Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5/16.0T8BRR.L1-4
Relator: JOSÉ EDUARDO SAPATEIRO
Descritores: PROCEDIMENTO CAUTELAR COMUM
ISENÇÃO DE HORÁRIO DE TRABALHO
CESSAÇÃO DE PAGAMENTOS
DEVER DE OCUPAÇÃO EFECTIVA
PRINCÍPIO DA BOA FÉ
SUBSÍDIO DE EXCLUSIVIDADE
PERICULUM IN MORA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/15/2016
Votação: DECISÃO INDIVIDUAL
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A DECISÃO
Sumário: I- Não obstante ser verdade que os factos em causa são normalmente articulados com aquele propósito (danos não patrimoniais), nada impede que o trabalhador afetado desenvolva esse tipo de alegação circunstancial, envolvente, de enquadramento mais geral da sua situação de inatividade forçada e injustificada, fazendo-a refletir em sede da violação do dever de ocupação efetiva por parte da sua entidade empregadora, assim reforçando e justificando ainda mais o cariz ilícito, progressivo e grave desse incumprimento, o mesmo sendo defensável quanto a cenários particulares, subtis, falseados, enviesados, armadilhados, em que as referidas inação ou inatividade ou as suas consequências não são facilmente discerníveis e qualificáveis.
II- Os factos revelam uma prática de gestão criativa e engenhosa mas altamente censurável a todos os níveis, consistente no esvaziamento das funções correspondentes à categoria do trabalhador qualificado (Diretor) e na concomitante retirada de determinadas prestações laborais que, por força de tal «secagem» de funções, já não se justificam jurídica e contratualmente.
III- O princípio da boa-fé (artigo 126.º do C.T./2009) – já para não falar de outros princípios e valores mais elevados e abrangentes, como os direitos de personalidade, sempre radicados e pautados pela dignidade da pessoa humana, designadamente, na vertente da preservação da sua integridade física e moral (cfr., por exemplo, os artigos 14.º e seguintes do C.T./2009 e 70.º do C. Civil) – está sempre presente no cumprimento e execução do contrato de trabalho, o que significa que as partes não podem agir nas suas relações contratuais de uma forma infundada, despauterada, por sua livre e autorrecriação, sem motivo objetivo, plausível, lógico e reconhecido como legítimo pelo direito (logo, em violação do dito princípio da boa-fé), assim como não podem atuar em abuso de direito (artigo 334.º do Código Civil).
IV- Os artigos 115.º, 118.º, 126.º, 127.º, números 1, alíneas a) e c) e 2 e 129.º, número 1, alínea b) do C.T./2009 impõem a obrigação à entidade empregadora de, no âmbito da relação laboral estabelecida e dentro dos limites estabelecidos por lei, atribuir funções efetivas e suficientes aos seus trabalhadores, estando-lhe vedado não o fazer de uma forma injustificada.
V- A factualidade dada como indiciariamente provada e os documentos que a complementam não evidenciam qualquer fundamento ou justificação legítimas para a Requerida não ocupar o Requerente de facto e com atribuições compatíveis com a sua nova posição (assessor do C.A., embora com a categoria profissional de diretor), verificando-se assim uma violação do dever de ocupação efetiva do mesmo.
VI- Atendendo aos termos do contrato de trabalho celebrado entre o Requerente e o banco antecessor da Requerida, o subsídio de exclusividade constitui uma das condições de trabalho que estiveram na génese da celebração do referido negócio jurídico, ou seja, uma das realidades de cariz pecuniário que foram elemento negociado e constitutivo do vínculo de trabalho em questão e que, sendo liquidado 14 vezes ao ano, não encontra fundamento legítimo que consinta à empregadora retirá-lo unilateralmente.
VII- Numa outra perspetiva e não olhando sequer a tal cariz constitutivo e consensual, inexistem factos ou documentos que nos permita qualificar esse subsídio de exclusividade de forma distinta da retribuição, dado a Requerida não ter logrado dissociá-lo da natureza retributiva presumida que ressalta dos artigos 82.º, número 3, da LCT, 249.º, número 3 do C.T./2003 e 258.º, número 3, do C.T./2009, recaindo sobre ela tal ónus de alegação e prova.
VIII- No que concerne ao subsídio de exclusividade, à sua natureza retributiva, ao seu valor mensal de € 1.130,56 e à circunstância de o mesmo ter sido retirado ao Requerente, num efeito cumulativo com a IHT (o que aconteceu em 15/2/2013 e com referência a um montante mensal de valor mensal de € 1.237,70) e ainda com o subsídio de representação no valor mensal de € 234,44 e o subsídio a título de despesas de representação no valor mensal de € 364,33, mostra-se cumprido o requisito «periculum in mora».
IX- No que concerne à Isenção de Horário do Trabalho, não se verifica o requisito do «periculum in mora», pois o Requerente só veio reagir à retirada de tal prestação pela Requerida mais de 3 anos após tal propósito da mesma lhe ter sido comunicado e cerca de 30 meses depois de tal IHT ter deixado de ser efetivamente paga aquele.
X- Não se pode equiparar a remuneração do trabalhador, que se traduz na contrapartida do trabalho prestado ao empregador, a um qualquer crédito proveniente de um contrato civil ou comercial, o que quer dizer que na aferição de qualquer lesão à mesma, importa, por um lado, ser bastante rigoroso na sua avaliação e tolerância, mesmo que em termos meramente cautelares, pois estão em causa direitos constitucionais básicos, de índole patrimonial, social, familiar, pessoal e moral, que, no seu conjunto, se reconduzem, em última análise, à dignidade da pessoa humana, nas diversas vertentes consideradas na Constituição da República Portuguesa, não se podendo ter, por outro lado e consequentemente, uma perspetiva miserabilista ou muito restrita do fundamento e âmbito de aplicação das providências cautelares, em casos como o dos autos, em que estão em causa, ainda que parcialmente, as necessidades básicas de subsistência do Requerente (alimentação, vestuário, calçado, habitação, saúde, etc.).
XI- A violação do dever de ocupação efetiva tem natureza continuada, progressiva, cuja gravidade não se atenua com o passar do tempo mas antes pelo contrário se acentua e qualifica, explicando-se tal afirmação pela índole jurídica multifacetada que o direito do trabalhador à sua ocupação efetiva no seio da estrutura organizada do empregador possui, dado enxertar-se não apenas na contrapartida contratual do salário que é devida ao empregador, mas também noutras realidades que se prendem com o ambiente e as condições gerais do trabalho, o relacionamento com os colegas, dirigentes e clientes, os direitos de realização e progressão profissional do trabalhador assim como com os seus direitos de personalidade (na vertente última da dignidade humana, ou seja, no respeito pela sua integridade moral e física) e com os normais reflexos que transporta para o exterior (agregado familiar, vida social, etc.).
XII- No caso dos autos, não apenas o Requerente tentou por diversas vezes chegar à fala com os Presidentes do C.A. da Requerida (sem que tivesse logrado uma resposta conclusiva da parte dos mesmos, apesar de o mesmo ser Assessor de tal Conselho de Administração) como se verifica uma deterioração prolongada no seu equilíbrio pessoal, social e familiar, que tem de ser também aqui equacionada, mostrando-se assim preenchido o requisito «periculum in mora».
(Sumário elaborado pelo Relator
Decisão Texto Parcial:DECISÃO SUMÁRIA, NOS TERMOS DO ARTIGO 656.º DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.



I– RELATÓRIO:


AA, com o NIF (…) e residente na Rua (…), veio instaurar, em 31/12/2015, o presente procedimento cautelar comum contra BB, pessoa coletiva n.º (…), com sede na Rua (…) Lisboa, pedindo, em síntese, o seguinte:
«a) Ser declarado que as prestações regulares e periódicas auferidas pelo Requerente a título de subsídio de exclusividade no valor mensal de € 1.130,56, de subsídio de representação no valor mensal de € 234,44, de subsídio a título de despesas de representação no valor mensal de € 364,33, de retribuição de isenção de horário de trabalho no valor mensal de € 1.237,70, integram a sua retribuição;
b) Ser declarado que, a partir de 15 de Fevereiro de 2013 (retribuição de isenção de horário de trabalho) e partir de Novembro de 2015, inclusive (subsídio de exclusividade, subsídio de representação e subsídio a título de despesas de representação), a Requerida diminuiu ilegalmente a retribuição do Requerente, em flagrante violação do disposto no artigo 129.º, n.º 1, alínea d), do Código do Trabalho e no artigo 406.º, n.º 1, do Código Civil;
c) Ser a Requerida condenada a pagar ao Requerente, desde 15 de Fevereiro de 2013 a retribuição de isenção de horário de trabalho e desde Novembro de 2015, inclusive, o subsídio de exclusividade, o subsídio de representação e o subsídio a título de despesas de representação, acrescidos dos juros de mora à taxa legal vencidos e vincendos desde as respetivas datas de vencimento e até integral pagamento;
d) Ser declarado que a Requerida violou o dever de ocupação efetiva do Requerente, consagrado no artigo 129.º, n.º 1, alínea b), do Código do Trabalho;
e) Ser a Requerida condenada a atribuir tarefas ao Requerente, correspondentes à sua categoria profissional de Diretor.»
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Como fundamento do seu pedido alegou o Requerente, muito em síntese, que é trabalhador da Requerida e que, apesar de tais prestações terem sido acordadas pelas partes no quadro do contrato de trabalho firmado em 29/6/1998 (e que tendo sido consensualizadas com a CC, se mantiveram com a aquisição pela aqui Requerida dos ativos e passivos dessa instituição bancária, no final do ano de 2010) lhe foi comunicada, por escrito, em 6/11/2012, a cessação do regime de isenção de horário de trabalho e do pagamento da correspondente remuneração, vindo depois a Administração da BB a comunicar-lhe em 19/10/2015, o fim do regime de exclusividade e do pagamento do respetivo subsídio, assim como dos subsídios de representação e a título de despesas de representação.

A Requerida, para além de um procedimento disciplinar com intenção de despedimento que veio a culminar na proposta pelo instrutor do procedimento disciplinar de aplicação da sanção disciplinar de apreensão registrada e que a Requerida veio simplesmente a arquivar, numa atitude de assédio moral ou mobbing, deixou de atribuir quaisquer funções ao Requerente desde 10/4/2013, não obstante ter sido nomeado assessor do Conselho de Administração da BB, numa clara violação do dever de ocupação efetiva.

A quebra da retribuição do Requerente, ocorrida entre os anos de 2002 e 2016, de um valor anual de € 77.566,48 para € 36.756,72, ou seja num montante global e anual de 40.809,76 € (52,61%) causou uma evidente e muito significativa diminuição da sua situação patrimonial, com reflexos muito negativos na vida familiar e social dele próprio e do seu agregado familiar, constituído por sua esposa (com um rendimento mensal de 405,44 €) e 3 filhos menores, todos a estudarem.    

