Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
939/16.1T8LSB-G.L1-2
Relator: GABRIELA CUNHA RODRIGUES
Descritores: ROL DE TESTEMUNHAS
ADITAMENTO
TEMPESTIVIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/26/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I - Tendo em conta a letra da lei e a ratio do artigo 598.º, n.º 2, do CPC, a expressão «até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final» significa «até à data em que efetivamente se inicie a audiência final».
II - Mas uma vez iniciada, se tiver várias sessões, ainda que entre as mesmas decorram mais de 20 dias, não é admissível o aditamento ou a alteração do rol de testemunhas ao abrigo do referido preceito.
III - O Código de Processo Civil contém diversos preceitos legais que permitem contrabalançar o regime do artigo 598.º, n.º 2, obviando a eventuais iniquidades decorrentes dos mecanismos de preclusão, designadamente o artigo 526.º, n.º 1, que prevê a iniciativa probatória do juiz quando, no decurso da ação, haja razões para presumir que determinada pessoa, não oferecida como testemunha, tem conhecimento de factos importantes para a boa decisão da causa.
IV - De igual modo, pode suceder que alguma testemunha não compareça na audiência final e seja justificada a inquirição de novas testemunhas, prevendo-se o regime de substituição de testemunhas, nos termos do n.º 3 do artigo 508.º do CPC.
V - O direito à prova não pode ser esgrimido contra toda e qualquer falta das partes a respeito da apresentação dos meios de prova, em rota de colisão com princípios estruturantes do processo civil, como o dispositivo, a igualdade das partes, a independência do tribunal e a imparcialidade do juiz (artigos 20.º e 62.º da CRP).
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa

I - Relatório
1. Na ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, que Keycapital, SGPS intentou contra JM…, MG…, Brainthink, SGPS, Unipessoal, Lda. e JMR…, a Autora interpôs recurso da decisão de indeferimento da alteração ao rol de testemunhas proferida no dia 14.5.2019.
2. A 1.ª sessão da audiência final ocorreu no dia 21 de Janeiro de 2019 (logo com a produção de prova), a 2.ª sessão no dia 22 de janeiro de 2019, a 3.ª sessão no dia 8 de março de 2019 e a 4.ª sessão no dia 21 de março  de 2019.
3. Quando se encontrava designada a 5.ª sessão para o dia 31 de maio de 2019,  a Autora apresentou, a 13 de maio de 2019, o seguinte requerimento (ref.ª 32401409):
«KEYCAPITAL, SGPS, LDA., mais bem identificada pelos sinais nos autos à margem cotados, em que é Autora e Reconvinda, tendo sido notificada do despacho que designa a data de 31 de Maio corrente para a continuação da audiência de discussão e julgamento, vem, por este meio, muito respeitosamente, junto de V. Exa., porque em tempo e com legitimidade, nos termos do disposto no no. 2 do Artigo 598° do Código de Processo Civil, aditar o respectivo rol de testemunhas, indicando as testemunhas seguintes:
         1. DM…;
         2. FJ…;
         3. AV…;
         4. SS…».
4. No dia 14.5.2019 (ref.ª 386915585), o requerimento referido no ponto 3. foi objeto do seguinte despacho
«Requerimento de fls. 860 vs.:
Veio a Autora, a fls. 860 vs., aditar o respectivo rol de testemunhas.
Cumpre apreciar e decidir.
Dos autos resulta que a 1.ª sessão da audiência final ocorreu no dia 21 de Janeiro de 2019 (com produção de prova), a 2.° sessão no dia 22 de Janeiro de 2019 (com produção de prova), a 3.ª  sessão no dia 8 de Março de 2019 (com produção de prova), a 4.ª sessão no dia 21 de Março e encontra-se designada a 5.ª sessão para o dia 31 de Maio de 2019.
Dispõe o artigo 598.º, n.º 2 do Código de Processo Civil : “O rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final (...).”.
A possibilidade de aditamento ou alteração do rol de testemunhas é limitado em função de dois parâmetros fundamentais :
a) a necessidade de actuação da regra do contraditório, notificando-se a parte contrária da modificação introduzida e permitindo-lhe usar de idêntica faculdade;
b) a necessidade de evitar que o exercício de tal direito colida com a realização da audiência, não devendo constituir, em nenhum caso, causa de adiamento, daí que se estabeleça um termo final para o exercício desse direito – 20 dias antes do dia que se realiza a audiência.
Tem sido entendido, quer na doutrina quer na jurisprudência, cremos que de forma pacífica, que o prazo de 20 dias previsto no n.º 2 do artigo 598.º do Código de Processo Civil, para aditamento ou alteração do rol de testemunhas, deve ser contado tendo como referência a realização efectiva da audiência final e não a simples abertura desta (LEBRE DE FREITAS e ISABEL ALEXANDRE, CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, volume II, página 675; Acórdão do TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO, de 5 de Março de 2007; Acórdão do TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA, de 4 de Outubro de 2010; Acórdão do TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA, de 8 de Setembro de 2015; Acórdão do TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES, de 17 de Dezembro de 2015, todos disponíveis em www.dgsi.pt.).
Como se escreveu no Acórdão do TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES, de 17 de Dezembro de 2015, «[é] esta, aliás, a interpretação que melhor se coaduna com a letra do preceito, ao
referir o prazo de 20 dias antes da data em que se realize a audiência de julgamento.
Defende-se que a previsão do art. 598º nº 2 do actual CPC (à semelhança do que já acontecia com o artº 512º-A do anterior código) não pode ter uma interpretação restritiva, por forma a não abranger na sua previsão os casos em que a audiência seja adiada ou seja repetida, por anulação do julgamento, para renovação de meios de prova ou mesmo ampliação da matéria de facto.
Ou seja, o entendimento que tem sido defendido é o de que o preceito em análise se aplica a qualquer audiência de julgamento, quer haja adiamento ou repetição, apenas se impondo que o requerimento se faça até vinte dias antes da data em que ela se realiza.
Cumpre-se, dessa forma, em nosso entender, o desiderato da norma, que é o de poderem ser actualizados os meios de prova, considerando o lapso de tempo (normalmente longo) que medeia, quer entre a data do requerimento de prova e a marcação da audiência, quer entre a marcação da audiência e a sua efectivação (em caso de adiamento ou de repetição).
Faculta-se também às partes a possibilidade de trazerem ao tribunal (mais) elementos de prova que possam contribuir para um melhor esclarecimento da causa (situação que é sempre de sufragar).
Os direitos da parte contrária são, por sua vez, salvaguardados, na medida em que, uma vez notificada, pode também aditar ou alterar o seu rol de testemunhas nos 5 dias subsequentes à notificação do aditamento ou alteração.
         (...).
Ou seja, no tocante aos 20 dias, a ratio legis assenta no termo ad quem e não no termo a quo, ou seja, o que importa é não inviabilizar nem os direitos da parte contrária nem a efectivação da audiência de julgamento para cuja sessão designada pelo tribunal se pretende a alteração ou aditamento do rol de testemunhas.»
Ora, a Autora requer o aditamento ao rol de testemunha quando já decorreram 4 sessões da audiência final (sendo que a primeira sessão ocorreu em Janeiro de 2019 e as três primeiras com produção de prova), pelo que não sofre a mínima discussão que o faz fora de prazo, não relevando aqui o facto da audiência se ter prolongado por mais sessões, nem podendo invocar-se a este propósito o princípio da adequação formal para permitir um aditamento ao rol de testemunhas apresentado claramente fora do prazo legal.
Pelo exposto, sem mais considerações, indefere-se o requerido e, em consequência, não se admite o aditamento ao rol de testemunhas apresentado pela Autora a fls. 860 vs..
         Notifique (…)».
5. Inconformada com o assim decidido, a Autora interpôs recurso de apelação, apresentando as seguintes CONCLUSÕES:
«1. O pedido de aditamento do rol de testemunhas que o despacho recorrido indeferiu por alegada intempestividade louvava-se e invocada expressamente a faculdade prevista no no. 2 do Artigo 598° do Código de Processo Civil.
2. Porém, a apresentação do referido requerimento foi feita com observância do prazo previsto naquela mesma disposição legal, facto processual este que a douta decisão recorrida não questiona.
3. O facto de que, em momento anterior ao da apresentação do requerimento de aditamento do rol de testemunhas houvessem já decorrido 4 sessões da audiência de julgamento, não constitui causa ou fundamento de rejeição por intempestividade.
4. A lei não distingue — não o distingue no plano literal e não encontra justificação para uma tal distinção no plano da teleologia objectiva da norma — entre o aditamento ou modificação do rol de testemunhas por requerimento apresentado com não menos de vinte dias de antecedência relativamente à audiência de discussão e julgamento que deva correr em apenas uma sessão e o exercício de idêntica faculdade processual nas situações em que a audiência deva prolatar-se por mais do que uma sessão.
5. A lei exige apenas que o prazo de não menos de vinte dias relativamente à data em que a prova deva efectivamente ser produzida e que se ache agendada seja observado, garantindo, assim, quer a igualdade processual de armas pela concessão tempestiva de idêntica faculdade à contraparte, quer a não dilacção do curso da audiência de discussão e julgamento.
6. O interesse na continuidade da audiência justifica, por igualdade ou até por maioria de razão, que seja legalmente admitido o aditamento ou a alteração do rol de testemunhas, especialmente nas situações em que, a par de uma significativa dilacção temporal entre o momento da apresentação dos articulados e o início da audiência de discussão e julgamento, esta última se prolongue por mais do que uma sessão, sendo quaisquer duas distantes entre si em mais de vinte dias.
7. O seguimento desta interpretação e sentido de aplicação da norma do nº. 2 do Artigo 598° do Código de Processo Civil são, também, in casu sub iudice, os que se mostram mais consentâneos com a igualdade de tratamento que as leis do processo impõem, uma vez que já antes havia sido admitido, a requerimento da parte contrária (aqui Recorrida), a inquirição de originariamente arrolada e a cuja comprometida apresentação a parte não havia procedido».
6. Não foram apresentadas alegações de resposta.
7. O recurso de apelação foi admitido por despacho proferido no dia 3.07.2019, com subida imediata, em separado e efeito devolutivo.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II - Âmbito do recurso de apelação

Sendo o objeto do recurso balizado pelas conclusões da Recorrente (artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do CPC), ressalvadas as questões que sejam do conhecimento oficioso do tribunal (artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do CPC), a solução a alcançar pressupõe a análise da seguinte questão:
- saber se o Tribunal a quo desrespeitou o preceituado no artigo 598.º, n.º 2, do CPC ao indeferir o aditamento rol de testemunhas requerido pela Autora no dia 14.5.2019.
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III - Fundamentação

Fundamentação de facto

Com relevância para a decisão a proferir, importa ter em consideração o iter processual descrito no relatório.

Enquadramento jurídico

a) A Apelante recorre do despacho proferido no dia 14.5.2019 que indeferiu o aditamento ao rol de testemunhas para a sessão da audiência final do dia 31 de maio de 2019, com fundamento no disposto no artigo 598.º, n.º 2, do CPC.
Sustenta que o facto de terem já decorrido quatro sessões da audiência final em momento anterior ao da apresentação do requerimento de aditamento do rol de testemunhas não constitui fundamento de indeferimento por intempestividade, pois a lei não distingue nos planos literal e teleológico da norma entre o aditamento do rol de testemunhas por requerimento apresentado com não menos de 20 dias de antecedência relativamente à audiência final que deva correr em apenas uma sessão e o exercício de idêntica faculdade nas situações em que a audiência deva estender-se por mais do que uma sessão.
Mais argui que o interesse na continuidade da audiência justifica, por igualdade ou até por maioria de razão, que seja legalmente admitido o aditamento ou a alteração do rol de testemunhas, especialmente nas situações em que, a par de uma significativa dilação temporal entre o momento da apresentação dos articulados e o início da audiência de discussão e julgamento, esta última se prolongue por mais do que uma sessão, sendo quaisquer duas distantes entre si em mais de vinte dias.
           
b) A questão a solucionar consiste em saber se os 20 dias a que se reporta o artigo 598.º, n.º 2, do CPC se contam tendo como referência qualquer uma das sessões em que a audiência final se pode desdobrar ou se tem como bússola a sessão da audiência que dá efetivamente início à discussão da causa.
Dispõe o citado artigo 598.º, n.º 2, do CPC, sob a epígrafe «Alteração do requerimento probatório e aditamento ou alteração ao rol de testemunhas», que «O rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, sendo a parte contrária notificada para usar, querendo, de igual faculdade, no prazo de cinco dias».
A redação do preceito corresponde ao texto do anterior artigo.º 512.º-A do CPC de 1961, na versão que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 180/96 de 25.9, verificando-se uma clara intenção do legislador de flexibilizar o regime do artigo 619.º do CPC, o qual só permitia a alteração do rol dentro do prazo para a sua apresentação (salvo casos excecionais).
Em jeito de comentário, Lopes do Rego aplaudiu tal normativo por afastar um regime que se configurava como excessivamente restritivo, amarrando as partes, sem justificação plausível, a provas que foram indicadas com enorme antecedência (cf. Comentários ao Código de Processo Civil, vol. I, 2.ª ed., Coimbra: Almedina, p. 448). Apenas alertou para os limites decorrentes de dois parâmetros fundamentais: a necessidade de atuação da regra do contraditório; e a necessidade de evitar que o exercício de tal direito colida com a realização da audiência, não devendo constituir em nenhum caso, nova causa de adiamento.
Tem sido entendido que o prazo de 20 dias previsto no artigo 598.º, n.º 2, do CPC, para aditamento ou alteração do rol de testemunhas, deve ser contado tendo como referência a realização efetiva da audiência e não a simples abertura desta.
Esta tese, que nos parece maioritária na doutrina e na jurisprudência, encontra, aliás, afinidade com o que foi defendido na vigência do anterior Código de Processo Civil relativamente ao artigo 512.º-A.
A propósito do n.º 2 do artigo 423.º do CPC de 2013, relativo à junção da prova documental «até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final», Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro dão-nos conta do paralelismo com aquele preceito, afirmando tratar-se da densificação de «uma regra de estabilização dos meios de instrução a partir do vigésimo dia que antecede a audiência final» - in “Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil”, 2014, 2.ª edição, Coimbra Almedina, p. 370.
Neste particular, veja-se ainda a nota de Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa ao citado artigo 423.º, n.º 2, do CPC: «A teleologia do preceito, que visa evitar a perturbação resultante da apresentação extemporânea de documentos, leva-nos a considerar que o limite para a sua apresentação (e também para a alteração do rol de testemunhas, ao abrigo do art. 598º, nº 2, com semelhante redação) tem como referência a data designada para a audiência final ou para a primeira sessão, independentemente de qualquer adiamento ou continuação (neste sentido, reportando-se à alteração do rol de testemunhas admitida pela norma do art. 598º, nº 2, cf. Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo", 2ª ed., p. 327, e RP 12-5-15, 7724/10)» (in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Coimbra: Almedina, 2018, p. 499; negrito nosso). Divergimos deste entendimento apenas no que concerne à desconsideração do adiamento da audiência final (embora irrelevante para o caso em apreço), adotando antes a posição de Lebre de Freitas e Isabel Alexandre que, em anotação ao artigo 598.º, escreveram que «O n.º 2 permite o adiamento ou a alteração (…) do rol de testemunhas até 20 dias antes da data em que efetivamente se realize a audiência final. A fixação duma primeira data, havendo depois adiamento da audiência, ainda que depois de aberta, nos termos do art. 151-4 ou do art. 603-1, ou a suspensão da instância, nos termos do art. 269, não releva para o efeito, uma vez verificado o adiamento ou a suspensão» (in Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 3.ª edição, Coimbra Almedina, p. 675).
Seguindo de perto o acórdão do TRL de 6.6.2019 (p. 18561/17.3T8LSB-A.L1-2, in www.dgsi.pt, subscrito pela aqui relatora como 1.ª adjunta), devem considerar-se ainda compreendidos no preceito alguns casos de anulação da audiência final, como aquele em que a audiência final é anulada por não ter sido adiada quando o devia ter sido ou quando ocorre uma anulação parcial do julgamento para ampliação da matéria de facto.
Em defesa da admissibilidade da junção documental e da alteração do rol de testemunhas até 20 dias antes do início de cada uma das sessões da audiência final, pode ler-se no sumário do acórdão do TRP de 15.11.2018 (p. 11465/17.1T8PRT-B.P1, disponível em www.dgsi.pt) que «O prazo limite para a apresentação de documentos (bem como o da alteração do rol de testemunhas) tem por referência não a data inicialmente designada para a audiência final mas a data da efetiva realização da audiência, quer haja adiamento ou continuação da audiência)».
Esta posição minoritária não se incorpora no espírito da norma e conflitua com os princípios da continuidade da audiência e da concentração dos seus atos (cf. artigo 606.º do CPC), potenciando o risco de perturbação do desfecho da audiência final.
Como se escreveu no acórdão do TRL de 15.11.2012 (p. processo n.º 76/11.5TBCSC-A.L1-2, consultável em www.dgsi.pt), o «pretendido alargamento do prazo para indicação de novos meios de prova, supostamente até vinte dias antes da última sessão da audiência de julgamento, seria um factor de perturbação do processo, numa fase muito sensível como se julga ser a do julgamento, designadamente no que respeita ao respectivo agendamento, numa única ou em várias sessões, separadas, ou não por mais de vinte dias, ou ainda ao agendamento da continuação não prevista de uma audiência que, com mais ou menos fundamento, não seja concluída na data prevista. Poderiam ser suscitadas muitas questões, tendo por referência o decurso do referido prazo de vinte dias, como condição da admissão de um novo meio de prova. E, como já se referiu, sem evidente vantagem, uma vez que um depoimento importante para a boa decisão da causa é sempre admissível nos termos já referidos do art. 645.º do CPC.
Ou seja – conclui o douto aresto –, julga-se que a possibilidade de o rol de testemunhas ser aditado até vinte dias antes de qualquer sessão da audiência de julgamento seria uma causa de instabilidade e de perturbação processual, que o interesse tutelado não justifica».
No sentido da jurisprudência maioritária podem consultar-se, entre outros, os acórdãos do TRP de 5.3.2007 (p. 0656916), do TRC de 8.9.2015 (p. 2035/09.9TBPMS-A.C1), do TRG de 17.12.2015 (p. 3070/09.2TJVNF-B.G1), do TRE de 28.6.2018 (p. 922/15.4T8PTM-A.E1) e do TRL de 20.2.2019 (p.7535/15.9T8VIS-B.C1), todos disponíveis em www.dgsi.pt.
Transpondo estas considerações para a situação em espécie, é de concluir que a data da 1.ª sessão da audiência final - dia 21 de janeiro de 2019 – é a que releva para efeitos da contagem do referido limite temporal de 20 dias.
Ora, atendendo a que o requerimento de aditamento ao rol foi apresentado muito posteriormente à data da 1.ª sessão da audiência final, na qual houve produção de prova, é claramente intempestivo, como se entendeu, e bem, no despacho recorrido.
Poder-se-á objetar que, deste modo, está coartado o direito da Autora à prova, à luz do disposto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.
Porém, o direito à prova não pode ser esgrimido contra toda e qualquer falta das partes a respeito da apresentação dos meios de prova, em rota de colisão com princípios estruturantes do processo civil, como o dispositivo, a igualdade das partes, a independência do tribunal e a imparcialidade do juiz (artigos 20.º e 62.º da CRP) (cf. citado acórdão do TRL de 6.6.2019).
Acresce que o Código de Processo Civil contém diversos preceitos legais que permitem contrabalançar o regime do artigo 598.º, n.º 2, obviando a eventuais iniquidades decorrentes dos mecanismos de preclusão.
Assim, nos casos excecionais em que se detete a existência de uma testemunha desconhecida, conhecedora de factos relevantes para a decisão da causa mas cuja identidade só venha a ser conhecida durante a audiência final, o artigo 526.º, n.º 1, do CPC prevê a iniciativa probatória do juiz, consignando que «Quando, no decurso da ação, haja razões para presumir que determinada pessoa, não oferecida como testemunha, tem conhecimento de factos importantes para a boa decisão da causa, deve o juiz ordenar que seja notificada para depor».
De igual modo, pode suceder que alguma testemunha não compareça na audiência final e seja justificada a inquirição de novas testemunhas, prevendo-se o regime de substituição de testemunhas, nos termos do n.º 3 do artigo 508.º do CPC.
Em face do exposto, entendemos que a decisão recorrida não desrespeitou os princípios estruturantes do direito processual civil nem as regras de direito aplicáveis, pelo que deve ser alterada.
A apelação deve, pois, improceder.
Vencida a Recorrente neste recurso, é responsável pelo pagamento das custas do recurso – artigos 527.º, n.º 1, 529.º e 533.º, 607.º, n.º 4, do CPC.
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IV - Decisão

Nestes termos, acordam os Juízes desta 2.ª Secção deste Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente a apelação e, em consequência, manter a decisão recorrida.
Mais se decide condenar a Recorrente no pagamento das custas do recurso.
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Lisboa, 26 de setembro de 2019
Gabriela Cunha Rodrigues
Arlindo Crua
António Moreira