Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
68/12.7TBTVD.L1-2
Relator: VAZ GOMES
Descritores: IMPUGNAÇÃO PAULIANA
PRESUNÇÕES JUDICIAIS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/20/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I Nos termos do art.74º, nº1, da LGT “o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da Administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque”. Contudo, subsistem duas exceções:
i.- Quando os elementos de prova dos factos estiverem em poder da AT, o ónus da prova considera-se satisfeito caso o interessado tenha procedido à sua correta identificação junto da AT;
ii.- Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à Administração Tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respetiva quantificação.

II Poderão surgir alguns problemas quando se trata de articular o ónus probatório com o dever de investigação da Administração. Nesse sentido, a ideia é de que o ónus probatório que possa impender sobre o contribuinte não dispensa a AT de efetuar o seu trabalho de busca da verdade material e de prossecução da justiça, trazendo para o seu procedimento elementos relevantes benéficos para ele. O art.139º, do CIRC, permite ao sujeito passivo provar que o valor do imóvel pelo qual foi transacionado não corresponde ao valor resultante da avaliação, através de procedimento próprio, com efeito suspensivo da liquidação, seguindo a tramitação do procedimento de revisão da matéria coletável por métodos indiretos. É condição necessária para que se verifique a procedibilidade da impugnação judicial que eventualmente seja apresentada, não podendo o acto de liquidação ser atacado sem que o referido procedimento seja instaurado.

III Assim, o procedimento de prova do preço efetivo da transação constitui em termos processuais uma inversão do ónus da prova do valor do imóvel, uma vez que, a lei presume o valor real pelo qual os imóveis são vendidos corresponde ao valor resultante da avaliação, que constituirá assim um valor de venda mínimo a ser considerado para efeitos fiscais. Contudo, o contribuinte tem, nos termos do art.73º, da LGT, conjugado com o art.350º do CC, a possibilidade de provar o contrário. Ou seja, provar que o valor real da transmissão do imóvel não corresponde ao valor fixado na avaliação através, como refere o art.139º, nº2 , do CIRC, designadamente da demonstração do facto da qualidade construtiva efectiva não corresponder à que foi fixada pelos peritos da AT.

IV Assim, se para efeitos fiscais seria de presumir que antes da venda e aquando da venda de 6/12/2010, o imóvel valeria os 29.270,00 euros, muito próximos dos 30 mil euros da escritura dessa mesma data e esse valor não foi posto em causa por nenhum dos intervenientes nesse negócio, tanto quanto resulta da matéria de facto provada, essa presunção do valor, para efeitos fiscais, não é um facto base conhecido para efeitos do art.º 349, do CCiv, e que permita concluir que o preço efectivamente pago, o preço real foi superior aos 17.500,00 euros, precisamente por ser ele próprio um facto presumido assente numa avaliação feita pelas finanças, cuja base desconhecemos em absoluto e não permite concluir que foi esse ou outro qualquer até 92 mil euros o valor real da transacção e o preço pago na transacção de 24/5/09.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Decisão:


RELATÓRIO.


APELANTES/RÉUS: MS... e CS... (representados em juízo pelo ilustre advogado VC..., com escritório em Torres Vedras, conforme cópias dos instrumentos de procuração de 6/2/2012 de fl. 173/174); JD... e MD... (litigando com apoio judiciário nas modalidades de dispensa  de taxa de justiça e demais encargos com o processo conforme decisão 13/12/2012 e constante de fls. 432/433,,representados em juízo pela ilustre advogada PL..., com escritório em Caldas da Rainha conforme instrumentos de procuração de 29/12/2012 de fls. 402/403 do II volume); CO-RÉ NÃO APELANTE: imobiliária Q... F..., ld.ª, absolvida dos pedidos
APELADO/AUTORA: CAIXA de CRÉDITO AGRICOLA MÚTUO de TORRES VEDRAS (representada em juízo, juntamente com outra advogada, pelo ilustre advogado MG..., com escritório em Torres Vedras, conforme cópia do instrumento de procuração de fls.29)
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Com os sinais dos autos.
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Valor da acção: 92.500,00 euros (ref.ª5366548, despacho saneador de 3/2/2014, fls. 543 do III volume))
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I.1.A Autora propôs contra os Réus acção declarativa de condenação sob a forma então de processo ordinário em que pede sejam julgadas provadas e procedentes as impugnações das escrituras de compra e venda referida no art.º 32 entre os 1.ºs e 2.ºs réus e entre os 2.ºs e 3.ºs réus e caso assim se não entenda a declaração de nulidade dessas mesmas escrituras por simuladas nos termos do art.º 240 do CCiv e serem os 1.ºs 2.ºs e 3.ºs réus condenados a restituir à Autora o montante de 92.500,00 euros à custa do valor recebido pela alienação do imóvel nos termos do art.º 616/2, do CCiv, mais os juros legais assim como a condenação de todos os réus no pagamento das custas e procuradoria.

Em suma alegou que:
No exercício da sua actividade bancária instrumental à sua função de crédito agrícola concedeu, aos 22/12/2005, ao 1.º réu marido e a PD... um crédito no montante de 125 mil euros que estes lhe haviam solicitado em 5/12/05 e que a Direcção da Autora aceitou em 22/12/2005, tendo em consequência aberto a favor do mutuário JD..., ora 1.º réu marido, um crédito em regime de conta corrente caucionada naquele valor, tendo os mutuários, quer o 1.º réu marido quer P...S...D..., aceite subscrever uma livrança para caucionar o integral cumprimento das obrigações, livrança essa que foi avalizada por MD... e ED..., mulheres dos mutuários, livrança essa que foi entregue com valor e data de vencimento em branco, em execução da proposta de crédito, a Autora autorizou que JD..., 1.º réu marido movimentasse a conta de descoberto à ordem que identifica até esse montante, o que este último fez; apresentada a pagamento, na data de vencimento, seja em 20/2/09 a referida livrança, o respectivo montante não foi pago por nenhum dos intervenientes e dado o incumprimento das obrigações assumidas no contrato ou dele emergentes como acordado todo o empréstimo se venceu, tendo a Autora denunciado o contrato nos termos contratuais, por escrito de 12/1/09, nenhum dos réus tendo pago, apesar das insistências, razão pela qual, em Fevereiro de 2009, por carta registada com A/R a Autora informou todos os réus de que iria preencher a livrança e propor a competente acção executiva o que fez mediante o processos executivo 621/09.6tbtvo que não obteve oposição, não tendo nem os mutualistas nem os avalistas apesar de interpelados pago a quantia e demais juros e encargos (art.ºs 1 a 27).
O mutuário principal PD... e a avalista ED...apresentaram-se à insolvência tendo sido decretada a mesma no respectivo processo de Torres Vedras em 10/7/09, por escritura de 24/4/09 os 1.ºs réus venderam aos 2.ºs réus e estes compraram o prédio urbano identificado no art.º 32, venda que os 1.ºs réus nunca quiseram realizar nem os 2.ºs pretenderam comprar, nunca os 1.ºs réus tendo recebido dos 2.ºs, total ou parcialmente, o preço da escritura, após a realização da escritura de compra e venda os 1.ºs réus continuaram a habitar usando fruindo e tirando os respectivos proveito do mesmo, pelo que a declaração constante da escritura foi feita com o intuito de enganar os credores dos 1.ºs réus, designadamente a Autora, vontade negocial que não correspondia à sua vontade real, os 1.ºs e 2.ºs réus pretendiam com a escritura transmitir a propriedade por forma a que a sua esfera patrimonial não fosse atingida, permitindo assim aos 1.ºs réus encontrar um verdadeiro interessado em adquirir o imóvel pelo seu valor real de mercado, o que seria impossível se o imóvel estivesse onerado com uma penhora nomeadamente a favor da ora Autora, imóvel cujo valor comercial à data da venda não era inferior a 90 mil euros, tendo sido celebrada por 17.500,00 euros, porquanto passado um ano o mesmo imóvel foi revendido pelos 2.ºs réus à 3.ª Ré pelo valor declarado na escritura de 16/12/2010 de 30.000,00 euros, escritura essa em que a 3.ª Ré adquirente vem representada pelo 2.º Réu marido CS... , e nesse mesmo dia, a 3.ª Ré, representada pelo 2.º Réu marido e outro sócio gerente, outorgou escritura de compra e venda do mesmo imóvel com mútuo e hipoteca e mandato que foi feita pelo valor de 92.000,00 euros; esta última transmissão foi simulada, a transmissão do imóvel para o património da 3.ª Ré empresa imobiliária, visou a alienação do imóvel pelo valor de mercado ou seja 5 x superior à 1.ª transmissão, o 2.º réu marido que é sócio gerente da 3.ª Ré usou a empresa de forma deliberada para proceder à subtracção do imóvel ao pagamento da dívida que é antiga e foi construída de forma planeada, os prédios constantes dos art.º 1... e 3... da freguesia de São pedro da cadeira, Torres Vedras, conforme respectivas cadernetas estavam omissos na Conservatória do Registo Predial, quando a Autora requereu na execução a realização da penhora constatou que os prédios haviam sido descritos como se de um só se tratasse e alienados pelos 1.ºs réus aos 2.ºs réus, tendo sido registados como um único prédio para os subtrair ao pagamento da dívida dos 1.ºs réus e dos ora insolventes PD... e ED..., isto em virtude de afinidade e de amizade que existe entre os 1.ºs e 2.ºs Réus, os 2.ºs Réus sabiam que  a empresa detida pelo 1.º réu marido e seu filho PD... denominada M... Ldª foi declarada insolvente e que os réus perderam os seus rendimentos e que os 1.ºs réus ficara com inúmeras dívidas, sabiam da insolvência do filho dos 1.ºs réus e sua mulher e foi neste contexto que os 2.ºs réus se propuseram ajudar os 1.ºs réus simulando uma escritura de compra e venda de um imóvel que nunca pretenderam adquirir com a finalidade de o subtrair à penhora dos credores do 1.º Réu, e posteriormente para tornar essa transmissão inatacável fizeram nova transmissão para uma empresa imobiliária em que o 2.º réus intervém na dupla qualidade de vendedor e legal representante da adquirente e nesse mesmo dia o 2.º réu marido nessa mesma qualidade vende o imóvel a terceiro por um valor 3 vezes superior àquele porque adquiriu; todos os réus sabiam da existência do crédito da Autora e quiseram, deliberadamente, prejudicá-la, a 3.ª Ré sabia e não podia desconhecer quer a situação dos 1.ºs réus quer das circunstância e objectivos da aquisição do imóvel pelos 2.ºs réus por ser representante da 3.ª Ré, já que o crédito da Autora sobre os 1.ºs réus se venceu em 20/2/09 tendo estes sido informados por carta registada com A/R da intenção da Autora em proceder ao preenchimento da livrança caução em Fevereiro de 2009 e de a da à execução em Abril desse ano pelo que os 1.ºs, 2.º e 3.ª Ré sabiam, em 24/4/09, que o crédito da Autora já se vencera e que já tinha sido interposta a acção executiva e os 1.ºs Réu também sabia que com a declaração de insolvência de PD... e ED... seria sobre estes que seria exigido o pagamento coercivo da dívida, todos estavam ao corrente da situação, conluiados impediram a penhora e subsequente venda judicial do imóvel no processo executivo, pretendendo impedir o funcionamento do art.º 819, do CCiv, sendo essas alienações nulas por simuladas (art.ºs 28 a 136);
O valor comercial do imóvel cuja venda ora se impugna era, à data da respectiva escritura de compra e venda não inferior a 92.500,00 euros, pois cerca de um ano depois os 2.os réus venderam à 3.ª Ré o imóvel por 30 mil euros e nesse mesmo dia esta revendeu-o por 92.500,00 euros pelo que o património dos 1.ºs réus ficou diminuído em pelo menos 92.500,00 euros, os 1.ºs réus, por esta via, não suportaram um encargo tributário elevado pelo acto da transmissão IMT, impedindo assim que os 2.ºs réus pagassem um encargos fiscal elevados a título de mais-valias por o imóvel já estar no seu património pelo valor de 17.500,00 euros, estão preenchidos os pressupostos da impugnação da escrituras dos art.ºs 610 615/1 e 618, não podendo a Autora obter a restituição do bem na medida do seu interesse ao património dos 1.ºs réus dada a retransmissão do imóvel pela 3.ª Ré a terceiros, pode ressarcir-se, uma vez que se demonstram os pressupostos para a procedência da impugnação pauliana em relação à primeira transmissão e quanto à segunda transmissão, patente o acto conluiado praticado com má-fé pelos 2.ªs e 3.ª Ré pelo valor do imóvel que não é inferior a 92.500,00 euros (art.ºs 137 a 184);

