas supra em 11 a 15.
36. A jornalista C no dia 07/02/2020 contactou … Banco, quer telefonicamente, quer por e-mail, este com o teor que consta do doc. 1 junto com a contestação.
37. Lê-se no referido e-mail da jornalista C, enviado para as responsáveis do departamento de comunicação do Banco que;
“(…) No âmbito de uma reportagem que estou a realizar para o programa A, visando denuncias de desvio de dinheiro de clientes da … (...), em que é visado o vosso colaborador J, que exerce funções no Balcão de ..., venho colocar as seguintes questões.
1) Quais as funções exercidas pelo senhor J na estrutura do Banco?
2) O Mandatário da sociedade PP Lda., denunciou a 18 de maio de 2018 à Provedoria do Cliente do Banco atos praticados pelo funcionário Dr. J que genericamente configuravam um possível desvio de fundos. A mesma denuncia seguiu a 18 de julho de 2018 para o Conselho de Administração da .... Atendendo à resposta da Provedoria do Cliente Banco que considerou não ter reunido evidências no sentido da alegada apropriação da quantia em causa, venho perguntar se existiu um inquérito disciplinar?
3) O que concluiu o processo disciplinar?
4) O colaborador J foi alvo de processo disciplinar?
5) O colaborador J foi suspenso preventivamente?
6) O Colaborador era gerente de conta da cliente PP entre Julho de 2017 e Fevereiro de 2018?
7) Quem autorizou os levantamentos a descoberto das contas da PP entre Julho de 2017 e fevereiro de 2018?
8) O Banco moveu alguma ação à sociedade PP ou aos seus sócios por falsificação de documentos, abuso de confiança e apropriação de fundos ilícitos?
9) A .... ou a provedoria do Cliente recebeu mais denuncias de clientes por irregularidades praticadas pelo referido colaborador J?
10) Em caso afirmativo, que seguimento tiveram?
11) Venho ainda por este meio pedir uma entrevista ao senhor Dr. J a fim de lhe colocar as questões relacionadas com este caso. (…)”
38. Tendo recebido a seguinte resposta do Banco: “Tal como falámos ao telefone, junto a resposta do Banco abaixo. 
Agradecemos também o convite para o debate, mas a instituição não pode estar presente pelas mesmas razões elencadas na resposta.
O colaborador comunicou-nos não estar disponível, sendo certo que também lhe estaria vedada a participação no debate pelos mesmos motivos abaixo elencados.
“O Banco atua com integral respeito pelas suas obrigações de instituição de crédito, dando competente resposta às reclamações dos clientes e seguimento aos procedimentos internos que se mostrem adequados em cada situação.
O Banco está impedido, nos termos do disposto no artigo 78.º do RGICSF, de revelar ou utilizar informações sobre factos ou elementos respeitantes à vida da instituição ou às relações desta com os seus clientes (…)”, cfr. doc. 1 junto com a contestação.
39. No dia 12 de fevereiro de 2020 foi emitida, entre as 20h e as 21h, no programa de informação “Jornal das 8” do canal televisivo da ..., a reportagem realizada intitulada de “Burlas por Gestor do Banco”.
40. No jornal das 8 a R. A apresentou o A. visado na reportagem da seguinte forma “é o gestor bancário em causa que trabalha no balcão do Banco de ...., uma pessoa que não tendo outra actividade profissional conhecida nem fortuna de família se desloca no Top de Gama da jaguar, para se ter uma é o carro usado pela família real Inglesa e está a ser acusado por clientes do Banco de burla, de lhes ter retirado de lhes ter desviado o dinheiro…
41. mais à frente diz que há outras histórias a que nós chegamos verdadeiramente surpreendentes… já tinha havido denuncias… a situação concreta está a ser investigada pela Polícia Judiciária…estas pessoas apresentaram queixa… nem todas. falamos de um gestor bancário que tem um profundo conhecimento da via empresarial destas pessoas … que se sentem nas mãos destas pessoas, são inclusivamente ameaçadas… o que foi suficiente para travarem o ímpeto de denunciarem.”
42. A reportagem televisiva seguida de debate foi transmitida às 21h desse mesmo dia, no programa “A”, na ....
43. Nesta reportagem/debate o Autor foi acusado publicamente de ter desviado dinheiro da sociedade “PP, Lda.” e de se ter apropriado com essas quantias.
44. A Ré A inicia a referida reportagem no programa “A”, na .... da seguinte forma:
“Boa noite. É uma burla milionária no Banco. Vários Clientes apontam o dedo a um simples gestor de conta que se desloca num Jaguar de luxo, para se ter uma ideia falamos no mesmo modelo de carro usado pela família real Inglesa e governo britânico.”
45.  E prossegue:
“uma investigação da .... conseguiu reunir provas desta mega fraude que já está a ser investigada pela Polícia Judiciária. Apesar de haver já várias queixas a administração do Banco mantém em funções o funcionário visado que chega a ameaçar os clientes. Em causa poderão estar também pagamentos suspeitos a uma acompanhante de luxo. São meus convidados neste debate L, cliente do Banco lesada, J, também cliente do Banco lesado pelo gestor de conta visado na nossa investigação, A …, C jornalista da .... e Autora desta investigação. Ausentes mas convidados…o gestor de conta visado na nossa investigação: J”.
46. M na reportagem à pergunta da jornalista qual é o desvio que está aqui em causa responde que o prejuízo directo são 300 mil e indirecto milhões, mais à frente refere que dinheiro efectivo são 280, 300 mil euros. referindo a mesma ainda que “eu fiz tudo o que estava ao meu alcance para evitar isto visto que as pessoas competentes não me ajudaram a única forma que tenho é expor… expor o que se está a passar”.
47. Mais é dito pela jornalista da .... que “o que se está a passar é o que a Polícia Judiciária investiga neste momento… o visado é J o banqueiro que se desloca num XJ modelo de luxo da Jaguar exactamente igual ao utilizado pela família real Inglesa e pelo governo Britânico. O homem foi denunciado à Administração do Banco e continua em funções há queixas de desvio de milhares de euros e até pagamentos suspeitos a uma acompanhante de luxo…”
48. E mais à frente diz a jornalista que em 21 cheques apenas 6 tinham a identificação de quem os levantou…
49. Diz ainda que Tudo se precipitou em Março de 2018 quando o gerente de conta esteve ausente do banco durante um mês … de licença de paternidade…
50. E ainda dito mais à frente na reportagem que a .... ouviu outros lesados que descrevem um esquema idêntico há quem fale em burlas que ultrapassam só num caso meio milhão de euros sempre a envolver cheques em branco entregues ao gestor J … a verdade é que não apresentaram queixa crime… nuns casos por ser difícil de provar noutros por temer represálias há até quem … tenha voltado a receber SMS ameaçadores…L e J não foram os primeiros a denunciar por burla .. em 2017 … foi notícia o caso da acompanhante de Luxo que acusava um bancário de ....a tinha enganado… a relação terminara em 2016… com o bancário a exigir o apartamento de volta…a acompanhante chegou a processar J por burla…J contestou … depois da notícia as partes chegaram a acordo… com processo arquivado em Abril de 2018, um mês depois de J ter descoberto a burla…”
51. É dito além do mais que … este foi o único ponto em que a provedoria do cliente do Banco veio a dar razão a L e J mas nem assim o banco assumiu o prejuízo… os empresários queixaram-se do bancário J à Provedoria do Banco e também ao Conselho de Administração do banco…A Provedoria do Cliente demorou 9 meses a responder, no final indeferiu o reembolso dos 200 mil euros pelos cheques endossados ao gerente J, entendeu que não se reuniram evidências de apropriação pelos colaboradores do Banco… o caso está agora com a Polícia Judiciária… .
O Banco e o colaborador J recusaram prestar esclarecimentos alegando estarem impedidos por lei de revelarem informações… o inquérito crime está pendente no DIAP de …há mais de um ano até ao momento sem arguidos…
Se a empresa já estava mal o desaparecimento de 300.000 euros entre cheques letras e algum dinheiro vivo que nunca foi depositado tudo isto deu o golpe final … ficaram inibidos no banco de Portugal … a insolvência é agora o caminho mais provável…
52. No debate televisivo que ocorreu no mesmo dia na ...24 começa da mesma forma referida em 45, no decurso do debate é dito ainda por A que:
Ausentes, mas convidados a administração do Banco e o gestor de conta visado J…
53. Mais foi lida por A uma parte do email enviado pela advogada do A. “nós ainda hoje agora durante a tarde recebemos um comunicado da advogada do gestor de conta visado em que diz que “os jornalistas que levaram a cabo a investigação e reportagem não contactaram o meu constituinte para obterem a sua versão dos factos ou sequer autorizar a divulgação do seu nome e imagem…” estamos aqui perante uma mentira não podemos dizer isto de outra forma.
54. A jornalista C respondeu que “não vale a pena perder muito tempo quando temos papeis … documentos oficiais, a nossa tentativa no dia 07/02 para o email da acessória de imprensa do Banco onde num dos pontos vimos por este meio pedir uma entrevista ao Dr. J … prazo limite terça feira … em resposta o Banco diz-nos ontem que “o colaborador comunicou-nos não estar disponível… sendo certo que também estaria vedada a participação no debate… por proibição legal de se pronunciarem sobre a vida do banco e a relação com os clientes…” temos perfeita noção que é uma acusação muito grave, mas é uma acusação sustentada… investigada…não nos limitamos ouvir duas pessoas, um casal.. ouvimos outras pessoas…procuramos documentos… nós é que fomos consultar processos…
55. Mais foi lido uma parte do comunicado da advogada do A. em que esta refere que “reitero que ninguém da .... contactou o meu cliente para que fosse ouvido previamente… informo que o meu constituinte possui prova da investigação já levada a cabo pelo Banco da sua completa inocência e da falsidade das acusações que lhe são imputadas nas quais a PP alegam estar envolvido … há uma profunda má fé e intenção objectiva de prejudicar a vida de um profissional e de um ser humano… o banco instaurou um processo disciplinar ao meu constituinte tendo sido despendidas mais de 200 horas obtenção e análise de documentos e inquirição morosa de testemunhas… que todas confirmaram que a PP …era uma empresa que habitualmente reclamava junto do banco a dizer que não tinha autorizado débitos e operações que depois se confirmava estarem devidamente assinadas e autorizadas.”
56. No decurso do debate C diz que “ouviram a L e o J … sentiram que as pessoas estavam a dizer a verdade… chegou a outros casos… contactou as pessoas… não teve dúvidas nenhumas… não foi só ela também o N… quando ouviram as pessoas… perceberam que havia denominador comum… relações de muitos anos… pessoas assinavam frente e verso os cheques que iam com o gestor de conta… uma pessoa diz que recebe depósitos na conta desta acompanhante de luxo para simular uma transação… sentiu medo… foi fundamental a consultar o inquérito crime com a denuncia da senhora que se apresenta como acompanhante de luxo.. que está a dizer que o gerente de conta em alguns momentos depositava na conta dela cheques que ele tinha recebido ao portador de clientes…”
57. Mais diz C “consultei os dois processos começa com uma acção executiva e despoleta uma queixa crime consultei o processo da primeira à última folha… requeri a consulta do processo e consultei o processo... o processo é consultável não está em segredo de justiça… quando se torna pública a notícia … de repente chegaram a acordo e tudo se resolve…”
58. Na aludida reportagem, as RR., além do Jaguar de luxo (com exibição de imagens dos jaguares da família real inglesa e do governo britânico) mencionaram também que poderão estar em causa “pagamentos suspeitos a uma Acompanhante de luxo” exibindo extracto de notícia do Correio da Manhã referida infra.
59. Em 25 de Novembro de 2017, o jornal “Correio da Manhã” noticiou “Acompanhante de luxo exige pensão a cliente” “bancário de ... dava 10 mil euros/mês a amiga” … “Acompanhante diz que foi enganada.”. cfr. doc. junto com o requerimento ref.ª 44707147.
60. O bancário visado não era identificado na notícia referida em 25. mas correspondia ao A..
61. Em 2014, o Autor manteve uma relação amorosa com uma mulher de nome E a quem emprestou dinheiro, tendo a relação terminado.
62. Correu termos a acção executiva pelo A. contra a referida mulher com o n.º …. do Juízo de Execução do … cuja petição se mostra junta aos autos como doc. 4 por requerimento ref.ª 39157497 de 14-06-2021 para cobrança de dívida relativa a empréstimo para aquisição de um imóvel, na qual as partes chegaram a acordo, em que a executada se confessou devedora ao exequente aqui A. do valor de €185.000,00, tendo a executada pago a quantia exequenda acordada.
63. Correram termos pelo DIAP 2.ª Secção de Gondomar os autos de inquérito com o n.º … com origem em participação de E contra o A. a quem imputa a prática dos crimes de burla qualificada previsto e punido pelos artigos 217.º, n.º1 e 218.º, n.º2, al. a), falsificação de documento, previsto e punido pelo art.º 256.º, n.º1 al. d) e n.º 3 e falsas declarações da previsão do artigo 348.º A, n.ºs 1 e 2 do Código Penal, no qual foi proferida despacho de arquivamento pelo Ministério Público em 12/04/2018 que se mostra junto aos autos com o req.º ref.ª 39439094 de 12/07/2021.
64. Em momento algum foi mencionado na reportagem a extinção do processo crime, onde era queixosa a referida “acompanhante de Luxo” de nome E.
65. No referido dia 12.02.2020, o programa televisivo exibiu várias imagens e gravações vídeo do Autor, da sua cara, junto à sua casa de morada de família e o do seu carro.
66. Foram exibidas imagens do Autor a entrar no carro, a sair do carro, à porta do Banco, à porta de casa e na auto-estrada, identificando-se em grandes planos a sua imagem, a sua cara.
