Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2284/12.2TVLSB.L1-6
Relator: ANTÓNIO SANTOS
Descritores: INSTITUIÇÃO DE CRÉDITO
REVOGAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO
ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/09/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: -A decisão de revogação da autorização de instituição de crédito produz os efeitos da declaração de insolvência ( cfr. art.º 8.º , n.º 2 , do Dec.-Lei n.º 199/2006, de 25.10 ) , obrigando tal decisão a um subsequente processo de liquidação judicial da instituição de crédito visada [daí que, tal como ocorre com o processo de insolvência, é no referido processo que se executa a liquidação do património da instituição de crédito e a repartição do produto obtido pelos credores - cfr art.º 1º do CIRE ].

- Em face do referido, a decisão de revogação da autorização de instituição de crédito justifica outrossim a aplicação - às acções declarativas pendentes contra a instituição de crédito objecto de decisão de revogação - do Ac. Uniformizador de Jurisprudência, de 8/5/2013, nos termos do qual “Transitada em julgado a sentença que declara a insolvência, fica impossibilitada de alcançar o seu efeito útil normal a acção declarativa proposta pelo credor contra o devedor, destinada a obter o reconhecimento do crédito peticionado, pelo que cumpre decretar a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do art. 287.º do C.P.C.

-A doutrina uniformizada pelo Supremo, ainda que não vinculativa para quaisquer tribunais, apenas se justifica não ser seguida quando na presença de fortes razões ou outras especiais circunstâncias que porventura ainda não tenham sido suficientemente ponderadas.

(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial: Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.
                                                          

1.-Relatório:


A  e B , intentaram em Novembro de 2012 acção declarativa, com processo comum e sob a forma Ordinária, contra

Banco …… Português, SA ( em liquidação ) e Massa Insolvente do Banco ….. Português, pedindo que, julgada a acção provada e procedente, seja declarada a extinção, por compensação, dos dois financiamentos de €7.500.000,00 cada um, num total de €15.000.000,00 , concedidos aos AA pela 1ª Ré em 27/2/2008.

1.1-Para tanto, alegaram os AA, em síntese, que :
-A primeira Ré, que em 1996 foi autorizada pelo Banco de Portugal a realizar operações bancárias em Portugal, propôs e aconselhou o Autor marido a aderir a um produto financeiro, designado Privado Financeiras, o que veio a suceder em meados de Março e Maio de 2007, entregando-lhe então para o referido efeito 15.000.000,00€ ;
-Sucede que, tendo o produto financeiro, designado Privado Financeiras, concentrado em exclusivo a totalidade do investimento conseguido na aquisição de acções do BCP, verificou-se posteriormente que a cotação das acções do BCP       vieram a cair acentuadamente , de cerca de 4,00€ em Junho de 2007 para 2,00€ em Fevereiro de 2008 e para €1,00 no último trimestre de 2008 ;
-Já em Fevereiro de 2008, novamente aconselhado e estimulado pela   primeira Ré, e com vista a participar no aumento de capital da Privado Financeiras, o Autor marido contraiu junto da 1ª Ré dois financiamentos de €7.500.000,00 cada um, num total de €15.000.000,00;
-Em consequência dos actos praticados pela 1ª Ré acima referidos, e outros, veio o Autor a sofrer um prejuízo no montante de €30.000.000.00, sendo que a responsabilidade do mesmo é de atribuir à 1ª Ré, porque violou diversos deveres gerais de qualquer intermediário financeiro, nos termos do CVM.

1.2.-Citados os RR, vieram ambos, em conjunto, apresentar contestação, no âmbito da qual deduziram defesa por excepção , dilatória [ incompetência material ; Ineptidão da petição ; excepção dilatória inominada  ] e peremptória [ Prescrição ] , e por impugnação motivada, pugnando no essencial pela improcedência da acção.

1.3.-Prosseguindo os autos a respectiva tramitação legal, maxime com a realização de uma audiência prévia , nesta foi relegado para momento posterior a apreciação do grosso das excepções pelas RR invocadas na contestação,  e , bem assim, foi igualmente decidido que a questão pelas RR suscitada em requerimento incorporado nos autos em Julho de 2014 e atinente à inutilidade superveniente da lide [ em razão de estar a decorrer um processo de insolvência da Ré , sendo que é nesse processo que os credores da insolvência devem reclamar os seus créditos ] , seria oportunamente apreciada/conhecida.

É que, com referência à referida questão de inutilidade superveniente da lide , considerou o tribunal a quo que importava conhecer antes de mais qual a decisão final a proferir na acção n.° 1470/10.4BELSB, do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, 5.ª Unidade Orgânica, intentada pela sociedade PRIVADO HOLDING SGPS, S.A, e tendo em vista a anulação do acto do Banco de Portugal de revogação da autorização concedida ao BANCO …. PORTUGUÊS, S.A. para o exercício da actividade bancária.

1.4.-Conhecido o desfecho final da acção n.° 1470/10.4BELSB, do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, e conclusos os autos em 11/10/2016, proferiu então o tribunal a quo sentença, sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor:
Atento o supra exposto, de harmonia com o disposto no art. 277°, e), do Código de Processo Civil, declaro extinta a presente instância por inutilidade superveniente da lide.
Custas pelos AA, cfr. art. 536°, 3, do Código de Processo Civil, uma vez que na data da propositura da acção já tinha sido revogada ao BPP a autorização para o exercício da actividade bancária, pelo que aquele iria, necessariamente, entrar em processo de liquidação, razão pela qual é de afastar a aplicação do preceituado no n° 2, e) do citado art. 536° do CPC.
Registe e notifique.
Fica prejudicado o despacho proferido anteriormente.
Lisboa, m.d.”

