Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
12361/15.2T8ALM.L1-2
Relator: ANTÓNIO MOREIRA
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANO BIOLÓGICO
PERDA DA CAPACIDADE DE GANHO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/01/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTES AMBOS OS RECURSOS
Sumário: 1.– Os subsídios de patrulha e de turno que o A. (agente da PSP) auferia até ao acidente dependem de uma efectiva prestação de serviço, que está para lá do que seriam as exigências do normal desempenho da sua actividade profissional, pelo que não se pode afirmar a previsibilidade do seu recebimento até à reforma, para efeitos de preenchimento da previsão do nº 2 do art.º 564º do Código Civil.

2.– Tendo a sentença recorrida contemplado o ressarcimento de todas as vertentes do dano biológico do A., arbitrando um montante indemnizatório quanto à vertente patrimonial do mesmo e um outro montante indemnizatório quanto à vertente não patrimonial do mesmo, não há lugar a considerar outro montante indemnizatório autónomo para o mesmo dano biológico, sob pena de duplicação de indemnizações pelo mesmo dano.

3.– Mostra-se equilibrada e respeitadora da justiça relativa das decisões a fixação de uma indemnização de € 190.000,00, devida pela perda da capacidade de ganho do lesado que, sendo agente da PSP com 52 anos de idade e auferindo uma retribuição líquida anual de € 20.774,99, foi vítima de acidente de viação, daí resultando sequelas determinantes de défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 32,90 pontos (em 100) e incompatível com a actividade profissional habitual específica do mesmo (motorista).

(Sumário elaborado pelo relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados:


Valdemar S. intentou a presente acção declarativa de condenação, sob forma de processo comum, contra N Seguros, S.A., pedindo a condenação da R. no pagamento de indemnização no valor global de € 293.317,90, acrescida de juros a contar desde a data da citação até integral pagamento, sendo aquela indemnização composta pelos seguintes valores parcelares:
a)- € 4.470,95 + € 1.250,00 – cirurgia a realizar e respectivo pós-operatório;
b)- € 3.782,81 – perdas salariais;
c)- € 190.000,00 – danos patrimoniais futuros;
d)- € 50.000,00 – dano biológico;
e)- € 40.000,00 – danos não patrimoniais;
f)- € 1.114,14 – despesas médicas e medicamentosas.

Alega o A. que ocorreu um embate entre um veículo ligeiro de mercadorias e o motociclo por si conduzido, cujo responsável foi o segurado da R., porquanto invadiu a faixa de rodagem do A., cortando-lhe a sua linha de marcha. Deste acidente resultaram danos patrimoniais e não patrimoniais, designadamente incapacidade permanente geral de 32,90 pontos, com incapacidade total absoluta para a profissão habitual, prejuízo de afirmação pessoal de grau 1/5, quantum doloris de grau 5/7, dano estético de grau 2/7 e prejuízo sexual de grau 1/5.

Regularmente citada, a R. contestou, assumindo a responsabilidade pelo sinistro, mas divergindo da avaliação do dano efectuada pelo A., com fundamento, designadamente, em que o ligeiro défice funcional permanente do A. não implica qualquer limitação de natureza profissional.

Com dispensa de audiência prévia procedeu-se ao saneamento da causa, bem como à fixação do objecto do litígio e dos temas da prova, sem reclamações.

Realizou-se a audiência final, com observância das legais formalidades, no decurso da qual foi apresentado articulado superveniente pelo A., o qual foi admitido.

No articulado superveniente o A. requer a ampliação do pedido, no sentido da condenação da R. no pagamento dos suplementos de turno e patrulha até à idade normal da reforma, que neste momento na PSP se situa nos 60 anos, o que se traduz num total de € 33.551,88.

A R. respondeu, sustentando que o A. não ficou com qualquer rebate profissional em virtude do acidente e que desconhece se os suplementos se manteriam até à idade da reforma.

Mais solicitou o A. a condenação da R. por litigância de má-fé, tendo esta pugnado pela improcedência do pedido.

Após a conclusão da audiência final foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
Em face do exposto e tudo ponderado, o Tribunal decide julgar a presente ação parcialmente procedente, e em conformidade:
1. Condena a R. N Seguros, S.A., a pagar ao A. Valdemar [S.]:
i) indemnização:
a)- pelos custos associados à cirurgia ao joelho e respetivo pós-operatório, € 5.720,95;
b)- por perdas salariais, no valor de € 3.782,81;
c)- por dano patrimonial futuro, no valor de € 190.000,00;
d)- por danos não patrimoniais, no valor de € 40.000,00;
e)-por despesas médicas e medicamentosas, no valor de € 1.114,14;
ii)- juros de mora:
a)- sobre as indemnizações aludidas em a), b) e e), desde a data da citação até à presente data, à taxa de 4%, e desde a presente data até efetivo e integral pagamento, à taxa legal;
b)- juros de mora sobre as indemnizações aludidas em c) e d), desde a data da presente decisão até efetivo e integral pagamento, à taxa legal;
2.- Absolve, no mais, a R. do pedido, assim como absolve a R. do pedido de condenação como litigante de má fé”.

Quer o A., quer a R., recorrem desta decisão final.

Quanto ao A., termina a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem:
A)– Apesar de a Mm.ª Juíza “ad quo” ter entendido que o facto de o Autor não estar em condições de receber tais subsídios não lhe é imputável, por ser consequência de um acidente pelo qual é responsável um terceiro, veio a determinar que não há razões para considerar previsível o recebimento desses suplementos até à idade da reforma. Pois, o Autor enquanto agente da PSP poderia requerer a mudança de serviço ou ser proferida decisão oficiosa nesse sentido, para serviço que não fosse compatível com o recebimento de tais subsídios.
B)– Acontece que, não resultou demonstrado que o Autor tivesse requerido a mudança de serviço nem tenha sido proferida decisão oficiosa nesse sentido, ou seja, o Autor mantinha e manteve sempre interesse em estar a exercer as funções que exercia e que pelas quais lhe eram devidos tais subsídios de turno e de patrulha.
C)– Pelo que, também não estará correto afirmar que não há razões para considerar previsível o não recebimento desses suplementos até à idade da reforma, sendo certo que era essa a intenção do Autor e cuja continuidade lhe foi completamente vedada pelas lesões sofridas em consequência do acidente em causa. Tanto mais que nem se poderá afirmar que é impossível a realização de tais serviços até à idade da reforma, pois tal acontece com cerca de 90% dos seus colegas de trabalho.
D)– E o Autor viu essa possibilidade vedada aos 40 anos de idade.
E)– Que, tendo em conta o explanado no Art.º 562º do C.C., «quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação», acrescentando o art.º 563º do C.C. que «a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria se não fosse a lesão».
F)– Logo, a impossibilidade de o Autor poder vir a realizar o seu trabalho habitual, do qual resultava o recebimento dos subsídios de turno e de patrulha, merece tutela jurídica e deve o mesmo ser compensado por tais subsídios até à idade da reforma, tendo em conta que é mais certo que o Autor pudesse realizar o mesmo serviço até à idade da reforma do que o seu contrário.
G)– Assim, o valor peticionado a título de dano emergente por perdas salariais até à idade da reforma, ou seja, por mais 17 anos, deverá ser atendido, condenando-se a Ré a pagar ao Autor o valor de € 33.551,88 (€ 164,47 x 204 meses).
H)– Por outro lado, decidiu a Mm.ª Juíza “ad quo” nada fixar a título de Dano Biológico, porquanto poderia estar a incorrer numa duplicação de indemnizações, uma vez que já havia fixado o dano patrimonial futuro e o dano não patrimonial.
I)– A Jurisprudência mais recente do STJ tem entendido que o Dano Biológico visa a compensação ao lesado pela incapacidade permanente geral, correspondente à afetação definitiva da capacidade física e/ou psíquica, com repercussão nas actividades da vida diária, incluindo familiares, sociais, de lazer e desportivas, a qual até pode não ter sequer expressão em termos de incapacidade para o trabalho.
J)– Que, por força do comummente decidido por vários Acórdãos do STJ, em que se destaca o Acórdão do STJ datado de 11-12-2012, o dano biológico decorrente das sequelas das lesões sofridas, perspetivado não como fonte de uma perda de rendimentos laborais, mas antes como diminuição global das capacidades gerais do Autor, envolvendo uma verdadeira capitis deminutio para a realização de quaisquer tarefas, que passam a exigir-lhe um esforço acrescido compensado, precisamente, com o arbitramento desta indemnização.
K)– Assim como, o Dano Biológico, também não poderá ser confundido nem reduzido a danos morais, pois o dano biológico visa também compensar prejuízos de natureza patrimonial provenientes das consequências negativas ao nível da atividade geral do lesado.
L)– E, dúvidas não restam de que o Autor terá que ser vigiado medicamente e efectuar terapêutica medicamentosa, bem como tratamentos de Medicina Física e de Reabilitação, na tentativa de minimizar as queixas álgicas, que terão períodos de exacerbação, para além da vigilância em ORL, reabilitação vestibular, e eventual acompanhamento/reabilitação psicológica, Cfr quesito 14 dos factos provados.
M)– Pelo que, o Douto Tribunal “ad quo” deveria ter dado provimento ao valor peticionado pelo Autor a título de dano biológico, de € 50.000,00, o qual refira-se, peca por defeito e não por excesso, tendo em conta a realidade do Autor que ficou com a sua vida quer laboral quer pessoal completamente desfeita em consequência do acidente em causa.
N)– A douta Sentença recorrida violou, assim o disposto nos artºs 495º, 562º e 566º todos do Código Civil e alínea b) do n.º 1 do art.º 615º do C.P.C.