O Requerente descreveu os factos em que assenta a sua pretensão e concluiu pela procedência da providência.            
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Citado o Requerido (cf. fls. 388 e 400), veio o mesmo, a fls. 405 e seguintes, deduzir oposição, onde, em síntese, negou o carácter retributivo das prestações reclamadas e a violação do dever de ocupação efetiva, bem como a existência de periculum in mora.
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Foi designada data para a Audiência Final (fls. 388), a que se procedeu com observância do legal formalismo (fls. 424 a 427 e 433), tendo a prova aí produzida sido objeto de gravação-áudio.
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Veio então a ser proferida a sentença de fls. 434 a 445, com data de 28/02/2016, que decidiu, a final, o seguinte:
Nestes termos, julgo o presente procedimento cautelar comum parcialmente procedente e, em consequência:
-Condeno a requerida BB:
-A reconhecer que as prestações regulares e periódicas auferidas pelo Requerente AA a título de subsídio de exclusividade no valor mensal de € 1.130,56, de subsídio de representação no valor mensal de € 234,44, de subsídio a título de despesas de representação no valor mensal de € 364,33, integram a sua retribuição;
-No pagamento ao Requerente, desde Novembro de 2015, inclusive, o subsídio de exclusividade, o subsídio de representação e o subsídio a título de despesas de representação, acrescidos dos juros de mora à taxa legal vencidos e vincendos desde as respetivas datas de vencimento e até integral pagamento.
-Absolvo a requerida do demais peticionado.
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Valor da ação: € 5.000,01 (cinco mil euros e um cêntimo).
Custas por requerente e requerida em partes iguais.
Registe e notifique e comunique a presente decisão ao ACT localmente competente, para acompanhamento da situação de violação do dever de ocupação efetiva.”
*

O Tribunal do Trabalho do Barreiro fundamentou nos seguintes moldes a improcedência deste procedimento cautelar:

«Nos termos do disposto no art.º 362.º, n.º 1, do Novo Código de Processo Civil, Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efectividade do direito ameaçado.
Assim, cumpre verificar se estão indiciariamente provados, por um lado, a existência do direito; por outro lado, o periculum in mora, a necessidade de decisão imediata, não se podendo aguardar pelo desfecho da ação principal.
No caso sub judice, apurou-se a violação do dever de ocupação efetiva.
Porém, não há periculum in mora: a situação arrasta-se há muito tempo, nunca antes o tendo o requerente sentido necessidade de proteção, não havendo qualquer indício de que a situação atual se tenha agravado; uma decisão no sentido requerido seria inócua, quer porque seria uma mera repetição de disposição legal, quer porque seria possível executá-la coercivamente.
Também não há periculum in mora no que toca à falta de pagamento do subsídio de isenção de horário de trabalho, igualmente tendo em conta o tempo entretanto decorrido desde que foi retirado ao requerente; aqui, é até duvidosa a existência do direito, uma que a isenção de horário de trabalho, pela sua própria natureza, pode ser retirada ao trabalhador sem a sua concordância.
Já no que toca aos demais complementos retirados ao requerente, dispõe o art.º 258.º, n.ºs 1 e 2, do Código do Trabalho, que: 2 - A retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie. 3 - Presume-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador.
Ora, a requerida não logrou afastar a presunção de carácter retributivo das prestações; pelo contrário, dos factos indiciariamente provados resulta que o são.»
*

A Requerida BB, inconformada com tal decisão, veio, a fls. 454 e seguintes e em 17/03/2016, interpor recurso da mesma, tendo requerido a fixação do efeito suspensivo à Apelação.

O juiz do processo admitiu, a fls. 621, o recurso interposto, como de Apelação, tendo determinado a sua subida imediata, nos próprios autos, sendo o efeito suspensivo em função da caução prestada pela recorrente.
*

A Apelante apresentou alegações de recurso (fls. 456 e seguintes), onde formulou as seguintes conclusões:
(…)
Termos em que, Com o douto suprimento do Venerando Tribunal ad quem, requer-se que seja fixado ao presente recurso efeito suspensivo, dando-se provimento ao mesmo, revogando-se parcialmente a decisão recorrida face aos elementos prova constantes do processo sobre os pontos da matéria de facto em causa e substituindo-se a mesma por decisão que declare totalmente improcedente o procedimento cautelar comum, absolvendo a Requerida, aqui Recorrente, dos demais pedidos, assim se fazendo JUSTIÇA!»
*

Notificado o Requerente para responder a tais alegações, veio o mesmo fazê-lo dentro do prazo legal, nos moldes constantes de fls. 588 e seguintes, tendo formulado as seguintes conclusões:
(…)
Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, por não provado, proferindo-se acórdão que confirme, nos seus precisos termos, a douta decisão recorrida, na parte em que condenou a Recorrente a reconhecer que a prestação regular e periódica auferida pelo Recorrido a título de subsídio de exclusividade, no valor mensal de € 1.130,56, integra a sua retribuição, e condenou a Recorrente a pagar-lhe, desde Novembro de 2015, inclusive, o subsídio de exclusividade, acrescidos dos juros de mora à taxa legal vencidos e vincendos desde as respetivas datas de vencimento e até integral pagamento, pois, só assim se fará a costumada JUSTIÇA!»
*

O Requerente AA, também inconformado com tal decisão, veio, a fls. 493 e seguintes e em 23/03/2016, arguir a sua nulidade e interpor recurso da mesma.
O juiz do processo admitiu, a fls. 621, o recurso interposto, como de apelação, tendo determinado a sua subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
*

O Apelante apresentou alegações de recurso (fls. 495 e seguintes), onde formulou as seguintes conclusões:
(…)
Nestes termos, e nos demais de Direito, cujo douto suprimento expressamente se requer, deve ser concedido integral provimento ao presente recurso de apelação, revogando-se a decisão recorrida na parte em que (i) absolveu a Recorrida do pedido de reconhecimento de que a retribuição de isenção de horário de trabalho, no valor mensal de € 1.237,70, integra a retribuição do Recorrente, (ii) não declarou que, a partir do dia 15 de Fevereiro de 2013, a Recorrida diminuiu ilegalmente a sua retribuição, (iii) não condenou a Recorrida a pagar-lhe, desde o dia 15 de Fevereiro de 2013, a retribuição de isenção de horário de trabalho e, (iv) não condenou a Recorrida a atribuir-lhe tarefas, correspondentes à sua categoria profissional de Director, substituindo-se a mesma por outra que reconheça que a retribuição de isenção de horário de trabalho, no valor mensal de € 1.237,70, integra a retribuição do Recorrente, (ii) que declare que, a partir do dia 15 de Fevereiro de 2013, a Recorrida diminuiu ilegalmente a sua retribuição, (iii) que condene a Recorrida a pagar-lhe, desde o dia 15 de Fevereiro de 2013, a retribuição de isenção de horário de trabalho e, (iv) que condene a Recorrida a atribuir-lhe tarefas, correspondentes à sua categoria profissional de Director, assim se fazendo inteira JUSTIÇA!”.
*

Notificada a Requerida para responder a tais alegações, veio o mesmo fazê-lo dentro do prazo legal, nos moldes constantes de fls. 550 e seguintes, tendo formulado as seguintes conclusões:
(…)
Termos em que, Com o douto suprimento do Venerando Tribunal ad quem, deve o recurso interposto ser considerado integralmente improcedente, confirmando-se na íntegra a parte da decisão ora recorrida, conforme é de Justiça!”.
*

O ilustre magistrado do Ministério Público, a fls. 637 dos autos, proferiu parecer no sentido da improcedência dos presentes recursos de Apelação, não tendo a Requerida se pronunciado acerca do mesmo, dentro do prazo de 10 dias, apesar de ter sido notificada para o efeito, ao contrário do que fez o Requerente que veio manifestar a sua concordância no que toca ao conteúdo daquele e com referência ao recurso de Apelação interposto pela parte contrária.
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Considerando a simplicidade das questões suscitadas, o relator, fazendo apelo ao disposto nos artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e 656.º do Novo Código de Processo Civil, vai julgar o presente recurso de apelação através de Decisão Singular e Sumária. 
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Cumpre decidir.

II – OS FACTOS.

O tribunal da 1.ª instância recorrido considerou indiciariamente provados os seguintes factos:

«A. No dia 29 de Junho de 1998, o Requerente celebrou um contrato de trabalho sem termo com o CC, S.A., com início no dia 06 de Julho de 1998, para o exercício das funções correspondentes à categoria profissional de Subdiretor no Gabinete de Controlo Interno, no Porto, e com uma antiguidade reportada, para todos os efeitos, ao dia 01 de Agosto de 1990.
B. Entre as condições expressamente acordadas pelo Requerente com o CC, S.A. para a sua admissão, encontrava-se a atribuição (i) de um subsídio de exclusividade no valor mensal de Esc. 47.000,00, (ii) de um subsídio de representação no valor mensal de Esc. 47.000,00 (iii) e de um Cartão Visa com um valor limite mensal de Esc. 50.000,00, tendo o Requerente subscrito ainda a «Declaração de Concordância com Isenção de Horário de Trabalho», datada de 6/7/1998 e junto a fls. 44 dos autos.

[B. Entre as condições expressamente acordadas pelo Requerente com o CC, S.A. para a sua admissão, encontrava-se a atribuição (i) de um subsídio de exclusividade no valor mensal de Esc. 47.000,00, (ii) de um subsídio de representação no valor mensal de Esc. 47.000,00, (iii) de um Cartão Visa com um valor limite mensal de Esc. 50.000,00 e (iv) de isenção de horário de trabalho mediante o pagamento de uma remuneração adicional correspondente a 2 (duas) horas de trabalho suplementar por dia.]

C. Do contrato de trabalho celebrado decorre expressa e inequivocamente que, naquela data, o CC e o Requerente acordaram, foram os seguintes:
(i) O Segundo Outorgante se obriga-se a prestar os seus serviços profissionais como empregado do Primeiro Outorgante;
(ii) O Segundo Outorgante desempenhará as suas funções, em quaisquer instalações, estabelecimentos, agências ou sucursais do CC;
(iii) O Segundo Outorgante fica abrangido pelo Acordo Coletivo de Trabalho “ACT” do Setor Bancário (ACT celebrado entre várias instituições de crédito e a FEBASE – Federação do Setor Financeiro, cuja última versão consolidada está publicada no BTE, 1.ª série, n.º 3, de 22/1/2011), aplicável à Requerida por ser parte outorgante, sendo-lhe atribuído o Nível 14 e a categoria de Subdiretor (Cl. 3.ª);
(iv) A retribuição mensal do Segundo Outorgante será igual à que, em cada momento, estiver fixada no ACTV do Sector Bancários, para os empregados do Nível 14 (Cl. 4.ª).

D. Através da Declaração de Concordância com Isenção de Horário de Trabalho, datada de 06 de julho de 1998, e por si subscrita o Requerente declarou: “Concordar com a concessão de isenção de horário de trabalho a requerer em 06.07.98, por motivo da qual e das funções que exerce, aufere a retribuição mensal de Esc.:288.320$00, acrescida de Esc.: 133.867$00, de retribuição adicional pela isenção”.

E. Em data indeterminada situada entre 1 de Agosto e 1 de Novembro de 1999, o Requerente passou a exercer as funções de Subdiretor da Direção de Auditoria Interna do CC, S.A., em Lisboa.