1.5.-Inconformados com a sentença indicada em 1.4., da mesma apelaram ambos os AA  A e  B, apresentando na respectiva peça recursória as seguintes conclusões :
A.-A acção proposta pelos AA., aqui apelantes, visa a declaração da extinção, por compensação, dos créditos de reembolso dos dois financiamentos de €7.500.000,00 (sete milhões e quinhentos mil euros), cada um, num total de €15.000.000,00 (quinze milhões de euros) concedidos aos AA. pela Ré, em 27 de Fevereiro de 2008, para aquisição de valores mobiliários, uma vez que têm direito a ser indemnizados pelo BPP no montante de €30.000.000,00 (trinta milhões de euros).
B.-A sentença recorrida declarou extinta a presente instância por inutilidade superveniente da lide, considerando que os AA., aqui apelantes, deviam reclamar o seu crédito e respectiva compensação nos autos de insolvência.
C.-Para aquela conclusão, concorreram, desde logo, dois argumentos que, em bom rigor, não se revelam congruentes com a decisão constante do dispositivo da sentença recorrida.
D.-Na perspectiva da sentença recorrida, nos termos do artigo 90.2 do CIRE, na pendência do processo de insolvência do devedor, os credores apenas poderão exercer os seus direitos no âmbito daquele processo de execução universal e segundo os meios processuais previstos no CIRE.
E.-E, se uma acção declarativa em que se discutem direitos patrimoniais oponíveis ao devedor insolvente prosseguir, estar-se-á a desrespeitar o comando dos preceitos legais plasmados nos artigos 90.º, 91.º/1 e 128.º/1 e 3, todos do CIRE, porquanto o autor daquela acção estaria, na pendência do processo de insolvência, a exercer os seus direitos por meios processuais alheios ao CIRE, em violação do princípio par conditio creditorum.
F.-Ora, tais argumentos que se extraem da fundamentação de direito da decisão recorrida apontam no sentido de que os AA., aqui apelantes, não terão deduzido a sua pretensão segundo a forma especial de processo legalmente prevista, in casu, o processo de insolvência.
G.-Verificar-se-ia, então, nos termos dos artigos 193.º e 546.º, n.º 2 do CPC, uma situação de inadequação do processo utilizado ao fim por ele visado pelos AA., a qual se reconduz à figura do erro na forma do processo e não à inutilidade superveniente da lide.
H.-De igual modo, um terceiro argumento em que se fundamenta a conclusão emanada da sentença recorrida também não se revela congruente com o dispositivo da decisão do Tribunal a quo.
I.-Extrai-se da sentença recorrida a premissa de que se revela inútil uma sentença proferida em acção declarativa instaurada contra o devedor insolvente, se o credor não reclamar o seu crédito no processo falimentar, porquanto aquela decisão jamais poderá ser dada à execução para cumprimento coercivo (cfr. artigo 88.5 do CIRE).
J.-A qual parece reconduzir-se, portanto, ao entendimento de que, embora a parte insista na continuação da lide, manifestando, assim, o seu interesse em obter uma decisão, o desenrolar da mesma aponta para um desfecho que sempre será inócuo, ou indiferente, em termos de não modificar, a situação que existia antes de ser posta em juízo.
K.-A verificar-se a hipótese ora descrita, ter-se-ia que concluir pela falta de interesse processual em agir dos AA., excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso (artigos 577.º e 578.º do CPC), que se coloca no plano da relação entre a parte e o objecto do processo e é passível de se verificar ab initio ou posteriormente.
L.-Distintamente, e unicamente em coerência com a conclusão constante do dispositivo da sentença recorrida, encontramos o último dos fundamentos do argumentário em que assenta a decisão do Tribunal a quo, quando aí se convoca o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do STJ n.º 1/2014, de 25.02.2014.
M.-Em obséquio ao bom rigor técnico-jurídico, deve ter-se presente que a inutilidade superveniente da lide implica a verificação de um facto ou de uma situação posterior à inauguração daquela, por força da qual se vem a revelar impertinente ou desnecessário fazer recair sobre ela uma pronúncia judicial, por ausência de efeito útil.
N.-Desnecessidade aquela que só pode ser aferida em termos objectivos, para se concluir pela extinção da instância por inutilidade superveniente da lide (artigo 277.º, alínea e) do CPC), sob pena de se confundir com o pressuposto processual da falta de interesse processual em agir.
O.-Assim, e relativamente, pelo menos, a três dos fundamentos em que assenta a sentença recorrida, verifica-se uma situação de incongruência entre os fundamentos e o dispositivo da decisão, não sendo este último, conclusão lógica das três primeiras premissas em que a sentença recorrida assentou.
P.-O que configura, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC, uma nulidade da sentença por oposição entre os seus fundamentos e a sua decisão ou, pelo menos, por ambiguidade ou obscuridade que a torna ininteligível, a qual expressamente se invoca.
Q.-Sem prejuízo da verificação daquela nulidade, e sem conceder, sempre se teria que concluir que o entendimento perfilhado pelo Tribunal recorrido a respeito dos argumentos que, em bom rigor, configurariam erro na forma do processo não têm o mínimo de assento na letra da lei, nem de suporte nos cânones da hermenêutica jurídica.
R.-Contrariamente ao entendimento rígido que sustenta todo o edifício argumentativo da sentença recorrida, dos artigos 90.º , 91.º/1 e 128.º/1 e 3, todos do CIRE, maxime daquele artigo 90.º, apenas resulta, em geral, a consagração da natureza especial das normas, substantivas ou processuais, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas relativas aos direitos sobre a insolvência.
S.-Mas delas não se pode extrair, de forma liminar, que as acções declarativas sejam afectadas pela declaração de insolvência do devedor ao qual é oponível um crédito que se pretende reconhecido na instância declarativa.
T.-Impondo-se, antes, reconhecer que é na tramitação das acções executivas (e não das acções declarativas) para pagamento de quantia certa que a pendência do processo de insolvência contra o devedor pode interferir mais intensa e precocemente, por força do disposto no artigo 88.º do CIRE.
U.-Daquela disposição resulta como efeito necessário, imediato e automático da declaração de insolvência do devedor, a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências cautelares requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e a impossibilidade de instauração ou prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência.
V.-E bem se compreende aquela solução legal, porque, aqui sim, se coloca a necessidade de cedência dos interesses individuais de cada um dos credores perante os interesses colectivos.
W.-Presidindo àquela solução normativa uma finalidade claramente cautelar: obstar a que a actuação individual dos credores comprometa de forma irremediável a eventual recuperação da empresa e redunde na afectação do activo do devedor em benefício exclusivo de algum ou de alguns daqueles credores.
X.-Dessa forma se defraudando o princípio que preside aos efeitos processuais da insolvência: o princípio par conditio creditorum.
Y.-Mas mesmo este efeito suspensivo que se produz sobre acções executivas pendentes comporta excepções.
Z.-Por outro lado, se é verdade que, em princípio, a suspensão da execução deve manter-se até ao encerramento do processo, com a qual cessam os efeitos da declaração de insolvência, como decorre do disposto no art. 233º do CIRE, não é verdade que a cessação tenha que dar lugar, de forma automática, à extinção de execução suspensa.
AA.-Já em relação aos efeitos que eventualmente se produzem sobre as acções declarativas, como a dos presentes autos, importa ter presente que o CIRE não regula de forma sistematizada os efeitos processuais externos da declaração de insolvência sobre as acções declarativas intentadas contra o insolvente.
BB.-O que se compreende, porque estas acções não colocam em crise, pelo menos de forma imediata, o princípio par conditio creditorum, ao contrário do que pode suceder com as acções executivas.
CC.-De harmonia com o disposto no artigo 128.º , n.º 3, do CIRE, «(,..) mesmo o credor que tenha o seu crédito reconhecido por decisão definitiva não está dispensado de o reclamar no processo de insolvência, se nele quiser obter pagamento».
DD.-Desta norma resulta que o reconhecimento judicial dc crédito no âmbito de uma acção intentada pelo respectivo titular contra o devedor insolvente não tem força executiva no processo de insolvência - só a sentença que, neste processo, julgar verificado esse crédito terá essa força.
EE.-Isto porque, o legislador quis conferir a todos os credores, em igualdade de condições, a possibilidade de discutir o passivo do insolvente, na medida em que a verificação deste acaba por interferir com o grau de satisfação de cada um dos créditos.
FF.-Coerentemente, aliás, atribuiu legitimidade a todos os interessados para impugnar os créditos reclamados, como resulta, entre outros preceitos, do disposto nos artigos 130.º, 136.º, n.º 2, e 146.º do CIRE.
GG.-Mas daquela norma, que visa tutelar o princípio da intangibilidade do património do devedor insolvente, também tem que extrair-se, por um argumento a contrario sensu, que não é exigível a reclamação de um crédito no processo de insolvência se o credor não quiser obter o seu pagamento.
HH.-Ora, é precisamente esta a situação que se verifica nos presentes autos.
II.-Os AA., aqui apelantes, não visam, na qualidade de credores, obter ou sequer habilitar-se a obter pagamento em concurso de credores.
JJ.-Visam isso sim, na qualidade de devedores, libertar-se das suas dívidas, mediante compensação de um crédito, de igual montante, de que são titulares.
KK.-Pelo que, sem prejuízo do princípio da intangibilidade do património do devedor, a declaração de insolvência do devedor não importa a suspensão ou inibe quaisquer acções declarativas destinadas a exercer o direito de compensação contra aquele devedor insolvente (artigo 85.º e artigo 88.º, n.º 1, a contrario do CIRE).
LL.-A sentença recorrida incorreu, assim, em erro na interpretação e aplicação das normas contidas nos artigos 88.º, n.º 1, a contrario, 90.º, 91.º/1 e e 3, todos do CIRE, pelo que deve a mesma ser anulada, o que expressamente se requer.
MM.-Afigurando-se igualmente verificada a inconstitucionalidade das normas dos artigos 88.º, n.º 1, a contrario, 90.º, 91.º/1 e 128.º, nºs 1 e 3, todos do CIRE, na interpretação segundo a qual os credores apenas poderão exercer os seus direitos no âmbito daquele processo de execução universal e segundo os meios processuais previstos no CIRE, cuja declaração expressamente se requer, por violação do direito de acesso ao Direito e à tutela jurisdicional efectiva, consagrado no artigo 20.º da CRP.
NN.-Imagine-se que os AA., aqui apelantes, na qualidade de devedores, não apresentam a presente acção declarativa de simples apreciação negativa para se libertarem da sua dívida para com o 1.º R.
OO.-E, por sua vez, o lº R., pretendendo fazer valer os seus créditos contra os AA., aqui apelantes, e no exercício normal do seu direito, apresenta uma acção declarativa de condenação dos AA. ao pagamento daqueles créditos.
PP.-Pergunta-se: se os AA., réus naquela acção declarativa de condenação que ora se equacionou, viessem deduzir a excepção peremptória da compensação, viria o Meritíssimo Juiz que presidiria àquela instância declarar que a invocação da compensação de créditos dependeria de prévio reconhecimento do seu crédito sobre o BPP, S.A. no processo de insolvência deste?
QQ.-Admitindo, por mero exercício académico, que o exercício do direito de compensar poderia ser feito depender do prévio reconhecimento do crédito no processo falimentar, tal implicaria a renúncia àquele direito de compensar.
RR.-Neste sentido, na doutrina alemã, NERLICH & ROMMERMAN, Insolvenzordnung Kommentar, Beck Online, 2012, Rn 33-35, a respeito do §94 da lei da insolvência germânica, consabidamente inspiradora do nosso Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
SS.-Ademais, determina o artigo 85.º , n.º 1 do CIRE que « [d]eclarada a insolvência, todas as acções em que se apreciem questões relativas a bens compreendidos na massa insolvente, intentadas contra o devedor, ou mesmo contra terceiros, mas cujo resultado possa influenciar o valor da massa, e todas as acções de natureza exclusivamente patrimonial intentadas pelo devedor são apensadas ao processo de insolvência, desde que a apensação seja requerida pelo administrador da insolvência, com fundamento na conveniência para os fins do processo.»
TT.-E resulta evidenciado nos autos, mormente pelo requerimento Ref. CITIUS 14996681 dos RR. Banco … Português, S.A. - Em Liquidação ("BPP, SA"), e Massa Insolvente do Banco … Português, S.A., que não corresponde à verdade a passagem da fundamentação da decisão recorrida onde se assevera que «esta apensação não foi requerida».
UU.-Naquele requerimento, sob artigo l.º , declara-se que « [p]or se considerar de relevo para a tramitação dos presentes autos, informa-se V. Exa., ao abrigo do princípio da cooperação processual, que, no dia 04/11/2013, a Comissão Liquidatária do aqui R. BPP SA requereu a apensação da presente acção ao Processo de Liquidação Judicial do R. BPP SA, que corre termos pelo 2º Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa sob o nº 519/10.5TYLSB, conforme cópia do Requerimento que se junta como Doc. 1 e se dá integralmente por reproduzido para todos os devidos efeitos legais.» [sublinhado e negrito nossos]
VV.-Contudo, a presente acção veio depois a prosseguir, por força da recusa da apensação pela Meritíssima Juiz do Processo de Liquidação Judicial do R. BPP,SA, em cujo despacho se declara que a matéria da presente acção não importava ao processo de insolvência, gozando, portanto, de autonomia em relação àquele.
WW.-Por outro lado, ainda, sendo quase impossível enumerar todas as situações em que não existe inutilidade no prosseguimento de acções declarativas, só caso a caso se poderá desenvolver tal apreciação.
XX.-Neste sentido, os Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, de 30-06-2010 ( Relatora Des. Paula Sá Fernandes) e de 15-02-2011 (Relator Des. Manuel Marques).
YY.-Porém, tal apreciação casuística não foi devidamente realizada e concretizada na fundamentação da sentença recorrida.
ZZ.-Antes omite e ultrapassa esse competente exercício, sustentando, sem mais, que o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do STJ n.º 1/2014, de 25.02.2014 veio decidir definitivamente a questão da eventual inutilidade superveniente da lide para situações como a dos presentes autos no sentido da sua verificação.
AAA.-Ao promover a extensão da jurisprudência daquele acórdão do STJ a questões alegadamente similares às que concretamente foram objecto daquela pronúncia, tal equivale a atribuir à força meramente persuasiva de um acórdão uniformizador a natureza de lei !
BBB.-Natureza esta que aquele naturalmente não tem nem pode ter, sob pena de violação do basilar princípio da separação de poderes ( artigo 1.º da CRP), cuja violação esteve aliás na génese da extinção dos "assentos" no nosso ordenamento jurídico.
CCC.-Neste sentido se pronunciou o Venerando Juiz Conselheiro SEBASTIÃO PÓVOAS, em declaração de voto de vencido proferida precisamente naquele Acórdão Uniformizador n.º 1/2014 : « A função primeira do Supremo Tribunal de Justiça é a jurisdicional, como instância de recurso, não podendo esquecer-se que o cerne é julgar uma revista, que se nega ou concede a final. É na argumentação e nos fundamentos da decisão que se irá optar — ou definir — por uma corrente doutrinária ou jurisprudencial, sendo que a ratio decidendi será encontrada pelas partes e por todos os comentadores ou meros leitores do texto. A prolação do «assento» final, na modalidade de proposição conclusiva, neste tipo de acórdãos, só serve para enfatizar um carácter vinculativo ou obrigatório de uma decisão que é, apenas, meramente persuasiva e mutável .» [sublinhados e negrito nossos]
DDD.-Sem prejuízo do que se acaba de alegar, e ainda que se levasse em consideração a jurisprudência - meramente persuasiva e mutável, reitera-se -daquele Acórdão Uniformizador do STJ n.º 1/2014, seria exigível, pelo menos, que a sentença recorrida cuidasse de assegurar que o enquadramento fáctico e de direito relativo à situação ali julgada mantivesse uma relação de identidade com a hipótese dos presentes autos.
EEE.-Mas nem isso se verifica, o que é bem revelador do laxismo externado pelo Tribunal a quo na prolação da sentença ora colocada em crise.
FFF.-Se se atentar, com o zelo e diligência minimamente exigíveis para o segmento dispositivo daquele Acórdão Uniformizador n.º 1/2014, do Venerando STJ, verifica-se que a jurisprudência nele fixada se aplica tão-somente aos casos em que os credores se pretendem fazer pagar pela liquidação do património do devedor insolvente, cujo produto obtido é por eles repartido.
GGG.-Trata-se afinal da finalidade primordial a que preside o processo de insolvência e que, nalguma medida, se poderia lograr alcançar, à margem do processo falimentar, mediante acções declarativas de condenação.
HHH.-Mas nunca mediante a instauração de acções de simples apreciação negativa, como a dos presentes autos.
III.-Se o Tribunal a quo tivesse desenvolvido, como lhe era exigível, uma leitura e análise atenta e aturada do teor integral do Acórdão Uniformizador n.º 1/2014, concluiria seguramente, como é facilmente perceptível, que a situação dos autos onde foi prolatado aquele acórdão teve origem numa acção declarativa de condenação.
JJJ.-Isto mesmo resulta expressamente do primeiro parágrafo daquele Acórdão Uniformizador n.º 1/2014, que aqui se reproduz por facilidade expositiva: « Na presente acção declarativa, com processo comum, intentada, a 4.3.2008, no Tribunal do Trabalho de Almada, em que são partes Helena Maria Ramos da Silva Capelo e «Imperavis - Investimentos Imobiliários, S.A.», a A. pediu a condenação da R. a ver declarada a ilicitude do despedimento de que foi alvo, com a consequente condenação desta na sua reintegração e no pagamento das prestações vencidas e vincendas, conforme oportunamente discriminado.» [sublinhados e negritos nossos].
KKK.-Mas a sentença recorrida não se fica por aqui no arrazoado de argumentos impertinentes e inaplicáveis à situação dos autos.
LLL.-Acrescenta-se ainda na decisão ora em crise que não é admissível, sequer, o entendimento de que só se verifica inutilidade superveniente da lide das acções declarativas que têm por objecto o reconhecimento judicial de um crédito oponível ao devedor insolvente apenas após a prolação da sentença de verificação e graduação de créditos, momento em que se reconhece e define os direitos dos credores.
MMM.-Entendimento este sufragado, designadamente, nos Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto, de 17-12-2008 ( Relatora Des. MARIA CATARINA), de 22-09-2009 (Relatora Des. ANA LUCINDA CABRAL), de 02-03-2010 (Relator Des. MARQUES DE CASTILHO) e de 01-06-2010 (Relator Des. GUERRA BANHA); e nos Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, de 30-06-2010 ( Relatora Des. PAULA SÁ FERNANDES) e de 15-02-2011 (Relator Des. MANUEL MARQUES).
NNN.-Sustentando a sentença recorrida, para tanto, que aquele entendimento é contrário ao princípio par conditio creditorum e abriria caminho a situações de conluio e favorecimento entre alguns dos vários credores, por um lado, e a empresa em insolvência iminente ou já insolvente, por outro.
OOO.-Com o devido respeito, em primeiro lugar, revela-se manifestamente desajustado insinuar, ainda que em abstracto, quaisquer situações de conluio ou favorecimento de credores, quando, em concreto, se pretende apenas a mera declaração da extinção de um crédito da lª Ré por intermédio de uma modalidade alternativa de extinção das obrigações: a compensação (artigo 854.2 do CC).
PPP.-Em segundo lugar, ignora-se a utilidade da sentença nas situações em que o processo de insolvência é encerrado antes do rateio final sem que chegue a ser proferida sentença de verificação e graduação de créditos.
QQQ.-E, bem assim, se olvida que a obrigatoriedade de que todos os créditos de natureza patrimonial contra o insolvente serem reclamados no processo de insolvência, através de requerimento endereçado ao administrador da insolvência ( arts. 90.º e 128.º do CIRE), não assegura que o crédito venha a ser reconhecido (art. 129.2 do CIRE) nem dispensa o credor de fazer prova da existência e do valor do seu crédito (art. 128.º, n.º 1, do CIRE).
RRR.-No mesmo sentido de que a acção (declarativa condenatória, que nem é a hipótese dos presentes autos, reitera-se) não deve ser extinta por inutilidade superveniente da lide, MARIA DO ROSÁRIO EPIFÂNIO, Manual de Direito da Insolvência, Coimbra, Almedina, 2016, pp. 160: «Pensamos que, apesar de a acção não ser apensada e o credor não reclamar o seu crédito no processo de insolvência, a acção declarativa condenatória conserva a sua utilidade e, por isso, deverá apenas ser suspensa e não extinta por inutilidade superveniente da lide. Só no caso de o credor ter reclamado o seu crédito e de este ter sido objecto de sentença de verificação e graduação de créditos poderá a instância extinguir-se por inutilidade superveniente da lide (art. 277.º, al e) do CPCivil). (...)» [sublinhados e negritos nossos] ]
SSS.-Por último, importa ainda convocar a douta jurisprudência prolatada também por aquele Venerando STJ, em Acórdão de 15.03.2012 (Relator Des. SEBASTIÃO PÓVOAS), disponível em http://www.dgsi.pt/, cujo sumário, por facilidade expositiva, tomamos a liberdade de aqui reproduzir:

«1)A alínea e) do artigo 287.º do Código de Processo Civil prende-se com o princípio da estabilidade da instância que se inicia com a formulação de um pedido consistente numa pretensão material com solicitação da sua tutela  judicial (pretensão processual) aquele de corrente de um facto jurídico causal (essencial ou instrumental) da qual procede (causa de pedir).
2)A lide torna-se impossível quando sobrevêm circunstâncias que inviabilizam o pedido, não em termos de procedência/mérito mas por razões conectadas com o mesmo já ter sido atingido por outro meio não podendo sê-lo na causa pendente.
3)Torna-se inútil se ocorre um facto, ou uma situação, posterior à sua instauração que implique a desnecessidade se sobre] ela recair pronúncia judicial por falta de efeito.
4)A desnecessidade deve ser aferida em termos objectivos não se confundido com uma situação fronteira, então já um pressuposto processual, que é o interesse em agir.
5)Situações há em que, embora a parte insista na continuação da lide, o desenrolar da mesma aponta para uma decisão que será inócua, ou indiferente, em termos de não modificar a situação posta em juízo.
6)Cabe, então, ao julgador optar ou pela extinção da instância por inutilidade da lide (como se disse, a apreciar objectivamente) ou pela excepção dilatória inominada (conceito de relação entre a parte e o objecto do processo) que perfilando-se, em regra, "ab initio" pode vir a revelar-se no decurso da causa.
7)O interesse processual determina-se perante a necessidade de tutela judicial através dos meios pelos quais o autor unilateralmente optou.
8)A alínea c) do n.° 2 do artigo 449 ° do Código de Processo Civil não contém uma hipótese de falta de interesse em agir mas de extinção da instância, com tributação a cargo do demandante, por indiciar uma litigância não necessária.
9)O Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas não contém para as acções declarativas uma norma homóloga à das execuções - artigo 88º - que não é aplicável àquelas.
10)Às acções declarativas intentadas contra o insolvente, ou por este intentados (quer por via principal, quer por via cruzada) é aplicável o regime do artigo 81. 9 daquele diploma.
11)Cumprindo ao administrador gerir e zelar pela massa insolvente fica, nos termos do n.º 3 daquele preceito, habilitado para em seu nome prosseguir os ulteriores termos das lides declarativas em que o insolvente seja autor ou réu aí juntando procuração e prova da declaração de insolvência.
12)A apensação desses processos à insolvência não é oficiosa (automática) antes dependendo do requerimento motivado do administrador.
13)O princípio "par conditio creditorum" não é afastado pelo prosseguimento dessas acções na conjugação com a imposição de reclamação dos créditos no processo de insolvência para aí poderem obter satisfação, já que a sentença que venha a ser proferida apenas pode valer com o documento da respectiva reclamação.
14)O administrador habilitado nos termos do n.º 3 do artigo 85º do CIRE não pode impor ao Autor de acção intentada contra o insolvente que venha reclamar o crédito nos termos do artigo 128.º por isso pedindo a extinção da instância por inutilidade da lide, já que o Autor é livre de o fazer ou renunciar à reclamação do mapa/lista (optando, ou não, pela insinuação tardia) e o administrador pode pedir a apensação da acção declarativa e ponderar o crédito pedido em termos de o considerar, ou não, reconhecido) se o entender conveniente.
15)Além do mais, e atendendo ao artigo 184º do CIRE, a dispor que se, após a liquidação, existir um saldo a exceder o necessário para o pagamento integral das dívidas da massa, o mesmo deve ser entregue ao devedor, sempre o demandante (munido de um título executivo) pode obter o pagamento do seu crédito, tal como o poderá fazer se o devedor lograr obter bens após o encerramento do processo “, [sublinhado e negrito nossos]

III.-Nesta avisada e qualificada jurisprudência, além de se repisarem os fundamentos que já aqui se invocaram para colocar em crise a sentença recorrida, convoca-se - e bem - um argumento adicional, embora inaplicável -reitera-se e sublinha-se - à pretensão dos AA., aqui apelantes, nos presentes autos.
UUU.-Deve ter-se presente que, em tese, é possível que o produto da liquidação seja suficiente para o pagamento da integralidade dos créditos sobre a insolvência, pelo que, nessa hipótese, nada impede que um credor, munido de uma sentença judicial, possa vir a obter, em momento posterior ao encerramento da insolvência, o pagamento do seu crédito.
VVV.-Assim, por todos os fundamentos aqui expostos, alicerçados em ampla e avisada jurisprudência aplicável à situação dos autos, só pode concluir-se que a sentença recorrida errou na interpretação e aplicação do artigo 277.º, alínea e) do CPC.
WWW.-Devendo aquela norma ter sido interpretada e aplicada no sentido de não se verificar, na situação dos autos, inutilidade superveniente da lide.
XXX.-Pelo que deve a mesma ser anulada, o que expressamente se requer.

1.5.-As apeladas Banco …. Português, SA ( em liquidação ) e Massa Insolvente do Banco ….. Português , vieram apresentar contra-alegações, impetrando a confirmação da sentença apelada, e concluindo para tanto do seguinte modo:
A)A Douta Sentença encontra-se correcta e devidamente fundamentada e não padece de qualquer vício ou erro de interpretação.
B)Não se verifica qualquer oposição entre os fundamentos e a decisão recorrida ou ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
C)A alegação dos Recorrentes também não permite concluir que os fundamentos da decisão apontem para uma situação de erro na forma do processo ou, por outro lado, para falta de interesse processual em agir, e não para a inutilidade superveniente da lide.
D)A extinção da instância justifica-se quando, em virtude de factos novos ocorridos na pendência do processo, a decisão a proferir já não possa ter qualquer efeito útil, designadamente, porque não é possível dar satisfação à pretensão que o demandante quer fazer valer no presente processo.
E)Não obstante os Recorridos entenderem, como declararam nos autos, que a situação sub judice configura uma verdadeira impossibilidade originária da lide, o certo é que, no limite, e perante o facto superveniente relativo ao trânsito em julgado da sentença que julgou improcedente a acção de anulação da decisão adoptada pelo Banco de Portugal, que revogou a autorização para o exercício da actividade bancária do BPP SA, os Autores apenas poderão ver reconhecidos os seus créditos e operar a compensação nos autos de insolvência do BPP.SA e segundo os meios processuais regulados no CIRE, com estrita observância do princípio par conditio creditorum.
F)Assim, a acção declarativa movida pelos Autores tornou-se inútil, conforme bem decidiu o Tribunal a quo.
G)A Sentença recorrida é clara, coerente e inequívoca, quer nos seus fundamentos quer na decisão, não padecendo de qualquer contradição, ambiguidade ou obscuridade, que determine a sua invalidade.
H)Os Autores pretendem que lhes seja reconhecido um crédito indemnizatório sobre o BPP,SA fundado em responsabilidade civil, o qual, se viesse a ser reconhecido, passaria a integrar o conceito de crédito sobre a insolvência ( cfr. art. 47° do CIRE).
I)Por outro lado, o crédito de € 15.000.000,00 que o BPP,SA detinha sobre os Autores encontrava-se registado no seu balanço e, como tal, fazia parte integrante da Massa Insolvente do BPP, nos termos do artigo 85°, n° 1, do  CIRE.
J)De acordo com o artigo 90° do CIRE, aplicável à liquidação judicial do BPP,SA ex vi artigo 8°, n° 1, do Decreto-Lei 199/2006, durante a pendência do processo de insolvência, os credores da insolvência apenas poderão exercer os seus direitos no processo de insolvência e em conformidade com os preceitos e meios processuais desse código.
K)É o que determina o princípio par conditio creditorum.
L)Assim se garante a intangibilidade do património do devedor, já que a massa insolvente deixa de poder ser utilizada como garantia geral de outros créditos que não aqueles que sejam exercidos no processo de insolvência.
M)Mesmo o credor que tenha o seu crédito reconhecido por decisão definitiva, não está dispensado de o reclamar no processo de insolvência, se nele quiser obter pagamento, obrigação esta que é reforçada quando o credor não tenha o seu direito de crédito judicialmente declarado e reconhecido, como sucede no caso vertente (cfr. artigo 128°, nºs 1 e 3, do CIRE).
N)Ainda que os Autores não tenham pedido na presente acção a condenação do BPP SA no pagamento de indemnização, o certo é que o conhecimento de tal putativo direito e o seu reconhecimento constitui actividade lógica e prévia à declaração de compensação.
O)Sempre deveriam os Recorrentes ter deduzido a sua pretensão no processo de liquidação judicial do BPP SA, nos termos previstos nos artigos 128° e segs. ou nos artigos 146° e segs. do CIRE, com vista ao reconhecimento e declaração do seu direito de crédito, de forma a invocar contra o BPP SA a compensação de créditos.
P)É, pois, manifesto que o expediente processual previsto nos artigos 128° e segs. do CIRE, que constitui um verdadeiro ónus de todos quantos se arrogam credores do insolvente (cfr. art. 90° do CIRE), retira todo e qualquer efeito útil à acção declarativa movida pelos ora Recorrentes.
Q)Mesmo obtendo a procedência da acção, no que não se concede, os Autores não poderiam dar tal decisão à execução para cumprimento coercivo, atenta a natureza e a função do processo de insolvência, rectius liquidação judicial, como execução universal (cfr. art. 1 ° do CIRE).
R)Daqui resulta que a presente acção declarativa é inútil, não podendo este Tribunal conhecer do mérito da mesma.
S)Se assim não fosse, estaria encontrada a forma de contornar os princípios mais elementares do processo de insolvência, permitindo-se a alguns credores tentar obter a satisfação do seu crédito, ainda que parcialmente, por via da compensação de créditos, sobre o insolvente fora do processo de insolvência, assim violando o princípio basilar do tratamento igualitário de credores.
T)Precisamente por este motivo está vedado aos credores proporem acções executivas contra o insolvente após a declaração de insolvência (cfr. art. 88°, n° 1, do CIRE).
U)Produzindo a compensação (quando válida e eficaz, e tal não é o caso da situação sub judice) um efeito equivalente ao de uma acção executiva - a satisfação efectiva de um direito de crédito - não pode a mesma ser realizada ou invocada, judicial ou extra-judicialmente, fora do processo de insolvência;
V)E sem que aí o crédito sobre a insolvência tenha sido declarado e reconhecido (cfr. neste sentido Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12/0112010, processo 20463/09.8YIPRT.C1., disponível em www.dgsi.pt).
W)Os Autores pretendem alcançar através da presente acção uma finalidade proibida por lei, sendo inaplicável, ainda que em tese, a legislação e doutrinas alemãs.
X)Aliás, o nosso CIRE optou por regular expressamente a admissibilidade da compensação no artigo 99° do CIRE, impondo requisitos adicionais face ao regime ordinário civilístico.
Y)Por outro lado, qualquer questão relativa à compensação de créditos deve ser julgada e decidida no processo de liquidação judicial do BPP SA, conforme estatui a norma especial constante do artigo 99° do CIRE;
Z)Não podem os Autores, através de uma acção declarativa alcançar os efeitos que o CIRE veda a partir do momento em que é declarada a insolvência (cfr. art. 88°, n° 1 do CIRE).
AA)Ademais, a compensação invocada não é admissível ao abrigo do disposto no referido artigo 99° do CIRE, por não estarem reunidos os pressupostos previstos nas alíneas a) e b) do seu n° l, designadamente por o crédito dos Autores não ser exigível e porque contra o mesmo procede excepção dilatória de direito material (cfr. artigo 847°, n° 1, al. a) do Código Civil).
BB)Diga-se ainda que o crédito invocado pelos Recorrentes é meramente hipotético, não tendo existência jurídica, carecendo de ser judicialmente declarado e reconhecido. E, como tem sido entendido pela doutrina e jurisprudência, não é admissível a compensação de créditos quando o direito invocado não se apresenta como um direito de crédito exigível, por necessitar de ser judicialmente reconhecido, na verificação do dever de indemnizar, pela prática de um ilícito contratual do mesmo gerador,
CC)Ora, o reconhecimento de créditos sobre o BPP SA é da exclusiva competência do Juiz da insolvência e deve, por essa razão, ter lugar no âmbito dos autos de insolvência do BPP SA.
DD)Os argumentos ora expendidos revestem particular acuidade num processo de liquidação judicial de uma instituição de crédito como é o caso do BPP SA, tendo em conta os interesses envolvidos, designadamente dos credores da massa insolvente do BPP SA.
EE)Os exemplos aludidos pelos Recorrentes referentes a situações específicas de excepção não têm qualquer aplicação ao presente processo, sendo, pois, desajustadas e irrelevantes para apreciação do thema decidendum.
FF)Não se pode aceitar a alegação dos Recorrentes de que não é exigível a reclamação de um crédito no processo de insolvência se o credor não quiser obter o seu pagamento. Os Recorrentes pretendem o reconhecimento da validade e eficácia da compensação de créditos, a qual é uma forma de extinção de obrigações que produz um efeito semelhante ao pagamento - satisfação efectiva de um direito de crédito.
GG)Carecem de fundamento as considerações vertidas nos pontos 56. a 58. da Alegação. A compensação não pode actualmente ser invocada judicialmente por via de excepção, mas apenas por via de pedido reconvencional (cfr. artigo 2660, n° 2, al. c) do Novo CPC). Pelo que, os Recorrentes teriam sempre de deduzir um pedido contra o BPP SA e discutir, do ponto de vista substantivo, a admissibilidade da compensação, ao abrigo do disposto no artigo 99° do CIRE.
HH)Tal significa que nunca estariam dispensados de reclamar os seus créditos, nos termos dos artigos 128° e segs. do CIRE, caso quisessem obter o seu reconhecimento e operar a compensação.
II)-Caso não o fizessem, o BPP SA poderia defender-se do pedido reconvencional, excepcionando, designadamente, que o crédito invocado pelos devedores não foi reclamado e reconhecido no processo de insolvência.
JJ)-É que os créditos não reclamados nem reconhecidos no processo de insolvência não podem ser compensados com a dívida à massa (cfr. artigo 90° do CIRE).
KK)-Por outro lado, é evidente que qualquer acção declarativa de condenação de natureza patrimonial movida pelo BPP SA após a declaração de insolvência, representado pela Comissão Liquidatária, correria sempre por apenso ao processo de insolvência e seria decidida pelo juiz do processo de insolvência (cfr. artigo 85° do CIRE).
LL)-Não se verifica, assim, qualquer erro de interpretação e aplicação na decisão recorrida das normas contidas nos artigos 85°, 88°, n° 1 a contrario, 90°, 91º, n° 1, e 128°, nºs 1 e 3 do CIRE.
MM)-A Douta Sentença recorrida não viola o direito de acesso ao Direito e à tutela jurisdicional efectiva, consagrado no artigo 20° da CRP. A lei prevê diversas formas de os credores da insolvência fazerem valer os seus direitos no processo de insolvência. Para tanto, teriam de reclamar os seus créditos, no prazo fixado na sentença declaratória de insolvência (artigo 128.° do CIRE), ou posteriormente, se verificados os condicionalismos dos artigos 146.° e segs. do mesmo código. Os Recorrentes tinham, assim, ao seu alcance todos os meios necessários para fazerem valer os direitos a que se arrogam, não se afigurando qualquer inconstitucionalidade dos normativos constantes dos artigos 88°, n° 1 a contrario, 90°, 91 0, n° 1, e 128°, nºs  1 e 3 do CIRE
NN)-Verificava-se toda a conveniência na apensação da sobredita acção judicial aos presentes autos de liquidação, pois nesta acção i) os Autores invocam o direito a um crédito indemnizatório sobre o BPP SA e a respectiva massa insolvente e ii) requerem a compensação do seu alegado crédito no valor de €30.000.000,00 com o crédito do insolvente registado no seu balanço e, por conseguinte, compreendido na massa insolvente.
OO)-Sem prejuízo, a não apensação da acção declarativa aos autos de liquidação judicial do BPP SA em nada contende com o facto de os ora Recorrentes terem o ónus de reclamar créditos no processo de insolvência se quiserem fazer operar a compensação válida e eficazmente.
PP)-O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n° 1/2014, de 25/02/2014 tem plena aplicação ao caso sub judice, em relação aos créditos invocados pelos ora Recorrentes.
A Sentença recorrida realizou uma apreciação casuística devidamente fundamentada quanto à inutilidade no prosseguimento da presente acção declarativa e quanto à aplicação do supracitado Acórdão de Uniformização de Jurisprudência aos presentes autos, conforme resulta da fundamentação da mesma.
QQ)-A presente acção declarativa não é uma acção de simples apreciação negativa.
Os Recorrentes não pretendem obter a declaração da inexistência de um direito cujo pedido, aliás, nem sequer deduzem - mas obter o reconhecimento judicial de um crédito, para poderem libertar-se de uma dívida por via da compensação,
Para operar e/ou reconhecer a compensação, os Recorrentes tinham de obter previamente o reconhecimento judicial do seu crédito no processo de insolvência.
RR)-Em face de todo o exposto, reque-se a V. Exas. se dignem negar provimento ao presente recurso e, consequentemente, proferir douto Acórdão que confirme integralmente a decisão contida na Douta Sentença recorrida, declarando a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos do disposto no artigo 277°, al. e), do CPC, com todas as consequências legais,
Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis, deverá ser negado provimento ao presente Recurso, mantendo-se integralmente a Douta Sentença recorrida.
                                                          