Quanto à R., termina a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem:
1)– A Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal “a quo”, porquanto na mesma não houve uma apreciação correcta dos pressupostos de direito e de facto constantes dos presentes autos.
2)– Considerou o tribunal a quo como provados os factos nºs 11º, 12º, 13º, 14º, 15º, 18º, 19º, 23º, 28º, 31º, 33º, 34º, indicados na sentença.
3)– Não pode a Recorrente concordar com tal entendimento já que o que consta naqueles artigos são meras transcrições do Parecer Médico-legal junto pelo Recorrido na Petição Inicial, cujas conclusões não correspondem à verdade factual, estando as mesmas manifestamente extrapoladas.
4)– Entendeu o tribunal a quo dar credibilidade ao Parecer Médico-Legal da Dra. R...M..., em vez de valorizar o Relatório final de Avaliação do Dano em Direito Civil, elaborado pelos serviços clínicos da Recorrente, o que não se compreende.
5)– Atendeu o tribunal a quo ao Parecer Médico-Legal da Dra. R...M... pelo facto de esta ser médica especialista em medicina legal, na componente de avaliação de dano em direito civil, porque o mesmo contem uma descrição pormenorizada acerca do conteúdo da percentagem de incapacidade e por incluir uma indicação exaustiva dos elementos clínicos do Recorrido e por ser auxiliado por outros dois relatórios médicos do Dr. P...C... e do Dr. P...M... e pela Avaliação Psicológica da Dra. M...M... e C...M..., facto que, para o tribunal a quo, foi achado como relevante.
6)– O Médico da Recorrente ouvido em audiência de julgamento, Dr. J...L... tem vasta experiência como médico especialista em ortopedia ao contrário da Dra. R...M... que não tem essa especialidade.
7)– O tribunal a quo na sentença, ignorou as observações clinicas juntas como doc nº 3 com a Contestação, onde se explica todo o trajeto clinico do Recorrido aquando da assistência pelos clínicos da Recorrente, contendo todos os exames realizados, TAC´s, Rx, e as várias consultas, com médicos diferente, a que este se submeteu.
8)– O tribunal a quo baseou a Sentença, em meras fotocópias dos relatórios dos Drs. P...C..., P...M... e C...M..., não os conhecendo integralmente.
9)– Só constam dos autos meros excertos transcritos à revelia da Dra. R...M... dos relatórios dos Drs. P...C..., P...M... e C...M..., sem conter, sequer, as conclusões.
10)– Não conhece a Recorrente os relatórios completos transcritos em excertos no Parecer Médico-Legal da Dra. R... M....
11)– Quanto ao relatório da Dra. M...J...M... este tão pouco serviu para estabelecer o nexo causal entre as sequelas e o evento, já que nunca a referida testemunha, em audiência, apontou para tal nexo (Declarações da Testemunha M...J...M... minutos 1:23:50 a 1:24:26).
12)– A Dra. L...A...C... baseou-se, unicamente, nas conclusões do relatório da Dra. M...J...M..., que nunca estabeleceu o nexo causal entre as evento e as lesões (Declarações da Testemunha L...A... C... minutos 00:55:26 a 00:56:15).
13)– O relatório da Dra. M...J...M..., nem o treino encetado pela Dra. L...A...C... deveriam ter merecido acolhimento pelo tribunal a quo, pois não estabeleceram qualquer nexo causal entre o evento e as lesões.
14)– O Parecer Médico-legal apresentado pelo Recorrido recorre quase exclusivamente a documentos clínicos que constam do capítulo de dados complementares, tal como referiu a Dra. R... M... (Declarações da testemunha R...M... minuto 00:03:59).
15) Pelo contrário, o relatório médico de avaliação em direito civil apresentado pela Recorrente da Autoria do Dr. J...L..., teve como base a observação ao longo de mais de um ano (declarações da testemunha J...L... minuto 00:02:05 a 00:02:46, 00:03:27 a 00:04:57, 00:05:26 a 00:08:55).
16)– Pelas palavras do Dr. J...L..., os serviços clínicos da Recorrente, nunca detetaram qualquer sequela ao nível do joelho direito.
17)– Consta do relatório do Hospital Garcia da Orta que o joelho não tinha qualquer fractura nos membros, com mobilidade mantida.
18)– De acordo com o Médico da Recorrente também não existiu qualquer lesão ao nível do ombro direito (Declarações da testemunha J...L..., minuto, 00:14:33 a 00:14:56).
19)– Tendo em conta o parecer do Médico da Recorrente, não existiu qualquer sequela ao nível das costelas Declarações da testemunha J...L..., minuto 00:14:59 a 00:15:03.
20)– Ao contrário do referido no Parecer da Dra. R...M..., não existiu qualquer sequela ao nível do punho esquerdo (Declarações da testemunha J...L..., minuto 00:15:13 a 00:15:26).
21)– O Recorrido não ficou a padecer de alterações de equilíbrio tendo em conta o Médico da Recorrente (Declarações da testemunha J...L..., minuto, 00:15:34 a 00:15:51).
22)– No âmbito psicológico, foi detectado por parte do parecer médico oferecido pelo Recorrido, sequela ao nível da perturbação persistente de humor, sendo que o mesmo foi desvalorizado em 10 pontos.
23)– No âmbito da sequela psicológica, desde já se refere que nem a Dra. R...M... é especialista em psiquiatria, nem tão pouco as Dras. M...J...M... e L...A..., conseguiram estabelecer o nexo causal entre o evento e as sequelas.
24)– Durante o tempo em que o Recorrido foi seguido pelos serviços clínicos da Recorrente, o mesmo nunca apresentou ou deixou antever qualquer sequela ao nível psicológico (Declarações da testemunha J...L... minuto 00:16:51 a 00:17:16).
25)– Discorda ainda a Recorrente da data de consolidação indicada no relatório da Dra. R...M..., pois de acordo com os serviços médicos da Recorrente a data de consolidação seria sempre 12.12.2013 (Declarações da testemunha J...L..., minuto 00:18:30 a 00:19:38).
26)– Ao contrário do defendido pelo tribunal a quo, entende a Recorrente que não ficou provado que o Recorrido, devido ao acidente dos autos, tenha sequelas ao nível sexual, de afirmação pessoal e que não pode continuar a exercer a sua profissão na PSP (Declarações da testemunha J...L..., minuto, 00:21:11 a 00:22:25, 00:23:49 a 00:24:09, 00:22:41 a 00:23:16 e 00:25:14 a 00:25:18).
27)– Consta do relatório da Dra. M...J...M..., que o Recorrido pode continuar a integrar as funções já por si exercidas.
28)– Foi referido em audiência pela Dra. R...M... que o Recorrido sofre de alterações de equilíbrio e perturbação de memória e que não consegue estar sentado durante muito tempo (Declarações da testemunha R...M... 00:13:49 a 00:14:20 e 00:25:21 a 00:26:26).
29)– Contudo, sobre o indicado em no ponto nº 28, também testemunhou o Médico da Recorrente que com uma opinião diversa da apontada pela Dra. R...M..., referiu que o Recorrido não sofre de qualquer síndrome vertiginoso e muito menos que não consegue ficar sentado durante muito tempo (Declarações da testemunha J...L..., minuto, 00:25:24 a 00:25:54 e 00:26:49 a 00:27:10).
30)– Tal parâmetro de dano relativo ao dano futuro só pode ser atribuído quando haja com elevada probabilidade um agravamento das sequelas.
31)– No caso concreto, no relatório da Dra. R...M..., acresceu-se mais 3 pontos ao nível do Dano Futuro, contudo, segundo as regras de avaliação deste dano não se poderia atribuir aquela pontuação, pois não ficou determinado no relatório qual o dano futuro parcialmente avaliável já que não existe menção no relatório qual a perspetiva quanto à dimensão que o dano venha a adquirir.
32)– Para além disso o Médico da Recorrente entende que no caso concreto não existe qualquer dano futuro (Declarações da testemunha J...L..., minuto 00:26:25 a 00:26:47).
33)– Durante mais de um ano o Recorrido andou a ser seguido pelos serviços médicos da Recorrente.
34)– Durante mais de um ano o Recorrido nos serviços médicos da Recorrente realizou vários exames e foi seguido por outros médicos nas especialidades de neurocirurgia e ortopedia, o que só por si permite dar credibilidade ao relatório médico de avaliação civil do dano corporal da Recorrente, em prejuízo de um Parecer médico tendo por base excertos de outros relatórios, inclusive relatórios da Direcção Nacional da PSP-Divisão de Psicologia, com obvio favorecimento das pretensões do Recorrente, sendo este à altura do acidente agente da PSP (Vejamos as declarações da testemunha José Laranjeira, minuto, 00:32:16 a 00:33:04.
35)– Na sentença é ainda feita referência ao relatório do Hospital Garcia da Orta e ao facto do relatório do Dr. P...C... fazer alusão ao joelho direito, sendo que, sobre este aspecto testemunhou o Médico da Recorrente indicando que não existe qualquer referência a um traumatismo no joelho direito (Declarações da testemunha J...L..., minuto 00:41:43 a 00:44:05).
36)– Do acidente dos autos resultaram sequelas de menor gravidade, sendo que as lesões foram consolidadas, sendo que muitas outras apontadas têm natureza degenerativa (Declarações da Testemunha J...L... minuto 00:12:02 a 00:12:21).
37)– Na sequência das lesões o sinistrado permaneceu internado somente dois dias no Garcia da Orta para vigilância e controlo por exames de imagem, tendo recebido alta para o domicílio medicado, por o seu estado geral não inspirar cuidados de especialidade.
38)– Durante o internamento não foram detectadas lesões com gravidade tendo recebido alta dois dias depois.
39)– Durante cerca de um ano de assistência por Clínicos conceituados, o Recorrido nunca apresentou queixas ou manifestou desconforto em outras regiões anatómicas sem ser aquelas indicadas no Relatório de Avaliação do Dano em direito civil junto pela Recorrente.
40)– A patologia do joelho direito, que não foi evidenciada na urgência do Garcia da Orta, nem nas observações subsequentes pelos médicos da Recorrente.
41)– A patologia no joelho direito, se fosse aguda, teria tido repercussões imediatas e manifestações subsequentes durante a assistência o que nunca se verificou.
42)– A patologia do joelho direito é prévia ao acidente e por isso desvalorizada pelos médicos da Recorrente, só realçada após a alta da Recorrente e por ortopedista particular.
43)– Mais se diz que o Parecer da Dra. R...M..., foi feito sem observação do recorrido na fase aguda das lesões, ao contrário da observação realizada pelos serviços médicos da Recorrente.
44)– Os exames de psicologia e neurocirurgia apresentados pelo Recorrido e resumidos no Parecer Médico da Dra. R...M..., não permitem esclarecer o perfil psico-intelectual prévio às lesões do Recorrido, tratando-se de uma mero registo de queixas subjectivas nunca confirmadas por exames.
45)– O Parecer Médico-legal da Dra. R...M... resume-se a uma junção de vários relatórios médicos, sem qualquer consistência clinica, sem observação do sinistrado na sua fase aguda, o que é na sentença injustificadamente atendido.
46)– Na análise saquelar, a Dra. R...M... baseia-se na subjectividade dolorosa descrita pelo sinistrado sem que isso tenha uma correspondência objectiva com aquilo que se prevê pela experiência médica em casos semelhantes.
47)– A Dra. R...M... analisou ponto doloroso a ponto doloroso, sem que haja qualquer observação de uma real lesão que se entenda como admissível de ser valorizada, doutro modo, encontra-se sempre pontuações finais, que embora possam agradar muito aos sinistrados, não correspondem às reais incapacidades dos mesmos.
48)– Nos termos do artº 651 nº1 do C.P.C, tendo em conta o julgamento da matéria de facto proferido pelo tribunal a quo, a Recorrente junta aos autos Relatório Médico que reforça o relatório apresentado pela Recorrente na Contestação e elaborado pelo Dr. J...L...B....
49)– Face ao exposto, tendo em conta a prova produzida pela Recorrente em julgamento, a mesma entende que os teores dos factos nºs 11º, 12º, 13º, 14º, 15º, 18º, 19º, 23º, 28º, 31º, 33º, 34º da matéria de facto dada como provada, escudados no parecer médico apresentado pelo Recorrido, devem ser substituídos pelo teor do Relatório Médico da Avaliação do Dano em Direito Civil da autoria do Dr. J...L...B..., assim passando a constar:
50)– Ponto nº 11- Em sequência directa do embate descrito, o Autor sofreu as seguintes lesões: 1- TCE e cervical com perda de conhecimento e fractura do côndilo ocipital esquerdo; 2- Traumatismo Toracico com fractura dos 7º e 8º arcos costais direito com contusão pulmonar e hemotórax; 3- Traumatismo da Coluna Dorsal com fractura da apófise transversa D1 à Direita; 4- Traumatismo Acrómio-clavicular direito com distensão articular sem luxação. Assistido no hospital Garcia da Orta foi observado e permaneceu internado 2 dias, tendo recebido alta para o domicílio.
51)– Ponto nº 12- Em sequência das lesões o Autor ficou com a seguinte sequela: a) Coluna Cervical, sem lesão óssea os disco-ligamentar documentada (dores intermitentes implicando medicação analgésica ou anti-inflamatória, com reduzido compromisso de mobilidade) (MD801-2 pontos).
52)– Ponto nº 13- Tal sequela determina para o Autor: Quantum doloris durante o período de Incapacidade Temporária de Grau 5/7; Défice Funcional Permanente da Integridade Fisico-Psiquica de 2 pontos; Dano Estético 1/7.
53)– Pontos 14º, 15º, 18º- Prejudicados uma vez que no relatório médico do Dr. J...L...B... não foi contemplada qualquer lesão no joelho direito e dependências permanentes medicamentosas ou de tratamentos médicos, para além daquelas relativas à sequela MD801( analgésicos e anti-inflamatórios).
54)– Ponto 19º- As lesões determinaram para o Autor: Um período de défice funcional temporário total de 16.10.2012 a 18.10.2012; Um período de défice funcional temporário parcial de 19.10.2012 a 12.12.2013; Um período de incapacidade temporária profissional de 16.10.2012 a 12.12.2013.
55)– Ponto 23- Prejudicado, uma vez que o Autor não ficou com qualquer rebate profissional.
56)– Pontos 28º, 29º, 31º, 33º e 34º- Prejudicados, uma vez que o Autor, de acordo com o relatório médico do Dr. J...L...B..., o Autor não ficou a padecer de qualquer prejuízo de afirmação pessoal, não necessita no futuro de qualquer dependência médica, não tem problemas de equilíbrio, não teve qualquer prejuízo sexual.
57)– Considera ainda a Recorrente que as declarações do Médico da Recorrente, colocaram em dúvida o relatório indicado na sentença em que o tribunal a quo se baseou, pelo que, nos termos do artº 414 do C.P.C, a dúvida sobre a realidade de um facto resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita.
58)– Mesmo tendo em conta o Parecer Médico justificativo da sentença os valores atribuído a título Danos não Patrimoniais são exagerados.
59)– Repara-se que o Recorrido não foi sujeito a qualquer intervenção cirúrgica e o tempo de défice temporário total foi só de 2 dias, pelo que, de acordo com a jurisprudência recente para casos semelhantes, o valor a atribuir deveria situar-se, sempre, entre os € 15.000,00 e os € 20.000,00.
60)– O valor de € 190.000,00 atribuído a título de danos patrimoniais futuros é igualmente desproporcionado tendo em conta o rendimento anual do Recorrido e acórdãos semelhantes (Acórdão do STJ de 24.04.2012 relativo ao processo 1496/04.7TBMAI.P1.S1-1ª Secção; Acórdão do STJ de 25-09-2012 relativo ao processo 232/04.2TBAVV.G1.S1-1ª Secção).
61)– O tribunal a quo nos cálculos que faz para chegar ao valor do dano patrimonial futuro múltipla pelos 32,9 pontos, quando devia somente considerar o valor de 29 pontos, já que os outros serão relativos a um dano futuro que pode ser incerto.
62)– Perante todo o supra exposto, pugna a ora Recorrente pela revogação da Sentença proferida pelo douto tribunal “a quo”.
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A R. apresentou ainda alegação de resposta à alegação do A., sustentando a manutenção da decisão recorrida, quanto aos pontos indicados pelo A., relativamente à sua absolvição do pagamento dos montantes relativos a dano biológico e suplementos salariais perdidos até à idade da reforma.
Já o A. não apresentou alegação de resposta à alegação de recurso da R.
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Sendo o objecto dos recursos balizado pelas conclusões dos apelantes, nos termos preceituados pelos art.º 635º, nº 4, e 639º, nº 1, ambos do Novo Código de Processo Civil, as questões submetidas a recurso, delimitadas pelas aludidas conclusões, prendem-se:
a)- Com a alteração da matéria de facto;
b)- Com a determinação dos danos a indemnizar pela R.
***