[E. A partir de 1 de Agosto de 1999, o Requerente passou a exercer as funções de Subdiretor da Direção de Auditoria Interna do CC, S.A., em Lisboa.]
F. A partir de 01 de Setembro de 2007, o Requerente foi promovido à categoria profissional de Director da Direcção de Auditoria Interna do CC, S.A.
G. A partir dessa data, o Requerente foi nomeado, em acumulação, Responsável pelo Gabinete de Provedoria do Cliente, Responsável pela Supervisão e Controlo para as Atividades de Intermediação Financeira e Coordenador das Ações relacionadas com o Branqueamento de Capitais na Comissão de Prevenção do Branqueamento de Capitais.
H. No dia 02 de Dezembro de 2008, o Requerente foi nomeado Responsável do Departamento de Auditoria Interna Corporativa do DD, S.A..
I. No final de 2010, a Requerida adquiriu o CC, S.A., tendo sido outorgado no dia 04 de Abril de 2011, um contrato de aquisição de ativos e passivos, em virtude do qual foram transmitidos para a Requerida todos os ativos e passivos que constituíam o estabelecimento relativo à atividade bancária até àquela data exercida pelo CC, S.A..
J. Em 22 de Fevereiro de 2011, numa reunião de quadros da Requerida, o Senhor Dr. EE, Administrador com o pelouro da Direção de Auditoria Interna, informou o Requerente que o mesmo iria substituir o Senhor Dr. FF, Diretor Coordenador da Direção de Auditoria Interna do CC, S.A., a partir da data da sua reforma.
K. A partir do dia 4 de Abril de 2011, o Requerente exerceu as funções de Adjunto da Direção de Auditoria Interna da Requerida e foi nomeado Responsável do Departamento de Auditoria.
L. Ainda no mês de Abril de 2011, o Senhor Dr. EE, Administrador com o pelouro da Direção de Auditoria Interna, na presença do Senhor Dr. FF comunicou a todos os colaboradores da Direção de Auditoria Interna da Requerida que o Requerente o iria substituir, a partir da data da sua reforma.
M. Em reunião realizada no dia 25 de Outubro de 2012, o Senhor Dr. EE e o Senhor Dr. GG, Administradores da Requerida, informaram o Requerente que o Conselho de Administração da Requerida havia deliberado, nessa data, que o mesmo passaria a exercer as funções de Diretor da Direção de Desenvolvimento de Serviço de Apoio da Requerida, com efeitos imediatos.
N. Assim, a partir do dia 26 de Outubro de 2012, o Requerente passou a apresentar na Direção de Desenvolvimento de Serviço de Apoio da Requerida, tendo sido informado pelo Senhor Dr. HH (Diretor da Direção de Desenvolvimento de Serviço de Apoio da Requerida) que a sua única tarefa consistiria na abertura do correio externo recebido pela Requerida.
O. Através de comunicação datada de 6 de Novembro de 2012, a Requerida informou o Requerente de que havia procedido à cessação do regime de isenção de horário de trabalho e da retribuição do mesmo, com efeitos a partir de dia 15 de Fevereiro de 2013.
P. Através de comunicação datada de 02 de Abril de 2013, a Requerida informou o Requerente que se deveria apresentar, no dia 10 de Abril de 2013, na Rua (…), em Lisboa, «ficando na dependência da Conselho de Administração».
Q. A partir de 10 de Abril de 2013, o Requerente foi nominalmente nomeado Assessor do Conselho de Administração da Requerida.
R. O Requerente, logo no dia 29 de Abril de 2013, enviou um E-mail à Secretária do Senhor Dr. II, à data, Presidente do Conselho de Administração da Requerida, solicitando uma entrevista com o mesmo.
S. O Presidente do Conselho de Administração da Requerida nem respondeu ao E-mail do Requerente.
T. Em consequência, no dia 14 de Maio de 2013, o Requerente enviou novamente um E-mail à Secretária do Presidente do Conselho de Administração da Requerida, solicitando uma entrevista com o mesmo.
U. O Presidente do Conselho de Administração da Requerida mais uma vez nem respondeu ao E-mail do Requerente.
V. Acresce que, a Requerida, desde Abril de 2013, não atribuiu quaisquer tarefas ao Requerente.
W. O Requerente, desde aquela data, permanece diariamente num gabinete, sem pessoal para dirigir, coordenar ou orientar, e sem funções, tarefas e/ou qualquer atividade distribuída pela Requerida.
X. O Requerente, desde aquela data, não recebe qualquer ordem, instrução, orientação, diretiva ou contacto, nem tão-pouco produz qualquer trabalho, estudo, informação ou relatório, prolongando-se essa inatividade há mais de 2 (dois) anos e meio.
Y. O atual Presidente do Conselho de Administração da Requerida tomou posse no dia 5 de Agosto do corrente ano e, desde dessa data, nunca contactou o Requerente.
Z. Através de carta datada de 30 de Outubro de 2015, o Requerente solicitou uma reunião com o Presidente do Conselho de Administração da Requerida.

AA. A Secretária do Presidente do Conselho de Administração da Requerida informou o Requerente de que seria agendada a solicitada reunião.
BB. Porém, até à data, o Presidente do Conselho de Administração da Requerida ainda não agendou qualquer reunião com o Requerente.
CC. A retribuição do Requerente, para além da retribuição base e das diuturnidades, inclui, desde a data da sua admissão, a retribuição de isenção de horário de trabalho, um subsídio de exclusividade, um subsídio de representação e um valor limite mensal no Cartão Visa o qual, a partir de Março de 2011 e com retroactivos a Janeiro desse ano, passou a ser pago com a designação de «subsídio a título de despesas de representação».
DD. A retribuição de isenção de horário de trabalho, o subsídio de exclusividade e o subsídio de representação sempre foram pagos mensalmente e 14 (catorze) vezes por ano, ou seja, integravam também o cálculo do subsídio de férias e do subsídio de Natal.
EE. Em 2007, o Requerente auferiu a retribuição de isenção de horário de trabalho no valor mensal de € 1.000,78, um subsídio de exclusividade no valor mensal de € 657,91, até Março, pago em duas parcelas no valor de € 375,00 e € 282,91, no valor mensal de € 1.382,91, entre Abril e Agosto, pago em duas parcelas no valor € 1.100,00 e € 282,91, e no valor de € 1.130,56, entre Setembro e Dezembro, pago em duas parcelas de € 847,65 e € 282,91 e um subsídio de representação no valor mensal de € 234,44.
FF. Em 2008, o Requerente auferiu a retribuição de isenção de horário de trabalho no valor mensal de € 1.109,76, um subsídio de exclusividade no valor mensal de € 1.130,56, pago em duas parcelas de € 847,65 e € 282,91 e um subsídio de representação no valor mensal de € 234,44.
GG. Em 2009, o Requerente auferiu a retribuição de isenção de horário de trabalho no valor mensal de € 1.126,41, um subsídio de exclusividade no valor mensal de € 1.130,56, pago em duas parcelas de € 847,65 e € 282,91 e um subsídio de representação no valor mensal de € 234,44.
HH. Em 2010, o Requerente auferiu a retribuição de isenção de horário de trabalho no valor mensal de € 1.237,73, um subsídio de exclusividade no valor mensal de € 1.130,56, pago em duas parcelas de € 847,65 e € 282,91, em Janeiro e numa única parcela a partir de Fevereiro, e um subsídio de representação no valor mensal de € 234,44.
II. Em 2011, o Requerente auferiu a retribuição de isenção de horário de trabalho no valor mensal de € 1.237,73, um subsídio de exclusividade no valor mensal de € 1.130,56, um subsídio de representação no valor mensal de € 234,44 e um subsídio a título de despesas de representação no valor de € 364,33.
JJ. Em 2012, o Requerente auferiu a retribuição de isenção de horário de trabalho no valor mensal de € 1.237,70, um subsídio de exclusividade no valor mensal de € 1.130,56, pago em duas parcelas de € 847,65 e € 282,91, um subsídio de representação no valor mensal de € 234,44 e um subsídio a título de despesas de representação no valor de € 364,33.
KK. Em 2013, o Requerente auferiu a retribuição de isenção de horário de trabalho no valor mensal de € 1.237,70, até 15 de Fevereiro, um subsídio de exclusividade no valor mensal de € 1.130,56, um subsídio de representação no valor mensal de € 234,44 e um subsídio a título de despesas de representação no valor de € 364,33.
LL. Em 2014, o Requerente auferiu um subsídio de exclusividade no valor mensal de € 1.130,56, pago em duas parcelas de € 847,65 e € 282,91, em Julho e numa única parcela entre Janeiro e Junho e entre Agosto e Dezembro, subsídio de representação no valor mensal de € 234,44 e um subsídio a título de despesas de representação no valor de € 364,33.
MM. Entre Janeiro e Outubro de 2015, o Requerente auferiu um subsídio de exclusividade no valor mensal de € 1.130,56, um subsídio de representação no valor mensal de € 234,44 e um subsídio a título de despesas de representação no valor de € 364,33.
NN. Através de comunicação datada de 19 de Outubro de 2015, a Requerida informou o Requerente da cessação, com efeitos imediatos, do regime de exclusividade e respetivo subsídio que vinha auferindo, assim como a rubrica a título de subsídio de representação, incluindo o subsídio a título de despesas de representação.
OO. O Requerente respondeu através de carta datada de 30 de Outubro de 2015, opondo-se à pretensão da Requerida.
PP. A Requerida não atendeu à oposição do Requerente à sua pretensão.
QQ. A partir de Novembro de 2015, inclusive, a Requerida deixou de pagar ao Requerente o subsídio de exclusividade no valor mensal de € 1.130,56, o subsídio de representação no valor mensal de € 234,44 e o subsídio a título de despesas de representação no valor de € 364,33.
RR. O Requerente é casado e tem três filhos menores.
SS. A mulher do Requerente aufere € 405,44.
TT. O Requerente despende, mensalmente, e em média, o valor de € 850,00 em despesas de supermercado, maioritariamente destinadas à alimentação, e despesas relacionadas com a vida doméstica do seu agregado familiar.
UU. O Requerente despende, mensalmente, e em média, o valor de € 20,00 com o pagamento das despesas de saúde próprias e do seu agregado familiar.
VV. O Requerente despende, mensalmente, e em média, o valor de € 1.527,47 com o pagamento das despesas de educação dos três filhos menores.
WW. O Requerente despende, mensalmente, e em média, o valor de € 350,00 com o pagamento das despesas de vestuário e de calçado, próprias e do seu agregado familiar.
XX. O Requerente despende, mensalmente, o valor de € 704,13 com o pagamento de todos os encargos do financiamento bancário que contraiu para aquisição da habitação onde reside com a mulher e com os seus três filhos menores e da sua segunda habitação.
YY. O Requerente despende, mensalmente, o valor de € 22,90 com o pagamento das quotas da Ordem dos Técnicos de Contas, da Ordem dos Economistas e do Instituto Português de Auditoria Interna.
ZZ. O Requerente despende, mensalmente, o valor de € 45,29 com o pagamento do condomínio da habitação onde reside com a sua mulher e com os seus três filhos menores e da segunda habitação.

AAA. O Requerente despende, mensalmente, e em média, o valor de € 200,00 com o pagamento da eletricidade e do gás da habitação onde reside com a sua mulher e com os seus três filhos menores, tendo recebido, a partir de Agosto de 2015, vários avisos de suspensão de fornecimento do gás por falta de pagamento das respetivas faturas e estando a pagar em prestações a fatura de 13 de Outubro de 2015.
BBB. O Requerente despende, mensalmente, e em média, o valor de € 5,71 com o pagamento do gás da sua segunda habitação, tendo já recebido avisos de suspensão de fornecimento de gás por falta de pagamento das respetivas faturas.
CCC. O Requerente despende, mensalmente, e em média, o valor de € 65,00 com o pagamento da água da habitação onde reside com a sua mulher e com os seus três filhos menores e da sua segunda habitação, estando a pagar em prestações a fatura de 06 de Fevereiro de 2015.
DDD. O Requerente despende, mensalmente, e em média, o valor de € 10,00 com o pagamento da eletricidade da sua segunda habitação.
EEE. O Requerente despende, mensalmente, e em média, o valor de € 50,00 com o pagamento do IMI da habitação onde reside com a sua mulher e com os seus três filhos menores e da sua segunda habitação.
FFF. O Requerente despende, mensalmente, e em média, o valor de € 73,50 com o pagamento do seguro da viatura automóvel do agregado familiar.
GGG. O Requerente despende, mensalmente, e em média, o valor de € 150,00 com o pagamento do telefone, da televisão e da internet da habitação onde reside com a sua mulher e com os seus três filhos menores, sendo certo que os seus filhos são estudantes e necessitam de ter internet para realizarem as suas atividades escolares.
HHH. E o Requerente despende, mensalmente, e em média, o valor de € 90,00 com o pagamento de portagens.
III. Em consequência de toda esta situação, o Requerente tem vivido numa constante angústia, inquietação e ansiedade.
JJJ. O que até então não acontecia.
KKK. Afetando a sua estabilidade emocional e psicológica, bem como a dos seus três filhos menores e da sua mulher.
LLL. E perturbando gravemente a sua vida familiar e social.
*

Encontram-se indiciariamente não provados os seguintes factos:

1. O Requerente passou a exercer as funções de Subdiretor da Direção de Auditoria Interna do CC, S.A., em Lisboa a partir de Novembro de 1999.
2. O regime de isenção de horário de trabalho foi proposto ao Requerente pelo Conselho de Administração do CC, já após a formalização do contrato de trabalho entre as partes.
3. Apenas por carta datada de 06 de julho de 1998 e junta pelo Requerente como Doc. 2, e em relação à qual este concedeu a sua concordância, decidiu o CC atribuir-lhe um subsídio de exclusividade.
4. O subsídio de representação pago em virtude da função desempenhada pelo Requerente, não foi inicialmente contratualizado entre as partes em sede de contrato de trabalho, apenas tendo sido estabelecido através da comunicação dirigida ao Requerente em 06 de julho de 1998.
5. Isto porque a Requerida se encontra atualmente a proceder a um estudo da sua organização estrutural e dos quadros humanos que a compõem, tendo em vista a implementação de um processo de redefinição estratégica a qual passará pela reorganização interna, adequando a realidade empresarial às atuais necessidades do mercado em que a mesma atua.
6. O requerente encontra-se sem ocupação efetiva porque a Requerida tem sofrido uma forte contração da sua atividade nos diversos segmentos de mercado em que opera: tanto no plano na contração de crédito quanto no segmento de captação de poupanças e que torna premente a necessidade de adoção de medidas de reestruturação.
7. Por seu turno, a conclusão do processo de aquisição do CC, S.A. levou a que se tivesse verificado uma transmissão dos contratos de trabalho aí existentes para a Requerida, sendo que muitas das vezes essa transmissão não se traduziu num aumento igualmente proporcional do volume da atividade, levando a um sobredimensionamento do quadro de pessoal, e que reclama o respetivo redimensionamento.
8. Uma dessas situações é precisamente a dos Assessores do Conselho de Administração, não se verificando a necessidade de acompanhamento deste órgão, por tantos quadros da Requerida.
9. Pretendendo evitar a adoção de medidas mais drásticas, num primeiro momento a Requerida procedeu a uma redução da massa salarial dos seus trabalhadores, através da extinção de alguns complementos, nas situações em que isso era possível e que não se verificavam os respetivos pressupostos de atribuição.
10. Todavia, perante a insuficiência dessas medidas, desde o último trimestre do ano transato que encontra-se a ser objeto de análise a necessidade de manutenção dos postos de trabalho atualmente existentes na Requerida, com vista à determinação da sua justificação ou redundância.
*

Não se consignam mais factos (provados ou não provados) porque irrelevantes para a decisão da causa, nomeadamente no que toca à existência de anterior processo disciplinar, bem como outros trabalhadores sem ocupação efetiva.»

NOTA: Encontram-se já inseridas nos locais próprios as alterações decididas por este Tribunal da Relação de Lisboa no quadro do recurso da impugnação da Decisão da Matéria de Facto interposto pelos Apelantes (Requerente e Requerida) e relativas aos Pontos B e E.   

III–O DIREITO.

É pelas conclusões do recurso que se delimita o seu âmbito de cognição, nos termos do disposto nos artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e 639.º e 635.º n.º 4, ambos do Novo Código de Processo Civil, salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608.º n.º 2 do NCPC).

A–REGIME PROCESSUAL APLICÁVEL.

Importa, antes de mais, definir o regime processual aplicável aos presentes autos, atendendo à circunstância do presente procedimento cautelar comum ter dado entrada em tribunal em 31/12/2015, ou seja, depois da entrada em vigor das alterações introduzidas no Código do Processo do Trabalho pelo Decreto-Lei n.º 295/2009, de 13/10, que segundo o seu artigo 6.º, só se aplicam às acções que se iniciem após a sua entrada em vigor, tendo tal acontecido, de acordo com o artigo 9.º do mesmo diploma legal, somente em 1/01/2010.
Esta ação, para efeitos de aplicação supletiva do regime adjetivo comum, foi instaurada depois da entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil, que ocorreu no dia 1/9/2013.
Será, portanto e essencialmente, com os regimes legais decorrentes da atual redação do Código do Processo do Trabalho e do Novo Código de Processo Civil como pano de fundo adjetivo, que iremos apreciar as diversas questões suscitadas neste recurso de Apelação.
Também se irá considerar, em termos de custas devidas no processo, o Regulamento das Custas Processuais – aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26/02, retificado pela Declaração de Retificação n.º 22/2008, de 24 de Abril e alterado pelas Lei n.º 43/2008, de 27-08, Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28-08, Lei n.º 64-A/2008, de 31-12, Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de Abril com início de vigência a 13 de Maio de 2011, Lei n.º 7/2012, de 13 Fevereiro, retificada pela Declaração de Retificação n.º 16/2012, de 26 de Março, Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, com início de vigência a 1 de Janeiro de 2013, Decreto-Lei n.º 126/2013, de 30 de Agosto, com início de vigência a 1 de Setembro de 2013 e Lei n.º 72/2014, de 2 de Setembro, com início de vigência a 2 de Outubro de 2014 –, que entrou em vigor no dia 20 de Abril de 2009 e se aplica a processos instaurados após essa data.     
Importa, finalmente, atentar na circunstância dos factos que se discutem no quadro destes autos terem ocorrido sucessivamente na vigência da LCT e legislação complementar, do Código do Trabalho de 2003, que entrou em vigor no dia 1/12/2003 e do Código do Trabalho de 2009, que entrou em vigor em 17/02/2009, sendo, portanto, o regime dos mesmos derivados que aqui irá ser chamado à colação em função da factualidade em julgamento.

B–NULIDADE DA SENTENÇA.

O Recorrente veio nas suas alegações [[1]] arguir a nulidade da sentença que se mostra vertida na primeira parte do número 1, alínea c) do art.º 615.º do Novo Código de Processo Civil (“É nula a sentença quando: c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;”), estipulando ainda o artigo 607.º, número 3, desse mesmo diploma legal, a propósito da estrutura da sentença, que “…seguem-se os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes concluindo pela decisão final”.
 Chegados aqui, impõe-se, desde logo e antes de mais, atentar na regra especial, de índole formal, que, no quadro do direito processual laboralista, vigora nesta matéria e que se acha contida no número 1 do artigo 77.º do Código de Processo de Trabalho:   

Artigo 77.º
Arguição de nulidades da sentença
1– A arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso.
2– (…)

Ora, se compulsarmos as alegações de recurso do Apelante verificamos que o mesmo dá cumprimento integral a tal exigência legal específica do regime adjetivo juslaboralista, pois invoca, de forma autónoma, no quadro do requerimento de interposição do recurso, a irregularidade em questão.

Acerca do vício de natureza formal que deixámos enunciado, convirá ouvir Fernando Amâncio Ferreira [[2]] diz: “Na alínea c) do número 1 do artigo 668.º, a lei refere-se à contradição real entre os fundamentos e a decisão: a construção da sentença é viciosa, uma vez que os fundamentos referidos pelo juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente. Diversa desta situação, por não respeitar a um vício lógico na construção da sentença, mas a uma contradição aparente é a que deriva de simples erro material, quer na fundamentação, quer na decisão, que se elimina por simples despacho, de harmonia com o disposto no artigo 667.º              
(…) Registe-se que a oposição entre os fundamentos e a decisão não se reconduz a uma errada subsunção dos factos à norma jurídica nem, tão-pouco, a uma errada interpretação dela. Situações destas configuram-se como erro de julgamento”). 

Ainda a respeito da irregularidade contemplada no artigo 668.º, número 1, alínea c) do Código de Processo Civil, Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora [[3]] afirmam o seguinte:
A segunda categoria de deficiências da sentença, que podem determinar a intervenção do juiz depois de ela ter sido proferida, é a das nulidades da decisão.
Da enumeração taxativa das causas de nulidade sujeitas, aliás em termos muito limitados, ao processo de retificação regulado no artigo 670.º, duas conclusões ressaltam imediatamente:
a) A de que não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário, ao contrário do que sucedia no Código de 1876 (art.º 1159.º, & 2.º); (…)
A lei refere-se, na alínea c) do n.º 1 do artigo 668.º, à contradição real entre os fundamentos e a decisão e não às hipóteses de contradição aparente, resultantes de simples erro material, seja na fundamentação, seja na decisão. Neste caso, efetuada por despacho a correção adequada, nos termos do artigo 667.º, a contradição fica eliminada.
Nos casos abrangidos pelo artigo 668.º, número 1, alínea c), há um vício real no raciocínio do julgador (e não um simples “lapsus calami” do autor da sentença): a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direção diferente”.

Como ensina o Prof. Alberto dos Reis, em “Código de Processo Civil Anotado”, volume V, Coimbra Editora, 1981, página 141, tal nulidade da alínea c) do artigo 668.º, número 1 do Código de Processo Civil ocorre quando «(…) a sentença enferma de vício lógico que a compromete (…), quando a construção da sentença é viciosa, pois os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas ao resultado oposto (…)».

Por seu turno, José Lebre de Freitas, em “Código de Processo Civil Anotado”, volume 2.º, Coimbra Editora, pág. 670, diz que «(…) entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade. A oposição entre os fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na contradição entre o pedido e a causa de pedir, geradora da ineptidão da petição inicial (…)».
     
Tendo em atenção a doutrina expressa nos excertos acima transcritos e com a qual concordamos, é manifesto que não nos achamos perante um caso de oposição ou contradição manifesta entre a fundamentação e a decisão tomada, pois a mesma mostra-se clara e inequivocamente sustentada de facto e de direito e, lógica e cronologicamente, construída no sentido da conclusão jurídica final a que chegou [[4]], podendo antes nos encontrar face a um eventual erro de julgamento, traduzido numa incorreta interpretação da factualidade dada como assente ou numa indevida subsunção das normas jurídicas aplicáveis a essa factualidade, mas tal situação não se confunde com a nulidade de sentença invocadas pelo Requerente e aqui em análise.           
Logo, por a questão suscitada não configurar, verdadeiramente, a nulidade de sentença arguida pelo Apelante no seu requerimento e prevista no artigo 615.º, número 1, alínea c) do Novo Código de Processo Civil, vai a mesma indeferida.                                   

C–IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO.
(…)
F–RECURSOS DE APELAÇÃO – QUESTÕES JURÍDICAS.

O Requerente e Apelante suscita, muito em síntese, as seguintes questões jurídicas:
1. O presente recurso de apelação vem interposto da sentença de fls. dos autos que julgou parcialmente procedente o presente procedimento cautelar comum, e não se conformando com tal decisão, na parte em que (i) não reconheceu que a retribuição de isenção de horário de trabalho, no valor mensal de € 1.237,70, integra a retribuição do Recorrente, (ii) não declarou que, a partir do dia 15 de Fevereiro de 2013, a Recorrida diminuiu ilegalmente a sua retribuição, (iii) não condenou a Recorrida a pagar-lhe, desde o dia 15 de Fevereiro de 2013, a retribuição de isenção de horário de trabalho e, (iv) não condenou a Recorrida a atribuir-lhe tarefas, correspondentes à sua categoria profissional de Diretor, doravante designada por «decisão recorrida».
A Requerida e igualmente Apelante vem levantar, no âmbito do seu recurso, a seguinte questão jurídica:
- Regime de exclusividade, correspondente subsídio e licitude da cessação do seu pagamento. 
    
G–REQUISITOS LEGAIS DAS PROVIDÊNCIAS CAUTELARES NÃO ESPECIFICADAS.

O Requerente (e Apelante) lançou mão dos autos de Procedimento Cautelar Comum com vista ao deferimento das pretensões que deixámos acima enunciadas, tendo a Requerida, na sua oposição, sustentado que os factos alegados e o regime legal, convencional e contratual, aplicável não justificava o decretamento das providências cautelares em questão, por não se mostrarem preenchidos os requisitos legalmente exigidos para o efeito.              
Os artigos 381.º e 387.º do Código de Processo Civil, na parte que nos interessa, estatuem o seguinte (o artigo 32.º do Código do Processo do Trabalho não tem qualquer relevância nesta matéria):

Artigo 381.º
(Âmbito das providências cautelares não especificadas)
1. Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efectividade do direito ameaçado.
2. O interesse do requerente pode fundar-se num direito já existente ou em direito emergente de decisão a proferir em acção constitutiva, já proposta ou a propor.
3. (…).

Artigo 387.º
(Deferimento e substituição da providência)
1. A providência é decretada desde que haja probabilidade séria da existência do direito e se mostre suficientemente fundado o receio da sua lesão.
2. A providência pode, não obstante, ser recusada pelo tribunal, quando o prejuízo dela resultante para o requerido exceda consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar.
3. (…)

A interpretação conjugada do regime acima reproduzido permite-nos corroborar o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 4/11/2009, processo n.º 2471-09.0TTLSB.L1-4, em que foi relatora a Juíza-Desembargadora Isabel Tapadinhas, publicado em www.dgsi.pt (Sumário), quando afirma o seguinte (cf., também, nesse mesmo sentido, a sentença impugnada):
“I– A solicitação de medidas cautelares não especificadas depende essencialmente da verificação de dois requisitos, nos termos dos arts. 381.º e 387.º do Cód. Proc. Civil:
a) Aparência ou verosimilhança de um direito do requerente carecido de tutela (fumus boni iuris);
b) Verificação de situação de perigo de ocorrência de lesão grave e dificilmente reparável se acaso a providência não for decretada (periculum in mora). (…)”

António Abrantes dos Santos Geraldes, por seu turno, em “Temas da Reforma do Processo Civil – 5. Procedimento cautelar comum”, III Volume, 4.ª Edição Revista e Actualizada, Almedina, Janeiro de 2010, página 99, afirma a este respeito, o seguinte:
Partindo do modo como vem regulada a matéria, o decretamento de providências não especificadas está dependente da conjugação dos seguintes requisitos:
a) Probabilidade séria da existência do direito invocado;
b) Fundado receio de que outrem, antes de a acção ser proposta ou na pendência dela, cause lesão grave e dificilmente reparável a tal direito:
c) Adequação da providência a situação de lesão iminente;
d) Não existência de providência específica que acautele aquela situação de perigo.”

H–PRIMEIRO REQUISITO.

Entrando na análise do primeiro requisito indicado (alíneas a) das duas transcrições), impõe-se abordar, desde logo, neste âmbito, as três realidades acima enunciadas e que são objeto dos dois recursos em julgamento, na sua faceta jurídica.

I–ISENÇÃO DO HORÁRIO DE TRABALHO.

Diremos, no que concerne a esta prestação, que, conforme resultou da alteração da Matéria de facto dada como indiciariamente provada, a IHT não constituiu uma das condições ou cláusulas que integraram a negociação e texto final do contrato de trabalho firmado entre o trabalhador e aqui requerente e a CC, não se encontrando assim abarcada pelo conteúdo consensual, original e constitutivo do vínculo laboral dos autos.
Impõe-se dizer – como aliás, já deixámos indicado na análise que fizemos acerca de tais aspetos em sede da impugnação da Decisão da Matéria de Facto – que a aparente e formal cisão entre o documento escrito denominado de «contrato de trabalho» e a carta datada da mesma data e remetida ao recorrente não traduzem, como defende convenientemente a Requerida, que o contrato de trabalho dos autos se reduz e reconduz apenas aquele primeiro documento, nada tendo as demais condições laborais a ver com tal acordo escrito, apesar de as mesmas serem alvo de mera informação – não de proposta, sugestão ou sequer imposição da entidade empregadora e sua remetente – que vem a ser recebida e aceite pelo trabalhador recém-admitido, que, para o efeito, assina a mesma.
Essa carta é uma declaração negocial complementar do «contrato de trabalho» que para qualquer destinatário normal colocado na posição do aqui trabalhador, se insere e completa o mesmo, limitando-se a registar ou a colocar por escrito o que foi acordado prévia e verbalmente entre as partes contraentes (artigos 236.º a 239.º do Código Civil), configurando o conjunto desses dois documentos o dito contrato de trabalho em toda a sua extensão e integralidade.
Ora, a ser assim, a IHT não foi aí contratualmente consensualizada como condição condicionadora e determinante da aceitação por parte do trabalhador da sua admissão no CC, ao contrário do que aconteceu – adiantando desde logo e aqui a nossa posição no que respeita a essa outra prestação em causa nos autos - que foi o subsídio de exclusividade.
Logo, não tendo o regime de Isenção de Horário de Trabalho sido instituído no âmbito do contrato de trabalho dos autos e tendo a situação geradora ou justificadora da atribuição de tal regime cessado, podia a entidade empregadora – nesse caso, a aqui Requerida BB -, desde que não houvesse nenhuma cláusula convencional contida na Regulamentação Coletiva aplicável que obstasse a tal, (cfr. cláusula 54.ª do ACT de 2009 [[5]]), nem norma legal igualmente impeditiva de tal retirada (cfr., artigos 218.º, 219.º e 265.º do C.T./2009, que sucederam aos artigos 177.º a 179.º e 256.º do C.T./2003 e 13.º e 15.º do Decreto-Lei n.º 409/71, de 27/9).

Tendo como pano de fundo tal regime jurídico, chamem-se à colação os factos pertinentes à análise desta matéria:

«F. A partir de 01 de Setembro de 2007, o Requerente foi promovido à categoria profissional de Diretor da Direção de Auditoria Interna do CC, S.A.
G. A partir dessa data, o Requerente foi nomeado, em acumulação, Responsável pelo Gabinete de Provedoria do Cliente, Responsável pela Supervisão e Controlo para as Atividades de Intermediação Financeira e Coordenador das Ações relacionadas com o Branqueamento de Capitais na Comissão de Prevenção do Branqueamento de Capitais.
H. No dia 02 de Dezembro de 2008, o Requerente foi nomeado Responsável do Departamento de Auditoria Interna Corporativa do DD, S.A..
I. No final de 2010, a Requerida adquiriu o CC, S.A., tendo sido outorgado no dia 04 de Abril de 2011, um contrato de aquisição de ativos e passivos, em virtude do qual foram transmitidos para a Requerida todos os ativos e passivos que constituíam o estabelecimento relativo à atividade bancária até àquela data exercida pelo CC, S.A.
J. Em 22 de Fevereiro de 2011, numa reunião de quadros da Requerida, o Senhor Dr. EE, Administrador com o pelouro da Direção de Auditoria Interna, informou o Requerente que o mesmo iria substituir o Senhor Dr. FF, Diretor Coordenador da Direção de Auditoria Interna do CC, S.A., a partir da data da sua reforma.
K. A partir do dia 4 de Abril de 2011, o Requerente exerceu as funções de Adjunto da Direção de Auditoria Interna da Requerida e foi nomeado Responsável do Departamento de Auditoria.
L. Ainda no mês de Abril de 2011, o Senhor Dr. EE, Administrador com o pelouro da Direção de Auditoria Interna, na presença do Senhor Dr. FF comunicou a todos os colaboradores da Direção de Auditoria Interna da Requerida que o Requerente o iria substituir, a partir da data da sua reforma.
M. Em reunião realizada no dia 25 de Outubro de 2012, o Senhor Dr. EE e o Senhor Dr. GG, Administradores da Requerida, informaram o Requerente que o Conselho de Administração da Requerida havia deliberado, nessa data, que o mesmo passaria a exercer as funções de Diretor da Direção de Desenvolvimento de Serviço de Apoio da Requerida, com efeitos imediatos.
N. Assim, a partir do dia 26 de Outubro de 2012, o Requerente passou a apresentar na Direção de Desenvolvimento de Serviço de Apoio da Requerida, tendo sido informado pelo Senhor Dr. HH (Diretor da Direção de Desenvolvimento de Serviço de Apoio da Requerida) que a sua única tarefa consistiria na abertura do correio externo recebido pela Requerida.
O. Através de comunicação datada de 6 de Novembro de 2012, a Requerida informou o Requerente de que havia procedido à cessação do regime de isenção de horário de trabalho e da retribuição do mesmo, com efeitos a partir de dia 15 de Fevereiro de 2013.
P. Através de comunicação datada de 02 de Abril de 2013, a Requerida informou o Requerente que se deveria apresentar, no dia 10 de Abril de 2013, na Rua (…), em Lisboa, «ficando na dependência da Conselho de Administração».
Q. A partir de 10 de Abril de 2013, o Requerente foi nominalmente nomeado Assessor do Conselho de Administração da Requerida.
R. O Requerente, logo no dia 29 de Abril de 2013, enviou um E-mail à Secretária do Senhor Dr. II, à data, Presidente do Conselho de Administração da Requerida, solicitando uma entrevista com o mesmo.
S. O Presidente do Conselho de Administração da Requerida nem respondeu ao E-mail do Requerente.
T. Em consequência, no dia 14 de Maio de 2013, o Requerente enviou novamente um E-mail à Secretária do Presidente do Conselho de Administração da Requerida, solicitando uma entrevista com o mesmo.
U. O Presidente do Conselho de Administração da Requerida mais uma vez nem respondeu ao E-mail do Requerente.
V. Acresce que, a Requerida, desde Abril de 2013, não atribuiu quaisquer tarefas ao Requerente.
W. O Requerente, desde aquela data, permanece diariamente num gabinete, sem pessoal para dirigir, coordenar ou orientar, e sem funções, tarefas e/ou qualquer atividade distribuída pela Requerida.
X. O Requerente, desde aquela data, não recebe qualquer ordem, instrução, orientação, diretiva ou contacto, nem tão-pouco produz qualquer trabalho, estudo, informação ou relatório, prolongando-se essa inatividade há mais de 2 (dois) anos e meio.
Y. O atual Presidente do Conselho de Administração da Requerida tomou posse no dia 5 de Agosto do corrente ano e, desde dessa data, nunca contactou o Requerente.
Z. Através de carta datada de 30 de Outubro de 2015, o Requerente solicitou uma reunião com o Presidente do Conselho de Administração da Requerida.
AA. A Secretária do Presidente do Conselho de Administração da Requerida informou o Requerente de que seria agendada a solicitada reunião.
BB. Porém, até à data, o Presidente do Conselho de Administração da Requerida ainda não agendou qualquer reunião com o Requerente.»
Ora, analisando tal factualidade indiciariamente dada como assente, assim como os documentos juntos aos autos que a suportam (bem como aqueles que sustentam os Pontos de Facto CC) a KK) – remuneração global auferida pelo trabalhador entre 2007 e 2013), constata-se que a Requerida pôs um ponto final no regime da IHT e do pagamento da respetiva retribuição (3 meses após a sua comunicação, nos termos da Cláusula 54.ª do ACT), mas não encontramos no presente procedimento cautelar um fundamento legítimo e justificativo para tal acontecer, sendo que a categoria profissional do Requerente era de Diretor e que, não obstante tal retirada da IHT, manteve tal categoria, ainda que reduzida à tarefa de abrir o correio externo.

O que ser deixou acima referido prende-se com o próximo ponto da nossa agenda, mas os factos acima dados como reproduzidos revelam uma prática de gestão criativa e engenhosa mas altamente censurável a todos os níveis, consistente no esvaziamento das funções correspondentes à categoria do trabalhador qualificado (Diretor) e na concomitante retirada de determinadas prestações laborais que, por força de tal «secagem» de funções, já não se justificam jurídica e contratualmente.

Importa recordar que o princípio da boa-fé (artigo 126.º do C.T./2009) – já para não falar de outros princípios e valores mais elevados e abrangentes, como os direitos de personalidade, sempre radicados e pautados pela dignidade da pessoa humana, designadamente, na vertente da preservação da sua integridade física e moral (cfr., por exemplo, os artigos 14.º e seguintes do C.T./2009 e 70.º do C. Civil) – está sempre presente no cumprimento e execução do contrato de trabalho, o que significa que as partes não podem agir nas suas relações contratuais de uma forma infundada, despauterada, por sua livre e autorrecriação, sem motivo objetivo, plausível, lógico e reconhecido como legítimo pelo direito (logo, em violação do dito princípio da boa-fé), assim como não podem atuar em abuso de direito (artigo 334.º do Código Civil).

Ora, face à factualidade dada como perfunctoriamente demonstrada, temos que a Requerida, na cessação do regime da IHT e do correspondente pagamento da retribuição respetiva, agiu em manifesta contravenção a esse princípio da boa-fé, quando não mesmo em abuso de direito.

A ser assim e no que concerne à IHT, pode-se falar, nas circunstâncias muito concretas, que deixámos analisadas, numa «Probabilidade séria da existência do direito invocado».                                                 
J-VIOLAÇÃO DO DEVER DE OCUPAÇÃO EFETIVA.

O mesmo teremos que dizer quanto a esta efetiva violação continuada e reiterada, desde 26/10/2012 (sendo que, desde 1/4/2013, se reconduziu a uma absoluta inatividade funcional e imobilidade profissional, quando até ali se reduziu a tarefas administrativas de secretariado de abertura do correio externo, já de si desadequadas e humilhantes em si para o trabalhador, com a categoria profissional de Diretor).

Os artigos 115.º, 118.º, 126.º, 127.º, números 1, alíneas a) e c) e 2 e 129.º, número 1, alínea b) do C.T./2009 impõem a obrigação à entidade empregadora de, no âmbito da relação laboral estabelecida e dentro dos limites estabelecidos por lei, atribuir funções efetivas e suficientes aos seus trabalhadores, estando-lhe vedado não o fazer de uma forma injustificada.

Ora, se olharmos para a factualidade dada como indiciariamente provada e para os documentos que a complementam não vislumbramos qualquer fundamento ou justificação legítimas para a Requerida BB não ocupar de facto e com atribuições compatíveis com a sua nova posição (ainda que com a categoria profissional de Diretor, passou a ocupar, formalmente, o lugar de Assessor do Conselho de Administração da sua entidade empregadora).

Se a Requerida não tem um concreto posto de trabalho onde o Requerente possa ser colocado dentro da estrutura organizativa da instituição financeira que é, reconduzindo-se a sua existência dentro do seio da BB a uma situação de quadro diretivo excedentário, tem como instrumento legal suscetível de resolver a contento de ambas as partes este cenário de inércia interna de mais de 3 anos, que é o despedimento por extinção do posto de trabalho ou o acordo de revogação do contrato de trabalho. Deixar o trabalhador sem quaisquer funções durante tão longo período de tempo não é compreensível nem aceitável, independentemente da perspetiva que se queira adotar nesta matéria: jurídica, profissional, pessoal, familiar, ética, social ou, simplesmente, humana. 
       
Logo, também tal violação permanente, teimosa e injustificada do dever de ocupação efetiva do Requerente traduz-se no preenchimento do primeiro requisito da providência cautelar comum, como antes o deixámos sintetizado[[6]].               

K–SUBSÍDIO DE EXCLUSIVIDADE.

Chegados aqui e recordando o que já se deixou dito quanto aos termos do contrato de trabalho celebrado entre o Requerente e o CC, afigura-se-nos que tal subsídio de exclusividade – que não está previsto, enquanto prestação laboral autónoma na regulamentação coletiva aplicável – constitui uma das condições de trabalho que estiveram na génese da celebração do referido negócio jurídico, ou seja, uma das realidades de cariz pecuniário que foram elemento negociado e constitutivo do vínculo de trabalho em questão e que, sendo liquidado 14 vezes ao ano, não encontra fundamento legítimo (designadamente, por não ser temporário e atribuído em função dos serviços concretos executados, à imagem, por exemplo, do que acontece com a IHT) que consinta à BB retirá-lo unilateralmente.

Numa outra perspetiva e não olhando sequer a tal cariz constitutivo e consensual, inexistem factos ou documentos que nos permita qualificar esse subsídio de exclusividade de forma distinta da retribuição, dado a Requerida não ter logrado dissociá-lo da natureza retributiva presumida que ressalta dos artigos 82.º, número 3, da LCT, 249.º, número 3 do C.T./2003 e 258.º, número 3, do C.T./2009, recaindo sobre ela tal ónus de alegação e prova.
Se pensarmos, aliás, um pouco, que vera situação de exclusividade compensaria tal subsídio de exclusividade? O Requerente, sendo trabalhador bancário, se não fosse tal subsídio, poderia trabalhar em diversas instituições concorrentes do CC ou em atividades financeiras paralelas ou na mesma área dessa instituição bancária, por conta própria, como profissional liberal? Seria tal cenário concebível, na prática, ou sequer admissível juridicamente face ao dever de confidencialidade que consta da cláusula 11.ª do «contrato de trabalho» de fls. 41 e 42?

Nesta matéria, estamos de acordo com a análise feita pela sentença recorrida, encontrando-nos, efetivamente, perante uma prestação de índole retributiva, dado a Requerida, no mínimo, não ter logrado ilidir a referida presunção juris tantum.

Mas, à imagem do que já dissemos para a IHT, também aqui se verifica (perdoe-se-nos a expressão popular) uma cena de «pescadinha de rabo na boca» que é como quem diz, esvazia-se o quadro funcional do trabalhador de qualquer conteúdo e depois retira-se o subsídio de exclusividade, por já não haver, na situação concreta ilegítima criada pela própria entidade empregadora, razão para tal exclusividade ou subsídio, numa atitude que é de má-fé, senão mesmo de abuso de direito (artigo 334.º do C.T./2009).

Nessa medida, está também preenchido, quanto a esta prestação, o requisito da providência cautelar comum que temos vindo aqui a apreciar.                                                      
         
L–SEGUNDO REQUISITO.

Olhando agora para o segundo requisito – Verificação de situação de perigo de ocorrência de lesão grave e dificilmente reparável se acaso a providência não for decretada –, convirá, antes de mais, ouvir ANTÓNIO DOS SANTOS ABRANTES GERALDES, obra citada, páginas 100 e seguintes, quando sustenta o seguinte, acerca do segundo requisito comum às providências cautelares inominadas:

“22. Lesão grave e dificilmente reparável:

22.1. O fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável constitui, nas medidas cautelares atípicas, a manifestação do requisito comum a todas as providências: o " periculum in mora".
Tal como ocorre com a generalidade das providências, o receio tanto pode manifestar-se antes da propositura da acção como na sua pendência. Em qualquer das situações, o autor pode solicitar a adopção da medida que julgue mais adequada para acautelar o efeito útil que através do processo principal pretende ver reconhecido ou satisfeito.
Mas não é toda e qualquer consequência que previsivelmente ocorra antes de uma decisão definitiva que justifica o decretamento de uma medida provisória com reflexos imediatos na esfera jurídica da contraparte. Só lesões graves e dificilmente reparáveis, têm essa virtualidade de permitir no tribunal, mediante solicitação do interessado, a tomada de uma decisão que o defenda do perigo.
Compreende-se o cuidado posto pelo legislador no restringir a concessão da tutela provisória. É esse mesmo cuidado que deve guiar o juiz quando se debruça sobre a situação sujeita a apreciação jurisdicional. De facto, tratando-se de uma tutela cautelar decretada, por vezes, sem audiência contraditória, não é qualquer lesão que justifica a intromissão na esfera jurídica do requerido com a intimação para se abster de determinada conduta ou com a necessidade de adoptar determinado comportamento ou de sofrer um prejuízo imediato relativamente ao qual não existem garantias de efectiva compensação em casos de injustificado recurso à providência cautelar (art.º 390.º, n.° 1).

22.2. O interesse em agir, que constitui na generalidade das acções judiciais um pressuposto processual autónomo, atinge aqui uma especial relevância, de modo a evitar abusos na utilização desta forma de composição provisória dos conflitos. Daí que se imponha ao juiz a necessidade de colocar na balança dos interesses, a par dos prejuízos que o requerente pretende evitar, aqueles que a decisão possa provocar na esfera jurídica do requerido, seguindo o padrão referido no art.º 387.º, n.º 2, e, assim, indeferindo a providência quando o prejuízo dela resultante exceda consideravelmente o dano que com ela se pretende evitar.
Independentemente da ponderação destes factores, o juiz deve convencer-se da seriedade da situação invocada pelo requerente e da carência de uma forma de tutela que permita pô-lo a salvo dos danos futuros. A gravidade da lesão previsível deve ser aferida tendo em conta a repercussão que determinará na esfera jurídica do interessado. (…)

22.3. A protecção cautelar não abarca apenas os prejuízos imateriais ou morais, por natureza irreparáveis ou de difícil reparação, mas ainda os efeitos que possam repercutir-se na esfera patrimonial do titular. (…)
Importa ainda ponderar em que medida a reintegração do direito por via da reconstituição natural ou da indemnização se mostra eficaz, oportuna e realista, prevenindo pela via cautelar situações de perigo de lesão em que tal reparação não seja previsível ou se revele difícil ou morosa, deste modo dando relevo à susceptibilidade de tutela adequada.

22.4. O facto de o legislador ter ligado as duas expressões com a conjunção copulativa "e", em vez da disjuntiva "ou", determina que não é apenas a gravidade das lesões previsíveis que justifica a tutela provisória, do mesmo modo que não basta a irreparabilidade absoluta ou difícil. Apenas merecem a tutela provisória consentida através do procedimento cautelar comum as lesões graves que sejam simultaneamente irreparáveis ou de difícil recuperação.
Ficam afastadas do círculo de interesses acautelados pelo procedimento comum, ainda que se mostrem irreparáveis ou de difícil reparação, as lesões sem gravidade ou de gravidade reduzida, do mesmo modo que são excluídas as lesões que, apesar de graves, sejam facilmente reparáveis.
A utilização de tal conceptualização liga-se à própria natureza das providências cautelares comuns e à plasticidade que as caracteriza, a qual lhes atribui a capacidade de servirem uma diversidade de direitos e de relações jurídicas e lhes proporciona uma mais fácil adaptação às situações da vida real difíceis de catalogar de modo mais preciso. Tornando-se mais difícil a densificação desses conceitos, há-de reconhecer-se igualmente que o uso de semelhante técnica legislativa confere à norma uma maior capacidade de adaptação à vida real que antecipada e abstractamente se pretendeu regular.
É o juiz que, confrontado com a realidade projectada pelas partes nos procedimentos cautelares, está em melhores condições de ponderar a conexão entre a previsão normativa e essa realidade, sendo-lhe atribuída a tarefa de seleccionar, dentro da diversidade da vida real, as situações carecidas de tutela rápida e eficaz que se insiram nas mencionadas abstracções normativas. A evolução social, o surgimento de novos valores (v.g. relacionados com o bem estar social ou com a qualidade de vida), a par do esbatimento de outros, exigem dos tribunais uma constante atenção e adaptação, de forma a evitar insustentáveis situações de divórcio entre o raciocínio jurídico-formal e os sentimentos predominantes na sociedade. Só a utilização de conceitos indeterminados como aqueles permite manter razoavelmente actualizadas as normas jurídicas, sem prejuízo de, em certas situações, o legislador nelas introduzir determinadas clarificações e especificações.
Por conseguinte, na avaliação da gravidade da lesão deve o juiz verter para a decisão os valores que considere mais adequados em determinados momentos, tendo sempre em conta, no entanto, que a apreciação dos requisitos se deve pautar por um critério tão objectivo quanto possível. (…)

24. Fundado receio:

24.1. O receio de ocorrência de lesão grave e dificilmente reparável deve ser fundado, ou seja, apoiado em factos que permitam afirmar, com objectividade e distanciamento, a seriedade e a actualidade da ameaça e a necessidade de serem adoptadas medidas tendentes a evitar o prejuízo. (…)
"Fundado receio" tem a mesma significação que a expressão utilizada no art.º 406.º, n.º 1, do CPC, ou no art.º 619.º do Código Civil, que, a propósito do arresto, exigem, respectivamente, o “justificado receio" ou o "justo receio" de perda da garantia patrimonial, pressupondo ambas as normas a iminência da verificação ou repetição de uma lesão no direito.

24.2. A qualificação do receio de lesão grave como “fundado" visa restringir as medidas cautelares, evitando que a concessão indiscriminada de protecção provisória, eventualmente com efeitos antecipatórios, possa servir para alcançar efeitos inacessíveis ou dificilmente atingíveis num processo judicial pautado pelas garantias do contraditório e da maior ponderação e segurança que devem acompanhar as acções definitivas.
Dai que se sustente correntemente que o juízo de verosimilhança deve aplicar-se fundamentalmente quando o juiz tem de se pronunciar sobre a probabilidade da existência do direito invocado, devendo usar um critério mais rigoroso na apreciação dos factos integradores do "periculum in mora".
Parece ser esta a melhor interpretação da expressão “fundado receio", se a confrontarmos com a letra do art.º 387.º, n.º 1, localizada no momento da decisão, onde se determina que a procedência pressupõe que se "mostre suficientemente fundado" o receio de lesão, diversamente do que ocorre quanto ao direito tutelável, para cuja afirmação bastam juízos de “séria probabilidade"
No entanto, o critério de aferição não deve ser reconduzido a certeza inequívoca quanto à existência da situação de perigo dificilmente comprovada em processos com as características e objectivos dos procedimentos cautelares, bastando, por isso, que se mostre razoavelmente fundado esse pressuposto.
As circunstâncias em que o juiz deve ter por justificado o receio de lesões futuras devem ser apreciadas objectivamente, tendo em conta o interesse do requerente que promove a medida e o do requerido que com ela é afectado, as condições económicas de um e outro, a conduta anterior e a sua projecção nos comportamentos posteriores.”
Este mesmo autor, na sua obra «Suspensão de despedimento e outros procedimentos cautelares no processo do trabalho – novo regime – Decreto-Lei n.º 295/2009, de 13 de Outubro», Almedina, Fevereiro de 2010, páginas 112 a 114, refere como áreas possíveis de beneficiar, no quadro do direito laboral, de providências cautelares não especificadas, o seguinte:
«Ponderando casuisticamente a natureza do direito e a gravidade da previsível violação, de entre as áreas do direito laboral onde se pode suscitar a intervenção de providências cautelares não especificadas podemos enunciar, ainda que sem carácter taxativo, as seguintes:[[7]]
- Direitos de personalidade do trabalhador constitucionalmente previstos (v.g., artigos 14.º do Código do Trabalho); [[8]]
- (…)
- Falta de pagamento de retribuições que coloque o trabalhador em graves dificuldades da sua subsistência e respetivo agregado familiar; [[9]]
- Exercício do direito de ocupação efetiva por parte do trabalhador; [[10]]
- Desrespeito das regras sobre qualificação profissional do trabalhador, com resultados vexatórios, ou esvaziamento das tarefas adstritas ao trabalhador ainda que com imposição de permanência no local do trabalho [[11]]
- (…)».
No que concerne ao subsídio de exclusividade, à sua natureza retributiva, ao seu valor mensal de € 1.130,56 e à circunstância de o mesmo ter sido retirado ao Requerente, num efeito cumulativo com a IHT (o que aconteceu em 15/2/2013 e com referência a um montante mensal de valor mensal de € 1.237,70) e ainda com o subsídio de representação no valor mensal de € 234,44 e o subsídio a título de despesas de representação no valor mensal de € 364,33, basta recordar o que deixámos sustentado numa situação similar à dos autos no Acórdão datado de 29/02/2012 e proferido no processo n.º apelação n.º 3013/11.3TTLSB.L1, que se acha publicado em www.dgsi.pt:
«Importa talvez lembrar a esse respeito que, segundo a nossa melhor doutrina e jurisprudência, a remuneração do trabalhador, por constituir, na esmagadora maioria das vezes, a sua única fonte de rendimento - como é o caso do Requerente - possui uma natureza social e jurídica muito particular porque, como afirma António Monteiro Fernandes em “Direito do Trabalho”, 13.ª Edição, Almedina, Janeiro de 2006, paginas 436 e seguintes, ainda que a propósito do regime constante do Código do Trabalho de 2003, “desde logo, o salário não é a mesma coisa para o trabalhador e para a entidade patronal: aquele tende a encará-lo como meio de subsistência e a estabelecer uma correlação entre a penosidade do trabalho e o grau de satisfação (ou insatisfação) das suas necessidades pessoais e familiares…Ou seja: entre os padrões de avaliação do trabalhador (necessidades próprias) e da entidade patronal (produtividade) não há coincidência, nem mesmo tendencial. Para um, o salário é algo como um crédito alimentar; para o outro, é o preço de um fator produtivo. A negociação coletiva sobre a matéria salarial encontra aqui uma parte das razões da sua dificuldade, por vezes insuperável em termos pacíficos: o critério de uma das partes é basicamente social - o da outra é sobretudo económico. (…)
A destinação do salário à satisfação das necessidades pessoais e familiares do trabalhador constitui uma outra perspetiva a que o legislador atribui particular saliência. Pode dizer-se que é essa a conceção subjacente a todo o regime jurídico da retribuição no Código do Trabalho. Desde logo, o critério legal para a determinação qualitativa da retribuição é largamente tributário dela: ele assenta na ideia de regularidade do seu recebimento pelo trabalhador, ou seja, parte da existência de expectativas deste quanto ao grau de satisfação de necessidades correntes que os rendimentos do trabalho lhe asseguram.
Na perspetiva de se correlacionar o salário com as necessidades do trabalhador situa-se o regime da remuneração mínima garantida, cuja primeira versão constou do DL 217/74, de 27/5, e que hoje integra o art.º 266.º Código do Trabalho.
Esse regime tem raiz constitucional: o art.º 59.º/2 a) CRP vincula o Estado a estabelecer e atualizar o salário mínimo nacional, atendo em conta, entre outros fatores, as necessidades dos trabalhadores, o aumento do custo de vida...». A verdade porém é que, não obstante a aparência criada (nomeadamente por diversas passagens dos preâmbulos dos diplomas que sobre o assunto foram surgindo, ao longo dos anos), não pode dizer-se que existe um autêntico salário mínimo nacional. O sentido normativo desta noção (como, de resto, ressalta do teor do preceito constitucional) engloba uma conotação de suficiência que, para ser correspondida, implicaria a correlação com um mínimo de subsistência familiar previamente determinado. Haveria, em suma, que fixar um quantitativo mínimo bastante para cobrir as necessidades tidas por essenciais dum agregado familiar com certa dimensão, face ao nível atingido pelo custo de vida. Não é, seguramente, esse o conteúdo da garantia existente: a lei fixa um quantitativo que (suficiente ou não) se tem por irredutível, obstando a que níveis remuneratórios inferiores sejam consignados na negociação coletiva ou nos contratos individuais.
E, ainda assim, o anterior regime, constante do DL 69-A/87, previa desvios para menos, relativamente a certas atividades (serviço doméstico, trabalho artesanal) ou em função de determinadas características dos trabalhadores (menores, praticantes, aprendizes, estagiários, ou com capacidade de trabalho reduzida) - que, no entanto, com o CT, deixam de ser aplicáveis.
Sublinhe-se, por outro lado, que, quanto aos critérios a adotar na definição da remuneração mínima garantida, o CT se aproxima, mais do que a lei anterior, dos desígnios constitucionais relativos ao salário mínimo: devem ser objeto de ponderação "as necessidades dos trabalhadores, o aumento do custo de vida e a evolução da produtividade" (art.º 266.°/2).
Todavia, as expressões mais significativas do nexo estabelecido entre a retribuição e as necessidades do trabalhador consistem num conjunto de normas legais que oferece uma especial tutela da integridade dos valores que compõem o salário. Essa tutela aponta mesmo para a limitação dos efeitos normais que a atividade jurídica do trabalhador teria sobre tal parte (essencial) do seu património.
Assim, vigora a regra da inadmissibilidade da compensação integral da retribuição em dívida com créditos da entidade patronal sobre o trabalhador (art.º 270.º): a compensação, quando admitida (n.º 2 do mesmo art.º), não pode exceder, em regra, um sexto do salário.
Por outro lado, os créditos salariais são parcialmente impenhoráveis (em dois terços do seu montante: art.º 823.°/1 CPC) e também parcialmente insuscetíveis de cessão (art.º 271.°), aliás em medida idêntica.
Além disso, a retribuição do trabalho beneficia de importantes privilégios creditórios (art.º 377.° CT), não apenas sobre os bens móveis do empregador mas também sobre os imóveis em que preste o seu trabalho. Os créditos dos trabalhadores são colocados em primeiro lugar tanto num caso como no outro. Deste modo, a situação dos créditos remuneratórios e indemnizatórios, anteriormente bastante débil, resultou consideravelmente reforçada.
De qualquer modo, é patente que as disposições referidas assentam numa conceção não puramente «retributivas do salário - antes sublinhando a inerência deste último à satisfação das necessidades pessoais e familiares do trabalhador”. (não será despiciendo referir também, a este propósito, como aliás faz o autor citado, o Fundo de Garantia Salarial, instituído pelo Decreto-Lei n.º 212/99, de 15/06 e depois revogado pelo Código do Trabalho de 2003 - artigos 380.º e 316.º a 326.º da Lei n.º 35/2004, de 29/07 -, achando-se hoje previsto no artigo 336.º do Código do Trabalho de 2009 e nessas disposições da Regulamentação do anterior Código, bem como ainda o regime constante dos artigos 25.º a 31.º da Lei n.º 105/2009, de 14/09, como, por exemplo, a suspensão da execução fiscal ou da sentença de despejo).        
Logo, pelos motivos jurídicos e sociais expostos, não se pode equiparar a remuneração do trabalhador, que se traduz na contrapartida do trabalho prestado ao empregador, a um qualquer crédito proveniente de um contrato civil ou comercial - sendo, nessa medida e em nossa opinião, mais legítimo aproximá-lo antes da prestação alimentar a menores ou maiores -, o que quer dizer que na aferição de qualquer lesão à mesma, importa, por um lado, ser bastante rigoroso na sua avaliação e tolerância, mesmo que em termos meramente cautelares, pois estão em causa direitos constitucionais básicos, de índole patrimonial, social, familiar, pessoal e moral, que, no seu conjunto, se reconduzem, em última análise, à dignidade da pessoa humana, nas diversas vertentes consideradas na Constituição da República Portuguesa, não se podendo ter, por outro lado e consequentemente, uma perspetiva miserabilista ou muito restrita do fundamento e âmbito de aplicação das providências cautelares, em casos como o dos autos, em que estão em causa, ainda que parcialmente, as necessidades básicas de subsistência do Requerente (alimentação, vestuário, calçado, habitação, saúde, etc.).»
      
No que concerne à igualmente pretendida Isenção de Horário do Trabalho e tendo em atenção o que a nossa melhor doutrina sustenta quanto ao requisito do «periculum in mora», afigura-se-nos assistir razão na fundamentação sustentada pela sentença impugnada para afastar a sua verificação no caso concreto e quanto à retirada dessa prestação ao Autor, pois o mesmo só veio reagir a tal atuação da Requerida mais de 3 anos após tal propósito da BB lhe ter sido comunicado e cerca de 30 meses depois de tal IHT ter deixado de ser efetivamente paga ao mesmo.

A urgência e os perigos daí advenientes para o sustento do trabalhador e do seu agregado familiar parecem só terem emergido agora, com a privação adicional na remuneração global do trabalhador dos outros três subsídios acima identificados e cujo direito à continuação do seu recebimento foi reconhecido – e bem - pelo tribunal da 1.ª instância no âmbito do presente procedimento cautelar. 
                           
O Tribunal do Trabalho do Barreiro quanto à violação do dever de ocupação efetiva por parte da Apelada e como justificação para o indeferimento da pretensão do aqui Apelante, afirmou, muito sumariamente, o seguinte:
«No caso sub judice, apurou-se a violação do dever de ocupação efetiva.
Porém, não há periculum in mora: a situação arrasta-se há muito tempo, nunca antes o tendo o requerente sentido necessidade de proteção, não havendo qualquer indício de que a situação atual se tenha agravado; uma decisão no sentido requerido seria inócua, quer porque seria uma mera repetição de disposição legal, quer porque seria possível executá-la coercivamente.»
Temos de confessar, salvaguardando o respeito devido a tal argumentação, que não compreendemos o sentido e o alcance da última parte da dita fundamentação, quer no que toca à aí invocada inocuidade de uma decisão favorável, por ser mera repetição de disposição legal, quer porque seria (impossível? [[12]]) executá-la coercivamente.   
No que respeita à primeira parte da justificação avançada pelo tribunal recorrido, embora compreendamos o raciocínio efetuado, temos sérias dúvidas de que se possa aplicar o mesmo, de forma mecânica e similar ao efetuado para a IHT, a esta situação prolongada de não prestação injustificada do trabalho para que o Requerente foi contratado.
A violação do dever de ocupação efetiva tem natureza continuada, progressiva, cuja gravidade não se atenua com o passar do tempo mas antes pelo contrário se acentua e qualifica, explicando-se tal afirmação pela índole jurídica multifacetada que o direito do trabalhador à sua ocupação efetiva no seio da estrutura organizada do empregador possui, dado enxertar-se não apenas na contrapartida contratual do salário que é devida ao empregador, mas também noutras realidades que se prendem com o ambiente e as condições gerais do trabalho, o relacionamento com os colegas, dirigentes e clientes, os direitos de realização e progressão profissional do trabalhador assim como com os seus direitos de personalidade (na vertente última da dignidade humana, ou seja, no respeito pela sua integridade moral e física) e com os normais reflexos que transporta para o exterior (agregado familiar, vida social, etc.).
Não se pode encarar de ânimo leve como uma aceitação tácita da situação de inatividade laboral injustificada criada pela entidade empregadora a circunstância de o trabalhador visado já se encontrar há bastante tempo em tal imobilidade funcional, as mais das vezes, humilhante [[13]], pois, por um lado, não é obrigado a revogar, a denunciar ou a resolver com ou sem invocação de justa causa o correspondente vínculo laboral e, por outro lado, a sua presença no posto de trabalho e a permanente disponibilidade da sua força produtiva (ainda que não utilizada, de forma injustificada) é legitimada pelo contrato de trabalho firmado com o empregador (no nosso caso, celebrado com o CC e transmitido à aqui Requerida).
Estando a relação laboral viva (ainda que de fraca saúde, perdoe-se-nos a expressão), movemo-nos num quadro muito especial, de direitos e deveres (principais e acessórios) constantes e recíprocos, assim como de garantias e proibições, de conteúdo e índole jurídica complexa e evolutiva (e muitas vezes de natureza indisponível e irrenunciável) que tem de ser sempre ponderado e, nessa medida, condicionar qualquer apreciação e julgamento que se faça nesta matéria.
Ora, no caso dos autos, não apenas o Requerente tentou por diversas vezes chegar à fala com os Presidentes do C.A. da Requerida (sem que tivesse logrado uma resposta conclusiva da parte dos mesmos, apesar de o mesmo ser Assessor de tal Conselho de Administração) como se verifica uma deterioração prolongada no seu equilíbrio pessoal, social e familiar, que tem de ser também aqui equacionada.                                      
Ora, tendo como pano de fundo a doutrina e jurisprudência referidas pelo agora Juiz Conselheiro António Abrantes dos Santos Geraldes e olhando para o caso em análise, afigura-se-nos manifesto que nos deparamos também aqui com uma situação de perigo de ocorrência de lesão grave e dificilmente reparável se acaso a providência não for decretada.
Tudo isto para se concluir pela verificação desse segundo requisito no que toca também à violação do dever de ocupação efetiva do Requerente e, consequentemente, pela procedência parcial do recurso de Apelação do trabalhador, com a alteração da sentença impugnada.

IV–DECISÃO
                  
Por todo o exposto, nos termos dos artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e 656.º e 662.º do Novo Código de Processo Civil, decide-se neste Tribunal da Relação de Lisboa o seguinte:
a) Em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto por BB, no que respeita à impugnação da Decisão da Matéria de Facto, alterando-se, nessa sequência, o teor do Ponto B;
b) Em julgar parcialmente procedente o presente recurso de apelação interposto por AA, no que respeita à impugnação da Decisão da Matéria de Facto, alterando-se, nessa sequência, o teor do Ponto E;
c) Em julgar improcedente o recurso de apelação interposto por BB, no que respeita à sua vertente jurídica, confirmando-se, nessa medida, a decisão impugnada;
d) Em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto por AA, alterando-se, nessa medida, a decisão impugnada e condenando-se a Requerida a atribuir funções efetivas e concretas ao Requerente, correspondentes à sua categoria profissional de Diretor.        
*

Custas da ação e do recurso de Apelação do Requerente na proporção do decaimento e do recurso da Requerida a cargo da mesma – artigos 539.º e 527.º do Novo Código de Processo Civil.
Registe e notifique.



Lisboa, 15/09/2016


José Eduardo Sapateiro


[1]«I. DA NULIDADE DA SENTENÇA
Nos termos do disposto no artigo 77.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, a arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso.
Assim, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 77.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, o Requerente vem arguir, expressa e separadamente, no requerimento de interposição de recurso, a nulidade da sentença, porque os seus fundamentos estão em oposição com a parte decisão, nos termos previstos no artigo 615.º, n.º 1, alínea c), primeira parte, do Código de Processo Civil, nos termos e com os fundamentos seguintes:
A)ALEGAÇÕES
O Requerente pediu que fosse declarado que a retribuição de isenção de horário de trabalho, no valor mensal de € 1.237,70, integra a sua retribuição.
A sentença absolveu a Requerida de tal pedido.
Porém, em CC. a sentença considerou provado que a retribuição do Requerente incluiu, desde a data da sua admissão, a retribuição de isenção de horário de trabalho.
Assim, é por demais evidente que o facto provado em CC. está em oposição com a sentença na parte em que absolveu a Requerida do pedido de reconhecimento de que a retribuição de isenção de horário de trabalho, no valor mensal de € 1.237,70, integra a retribuição do Requerente.
Nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea c), primeira parte, do Código de Processo Civil, é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão.
Pelo exposto, a sentença, na parte em que absolveu a Requerida do pedido de reconhecimento de que a retribuição de isenção de horário de trabalho, no valor mensal de € 1.237,70, integra a retribuição do Requerente, é nula por estar em oposição com o facto provado em CC., nos termos previstos no artigo 615.º, n.º 1, alínea c), primeira parte, do Código de Processo Civil.
B)CONCLUSÕES
1. Em CC., a sentença considerou provado que a retribuição do Requerente incluiu, desde a data da sua admissão, a retribuição de isenção de horário de trabalho;
2. A sentença absolveu a Requerida do pedido de reconhecimento de que a retribuição de isenção de horário de trabalho, no valor mensal de € 1.237,70, integra a retribuição do Requerente;
3. A sentença, na parte em que absolveu a Requerida do pedido de reconhecimento de que a retribuição de isenção de horário de trabalho, no valor mensal de € 1.237,70, integra a retribuição do Requerente, é nula por estar em oposição com o facto provado em CC., nos termos previstos no artigo 615.º, n.º 1, alínea c), primeira parte, do Código de Processo Civil.»
[2]Em “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 6.ª Edição, Almedina, páginas 53 e 54.
[3]No seu “Manual de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1984, págs. 668 a 671.
[4]Muito embora a IHT possua a natureza jurídica de retribuição, seguro é que a sentença impugnada não contrariou ou contraditou tal constatação jurídica, limitando-se a dizer que tal prestação não é vitalícia ou eterna, podendo ser retirada ao trabalhador sem a sua concordância e que tal retirada ocorreu há bastante tempo, o que coloca em crise a existência do requisito periculum in mora.    
[5]Cláusula 54.ª
Isenção de horário de trabalho
1-Por acordo escrito, podem ser isentos de horário de trabalho os trabalhadores com funções específicas ou de enquadramento e todos aqueles cujas funções o justifiquem.
2-Os trabalhadores isentos de horário de trabalho têm direito a uma retribuição adicional, que não será inferior à remuneração correspondente a uma hora de trabalho suplementar por dia, no caso de, em média, não excederem de uma hora o seu período normal de trabalho diário; de outra forma, a remuneração adicional não será inferior à correspondente a duas horas de trabalho suplementar por dia.
3-A isenção de horário de trabalho não prejudica o direito aos dias de descanso semanal e aos feriados previstos neste acordo.
4-O regime de isenção de horário de trabalho cessará nos termos acordados ou, se o acordo for omisso, mediante denúncia de qualquer das partes feita com a antecedência mínima de um mês.
5-Se a denúncia for da iniciativa da instituição, é devido o pagamento da retribuição adicional até três meses depois de a mesma ter sido comunicada ao trabalhador.
[6]No mesmo sentido do texto, a sentença recorrida afirma o seguinte: «No caso sub judice, apurou-se a violação do dever de ocupação efetiva.»
[7]«SOUSA PINHEIRO, em O Procedimento Cautelar Comum no Direito Processual do Trabalho, 2 ed., págs. 141 e segs., acompanha e amplia esta exemplificação, referindo a transferência ilegítima do trabalhador para outro local de trabalho, a violação do direito do trabalhador à ocupação efetiva, a aplicação de sanções disciplinares proibidas por lei ou abusivas, a mudança unilateral do horário de trabalho, a violação das normas sobre períodos de descanso, a violação das normas sobre gozo ou marcação de férias, o exercício ilegítimo do "jus variandi", a privação total ou parcial da retribuição, ofensas aos direitos de personalidade do trabalhador, a violação das normas sobre proteção da maternidade e a violação das regras sobre liberdade sindical. Cfr. ainda PAULO MORGADO DE CARVALHO, O procedimento cautelar comum no processo laboral, em Estudos Jurídicos em Homenagem ao Prof. Doutor António de Motta Veiga, págs. 242 e segs.» - NOTA DE RODAPÉ DO AUTOR TRANSCRITO
[8]«Como refere CAPELO DE SOUSA, na sua obra O Direito Geral de Personalidade, pág. 100, «no âmbito das relações jurídicas entre os sujeitos participantes na produção de bens e entre produtores e consumidores, vêm-se incorporando normas de tutela da personalidade humana, enquanto tal».
Determinados comportamentos lesivos dos direitos de natureza pessoal ou da dignidade humana sempre encontrarão no sistema jurídico globalmente apreciado a conveniente tutela. Se as circunstâncias do caso concreto permitirem a afirmação da gravidade da previsível lesão e da irreparabilidade ou da difícil reparação das respetivas consequências, não há que duvidar do recurso a medidas cautelares preventivas ou antecipatórias ajustadas à situação.
É verdade que nos novos arts. 186.°-D a 186.°-F do CPT se regula o novo processo especial de tutela da personalidade do trabalhador a que é atribuída natureza urgente. Em regra, tal característica levará a que na generalidade dos casos não haja necessidade de recorrer a procedimento cautelar. Mas não está afastada a possibilidade de requerer medidas cautelares se acaso a situação concreta exigir uma intervenção urgentíssima que não se compadeça com os prazos previstos para a tramitação da ação principal.» - NOTA DE RODAPÉ DO AUTOR TRANSCRITO
[9]«No mesmo sentido cfr. SOUSA PINHEIRO, O Procedimento Cautelar Comum no Direito Processual do Trabalho, 2ª ed., págs. 210 e segs.
Desta forma, a providência cautelar exercerá função semelhante à que é atribuída ao arbitramento de reparação provisória emergente da responsabilidade civil, com apoio direto no art.º 381.º, n.º 1, do CPC, onde se prevê, sem restrições atinentes à natureza do direito ou da relação jurídica de que deriva, a possibilidade de ser deferida a antecipação dos efeitos da sentença, verificadas que sejam determinadas circunstâncias.
Quando estiver em causa não o pagamento de retribuições correspondentes a prestação de trabalho, mas o pagamento de indemnização devida pela cessação do contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador, nos termos dos arts. 394.º, n.º 1, al. a), e 396.º do Cód. do Trabalho, a medida que se ajusta será o arbitramento de reparação provisória, desde que se verifiquem os requisitos do art.º 403.°, n.º 3, do CPC.
Note-se que, em Itália, é amplamente admitida a medida antecipatória em relação a créditos laborais, quando estes não sofram contestação ou nos casos em que, apesar de contestados, se formule um juízo de probabilidade quanto à sua existência. Em qualquer dos casos, dispensa-se a prova de uma situação de necessidade (cfr. MONICA ZUCCHI, "L'ordinanza di pagamento delle somme non con testate", na Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, 1991, págs. 1025 e segs., e FILIPPO COLLIA, "L'ordinanza per il pagamento di somme non contestate nel processo del lavoro", na Rivista do Diritto Processuale, 1994, págs. 538 e segs.).
No Ac. da Rel. de Lisboa, de 4-11-09 (www.dgsi.pt), considerou-se que a redução de vencimento só constitui prejuízo de difícil reparação se dele resultar a impossibilidade de satisfação das necessidades do agregado familiar do requerente. - NOTA DE RODAPÉ DO AUTOR TRANSCRITO
[10]«Cfr. o Ac. da Rel. de Lisboa de 02/06/2005, www.dgsi.pt» - NOTA DE RODAPÉ DO AUTOR TRANSCRITO
[11]«Cfr. o Ac. da Rel. de Lisboa de 27/01/1996, sumariado no BMJ 461.º/507» - NOTA DE RODAPÉ DO AUTOR TRANSCRITO
[12]Afigura-se-nos haver um lapso na afirmação transcrita e comentada, pois aí se terá querido referir a natureza infungível da prestação de facto reclamada pelo trabalhador e a inviabilidade da sua efetiva concretização por via coerciva/executória.   
[13]A ser assim, deixava de poder resolver a partir de certa altura – quando se entendesse que tinha deixado passar tempo demais ou pelo menos o que se considerasse indicador da tal presumida aceitação/conformismo -, com invocação de justa causa, o respetivo contrato de trabalho (tudo sem prejuízo, em casos muito excecionais, do funcionamento da válvula de segurança do instituto do abuso de direito – artigo 334.º do C. Civil).        

Decisão Texto Integral: