Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ALDA MARTINS | ||
Descritores: | ACIDENTE DE TRABALHO SUBSÍDIO DE ELEVADA INCAPACIDADE | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/10/2014 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | N | ||
Texto Parcial: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA A DECISÃO | ||
Sumário: | O regime da responsabilidade da seguradora e do empregador na proporção da retribuição declarada e não declarada, respectivamente, para efeito do prémio de seguro, tanto se aplica às indemnizações por incapacidade temporária e pensões devidas como, entre outros, ao subsídio por situação de elevada incapacidade e às despesas de transportes. (Elaborado pela Relatora) | ||
Decisão Texto Parcial: | Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: 1. Relatório 1.1. AA, (...) Lisboa, intentou a presente acção com processo especial emergente de acidente de trabalho contra BB - Companhia de Seguros, S.A., com sede (...), e CC – Centro de Recuperação e Repouso, Lda., (...), formulando os seguintes pedidos (fls. 154 e ss.): - a condenação da 1.ª ré a pagar-lhe, com início em 13.05.2010, uma pensão anual e vitalícia de € 4.288,10 (quatro mil, duzentos e oitenta e oito euros e dez cêntimos), nos termos do art. 17.º n.º 1, alínea b) e n.º 4 da Lei n.º 100/97 de 13.09.; - a condenação da 1.ª ré a pagar-lhe a quantia de € 882,53 (oitocentos e oitenta e dois euros e cinquenta e três cêntimos), a título de indemnização por incapacidades temporárias, incluindo o período de recaída, nos termos do art. 17.º, n.º 1, alíneas e) e f) e n.º 4 da Lei n.º 100/97 de 13.09.; - a condenação da 1.ª ré a pagar-lhe um subsídio por situações de elevada incapacidade permanente, no montante de € 5.400,00 (cinco mil e quatrocentos euros), nos termos do art. 23.º da Lei n.º 100/97 de 13.09.; - a condenação da 1.ª ré a pagar-lhe € 22,60 (vinte e dois euros e sessenta cêntimos) a título de despesas de transporte; - a condenação da 2.ª ré a pagar-lhe, com início em 13.05.2010, uma pensão anual e vitalícia de € 413,77 (quatrocentos e treze euros e setenta e sete cêntimos), nos termos dos arts. 17.º, n.º 1, alínea b) e 37.º, n.ºs 1 e 3 da Lei n.º 100/97 de 13.09.; - a condenação da 2.ª ré a pagar-lhe a quantia de € 413,77 (quatrocentos e treze euros e setenta e sete cêntimos), a título de indemnização por incapacidades temporárias, incluindo o período de recaída, nos termos do art. 17.º, n.º 1, alíneas e) e f) e n.º 4 da Lei n.º 100/97 de 13.09.; Para tanto alegou, em síntese, que trabalhava sob as ordens, direcção e fiscalização da 2.ª ré, auferindo a quantia mensal de € 450,00, acrescida de € 112,00 de subsídio de trabalho nocturno e de € 3,13 de subsídio de alimentação, tendo sofrido no tempo e local de trabalho um acidente de trabalho que lhe determinou sequelas de onde resultaram incapacidades temporárias, permanente e para o trabalho habitual. Regularmente citadas, contestaram as rés, nos seguintes termos: - a BB - Companhia de Seguros, S.A., impugnando a avaliação de incapacidade, bem como os períodos de incapacidades temporárias, sendo que estas últimas se encontram pagas (fls. 186 e ss.); - A ré CC – Centro de Recuperação e Repouso, Lda., refutando a sua responsabilidade, porquanto se encontrava transferida para a 1.ª ré a responsabilidade emergente de acidente de trabalho pela totalidade da remuneração (fls. 195 e ss.). Notificada, respondeu a 1.ª ré à contestação da co-ré, dizendo que o seguro de acidentes de trabalho foi celebrado na modalidade de prémio variável, por folhas de férias, e que são apenas os valores nestas declarados que determinam a sua responsabilidade (fls. 221 e ss.). Foi proferido despacho saneador que julgou válidos os pressupostos da instância, fixou os factos assentes e elaborou a base instrutória (fls. 239 e ss.). Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, no termo da qual foi proferida a decisão relativa à matéria de facto, sem qualquer reclamação (fls. 308 e ss.). Seguidamente, a Mma. Juíza a quo proferiu sentença que terminou com o seguinte dispositivo (fls. 317 e ss.): «4.1. Pelo exposto, julgo a presente acção procedente e, em consequência: 4.1.1. Condeno a ré "Companhia de Seguros BB – Mundial, SA” a pagar à autora AA uma pensão anual e vitalícia de € 4.160,99 (quatro mil, cento e sessenta euros e noventa e nove cêntimos), devida a partir de 09.05.2010, pagável no domicilio da sinistrada, adiantada mensalmente, até ao 3º dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual, sendo que nos meses de Maio e Novembro deverão acrescer mais 1/14, a título, respectivamente, subsídio de férias e de Natal; 4.1.2. Condeno a ré "CC – Centro de Recuperação e Repouso, Lda.” a pagar à autora AA uma pensão anual e vitalícia de € 401,51 (quatrocentos e um euros e cinquenta e um cêntimos), devida a partir de 09.05.2010, pagável no domicilio da sinistrada, adiantada mensalmente, até ao 3º dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual, sendo que nos meses de Maio e Novembro deverão acrescer mais 1/14, a título, respectivamente, subsídio de férias e de Natal; 4.1.3. Condeno a ré "Companhia de Seguros CC, SA” a pagar à autora AA o montante de € 5.400,00 (cinco mil e quatrocentos euros), a título de subsidio por elevada incapacidade previsto no art.º 23º da Lei n.º 100/97, de 13.09; 4.1.4. Condeno as rés a pagar à sinistrada juros de mora calculados à taxa de legal fixada em 4%, desde o vencimento de cada uma das prestações referidas em 4.1.1. (1ª ré) e 4.1.2. (2ª ré) e desde 09 de Maio de 2010 quanto ao subsídio referido em 4.1.3. (1ª ré). 4.1.5. Condeno a ré "CC – Centro de Recuperação e Repouso, Lda.” a pagar à autora AA, a título de incapacidades temporárias, a quantia de € 367,49 (trezentos e sessenta e sete euros e quarenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora calculados à taxa legal desde data vencimento até integral pagamento. 4.1.6. Condeno a ré "Companhia de Seguros CC, SA” a pagar à autora AA a quantia de € 22,60 (vinte e dois euros e sessenta cêntimos) a título de despesas de transportes. Custas a cargo das ré “Companhia de Seguros CC, SA” e “CC – Centro de Recuperação e Repouso, Lda.” na proporção da respectiva proporcionalidade (art.º 446.º do Código do Processo Civil, aplicável ex vi art.º 1º nº 2 al. a) do Código de Processo do Trabalho). Valor da acção: € 73.547,75 (setenta e três mil, quinhentos e quarenta e sete euros e setenta e cinco cêntimos).» 1.2. A ré CC - Companhia de Seguros, S.A., inconformada, interpôs recurso desta decisão e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (fls. 345 e ss.): (…) 1.3. A autora e a 2.ª ré não apresentaram resposta ao recurso. 1.4. O recurso foi admitido por despacho de fls. 362, como apelação. 1.5. Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se no sentido de ser concedido provimento à apelação (fls. 369). Colhidos os vistos (fls. 376), cumpre decidir. 2. Objecto do recurso Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, a única questão que se coloca a este tribunal é a de saber se a ré empregadora deve comparticipar proporcionalmente no pagamento do subsídio de grande incapacidade e das despesas com transportes. 3. Fundamentação de facto Os factos materiais relevantes para a decisão da causa foram fixados pela sentença recorrida nos seguintes termos: (…) 4. Fundamentação de direito Como se disse, a única questão a apreciar é a de saber se a ré empregadora deve comparticipar proporcionalmente no pagamento do subsídio de grande incapacidade e das despesas com transportes. Diz a Recorrente, em síntese, que, estando a responsabilidade transferida para si apenas na proporção de 91,20% da retribuição auferida pela sinistrada, deve suportar apenas a quantia de € 4.924,79 €, relativa a subsídio de grande incapacidade (€ 5.400,00 X 91,20%) e a quantia de € 20,61 relativa a transportes (€ 22,60 X 91,20%), nos termos do art. 37.º, n.º 3 da Lei n.º 100/97 e do art. 12.º Apólice Uniforme. Com efeito, estabelecia o art. 37.º do regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, aprovado pela Lei n.º 100/97, de 13.09, aplicável ao caso dos autos, sob a epígrafe «Sistema e unidade de seguro»: 1 - As entidades empregadoras são obrigadas a transferir a responsabilidade pela reparação prevista na presente lei para entidades legalmente autorizadas a realizar este seguro. (…) 3 - Quando a retribuição declarada para efeito do prémio de seguro for inferior à real, a entidade seguradora só é responsável em relação àquela retribuição. A entidade empregadora responderá, neste caso, pela diferença e pelas despesas efectuadas com a hospitalização, assistência clínica e transporte, na respectiva proporção. (…) Por outro lado, dispunha o art. 38.º, intitulado «Apólice uniforme»: 1 - A apólice uniforme do seguro de acidentes de trabalho adequada às diferentes profissões e actividades, de harmonia com os princípios estabelecidos nesta lei e respectiva legislação regulamentar, é aprovada pelo Instituto de Seguros de Portugal, ouvidas as associações representativas das empresas de seguros. (…) 4 - São nulas as cláusulas adicionais que contrariem os direitos ou garantias estabelecidos na apólice uniforme prevista neste artigo. Em conformidade, a Norma n.º 12/99-R, de 8 de Novembro (D.R. II Série, de 30/11/1999), com as alterações introduzidas pelas Normas n.ºs 11/2000-R, de 13 de Novembro, 16/2000-R, de 21 de Dezembro, e 13/2005-R, de 18 de Novembro, veio aprovar a Apólice Uniforme do Seguro de Acidentes de Trabalho para Trabalhadores por Conta de Outrem, cujo art. 12.º estabelecia, sob a epígrafe «Insuficiência da retribuição segura»: No caso de a retribuição declarada ser inferior à efectivamente paga, ou não havendo declarações de qualidade de praticante, aprendiz ou estagiário, e respectivas retribuições de equiparação, o tomador de seguro responderá: i) pela parte excedente das indemnizações e pensões; ii) proporcionalmente pelas despesas de hospitalização, assistência clínica, transportes e estadas, despesas judiciais e de funeral, subsídios por morte, por situações de elevada incapacidade permanente e de readaptação, prestação suplementar por assistência de terceira pessoa e todas as demais despesas realizadas no interesse do sinistrado. Conclui-se, pois, que o regime da responsabilidade da seguradora e do empregador na proporção da retribuição declarada e não declarada, respectivamente, para efeito do prémio de seguro, tanto se aplica às indemnizações por incapacidade temporária e pensões devidas como, entre outros, às despesas de transportes e subsídio por situação de elevada incapacidade permanente, sendo exemplificativa a enumeração que é feita no art. 37.º, n.º 3 da Lei n.º 100/97. Nesse sentido, veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20.03.2014 (in www.dgsi.pt), cujo sumário refere: “I- A norma do nº 3 do artigo 37ºda Lei 100/97 de 13 de Setembro encerra uma enumeração meramente exemplificativa das prestações proporcionalmente a cargo da entidade empregadora e da entidade seguradora, quando a retribuição declarada para efeito de prémio for inferior à real. II- Por isso, serão da responsabilidade da seguradora e da entidade empregadora, em valores a fixar na respectiva proporção, os subsídios devidos por situações de elevada incapacidade permanente, por obras de readaptação da residência do sinistrado, prestação suplementar por assistência de terceira pessoa e as despesas por transportes.” E, de igual modo, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29.11.2006, mencionado pelo Recorrente nas suas alegações, também disponível em www.dgsi.pt. Deste modo, atendendo a que a responsabilidade se encontrava transferida para a seguradora na proporção de 91,20% da retribuição auferida pela sinistrada, deve aquela suportar a quantia de € 4.924,79 €, relativa a subsídio de grande incapacidade (€ 5.400,00 X 91,20%), e a quantia de € 20,61, relativa a transportes (€ 22,60 X 91,20%), suportando a empregadora a diferença nos valores de, respectivamente, € 475,21 e € 1,99. Nestes termos, entende-se que o recurso da Apelante procede inteiramente. 4. Decisão Pelo exposto, acorda-se em julgar a apelação procedente, e, em consequência: a) em condenar a BB - Companhia de Seguros, S.A. e a CC – Centro de Recuperação e Repouso, Lda. a pagar à sinistrada AA as quantias de € 4.924,79 e € 475,21, respectivamente, a título de subsídio de grande incapacidade; b) em condenar a BB - Companhia de Seguros, S.A. e a CC – Centro de Recuperação e Repouso, Lda. a pagar à sinistrada AA as quantias de € 20,61 e € 1,99, respectivamente, a título de despesas de transportes; c) em manter no mais a sentença recorrida. Custas pelas rés na proporção das respectivas responsabilidades. Lisboa, 10 de Abril de 2014 Alda Martins Paula Santos Seara Paixão | ||
Decisão Texto Integral: |