Previamente, porém, há que decidir da admissibilidade da junção do documento apresentado pela R. com a sua alegação e classificado pela mesma como “Relatório Médico que reforça o relatório apresentado pela Recorrente na Contestação”.
Com efeito, e como decorre do art.º 651º, nº 1, do Novo Código de Processo Civil, com as alegações as partes apenas podem juntar documentos nas situações excepcionais a que se refere o art.º 425º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na primeira instância.
Quanto ao art.º 425º do Novo Código de Processo Civil, dispõe que depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.
Por outro lado, e como decorre do art.º 443º do Novo Código de Processo Civil, não são admitidos documentos impertinentes ou desnecessários. Sendo que um documento só é necessário como meio probatório quando respeita a factualidade controvertida e carecida de prova.
Relativamente ao documento em questão, está o mesmo assinado e datado de 14/6/2017, corresponde a um “relatório médico” relativo ao A., com respeito ao acidente de viação ocorrido em 16/10/2012, e as suas conclusões prendem-se com a afirmação da “sólida reputação e competência” dos médicos envolvidos na assistência ao A., bem como pela disponibilidade dos mesmos para “contrapor com firmeza e convicção os pareceres dos médicos particulares que, sem assistirem o Sinistrado redigiram relatórios de sequelas que se tornam agora injustificadamente predominantes”.

Ou seja, tendo presente que a sentença recorrida foi notificada às partes por transmissão electrónica de dados de 3/5/2017, logo se alcança que a produção desse “relatório médico” só teve por objecto sustentar a alegação da R., na parte em que visa abalar a convicção manifestada pelo tribunal recorrido, relativamente ao julgamento da matéria de facto.

Não se trata, pois, de documento necessário à prova dos fundamentos da acção ou da defesa, mas apenas e tão só (na perspectiva da R.) para conferir especial força probatória a meios de prova oportunamente produzidos, abalando, por outro lado, a força probatória de meios de prova documentais e testemunhais produzidos pela contraparte.

Pelo que, à face do disposto nos art.º 415º, nº 2, 444º, nº 1, e 522º, nº 3, todos do Novo Código de Processo Civil, é manifestamente intempestiva a sua apresentação apenas neste momento processual, pois que o contraditório em questão devia ter sido exercido nos prazos e termos aí fixados.