I.2.Os RR MS..., CS... e Imobiliária citados, vieram pugnar pela improcedência da acção, absolvição dos réus e condenação da Autora como litigante de má-fé em indemnização aos réus em 20.000,00 euros e 2.500,00 euros de honorários ao mandatário destes e motivadamente impugnam a petição em suma dizendo:
Viram um letreiro de vende-se junto à casa em questão que esteve vários meses junto à casa e era visível para todos quantos passavam na localidade, visitam a casa constataram que era pequena e estava muito degradada e necessitava de obras, acordaram o preço de 17.500,00 euros, valor que pagaram por cheque mais os 802,50 euros de registos e escritura notarial, os réus não conviviam com os vendedores e não é verdade que os 1.ºs réus ali continuaram a habitar depois da venda, pois entregaram-ma em 24/4/09 aos 2.ºs réus no dia da escritura e foram viver com um filho para Santa Cruz e mais tarde tomaram de arrendamento essa mesma casa, devendo por isso ser a Autora condenada como litigante de má-fé e foi por causa do estado de degradação do imóvel que os réus contestantes decidiram incumbir a 2ª Ré contestante de proceder a obras e revendê-la, a 3.ª Ré procedeu a essas obras tendo despendido 20 mil euros, após essas obras a 3.ª Ré revendeu a casa através da empresa C... que anunciou a venda e em 16/12/2010 foi outorgada a escritura da compra e venda, a  3.ª Ré pagou 3.357,75 euros de comissão de venda à C..., o Réu CS... recebeu 20 mil euros da 3.ª ré, a casa tinha um valor patrimonial de 5.253,53 euros em 2006, em 2009 após as obras e revenda passou a ter o valor tributário de 25.050 euros, o 2.º Réu e sócio de duas empresas do sector da construção civil explora um posto de combustíveis, a escritura de venda dos 2.ºs réus à 3.ª Ré é de 16/12/2010 e não de 6/12/2010, tratou-se de um investimento, os 2.ºs RR compraram por 17.500,00 euros, pagaram a escritura e registos, foram investidos 20 mil euros em obras de restauração e construção de anexos, a 3.ª Ré pagou 20 mil euros ao 2.º Réu, foram pagos 3.357,75 euros à C..., registos e escrituras, deduzindo 60 mil euros investidos dos 92.500,00 euros resultaram 30 mil euros de lucro, o imóvel valorizou 5 x para a Fazenda Nacional (art.ºs 1 a 35);
Os réus não eram nem são amigos e nunca conviveram entre si com os 1.ºs réus, nem os 2.ºs réus nem a 3.ª ré sabiam que os 1.ºs réus tinham dívidas e se o soubessem não teriam efectuado negócio e investido com obras na casa e só referido letreiro levou os 2.ªs réus à compra da casa, os 2.ªs rés só compraram a casa para darem de arrendamento e terem rendimento pessoal, na fase inicial, perante o estado degradado decidiram efectuar obras de restauração e revendê-la, pagaram todas as obras, equipamentos, electrodomésticos novos construção de 2 anexos alcavalas fiscais comissões de venda registos etc no pleno exercício do seu direito de propriedade e de rentabilizar o investimento de 17.500,00 euros pagos através de agência da própria autora, o valor do imóvel de 92.500,00 euros resultou das obras de que beneficiou bem assim como dos equipamentos e electrodomésticos ali colocados no estado de novos, os 1.ºs RR foram viver para Santa Cruz para casa de um filho e posteriormente arrendaram uma casa a JM... por 350,00 euros/mês, as obras executadas por GS... entre meados de 2009 e princípios de 2010 impossibilitavam que a casa fosse usada (art.ºs 36 as 87);
A Autora omite que na acção executiva e na Insolvência foram penhorados um veículo automóvel 4 prédios rústicos uma fracção autónoma no processo 621/09.6tbtvd e 1689/09.0tbtvd, a Autora ao ignorar os movimentos bancários que ocorreram sob a sua égide na agência de São Pedro da Cadeira ao atribuir factos falsos aos réus, sabendo que os 17.500,00 euros foram pagos através da sua agência referida e que a 3.ª ré transferiu 20 mil euros para a conta do 2.º réu, nas referidas instalações, sabendo que as datas das escrituras dos 2.ºs réus para a 3.º ré são diferentes, sabendo das obras e da valorização do imóvel para efeitos fiscais litiga de má-fé. (art.º 88 a 99)
I.3.Em resposta a Autora veio responder aos factos consubstanciadores da sua condenação como litigante de má, refutando-os e pedindo por sua vez a condenação dos Réus como litigantes de má-fé alegando factos consubstanciadores de tal, ao que os mesmos réus responderam pela improcedência.
I.4.A acção mostra-se registada mediante a Ap 2235 de 12/9/2013 conforme fls. 527/528.
I.5.Renovados os requerimentos probatórios com a entrada em vigor da Lei 41/2013, foi aos 3/2/2014 proferido saneador tabelar definido o objecto do litígio como sendo o de determinar qual o negócio celebrado entre os primeiros e segundos réus e entre este últimos e a terceira ré e se existe fundamento para que os mesmo sejam objecto de impugnação pauliana e consequente restituição do valor dos bens mais os juros assim como a litigância de má-fé sendo temas de prova os 27 aí indicados (onde avultam os temas 10/11 e 14/15 que também parecem integrar os factos consubstanciadores da simulação), foram deferidos os requerimentos probatórios e no tocante à avaliação que os réus na contestação requereram a fls. 158 foi proferido o seguinte despacho “...uma vez que está em causa nestes autos o valor do negócio, titulado pelo documento escrito e não o valor real do bem imóvel em causa, por ora não se afigura necessária a realização de qualquer avaliação ao imóvel (cfr. fls. 550 do III volume).
I.5.Este despacho que ao ilustre advogado foi notificado aos 4/3/2014 (cfr fls. 554), não mereceu do ilustre advogado dos réus requerentes qualquer reclamação ou recurso, instruídos os autos com documentos vários, procedeu-se ao julgamento nas sessões de 6/9/2016 e 14/10/2016 com observância do legal formalismo.
I.6.Inconformados com a sentença de 20/11/2016 de fls. 824/877 que, julgando a acção e o incidente de litigância de má-fé parcialmente procedentes por parcialmente provados (ref.ª131135499), consequentemente declarou a ineficácia em relação à Autora da escritura de compra e veda outorgada em 24/9/09 entre os 1.ºs Réus e o 2.º Réu marido respeitante ao prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras sob a ficha 3.../200... da freguesia de São Pedro da Cadeira e inscrito na matriz respectiva sob o art.º 4..., condenou os 1.ºs e 2.ºs RR a restituir solidariamente o valor do imóvel alineado reportado a 24/9/09 a calcular em liquidação de execução de sentença no intervalo entre 17.500,00 euros era 92.500,00 euros acrescido de juros de mora contados à taxa legal de 4% ano desde a referida data até integral e efectivo pagamento tendo condenado os 1.ºs e 2.ºs réus como litigantes de má-fé, respectivamente em 3 UC`s de multa processual e no pagamento à Autora de 2.000,00 euros a título indemnizatório, absolvendo a 3.ª Ré da totalidade dos pedidos e os 1.º e 2.º Réus do restante peticionado, dela apelaram os réus MS... e CS... em cujas alegações concluem em suma:
a)- Os réus solicitaram perícia-avaliação do imóvel identificado nos autos, essencial para o apuramento do valor da casa em 24/4/09 data das escritura de compra e venda dos primeiros réus para os 2.ºs réus, o tribunal recorrido ostracizou a prova, impediu, omitiu rejeitar a perícia e não cumpriu no ónus da investigação em violação do art.º 6/1 da Convenção Europeia violando o conceito do fair trial seja do processo justo e equitativo ali referido na Convenção (Conclusões 1 a 4).
b)- Os factos dados como provados sob 30 a 33, 35 e 36 devem ser dados como não provados pois em julgamento os réus JD... e CS... perante o meritíssimo juiz a quo disseram o que vem transcrito sob conclusão 5 e 6; existe contradição insanável entre os factos dados como provados sob 29 e 66 em momento algum dos depoimentos de JD... e CS..., cujo depoimentos parcialmente transcreve foi referido que o valor da venda tenha sido superior ao indicado na escritura de 17.500,00 euros, devendo assim dar-se como não provado o facto 29; os factos  55 e 57 não têm qualquer suporte de prova factual documental ou testemunhal no sentido de que os réus saberiam que a M... fora declarada insolvente, a presunção contraria as declarações não existem documentos divergentes, não foi feita a avaliação do imóvel à data da primeira escritura, o facto desconhecidos que são as relações familiares versus concluiu entre os réus foi adquirido por presunção inexiste forma de concluir qua tale face  aos elementos de prova a ilação que o Tribunal extraiu na decisão de que é de presumir que os réus tivessem contactos próximos entre si pelas  afinidades familiares e no mesmo concelho de Torres Vedras e que os 2.ºs réus sabiam das dívidas assumidas perante a Autora viola o disposto nos art.ºs 201, 205 da CRP e 349 do CCiv:; os elementos probatórios disponíveis demonstram erro, a sentença desconsidera a 34escritura pública e as declarações dos réus bem como da testemunha J...M...A...S... que disse que 18 ou 20 mil euros era um valor alto e ofereceu 15.000,00 euros, não se alcança que em 24/4/09 o tenha decidido através de presunção ao quantum alargado de 17.500,00 euros  a 92.000,00 euros e em 6/12/09 tenha concluído que o valor foi de 30 mil euros, a lógica na visão do Tribunal recorrido seria  a de concluir por um valor entre os 17.500,00 euros e os 30 mil euros, é ilógico comprar por 17.500,00 euros e revender por 30 mil euros executar obras não apuradas maquis tarde em 16/12/09 revender por 92.000,00 euros mediante recurso a crédito bancário, dando-se como provado que  a 1.ª escritura o valor foi de 17.500,00 euros até 92.000.00 euros sem obras sem crédito bancário sem rasto documental do dinheiro sendo certo que mediante tal presunção o valor da 2.ª escritura também poderia ser superior a 30 mil euros e até a 92 mil euros e a terceira escritura já agora ser inferior a 92 mil euros enquanto o IMI subiu 500% para a Fazenda Nacional, a decisão deve ser modificada pela Relação os factos 29 a 34, 35 devem ser dados como não provados, a única solução justa é a de ordenar a avaliação do imóvel nos termos do art.º 662/2/b do C.P.C. anulando-se a decisão e facto e após a mesma concluir que o valor pago de 17 500,00 euros equivale ao efectivamente entregue aos 1.ºs RR e não outro (Conclusões 5 a 19)
c)- O Tribunal incorreu em decisão surpresa ao dar como provado em 29 um valor divergente dos 17.500,00 euros pagos por cheque da própria Autora- cheque da Autora agência em São Pedro da Cadeira alegado pelos réus perante o Notário, não foi dado conhecimentos às partes da intenção de a proferir para se pronunciarem o que gera nulidade total nos termos do art.º 195 do NCPC a jurisprudência comunitária exige explicitação do Tribunal sobre os argumentos das partes e motivação concreta da sentença, o mero reflexo pessoal do juiz julgador através da presunção não cumpre o ónus da motivação da sentença que não atendeu às provas produzidas e perante a omissão de diligência requerida pelos réus traduz violação do art.º 6/1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem como nos casos dos acórdãos de 9/12/19994 de Ruiz Torija contra Espanha e Hiro Balani contra Espanha ou no acórdão “K, Z e S contra a Holanda em que os senhores juízes da Cour Européene decidiram mesmo que há casos em que é claro que a presunção não corresponde à situação real (Conclusões 20 a 30)
Termina indicando como normas violadas os art.ºs 6 da Convenção Europeia, 202, 205 da CRP, 349 do CCiv, 662/2/b do CPC e dizendo ainda que os pontos de facto 5,6, 17 foram incorrectamente julgados devendo a sentença ser revogada, julgando a acção improcedente absolvendo os réus ou ordenando a avaliação do imóvel à data das escrituras, devendo ainda ser determinada uma audiência pública ao abrigo do art.º 6/1 da CEDH
I.2.Também os réus JD... e MD..., inconformados com o acórdão, dele interpuseram recurso de apelação em cujas alegações concluem:
a)- Os apelantes insurgem em primeiro lugar contra o facto de ter sido dada como provada a factualidade dos art.ºs 29,30, 31, 32, 33 e 35 dos factos assentes, as testemunhas arroladas pelos autores contrariam essas conclusões, a decisão correcta deve ser a de não provados, existe contradição entre os factos 29 e 66 em momento algum dos depoimentos de JD... e CS...  resulta que o valor tenha sido superior ao indicados nem da prova documental resulta outro valor que não o de 17.500,00 euros, do depoimento da testemunha JS... até resulta que o valor de 18 ou 20 mil era alto tendo oferecido 15 mil euros (Conclusões B) a N]
b)- O negócio impugnado posterior não foi realizado dolosamente com o fim de impedir a satisfação do direito do autor (Conclusão A]
Termina pedindo a revogação da sentença e a sua substituição por outra que julgue não verificada nem procedente a impugnação pauliana invocada pelo autor por se não verificarem os requisitos cumulativos de tal instituto absolvendo os apelantes do pedido.