Thema decidendum
1.6-Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões [ daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem ] das alegações dos recorrentes ( cfr. artºs. 635º, nº 3 e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho ), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, as questões a apreciar e a decidir são apenas as seguintes :

I-Se a sentença recorrida integra vício de nulidade, nos termos do artº 615º,nº1, alínea c), do CPC;
II-Aferir se a sentença recorrida, ao declarar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, errou na interpretação e aplicação do artigo 277.º, alínea e) do CPC, designadamente porque :
a)-o artº 90º, do CIRE, não afecta/abrange as acções declarativas, como o é a presente ;
b)-na presente acção não têm os AA por desiderato reclamar o pagamento de um crédito, antes visam tão só exercer o direito de compensação;
c)-a interpretação do tribunal a quo - segundo a qual os credores apenas poderão exercer os seus direitos no âmbito daquele processo de execução universal e segundo os meios processuais previstos no CIRE - é inconstitucional, por violação do direito de acesso ao Direito e à tutela jurisdicional efectiva, consagrado no artigo 20.º da CRP.
d)-o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do STJ n.º 1/2014, de 25.02.2014, não se “aplica” à presente acção, a qual é de simples apreciação negativa.
                                                          
2.-Motivação de Facto.
A factualidade a atender em sede de julgamento do mérito da  apelação pelos AA interposta é a que se mostra indicada no Relatório do presente Acórdão, e para o qual se remete, acrescentando-se tão só a seguinte ( que resulta do teor dos documentos juntos aos autos ) :
2.1.-O BANCO de PORTUGAL, por deliberação do Conselho de Administração de 15 de Abril de 2010, tomada ao abrigo do artigo 23.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei nº 292/92, de 31 de Dezembro, revogou a autorização para o exercício da actividade bancária do BANCO …. PORTUGUÊS, S.A.;
2.2.-Intentada acção no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa,  5ª Unidade Orgânica, sob o n.º 1470/10.4BELSB, pela sociedade PRIVADO HOLDING SGPS, S.A, e tendo em vista a anulação do acto do Banco de Portugal indicado em 2.1., veio em 29/1/2016 a ser proferida sentença, já transitada em julgado - em 16/3/2016 - , e que julgou a acção improcedente.
*

3.-Se deve a sentença recorrida ser declarada nula, por força do disposto no artº 615º, nº1 al. c) do CPC.
Em sede de conclusões da respectiva instância recursiva, dizem os recorrentes que a sentença apelada socorre-se de diversos fundamentos para concluir pela extinção da instância por inutilidade superveniente da lide , mas , em rigor, o grosso dos mesmos em caso algum justificam e conduzem à extinção da instância por inutilidade superveniente da lide ( cfr. artigo 277.º, alínea e) do CPC), razão porque verifica-se uma situação de incongruência entre os fundamentos e o dispositivo da decisão, não sendo este último, conclusão lógica das premissas em que a sentença recorrida assentou.
Destarte, concluem os apelantes , a incongruência referida configura, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC, uma nulidade da sentença por oposição entre os seus fundamentos e a sua decisão ou, pelo menos, por ambiguidade ou obscuridade que a torna ininteligível.
Adiantando desde já o nosso veredicto, afigura-se-nos que, em rigor, não padece a sentença apelada , e manifestamente, do vício adjectivo acima apontado pelos recorrentes.

Senão, vejamos .