67. As RR. A e C não contactaram pessoalmente o Autor, não o informaram pessoalmente de que estavam a levar a cabo esta investigação, de que iam transmitir a reportagem televisiva supra referida, não cuidaram de ouvir a sua versão dos factos.
68. As mesmas não colheram junto dele qualquer consentimento para efectuarem gravações em vídeo e fotografias sobre a sua pessoa, as quais sabiam que não tinham autorização do A. para filmarem e fotografarem o mesmo na sua vida profissional e pessoal.
69. A imagem do Autor foi divulgada, como forma de publicitação da aludida reportagem, durante os dias que antecederam a exibição da mesma e permaneceu na internet até pelo menos a data de 25/10/2022 nomeadamente através dos links: https://....24.iol.pt/ana-lealhttps://....24.iol.pt/sociedade/programa-ana-leal/ana-leal-clientes-do-Banco-acusam-gestor-de-conta-de-desviar-milhoes
70. As RR. sem autorização do Autor, utilizaram fotografias, imagens, filmagens do Autor a sair do carro, de casa, filmando e divulgando a sua imagem, o seu corpo e o seu rosto, divulgando o seu carro e a zona onde habita, passando-as na televisão, publicando-as e a reportagem/debate na sua página de “Facebook”, na internet, no Youtube e no site oficial da .... player, e que aí permaneceram até pelo menos a data de 25/10/2022 cfr. doc. 6 - vide a titulo exemplificativo: https://www.msn.com/pt-pt/video/....24/a-gestor-do-Bancoinvestigado-por-fraude-milion%C3%A1ria
71. Após tomar conhecimento, uns dias antes da transmissão da reportagem, pelo anúncio da exibição da referida reportagem na televisão, no dia 12.02.2020, o Autor instaurou procedimento cautelar contra as RR., .... televisão, SA, Sgps, SA e A, tendo sido citadas em 14/02/2020 que corre termos sob o n.º … junto do Tribunal Judicial da Comarca de … – cfr. doc.7 que junto.
72. No mesmo dia, 12.02.2020, pelas 16h35, o Autor, através da sua mandatária, dirigiu um email às RR., onde expressamente proibiu a emissão da reportagem e solicitou que fossem imediatamente retiradas todas as suas imagens da televisão, internet, e redes sociais, e as VT´S de apresentação do programa e ainda que fosse de imediato suspensa a transmissão do aludido programa/ reportagem no Jornal das 8 da ...., de hoje dia 12.02.2020, bem como em qualquer data posterior, em qualquer canal ou meio de comunicação social.– cfr. email junto como documento 8 com a PI que junta que a seguir se reproduz:
De: …
Enviada: quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020 16:35
Para: ….
Cc: …
 Assunto: Urgente - Reportagem a transmitir hoje pelas 20 horas no Jornal das 8 - A Reportagem- Mega burla milionária no Banco
Exmo. Senhores,
…., Advogada, titular da cédula profissional n.º …., com escritório na Rua….., na qualidade de mandatária do Exmo. Sr. Dr. J, devidamente mandatada de acordo com a procuração que anexo, venho informar que o m/ Cliente não autoriza a divulgação do seu nome, nem imagem no programa que será emitido hoje pelas 20 horas no Jornal das 8. O m/ Constituinte tomou conhecimento hoje, que a .... tem vindo a divulgar e a publicitar na televisão e meios de comunicação social, a emissão de um programa sob o tema- “Mega fraude milionária no Banco”. Na divulgação que tem vindo a ser efetuada pela .... e pela jornalista A aparece a imagem do m/ Constituinte, a identificação do seu rosto, automóvel e habitação.
Estranhamente e de forma contrária aos deveres a que estão adstritos os jornalistas que levaram a cabo esta investigação e reportagem, não contactaram o m/ Constituinte para obterem a sua versão dos factos ou sequer autorizar a divulgação do seu nome e imagem, que reitero, não autoriza.
No programa televisivo “Programa A – Reportagem” que será emitido hoje à noite, serão emitidas várias imagens e gravações vídeo do meu Constituinte, da sua cara, da sua casa de morada de família e o do carro, com acusações que não correspondem á verdade e que lhe causarão enorme prejuízo! Aliás, a imagem do Dr. J tem já sido divulgada, como forma de publicitação da aludida reportagem, durante os últimos dias, o que só hoje tomou conhecimento!!!
Reitero que ninguém da .... contactou o m/ Cliente para que fosse ouvido previamente, e informo que o m/ Constituinte possui prova da investigação já levada a cabo pelo Banco, da sua completa inocência e da falsidade das acusações que lhe são imputadas ou nas quais a PP (O Sr. J e mulher D. L) alegam estar envolvido. Há uma profunda má fé e intenção objectiva de prejudicar a vida de um profissional e um ser humano que sempre se dedicou com o maior empenho e dedicação à .... (Banco) e á sua vida profissional.
Colocar em causa a seriedade e honestidade de um bancário causa um prejuízo irreparável.
Resultou do relatório de averiguações realizado pela DAI que o Requerente não se apropriou de nenhuma quantia, e que as reclamações apresentadas eram totalmente infundadas e improcedentes.
Após a apresentação destas infundadas acusações no Banco, o Banco instaurou um processo disciplinar ao m/ Constituinte, tendo sido despendidas mais de 200 horas, na obtenção e análise de documentos e inquirição morosa de diversas testemunhas que todas confirmaram que a PP ( e seus legais representantes que aparecem nas VT´S da vossa reportagem) era uma empresa que habitualmente reclamava junto do Banco a dizer que não tinha autorizado débitos e operações que depois se confirmava estarem devidamente assinadas e autorizadas. O processo foi arquivado com prova rotunda de que nenhuma burla havia sido praticada, e de que o funcionário, meu Constituinte, visado na vossa reportagem havia sempre atuado de forma irrepreensível.
Informo que corre providência cautelar a proibir-vos de publicitarem e emitirem o programa e que se tal acontecer incorrerão em processo crime e cível.
Pelo exposto solicito sejam imediatamente retiradas todas as imagens do M/ Constituinte da televisão, internet, e redes sociais, e as VT´S de apresentação do programa e ainda que seja de imediato suspensa a transmissão do aludido programa/ reportagem no Jornal das 8 da ..., de hoje dia 12.02.2020, bem como em qualquer data posterior, em qualquer canal ou meio de comunicação social.
Com os melhores cumprimentos,
…/Lawyer
73. Em momento algum, as RR. interpelaram ou contactaram pessoalmente o Autor, e tiveram oportunidade de o fazer, porquanto cruzaram-se várias vezes na rua com aquele, nunca tendo ido ter com ele e falado diretamente.
74. A mandatária signatária foi contactada pelo Autor que a informou que andavam na zona do Banco de ... jornalistas da .... a fazerem perguntas sobre a empresa PP (PP) e o Autor.
75. A mandatária do Autor pressupôs que a reportagem seria sobre a PP, Lda.
76. A advogada do A. contactou a .... na pessoa de B…, no dia 04/02/2020, dizendo que tinha uma bomba que descredibilizava a PP, a empresa dos lesados entrevistados na reportagem.
77. O referido jornalista deu a conhecer esse contacto a N… e ele e a jornalista C deslocaram-se ao escritório da referida advogada no ….
78. A Exma. advogada queria saber o que estavam a investigar e que informações tinha e de quem.
79. Informando que a suposta “bomba” que descredibilizava por completo a “PP” era um “print” de uma SMS de uma alegada ex-funcionária da “PP”, a acusar a empresa PP de fazer lavagem de dinheiro.
80. A Ré C sabendo que estava no escritório da mandatária do Autor, porque no decurso da conversa lhe foi dito pela mesma, poderia ter informado que estava a fazer a reportagem sobre este, mas recusou-se a identificar o visado da reportagem a exibir.
81. Omitindo os jornalistas que o Autor era o visado da reportagem mesmo após terem sido instados pela advogada do Autor sobre o assunto que estavam a investigar e seus intervenientes, porque se algo estivesse relacionado com o seu Constituinte tinha prova documental da sua inocência.
82. As RR. tomaram conhecimento, antes da data da transmissão da reportagem/debate, da existência de processo disciplinar instaurado pelo Banco contra o A. e do seu arquivamento.
83. Na aludida reportagem não foi mencionado directamente que o processo de investigação tinha sido arquivamento pelo Banco nem que o processo disciplinar instaurado pelo Banco ao Autor tinha sido objecto de decisão de arquivamento.
84. As RR. não transmitiram a informação da existência de processo crime instaurado pelo Autor contra a PP e J, que corria termos com o n.º …, no DIAP de ...;
85. O A. sentiu-se ofendido na sua honra, imagem e bom nome em consequência da emissão da reportagem e do debate televisivos.
86. Após a transmissão da reportagem e debate televisivo em questão, a vida familiar, social e profissional do Autor e da sua família sofreram um grande abalo.
87. A referida reportagem foi novamente exibida pela Ré ..., através do canal ...24, no dia 14 de março de 2020, pelas 22h30 e no dia seguinte, 15 de março, pelas 08h29 no programa “A” no canal “...24”.
88. as imagens do Autor e as acusações que lhe imputam foram transmitidas na altura do surto de coronavírus (COVID-19) que assolava o País e o mundo.
89. As RR. decidiram exibir novamente a reportagem, com o intuito de angariar audiências.
90. As RR. fizeram-no quando já tinham sido citadas no procedimento cautelar.
91. Esta situação desenvolveu no Autor insónias, ansiedade e depressão.
92. O Autor viveu uma grande angústia e ansiedade pois receava ser definitivamente afastado do Banco.
93. O Autor, sabendo que muita gente ficou a saber onde vive, onde trabalha e em que viatura se desloca, e perante o mediatismo que viveu nos dias em que foi transmitida a reportagem, temeu pela sua segurança e da sua família.
94. A sua mulher, filhos e pais, choraram várias vezes por causa da reportagem/debate.
95. O Banco, onde o Autor trabalha desde 1995, face ao impacto publico da reportagem, e, não obstante ter procedido ao arquivamento dos processos de averiguações e disciplinar, mudou o A. de funções e de local de trabalho, para o Centro de empresas do …. colocando-o em funções administrativas, sem contacto com clientes.
96. Em nome da entidade empregadora, representada pelo Dr. V, solicitaram-lhe que assinasse um documento em que declarava concordar com a sua destituição das funções comerciais de Gerente de Cliente Empresas.
97. O Autor sentiu-se e sente-se ferido, humilhado, revoltado e incrédulo.
98. Na sequência do mencionado na reportagem o Autor chegou a ser apontado e incomodado com insultos sempre que saía à rua, passando a evitar sair à rua;
99. O Autor é uma pessoa de bem, respeitada na sociedade, nomeadamente na sua cidade natal e no meio onde habita, onde sempre foi conhecido e considerado.
100. Desde o dia 12.02.2020, o Autor tem sido alvo de críticas nas redes sociais, na rua, nos cafés, nas escolas dos filhos e universidade da filha.
101. O Autor chegou a pedir aos seus filhos que evitassem as redes sociais, perante comentários maldosos e ofensivos, que os afetam.
102. O Autor sempre foi um profissional exemplar, empenhado, honesto, respeitador e respeitado por todos.
103. A transmissão da reportagem e debate televisivos mancharam publicamente a imagem e o nome do Autor.
104. a imagem e o nome de um gestor bancário são cruciais para o exercício dessa profissão. 
105. Os pais do Autor, choraram várias vezes por causa da reportagem.
106. Na escola, os filhos do Autor ouvem o Pai ser apelidado de ladrão e vigarista.
107. A filha mais velha do Autor, estudante universitária, chegou a suspender a frequência do curso.
108. As RR. tinham conhecimento da imagem de perfil do Autor na rede “Whatsapp”.
109. O A. quando exercia funções no Centro de empresas de ... beneficiava da atribuição e uso de viatura automóvel e telemóvel, a cargo da entidade empregadora e de isenção de horário.
110. Em Dezembro de 2020 o Banco retirou ao Autor o telemóvel que lhe tinha sido atribuído.
111. No dia 29 de julho de 2021, o Autor foi contactado pelo Banco no sentido de ser alcançada uma rescisão por mútuo acordo do contrato de trabalho, a qual o A. não aceitou – doc.3.
112. Foi retirada ao Autor a isenção de horário de trabalho.
113. O A. já não tem carro atribuído e para ir trabalhar para o Centro de Empresas do …. o Autor tem de efetuar deslocações diárias entre …. e o …, suportando as despesas de deslocação.
114. Em Dezembro de 2021 o Banco emitiu a favor do A. o aviso de crédito junto como doc. 4 com o articulado superveniente relativo à categoria de gerente tendo sido pago ao A. nesse mês o vencimento líquido de €1.982,05 - cfr..
115. A jornalista C consultou a acção executiva e o processo crime referidos em 62 e 63 dos factos provados, antes da transmissão da reportagem.
116. O A. apresentou queixa crime contra PP e J por crime de denuncia caluniosa p.º e p.º pelos art.ºs 180.º, n.º1, 182.º e 183.º, n.º1, al. b) do CP por a denunciada ter apresentado a reclamação em 18/05/2018 à Provedoria do Cliente do Banco que seguiu como processo de inquérito com o n.º …. no Departamento de Investigação e Acção Penal-secção de ..., no qual foi proferido despacho de arquivamento em 01/09/2020 junto com o req.º ref.ª 39404093.