I.3.Em contra-alegações do recurso de CS... e MS... , conclui, em suma, a Autora Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Torres Vedras CRL:
a)- Pretendem os Réus reagir contra o despacho de 3/2/2014 que indeferiu a avaliação do imóvel em causa, porém este despacho já transitou em julgado tendo formado caso julgado formal que obsta a que a questão resolvida por via deste despacho seja novamente apreciada no presente processo, mesmo sem conceder dir-se-á que bem andou o Tribunal em indeferir a diligência probatória requerida pelos recorrentes dado que o que está em causa nos autos é o valor do negócio titulado em documento escrito e não valor real do bem imóvel  [Conclusões 1 a 4]
b)- Bem andou igualmente o tribunal ao dar como provados os factos 30, 31, 32, 33, 35 e 36, não só porque a afinidade resulte documentalmente comprovada como porque os 1.ºs réus JD... e MD... admitiram que conheciam o recorrente CS... não apenas pelas razão da afinidade como porque todos viviam na mesma freguesa do concelho e atendendo ao norma devir das coisas ao contexto factual e familiar demonstrado que não se afigura verosímil a tese defendida pelos recorrentes de que apenas por mera coincidência e na sequência da colocação do letreiro no imóvel é que os sogros da irmã da devedora e insolvente ED...tenham adquirido aos sogros e co-obrigados 1.ºs réus o único bem imóvel que poderia responder pela dívida à recorrida Caixa sendo de presumir que os réus JD... e CS... tinham contacto entre si não apenas pelas afinidades como por residirem na mesma freguesa e por serem empresários do ramo da construção civil e do ramo imobiliário do referido concelho como decorre dos depoimentos dos 1.ºs réus e recorrente Carlos e só essa relação de proximidade e confiança justifica que após a venda do imóvel os 2.ºs réus ora recorrentes tenham autorizado os 1.ºs réus a continuar a habitar o imóvel por mais algum tempo e ficarem na posse da chave do correio como resulta desses depoimentos e é nesse contexto que os recorrentes tinham conhecimento da dívida do 1.º réu JD... e do filho PD... à Caixa bem como das responsabilidades assumidas perante esta pelas suas mulheres MD... e ED... tendo agido conluiados entre si com o propósito de subtraírem o imóvel em causa nos autos do património dos1.ºs réus para que este não respondesse pelo pagamento da dívida à Caixa nenhum erro existindo na decisão de factos dos pontos 30 a 33, 35, 36, inexistindo igualmente contradição entre os pontos 29 e 66, o depósito do referido cheque d e 17 500,00 euros não exclui nem contraria a conclusão por presunção de que o preço efectivamente pago pelo imóvel excedeu o valor declarado na escritura e titulado pelo cheque, pois isso resulta da conjugação da avaliação tributária efectuada messes depois ao imóvel atribuindo-lhe o valor de 29.270,00 euros sendo consabido que o valor patrimoniais dos bens é sempre inferior ao valor real dos bens, depoimento da testemunha M...C...S...C... e fotografias de fls. 733/737 que demonstram que o imóvel em Maio de 2009 se encontrava em bom estado de conservação estava equipado com aquecimento solar de águas sanitárias, não carecendo e obras sendo forçoso concluir que o preço da venda do imóvel foi superior ao declarado, os recorrentes e a 3.ª Ré Imobiliária não efectuaram as obras de remodelação alegadas apenas sse demonstrando do depoimento das testemunhas JS... e GS... que foram efectuadas pinturas na moradia e construídos um anexo e uma churrasqueira desconhecendo-se o custo destas obras e quem o suportou  (Conclusões 5 a 23]
c)- A presunção contida nos factos dados como provado sob 55 e 57 é legítima face à relação e proximidade e de confiança entre os recorrentes e os 1.ºs réus sendo que os 2.ºs réus e a 3.º ré da qual são gerentes o recorrente e o seu filho sabiam que a M... Ld.ª detida pelo 1.º réu marido e filho PD... tinha sido declarada insolvente e que os 1.ºs réus perderam os seus rendimentos, sendo legítima a ilação que o Tribunal recorrido extraiu, as ilações assentam em factos devidamente provados nos autos quer documental quer testemunhal e máximas de experiência não tendo o Tribunal infringido o disposto nos art.ºs 349, 351 do CCiv, 202, 205 da CRP, não constituindo uma decisão surpresa, a presunção da simulação de preço não sai beliscada por se não ter apurado ter havido simulação de preço na escritura de 6/12/2010, porque como diz o Tribunal recorrido é plausível que os recorrentes tenham feito o negócio por 30 mil euros inferior ao valor de mercado para evitar uma maior incidência de mais-valias seja porque quiseram transferir o lucro para a 3.ª Ré de que são sócios o que veio a suceder em 16/12/2010, negócio praticado pela Imobiliária que tem por isso um tratamento fiscal mais vantajoso, devendo manter-se a sentença (Conclusões 24 a 35]

I.4.–Em contra-alegações de recurso dos réus JD... e mulher, a Autora atendendo à coincidência da impugnação da decisão e factos nos 2 recursos, conclui de forma idêntica pela manutenção do decidido.
I.5.Por despacho de 23/1/2018, o Meritíssimo Juiz, mantendo a decisão recorrida, entendeu em suma inexistir a alegada nulidade, na medida em que estando o uso da presunção judicial devidamente fundamentado na decisão, tal não constitui qualquer nulidade, tendo o Tribunal oportunamente emitido pronúncia sobre a avaliação do imóvel, indeferindo-a.
I.6.Nada obsta ao conhecimento do recurso.

I.7.Questões a resolver:
No recurso dos co-réus CS... e MS...:
a)- Saber se a decisão recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia sobre a oportunamente requerida avaliação do imóvel e se padece de nulidade na modalidade de decisão surpresa pelo uso indevido de presunções judiciais para fundamentar a decisão de facto;
b)- Saber se ocorre erro na apreciação dos meios de prova e subsequente decisão dos factos constantes dos pontos 5, 6, 17, 29, 30 a 33, 35, 36, 55 e 57;
c)- Saber se, não sendo alterada a decisão de facto de 29, deve ser determinada a avaliação do imóvel nos termos do art.º 662/2/b do C.P.C., anulando-se a decisão
No recurso dos co-réus JD... e mulher: Saber se ocorre erro na apreciação dos meios de prova e subsequente decisão de facto constante dos pontos 29 a 35 que devem ser dados como não provados.

IIFUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.1 O Tribunal recorrido deu como provados os seguintes factos vindo impugnados os factos 5, 6, 17, 29, 30 a 35, 36, 55 e 57:

1)- A Autora tem por objecto o exercício e funções de crédito agrícola e a prática dos demais actos inerentes à actividade bancária que sejam instrumentais em relação àquelas funções e lhe não estejam especialmente vedadas.
2)- No âmbito dessa actividade, em 22 de Dezembro de 2005 a Autora concedeu, por força da aprovação da Proposta de Crédito n.º 72... ao 1º Réu - marido e a PD... um crédito no montante de 125.000,00 € (cento e vinte e cinco mil euros);
3)- O crédito foi solicitado pelos mutuários em 05/12/2005, tendo sido aceite pela Direcção da Autora em 22/12/2005, conforme Proposta de Crédito número 72... que consta de fls. 30 a 31 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
4)- Através da concessão do crédito a Autora abriu a favor do mutuário JD... - ora 1º Réu marido - um crédito em regime de conta corrente caucionada, no valor de 125.000,00 € (cento e vinte e cinco mil euros);
5)- Os mutuários, quer o ora 1.° Réu, quer PD..., aceitaram, ainda, subscrever uma livrança, para caucionar o integral cumprimento de todas e quaisquer obrigações e responsabilidades, actuais ou futuras, nomeadamente para caução de capital, juros remuneratórios, juros de mora e demais encargos, incluindo as despesas judiciais e extrajudiciais que a ora Autora tivesse de fazer para se ressarcir dos seus créditos – conforme
documento constante de fls. 232 a 34 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
6)- Como forma de melhor garantir o pagamento da referida livrança, esta foi, igualmente, avalizada por MD... e ED..., mulheres dos mutuários;
7)- Esta livrança foi entregue com o valor e a data de vencimento em branco, ficando a Autora Caixa de Crédito Agrícola autorizada a proceder ao preenchimento do referido título, pelo valor do saldo em dívida, apurado no encerramento da conta, com a data que lhe convier, e exigir o pagamento no vencimento nele aposto, nos termos do disposto da autorização de preenchimento subscrita por JD... e PD... e respectivas avalistas;
8)- Em execução da supra identificada Proposta de Crédito em Regime de Conta Corrente Caucionada, a Autora autorizou que JD... - ora 1.° Réu - marido - movimentasse a conta de Descoberto à Ordem n.º 14... a débito até ao montante do crédito aprovado, ou seja, 125.000,00 € (cento e vinte e cinco mil euros);
9)- O que este fez;
10)- Sobre os saldos devedores seriam contabilizados, e pagos, juros à taxa contratual de 8.75% ao ano, sendo que em caso de mora esta taxa seria acrescida da sobretaxa de 4%, conforme Cláusula XI, alínea a) das Condições Gerais da Proposta de Crédito;
11)- A taxa de juro em vigor era ajustável no decurso da duração do contrato, por simples deliberação da Caixa Agrícola, em função de eventuais alterações legais da taxa de juro para operações de natureza e prazo idêntico;
12)- E os juros da operação de crédito concedida em regime de conta corrente caucionada eram devidos em função dos períodos e montantes da utilização efectiva dos fundos creditados, e calculados, dia a dia e debitados postecipadamente ao mês ou na data do seu encerramento, na conta de depósito à ordem comprometendo-se os mutuários, entre os quais, o aqui 1.° Réu JD... a, para esse efeito, mantê-la devidamente provisionada com fundos bastantes;
13)- Nos termos da cláusula XIV das Condições Gerais da Proposta de Crédito (doc. n.º 1), o incumprimento de qualquer das obrigações previstas quer por parte do mutuário, aí se incluindo o pagamento atempado dos juros, implica automaticamente o vencimento de toda a
dívida;
14)- Apresentada a livrança a pagamento, na data de vencimento que lhe foi aposta, ou seja, em 20/02/2009 o montante concedido e titulado pela livrança subscrita não foi liquidado, não obstante todas as diligências efectuadas pela Autora no sentido dos mutuários, entre os quais o 1.º Réu - marido procederem ao seu pagamento voluntário;
15)- No entanto estes não o fizeram, nem o fizeram os outros intervenientes no crédito concedido;
16)- O montante devido a título de juros desde a data de vencimento, ou seja desde 20/02/2009, ascendia ao montante de 292,81€ (duzentos e noventa e dois euros e oitenta e um
cêntimos), montante que não foi liquidado;
17)- Deliberou, então, a ora Autora, no uso dos poderes que lhe foram contratualmente atribuídos para tanto, denunciar o contrato de empréstimo concedido sob a forma de conta corrente caucionada;
18)- Tendo, para o efeito, comunicado em 12 de Janeiro de 2009, por escrito mediante carta registada com aviso de recepção, a todos os intervenientes no crédito, nomeadamente aos 1.ºs Réus – conforme as cartas de interpelação juntas a fls. 36-37, 38-39, 40-41, 42-43, 44-45, 46-47, 48-49 e 50-51, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
19)- Apesar de instados para proceder à regularização da dívida, nem os 1.ºs Réus nem PD... e ED..., pagaram qualquer quantia, não obstante todas as insistências feitas nesse sentido, pelo que a Autora se encontra desembolsada do capital mutuado e respectivos juros contratuais compensatórios devidos;
20)- Pelo que, em Fevereiro de 2009, por carta registada com aviso de recepção, dirigida a todos os intervenientes no crédito, nomeadamente aos 1.ºs Réus, a Autora informou que iria preencher a livrança e propor a competente acção executiva – conforme cartas de interpelação juntas a fls. 52-53, 54-55 e 56-57, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
21)- Após, a Autora procedeu ao preenchimento da livrança.
22)- Desde 20/02/2009 até 06/01/2012 os juros contratuais moratórios vencidos e não pagos totalizam o montante de 12.166,10 € (doze mil, cento e sessenta e seis euros e dez cêntimos);

23)- Nesta data, os 1.ºs Réus bem como PD... e ED... são devedores à Autora, por força da operação de crédito número 72... liquidando-se, assim, a quantia em dívida à data de hoje, compreendendo a mesma capital, juros compensatórios e moratórios vencidos e não pagos, conforme se discrimina:
a)-Capital………………………………………….…...125.000,00 €
b)-Juros compensatórios vencidos em 20.02.2009…….......292,81 €
c)-Juros de mora vencidos desde 20.02.2009 até hoje.....12.166,10€
d)-Imposto de Selo calculado à taxa legal de 4% por ano sobre os juros moratórios..
Total:……........…….………………………………....137.458,91€.

