Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
162/13.7YUSTR.L1-5
Relator: JOSÉADRIANO
Descritores: CONTRA-ORDENAÇÃO
PRAZO DE DEFESA
ALTERAÇÃO DOS FACTOS
CULPA
CONCURSO DE INFRACÇÕES
NEGLIGÊNCIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/05/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: I - Recolhidos os indícios da prática de uma contra-ordenação e de quem foi o seu autor, a aplicação da respectiva coima ou de qualquer sanção acessória não é permitida sem que antes seja assegurada ao arguido «a possibilidade de, num prazo razoável, se pronunciar sobre a contra-ordenação que lhe é imputada e sobre a sanção ou sanções em que incorre», consagrando-se tal direito de audição e defesa no art. 50.º, do RGCO aprovado pelo DL n.º 433/82, de 27/10.

II - A norma do art.º 22.º da Lei n.º 99/2009 de 4/9 que prevê um prazo a fixar entre 10 e 20 dias úteis, para o infractor apresentar resposta escrita, juntar os documentos probatórios e arrolar testemunhas até ao máximo de 3 por infracção e requerer diligências de prova, não tem como pressuposto que a imputação seja por um só ilícito, pois nela se prevê expressamente a imputação de vários ilícitos em simultâneo, ao permitir que sejam indicadas três testemunhas por cada infracção.

III - Para o cabal exercício do direito de audição e defesa, basta que a arguida tome conhecimento da factualidade que lhe é imputada, quais as infracções que se considera estarem preenchidas e quais as sanções que lhe correspondem, com a menção das normas legais correspondentes, não tendo de ser indicada, naquele momento processual, a sanção concreta que a autoridade administrativa entende dever ser aplicada, pois muitos elementos de prova e vários outros factos novos podem ainda ser obtidos e apurados, nomeadamente com o contributo da defesa, com relevância para a determinação da sanção.

IV - Mesmo em processo criminal, em que as exigências e formalismos têm necessariamente de ser acrescidas dada a maior e incomparável gravidade das sanções correspondentes, nunca se ouviu defender a exigência de a acusação ter de propor a pena concreta que devia ser aplicada ao arguido.

V - Independentemente do meio ou da forma como vem ao conhecimento o cometimento da infracção, a autoridade administrativa competente tem o dever de agir, investigar, apurar as circunstâncias respectivas, quem foi o seu autor e proceder contra este, aplicando as respectivas sanções. A mesma entidade tem poderes de regulação/supervisão, de fiscalização e sancionatórios.

VI - Na ausência de normas específicas que regulem tal matéria no RGCO, terá de entender-se que são subsidiariamente aplicáveis as normas dos arts. 358.º e 359.º, do CPP, quando se provarem factos relevantes para a decisão da causa, diferentes dos imputados aos arguidos na “acusação”. No RGCO nada existe que possa indiciar que tal mecanismo não foi pretendido pelo legislador, ou que se mostre afastado por alguma norma ali consagrada, antes pelo contrário, normas há que pressupõem a sua aplicação subsidiária.

VII - Há que distinguir entre o termo da audiência e o encerramento da discussão a que se refere o art. 361.º, n.º 2, do CPP. Segundo este, encerrada a discussão - ou seja, finda a produção da prova, feitas as alegações orais e ou vido, a final, o arguido sobre o que tem a acrescentar em abono da sua defesa -, o Tribunal retira-se para deliberar.

VIII - É este o momento em que o julgador vai avaliar a prova produzida e tudo o que resultou da discussão da causa, para fixar a correspondente matéria de facto, determinando o que ficou provado e não provado. Só nesse momento é que há uma noção precisa dos factos que devem considerar-se provados e se estes representam ou não alguma alteração relativamente aos imputados na acusação.

IX - Se houver alteração fáctica relevante, para a mesma ser tomada em consideração na decisão impor-se-á o cumprimento do preceituado nos normativos em causa (art. 358.º, ou 359.º, consoante as circunstâncias), procedendo-se depois em conformidade, podendo até haver necessidade de ser retomada a produção da prova se novas provas tiverem sido indicadas aos novos factos por algum dos intervenientes, seguindo-se novas alegações e a deliberação, com a posterior leitura da sentença.

X - Em matéria de contra-ordenações não se pode falar de uma culpa como a jurídico penal, baseada numa censura ética, dirigida à pessoa do agente e à sua atitude interna, mas apenas de uma imputação do facto à responsabilidade social do seu autor.

XI - Concepção que tem consequências de vária ordem, desde logo ao nível da autoria, vigorando um conceito extensivo de autoria no âmbito da responsabilidade contra-ordenacional, conceito esse que conduzirá, em regra, à responsabilização da entidade sobre a qual recai o dever, sempre que se tenha verificado o resultado que aquela estava legalmente incumbida de evitar.

XII - Inexiste, em matéria de contra-ordenações, norma que preveja ou sequer tenha como pressuposto a existência de contra-ordenação na forma continuada.

XIII - Apesar de se verificarem, autonomamente, «seis violações ao artº 113º, nº 1, al. xxx), da Lei nº 5/2004», devem as mesmas, no entanto, enquadrar-se juridicamente «como uma única infracção», porquanto, «neste processo, todas as violações advêm de uma única e mesma falta de cuidado.

(sumário elaborado pelo relator)

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência, na 5.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório:
1. Em processo de contra-ordenação, a arguida A impugnou judicialmente a decisão administrativa do I (Autoridade Adminstrativa), que a havia condenado pela prática de vinte e sete contra-ordenações ao disposto no art. 113.º, n.ºs 1, al. xxx), 2 e 6, da Lei n.º 5/2004, de 10/02, na coima única de € 80 000,00 (oitenta mil euros)
Realizado o julgamento, pelo 1.º Juízo do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação, condenando a arguida nos seguintes termos (transcrição do respectivo dispositivo):
«Face ao exposto, o Tribunal decide:
- julgar improcedentes todas as nulidades invocadas pela Recorrente ;
- julgar improcedente a questão da alteração não substancial suscitada, não revogando o despacho;
- condenar a Recorrente pela prática de uma contraordenação, p.p. pelo art° 113°, n° 1, al. xxx) e n° 2 e 6 da Lei n° 5/2004, de 10 de Fevereiro ao pagamento da coima de € 20.000,00 (vinte mil euros);
-absolver a Recorrente das demais contraordenações imputadas;
- condenar a Recorrente ao pagamento das custas e demais encargos processuais, fixando-se a taxa de justiça em 4 Uc's.»


2. Inconformados, recorreram para este Tribunal da Relação de Lisboa:
a) A arguida A, formulando as seguintes conclusões (transcrição):
1. O presente recurso vem interposto da Sentença proferida em 28 de Abril de 2014, pela qual a Arguida foi condenada pela prática de um ilícito contraordenacional, previsto na alínea xxx) do n.º 1 do artigo 113.º da LCE e punível nos termos do n.º 2 do artigo 113.º da LCE, por suposto incumprimento da Deliberação da Autoridade Administrativa de 28 de Outubro de 2010, a título de negligência inconsciente, numa coima única de € 20.000,00 (vinte mil euros).
2. A Sentença deve ser declarada nula, porquanto o processo enferma de vício processual que devia ter obstado ao conhecimento do mérito da causa, dada a preterição do direito de defesa da Arguida em prazo razoável, o que representa violação do artigo 32.º n.º 10 da CRP e também do princípio da igualdade de armas previsto no artigo 13.º da CRP.
3. A Lei Quadro define no seu artigo 22.º que o prazo para exercício do direito de defesa é fixado entre 10 e 20 dias úteis.
4. Sucede que este preceito legal foi redigido tendo por base a perspetiva da preparação da defesa de um único ilícito ou, pelo menos, não terá sido certamente redigido para conformar a preparação da defesa quanto à imputação de mais de 80 ilícitos.
5. Tendo a Autoridade Administrativa decidido iniciar um processo de contraordenação para acusar pela alegada prática de mais de 80 ilícitos, tinha de conceder à Arguida um prazo razoável e adequado ao número de imputações a que tinha que se defender, o que não sucedeu no presente caso, em que a Autoridade Administrativa concedeu apenas 15 dias úteis, que posteriormente prorrogou apenas por mais 5.
6. É manifesto o desequilíbrio que existe nestes processos de contraordenação, nos quais a Autoridade que acusa se arroga a faculdade de demorar o tempo que entende para investigar ao mesmo tempo que não tem de notificar a Arguida com os elementos referidos na Acusação e indefere o prazo que lhe é requerido por ser o razoável para preparar e apresentar a defesa escrita.
7. A Sentença deve ser declarada nula, porquanto o processo enferma de nulidade por violação do princípio da presunção de inocência e pela não ponderação dos critérios respeitantes à coima na acusação, o que representa violação dos artigos 18.º e 50.º RGCO, 32.º n.º 2 da CRP e artigos 6.º n.º 2 e 48.º da Carta Europeia dos Direitos do Homem.
8. Ao contrário do que decidiu o Tribunal a quo, verifica-se que, neste processo, o direito de defesa da Arguida e o princípio da presunção de inocência foram preteridos, na medida em que a Acusação, em violação do disposto no artigo 50.º do RGCO, não continha uma concretização de todos os aspetos de facto necessários para o exercício de tal direito.
9. Na Acusação, a Autoridade Administrativa apresentou diversas conclusões e presunções que não assentavam em factos, mas em ideias pré-formadas daquela Autoridade Administrativa, que não corrigiu na decisão final.
10. A Autoridade Administrativa qualificou a conduta da Arguida como grave, mas fê-lo com base em circunstâncias abstratas, justificando-se na importância da ORAC e não por referência a circunstâncias concretas do comportamento da Arguida, nem com base em quaisquer consequências que do mesmo tivessem advindo.
11. A questão da imputação subjetiva tinha necessariamente de ser ponderada, porquanto o enquadramento subjetivo tem necessariamente repercussões ao nível da sanção que poderá vir a ser aplicada.
12. Revela-se essencial que, aquando do exercício do direito de defesa pela Arguida, esta tenha oportunidade de se pronunciar sobre o enquadramento subjetivo que a Autoridade Administrativa faz dos factos em causa.
13. A Acusação não continha qualquer especificação de factos relativamente a diversos critérios com influência na determinação da medida concreta da coima que a Autoridade Administrativa pretendia aplicar.
14. O artigo 50.º do RGCO impõe que ao arguido seja dada a possibilidade de se pronunciar sobre a contraordenação que lhe é imputada e sobre a sanção em que incorre.
15. Afigura-se perfeitamente claro que para que o arguido possa pronunciar-se de forma adequada sobre a sanção em que incorre, a Autoridade Administrativa deve (i) indicar qual o valor da coima que projeta aplicar e (ii) apresentar factos e elementos de prova relativamente aos fundamentos que a levaram a planear aplicar essa sanção, ou seja, a Autoridade Administrativa deve analisar na Acusação os critérios enunciados no artigo 18.º do RGCO.
16. A Sentença deve ser declarada nula, porquanto o processo enferma de vício processual que devia ter obstado ao conhecimento do mérito da causa, dada a ininteligibilidade da acusação, que acarreta a nulidade da Sentença, nos termos do artigo 50.º do RGCO, artigo 283.º, n.º 3, do CPP e artigos 18.º, n.º 1, e 32.º, n.º 2 e n.º 10 da CRP.
17. A A deparou-se com gravíssimas dificuldades na preparação da sua defesa, resultando algumas dessas dificuldades do facto de diversas questões relativas a matérias fundamentais em apreciação neste caso serem apresentadas pela Autoridade Administrativa na Acusação de forma absolutamente ininteligível.
18. Não foi possível à Arguida compreender o iter cognoscitivo da Autoridade Administrativa na Acusação no que respeita ao número de infrações que esta Autoridade considerou que a A praticou.
19. Nessa medida a Arguida não pôde defender-se convenientemente de 82 infrações que lhe estavam a ser imputadas sem compreender os factos que deram origem a tal imputação pela Autoridade Administrativa.
20. As inconsistências e imprecisões da acusação impediram a A de refutar cabalmente as imputações que lhe foram dirigidas, em relação a muitas das quais não conseguiu sequer perceber os termos em que se encontravam formuladas.
21. Do exposto resulta que não foi plenamente assegurado à A o exercício do seu direito constitucional e legal de defesa no âmbito de um processo de contraordenação, o que constitui mais uma nulidade insanável.
22. Em suma, não foram fornecidos à A os elementos necessários para conhecer todos os aspetos relevantes para a decisão final, quer em termos de facto, quer em termos de Direito, sendo a transmissão desses elementos essencial para o cabal exercício do respetivo direito de defesa (cfr. a Jurisprudência uniformizada do Assento n.º 1/2003 do Supremo Tribunal de Justiça, in Diário da República, I Série-A, n.º 21, de 25 de Janeiro de 2003, pp. 547-558).
23. A Sentença deve ser declarada nula por violação do princípio da separação de poderes e do processo justo e equitativo, nos termos do artigo 2.º, 20.º n.º 4 da CRP, artigo 10.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 47.º 2.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.
24. A prossecução das funções e o uso dos poderes sancionatórios da Autoridade Administrativa  encapotados no âmbito de um processo de fiscalização constituem uma violação do princípio da separação de poderes, ínsito no artigo 2.º da CRP.
25. O princípio da separação de poderes enquanto pilar do Estado de Direito (com assento no artigo 2.º da CRP) é crucial para o saudável funcionamento do sistema de garantias constitucionais.
26. Segundo este princípio, deve a atuação das autoridades reguladoras independentes ser de molde a não o desvirtuar através da forma do exercício dos poderes que lhes são conferidos pelo legislador.
27. Muito embora enquadrados formalmente nos poderes de supervisão, os poderes de fiscalizar e de sancionar revestem naturezas diferentes e, por isso, o respetivo exercício também se encontra sujeito a regras diferentes: o exercício dos primeiros regula-se essencialmente pelo Direito administrativo ao passo que o exercício dos segundos se enquadra nas regras aplicáveis aos processos sancionatórios.
28. O que se verificou no presente processo é que não foram integralmente respeitadas tais regras nem observados tais princípios, porquanto a Autoridade Administrativa conduziu um processo de fiscalização quando, na verdade, encontrava-se a investigar suspeitas da prática de infrações pela A.
29. A atuação da Autoridade Administrativa acima descrita viola, para além do princípio da separação de poderes, o direito a um processo equitativo, ínsito no artigo 20.º, n.º 4 da CRP, no artigo 10.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, no artigo da 6.º Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artigo 47.º, § 2.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.
30. A garantia de um processo equitativo é um dos princípios estruturantes do processo, e tem um particular destaque no âmbito do exercício da ação sancionatória.
31. O presente processo de contraordenação – na decorrência da violação do princípio da separação de poderes, ou seja, pela instrução de uma investigação sem que fossem asseguradas à Arguida as garantias que lhe assistem nessa qualidade – não foram cumpridas as exigências decorrentes do princípio do processo equitativo e do princípio da lealdade processual.
32. A condução do presente processo de contraordenação pela Autoridade Administrativa foi feita com total promiscuidade das suas funções de fiscalização e sancionatórias, através da prossecução da função de investigação em sede contraordenacional sob a capa das suas competências de fiscalização.
33. A Autoridade Administrativa conduziu o presente processo de uma forma pouco transparente e pouco neutral, tendo decidido a amostra, os locais e as situações a fiscalizar mediante indicações dos concorrentes da A, a sua solicitação.
34. Toda a fase de análise dos elementos recolhidos em sede de fiscalização, de investigação e de elaboração da Acusação foi feita sem que tivesse sido instaurado o competente processo de contraordenação.
35. A instrutora do processo que elaborou a proposta de Acusação, fê-lo sem que tivesse sido ainda investida de poderes para instruir o presente processo, tendo, em simultâneo, proposto que a mesma fosse deduzida e que fosse nomeada como instrutora do processo.
36. A investigação de uma suspeita da prática de qualquer ilícito contraordenacional deve dar lugar à instauração do competente processo de contraordenação, que prossegue a função de investigação e sancionamento de infrações e não – como no presente caso – a um processo de fiscalização, que serve o propósito de fiscalização do cumprimento das regras, sem que se suspeite (nem que seja expectável) que as mesmas estão a ser incumpridas.
37. A Sentença é nula por nela o Tribunal a quo ter interpretado preceitos legais de forma inconstitucional, nos termos dos artigos 32.º n.ºs 5 e 10 e 205.º n.º 1 da CRP.
38. No presente processo foram preteridos vários direitos fundamentais da Arguida.
39. O processo que dá causa ao presente enferma, efetivamente e indubitavelmente de gravíssimos atropelos a direitos fundamentais dos arguidos aplicáveis em sede de processos de contraordenação, pelo que não pode deixar de realçar tais violações, que poem em causa a Sentença e comprometem a validade de todo o processo.
40. Foi, desde logo, preterido o direito de defesa da Arguida decorrente do artigo 32.° da CRP, do artigo 50.° do RGCO e do artigo 22.º da Lei Quadro.
41. Os arguidos têm de ter a possibilidade de se defenderem como devem, ou seja, através da salvaguarda de todos os direitos que constitucionalmente lhe assistem, sob pena de nulidade de todo o processo.
42. É essa a conclusão que se extrai do Assento nº 1/2003 do Supremo Tribunal de Justiça, publicado no Diário da República, Série I em 25 de janeiro de 2003, invocado na DI, no qual se refere expressamente que nos casos em que tal nulidade seja considerada fundada, “o tribunal invalidará a instrução administrativa” a partir do momento em que o vício se produziu “e também, por dela depender e a afetar, a subsequente decisão administrativa [artigos 121.º, n.ºs 2, alínea d), e 3, alínea c), e 122.º, n.º 1, do Código de Processo Penal e 41.º, n.º 1, do regime geral das contraordenações]”.
43. Para além de estarem em causa nulidades que determinam a violação de preceitos constitucionais, tal como acima assinalado, a Autoridade Administrativa teve oportunidade de corrigir a sua acusação e não o fez.
44. A preterição do direito de defesa do arguido e da presunção de inocência corresponde a um vício de natureza substantiva e não meramente processual, afetando o núcleo essencial dos direitos dos arguidos
45. Por essa razão, desde logo, não poderia a preterição de tal direito e de tal princípio reconduzir-se a uma mera nulidade sanável pelo exercício ainda que meramente formal dos direitos de defesa, conforme o Tribunal a quo parece entender.
46. A preterição de direitos e princípios aplicáveis aos arguidos que encontram proteção constitucional – como é o caso das nulidades invocadas pela aqui Arguida, nomeadamente em termos de preterição do direito de defesa - devem configurar nulidades insanáveis.
47. Deve concluir-se que foram violados direitos fundamentais consagrados no artigo 32.º da CRP e que tal violação redunda numa nulidade insanável, nulidade essa que desde já vem arguir-se para todos os efeitos legais, correspondendo à falta de fundamentação da Decisão da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, em violação direta do disposto nos artigos 205.º n.º 1 da CRP, 58.º n.º 1 alínea b) do RGCO e 374.º n.º 2 e 379.º n.º 1 alíneas a) e b) do Código de Processo Penal.
48.  Sendo inconstitucionais por violação dos artigos 32.º n.ºs 5 e 10 e 205.º n.º 1 da CRP as normas correspondentes ao artigo 50.º do RGCO na interpretação de que não é necessário a autoridade administrativa relevante (i) fundar a sua Acusação em concretos factos, bastando-se com a aplicação de conceitos por si definidos e interpretados de acordo com teorias e com meros exercícios de raciocínio; (ii) dar ao arguido a oportunidade de se pronunciar convenientemente sobre os novos factos e respetivo enquadramento constantes da Acusação antes de ser proferida decisão final, apresentando a sua versão dos mesmos; (iii) dar ao arguido a oportunidade de contraditar convenientemente todos os elementos constantes do processo; (iv) dar ao arguido a oportunidade de se pronunciar convenientemente sobre a versão e o enquadramento jurídico que a autoridade administrativa pretenda aplicar aos factos que estão na origem da censura que se pretende fazer ao arguido; e/ou (v) dar ao arguido a oportunidade de se pronunciar convenientemente sobre a sanção (ou sanções) que a autoridade administrativa considera dever ser aplicada ao arguido no caso concreto antes da respetiva condenação.
49. A Sentença é nula por nela terem sido utilizados para condenar a Arguida factos introduzidos na sequência de uma alteração inadmissível dos factos após o encerramento da audiência, tendo o Tribunal incorrido em erro de direito por ter aplicado de forma incorreta o disposto nos artigos 41.º n.º 1 do RGCO e 358.º, 361.º e 371.º do CPP.
50. Com efeito, o Tribunal a quo aplicou o disposto no artigo 358.º n.ºs 1 e 3 do CPP após o encerramento da audiência, desrespeitando o mencionado normativo bem como os artigos 361.º e 371.º do CPP.
51. Findas as alegações, o Tribunal não proferiu a Sentença, tendo determinado a reabertura da audiência para proferimento de despacho de alteração não substancial de factos.
52. O Tribunal reabriu a audiência para aditar novos factos com impacto nas matérias da tipicidade e da ilicitude, o que, portanto, não é, salvo o devido respeito, admissível.
53. Os artigos 358.º, 361.º e 371.º do CPP são inconstitucionais na interpretação feita pelo Tribunal, em violação do disposto nos artigos 20.º e 32.º n.º 10 da CRP, ao permitir que, finda a produção de prova e encerrada a discussão, seja feita a reabertura da audiência para fins diferentes dos previstos nos artigos 371.º e 369.º n.º 2 do CPP.
54. O instituto de alteração dos factos (substancial ou não), previsto nos artigos 358.º e 359.º do CPP, não é passível de aplicação subsidiária aos processos contraordenação.
55. A alteração dos factos pelo Tribunal no decurso da audiência contende de forma evidente com o direito de defesa do arguido, que se vê na necessidade de reponderar a sua estratégia de defesa, ainda para mais quando em processos de contraordenação não é possível recorrer para o Tribunal da Relação quanto à matéria de facto, prevista no artigo 75.º do RGCO.
56. O Tribunal a quo desvalorizou a questão e invocou, simplesmente, que “os princípios que enformam o Processo Penal são transponíveis de uma forma menos acentuada para o Processo Contraordenacional”.
57. Ora, precisamente por esse motivo – e para assegurar ao arguido em processo de contraordenação o núcleo essencial do direito ao recurso (a um único grau de recurso) – terá de considerar-se que a factualidade relevante imputada ao arguido em cada processo fica estabilizada com a decisão da autoridade relevante, da qual o arguido poderá recorrer, por discordar do entendimento quanto à prova ou não prova de tais factos ou quanto à não subsunção dos mesmos no tipo contraordenacional em causa, para um tribunal.
58. Na ausência de norma específica no RGCO e no DL 17/91, não podem ser aplicados os artigos 358.º e 359.º do CPP ao processo de contraordenação, por contenderem com regras específicas previstas no RGCO, como seja a impossibilidade de recurso da decisão do tribunal de primeira instância quanto à matéria de facto, pelo que o Tribunal a quo violou os artigos 2.º e 20.º da CRP.
59. A Sentença deve ser revogada porquanto não poderia ter sido exigida à Recorrente conduta diversa, pelo que foi violado o artigo 1.º do RGCO, artigo 40.º n.º do Código Penal.
60. O Tribunal a quo condenou a Recorrente tendo por base a alegada verificação de seis desconformidades entre os dados do terreno e a informação constante da Extranet ORAC, condenando a Recorrente pela prática de uma infração ao artigo 113.º, n.º 1, alínea xxx) da LCE.
61. No entender do Tribunal a quo, a Recorrente atuou com falta de cuidado.
62. Identificou o Tribunal a quo essa falta de cuidado na “confiança nos terceiros” e na “falta de verificação das informações que estes prestam”.
63. A Recorrente não pode aceitar tal conclusão do Tribunal a quo, na medida em que a Deliberação da Autoridade Administrativa que está em causa nos autos como alegadamente violada pela A não impõe, em ponto algum, à A a obrigação de verificar as informações que lhe são prestadas por terceiros.
64. Para além de a tal não estar obrigada, também não é exigível impor à A que verifique por mero “especial” dever de cuidado a informação que lhe é prestada por terceiros.
65. De acordo com o disposto no artigo 1.º do RGCO, para que um facto constitua contraordenação, é necessário que preencha um tipo legal no qual se comine uma coima, e que esse facto seja ilícito e censurável.
66. Para condenar a Arguida – como fez o Tribunal a quo - teria de ter ficado demonstrado – sendo que não ficou – que o comportamento da Arguida se enquadra no tipo objetivo do ilícito em causa – no presente caso o tipo revelado pelo artigo 113.º n.º 1 alínea xxx) da Lei n.º 5/2004 – bem como que a Arguida teria agido culposamente.
67. A Arguida atuou sem culpa e o seu comportamento não revela desrespeito pela ordem jurídica em geral nem pelas obrigações impostas em matéria de ORAC em particular.
68. A Arguida sempre orientou a sua conduta para o cumprimento das obrigações regulamentares e impostas pelas Deliberações da Autoridade Administrativa em matéria de ORAC, mesmo nos casos em que com elas não concordou.
69. A A criou e organizou os seus sistemas informáticos por forma a garantir que a informação residente nos mesmos era disponibilizada, com o grau de detalhe exigido pela Autoridade Administrativa, a todas as beneficiárias da ORAC.
70. A A também definiu procedimentos para a inserção de informação no cadastro, tendo em vista garantir a fiabilidade e correção dos dados constantes da Extranet.
71. A informação de que a A dispõe, no caso de eventuais informações erróneas ou atrasos no envio de informação, é a mesma de que dispõem as beneficiárias da ORAC, pelo que inexiste qualquer afetação do princípio da equivalência que subjaz à definição das obrigações de disponibilização de informação.
72. Não se pode exigir à A um grau de correção e fiabilidade de informação constante da Extranet equivalente em absoluto à realidade.
73. Ficou evidenciado que não só o comportamento da Arguida demonstra a sua total adesão às obrigações impostas ao nível da ORAC, como não pode tal comportamento ser censurado, mesmo nas situações em que eventualmente existam desconformidades na informação disponibilizada na Extranet, porquanto não existe comportamento alternativo adequado a evitar tais pontuais desatualizações.
74. Não era exigível que a Arguida adotasse um comportamento diferente daquele que adotou no que respeita ao cumprimento da Deliberação de 28 de outubro de 2010.
75. Assim, no mínimo, a inexigibilidade da adoção de comportamento diverso pela Arguida funciona como causa de exclusão de culpa e conduz à sua não responsabilização.
76. Impõe o princípio da culpa, ínsito no artigo 40.º n.º 2 do Código Penal, aplicável por força do disposto no artigo 32.º n.º 2 do RGCO, que a medida da pena tem como limite a medida da culpa do agente.
77. Estando a culpa relacionada com a censurabilidade da conduta do agente, a mesma estará excluída sempre que ocorrerem situações que sejam reconduzíveis a causas de exclusão da culpabilidade, nomeadamente aquelas que determinam a inexigibilidade de comportamento diverso ao agente.
78. A Sentença deve ser revogada por ter condenado a Arguida em coima desproporcional face à factualidade em causa e, sobretudo, face ao nível de culpa que constatou ter a A, o que resulta na violação do artigo 18.º do RGCO e do princípio da proporcionalidade das penas previsto no artigo 18.º, n.º 2, da CRP.
79. O Tribunal a quo considerou que “perante os resultados múltiplos decorrentes da prática desta contraordenação, esta assume uma gravidade relevante, que afasta a aplicação de uma admoestação” (sublinhado nosso).
80. Contudo, é forçoso concluir que não existe gravidade na atuação da A ou que, a existir – o que não se admite – é manifestamente reduzida.
81. Ficou demonstrado – como reconhece o Tribunal a quo – que a conduta da A não causou prejuízos às beneficiárias da ORAC.
82. Ademais, em face do número de condutas existente na cidade de Lisboa e em todo o país e ainda ao número de CVPs fiscalizadas, relativamente às quais nenhuma desconformidade ficou provada, terá de entender-se que a pouca expressão e o carácter pontual dos ilícitos imputados à A, bem como a sua culpa diminuta, conduzem ao entendimento de que a sua conduta é pouco grave.
83. A Arguida sempre pugnou pelo cumprimento das normas e deliberações da Autoridade Administrativa, nomeadamente através da imediata retificação da informação da Extranet, quando necessário, pelo que a conduta aqui em causa, teria de ser considerada de gravidade diminuta.
84. A A utiliza a melhor tecnologia ao seu alcance, formando especificamente os seus colaboradores sobre esta matéria, estabelecendo procedimentos rigorosos para a transmissão de informação necessária à atualização do cadastro, tendo equipas que realizam operações de verificação no terreno sempre que alguma desconformidade é reportada ou há suspeita da mesma, a Arguida colocou os seus melhores meios e desenvolveu todos os esforços que lhe eram exigíveis, tendo em vista evitar a existência de informação desatualizada na Extranet.
85. Como decorre do n.º 2 do artigo 40.º do CP e do 18.º n.º 2 da CRP, as penas têm finalidades de prevenção geral e especial, sendo o respetivo limite inultrapassável a culpa, e sendo a culpa o suporte axiológico-normativo da sanção.
86. Tendo a Arguida sido punida – ainda que erradamente – determina o princípio da necessidade das penas (que resulta da aplicação do n.º 2 do artigo 18.º da CRP) que para a medida da pena ser proporcional e adequada à culpa têm que ser ponderadas todas as circunstâncias que rodearam o comportamento da Arguida e que foram elencadas e desenvolvidas ao longo do presente recurso.
87. Entende ainda a Recorrente que o Tribunal a quo não ponderou corretamente o carácter absolutamente alheio à A das situações que originaram os factos que são imputados à Arguida como ilícitos contraordenacionais, porquanto, caso o tivesse feito, não teria determinado a aplicação a um arguido “primário” nestas matérias, o montante de coima que aplicou.
88. Acresce ainda que a coima aplicada é manifestamente desproporcional face ao número de ilícitos – um – em que a A foi condenada, tendo em consideração que vinha condenada por 27 ilícitos.
89. Atendendo à absolvição da A da prática de 26 ilícitos, restando apenas 1, não se compreende a redução para apenas um quarto da coima inicialmente aplicada.
90. Por último, ainda que o Tribunal a quo tivesse entendido que o comportamento da A e foi censurável – o que não se admite –, sempre a circunstância de ser inexigível comportamento diverso à Recorrente deveria determinar uma redução relevante da pena, por força do princípio da proporcionalidade, na medida em que o mesmo postula a adequação da pena imposta à gravidade dos factos apurados, de molde a que a medida punitiva a aplicar seja aquela que, sendo idónea aos fins a atingir, se apresente como a menos gravosa para o arguido, em decorrência ou emanação também do princípio da intervenção mínima ligado ao princípio da liberdade.
91. Considera-se – por mera cautela de patrocínio – que, a aplicar-se uma sanção, tal deveria ter-se limitado a uma admoestação, a única sanção adequada e proporcional ao presente caso, na medida em que: (i) se verificam diversos fatores que não foram ponderados para efeitos de determinação da gravidade da conduta da Arguida, mas que se o tivessem sido necessariamente teriam conduzido à conclusão que a conduta da Arguida não poderia ser qualificada como um a infração grave; e que (ii) a culpa da Arguida, a existir, o que não se concede, seria diminuta.

b) O I… - AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, assim concluindo a respectiva motivação (transcrição):
I. A prática pela arguida dos factos descritos no §5 da motivação do recurso, que aqui se dão por reproduzidos, representa, contrariamente ao entendido na douta sentença, e nos termos do Art. 1.º n.º 2 da Lei n.º 99/2009, de 4 de Setembro, uma contra-ordenação do sector das comunicações, para efeitos daquela lei, por se tratarem de factos ilícitos e censuráveis que preenchem um tipo legal correspondente à violação de disposições legais e regulamentares relativas ao sector das comunicações, para as quais se comine uma coima, cujo processamento e punição seja da competência do I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA;
II. Concretamente, o incumprimento da seguinte deliberação da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA de 28/10/2010, que determina: “D 5. A informação a disponibilizar na Extranet consiste na informação que a A se propôs introduzir, incluindo necessariamente os seguintes elementos: (a) perfil da conduta (com a representação da formação dos tubos entre CV’s adjacentes), permitindo a indicação do(s) tubo(s) a ocupar; (b) informação indicativa da ocupação dos troços de conduta, com base num sistema com pelo menos quatro níveis (intervalos) de ocupação (em %); (c) informação sobre a secção total, em cm, dos troços de conduta correspondendo à totalidade dos tubos do troço de conduta”.
III. Infracção essa p e p elo artº 113º, nº 1, al. xxx), da Lei nº 5/2004, de 10/02 (na versão anterior às alterações introduzidas pela Lei nº 51/2001). Porquanto,
IV. Contrariamente ao entendimento expresso na douta sentença recorrida, os lapsos verificaram-se pela omissão pela arguida do dever de cuidado a que estava obrigada e de que era capaz.
V. Muito embora o Douto Tribunal a quo haja entendido, naqueles casos afastar a responsabilidade da arguida, por não se terem determinado as concretas razões que conduziram à não atualização da informação cadastral, apontando até, como possíveis causas lapsos dos respetivos serviços ou funcionários ou prestação de informação errada por parte de outro operador, certo é que,
VI. Essas falhas hipotéticas sempre lhe seriam imputáveis porquanto;
a. Em matéria de responsabilidade contra-ordenacional das pessoas coletivas, a Lei n.º 99/2009, de 04.09, prevê, no seu artigo 3º, um amplíssimo regime de sancionamento das mesmas:
b. Pela prática das infracções a que se refere o presente regime podem ser responsabilizadas pessoas singulares ou colectivas, ainda que irregularmente constituídas e associações sem personalidade jurídica.
c. As pessoas colectivas referidas no número anterior são responsáveis pelas infracções cometidas em actos praticados em seu nome ou por sua conta, pelos titulares dos seus órgãos sociais, pelos titulares dos cargos de direcção e chefia e pelos seus trabalhadores no exercício das suas funções, bem como pelas infrações cometidas por seus mandatários e representantes, em actos praticados em seu nome e por sua conta.
VII. E, se nos termos deste regime contra-ordenacional especial, a responsabilidade das pessoas coletivas só é excluída quando o agente atue contra ordens ou instruções expressas da pessoa coletiva (cfr. artigo 3º, n.º 3) a mera constatação hipotética de que poderiam ter ocorrido de falhas, só por si, é totalmente irrelevante e não consentiria a absolvição da arguida;
VIII. A empresa é responsável pelos actos e omissões do(s) seu(s) dirigente(s) ou trabalhadore(s), nessa responsabilidade se incluindo o deficiente desempenho no cumprimento dos exigíveis parâmetros públicos de serviço - o não cumprimento desse dever implica a responsabilidade da arguida, de forma imediata: é uma imputação directa, que existe logo que se estabeleça um nexo causal entre a arguida e o acto ilícito e se não prove a exclusão da sua responsabilidade;
IX. Acresce que embora o Douto Tribunal a quo tenha tido sempre por referência, na avaliação da culpa da arguida, o facto de a mesma deter 250.000 caixas de visita e de passagem na totalidade do território nacional, num universo de 14 caixas em causa no presente recurso, das 33 visitadas pela AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, referentes à área da grande Lisboa, o Tribunal detetou 7 – metade! - em que ocorreram lapsos, o que demonstra de modo suficiente que tais lapsos estão longe de ser pontuais e, a admitirem-se como legítimos, não permitirão o cumprimento do desígnio subjacente à imposição da obrigação de atualização do cadastro imposta pela ORAC;
X. Considerou o Tribunal que se verificavam apenas 6 violações ao artº 113º, nº 1, al. xxx), da Lei nº 5/2004, mas que estas correspondiam a uma só infracção consistente numa mesma falta de cuidado;
XI. Tal entendimento viola os Art.s 30.º n.º 1 e 2 do CPP e o Art. 1.º n.º 2 da Lei  n.º 99/2009 de 4 de Setembro, porquanto:
a. Se não verifica qualquer conexão relevante que se aproximasse da definição de crime continuado prevista no Art. 30.º n.º 2 do CPP, em particular;
b. se não vislumbra da factualidade provada qualquer solicitação exterior que diminua a culpa do agente – situação que deve ser factual, não pode ser meramente hipotética ou pressuposta, até porque se deverá reflectir como uma diminuição da culpa no caso concreto.
XII. Também, conforme se reconhece na douta Sentença recorrida, impõe-se à Recorrente que efetue os esforços necessários a que a Extranet ORAC represente o que se encontra no terreno (cfr. pág. 103).
XIII. A arguida tinha, necessariamente, conhecimento e capacidade para levar a cabo o procedimento para cumprir o determinado (considerou-se capaz de verificar todas as caixas em 3 anos), tal como sabia que o incumprimento de uma ordem ou instrução regularmente notificada do Regulador era punível como contraordenação;
XIV. A arguida tinha igualmente consciência de que a informação cadastral constante da Extranet ORAC nem sempre corresponde à que se encontra no terreno. A este propósito, tenha-se em consideração a factualidade provada no ponto 46 da douta Decisão recorrida: a arguida tinha conhecimento, em 2011, que vários operadores tinham informado incorretamente sobre as operações realizadas nas condutas da Recorrente.
XV. Não obstante, e conforme ficou igualmente provado no ponto 43 da douta Sentença recorrida, «Quando os operadores (ou os construtores) concluíam a intervenção nas condutas da Recorrente, esta não vistoriava (com fiscais qualificados para o efeito, nem por qualquer outro funcionário), no local, sobre se a intervenção realizada era a mesma que lhe tinha sido comunicada, entendendo a Recorrente que se existisse alguma desconformidade, acabaria por ter conhecimento mais tarde, quando novas intervenções fossem solicitadas, por outros operadores, no local».
XVI. Representou por isso a possibilidade do facto que preenche um tipo legal de contraordenação, não tendo diligenciado, como podia e devia, de modo a evitar o resultado típico. Assim,
XVII. A culpa da arguida na prática das infrações pelas quais foi condenada pelo Douto Tribunal a quo não se pode qualificar como negligência inconsciente, tendo a douta Sentença recorrida, também neste aspeto, incorrido em erro de julgamento, e devendo, por isso, ser corrigida.
Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, deverão V.Exas. revogar a decisão sob recurso, substituindo-a por outra que, por um lado, impute à arguida a responsabilidade pela prática das infrações identificadas no ponto 5 desta motivação e, por outro, no que se refere às infracções pelas quais a mesma deva ser condenada, altere a qualificação da modalidade da culpa, o que terá reflexos na coima única aplicada, pelos motivos melhor explicitados na MOTIVAÇÃO que antecede, assim se fazendo JUSTIÇA!

3. Admitidos os recursos, responderam:
3.1. O MP, a ambos os recursos, concluindo do seguinte modo:
3.1.1. Ao recurso da A:
1- Nos termos do art.º 75.º, n.º1 do RGCO, o presente recurso é restrito à matéria de direito, pelo que, os factos considerados provados não podem ser alterados pelo Tribunal Superior, sem prejuízo dos vícios de conhecimento oficioso a que se refere o art.º 410.º n.º 2 do Código de Processo Penal.
2- Por força do disposto no artigo 22.º da Lei n.º 99/2009, de 4/09, alterada pela Lei n.º 46/2011, de 24/ 06 o prazo a conceder para dedução da defesa, na sequência da acusação, é um prazo entre 10 a 20 dias.
3- A AUTORIDADE ADMINISTRATIVA respeitou integralmente a supra citada disposição legal, concedendo o prazo máximo legalmente fixado para a Recorrente se pronunciar acerca das condutas que lhe são imputadas.
4- Prazo esse que não poderá deixar de se considerar razoável e adequado, “ pois não há razões para o arguido ter mais tempo para presentar a sua defesa no processo contra-ordenacional do que aquele de que dispõe no processo-crime para contestar”.
5- A lei, no caso concreto, não fixa qualquer prazo de duração máxima para a investigação e instrução do processo definindo apenas o que entende por tempo razoável, ao indicar os prazos de prescrição do procedimento contra-ordenacional.
6- Não se verifica qualquer violação do do artigo 32.º n.º 10 e 13.º da CRP.
7- A ratio do artigo 50.º do RGCO é dar a conhecer ao arguido as razões pelas quais lhe é imputada a prática de determinada contraordenação, e consequentemente, as sanções que incorre, de modo que este, lendo a notificação, se possa aperceber, de acordo com os critérios de normalidade de entendimento, das razões pelas quais lhe é imputada tal contraordenação e, assim, possa defender-se.
8- O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2003, de 28/11/2002, fixa jurisprudência no sentido de ao arguido terem de ser dados a conhecer todos os “elementos necessários para que este fique a conhecer a totalidade dos aspectos relevantes para a decisão, nas matérias de facto e de direito”, para que o arguido, conhecendo toda a factualidade que lhe é imputada, possa exercer devidamente o seu direito de defesa, mas não obriga a que a indicação das provas e os critérios a atender para graduação da coima conste expressamente da notificação a que alude o artigo 50.º do RGCO.
9- Não se verifica qualquer nulidade, por violação do princípio de presunção de inocência, ou de qualquer outro preceito constitucional ou convenção europeia.
10-  A Acusação mostra-se suficientemente concretizada e fornece todos os elementos necessários ao cabal exercício do direito de defesa, contrariamente ao alegado pela Recorrente.
11- Mas, mesmo que assim não se entendesse, verificando-se que a Recorrente se defendeu relativamente a todas as matérias, sempre se teria que considerar que o vício invocado se mostraria sanado, em razão da jurisprudência fixada no Assento n.º 1/2003 do STJ (publicado no DR, I série-A, n.º 21, de 25-01-2003), onde se decidiu:“(…) Todavia, se o impugnante se prevalecer na impugnação judicial do direito preterido (abarcando, na sua defesa, os aspectos de facto ou de direito omissos na notificação mas presentes na decisão/acusação), a nulidade considerar-se-á sanada [artigos 121.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal e 41.º, n.º 1, do regime geral das contra-ordenações…”
12- A AUTORIDADE ADMINISTRATIVA é uma entidade administrativa independente de regulação e de supervisão, que atua no sector das telecomunicações, tendo competências para fiscalizar o cumprimento da lei e dos regulamentos aplicáveis no sector das comunicações, bem como para instaurar e instruir os processos sancionatórios e punir as infrações que sejam da sua competência, estando os seus atos sujeitos ao controlo dos Tribunais.
13- Inexiste qualquer nulidade por violação do princípio da separação de poderes e do processo justo e equitativo.
14- «O regime da alteração dos factos na audiência de julgamento no processo contra-ordenacional rege-se por critérios distintos dos previstos nos artigos 358.° e 359.° do CPP, uma vez que o tribunal procede a uma renovação da instância com base na remessa dos autos e não a uma mera reforma da decisão administrativa recorrida, devendo por isso ter em conta toda a prova já produzida nos autos e a que vier a ser produzida na audiência de julgamento, bem como todos os factos que dela resultem, mesmo que não tenham sido incluídos na decisão administrativa recorrida ou não tenham sido invocados pela defesa diante da autoridade administrativa.»
15- “No processo de impugnação judicial de decisão da autoridade administrativa que impôs uma coima, o juiz pode apurar novos factos sem vinculação ao texto da decisão impugnada, apenas com o limite de não poder alterar substancialmente os factos constantes dessa decisão”.(cfr. Ac. da Relação de Coimbra, de 4/10/2006, consultável em www.dgsi.pt)
16- “«A expressão do art. 358º, nº 1, do CPP - «no decurso da audiência» - abrange todo o período que vai da respectiva abertura até à leitura da sentença. Só com tal leitura é que fica precludida a possibilidade de o tribunal proceder à alteração dos factos nos termos dos arts. 358º e 359º, do CPP” (cfr. Ac. da Relação de Lisboa, de 7/09/2010, no Proc. 1511/10.04PBXL.L1-5, consultável em www.dgsi.pt).
17- «(…) na medida em que foi ainda no decurso da audiência que a Mmª Juiz a quo procedeu ao cumprimento do previsto no citado artº 358º, nºs 1 e 3, do CPP – ou seja, antes da publicação da sentença final, determinando a sua continuação. Com esta interpretação do nº 3 do artº 358º do CPP, a Mmª Juiz a quo agiu em conformidade e tendo em devida conta os princípios e normas constitucionais, mormente o exercício do direito de defesa - cfr. artº 32º, nº 1, da CRP» (cfr. Ac. da Relação de Lisboa de 6/12/2006-proc.7029-3, consultável em www.dgsi.pt).
18- O Tribunal a quo deu criterioso cumprimento ao disposto no art.º 358.º n.º 1 do CPP antes da leitura da sentença, mostrando-se devidamente asseguradas as garantias de defesa da Arguida e o contraditório, não tendo incorrido em qualquer erro de direito.
19- Os factos relativos ao elemento subjectivo estão assentes e de forma definitiva, uma vez que pela Arguida não vem invocado qualquer dos vícios que, excepcionalmente permitem e admitem o conhecimento da matéria de facto.
20- A admoestação, prevista no artigo 51° do R.G.C.O., é aplicada nos casos de reduzida gravidade da infracção e da culpa do agente, o que, manifestamente, não se verifica no caso em apreço, não se mostrando adequada a sua aplicação.
21-  A coima aplicada mostra-se justa, equilibrada e proporcional, não se vislumbrando que o Mmo Juiz a quo tenha feito qualquer errada interpretação dos normativos em presença em razão da sua aplicação à base fáctica dada como provada.
22- No caso em apreço não existem circunstâncias excepcionais que diminuam por forma acentuada a ilicitude dos factos, a culpa do Arguida ou a necessidade de coima.
23- As circunstâncias atenuantes foram devidamente valoradas pelo Tribunal a quo, pelo que a coima aplicada não deve sofrer qualquer redução.
24- A douta sentença recorrida fez boa apreciação dos factos e do direito, não se mostrando violado qualquer preceito legal.
Em face do exposto, deverá ser negado provimento ao recurso e confirmada a douta decisão recorrida.

3.1.2. Ao recurso de I- AUTORIDADE ADMINISTRATIVA:
1- Os factos provados da decisão recorrida mostram-se comprovados de acordo com as regras da experiência, a lógica e o estado actual do conhecimento e valorados de acordo com a livre apreciação do julgador;
2- A arguida foi condenada por uma contra-ordenação assente num único juízo de censura pela violação plúrima do mesmo dever legal
3- A culpa contra-ordenacional funda-se num juízo de censurabilidade pelo exercício deficiente da responsabilidade social do agente económico, na sua relação com o bem jurídico tutelado;
4- No processo da contra-ordenação não rege o instituto da responsabilidade objectiva (cfr. art.º 8.º, n.º 1, do RGCO), pelo que na parte da absolvição, bem andou o Tribunal, por não ter sido apurado nos autos, seja na fase administrativa, seja na fase judicial, o concreto conteúdo material da violação do dever de cuidado que conforma a actuação negligente;
5- A responsabilidade das pessoas colectivas, nos termos em que é explicitada no recurso da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, excede o objecto dos autos;
6- Está vedado à recorrente a alteração da base factual, com a  introdução de novos factos relativos à negligência consciente, tanto mais que os factos integradores do dolo e da negligência configuram matéria de facto, pois caracterizam uma determinada conduta interna.
Termos em que deverá o presente ser declarado improcedente, assim se mantendo a douta sentença recorrida, fazendo-se assim justiça.

3.2. A AUTORIDADE ADMINISTRATIVA ao recurso da A, rematando do seguinte modo:
«A douta Sentença recorrida fez o devido enquadramento dos factos e a correta interpretação e aplicação do Direito, devendo, por isso, ser mantida, porquanto:
1) Nos termos do disposto no artigo 113º, n.º 1, alínea xxx), da Lei n.º 5/2004, de 10.02 (na redação anterior às alterações introduzidas pela Lei n.º 51/2011, de 13.09), constitui contraordenação o incumprimento de ordens ou mandados legítimos da Autoridade Reguladora Nacional regularmente comunicados aos seus destinatários;
2) Através de Deliberação proferida em 28.10.2010, a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA impôs à Recorrente a disponibilização na Extranet ORAC de determinada informação sobre a ocupação de condutas e infraestrutura associada, designadamente sobre o perfil das condutas, níveis de ocupação dos troços de condutas e secção total desses troços, nos termos melhor descritos no ponto D5. daquela decisão;
3) Na douta Sentença recorrida entendeu-se que a Recorrente praticou autonomamente seis violações do mencionado artigo 113º, n.º 1, alínea xxx), da Lei n.º 5/2004, de 10.02, no respeitante a desconformidades constatadas no terreno face à informação constante da Extranet ORAC verificadas na Rua Alfredo Mesquita, em Lisboa, na CVP 4096, sita na Rua 5 de Outubro, em Carcavelos, na CVP 34005 – Troço 190 Oeste, sita na Rua José da Costa Pedreira, em Lisboa, e nas CVP 53609 – Troços 157 (Norte) e 475 (Noroeste), CVP 69284 – Troço 190 (Sudeste) e CVP 69285 – Troços 190 (Sudeste) e 95 (Noroeste), sitas na Rua dos Soeiros, em Lisboa;
4) Entendeu, contudo, o douto Tribunal a quo que todas essas violações advinham de uma única e mesma falta de cuidado – a confiança da Arguida nos terceiros e a falta de verificação das informações que estes lhe prestam ou não lhe prestam –, devendo, por isso, ser enquadradas juridicamente como uma única infração;
5) Improcede a alegada nulidade de todo processado desde a notificação da acusação, bem como da Sentença recorrida, por violação do direito de defesa da Arguida, por não lhe ter sido concedido um prazo razoável de defesa, uma vez que a mesma exerceu efetivamente e na íntegra, o direito de defesa que lhe assiste, tendo apresentado uma defesa exaustiva, constituída por 767º artigos (com resposta à acusação composta por 74º artigos), a que juntou 2 documentos, tendo ainda requerido a inquirição de 8 testemunhas e a realização de diligências complementares de prova, defesa na qual se pronunciou, detalhada e exaustivamente, sobre cada uma das 82 infrações que lhe foram imputadas;
6) Contrariamente ao que a Recorrente alega, do teor do mencionado artigo 22º da Lei‑Quadro não se pode retirar a interpretação de que o mesmo tenha sido redigido tendo em vista a preparação da defesa quanto a um único ilícito;
7) Tendo já tido em consideração o número de indícios de infração resultantes das fiscalizações efetuadas, a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA concedeu à Recorrente o prazo de 15 dias úteis para o exercício do seu direito de defesa, prazo esse que, na sequência de pedido seu de prorrogação, acabou por ser estendido até 20 dias úteis, o que corresponde ao limite máximo previsto no citado preceito;
8) É evidentemente da exclusiva responsabilidade da Recorrente a forma como gere o prazo concedido para o exercício do seu direito de defesa, designadamente quanto ao modo de obtenção de elementos instrutórios do processo que repute necessários para esse efeito;
9) Não recai sobre a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, enquanto autoridade administrativa competente para a instauração de processos de contraordenação, qualquer obrigação de, oficiosamente, enviar aos arguidos, juntamente com as respetivas acusações, os elementos que instruem os processos de contraordenação, já que lhes assiste a faculdade de consultarem os processos e obterem as respetivas cópias;
10) É destituída de qualquer sentido e irrelevante a comparação que a Recorrente faz entre o prazo de que dispôs para o exercício do seu direito de defesa e o prazo que a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA teve para a elaboração da acusação, uma vez que não existe qualquer preceito no direito de mera ordenação social (nem no direito processual penal) que estipule prazo para a interposição de processo de contraordenação, estando, por isso, a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA apenas condicionado e limitado pelo prazo de prescrição da infração respetiva, sem que se possa falar em qualquer violação do princípio da igualdade de armas;
11) Não se verifica igualmente a alegada nulidade do processo por violação do princípio da presunção de inocência e pela não ponderação dos critérios respeitantes à coima na acusação;
12) Conforme consta claramente da acusação, foram detalhadamente indicados os factos cuja prática foi imputada à Arguida, foi feita a imputação subjetiva dos mesmos em moldes de que resultava a inequívoca imputação dos ilícitos em causa a título doloso, foi descrita a situação económica da Arguida e, na parte referente à matéria de direito, foi enquadrado o comportamento da Arguida face às normas violadas, permitindo-lhe, assim, o conhecimento de todos os aspetos relevantes para a decisão (nas matérias de facto e de direito) para que pudesse exercer de forma cabal o seu direito de defesa, o que efetivamente fez, através da defesa que apresentou, em que contestou quer a matéria de facto, quer a matéria de direito constantes da acusação, demonstrando inteiro conhecimento dos factos imputados e do direito aplicável aos mesmos;
13) Conforme decorre claramente do que ficou referido nos artigos 68º a 72º da acusação, após ter indicado detalhadamente os factos cuja prática era imputada à Arguida, a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA fez a imputação subjetiva dos mesmos referindo as circunstâncias de facto de que resultava o dolo, dando, assim, cumprimento ao estabelecido no artigo 50º do RGCO, pelo que é manifestamente infundada a alegação da Recorrente segundo a qual o elemento subjetivo do tipo não foi expressamente afirmado na acusação, só podendo ser extraído por mera dedução lógica, ou suposição;
14) Em todo o caso, conforme reconheceu o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, em Sentença proferida em 21.01.2013 (Proc. n.º 82/12.2YQSTR), sufragando a posição defendida por esta Autoridade e na esteira da jurisprudência mais recente, «… nada obsta a que o elemento subjetivo da conduta seja inferido do próprio elemento objetivo, podendo o julgador, perante as circunstâncias factuais integrantes da tipicidade objetiva, inspirado nas regras da experiência, em juízos correntes de probabilidade, nos princípios da lógica ou nos próprios dados da intuição humana, daquelas presumir ou retirar a necessária imputação subjetiva»;
15) Não se afigura igualmente procedente a alegação sobre o facto de a acusação referir que a conduta da Arguida teria sido grave com base em circunstâncias abstratas, justificando-se na importância da ORAC, e não por referência a circunstâncias concretas do comportamento da Arguida, nem a quaisquer consequências resultantes do mesmo, já que na acusação foram identificados todos os concretos comportamentos da Arguida desconformes com a informação disponibilizada pela Extranet ORAC aquando das fiscalizações efetuadas, sendo que, atenta a relevância da ORAC, enquanto instrumento de recurso ao acesso, por outros operadores, à infraestrutura do operador com poder de mercado significativo, promovendo a existência de uma concorrência efetiva e sustentável, qualquer conduta que possa pôr em causa ou dificultar a disponibilização às entidades beneficiárias de informação correta e atualizada sobre os traçados e ocupações das condutas reveste inequivocamente gravidade;
16) Relativamente aos critérios com influência na determinação da medida concreta da coima, designadamente os critérios enunciados no artigo 5º da Lei n.º 99/2009, de 04.09, decorre da epígrafe desse preceito que os critérios aí previstos devem ser avaliados no momento da operação de determinação da sanção aplicável, que tem lugar somente no final da instrução do processo, depois de apreciada toda a prova produzida e aquando do apuramento da prática da infração, e não na fase da acusação (altura em que se desconhece a defesa que poderá vir a ser apresentada e a prova adicional que poderá vir a ser produzida no processo), uma vez que só depois de produzida a prova se pode determinar com rigor qualquer daqueles critérios;
17) O artigo 50º do RGCO não exige que a autoridade administrativa indique a medida da sanção que, em concreto, pretende aplicar, mas somente que indique a sanção ou sanções que poderão, abstratamente, ser aplicáveis, o que foi efetivamente feito na acusação proferida no presente processo. Uma tal exigência seria, de resto, destituída de qualquer sentido, uma vez que a sanção concreta a aplicar somente pode ser determinada no final da instrução do processo, ponderados os critérios previstos no artigo 5º da Lei n.º 99/2009;
18)  É falsa a alegação de que a acusação não indicou qual a informação disponibilizada pela Extranet ORAC, nem qual a discrepância relativamente à informação disponibilizada que permitiu concluir pela desatualização daquela informação da Extranet., uma vez que, a propósito da indicação da data e local de realização de cada ação de fiscalização efetuada pela AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, a acusação indicou expressamente qual a informação disponibilizada pela Extranet ORAC que foi tida em consideração (vd. artigos 3º, 16º, 32º e 48º);
19) Não procede igualmente a alegada falta de indicação, na acusação, das circunstâncias concretas que permitiram a conclusão de que as caixas de visita ou as condutas não seriam visíveis por ‘falta de manutenção’, não só porque que se trata de um conceito cujo significado é comummente conhecido, sendo que as afirmações feitas tiveram por suporte registos fotográficos igualmente anexos ao Relatório de Fiscalização (de que a Arguida teve conhecimento pela consulta do processo realizada e pela obtenção da respetiva cópia) que evidenciavam claramente em que consistia essa ‘falta de manutenção’, como ainda, na decisão administrativa, a Arguida foi absolvida da prática das infrações correspondentes a essa ‘falta de manutenção’;
20) A omissão de realização, pelos Agentes de Fiscalização, de testes de medição do espaço disponível em condutas e de verificação do encaminhamento dos tubos, quando relevante, foi tida em devida consideração na decisão sobre a prova dos factos imputados à Arguida, tendo a mesma sido absolvida de grande parte dos mesmos em obediência ao princípio in dubio pro reo, aliás, como a própria reconheceu nos pontos 60º e 61º da sua impugnação judicial, não se justificando a presente insistência neste ponto;
21) De resto, de acordo com a doutrina fixada pelo Assento n.º 1/2003 do Supremo Tribunal de Justiça, as hipotéticas nulidades invocadas estariam já sanadas, uma vez que, na resposta à acusação deduzida, a Recorrente pronunciou-se sobre a matéria de facto em causa e na sua impugnação judicial prevaleceu-se dos direitos alegadamente preteridos, tendo-se pronunciado sobre todos os aspetos de facto e de direito alegadamente omissos;
22) Termos em que necessariamente se conclui que bem decidiu o Tribunal a quo ao considerar não verificada qualquer violação do preceituado no artigo 50º do RGCO, nem do princípio da presunção de inocência, nem que de qualquer preceito constitucional invocado pela Recorrente;
23) Quanto à alegada ininteligibilidade da acusação, a extensíssima resposta que a Recorrente apresentou à acusação, onde contraditou, exaustivamente e sem qualquer hesitação, todos os indícios de infração aí enunciados, é quanto basta para demonstrar que entendeu devidamente todas as imputações que lhe foram feitas, não fazendo qualquer sentido vir invocar a impossibilidade de compreensão na íntegra do teor da acusação;
24) De resto, apesar do que alega sobre a ininteligibilidade da acusação, a Recorrente apenas indica como único exemplo a incompreensão do critério utilizado pela AUTORIDADE ADMINISTRATIVA para considerar que a sua conduta corresponderia à prática de 82 contraordenações, quando apenas procedeu à inspeção de 33 caixas de visita (e não 82) e mencionou 57 troços diferentes (e não 82);
25) Foram de facto fiscalizadas 33 caixas de visita; contudo, houve algumas onde foi verificada mais do que uma irregularidade, indiciadora de incumprimento ao disposto na Deliberação de 28.10.2010, sendo que cada irregularidade concretamente detetada foi expressamente enunciada na acusação a propósito de cada caixa de visita/troço; nessa medida, foi contabilizado um número maior de infrações do que caixas de visita e/ou troços fiscalizados, obtendo-se o número de infrações imputadas na acusação mediante uma simples soma, que não oferecia qualquer dificuldade de cálculo;
26) Tanto é assim que, como bem referiu o douto Tribunal a quo, «Analisando a acusação, verifica-se que a Autoridade Administrativa imputa a prática de várias infrações numa mesma caixa; e daí o maior número de infrações imputadas. A acusação é perfeitamente inteligível. Assim como a decisão final também o é. É só uma questão de fazer uma leitura atenta.»;
27) Não se percebe igualmente, nem a Recorrente cuida de explicar, como pode afirmar que na decisão administrativa a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA multiplicou o número de infrações. Como resulta de uma simples leitura, o número de infrações analisadas corresponde precisamente ao que foi imputado em sede de acusação;
28) Relativamente às invocadas normas do Código do Procedimento Administrativo relativas à inteligibilidade dos atos administrativos, as mesmas não têm qualquer aplicação aos processos contraordenacionais, como bem referiu a douta Sentença recorrida;
29) Sem embargo, a nulidade invocada, a verificar-se – o que apenas para efeitos de raciocínio se concede – seria uma nulidade sanável, atento o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 121º do CPP, aplicável ex vi o n.º 1 do artigo 41º do RGCO, a qual, de acordo com a referida jurisprudência fixada pelo Assento n.º 1/2003 do STJ, estaria já sanada uma vez que a defesa apresentada pela Arguida abarcou claramente os aspetos que alega serem omissos e ininteligíveis na acusação;
30) Improcede, por isso, a alegada preterição do direito de defesa e do princípio da presunção de inocência da Arguida em virtude da alegada ininteligibilidade da acusação;
31) Não tem igualmente qualquer fundamento a alegada violação do princípio da separação de poderes e do processo justo e equitativo, constatando-se que a Recorrente confunde os poderes de supervisão com os poderes sancionatórios conferidos por lei à AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, não tendo qualquer razão para afirmar que foram violados o direito ao silêncio do arguido e o direito à não autoincriminação, na medida em que as ações de fiscalização realizadas por esta Autoridade se inserem nos respetivos poderes de supervisão;
32) A supervisão do mercado das comunicações consiste no acompanhamento, vigilância e controlo exercido por uma autoridade pública – in casu a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA – sobre a atividade e as operações dos diversos intervenientes nesse mercado, conforme previsto no n.º 2 do artigo 1º e na alínea b) do n.º 1 do artigo 6º dos Estatutos da … AUTORIDADE ADMINISTRATIVA (aprovados em anexo ao Decreto-Lei n.º 309/2001, de 07.12);
33) As competências de supervisão da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA incluem, entre o mais, os poderes de fiscalizar o cumprimento da lei e dos regulamentos aplicáveis no sector das comunicações e o de instaurar e instruir processos sancionatórios e punir as infrações que sejam da sua competência, ou seja, atuar a título preventivo e a título repressivo (cfr. artigo 9º, alíneas c) e f), dos referidos Estatutos);
34) De facto, a supervisão, traduzida na necessidade de controlar e fiscalizar com caráter preventivo e repressivo as irregularidades cometidas pelas entidades supervisionadas, tem de abranger a possibilidade de estes ilícitos, no caso contraordenacionais, serem sancionados pela entidade reguladora como forma de garantir a eficácia da supervisão;
35) No quadro do desempenho das funções que lhe estão legalmente cometidas,  AUTORIDADE ADMINISTRATIVA pode, nos termos da lei, proceder a averiguações e exames em qualquer entidade ou local (cfr. artigo 12º dos referidos Estatutos);
36) Por sua vez, de acordo com o estabelecido no n.º 1 do artigo 13º dos Estatutos do I - AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, as entidades concessionárias ou licenciadas, os operadores bem como os demais prestadores de serviços registados devem prestar a esta Autoridade toda a cooperação que esta lhes solicite para o cabal desempenho das suas funções, designadamente as informações e documentos que lhe sejam solicitados;
37) Ora, a obrigação legal de prestar informações no âmbito de um processo de fiscalização e supervisão não se confunde nem prejudica o direito ao silêncio que assiste ao arguido no âmbito de um eventual processo sancionatório posterior;
38) Note-se que, em momento algum, a Recorrente foi intimada a declarar se cometeu ou não determinado incumprimento da Deliberação do I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA de 28.10.2010, pelo que nunca o seu direito ao silêncio foi violado, podendo, por isso, ser usadas as provas recolhidas nas fiscalizações efetuadas. Além disso, sendo a Recorrente um operador num mercado regulado, tem de se sujeitar às investigações do Regulador e de lhe submeter toda a documentação preexistente e necessária ao exercício das funções de regulação e de subsequente decisão sobre a eventual instauração de processo contraordenacional;
39) No exercício dos seus poderes de supervisão e fiscalização e de recolha de provas, pode a entidade supervisora e fiscalizadora concluir que existem ou não indícios da prática de um ou mais ilícitos contraordenacionais; concluindo que se verificam indícios da prática de contraordenações, cabe à autoridade administrativa exercer o poder sancionatório de que está investida, aplicando-se a partir daí o regime do processo de contraordenação; e, a partir do momento em que se inicia o processo de contraordenação, cessa o dever de colaboração do visado, que passa assim a assumir a qualidade de arguido, com todos os direitos e deveres inerentes a esse estatuto;
40) Tendo chegado ao conhecimento da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA denúncias relativas a incorreções na informação disponibilizada pela Recorrente na Extranet ORAC, esta Autoridade decidiu, ao abrigo dos seus poderes de fiscalização, proceder uma averiguação com o objetivo de verificar, no local, a conformidade e correção daquela informação;
41) Assim, ao abrigo do quadro legal atrás descrito, a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA efetuou, entre 19 de abril e 2 de maio de 2011, ações de fiscalização tendentes a verificar a informação constante do Portal “… – Serviço de Informação On line ORAC …” (Extranet ORAC), com vista a aferir o cumprimento, pela Recorrente, do determinado na Deliberação de 28.10.2010; e tendo, nesse âmbito, verificado 81 desconformidades com o estabelecido na informação da Extranet ORAC, suficientemente indiciadores de 81 incumprimentos ao determinado naquela Deliberação, instaurou processo de contraordenação à A;
42) O presente processo de contraordenação apenas teve início depois de terminada a fiscalização efetuada pelos Serviços de Fiscalização desta Autoridade, em que foram apurados indícios da prática das referidas desconformidades, que terminou com a elaboração do Relatório com a ref.ª AH013979/2011-2011073154 (de fls. 1 a 173 dos autos), sendo que a instauração de processo de contraordenação à Recorrente foi determinada em 09.02.2012, por despacho da Diretora de Contencioso e Contraordenações do ICP-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, tendo-lhe a acusação sido notificada em 13.02.2012;
43) A ‘amostra’ utilizada na ação de fiscalização foi definida pelos Serviços de Fiscalização da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA e cobriu as zonas que esses Serviços entenderam que deviam ser alvo de fiscalização, sendo falsa a afirmação de que tal ‘amostra’ de caixas de visita fiscalizadas tenha sido escolhida pela AUTORIDADE ADMINISTRATIVA em conjunto com os concorrentes da A e segundo critérios que serviriam os interesses desses;
44) É absolutamente descabido e irrelevante para o processo tudo quanto a Recorrente alega sobre a instrução e dedução de acusação no presente processo. Os termos em que é analisado e proposto o processo pelo instrutor cabe no âmbito da definição de funções pela AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, sendo evidentemente um assunto que não diz respeito à Recorrente;
45) Decorre de tudo quanto ficou exposto anteriormente que as inconstitucionalidades invocadas pela Recorrente quanto à interpretação e aplicação das normas que invocou em sede de questões prévias não se verificam no processo, não ocorrendo, por isso, qualquer das consequências invocadas, nos termos que ficaram evidenciados;
46) Contudo, e sem conceder, sempre se dirá que, qualquer que seja a interpretação que se dê ao referido artigo 119º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Penal, o mesmo tem que ser lido nos limites do mencionado Assento n.º 1/2003, isto é, as invocadas nulidades encontrar-se-iam sanadas tendo em conta que a Recorrente abarcou na sua defesa e na sua impugnação judicial os aspetos supostamente omissos;
47) Não constitui violação do preceituado no artigo 371º do CPP ter sido comunicada uma alteração não substancial dos factos na data que fora fixada para a leitura da sentença após a realização das alegações;
48) Só no momento da deliberação o Tribunal pode chegar à conclusão se os factos que resultam provados constituem ou não alteração aos factos imputados na acusação, e qualquer juízo em momento anterior seria prematuro e, obviamente, sujeito a subsequentes e sucessivas alterações;
49) O encerramento da discussão da causa não se confunde com o encerramento da audiência, sendo que esta última, em regra, só termina com a leitura da decisão, e podendo mesmo prolongar-se para além desta;
50) Só com a leitura da sentença é que fica precludida a possibilidade de o Tribunal proceder à alteração dos factos, sendo que o que importa é que ao arguido seja proporcionada oportunidade de se defender, em plenitude, dessa alteração de factos, obviamente antes de proferida a decisão;
51) Em processos de contraordenação são admissíveis alterações não substanciais de factos e alterações de qualificação jurídica, desde logo por via da aplicação subsidiária do Código de Processo Penal, uma vez que não existe nenhuma norma em sentido contrário;
52) A admissibilidade da alteração não substancial de factos não se funda na existência e previsão legal de um duplo grau de jurisdição sobre a matéria de facto, mas sim na garantia de que a descoberta da verdade material não prejudique os direitos de defesa dos arguidos;
53) O artigo 20º da Constituição garante o direito de recurso, mas não o direito a um duplo grau de jurisdição;
54) O direito ao recurso apenas garante um duplo grau de jurisdição no âmbito do processo penal e relativamente às decisões condenatórias do arguido e ainda quanto às decisões penais respeitantes à situação do arguido face à privação ou restrição da liberdade ou de quaisquer outros direitos fundamentais, o que tem sido unanimemente reconhecido pela jurisprudência do Tribunal Constitucional;
55) A limitação do direito ao recurso para o Tribunal da Relação das decisões judiciais proferidas no processo de contraordenação, faz sentido e justifica-se atenta a natureza do ilícito de mera ordenação social e das sanções que lhe correspondem;
56) Não se pode considerar inconstitucional a não admissibilidade de recurso jurisdicional de decisões proferidas em sede de impugnação judicial de decisões administrativas aplicadoras de coimas quando nem sequer relativamente às correspondentes decisões no âmbito do processo criminal idêntica garantia é exigida;
57) O juiz de primeira instância, em processo de impugnação judicial de coima aplicada pela autoridade administrativa, não está adstrito ao factualismo constante da decisão impugnada, o qual pode ser livremente investigado, em vista da descoberta da verdade material;
58) A restrição de recurso para os tribunais superiores do ordenamento jurídico nacional não põe em causa a constitucionalidade da alteração não substancial de factos e da alteração da qualificação jurídica em processos de contraordenação, considerando-a inclusivamente uma decorrência dos poderes do juiz;
59) O caráter excecional da norma que resulta do artigo 18º e do n.º 2 do artigo 72º do RGCO tem o único e exclusivo fim de permitir uma exceção ao princípio da reformatio in pejus, não sendo possível retirar dela qualquer norma geral que impedisse a realização de alterações não substanciais de factos e de alterações de qualificação jurídica nos recursos de processos de contraordenação;
60) A Recorrente é ainda a prestadora do serviço universal de telecomunicações, e ainda lhe compete o desenvolvimento, a exploração e a gestão das infraestruturas de telecomunicações, tendo, neste âmbito, de garantir às empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público o acesso a condutas e outras infraestruturas de que seja proprietária ou cuja gestão lhe incumba para instalação e manutenção dos seus sistemas e equipamentos, e, para esse efeito, deve disponibilizar uma oferta de acesso, que foi designada como Oferta de Referência de Acesso a Condutas (“ORAC”);
61) A obrigação de criação e manutenção de uma base de dados atualizada com informação detalhada relativa às condutas e infraestrutura associada foi imposta à Recorrente através de Deliberação do I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA de 17.07.2004, que a sujeitava a um conjunto de obrigações de disponibilização do acesso às condutas às empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público, as quais deveriam ser cumpridas no prazo de 90 dias, nomeadamente, deveria, nesse prazo, ser criada e mantida uma base de dados atualizada com informação detalhada relativa às condutas e infraestrutura associada;
62) Posteriormente, em 26.05.2006, a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA determinou a introdução de novas alterações à ORAC, intensificando o detalhe da informação exigida à A enquanto concessionária do serviço público de telecomunicações, impondo ainda um prazo de 18 meses para a mesma concluir a recolha de informação e a elaboração da base de dados e levantamento do Cadastro de Condutas e infraestrutura associada. A ORAC entrou em vigor em 14.07.2006;
63) Através da Deliberação de 28.10.2010, a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA alterou as obrigações de disponibilização, na Extranet, de informação sobre a ocupação de condutas, designadamente sobre o perfil das condutas, níveis de ocupação dos troços de condutas e secção total desses troços;
64) Como bem se refere na douta Sentença recorrida, «A deliberação de 28/10/2010 pressupõe uma Extranet ORAC devidamente atualizada. E, portanto, impõe-se à Recorrente que efetue os esforços necessários a que a Extranet ORAC represente o que se encontra no terreno.», bem como «Subjacente à obrigação imposta à Recorrente através da Deliberação de 28.10.2010 está a necessidade de indicação atualizada e correta das infraestruturas em causa»;
65) Relativamente às infrações por que foi condenada na Sentença recorrida, o douto Tribunal a quo considerou – e bem – que a Arguida tinha o dever de fiscalizar e não confiar na informação que lhe é prestada por terceiros para atualização do cadastro das suas condutas e que, ao não fazê-lo, omitiu um dever de cuidado que lhe era exigível e de que era capaz;
66) O fundamento da punibilidade da negligência prende-se com a censurabilidade dirigida ao agente pela produção do resultado, quando lhe era possível evitá-lo caso tivesse observado o dever que lhe incumbia e preparado as suas capacidades para o evitar;
67) A objeção da Recorrente quanto a não estar obrigada a verificar a informação que terceiros lhe estão obrigados a remeter é totalmente infundada e destituída de qualquer lógica, pois, se, nos termos das obrigações que lhe foram impostas em matéria da ORAC, recai sobre si, em especial, a de disponibilizar informação correta e atualizada sobre a ocupação de condutas e infraestrutura associada de que seja proprietária ou cuja gestão lhe incumba, é evidente que, para o cabal e rigoroso cumprimento de tal obrigação, está efetivamente obrigada a verificar a correção da informação que outros lhe remetem, sob pena de, não o fazendo, incorrer nas consequências advenientes de eventuais desconformidades ou desatualizações da informação constante da Extranet ORAC;
68) Na verdade, a obrigação de disponibilizar informação correta e atualizada sobre a ocupação de condutas e infraestrutura associada na Extranet ORAC foi imposta à Recorrente, e não a terceiros, pelo que lhe incumbe o especial dever de cuidado de verificar a correção da informação prestada para efeitos de atualização da informação Extranet ORAC;
69) Não o tendo feito, é evidente que a Recorrente omitiu um especial dever de cuidado que lhe era exigível e de que era capaz, tendo incumprido, por isso, o determinado no ponto D5. da referida Deliberação de 28.10.2010, atentas as desconformidades verificadas no terreno face à informação disponibilizada na Extranet ORAC;
70) Acresce que da factualidade dada como assente nos pontos 38. a 46. da douta Sentença recorrida resulta uma inadmissível postura da Recorrente de total indiferença face ao rigoroso cumprimento da obrigação em causa;
71) Com efeito, a Recorrente, tendo obrigatoriamente conhecimento da realização de alterações nas suas condutas e infraestrutura associada (por via dos pedidos de viabilidade que lhe são apresentados), e sabendo efetivamente que os operadores normalmente não cumprem o prazo de 30 dias para lhe comunicarem as alterações efetuadas, ainda assim, não cuidou de implantar um qualquer mecanismo autónomo que indagasse a data da conclusão dessas intervenções bem como o resultado das mesmas, para efeitos de atualização da informação da Extranet ORAC, conforme está obrigada;
72) Após a conclusão das intervenções efetuadas pelos operadores ou os construtores nas suas condutas, a Recorrente não cuida sequer de vistoriar se a intervenção realizada foi a mesma que lhe tinha sido comunicada, entendendo que se existir alguma desconformidade acabará por ter conhecimento mais tarde, quando novas intervenções forem solicitadas, por outros operadores, no local;
73) Mais ainda, a Recorrente tem conhecimento de informações incorretas sobre as intervenções efetuadas nas suas condutas por parte de vários operadores!
74) Atento o relevante estatuto da Recorrente no sector das comunicações eletrónicas –sendo a operadora histórica detentora da rede básica de telecomunicações e infraestrutura associada, facto que torna maior a sua responsabilidade, pois trata-se de uma grande empresa, bem estruturada e com grande experiência e know how –, é inadmissível a assunção de um comportamento como o que ficou descrito, o qual demonstra que, de facto, não se trata de qualquer situação de inexigibilidade de adoção de comportamento diverso, mas, pura e simplesmente, de uma violação consciente do mais elementar dever de cuidado exigível à Recorrente no cumprimento da obrigação em causa;
75) Assim sendo, é obviamente improcedente a alegação da Recorrente de que atuou sem culpa e que o seu comportamento não revela desrespeito pela ordem jurídica em geral, nem pelas obrigações impostas em matéria de ORAC em particular; a factualidade provada demonstra que a Recorrente não aplica os seus melhores esforços no sentido de manter atualizada a informação da Extranet ORAC, preferindo adotar uma conduta passiva de esperar que chegue ao seu conhecimento a deteção de alguma desconformidade por via de qualquer intervenção e, só então, alegadamente efetuar a atualização devida da informação da Extranet ORAC;
76) Independentemente do elevado número de caixas de visita existentes no país, o certo é que a obrigação de criação e manutenção de uma base de dados atualizada com informação detalhada relativa às condutas e infraestrutura associada foi imposta à Recorrente, por poder e ser capaz – atento o seu estatuto de operador histórico de telecomunicações em Portugal dotada de elevados recursos técnicos e humanos –, e esta tem que cumpri-la nos exatos termos estabelecidos, não podendo transferir a sua responsabilidade pelo rigoroso cumprimento de tal obrigação para terceiros;
77) Pese embora o douto Tribunal a quo tenha tido sempre por referência, na avaliação da culpa da Arguida, o facto de a mesma deter 250.000 caixas de visita na totalidade do território nacional, a verdade é que, num universo muito mais restrito de apenas 14 caixas, em causa no presente recurso, referentes à área da grande Lisboa, o Tribunal detetou 6 – quase metade – em que ocorreram lapsos ou desconformidades, o que demonstra bem que, contrariamente ao sustentado pela Recorrente, tais lapsos estão longe de ser pontuais, obstando a sua ocorrência ao efetivo cumprimento do desígnio subjacente à imposição da obrigação de atualização do cadastro imposta pela ORAC, que é a promoção de uma concorrência sustentada no mercado das comunicações eletrónicas, em benefício dos consumidores finais;
78) Relativamente às alegadas interrupções e falhas dos sistemas informáticos que implementou, releva-se que não ficou provada nos autos a existência deficiências de funcionamento nos sistemas Extranet da Recorrente, pelo que improcede a argumentação tecida pela Recorrente a esse respeito;
79) Não resultou igualmente provado nos autos que a Recorrente realize auditorias aleatórias sobre as caixas de visita, para verificação das informações da Extranet, pelo que também se julgam irrelevantes as alegações que tece a esse respeito;
80) Da matéria fáctica dada como assente resultaram seis desconformidades à informação disponibilizada pela Extranet ORAC, que constituem incumprimentos ao determinado na Deliberação da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA de 28.10.2010, designadamente ao respetivo ponto D5.; assim, demonstrado que a Recorrente incumpriu, negligentemente, a referida determinação da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, que lhe havia sido regularmente notificada, encontra-se preenchido o tipo contraordenacional em questão nestes autos;
81) E, sendo por demais evidente que não resultou provada nos autos a inexigibilidade da adoção de comportamento diverso pela Recorrente que funcionasse como causa de exclusão da sua culpa, conclui-se que não se verifica qualquer inconstitucionalidade da interpretação da norma constante do artigo 113º, n.º 1, alínea xxx), da LCE, no sentido de que o comportamento da Recorrente que ficou provado nos autos preenche o tipo objetivo de ilícito em causa, devendo improceder toda a argumentação expendida pela Recorrente a propósito da nulidade e inconstitucionalidade de tal interpretação;
82) É falacioso o argumento da Recorrente segundo o qual, tendo sido condenada pela AUTORIDADE ADMINISTRATIVA por 27 ilícitos, acabou por ser condenada pelo Tribunal a quo apenas por um, o que revela a pouca expressão e o caráter pontual da sua atuação; o Tribunal a quo entendeu que a Recorrente praticou autonomamente seis violações do artigo 113º, n.º 1, alínea xxx), da Lei n.º 5/2004, de 10.02, mas que todas essas violações advinham de uma única e mesma falta de cuidado – a confiança da Arguida nos terceiros e a falta de verificação das informações que estes lhe prestam ou não lhe prestam –, pelo que as enquadrou juridicamente como uma única infração, linha de raciocínio esta que não foi a adotada pela decisão administrativa, que considerou terem sido praticadas 27 infrações em concurso;
83) Assim, ainda que a Recorrente tenha sido condenada apenas num ilícito, essa circunstância não justifica a sua conduta nem diminui sensivelmente a sua culpa, já que, não só tal ilícito se decompôs em seis condutas naturalisticamente autónomas, como, ainda, cada ilícito encerra um desvalor em si mesmo, sendo que a Recorrente deve nortear a sua atuação por boas práticas que evitem a ocorrência de qualquer ilícito;
84) A infração praticada reveste de facto gravidade, atendendo a que não só se traduz no incumprimento de uma determinação imposta pelo Regulador à Recorrente em matéria de acesso a condutas, em virtude da sua qualidade de operador histórico detentor da rede básica de telecomunicações e infraestrutura associada - designadamente a de disponibilizar na Extranet ORAC informação sobre o perfil das condutas, níveis de ocupação dos troços de condutas e secção total desses troços -, como, ainda, pelo facto de o correto mapeamento dos traçados das suas condutas assumir especial relevância na promoção de uma concorrência sustentada no mercado das comunicações eletrónicas, em benefício dos consumidores finais, já que a desconformidade da informação referente a condutas constante da Extranet ORAC com os dados efetivamente existentes no terreno traduz uma limitação passível de causar prejuízos às beneficiárias da ORAC;
85) Nenhum dos factos provados permite concluir que a Recorrente tudo fez para evitar lapsos, bem pelo contrário, a conduta e postura por si assumidas no decurso do processo é de absoluta despreocupação, para não dizer desinteresse, face ao rigor e fiabilidade da informação transmitida por terceiros, revelando a omissão de deveres de cuidado que lhe são exigíveis por poder e ser capaz;
86) É igualmente manifesto que não se encontram reunidos os pressupostos de que, nos termos do artigo 51º do RGCO, depende a aplicação de uma pena de admoestação: reduzida gravidade da infração e da culpa do agente; de facto, da matéria de facto apurada, não resulta qualquer circunstancialismo de onde se possa extrair essa redução da gravidade da infração e do grau de culpa da Recorrente, justificativo da admoestação;
87) Tendo em consideração a factualidade provada e à culpa da Recorrente, conclui-se que a coima aplicada pelo Tribunal a quo peca apenas por defeito, devendo manifestamente improceder a pretensão da Recorrente, já que a sua condenação numa coima ainda mais reduzida do que aquela que lhe foi aplicada não permitirá satisfazer as exigências de prevenção que subjazem à aplicação de sanções.
Pelo exposto e pelo que será Doutamente suprido, deverá ser negado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser mantida a Douta Decisão recorrida, com todas as consequências legais.»

3.3.  A A, ao recurso da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, concluindo do seguinte modo:
1. A presente resposta versa sobre o recurso interposto pela AUTORIDADE ADMINISTRATIVA quanto à Sentença do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (que, concedendo provimento parcial recurso interposto pela A relativamente à Decisão Condenatória da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, absolveu a A da prática de vinte e seis ilícitos contraordenacionais e condenou a A pela alegada prática de uma infrações previstas no artigo 113.º n.º 1 alínea xxx) da LCE, numa coima de € 20.000,00), no qual a Autoridade suscita três questões fundamentais:

i) a absolvição da A relativamente a 21 infrações por ausência de prova do dever de cuidado concretamente violado e reconhecimento pelo Tribunal de que é admissível que, apesar de todos os cuidados, possa ocorrer algum lapso inadvertido, derivado, por exemplo, de alguma desatenção humana contra as suas instruções, tendo em conta que a A gere uma rede de mais de 250.000 CVP’s;
ii) a configuração das 6 violações ao artigo 113.º, n.º 1, alínea xxx) da LCE numa única infração, por assim deverem ser juridicamente enquadradas, dado resultarem de uma única e mesma falta de cuidado por parte da A; e
iii) a qualificação da culpa da A como negligência inconsciente.
2. O enquadramento que a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA apresentou da Deliberação de 28 de outubro de 2010 (cujo alegado incumprimento está em causa nos presentes autos) não é correto.
3. Com efeito, e sucintamente:
i) pelo DL 31/2003 foi atribuída à A a concessão do serviço público de telecomunicações, que engloba a prestação do serviço universal de telecomunicações e de outros serviços de telecomunicações, bem como o desenvolvimento, a exploração e a gestão das infraestruturas de telecomunicações;
ii) de acordo com o n.º 4 do artigo 26.º do REGICOM, a concessionária tem a obrigação de disponibilizar “uma oferta de acesso às condutas, postes, outras instalações e locais, da qual devem constar as condições de acesso e utilização, nos termos a definir pela ARN” (Autoridade Reguladora Nacional (ARN), in casu a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA), que foi designada como Oferta de Referência de Acesso a Condutas, ORAC;
iii) a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA tinha já emitido diversas Deliberações nas quais definiu os termos das condições de acesso e utilização das condutas e outras infraestruturas essenciais para o fornecimento de serviços de telecomunicações, tendo a A, na medida do possível, conformado a sua ORAC às exigências, as mais das vezes desproporcionais, do Regulador;
iv) foi emitida uma primeira Deliberação, em 17 de julho de 2004, sendo que, em virtude do carácter manifestamente ilegal e desproporcional das exigências constantes da Deliberação de 17 de Julho de 2004, a A apresentou, em 4 de novembro de 2004, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, um pedido de suspensão de eficácia parcial dessa Deliberação;
v) em 5 de Agosto de 2005, o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa julgou improcedente a providência cautelar instaurada pela A, tendo em consequência, a A enviado à AUTORIDADE ADMINISTRATIVA uma comunicação datada de 1 de Setembro de 2005, na qual, em suma, referiu que estava a desenvolver os passos necessários para a preparação do cadastro e para a construção da base de dados com informação descritiva das condutas e infraestrutura associada, advertindo, contudo, que se trataria, necessariamente, de um processo complexo e moroso;
vi) em 20 de setembro de 2005, e com base em estudos iniciados em 2005, a A expressou claramente, entre outros pontos, a impossibilidade de cumprir todas essas exigências;
vii) não obstante, em 26 de maio de 2006, o Conselho de Administração da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA decidiu introduzir novas alterações à ORAC, intensificando drasticamente o detalhe da informação exigida à A;
viii) a A concluiu o cadastro em 15 de novembro de 2007, voltando a chamar à atenção da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA para diversos aspetos, como por exemplo que se tratava de uma medida sem paralelo a nível europeu no que respeita ao grau de detalhe exigido na informação a disponibilizar às beneficiárias do acesso às condutas;
ix) em 14 de novembro de 2008, a A foi notificada de uma Acusação, na qual a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA lhe imputava o facto de não ter disponibilizado toda a informação imposta pela AUTORIDADE ADMINISTRATIVA no contexto da ORAC, tendo a  A apresentou a sua defesa escrita, tendo explicitado à AUTORIDADE ADMINISTRATIVA que sempre cumpriu as suas obrigações no âmbito da ORAC, na medida do possível e do que pode ser-lhe exigido tendo em consideração os constrangimentos decorrentes da impossibilidade de garantir que todas as condutas (que são milhares) estão cadastradas de forma exata e totalmente fiel;
x) após a inquirição das testemunhas arroladas pela A na sua defesa escrita, a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA arquivou o processo por inexistirem indícios da prática de contraordenação pela A;
xi) desde essa data até à notificação da Acusação relativa ao processo de contraordenação que deu causa ao presente recurso, a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA tem vindo a analisar periodicamente a matéria da ORAC, tendo emitido várias Deliberações;
xii) através da Deliberação de 28 de outubro de 2010, veio a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA insistir na disponibilização pela A, na Extranet, de informação ainda mais detalhada sobre a ocupação de condutas, o que, para além de ser “uma exigência sem paralelo na Europa”, é inexigível, sendo impossível criar um sistema de análise de viabilidade em tempo real para utilização própria e sendo inviável recolher, de forma exaustiva, no terreno todas as informações; e
xiii) são as beneficiárias da ORAC que efetuam o levantamento de cadastro, pelo que é com base na informação prestada por estas que os sistemas da A são atualizados, tendo a A de confiar na fiabilidade, atualidade e correção de tais informações.
4. Relativamente à questão da alegada violação de dever de cuidado por parte da A, no que respeita a desconformidades detetadas entre a Extranet e o terreno, bem andou o Tribunal na decisão de absolver a A porquanto a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA não explicitou (nem provou) a violação de um dever de cuidado pela A ao recusar aqueles determinados pedidos de portabilidade, alegação e prova que, por força do ónus da prova que lhe cabe na qualidade de Acusação, decorrente do princípio do acusatório e da presunção de inocência.
5. Acresce, aliás, que a A logrou provar o cumprimento do dever de cuidado que lhe competia e a que estava obrigada atentas as circunstâncias externas em que atuava para a resposta a tais pedidos de portabilidade.
6. O entendimento da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA relativamente à responsabilidade contraordenacional das pessoas coletivas e à imputação dos factos a títubo culposo ao ente coletivo não é correto, sendo que a Autoridade interpreta incorretamente o artigo 3.º da Lei Quadro.
7. É errado o entendimento da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA no sentido de que o n.º 3 do artigo 3.º da Lei Quadro apenas seria aplicável aos mandatários e representantes, porquanto se o Legislador quisesse limitar a aplicação dos pressupostos de exclusão da responsabilidade das pessoas coletivas previstos no n.º 3 do artigo 3.º da Lei Quadro à atuação dos mandatários e representantes tê-lo-ia dito, tendo, no entanto, feito referência ao “agente”, o que, em linguagem jurídico-sancionatória, corresponde àquele que pratica os factos (e não, ao significado de “agente” em sentido jurídico-comercial, que será com quem o principal celebra um contrato de agência, que parece ser o defendido pela AUTORIDADE ADMINISTRATIVA).
8. A AUTORIDADE ADMINISTRATIVA também não interpreta corretamente o n.º 2 do artigo 3.º da Lei Quadro, porquanto sustenta que do mesmo normativo se retira a possibilidade de responsabilização da pessoa coletiva pelos factos ilícitos praticados em seu nome ou por sua conta, pelos titulares dos seus órgãos sociais, pelos titulares dos cargos de direção e chefia e pelos seus trabalhadores no exercício das suas funções, bem como pelas infrações cometidas por seus mandatários e representantes, em atos praticados em seu nome ou por sua conta, sem mais, i.e., sem qualquer consideração da culpa imputável ao ente coletivo.
9. O entendimento da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA do artigo 3.º n.º 2 da Lei Quadro, no sentido de que a pessoa coletiva é responsabilizada pelos atos dos seus funcionários, independentemente da culpa da pessoa coletiva em si mesma considerada, bastando a culpa do agente individual que materialmente praticou o facto, é inconstitucional, por violação dos artigos 32.º n.º 2 e 10, 30.º n.º 3 e 2.º da Constituição da República Portuguesa, na medida em que parte de um pressuposto implícito de que a culpa da pessoa singular que pratica o facto ilícito é transmissível à pessoa coletiva.
10. Julga-se que a correta interpretação de tal normativo é aquela que foi preconizada pelo Tribunal a quo e deve ser mantida: tal normativo prevê o nexo de imputação objetiva de factos praticados por pessoas singulares ao ente coletivo, mas não dispensa a verificação da existência de culpa autónoma imputável à pessoa coletiva, pelo que bem andou o Tribunal a quo ao ter considerado, em face dos factos dados como provados, que não se demonstrou a violação de um dever de cuidado que vinculasse a A e que fosse adequado a evitar tais recusas de pedidos de portabilidade.
11. Resulta provado nos autos, em particular no ponto 45A dos factos provados, que “Nos termos da ORAC, e tal como foi comunicado pela Autoridade Administrativa, pende sobre as beneficiárias (definidas como “Empresa que oferece redes ou serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público”) o dever de comunicação de quando é que as operações estão concluídas” (sublinhado nosso).
12. Tal resulta também, expressamente, do ponto 36. dos factos provados na Sentença, que transcreve a Deliberação em causa nos autos, e onde pode ler-se no ponto 2.6.1 da ORAC que “Nos termos da ORAC, no final da instalação (ou) intervenção (ou) remoção (ou) desvio de traçados pela beneficiária, esta tem de apresentar à A, no prazo máximo de trinta dias, um cadastro de ocupação atualizado”.
13. É evidente que não pode imputar-se à A o incumprimento, pelas beneficiárias, das obrigações que sobre si recaem ao abrigo da ORAC e – mais ainda – não pode entender-se, à saciedade, que sobre a A recaia um dever de cuidado de “fiscalizar” o cumprimento da ORAC.
14. Deve, em consequência, negar-se provimento ao recurso interposto pela AUTORIDADE ADMINISTRATIVA neste ponto, mantendo-se a absolvição da A no que respeita aos 26 ilícitos contraordenacionais.
15. Relativamente à questão do enquadramento de 6 alegadas violações num único ilícito contraordenacional e apesar de a A não concordar com a invocada falta de cuidado que lhe foi imputada – tendo exposto cabalmente as suas razões no recurso que oportunamente interpôs – a verdade é que, a considerar-se que tal dever de cuidado existia e teria sido negligenciado pela A – o que apenas por cautela de patrocínio se admite, sem conceder – andou bem o Tribunal a quo em enquadrar juridicamente as desconformidades numa única contraordenação.
16. Nas suas alegações, a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA parte do pressuposto de que o Tribunal a quo aplicou ao caso o instituto do ilícito continuado e argumenta no sentido de rebater a referida aplicação.
17. Acontece que o Tribunal a quo expressamente referiu na Sentença que “atendendo à imputação que supra efetuámos, mostra-se prejudicado o conhecimento da infração continuada (foi efetuada a imputação de uma única infração, e não de várias)” (sublinhado nosso).
18. Ou seja, o Tribunal a quo não aplicou, nem sequer considerou a aplicação do instituto do ilícito continuado, pelo que fica assim prejudicado por ausência de oportunidade, o teor das alegações da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA vertidas nos pontos 58. a 61. do seu recurso, devendo também negar-se provimento ao recurso interposto pela AUTORIDADE ADMINISTRATIVA neste ponto.
19. Relativamente à questão da configuração da culpa da Arguida, o Tribunal a quo considerou que a A atuou com negligência inconsciente, por entender que a Recorrente atuou com falta de cuidado, na medida em que confiou em terceiros e não verificou as informações que estes prestavam.
20. A AUTORIDADE ADMINISTRATIVA defende, numa base assente em pressupostos erróneos, que “a arguida representou a possibilidade do facto que preenche um tipo legal de contraordenação, não tendo diligenciado, como podia e devia, de modo a evitar o resultado típico.
21. Tal entendimento da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA não pode proceder; a Deliberação da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA que está em causa nos autos como alegadamente violada pela A não impõe, em ponto algum, à A a obrigação de verificar as informações que lhe são prestadas por terceiros.
22. A A estava, e está, efetivamente, obrigada a atualizar a Extranet ORAC, mas para esse efeito não está obrigada – como não poderia deixar de ser – a verificar a informação que terceiros estão obrigados (esses sim!) a remeter à A.
23. Para além de a tal não estar obrigada, também não é exigível – conforme se expôs em recurso oportunamente interposto pela A – impor à A que verifique por mero “especial” dever de cuidado a informação que lhe é prestada por terceiros.
24. Ficou evidenciado que não só o comportamento da Arguida demonstra a sua total adesão às obrigações impostas ao nível da ORAC, como não pode tal comportamento ser censurado, mesmo nas situações em que eventualmente existam desconformidades na informação disponibilizada na Extranet, porquanto não existe comportamento alternativo adequado a evitar tais pontuais desatualizações.
25. Assim, o entendimento da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA não pode proceder, sendo que nem a títubo de negligência inconsciente devia a A ter sido condenada, pelo que também neste ponto deve negar-se provimento ao recurso interposto pela AUTORIDADE ADMINISTRATIVA.
Nestes termos e nos restantes de Direito aplicáveis, deve o recurso interposto pela AUTORIDADE ADMINISTRATIVA ser julgado improcedente, mantendo-se, no que às questões suscitadas nesse recurso respeita, a Sentença Recorrida, assim se fazendo Justiça!

Admitidas as respostas, o Mm.º Juiz a quo proferiu despacho de sustentação da decisão recorrida.
Subidos os autos, neste Tribunal a Sr.ª Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se pela improcedência do recurso da arguida.
Cumprido o art. 417.º, n.º 2, do CPP, apenas a A respondeu àquele parecer do MP, para «reafirmar e dar por integralmente reproduzido tudo o que alegou no recurso por si interposto».
Após o exame preliminar foram colhidos os vistos legais e teve lugar a conferência, cumprindo decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO
1. Vejamos, antes de mais, os fundamentos de facto e de direito da decisão impugnada (transcrição):
«IV. Fundamentação de facto
a) Factos provados
1. No dia 19/04/2011, na Rua Alfredo Mesquita, em Lisboa, na caixa de visita prolongamento da caixa nº 45366, no topo da rua, verificou-se existir
- uma caixa de visita (doravante apenas “CVP”) e
- um ramal de acesso para um edifício
não representados na Extranet ORAC (e no cadastro).
2. A CVP e o ramal referidos no número 1. dos factos provados eram de construção recente à data da fiscalização, sendo construídos pelo construtor responsável pela operação urbanística, que não comunicou à Recorrente a conclusão da obra.
3. Em data posterior a 19/04/2011, a Recorrente atualizou a extranet, fazendo constar a CVP e o ramal de acesso referidos no número 1. dos factos provados.
4. A sociedade C instalou, em fevereiro de 2011, um cabo C500 no ramal e na caixa indicada no número 1. dos factos provados, tendo iniciado o pedido, para o efeito, à Recorrente, no âmbito da ORAC, em Janeiro de 2011, não tendo, entretanto, desinstalado tal cabo.
5. Em 19/04/2011 ainda não tinha a Recorrente recebido a informação cadastral relativa àquela CVP, por parte do respetivo construtor, não tendo, por isso, procedido à atualização da informação em causa na Extranet, no que respeita à existência desta.
6. A Recorrente sabia do início da construção da CVP e do pedido de colocação de cabo na conduta (por parte da C) e não cuidou de saber em que data a mesma CVP e ramal de acesso ao edifício ficaram concluídos, para efeitos de cumprimento da obrigação de atualização do cadastro, não atuando assim com o cuidado devido e que podia e era capaz.
*
7. No dia 19/04/2011, surgia uma conduta visível na Extranet ORAC na Alameda dos Oceanos (Perto Rotunda SUL ), em Lisboa, na CVP 87566 – Troço 95 (Oeste), sendo que, no terreno, a conduta encontrava-se tamponada.
*
8. No dia 19/04/2011, no Cruzamento Alameda dos Oceanos com Rua Mar do Norte, em Lisboa, na CVP 87794 – Troço 1029 (Oeste), verificou-se existir 1 tubo de secção intermédia não cadastrado na Extranet ORAC.
*
9. No dia 19/04/2011, no Cruzamento Alameda dos Oceanos com Rua Mar do Norte, em Lisboa, na CVP 87794 – Troço 513 (Norte), em Lisboa existia
- um tubo de secção intermédia e
- quatro tubos de secção superior que
não se encontravam representados na informação disponibilizada pela Extranet ORAC.
*
10. No dia 02/05/2011, na Rua Dr. José Joaquim Almeida, na CVP 1493 – Troço 95 (Sul), em Carcavelos, não existia uma conduta, não se encontrando, informação disponibilizada pela Extranet ORAC atualizada relativamente ao número de condutas.
10A. A conduta deixou de existir na sequência de uma eliminação de um dos furos do Troço 95.
*
11. No dia 02/05/2011, na rua 5 de Outubro, em Carcavelos, na CVP 4096 – Troço 95 (Este), apesar de estar representado um semáforo verde, não existia espaço disponível para serem incluídos novos cabos (não devendo o semáforo ser verde), pelo que a informação disponibilizada pela Extranet ORAC não se encontrava atualizada relativamente ao semáforo (Extranet ORAC não se encontrava atualizada relativamente ao semáforo).
12. O semáforo indicado na Extranet teve por base as informações que o construtor do prédio que liga com a CVP em causa deu à Área do Cadastro, tendo o mesmo comunicado a instalação de um tubo de 110 mm, quando, na verdade, instalou um tubo mais pequeno de 40 mm ou 60 mm.
13. Ao não se ter certificado sobre a correção da informação cadastral alegadamente comunicada pelo construtor da referida CVP, a Recorrente não agiu com o cuidado e diligência que lhe é exigível.
*
14. No dia 26/04/2011, na Rua José da Costa Pedreira, em Lisboa, CVP 34005 – Troço 190 Oeste, existiam
- um tritubo e
- seis tubos de secção intermédia não cadastrados, não se encontrando, por isso, a informação disponibilizada pela Extranet ORAC atualizada relativamente ao número de condutas.
15. Os tubos em causa foram cadastrados incorretamente, de acordo com a informação prestada pelo construtor contratado pela Recorrente, tendo a Recorrente confiado nas informações transmitidas por este construtor, não atuando assim com o cuidado que podia e era capaz.
15A. Na sequência da verificação desse erro, o cadastro foi retificado.
*
16. No dia 26/04/2011, na Rua José da Costa Pedreira, em Lisboa, relativamente à CVP 22542 – Troço S/N (Sul), na extranet não existia indicação do semáforo, não se encontrando, assim, a informação disponibilizada pela Extranet ORAC atualizada relativamente ao semáforo.
*
17. No dia 26/04/2011, na Rua Embaixador Martins Janeira, no que respeita à CVP 113619 – Troço 95 (Norte), verificou-se a existência de um tubo não cadastrado na extranet ORAC, não se encontrando, assim, atualizada a informação disponibilizada pela Extranet ORAC, relativamente ao número de condutas.
*
18. No dia 26/04/2011, na Rua Manuel Marques, no que respeita à CVP 46076 – Troço 190 (Norte), verificou-se a existência na extranet ORAC de um troço que não existia no terreno, não se encontrando, assim, atualizada a informação disponibilizada pela Extranet ORAC relativamente ao traçado.
*
19. No dia 28/04/2011, na Rua dos Soeiros, em Lisboa, e no que respeita à CVP 53609, os troços 157 (Norte) e 475 (Noroeste) representados na extranet, não se encontravam no terreno, pelo que a informação disponibilizada pela Extranet ORAC não se encontrava atualizada relativamente ao número de condutas.
20. A CVP 53609 tem registo de construção datado de 1992 e foi cadastrada tendo por base um projeto disponibilizado à Recorrente pelo construtor dos troços em causa, construtor em quem a Recorrente confiou, não atuando assim com o cuidado que podia e era capaz.
*
21. No dia 28/04/2011, na Rua dos Soeiros, em Lisboa, no que respeita ao Troço 190 (Sudeste) da CVP 69284, que não existia essa conduta no terreno, pelo que a informação disponibilizada pela Extranet ORAC não se encontrava atualizada relativamente ao número de condutas.
22. A CVP 69284 foi construída em 1995, e constava nos documentos, fornecidos por terceiros, que a Recorrente usou para a atualização do seu cadastro, tendo a Recorrente neles confiado, não atuando com o cuidado que podia e era capaz.
22A. A Recorrente, entretanto, atualizou a informação, na extranet, relativamente a esta conduta.
*
23. No dia 28/04/2011, na Rua dos Soeiros, em Lisboa e no que respeita à CVP 69285 – Troços 190 (Sudeste) e Troço 95 (Noroeste), esses troços não existiam no terreno, pelo que a informação disponibilizada pela Extranet ORAC não se encontrava atualizada relativamente ao número de condutas.
24. A CVP 69285 foi construída em 1995, e constava nos documentos, fornecidos por terceiros, que a Recorrente usou para a atualização do seu cadastro, tendo a Recorrente neles confiado, não atuando com o cuidado que podia e era capaz.
*
25. No dia 28/04/2011, no cruzamento entre a Rua do Brasil e a Rua do Parque, em Lisboa, e no que respeita à CVP 26901 – Troço Nordeste, verificou-se que esse Troço também não se encontrava cadastrado, não se encontrando, por isso, a informação disponibilizada pela Extranet ORAC atualizada relativamente ao traçado.
*
26. A Recorrente detém a concessão do serviço público de telecomunicações, que engloba a prestação do serviço universal de telecomunicações e de outros serviços de telecomunicações, bem como o desenvolvimento, a exploração e a gestão das infraestruturas de telecomunicações, tendo, neste âmbito, de garantir às empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público o acesso a condutas e outras infraestruturas de que seja proprietária ou cuja gestão lhe incumba para instalação e manutenção dos seus sistemas e equipamentos, acesso que foi designada como Oferta de Referência de Acesso a Condutas (“ORAC”).
27. A AUTORIDADE ADMINISTRATIVA emitiu uma Deliberação, em 17 de julho de 2004, referente às condições de acesso e utilização das condutas e infraestrutura associada da Recorrente, que impunha à concessionária (a Recorrente) um conjunto de obrigações de disponibilização do acesso às condutas da A às empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público.
28. Segundo a Deliberação de 17 de Julho de 2004, tais obrigações deveriam ser cumpridas no prazo de 90 dias, nomeadamente, deveria, nesse prazo, ser criada e mantida uma base de dados atualizada com informação detalhada relativa às condutas e infraestrutura associada.
29. A Recorrente comunicou à Autoridade Administrativa, em 01/09/2005, que se encontrava a desenvolver os passos necessários para o cumprimento da deliberação de 17/07/2004, mas que o processo seria moroso e complexo.
30. Em 02/09/2005, a Autoridade Administrativa instou a Recorrente para, até 20/09/2005, apresentar uma “descrição da concepção da base de dados e uma calendarização detalhada e faseada, do processo de operacionalização da base de dados e do levantamento exaustivo do cadastro das condutas e infra-estruturas associadas, por área geográfica, no território nacional”, bem como para apresentar a descrição do espaço em condutas e infraestrutura associada, tendo a Recorrente procurado cumprir estas determinações.
31. Assim, a Recorrente, em 20/09/2005:
a) remeteu ao I…-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA a informação solicitada, nomeadamente a descrição do sistema de informação geográfica da A, a Especificação de Requisitos para Adequação do Cadastro de Ocupação de Condutas, a Especificação de Requisitos para Adequação do SIGNet, a Especificação da Operacionalização da Base de Dados e do Levantamento do Cadastro e o Plano de Necessidades Associadas ao Desenvolvimento de Infra-Estruturas;
b) esclareceu o I…-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA que o SIG-… é um sistema de informação geográfica, relativo ao cadastro de infraestruturas da rede de acesso e exterior da A e que o processo de informatização do cadastro da rede de acesso local (RAL) se encontrava na sua fase final de implementação;
c) salientou que as novas exigências do I…-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA implicariam a adaptação das aplicações de gestão de infraestruturas de suporte da A (SIG-… e SIGNet) para disponibilizar a informação adicional de cadastro, o que previsivelmente levaria 4 meses;
d) informou que seria igualmente necessário proceder ao carregamento da informação nos sistemas de cadastro, de maneira a que esta ficasse disponível na base de dados;
e) advertiu que o levantamento de campo necessário para a recolha de informação relativa à ocupação e respetiva atualização do cadastro em SIG-… (carregamento dessa informação) levaria aproximadamente 3 anos e implicaria a abertura de mais de 250.000 caixas de visita e de passagem espalhadas por todo o território nacional;
f) salientou que o nível de detalhe da base de dados imposto acarretaria custos muito elevados, implicando um investimento não inferior a € 15.000.000,00 acrescido de pelo menos € 1.000.000,00 de custos anuais de manutenção;
g) expressou claramente a impossibilidade de cumprir todas essas exigências no prazo fixado, desde logo devido aos fatores assinalados nas alíneas anteriores;
h) manifestou a sua preocupação quanto às consequências para a segurança das comunicações nacionais do cumprimento integral das imposições da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, nomeadamente a construção da base de dados e disponibilização numa Extranet;
i) terminou reiterando a sua discordância relativamente às obrigações impostas pela Deliberação de 17 de Julho de 2004 e relativamente àquelas que estavam a ser impostas pela Deliberação de 2 de Setembro de 2005.
32. Em 26/05/2006, o Conselho de Administração do I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA decidiu introduzir novas alterações à ORAC, intensificando o detalhe da informação exigida à A enquanto concessionária do serviço público de telecomunicações, impondo ainda um prazo de 18 meses para a Recorrente concluir a recolha de informação e a elaboração da base de dados e levantamento do Cadastro de Condutas e infraestrutura associada.
33. A Recorrente informou o I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA de que a partir de 26 de novembro de 2007 iria disponibilizar na sua Extranet toda a informação disponível relativa a mapeamento de traçados de condutas, ramais de acesso a edifícios e localização de câmaras de visita através do acesso a uma base de dados cadastral, tendo ainda alertado a Autoridade Administrativa para as dificuldades de implementação da deliberação.
34. Pela deliberação de 28 de outubro de 2010, A Autoridade Administrativa insistiu na disponibilização pela Recorrente, na Extranet, de informação ainda mais detalhada sobre a ocupação de condutas, que deu origem à colocação dos semáforos na extranet.
35. Mais concretamente, em 28/10/2010, a Autoridade Administrativa deliberou, sendo do conhecimento da Recorrente ainda no ano de 2010, no que respeita a alterações à Oferta de Referência de Acesso a Condutas (ORAC), que:
“1. Deve a A alterar a ORAC no prazo de 20 dias úteis, após a notificação da decisão final do I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, tendo em conta o seguinte:
D 1. É adoptada uma abordagem geograficamente segmentada e faseada na disponibilização de informação sobre ocupação de condutas na Extranet, com os seguintes prazos máximos, contados a partir da data de aprovação da deliberação final:
- Grande Lisboa e Grande Porto: 3 meses
- Restantes ''áreas C'' da análise do mercado 5: 6 meses
- ''Áreas NC'' da análise do mercado 5 1: Não se exige a inclusão de informação sobre ocupação na Extranet, excepto quando se trate de novas condutas construídas no decurso do ano de 2009 e seguintes 2, ou quando se trate de condutas que, independentemente da data da sua construção, foram objecto de análise de viabilidade 3, devendo essa informação ser incluída na Extranet no prazo máximo de 6 meses.
D 2. Relativamente a condutas em que seja obrigatória a disponibilização de informação ''on-line'' nos termos referidos em D 1, enquanto a informação não estiver disponível na Extranet:
- O prazo de resposta a pedido de análise de viabilidade de ocupação reduz-se de 15 dias de calendário para 10 dias de calendário (para 100% dos casos).
- A A não poderá cobrar um preço, nestas áreas, pela resposta a um pedido de análise de viabilidade de ocupação (se a resposta for negativa ou, caso seja positiva, se dela resultar posteriormente um pedido de acesso e instalação submetido pela beneficiária), uma vez que os pedidos de análise de viabilidade são desencadeados pelo facto de a informação sobre ocupação de condutas ainda não se encontrar disponível na Extranet.
D 3. Nas ''áreas NC'' reduz-se o prazo de resposta a pedido de análise de viabilidade de ocupação de 15 para 10 dias de calendário, para 100% dos casos, seguindo-se o processo actualmente definido na ORAC.
D 4. Em caso de incumprimento dos prazos definidos em D 1, aplica-se a cada pedido de análise de viabilidade uma compensação em favor da beneficiária afectada de 50 euros multiplicada pelo número de dias de resposta (já que com recurso à Extranet a informação sobre viabilidade de ocupação é obtida em tempo real), a pagar trimestralmente a cada operador, sem prejuízo da possibilidade de aplicação de sanções pecuniárias compulsórias, nos termos previstos no artigo 116.º da Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro.
D 5. A informação a disponibilizar na Extranet consiste na informação que a A se propôs introduzir, incluindo necessariamente os seguintes elementos:
(a) perfil da conduta (com a representação da formação dos tubos entre CV’s adjacentes), permitindo a indicação do(s) tubo(s) a ocupar;
(b) informação indicativa da ocupação dos troços de conduta, com base num sistema com pelo menos quatro níveis (intervalos) de ocupação (em %);
(c) informação sobre a secção total, em cm, dos troços de conduta correspondendo à totalidade dos tubos do troço de conduta.
A A deverá transmitir ao I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA no prazo de trinta dias úteis após a notificação da presente deliberação, informação detalhada sobre o modo como é determinado em cada troço o respectivo nível de ocupação.
D 6. Nas zonas em que se encontre disponível a informação sobre ocupação de condutas (vide D 1) a beneficiária, após verificar se existe, ou não, espaço disponível, deve efectuar desde logo um pedido de instalação, como previsto na ORAC, podendo subsequentemente (após agendamento com a A nos termos previstos na ORAC) instalar o cabo seguindo uma regra de ocupação de tubos no sentido ascendente dando prioridade a tubos já ocupados, desde que haja espaço disponível.
D 7. Nos casos em que a A dê uma resposta positiva a um pedido de análise de viabilidade que venha a revelar-se errada ou que das informações da Extranet decorra incorrectamente essa viabilidade, salvo situações em que demonstre perante a beneficiária e o I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA a ausência da sua responsabilidade, deve a A introduzir na ORAC a obrigatoriedade de:
(a) pagar uma compensação de 200 euros à beneficiária e, cumulativamente;
(b) indicar um traçado alternativo viável e sem custos adicionais para a beneficiária, no prazo previsto na ORAC, no caso de inexistência de condutas no traçado em questão, não sendo necessário a beneficiária submeter um novo pedido de viabilidade;
(c) remover os cabos, no prazo previsto na ORAC e a expensas próprias, e permitir a utilização (ocupação) pela beneficiária das condutas às quais foi dada viabilidade, no caso de as condutas estarem ocupadas com cabos mortos da A inviabilizando a instalação;
D 8. No caso de resposta negativa a um pedido de análise de viabilidade de ocupação, a A deverá fundamentar a inviabilidade de ocupação no(s) troço(s) de conduta em causa perante a beneficiária, podendo o I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA efectuar acções de fiscalização, a pedido e caso considere justificado. Caso se comprove que a resposta negativa era incorrecta, deve a A pagar a compensação de 200 euros à beneficiária.
D 9. A A deve publicar, no prazo de 30 dias úteis a contar da notificação da presente deliberação, uma oferta de referência de acesso a postes, incluindo todas as condições procedimentais, técnicas e económicas aplicáveis, designadamente para a instalação de cabos, e considerando os princípios gerais adoptados na ORAC. A sua fundamentação detalhada deve ser remetida ao I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA no mesmo prazo, justificando os desvios face ao previsto na ORAC.
D 10. Deve ser eliminada na ORAC a referência à inelegibilidade, no âmbito daquela oferta, dos túneis de cabo das centrais da A, devendo assim ser incluídos no âmbito da ORAC a CV da A de acesso ao edifício de central e o ramal de acesso a esse edifício.
D 11. A A deve definir as condições aplicáveis na transição de acesso subterrâneo para acesso aéreo (postes) usando tubos de subida, devendo, especificamente:
(a) prever o acesso a tubos de subida da A, sempre que haja nos mesmos capacidade disponível;
(b) definir, na oferta de referência de acesso a postes, os procedimentos operacionais e as regras técnicas a que as beneficiárias têm de observar na construção dos tubos de subida a postes da A;
(c) incluir, na ORAC, um serviço de acesso ao ramal de acesso ao tubo de subida a postes, sempre que uma beneficiária pretenda uma transição de condutas para postes (quer para tubos de subida da A, quer para tubos de subida das beneficiárias em postes da A);
(d) incluir na ORAC e/ou na oferta de referência de acesso a postes, um serviço de análise de viabilidade conjunta de acesso a condutas e postes.
D 12. A A deve introduzir na ORAC uma compensação diária de 50 euros, por cada dia adicional de indisponibilização das plantas geradas.
D 13. Com vista a uma análise mais aprofundada, a A deve informar o I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA no prazo de 30 dias úteis após a notificação da presente deliberação sobre os desenvolvimentos que se encontra a efectuar para melhorar o nível de automatismo da Extranet e o respectivo prazo indicativo para a sua concretização, identificando o impacte que tais desenvolvimentos terão a nível da possibilidade de impressão automática e imediata das plantas aquando da sua consulta, explicando detalhadamente eventuais intervenções ''off-line'' que a condicionem.
D 14. Com vista a uma análise mais aprofundada, a A deve informar o I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA no prazo de 30 dias úteis após a notificação da presente deliberação sobre os motivos que levam a não disponibilizar a informação cartográfica em formato vectorial.
D 15. O I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA recomenda que a A tenha em conta eventuais sugestões que a AP... ou que beneficiários da ORAC individualmente lhe façam chegar sobre o SI ORAC, e, se as não aceitar, o faça fundamentadamente, em resposta àquela(s) entidade(s), com conhecimento ao I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA. Tais sugestões devem ser remetidas no prazo de dois meses contabilizados após a notificação da deliberação.
D 16. A A deve introduzir na ORAC o objectivo de 10 dias úteis, após recepção de informação das beneficiárias, para actualização da informação sobre o cadastro de ocupação de condutas na Extranet aplicável a 100% dos casos.
D 17. A A não deve facturar pelo serviço de acompanhamento da intervenção/instalação nos casos em que opta por não o efectuar ou, optando por fazê-lo, não comparece no dia e local agendados.
D 18. Caso seja efectuado um agendamento de acompanhamento pela A para intervenção/instalação a realizar pela beneficiária, e no terreno se verifique uma não comparência do(s) técnico(s) da A na hora e local agendado, a beneficiária poderá efectuar os trabalhos em causa (se não existir qualquer impedimento decorrente da não comparência do técnico da A), recomendando-se que o técnico da beneficiária contacte previamente a A.
D 19. Deve a A incluir um novo campo no formulário referente ao pedido de remoção de cabos que se destina a indicar à A se a beneficiária pretende utilizar o espaço ocupado pelos cabos a remover, para instalação posterior, num prazo máximo de 60 dias, devendo a A garantir que esse espaço não será utilizado por si ou por outras beneficiárias durante aquele período.
D 20. Na ORAC, qualquer serviço que implique uma resposta por parte da A a um pedido da beneficiária, relativa a um processo totalmente controlado pela A, deve ter associado um prazo-objectivo para o tempo daquela resposta e respectivas compensações em caso de incumprimento.
D 21. Deve a A alterar a ORAC no sentido de definir o prazo de resposta a pedidos de informação sobre condutas em 1 dia útil, para 100% dos casos.
D 22. Deve a A alterar a ORAC no sentido de reduzir o prazo para agendamento de acompanhamento de uma intervenção urgente (PQS4) de 8 para 4 horas (consecutivas).
D 23. Deve a A alterar a ORAC no sentido de definir o prazo de resposta a pedidos de instalação de cabos em condutas, em 5 dias úteis, para 100% dos casos.
D 24. Deve a A incluir na ORAC o parâmetro de qualidade de serviço (PQS7) correspondente ao prazo de envio (pela A à beneficiária) de orçamento para desobstrução de condutas, tendo como prazo-objectivo 5 dias úteis, para 100% dos casos.
D 25. Em caso de incumprimento do prazo de agendamento de acompanhamento das intervenções a realizar pelas beneficiárias, aplica-se por cada hora de atraso uma compensação de 25 euros (agendamento de intervenções não urgentes) e de 50 euros (agendamento de intervenções urgentes).
D 26. Quando a não comparência de colaboradores da A no local e hora agendado impeça, de alguma forma, que a beneficiária proceda à intervenção, aplica-se por cada hora de atraso uma compensação de 25 euros (agendamento de intervenções não urgentes) e de 50 euros (agendamento de intervenções urgentes), recomendando-se que a beneficiária, no máximo até duas horas após a hora de agendamento, contacte a A dando conta desse incumprimento.
D 27. Em caso de incumprimento do PQS6 ou do PQS7 aplica-se uma compensação de 50 euros diários, limitada a um máximo de 60 dias úteis.
D 28. Deve a A alterar na ORAC as condições de pagamento de compensações por incumprimento dos objectivos definidos nos seguintes termos:
- Caso as beneficiárias remetam à A as previsões de procura de condutas, nos termos e com a fiabilidade especificados na oferta, beneficiam da totalidade das compensações;
- Caso contrário, beneficiam de 75% do valor das compensações definidas na ORAC.
Em todo o caso, os planos de previsões a apresentar pelas beneficiárias da ORAC não abrangem número de pedidos de informação sobre condutas, número de pedidos de intervenções urgentes e não urgentes e número de pedidos de desobstruções de condutas.
D 29. Deve a A introduzir na ORAC a obrigação de proceder, por sua própria iniciativa, ao pagamento das compensações por incumprimento dos objectivos de qualidade de serviço fixados, até ao final do segundo mês após o final do semestre em questão, sem prejuízo para posterior reavaliação e acerto tendo em conta os valores apurados pelas beneficiárias.
D 30. Deve a A alterar a ORAC e o contrato-tipo no sentido de consagrar o direito de as beneficiárias (ou de a A) serem compensadas por prejuízo que venham a sofrer nas suas redes, desde que o mesmo decorra do acesso ou dos trabalhos ou dos meios instalados nas condutas durante a instalação, intervenção ou remoção, pela A (ou pelas beneficiárias)”.
36. Na deliberação referida no número anterior (que foi recebida pela Recorrente) e antecedendo e fundamentando essa deliberação, expôs a Autoridade Administrativa, além do mais, que
“1. ENQUADRAMENTO
O I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA tem vindo a defender, desde a liberalização no sector das comunicações electrónicas, a existência de uma concorrência efectiva e sustentável, com recurso nomeadamente ao acesso grossista à infra-estrutura do operador com poder de mercado significativo (PMS).
(…)
Portugal foi precursor, nomeadamente a nível europeu, no que diz respeito à disponibilização das condutas do operador histórico para o estabelecimento de infra-estruturas concorrentes, com vista à afirmação de uma concorrência sustentada no mercado das comunicações electrónicas, em benefício dos consumidores finais. Trata-se de um percurso que teve a sua primeira expressão política na redacção do contrato de concessão do serviço público de telecomunicações (artigo 7.º das respectivas bases), reforçada posteriormente na Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro (artigo 26.º), e
que teve depois reflexo regulatório na decisão de 17.07.2004 do I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, que levou assim à disponibilização de uma oferta de referência de acesso a condutas (ORAC), na qual assume particular relevância a disponibilização de informação sobre os traçados e ocupações das condutas.
(…)
2.1. A oferta de referência de acesso a condutas da A
A obrigação de disponibilização, por parte da A, do acesso às condutas de que seja proprietária ou cuja gestão lhe incumba, foi imposta pelo artigo 26.º da Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro, o qual estabeleceu, ainda, a obrigação de disponibilização, pela concessionária, de uma ORAC, na qual devem constar as condições de acesso e utilização, nos termos a definir pelo I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA.
A ORAC entrou em vigor em 14.07.2006 e, desde então, tem registado um interesse acrescido por parte das beneficiárias, como atestam a evolução do número de pedidos de informação sobre condutas e do número de pedidos de análise de viabilidade de ocupação.
2.2. Inclusão de informação sobre ocupação de condutas na Extranet e serviço de viabilidade de ocupação de condutas Um aspecto fundamental no âmbito de uma aproximação a um acesso equivalente será a beneficiária poder avaliar, por si própria e em tempo real, se a instalação de cabos em condutas da A será viável num determinado traçado.
Sobre este aspecto, na deliberação do I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA de 17.07.2004 que definiu os elementos mínimos da ORAC da A, estabeleceu-se a obrigação de a A proceder à construção, manutenção e actualização de uma base de dados (Extranet) que disponibilize informação descritiva das condutas e infra-estrutura associada, incluindo informação sobre dimensões das condutas e do volume ocupado para efeitos de cedência de espaço, tendo-se fixado, na deliberação de 26.05.2006, em 18 meses o prazo máximo para que essa base de dados estivesse operacional (ou seja, em 26.11.2007).
Sem prejuízo de ter interposto acção administrativa especial visando a declaração de nulidade das deliberações do I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA de 17.07.2004 e de 26.05.2006, a A disponibiliza, desde 26.11.2007, o acesso a uma Extranet que contém a identificação/localização de infra-estruturas, designadamente o mapeamento de traçados de condutas, ramais de acesso a edifícios e localização de câmaras de visita, mas que não contém qualquer informação sobre dimensões, volume ocupado e espaço disponível em conduta, incumprindo assim o determinado pelo I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA.
Após esclarecimentos solicitados pelo I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA em 07.12.2007, a A reiterou em 21.12.2007 que a exigência de disponibilização de informação relativa à ocupação de condutas seria desproporcionada, uma vez que implicaria a adição de campos de informação sobre cabos e condutas nas aplicações de gestão de infra-estruturas e um exaustivo levantamento de campo para recolha de informação de ocupação de condutas, com a identificação do cabo ou cabos instalados em cada furo de condutas e em cada subconduta (o que implicaria a abertura de mais de 250.000 caixas de visita e de passagem, estimando a A que resultaria num investimento muito significativo e custos de manutenção não inferiores a cerca de 7% do valor desse investimento por ano).
A não inclusão de informação sobre ocupação das condutas da A na Extranet implica que, desde então, os Beneficiários da ORAC tenham tido de recorrer ao serviço de análise de viabilidade de, ocupação de condutas, o qual prevê a resposta da A num prazo máximo de 15 dias de calendário, que é exigido para 100% dos casos e tem sido incumprido14 pela A. No entanto, é preciso relevar que estando o prazo-objectivo definido para 100% dos casos, poderá acontecer que, por exemplo, em 1000 casos a A cumpra 999 e falhe 1, sendo que, em termos de resultado, a A incumpriu.
Desde a deliberação de 17.07.2004, a situação tem vindo a alterar-se.
(…)
Sobre a informação a disponibilizar na Extranet, a S e a T (em 17.07.2008 e em 05.09.2008 respectivamente), defenderam a inclusão dos seguintes itens (com identificação, em cada um deles, dos cabos não utilizados e respectivas datas de instalação):
(a) Espaço útil por troço;
(I) Espaço usado para efeitos da concessão;
(c) Espaço reservado para a concessão (com data de início de reserva);
(d) Espaço usado para empresas do Grupo (extra concessão);
(e) Espaço usado por terceiros.
Releva-se que a reserva de espaço para utilização própria futura pela A para a prestação de serviços concessionados já se encontra definida na ORAC desde a entrada em vigor da oferta, devendo a A fundamentar devidamente essa reserva junto do I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA.
Assim, tendo em conta os argumentos expostos pelo I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA no relatório anexo à presente decisão, considera-se excessivo tal detalhe de informação, sendo apenas relevante, para os efeitos de análise de viabilidade e instalação de cabos da beneficiária e para a promoção de situações de transparência, conhecer o perfil da conduta, a secção total dos troços de conduta e a informação indicativa da ocupação dos troços de conduta (em %), com base num sistema de níveis (intervalos) de ocupação, contabilizando já o espaço reservado para utilização futura.
D 5. A informação a disponibilizar na Extranet consiste na informação que a A se propôs introduzir, incluindo necessariamente os seguintes elementos:
(a) perfil da conduta (com a representação da formação dos tubos entre CV’s adjacentes), permitindo a indicação do(s) tubo(s) a ocupar;
(I) informação indicativa da ocupação dos troços de conduta, com base num sistema com pelo menos quatro níveis (intervalos) de ocupação (em %);
(c) informação sobre a secção total, em cm, dos troços de conduta correspondendo à
totalidade dos tubos do troço de conduta.
A A deverá transmitir ao I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA no prazo de trinta dias úteis após a notificação da presente deliberação, informação detalhada sobre o modo como é determinado em cada troço o respectivo nível de ocupação.
A partir do momento e para as zonas em que se encontra disponível, na Extranet, a informação referida em D 5, o serviço de análise de viabilidade de ocupação de condutas tal como existe deixa de fazer sentido. Para essas zonas, após verificar se existe, ou não, espaço disponível, a beneficiária deve efectuar desde logo um pedido de instalação, como previsto na ORAC, podendo subsequentemente (após agendamento com a A nos termos previstos na ORAC) instalar o cabo (seguindo uma regra de ocupação de tubos no sentido ascendente) preferencialmente num tubo ocupado, desde que haja espaço disponível, para se assegurar uma gestão eficiente da ocupação das condutas, assim se reduzindo o prazo até à instalação em quinze dias de calendário decorrente da eliminação do serviço de análise de viabilidade.
Assim:
D 6. Nas zonas em que se encontre disponível a informação sobre ocupação de condutas (…) a beneficiária, após verificar se existe, ou não, espaço disponível, deve efectuar desde logo um pedido de instalação, como previsto na ORAC, podendo subsequentemente (após agendamento com a A nos termos previstos na ORAC) instalar o cabo seguindo uma regra de ocupação de tubos no sentido ascendente dando prioridade a tubos já ocupados, desde que haja espaço disponível.
(…)
2.2.1. Falhas nos resultados das análises de viabilidade
Um pedido de análise de viabilidade de ocupação de condutas da A, suImetido por uma Beneficiária da ORAC, pode conter um ou mais troços de conduta entre câmaras de visita, até um máximo de 20 troços por pedido (tal como determinado pelo I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA na decisão de alterações à oferta datada de 26.05.2006).
Tem de existir sempre uma resposta da A a cada pedido de viabilidade formulado por uma Beneficiária, resposta que poderá ser “viável” ou “inviável”. Para que a resposta a um pedido de viabilidade seja “viável”, entende-se que isso acontece quando em todos os troços de conduta (e respectivas CV’s adjacentes) integrantes do pedido, exista viabilidade de ocupação com os cabos da Beneficiária. A resposta a um pedido de viabilidade é “inviável” quando a respectiva análise identificar pelo menos um troço de conduta integrante do pedido cuja ocupação com os cabos da Beneficiária seja considerada inviável pela A.
Uma das limitações identificadas pelas Beneficiárias da ORAC consiste no facto de, após a A ter dado resposta positiva (portanto “viável”) ao pedido de viabilidade de ocupação de cabos (do operador Beneficiário) nas suas condutas, estas não existirem ou estarem localizadas em locais distintos dos indicados nas plantas. Por outro lado, quando as respostas a pedidos de viabilidade indicam traçados alternativos, as Beneficiárias informaram ter identificado, em várias situações, condutas que não estavam indicadas nas plantas iniciais.
Nos casos em que a A responde positivamente a um pedido de análise de viabilidade e envia à Beneficiária o projecto global detalhado com o traçado a ser ocupado pelos cabos da Beneficiária, e esta posteriormente constata no terreno que não lhe é possível ocupar esse traçado, sendo o lapso imputável à A (só se consideram aqui viabilidades incorrectas por motivos imputáveis à A, excluindo viabilidades incorrectas por não ter sido ainda remetida a informação actualizada de informação de cadastro de ocupação de condutas por qualquer Beneficiária (…) entende-se que as Beneficiárias não devem ser prejudicadas e como tal deve a A:
(a) indicar um traçado alternativo sem custos adicionais para a Beneficiária, no prazo previsto na ORAC, no caso de inexistência de condutas no traçado em questão, não sendo necessário a Beneficiária submeter um novo pedido de viabilidade;
(I) remover os cabos, no caso de as condutas estarem ocupadas com cabos mortos da A inviabilizando a instalação, nos prazos previstos na ORAC e a expensas próprias, e permitir a utilização (ocupação) pela Beneficiária das condutas às quais foi dada viabilidade.
Por outro lado, o I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA entende que as falhas no cadastro das infra-estruturas são indesejáveis, pelo que se justifica prever a existência de uma compensação que incentive a A a assegurar a correcção da informação de cadastro. Assim, desde que a incorrecção ou imprecisão seja imputável à A (por exemplo, caso não resulte de omissão de informação por parte das Beneficiárias da ORAC), deve aquela empresa proceder ao pagamento de uma compensação cujo valor deve ser mais elevado do que o valor diário aplicável ao atraso na resposta a pedidos de viabilidade uma vez que, além do tempo decorrido entre a resposta positiva e a verificação de que essa resposta não estava correcta, a Beneficiária tem custos na deslocação de pessoal e respectivo material ao local da instalação sem que possa imediatamente executar os traIalhos de instalação.
D 7. Nos casos em que a A dê uma resposta positiva a um pedido de análise de viabilidade que venha a revelar-se errada ou que das informações da Extranet decorra incorrectamente essa viabilidade, salvo situações em que demonstre perante a Beneficiária e o I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA a ausência da sua responsabilidade, deve a A introduzir na ORAC a obrigatoriedade de:
(a) pagar uma compensação de 200 euros à Beneficiária e, cumulativamente;
(b) indicar um traçado alternativo viável e sem custos adicionais para a Beneficiária, no prazo previsto na ORAC, no caso de inexistência de condutas no traçado em questão, não sendo necessário a Beneficiária submeter um novo pedido de viabilidade;
(c) remover os cabos, no prazo previsto na ORAC e a expensas próprias, e permitir a utilização (ocupação) pela Beneficiária das condutas às quais foi dada viabilidade, no caso de as condutas estarem ocupadas com cabos mortos da A inviabilizando a instalação.
No caso de resposta negativa a um pedido de análise de viabilidade de ocupação, a A deverá fundamentar a inviabilidade de ocupação no(s) troço(s) de conduta em causa perante a Beneficiária, podendo o I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA efectuar acções de fiscalização, a pedido e caso considere justificado.
Caso se comprove que a resposta negativa era incorrecta, deve a A pagar uma compensação de 200 euros à Beneficiária, pelos prejuízos causados, nomeadamente pelo impedimento causado à Beneficiária em instalar, com maior celeridade, os cabos nos troços em causa.
Considerando-se útil a implementação de um serviço de visitas conjuntas (A e Beneficiária) para despistagem de situações de inviabilidade de ocupação, recomenda-se que a A inclua na ORAC um serviço de visitas conjuntas em caso de respostas negativas a pedidos de análise de viabilidade ou acompanhe as respostas negativas àqueles pedidos com evidências fotográficas.
D 8. No caso de resposta negativa a um pedido de análise de viabilidade de ocupação, a A deverá fundamentar a inviabilidade de ocupação no(s) troço(s) de conduta em causa perante a Beneficiária, podendo o I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA efectuar acções de fiscalização, a pedido e caso considere justificado. Caso se comprove que a resposta negativa era incorrecta, deve a A pagar a compensação de 200 euros à Beneficiária.
(…)
D 9. A A deve publicar, no prazo de 30 dias úteis a contar da notificação da presente deliberação, uma oferta de referência de acesso a postes, incluindo todas as condições procedimentais, técnicas e económicas aplicáveis, designadamente para a instalação de cabos, e considerando os princípios gerais adoptados na ORAC. A sua fundamentação detalhada deve ser remetida ao I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA no mesmo prazo, justificando os desvios face ao previsto na ORAC.
2.4. Informação sobre condutas e infra-estrutura associada da A
2.4.1. Impressão automática das plantas pelas Beneficiárias
Segundo a operadora C, o acesso à informação sobre  condutas – i.e., o serviço de disponibilização de plantas através da Extranet – está dependente da intervenção de pessoal da A e não permite às Beneficiárias da ORAC, aquando da sua consulta, a impressão automática das plantas com a localização das condutas.
Em relação à possibilidade de a beneficiária imprimir directamente as plantas de que necessite, o processo actual prevê que esta tenha de confirmar a geração das plantas e só posteriormente (no prazo de um dia útil) a possa recolher. De facto, nos termos da ORAC, o serviço de acesso à informação via Extranet permite aos utilizadores da Beneficiária a visualização de um mapa à escala nacional, a selecção de plantas e o acesso em formato pdf e, segundo o manual de utilização da Extranet, só após a confirmação da geração de plantas pelo utilizador é que são processados os ficheiros pdf à escala 1:1000, sendo disponiIilizados na área de cada Beneficiária no prazo objectivo  de um dia útil.
(…)
2.6. Informação de cadastro a remeter pela Beneficiária
2.6.1. Recomendação para elaboração da informação de cadastro
Nos termos da ORAC, no final da instalação (ou) intervenção (ou) remoção (ou) desvio de traçados pela Beneficiária, esta tem de apresentar à A, no prazo máximo de trinta dias, um cadastro de ocupação actualizado.
Segundo o anexo 3 da ORAC, o cadastro da ocupação deve incluir plantas com troços de condutas, comprimento dos troços de conduta, câmaras de visita, ramais de acesso a edifícios, pontos de entrada e saída, esquemas dos espelhos das câmaras de visita, tipo e número de cabos instalados, secção dos cabos instalados, data de início da ocupação, extensão em metros de condutas e subcondutas, material utilizado e folgas. Essa informação de cadastro é apresentada através do formulário 4.6 da ORAC, designado por formulário de cadastro de ocupação, o qual deve ser acompanhado por plantas contendo informação do traçado.
Sobre esta matéria, a A, elaborou uma “Recomendação para elaboração da informação de cadastro da oferta ORAC…”, cujas instruções a C considerou terem um carácter equívoco na medida em que fariam referência a procedimentos de carácter obrigatório para os Beneficiários da ORAC.
Sem prejuízo de o I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA considerar que a referida recomendação para elaboração da informação de cadastro (da qual teve conhecimento através da C) não faz parte integrante da ORAC e que não reveste um carácter vinculativo para os Beneficiários, entende-se que a mesma é útil no sentido de prever uma maior precisão dos aspectos relacionados com a ocupação das condutas pelos operadores, contribuindo para uma melhor identificação dos elementos envolvidos, designadamente traçados de cabos, pontos de ligação, pontos de entrada e folgas, sendo benéfica a representação de furos e cabos dos operadores nos espelhos das caixas de visita.
Assim, considera-se importante que a A e as Beneficiárias da ORAC possam recolher e identificar o mesmo tipo de informação, aquando da instalação, intervenção ou remoção de cabos nas condutas, podendo as regras (recomendadas pela A) para apresentação da informação sobre  traçados de cabos, pontos de ligação, pontos de entrada, folgas, furos e cabos nos espelhos das caixas de visita, revestir ainda uma maior eficácia e transparência se forem integradas na Iase de dados descritiva das condutas actualmente disponibilizada através de acesso Extranet.
2.6.2. Prazo para actualização do cadastro
Conforme referido na secção anterior, subsequentemente à intervenção (com impacto cadastral) de uma Beneficiária da ORAC nas condutas da A, a Beneficiária está obrigada a remeter à A, no prazo de 30 dias de calendário, a informação actualizada do cadastro de ocupação das condutas, podendo vir o I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA a definir medidas que incentivem a esse envio, caso venha a ter conhecimento que este procedimento não está a ser cumprido.
Neste contexto, a A, como entidade gestora da Extranet, ao receber das Beneficiárias a informação actualizada do cadastro de ocupação das condutas, deve inserir essa informação na Extranet, considerando-se útil e proporcional a definição de um prazo de 10 dias úteis para a efectivação dessa actualização. Não se justifica a imposição de uma compensação neste caso, uma vez que a mesma já é aplicável no caso de falhas na informação sobre viabilidade.
D 16. A A deve introduzir na ORAC o objectivo de 10 dias úteis, após recepção de informação das Beneficiárias, para actualização da informação sobre o cadastro de ocupação de condutas na Extranet aplicável a 100% dos casos”.
37. A Recorrente comunicou à Autoridade Administrativa que não dispunha nos sistemas de informação com o nível de detalhe solicitado, nem tal lhe seria exigível e informou igualmente o I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA que pretendia “brevemente disponibilizar a informação de perfis das condutas com a representação da formação dos tubos das condutas entre CV’s adjacentes”, salientando também que tal informação poderia revelar alguma desatualização.
*
38. Em 2011, sempre que um operador de telecomunicações ou um construtor, que cumpra as normas da ORAC, pretendesse efetuar uma alteração às condutas existentes da Recorrente, acedendo a estas condutas, efetuava um pedido de viabilidade nesse sentido à Recorrente.
39. Em caso de resposta afirmativa ao pedido de viabilidade, a Recorrente e os requerentes, conjuntamente, procediam ao agendamento da data em que se iria iniciar a intervenção.
40. Os técnicos da Recorrente, usualmente, não acompanhavam a instalação de novos cabos nas condutas, a tempo inteiro ou então nem sequer acompanham essa instalação.
41. A Recorrente não verifica quando é que a intervenção solicitada estava terminada, aguardando que os operadores (ou os construtores) lhe comunicassem quando é que terminavam a intervenção e os resultados dessa intervenção, só depois procedendo à transposição, para o cadastro, da informação comunicada.
42. O prazo de 30 dias para os outros operadores comunicarem à Recorrente a cessação da obra, normalmente, não era cumprido, não tendo a Recorrente nenhum sistema autónomo implantado para indagar quando é que as intervenções estavam concluídas e o resultado dessas intervenções.
43. Quando os operadores (ou os construtores) concluíam a intervenção nas condutas da Recorrente, esta não vistoriava (com fiscais qualificados para o efeito, nem por qualquer outro funcionário), no local, sobre  se a intervenção realizada era a mesma que lhe tinha sido comunicada, entendendo a Recorrente que se existisse alguma desconformidade, acabaria por ter conhecimento mais tarde, quando novas intervenções fossem solicitadas, por outros operadores, no local.
44. Se a intervenção for efetuada por empreiteiros contratados pela Recorrente, o procedimento é o mesmo que referido no número 43. dos factos provados.
45. A Recorrente não estabelecia nenhum agendamento com os construtores ou os operadores, no sentido da obra incluída no pedido de viabilidade estar concluída em determinada data.
45A. Nos termos da ORAC, e tal como foi comunicado pela Autoridade Administrativa, pende sobre  as Beneficiárias (definidas como “Empresa que oferece redes ou serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público”) o dever de comunicação de quando é que as operações solicitadas estão concluídas.
46. A Recorrente tinha conhecimento, em 2011, que vários operadores tinham informado incorretamente sobre  as operações realizadas nas condutas da Recorrente.
47. Os procedimentos implementados pela Recorrente, e referidos nos números 38. a 46., possiIilitaram as ocorrências referidas nos números 1., 11. e 14. dos factos provados.
48. A Autoridade Administrativa analisou 33 caixas de visita nas inspeções que efetuou.
48A. As obrigações da Recorrente, relativas à ORAC, e sem prejuízo do número de caixas de visita (CVP) reportam-se a milhares de condutas.
48I. A Autoridade Administrativa não tem instalado qualquer sistema de informação centralizado que assegure a informação sobre  o cadastro de todas as infraestruturas aptas ao alojamento de todas as redes de infraestruturas.
*
49. A Recorrente tem cerca de 7000 funcionários, estando 2500 adstritos à ORAC.
50. Em 2012 teve um volume de negócios de €1.774.317.741,00 e um resultado líquido de - €86.901.669,00.
51. A Recorrente, em 2011, apresentou um resultado líquido do exercício negativo, no valor de € - 369.353.353,00 e um volume de negócios de €1.796.757.880,00.
52. A Recorrente nunca foi condenada anteriormente pela prática de infrações como as que foram imputadas pela Autoridade Administrativa.
*
I) Factos não provados
1. No que respeita aos números 8. e 9. dos factos provados, a Recorrente não tinha possibilidade de, na extranet, representar a situação realmente existente no terreno.
2. Existiam deficiências de funcionamento nos sistemas extranet da Recorrente.
3. No que respeita às condutas referidas nos números 8. e 9. dos factos provados, estas encontravam-se devidamente cadastradas no cadastro da Recorrente.
4. O construtor referido no número 15. dos factos provados pertencia ao quadro de funcionários da Recorrente.
5. A Recorrente realiza auditorias aleatórias sobre  as caixas de visita.
6. As obrigações da Recorrente, relativas à ORAC, reportam-se a 235.000 caixas.
7. No que respeita aos factos presentes no número 39. dos factos provados, era a Recorrente que, autonomamente, comunicava a data do agendamento, sem qualquer concertação com o requerente.
8. A Recorrente efetuava os procedimentos referidos nos números 43. e 44. dos factos provados por entender que a ORAC não lhe impunha qualquer vistoria.
9. No que respeita aos factos presentes no número 47. dos factos provados, as demais desconformidades tiveram origem nos procedimentos referidos nos números 38. a 46. dos factos provados.
*
Os demais elementos da decisão Recorrida e das alegações de recurso não foram selecionados por se tratarem de elementos irrelevantes ou conclusivos, insuscetíveis de seleção.
De salientar, tamIém, que um conjunto de elementos presentes na resposta de fls. 2139 a 2148 não foram igualmente selecionados por se tratarem de elementos conclusivos.
*
c) Motivação da matéria de facto

(...)
IV. Enquadramento jurídico
A Autoridade Administrativa imputou à Recorrente a prática de 27 infrações, previstas pelo artº 113º, nº 1, al. xxx), da Lei nº 5/2004, de 10/02 (na versão anterior às alterações introduzidas pela Lei nº 51/2001).
Estipula o artº 113º, nº 1, al. xxx), da Lei nº 5/2004 (com a redação introduzida pelo DL nº 176/2007, de 08/05,k que 1 - Sem prejuízo de outras sanções aplicáveis, constituem contra-ordenações: xxx) O incumprimento de ordens ou mandados legítimos da ARN regularmente comunicados aos seus destinatários.
Em causa, neste processo, e segundo a própria Autoridade Administrativa, está o “desrespeito pela Deliberação de 28/10/2010”.
Analisando a decisão recorrida, verifica-se que as imputações referem-se a 3 grupos de situações:
(i) situações em que a extranet não reflete o que se encontra no terreno, apresentando informação em quantidade inferior à que deveria apresentar;
   (ii) situações em que a extranet não reflete o que se encontra no terreno, apresentando informação que não se encontra no terreno;
   (iii) uma situação em que o grau de disponiIilidade da conduta está indevidamente exposto.
Estas situações são referentes às seguintes Caixas de Visita:
a) Rua Alfredo Mesquita, em LisIoa, na caixa de visita prolongamento da caixa nº 45366;
I) Alameda dos Oceanos (Perto Rotunda SUL – GALP), CVP 87566 – Troço 95 (Oeste);
c) Cruzamento Alameda dos Oceanos com Rua Mar do Norte, em LisIoa, na CVP 87794 – Troço 1029 (Oeste);
d) Cruzamento Alameda dos Oceanos com Rua Mar do Norte, em LisIoa, na CVP 87794 – Troço 513 (Norte);
e) Rua Dr. José Joaquim Almeida, na CVP 1493 – Troço 95 (Sul);
f) Rua 5 de OutuIro, em Carcavelos, na CVP 4096 – Troço 95 (Este);
g) Rua José da Costa Pedreira, em LisIoa, CVP 34005 – Troço 190 Oeste;
h) Rua José da Costa Pereira, em LisIoa, CVP 22542 – Troço S/N (Sul);
i) Rua EmIaixador Martins Janeira, em LisIoa CVP 113619 – Troço 95 (Norte)
j) Rua Manuel Marques, em LisIoa CVP 46076 – Troço 190 (Norte);
k) Rua dos Soeiros, em LisIoa, CVP 53609, os troços 157 (Norte) e 475 (Noroeste);
l) Rua dos Soeiros, em LisIoa, Troço 190 (Sudeste) da CVP 69284;
m) Rua dos Soeiros, em LisIoa e no que respeita à CVP 69285 – Troços 190 (Sudeste) e Troço 95 (Noroeste);
n) Cruzamento entre a Rua do Irasil e a Rua do Parque, em LisIoa, e no que respeita à CVP 26901 – Troço Nordeste.
Vejamos então cada uma das situações.
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a) Rua Alfredo Mesquita, em LisIoa, na caixa de visita prolongamento da caixa nº 45366
No presente processo provou-se que:
- A Autoridade Administrativa emitiu, em 28/10/2010, uma deliberação, nos termos da qual deveria a Recorrente disponibilizar na sua extranet (cfr. número 35. dos factos provados):
“D 5. A informação a disponibilizar na Extranet consiste na informação que a A se propôs introduzir, incluindo necessariamente os seguintes elementos: (a) perfil da conduta (com a representação da formação dos tubos entre CV’s adjacentes), permitindo a indicação do(s) tubo(s) a ocupar; (I) informação indicativa da ocupação dos troços de conduta, com base num sistema com pelo menos quatro níveis (intervalos) de ocupação (em %); (c) informação sobre  a secção total, em cm, dos troços de conduta correspondendo à totalidade dos tubos do troço de conduta”.
Evidentemente que, subjacente a este dever, imposto pela Autoridade Administrativa, está a necessidade de indicação atualizada e correta das infraestruturas em causa.
Provou-se também que:
- No dia 19/04/2011, na Rua Alfredo Mesquita, em Lisboa, na caixa de visita prolongamento da caixa nº 45366, no topo da rua, verificou-se existir uma caixa de visita (“CVP”) e um ramal de acesso para um edifício não representados na Extranet (cfr. número 1 dos factos provados);
- A CVP e o ramal referidos eram de construção recente à data da fiscalização, sendo construídos pelo construtor responsável pela operação urbanística, que não comunicou à Recorrente a conclusão da obra. (cfr. número 2. dos factos provados).
Prova-se, assim, a existência de uma informação desatualizada no cadastro e, consequentemente, na extranet da Recorrente.
Mais se provou que a Recorrente saIia do início da construção da CVP e do pedido de colocação de cabo na conduta (por parte da operadora C) e não cuidou de saber em que data a mesma CVP e ramal de acesso ao edifício ficaram concluídos (cfr. número 6 dos factos provados).
Mas a Recorrente tinha necessariamente conhecimento, em Janeiro de 2011, que a CVP e o ramal de acesso estariam concluídos, já que a operadora C lhe dirigiu um pedido para colocação de um cabo numa conduta pelo ramal (cfr. número 4 dos factos provados).
Tal pressupunha que a obra estivesse concluída, pois não iria a C colocar um cabo, que iria passar por uma CVP e por um ramal, sendo que esta CVP e o ramal ainda estariam em construção.
Por esse motivo, por não indagar junto do construtor, a data da conclusão da CVP e do ramal, apesar do pedido da Operadora C, a Recorrente não atuou com o cuidado que podia e era capaz (cfr. número 6. dos factos provados).
Está assim provada a negligência da Recorrente.
Inexistem causas de exclusão da ilicitude, culpa ou punibilidade.
A Recorrente praticou, por isso, uma contraordenação no que respeita à falta de inclusão, no cadastro (e extranet) da CVP existente no prolongamento da caixa nº 45366.
A Autoridade Administrativa, no entanto, imputou à Recorrente a prática de duas contraordenações: uma relativa à não inclusão da CVP; e outra respeitante à não inclusão do ramal.
Entendemos, no entanto, que se trata da mesma construção, respeitante a uma CVP e ramais de acesso a esta. Por esse motivo, e sem prejuízo do que infra iremos expor acerca do número de infrações, o TriIunal entende que se verifica apenas uma violação do artº 113º, nº 1, al. xxx), da Lei nº 5/2004.
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I) Alameda dos Oceanos (Perto Rotunda SUL – GALP), CVP 87566 – Troço 95 (Oeste)
No dia 19/04/2011, surgia uma conduta visível na Extranet ORAC na Alameda dos Oceanos (Perto Rotunda SUL ), em Lisboa, na CVP 87566 – Troço 95 (Oeste), sendo que, no terreno, a conduta encontrava-se tamponada - cfr. número 7. dos factos provados.
Tal não viola a deliberação da Autoridade Administrativa. Uma conduta tamponada é uma conduta que existe, mas que tem um tampão na extremidade, para garantir que essa conduta se mantém limpa, se for necessário usá-la.
Portanto, se existir, deve a mesma ser representada na Extranet Orac.
Assim sendo, entende o Tribunal que estes factos são contraordenacionalmente irrelevantes, sendo a Recorrente imediatamente absolvida da contraordenação que lhe era imputada.
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c) Cruzamento Alameda dos Oceanos com Rua Mar do Norte, em LisIoa, na CVP 87794 – Troço 1029 (Oeste)
Provou-se que no dia 19/04/2011, no Cruzamento Alameda dos Oceanos com Rua Mar do Norte, em Lisboa, na CVP 87794 – Troço 1029 (Oeste), verificou-se existir 1 tuIo de secção intermédia não cadastrado na Extranet ORAC.
Tal constitui uma violação da deliberação da Autoridade Administrativa de 28/10/2010.
Sucede que não foi possível ao Tribunal apurar, com certeza qual o dever de cuidado que foi violado por parte da Recorrente.
A imputação das infrações, a títubo negligente, não é uma operação objetiva: é sempre necessário apurar qual o dever de cuidado que, objetivamente, foi violado.
Ora não se sabe qual foi a razão que levou à não atualização do cadastro. Terá sido um lapso dos serviços da Recorrente? Terá sido uma informação errada de um outro operador?
O Tribunal desconhece e tem e consideração que a Recorrente gere uma rede de mais de 250.000 CVP’s (cfr. número 35. dos factos provados).
A existência de um tubo não cadastrado é um lapso perfeitamente possível de ocorrer, sendo admissível que a Recorrente, apesar de todos os cuidados, possa ter algum lapso inadvertido (que poderá decorrer até de alguma desatenção humana, contra as instruções da própria Recorrente).
E também é preciso não esquecer que, na dúvida, a Recorrente beneficia do princípio da presunção de inocência.
Na dúvida, o Tribunal entende que não é possível imputar qualquer negligência
E por isso absolve a Recorrente da prática de qualquer infração resultante desta CVP.
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d) Cruzamento Alameda dos Oceanos com Rua Mar do Norte, em LisIoa, na CVP 87794 – Troço 513 (Norte)
A mesma apreciação que fizemos para a infração respeitante à CVP 87794 – Troço 1029 (Oeste) é a mesma que podemos efetuar para a infração respeitante à CVP 87794 – Troço 513 (Norte).
De facto, provou-se que no dia 19/04/2011, no Cruzamento Alameda dos Oceanos com Rua Mar do Norte, em Lisboa, na CVP 87794 – Troço 513 (Norte), em Lisboa existia um tuIo de secção intermédia e quatro tubos de secção superior que não se encontravam representados na informação disponibilizada pela Extranet ORAC (cfr. número 9. dos factos provados).
Tal constitui uma violação da deliberação da Autoridade Administrativa, de 28/10/2010.
Mas esta violação foi causada por uma deficiente organização da Recorrente? Foi algum lapso de um trabalhador?
O Tribunal desconhece a causa.
O que sabe é que a Recorrente tem mais de €250.000,00 caixas (CVP).
Na dúvida quanto à imputação de qualquer violação do dever de cuidado, o Tribunal absolve a Recorrente da prática da infração.
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e) Rua Dr. José Joaquim Almeida, na CVP 1493 – Troço 95 (Sul)
Neste caso, provou-se que no dia 02/05/2011, na Rua Dr. José Joaquim Almeida, na CVP 1493 – Troço 95 (Sul), em Carcavelos, não existia uma conduta, não se encontrando, informação disponibilizada pela Extranet ORAC atualizada relativamente ao número de condutas (cfr. número 10. dos factos provados).
Tal ter-se-á ficado a dever a uma eliminação de um dos furos do Troço 95 – sul (cfr. número 10A. dos factos provados).
Mais uma vez, existe violação da deliberação de 28/10/2010.
Mas desconhece-se qual foi o dever de cuidado que a Recorrente violou. Desconhece-se também quem terá eliminado a conduta que existia e deixou de existir. E se o fez contra a vontade da Recorrente.
E quando é que o fez.
A imputação de um dever de cuidado não se mostra demonstrada, tendo o Tribunal muitas dúvidas.
Na dúvida, decide-se favoravelmente à Recorrente e é a mesma absolvida da prática de qualquer infração respeitante a esta CVP.
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f) Rua 5 de OutuIro, em Carcavelos, na CVP 4096 – Troço 95 (Este)
Neste processo provou-se que no dia 02/05/2011, na CVP 4096 – Troço 95 (Este) rua 5 de Outubro, em Carcavelos, apesar de estar representado um semáforo verde, não existia espaço disponível para serem incluídos novos cabos (não devendo o semáforo ser verde), pelo que a informação disponibilizada pela Extranet ORAC não se encontrava atualizada relativamente ao semáforo (Extranet ORAC não se encontrava atualizada relativamente ao semáforo) – cfr. número 11. dos factos provados.
Verifica-se ter existido uma violação da deliberação da Autoridade Administrativa, na medida em que a Recorrente não manteve a Extranet devidamente atualizada.
Mais se provou que o semáforo indicado na Extranet teve por base as informações que o construtor do prédio que liga com a CVP em causa deu à Área do Cadastro, tendo o mesmo comunicado a instalação de um tubo de 110 mm, quando, na verdade, instalou um tubo mais pequeno de 40 mm ou 60 mm (cfr. número 11. dos factos provados).
A Recorrente, neste caso, não atuou com o cuidado que se lhe impunha. Com efeito, impunha-se à Recorrente a verificação da informação que lhe é prestada pelos construtores dos prédios.
Ao acreditar cegamente no que lhe dizem, em vez de enviar para o local técnicos especializados que verificam e monitorizam a informação que foi prestada, a Recorrente não agiu com o cuidado e diligência que lhe é exigível (cfr. número 13. dos factos provados).
A Recorrente atuou, por isso, com negligência.
Inexistem causas de exclusão da ilicitude, culpa ou punibilidade.
A conduta é, autonomamente, subsumível à infração imputada, sem prejuízo do enquadramento jurídico que infra iremos efetuar.
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g) Rua José da Costa Pedreira, em LisIoa, CVP 34005 – Troço 190 Oeste
Neste processo provou-se que no dia 26/04/2011, na Rua José da Costa Pedreira, em Lisboa, CVP 34005 – Troço 190 Oeste, existiam um tritubo e seis tubos de secção intermédia não cadastrados, não se encontrando, por isso, a informação disponibilizada pela Extranet ORAC atualizada (cfr. número 14 dos factos provados).
Ao não manter atualizada a informação presente na Extranet Orac, a Recorrente violou a deliberação da Autoridade Administrativa de 28/10/2010.
Mais se provou que os tubos em causa foram cadastrados incorretamente, de acordo com a informação prestada pelo construtor contratado Recorrente, e tendo a Recorrente confiado nas informações prestadas por este construtor (cfr. número 15 dos factos provados).
É neste ponto que reside a falta de cuidado da Recorrente. O facto de esta confiar no que lhe dizem os construtores (internos ou externos à Recorrente), sem uma verificação cuidada do resultado final, faz com que se verifique uma violação do dever de cuidado.
A Recorrente atuou, por isso, com negligência.
Inexistem causas de exclusão da ilicitude, culpa ou punibilidade.
A conduta é, autonomamente, subsumível a uma infração das imputada, sem prejuízo do enquadramento jurídico que infra iremos efetuar.
A Autoridade Administrativa efetua uma imputação de 7 infrações (cada tubo, uma infração). Manifestamente nos parece que a imputação é desacertada. A falta de atualização é relativa à totalidade da CVP, não se devendo efetuar uma imputação por cada uma das desconformidades, já que o Iem jurídico violado é sempre o mesmo.
Por isso, e independentemente da imputação que infra iremos efetuar, logo à partida deixamos bem clara a nossa discordância quanto a esta imputação da prática de sete infrações.
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h) Rua José da Costa Pereira, em LisIoa, CVP 22542 – Troço S/N (Sul)
Neste processo, provou-se que no dia 26/04/2011, na Rua José da Costa Pedreira, em Lisboa, relativamente à CVP 22542 – Troço S/N (Sul), na extranet não existia indicação do semáforo, não se encontrando, assim, a informação disponibilizada pela Extranet ORAC atualizada relativamente ao semáforo (cfr. número 16. dos factos provados).
Verifica-se existir uma violação da deliberação da Autoridade Administrativa.
No entanto, neste caso, o Tribunal afasta uma imputação, por ter dúvidas quanto à culpa da Recorrente.
Com efeito, foi a deliberação de 28/10/2010 que veio dar origem à necessidade de representação do grau de ocupação das condutas (cfr. número 34. dos factos provados).
A Recorrente tem mais de 250.000 CVP’s – cfr. número 31. dos factos provados.
Com várias condutas a saírem de cada CVP, tem-se a ideia da dimensão que é colocar semáforos de ocupação em cada conduta.
Os factos ocorreram em 26/04/2011.
Perante a tarefa ciclópica, lapsos poderão sempre existir, por muito cuidado e esforço que a Recorrente quisesse imprimir à sua atuação. E estamos a enquadrar factos que ocorreram sete meses após a deliberação.
O Tribunal não consegue vislumbrar a violação de um dever de cuidado à Recorrente (contrariamente ao que sucede nos factos referidos no número 11 dos factos provados, em que se verifica uma falta de cuidado que não está relacionada com a dimensão da tarefa da Recorrente), que não seja relacionado com um qualquer lapso na falta de colocação do semáforo.
Face às circunstâncias, o Tribunal exclui a culpa da Recorrente na violação da norma, por estes factos.
Por esse motivo, o Tribunal julga estes factos como contraordenacionalmente irrelevantes, absolvendo, desde logo, a Recorrente da infração que lhe era imputada.
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i) Rua Embaixador Martins Janeira, em LisIoa CVP 113619 – Troço 95 (Norte)
Provou-se que, no dia 26/04/2011, na Rua Embaixador Martins Janeira, no que respeita à CVP 113619 – Troço 95 (Norte), verificou-se a existência de um tubo não cadastrado na extranet ORAC, não se encontrando, assim, atualizada a informação disponibilizada pela Extranet ORAC, relativamente ao número de condutas – cfr. número 17. dos factos provados.
Retomamos aqui a argumentação já anteriormente usada.
Houve violação da deliberação. Mas qual é o dever de cuidado que a Recorrente deveria ter tido e não teve e que originou esta violação?
Terá sido um lapso de um funcionário, que, contra as ordens da Recorrente, prestou uma informação errada?
Será uma qualquer outra razão?
Não se sabe.
E são 250.000 CVP’s.
A imputação de ilícitos contraordenacionais também não é uma imputação oIjetiva.
Na dúvida, decide-se favoravelmente à Recorrente e é a mesma aIsolvida da prática de qualquer infração respeitante a esta CVP.
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j) Rua Manuel Marques, em LisIoa CVP 46076 – Troço 190 (Norte);
Neste processo provou-se que no dia 26/04/2011, na Rua Manuel Marques, no que respeita à CVP 46076 – Troço 190 (Norte), verificou-se a existência na extranet ORAC de um troço que não existia no terreno, não se encontrando, assim, atualizada a informação disponibilizada pela Extranet ORAC relativamente ao traçado (cfr. número 18. dos factos provados).
Toda a argumentação que se usou para infração respeitante à Rua Embaixador Martins Janeira, em Lisboa CVP 113619 – Troço 95 (Norte), é a mesma que agora se usa.
Desconhece-se qual o dever de cuidado que a Recorrente não teve, sendo certo que se está perante uma imensidão de CVP’s.
Por esse motivo, o Tribunal aIsolve a Recorrente da prática de qualquer infração respeitante a estas CVP.
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k) Rua dos Soeiros, em Lisboa, CVP 53609, os troços 157 (Norte) e 475 (Noroeste)
Neste processo provou-se que no dia 28/04/2011, na Rua dos Soeiros, em Lisboa, e no que respeita à CVP 53609, os troços 157 (Norte) e 475 (Noroeste) representados na extranet, não se encontravam no terreno, pelo que a informação disponibilizada pela Extranet ORAC não se encontrava atualizada relativamente ao número de condutas (cfr. número 19. dos factos provados).
Foi, por isso, violada a deliberação de 28/10/2010.
Mais uma vez, a Recorrente confiou cegamente na informação prestada pelo construtor dos troços em causa.
É neste aspeto que é possível verificar a falta de cuidado da Recorrente.
Impunha-se à Recorrente uma verificação desses elementos. E, repare-se, que desde 1992 a 2011 não há qualquer razão para que esta verificação não tenha sido efetuada.
Por isso se considera que a Recorrente não atuou com o cuidado que podia e era capaz.
A Recorrente atuou assim negligentemente.
Inexistem causas de exclusão da ilicitude, culpa ou puniIilidade.
A conduta é, autonomamente, subsumível a uma infração das imputadas, sem prejuízo do enquadramento jurídico que infra iremos efetuar.
A Autoridade Administrativa efetua uma imputação de 2 infrações. O Iem jurídico violado é sempre o mesmo.
Por isso, e independentemente da imputação que infra iremos efetuar, logo à partida deixamos bem clara a nossa discordância quanto a esta imputação da prática de duas infrações.
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l) Rua dos Soeiros, em Lisboa, Troço 190 (Sudeste) da CVP 69284
Neste processo provou-se que, No dia 28/04/2011, na Rua dos Soeiros, em Lisboa, no que respeita ao Troço 190 (Sudeste) da CVP 69284, que não existia essa conduta no terreno, pelo que a informação disponibilizada pela Extranet ORAC não se encontrava atualizada relativamente ao número de condutas (cfr. número 21. dos factos provados).
Verificou-se, por isso, uma violação da deliberação da Autoridade Administrativa de 28/10/2010.
Mais se provou que a CVP 69284 foi construída em 1995, e constava nos documentos, fornecidos por terceiros, que a Recorrente usou para a atualização do seu cadastro, tendo a Recorrente neles confiado (cfr. número 22. dos factos provados).
É neste aspeto que a Recorrente não atua com os cuidados que podia e era capaz, na medida em que acredita cegamente nos documentos que terceiros lhe fornecem, sem fazer uma verificação própria.
Por esse motivo, atua negligentemente.
Inexistem causas de exclusão da ilicitude, culpa ou punibilidade.
A conduta é, autonomamente, subsumível a uma infração das imputadas.
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m) Rua dos Soeiros, em Lisboa e no que respeita à CVP 69285 – Troços 190 (Sudeste) e Troço 95 (Noroeste)
Neste processo provou-se que, no dia 28/04/2011, na Rua dos Soeiros, em Lisboa e no que respeita à CVP 69285 – Troços 190 (Sudeste) e Troço 95 (Noroeste), esses troços não existiam no terreno, pelo que a informação disponibilizada pela Extranet ORAC não se encontrava atualizada relativamente ao número de condutas (cfr. número 23. dos factos provados).
Verificou-se, por isso, uma violação da deliberação da Autoridade Administrativa de 28/10/2010.
Mais se provou que a CVP 69285 foi construída em 1995, e constava nos documentos, fornecidos por terceiros, que a Recorrente usou para a atualização do seu cadastro, tendo a Recorrente neles confiado, não atuando com o cuidado que podia e era capaz (cfr. número 24. dos factos provados).
Por esse motivo, atuou negligentemente.
Inexistem causas de exclusão da ilicitude, culpa ou punibilidade.
A conduta é, autonomamente, subsumível a uma infração das imputadas, afastando-se o Tribunal da imputação de duas infrações, pelas razões supra referidas.
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n) Cruzamento entre a Rua do Brasil e a Rua do Parque, em Lisboa, e no que respeita à CVP 26901 – Troço Nordeste
Neste processo provou-se que no dia 28/04/2011, no cruzamento entre a Rua do Brasil e a Rua do Parque, em Lisboa, e no que respeita à CVP 26901 – Troço Nordeste, verificou-se que esse Troço também não se encontrava cadastrado, não se encontrando, por isso, a informação disponibilizada pela Extranet ORAC atualizada relativamente ao traçado – cfr. número 25. dos factos provados.
Toda a argumentação que se usou para infração respeitante à Rua Embaixador Martins Janeira, em Lisboa CVP 113619 – Troço 95 (Norte), é a mesma que agora se usa.
Desconhece-se qual o dever de cuidado que a Recorrente não teve, sendo certo que se está perante uma imensidão de CVP’s.
Por esse motivo, o Tribunal absolve a Recorrente da prática de qualquer infração respeitante a esta CVP.
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Desta forma, em termos objectivos, os factos são subsumíveis a:
- uma violação do artº 113º, nº 1, al. xxx), da Lei nº 5/2004, no que respeita à Rua Alfredo Mesquita;
- uma violação do artº 113º, nº 1, al. xxx), da Lei nº 5/2004, no que respeita à Rua 5 de Outubro, em Carcavelos, na CVP 4096;
- uma violação do artº 113º, nº 1, al. xxx), da Lei nº 5/2004, no que respeita à Rua José da Costa Pedreira, em Lisboa, CVP 34005 – Troço 190 Oeste;
- uma violação do artº 113º, nº 1, al. xxx), da Lei nº 5/2004, no que respeita à Rua dos Soeiros, em Lisboa, CVP 53609, os troços 157 (Norte) e 475 (Noroeste);
- uma violação artº 113º, nº 1, al. xxx), da Lei nº 5/2004, no que respeita à Rua dos Soeiros, em Lisboa, Troço 190 (Sudeste) da CVP 69284;
- uma violação do artº 113º, nº 1, al. xxx), da Lei nº 5/2004, no que respeita à Rua dos Soeiros, em Lisboa e no que respeita à CVP 69285 – Troços 190 (Sudeste) e Troço 95 (Noroeste);
Ou seja, autonomamente, verifica-se existir seis violações ao artº 113º, nº 1, al. xxx), da Lei nº 5/2004.
No entanto, o Tribunal entende que se deve enquadrar juridicamente como uma única infração.
Com efeito, neste processo, todas as violações advém de um única e mesma falta de cuidado: a confiança nos terceiros e a falta de verificação das informações que estes prestam, ou não prestam.
Se os terceiros construtores enviarem a informação de conclusão de uma oIra, a Recorrente faz incluir essa informação acriticamente, no seu cadastro. Se não enviarem, a Recorrente aguarda que estes enviem a informação, não dispondo de qualquer mecanismo de confirmação do andamento da obra.
Assim como a Recorrente recebeu informações de terceiros e construtores assume-os como idóneos, sem qualquer verificação.
Ou seja, existe um falha nos procedimentos internos da Recorrente, no que respeita à recolha da informação necessária à atualização do cadastro.
A Recorrente podia e deveria ter outros procedimentos instituídos, com uma análise da informação que os terceiros construtores lhe fornecem.
E é essa falha nos procedimentos que deu depois origem a uma multiplicidade de situações.
A conduta da Recorrente é censurável, sendo que o Tribunal rejeita a argumentação da ausência de culpa, presente nos artigos 661º a 706º das alegações de recurso.
Evidentemente que inexiste qualquer inconstitucionalidade com esta apreciação. A Recorrente poderia ter outra conduta e que iria evitar estes resultados.
E é por considerar que a causa está numa mesma falta de cuidado, que o Tribunal entende que as situações contraordenacionalmente relevantes são subsumíveis à prática de uma única contraordenação, por violação, negligente, do artº 113º, nº 1, al. xxx), da Lei nº 5/2004.
A Recorrente é, por isso, absolvida, das demais infrações imputadas.
A Recorrente veio afirmar também, designadamente na resposta às alterações que lhe foram comunicadas, que a ORAC não lhe impunha outra atuação.
A deliberação de 28/10/2010 pressupõe uma Extranet ORAC devidamente atualizada.
E, portanto, impõe-se à Recorrente que efetue os esforços necessários a que a Extranet ORAC represente o que se encontra no terreno.
Também não se pode aceitar a argumentação de que a Recorrente apenas teria de aguardar as informações prestadas pelas Beneficiárias.
É verdade que a ORAC define procedimentos para as Beneficiárias, designadamente, no que respeita ao dever de comunicação da conclusão das intervenções.
Mas as Beneficiárias, para efeito da ORAC, são as outras operadoras – cfr. número 45A. dos factos provados.
Ora a imputação que acima foi efetuada teve por Iase a atuação da Recorrente relativamente a construtores.
Os construtores não são “Beneficiárias” para efeitos da ORAC. Por isso, não é possível referir que nos termos da ORAC, a atuação censurável das Beneficiárias, isenta de culpa a Recorrente. O que está em causa, neste processo, é a imputação referente à conduta de construtores. E por isso, relativamente a estes, nem se discute que a Recorrente tinha o dever de vigiar a atuação destes.
Por fim, refira-se que a Autoridade Administrativa deliIerou no exercício dos seus poderes, conferidos pelo seu estatuto, sendo que as normas estão devidamente detalhadas, afastando-se qualquer juízo de inconstitucionalidade por existência de normas sancionadoras em branco.
Atendendo à imputação que supra efetuámos, mostra-se prejudicado o conhecimento da infração continuada (foi efetuada a imputação de uma única infração, e não de várias).

VI. Da sanção a aplicar
A contraordenação supra referida é punível com coimas de €2.500,00 a €2.500.000,00, nos termos do disposto no artº 113º, nºs 2 e 6, da Lei nº 5/2004, de 10/02 (na versão anterior à redação introduzida pela Lei nº 51/2011) e artº 4º da Lei nº 99/2009, de 04/09.
A Autoridade Administrativa aplicou a coima única de €80.000,00.
Vejamos.

A Recorrente veio referir que, a ser aplicada uma sanção, então deveria o Tribunal optar pela aplicação de uma admoestação.
Estipula o artº 51º, nº1, do RGCOC que “quando a reduzida gravidade da infração e da culpa do agente o justifique, pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação”. Para os Sr.s Conselheiros Simas Santos/Lopes de Sousa “A admoestação, prevista no artigo 51º R.G.C.O., tem em vista casos de reduzida gravidade da infração e da culpa do agente, encontrando-se, por isso, reservada para contraordenações leves ou simples” – Contraordenações, Anotações ao Regime Geral, 2ª edição, 2002, p.316.
Na ponderação da aplicação da pena de admoestação está em causa:
- a reduzida gravidade da infração;
- um juízo de censura inerente à culpa que não seja muito intensificado.
Ora, entende o Tribunal que, perante os resultados múltiplos decorrentes da prática desta contraordenação, esta assume uma gravidade relevante, que afasta a aplicação de uma admoestação.
E, por isso mesmo, o Tribunal não aplica a sanção admoestação.

Nos termos do disposto no artº 5º, nº 1, da Lei nº 99/2009, “1 — A determinação da medida da coima e a decisão relativa à aplicação de sanções acessórias são feitas em função da ilicitude concreta do facto, da culpa do agente, dos Ienefícios oItidos com a prática da contraordenação e das exigências de prevenção, tendo ainda em conta a natureza singular ou colectiva do agente.
2 — Na determinação da ilicitude concreta do facto e da culpa das pessoas colectivas e entidades equiparadas atende -se, entre outras, às seguintes circunstâncias: a) Ao perigo ou ao dano causados; I) Ao carácter ocasional ou reiterado da infracção; c) À existência de actos de ocultação tendentes a dificultar a descoberta da infracção; d) À existência de actos do agente destinados a, por sua iniciativa, reparar os danos ou obviar aos perigos causados pela infracção. b
4 — Na determinação da sanção aplicável são ainda tomadas em conta a situação económica e a conduta do agente”.
A Recorrente é uma pessoa coletiva.
As exigências de prevenção geral são elevadas, já que o que está em causa é garantir que as deliberações do regulador são escrupulosamente cumpridas e com todo o empenho.
Não se vislumbram exigências de prevenção especial muito intensas, já que não se provaram antecedentes contraordenacionais.
No que respeita à ilicitude concreta dos factos:
- não se provou um concreto perigo ou dano intenso, já que não se provou que nenhum terceiro (incluindo as outras operadoras) tivessem ficado impossibilitadas de colocar os seus cabos nas condutas da Recorrente;
- a contraordenação teve um caráter reiterado, com uma multiplicidade de desconformidades em diversas CVP’s e que se prolongaram no tempo;
- inexistiram atos de ocultação tendentes a dificultar a descoberta da infração;
- A recorrente, após a fiscalização, alterou a extranet, corrigindo as desconformidades;
Relativamente à culpa, a Recorrente atuou com negligência inconsciente, o que diminui a censura;
Não se vislumbram benefícios económicos retirados com a prática da infração.
No que respeita à situação económica da Recorrente, em 2012, teve um volume de negócios de €1.774.317.741,00 e um resultado líquido de - €86.901.669,00 (cfr. número 50. dos factos provados.
Tudo visto, o Tribunal julga justo, por adequado, fixar a coima em €20.000,00 (vinte mil euros).
Face à culpa apurada e ao número de infrações, não se atenua especialmente a coima nem se suspende a sua execução.

O Tribunal aplica a coima de acordo com o Regime legal em vigor à data dos factos e não o regime legal atualmente vigente.
Com efeito, aplicando o regime atualmente vigente, as condutas que se consideraram contraordenacionalmente relevantes continuavam a ser ilícitas (cfr. artº 113º, nº 3, al. II), da Lei nº 5/2004, na redação atualmente em vigor.
Sucede que, em função do volume de negócios e do número de trabalhadores, a recorrente seria considerada uma grande empresa.
Assim, e nos termos do disposto no artº 113º, nº 8, al. e), e nº 11, da Lei nº 5/2004 (Redação atual) e 4º da Lei nº 99/2009, a coima aplicável teria uma moldura entre €10.000,00 e €2.500.000,00.
O Tribunal, em função desta moldura mínima mais elevada, iria agravar a coima aplicada que não seria inferior a €40.000,00.
Por conseguinte, o atual regime legal não se vislumbra mais favorável à Recorrente, aplicando-se o regime legal em vigor à data da prática dos factos – cfr. artº 3º, nº 2, do RGCOC, à contrário.»


2.1. Das conclusões formuladas pelas recorrentes e que acima transcrevemos – as quais, como tem sido uniforme e recorrentemente afirmado pelos nossos Tribunais Superiores, delimitam e fixam o objecto do recurso, sem prejuízo da matéria de conhecimento oficioso -, extrai-se que aquelas submetem à apreciação deste Tribunal de 2.ª instância as seguintes questões:
2.1.1. A arguida A:
a) A sentença recorrida é nula, porquanto:
- Foi preterido o direito de defesa em prazo razoável, em violação dos arts. 32.º/10 e 13.º, da CRP;
- Foi violado o princípio da presunção de inocência;
- Não foi feita devida ponderação dos critérios respeitantes à determinação da coima;
- A acusação comunicada à arguida era ininteligível;
- Foi violado o princípio da separação de poderes e do processo justo e equitativo;
- Foram interpretados preceitos legais de forma inconstitucional, prejudicando o direito de defesa da arguida;
- A arguida foi condenada por factos que resultaram de uma alteração não substancial dos factos da acusação após o encerramento da audiência, sendo que os arts. 358.º e 359.º, do CPP, não têm aplicação, subsidiária, em processo de contra-ordenação.
I) São inconstitucionais, por violação dos artigos 32.º n.ºs 5 e 10 e 205.º n.º 1 da CRP as normas correspondentes ao artigo 50.º do RGCO na interpretação de que não é necessário a autoridade administrativa relevante (i) fundar a sua Acusação em concretos factos, bastando-se com a aplicação de conceitos por si definidos e interpretados de acordo com teorias e com meros exercícios de raciocínio; (ii) dar ao arguido a oportunidade de se pronunciar convenientemente sobre os novos factos e respectivo enquadramento constantes da Acusação antes de ser proferida decisão final, apresentando a sua versão dos mesmos; (iii) dar ao arguido a oportunidade de contraditar convenientemente todos os elementos constantes do processo; (iv) dar ao arguido a oportunidade de se pronunciar convenientemente sobre a versão e o enquadramento jurídico que a autoridade administrativa pretenda aplicar aos factos que estão na origem da censura que se pretende fazer ao arguido; e/ou (v) dar ao arguido a oportunidade de se pronunciar convenientemente sobre a sanção (ou sanções) que a autoridade administrativa considera dever ser aplicada ao arguido no caso concreto antes da respetiva condenação.
c) São inconstitucionais os artigos 358.º, 361.º e 371.º do CPP, na interpretação feita pelo Tribunal, em violação do disposto nos artigos 20.º e 32.º n.º 10 da CRP, ao permitir que, finda a produção de prova e encerrada a discussão, seja feita a reaIertura da audiência para fins diferentes dos previstos nos artigos 371.º e 369.º n.º 2 do CPP.
d) A arguida agiu sem culpa, por não lhe poder ser exigida conduta diversa;
e) A coima aplicada é desproporcional, face à factualidade em causa e sobretudo face ao nível de culpa, tendo sido violado o art. 18.º do RGCO e o princípio da proporcionalidade (art. 18.º/2 da CRP), devendo a sanção limitar-se a uma admoestação;
2.1.2. O I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA:
a) Os factos descritos no § 5.º da motivação do recurso constituem infracção ao disposto no art. 113.º, n.º 1 al. xxx), da Lei 5/2004, de 10/02, e 1.º/2 da Lei 99/2009 de 4/9, por traduzirem incumprimento da deliberação da AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, de 28/10/2010;
I) O entendimento do Tribunal, de que as seis violações constatadas preenchem uma só contra-ordenação, viola o art. 30.º, n.ºs 1 e 2, do CP e o art. 1.º/2 da Lei 99/2009 de 4/9;
c) A culpa da arguida não pode classificar-se como de negligência inconsciente, porquanto a arguida representou a possiIilidade do facto que preenche um tipo legal de contra-ordenação, não tendo diligenciado, como podia e devia, de modo a evitar o resultado;
d) Tendo aquela modificação na modalidade da culpa reflexos na coima única aplicada.


2.2. Conheçamos, pois, das aludidas questões:
Antes, porém, um esclarecimento prévio se impõe: em matéria contraordenacional, apesar de o Tribunal de recurso poder alterar a decisão recorrida, sem qualquer vinculação aos termos e sentido da mesma - salvo o disposto no art. 72.º-A quanto à proiIição da reformatio in pejus -, o certo é que o Tribunal da Relação apenas conhece de direito (art.º 75.º, n.º 1 e 2, do RGCO).
Tal afirmação implica que, com o julgamento efectuado no Tribunal de primeira instância, fica definitivamente encerrada a valoração das provas e fixada a matéria de facto, sem prejuízo de eventuais nulidades ou vícios de que possa padecer a decisão recorrida.
Assim:
*
2.2.1. Quanto às pretensas nulidades da decisão recorrida:
Defende a arguida que a sentença recorrida é nula, com os fundamentos de que:
- Foi preterido o direito de defesa em prazo razoável, em violação dos arts. 32.º/10 e 13.º, da CRP;
- Foi violado o princípio da presunção de inocência;
- Não foi feita devida ponderação dos critérios respeitantes à determinação da coima;
- A acusação comunicada à arguida era ininteligível;
- Foi violado o princípio da separação de poderes e do processo justo e equitativo;
- Foram interpretados preceitos legais de forma inconstitucional, prejudicando o direito de defesa da arguida;
- A arguida foi condenada por factos que resultaram de uma alteração não substancial dos factos da acusação após o encerramento da audiência, sendo que os arts. 358.º e 359.º, do CPP, não têm aplicação, subsidiária, em processo de contra-ordenação.

Mas, sem razão alguma.
Há, em primeiro lugar, que destrinçar as situações que se traduzem em nulidade de sentença, das demais, em que a respectiva inobservância de determinadas disposições legais se traduz em nulidade do procedimento contra-ordenacional e não da sentença.
Tendo-se como subsidiariamente aplicável o disposto no art. 379.º, do CPP – na medida em que a decisão proferida em sede de recurso de impugnação judicial é uma sentença proferida em primeira instância – e tendo em conta o princípio da legalidade em matéria de nulidades, só as situações elencadas no n.º 1 daquela norma processual penal (art. 379.º, n.º 1) constituem nulidade de sentença.
Todas as demais situações de violação de disposições legais, que sejam cominadas com a sanção da nulidade, respeitarão ao respectivo procedimento.
A distinção assume enorme relevância, dada a diferença de regime e de tratamento que deve ser dado a cada uma das modalidades em causa, desde logo, quanto ao momento até ao qual podem ser arguidas.
É certo que a arguida, para assegurar a tempestividade da respectiva arguição, classificou as nulidades invocadas como insanáveis.
Todavia, para além das expressamente previstas no art. 119.º, do CPP, só podem considerar-se insanáveis as nulidades que, como tal, forem cominadas noutras disposições legais.
Assim, para que a preterição de uma formalidade legal constitua nulidade, é preciso, em primeiro lugar, que a lei a classifique como tal e, para que a nulidade seja insanável, terá a lei de o dizer expressamente, soI pena de aquela ilegalidade se reconduzir a uma mera irregularidade.
Vejamos, então, à luz de tais princípios, as diversas situações acima discriminadas.
a) Alega a arguida que foi preterido o seu direito de defesa em prazo razoável, o que representa violação dos arts. 32.º, n.º 10 e 13.º, da CRP, porquanto, tal prazo foi fixado em 15 dias, prorrogado por mais 5, num total de 20 dias, tendo sido indeferido um pedido para dilatação desse prazo, apesar de a imputação ser por mais de 80 ilícitos, sendo que, o prazo fixado na lei pressupõe a defesa de um único ilícito, para além de a autoridade administrativa se arrogar a faculdade de demorar o tempo que entende para investigar.
A autoridade administrativa tem o dever de investigar, sempre que haja indícios da prática de uma infracção, tendo de recolher as provas necessárias para poder formular a acusação. Para tal, o único limite é o prazo de prescrição do respectivo procedimento. Só com a prescrição - ou cessação da responsabilidade contra-ordenacional por qualquer outra via - cessa aquele dever. Recolhidos os indícios da prática de uma contra-ordenação e de quem foi o seu autor, a aplicação da respectiva coima ou de qualquer sanção acessória não é permitida sem que antes seja assegurada ao arguido «a possibilidade de, num prazo razoável, se pronunciar sobre a contra-ordenação que lhe é imputada e sobre a sanção ou sanções em que incorre», consagrando-se tal direito de audição e defesa no art. 50.º, do RGCO aprovado pelo DL n.º 433/82, de 27/10.
Na concretização daquele direito em matéria de telecomunicações, dispõe o Artigo 22.º da Lei n.º 99/2009 de 4/9, (Tramitação do processo comum) que, «A acusação é notificada ao infractor para, em prazo a fixar entre 10 e 20 dias úteis, apresentar resposta escrita, juntar os documentos probatórios de que disponha, arrolar testemunhas, até ao máximo de três por cada infracção, e requerer as diligências de prova que considere necessárias.»
Contrariamente ao alegado pela arguida, tal norma não tem como pressuposto que a imputação seja por um só ilícito, pois nela se prevê expressamente a imputação de vários ilícitos em simultâneo, ao permitir que sejam indicadas três testemunhas por cada infracção.
Aquele prazo de 20 dias úteis foi considerado manifestamente suficiente pelo legislador para o arguido se defender de qualquer imputação, por maior que seja o número de infracções a que respeita a acusação e independentemente da complexidade do processo.
Definida que se mostra a matéria de facto indiciada e que constitui o suporte da acusação deduzida, e efectuado o respectivo enquadramento jurídico, com indicação das sanções em que, face a este, pode incorrer o arguido, a concessão de 20 dias úteis para o mesmo deduzir oposição é suficiente em quaisquer circunstâncias.
No presente caso, a arguida gozou desse prazo de 20 dias úteis. Por isso, não se pode queixar de falta de tempo para contestar, pois, beneficiou do prazo máximo legalmente previsto.
De qualquer modo, com a impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa – com a qual, como sabemos, passa a decisão condenatória administrativa a valer como mera acusação - teve aquela oportunidade de apresentar a sua defesa de forma sustentada, assim como teve a possibilidade de fazer vingar a sua versão em audiência de julgamento, produzindo a prova que achou por bem apresentar, exercendo na sua plenitude os seus direitos de defesa, pelo que, não pode, neste momento, ancorar-se em qualquer eventual ausência de possibilidade  de contraditório ou de limitação desse direito para justificar uma eventual injustiça da decisão. 
Não houve qualquer ofensa ao princípio da igualdade, previsto no art. 13.º, da CRP – os prazos para investigar nenhuma relação têm com o prazo para contestar uma acusação já formulada -, nem ao disposto no art. 32.º, n.º 10, do diploma fundamental, pois, foram devidamente assegurados à arguida, no presente caso, os seus direitos de audição e defesa.
I) Em conexão com o argumento anterior, o segundo fundamento de nulidade da sentença invocado pela arguida decorreria da violação do princípio da presunção de inocência e da não ponderação dos critérios respeitantes à coima, na acusação, pelas razões aduzidas nas conclusões 8 a 15, que aqui damos por reproduzidas.
Não vemos como é que a dedução da acusação contra a arguida possa violar o princípio da presunção de inocência.
Segundo o art. 32.º, n.º 2, da CRP, «todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação».
Trata-se de uma mera presunção, que não deixa de existir com a dedução da acusação, ou mesmo com a sentença condenatória, enquanto esta não tiver transitado em julgado.
A arguida coloca o acento tónico no conteúdo da própria acusação que lhe foi comunicada, para efeitos do já mencionado art. 50.º, do RGCO, alegando que aquela apresentava diversas conclusões e presunções, que a classificação da conduta da arguida como grave assentava em circunstâncias abstractas, que naquela não foi ponderada a questão da imputação subjectiva, nem continha factos relativos aos critérios de determinação da medida concreta da coima.
Não corresponde o alegado à realidade, pois a arguida foi notificada para se defender de um conjunto de factos, os quais, no entender da autoridade administrativa, constituíam determinado número de contra-ordenações, mencionando-se as disposições legais que puniam a conduta como tal, com indicação das sanções legalmente previstas e nas quais podia incorrer a arguida. É quanto basta para que a arguida pudesse defender-se, não tendo de ser indicada, naquele momento processual, a sanção concreta que a autoridade administrativa entende dever ser aplicada, pois muitos elementos de prova e vários outros factos novos podem ainda ser obtidos e apurados, nomeadamente com o contributo da defesa, com relevância para a determinação da sanção.
Mesmo em processo criminal, em que as exigências e formalismos têm necessariamente de ser acrescidas dada a maior e incomparável gravidade das sanções correspondentes, nunca se ouviu defender a exigência de a acusação ter de propor a pena concreta que devia ser aplicada ao arguido.
Ou seja, para o cabal exercício do direito de audição e defesa, Basta que a arguida tome conhecimento da factualidade que lhe é imputada, quais as infracções que se considera estarem preenchidas e quais as sanções que lhe correspondem, com a menção das normas legais correspondentes. Foi o que aconteceu no presente caso.
Todavia, tal com o já referimos supra, com a impugnação judicial da decisão administrativa e a subsequente apresentação dos autos ao juiz, valendo tal acto como acusação (art. 62.º, n.º 1, do TGCO), prejudicado fica, porque irrelevante, tudo o que possa ser agora alegado, com referência ao aludido direito de audição e defesa ao abrigo do art. 50.º, do RGCO.
c) O mesmo se pode dizer quanto à alegação de que «o processo enferma de vício processual que devia ter obstado ao conhecimento do mérito da causa, dada a ininteligibilidade da acusação».
Essa apreciação teria agora de ser feita relativamente à decisão da autoridade administrativa, em comparação com o teor da própria sentença recorrida.
O certo é que, mesmo em relação à “acusação” de que foi notificada a arguida para efeitos do art. 50.º, do RGCO, esta exerceu o seu direito de defesa, de forma cabal e esclarecida, tal como salienta a autoridade administrativa na respectiva resposta, não deixando aquela transparecer qualquer dificuldade na compreensão daquilo que lhe era imputado.
d) Uma outra causa de nulidade da sentença, do ponto de vista da arguida, reside numa pretensa violação do princípio da separação de poderes e do processo justo e equitativo, porque a condução, pela AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, do presente processo de contra-ordenação «foi feita com total promiscuidade das suas funções de fiscalização e sancionatórias, através da prossecução da função de investigação em sede contra-ordenacional soI a capa das suas competências de fiscalização», tendo conduzido o processo «de uma forma pouco transparente e pouco neutral, tendo decidido a amostra, os locais e as situações a fiscalizar mediante indicações dos concorrentes da A, a sua solicitação».
Mais uma vez, a arguida repete aqui o que já havia alegado, sem êxito, na impugnação judicial, tendo-se pronunciado a sentença sobre esta questão, tal como relativamente às demais já tratadas e a tratar.
Sobre esta problemática, o que há a dizer é que a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA actuou sempre dentro dos respectivos poderes e atribuições, não tendo sido excedidos, nem uns, nem as outras.
Independentemente do meio ou da forma como vem ao conhecimento o cometimento da infracção, a autoridade competente tem o dever de agir, investigar, apurar as circunstâncias respectivas, quem foi o seu autor e proceder contra este, aplicando as respectivas sanções.
A tradicional teoria da separação de poderes respeita aos poderes legislativo, executivo/administrativo e judicial.
Não são esses os poderes exercidos pelo I-AUTORIDADE ADMINISTRATIVA.
Aqui não há poderes separados. A mesma entidade tem poderes de regulação/supervisão, de fiscalização e sancionatórios.
O conhecimento do cometimento da infracção por parte das entidades sujeitas à supervisão tanto pode advir de denúncia de uma outra entidade ou de terceiros, como através de um acto de fiscalização. Isso é absolutamente irrelevante.
A partir do momento em que se colham indícios da existência do ilícito, terá de ser aberto o respectivo processo contra-ordenacional, no qual se apurarão todos os elementos da infracção, culminando com uma decisão, que pode ser condenatória, como foi no presente caso.
À arguida foram concedidos todos os direitos de defesa que a lei consagra, nomeadamente o direito ao recurso daquela decisão condenatória, para os tribunais – órgão de soIerania, imparcial e independente -, pelo que não foi feita nenhuma afronta aos seus direitos.
O processo foi justo e equitativo, não tendo sido violada nenhuma das disposições legais invocadas pela arguida.
e) Complementarmente ao atrás alegado e sintetizando as várias vertentes em que se desdobra a nulidade invocada, remata a arguida que foram interpretados de forma inconstitucional diversos preceitos da Constituição, prejudicando o seu direito de defesa.
Tal afirmação nada de novo acrescenta ao que já foi atrás mencionado, reafirmando-se aqui a falta de razão da recorrente, na medida em que nenhuma afronta foi feita ao seu direito de defesa.
O concreto problema da inconstitucionalidade das normas pretensamente violadas pela decisão recorrida será tratado em alínea própria, mais adiante. 
f) Por fim, a única situação verdadeiramente nova - no sentido de que não fora anteriormente invocada em sede de impugnação judicial - e que poderia, efectivamente, consubstanciar nulidade de sentença, ao abrigo do art. 379.º, n.º 1 al. I), do CPP, consiste na alegação de que «a arguida foi condenada por factos que resultaram de uma alteração não substancial dos factos bda acusação após o encerramento da audiência», defendendo a arguida que os arts. 358.º e 359.º, do CPP, não têm aplicação em processo de contra-ordenação.
Que ocorreu uma alteração de factos é uma evidência – conforme resulta do despacho de fls. 2102 a 2117 -, tal alteração foi classificada, sem controvérsia, como de não substancial e foi concedido prazo à arguida, a pedido desta, para se pronunciar, o que em devido tempo fez (fls. 2137 a 2148), invocando a inadmissibilidade de tal alteração.
Porque no respectivo requerimento a arguida levantou de imediato as questões que ora suscita, de novo, a esse propósito, pronunciou-se sobre elas a sentença recorrida, nos seguintes termos:
«…
A Recorrente entende que as alterações não substanciais dos factos, tal como previsto no artº 358º, nº 1, do CPP, não são possíveis de serem efetuadas em processos contraordenacionais.
Entende o Tribunal que, perante a lacuna existente no RGCOC, terá o Tribunal de se socorrer ao artº 358º do CPP, sendo este aplicável[1].
Com efeito, embora o RGCOC não o afirme expressamente, existem disposições legais que, implicitamente, confirmam esta possibilidade  de alteração dos factos (alteração não substancial).
Por exemplo, o artº 18º do RGCOC impõe a apreciação da situação económica do agente, como critério de fixação do valor da coima concreta.
Se a situação económica da arguida se alterar (relativamente à que vinha descrita na decisão recorrida), como poderá o Tribunal apreciar este critério, tendo em consideração a nova situação económica da arguida, se não puder acrescentar os factos relativos à nova situação económica (efetuando, para o efeito, uma alteração não substancial dos factos)?
Outro exemplo.
O artº 72º-A, nº 2, do RGCOC permite o agravamento do valor da coima, se a situação económica do arguido tiver entretanto melhorado de forma sensível.
Perante uma situação de melhoria sensível da situação económica do arguido, como poderia o Tribunal incluir os factos comprovativos desta melhoria, se não pudesse efetuar uma alteração não substancial dos factos?
Ou seja: há mecanismos legalmente previstos que só poderão ser respeitados, se for possível aplicar, subsidiariamente, o regime da alteração não substancial dos factos, presente no artº 358º do CPP.
A lacuna no RGCOC parece-nos ser evidente.
A Recorrente veio esgrimir com o argumento do duplo grau de jurisdição, relativamente aos factos que são aditados (ou alterados) – cfr. fls. 2141.
A Recorrente não tem razão.
Com efeito, os princípios que enformam o Processo Penal são transponíveis de uma forma menos acentuada para o Processo Contraordenacional.
E por isso, se tem admitido que nem todas as decisões proferidas em Processo Contraordenacional sejam suscetíveis de recurso, sem que se possa equacionar a violação do duplo grau de jurisdição.
O artº 32º, nº 10, da CRP, não inclui o direito a um duplo grau de apreciação jurisdicional. Por outro lado, a Constituição não impõe um duplo grau de jurisdição em matéria de facto – neste sentido, os acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 73/2007, 386/2009 e 632/2009.
Por conseguinte, é perfeitamente possível (e necessário, por vezes) ao Tribunal efetuar alterações não substanciais dos factos, inexistindo qualquer inconstitucionalidade.
Dúvidas também não existem de que as alterações comunicadas são alterações não substanciais – cfr. artº 1º, nº 1, al. f), do Cód. Proc. Penal.
Não se vislumbra qualquer nulidade ou preceito constitucional que tenha sido violado.
Por conseguinte, o Tribunal julga a questão suscitada improcedente, indeferindo o requerimento de revogação do despacho supra indicado.»

Nesta sede, alega a arguida que o Tribunal aplicou o art. 358.º, n.ºs 1 e 3 do CPP após o encerramento da audiência, desrespeitando tal normativo e ainda os arts. 361.º e 371.º, do mesmo diploma. Defende que o instituto da alteração de factos previsto nos arts. 358.º e 359.º, do mencionado Código, não é passível de aplicação subsidiária aos processo de contra-ordenação.
O principal argumento da recorrente assenta na ideia de que qualquer eventual alteração fáctica pelo Tribunal de primeira instância contende com os direitos de defesa da arguida, na medida em que em processo de contra-ordenação não é possível recorrer para a Relação em matéria de facto, por força do disposto no art. 75.º, do RGCO.
Relembrando o que já atrás dissemos, na sequência da impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa, a remessa dos autos ao juiz pelo MP equivale a uma acusação. Ou seja, aquela impugnação não é um verdadeiro recurso, tendo por efeito atribuir a um Tribunal a competência para decidir da causa, retirando-a da esfera administrativa. Ou seja, a impugnação não vai ser decidida por outra entidade hierarquicamente superior à recorrida, mas por um órgão independente e imparcial, pertencente a uma outra jurisdição. Daí que, o Tribunal, ao julgar o dito “recurso”, julgará toda a matéria da causa, como se o fizesse pela primeira vez, valorando todas as provas, quer as que já constavam do processo e sustentaram a decisão impugnada, quer aquelas que o impugnante tiver posteriormente indicado, não estando o julgador vinculado nem limitado às questões tratadas na decisão impugnada, nem às que são suscitadas na impugnação, sem prejuízo, obviamente, de ter de respeitar o objecto do processo, definido, em termos de imputação fáctica e de direito, pela decisão administrativa, que passa a ter, como dissemos e nessa concreta vertente, a função de qualquer acusação em matéria criminal, ressalvadas as devidas diferenças que, para o caso, são irrelevantes.
Definido por essa via o ojecto do processo e da matéria a julgar, quer de facto quer de direito, o Tribunal, seja por mero despacho, seja após audiência de julgamento, conhecerá amplamente do mérito da causa, sem quaisquer restrições – para além da que decorre da proibição da reformatio in pejus -, cumprindo o formalismo próprio bda audiência de julgamento, quando a esta há lugar, nos termos definidos no Código de Processo Penal, cujos preceitos são subsidiariamente aplicáveis, se o contrário não resultar do RGCO, nos termos do art. 41.º, n.º 1 deste mesmo Regime.
Ora, na ausência de normas específicas que regulem tal matéria no RGCO, terá de entender-se que são subsidiariamente aplicáveis as normas dos arts. 358.º e 359.º, do CPP, quando se provarem factos relevantes para a decisão da causa, diferentes dos imputados aos arguidos na “acusação”.
Os aludidos normativos visam precisamente dar garantias ao arguido de que tais factos não serão tomados em consideração sem que este sobre eles se pronuncie, ou seja, visam garantir um verdadeiro contraditório quanto a tais novos factos, definindo os limites e condições em que eles podem ser tomados em consideração na decisão final, em especial quando os mesmos impliquem uma alteração substancial da acusação.
Ou seja, o mecanismo previsto naqueles dois normativos constitui uma garantia acrescida aos direitos de defesa do arguido, e não o contrário, como parece entender a recorrente.
No RGCO nada existe que possa indiciar que tal mecanismo não foi pretendido pelo legislador, ou que se mostre afastado por alguma norma ali consagrada, antes pelo contrário, normas há que pressupõem a sua aplicação subsidiária , tal como adiantado pela decisão recorrida.
O argumento da arguida de que a impossibilidade  de recurso em matéria de facto, para a Relação, em processo de contra-ordenação, impediria o aditamento de novos factos por parte do Tribunal de primeira instância, é falacioso e não convence.
Em processo penal, das decisões proferidas em matéria criminal pela Relação, muitas delas não têm recurso para o STJ e, em nenhuma delas se pode recorrer em matéria de facto para este mais alto Tribunal, o qual só conhece de direito. Isso não impede, porém, que a Relação, ao conhecer do recurso em matéria de facto, introduza novos factos, que consubstanciem uma alteração não substancial dos descritos na decisão recorrida, desde que cumpra previamente o respectivo contraditório, nos termos do disposto no art. 424.º, n.º 3, do CPP.
Se assim é em matéria criminal, não se vislumbra qualquer razão de substância que impeça que assim seja em matéria contra-ordenacional, em que os interesses em causa e sanções correspondentes são substancialmente de menor valia e com um grau de censura incomparavelmente menor.
     A arguida não foi surpreendida com os novos factos na sentença. Foi-lhe dado conhecimento prévio dos mesmos, sobre eles teve oportunidade de se pronunciar e exercer os respectivos direitos de defesa – podia, nomeadamente, ter requerido a produção de novas provas quanto aos mesmos, apesar de o não ter feito -, pelo que, não tem quaisquer razões de queixa quanto ao procedimento seguido pelo Tribunal, o qual se caracteriza pela mais absoluta transparência e integral respeito pelos seus direitos.
Quanto ao momento em que foi dado cumprimento ao art. 358.º, do CPP, também nada há a censurar ao Tribunal. A audiência comporta várias fases, nomeadamente, os actos introdutórios, a produção da prova, as alegações orais, a sentença, independentemente do número de sessões que aquela comporte.
A audiência só termina com a publicação da sentença e decisão dos eventuais incidentes que se lhe seguirem nessa sessão (eventuais requerimentos ou recursos e subsequentes despachos que sobre eles recaírem).
Há que distinguir entre o termo da audiência e o encerramento da discussão a que se refere o art. 361.º, n.º 2, do CPP
Segundo este, encerrada a discussão - ou seja, finda a produção da prova, feitas as alegações orais e ouvido, a final, o arguido sobre o que tem a acrescentar em abono da sua defesa -, o Tribunal retira-se para deliberar.
Obviamente que é esse o momento em que o julgador vai avaliar a prova produzida e tudo o que resultou da discussão da causa, para fixar a correspondente matéria de facto, determinando o que ficou provado e não provado. Só nesse momento é que há uma noção precisa dos factos que devem considerar-se provados e se estes representam ou não alguma alteração relativamente aos imputados na acusação.
Se houver alteração fáctica relevante, para a mesma ser tomada em consideração na decisão impor-se-á o cumprimento do preceituado nos normativos em causa (art. 358.º, ou 359.º, consoante as circunstâncias), procedendo-se depois em conformidade, podendo até haver necessidade de ser retomada a produção da prova se novas provas tiverem sido indicadas aos novos factos por algum dos intervenientes, seguindo-se novas alegações e a deliberação, com a posterior leitura da sentença.
A observância desse formalismo, naquele momento processual, tem lugar no decurso da audiência, conforme previsto no art. 358.º, n.º 1, pois a esta ainda não foi posto termo.
 Por isso, não se verifica a invocada nulidade da sentença.
2.2.2. No que concerne às invocadas inconstitucionalidades:
Alega a arguida que:
- São inconstitucionais, por violação dos artigos 32.º n.ºs 5 e 10 e 205.º n.º 1 da CRP as normas correspondentes ao artigo 50.º do RGCO na interpretação de que não é necessário a autoridade administrativa relevante (i) fundar a sua Acusação em concretos factos, Bastando-se com a aplicação de conceitos por si definidos e interpretados de acordo com teorias e com meros exercícios de raciocínio; (ii) dar ao arguido a oportunidade de se pronunciar convenientemente sobre os novos factos e respectivo enquadramento constantes da Acusação antes de ser proferida decisão final, apresentando a sua versão dos mesmos; (iii) dar ao arguido a oportunidade de contraditar convenientemente todos os elementos constantes do processo; (iv) dar ao arguido a oportunidade de se pronunciar convenientemente sobre a versão e o enquadramento jurídico que a autoridade administrativa pretenda aplicar aos factos que estão na origem da censura que se pretende fazer ao arguido; e/ou (v) dar ao arguido a oportunidade de se pronunciar convenientemente sobre a sanção (ou sanções) que a autoridade administrativa considera dever ser aplicada ao arguido no caso concreto antes da respetiva condenação.
- São inconstitucionais os artigos 358.º, 361.º e 371.º do CPP, na interpretação feita pelo Tribunal, em violação do disposto nos artigos 20.º e 32.º n.º 10 da CRP, ao permitir que, finda a produção de prova e encerrada a discussão, seja feita a reaIertura da audiência para fins diferentes dos previstos nos artigos 371.º e 369.º n.º 2 do CPP.

Decorre do atrás exposto que também nestes pontos carece de razão a arguida.
Quanto ao primeiro grupo de inconstitucionalidades, contrariamente ao alegado, a autoridade administrativa acusou imputando factos concretos, não se tendo Bastado «com a aplicação de conceitos por si definidos e interpretados de acordo com teorias e com meros exercícios de raciocínio», foi dada à arguida a «oportunidade de se pronunciar convenientemente sobre os novos factos e respectivo enquadramento [jurídico], apresentando a sua versão dos mesmos», foi-lhe igualmente dada «a oportunidade de contraditar convenientemente todos os elementos constantes do processo», Iem como «a oportunidade de se pronunciar convenientemente sobre a versão e o enquadramento jurídico» feito pela autoridade administrativa e, finalmente, foi dada oportunidade à arguida de se «pronunciar convenientemente sobre a sanção (ou sanções)» a aplicar, dando-lhe a conhecer as coimas aplicáveis às infracções imputadas e não havendo obrigação alguma de a autoridade administrativa informar, desde logo e para efeitos do art. 50.º, do RGCO, qual o montante da coima que concretamente iria aplicar em caso de condenação.
Quanto à aplicação dos arts 358.º, 361.º e 371.º, e à pretensa violação dos arts 20.º e 32.º n.º 10, da CRP, não merece melhor sorte o recurso da arguida.
Segundo este último normativo, «nos processos de contra-ordenação, bem como em quaisquer processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa», enquanto o art. 20.º do mesmo diploma fundamental respeita ao «acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva», dispondo o n.º 1 que «a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos».
Conforme já referimos supra, à arguida foram garantidos todos os «direitos de audiência e defesa», teve oportunidade de se pronunciar sobre todas as questões de facto e de direito suscitadas no processo e de se defender de todas as acusações que lhe foram feitas, matérias que foram amplamente discutidas em audiência de julgamento presidida por um juiz, em que estava garantida a independência e a imparcialidade do julgador, tendo ainda direito a recurso da decisão proferida, direito que exerceu.
A arguida não concretiza nenhum direito relativamente ao qual faça a demonstração de que o respectivo exercício lhe foi negado no presente processo.
Em contrapartida, está suficientemente demonstrado que à arguida foram asseguradas todas as garantias de defesa, incluindo o direito ao recurso (art. 32.º, n.º 1, da CRP).
Assim, porque falecem os pressupostos em que assenta o fundamento das inconstitucionalidades invocadas, estas têm necessariamente de improceder.

2.2.3. Resolvidas aquelas questões de natureza processual e constitucional, passemos agora às que respeitam à substância, que se dirigem ao verdadeiro mérito da causa, sejam as ligadas à responsabilidade contra-ordenacional da arguida, sejam as que versam sobre as respectivas sanções.
a) Alega a arguida que agiu sem culpa, por não lhe poder ser exigida conduta diversa, o que, do seu ponto de vista, constitui causa de exclusão da culpa, pelo que não pode ser sancionada com coima, face ao disposto no art. 40.º, n.º 2, do CP, aplicável por força do art. 32.º, do RGCO.

Esclareça-se, desde logo, que “a culpa nas contra-ordenações não se Iaseia em qualquer censura ético-penal, mas tão só na violação de certo procedimento imposto ao agente, Bastando-se, por isso, com a imputação do facto ao mesmo agente (cfr. acórdão desta Relação, proferido no Proc. 13/12.0YUSTR.L1 e Ac. da Relação do Porto, de 12/9/2007, naquele citado). Em matéria de contra-ordenações não se pode falar “de uma culpa como a jurídico penal, baseada numa censura ética, dirigida à pessoa do agente e à sua atitude interna, mas apenas de uma imputação do facto à responsabilidade social do seu autor; dito de outra forma, da adscrição social de uma responsabilidade que se reconhece exercer ainda uma função positiva e adjuvante das finalidades admonitórias da coima” – Figueiredo Dias,O movimento da descriminalização e o ilícito de mera ordenação social”, in Jornadas de Direito Criminal, I, pag, 331, ed. do CEJ, de 1983.

Concepção que tem consequências de vária ordem, desde logo ao nível da autoria, vigorando um conceito extensivo de autor no âmbito da responsabilidade contra-ordenacional, por oposição ao conceito mais restrito que vigora em direito penal, o que não é mais do que «uma decorrência lógica da existência no direito de mera ordenação social de normas de dever, cujo incumprimento é sancionado com coimas. Se o sistema impõe deveres a um leque alargado de destinatários é porque lhes reconhece capacidade para os cumprir e também para os violar. Daí que, apurando-se a violação do dever legalmente estabelecido, os destinatários do mesmo serão responsáveis por essa violação. “O critério de delimitação da autoria neste tipo de ilícito não é o do domínio do facto, mas sim o da titularidade do dever” (Frederico Lacerda da Costa Pinto, em “O ilícito de mera ordenação social”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 7, Fasc. 1, pag. 48) – Ac. do Tribunal Constitucional n.º 45/2014, DR II série de 11/02/2014.
Aquele conceito extensivo de autoria conduzirá, em regra, à responsabilização da entidade sobre a qual recai o dever, sempre que se tenha verificado o resultado que aquela estava legalmente incumbida de evitar.
Tudo sem prejuízo, obviamente, de se verificarem situações excludentes da ilicitude ou da culpa.
Todavia, da matéria de facto apurada - e esta é que conta, em exclusivo -, nada resulta susceptível de poder integrar qualquer causa de exclusão da ilicitude ou da culpa da arguida.
A norma que esteve na Iase da condenação sanciona com coima o «incumprimento de ordens ou mandados legítimos da ARN regularmente comunicados aos seus destinatários».
Por deliberação de 28/10/2010, cujo conteúdo foi dado a conhecer à A, o I-Autoridade Administrativa impôs àquela um determinado número de procedimentos para disponibilização na Extranet da informação actualizada sobre a ocupação de condutas, no âmbito da ORAC (Oferta de Referência no Acesso a Condutas).
Constatou-se que, em várias situações, a informação fornecida pela A não correspondia ao que constava no terreno, ou seja, a informação fornecida não estava actualizada.
Alega a arguida que não lhe pode ser exigida conduta diversa, pretendendo que se considere que não agiu com culpa, por inexigibilidade de comportamento diverso.
A inexigibilidade é, de facto, «uma causa de exclusão da culpa, derivada do circunstancialismo especial em que o agente se encontra colocado e da manutenção por este de uma atitude de fidelidade ao direito», não tendo, porém, «a natureza de uma causa geral de exclusão da culpa», antes estando tipificada pelo legislador, ao qual compete «definir os circunstancialismos em que já não espera do agente fiel ao direito a observância deste mesmo direito, soI pena de outra solução implicar uma grande insegurança na aplicação do direito e a concomitante redução da eficácia de prevenção geral do sistema penal». Tais casos, definidos pelo legislador, são o estado de necessidade desculpante e o excesso de legítima defesa – cfr. Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código Penal, ed. 2008, pág. 154/155, em nota prévia ao art. 33.º, do CP.
Ora, segundo a factualidade provada – que é insusceptível de impugnação para este Tribunal de recurso -, naquelas situações relativamente às quais se considerou ter agido com culpa, o não cumprimento da oIrigação de actualização do cadastro deveu-se ao facto de a arguida não ter actuado com o cuidado devido, podendo tê-lo feito e de que era capaz.
O que contraria frontalmente o alegado por esta.
Era-lhe exigível, pelo menos nos aludidos casos, uma conduta diversa.
I) Antes de passarmos à escolha da sanção e medida da coima – última das questões suscitadas pela arguida – vejamos, em primeiro lugar, os fundamentos do recurso do I – Autoridade Administrativa, respeitantes à qualificação jurídica dos factos provados.
1. Começa este por defender que os factos descritos no § 5.º da sua motivação constituem infracção ao disposto no art. 113.º, n.º 1 al. xxx) da Lei 5/2004 de 10/2, e 1.º/2 da Lei 99/2009 de 4/9, por traduzirem incumprimento da deliberação de 28/10/2010.
 Os factos em questão são os provados soI os números 8, 9, 10, 10-A, 11, 16, 17, 18 e 25, cujo teor é o seguinte:
«8. No dia 19/04/2011, no Cruzamento Alameda dos Oceanos com Rua Mar do Norte, em Lisboa, na CVP 87794 – Troço 1029 (Oeste), verificou-se existir 1 tubo de secção intermédia não cadastrado na Extranet ORAC.
*
9. No dia 19/04/2011, no Cruzamento Alameda dos Oceanos com Rua Mar do Norte, em Lisboa, na CVP 87794 – Troço 513 (Norte), em Lisboa existia
- um tubo de secção intermédia e
- quatro tuos de secção superior que
não se encontravam representados na informação disponibilizada pela Extranet ORAC.
*
10. No dia 02/05/2011, na Rua Dr. José Joaquim Almeida, na CVP 1493 – Troço 95 (Sul), em Carcavelos, não existia uma conduta, não se encontrando, informação disponibilizada pela Extranet ORAC atualizada relativamente ao número de condutas.
10A. A conduta deixou de existir na sequência de uma eliminação de um dos furos do Troço 95.

16. No dia 26/04/2011, na Rua José da Costa Pedreira, em Lisboa, relativamente à CVP 22542 – Troço S/N (Sul), na extranet não existia indicação do semáforo, não se encontrando, assim, a informação disponibilizada pela Extranet ORAC atualizada relativamente ao semáforo.
*
17. No dia 26/04/2011, na Rua Embaixador Martins Janeira, no que respeita à CVP 113619 – Troço 95 (Norte), verificou-se a existência de um tubo não cadastrado na extranet ORAC, não se encontrando, assim, atualizada a informação disponibilizada pela Extranet ORAC, relativamente ao número de condutas.
*
18. No dia 26/04/2011, na Rua Manuel Marques, no que respeita à CVP 46076 – Troço 190 (Norte), verificou-se a existência na extranet ORAC de um troço que não existia no terreno, não se encontrando, assim, atualizada a informação disponibilizada pela Extranet ORAC relativamente ao traçado.

25. No dia 28/04/2011, no cruzamento entre a Rua do Brasil e a Rua do Parque, em Lisboa, e no que respeita à CVP 26901 – Troço Nordeste, verificou-se que esse Troço também não se encontrava cadastrado, não se encontrando, por isso, a informação disponibilizada pela Extranet ORAC atualizada relativamente ao traçado.»

Relativamente a esses factos, recordemos a explicação dada pelo Tribunal recorrido para não imputar tais incumprimentos à arguida:
«c) Cruzamento Alameda dos Oceanos com Rua Mar do Norte, em Lisboa, na CVP 87794 – Troço 1029 (Oeste)
Provou-se que no dia 19/04/2011, no Cruzamento Alameda dos Oceanos com Rua Mar do Norte, em Lisboa, na CVP 87794 – Troço 1029 (Oeste), verificou-se existir 1 tubo de secção intermédia não cadastrado na Extranet ORAC.
Tal constitui uma violação da deliberação da Autoridade Administrativa de 28/10/2010.
Sucede que não foi possível ao Tribunal apurar, com certeza qual o dever de cuidado que foi violado por parte da Recorrente.
A imputação das infrações, a título negligente, não é uma operação objetiva: é sempre necessário apurar qual o dever de cuidado que, objetivamente, foi violado.
Ora não se sabe qual foi a razão que levou à não atualização do cadastro. Terá sido um lapso dos serviços da Recorrente? Terá sido uma informação errada de um outro operador?
O Tribunal desconhece e tem e consideração que a Recorrente gere uma rede de mais de 250.000 CVP’s (cfr. número 35. dos factos provados).
A existência de um tubo não cadastrado é um lapso perfeitamente possível de ocorrer, sendo admissível que a Recorrente, apesar de todos os cuidados, possa ter algum lapso inadvertido (que poderá decorrer até de alguma desatenção humana, contra as instruções da própria Recorrente).
E também é preciso não esquecer que, na dúvida, a Recorrente beneficia do princípio da presunção de inocência.
Na dúvida, o Tribunal entende que não é possível imputar qualquer negligência
E por isso absolve a Recorrente da prática de qualquer infração resultante desta CVP.
*
d) Cruzamento Alameda dos Oceanos com Rua Mar do Norte, em Lisboa, na CVP 87794 – Troço 513 (Norte)
A mesma apreciação que fizemos para a infração respeitante à CVP 87794 – Troço 1029 (Oeste) é a mesma que podemos efetuar para a infração respeitante à CVP 87794 – Troço 513 (Norte).
De facto, provou-se que no dia 19/04/2011, no Cruzamento Alameda dos Oceanos com Rua Mar do Norte, em Lisboa, na CVP 87794 – Troço 513 (Norte), em Lisboa existia um tubo de secção intermédia e quatro tubos de secção superior que não se encontravam representados na informação disponibilizada pela Extranet ORAC (cfr. número 9. dos factos provados).
Tal constitui uma violação da deliberação da Autoridade Administrativa, de 28/10/2010.
Mas esta violação foi causada por uma deficiente organização da Recorrente? Foi algum lapso de um trabalhador?
O Tribunal desconhece a causa.
O que sabe é que a Recorrente tem mais de €250.000,00 caixas (CVP).
Na dúvida quanto à imputação de qualquer violação do dever de cuidado, o Tribunal absolve a Recorrente da prática da infração.
*
e) Rua Dr. José Joaquim Almeida, na CVP 1493 – Troço 95 (Sul)
Neste caso, provou-se que no dia 02/05/2011, na Rua Dr. José Joaquim Almeida, na CVP 1493 – Troço 95 (Sul), em Carcavelos, não existia uma conduta, não se encontrando, informação disponibilizada pela Extranet ORAC atualizada relativamente ao número de condutas (cfr. número 10. dos factos provados).
Tal ter-se-á ficado a dever a uma eliminação de um dos furos do Troço 95 – sul (cfr. número 10A. dos factos provados).
Mais uma vez, existe violação da deliberação de 28/10/2010.
Mas desconhece-se qual foi o dever de cuidado que a Recorrente violou. Desconhece-se também quem terá eliminado a conduta que existia e deixou de existir. E se o fez contra a vontade da Recorrente.
E quando é que o fez.
A imputação de um dever de cuidado não se mostra demonstrada, tendo o Tribunal muitas dúvidas.
Na dúvida, decide-se favoravelmente à Recorrente e é a mesma absolvida da prática de qualquer infração respeitante a esta CVP.
*
h) Rua José da Costa Pereira, em Lisboa, CVP 22542 – Troço S/N (Sul)
Neste processo, provou-se que no dia 26/04/2011, na Rua José da Costa Pedreira, em Lisboa, relativamente à CVP 22542 – Troço S/N (Sul), na extranet não existia indicação do semáforo, não se encontrando, assim, a informação disponibilizada pela Extranet ORAC atualizada relativamente ao semáforo (cfr. número 16. dos factos provados).
Verifica-se existir uma violação da deliberação da Autoridade Administrativa.
No entanto, neste caso, o Tribunal afasta uma imputação, por ter dúvidas quanto à culpa da Recorrente.
Com efeito, foi a deliberação de 28/10/2010 que veio dar origem à necessidade de representação do grau de ocupação das condutas (cfr. número 34. dos factos provados).
A Recorrente tem mais de 250.000 CVP’s – cfr. número 31. dos factos provados.
Com várias condutas a saírem de cada CVP, tem-se a ideia da dimensão que é colocar semáforos de ocupação em cada conduta.
Os factos ocorreram em 26/04/2011.
Perante a tarefa ciclópica, lapsos poderão sempre existir, por muito cuidado e esforço que a Recorrente quisesse imprimir à sua atuação. E estamos a enquadrar factos que ocorreram sete meses após a deliberação.
O Tribunal não consegue vislumbrar a violação de um dever de cuidado à Recorrente (contrariamente ao que sucede nos factos referidos no número 11 dos factos provados, em que se verifica uma falta de cuidado que não está relacionada com a dimensão da tarefa da Recorrente), que não seja relacionado com um qualquer lapso na falta de colocação do semáforo.
Face às circunstâncias, o Tribunal exclui a culpa da Recorrente na violação da norma, por estes factos.
Por esse motivo, o Tribunal julga estes factos como contraordenacionalmente irrelevantes, absolvendo, desde logo, a Recorrente da infração que lhe era imputada.
*
i) Rua Embaixador Martins Janeira, em Lisboa CVP 113619 – Troço 95 (Norte)
Provou-se que, no dia 26/04/2011, na Rua Embaixador Martins Janeira, no que respeita à CVP 113619 – Troço 95 (Norte), verificou-se a existência de um tubo não cadastrado na Extranet ORAC, não se encontrando, assim, atualizada a informação disponibilizada pela Extranet ORAC, relativamente ao número de condutas – cfr. número 17. dos factos provados.
Retomamos aqui a argumentação já anteriormente usada.
Houve violação da deliberação. Mas qual é o dever de cuidado que a Recorrente deveria ter tido e não teve e que originou esta violação?
Terá sido um lapso de um funcionário, que, contra as ordens da Recorrente, prestou uma informação errada?
Será uma qualquer outra razão?
Não se sabe.
E são 250.000 CVP’s.
A imputação de ilícitos contraordenacionais também não é uma imputação objetiva.
Na dúvida, decide-se favoravelmente à Recorrente e é a mesma absolvida da prática de qualquer infração respeitante a esta CVP.
*
j) Rua Manuel Marques, em Lisboa CVP 46076 – Troço 190 (Norte);
Neste processo provou-se que no dia 26/04/2011, na Rua Manuel Marques, no que respeita à CVP 46076 – Troço 190 (Norte), verificou-se a existência na extranet ORAC de um troço que não existia no terreno, não se encontrando, assim, atualizada a informação disponibilizada pela Extranet ORAC relativamente ao traçado (cfr. número 18. dos factos provados).
Toda a argumentação que se usou para infração respeitante à Rua Embaixador Martins Janeira, em Lisboa CVP 113619 – Troço 95 (Norte), é a mesma que agora se usa.
Desconhece-se qual o dever de cuidado que a Recorrente não teve, sendo certo que se está perante uma imensidão de CVP’s.
Por esse motivo, o Tribunal absolve a Recorrente da prática de qualquer infração respeitante a estas CVP.
*
n) Cruzamento entre a Rua do Brasil e a Rua do Parque, em Lisboa, e no que respeita à CVP 26901 – Troço Nordeste
Neste processo provou-se que no dia 28/04/2011, no cruzamento entre a Rua do Irasil e a Rua do Parque, em Lisboa, e no que respeita à CVP 26901 – Troço Nordeste, verificou-se que esse Troço também não se encontrava cadastrado, não se encontrando, por isso, a informação disponibilizada pela Extranet ORAC atualizada relativamente ao traçado – cfr. número 25. dos factos provados.
Toda a argumentação que se usou para infração respeitante à Rua Embaixador Martins Janeira, em Lisboa CVP 113619 – Troço 95 (Norte), é a mesma que agora se usa.
Desconhece-se qual o dever de cuidado que a Recorrente não teve, sendo certo que se está perante uma imensidão de CVP’s.
Por esse motivo, o Tribunal absolve a Recorrente da prática de qualquer infração respeitante a esta CVP.»

Objectivamente, os factos provados atrás aludidos traduzem uma desconformidade entre a situação existente no terreno e o conteúdo da extranet, sendo certo que sobre a arguida recaía a obrigação de manter esta actualizada, devendo a respectiva informação reflectir a situação real.
Todavia, para além daquela situação objectiva, exige-se que tal falta de correspondência possa ser imputada à arguida, a título de culpa.
Esta pode revestir as modalidades de dolo ou de negligência. Segundo o art. 8.º, n.º 1 do RGCO, «só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência».
Consiste esta última na «atitude de descuido ou leviandade consubstanciada na violação do cuidado a que, segundo os seus conhecimentos e capacidades pessoais, o agente está obrigado» (Paulo Pinto de Albuquerque, oI citada, pág. 96).
Conforme já acima dissemos e reafirmamos, a matéria de facto foi definitivamente fixada pela primeira instância, e dela nada resulta – porque nada se provou a esse respeito – quanto às eventuais razões pelas quais a extranet não correspondia à realidade encontrada no terreno, naquelas concretas situações identificadas pelo recorrente, não sendo possível imputar à arguida tais desconformidades, ou seja, não ficou demonstrado que estas tenham ocorrido por culpa sua, podendo, por isso, dever-se a quaisquer outras circunstâncias não relacionadas com a eventual inobservância do dever a que a arguida estava obrigada no que concerne à actualização da extranet.
Assim, quanto às pretensas infracções consubstanciadas nos factos provados 8 a 10-A, 16 a 18 e 25, não se provou que as respectivas desconformidades tivessem ocorrido por culpa da arguida, razão pela qual esta foi absolvida nessa parte.
Não havendo, por isso, razões para censurar a decisão recorrida nessa matéria.
c) Relativamente às infracções pelas quais foi condenada a arguida, defende a AUTORIDADE ADMINISTRATIVA que a culpa daquela não pode classificar-se como de negligência inconsciente, porquanto a mesma representou a possibilidade  do facto que preenche um tipo legal de contra-ordenação, não tendo diligenciado, como podia e devia, de modo a evitar o resultado. Como consequência, tendo aquela modificação na modalidade da culpa reflexos na coima única aplicada, deveria esta ser agravada.
Perante a ausência de norma específica no RGCO sobre esta matéria, há que recorrer subsidiariamente ao disposto no Código Penal, cujo art. 15.º nos dá a definição de negligência e das suas modalidades, nos seguintes termos:
     «Age com negligência quem, por não proceder com o cuidado a que, segundo as circunstâncias, está obrigado e de que é capaz:
a) Representar como possível a realização de um facto que preenche um tipo de crime mas actuar sem se conformar com essa realização; ou
I) Não chegar sequer a representar a possibilidade  de realização do facto.»
 
As alíneas a) e I) dão-nos o conceito de negligência consciente e de negligência inconsciente, respectivamente.
Ocorre esta quando o agente não chega sequer a representar a possibilidade  de realização do facto.
O que consta da matéria de facto provada é o seguinte:
- Quanto à primeira situação (CVP 45366), que a arguida «não cuidou de saber em que data a mesma CVP e ramal de acesso ficaram concluídos»;
- Quanto à segunda situação (CVP 4096 – Troço 95 Este), a existência de semáforo verde, quando no terreno não havia espaço para incluir novos cabos, deveu-se a informação errada fornecida à Área do Cadastro pelo construtor do prédio que liga com a CVP em causa, que comunicou a instalação de um tubo de 110 mm quando na verdade e instalou um tubo de menores dimensões;
- Quanto à CVP 34005 (Troço 190-Oeste), os respectivo tubos estavam cadastrados incorrectamente, em consequência da informação incorrectamente prestada pelo construtor contratado pela arguida, tendo esta confiado nas informações prestadas;
- Relativamente à situação da Rua dos Soeiros – CVP 53609, Troços 157 (Norte) e 475 (Noroeste) - , a representação destes troços na extranet não tinha correspondência no terreno, porque a recorrente confiou, mais uma vez, na informação prestada pelo construtor dos troços em causa;
- No que concerne à CVP 69284 (Troço 190 Sudeste) da mesma Rua, a conduta não existia apesar de assinalada na extranet, porque a mesma constava nos documentos, fornecidos por terceiros, que a arguida usou para actualização do cadastro, por neles ter confiado;
- Finalmente, na situação da CVP 69285 – Troços 190 e 95 – troços que não existiam no terreno apesar de indicados na extranet, mais uma vez, a arguida confiou em documentos fornecidos por terceiros.

Do exposto se conclui que, nas situações atrás descritas, a arguida não tinha plena consciência da existência das aludidas desconformidades entre a informação que era exibida na extranet e a real situação no terreno, tendo sempre confiado em informações e documentos fornecidos por terceiros.
Todavia, segundo o facto provado n.º 43, terminada a intervenção nas condutas, levada a cabo pelos operadores ou pelos construtores, a arguida não vistoriava o local, para se certificar se a intervenção realizada era a mesma que lhe tinha sido comunicada, «entendendo a Recorrente que se existisse alguma desconformidade, acabaria por ter conhecimento dela mais tarde, quando novas intervenções fossem solicitadas, por outros operadores, no local».
Por sua vez, o facto provado n.º 46 diz-nos que «a recorrente tinha conhecimento, em 2011, que vários operadores tinham informado incorrectamente sobre as operações realizadas nas condutas da recorrente».
A constatação das infracções aqui em causa ocorreu em Abril e Maio de 2011.
Ora, apesar de a arguida não ter efectivo conhecimento de que a situação no terreno não correspondia à informação transmitida pela extranet, a qual teve por base as informações fornecidas por terceiros, o certo é que aquela, apesar de confiar na veracidade de tal informação, admitia a possibilidade  de existirem tais desconformidades, ou seja, de a extranet estar a fornecer informação que não correspondia à realidade, pelo facto de as informações recebidas poderem não corresponder ao trabalho efectivamente realizado no local pelos construtores, ao ponto de admitir que tais eventuais desconformidades, a existirem, seriam corrigidas oportunamente, quando ocorressem novas intervenções no mesmo local.
Pelo que, razão tem, neste ponto, o recorrente I-Autoridade Administrativa, quando afirma que a arguida agiu com negligência consciente, porquanto esta representou como possível a realização de um facto que preenche um tipo de contra-ordenação.
Quanto ao pedido de agravação da coima, sobre ele nos pronunciaremos mais à frente, quando tratarmos da respectiva medida.

d) Segundo o recorrente I-Autoridade Administrativa, o entendimento do Tribunal, de que as seis violações constatadas preenchem uma só contra-ordenação, viola o art. 30.º, n.ºs 1 e 2, do CP e o art. 1.º/2 da Lei 99/2009 de 4/9.
Aquele primeiro normativo, com a epígrafe concurso de crimes e crime continuado e aplicável em matéria de contra-ordenações, dispõe:
      1 - O número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente.
      2 - Constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.

Como é fácil de constatar, prevê tal norma duas realidades distintas: o concurso de crimes e o crime continuado.
A primeira situação (concurso) consiste na suIsunção dos factos a uma pluralidade de “tipos de crime” com um desvalor jurídico autónomo, sendo que, a concretização de cada “tipo de crime” se faz por referência ao critério da identidade do Iem jurídico protegido pelo tipo, corrigido pelo critério da “conexão situacional” entre diversas realizações típicas homogéneas (Pinto de Albuquerque, obra citada, pág. 136).
Diversamente, a segunda situação (crime continuado) consiste numa unificação jurídica de um concurso efectivo de crimes que protegem o mesmo bem jurídico, fundada numa culpa diminuída.
Por sua vez, o art. 1.º, n.º 2, da Lei n.º 99/2009 dispõe:
«Constitui contra -ordenação do sector das comunicações, para efeitos da presente lei, todo o facto ilícito e censurável que preencha um tipo legal correspondente à violação de disposições legais e regulamentares relativas ao sector das comunicações, para as quais se comine uma coima, cujo processamento e punição seja da competência do I –AUTORIDADE ADMINISTRATIVA»
O regime geral das contra-ordenações também prevê, sem o definir, o concurso de contra-ordenações, no art. 19.º do RGCO - uma disposição algo semelhante ao art. 79.º, do CP -, o qual regula a respectiva punição.

Porém, inexiste, em matéria de contra-ordenações, norma que preveja ou sequer tenha como pressuposta a existência de contra-ordenação na forma continuada.

De qualquer modo, isso é irrelevante para o presente caso, porquanto, diversamente do que parece ter pressuposto o recorrente I, a arguida não foi condenada por qualquer infracção na forma continuada, mas sim por ter cometido uma única infracção, pois, entendeu o Tribunal recorrido que, apesar de se verificarem, autonomamente, «seis violações ao artº 113º, nº 1, al. xxx), da Lei nº 5/2004», devem as mesmas, no entanto, enquadrar-se juridicamente «como uma única infracção», porquanto, «neste processo, todas as violações advêm de uma única e mesma falta de cuidado: a confiança nos terceiros e a falta de verificação das informações que estes prestam, ou não prestam. Se os terceiros construtores enviarem a informação de conclusão de uma oIra, a Recorrente faz incluir essa informação acriticamente, no seu cadastro. Se não enviarem, a Recorrente aguarda que estes enviem a informação, não disposto de qualquer mecanismo de confirmação do andamento da obra. Assim como a Recorrente recebeu informações de terceiros e construtores assume-os como idóneos, sem qualquer verificação. Ou seja, existe uma falha nos procedimentos internos da Recorrente, no que respeita à recolha da informação necessária à atualização do cadastro. A Recorrente podia e deveria ter outros procedimentos instituídos, com uma análise da informação que os terceiros construtores lhe fornecem. E é essa falha nos procedimentos que deu depois origem a uma multiplicidade de situações».

Finalizando a discussão sobre este tema, rematou o Tribunal recorrido do seguinte modo: «Atendendo à imputação que supra efetuámos, mostra-se prejudicado o conhecimento da infração continuada (foi efetuada a imputação de uma única infração, e não de várias)».

Consequentemente, não poderia ter sido violado o art. 30.º, n.º 2, do CP.
Estamos perante uma omissão negligente, pois é nisso que se traduz o incumprimento, por parte da arguida, relativamente à deliberação do Iç, resultando tal incumprimento da não actualização das informações fornecidas pela extranet-ORAC.
O incumprimento tanto se verifica havendo uma só situação em que a informação fornecida não corresponde ao que existe no terreno, como havendo várias, ou seja, para o preenchimento do tipo em causa, Basta uma só desconformidade entre aquela informação e a realidade constatada no terreno, todavia, tendo sido constatadas várias desconformidades, a violação do dever de actualizar continua a ser o mesmo e um só, tal como referido pelo Tribunal recorrido. Isto porque o dever de actualização constitui uma actividade permanente e sempre actuante. Quando falha, tanto pode reflectir-se numa anomalia como em múltiplas anomalias. Trata-se de uma situação cuja abordagem tem contornos semelhantes (ressalvadas as respectivas especialidades) aos crimes que traduzem uma prática reiterada de actos integrantes de uma mesma actividade (de que é exemplo paradigmático o tráfico de estupefacientes), em que um só acto se mostra suficiente para o preenchimento do tipo, todavia, a multiplicidade de actos em que se desenrola a actividade criminosa continuará a constituir um só crime e não vários em concurso – cfr. acórdão do STJ de 15-05-1997, Processo nº 9/97 - 3ª Secção (entre muitos outros): «O crime de tráfico de estupefacientes é um crime de actividade ou de trato sucessivo, pelo que se tem por unificada a prática repetida de actos do tipo dos indicados no art.º 21 do DL 15/93, de 22-01».
Cremos, pois, não haver razões para censurar a decisão recorrida, ao considerar a arguida autora de uma só contra-ordenação, e não de várias (6), em concurso.
e) Quanto à sanção a aplicar e respectiva medida:

Alega a arguida que a coima aplicada é desproporcional, face à factualidade em causa e sobretudo face ao nível de culpa, tendo sido violado o art. 18.º do RGCO e o princípio da proporcionalidade (art. 18.º/2 da CRP), devendo a sanção limitar-se a uma admoestação.
Em contrapartida, o  I advoga o agravamento da coima aplicada à arguida, com o fundamento de que esta agiu com negligência consciente.
Quanto à medida da coima, prevê o Art. 5.º  da Lei 99/2009 de 4/9:
«1 - A determinação da medida da coima e a decisão relativa à aplicação de sanções acessórias são feitas em função da ilicitude concreta do facto, da culpa do agente, dos benefícios obtidos com a prática da contra-ordenação e das exigências de prevenção, tendo ainda em conta a natureza singular ou colectiva do agente.
2 - Na determinação da ilicitude concreta do facto e da culpa das pessoas colectivas e entidades equiparadas atende-se, entre outras, às seguintes circunstâncias:
a) Ao perigo ou ao dano causados;
I) Ao carácter ocasional ou reiterado da infracção;
c) À existência de actos de ocultação tendentes a dificultar a descoberta da infracção;
d) À existência de actos do agente destinados a, por sua iniciativa, reparar os danos ou obviar aos perigos causados pela infracção.
3 - Na determinação da ilicitude concreta do facto e da culpa das pessoas singulares, atende-se, além das referidas no número anterior, às seguintes circunstâncias:
a) Intenção de obter, para si ou para outrem, um benefício ilegítimo ou de causar danos;
I) Especial dever de não cometer a infracção.
4 - Na determinação da sanção aplicável são ainda tomadas em conta a situação económica e a conduta do agente.»

O Tribunal recorrido, recusando a aplicação de admoestação e fixando a coima em € 20 000,00, fundamentou a sua posição do seguinte modo:
«A contraordenação supra referida é punível com coimas de €2.500,00 a €2.500.000,00, nos termos do disposto no artº 113º, nºs 2 e 6, da Lei nº 5/2004, de 10/02 (na versão anterior à redação introduzida pela Lei nº 51/2011) e artº 4º da Lei nº 99/2009, de 04/09.
A Autoridade Administrativa aplicou a coima única de € 80.000,00.
Vejamos.
*
A Recorrente veio referir que, a ser aplicada uma sanção, então deveria o Tribunal optar pela aplicação de uma admoestação.
  Estipula o artº 51º, nº1, do RGCOC que “quando a reduzida gravidade da infração e da culpa do agente o justifique, pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação”. Para os Sr.s Conselheiros Simas Santos/Lopes de Sousa “A admoestação, prevista no artigo 51º R.G.C.O., tem em vista casos de reduzida gravidade da infração e da culpa do agente, encontrando-se, por isso, reservada para contraordenações leves ou simples” – Contraordenações, Anotações ao Regime Geral, 2ª edição, 2002, p.316.
Na ponderação da aplicação da pena de admoestação está em causa:
- a reduzida gravidade da infração;
- um juízo de censura inerente à culpa que não seja muito intensificado.
Ora, entende o Tribunal que, perante os resultados múltiplos decorrentes da prática desta contraordenação, esta assume uma gravidade relevante, que afasta a aplicação de uma admoestação.
E, por isso mesmo, o Tribunal não aplica a sanção admoestação.
*
  Nos termos do disposto no artº 5º, nº 1, da Lei nº 99/2009, “1 — A determinação da medida da coima e a decisão relativa à aplicação de sanções acessórias são feitas em função da ilicitude concreta do facto, da culpa do agente, dos benefícios obtidos com a prática da contraordenação e das exigências de prevenção, tendo ainda em conta a natureza singular ou colectiva do agente.
2 — Na determinação da ilicitude concreta do facto e da culpa das pessoas colectivas e entidades equiparadas atende -se, entre outras, às seguintes circunstâncias: a) Ao perigo ou ao dano causados; I) Ao carácter ocasional ou reiterado da infracção; c) À existência de actos de ocultação tendentes a dificultar a descoberta da infracção; d) À existência de actos do agente destinados a, por sua iniciativa, reparar os danos ou obviar aos perigos causados pela infracção.
4 — Na determinação da sanção aplicável são ainda tomadas em conta a situação económica e a conduta do agente”.
A Recorrente é uma pessoa coletiva.
As exigências de prevenção geral são elevadas, já que o que está em causa é garantir que as deliberações do regulador são escrupulosamente cumpridas e com todo o empenho.
Não se vislumbram exigências de prevenção especial muito intensas, já que não se provaram antecedentes contraordenacionais.
No que respeita à ilicitude concreta dos factos:
- não se provou um concreto perigo ou dano intenso, já que não se provou que nenhum terceiro (incluindo as outras operadoras) tivessem ficado impossibilitadas de colocar os seus cabos nas condutas da Recorrente;
- a contraordenação teve um caráter reiterado, com uma multiplicidade de desconformidades em diversas CVP’s e que se prolongaram no tempo;
- inexistiram atos de ocultação tendentes a dificultar a descoberta da infração;
- A recorrente, após a fiscalização, alterou a extranet, corrigindo as desconformidades;
Relativamente à culpa, a Recorrente atuou com negligência inconsciente, o que diminui a censura;
Não se vislumbram benefícios económicos retirados com a prática da infração.
No que respeita à situação económica da Recorrente, em 2012, teve um volume de negócios de €1.774.317.741,00 e um resultado líquido de - €86.901.669,00 (cfr. número 50. dos factos provados.
Tudo visto, o Tribunal julga justo, por adequado, fixar a coima em € 20.000,00 (vinte mil euros).
Face à culpa apurada e ao número de infrações, não se atenua especialmente a coima nem se suspende a sua execução.»
Não podemos deixar de subscrever tal decisão no que concerne, desde logo, à não aplicação de admoestação, tendo-se optado pela imposição de uma coima.
Na verdade, os pressupostos daquela medida, enunciados no art. 51.º, n.º 1 do RGCO, não estão preenchidos, na medida em que não estamos perante uma infracção de reduzida gravidade, atentos os interesses fundamentais que foram comprometidos pela acção negligente da arguida e que a deliberação do I, não cumprida pela arguida, visava salvaguardar, assim como, não se pode considerar diminuta a culpa desta, na medida em que a omissão das diligências necessárias à actualização da extranet-ORAC se prolongou por Bastante tempo, sem que tenham sido feitas quaisquer diligências para superar as lacunas existentes, apesar de ser do conhecimento da arguida que «vários operadores tinham informado incorrectamente sobre as operações realizadas nas condutas».
No que concerne à medida da coima, entendemos que a mesma também não merece censura.

Em primeiro lugar, porque, contrariamente ao sufragado pelo recorrente I, somos de opinião que a circunstância de se ter entendido que a arguida agiu com negligência consciente - divergindo do Tribunal recorrido, que considerou ter havido negligência inconsciente -, não implica, necessariamente, uma agravação da coima aplicada.

Na verdade, apesar de algumas divergências na doutrina que não podemos deixar de realçar, havendo quem defenda que «a negligência consciente é mais digna de pena que a inconsciente, porque a representação de uma possível realização do tipo confere ao agente um contra-motivo mais forte que os ensejos que serão dados ao agente na negligência inconsciente, para se aperceber do perigo dele proveniente», sem, porém, deixar de se reconhecer «o significado relativamente pequeno da distinção», estamos neste ponto solidários com Figueiredo Dias (Direito Penal – Parte Geral, tomo I, pág. 632), quando afirma: «… em matéria de gravidade do ilícito não vemos que a representação da violação como possível indicie sempre um maior peso da negligência consciente face à inconsciente: relativamente à morte de um peão, o ilícito imputável ao automobilista que conduz em animada conversa e brincadeira com os passageiros amigos e em consequência não representa sequer a possibilidade  de atropelamento, não tem de ser menos grave do que o daquele que em virtude de uma desatenção momentânea representa, se bem que já tarde, aquela possibilidade . De qualquer modo, exacto nos parece que a distinção entre negligência consciente e inconsciente visa tão-só estabelecer os requisitos puramente psicológicos – positivos ou negativos – que pode assumir a negligência no seu conjunto, bem como reafirmar o critério, já constante do art. 14.º, nomeadamente do seu n.º 3, de distinção entre dolo (eventual) e negligência (consciente). Em termos de medida da pena tudo dependerá das exigências de prevenção que no caso se façam sentir e da gravidade da realização do tipo de ilícito e do tipo de culpa».

À luz de tais ensinamentos, vejamos, então, a medida concreta da coima.
Foi esta fixada em € 20 000,00.
As anomalias, por desconformidades entre a informação fornecida pela extranet e o que foi constatado no terreno, foram verificadas em 19/4, 26/4, 28/4 (3) e 2/5, do ano de 2011, abarcando, por isso, um período relativamente curto, sendo certo que a arguida tinha de controlar mais de 250000 CVP.
A arguida corrigiu as desconformidades, logo a seguir à respectiva denúncia, não havendo actos de ocultação tendentes a dificultar a descoberta da infracção.
Apesar de elevadas as exigências de prevenção geral, no plano da prevenção especial elas estão num patamar bem mais baixo.
A ilicitude dos factos situa-se num nível mediano. Não retirou a arguida benefícios económicos com a infracção.
Consequentemente, tendo em conta a moldura correspondente da coima para pessoas colectivas, a situação económica da arguida, bem como todo o demais circunstancialismo atrás assinalado e que foi devidamente tomado em consideração pelo Tribunal recorrido, concluímos que a coima aplicada se mostra justa e adequada, não havendo razões ponderosas para a sua modificação, quer no sentido do seu agravamento (a pedido do I), quer no da sua redução (a pedido da arguida), razão pela qual só nos resta confirmá-la.

 Em conclusão, são improcedentes os recursos interpostos.

***

III. DECISÃO:
Em conformidade com o exposto, julgam-se improcedentes os recursos interpostos pelo I e pela arguida A, confirmando-se a decisão recorrida.
*
Condena-se a arguida nas custas, fixando-se a taxa de justiça em cinco (5) UC.
Notifique.
Lisboa,      /      /
(Elaborado em computador e revisto pelo relator - artigo 94.º, n.º 2, do CPP


[1]                      Neste sentido, também o acórdão do TRC de 04/10/2006, processo nº 1369/06.9YRCBR, integralmente disponível no sítio www.dgsi.pt.