Assim, carece de qualquer oportunidade a apresentação do documento ora em crise, já que não respeita ao circunstancialismo do nº 1 do art.º 651º do Novo Código de Processo Civil.
Face ao exposto, não se admite a junção do documento apresentado pela R. com a sua alegação.
***

A sentença recorrida considerou como provada a seguinte matéria de facto:
1.– No dia 16/10/2012, por volta das 16:45 horas, ocorreu uma colisão na Av. Rainha Dona Leonor, na Cova da Piedade, Almada.
2.– Nela foram intervenientes: o veículo ligeiro de mercadorias de matrícula xx-xx-QO, conduzido por Joaquim P., e; o motociclo de matrícula xx-xx-OS, conduzido pelo A.
3.– À data da colisão, a responsabilidade civil decorrente de eventos com o veículo QO estava transferida para a R., através da apólice n.º 1039013.
4.– A Av. Rainha Dona Leonor, no local da colisão, é constituída por uma recta de boa visibilidade e com dois sentidos de trânsito, sendo uma via em cada sentido.
5.– O veículo QO circulava na Av. Dona Leonor, no sentido sul/norte.
6.– O motociclo conduzido pelo A. circulava na mesma avenida, no sentido norte/sul.
7.– O condutor do veículo QO pretendia estacionar no seu lado esquerdo.
8.– O condutor do veículo QO, sem tomar atenção ao trânsito que circulava em sentido contrário, passou por cima do sinal demarcado no pavimento, vulgarmente denominado como “zebra”, e avançou, com o objectivo de estacionar a viatura por si conduzida.
9.– Invadindo a faixa de rodagem por onde circulava o OS, tendo-lhe cortado a sua linha de marcha.
10.– Face ao aparecimento inesperado do veículo QO na sua via de trânsito, o A. não conseguiu evitar o embate com a parte frontal do OS na direita do veículo QO.

11.– Em consequência directa do embate descrito, o A. sofreu as seguintes lesões:
a.- Traumatismo craniano com perda de conhecimento e fractura do côndilo occipital esquerdo, com destacamento de pequeno fragmento do contorno infero interno do mesmo côndilo e pequena extensão, paramediana esquerda, ao contorno do buraco occipital;
b.- Traumatismo vertebral com fractura da apófise transversa direita de D1;
c.- Traumatismo torácico com fractura subcapital da 1ª costela direita e das 2ªs costelas direita e esquerda, e fractura desalinhada das 6ª, 7ª e 8ª costelas direitas, com contusão de todos os lobos do pulmão direito, em particular nos lobos superior e inferior, com hemotórax e enfisema subcutâneo;
d.- Traumatismo do ombro direito com estiramento/rotura do tendão do supra espinhoso (em ombro com alterações degenerativas prévias) subcutâneo;
e.- Traumatismo do punho esquerdo com subluxação da articulação trapézio metacárpica (em punho com alterações degenerativas prévias);
f.- Traumatismo do joelho direito com fratura do menisco interno e rotura do ligamento cruzado anterior.

12.– Em consequência de tais lesões, o A. ficou com as seguintes sequelas:
a.- Cicatriz no joelho direito;
b.- Raquialgias e limitação dos movimentos da coluna cervical (Md 0903 – 5 pontos);
c.- Subjectivos dolorosos no ombro direito com infra desnivelamento procidência da extremidade externa da clavícula, crepitação com a mobilidade e ligeira atrofia da cintura escapular (Mf 1202 – 3 pontos);
d.- Fractura de costelas viciosamente consolidadas com toracalgia (Mf 1401 – 3 pontos);
e.- Punho esquerdo doloroso (Mf 1219 – 2 pontos);
f.- Joelho direito doloroso (Mf 1202 – 3 pontos);
g.- Hiperreflexia vestibular com alterações do equilíbrio (Sb 0303 – 3 pontos);
h.- Perturbação persistente do humor, traduzido clinicamente por alterações mnésticas, perda da capacidade de retenção e de atenção, lentidão de raciocínio, factibilidade intelectual, humor lábil, alterações do sono, cefaleias e intolerância ao ruído (Na 0310 – 10 pontos).

13.– Tais sequelas determinaram ao A.:
a.- Quantum Doloris durante o período de Incapacidade Temporária de Grau 5/7;
b.- Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica (anteriormente designada Incapacidade Geral Parcial Permanente Global) de 32,90 pontos;
c.- O Défice aludido na alínea b. é incompatível com a Actividade Profissional Habitual específica (Agente da PSP – Motorista);
d.- Dano Estético Permanente de Grau 2/7;
e.- Repercussão Permanente nas Actividades Desportivas e de Lazer (anteriormente designado por Prejuízo de Afirmação Pessoal) de Grau 1/5;
f.- Prejuízo Sexual de Grau 1/5.

14.– O A. terá de ser vigiado medicamente e efectuar terapêutica medicamentosa, bem como tratamentos de Medicina Física e de Reabilitação, na tentativa de minimizar as queixas álgicas, que terão períodos de exacerbação, para além da vigilância em ORL, reabilitação vestibular, e eventualmente acompanhamento/reabilitação psicológica.
15.– E, além disso, o A. carece ainda de tratamento cirúrgico ao joelho direito com a maior brevidade possível, para evitar um agravamento das suas sequelas.
16.– O A. ainda não foi submetido a tal cirurgia, por não dispor de condições económicas para o fazer.
17.– Para a realização de tal cirurgia o A. necessita de € 2.445,95 para o bloco operatório, internamento e instrumentista, e além disso terá que suportar os honorários da equipa médica que realizará a cirurgia, no valor de € 2.025,00.
18.– Em sede de tratamento pós-cirúrgico, o Autor necessita de 30 sessões de fisioterapia, a € 40,00 por sessão, e de 2 pensos, a € 25,00 cada.

19.– As lesões determinaram ao A.:
a.-Um período de Défice Funcional Temporário Total (anteriormente designado por Incapacidade Geral (fisiológica) Temporária Absoluta), correspondendo aos períodos de internamento e/ou repouso absoluto, de 16/10/2012 a 19/10/2012;
b.-Um período de Défice Funcional Temporário Parcial (anteriormente designado por Incapacidade Geral (fisiológica) Parcial), correspondendo ao período que se iniciou logo que a evolução das lesões passou a consentir algum grau de autonomia na realização desses actos, ainda que com limitações, de 20/10/2012 a 9/11/2014;
c.-Um período de Repercussão Temporária Total na Actividade Profissional (anteriormente designada por Incapacidade Temporária Profissional Total) de 16/10/2012 a 12/12/2013;
d.-Um período de Repercussão Temporária Parcial na Actividade Profissional (anteriormente designada por Incapacidade Temporária Parcial para a Actividade Profissional), fixável numa média de 40%, de 13/12/2013 a 9/11/2014.

20.– No período entre 13/12/2013 e 13/10/2015 o A. foi colocado pela PSP nos serviços moderados internos.
21.– A partir de Dezembro de 2013 o A. deixou de receber da PSP os suplementos mensais de turno e de patrulha, no valor mensal de € 164,47.
22.– A R. pagou tais subsídios desde Outubro de 2012 até Novembro de 2013.
23.– Em 13/10/2015 o A. foi submetido a uma Junta Superior de Saúde na PSP, que o declarou incapaz para todo e qualquer serviço junto da PSP.
24.– Foi consignado na decisão aludida em 23., no campo destinado às “Observações”, “propor-se à Junta Médica da CGA para eventual aposentação”.
25.– Os serviços clínicos da R. entenderam que o A. estaria apto para o trabalho e apenas com 2 pontos de IPG (Md 801).
26.– O A. auferiu o salário líquido anual de € 20.774,99 no ano de 2011.
27.– O A. nasceu a 6/9/1972.
28.– O A. tem passado por sofrimento, por ter ficado totalmente incapacitado para o seu trabalho habitual, perdeu a sua auto-estima, por se encontrar impedido fisicamente de realizar as suas actividades desportivas e de lazer, e tem dores intensas, que se mantêm desde a data da colisão.
29.– Realizou treino de reabilitação neuropsicológica, com acompanhamento semanal, com a Dr.ª L...C..., nos serviços da PSP.
30.– O A. era uma pessoa alegre, bem disposta e saudável, e praticava desporto diariamente, nomeadamente natação, atletismo, musculação, BTT, tendo sido atleta de alta competição, na modalidade de salto com vara, no Benfica.
31.– Após o acidente o A. deixou de praticar todo e qualquer desporto, devido às queixas álgicas que apresenta, assim como problemas de equilíbrio, e pela necessidade de intervenção cirúrgica ao joelho direito.
32.– Na data da colisão a filha do A. tinha 10 anos de idade, e o A. deixou de poder levantá-la ao colo, brincar com ela no chão, praticarem atividades desportivas juntos.
33.– Assim como ocorreu uma diminuição significativa da líbido do A., prejudicando a sua vida sexual.
34.– O A. deixou de poder andar de mota, situação essa irreversível, devido à falta de força no pulso e no joelho direito, assim como à situação dos desequilíbrios.
35.– O A. gostava de conviver com amigos, e após a colisão deixou de sair, refugiando-se em casa.
36.– Efectuou várias dolorosas sessões de fisioterapia.
37.– O A. ainda terá sofrimento com a cirurgia que tem de realizar, assim como com as dolorosas sessões de fisioterapia, após a cirurgia.
38.– O A. tem necessitado de tratamento de fisioterapia para reduzir as suas queixas álgicas, assim como estimulação muscular, pelo que tem realizado tais tratamentos na Clínica WFY, Lda., com sede na Charneca da Caparica.
39.– Por não ter condições económicas para pagar tais tratamentos, o A. tem recorrido a eles apenas em períodos de maior necessidade, encontrando-se em dívida com a referida clínica no valor global de € 2.700,00.

40.– O A. teve também as seguintes despesas, médicas e medicamentosas:
a.- Farmácia: € 64,63;
b.- Exames: € 322,32;
c.- Consultas: € 337,19;
d.- Tratamentos: € 390,00.

41.– Os serviços clínicos da R. entendem que o A. ficou com dano estético nunca superior a 1.
42.– Em 13/12/2013 a R. considerou que o A. apresentava situação estabilizada, com consolidação das fracturas costais, da vértebra dorsal e do côndilo occipital.
43.– Nessa data a R. considerou que o A. apresentava mobilidade completa dos membros inferiores.
44.– O Défice fixado em 13.b. corresponde à soma de 29,90 pontos a título de Défice, com 3 pontos relativos a Dano Futuro.
45.– Na decisão aludida em 23. foi fixada ao A. uma IPP de 23,22%.
46.– O A. casou com Sónia C. em 7/8/1999.
***

A sentença recorrida considerou ainda como não provada a seguinte matéria de facto:
I.– O A. esteve na situação de Incapacidade Temporária Parcial para a sua actividade profissional até 13/10/2015.
II.– A decisão da Junta Superior de Saúde da PSP implica necessariamente a aposentação por invalidez do A.
III.– O A. saía uma vez por semana com os amigos.
IV.– Em 13/12/2013 o A. apenas referia cervicalgia residual em esforço.
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Da alteração da matéria de facto.

Decorre da conjugação dos art.º 635º, nº 4, 639º, nº 1 e 640º, nº 1 e 2, todos do Novo Código de Processo Civil, que quem impugna a decisão da matéria de facto deve, nas conclusões do recurso, especificar quais os pontos concretos da decisão em causa que estão errados e, ao menos no corpo das alegações, deve, sob pena de rejeição, identificar com precisão quais os elementos de prova que fundamentam essa pretensão, sendo que, se esses elementos de prova forem pessoais, deverá ser feita a indicação com exactidão das passagens da gravação em que se funda o recurso (reforçando a lei a cominação para a omissão de tal ónus, pois que repete que tal tem de ser feito sob pena de imediata rejeição na parte respectiva) e qual a concreta decisão que deve ser tomada quanto aos pontos de facto em questão.
Na sua alegação a R. deu cumprimento aos preceitos legais em questão, quanto ao julgamento da matéria de facto que pretende ver alterado, e que corresponde aos pontos 11. a 15., 18., 19., 23., 28., 31., 33. e 34. dos factos provados.
Mais vêm indicadas as passagens das gravações da prova produzida na audiência final que, no entender da R., justificam a alteração pretendida.
Pelo que é em relação à matéria de facto em questão, e apenas em relação a esta, que deve ser conhecida a parte do recurso relativa à impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
O tribunal recorrido motivou pela seguinte forma a decisão de dar como provada a matéria de facto em questão:
Passando à análise crítica da prova:
(…)
Importa começar por assinalar que sempre que se julgou pertinente foi transcrito o teor do documento onde a parte assentou a sua alegação, em lugar de transcrever a alegação, como sucedeu com o relatório subscrito pela Dra. R...M..., designadamente com respeito ao teor das consequências do acidente, suas sequelas e conclusões vertidas em tal relatório.
No que tange à prova produzida em audiência, o A. prestou declarações que consideramos sinceras quanto às limitações que efetivamente sente na sua vida diária, após o acidente, tanto no plano profissional, como no plano pessoal, às quais aludiu de forma pormenorizada e credível.
Tais limitações foram globalmente confirmadas em duas vertentes: a estritamente técnica, pelas testemunhas R...M..., M...M... e L...C...; e a que respeita à perceção de senso comum, pelas testemunhas Sónia [C.], Carlos [L.] e Gustavo [E.].
No que concerne ao aspeto técnico, temos três documentos a ponderar: o relatório da R., datado de 13.12.2013, subscrito pelo Dr. J...L...B...; o relatório da Dra. R...M..., datado de 24.03.2015; e a decisão da Junta Superior de Saúde da PSP, datada de 13.10.2015.
Cada um deles aponta para conclusões diferentes: no relatório da R. é fixada ao A. uma incapacidade de 2 pontos; no relatório da Dra. R...M... a incapacidade é fixada em 32,90 pontos, correspondendo 3 pontos a dano futuro; e na decisão da Junta Superior de Saúde da PSP a incapacidade é fixada em 23,22%.
Perante tais discrepâncias, sobretudo do relatório da R., e na ausência de prova pericial, que não foi requerida por qualquer das partes, cabe ao Tribunal analisar tais documentos, conjugadamente com a prova produzida em audiência, a fim de decidir a questão da quantificação da incapacidade do A., sendo certo que é transversal a todos estes documentos a conclusão de que o A. ficou a padecer de uma incapacidade permanente, em consequência do acidente.
A este propósito assinala-se que o relatório da R. é subscrito por médico especialista em ortopedia e na avaliação de dano corporal em direito civil, sendo a Dra. R...M... também médica especialista em medicina legal, designadamente com a componente de avaliação do dano em direito civil, e mostrando-se desconhecidas as especialidades dos médicos que subscreveram a decisão da Junta Superior de Saúde da PSP.
Por outro lado, o relatório da Dra. R...M..., ao contrário dos outros dois documentos, contém descrição pormenorizada e fundamentada acerca do conteúdo da percentagem de incapacidade fixada ao A.
Desta descrição extrai-se que as lesões que afetam o A. se situam nas especialidades da ortopedia e da neurologia, competindo, aliás, uma parte razoável dessa incapacidade à neurologia, ou seja, 10 pontos em 29,90 pontos de incapacidade.
Atendendo, assim, à especialidade da Dra. R...M... em medicina legal, e mais considerando que o seu relatório é o único que efetua uma análise pormenorizada e fundamentada da situação do A., entendemos que este relatório deve ser o nosso arrimo.
Aliás, salientamos que essa análise está concretizada nos moldes em que são elaborados os relatórios pelo Instituto Nacional de Medicina Legal, no âmbito das perícias solicitadas pelo Tribunal, constando do relatório da Dra. R...M..., designadamente, uma indicação exaustiva dos elementos clínicos do A. que foram aquilatados, pelo que se trata de um documento que nos merece toda a credibilidade.
Acresce que, como salientámos acima, a Dra. R...M... foi ouvida como testemunha e prestou todos os esclarecimentos que lhe foram solicitados, em termos que reputamos coerentes.
É verdade, todavia, que o Dr. J...L... foi de igual modo ouvido como testemunha, tendo explicado que no acompanhamento que fez ao A. verificou a situação que assinalou no relatório da R.. Mas consideramos que existindo dois outros relatórios que apontam para níveis de incapacidade substancialmente superiores, sendo ambos absolutamente claros quanto à circunstância do A. não reunir condições para o exercício da sua profissão habitual, e mais se constatando que estes dois relatórios foram produzidos em 2015, portanto cerca de dois anos depois do relatório da R., deveremos considerar que estes dois relatórios retratam a situação clínica atual do A..
A este propósito temos ainda de referir que atenta a ligação estabelecida no relatório da Dra. R...M... entre o acidente e a situação clínica atual do A., alicerçada designadamente nos relatórios do ortopedista Dr. P...C... e do neurocirurgião Dr. P... M..., bem como a circunstância de não ter sido alegado nem ter sido mencionado por qualquer pessoa que o A. houvesse sofrido algum outro acidente ou doença que lhe tivessem provocado as lesões que apresenta, temos como assente a existência de nexo de causalidade entre o acidente e as sequelas diagnosticadas ao A..
Neste ponto houve efetivamente divergência entre as posições assumidas pela Dra. R...M... e pelo Dr. J...L...B..., sendo que no relatório da primeira surge referência expressa a “alterações degenerativas prévias” quanto ao ombro direito e quanto ao punho esquerdo (fls. 24-v), mas não deixa de ser aí atendido o dano resultante do acidente quer quanto ao ombro direito, quer quanto ao punho esquerdo. No seu depoimento a Dra. R...M... foi, aliás, clara quanto ao facto destas lesões degenerativas não terem determinado as lesões que o A. apresenta.
Salienta-se, a este respeito, que no relatório de urgência do Hospital Garcia de Orta consta a seguinte referência: “Ponto de aplicação no joelho direito. Sem fracturas nos membros, com mobilidade mantida.” (fls. 15)
E no relatório do Dr. P...C... de 05.01.2015 diz-se: “Traumatismo e entorse no joelho direito que na altura não foi valorizado pela maior gravidade das outras lesões. (…) Apresenta uma Rotura do menisco interno do joelho direito, resultante do traumatismo do joelho na altura do acidente; já referiu estas queixas na seguradora mas não lhe têm dado seguimento.” (fls. 18)
O médico ortopedista Dr. P...C... acompanhou o A., pelo menos, desde 07.02.2014, data do primeiro relatório transcrito no relatório da Dra. R...M..., o que significa que o seu acompanhamento se terá iniciado pouco depois do termo do acompanhamento pela seguradora, a 13.12.2013.
Nas suas declarações de parte o A. afirmou reiteradamente que expôs as suas queixas aos médicos que o acompanharam por parte da R., mas que estas foram ignoradas ou desvalorizadas, o que corrobora a menção constante deste relatório do Dr. P...C....
Também na vertente neurológica e psicológica está demonstrado que o A. foi acompanhado, tendo sido elaborado um primeiro relatório, a 22.09.2013, pela Dra. C...M..., onde se conclui pela inexistência de alterações cognitivas ou sintomas depressivos (fls. 18-v a 19, em particular fls. 19).