24)- Em 10 de Março de 2009, perante a atitude dos mutuários e avalistas, que apesar de interpelados não procederem ao pagamento da quantia devida até 14/04/2009, a ora Autora propôs execução comum para pagamento de quantia certa, que corre termos no 1.° Juízo do Tribunal Judicial de Torres Vedras sob o n.º de processo 621/09.6TBTVO – conforme certidão de fls. 269 e segs., cujo teor se dá por reproduzido;
25)- Os 1.ºs Réus foram devidamente citados para o efeito, todavia não deduziram qualquer oposição à execução, pelo que a mesma seguiu os seus trâmites normais;
26)- No entanto, não obstante as suas expectativas, até hoje a Autora ainda não conseguiu, liquidar de forma parcial ou integralmente o seu crédito reclamado;
27)- Isto porque, os 1ºs Réus dissiparam todo o seu património imobiliário em data posterior à interposição da execução comum para pagamento de quantia certa supra identificada, com o objectivo de se furtarem ao pagamento do crédito da Autora;
28)- Por sua vez, o mutuário principal PD... e a avalista ED...apresentaram-se à insolvência, tendo a Sentença sido decretada em 10/07/2009, cujo processo correu os seus trâmites sob o n.º 1689/09.0TBTVD no 2.° Juízo do Tribunal Judicial de Torres Vedras – cfr. doc. de fls. 348 a 369, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
29)- Por Escritura Pública outorgada em 24 de Abril de 2009, lavrada de fls. 156 a 159V do Livro de Notas para Escrituras Diversas nº 17 do Cartório Notarial de Sobral de Monte Agraço, os 1.°s Réus venderam aos 2ºs Réus e estes compraram, por valor não apurado mas superior a 17.500,00€ e inferior a 92.500,00€, o prédio urbano composto de casa de rés-do-chão para habitação, com superfície coberta de 56m2 e logradouro com a área de 223m2 com, sito em Azenha Velha, freguesia de São Pedro da Cadeira, concelho de Torres Vedras, descrito na Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras sob a ficha 3.../200..., da freguesia de São Pedro da Cadeira e inscrito na matriz respectiva sob o art.º4... – conforme certidão de escritura pública constante de fls. 281 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
30)- Os 1.ºs Réus e o 2º Réu marido quiseram, com a outorga da referida escritura de compra e venda transferir a propriedade do bem para os 2.ºs Réus e em simultâneo impedir a satisfação parcial do crédito da Autora;
31)- Com esta transmissão do prédio urbano identificado em 29), os Réus JD..., MD... e CS...  lograram que o referido imóvel não ficasse à mercê da credora, aqui Autora;
32)- Os 1.ºs Réus tinham perfeita consciência do acto que praticavam bem como do objectivo que pretendiam atingir;
33)- E, quer os 1ºs Réus, quer o 2º Réu marido, estavam cientes do prejuízo que a alienação do imóvel causava à Autora;
34)- O qual bem sabia, teria de responder pelo pagamento da dívida por eles - 1.ºs Réus - assumida na qualidade de mutuário (apenas o 1º Réu marido) e de avalistas do crédito solicitado e concedido pela Autora;
35)- Visaram, os 1ºs e o 2.º Réu marido, através de um conluio arquitectado, além do mais, tornar impossível a liquidação ainda que parcial do crédito da Autora, nomeadamente através da penhora e subsequente venda judicial do prédio identificado em 29), no âmbito do processo executivo n.º 621/09.6TBTVO;
36)- Os 2.ºs Réus nunca fizeram do referido imóvel a sua casa de habitação, não tomaram lá as suas refeições, nem pernoitaram no imóvel por si adquirido;
37)- Por Escritura Pública outorgada em 06-12-2010, lavrada de fls. 36 a 37V do Livro de Notas para Escrituras Diversas nº 26 do Cartório Notarial de Sobral de Monte Agraço, os 2°s Réus venderam à 3ª Ré e esta comprou, por 30.000,00€, o prédio urbano que haviam adquirido aos 1ºs Réus melhor descrito supra no ponto 29) – cfr. certidão de fls. 290 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
38)- Nesta Escritura Pública o 2º Réu marido, CS... dos Santos interveio na dupla qualidade de vendedor e sócio-gerente da sociedade compradora e ora 3ª Ré “Imobiliária Q... F..., Lda.”;
39)- Os 2.ºs Réus, CS...  e MS... , tinham perfeita consciência do acto que praticavam;
40)- No dia 16-12-2010, a 3ª Ré “Imobiliária Q... F..., Lda.”, representada no acto pelo 2º Réu marido e por outro sócio-gerente outorgou, na Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras título de Compra e Venda, Mútuo com Hipoteca e Mandato, pela qual alienou o imóvel adquirido pelos 2º Réus aos 1ºs Réus e melhor identificado supra no ponto 29) – cfr. doc. a fls. 290 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
41)- A alienação foi feita pelo valor de € 92.500,00 (noventa e dois mil e quinhentos euros);
42)- O 2º Réu marido é sócio-Gerente da 3ª Ré – cfr. certidão de fls. 345 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
43)- O prédio transmitido teve origem nos artigos matriciais 1... e 3398 da freguesia de São Pedro da Cadeira, Torres Vedras, que inicialmente correspondiam a dois prédios distintos;
44)- Os 1ºs Réus JD... e MD... são casados entre si - cfr. certidão do assento de casamento a fls. 400, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
45)- Ambos, são progenitores de PD..., co-obrigado no crédito da Autora;
46)- O filho dos 1ºs Réus, PD... é casado com ED..., igualmente co-obrigada na operação, na qualidade de avalistas, co-executados na acção proposta pela Autora e actualmente, Insolventes - cfr. certidão do assento
de nascimento a fls. 388-389, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
47)- A devedora / Executada / Insolvente ED... tem uma irmã chamada CA... (“Santos” pelo casamento);
48)- A qual é casada com JS...;
49)- O qual, por sua vez, é filho dos 2.ºs Réus, CS... e mulher MS... - cfr. certidões de assentos de nascimento a
fls. 391-392 e a fls. 394-395, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
50)- O referido JS... é sócio-gerente da 3ª Ré, sociedade “Imobiliária Q... F..., Lda.” – cfr. certidão comercial de fls. 345 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
51)- Tendo, nesta qualidade, outorgado as escrituras de compra e venda realizadas em 06-12-2010 e 16-12-2010;
52)- Todos os Réus vivem há longos anos na freguesia de São Pedro da Cadeira, concelho de Torres Vedras;
53)- Os 2ºs Réus têm acompanhado a situação pela qual os 1ºs Réus têm passado;
54)- A qual é do conhecimento comum na freguesia;
55)- Com efeito, os 2ºs Réus e a 3ª Ré sabiam que a empresa detida pelo 1º Réu marido e seu filho, PD..., denominada “MKR..., Importador e Distribuidor de Equipamentos para a Construção, Lda.” fora declarada insolvente e que os Réus perderam os
seus rendimentos;
56)- Sabiam igualmente que os 1ºs Réus ficaram com inúmeras dívidas, na sequência de avales prestados à empresa “MKR..., Lda.”;
57)- Bem como sabiam a situação de insolvência do filho dos 1ºs Réus e sua mulher;
58)- E foi neste contexto e também visando obter algum lucro com o negócio que os 2ºs Réus aceitaram ajudar os 1ºs Réus e adquirir-lhes a casa de habitação;
59)- Em 21-12-2010, por ordem da 3ª Ré, a Caixa Agrícola de Torres Vedras – Balcão de S. Pedro da Cadeira, transferiu a quantia de 20.000,00€ da conta desta sociedade para a conta à ordem titulada pelo Réu CS..., que creditou no referido montante – cfr. doc. a fls. 422, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
60)- Em 2006, o prédio urbano identificado em 29) tinha o valor patrimonial de 5.253,53 €;
61)- E em 06-12-2010, após reavaliação, tinha o valor tributário de 29.270,00€;
62)- Os 2ºs Réus pagaram 802,50€ de registos e escritura notarial;
63)- Após a venda aludida em 29 foram realizadas obras no imóvel em causa, em quantidade, extensão e valor não apurados, que incluíram pinturas e a construção de uma churrasqueira e de um anexo;
64)- No negócio de promoção da venda e na venda aludida em 41), interveio a sociedade “C... – Mediação Imobiliária, Lda.”, titular da licença n.º 5...-AMI;
65)- A 3ª Ré pagou 3.357,75 € (IVA incluído) de comissão de venda à referida sociedade mediadora - cfr. doc. de fls. 421, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
66)- Para pagamento do valor de aquisição do imóvel declarado na escritura referida em 29), o 2º Réu marido emitiu e entregou ao 1º Réu um cheque, com data de 24-04-2009, no valor de 17.500,00€, sacado sobre a conta de que é titular junto da Caixa Agrícola-Dependência de S. Pedro da Cadeira, cheque que o beneficiário JD... depositou, no dia 06/05/2009, em conta por si titulada junto do Banco Espírito Santo – cfr. docs. a fls. 45, 617 e 696, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
67)- No âmbito do processo de Insolvência de ED...e PD..., referido em 28), foram apreendidos dois bens, a saber:
a)- Um veículo automóvel, de marca Volkswagen, modelo Polo, com a matrícula 42-..-.., avaliado em € 7.800,00;
b)- A fracção autónoma designada pelas letras AA correspondente ao 3º andar, Piso 3, letra “C”, bloco 1, com 2 espaços para estacionamento sito no Areal do cabeço de Barro, freguesia de Silveira, Torres Vedras, inscrito na matriz predial urbana sob o art.º 8... e descrito na Conservatória do Registo Predial de Predial de Torres Vedras sob o n.º 4..., com o valor patrimonial de € 78.890,00, a qual se encontra onerada com uma hipoteca a favor da CGD pelo montante máximo de € 204.070,10, tendo esta Instituição reclamado créditos no valor de € 1.305.402,25 (um milhão, trezentos e cinco mil, quatrocentos e dois euros e vinte e cinco cêntimos) – cfr. docs. juntos de fls. 348 a 362, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
68)- Os co-obrigados PD... e ED...em sede de Insolvência viram liminarmente indeferido o pedido de exoneração do passivo restante, dado que não tomaram
as necessárias diligências que lhe eram exigíveis, de acordo com a ponderação de um homem
médio – cfr. doc. a fls. 363 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido
69)- A 2ª Ré MD... é proprietária de 2/5 indivisos do prédio rústico denominado Várzea Grande, inscrito na matriz sob os artigos 112, 113, 114, 115 e 116, todos da Secção K, da freguesia de S. Pedro da Cadeira, descrito no Conservatória do Registo Predial de Tores Vedras, sob o n.º 1.../19... – cfr. certidão de fls. 580 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
70)- Pela Apresentação 4018, de 2009/07/29, mostra-se inscrita na Conservatória do Registo Predial, a penhora, a favor da Autora, do referido direito indiviso, no âmbito do processo executivo n.º 621/09.6TBTVD - cfr. certidão anteriormente referida.

II.2.Deu o Tribunal como não provados os seguintes factos:
Não se provaram outros factos de entre os alegados pelas partes que estejam em contradição com os supra descritos, designadamente que os 1.°s Réus nunca quiseram vender o prédio urbano supra identificado em 29);
Nem que nunca os 2.°s Réus o pretenderam comprar;
Nem que os 1.°s Réus nunca receberam e os 2.ºs Réus nunca pagaram, total ou parcialmente, o preço declarado na Escritura Pública de compra e venda supra referida;
Nem que após a data da alegada escritura de compra e venda continuaram os 1.°s Réus a habitar o prédio identificado em 29), como aliás sempre fizeram;
Nem que os 1º Réus entregaram o referido imóvel aos 2ºs Réus em 24-04-2009, após a escritura de compra e venda;
Nem que foi nesse imóvel que os 1.ºs Réus continuaram a tomar as refeições e a receber os seus amigos;
Nem que os 2ºs e 3ª Réus tiverem em vista permitir aos 1ºs Réus encontrar um verdadeiro interessado em adquirir o imóvel, pelo seu valor real de mercado;
Nem que à data da venda, o valor comercial do imóvel não era inferior a 90.000,00 € (noventa mil euros);
Nem que o Réu CS... autorizou que os 1.ºs Réus, continuassem a habitar o imóvel até à sua posterior revenda, agindo como se o mesmo fosse propriedade sua, utilizando-o a seu bel-prazer e comportando-se como seus verdadeiros proprietários;
Nem que com a segunda e terceira transmissões (n.ºs 37 e 40 supra) do prédio urbano identificado em 29), os Réus MS... , CS...  e “Imobiliária Q... F..., Lda.”, pretenderam, apenas e tão só, que o referido imóvel não ficasse à mercê da credora, aqui Autora;
Nem que a Ré MS...  e a “Imobiliária Q... F..., Lda.”, nas transmissões descritas em 37) e 40), agiram conluiados com o propósito de tomar impossível a liquidação ainda que parcial do crédito da Autora, nomeadamente através da penhora e subsequente venda judicial do prédio identificado em 29), no âmbito do processo executivo n.º 621/09.6TBTVO;
Nem que as obras de recuperação da casa consistiram em restaurar telhados, interior, dois anexos, tendo a 3ª Ré despendido cerca de 20.000,00 Euros;
Nem que foram executados trabalhos de construção civil no valor de 15.000,00 € sendo ainda colocados cerca de 5.000 € em materiais de stock da empresa 3ª Ré;
Nem que a 3ª Ré comprou e instalou na casa móveis de cozinha novos com portas e frentes em tafilam, kit persianas e lava-louças a MH... – Aranha - S. Pedro da Cadeira, no que despendeu 2.511,07 €;
Nem que a 3ª Ré instalou na mesma casa máquinas novas na cozinha: máquinas de lavar loiça, lavar roupa e combinado Zanussi no valor de 1.470,00 Euros, que pagou a MH...;
Nem que a 3ª Ré instalou bancada em s. light aosta, painel parede e rodatempo através da empresa C... sediada em Formigal e pagou 1.004,28 €;
Nem que a 3ª Ré instalou nessa casa um esquentador Vulcano para o que pagou 381,45 € a V... Lda.;
Nem que na acção executiva que corre termos sob o n.º 621/09.6TBTVD existem 5 imóveis penhorados, propriedade de Ré MD...;
Nem que o 2º Réu é sócio de duas empresas do sector da construção civil e explora um posto de combustíveis;
Nem que os 2ºs Réus e a 3ª Ré desconheciam que os 1ºs Réus tinham dividas;
Nem que só o letreiro aposto na frente da casa a comunicar “vende-se” levou os 2ºs Réus a comprar a mesma;
Nem que os 2.ºs Réus não eram, nem são amigos e nunca conviveram entre si com os 1ºs Réus;
Nem que os 2ºs Réus desconheciam que os 1ºs Réus e familiares tinham avales, dívidas e problemas com a Autora e que o filho dos 1ºs Réus estava insolvente;
Nem que o 1º Réu tentou vender a casa durante meses e que teve o letreiro longo tempo, à vista de todos;
Nem que os bens penhorados no processo de execução 621/09.6TBTVD podem assegurar a satisfação do crédito da Autora.

III–FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.

III.1.– Conforme resulta do disposto nos art.ºs 608, n.º 2, 5, 635, n.º 4, 649, n.º 3, do CPC[1] são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso. É esse também o entendimento uniforme do nosso mais alto Tribunal (cfr. por todos o Acórdão do S.T.J. de 07/01/1993 in BMJ n.º 423, pág. 539.
III.2.– Não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objecto tal como enunciadas em I.
III.3– No recurso dos co-réus CS... e MS...:
III.3.1.– Saber se a decisão recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia sobre a oportunamente requerida avaliação do imóvel e se padece de nulidade na modalidade de decisão surpresa pelo uso indevido de presunções judiciais para fundamentar a decisão e facto;
III.3.2.– Como diz e bem a Autora a requerida (na contestação dos réus)- e resulta do relatório supra-, a avaliação do imóvel foi indeferida por despacho de 3/2/2014 despacho com o seguinte teor“...uma vez que está em causa nestes autos o valor do negócio, titulado pelo documento escrito e não o valor real do bem imóvel em causa, por ora não se afigura necessária a realização de qualquer avaliação ao imóvel (cfr. fls. 550 do III volume); este despacho que ao ilustre advogado foi notificado aos 4/3/2014 (cfr fls. 554), não mereceu do ilustre advogado dos réus requerentes qualquer reclamação ou recurso que se impunha por força do art.º 644/2/d, tendo por isso transitado em julgado, com força de caso julgado formal, sendo insusceptível de segunda pronúncia no mesmo sentido ou em sentido contrário. No que ao alegado indevido uso de presunções judiciais para a decisão de facto tal não consubstancia qualquer decisão surpresa na medida em que o julgador aprecia livremente as provas nos termos do n.º 4 do art.º 607, norma que de nenhuma inconstitucionalidade, padece como o T.C tem vindo a reconhecer; questão diferente é a de saber se ocorre no uso da presunção judicial violação das disposições legais dos art.ºs 349 e 351 do CCiv por inexistir facto conhecido que suporte a ilação o que a seguir se analisará.

III.3.1.– No recurso do dos co-réus CS... e MS...: Saber se ocorre erro na apreciação dos meios de prova e subsequente decisão dos factos constantes dos pontos 5, 6, 17, 29, 30 a 33, 35, 36, 55 e 57;
III.3.2.– Estatui o art.º 640 n.º 1: “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente, obrigatoriamente, especificar, sob pena de rejeição: a) os concretos pontos de facto que considerar incorrectamente julgados; b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) a decisão que no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. O n.º 2 do art.º, por seu turno estatui que quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar, com exactidão as passagens de gravação em que se funda o recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (alínea a); independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes (alínea b)”.

III.3.3.– A rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão de facto deve verificar-se, entre o mais, no entendimento da doutrina, se não ocorrer, nas conclusões de recurso, a especificação dos concretos pontos de facto que considerar incorrectamente julgados, a referência aos concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (ainda que por remissão para o corpo das alegações) e a decisão que no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas; também a falta de indicação exacta das passagens da gravação em que o recorrente se funda, podendo o apelante proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos; trata-se de uma decorrência do princípio da autorresponsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo, exigências que afinal devem ser o contraponto dos esforços de todos quantos, durante décadas, reclamaram pela atenuação do princípio da oralidade pura e pela atribuição à Relação de efectivos poderes de sindicância da decisão sobre a matéria de facto como instrumento de realização da justiça.[2]

III.3.4.– Os apelantes indicam nas conclusões os pontos de facto incorrectamente julgados o sentido correcto da decisão, no seu entender, e por remissão para o corpo das alegações os meios de prova que suportam a alegação da decisão de facto, no que aos pontos de facto 30 a 33, 35, 36 com base nas declarações de parte e prova testemunhal que parcialmente transcrevem, no que toca aos ponto 55/57 com base na insuficiência dos elementos de facto para extrair a presunção, assim como em relação ao 29; no que aos pontos de facto 5, 16 e 17 os mesmo apenas se encontram impugnados nas conclusões e não também no corpo o que tanto bastaria para se não conhecer, nessa parte da impugnação, acresce que em relação aos mesmos não vêm indicados nem o sentido correcto da decisão nem os meios de prova que no entender dos apelantes suportariam decisão diversa pelo que nessa parte não se conhecerá do recurso.

III.3.4.– Está este Tribunal em condições de poder reapreciar os referidos pontos de facto sindicados na apelação.

III.3.5.– Os pontos de factos 30 a 33, 35 e 36 referem-se à consciência por parte dos 1.ºs e 2.ºs réus do prejuízo que com a transmissão causavam ao credor e à vontade ou seja impedir a satisfação parcial do crédito da Autora e aina a circunstância de os 2.ºs réus nunca terem feito do imóvel a sua casa de habitação, lá não tomando as refeições não pernoitando. Como resulta da motivação da decisão de facto a convicção em relação a esses factos resultou da apreciação e valoração crítica da prova documental e declarações prestadas em audiência pelos réus JD..., MD... e CS...  e pelas testemunhas J..., C..., M..., J..., G... e JC...; a impugnação baseia-se nas declarações dos réus maridos JD... e CS..., assim como no da testemunha JS... testemunha comum aos 1.º e 2.º RR que como da motivação resulta “declarou que viu o anúncio da venda da moradia dos 1.ºs Réus falou com o filho destes PD... e este pediu 18 ou 20 mil euros, ofereceu 15 mil sem sucesso, porque a casa precisava de obras e que mais tarde passou no local a moradia tinha o aspecto de ter sofrido remodelações, mas que instado a esclarecer as obras de que a moradia estava necessitada não foi capaz de o fazer”; ou seja em relação a esta testemunha a mesma não mereceu credibilidade ao Tribunal na medida em que a mesma não foi capaz de esclarecer a razão entre os valores que oferecia pela moradia e as obras de que a mesma carecia, e na verdade para se perceber porque razão é que em 2009, ou seja há 9 anos, alguém oferecia pela compra de uma moradia a quantia de 15 mil euros era preciso perceber a razão de ser desse valor, (que é objectivamente baixo para um imóvel de habitação ainda que situada em Torres Vedras); no que toca aos depoimentos de JD... e mulher e bem assim como de CS... , no que às razões e motivos que os levaram a efectivar o negócio da compra e venda o Tribunal recorrido entendeu que “constância, coerência e verosimilhança são qualificativos que não se podem atribuir às declarações prestadas na audiência pelos réus JD..., MD... e CS... ...os 1.ºs réus JD... e MD... são casados entre si e ambos são progenitores de PD..., co-obrigados no crédito da Autora que assim não o podia desconhecer, PD... ...é casado com ED..., igualmente co-obrigada na mesma operação de crédito m qualidade de avalista, sendo co-executados na acção executiva proposta pela Autora e actualmente insolventes como resulta dos factos provados...ED...tem uma irmã chamada CA... a qual é casada como JA..., filho dos 2.ºs réus CS...  e mulher MS..., o 2.º réu e o filho JS... são ambos sócios-gerentes da 2.ª ré sociedade...nessa qualidade de legais representantes da 3.ª Ré outorgaram a escritura de compra e venda realizada em 16/12/09, em suma o filho dos 2.ºs réus (JA...) é casado com CA... cunhada (irmã da mulher) de P...J..., filho dos 1.ºs réus e co-obrigados da obrigação assumida perante a autora...atendendo ao com texto factual e familiar apontado e à circunstância de todos os devedores da Autora e seus familiares e intervenientes nos negócios viverem próximo uns dos outros (freguesia de São Pedro das Cadeira) não se pode concluir que apenas por era coincidência e na sequência do anúncio constante do letreiro “vende-se” os sogros (2.ºs réus) da irmã da devedora e insolvente ED...adquiriam aos sogros desta e co-obrigados (1.ºs réus) o único bem imóvel que e4ste possuíam e que poderá ser executado pela Autora, sendo, isso sim de presumir que os réus P... e CS... tivessem contacto próximo entre si não apenas pelas afinidades familiares referidas mas também enquanto empresários do ramo da construção civil e do imobiliário no mesmo concelho de Torres Vedras...o 1.º réu marido e o filho, o insolvente PD... eram sócios da sociedade insolvente M... Ld.ª que tinha por objecto a importação e distribuição de equipamentos para a construção civil e que o 2.º réu marido e o filho são empresários do ramo imobiliário, em tal contexto terá de presumir que os 2.ºs réus sabiam das dívidas assumidas perante a autora por PD... e pelo pai JD... (1.º réu) que estavam cientes das coresponsabilidades assumidas perante aquela credora pelos seus cônjuges ED... e MD... e que actuaram conluiados entre si de modo a que o imóvel em causa não respondesse pelo pagamento da dívida à Autora: os 1.ºs réus e os 2.ºs réus através do acto de compra e venda de 24-04-09 transferindo a propriedade do bem para a esfera patrimonial dos adquirentes (2.ºs réus) e entregando aos vendedores (1.ºs réus) uma contrapartida em dinheiro que se sabe fungível. E foi certamente com base nesse conhecimento e confiança que os 2.ºs réus autorizaram os 1.ºs réus a continuara a habitar a moradia por mais algum tempo e a ficarem na posse da chave de correio, assim como tem de se presumir, face à globalidade da prova produzida e às regras de experiência comum que o preço declarado como sendo o da venda (15.5600,00 euros) não correspondia ao efectivamente pago pelos 2.ºs réus (compradores) e recebido pelos 1.ºs vendedores para tanto apontando quer a avaliação patrimonial efectuada pela autoridade tributária poucos meses depois do negócio que resultou na atribuição do valor patrimonial tributário de 29.270,00 euros que se sabe ser inferior ao valor patrimonial e mercado quer a prova feita relativamente ao estado de conservação do imóvel, designadamente do testemunho prestado por MCC..., engenheiro civil que visitou a casa em Maio de 2009 para elaboração do certificado do desempenho energético constante dos autos e tirou as fotografias de fls. 733 a 737 resultando do mesmo que a moradia se apresentava naquela data em bom estado de conservação e que estava equipada com sistema de aquecimento de águas sanitárias (painel solar e depósito de água). A mera visualização dos referidos fotogramas permite visualizar o bom estado da pintura e do revestimento das paredes da sala, cozinha e quarto do casal. Tudo indica que o preço de venda foi superior ao declarado que os 1ºs réus e o 2.º réu declararam um preço inferior ao preço real que simularam, tanto mais que não se provou que o imóvel estivesse degradado e carecido de muitas obras de remodelação, o que não nos parece sequer plausível atendendo ao ramo empresarial do 1.º réu marido. Não se olvida que os 1.ºs e 2.ºs réus fizeram juntar aos autos cópias de um cheque emitido pelo 2.º réu marido a favor do 1.º réu marido na data da escritura, no montante de 17.500,00 euros, bem como o comprovativo do depósito deste valor na conta do beneficiário. No entanto, tal prova documental apenas prova isso mesmo, não sendo excludente da conclusão, por presunção de que o preço pago pelo imóvel excedeu o valor declarado na escritura e titulado pelo cheque...”

III.3.6.– A transcrição dos depoimentos de JD..., réu, na medida em que não são confessórios, ou seja, na medida em que não resulta a confissão de qualquer facto que lhe seja desfavorável e que favoreça a parte contrária, estão sujeitos à livre apreciação do julgador assim como os dos restantes réus. Resulta da transcrição parcial do seu depoimento e que o Autor não impugna que o mesmo pedia 20 mil euros pelo imóvel, “houve um outro que chegou aos 15 mil, vendeu ao 2.º réu que viu a placa ofereceu mais 2.500,00 euros, conhecia-o pessoalmente lá da freguesia como as outras pessoas, vendi pelos 17.500,00 euros carecia desse montante para ajudar o filho”; o depoimento transcrito de B... não vai fora disto, justifica a razão do preço pela necessidade das obras que eram precisas serem feitas e que foram feitas no que se gastou à volta de 40, 50 mil euros, vendeu por 30 à Imobiliária de que era legal representante e que foi esta quem suportou a despesa das obras “...foi tudo, parafuso, foi tudo novo, os anexos, a casa por dentro as pinturas tudo de novo, só ficou as paredes, tudo novo, a imobiliária Q... F... reconstruiu tudo de novo, depois pôs à venda, uma agência encarregou-se de...a vender, foi avaliada pelo banco, o banco aceitou e o senhor pediu pelo dinheiro e comprou...” Desses depoimentos, sustentam os apelantes, não resulta qualquer conluio para tornar impossível a liquidação do crédito da Autora. Ora, é evidente que o comprador e vendedores nunca iriam sustentar em Tribunal que agiram conluiados no sentido de tornar impossível ou mais difícil a liquidação do crédito da Autora. A ilação que o Tribunal retirou terá de se suportar noutra factualidade que não naquela realidade que as declarações do réus exibem, pois tal só seria possível por via da confissão que teria de ter sido extractadas em acta o que não ocorreu. Ora, há um conjunto de factos que os apelantes não impugnaram e seria natural que o tivessem feito, posto que pretendem por em causa o uso da presunção judicial por parte do Tribunal e esses factos constam de 52 a 54 e 56. São eles:
52)- Todos os Réus vivem há longos anos na freguesia de São Pedro da Cadeira, concelho de Torres Vedras;
53)- Os 2ºs Réus têm acompanhado a situação pela qual os 1ºs Réus têm passado;
54)- A qual é do conhecimento comum na freguesia;
56)- Sabiam igualmente que os 1ºs Réus ficaram com inúmeras dívidas, na sequência de avales prestados à empresa “MKR..., Lda.”;
E foram estes factos que conjugados com os outros de 42 a 51 relativos às relações de afinidade, da representação da 3.ª ré Imobiliária por parte do 2.º Réu e JS... que permitiram tirar as ilações que o Tribunal tirou. Podê-las-ia ter tirado?

III.3.7.– Pelo cumprimento da obrigação respondem todos os bens do devedor susceptíveis de penhora (art.º 601 do CCiv), podendo as partes convencionar fora de matéria subtraída à disponibilidade das mesmas a limitação da responsabilidade a alguns dos seus bem, no caso de incumprimento (art.º 602 do CCiv). Os credores têm legitimidade para invocar a nulidade dos actos praticados pelo devedor quer estes sejam anteriores quer posteriores à constituição do crédito desde que tenham interesse na declaração de nulidade, não sendo necessário que o acto produza ou agrave a insolvência do devedor (art.º 605/1 do CCiv). Os actos que envolvam diminuição da garantia patrimonial do crédito e não sejam de natureza pessoal podem ser impugnados pelo credor se o crédito for anterior ao acto ou sendo posterior ao acto este tiver sido realizado dolosamente com o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor (610/a) e resultar do acto a impossibilidade para o credor de obter a satisfação integral do seu crédito, ou agravamento dessa impossibilidade (art.º 610/b do CCiv). O acto oneroso só está sujeito à impugnação pauliana se o devedor e o terceiro tiverem agido de má-fé e se o acto for gratuito a impugnação procede ainda que um e outro agissem de boa-fé (art.º 612 do CCiv). A razão de ser da anterioridade do crédito em relação ao acto a impugnar radica da circunstância de os credores só poderem contar com os bens que existam efectivamente no património do devedor à data da constituição da dívida e com os que nele entrem depois. O que releva pois é a data da constituição do crédito e não a da sua exigibilidade, pois resulta claro do art.º 614 do CCiv.[3] No que toca à má-fé não se desconhece que o entendimento sobre o alcance da má-fé não é de entendimento jurisprudencial uniforme. Assim há a corrente representada no Ac STJ de 23/01/92 (BMJ 413/552), segundo o qual, está subjacente ao instituto a ideia de fraude e da necessidade da sua repressão e, por isso, não exigindo a lei o dolo directo (não o excluindo necessariamente), exige contudo a adesão dos agentes ao resultado pernicioso em qualquer das formas do dolo directo, necessário e eventual, com exclusão da negligência consciente; existe uma outra, segundo a qual não é exigível qualquer concertação das partes para atentar contra o património do credor, o chamado concilium fraudis, bastando que o devedor e o terceiro tenham agido com consciência do prejuízo que o acto causa ao credor (cfr. Ac do STJ de 26/5/94 CJSTJ, II, II, pág.115).

III.3.8.– A lei não exige a concertação do vendedor e do comprador, apenas exige que os mesmos tenham consciência de que a venda do modo que foi feita prejudica o credor. As presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido (art.º 349 do CCiv), a dispensa e a liberação do ónus da prova a que se refere o art.º 344 distinguem-se das presunções, aquelas importam o reconhecimento de certo facto, senão se provar o contrário e nestas supõe-se a prova de um facto conhecido que é a base da presunção do qual, se infere o facto desconhecido, podendo ser legais ou judiciais. As presunções judiciais são admitidas nos mesmos termos em que se admite a prova testemunhal (art.º 352 do CCiv), são admitidas pelo julgador enquanto presunções de facto ou naturais, baseadas nos ensinamentos de experiência e nas regras de vida, admitem a prova em contrário, sendo colocadas em sindicação por mera contraprova, inspiram-se estas presunções nas máximas de experiência, nos juízos correntes de probabilidade, nos princípios da lógica ou nos próprios dados da intuição humana, podendo ser afastados pela simples prova em contrário.[4] Não ensaiaram os réus sequer provar o contrário do que pareceria resultar desde logo da demonstração das relações de afinidade, de proximidade geográfica, da patente necessidade que os 2.ºs réus sentiram de proteger uma irmã da nora, no caso a mencionada ED...e por reflexo a sua própria família, conhecidas as dívidas do casal e da própria empresa M... que foi declarada insolvente e, depois os levaram, também à insolvência (factos 5 a 16, 23, 24 a 28, 55); no sentido da admissibilidade do uso das presunções judiciais quanto à matéria em questão, entre outros, vejam-se os acórdãos do STJ disponíveis no sítio www.dgsi.pt, 30/6/2011, proferido no processo 6450/05.9tbsxl.l1.s1. relatado por Lopes do Rego, de 25/11/2014, no processo 6629/09.4tbbrg.g1.s1, relatado por Pinto Almeida, de 14/7/2016 proferido no processo 377/09.2tbacb,l1.s1, relatado por Tomé Gomes. Como se diz no acórdão do STJ de 19/1/2017, relatado por Joaquim Piçarra no processo 841/12.6tbmsr.c1-s1, como se alcança do art.º 349º do Cód. Civil, as presunções são ilações que o julgador extrai a partir de factos conhecidos (factos de base) para dar como provados factos desconhecidos (factos presumidos), a presunção traduz-se e concretiza-se num juízo de indução ou de inferência extraído do facto de base ou instrumental para o facto essencial presumido, à luz das regras da experiência, sendo admitida nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal (art.º 351º do Cód. Civil). Daí que, face à competência alargada da Relação, em sede da impugnação da decisão de facto (art.º 662º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil), é lícito à 2ª instância, com base na prova produzida constante dos autos, reequacionar a avaliação probatória feita pela 1ª instância, nomeadamente no domínio das presunções judiciais, nos termos do n.º 4 do art.º 607º, aplicável por via do art.º 663º, n.º 2, ambos do Cód. Proc. Civil. Ora, daqueles factos conhecidos e já referidos, as máximas de experiência e do comportamento humano permitem concluir como a 1.ª instância concluiu nos pontos de factos 30 a 36 e 55 e 57. Já no tocante à simulação do preço constante dessa escritura de 24/4/09 e que o Tribunal deu como provado nos termos do ponto 29, o Tribunal convenceu-se que para pagamento do valor de aquisição do imóvel declarado nessa escritura o 2.º réu marido emitiu e entregou ao 1.º réu o cheque datado de 24/4/09 no valor de 17.500,00 euros sacado sobre a conta de que é titular numa dependência da Autora de São Pedro da Cadeira, cheque esse que o beneficiário JD... depositou no dia 6/5/09 em conta por si titulada junto do Banco Espírito Santo e isto com base nos documentos de fls. 45,617 e 696 (ponto 66), mas também se convenceu, por presunção que esse não foi o valor total do preço da venda, convenceu-se que esse preço foi superior a 17.500,00 mas inferior a 92.500,00 euros (ponto 29). E quais foram os factos base conhecidos de que o Tribunal da primeira instância partiu para chegar ao facto presumido de que o preço real variou entre os 17.500,00 euros e os 90 mil euros? Como resulta da motivação supra os factos base são “a avaliação patrimonial efectuada pela autoridade tributária poucos meses depois do negócio que resultou na atribuição do valor patrimonial tributário de 29.270,00 euros que se sabe ser inferior ao valor patrimonial e mercado quer a prova feita relativamente ao estado de conservação do imóvel, designadamente do testemunho prestado por MCC..., engenheiro civil que visitou a casa em Maio de 2009 para elaboração do certificado do desempenho energético constante dos autos e tirou as fotografias de fls. 733 a 737 resultando do mesmo que a moradia se apresentava naquela data em bom estado de conservação e que estava equipada com sistema de aquecimento de águas sanitárias (painel solar e depósito de água). A mera visualização dos referidos fotogramas permite visualizar o bom estado da pintura e do revestimento das paredes da sala, cozinha e quarto do casal”.

