Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
| Processo: |
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| Relator: | MARIA DO CÉU SILVA | ||
| Descritores: | EXECUÇÃO EMBARGOS DE EXECUTADO SENTENÇA EXECUÇÃO COM PENHORA MAIS ANTIGA RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS CASO JULGADO | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 06/07/2023 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | PROCEDENTE | ||
| Sumário: | 1–A falta de oposição à execução sustada ou a não dedução de todos os fundamentos de defesa nessa execução não produz efeito preclusivo na reclamação de créditos apresentada na execução em que a penhora é mais antiga. 2–A força do caso julgado da decisão de mérito proferida nos embargos de executado é restrita aos fundamentos que ali foram invocados. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa Na reclamação de créditos que corre por apenso à ação executiva instaurada pelo Banco BPI, S.A. e que prossegue contra, entre outros, AA, esta, habilitada como sucessora de BB, interpôs recurso da sentença de verificação e graduação de créditos, pela qual foi reconhecido o crédito reclamado pelo Banco Santander Totta, S.A. e foi tal crédito graduado a seguir ao crédito exequendo. Na alegação de recurso, a recorrente formulou as seguintes conclusões: «I.–Vem o presente Recurso interposto da Sentença de Verificação e Graduação de Créditos proferida nestes autos, decisão na qual o Tribunal “a quo” se absteve de conhecer das excepções invocadas pelo Reclamado e executado BB - falecido cônjuge da ora Recorrente - em sede da impugnação pelo mesmo deduzida ao crédito reclamado pelo Banco Santander Totta, S.A., II.–Por considerar que tal crédito já se encontra verificado e reconhecido, atento o facto de ter o mesmo executado deduzido oposição à execução n.º 1065/09.5TBCLD, a correr termos no 1.ª Juízo do extinto Tribunal Judicial da comarca de Caldas da Rainha (e actual Juiz 1, do Juiz de Execução de Alcobaça, Tribunal Judicial da comarca de Leiria), execução na qual o Reclamante ocupava a posição de Exequente, e a qual foi julgada improcedente, III.–Em consequência, do que, e dando por reconhecido tal crédito, procedeu à sua graduação. IV.–Não se conforma a Recorrente, com tal decisão, a qual incorreu num erro de julgamento, Error in judicando”, como o apelida a Doutrina, que constitui fundamento para o presente recurso, por configurar uma violação da lei substantiva, termos do disposto nas alíneas a) e b), do n.º 2 do art.º 639.º do CPC. V.–Porquanto, efectuou tal decisão, uma errónea interpretação das normas que regulam quer o âmbito da impugnação, em sede de reclamação de créditos, quer os efeitos da decisão que conheça e aprecie da oposição à execução deduzida pelo executado. VI.–O qual conduziu à prolação de uma Decisão desacertada, por errado exercício subsuntivo ou integrativo, das normas constantes dos n.º 6 do artigo 732.º e 791.º do Código de Processo Civil (NCPC). VII.–A “questão decidenda” ou “thema decidendum” que constitui o objecto do presente recurso é, assim, apenas uma: Saber se a circunstância do falecido executado BB ter deduzido oposição à execução, nos autos com o n.º 1065/09.5TBCLD, a qual foi julgada improcedente por Sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância e confirmada por Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, Fez precludir o direito de invocar matéria de excepção noutra sede, nomeadamente, em sede de processo executivo, como é o caso, em que se trata de uma oposição/ impugnação a um crédito reclamado por um credor, que nos referidos autos que se identificaram supra ocupa a posição de Exequente. VIII.–Como resulta do supra exposto, não conheceu o Tribunal “a quo” do mérito da impugnação apresentada pelo Reclamado BB, falecido cônjuge da Recorrente, por considerar que o executado apenas poderá invocar nesta sede os meios de defesa atinentes à própria reclamação de créditos (ex., extemporaneidade da reclamação) ou que sejam posteriores ao termo do prazo da oposição na 1.ª execução), o que não é o caso”. IX.–Considerando, assim, que, ressalvada a matéria dos factos supervenientes, o termo do prazo para a dedução de oposição da execução faz precludir o direito do executado se defender por excepção, noutra sede que não seja o processo executivo. X.–Decisão que não se aceita. XI.