No entanto, a Dra. C...M... consignou, como “nota” ao seu relatório:
“Sugere-se reavaliação dentro de 6 meses/1 ano para confirmação do quadro” (fls. 18-v a 19, em particular fls. 19), o que revela claramente que não considerou esta avaliação definitiva.
E em relatório posterior da Dra. M...M..., datado de 12.12.2014, efetuado por solicitação do médico-chefe do Posto Clínico nº 40, da Divisão de Almada, Dr. Leitão, concluiu-se diversamente que o A. “apresenta queixas, no processo de entrevista, que se suspeitam estar ligadas ao tronco cerebral, designadamente ao nível do VII, VIII e IX nervo craniano, motivo pelo qual a avaliação neuropsicológica efectuada anteriormente não sugeriu «alterações cognitivas» (sic), de acordo com o relatório da Dra. C...M.... Aliado aos indicadores acima mencionados, relativamente diminuído funcionamento das funções superiores, também se sugere compromisso na área responsável pela capacidade de interpretação, memória de fixação e atenção, com enfoque no lobo temporal.” (fls. 19 a 20-A, em particular 20-A).
O A. efetuou treino de reabilitação neuropsicológica, por indicação da Dra. M...M..., no relatório ora citado (versão integral a fls. 32-v e segs.), tendo a mesma confirmado esta indicação no depoimento que prestou.
A psicóloga que realizou este tratamento, a Dra. L...C..., foi muito clara, no seu depoimento, quanto à situação do A.: o treino de reabilitação permite ao A. recuperar alguns mecanismos de funcionamento cognitivo, designadamente em termos de memória, mas não o cura, reaparecendo as dificuldades assim que o treino cessa. É, pois, algo de semelhante a um desportista, que enquanto mantém treino físico regular consegue elevados níveis de desempenho, mas se parar de treinar, mesmo que não tenha qualquer lesão, começa de imediato a perder as capacidades adquiridas com aquele treino físico, podendo voltar a ganhá-las se recomeçar o treino.
Em semelhante quadro, e não tendo sido apontada a ocorrência de qualquer evento novo distinto do acidente e posterior a este, reafirmamos a convicção de que o relatório da Dra. R...M..., ao considerar uma percentagem de incapacidade em sede de neurologia, está a retratar a situação atual do A., resultante do acidente.
Acrescentamos ainda, quanto à gravidade do acidente em causa, que a Dra. R...M... aludiu, no seu depoimento, ao facto da zona do crâneo afetada pelo acidente ser muito melindrosa, pelo que o A. podia ter morrido ou ficado tetraplégico em virtude deste sinistro.
No que respeita à vertente não técnica, salientamos em particular que as testemunhas Sónia [C.] e Gustavo [E.] conheceram muito bem o A. antes do acidente, pelo que têm a noção da diferença relativamente à pessoa com a qual convivem hoje, tendo explicado em particular a alegria e o dinamismo do A., que foi atleta de alta competição. Também o A. salientou o aspeto de ter sido desportista de alta competição durante 18 anos, o que fez até 2002 ou 2003, sendo que a partir de 1997 acumulou esta sua condição com o serviço na PSP, e acrescentou ainda a importância do seu pai na sua ligação intensa ao desporto, o qual foi desportista e pertencia à Marinha.
Em particular a mulher do A. aludiu às dificuldades do A. na relação conjugal e na dinâmica com a filha do casal, tendo de igual modo a testemunha Gustavo [E.] confirmado que o seu amigo lhe confidenciou essas dificuldades, expressando-lhe a sua preocupação com a filha.
A mulher do A., bem como a psicóloga Dra. L...C... e a testemunha Carlos [L.] referiram todos o facto do A. ter estado a desempenhar serviços moderados internos na PSP, que descreveram como funções de natureza administrativa.
A testemunha Carlos [L.] explicou adicionalmente que por estar na altura a trabalhar como Adjunto do Comandante acompanhou esta situação, referindo-se ao facto do A. ter gabinete próprio e estar responsável pelo atendimento ao público, cumprindo horário de trabalho das 09:00 às 12:30 e das 13:30 às 16:00.
Contudo, o A. esquecia de algumas coisas, designadamente números, bem como das tarefas que tinha para realizar, pelo que às vezes perguntava à testemunha.
Acresce que se irritava com muita facilidade, o barulho e a confusão incomodavam-no, e por isso pedia para descansar, vinha um pouco até à rua.
A testemunha sublinhou que antes do acidente nunca o A. apresentou este comportamento, facto do qual tem conhecimento pessoal e direto, pois conhece o A. há 10 anos e trabalharam juntos durante 2 ou 3 anos, em patrulha, e a testemunha chegou mesmo a chefiar a equipa do A.. A testemunha descreveu o A., neste período, como um colega que desempenhava as funções com profissionalismo e dedicação, apresentando um discurso coerente e sendo educado com o público.
No que se reporta aos suplementos que deixou de receber, quer o A. na suas declarações de parte, quer a sua mulher e a testemunha Carlos [L.] reportaram-se a essa matéria de forma convergente.
Relativamente à cirurgia ao joelho direito, o Tribunal atendeu em particular aos documentos de fls. 136 e 137 (relatórios do Dr. P...C..., datados de 07.02.2014 e de 27.10.2014), bem como à transcrição de mais dois relatórios do Dr. P...C..., datados de 05.11.2014 e de 05.01.2015, constantes do relatório da Dra. R... M... (fls. 18), reiterando-se no último a “indicação cirúrgica formal e a curto prazo pois está a deteriorar o estado do joelho podendo comprometer a sua recuperação e trazer-lhe consequências futuras”.
Aliás, no relatório da Dra. R...M... os 3 pontos de dano futuro aí propostos são apontados precisamente à parte ortopédica: “as sequelas resultantes das lesões sofridas a nível da coluna vertebral, do ombro direito, do punho esquerdo e do joelho direito, com o decorrer do tempo sofrerão agravamento até à artrose, com repercussão não só na função como no agravamento das queixas álgicas a este nível” (fls. 25).
Assim, a cirurgia a realizar tem efetiva conexão com o acidente e as suas sequelas.”.
Contra esta fundamentação a R. aponta, essencialmente, a consideração do relatório elaborado pelos seus serviços clínicos em 13/12/2013 (fls. 73), conjugado com o depoimento do seu subscritor, a testemunha J...L...B....
Sucede que, como decorre da fundamentação apresentada pelo tribunal recorrido, esse conjunto de meios de prova foi igualmente valorado, mas foi desconsiderado no seu confronto com os restantes meios de prova, designadamente o depoimento da testemunha R...M..., conjugado com o teor do relatório subscrito pela mesma e datado de 24/3/2015 (fls. 13v. a 26).
Invoca a R. que tal desconsideração não podia ter ocorrido, dada a vasta experiência da testemunha J...L...B... como médico especialista em ortopedia, especialidade que a testemunha Rosa Madeira não possui, dado que é especialista em medicina legal, designadamente na vertente de avaliação de dano corporal.
Todavia, e como decorre do teor do relatório de 13/12/2013, a razão de ciência invocada por J...L...B... para subscrever o mesmo resulta de ser “Perito em Avaliação de Dano Corporal pelo IMI de Coimbra”.
Ou seja, por esta via não se pode afirmar, como pretende a R., uma menor capacidade científica da testemunha R...M..., relativamente à testemunha J...L...B..., para afirmar os factos relativos aos danos corporais do A., decorrentes do acidente de viação de 16/10/2012.
Mais invoca a R. que o tribunal recorrido ignorou as observações clínicas que constam do documento 3 junto à contestação (fls. 73v. e 74), que correspondem ao acompanhamento da assistência prestada pelo corpo clínico da R. ao A., por médicos diferentes.
Todavia, constata-se que aí não está identificada, em momento algum, a testemunha J...L...B... como tendo sido um dos médicos da R. a acompanhar o A. entre a data do acidente e 9/12/2013, só sendo identificado nesta última data (9/12/2013) como o médico que elaborará o “Rel. Final” (entenda-se, o relatório final de avaliação de dano corporal de 13/12/2013).
Pelo que o argumento de que a testemunha R...M... não acompanhou clinicamente o A. e que, por isso, não lhe assiste conhecimento bastante, directo e pessoal, para proferir as afirmações que proferiu, relativamente à avaliação dos danos corporais do A., cai por terra, sob pena de, a atender-se tal argumento, ter de se concluir da mesma forma para o conhecimento de J...L...B..., na sua dupla qualidade de testemunha e subscritor do relatório de 13/12/2013.
E tal argumento tem o mesmo valor (ou falta dele) para a afirmação da R., no sentido do conhecimento de R...M... não lhe poder advir da consulta de outras observações clínicas (ou partes delas) e exames complementares.
É que do teor dos documentos já referidos, conjugado com os depoimentos de ambos os profissionais de saúde em questão, decorre que a metodologia usada por cada um deles para produzir o relatório respectivo que subscreveram foi essencialmente a mesma.
Com uma diferença assinalável: é que o relatório de R...M... auto-sustenta-se, entendida esta afirmação no sentido de que do mesmo constam os elementos que permitem percepcionar o iter cognitivo utilizado pela mesma para chegar às conclusões factuais a que chegou, relativamente à qualificação e quantificação do dano corporal do A., nas suas diversas vertentes. Já o relatório de J...L...B... não contém os elementos mínimos que permitam percepcionar como chegou o mesmo às conclusões factuais que aí ficaram expressas. O que, por si só, permite afirmar, como fez o tribunal recorrido, que o relatório de R...M... “é o único que efetua uma análise pormenorizada e fundamentada da situação do A.”, assim concluindo, por isso, que “entendemos que este relatório deve ser o nosso arrimo”.
E através da consideração desse relatório, complementado pelo depoimento de R...M..., é possível afirmar, como o fez o tribunal recorrido, as lesões corporais que decorrem para o A., sequelas das mesmas e respectivos défices funcionais, nos termos elencados em 11. a 15., 18., 19., 23., 33. e 34., dos factos provados.
E, designadamente, aquelas sequelas relativas ao joelho direito e ao punho esquerdo, para além das relativas ao ombro direito, às costelas ou mesmo ao nível do equilíbrio e ao nível psicológico, todas documentadas, do ponto de vista clínico e de exames complementares de diagnóstico, mas que a testemunha J...L...B... entendeu considerar como inexistentes, quer em 13/12/2013, quer quando ouvido em audiência final.
Aliás, e no que respeita à desconsideração total de qualquer sequela para o A., para além de cervicalgia residual em esforço (défice funcional valorado com 2 pontos, em 100 possíveis), a “avaliação de dano corporal” de J...L...B... é tanto mais insustentável (para não dizer contraditória) quanto, tendo o A. comprovadamente sofrido uma fractura de um dos ossos do crânio que se articula com a 1ª vértebra cervical (o côndilo occipital esquerdo), e tendo essa lesão merecido acompanhamento continuado, como o demonstram os sucessivos exames imagiológicos documentados (o que demonstra a gravidade da mesma), na observação clínica de 9/12/2013 J...L...B... afirma a mobilidade cervical completa do A. para, depois, afirmar a referida cervicalgia (ou seja, dor na zona cervical da coluna vertebral). Ou seja, fazendo com que se pudesse concluir que a mobilidade não será completa, dado que a dor causada por essa mobilidade sempre a condicionará, e não estabelecendo qualquer relação (ou falta dela) entre a fractura e a sequela anotada.
Do mesmo modo que, constando no relatório da urgência do Hospital Garcia de Orta a referência a uma lesão no joelho direito (através da expressão “ponto de aplicação no joelho direito”), a ausência de fracturas nos membros leva o referido J...L...B... (e a R., que repete nas suas conclusões como verdade inabalável tudo o que mesmo diz) a afirmar a ausência de qualquer lesão nessa parte do membro inferior direito do A. O que, a utilizar o “argumento de autoridade” da especialidade de ortopedia, leva a concluir pela desconsideração total dos conhecimentos especializados do mesmo J...L...B..., já que a mera experiência comum revela que nem só as fracturas ósseas constituem lesões corporais, mas igualmente outros traumatismos, como as rupturas articulares, ligamentares ou musculares.

Ou, do mesmo modo, há que considerar (como fez o tribunal recorrido) que as alterações degenerativas do A., prévias ao acidente, não concorrem para os danos e sequelas verificados no ombro direito e no punho esquerdo, antes havendo que concluir que decorrem do acidente e das diversas lesões daí emergentes, a que não será estranho o facto do A. conduzir um motociclo e ter embatido num veículo automóvel ligeiro de mercadorias que invadiu a sua faixa de rodagem e lhe cortou a linha de marcha, sendo projectado para o solo.

Ou ainda, do mesmo modo, há que considerar (como fez o tribunal recorrido) que as sequelas permanentes apuradas são susceptíveis de agravamento, tendo presente a sua localização (designadamente quanto às sequelas permanentes ao nível da coluna vertebral) e a sua origem traumática, e sendo esse agravamento altamente provável, face a tais circunstâncias, assim havendo que ser considerado como equivalendo a um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica valorado em 3 pontos, em 100 possíveis.

Pelo que, também por esta via, se impõe a afirmação da desconsideração do depoimento de J...L...B... e do seu relatório de 13/12/2013 (como fez o tribunal recorrido), já que o mesmo não cuidou de justificar cabalmente as suas afirmações conclusivas e de sinal contrário às considerações acima elencadas.
Já quanto à falta de indicação, pelas duas testemunhas ouvidas acerca das sequelas psicológicas do A. (L...C... e M...L...M...), do nexo causal existente entre as mesmas (por ambas verificadas através da observação clínica que fizeram do A.) e o acidente, basta atentar nos depoimentos prestados pela mulher do A. (Sónia C.), pelo colega do A. (Carlos L.) e por um amigo do A. (Gustavo E.) para se poder afirmar tal nexo causal. Nos exactos termos em que o fez o tribunal recorrido, ao afirmar o contributo dos depoimentos em questão, numa “vertente não técnica”, para a verificação do estado do A. antes e depois do acidente. Que é o mesmo que afirmar que decorre dos depoimentos de tais testemunhas o nexo causal entre as lesões psicológicas diagnosticadas ao A. e os danos sofridos pelo mesmo no acidente de 16/10/2012.

Por outro lado, e quanto à pretendida desconsideração da “subjectividade dolorosa descrita pelo sinistrado sem que isso tenha uma correspondência objectiva”, parece que a R. esquece (ou não sabe) que a dor é subjectiva, por sua própria natureza, sendo por isso que corresponde a uma lesão psíquica. O que equivale a afirmar que o seu apuramento clínico decorre da afirmação da sua existência, feita pelo paciente ao profissional da área médica, e não sendo comprovada cientificamente pelo mesmo, mas apenas aceite como provável, por decorrer da experiência médica que a determinados tipos de lesões correspondem determinados tipos de subjectivos dolorosos.

Ora, no caso das “algias” consideradas por R...M..., decorrentes das queixas respectivas manifestadas pelo A., têm as mesmas correspondência com as lesões traumáticas verificadas clinicamente, não carecendo de ser confirmadas por mais exames que aqueles que o A. realizou, e que estiveram disponíveis para consulta pela mesma médica.

Aliás, a posição da R., defendendo que o “mero registo de queixas subjectivas nunca confirmadas por exames” não tem aptidão para a determinação das sequelas psíquicas e psicológicas do A. (aqui se incluindo as cervicalgias/raquialgias, a toracalgia e as dores no ombro direito, no joelho direito e no punho esquerdo) explica a sua posição em sede de avaliação do dano corporal do A., na medida em que, para a R., toda a dor que não puder ser documentada com um exame objectivo não corresponde a um défice funcional, assim se permitindo afirmar (sem razão, todavia) que ao A. não foram detectadas lesões com gravidade, não inspirando o seu estado geral cuidados de especialidade, e podendo ter alta dois dias após o acidente, mesmo depois de reconhecer e aceitar a existência de um traumatismo crânio-encefálico e cervical com perda de conhecimento e fractura de um dos ossos do crânio, de um traumatismo torácico com fractura de duas costelas, contusão pulmonar e hemotórax, de um traumatismo da coluna com fractura da apófise à direita da primeira vértebra dorsal, e de um traumatismo do ombro direito, com distensão articular.
Pelo que, mais uma vez, a posição de J...L...B... (professada pela R. como única posição admissível para a determinação dos factos provados relativos aos danos e sequelas do A.) é inadmissível, do ponto de vista probatório, havendo que aproveitar antes a posição de R...M... (e dos restantes médicos em que a mesma se funda) para afirmar os diversos parâmetros do dano corporal do A. (como fez o tribunal recorrido).
O que equivale a concluir que os excertos do depoimento das testemunhas R...M..., L...C..., M...L...M... e J...L...B..., que foram identificados pela R., quando conjugados com o remanescente desses depoimentos e com a restante prova produzida, não têm o sentido fáctico que o R. procura retirar, mas aquele que foi encontrado pelo tribunal recorrido. E, deste modo, não conduzem à procedência da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, nos termos vertidos nas conclusões da alegação de recurso do R., assim se mantendo essa decisão.
Da determinação dos danos a indemnizar pela R.
Neste segmento quer a R., quer o A. insurgem-se contra a sentença proferida, sendo que o A. entende que há lugar a considerar a perda de suplementos remuneratórios (a título de subsídio de turno e de subsídio de patrulha) que auferiria até à reforma se não fossem as sequelas decorrentes do acidente, bem como a considerar autonomamente o dano biológico, não o confundindo com os danos não patrimoniais, e sendo que a R. entende que os valores fixados a título de danos não patrimoniais e danos patrimoniais futuros são exagerados, devendo ser reduzidos.
A sentença recorrida fixou a indemnização global devida ao A. em € 240.617,90 (acrescida de juros de mora), sendo que considerou como parcelas desse valor global, para além do mais, a quantia de € 3.782,81 a título de indemnização por perdas salariais, a quantia de € 190.000,00 a título de indemnização por dano patrimonial futuro, e a quantia de € 40.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais.
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Quanto à desconsideração dos suplementos remuneratórios para o cálculo da indemnização devida por perda de rendimentos laborais até à reforma, na sentença recorrida considerou-se a jurisprudência do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 29/1/2015 (relatado por Carlos Carvalho e disponível em www.dgsi.pt), considerando-se ainda que, face aos factos provados, “não pode ter-se como certo que até à sua reforma o A. receberia subsídios de turno e de patrulha”.

E tal conclusão é retirada da circunstância do A. ter estado afecto aos denominados serviços moderados internos, até à junta médica que o considerou inapto para o serviço, e daí se depreendendo que não reunia, à data, as condições para receber tais subsídios de patrulha e de turno, tendo ainda em atenção a tipificação do primeiro como aquele que é abonado ao “pessoal policial que efectue missões de patrulha”, tendo de ocorrer cumulativamente a “integração do elemento policial em escala de serviço aprovada” e a “prestação efectiva de serviço no exterior das instalações da subunidade”. E tendo ainda em atenção a tipificação do segundo, nos termos do disposto nos art.º 104º, nº 1 e 2, e 105º, ambos do D.L. 299/2009, de 14/10.

Já da jurisprudência referida decorre que “inexiste um direito da parte de funcionário, agente ou trabalhador a que lhe seja abonado um determinado suplemento remuneratório cujo processamento esteja ou seja independente da categoria, cargo ou função detida dado o mesmo exigir ou ser decorrência duma efetiva prestação de serviço [ou situação a tal legalmente equiparada] que está para lá daquilo que seriam as exigências do seu normal desempenho”.