III.3.9.– O art. 394°, n° 1, do Cód. Civil, torna inadmissível a prova por testemunhas se tiver por objecto convenções contrárias ao conteúdo de documentos autênticos, quer as convenções sejam anteriores à formação do contrato ou contemporâneas dele, quer sejam posteriores, estipulando, por outro lado, o art. 351º do mesmo código que as presunções judiciais só são admitidas nos casos e nos termos em que é admitida a prova testemunhal - o que, no rigor literal dos termos, restringia a possibilidade de prova de tais convenções à prova por confissão e à prova testemunhal -, a verdade é que a doutrina e a jurisprudência se mostram propensas a entender que os preceitos em questão não precludem o recurso à prova testemunhal em complemento da prova documental, posição esta à qual aderimos. Com efeito, se, como se crê, a razão de ser da proibição do art. 394° é a necessidade de afastar os riscos próprios da falibilidade da prova testemunhal, contra o valor que o documento deve ter, se o recurso às testemunhas for um mero complemento da prova documental, motivos não há para recear a verificação dos referidos riscos. Entendemos, pois, que a prova testemunhal pode ter uma função complementar quando exista um "começo de prova" documental. Admitindo-se, nestes termos, a prova testemunhal, de admitir igualmente será o recurso às presunções judiciais (neste sentido: Prof. Vaz Serra, RLJ 107º, 311 e sgs; Mota Pinto e Pinto Monteiro, CJ, Ano X, III, págs 15 e sgs; Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, 2ª edição, II, 237/238). E qual é o começo de prova? Tanto quanto resulta da motivação o começo de prova é o que consta do ponto 61 dos factos provados, ou seja que em 6/12/2010, após reavaliação, o imóvel tinha o valor tributário de 29.270,00 euros. Ora a reavaliação tributária é algo absolutamente alheio ao negócio jurídico efectuado entre os 1.ºs e os 2.ºs réus, e nada nos autos nos permite concluir que essa reavaliação do imóvel teve por base qualquer documento particular entre os mesmos outorgado, designadamente um contrato-promessa de compra e venda, pois nada disso resulta dos autos. Nos termos do art.74º, nº1, da LGT “o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da Administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque”. Contudo, subsistem duas exceções:
i.- Quando os elementos de prova dos factos estiverem em poder da AT, o ónus da prova considera-se satisfeito caso o interessado tenha procedido à sua correta identificação junto da AT;
ii.- Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à Administração Tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respetiva quantificação;

III.3.10.– Todavia, poderão surgir alguns problemas quando se trata de articular o ónus probatório com o dever de investigação da Administração. Nesse sentido, a ideia é de que o ónus probatório que possa impender sobre o contribuinte não dispensa a AT de efetuar o seu trabalho de busca da verdade material e de prossecução da justiça, trazendo para o seu procedimento elementos relevantes benéficos para ele O art.139º do CIRC permite ao sujeito passivo provar que o valor do imóvel pelo qual foi transacionado não corresponde ao valor resultante da avaliação, através de procedimento próprio, com efeito suspensivo da liquidação seguindo a tramitação do procedimento de revisão da matéria coletável por métodos indiretos. É condição necessária para que se verifique a procedibilidade da impugnação judicial que eventualmente seja apresentada, não podendo o acto de liquidação ser atacado sem que o referido procedimento seja instaurado.

III.3.11.– Assim, o procedimento de prova do preço efectivo da transação constitui em termos processuais uma inversão do ónus da prova do valor do imóvel, uma vez que, a lei presume o valor real pelo qual os imóveis são vendidos corresponde ao valor resultante da avaliação, que constituirá assim um valor de venda mínimo a ser considerado para efeitos fiscais. Contudo, o contribuinte tem, nos termos do art. 73º, da LGT, conjugado com o art. 350º do CC, a possibilidade de provar o contrário. Ou seja, provar que o valor real da transmissão do imóvel não corresponde ao valor fixado na avaliação através, como refere o art.139º nº2 do CIRC, designadamente da demonstração do facto da qualidade construtiva efectiva não corresponder à que foi fixada pelos peritos da AT.

III.3.12.– Assim para efeitos fiscais seria de presumir que antes da venda e aquando da venda de 6/12/2010 o imóvel valeria para efeitos fiscais os 29.270,00 euros muito próximos dos 30 mil euros da escritura dessa mesma data e esse valor não foi posto em causa por nenhum dos intervenientes nesse negócio tanto quanto resulta da matéria de facto provada. Contudo essa presunção do valor para efeitos fiscais não é um facto base conhecido para efeitos do art.º 349 do CCiv e que permita concluir que o preço efectivamente pago, o preço real foi superior aos 17.500,00 euros, precisamente por ser ele próprio um facto presumido assente numa avaliação feitas pelas finanças cuja base desconhecemos em absoluto e não permite concluir que foi esse ou outro qualquer até 92 mil euros o valor real da transacção e o preço pago na transacção de 24/45/09. Pode acontecer que em acção de condenação os factos provados embora conduzam à condenação do réu não permitam concretizar inteiramente a prestação devida e tal pode acontece tanto nos casos em que é deduzido um pedido genérico não subsequentemente liquidado como naqueles em que o pedido se apresenta determinado mas os factos constitutivos da liquidação da obrigação não são provados. O pedido de condenação no pagamentos dos 92.500,00 euros deduzido contra os 1.º, 2.ºs e 3.ª ré baseava-se na alegação de que o acto conluiado abarcou não só os 1.º e 2.ºs réus como ainda a 3.ª Ré (art.º 180 da p.i.) no entanto não ficou provada a má-fé nem da 3.ª Ré nem dos últimos adquirentes tanto que nenhum outra transacção é julgada ineficaz, designadamente a 2.º transacção para a Imobiliária e a decisão recorrida, nesse ponto intocada e intocável é no sentido de que a ineficácia se resume à primeira transacção e o valor é o valor real dessa transacção. De resto, não se vê por que razão se haveria de relegar para incidente de liquidação de sentença a determinação do preço da venda em causa que resultasse não de efectiva prova documental mas de uma ilação tirada pelo tribunal, pois das das duas uma ou o Tribunal se convenceu que o preço foi aquele declarado ou não se convenceu que esse foi o preço real mas sim um preço superior com base em presunção legitimamente exercida (que no caso não tem facto-base) e, nessa hipótese a prova do preço real não pode ser relegada para liquidação tem de resultar da prova complementar ao documento. Tudo para concluir que o facto 29 passar ter a seguinte redacção:
29)-Por Escritura Pública outorgada em 24 de Abril de 2009, lavrada de fls. 156 a 159V do Livro de Notas para Escrituras Diversas nº 17 do Cartório Notarial de Sobral de Monte Agraço, os 1.°s Réus venderam aos 2ºs Réus e estes compraram, por valor declarado de 17.500,00 euros que foi efectivamente pago como resulta do ponto 66, o prédio urbano composto de casa de rés-do-chão para habitação, com superfície coberta de 56m2 e logradouro com a área de 223m2 com, sito em Azenha Velha, freguesia de São Pedro da Cadeira, concelho de Torres Vedras, descrito na Conservatória do Registo Predial de Torres Vedras sob a ficha 3.../200..., da freguesia de São Pedro da Cadeira e inscrito na matriz respectiva sob o art.º4... – conforme certidão de escritura pública constante de fls. 281 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido;

III.4. No recurso dos co-réus JD... e mulher: Saber se ocorre erro na apreciação dos meios de prova e subsequente decisão de facto constante dos pontos 29 a 35 que devem ser dados como não provados.

III.4.1.– Pelas razões referida em III.3, salva a alteração da decisão de facto do ponto 29, soçobra a impugnação da decisão de facto.

III.5.– No recurso dos co-réus CS... e MS...: saber se, não sendo alterada a decisão de facto de 29, deve ser determinada a avaliação do imóvel nos termos do art.º 662/2/b do C.P.C., anulando-se a decisão.

III.5.1.– Pelas mesmas razões pelas quais não se pode relegar para incidente de liquidação de sentença a prova do preço efectivamente pago pelos compradores na escritura do ponto 29 também não há que anular a decisão da primeira instância com vista ao apuramento do valor real ou de mercado em 2009, por não ser esse o valor que se pretende provar.

III.6.– Saber se ocorre na decisão recorrida erro na interpretação e aplicação das disposições legais referentes à impugnação pauliana.

III.6.1.– Estão verificados os pressupostos da impugnação pauliana, como acima se disse e resulta da matéria de facto dada como provada. Como bem se diz na decisão recorrida, não sendo possível executar o imóvel alienado no património dos terceiros, sub-adquirentes de boa-fé terão os 1.ºs e 2.ºs réus de responder solidariamente pelo valor do bem calculado como referência ao momento da transmissão impugnada ou seja reportado a 24/09/09 por ser este o momento do enriquecimento, atenta a má-fé dos alienantes e adquirentes iniciais (art.ºs 616/2 do CCiv), assim com o os respectivos juros assegurando-se a actualização monetária do montante nos termos do art.º 480 do CCiv.

IV–DECISÃO
Tudo visto acordam os juízes na 2.ª secção desta Relação em:
a)- julgar parcialmente procedente a apelação dos co-réus MS... e CS...,  em conformidade com o que de III consta alteram o segmento b) da decisão que se substitui por estoutra decisão de condenação dos 1.ºs e 2.ºs réus a restituir à Autora, solidariamente, preço pago na referida escritura de 24/9/09 (alínea a) no montante de 17.500,00 euros (dezassete mil e quinhentos euros) acrescido dos juros, contados à taxa legal, nos termos do art.º 550, do CCiv e respectivas portarias desde 24/9/09, até efectivo pagamento, no mais se mantendo a decisão recorrida.
b)- julgar parcialmente procedente a apelação dos co-réus JD... e MD... nos mesmos termos de a).
Regime da responsabilidade por custas: As custas em ambas as instâncias são da responsabilidade da Autora e dos 1.ºs e 2.ºs RR (sem prejuízo do apoio judiciário na modalidade concedida aos corréus JD... e MD...) na proporção do decaimento, seja 80% para a Autora e 20% para os RR.



Lxa.20-09-2018



João Miguel Mourão Vaz Gomes
Jorge Manuel Leitão Leal
Ondina Carmo Alves

 
      
[1]Na redacção que foi dada ao Código do Processo Civil pela Lei 41/2013 de 26/7, atento o disposto nos art.º 5/1, 8, e 7/1 (a contrario sensu) e 8 da mesma Lei que estatuem que o novel Código de Processo Civil entrou em vigor no passado dia 1/09/2013 e que se aplica imediatamente às acções declarativas pendentes, não estando a situação ressalvada no art.º 7, atendendo a que a acção foi autuada e distribuída inicialmente ao 1.º juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Torres Vedras em 6/1/2012 (actual J2, secção cível, Instância Central de Loures, da Comarca de Lisboa Norte ), e a data da decisão recorrida que é de 20/11/2016; ao Código referido, na redacção dada pela Lei 41/2013, pertencerão as disposições legais que vierem a ser mencionadas sem indicação de origem.
[2]Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2014, págs. 133/135
[3]Cfr. entre outros Luiz Menezes Leitão, Direito das Obrigações, , vol. III, 2.ª edição, Almedina, pág. 291 e Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 10.ª edição, 2006, Almedina, págs. 860/861.
[4]Fernando Pereira Rodrigues, in “A Prova em Direito Civil”,
Coimbra Editora, 2011, págs. 16/18.