Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4548/09.3TBALM.L1-6
Relator: TERESA PARDAL
Descritores: PRIVAÇÃO DE USO DE IMÓVEL
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/16/2015
Votação: UNANIMIDADE COM * DEC VOT
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: - A compensação pela privação de uso de um imóvel pelo seu dono contra a sua vontade, devido a uma ocupação sem título justificativo, deve ser tutelada legalmente e, não se entendendo haver lugar à responsabilidade civil extracontratual por falta de prova de danos patrimoniais concretos, deverá recorrer-se à figura do enriquecimento sem causa.
- A respectiva obrigação deve corresponder ao valor locativo do imóvel durante o período da ocupação.
- Não havendo nos autos elementos suficientes para obter o valor locativo do imóvel, deverá a fixação do respectivo montante ser apurada em liquidação de sentença.
- A não correspondência de uma data, alegada de forma imprecisa pela parte (cerca de 4 anos antes de 1994), com a data que resulta provada na sentença, também ela não precisa (no início da década de oitenta), não é suficiente para se concluir que a parte litigou de má fé.

(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:

RELATÓRIO:

S… intentou contra M… acção declarativa com processo ordinário alegando, em síntese, que, após o divórcio por mútuo consentimento do autor e da ré, correu termos um processo de inventário em que lhe foi adjudicada uma fracção autónoma e outros bens móveis, ficando o autor obrigado a depositar tornas no prazo de dez dias a contar da data do trânsito em julgado da sentença em 9/10/2006, o que o autor, por erro, só fez em 9/01/2008 depois da notificação do mapa da partilha, acabando por pagar juros que foram reclamados pela ré pelo atraso do depósito; mas esta não entregou a fracção autónoma ao autor na referida data do trânsito em julgado, em 9/10/2006, apesar das interpelações que lhe foram feitas, acabando por só a entregar em 29/01/2009, sem nunca pagar qualquer quantia a título de contrapartida pela ocupação, entregando-a em estado degradado, obrigando o autor a realizar obras e limpezas e sem que no imóvel se encontrassem algumas das verbas móveis também adjudicadas ao autor.

Concluiu pedindo que a ré fosse condenada a pagar-lhe:
a) 12 600,00 euros a título de contrapartida pela ocupação da fracção, à razão de 450,00 euros vezes 28 meses;
b) 10 644,55 euros a título de despesas com obras e limpezas;
c) 3 840,00 euros a título de despesas com a reposição da canalização do imóvel;
d) 115,00 euros a título de restituição de tornas correspondentes a verbas de bens móveis que lhe foram adjudicados e que a ré não lhe entregou;
e) 94,55 euros a título de quota parte da ré no pagamento do IMI de 2006 relativo ao imóvel;
f) 10 000,00 euros a título de indemnização por danos não patrimoniais;
g) Juros sobre todas as referidas quantias à taxa legal desde a citação e até integral pagamento.

A ré contestou alegando que, tendo-lhe sido atribuído o direito à casa de morada de família por acordo firmado no processo de divórcio, não tinha obrigação de entregar o imóvel na data invocada pelo autor, mesmo porque nessa data ainda estava pendente uma acção que intentou contra o ora autor para que este reconhecesse que o direito à casa de morada de família não estava condicionado a qualquer prazo ou condição resolutiva; impugnou ainda a existência de qualquer dano que o autor tenha sofrido com a não entrega do imóvel, os danos relativos ao estado da casa, as alegadas obras aí efectuadas, a não entrega de bens que que foram adjudicados ao autor, os invocados danos não patrimoniais e a obrigação de pagar uma quota parte do IMI.  

Concluiu pedindo improcedência da acção e a absolvição do pedido, bem como a condenação do autor em multa e em indemnização por litigância de má fé.

Saneados os autos, procedeu-se a julgamento, findo o qual foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar ao autor a quantia de 7 000,00 euros a título de indemnização pela privação da fracção, acrescida de juros às taxas legais desde a citação e até integral pagamento e absolveu-a dos restantes pedidos formulados pelo autor, julgando ainda improcedente o pedido de condenação deste como litigante de má fé.

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Inconformada, a ré interpôs recurso e alegou, formulando as seguintes conclusões:
1ª – Para decidir se a actuação da Ré (ao entregar o imóvel em 29.01.2009) importa a obrigação de indemnizar o Autor, deveria a meritíssima juiz a quo apurar se o Réu sofreu na realidade algum dano, sendo certo que a este competiria, sendo caso disso, fazer prova da existência de danos;
2ª – Porém, embora expressamente conviesse em que “só os danos concretos merecem ser ressarcidos”, a meritíssima juiz a quo considerou que “a simples privação ilegal do uso já integra um prejuízo de que o proprietário deve ser compensado . . . com recurso às regras da equidade”.
3ª– Sendo este o ponto de partida para fundamentar a condenação em indemnização ao Apelado que acabou por decidir, a meritíssima juiz a quo transgrediu frontalmente a norma do artigo 4º do Código Civil, a qual apenas permite aos tribunais resolverem segundo a equidade nas situações previstas nas suas três alíneas, sendo que a situação sub judice não cabe manifestamente em nenhuma delas.
4ª – Não tendo havido prova da existência do dano não deveria a meritíssima juiz a quo condenar a Ré no pagamento ao Autor de indemnização nenhuma.
5ª – Acresce que a ora Apelante invocou o direito de uso e habitação de que era titular por força do acordo atingido no processo de divórcio por mútuo consentimento, alegando que este não estava sujeito a qualquer condição resolutiva, nomeadamente que não se teria extinguido com a partilha.
6ª - A este respeito a meritíssima juiz a quo afirmou que o direito de uso “cessa com a partilha do bem comum. É essa a essência do instituto. Atribuir o uso a um dos cônjuges, ou ex-cônjuges, até que se determine, por partilha, o destino ou a propriedade do mesmo ” o que constituiu um erro na interpretação do direito.
7ª – Na verdade aquele direito de uso e habitação tem por fonte um contrato cujo conteúdo tanto poderá ser o de atribuir o direito de uso e habitação a um dos cônjuges, com ou sem limitação de tempo e com ou sem condição resolutiva (v.g. a partilha), como pode ser o de não atribuir tal direito a nenhum dos cônjuges porque, por exemplo acordem em pôr o imóvel à venda, como pode inclusivamente ser o de que os cônjuges continuem a coabitar o imóvel nas condições que entendam definir.
8ª – Está-se, de pleno, no âmbito da liberdade negocial, só podendo determinar-se os contornos e eventuais limites daquele direito da Apelante com recurso às regras da interpretação da vontade negocial das partes dentro dos limites da legalidade (artº 405º nº1 do C.Civil).
9ª – Errou pois a meritíssima juiz a quo ao referir um inexistente instituto cuja essência invoca.
10ª – Igualmente errado foi ter sido considerado não haver causa de justificação para a Ré se ter mantido na posse do imóvel.
11ª – Tal causa de justificação sempre haveria visto que o Autor, que tinha obrigação de efectuar o pagamento das tornas até 9.10.2006, apenas fez o respectivo depósito em 9.01.2008 (457 dias mais tarde), como se vê do douto despacho de 11.09.2008 proferido nos autos de inventário ( Cf. fls. 48 e 49 dos autos).
12ª – De tal modo que a Apelante só em 22.07.2008 recebeu o valor simples das tornas (€ 30.116,75) através de cheque emitido pelo Instituto de Gestão Financeira e de Infra-Estruturas da Justiça, IP, E, como se vê da carta do Apelado de 4.08.2008 - Cf. fls. 53 dos autos e doc.1 (que se junta ao abrigo dos artigos 425º e 651º nº1 do C.Pr.Civil, porquanto não teria havido qualquer razão para a sua junção aos autos antes do julgamento, sendo a decisão proferida que determina a sua necessidade).
13ª – Mantendo-se a Apelante credora da quantia de € 1.548,85 de juros de mora que o Autor, pelo despacho de fls. 50 dos autos, foi condenado a pagar-lhe e que ele só veio a depositar em 18.09.2008, à ordem do tribunal (Cf. fls.. 51 e 52 dos autos).
14ª – Parece incontestável que, independentemente de quaisquer outras razões, a Apelante não teria obrigação de entregar o imóvel ao Autor, enquanto este se mantivesse em falta relativamente ao pagamento das tornas e respectivos juros de mora.

QUANTO AO VALOR DA INDEMNIZAÇÃO:
15ª – Resulta do que antecede que errou a meritíssima juiz a quo errou ao considerar, para cálculo da indemnização a fixar, o período de 28 meses que mediou entre a adjudicação do imóvel em sede de partilhas e as entrega do imóvel pela Ré ao Autor.
16ª - Disso mesmo estava consciente o Apelado, o qual só após o pagamento das tornas começou a instar a Apelante, directamente e através do advogado desta, para que o imóvel lhe fosse entregue – Cf. fls..53 a 60 dos autos.
17ª – E o Apelado através da notificação judicial avulsa de fls.. 61 e 62 dos autos deu à Apelante um prazo de 10 dias para ela desocupar o imóvel e lhe entregar as respectivas chave, prazo esse que terminava em 5.10.2008,
18ª - O que torna injusta e infundamentada a condenação da Recorrente a indemnizar o Recorrido pela ocupação do andar desde a data da sentença de partilha.
19ª – Tanto mais que a Apelante tinha necessidade de receber as quantias que o Recorrido estava obrigado a prestar-lhe, para poder comprar uma casa onde morar, para o que necessitou ainda dum financiamento que lhe foi concedido pelo Montepio Geral –Cf. doc. 2 (que se junta ao abrigo dos artigos 425º e 651º nº1 do C.Pr.Civil, porquanto não teria havido qualquer razão para a sua junção aos autos antes do julgamento, sendo a decisão proferida que determina a sua necessidade).

QUANTO À FUNDAMENTAÇÃO DA CONDENAÇÃO:
20ª - O fundamento da condenação da Recorrente em pagar uma indemnização ao Apelado, foram os supostos danos emergentes resultantes da falta de recebimento das rendas que o imóvel proporcionaria ao Apelado.
21ª - Acontece contudo que, como se encontra extensamente documentado nos autos (vide, máxime, a petição inicial e documentos que a instruíram), o Recorrido nunca pretendeu arrendar o imóvel, sendo sua única intenção remodelá-lo e vendê-lo.
22ª - Parece pois não fazer sentido a condenação da Apelante em indemnizar o Apelado por danos emergentes relativos às rendas dum imóvel que ele nunca quis arrendar.
23ª - Acresce que sempre se deverá ter por excessivo o valor de € 250,00 da renda atribuído pela meritíssima juiz a quo a um 3º andar sem elevador, com mais de 50 anos de uso e numa zona não central da cidade de Almada e, se não no exagerado estado de degradação que o Autor refere no seu petitório, pelo menos com o muito uso por um casal com dois filhos entre 1969 e Março de 1994 e, desde então da Apelante e dos filhos até 2005 e depois disso só pela Recorrente.
24ª - Assim, na mais gravosa das hipóteses para a Apelante, a indemnização a fixar não deveria exceder os € 300,00 correspondentes às rendas de Novembro e Dezembro de 2008 e de Janeiro de 2009, uma vez que o Recorrido lhe concedera prazo para entregar a casa até 5.10.2008 e tal entrega verificou-se em 29.01.2009.

QUANTO À MÁ-FÉ PROCESSUAL DO APELADO:
25ª - Não é certo que o instituto da litigância de má-fé deve reservar-se a situações excepcionais.
26ª - Quando, nas suas quatro alíneas, o nº 2 do artigo 456º do C.Pr.Civil prevê situações que qualifica como de litigância de má-fé, nada permite concluir que esteja a tratar de situações excepcionais.
27ª - Não constitui “situação excepcional” nem em sentido técnico-jurídico, nem como situação inusual ou insólita, constatar que, um litigante deduziu pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não ignorava ou que, ignorando, não devia ignorar.
28ª - Alterar a verdade dos factos ou omitir factos relevantes para a decisão da causa é uma prática tão usual que não pode qualificar-se como “situação excepcional.
29ª - Não restam dúvidas que o Recorrido mentiu redondamente quando nos artigos 28º e 29º da p.i. corrigida afirmou ter sido em 1990 que foram realizadas no imóvel uma série de obras que o tribunal veio a apurar que haviam tido lugar no início da década de 80 (confrontar o artigo 29º da p.i. corrigida com o nº 12 dos factos provados).
30ª - Tendo até justificado o motivo duma dessas obras: “d) Colocação de corticite em substituição de alcatifa, por motivo de saúde (alergias) da filha menor do casal.
31ª - A meritíssima juiz a quo constatou a falsidade da alegação do Recorrido, lendo-se da douta sentença: “Decorre das regras de experiência comum que, no início da década de 90, se começou, sim, a retirar o papel de parede e as alcatifas. E não a colocá-lo.
Também a utilização de corticite se mostra datada no tempo, conjugada com o facto da “menor” em 1990 estar já perto da maioridade, se não a tivesse já atingido. Não fazendo igualmente qualquer sentido que o sótão tenha sido só nessa altura adaptado. Quando os filhos se encontravam já perto da idade adulta”
32ª - Tendo constatado que o Apelado alterou a verdade dos factos e que o fez com perfeita disso, uma vez que se trata de factos pessoais; logo, que agiu com dolo ou negligência grave, a meritíssima juiz a quo errou ao não o condenar como litigante de má-fé e, por via dela, em multa e indemnização à Apelante, conforme pedido por esta na sua oportuna contestação.
33ª - Deve pois a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por decisão que absolva a Apelante de todos os pedidos formulados pelo A. e, em consequência, 34ª - Que condene o Recorrido na totalidade das custas.
35ª - Deve finalmente o Apelado ser declarado litigante de má-fé e, por via dela condenado em multa e em indemnização à Apelante ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 457º do C. Pr. Civil, em quantia não inferior a três mil euros.

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O apelado contra-alegou, pugnando pela confirmação da sentença recorrida.

O recurso foi admitido como apelação com subida nos autos e efeito suspensivo por ter sido prestada caução.

As questões a decidir são:
I) Direito a compensação pela privação da fracção e respectivo valor.
II) Litigância de má fé do autor.

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FACTOS:

Os factos considerados provados pela sentença recorrida são os seguintes:
1. Autor e Ré foram casados um com o outro, tendo esse casamento sido dissolvido por divórcio, por mútuo consentimento, decretado por sentença transitada em julgado no dia 23 de Setembro de 1997, proferida no processo n.º .../96, que correu seus termos pelo ....º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Almada. (Facto assente em A)).
2. Após o divórcio, correu termos, pelo ...º Juízo de Família e Menores do Tribunal de Família e Menores e de Comarca ..., o processo de partilha de bens em casos especiais, registado sob o n.º .../05.9TBSXL, no qual o Autor e a Ré alcançaram acordo quanto à partilha dos bens comuns, tendo sido proferida sentença homologatória da partilha, a qual transitou em julgado no dia 10/10/2006. (Facto assente em B)).
3. Da “Relação de Bens Comuns” foi, entre outras, adjudicada ao Autor a verba n.º 14, correspondente à fracção autónoma designada pela letra …, 3.º piso, do prédio constituído em propriedade horizontal, sito na Rua …, n.º…, freguesia e concelho de Almada, descrito na Primeira Conservatória do Registo Predial e Comercial de Almada sob o n.º…, e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo …. (Facto assente em C)).
4. No âmbito do citado processo n.º .../05.9TBSXL, o Autor pagou à Ré, a título de tornas e juros de mora, o valor global de € 1.548,85 (mil e quinhentos e quarenta e oito euros e oitenta e cinco cêntimos), fixado por despacho de 11.08.2008, naqueles autos proferido. (Facto assente em D)).
5. O imóvel descrito em 3 foi exclusivamente habitado pela Ré desde a separação e consequente divórcio do casal, até ao dia 29/01/2009, sem que o Autor tivesse, desde então, usado ou gozado o referido imóvel. (Facto assente em E)).
6. Para que a Ré lhe entregasse o aludido imóvel após a partilha, o Autor diligenciou do seguinte modo:
a) Através de cartas entregues por mão própria à Ré e através de cartas registadas com aviso de recepção remetidas ao seu mandatário, Dr. J….
b) Mediante notificação judicial avulsa, que correu termos no ....º Juízo Cível do Tribunal de Família, Menores e de Comarca de Almada, sob o processo n.º.../08.2TBALM, cumprida em 25/09/2008.
c) Mediante rescisão dos contratos de fornecimento de água e luz. (Facto assente em F)).
7. A Ré entregou ao Autor o imóvel descrito em 3. no dia 29 de Janeiro de 2009, sem que tenha pago qualquer contrapartida pelo seu gozo desde a partilha dos bens comuns do casal. (Facto assente em G)).
8. A única obra realizada pela Ré no imóvel, enquanto nele habitou, consistiu na reparação da canalização da cozinha e da casa de banho, sendo a canalização colocada no exterior das paredes. (Facto assente em H)).
9. Além da verba n.º 14 da Relação de Bens Comuns, foram adjudicadas ao Autor as seguintes Verbas:
Verba n.º 1 – Esquentador, no valor de € 20,00 (vinte euros);
Verba n.º 3 – Conjunto de sofás, no valor € 50,00 (cinquenta euros);
Verba n.º 6 – Móvel de canto (cantoneira), no valor de € 25,00 (vinte e cinco euros);
Verba n.º 7 – Máquina de lavar AEG, no valor de € 25,00 (vinte e cinco euros);
Verba n.º 8 – Aspirador AEG, no valor de € 15,00 (quinze euros);
Verba n.º 12 – Televisão Toshiba, no valor de € 50,00 (cinquenta euros);
Verba n.º 13 – Automóvel Fiat 127, no valor de € 50,00 (cinquenta euros). (Facto assente em I)).

10. O Autor pagou o IMI referente ao ano de 2006, no valor de € 189,11 (cento e oitenta e nove euros e onze cêntimos), recusando-se a Ré a pagar metade desse montante. (Facto assente em J)).
11. Na pendência da referida acção de divórcio, as partes acordaram que o uso do imóvel descrito em 3 ficava para a Ré. (Facto assente em L)).
12. No início da década de 80, foram realizadas obras no imóvel descrito em 3, as quais incluíram a colocação de caixilharia na varanda localizada junto à cozinha, a colocação de papel de parede em toda a casa (excepto cozinha, casa de banho e marquises), a colocação de corticite em substituição de alcatifa, por motivos de saúde (alergias) da filha menor do casal, abertura para o sótão, divisão e realização de condições para dois quartos para os filhos menores do casal, colocação de roupeiro grande no quarto de casal e um pouco tempo depois a colocação de caixilharia e telhado na varanda de 8,5 metros de comprimento, localizada na parte frontal do prédio. (resposta ao artigo 2 da B.I.).
13. Quando a Ré entregou o imóvel ao Autor, as paredes tinham marcas no estuque e na pintura, no local onde foram retirados pregos. (resposta ao artigo 4 da B.I.).
14. O Autor colocou novas fitas os estores das janelas da casa, de utilização manual de fita. (resposta ao artigo 6 da B.I.).
15. Por motivo de uma das fitas dos estores estar esgaçada e as restantes duas partidas. (resposta ao artigo 7 da B.I.).
16. Na marquise contígua à cozinha, a massa de fixação dos vidros apresentava-se de cor preta, devido à humidade. (resposta ao artigo 12 da B.I.).
17.As paredes da mesma marquise encontravam-se com marcas no estuque e com a tinta manchada. (resposta ao artigo 15 da B.I.).
18. O que levou à reparação e pintura das paredes. (resposta ao artigo 16 da B.I.).
19. Na marquise situada na parte frontal do prédio (com 8,50 metros de comprimento), as paredes apresentavam falta de algumas das placas de corticite que as forravam e outras placas encarquilhadas. (resposta ao artigo 17 da B.I.).
20. O Autor providenciou pela remoção dessas placas de corticite existentes na parede da marquise, assim como pela remoção da cola que as fixava. (resposta ao artigo 18 da B.I.).
21. Devido ao estado em que a parede ficou após a remoção das referidas placas, o Autor teve que providenciar pela reparação da parede dessa mesma marquise. (resposta ao artigo 19 da B.I.).
22. No pavimento dessa mesma marquise, também forrado com placas de corticite, as placas existentes apresentavam-se gastas. (resposta ao artigo 20 da B.I.).
23. O Autor providenciou pela remoção completa do pavimento da mesma marquise. (resposta ao artigo 21 da B.I.).
24. O Autor providenciou pela pintura das portas interiores. (resposta ao artigo 24 da B.I.).
25. Na única casa de banho existente na casa faltava o bidé e um lavatório, que haviam sido retirados para colocação de uma máquina de lavar. (resposta ao artigo 25 da B.I.).
26. A banheira continha vários picos de ferrugem. (resposta ao artigo 28 da B.I.)
27. O Autor providenciou pela substituição da banheira. (resposta ao artigo 29 da B.I.)
28. Dada a dificuldade do Autor em encontrar torneiras da mesma marca e modelo das originais existentes na casa de banho, adquiriu e providenciou pela colocação de torneiras em toda a casa de banho. (resposta ao artigo 32 da B.I.).
29. A Ré deixou colocados na zona do chão da casa de banho de onde removeu o bidé mosaicos diferente dos restantes existentes nesse mesmo chão, uma vez que os de origem já não eram fabricados. (resposta ao artigo 35 da B.I.).
30. Não tendo o Autor encontrado mosaicos iguais aos aí existentes, teve que substituir todo o pavimento da casa de banho. (resposta ao artigo 36 da B.I.).
31. Havia uma infiltração proveniente do imóvel descrito em 3, que tinha como causa a canalização da zona do esgoto da banheira da casa e a ligação à canalização onde anteriormente se encontrava o bidé. (resposta ao artigo 37 da B.I.).
32. Tendo essa canalização que ser substituída, assim como o sifão da banheira que se encontrava danificado. (resposta ao artigo 38 da B.I.).
33. O custo dos materiais utilizados pelo Autor no tecto da marquise ascendeu a € 65,75 (sessenta e cinco euros e setenta e cinco cêntimos). (resposta ao artigo 42 da B.I.).
34. Os móveis da cozinha tinham falta de portas. (resposta ao artigo 45 da B.I.).
35. O Autor removeu aqueles móveis e proceder à sua substituição por novos, incluindo bancadas e lava-loiças. (resposta ao artigo 46 da B.I.).
36. O Autor procedeu à lavagem e pintura das paredes da cozinha e varanda. (resposta ao artigo 48 da B.I.).
37. A substituição dos móveis da cozinha e a sua limpeza importaram em € 3.000 (três mil euros). (resposta ao artigo 49 da B.I.).
38. A porta de acesso ao imóvel descrito em 3 apresentava o aspecto retratado a fls. 93 e 94. (resposta ao artigo 50 da B.I.).
39. Tendo o Autor procedido à sua substituição. (resposta ao artigo 51 da B.I.).
40. O que importou na quantia de € 380,00 (trezentos e oitenta euros). (resposta ao artigo 52 da B.I.).
41. O pavimento do hall de entrada e das três assoalhadas apresentava a cortiça negra e gasta. (resposta ao artigo 53 da B.I.).
42. Cuja limpeza e tratamento não se mostram possíveis. (resposta ao artigo 54 da B.I.).
43. O Autor procedeu à total substituição do pavimento da casa. (resposta ao artigo 56 da B.I.).
44. E optado pela colocação de soalho flutuante, cujo custo ascendeu à quantia de € 1.100,00 (mil e cem euros). (resposta ao artigo 57 da B.I.).
45. A Ré deixou o imóvel, incluindo o sótão, com bens pessoais dos filhos e bens comuns do casal que não foram objecto de partilha. (resposta ao artigo 59 da B.I.).
46. O Autor ajustou com a Associação de Solidariedade “Reto” os serviços de remoção de objectos existentes no sótão, mediante pagamento da contrapartida de € 282,00 (duzentos e oitenta e dois euros). (resposta ao artigo 60 da B.I.).
47. Tendo o Autor removido outros objectos através de um sistema manual de transporte pelo exterior do prédio. (resposta ao artigo 61 da B.I.).
48. O Autor pagou a quantia mencionada em 37. (resposta ao artigo 62 da B.I.).
49. O imóvel, à data da separação do casal, tinha toda a canalização no interior das paredes. (resposta ao artigo 63 da B.I.).
50. Após a realização das obras acima descritas, o estado actual do imóvel é o que se observa nas fotografias de fls. 111 a 123. (resposta ao artigo 65 da B.I.).
51. Durante a realização dos trabalhos o Autor contratou terceiros, pediu orçamentos, removeu objectos e efectuou pequenas reparações. (resposta ao artigo 67 da B.I.).

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Ao abrigo dos artigos 607º nº 4 e 663º nº2 do CPC, considera-se ainda provados os seguintes factos, com base na certidão de fls 237 e seguintes:
52. Em Março de 2005 a ora ré intentou contra o ora autor uma acção com processo sumário, que correu termos com o nº.../05.3TBALM, pedindo que fosse declarado e reconhecido que o direito da aí autora a usar a casa de morada de família não estava sujeito a qualquer condição resolutiva, nomeadamente que não se extinguiria no caso de na partilha o imóvel vir a ser adjudicado ao autor e, subsidiariamente, se assim não se entendesse, que lhe fosse dado o arrendamento da casa de morada de família, propriedade comum das partes, fixando-se a renda em quantia não superior a 25,00 euros.

53. Nessa acção, no despacho saneador, o tribunal declarou-se incompetente em razão da matéria, absolvendo o réu da instância.
54. No âmbito de recurso interposto pela autora, ora ré, o Tribunal da Relação, em acórdão de 22 de Novembro de 2007, revogou a decisão da 1ª instância, declarando o tribunal competente, absolveu parcialmente da instância o réu, ora autor, por inadmissibilidade processual do pedido subsidiário e absolveu o réu do pedido principal por manifesta inviabilidade.
55. O acórdão do Tribunal da Relação transitou em julgado.

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ENQUADRAMENTO JURÍDICO:

I) Direito a compensação por privação da fracção e respectivo valor.
Com a presente acção, o autor, ora apelado pretende a condenação da ré, apelante, a pagar-lhe uma indemnização pela privação de uso do imóvel que lhe foi adjudicado na partilha por sentença transitada em julgado em Outubro de 2006, mas que só lhe foi entregue pela ré 28 meses depois, em Janeiro de 2009.
Para o efeito, formulou pedido de condenação no pagamento de uma indemnização no montante de 12.600,00 euros, correspondente ao valor locativo mensal do imóvel, de 450,00 euros, vezes 28 meses.
A sentença recorrida julgou parcialmente procedente este pedido e condenou a ré ora apelante a pagar uma indemnização, cujo valor fixou em 7 000,00 euros, à razão de 250,00 euros por mês, uma vez que não se provou o quesito 1º, onde se perguntava se o valor locativo da casa era de 450,00 euros mensais.

Alega a apelante que foi justificada a sua recusa de entrega do imóvel, por estar pendente uma acção em que pediu o reconhecimento de que o seu direito à casa de morada de família não tinha prazo e deveria perdurar mesmo que a casa viesse a ser adjudicada ao seu ex-cônjuge.
Esquece a apelante de referir que, como resulta dos factos provados (pontos 52 a 55) na referida acção, intentada em 2005, foi essa sua pretensão julgada improcedente por acórdão do Tribunal da Relação de 2007, que transitou em julgado, pelo que, nos termos dos artigos 671º e 673º do CPC anterior (actuais artigos 619º e 621º), não pode a questão ser discutida nos presentes autos.  
Mais alega a apelante que a recusa em entregar o imóvel foi igualmente justificada porque o autor não depositou imediatamente as tornas a que ficou obrigado, necessitando a apelante dessa quantia para providenciar por uma nova habitação.
Mas, mais uma vez, não lhe assiste razão.

Desde logo, este facto – necessidade das tornas para poder disponibilizar a casa – teria de ter sido alegado na contestação por força do artigo 489º do CPC anterior (actual artigo 573º), mas nunca foi alegado em 1ª instância, não estando demonstrado e não podendo ser considerado pelo presente tribunal de recurso.
Por outro lado, como se vê da propositura, em 2005, da acção onde a ora apelante reclamou o seu direito de se manter na casa mesmo que esta fosse adjudicada ao seu ex-cônjuge, já nesse ano de 2005, antes da partilha e da consequente obrigação de depósito das tornas, a apelante assumia que não entregaria o imóvel, invocando um direito que veio a improceder nessa acção.

Conclui-se, portanto, que não foi justificada a ocupação do imóvel pela ré apelante desde a data do trânsito da sentença de partilha, em 10/10/2006, ficando o autor efectivamente privado do uso respectivo até à data em que o acabou por receber.

Contudo, não tendo sido alegados nem provados danos patrimoniais concretos como resultado desta privação de uso, não se conforma a apelante com a decisão da sentença recorrida em condená-la numa indemnização de 7 000,00 euros a este título.
Como é sabido, tem sido discutido se a mera privação de uso de um bem, sem que se apurem prejuízos concretos, constitui responsabilidade civil extracontratual, prevista no artigo 483º do CC, que determine a obrigação de indemnizar.
Em sentido negativo pronunciaram-se, entre outros, os acs da RL de 14/02/2014, P. 2106/11 e do STJ de 3/10/2013, P. 9074/09 e 3/10/2013, P. 1261/07, todos em www.dgsi.pt.
No sentido de que a própria privação de uso constitui um dano que consiste na indisponibilidade de usufruir das utilidades do bem, pronunciaram-se, entre outros, os ac do STJ de 5/07/2007, P. 07B1849, da RP de 13/10/2009, P. 3570/05, da RL 6/12/2012, P. 813/09 (com voto de vencido), também em www.dgsi.pt. e, na doutrina, Abrantes Geraldes em “Indemnização do Dano de Privação de Uso”, Almedina, páginas 30 e seguintes e Meneses Leitão em “Direito das Obrigações”, Volume I, 10ª edição, página 303.
Entre estas duas posições há ainda jurisprudência que, nomeadamente no âmbito da privação de veículo automóvel, tem vindo a entender que, não sendo necessário provar danos concretos, deverão provar-se factos que demonstrem haver uma efectiva frustração de gozo, porque o bem em causa estaria destinado a determinada utilidade que foi indisponibilizada – neste sentido acórdãos STJ 6/05/2009, P. 08A1279, 9/12/2008, P. 08A3401, 9/03/2010, P. 1247/07, 16/03/2011, P. 3922/07, 3/05/2011, P.2618/08, 15/11/2011, P. 6472/06, 10/01/2012, P. 189/04, RL 20/04/2010, P. 7894/05, 6/12/2011, P.6948/08, RP 12/04/2011, P.273/09, 3/05/2012, P. 324/10, 14/05/2013, P. 1008/12, 11/11/, P. 270/12, RC 15/05/2012, P.686/10, 22/01/2013, P. 3654/03, 28/05/2013, P.1721, todos em www.dgsi.pt.

A sentença recorrida, seguindo a corrente jurisprudencial que se basta com a mera privação de uso para gerar a responsabilidade civil extracontratual prevista no artigo 483º do CC e recorrendo à equidade, fixou a referida indemnização de 7 000,00 euros.
A questão é, então, a de saber se é possível reclamar uma compensação patrimonial em situações com a dos autos, em que não estão demonstrados danos concretos.
Face à mencionada divergência jurisprudencial e doutrinária, não obteve o presente colectivo a maioria na adesão à corrente que defende que a mera privação de uso constitui, por si só, um dano indemnizável.

Porém, não se pode aceitar que não seja tutelada a posição dos respectivos titulares, quando reclamam a restituição do bem, intentando a competente acção judicial, esperando longos períodos de tempo (muitas vezes vários anos) até que essa restituição se concretize, sempre ilicitamente privados do bem e sem poder retirar utilidades do mesmo e com a natural dificuldade em identificar e quantificar o prejuízo patrimonial daí decorrente, precisamente porque estiveram impedidos de decidir de que forma iriam retirar as utilidades inerentes à sua exploração.
É assim que, a propósito deste tipo de situações, no acórdão do STJ de 3/10/2013, processo 1261/07, acima citado, onde se considerou que, não estando provados danos patrimoniais concretos, não existe responsabilidade civil extracontratual, se conclui que não é possível ficar-se indiferente a uma situação destas em que alguém que beneficia de bens alheios à custa e contra a vontade do respectivo dono.
E, tal como se conclui também neste acórdão do STJ, ao entender-se que não há responsabilidade civil nestas situações, a solução encontrada terá de ser a do enriquecimento sem causa.
Prevê efectivamente o artigo 473º do CC nº1 do CC que quem, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem, fica obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou.
O enriquecimento sem causa justificativa à custa de alguém poderá ou não corresponder a um empobrecimento deste alguém, consoante se trate, respectivamente, do recebimento indevido de uma prestação do empobrecido ou se trate do uso ou consumo de coisa alheia ou no exercício de direito alheio (neste sentido Pires Lima e A. Varela em CC anotado, vol. I, 4ª edição, páginas 454 e seguintes e página 457, onde consta, como exemplo de uso ou consumo de coisa alheia, precisamente o caso de instalação em casa alheia contra a vontade do dono).

Deste modo, mesmo não se aceitando a tese da responsabilidade civil extracontratual quando não são apurados danos concretos, sempre haverá que tutelar a posição do dono do bem injustamente privado do mesmo e recorrer ao instituto do enriquecimento sem causa, que, subsidiariamente, na falta de outro mecanismo legal de indemnização ou restituição (artigo 474º do CC), manda restituir aquilo com que houve locupletamento injusto.

Nos termos do artigo 479º nº1 do CC, a obrigação de restituir será então na medida da diferença entre a situação actual do beneficiado e a situação em que se encontraria se não ocorresse a alteração patrimonial; já no caso de não existir alteração patrimonial, ou empobrecimento, mas sim apenas um uso de coisa alheia, a obrigação de restituir terá de ter por objecto o que foi obtido à custa do titular da coisa (P. Lima e A. Varela, obra citada, página 467).

Num caso, como o dos autos, de ocupação de um imóvel para habitação, a obrigação de restituição a que se refere o artigo 479º corresponde às despesas que o beneficiado poupou enquanto utilizou o bem alheio, o que se reconduz ao valor de renda que não pagou e que seria devida por um imóvel desta natureza (neste sentido citado acórdão STJ de 3/10/2013).

No presente caso, não poderá opor-se à devida compensação o facto de o autor ter depositado tornas e de o ter feito com atraso, pois, obviamente, as tornas se destinam a compensar, não a ocupação do imóvel, mas sim o valor da quota parte da apelante nos bens que foram adjudicados ao autor e, sendo certo, por outro lado, que o atraso no respectivo depósito foi reparado com o pagamento de juros.
       
Relativamente ao valor a fixar à obrigação da apelante, foi ainda alegado nas alegações de recurso que o cômputo do tempo da ocupação do imóvel não deve contar-se do trânsito em julgado da sentença de partilha, mas sim das notificações que o autor efectuou interpelando-a para restituir a casa.

Não é assim, já que não estamos perante um caso em que a apelante estivesse a ocupar a casa por favor, sem prazo, caso em que só teria de sair quando o dono manifestasse a vontade de não manter a situação; estamos sim perante um caso em que a apelante ocupava a casa com um título que cessou assim que foi adjudicado o imóvel ao autor, ficando obrigada a entregá-lo a partir dada do trânsito da respectiva decisão.
Deverá, assim, contar-se o período durante o qual a apelante ocupou indevidamente o imóvel, privando o apelado de o usar, desde Outubro de 2006 Janeiro de 2009.

No que diz respeito ao valor locativo do imóvel, constata-se, todavia, que faltam elementos para a sua fixação.
Na verdade, não se tendo provado o valor 450,00 euros, alegado pelo autor, não ficou provado nenhum outro valor, entendendo a sentença recorrida fixar o valor mensal de 250,00 euros por recurso à equidade.

Porém, se é certo que, ao aderir à corrente jurisprudencial que considera existir responsabilidade civil extracontratual sem os correspondentes danos concretos, era permitido decidir segundo a equidade, ao abrigo da alínea a) do artigo 4º do CC e por via de norma expressa contida no artigo 566º nº3 do mesmo código, não menos certo é que, mesmo recorrendo à equidade, faltam elementos que suportem a apreciação assim obtida.

É que os factos em que a decisão recorrida se baseou para chegar ao valor mensal de 250,00 euros – antiguidade do imóvel, sua tipologia, localização, características, nomeadamente tratar-se de um 3º andar sem elevador – não estão incluídos nos factos provados e não podem ser sindicados.

Conclui-se, portanto, quer face aos pressupostos em que assentou a decisão recorrida, quer recorrendo-se ao instituto do enriquecimento sem causa e ao disposto no artigo 479º do CC, não existem suficientes elementos nos autos para fixar o valor locativo do imóvel e, consequentemente, o montante da obrigação da ré pela privação de uso do imóvel.
Deverá, assim, ser tal valor apurado em sede de liquidação de sentença, ao abrigo do artigo 609º nº2 do actual CPC (que corresponde ao anterior 661º nº2).

O valor a fixar não poderá, porém, exceder o montante mensal de 250,00 euros, tendo em atenção que o autor aceitou este montante fixado na 1ª instância, não recorrendo da decisão.

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II) Litigância de má fé do autor:

A apelante impugna ainda a sentença na parte que não condenou o autor como litigante de má fé.
Para tal, alega que o autor alegou na petição inicial (artigos 28º e 29º) que se separou da ré em 1994 e que cerca de quatro anos antes foram realizadas obras na casa, quando, no ponto 12 dos factos provados ficou provado que as obras foram realizadas no início da década de 1980.
Ora, tal diferença entre o que foi alegado e o que resultou provado parece-nos claramente insuficiente para integrar a litigância de má fé prevista no artigo 456º do CPC (redacção antiga), constituindo uma imprecisão (cerca de quatro anos antes de 1994 tanto pode corresponder a 1990, como pode corresponder a uns anos antes) que não preenche a previsão legal.
Improcede, pois esta pretensão da apelante.
      
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DECISÃO:

Pelo exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação e revogar a sentença recorrida na parte que condenou a ré a pagar a quantia de 7 000,00 euros ao autor, condenando-a a pagar ao autor a quantia correspondente ao valor locativo da fracção dos autos durante os meses de Outubro de 2006 a Janeiro de 2009, a liquidar em execução de sentença e até ao máximo de 250,00 (duzentos e cinquenta) euros mensais.
No mais, mantém-se a sentença recorrida.   
                                                           
Custas na proporção do vencimento.

                                                          
Lisboa-2015-04-16

                                                                                                                   Maria Teresa Pardal, com a declaração de que relatou por determinação da Presidente da Secção nos termos da parte final do nº4 do artigo 663º do CPC, por entender, ao contrário da tese que fez vencimento, ser de optar pela corrente que defende que a mera privação de uso constitui, por si só, um dano indemnizável, consubstanciado pela impossibilidade de o titular dispor do bem em causa, independentemente do uso (ou não uso) concreto que eventualmente lhe viesse a ser dado.


                                                                      
Carlos Marinho
Anabela Calafate