Ou seja, o que se pode retirar, da conjugação do regime legal aplicável à actividade profissional do A. (agente da PSP) com a jurisprudência em questão, é que, não obstante a intenção do A. de continuar a integrar turnos e patrulhas, o direito do mesmo aos suplementos remuneratórios respectivos só nasce com a sua integração efectiva nas escalas de serviço respectivas, que não depende do mesmo, mas da sua hierarquia.

E como se desconhece se, até à sua aposentação, a hierarquia do A. o manteria integrado nas escalas de turno e de patrulha, como sucedeu até Novembro de 2013 (só assim se justificando o pagamento dos subsídios correspondentes, como decorre do ponto 22. dos factos provados), não se pode afirmar, como pretende o A., “que é mais certo que o Autor pudesse realizar o mesmo serviço até à idade da reforma do que o seu contrário”.

Antes se concordando com o tribunal recorrido, quando conclui não estar preenchida a previsão legal do nº 2 do art.º 564º do Código Civil, por não se poder afirmar a previsibilidade de recebimento dos subsídios em questão, até à reforma do A., face ao regime legal que disciplina a concessão desses subsídios.
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Quanto à desconsideração do dano biológico para o cálculo da indemnização, não assiste qualquer razão ao A.
Com efeito, e como consta amplamente justificado na sentença recorrida, “constatamos que a lesão da integridade física do A. e a impossibilidade do exercício da profissão habitual, por si erigidas como fundamentos para o arbitramento de indemnização por dano biológico, se mostram já ressarcidas do ponto de vista patrimonial e não patrimonial, pelo que não encontra justificação nem se afigura correto ponderar o mesmo facto de forma autónoma, uma vez que constituiria uma duplicação de indemnizações”.

É que, ao contrário do que defende o A. ao convocar o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11/12/2012 (relatado por Lopes do Rego e disponível em ww.dgsi.pt), “o dano biológico decorrente das sequelas das lesões sofridas, perspectivado não como fonte de uma perda de rendimentos laborais, mas antes como diminuição global das capacidades gerais do lesado, envolvendo uma verdadeira capitis deminutio para a realização de quaisquer tarefas, que passam a exigir-lhe um esforço acrescido”, assim conceptualizado, mostra-se ressarcido através da consideração, na sentença recorrida, do montante de € 40.000,00, já que tal diminuição das capacidades gerais do A. para a realização de tarefas da sua vida pessoal, e que o obriga a um esforço acrescido, corresponde ao que ficou aí referido como “prejuízo de afirmação pessoal de grau 1” em 5 possíveis, como “dano estético de grau 2” em 7 possíveis, e como “prejuízo sexual de grau 1” em 5 possíveis, e que corresponde às limitações na prática das actividades desportivas, sociais e familiares que praticava antes do acidente, tudo em razão das sequelas corporais de que ficou a padecer. E mostra-se igualmente ressarcido através da consideração, na sentença recorrida, do montante de € 190.000,00, já que tal diminuição das capacidades gerais do A. tem, para além da dimensão não patrimonial acima referida, uma dimensão patrimonial, quando se repercute na capacidade de ganho do A.
Ou, dito de outra forma (e citando o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7/4/2016, relatado por Maria da Graça Trigo e disponível em www.dgsi.pt), “a afectação da integridade físico-psíquica (em si mesma um dano evento, que, na senda do direito italiano, tem vindo a ser denominado “dano biológico”) pode ter como consequência danos de natureza patrimonial e danos de natureza não patrimonial. Na primeira categoria não se compreende apenas a perda de rendimentos pela incapacidade laboral para a profissão habitual, mas também as consequências da afectação, em maior ou menor grau, da capacidade para o exercício de outras actividades profissionais ou económicas, susceptíveis de ganhos materiais”.

Ou, dizendo ainda de outra forma (citando o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24/4/2012, relatado por Garcia Calejo e disponível em www.dgsi.pt), “o dano biológico, que se traduz no dano funcional (…), não necessita, normalmente, de valorização em termos de indemnização autónoma, devendo-se, casuisticamente, proceder à respectiva valoração quer como dano patrimonial, quer como dano não patrimonial”.

O que equivale a afirmar que o dano biológico do A. decorrente do acidente, visto como afectação da sua integridade físico-psíquica para a prática de actos da sua vida produtiva e para a prática de actos da sua vida não produtiva, reconduz-se, no primeiro caso, à ocorrência de danos de natureza patrimonial (perda e/ou impossibilidade de obtenção de rendimentos) e, no segundo caso, à ocorrência de danos de natureza não patrimonial (limitações do direito de personalidade).

E como a sentença recorrida contemplou o ressarcimento de todas estas vertentes do dano biológico do A., arbitrando um montante indemnizatório quanto à vertente patrimonial do mesmo e um outro montante indemnizatório quanto à vertente não patrimonial do mesmo, o acolhimento da pretensão do A. mais não representaria que a duplicação de indemnizações pelo mesmo dano, em termos não permitidos pelo direito e, por isso, correctamente rejeitada pelo tribunal recorrido.
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Já quanto à consideração de valores indemnizatórios mais baixos que aqueles fixados pelo tribunal recorrido, quer a título de danos patrimoniais futuros, quer a título de danos não patrimoniais, funda a R. tal pretensão desde logo num quadro factual incorrecto.
É que a afirmação pela R. de um tempo de défice temporário total de “apenas” dois dias, desprezando que o A. esteve sem poder trabalhar durante cerca de 14 meses, e bem ainda que a consolidação das suas lesões só ocorre cerca de 25 meses depois do acidente, e ainda assim com sequelas permanentes, valoradas com 32,90 pontos, em 100 possíveis, deita por terra a convocação de “jurisprudência recente para casos semelhantes”, designamente quanto confrontada com a jurisprudência citada na sentença recorrida, e que aqui se acolhe.

Ou seja, tal como se considerou na sentença recorrida, o quantum doloris apurado, a par do prejuízo de afirmação pessoal e do prejuízo sexual, bem como as limitações da actividade lúdica, social e pessoal do A., correspondem a danos de natureza não patrimonial que, pela sua gravidade, são susceptíveis de compensação através do montante de € 40.000,00, e não se podendo igualmente esquecer que a gravidade do dano não patrimonial “há-de medir-se por um pa­drão objectivo (...) e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada)” (Pires de Lima e Antunes Varela, anotação ao art.º 496º do Código Civil, in Código Civil Anotado, volume I, 4ª edição, Coimbra, 1987).

Do mesmo modo que a consideração de um valor de 29 pontos (em 100 possíveis) para o cálculo da indemnização por danos patrimoniais futuros não corresponde à matéria de facto provada, de onde decorre que o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica do A. ascende a 32,90 pontos, mais determinando a incapacidade total do A. para o exercício da sua actividade habitual específica, de agente da PSP com a categoria profissional de motorista.

E a jurisprudência dos dois acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça (sendo o de 24/4/2012 relatado por Gregório Silva Jesus e o de 25/9/2012 relatado por Martins de Sousa, ambos disponíveis em www.stj.pt), convocada pela R. para sustentar o desajuste no arbitramento da quantia de € 190.000,00, não tem aqui cabimento, já que se reporta a casos com contornos factuais distintos do dos presentes autos, na medida em que em ambos não decorre a incapacidade absoluta do lesado para o exercício da sua profissão habitual.

Já a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça referida na sentença recorrida permite concluir que foi tratado de forma idêntica o que é idêntico, sendo analisadas decisões judiciais de casos análogos para alcançar a justiça relativa das decisões, designadamente no acórdão de 2/7/2012 (relatado por João Camilo e disponível em www.dgsi.pt), quando refere que:
Daqui resulta que o autor podendo exercer outras actividades laborais, está totalmente incapacitado de exercer a actividade profissional que exercia antes do acidente.
Logo e atendendo à idade do autor, à tendência das lesões para o agravamento – facto af) – e à difícil situação laboral existente em Portugal, será muito difícil ao autor conseguir uma actividade remunerada compatível com as suas habilitações e as suas limitações físicas, pelo que se poderá equiparar, de certo modo, a sua situação a uma incapacidade total para o exercício de uma actividade remunerada.
(…)
Por isso, entendemos que aqui deve ser calculado o montante que o autor poderia receber da sua actividade anterior ao acidente, nos oito anos de vida útil que se seguem ao termo da sua incapacidade total temporária e tomando em conta a antecipação do recebimento deste montante a que apenas teria direito no futuro.
Além disso, há que tomar em conta nos termos da equidade, a possibilidade embora reduzida, de o autor encontrar outra actividade compatível com as suas habilitações, o seu estado de limitação física, a sua idade e a situação laboral do país.
Tudo ponderado, parece-nos que a importância de trinta mil euros é adequada a ressarcir o dano decorrente dos quase oito anos que decorrem entre a data em que cessou a incapacidade total temporária e o termo provável da vida útil do autor”.

Ou, bem ainda, nos citados acórdãos do Tribunal da Relação do Porto, de 30/9/2014 e de 23/10/2014, e deste Tribunal da Relação de Lisboa, de 11/7/2013 (relatados, respectivamente, por Maria Amália Santos, por Pedro Martins e por Isabel Fonseca, todos disponíveis em www.dgsi.pt).

Assim, e nesta medida, há que concluir que a sentença recorrida não merece qualquer censura, já que a mesma determinou correctamente os danos a indemnizar ao A. pela R., nas suas diversas vertentes.

Ou seja, improcedem no seu todo quer as conclusões do recurso do A., quer as conclusões do recurso da R.

DECISÃO.
Em face do exposto julga-se improcedente quer o recurso do A., quer o recurso da R., mantendo-se a decisão recorrida.
Custas de cada um dos recursos pelo recorrente respectivo.



Lisboa, 1 de Março de 2018



António Moreira
Lúcia Sousa
Magda Geraldes