–Ou seja, e ao contrário do que é o entendimento sufragado pelo Tribunal “a quo”, a não utilização dos meios de defesa na execução não preclude a posterior invocação de excepções ao direito exequendo em outras acções, sendo que o efeito preclusivo só se verifica no processo executivo e relativamente aos meios de defesa específicos dessa execução. XII.–Pelo que nada impediria que o Tribunal recorrido, em sede de reclamação de créditos, apreciasse e conhecesse dos fundamentos invocados pelo Reclamado e que o mesmo não invocou em sede de oposição à execução, a saber, a inexistência de título executivo, nos termos do disposto na alínea a), do artigo 729.º e n.º 2 do artigo 788.º do CPC e o pagamento parcial do crédito reclamado. XIII.–Não advindo de tal decisão, nenhum problema de violação de caso julgado, porquanto tais excepções não foram submetidas à apreciação do Tribunal que julgou a oposição à execução, que por isso, das mesmas não conheceu. XIV.–Por outro lado, terá ainda de levar-se em linha de conta, não merecendo, aliás, qualquer contestação, que a reclamação de créditos é um verdadeiro processo declarativo de estrutura autónoma, não se encontrando o executado sujeito a qualquer ónus de oposição à execução, nem tendo a oposição à execução a natureza de uma contestação. Veja-se que, o legislador, não determina a aplicação, em sede da oposição à execução, do disposto no artigo 573.º do CPC. XV.–No caso dos autos, a situação concreta submetida à livre apreciação do Tribunal é diversa da retratada no primeiro dos acórdãos citados, dado que não estamos perante uma situação de falta de oposição à execução, mas de uma situação em que tal oposição foi deduzida e foi julgada improcedente, XVI.–Tendo posteriormente o Executado e Reclamado BB, no âmbito dos presentes autos, onde o Exequente Banco Santander Totta, S.A. veio reclamar o seu crédito – por ter sido sustada a execução por ele intentada, relativamente a dois bens imóveis aí penhorados – impugnado o mesmo, impugnação que fez assentar em três fundamentos, sendo que apenas um deles serviu de fundamento à oposição à execução. XVII.–Assim, diversamente, do que decidiu o Tribunal a quo nada impede o Executado, em termos de preclusão, de renovar a discussão que visou travar na oposição à execução, sendo certo que, por força do trânsito em julgado da decisão aí proferida, o Tribunal só poderá conhecer dos fundamentos invocados em sede da impugnação apresentada pelo mesmo, e que não estão abrangidos pelo caso julgado material aí formado. XVIII.–Em face do exposto, deverá ser prolatado acórdão que julgue procedente o recurso interposto pela Recorrente AA, Herdeira Habilitada do falecido Reclamado BB, XIX.–E, em consequência, que revogue a Sentença recorrida e determine o prosseguimento dos autos, para apreciação e decisão quanto aos fundamentos invocados em sede da impugnação apresentada nestes autos, e que não estão abrangidos pelo caso julgado formado na Oposição à Execução deduzida nos Autos de Execução com o n.º 1065/09.5TBCLD.» A reclamante respondeu à alegação da recorrente. É a seguinte a questão a decidir: - do caso julgado. * Na sentença recorrida, foram dados como provados os seguintes factos: «1.–A Reclamante propôs execução hipotecária contra BB e outros, com o nº. de processo: 1065/09.5TBCLD a correr seus termos no 1º Juízo do Tribunal Judicial de Caldas da Rainha, para pagamento da quantia certa no valor de € 6.168.211,51. 2.–BB deduziu oposição à execução referida em 1., que foi julgada improcedente por decisão da 1ª instância e confirmada pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa. 3.–Nos autos indicados em 1, foram penhorados os imóveis: dois prédios em propriedade total sem andares nem divisões, descritos na Conservatória do Registo Predial de…, respectivamente sob os nºs. … e …, ambos da freguesia da…, cfr. AP. … de 2010.09.01. 4.–Nos autos principais foram os mesmos imóveis penhorados através da AP. 508 de 2010.06.02.» * Importa ainda ter presente que resulta dos autos o seguinte: 5.–Na impugnação da reclamação de créditos, BB invocou a inexistência de título constitutivo; o pagamento parcial; e que não só não tinha consciência da declaração negocial, como não a teria produzido se tivesse tido conhecimento prévio que a sua intervenção era feita também em nome pessoal, e não só em representação da empresa mutuária. 6.–Na oposição à execução referida no ponto 2, BB alegou, «em síntese, que desconhecia que, ao subscrever o contrato de mútuo apresentado à execução, se estava igualmente a constituir como fiador e principal pagador, respondendo solidariamente com a sociedade "…", facto que lhe havia sido omitido por seu filho, o também executado, CC, sendo que na data do contrato em causa se encontrava já afastado da administração de facto da sociedade executada» (cf. informação junta a 11 de novembro de 2022). * “Como é sabido, a decisão judicial transita em julgado quando já não é suscetível de reclamação nem de recurso ordinário, quer nenhuma impugnação tenha tido lugar nos prazos legais, quer se tenham esgotado os meios de impugnação admissíveis e efetivamente utilizados (art. 628.º do Código de Processo Civil: CPC). Forma-se então o caso julgado, com efeitos circunscritos ao processo concreto em que a decisão é proferida, constituindo caso julgado meramente formal, quando ela seja de absolvição da instância (art. 279.º, CPC), extinga a instância por causa diversa do julgamento (art. 277.º, CPC) ou constitua despacho interlocutório que não seja de mero expediente (art. 152.º-4, CPC), e com efeitos dentro e fora do processo, constituindo caso julgado simultaneamente formal e material, quando tenha sido de mérito (art. 619.º-1, CPC). Dentro do processo, a definitividade da decisão impede que nele ela seja contraditada ou repetida. Fora do processo, produz-se um efeito preclusivo material: não só precludem todos os possíveis meios de defesa do réu vencido e todas as possíveis razões do autor que perde a ação, mas também, com maior amplitude, toda a indagação sobre a relação controvertida, delimitada pela pretensão substantivada (pedido fundado numa causa de pedir) deduzida em juízo. O caso julgado material é, pois, primacialmente caracterizado por impor às partes uma norma de comportamento, baseada no prévio acertamento, com o referido efeito preclusivo, das respetivas situações jurídicas. Ao contrário das preclusões (processuais) do direito à prática dos vários atos processuais que precedem a sentença, esta preclusão manifesta-se assim no plano do direito substantivo. A inadmissibilidade de nova decisão em futuro processo entre as mesmas partes e com o mesmo objeto, seja repetindo-a (proibição de repetição), seja modificando-a (proibição de contradição), mais não é do que consequência processual desse efeito substantivo: uma vez conformadas, pela sentença, as situações jurídicas das partes, elas passam a ser indiscutíveis. Esta indiscutibilidade manifesta-se de dois modos: - Entre as mesmas partes e com o mesmo objeto (isto é, com o mesmo pedido e a mesma causa de pedir), não é admissível nova discussão: o caso julgado opera negativamente, constituindo uma exceção dilatória que evita a repetição da causa (efeito negativo do caso julgado); - Entre as mesmas partes mas com objetos diferenciados, entre si ligados por uma relação de prejudicialidade, a decisão impõe-se enquanto pressuposto material da nova decisão: o caso julgado opera positivamente, já não no plano da admissibilidade da ação, mas no do mérito da causa, com ele ficando assente um elemento da causa de pedir (efeito positivo do caso julgado)” (Lebre de Freitas, Um Polvo Chamado Autoridade do Caso Julgado, Revista da Ordem dos Advogados Ano 79, Vol. III/ IV, Jul./ Dez. 2019, pág. 691 a 693). “… o trânsito em julgado de uma qualquer sentença de mérito é susceptível de produzir outros efeitos, mais difusos, mas não menos importantes quando se trata de relevar os valores da certeza e da segurança jurídica que qualquer sistema deve buscar e proteger. Trata-se da eficácia preclusiva dos fundamentos de defesa que, em regra, se esgotam com o decurso do prazo para a dedução da contestação. Por isso, em princípio, todos os fundamentos de defesa que não sejam apresentados na primeira acção ficam cobertos pela autoridade do caso julgado formado pela sentença” (www.dgsi.pt acórdão do STJ proferido a 10 de outubro de 2012, no processo 1999/11.7TBGMR.G1.S1). Conforme resulta da matéria de facto provada, BB deduziu oposição à execução 1065/09.5TBCLD, tendo esta sido julgada improcedente por decisão da 1ª instância e confirmada pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa. “Constituindo petição de uma acção declarativa e não contestação duma acção executiva, a dedução de oposição à execução não representa a observância de qualquer dos ónus cominatórios (ónus da contestação, ónus da impugnação especificada), a cargo do réu na acção declarativa: nem a omissão de embargar produz a situação de revelia nem a omissão de impugnação dum facto constitutivo da causa de pedir da execução produz qualquer efeito probatório, não fazendo sentido falar, a propósito, de prova de factos alegados pelo exequente ou de definição de direito decorrente do título executivo, o qual continua, após o decurso do prazo para a oposição como até ai, a incorporar a obrigação exequenda, com dispensa, em principio, de qualquer indagação prévia sobre a sua real existência. Mas, na medida em que os embargos de executado são o meio de oposição à execução idóneo à alegação dos factos que em processo declarativo constituiriam matéria de excepção, o termo do prazo para a sua dedução faz precludir o direito de os invocar no processo executivo, a exemplo do que acontece no processo declarativo. A não observância do ónus de excepcionar, diversamente da não observância do ónus de contestar ou do de impugnação especificada não acarreta uma cominação, mas tão só a preclusão dum direito processual cujo exercício se poderia revelar vantajoso.” “Ao estatuir que a oposição do executado dê lugar a uma acção declarativa que, a partir dos articulados, siga a forma de processo ordinário, a nossa lei estabeleceu para os embargos de executado uma forma quase tão solene como a do processo ordinário. Uma vez que o princípio do contraditório nela é plenamente assegurado, não se justificaria admitir posteriormente outra ação com a mesma causa de pedir em que se pudesse voltar a pôr em causa a existência da obrigação exequenda. Assim, no caso de oposição de mérito, a procedências dos embargos não se limita a ilidir a presunção estabelecida a partir do título e, embora sempre nos limites objectivos definidos pelo pedido executivo, goza de eficácia extraprocessual nos termos gerais, como definidora da situação jurídica de direito substantivo reinante entre as partes (…). A sentença proferida sobre uma oposição de mérito é assim dotada da força geral do caso julgado, sem prejuízo de, quando for de improcedência, os seus efeitos se circunscreverem, nos termos gerais, pela causa de pedir invocada (negação dum fundamento da pretensão executiva ou excepção peremptória contra ela), não impedindo nova ação de apreciação baseada em outra causa de pedir (Lebre de Freitas, A Ação Executiva, 1993, pág. 163 e ss). Nos termos do art. 732º nº 6 do C.P.C., “para além dos efeitos sobre a instância executiva, a decisão de mérito proferida nos embargos à execução constitui, nos termos gerais, caso julgado quanto à existência, validade e exigibilidade da obrigação exequenda.” «O sentido do estabelecido no então art. 732.º/5 do CPC pela reforma de 2013, conhecendo-se qual era o “estado da arte” – sobre os embargos constituírem a PI duma ação declarativa e não a contestação duma ação executiva e sobre o alcance (que era o que supra se referiu) do caso julgado da decisão proferida nos embargos – só pode ter sido o de deixar claro que uma decisão de mérito proferida nos embargos é dotada da força geral do caso julgado material em relação à causa de pedir e aos fundamentos que ali foram invocados (não impedindo nova ação de apreciação baseada em outra causa de pedir). Caso o legislador de 2013 pretendesse ser inovador e consagrar a solução de não poderem ser invocados, em nova ação, fundamentos que não foram invocados nos embargos, não podia (atento o referido “estado da arte”) deixar de ser explícito e, salienta-se, era-lhe muito simples sê-lo: bastaria introduzir no art. 732.º do CPC um número a dizer ser ao caso aplicável o disposto no art. 573.º/1 do CPC. E não se diga que a interpretação que fazemos se socorre de jurisprudência e de doutrina anteriores ao atual art. 732.º/6 do CPC e que neste só se diz que há caso julgado porque antes há preclusão e que “dado que o art. 732.º/5 do CPC estabelece o consequente - que é o caso julgado da decisão de improcedência dos embargos - então também tem de se verificar o antecedente - que é a preclusão dos fundamentos de defesa do executado que não tenham sido alegados nos embargos. É que não há nenhuma incompatibilidade entre considerar-se que não há preclusão e a existência de caso julgado, uma vez que, na interpretação que fazemos – e que, a nosso ver, corresponde ao entendimento que a lei consagrou – o caso julgado se constitui restrito aos fundamentos que foram invocados, discutidos e decididos pela decisão de mérito dos embargos, ou seja, há mesmo caso julgado material sobre a existência, validade e exigibilidade da obrigação exequenda, mas esse caso julgado é restrito à causa de pedir invocada e, claro, não há preclusão em relação ao que não foi invocado/ discutido nos embargos» (www.dgsi.pt Acórdão do STJ proferido a 3 de maio de 2023, no processo 1704/21.0T8GRD.C1.S1). O tribunal recorrido considerou que “o crédito ora reclamado já esta verificado e reconhecido, pois foi julgada improcedente a oposição a execução deduzida pelo aqui executado, entretanto falecido”. Apesar de o tribunal recorrido não ter invocado o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra proferido a 27 de fevereiro de 2018, no processo 1767/05.5TBCTB-B.C1 (acessível em www.dgsi.pt), transcreveu, como se sua fosse, fundamentação daquele acórdão. Nesse acórdão, pode ler-se: «Não tendo deduzido oposição na execução que contra si foi instaurada pelo aqui credor reclamante, ficou indiscutida na execução a exequibilidade do título. E quando, pelo facto de aquela execução ter sido sustada por motivo de existência de uma outra penhora prioritária, o aí exequente é obrigado a vir reclamar o seu crédito nos presentes autos, é ainda o direito exequendo exercitado em tal execução e que se tornou aí indiscutido, que aqui se pretende ver graduado – o reclamante pede aqui a realização coativa do seu direito que se encontra a ser exercitado na execução por si instaurada, invocando a penhora aí efetuada. Temos assim um “concurso” de execuções sobre o mesmo bem. O credor que viu a sua execução sustada por efeito da existência de uma outra penhora mais antiga goza da faculdade de se apresentar a reclamar o crédito exequendo na execução em que a penhora seja mais antiga, invocando a sua preferência no pagamento decorrente da garantia real consistente na penhora efetuada a seu favor. Assim sendo, se os demais credores que concorrem entre si pelo pagamento através de um determinado bem (credores reclamantes e exequente) gozam de ampla liberdade na impugnação dos demais créditos reclamados e das respetivas garantias, podendo ainda, inclusivamente, deduzir impugnação ao crédito exequendo, o executado (a quem lhe foi já atempadamente concedido prazo para deduzir oposição a tal crédito na execução sustada), apenas poderá aqui invocar os meios de defesa atinentes à própria reclamação de créditos (ex., extemporaneidade da reclamação) ou que sejam posteriores ao termo do prazo de oposição na 1ª execução. Confirmando-se o sustentado na sentença recorrida, de que o direito do executado a deduzir impugnação que ponha em causa o crédito exequendo se encontra precludido pela ausência de oposição na ação executiva que deu origem à garantia real que aqui se pretende fazer valer». Não podemos concordar com esta fundamentação. “Na ação executiva, … o efeito preclusivo da falta de oposição ou da não dedução de todos os fundamentos, ocorre apenas no processo executivo” (www.dgsi.pt Acórdão do STJ proferido a 24 de maio de 2022, no processo 327/20.5T8CBT.G1.S1). Assim, a falta de oposição à execução sustada ou a não dedução de todos os fundamentos de defesa nessa execução não produz efeito preclusivo na reclamação de créditos apresentada na execução em que a penhora é mais antiga. Acresce dizer que há meios de defesa que o tribunal pode conhecer oficiosamente. Nos termos do art. 734º nº 1 do C.P.C., “o juiz pode conhecer oficiosamente, até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726º, o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo”. Importa ainda referir que, conforme resulta do art. 788º nº 2 do C.P.C., “a reclamação tem por base um título exequível”. É a exequibilidade do título junto com a reclamação de créditos que importa apreciar nessa reclamação. O tribunal recorrido fez constar dos factos provado que a oposição à execução deduzida no processo 1065/09.5TBCLD foi julgada improcedente por decisão da 1ª instância e confirmada pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa. Deveria ter também feito constar dos factos provados os fundamentos invocados na oposição à execução, pois a força do caso julgado da decisão de mérito proferida nos embargos de executado é restrita a esses fundamentos. Dos pontos 5 e 6 aditados aos factos considerados provados pelo tribunal recorrido resulta que a inexistência de título executivo e o pagamento parcial do crédito reclamado não foram invocados na oposição à execução. * Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar procedente a apelação, revogando a sentença recorrida, devendo os autos prosseguir para conhecimento das questões da inexistência de título executivo e do pagamento parcial do crédito reclamado suscitadas na impugnação da reclamação de créditos. Custas do recurso pela reclamante. * Lisboa, 7 de junho de 2023 Maria do Céu Silva Teresa Sandiães Octávio Diogo |