117. O A. apresentou queixa crime contra a sociedade .... televisão, SA, SGPS, SA e PP, Lda, J, M, A e C que seguiu como processo de inquérito com o n.º … pelo Departamento de Investigação e Ação Penal- Secção de …, no qual foi em 31/05/2022 proferido despacho de arquivamento quanto às sociedades por inadmissibilidade legal, e deduzida acusação contra as pessoas singulares por três crimes de devassa da vida privada p. e p. pelo artigo 192.º, n.º1, als. a) b) e d) do CP com a agravação prevista no artigo 197.º, al. b) do mesmo diploma, por referência aos artigos 30.º, n.º1, 31.º, n.º1 e 3 da Lei 2/99 de 13 de janeiro, três crimes de Gravações e fotografias ilícitas p. e p. pelo artigo 199.º, n.º2 al. a) e b) do CP, com a agravação prevista no artigo 197.º, al. b) do mesmo diploma legal, aplicável ex vi do art.º 3 daquele preceito legal, por referência aos art.ºs 30.º, n.º1, 31.º, n.ºs 1 e 3 da Lei 2/99 de 13 de Janeiro e os arguidos J e M em co-autoria material de um crime de denúncia caluniosa p. e p. pelo artigo 365.º, n.º2 do Código Penal por factos praticados na reportagem7debate em causa nos autos.
118. Foi ainda no processo referido no ponto que antecede proferido despacho a acompanhar em parte a acusação particular do A. em que imputa aos arguidos J, M, A e C a prática em co-autoria material sob a forma consumada em concurso três crimes de difamação agravada com publicidade e calúnia p. p. pelo artigo 180.º, n.º1, 182.º, 183.º, n.º1, al. a) e b) e n.º 2 do Código Penal».
3.2. A sentença sob recurso considerou não provada a seguinte matéria de facto:

«a) as Rés não tinham o contacto direto do Autor.
b) a jornalista e o repórter de imagem que a acompanhou, ouviram vários testemunhos idênticos e credíveis de outros lesados pelo Autor e que não quiseram dar a cara, mas que foram determinantes na consolidação da investigação jornalística.
c) após a emissão da reportagem, a jornalista recebeu mais denúncias visando o mesmo gestor bancário e as mesmas práticas.
d) O valor base do modelo jaguar XF começa nos 130 mil euros.
e) a seleção das imagens a exibir teve sempre em conta o respeito pela dignidade do visado.
f) A fotografia de perfil do denunciante na rede “WhatsApp” é uma imagem de corpo inteiro, de calções, tronco nu e barriga proeminente, a beijar a mulher, em biquíni.
g) A PP, Lda. nunca recebeu o valor das obras na loja do Centro Comercial Colombo, que nunca lhes foi entregue a letra de cambio e por isso paga.
h) o recorte de jornal, que foi exibido na reportagem da ..., não foi fornecido à jornalista pela PP, mas por outra das fontes, que não tendo participado na reportagem, relatou à jornalista e ao seu repórter de imagem um esquema em tudo idêntico ao denunciado pelas pessoas que “deram a cara”.
i) E que garantiu que, apesar de a notícia do “Correio da Manhã” não identificar o bancário, imediatamente o identificou, tanto que até guardou o recorte do jornal.
j) A jornalista contactou o advogado da referida acompanhante e mais tarde a própria.
k) A referida senhora não quis participar na reportagem, alegando que não pretendia revelar pormenores do acordo.
l) durante a investigação para a reportagem, uma das fontes ouvidas, contactou a jornalista dizendo-lhe que o Autor já sabia da investigação jornalística e que já lhe teria enviado uma SMS com “ameaças” para levá-la a desistir de participar na reportagem. Facto que infelizmente conseguiu.
m) quando em 25 de novembro de 2017, o jornal “Correio da Manhã” noticiou “Exige fortuna por sexo de luxo” em ... todos ficaram a saber quem era: o gestor bancário do Banco, J.
n) O Autor recusou exercer o contraditório que lhe foi proporcionado.
o) a jornalista ouviu outros lesados que não participaram na reportagem, mas que descreveram esquemas idênticos praticados pelo Autor no seu âmbito profissional.
p) Ouviu-os individualmente, sem que nenhum soubesse o que os outros relataram, para que fossem o mais espontâneos possível e não se sentissem compelidos a aderir às versões de outros.
q) Para não induzir respostas, a jornalista nunca mencionou o nome do bancário, tendo sido essas pessoas sempre por livre iniciativa a mencionar “o Dr. J, do Banco”.
r) Uma das fontes, chegou mesmo a dizer: “Vamos lá deixar de falar em código, eu estou a falar do Dr. J, do balcão do Banco, em ...”.
s) O mesmo se passou quando ouviu a ex-funcionária da PP, senhora L foi categórica ao afirmar à jornalista e ao repórter de imagem, que chegou a levantar cheques e a entregar o dinheiro em mão ao Dr. J.
t) foi ouvida pelos jornalistas sem a presença da ex-patroa ou de qualquer outra pessoa, precisamente para não se sentir condicionada ou tentada a aderir à versão de outros.
u) No …, entre fevereiro de 2020 e maio de 2021, o Autor não teve um posto de trabalho, telefone e computador fixos, apenas podendo trabalhar em postos de outros Colegas que se encontram ausentes ou em regime de teletrabalho.
v) Até à presente data o Autor não tem ainda no seu atual posto de trabalho um telefone fixo.
w) a isenção de horário de trabalho, à data, era no valor mensal de €984,50.
x) Nesse mês, em 20 de agosto de 2021, no período de gozo de férias do Autor, o Banco comunicou, por escrito, ao Autor a cessação do pagamento da 5 retribuição adicional que, desde 1998, entre o trabalhador e a entidade empregadora tinha sido acordada e que, desde então, sempre foi paga.
y) Em novembro de 2021, o Banco deixou de pagar ao Autor a retribuição adicional no valor mensal de €984,50, o que se mantém até à presente data.
z) o Autor recebia mensalmente (14 meses por ano) um salário ilíquido aproximado de €3.500,00, a que acrescia a concessão ao Autor de um cartão mensal de combustível previamente pago a cargo da entidade empregadora.
aa) O A. despende em média mensalmente a quantia de 722,20€ em deslocações de ... para o …, em combustível, portagens, parques de estacionamento e alimentação».

IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
4.1. Comecemos pela impugnação da matéria de facto.
A este respeito, importa não esquecer que o regime processual vigente restringe a possibilidade de revisão da matéria de facto a questões de facto controvertidas, relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente, admitindo-se, apenas, a reapreciação de concretos meios probatórios relativos a determinados pontos de facto impugnados.
Rejeitaram-se, desta forma, quer soluções maximalistas que determinam a repetição de julgamentos ou a reapreciação de todos os meios de prova anteriormente produzidos, quer a possibilidade de recursos genéricos contra a decisão de facto (cfr. Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Almedina, Coimbra, 7.ª ed., 2022, p. 194 e segs.).
Com efeito, de acordo com o disposto no art.º 640.º do CPC, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados (com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões) e, fundando-se a impugnação em meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados, especificar, na motivação, aqueles que, em seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos, devendo, ainda, consignar, na motivação do recurso, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos (cfr. Ob. Cit., p. 197 e 198).
No caso dos autos, as recorrentes cumpriram o ónus de impugnação previsto no art.º 640.º do CPC, pelo que nada obsta à apreciação do recurso.
4.1.1. Principiam as recorrentes por requerer que o facto provado sob o n.º 64 seja eliminado, por não corresponder à prova constante dos autos e ser contraditório com facto provado sob o n.º 50, ou, pelo menos, que seja corrigido e passe a ter a seguinte redacção «foi mencionado na reportagem a extinção do processo crime, onde era queixosa a referida “acompanhante de Luxo” de nome E » (cfr. conclusões G) e H)).
Argumentam as recorrentes que, através da visualização dos vídeos da reportagem, verifica-se que a jornalista afirmou, expressamente, que «(…) foi notícia o caso da acompanhante de Luxo que acusava um bancário de ....a tinha enganado… a relação terminara em 2016… com o bancário a exigir o apartamento de volta…a acompanhante chegou a processar J por burla…J contestou … depois da notícia as partes chegaram a acordo… com processo arquivado em Abril de 2018 (…)».
O recorrido defende que não pode proceder a impugnação da decisão relativa ao facto provado n.º 64 por falta de indicação dos meios de prova que impunham decisão diversa da proferida, já que as recorrentes não indicam a que minuto da reportagem foi mencionada a extinção do processo crime, sendo certo que inexiste a apontada contradição, pois que o facto n.º 50 refere-se à acção executiva que recorrido instaurou e o n.º 64 ao processo crime.
Vejamos.
Desde logo, não assiste razão ao recorrido quanto à rejeição do recurso: as recorrentes indicaram o meio de prova que impunha decisão diversa (o vídeo da reportagem), sendo que a obrigação relativa à menção concreta das passagens da gravação em que fundam a impugnação respeita à gravação de declarações e depoimentos e não, salvo melhor opinião, ao vídeo em causa, que foi junto como documento e, como tal, tem de ser analisado e valorado, oficiosamente, no seu todo.
O n.º 64 dos factos provados tem a seguinte redacção: «Em momento algum foi mencionado na reportagem a extinção do processo crime, onde era queixosa a referida “acompanhante de Luxo” de nome E».
O processo crime que nele se refere é o que vem identificado no n.º 63: inquérito com o n.º …, com origem em participação de E contra o A., a quem imputa a prática dos crimes de burla qualificada previsto e punido pelos artigos 217.º, n.º1 e 218.º, n.º2, al. a), falsificação de documento, previsto e punido pelo art.º 256.º, n.º1 al. d) e n.º 3, e falsas declarações da previsão do artigo 348.º A, n.ºs 1 e 2 do Código Penal, e no qual foi proferido despacho de arquivamento pelo Ministério Público em 12.04.2018.
Ora, tal como decorre do n.º 50 dos factos provados, na reportagem em causa é dito, nomeadamente, que: «(…) foi notícia o caso da acompanhante de Luxo que acusava um bancário de ....a tinha enganado… a relação terminara em 2016… com o bancário a exigir o apartamento de volta…a acompanhante chegou a processar J por burla…J contestou … depois da notícia as partes chegaram a acordo… com processo arquivado em Abril de 2018 (…)».
Neste trecho é, apenas, feita alusão, ainda que implicitamente, ao processo crime instaurado na sequência da queixa da suposta “acompanhante de luxo” (é esse o sentido da expressão “chegou a processar…”), aí se referindo que o processo foi arquivado em Abril de 2018, o que, efectivamente, sucedeu (cfr. n.º 63).
Contrariamente ao defendido pelo recorrido, é inequívoco que o referido trecho da reportagem não se refere à acção executiva, até porque esta não foi “arquivada”, antes tendo sido julgada extinta, na sequência de transacção das partes, por sentença de 08.05.2018 (cfr. n.º 62 dos factos provados e documento nele referido).
É certo que, na passagem da reportagem supracitada, refere-se que “as partes chegaram a acordo”, mas com isso pretenderá aludir-se ao requerimento conjunto que a queixosa e o arguido apresentaram no processo de inquérito e que esteve na origem do seu arquivamento quanto ao crime de burla qualificada (vide o teor da primeira parte do despacho de arquivamento, no documento referido no n.º 63).
Assim sendo, importa eliminar o n.º 64 dos factos provados.
Refira-se que a alteração pretendida, subsidiariamente, pelas recorrentes mostra-se inútil, por já decorrer do n.º 50, nomeadamente, do excerto citado.
Procede, pois, o recurso nesta parte.
4.1.2. Prosseguem as recorrentes, pugnando pela eliminação dos factos provados sob os n.ºs 67 e 73, que consideram repetirem, essencialmente, a mesma factualidade, defendendo que: tais factos são conclusivos e contraditórios com outros factos provados; comportam a visão jurídica que a Mma. Juíza tinha reservado para os presentes autos e que é patente das sucessivas e orientadas interrupções do depoimento da jornalista; a prova produzida em audiência é contrária a tais factos, pois que as declarações da R. C, prestadas de forma credível, espontânea e serena (sessão de julgamento de 11/10/2022, com a referência 20221011103118, dos 2 minutos e 55 segundos, até aos 8 minutos e 20 segundo) impõem decisão diversa, delas resultando que tentou ouvir a versão do A. e entendeu que a melhor forma de o fazer era dirigir um pedido de contacto à assessoria de imprensa do Banco (factos n.º 37), tendo esse pedido sido rejeitado, ficando aquela R. com a sensação de que não existia a vontade de esclarecer a questão, não existindo qualquer motivo ou prova que contrarie a sua versão dos factos (cfr. conclusões I) a O)).
O recorrido pronunciou-se, argumentando resultar do depoimento de parte da R. C que o A. não foi, pessoalmente, contactado, informado ou ouvido  sobre a investigação jornalística em causa, conforme resulta da assentada confessória efectuada e das passagens da gravação que refere, o que também decorre dos depoimentos das testemunhas N, M, R, F, nas partes que transcreve.
Vejamos.
São os seguintes os factos em crise:
«67. As RR. A e C não contactaram pessoalmente o Autor, não o informaram pessoalmente de que estavam a levar a cabo esta investigação, de que iam transmitir a reportagem televisiva supra referida, não cuidaram de ouvir a sua versão dos factos».
«73. Em momento algum, as RR. interpelaram ou contactaram pessoalmente o Autor, e tiveram oportunidade de o fazer, porquanto cruzaram-se várias vezes na rua com aquele, nunca tendo ido ter com ele e falado diretamente».
A sentença recorrida motivou esta factualidade da seguinte forma:
- a R. C «admitiu que pessoalmente não contactaram o autor e, por isso, também não informaram pessoalmente que estava a ser levada a cabo a investigação em causa, nem por essa forma pessoalmente ouviram a sua versão dos factos, acrescentando a depoente que a audição do autor foi tentada através da entidade patronal, através da assessoria de imprensa da entidade patronal do autor, por contacto telefónico e por e-mail enviados para a referida assessoria de imprensa, endereço esse de e-mail fornecido pela assessoria de imprensa. Esclarece que não contactou o autor pessoalmente não tendo enviado e-mail directamente para ele, telefonado directamente para ele ou falado presencialmente com ele. Para si, considera que contactar a entidade patronal é contactar directamente o autor, pela forma como o fez pelo e-mail enviado em que solicitou a entrevista ao autor»;
- a R. A confirmou que foi a R. C que fez a investigação em causa e «confirma o envio do email de 07/02/2020 ao Banco para assessoria de imprensa pela C. No dia 11/02/2020 o Banco responde a dizer que o A. não estava disponível para ser ouvido».
Na acta da sessão da audiência final realizada no dia 11.10.2022 consta a seguinte assentada, efectuada nos termos do art.º 463.º do CPC, relativamente ao depoimento de parte da R. C: «a ré declarou que pessoalmente não contactaram o autor e, por isso, também não informaram pessoalmente que estava a ser levada a cabo a investigação em causa, nem por essa forma pessoalmente ouviram a sua versão dos factos, acrescentando a depoente que a audição do autor foi tentada através da entidade patronal, através da assessoria de imprensa da entidade patronal do autor, por contacto telefónico e por e-mail enviados para a referida assessoria de imprensa, endereço esse de e-mail fornecido pela assessoria de imprensa. Esclarece que não contactou o autor pessoalmente no sentido de não lhe ter enviado e-mail directamente para ele, telefonado directamente para ele ou falado presencialmente com ele. Para si, considera que contactar a entidade patronal é contactar directamente o autor, pela forma como o fez pelo e-mail enviado em que solicitou a entrevista ao autor. Na parte final do artigo 85º, acrescenta que foi enviado e-mail ao gabinete imprensa do Banco a solicitar a presença do autor. (…) disse que apenas o viu na rua, uma vez que coincidiu com a filmagem da imagem do mesmo. Disse ainda que nunca falou directamente com ele, no sentido de pessoalmente».
Tal assentada não foi objecto de qualquer reclamação, correspondendo, de resto, ao depoimento da R. C, por nós ouvido e transcrito pelas recorrentes e pelo recorrido nas respectivas alegações. Desse depoimento decorre, inequivocamente, confirmada a factualidade vertida nos n.ºs 67 e 73 dos factos provados, sendo certo que o advérbio de modo “pessoalmente” significa “de modo pessoal”, “por si próprio”, “directamente” ou “sem o intermédio”.
A questão de saber se o contacto feito, por e-mail e por telefone, para a assessoria de imprensa da entidade patronal do A. era ou não suficiente para ter-se o A. por contactado/auscultado para os efeitos previstos na legislação aplicável, nomeadamente, no Estatuto do Jornalista e no Código Deontológico dos Jornalistas, é já uma questão de direito, a abordar e resolver, se for pertinente, no ponto 4.2. deste acórdão.
Improcede, assim, o recurso nesta parte.
4.1.3. Continuam as recorrentes, advogando que os factos provados sob os n.ºs 80 e 81 devem ser alterados e passar a ter a seguinte redacção «A Ré C quando esteve no escritório da mandatária do Autor não informou que este era o visado da reportagem a exibir porque ainda não tinha terminado o trabalho de investigação da notícia».
Argumentam que tais factos não têm sustentação na prova e são, em grande medida, conclusivos, sendo que das declarações R. C (sessão de julgamento de 11/10/2022, com a referência 20221011103118, dos 14 minutos e 40 segundos, até aos 17 minutos e 21 segundo) e do depoimento da testemunha N (sessão de julgamento de 19/12/2022, com a referência 20221219141204) não é possível extrair todo o conteúdo fáctico incluído nos n.ºs 80 e 81 (cfr. conclusões P) a S)).
O recorrido pronunciou-se, salientando que a R. C confessou que, sabendo que a mandatária do A. era a sua representante legal e tendo estado no seu escritório três dias antes, optou por enviar, no dia 07.02.2020, um email ao Banco, para a assessoria de imprensa (que não representa o A.) e nada disseram deliberadamente à sua mandatária, nem ao A., visado na reportagem, sendo que aquela R. referiu no seu depoimento que  “não podia abrir o jogo”, que “não ia ouvi-lo naquela altura porque ainda corria o risco de aquela reportagem ir parar ao lixo” e  que “se a Sra. Dra. tivesse sabido na altura, o que nós estávamos a fazer, a providência cautelar teria saído muito mais cedo, como era evidente, e nós não andamos aqui a dormir”.
Vejamos.
São os seguintes os factos em causa:
«80. A Ré C sabendo que estava no escritório da mandatária do Autor, porque no decurso da conversa lhe foi dito pela mesma, poderia ter informado que estava a fazer a reportagem sobre este, mas recusou-se a identificar o visado da reportagem a exibir».
«81. Omitindo os jornalistas que o Autor era o visado da reportagem mesmo após terem sido instados pela advogada do Autor sobre o assunto que estavam a investigar e seus intervenientes, porque se algo estivesse relacionado com o seu Constituinte tinha prova documental da sua inocência».
A sentença recorrida motivou esta factualidade com base nas declarações do A., conjugadas com os depoimentos das RR. C A e com o depoimento da testemunha N, referindo que:
- a R. C «confessa que se deslocou, acompanhada com N, ao escritório da mandatária do autor, Dr.ª …, mas quando o fez, embora soubesse que era advogada, desconhecia que era a mandatária do autor, tendo-se deslocado na sequência do contacto da referida mandatária para o colega de nome Bruno Caetano que, por sua vez, deu a conhecer ao colega N. Nesse contacto foi perguntado pela mandatária do autor se estavam a fazer uma investigação à empresa PP e que tinham uma “bomba” (não era mais que uma SMS) que descredibilizava os responsáveis por essa empresa. A advogada queria saber o que sabiam sobre o A.. Aquando da conversa que tiveram com a mandatária do autor, não referiram que estavam a fazer uma reportagem que visava o autor, porque ainda estava em investigação. Admite que perguntou quem é que a mandatária representava, a qual lhe disse que representava o aqui autor, mas mesmo assim não referiu que a reportagem visava o autor. Confessa ter-lhe sido dito pela mandatária do autor que tinha prova documental da inocência do autor, documentação essa que nunca foi mostrada conforme explicou. Diz que as imagens do A. foram recolhidas apenas num dia. Confirmou que lhe foi dito na conversa da mandatária do autor que tinha existido um processo disciplinar contra o autor e que o mesmo tinha sido absolutamente ilibado do mesmo. A advogada não facultou o processo disciplinar. A advogada disse que lho ia enviar, mas não enviou. Ela, depoente, solicitou que lhe fosse enviado o processo disciplinar que nunca chegou a receber. Tomou conhecimento durante a investigação da existência de processo crime contra o autor, em que eram queixosos a Sr.ª L e o marido (responsáveis da empresa PP), processo que tentou consultar, mas que estava em segredo de justiça, tendo sido dito no M.P. que não havia arguidos constituídos».
- a R. A «mencionou um episódio da C chegar indignada à .... porque uma advogada telefonou a dizer que tinha “uma bomba sobre os lesados”. A C foi ter com a advogada para saber que bomba era essa. Afinal o que a advogada queria saber era coisas sobre o que estava a investigar a mesma disse que tinha uns documentos do processo disciplinar e que tinha sido arquivado. Não havia nada sobre os lesados. A advogada disse a dada altura que representava o A.»;
- a testemunha N «confirma que houve um colega …. que lhe comunicou que uma advogada queria falar com eles. Foram ao escritório no …, e ela dizia que tinha informações verdadeiras sobre as pessoas que estavam a contar a história que as desmascararam. Ela dizia que tinha coisas bombásticas para dizer, mas ela não adiantou nada. Perceberam que a Advogada representava o A. Ela prometeu a entrega de documentos do processo disciplinar» e «omitiu à advogada que estavam a investigar sobre o Dr. … porque o sigilo assim o obrigava. Acha que a advogada sabia que a investigação era sobre o A.».
Ora, da súmula dos referidos depoimentos (que se mostra conforme ao que foi, efectivamente, dito pelas RR. e pela testemunha em causa, cujo registo sonoro foi por nós auscultados) decorre, sem dúvidas, a factualidade vertida nos n.ºs 80 e 81.
Não vislumbramos, pois, que o tribunal a quo tenha violado qualquer regra de direito probatório aquando da apreciação dos meios de prova, antes tendo procedido a uma análise conjugada e crítica da prova produzida, observando e aplicando as normas legais, os princípios e as regras da racionalidade, da lógica e da experiência comum que se impunham.
Não podemos esquecer-nos que, de acordo com o disposto no art.º 607.º, n.º 5 do CPC, o “juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”, com exclusão, apenas, dos factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, bem como daqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.
O princípio da livre apreciação da prova impõe que o julgador proceda a uma valoração de cada meio de prova produzido, interligando-o com os demais elementos probatórios que constem dos autos, socorrendo-se dos conhecimentos científicos adquiridos e das regras de experiência comum da vida (cfr. Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, Conceito e Princípios Gerais à luz do Código Revisto, Coimbra, 1996, p. 157 e segs., e Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, II, p. 209).
A prova é, assim, apreciada segundo critérios de valoração racional e lógica do julgador, com recurso às regras da experiência e critérios de lógica. Neste sentido, escreve Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Reimpressão, 1993, p. 384, que «segundo o princípio da livre apreciação da prova o que torna provado um facto é a íntima convicção do juiz, gerada em face do material probatório trazido ao processo (bem como da conduta processual das partes) e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento dos homens; não a pura e simples observância de certas formas legalmente prescritas».
A prova idónea a alcançar um tal resultado é a prova suficiente, isto é, a que conduz a um juízo de certeza jurídica (e não uma certeza absoluta): a prova visa, apenas, de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à aplicação prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto.
É, por isso, comumente aceite que o juiz da 1ª Instância, perante o qual a prova é produzida, está em posição privilegiada para proceder à sua avaliação, e, designadamente, detectar no comportamento das testemunhas e das partes elementos relevantes para aferir da espontaneidade e credibilidade dos depoimentos, o que, frequentemente, não transparece da respectiva gravação.
Desta forma, a alteração da matéria de facto só deve ser efectuada pelo Tribunal da Relação quando este possa concluir, com a necessária segurança, que a prova produzida aponta em sentido diverso e impõe uma decisão diferente da que foi proferida pelo tribunal a quo, isto é, quando tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento na matéria de facto.
No caso dos autos, após ouvidas as declarações e depoimentos produzidos e analisados os mesmos, criticamente e de forma conjugada, não podemos deixar de aderir à fundamentação aduzida pelo tribunal a quo.
Mais uma vez, a questão de saber se o procedimento adoptado foi o correcto e se está conforme aos princípios e normas deontológicas aplicáveis (nomeadamente, saber se a R. C deveria ter informado a mandatária do A. de que estava a fazer uma reportagem sobre este e qual o assunto que estava a investigar ou se a recusa de identificação do visado da reportagem era legítima e justificada no caso) é já uma questão de direito, a apreciar no lugar próprio.
E, assim sendo, improcede, aqui também, o recurso.
4.1.4. Consideram, ainda, as recorrentes que o facto provado sob o n.º 83 deve ser eliminado ou, pelo menos, passar a ter a seguinte redacção «Na aludida reportagem foi mencionado que o processo de investigação tinha sido indeferido pelo Banco, não sendo mencionado o processo disciplinar instaurado pelo Banco ao Autor e que tinha sido objecto de decisão de arquivamento», por estar em contradição com o facto provado sob o n.º 51 (cfr. conclusões T) a U)).
Já o recorrido defende resultar do depoimento da R. C que não foi referido diretamente que o processo de investigação tinha sido arquivado pelo Banco, nem que o A. tinha sido ilibado do processo disciplinar, do que tinha conhecimento.
Vejamos.
É a seguinte a redacção do n.º 83 dos factos provados: «Na aludida reportagem não foi mencionado directamente que o processo de investigação tinha sido arquivamento pelo Banco nem que o processo disciplinar instaurado pelo Banco ao Autor tinha sido objecto de decisão de arquivamento».
O tribunal a quo formou a sua convicção quanto a este facto com base na visualização dos vídeos da reportagem e do debate juntos aos autos.
O n.º 51 dos factos provados (não posto em causa neste recurso), tem a seguinte redacção: «51. É dito além do mais que … este foi o único ponto em que a provedoria do cliente do Banco veio a dar razão a L e J mas nem assim o banco assumiu o prejuízo… os empresários queixaram-se do bancário J à Provedoria do Banco e também ao Conselho de Administração do banco…A Provedoria do Cliente demorou 9 meses a responder, no final indeferiu o reembolso dos 200 mil euros pelos cheques endossados ao gerente J, entendeu que não se reuniram evidências de apropriação pelos colaboradores do Banco… o caso está agora com a Polícia Judiciária… .O Banco e o colaborador J recusaram prestar esclarecimentos alegando estarem impedidos por lei de revelarem informações… o inquérito crime está pendente no DIAP de … há mais de um ano até ao momento sem arguidos… Se a empresa já estava mal o desaparecimento de 300.000 euros entre cheques letras e algum dinheiro vivo que nunca foi depositado tudo isto deu o golpe final … ficaram inibidos no banco de Portugal … a insolvência é agora o caminho mais provável…».
Vê-se, pois, que na reportagem em causa é, apenas, dito que a Provedoria do Cliente do  Banco “indeferiu o reembolso dos 200 mil euros pelos cheques endossados ao gerente J” e que “entendeu que não se reuniram evidências de apropriação pelos colaboradores do Banco”, sem mencionar que o processo de investigação tinha acabado por ser arquivado e, deixando, ao invés, subentender que não estaria findo, na medida em que refere que “o caso está agora com a Polícia Judiciária”.
É, assim, apodíctico afirmar que na reportagem em apreço não foi mencionado directamente que os processos de investigação e disciplinar instaurados ao A., internamente, pelo Banco tinham sido objecto de decisões de arquivamento, não se verificando a contradição apontada pelas recorrentes.
Destarte, improcede, igualmente, o recurso nesta parte.
4.1.5. Finalmente, entendem as recorrentes que «existe um conjunto de factualidade que, tendo sido por estes alegada na contestação, em função da prova dos autos e que por não ter sido posta em crise, deveria ter sido dada como provada», designadamente a seguinte:
«A jornalista e o repórter de imagem que a acompanhou, ouviram vários testemunhos idênticos e credíveis de outros lesados pelo Autor, que não quiseram dar a cara, mas que foram determinantes na consolidação reportagem»
«O recorte de jorna Correio da Manhã, que foi exibido na reportagem, foi fornecido à jornalista por outra das fontes que não tendo participado na reportagem, relatou à jornalista e ao seu repórter de imagem um esquema em tudo idêntico».
Sustentam tal pretensão nos depoimentos da R. C (sessão de julgamento de 11/10/2022, com a referência 20221011103118, dos 25 minutos e 50 segundos, até aos 28 minutos e 40 segundo) e da testemunha N (sessão de julgamento de 19/12/2022, com a referência 20221219141204, a partir do minuto 11 e até ao minuto 19), que consideram esclarecedores, coerentes e credíveis e não postos em causa pelos depoimentos de outras testemunhas ou por qualquer outra forma (cfr. conclusões V) a Z)).
O recorrido opôs-se a tal pretensão, argumentando que as recorrentes não identificam de que peça processual constam alegados tais factos.
Decidindo.
No art.º 41.º da contestação, as RR. alegaram que «Além disso, a jornalista e o repórter de imagem que a acompanhou, ouviram vários testemunhos idênticos e credíveis de outros lesados pelo Autor e que, infelizmente, não quiseram dar a cara, mas que foram determinantes na consolidação da investigação jornalística».
No art.º 57.º da contestação, as RR. alegaram que «Aliás, o recorte de jornal, que foi exibido na reportagem da ...., não foi fornecido à jornalista pela PP, mas por outra das fontes, que não tendo participado na reportagem, relatou à jornalista e ao seu repórter de imagem um esquema em tudo idêntico ao denunciado pelas pessoas que “deram a cara”».
Tais factos foram considerados não provados pelo tribunal recorrido (als. b) e h) dos factos não provados), com a seguinte justificação: «Quanto aos factos b) … nenhuma prova as RR. fizeram que tivessem ouvido outros lesados, que nem sequer foram identificados nem arrolados como testemunhas nem ouvidos em audiência, sendo que as pessoas que a jornalista ouviu (J, L e L) reportava-se à mesma alegada lesada a PP, Lda» e «Quanto aos h) …. não foi feita prova resultando até do depoimento de L ter sido ela que entregou cópia da notícia à jornalista».
Ora, em face das passagens das declarações e depoimento mencionados pelas recorrentes nas suas alegações, não podemos deixar de acompanhar a convicção do tribunal a quo.
Com efeito, tais declarações e depoimento resultaram demasiado vagos e genéricos e não foram apoiados em qualquer evidência objectiva que demonstrasse a sua credibilidade ou verosimilhança. Na verdade, quer a R. C, quer a testemunha N não lograram concretizar e identificar as pessoas/lesados que, alegadamente, prestaram perante si “testemunhos idênticos e credíveis” e que lhes forneceram um recorte de jornal, as quais, de resto, não arrolaram como testemunhas, não tendo sequer concretizado as informações ou denúncias que tais pessoas, alegadamente, forneceram.
E nem justifique tal omissão com o dever de sigilo das fontes jornalísticas, porque foram as recorrentes que optaram por alegar os factos em causa e pretendem, agora, prevalecer-se dos mesmos, a fim de, quanto parece, evidenciarem terem levado a cabo uma “investigação, pautada pelo rigor e objectividade, que confrontou e cruzou diversas fontes testemunhais e documentais que confirmou os factos relatados” (cfr. art.º 10.º da contestação). É que, às RR. não competia, apenas, o dever de alegação dos factos essenciais em que basearam as excepções invocadas, incumbindo-lhes, também, o ónus de provar tais factos, não podendo, obviamente, eximir-se desse ónus através da invocação de deveres de sigilo. Não pretendendo as RR. violar esse sigilo, bastar-lhes-ia não alegar tais factos; alegando-os, resta-lhes conformar-se com a sua não prova, se não identificarem - como não identificaram - as pessoas que ouviram e que lhes forneceram as informações ou recortes de jornais, a fim de confirmarem a sua alegação.
Por isso, aqui também, não cremos que o tribunal a quo tenha violado as regras de direito probatório aquando da apreciação dos meios de prova, antes tendo procedido a uma análise conjugada, crítica e exaustiva de toda a prova produzida, observando e aplicando as normas legais, os princípios e as regras da racionalidade, da lógica e da experiência comum que se impunham.
As recorrentes é que não lograram rebater a motivação da decisão recorrida, com a qual concordamos e que se insere numa linha coerente de julgamento.
Na verdade, as recorrentes, nas suas alegações, não demonstram em que pontos o Tribunal a quo se afastou do juízo imposto pelas regras legais, dos princípios, das regras da racionalidade e da lógica ou da experiência comum, sendo certo que não identificam qualquer meio de prova isento, objectivo e credível que permita colocar essa apreciação em dúvida, valendo nesse lugar as considerações supra expendidas sobre o princípio da livre apreciação das provas.
Tal como refere Ana Luísa Geraldes, Impugnação e Reapreciação da Decisão sobre a Matéria de Facto, Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, I, p. 609, refere que «em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte».
Pelo exposto, improcede, outrossim, o recurso nesta parte.
4.1.6. Aqui chegados, e sintetizando as considerações supra extraídas, conclui-se que a impugnação de facto improcede em todos os seus aspectos, com excepção do que respeita ao n.º 64, cuja exclusão do elenco dos factos provados se determina.
4.2. Vejamos, agora, se, em face da matéria de facto provada, a sentença recorrida fez uma incorrecta aplicação do direito.
As recorrentes consideram que a sentença recorrida fez uma errada interpretação e aplicação do disposto:
a) nos arts. 8.º, 16.º, 18.º, 26.º, 37.º e 38.º da Constituição da República Portuguesa, do art.º 19.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, do art.º 19.º do Pacto Internacional relativo aos Direitos Civis e Políticos e do art.º 10.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem;
b) nos arts. 335.º, 483.º, 484.º, 487.º, 494.º e 496.º do Código Civil, no art.º 34.º, n.ºs 1 e 4, da Lei n.º 2/99, de 13.01 (Lei de Imprensa), e nos arts. 1.º, 71.º, n.º 4, e 91.º da Lei n.º 27/2007, de 30.07 (Lei da Televisão e dos Serviços Audiovisuais a Pedido).
Com ressalva do que infra se dirá quanto ao ponto V.2 do dispositivo da sentença recorrida, não cremos que o tribunal a quo tenha feito errada interpretação e aplicação dos princípios e das disposições legais citadas.
É o que tentaremos demonstrar de seguida, seguindo a ordem das questões suscitadas pelas recorrentes nas conclusões do recurso (posto que, como se viu, são estas que delimitam o seu objecto).
4.2.1. Começam as recorrentes por defender que o Tribunal a quo efectuou uma errada ponderação do conflito entre os direitos do A. previstos no art.º 26.º da Constituição da República Portuguesa (bom nome, imagem e reputação) e o direito das RR. previsto nos respectivos arts. 37.º e 38.º (liberdade de expressão e informação), afirmando o primado do primeiro sobre o segundo, ao contrário do entendimento que vem sendo seguido pela jurisprudência nacional e do TEDH, que exige uma interpretação restritiva das excepções ou condicionamentos à liberdade de expressão previstos no n.º 2 do art.º 10.º da Convenção Europeia, sustentando que a ingerência litigiosa, enquanto restrição à liberdade de expressão, deve corresponder a uma necessidade social imperiosa e ser proporcional ao objectivo legítimo pretendido, sendo que, no caso dos autos, não foram excedidos os limites que têm vindo a ser definidos para o exercício de tal liberdade (als. AA) a SS) das alegações de recurso).
Analisada, todavia, a sentença recorrida, logo se concluiu que não assiste razão às recorrentes.
Com efeito, a sentença recorrida reconheceu a existência, na esfera pessoal do A., dos direitos à honra (interna e externa), ao bom nome, à reputação e à imagem, assim como reconheceu às RR. o direito à liberdade de expressão e de imprensa, não tendo procedido, contrariamente ao que as RR. afirmam, a qualquer hierarquização desses direitos ou estabelecido o primado de um sobre o outro.
É o que decorre, manifestamente, da seguinte passagem: «…a liberdade de expressão não é um direito absoluto, e deve ser compatibilizada nomeadamente com o direito à honra, que assume relevância idêntica na hierarquia dos direitos que têm tutela constitucional» (sublinhado nosso)
O que sucede é que o tribunal a quo considerou - e bem - que «visto o teor da reportagem/debate dúvidas não há que é objectivamente adequado a afectar o bom nome, reputação e consideração social e em especial profissional do A., bem como o direito à sua imagem», na medida em que nela se «imputa factos ao A. que atingem a sua honra e consideração em especial profissional na sua dimensão objectiva, desde logo o título da reportagem/debate “burlas por gestor do Banco”, que “é uma burla milionária no Banco” “Vários clientes apontam o dedo a um simples gestor de conta que se desloca num jaguar de luxo” “ mega fraude” “chega a ameaçar clientes” “em causa poderão estar pagamentos suspeitos a uma acompanhante de luxo” “há queixas de desvio de milhares de euros” “burlas num só caso que ultrapassam meio milhão de euros” entre outras passagens, identificando como visado o A. J, a quem as jornalistas imputam a pratica dos referidos crimes de burla, fraude, ameaça, que referem terem sido praticados no âmbito do exercício da profissão de gestor bancário no Banco, bem como abrangendo a vida pessoal, mencionando acompanhante de luxo. Ademais, foram captadas imagens e filmagens do A. e do seu carro em vários locais, que foram publicadas na reportagem, e na internet, sem o consentimento», sendo que «destes factos concluiu-se que a matéria das publicações em causa é susceptível de ofender os referidos direitos do autor e em concreto ofendeu como demonstram os factos provados, a que se refere o art.º 484.º do CC» (sublinhados nossos).
E, por isso, a sentença recorrida concluiu existir um conflito entre os dois direitos fundamentais, que considerou dever ser resolvido atendendo às circunstâncias do caso concreto: «a solução do conflito entre direitos fundamentais de igual relevo mas em sentidos antagónicos, deve encontrar-se na compatibilização e harmonização dos preceitos divergentes, em medida que dependerá do juízo de ponderação do peso relativo de cada um dos valores em colisão em cada caso concreto».
Também aqui, não podemos deixar de concordar com as conclusões e metodologia adoptada pelo tribunal a quo, o que, de resto, vai de encontro ao defendido pelas recorrentes (cfr. conclusões QQ) a SS) das suas alegações de recurso).
Enfim, a sentença recorrida, na linha do que vem sendo decidido pelo STJ e pelo TEDH, reconheceu que não existe qualquer hierarquia entre os direitos de personalidade e o direito à liberdade de expressão e informação e que ambos se revestem de idêntica dignidade constitucional e considerou que, em caso de colisão, devem ser ponderados, concretamente, em cada caso, improcedendo todas as conclusões recursivas a este respeito (cfr. conclusões als. AA) a SS)).
4.2.2. Sustentam, de seguida, as recorrentes que não deve haver lugar a qualquer responsabilidade da sua parte, na medida em que nunca foi ultrapassada a fronteira da licitude do direito/dever de informar, único desiderato das RR. (als. TT) a QQQ) das alegações de recurso).
Ora, na ponderação concreta dos direitos em colisão a que procedeu, a sentença recorrida considerou não se verificar uma causa de exclusão da ilicitude e concluiu que haviam sido excedidos os limites do direito à liberdade de expressão e de imprensa, previstos nos arts. 37.º, n.º 3 da CRP, 3.º da Lei de Imprensa e 27.º da Lei da Televisão: «In casu, adianta-se desde já que, a nosso ver, foram claramente ultrapassados os limites que justificam o exercício da liberdade de expressão, de informação e de imprensa, ultrapassando-se a fronteira da admissibilidade no que concerne ao direito de informar livremente que poderia ter motivado».
Assentou esse juízo, essencialmente, nas seguintes ordens de razões:
- foram feitas afirmações e juízos sobre o carácter do A. e o modo de exercer a profissão, associando-o à imagem de burlão;
- o A. não é uma figura pública;
- não foi feita prova da veracidade das imputações e valorações feitas (exceptio veritatis);
- não houve boa-fé das RR. ao reputar as informações recolhidas como verdadeiras;
- não foram apresentadas fontes fidedignas (nomeadamente, outros pretensos lesados) que suportassem as imputações.
- não se procedeu à audição do A. sobre os factos denunciados.
Vê-se, pois, que, ao contrário do que as RR. proclamam, a sentença recorrida não negou que as restrições ao exercício da liberdade de expressão só sejam admissíveis se necessárias à realização da proteção dos direitos de personalidade de outrem, nem que a violação desses direitos possa ser lícita se corresponder a uma causa justificativa e for feita para realizar interesses legítimos. O que entendeu foi que, tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, a violação dos direitos de personalidade do A. e a sua gravidade não tinham qualquer causa justificativa, entendimento que, em vista da facticidade provada, não pode deixar de sufragar-se e que encontra apoio na jurisprudência dos nossos tribunais superiores, de que é exemplo o acórdão do STJ de 02.12.2020, in www.dgsi.pt:
«I. É incontroverso que a liberdade de imprensa, enquanto manifestação da liberdade de expressão e de informação é essencial ao funcionamento do Estado de Direito «como meio por excelência para a defesa da liberdade e para transmitir valores, criar espaços de reflexão e de debate, denunciar abusos ou desvios do poder, posicionando- como guarda avançada no combate a todas as formas de criminalidade, abusos e descriminação e defesa da “res publica”»” e tem, tal como o direito ao bom nome e reputação, inscrição constitucional, como decorre dos artigos 37º e 38º da CRP, sendo certo que a liberdade de imprensa implica a liberdade de expressão e criação dos jornalistas e colaboradores» - 38º/2 al a) CRP;
II. Estando em causa dois artigos de natureza equivalente e onde se identifica um claro teor ofensivo: para além da animosidade espelhada, designadamente, na adjectivação, e sendo que num deles, à margem de qualquer demonstração, a R. imputou ao A. determinados factos cuja inverdade não podia razoavelmente ignorar e, objectivamente passível de quer pelo conteúdo quer pela forma, denegrir a honra e o bom nome do A., afigura-se que foi ultrapassado o direito à liberdade de expressão e de crítica.
III. Nos casos em que haja necessidade de ponderar se a liberdade de expressão ofende o direito ao bom nome de uma pessoa, legitimando a reprovação da ordem jurídica, importa um balanceamento concreto (não podendo aferir-se em abstracto).
IV. Neste sentido, a mais recente orientação jurisprudencial do STJ tem entendido ser de exigir um juízo de prognose sobre a hipotética decisão que o TEDH adoptaria se o caso lhe tivesse sido submetido, no sentido de se verificar se é de admitir como muito provável que, se a questão viesse a ser colocada ao TEDH, tal órgão jurisdicional entenderia que os artigos em causa extravasariam os limites toleráveis do exercício da liberdade de expressão e informação».
No caso vertente, diversamente do que as RR. advogam (cfr. conclusões UU e VV)), temos, desde logo, que não vislumbramos qualquer interesse legítimo, público ou comunitário, na divulgação dos factos em causa, com identificação do A. e exibição da sua imagem e do seu veículo particular: o caso que as RR. pretenderam noticiar resumia-se a um conflito entre um funcionário bancário dos quadros de um banco privado, sem qualquer notoriedade pública, e uma sociedade cliente desse banco, também privada, conflito esse que surgiu no âmbito das relações bancárias estabelecidas ente aquela sociedade e o banco, e que respeitava a procedimentos, alegadamente, adoptados na emissão/assinatura de cheques em branco, sendo o valor envolvido de cerca de €234.000,00 (note-se que a reportagem e o debate subsequente referem outras pessoas lesadas, mas nunca estas foram identificadas pelas RR., que, também, nunca concretizaram as imputações/acusações feitas por essas pessoas ao A.).
Não alcançamos como possa tal assunto ter qualquer relevância social ou ser de “incontornável interesse e significado para o público português em geral”, nem que consequências dele poderiam advir para “o sistema financeiro e bancário português”. Repete-se: estamos perante um conflito isolado entre um banco privado e uma empresa privada, com origem em procedimentos, pretensamente, ilegais, cujas eventuais consequências (que estão longe de atingir os “milhões” anunciados pelas RR.) ocorreriam, apenas, na esfera patrimonial daquele cliente. Por isso, assiste razão ao recorrido, quando nas suas contra-alegações, defende que inexistia «…qualquer inegável interesse público ou relevância social do caso, quando essa divulgação não derivou de qualquer imperiosa necessidade social suscetível de se entender como necessária e adequada, logo, proporcionada ao dever de informar com rigor».
De igual modo, não se antolha como verdadeiro que as RR. tenham fornecido, no âmbito da reportagem e debate em causa, qualquer informação relevante para o público em geral, que fosse demonstrativa das “fragilidades e possibilidades de manipulação do sistema financeiro e bancário português” (cfr. conclusão BBB), antes se evidenciando que o único resultado que, efectivamente, lograram atingir foi relativo à imagem, honra e bom nome de um anónimo funcionário bancário.
Aliás, por essa razão, também não colhe o argumento das recorrentes, segundo o qual «a identificação do autor na reportagem emitida pela .... – pelo seu nome e imagem – era absolutamente necessária, indispensável e proporcional quer em função da gravidade dos factos relatados na reportagem, quer pela necessidade de evitar confusão com os demais funcionários bancários da mesma instituição que não eram de todo visados pelas denuncias da já referida sociedade comercial» (conclusão HHH)).
Acresce que, tal como se salientou na sentença recorrida, não foi provada a veracidade das imputações feitas, quer pela sociedade referida, quer por qualquer outra pessoa (repare-se que o processo crime instaurado, por iniciativa da sociedade em causa, contra o A. viria a ser arquivado, por se ter concluído pela inexistência de «erro ou engano provocado astuciosamente pelo arguido, que tenha sido determinante da prática pelos legais representantes da sociedade PP, Lda. de um acto qualquer lesivo do património da mesma»), o que coloca a questão de saber se as imputações inverídicas eram verosímeis e, por conseguinte, se podiam ser, legitimamente, noticiadas.
E a conclusão não pode deixar de ser, em face da matéria de facto provada e não provada, a extraída pelo tribunal a quo: os factos inverídicos não eram verosímeis, no sentido de que não revestiam uma aparência de veracidade susceptível de convencerem o homem normal e, nomeadamente, as RR. (aliás, curiosamente, no debate que se seguiu à reportagem, e no qual podiam participar, por via telefónica, telespectadores, verificaram-se manifestações de estranheza quanto à facilidade da adesão dos legais representantes da sociedade PP, Lda., aos alegados procedimentos ilegais impostos pelo A., deixando subentender bastantes reticências quanto à sua credibilidade ou sustentabilidade).
Enfim, ao invés do que afirmam na conclusão AAA), as RR. não tinham «todas as razões para, de boa-fé, considerar como absolutamente credíveis os factos relatados pelos denunciantes, e divulgados na referida reportagem» e, se o tinham, não o demonstraram nestes autos.
Não podemos, pois, deixar de aderir às considerações a este respeito feitas na sentença recorrida: «…no caso concreto, não podemos afirmar que estivessem em boa fé ao reportá-las como verdadeiras. Efectivamente, por um lado, já tinham informação e prova documental do resultado do processo de averiguações do Banco. As RR. tinham à data da divulgação da reportagem conhecimento do resultado da investigação levada a cabo pelo Banco, sobre os mesmos factos que divulgaram na ...., tinham na sua posse as conclusões do relatório n.º 135/18 (Proc. n.º 154/18) de averiguação realizado pelo Banco mencionado nos factos provados 20 e 21. Já tinham informação de que o A. havia sido sujeito a um processo disciplinar na sequência do processo de investigação decorrente a reclamação da PP, e que foi arquivado e pelo mencionado nos factos provados 24 e 25, e que o mesmo se encontrava a exercer as funções no momento em que é transmitida a reportagem pela primeira vez, como referem na reportagem e consta do facto provado 26. Tinham ainda conhecimento da acção executiva instaurada pelo A. contra a mulher que designam de acompanhante de luxo e do arquivamento do processo crime instaurado pela mesma contra o A. mencionados nos factos provados 62 e 63 e não se coibiram de afirmar que “poderiam estar em causa pagamentos suspeitos a uma acompanhante de luxo” e exibir excertos da notícia que havia saído no Jornal Correio da Manhã, que diga-se nem sequer identificava o A., indo a .... mais longe ao proceder à sua identificação publicamente, como sendo o A. (…). Antes da divulgação da reportagem no mesmo dia à tarde receberam um email da Mandatária do A. mencionado no facto provado 72 (…). Se não tinham conhecimento do arquivamento do processo de averiguações e do processo disciplinar, bem como da instauração do procedimento cautelar, passaram a ter com este email, e mesmo assim, não se coibiram de apresentar a reportagem/debate, quando podiam ter suspendido a apresentação da mesma e realizado mais averiguações, face ao que era dito no email, tendentes a obter uma maior segurança de que o que iriam publicitar era fundado, nomeadamente ouvindo a mandatária do A. e o próprio A.. Ainda assim, acabaram por transmitir a reportagem, realizar o debate e repetir a transmissão a reportagem no mês seguinte (…). Ademais, atento o arquivamento do processo de averiguações e do processo disciplinar que fragilizavam a convicção de reputar como verdadeiro o que lhes foi contado pelos entrevistados J e M, pois que assumiam as “dores” da reclamante PP, Lda, conhecendo a sua existência, poderiam ter aguardado o desfecho do referido processo-crime n.º … (…) não apresentam na reportagem outros lesados, apenas a PP na pessoa dos L e J, nem mesmo em sede de julgamento foram apresentadas outras fontes testemunhais relativas a outros lesados, não apresentando no Julgamento outros “lesados” para além da referida M, para que o Tribunal funda-se a sua convicção de que estavam em boa fé ao reputar como verdadeiras as imputações. É certo que não se pode exigir que o jornalista efectue uma investigação com a profundidade de um processo judicial ou apure uma verdade incontornável, mas na imputação de factos os jornalistas devem agir de boa fé e basear-se em fontes fidedignas, ainda que não públicas, não sendo, porém, exigido que efectuem uma investigação autónoma, podendo divulgar citações de terceiros. Conquanto, ao que se apurou a “investigação” a que procedeu resumiu-se, à audição dos referidos M e J, e da L, ex-empregada. Porém, quer na reportagem, quer no debate, quer no julgamento não os apresentaram, nem arrolaram como testemunhas, e mesmo assim sempre seriam relativos a uma única alegada lesada a PP, Lda e não à “outros lesados” como afirmado na reportagem e debate. Ainda que as rés se tenham convencido da veracidade dos factos, certo é que não pode, em rigor, afirmar-se que essa sua convicção assentou numa base factual sólida, resultando antes da avaliação subjectiva que realizaram acerca da credibilidade dos depoimentos que ouviu, o que não é suficiente para a verificação de uma causa de exclusão da ilicitude. (…) atentas as circunstâncias não ocorre verosimilhança, nem a averiguação foi séria, nem com os cuidados que era exigido, aventando pormenores com nenhum valor informativo, como o relativo a alegados “a acompanhante de luxo” ou que se fazia transportar em jaguar topo de gama idêntico ao usado pela família real e governo Ingleses. Além disso, se terão existido fontes diversas a confirmar o relatado nas peças jornalísticas, não foi feita prova disso» (sublinhado nosso).
Avulta, também, que, em oposição ao que argumentam (cfr. conclusão ZZ)), as RR. não deram oportunidade de audição ao A. e não ouviram a sua versão dos factos, não permitindo, nem facilitando o exercício do contraditório, sendo, por isso, fortemente censurável que no debate subsequente à reportagem tenham afirmado ser “mentira” e “rotundamente falso” que não o tenham contactado, o que bem demonstra a sua falta de objectividade e denuncia um criticável envolvimento faccioso com o caso.
Na verdade, os contactos feitos, no dia 07.02.2020, pela 4.ª R. junto da … Banco (telefonicamente e por e-mail), não podem, obviamente, ter-se por contactos feitos na pessoa do A., sendo, de resto, claro do teor do e-mail em causa que as questões aí formulados foram colocadas ao banco - e não ao A. - e que o pedido de entrevista do A. não foi dirigido ao próprio, como, naturalmente, se impunha, ainda que o assunto pudesse ter que ver com a sua actividade profissional (o que, aliás, não é inteiramente verdade, dado que a reportagem e o debate abordam assuntos da exclusiva esfera privada e até íntima do A.).
Não desconhecemos que, na resposta dada à referida R., o banco informou que «o colaborador comunicou-nos não estar disponível», mas tal referia-se à sua participação no debate televisivo, tanto que logo acrescentou «sendo certo que também lhe estaria vedada a participação no debate pelos mesmos motivos abaixo elencados» (cfr n.º 38 dos factos provados).
Seja como for, tal como se  escreveu na sentença recorrida, «não obstante os factos provados relativos ao email enviado ao Banco, não se pode deixar de atentar que foi feito cinco dias antes da data em que veio a ser transmitida a reportagem, sendo escasso, além de que sendo visado o A. e não directamente o Banco, impunha-se a audição do visado, em concreto, do próprio A. e pessoalmente, atenta a gravidade das imputações».
Se é verdade, como as RR. alegam, que procederam a uma investigação cuidada e demorada, não se entende a repentina urgência na conclusão da reportagem e a sua divulgação no preciso momento em que o foi. Tal como salienta o recorrido nas suas contra-alegações, em face do teor do e-mail da sua mandatária, referido no n.º 72 dos factos provados, «qualquer jornalista de boa fé teria suspendido imediatamente a reportagem, contactava o visado, solicitava os elementos de que não dispusesse, solicitava as provas que não tivesse, atendendo à informação do email (enviado em data anterior à da reportagem) e além de o ouvir, convidava-o a participar no programa, o que nada foi feito».
As RR. tentaram justificar a sua opção de contactar a entidade patronal do visado e não este directamente, com o argumento de que necessitavam de uma prova clara de que haviam contactado o A.. Mas, se assim é, fica-se sem perceber que as RR. não tenham tido os mesmos cuidados e preocupações em saber, com a certeza que se impunha, se a entidade patronal iria transmitir o teor do e-mail ao A. e, muito menos, se a decisão de não prestar quaisquer esclarecimentos provinha da sua vontade livre e informada.
Mais uma vez, são pertinentes as observações do recorrido a respeito desta questão: «A Recorrente C diz que não contactou o Recorrido para evitar que ele dissesse que “não recebeu” ou que “não viu” a tentativa de contacto, mas depois diz que foi a ... para tentar falar com ele. Acabando por não falar. Pois diz, logo de seguida, que não o contactou porque ainda estava numa fase embrionária da investigação. A Recorrente C diz que enviou email para o gabinete de imprensa do Banco para ter a certeza absoluta que o pedido de entrevista chegava ao Autor. E, não obstante, esteve ao lado dele, filmou-o, persegui-o na auto estrada e estando ao lado dele, nunca o contactou, não o abordou, nem informou que estava a fazer a reportagem! Para não correr “o risco de a reportagem ir para o lixo!” Podia tê-lo contactado e filmado a tentativa de o ouvir, assim ficaria com a prova que o contactou, podia ter enviado sms para o seu telemóvel ou tentado ligar, assim também ficaria com a prova que o tentou contactar, podia tê-lo contactado e ouvido através da sua mandatária, quando soube que ela o representava, mas deliberadamente quis omitir e fazer tudo em surdina, não ouvindo deliberadamente o Recorrido!!!! Mas, pasme-se, [e puna-se] porque como refere a Recorrente ao minuto 15.23 do seu depoimento “não podia abrir o jogo!” e como diz ao minuto 18.40 do seu depoimento “não ia ouvi-lo naquela altura porque ainda corria o risco de aquela reportagem ir parar ao lixo!».
Enfim, também aqui, não podemos deixar de citar e aderir à sentença recorrida, quando nela se afirma que «antes da transmissão da reportagem e debate, poderiam ter ouvido o A., pois que tiveram possibilidade para o fazer, não sendo bastante para exercer o contraditório, o email enviado ao Banco, porquanto, além do mais, iriam mais além do que as designadas “burlas” e entrariam na vida pessoal do A. ao falar sobre uma acompanhante de luxo e pagamentos à mesma, bem como a forma como invocaram viatura que designam de “topo de gama” da jaguar em que se fazia circular equiparando-a a utilizada pela família real britânica e pelo governo Britânico, sem cuidarem de colher junto do A. a forma como o adquiriu, mencionando, sem se perceber como chegaram a essa conclusão, que o A. não tinha “fortuna de família”, mencionando ainda um período em que o A. esteve de “licença de paternidade”, factos que extravasam a questão profissional».
De todo o exposto decorre, pois, que as RR. não demonstraram ter procedido a uma averiguação séria e com observância das regras deontológicas e os cuidados que as concretas circunstâncias do caso, razoavelmente, exigiam, não tendo, minimamente, demonstrado a idoneidade das suas alegadas fontes ou o cruzamento das informações que lhes estavam disponíveis e que conheciam ou podiam conhecer, através, nomeadamente, dos processos judiciais e dos processos internos do banco a que se alude nos factos provados (contrariamente ao que afirmam na conclusão YY)).
As únicas fontes, efectiva e comprovadamente, utilizadas pelas RR. (os legais representantes da sociedade PP, Lda.) forneceram-lhes informações que não eram dignas de crédito (tanto que não as lograram provar em nenhum dos processos instaurados por sua iniciativa), sendo que as RR. não confirmaram as suas declarações factuais difamatórias, quando poderiam tê-lo feito e quando haviam sido advertidas da sua falsidade (cfr. n.º 72 dos factos provados), e não verificaram a credibilidade dessas únicas fontes, que, ademais, sabiam ser parte fortemente envolvida e interessada no caso.
Se as RR. tivessem despendido, como afirmam, «horas a cruzar informação com fontes, escalpelizou todos os documentos para perceber a história e eliminar “pontas soltas”, ouviu testemunhas, requereu a consulta e consultou dois processos judiciais que ninguém, nem mesmo o Banco, tomou a iniciativa de consultar» (cfr. conclusão EEE)), ter-se-iam, pelo menos, apercebido da fragilidade das denúncias feitas pelos sócios da referida sociedade e pela ausência ou debilidade dos dados objectivos que sustentavam, sendo certo, repete-se, que nunca demonstraram que tal versão tenha sido corroborada por outros lesados, como amiúde repetem.
Mais uma vez, não podemos deixar de aderir às considerações feitas a este respeito pela sentença recorrida: «..há que ter presente que o sigilo das fontes não pode servir para eximir o jornalista da comprovação do seu dever de rigor e cuidado no apuramento da veracidade de uma notícia, de indiscutível valia no contexto dos factos imputados ao A. e que se previa que teriam, como tiveram, uma grande repercussão pública e impacto na sua actividade profissional. Não estavam as RR. impedidas de fazer prova circunstancial do esforço desenvolvido com o cruzamento das respectivas fontes que estivessem em condições de transmitir dados sobre o assunto, esforço de comprovação da veracidade exigível ao jornalista médio que não se mostra objectivamente comprovado. O jornalista deve utilizar fontes sérias, dignas de confiança e assegurar-se, antes da publicação, da seriedade da notícia que pretende publicar».
Enfim, as RR., publicamente, transmitiram informações e formularam juízos de valor sobre o A., que não se mostram - nem se mostravam já à data - apoiados numa base factual minimamente satisfatória e em juízos de probabilidade consistentes e que não se justificavam à luz da protecção de interesses públicos relevantes.
Finalmente, as RR. também não agiram com moderação nos seus propósitos, não se contiveram dentro dos limites da necessidade e do dever de informar e dos fins ético-sociais do direito de informar, em nada tendo contribuído para o esclarecimento da opinião pública, antes a confundiram, com recurso a dramatismos e a manobras e comentários sensacionalistas (patentes, desde logo, no título da reportagem e do debate, nas referências aos “milhões” envolvidos, ao carro topo de gama, à família real inglesa, a acompanhantes de luxo, etc.) e dando sempre primado a pormenores com escasso ou nenhum valor informativo.
Tal como refere o recorrido o «…homem que no spot publicitário e no início da reportagem tinha “praticado mega burlas e lesado vários clientes do Banco”, afinal só tinha “lesado” a L e o J (que nem foram apresentados como marido e mulher, mas como clientes lesados) em apenas 20 cheques que constavam do relatório da DAI (que as Recorrentes tinham na sua posse e exibiram na reportagem) como tendo sido recebidos pela L, pelo marido J e pela funcionária L. Não havia outros clientes lesados, nunca se falou em mais ninguém…».
Aliás - contrariamente, agora, ao entendimento manifestado na sentença - é para nós evidente, no debate televisivo subsequente à reportagem, a animosidade das jornalistas presentes (as 3.ª e 4.ª RR.) em relação ao A. (que transparece, desde logo, da adjectivação utilizada) e a sua empatia relativamente aos representantes da sociedade PP, Lda., que se traduziu numa defesa acrítica da suas posições, na assunção leviana das informação inverídicas que forneceram, no tom pesaroso com que deles se despediram no final do debate…
Violaram, pois, as RR., inequivocamente, diversas regras e princípios deontológicos, nomeadamente, os deveres de investigação, de rigor, de exactidão, de verdade, de contraditório, de isenção e de independência.
Com efeito, de acordo com o art.º 14.º do Estatuto do Jornalista (Lei n.º 1/99, de 13.03, e sucessivas alterações), constituem, nomeadamente, deveres fundamentais dos jornalistas:
- informar com rigor e isenção, rejeitando o sensacionalismo e demarcando claramente os factos da opinião;
- procurar a diversificação das suas fontes de informação e ouvir as partes com interesses atendíveis nos casos de que se ocupem;
- identificar, como regra, as suas fontes de informação, e atribuir as opiniões recolhidas aos respectivos autores;
- abster-se de formular acusações sem provas e respeitar a presunção de inocência;
- abster-se de recolher declarações ou imagens que atinjam a dignidade das pessoas através da exploração da sua vulnerabilidade psicológica, emocional ou física;
- não recolher imagens e sons com o recurso a meios não autorizados a não ser que se verifique um estado de necessidade para a segurança das pessoas envolvidas e o interesse público o justifique;
- preservar, salvo razões de incontestável interesse público, a reserva da intimidade, bem como respeitar a privacidade de acordo com a natureza do caso e a condição das pessoas;
- identificar-se, salvo razões de manifesto interesse público, como jornalista e não encenar ou falsificar situações com o intuito de abusar da boa fé do público.
Tais deveres são reiterados no Código Deontológico dos Jornalistas (com as alterações aprovadas no 4.º Congresso dos Jornalistas, em janeiro de 2017 e, posteriormente, confirmadas no referendo de 26, 27 e 28 de outubro):
- o jornalista deve relatar os factos com rigor e exatidão e interpretá-los com honestidade. Os factos devem ser comprovados, ouvindo as partes com interesses atendíveis no caso. A distinção entre notícia e opinião deve ficar bem clara aos olhos do público;
- o jornalista deve combater a censura e o sensacionalismo e considerar a acusação sem provas e o plágio como graves faltas profissionais;
- o jornalista deve utilizar meios leais para obter informações, imagens ou documentos e proibir-se de abusar da boa-fé de quem quer que seja. A identificação como jornalista é a regra e outros processos só podem justificar-se por razões de incontestável interesse público e depois de verificada a impossibilidade de obtenção de informação relevante pelos processos normais;
- o jornalista deve usar como critério fundamental a identificação das fontes. O jornalista não deve revelar, mesmo em juízo, as suas fontes confidenciais de informação, nem desrespeitar os compromissos assumidos, exceto se o usarem para canalizar informações falsas. As opiniões devem ser sempre atribuídas;
- o jornalista deve salvaguardar a presunção de inocência dos arguidos até a sentença transitar em julgado.
- o jornalista deve respeitar a privacidade dos cidadãos exceto quando estiver em causa o interesse público ou a conduta do indivíduo contradiga, manifestamente, valores e princípios que publicamente defende. O jornalista obriga-se, antes de recolher declarações e imagens, a atender às condições de serenidade, liberdade, dignidade e responsabilidade das pessoas envolvidas.
Terá, pois, de concluir-se que a sentença recorrida procedeu a uma equilibrada e ponderada avaliação do caso concreto, solucionando a aludida colisão de direitos fundamentais em presença de modo adequado e, segundo cremos, conforme à hipotética decisão que o TEDH adoptaria.
 Ora, tal como lembra o recorrido, citando Jorge dos Reis Bravo, in Liberdade de expressão na Era digital: O resgate de um direito humano?, Revista do Ministério Público. N.º 160 (2019), p. 17, «O direito a informar dos jornalistas tem, porém, como contrapartida um dever de informar com verdade e objectividade, como consequência da «missão de serviço público» que lhes compete (…)».
Aliás, o acórdão do STJ de 24.05.2022, in www.dgsi.pt, considerou mesmo que «não existe um concreto conflito entre a liberdade de informação ou de expressão e o direito ao bom nome ou à honra, quando a divulgação de uma informação (ainda que verídica), por um órgão de comunicação social, constitui um ilícito que foi criminalmente punido ou quando é divulgada uma notícia falsa. São comportamentos que estão, indubitavelmente, para além da questão dos limites da liberdade de informação ou de expressão, não havendo, portanto, que proceder a qualquer juízo de prognose sobre o modo como o caso concreto seria apreciado à luz da jurisprudência do TEDH».
Bem andou, pois, a sentença recorrida ao considerar não se verificar qualquer causa de exclusão da ilicitude da conduta das RR. e ao haver por excedidos os limites da liberdade de expressão e de informação, tendo as RR., claramente, ultrapassado a fronteira da licitude do direito de informar, razão por que não se descortina qualquer violação do disposto nos arts. 17.º, 18.º 26.º, 37.º e 38.º da Constituição da República Portuguesa, no art.º 10.º da Convenção Europeia dos Direitos de Homem, nos arts. 70.º e 335.º do Código Civil, e no art.º 71.º, n.º 4 da Lei da Televisão (cfr. conclusões JJJ) e KKK)).
E, tal como se decidiu na sentença recorrida, as RR. actuaram, pelo menos, a título  negligente, atentos os deveres deontológicos e de cuidado não cumpridos «resvalando para o dolo, pelo menos eventual, quando a reportagem é repetida em 14 e 15 de Março, quando tinha já sido instaurada pelo A. a providência cautelar, com a citação já realizada, o que acentua a gravidade da conduta».
É, assim, de concluir, como na sentença recorrida, pela ilicitude da conduta das RR., pela verificação dos demais pressupostos da responsabilidade civil extracontratual e pela constituição, na sua esfera jurídica, da obrigação de indemnizar, com a correcta interpretação e aplicação do disposto nos arts. 483.º e 487.º do CC (cfr. conclusões LLL) a QQQ)).
4.2.3. Defendem, ainda, as recorrentes que o A. não sofreu danos de natureza não patrimonial que justifiquem a tutela do direito e, subsidiariamente, que o montante da indemnização fixado na sentença recorrida é ilegal, absurdo, excessivo e desproporcional, tendo, por isso, sido violado o disposto nos arts. 494.º e 496.º do CC (conclusões RRR) a XXX).
A sentença recorrida considerou que a factualidade provada «evidencia a existência de danos de natureza não patrimonial, lesivos da dignidade do Autor, que traduzem a gravidade exigida pela ordem jurídica, devendo, pois, ser ressarcidos, que no caso consideramos acentuada pelas repercussões que teve ao nível não só pessoal e social mas também profissional» e que «verificado ficou, também, o necessário nexo de causalidade entre o facto –a transmissão da reportagem na televisão mais do que uma vez e visualização na internet durante um grande hiato de tempo– e o dano», tendo julgado «adequado, justo e equitativo, face à gravidade dos danos não patrimoniais, às circunstâncias do caso, fixar o montante indemnizatório em €100.000 (cem mil euros)».
Tais considerações não nos merecem quaisquer reparos ou censura, tendo a sentença recorrida aplicado de forma correcta o Direito à factualidade provada (que, como se viu, se mantém, praticamente, inalterada), de tal forma que justificaria, neste lugar, apropriarmo-nos da sua fundamentação, sem maiores desenvolvimentos.
Sempre se dirá, contudo, em reforço da argumentação aduzida pelo tribunal a quo, que nos danos não patrimoniais, como é consabido, não é possível a reconstituição natural, havendo, por isso, nos termos do art.º 566.º do CC, que fixar a indemnização em dinheiro. Esta deverá ter como medida a situação patrimonial do lesado na data mais recente que o Tribunal puder atender e a que teria nessa data, se não existissem danos (teoria da diferença).
São de vária ordem os problemas suscitados pela avaliação do prejuízo causado ao nível do dano moral, funcionando o critério da equidade a que alude o art.º 566.º, n.º 3 do CC, por ser impossível, como facilmente se depreende, averiguar do valor exacto do dano, dado o seu cariz não patrimonial e ausência de valor venal.
O art.º 496.º, n.º 3, do CC impõe que se atenda às circunstâncias plasmadas no art.º 494.º do CC (grau de culpabilidade do agente, situação económica deste e do lesado e demais circunstâncias do caso).
O método geralmente seguido consiste na consideração de que se o prazer compensa a dor, há que procurar obter a reparação através de prazeres que o dinheiro pode facultar.
A partir daqui, serão a experiência geral da vida e o bom senso que, atentas as circunstâncias do caso e segundo padrões objectivos, permitirá um cálculo indemnizatório.
E, embora seja possível compreender a dor física através da extensão e gravidade das lesões e da complexidade do seu tratamento clínico, já a dor moral, traduzida nas aflições, desgostos, angústias e inquietações, tem de ser aferida através dos dados da experiência, sobretudo quando nem sequer é exteriorizada.
Enfim, o dano moral tem de ser aferido em concreto, estabelecendo-se a sua gravidade em função da sua intensidade, impacto, mal-estar ou ressonância que produzem sobre a sensibilidade do lesado, mas também, da sua duração, sendo certo que a indemnização não visará, nunca, “pagar” o dano, mas atenuar o mal consumado.
No caso presente, em face da factualidade provada, dúvidas não pode haver quanto à gravidade e intensidade dos danos não patrimoniais sofridos pelo A., sendo patente o sofrimento, a angústia, as preocupações, a humilhação, o desconforto, a revolta, os receios e o mal-estar a que foi sujeito, com repercussões relevantes na organização da sua vida pessoal, familiar e profissional, merecedores, portanto, de tutela jurídica e, por isso, indemnizáveis.
Tal como bem salienta o A., apesar de ter sido julgado inocente pela sua entidade empregadora e pelos tribunais competentes, «foi condenado em praça pública por causa da transmissão da reportagem e debate, em plena televisão nacional e em horário nobre» e «com esta reportagem das Recorrentes, o Recorrido foi condenado publicamente, morreu profissionalmente, foi afastado das suas funções, tem a sua honra, imagem e bom nome totalmente destruídos, de forma irrecuperável».
A mesma matéria de facto evidencia um grau intensíssimo da ilicitude do comportamento das RR., tendo, desde logo, em conta os diversos deveres deontológicos violados, mas também a enorme repercussão decorrente da publicação sensacionalista da reportagem e do debate subsequente, a ampla divulgação que mereceram e as audiências alcançadas, os meios utilizados (dois canais de televisão, de dimensão nacional e de grande difusão, e a internet, de dimensão mundial), o horário de transmissão, a repetição dessa transmissão (mesmo depois de as RR. tomarem conhecimento que tinha sido instaurada uma queixa e uma providência cautelar contra si), a circunstância de a divulgação ter ocorrido em período de confinamentos obrigatórios, em que as pessoas estavam mais atentas às emissões de televisão e aos meios de comunicação em geral, demonstrando que tudo as RR. fizeram para que a reportagem e o debate chegassem ao maior número de telespectadores possível.
De igual forma, a factualidade assente evidencia um elevado grau de culpabilidade das RR., quer no que concerne à supra apontada falta de rigor e leviandade na investigação jornalística a que se propuseram e na forma sensacionalista como foi divulgada, quer pela ausência de escrúpulos na formulação de graves e delicados juízos de valor sobre a pessoa do A., na sua identificação, na captação e divulgação de imagens do seu rosto, em momentos da sua vida privada e até, pasme-se, a conduzir na autoestrada, o que claramente demonstra que, deliberadamente, o pretenderam expor.
Patentes são, também, as vantagens económicas advindas para as RR., que, apesar de não contabilizadas (nada consta a este respeito dos factos provados), podem ter-se por certas, tendo em conta os horários de transmissão escolhidos, as audiências alcançadas e as retransmissões feitas.
As RR. não se inserem, seguramente, em contextos económicos deprimidos, nem provaram, de resto, quaisquer circunstâncias que justificassem a fixação da indemnização em montante deslocado da dimensão real dos danos.
Ora, devendo o montante da reparação ser proporcionado à gravidade do dano, atendendo-se, na sua fixação, a todas as regras de boa prudência, do bom sendo prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida, afigura-se equitativamente justa e criteriosa, a quantia de €100.000,00 fixada pelo tribunal a quo, a título de indemnização global pelos danos não patrimoniais supra referidos
Tal montante mostra-se, ainda, conforme às decisões jurisprudenciais sobre a matéria, pois que a aplicação de critérios equitativos não afasta a necessidade de ponderar as exigências do princípio da igualdade, o que aponta para uma tendencial uniformização de parâmetros na fixação judicial das indemnizações, sem prejuízo da consideração das circunstâncias do caso concreto (cfr. art.º 8.º, n.º 3 do CC, e acórdão do STJ de 07.05.2014, www.dgsi.pt).
Finalmente, tal como se escreveu no acórdão da RC de 22.09.2021, in www.dgsi.pt., «(…) importa ter presente que quanto à equidade, pode emergir uma dimensão subjectiva inerente a cada julgador, potenciadora de soluções divergentes para casos similares, razão pela qual a aplicação, em concreto, da equidade obriga a especial ponderação, de molde a, numa perspetiva objectivista do juízo equitativo, evitar soluções que, afetando a certeza e segurança do direito, sejam portadoras de injustiça. Neste âmbito, parece que os tribunais superiores devem adotar um critério prudencial que apenas considere como censurável e suscetível de revogação uma solução que, de forma manifesta e intolerável, exceda certa margem de liberdade decisória que permite considerar como ainda ajustado e razoável um montante indemnizatório situado dentro de determinados limites. Se é, pois, de sindicar o critério de equidade concretamente aplicado, contudo, a situar-se a indemnização fixada no quadro de um exercício razoável do juízo de equidade, designadamente à luz da prática jurisprudencial mais recente do STJ e atendendo às diferenças nas circunstâncias pessoais das vítimas, não será caso de revogar a decisão recorrida. Cfr., neste sentido, o acórdão do TRE, de 22/10/2015, proferido no proc. nº 378/10.8TBGLG.E1, acessível em www.dgsi.pt/jtre, em que se sublinhou esse preciso entendimento: “Os tribunais superiores devem apreciar as decisões de 1ª instância sobre a fixação de montantes indemnizatórios com apelo à equidade segundo uma perspectiva de intervenção que assente na aferição da calibragem do critério de equidade concretamente aplicado. Daqui decorre que quando a indemnização fixada se situar ainda dentro do quadro de um exercício razoável do juízo de equidade, não assiste ao tribunal ad quem razão para revogar a decisão da 1ª instância: só o deverá fazer quando haja uma concretização flagrantemente desajustada ou arbitrária do juízo de equidade pelo tribunal a quo”».
 No caso dos autos, o juízo de equidade utilizado pela 1.ª instância não merece, como se viu, censura, antes se conformando com a justiça do caso, pelo que não se vislumbra motivo para alteração da decisão no sentido pretendido pelas recorrentes.
4.2.4. Por último, advogam as recorrentes que «andou e fundamentou mal o Tribunal a quo quando decidiu condenar “(…) as 1.º e 2.º RR, após trânsito em julgado, a publicar a presente sentença, em lugar de destaque, na estação televisiva ...., em horário nobre nos termos do artigo 34.º da Lei de Imprensa», por esta norma ser inaplicável ao presente caso, a que se aplica o art.º 91.º da Lei da Televisão, que não abrange decisões proferidas em acções de efectivação de responsabilidade civil (cfr. conclusões YYY) a CCCC)).
A este respeito, a sentença recorrida limitou-se a fazer referência ao art.º 34.º da Lei de Imprensa (Lei n.º 2/99, de 13.01, e sucessivas alterações), onde se dispõe que:
«1 - As sentenças condenatórias por crimes cometidos através da imprensa são, quando o ofendido o requeira, no prazo de cinco dias após o trânsito em julgado, obrigatoriamente publicadas no próprio periódico, por extrato, do qual devem constar apenas os factos provados relativos à infração cometida, a identidade dos ofendidos e dos condenados, as sanções aplicadas e as indemnizações fixadas.
2 - A publicação tem lugar dentro do prazo de três dias a contar da notificação judicial, quando se trate de publicações diárias, e num dos dois primeiros números seguintes, quando a periodicidade for superior, sendo aplicável o disposto no n.º 3 do artigo 26.º
3 - Se a publicação em causa tiver deixado de se publicar, a decisão condenatória é inserta, a expensas dos responsáveis, numa das publicações periódicas de maior circulação da localidade, ou da localidade mais próxima, se naquela não existir outra publicação periódica.
4 - O disposto nos números anteriores é aplicável, com as devidas adaptações, às sentenças condenatórias proferidas em ações de efetivação de responsabilidade civil».
Tal norma insere-se no capítulo VI da referida Lei, que trata das formas de efectivação da responsabilidade civil emergente de factos cometidos por meio da imprensa (art.º 29.º), entendida como «todas as reproduções impressas de textos ou imagens disponíveis ao público, quaisquer que sejam os processos de impressão e reprodução e o modo de distribuição utilizado» (art.º 9.º).
Já a Lei da Televisão e Serviços Audiovisuais a Pedido, publicada posteriormente (Lei n.º 27/2007, de 20.07, e sucessivas alterações), dispõe no seu art.º 91.º, sob a epigrafe Difusão das Decisões, que:
«1 - A requerimento do Ministério Público ou do ofendido, e mediante decisão judicial, a parte decisória das sentenças condenatórias transitadas em julgado por crimes cometidos através da televisão, assim como a identidade das partes, é difundida pela entidade emissora.
2 - O acusado em processo crime noticiado através da televisão e posteriormente absolvido por sentença transitada em julgado pode requerer ao tribunal que o teor dessa sentença seja igualmente noticiado pela entidade emissora, no mesmo serviço de programas e em horário, espaço e com destaque televisivo equivalentes.
3 - A difusão da parte decisória das sentenças a que se referem os números anteriores deve efetuar-se de modo a salvaguardar os direitos de terceiros».
Não se prevê, portanto, norma idêntica à contida no n.º 4 do art.º 34.º da Lei de Imprensa (o mesmo sucedendo, aliás, com a Lei da Rádio – Lei n.º 54/2010, de 24.12, e sucessivas alterações), com o que só pode concluir-se que o estatuído quanto às sentenças condenatórias penais não é aplicável às sentenças condenatórias cíveis.
Por conseguinte, e tal como defendem as recorrentes, no caso da actividade televisiva, a possibilidade de requerimento da difusão de sentenças condenatórias restringe-se a decisões referentes a crimes “cometidos através da televisão”.
E nem se diga que estamos perante uma lacuna legislativa, a impor a aplicação subsidiária da Lei de Imprensa, porque se o legislador de 2007 quisesse acolher solução idêntica à adoptada no art.º 34.º, n.º 4 da Lei de Imprensa, teria, certamente, acrescentando ao art.º 91.º disposição semelhante, o que não fez (art.º 9.º, n.º 3 do CC).
Acresce que, salvo melhor opinião, o art.º 34.º, n.º 4 da Lei de Imprensa não pode ser objecto de aplicação analógica à actividade televisiva, quer porque não se verificam, exactamente, as mesmas razões justificativas (desde logo, pelo meio de transmissão em causa), quer atendendo à natureza excepcional da norma em presença, decorrente do seu carácter, indirectamente, sancionatório e das restrições que acarreta à liberdade de imprensa (art.º 11.º do CC).
E, destarte, procede o recurso nesta parte, impondo-se revogar a sentença recorrida, no que concerne ao ponto V.2 do respectivo dispositivo.   
As custas do recurso serão, contudo, da responsabilidade exclusiva das RR./recorrentes uma vez que o valor atribuído ao recurso foi determinado, apenas, pelo valor da condenação relativa ao pedido indemnizatório, não tendo o pedido de publicação da sentença tido qualquer utilidade económica determinante do referido valor.
V – DECISÃO
Pelos fundamentos expostos, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência, revoga-se o ponto V.2 da sentença recorrida, absolvendo-se as RR. do pedido de publicação da sentença, confirmando-se em tudo o mais a sentença recorrida.
Custas pelas apelantes.
Notifique.
*
Lisboa, 18.04.2024
Rui Manuel Pinheiro de Oliveira
Carla Figueiredo
Maria Teresa Lopes Catrola