Como é por demais consabido, a apontada nulidade de sentença decorrente de pretensa contradição entre a fundamentação e a decisão, apenas existe quando os fundamentos invocados - de facto e de direito - devessem, necessária e logicamente (qual vício lógico), conduzir a uma decisão diferente/oposta àquela que a sentença expressa, sob pena de existir entre ambos uma contradição insanável e incompreensível (a decisão colide com os fundamentos em que ostensivamente se apoia ) . (1)

Dito de uma outra forma, e como ensinam Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora (2), na alínea c), do nº1, do pretérito artº 668º do CPC, a lei refere-se à contradição real entre os fundamentos e a decisão e não à hipóteses de contradição aparente, resultantes de simples erro material, seja na fundamentação, seja na decisão.

É que, e em rigor, como bem explicam ainda os mesmos e ilustres Prof.s (3) citados, na situação referida, “há um vício real no raciocínio do julgador ( e não um simples lapsus calami do autor da sentença ) : a fundamentação aponta num sentido ; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente”.

Ainda como referência ao vício formal ora em apreço, e agora nas palavras de Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto (4), ” Entre os fundamentos da decisão não pode haver contradição lógica : se na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença”.

E, logo a seguir, os mesmos autores advertem que  “ Esta oposição não se confunde com o erro de subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade ; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correcta, a nulidade verifica-se. A oposição entre os fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na contradição entre o pedido e a causa de pedir, geradora da ineptidão da petição inicial (art. 193-2-b).”

Em suma, a hipótese da alínea c), pressupõe a existência de uma oposição real entre os fundamentos e a própria decisão, isto é, situações em que os fundamentos invocados pelo julgador devessem ter conduzido, logicamente e coerentemente , a um  resultado diferente do expresso na decisão . (5)

Dito isto, tal “obriga“ por si só e desde logo a arredar o invocado vício de nulidade de sentença, com base em pretensa contradição entre a fundamentação e a decisão ou comando /dispositivo – a solução dada ao litígio , pois que, analisado o grosso ( a globalidade) da fundamentação do tribunal a quo aduzida na sentença, não se descortina, antes pelo contrário, que aponte ela necessária e obrigatoriamente para um único sentido, tendo porém o Exmº julgador enveredado, contraditoriamente, por diferente desfecho/solução.

É certo que, os recorrentes, discordam e não se conformam com o comando decisório da sentença, considerando que, em função v.g. da motivação de facto e de direito para a mesma transportada, deveria necessariamente ter sido ele diferente, nada justificando a decidida extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.

Sucede que, a terem os recorrentes razão, então o vício que atinge a sentença será já de natureza substantiva ( error in judicando), que não adjectiva, não sendo ele subsumível à previsão do artº 668º, do CPC.

Em suma, e mais uma vez, o que de resto integra prática confrangedoramente repetitiva em sede de instâncias recursórias, confundem os recorrentes o error in judicando com o mero error in procedendo, ou seja , tratam o erro no julgar ou erro material ou de conteúdo como se fosse ele um mero erro adjectivo ou um vício de forma.

Por fim, e incidindo agora a nossa atenção sobre a pertinência de a sentença padecer ainda do vício adjectivo da alínea c), do nº1, do artigo 615º, do CPC actualmente em vigor, mas agora da respectiva segunda parte, recorda-se que  -  e em comparação com a disposição legal correspondente do pretérito CPC - mostra-se actualmente adicionada uma nova causa de nulidade de sentença, mas, por outra banda, deixou já o novo CPC de prever a existência de decisão autónoma da sentença que declarasse quais os factos provados e não provados ( decisão esta que era susceptível de reclamação por obscuridade - cfr. artº 653º, nº4 ), e , bem assim, de admitir que da sentença da primeira instância pudessem as partes requerer o respectivo esclarecimento de alguma obscuridade ou ambiguidade ,  logo , lícito é assim concluir que a nova causa de nulidade de sentença passa a abarcar/incluir ambos os referidos expedientes reclamatórios  do pretérito CPC.

Destarte, aplicando-se mutatis mutandis à segunda parte da alínea c), do nº1, do artigo 615º, do actual CPC , os “ensinamentos“ que justificavam as  anteriores  reclamações do revogado CPC, dir-se-á que a sentença será agora nula caso a respectiva decisão de facto ( cfr. nº 4, do artº 607º, do CPC ) , e outrossim , o respectivo comando decisório final ( cfr. nº 3, in fine , do artº 607º, do CPC ), venham a padecer de alguma ambiguidade e/ou obscuridade.

Dito isto, começando pelo significado de ambas as expressões legais vertidas na alínea c), do nº1, do artº 615º, do CPC, e como se pode ler num qualquer dicionário (6) (no sentido figurado que no Código é empregue), a obscuridade  será equivalente a “falta de clareza das palavras“ ,das ideias, e das expressões (as quais importam dificuldade em entender , trazendo confusão), e , a  ambiguidade , implica já a existência de expressões com duplo sentido, sentido equívoco ou duvidoso , ou seja , criam elas junto do destinatário uma incerteza.

Dizendo de uma outra forma, e quando em causa está designadamente uma decisão judicial, dir-se-á que a obscuridade traduz-se em sentença imperfeita, porque ininteligível , e , a ambiguidade, reconduz a uma decisão que, no passo considerado, podem razoavelmente atribuir-se dois ou mais sentidos diferentes (7).

Socorrendo-nos de seguida das palavras ( que permanecem sempre actuais ) do prestigioso José Alberto dos Reis (8) “ a sentença é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível; é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes. Num caso não se sabe o que o juiz quis dizer; no outro hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos. É evidente que, em última análise, a ambiguidade é uma forma especial de obscuridade. Se determinado passo da sentença é susceptível de duas interpretações diversas, não se sabe, ao certo, qual o pensamento do juiz.”

Ora, postas estas breves considerações, importa desde logo atentar que os apelantes , em rigor, não explicam/identificam quais as passagens da sentença que não conseguem entender/perceber, antes tudo indicia que compreenderam exactamente quais os fundamentos invocados pelo tribunal a quo e que ancoram o excerto decisório da referida sentença, mas, com tal fundamentação e subsequente decisão não concordam.

Em rigor, portanto, os apelantes conseguiram apreender qual a posição sufragada pelo juiz, qual o respectivo entendimento e pensamento, mas, com ele não estão de acordo, antes consideram-no errado/desadequado.

Porque tal discordância, insiste-se, também nada tem que ver com qualquer error in procedendo, forçoso é pois concluir que não padece a sentença apelada de qualquer nulidade, maxime da invocada pelos apelantes .
                                              
4.-Será que, a sentença recorrida, ao declarar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, errou na interpretação e aplicação do artigo 277.º, alínea e) do CPC ?

4.1.-Importa começar por precisar que, na génese da prolação pelo tribunal a quo da sentença recorrida, e em face da factualidade vertida nos itens 2.1. e 2.2. do presente Ac., está a aplicação in casu do disposto no artº 8º do Dec.-Lei n.° 199/2006 , de 25/10 [ com a redacção anterior à introduzida pelo Dec.-Lei n.º 31-A/2012, de 10/02, em face do disposto no  art.º 12.º n.º 1 e n.º 2, 1.ª parte, do Código Civil ] , rezando tal normativo , nos respectivos nºs 1 e 2, que :
1-A liquidação judicial das instituições de crédito fundada na revogação de autorização pelo Banco de Portugal faz-se nos termos do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, com as especialidades constantes dos artigos seguintes.
2-A decisão de revogação da autorização pelo Banco de Portugal produz os efeitos da declaração de insolvência.
A aplicação do referido diploma à situação sub judice, não sendo questionada pelas “partes”, e não se olvidando o disposto no artº 5º,  nº3, do CPC, deve ter-se como pertinente/ajustada, sendo que, em sede de preâmbulo do diploma aludido, explica o legislador que “ Continua a atribuir-se ao Banco de Portugal, enquanto autoridade de supervisão, a competência para a revogação da autorização de exercício da actividade bancária, à semelhança, aliás, do que sucede nos demais países da União Europeia, produzindo a decisão de revogação da autorização os efeitos da declaração de insolvência. A liquidação propriamente dita é cometida ao sistema judicial, opção justificada pela excepcional complexidade e especificidades características do sistema financeiro, bem como pela dimensão dos interesses e valores envolvidos, cabendo ao Banco de Portugal continuar a exercer as suas funções de supervisão, na parte relevante, e, ainda, prestar a necessária colaboração em juízo.”

Em complemento dos nºs 1 e 2, do artº 8º, acima indicados, aduz de imediato o dispositivo legal subsequente ( artº 9º) , no respectivo nº 3, que  “são aplicáveis, com as necessárias adaptações, as demais disposições do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas que se mostrem compatíveis com as especialidades constantes do presente decreto-lei, com excepção dos títulos IX e X.”

Em face da articulação/conjugação do Dec.-Lei n.° 199/2006, com o CIRE, forçoso é assim concluir, desde logo, que subsequente a uma decisão de revogação da autorização pelo Banco de Portugal, determinando a mesma a dissolução e liquidação da instituição de crédito atingida [ cfr, artº  22º,nº5, do DL n.º 298/92, de 31 de Dezembro - REGIME GERAL DAS INSTITUIÇÕES DE CRÉDITO E SOCIEDADES FINANCEIRAS ] e produzindo os efeitos da declaração de insolvência,  importa seguidamente diligenciar pela verificação do passivo da “entidade” dissolvida e pela liquidação do seu património, o que tudo deve processar-se em sede de processo cometido ao sistema judicial.

E, ainda em consequência da necessária articulação/conjugação do Dec.-Lei n.° 199/2006, com o CIRE, ao processo referido que é cometido ao sistema judicial, aplicar-se-ão forçosamente - com as necessárias adaptações - o grosso das normas do CIRE que disciplinam os efeitos da declaração de insolvência [ Título IV ], bem como as que regulam a verificação de créditos [ Título V ] e , também , as que regem a liquidação propriamente dita da Massa insolvente [ Título VI ] , ou seja, as que incidem sobre a tarefa de conversão do património da entidade bancária em quantia pecuniária com vista à respectiva repartição pelos credores [ cobrança de créditos e alienação dos bens e direitos ].

Ora, a ancorar a sentença apelada, encontra-se precisamente uma norma do CIRE, mais exactamente e fundamentalmente a do artº 90º  [ disposição que ,  sob a epígrafe de “ Exercício dos Créditos Sobre a Insolvência“, reza que "Os credores da insolvência apenas poderão exercer os seus direitos em conformidade com os preceitos do presente Código, durante a pendência do processo de insolvência " ] , sendo que, conjugada a referida disposição legal com outras do mesmo diploma legal, maxime com a do artº 128º, nºs 1 e 3 [ rezando v.g. o nº3, que  "A verificação tem por objecto todos os créditos sobre a insolvência, qualquer que seja a sua natureza e fundamento, e mesmo o credor que tenha o seu crédito reconhecido por decisão definitiva não está dispensado de o reclamar no processo de insolvência, se nele quiser obter pagamento " ] , conduziu a uma concreta interpretação que, sufragada por doutrina conceituada e vasta  jurisprudência, é exactamente a que sufraga a Exmª Juiz a quo na fundamentação da sentença apelada.

Ou seja, subscreve a Exmª Juiz a quo, na fundamentação da sentença apelada, o entendimento que v.g. o STJ, em Ac. de 20/9/2011 (9) , veio perfilhar, qual seja, o de que “ transitada em julgado a sentença que declara a insolvência da demandada, a acção que visa o reconhecimento de um direito de crédito sobre a insolvente, deve ser declarada extinta, por inutilidade superveniente da lide, de harmonia com o disposto no art. 287.º, al. e), do CPC “.

É certo que, divergindo de tal entendimento, e outrossim alicerçados em fundamentos e contributos igualmente atendíveis e reputados, muitas outras decisões judiciais - quer da 2ª instância, quer do próprio STJ -  vieram sufragar posições diversas, razão porque, e de alguma forma procurando contribuir para o desiderato a que alude o nº 3, in fine, do artº 8º, do CC, veio o STJ a Uniformizar  Jurisprudência, fixando em Ac. de 8/5/2013 (10) o seguinte entendimento: “ Transitada em julgado a sentença que declara a insolvência, fica impossibilitada de alcançar o seu efeito útil normal a acção declarativa proposta pelo credor contra o devedor, destinada a obter o reconhecimento do crédito peticionado, pelo que cumpre decretar a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do art. 287.º do C.P.C. “.

A sentença apelada, portanto, encontra apoio reforçado no referido  Acórdão Uniformizador de Jurisprudência, quando conclui, como concluiu/decidiu, que no caso sub judice importava declarar a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.

É verdade que, a justificar a não aplicação do referido Ac. Uniformizador aos presentes autos, “alinham” os recorrentes diversos argumentos, maxime o de não ser o mesmo aplicável à presente acção, porque de simples apreciação negativa [ além de o artº 90º, do CIRE, não afectar/abranger também as acções declarativas ] , como o é a presente  ,  e  , ademais, não ter a mesma por objecto a reclamação pelos AA do pagamento de um crédito, antes visam os demandantes exercer tão só o direito de compensação.

Importando , consequentemente,  tecer breves considerações a propósito dos referidos e invocados  “obstáculos“ ,  pertinente é em primeiro lugar aferir da natureza do Ac. do STJ  Uniformizador de  Jurisprudência, maxime se tem ele efeitos vinculativos ou , tão só , uma natureza meramente persuasiva  , de resto com valor diminuto no caso dos autos .

Ora, debruçando-se sobre tal matéria, esclarece Abrantes Geraldes (11) que, por oposição à doutrina emanada dos anteriores Assentos, é inquestionável e pacífico que os AUJ não são vinculativos para quaisquer tribunais , antes exercem uma força persuasiva,  o que tudo decorre , quer da função e objectivos da jurisprudência uniformizada [ o valor da segurança jurídica e a busca de soluções que potenciem o tratamento igualitário ], quer da tendência de estabilização da jurisprudência que pode resultar do julgamento ampliado conseguido através de diversas medidas dispersas pelo CPC [ artºs 629º, nº2,alínea c), 672º,nº1, alínea c), 656º, 679º, e 688º,nº3, todos do actual CPC].

Compreensível é, assim, considera Abrantes Geraldes (12), que a jurisprudência uniformizada - apesar de não vinculativa - deve merecer da parte de todos os juízes uma particular atenção, desde logo em face do respeito que suscita a qualidade e o valor intrínseco da jurisprudência uniformizada do STJ, razão porque apenas razões muito ponderosas e uma fundamentação convincente justificará um desvio de interpretação das normas jurídicas em causa.

Em suma, entende Abrantes Geraldes que, para contrariar a doutrina uniformizada pelo Supremo, devem valer fortes razões ou outras especiais circunstâncias que porventura ainda não tenham sido suficientemente ponderadas, pois que, como é consabido, o artº 629º, nº2, alínea c), do CPC, permite sempre a interposição de recurso [ independentemente do valor da causa e da sucumbência ] de decisões proferidas contra jurisprudência uniformizada do STJ .

O referido entendimento, além de sufragado pelo próprio STJ em diversos Acs. (13), é aquele que nos merece - sem reservas - total anuência, quer por ser o que contribui decisivamente para reduzir as polémicas/divergências jurisprudenciais, quer porque satisfaz o comando do artº 8º, nº3, do CCivil,  potenciando a segurança e a certeza na aplicação do direito, quer , finalmente, porque concorre e confere também para uma maior eficácia e celeridade ao sistema judiciário, garantindo em última instância a resolução dos litígios em prazos razoáveis.

Isto dito, nenhuma censura merece portanto a sentença recorrida ao sufragar o Ac. Uniformizador de  Jurisprudência, de 8/5/2013 , apenas importando aferir , de seguida , se é efectivamente a jurisprudência uniformizada que o mesmo fixa aplicável à hipótese dos autos, maxime por em causa estar a apreciação de questão idêntica.

É que, no tocante à pertinência e consistência dos fundamentos que subjazem à tese que logrou vencimento no Ac. Uniformizador de  Jurisprudência, de 8/5/2013, para o mesmo se remete, sendo que já muito foi escrito - pela doutrina e jurisprudência - sobre a questão, nada se justificando adiantar [  sob pena de replicarmos argumentação há muito pleiteada - ad infinitum - pela jurisprudência e doutrina ] , exercício que em rigor se traduzirá na prática de actividade inútil ( cfr. artºs 130º e 656º, ambos do CPCivil  ), logo, dispensável.

Ademais, e a justificar a conveniência da não aplicação in casu do Ac. Uniformizador de Jurisprudência, de 8/5/2013, não invocam em rigor os apelantes novase fortes razõesque não tenham já sido ad nauseam ponderadas, debatidas e esmiuçadas.

Ora, começando pela invocada não aplicabilidade do artº 90º, do CIRE, às acções declarativas, é o próprio Ac. Uniformizador de Jurisprudência, de 8/5/2013, que assim o considera, sendo de resto o respectivo excerto/comando decisório incisivo ao aludir expressis verbis que transitada em julgado a sentença que declara a insolvência, fica impossibilitada de alcançar o seu efeito útil normal a acção declarativa proposta pelo credor contra o devedor.
Logo, e independentemente da pertinência do entendimento que os apelantes perfilham no sentido de que do CIRE não se retira qualquer apoio de as acções declarativas - ao contrario das executivas - serem afectadas pela declaração de insolvência do devedor, é incontornável que o Ac. Uniformizador de Jurisprudência, de 8/5/2013, visa precisamente/exactamente as acções declarativas propostas contra o devedor que é judicialmente declarado insolvente.

Depois, se atentarmos ao pedido pelos AA deduzido na presente acção, manifesto é que não se integra esta última na previsão do artigo do artº 10º, nº3, alínea a) do CPCivil , não sendo de todo uma acção de simples apreciação , pois que , não tem  por fim “ (…) obter unicamente a declaração da existência ou inexistência de um direito ou de um facto”, maxime com o desiderato de pôr termo a uma incerteza objectiva susceptível de colocar em crise o valor de uma determinada relação jurídica.

É que, ainda que prima facie direccionada tão só para operar a compensação de um crédito dos AA com um outro das RR , é manifesto que a procedência da acção implica e pressupõe forçosamente , senão de uma forma expressa, então pelo menos implicitamente , a condenação das RR -na qualidade de devedoras - no pagamento de uma prestação aos AA, pois que, de outra forma, não há lugar a qualquer compensação, enquanto instituto de extinção de obrigações além do cumprimento ( artº 847º,do CC).

Dito de uma outra forma, a procedência da acção pelos AA proposta, implicando inevitavelmente o reconhecimento da sua qualidade de credores perante as RR, envolve e pressipôe sempre uma implícita condenaçãodos RR enquanto devedoresem relação aos AA,  ou , como bem chamam à atenção as apeladas ,“a extinção de um crédito por compensação com outro pressupõe, lógica e necessariamente, prévio reconhecimento judicial da existência, validade e eficácia do crédito invocado”.

Não é, assim, razoável e minimamente defensável sustentar-se, como o fazem os AA, que na presente acção não têm ambos por desiderato reclamar o pagamento de um crédito, antes visam tão só exercer o direito de compensação, pois que, não se alcança como  possível - em termos jurídicos - poder alguém livrar-se de uma obrigação por meio de compensação sem que, concomitantemente, se arrogue /reclame a qualidade de credor.
Aqui chegados, e sem necessidade de mais considerações, temos para nós que, em rigor, não reúne a presente acção qualquer especificidade/peculiaridade que justifique dever permanecer à margem do campo de aplicação do Ac. Uniformizador de  Jurisprudência, de 8/5/2013.

Destarte, porque como vimos já,  a decisão de revogação da autorização de instituição de crédito produz os efeitos da declaração de insolvência ( cfr. art.º 8.º , n.º 2 , do Dec.-Lei n.º 199/2006, de 25.10 ) , obrigando tal decisão a um subsequente processo de liquidação judicial da instituição de crédito visada [   daí que, tal como ocorre com o processo de insolvência , é no referido processo que se executa a  liquidação do património da instituição de crédito e a repartição do produto obtido pelos credores - cfr art.º 1º do CIRE ] , e , devendo o referido processo de liquidação processar-se nos termos do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas ( CIRE), não se descortina existir fundamento pertinente que obrigue à revogação da sentença apelada.

4.2-Se a interpretação do tribunal a quo - segundo a qual os credores apenas poderão exercer os seus direitos no âmbito daquele processo de execução universal e segundo os meios processuais previstos no CIRE - é inconstitucional, por violação do direito de acesso ao Direito e à tutela jurisdicional efectiva, consagrado no artigo 20.º da CRP.

Por fim, adiantam também os apelantes que , ainda que justificassem [ o que não é o caso, no entender dos recorrentes ] as normas dos artigos 88.º, n.º 1, a contrario, 90.º, 91.º/1 e 128.º, nºs 1 e 3, todos do CIRE, a interpretação sufragada pelo tribunal a quona sentença apelada,certo é que,“obrigado”não estava o tribunal a quo a segui-la, antes era-lhe exigido que da mesma divergisse.

É que, em rigor, incorre uma tal interpretação em manifesta violação do direito de acesso ao Direito e à tutela jurisdicional efectiva, consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.

Ora, tal não é , porém, o nosso entendimento, pois que, para nós, a referida interpretação não retira ou restringe direitos aos apelantes, antes clarifica e identifica quais os procedimentos legais a adoptar pelos recorrentes em sede de  tutela efectiva e em tempo útil dos seus direitos, nos termos do art. 20.º da CRP, ou , como salientam Luís Carvalho Fernandes e João Labareda (14) , limita-se designadamente o art. 90.º “ a determinar que, durante a pendência do processo de insolvência, os credores só podem exercer os seus direitos “em conformidade com os preceitos deste Código” ,  qual “ verdadeiro ónus posto a cargo dos credores”.

A referida solução, acrescentam Luís Carvalho Fernandes e João Labareda, é aquela “ que se harmoniza com a natureza e a função do processo de insolvência, como execução universal, tal como a caracteriza o art. 1.º do CIRE”,  sendo um  corolário fundamental do que fica determinado “ o de que”  para poderem beneficiar do processo de insolvência e aí obterem, na medida do possível, a satisfação dos seus interesses, têm de neles exercer os direitos que lhe assistem, procedendo, nomeadamente, à reclamação dos créditos de que sejam titulares, ainda que eles se encontrem já reconhecidos em outro processo ( cfr. artº 98º,nº3, vd., também , o nº2 do artº 87º)”

Em todo o caso, se dúvidas existissem a propósito da conformidade da referida interpretação com a CRP, a verdade é que o próprio Tribunal Constitucional teve já o ensejo de as remover, ao decidir [ precisamente a propósito do Ac. do STJ Uniformizador de  Jurisprudência,  de 8/5/2013 ] em Ac. de 9/1/2014 (15)  “ Não julgar inconstitucional a interpretação normativa de acordo com a qual, transitada em julgado a sentença que declara a insolvência, fica impossibilitada de alcançar o seu efeito útil normal a acção declarativa proposta pelo credor contra o devedor, destinada a obter o reconhecimento do crédito peticionado, pelo que cumpre decretar a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do art. 287.º do CPC “.

E, precisamente em relação à invocada ( pelos ora apelantes  ) violação do princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, partindo do pressuposto de que postulam ambos a garantia de uma protecção jurisdicional eficaz ou de uma tutela judicial efectiva [cujo âmbito normativo abrange nomeadamente: (a) o direito de acção, no sentido do direito subjectivo de levar determinada pretensão ao conhecimento de um órgão jurisdicional; (b) o direito ao processo, traduzido na abertura de um processo após a apresentação daquela pretensão, com o consequente dever de o órgão jurisdicional sobre ela se pronunciar mediante decisão fundamentada; (c) o direito a uma decisão judicial sem dilações indevidas, no sentido de a decisão haver de ser proferida dentro dos prazos preestabelecidos, ou, no caso de estes não estarem fixados na lei, dentro de um lapso temporal proporcional e adequado à complexidade da causa; (d) o direito a um processo justo baseado nos princípios da prioridade e da sumariedade, no caso daqueles direitos cujo exercício pode ser aniquilado pela falta de medidas de defesa expeditas ] , é o mesmo Tribunal assertivo em considerar que “ não se vê que a interpretação normativa questionada o tenha posto em causa e que a recorrente tenha sofrido limitação ou restrição intolerável no seu direito a uma solução jurisdicional do conflito, em prazo razoável”.

Sem necessidade de mais considerações, falecem também as conclusões recursórias direccionadas para a violação da CONSTITUIÇÃO.

Em conclusão,
tudo visto e sopesado, tudo aponta pois para que a sentença recorrida tenha decidido com total acerto, não sendo merecedora de qualquer censura - antes soçobram todas as razões que enformam as asserções conclusivas dos apelantes - e , consequentemente , merecendo ser confirmada, deve a apelação improceder.
                                                          
5.-Sumariando ( cfr. artº 663º, nº7,  do CPC):
5.1.-A decisão de revogação da autorização de instituição de crédito produz os efeitos da declaração de insolvência ( cfr. art.º 8.º , n.º 2 , do Dec.-Lei n.º 199/2006, de 25.10 ) , obrigando tal decisão a um subsequente processo de liquidação judicial da instituição de crédito visada [   daí que, tal como ocorre com o processo de insolvência, é no referido processo que se executa a  liquidação do património da instituição de crédito e a repartição do produto obtido pelos credores - cfr art.º 1º do CIRE ];
5.2.-Em face do referido em 5.1., a decisão de revogação da autorização de instituição de crédito justifica outrossim a aplicação - às acções declarativas pendentes contra a instituição de crédito objecto de decisão de revogação -  do Ac. Uniformizador de  Jurisprudência, de 8/5/2013 , nos termos do qual “ Transitada em julgado a sentença que declara a insolvência, fica impossibilitada de alcançar o seu efeito útil normal a acção declarativa proposta pelo credor contra o devedor, destinada a obter o reconhecimento do crédito peticionado, pelo que cumpre decretar a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do art. 287.º do C.P.C.
5.3.-A doutrina uniformizada pelo Supremo, ainda que não vinculativa para quaisquer tribunais, apenas se justifica não ser seguida quando na presença de fortes razões ou outras especiais circunstâncias que porventura ainda não tenham sido suficientemente ponderadas.
                                                          
6.-Decisão:

Em face de todo o supra exposto, acordam os Juízes na ...ª Secção Cível do Tribunal da Relação de LISBOA , em , não concedendo provimento à apelação interposta por AB;
6.1.-Confirmar a sentença apelada .
Custas pelos apelantes.


LISBOA , 9 /3/2017



António Manuel Fernandes dos Santos(O Relator)
Francisca da Mata Mendes (1ª Adjunta)                                        Eduardo Petersen Silva (2º Adjunto)    


                                                        
(1)Cfr. José Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil, anotado, 5ª , pág. 141.
(2)In Manual de Processo Civil, 1984, Coimbra editora, pág. 671.
(3)In ob. citada, pág. 671.
(4)In Código de Processo Civil, Anotado, Coimbra Editora, vol. II, pág. 670,
(5)Cfr. J.O. Cardona Ferreira, in Guia de Recursos em Processo Civil, 5ª Edição, pág. 71.
(6)Cfr. v.g. o rudimentar/escolar da Porto Editora, 6 ª Edição.
(7)Cfr. Ac. do STJ de 11/4/2002, Proc. nº 01P3821 , in www.dgsi.pt
(8)In CPC anotado, V  Volume, Coimbra 1984, pág. 151.
(9)In proc. nº 2435/09TBMTS.P1.S1, sendo Relator GARCIA CALEJO, e in www.dgsi.pt.
(10)Publicado no Diário da República, 1.ª série - N.º 39 , de  25 de Fevereiro de 2014, págs. 1642/1650.
(11)In Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2010, 3ª Edição, pág. 495.
(12)ibidem, pág. 498.
(13)Vg. no Ac. de 14/05/2009, proferido no processo nº 218/09.OYFLSB , sendo  Relator o Exmº Juiz Conselheiro SEBASTIÃO PÓVOAS, e de 11-09-2014, Proc. nº 3871/12.4 TBVFR-A.P1.S1 , sendo  Relator o Exmº Juiz Conselheiro BETTENCOURT DE FARIA, e in www.dgsi.pt.
(14)In Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, 3ª Edição, anotado, QUID JURIS, 2015, pág. 437.
(15)Acórdão proferido no Processo número 564/13, da
2.ª Secção, do Tribunal Constitucional, tendo sido seu Relator o Exmº Juiz Conselheiro Fernando Ventura, e
in www.dgsi.pt.

                                                                    
Decisão Texto Integral: