Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1410/14.1YYLSB-A.L1-8
Relator: ILÍDIO SACARRÃO MARTINS
Descritores: ACTA DA ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
EXEQUIBILIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/26/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: -A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte - artigo 6º nº 1 do DL nº 268/94 de 25 de Outubro.
-São, assim, requisitos de exequibilidade da acta da assembleia de condóminos:
-Deliberação sobre o montante das contribuições ou despesas devidas ao condomínio;
-Fixação da quota-parte devida por cada condómino;
-Fixação do prazo de pagamento respectivo.

(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial: Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.


I-RELATÓRIO:


Caixa ... SA, com sede ..., deduziu contra o Condomínio ..., embargos de executado, por apenso aos autos de execução para pagamento de quantia certa proposta por este, para haver a quantia de €10.282,26, titulada por acta de condomínio, pedindo que se julgue procedente a oposição à execução e, em consequência, extinta a execução.

Alegou, em síntese, ser inexistente o título executivo por apenas conter o reconhecimento do valor em dívida, e por outro, quanto às alegadas quantias abonadas pela Administração que – a existirem - não podem ser consideradas despesas mas, eventualmente, o pagamento de um empréstimo. Uma vez que a lei apenas reconhece a validade da acta da assembleia de condóminos para efeitos de cobrança coerciva de dívidas relativas a contribuições para as “despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum”, neste conceito não cabem os alegados abonos concedidos pela Administração. Mais alegou que tendo adquirido o imóvel em 2001 concedeu o gozo do mesmo à sociedade “T... Lda” mercê de contrato de locação financeira imobiliária que celebrou e, em resultado desse contrato, não é ao locador que compete o pagamento das despesas de condomínio quando o imóvel objecto do contrato de locação financeira faz parte de prédio constituído em propriedade horizontal, como é o caso dos autos, mas sim ao locatário. 

Alegou, ainda, que pagou na totalidade as quotizações do condomínio posteriores a Maio de 2009, não podendo o exequente imputar tais pagamentos a dívidas que não são da responsabilidade da executada.

Nada deve a título de juros de mora, não indica o exequente o período de contagem de juros, que não se encontra devidamente liquidado, e, ainda que assim não se considerasse, a existir qualquer dívida, todas as prestações e juros vencidos em momento anterior a Fevereiro de 2009 estariam prescritos nos termos da alínea g) do artº 310º do Código Civil.

O exequente deduziu contestação, alegando, em síntese, que a acta preenche todos os requisitos para valer como título executivo, pois nela já constam as dívidas apuradas e já existentes à data dessa aprovação.

As despesas abonadas pela administração para fazer face à insuficiência de receitas são “despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportados pelo condomínio”.

A responsabilidade pelo pagamento das prestações de condomínio são da responsabilidade da embargante, conforme ela própria disciplinou no artigo quinto do contrato de locação financeira que celebrou com a locatária. Ali consignou que “o locatário deverá pagar ao locador todos os encargos… despesas de condomínio…”.
A embargante foi sempre convocada para as assembleias gerais do condomínio e sempre lhe foi dado conhecimento das actas aprovadas em assembleia geral de condóminos.

É a locadora financeira, ora embargante, a responsável pelo pagamento das despesas comuns, uma vez que a locatária, enquanto não se tornar dona da coisa locada, tem apenas o direito de gozo da coisa e de todo os deveres que a locadora lhe impõe. A embargada é totalmente alheia ao contrato de locação financeira celebrado entre a locadora e a locatária.

Os juros de mora estão devidamente esclarecidos, quer na acta que serviu de título executivo à presente execução, quer no requerimento executivo.

A dívida não está prescrita.

Termina, pugnando pela improcedência dos embargos e que a embargante seja condenada como litigante de má fé.

A embargante respondeu apenas quanto à sua condenação como litigante de má fé, referindo (fls 138 a 140), que não tinha na sua posse os documentos da sua convocação para as assembleias gerais do condomínio. Ao ser confrontada com os documentos 11 a 54 (fls 81 a 133), verifica que estava em erro, requerendo que a matéria alegada nos artigos 25º e 26º da oposição seja considerada como não escrita.

Foi proferida SENTENÇA que julgou procedentes os embargos de executado, e absolveu a embargante da instância executiva, declarando extinta a execução, e ordenou que se proceda ao levantamento das penhoras ali realizadas.

Não se conformando com a sentença, dela recorreu a exequente, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES:
Consequentemente, atento todo o supra exposto, deveria o tribunal recorrido ter indeferido liminarmente a oposição deduzida à execução.
Não o tendo feito, violou assim, em nosso entender, entre outras, as seguintes disposições legais: al. c) e d) do n.º 1 do artº 732º do Novo Código de Processo Civil.

Termos em que, deve ser dado total provimento ao presente recurso e, consequentemente revogar-se a decisão recorrida, porquanto:
1ª-Ao contrário do que refere o tribunal recorrido na sua fundamentação, a acta dada como título executivo, refere clara e inequivocamente o valor das despesas mensais de condomínio  +(€ 197,94 - cfr. fls. 19 e 20 da acta), e portanto, partiu de fundamentação errada para a sua decisão, pois que refere: “… na acta nº 01/2013, realizada em 02/07/2013, junta ao requerimento executivo a fls. 5 a 12 e apresentada como título executivo, consta deliberado apenas o quantitativo que até então estava em dívida….”.
2ª-Ora, como se referiu, da acta dada como título executivo, resulta de forma clara, para além dos montantes em divida pelo executado/embargante, o valor das quotas mensais.
3ª-E por isso, parece-nos inquestionável, que o documento apresentado como título executivo nos presentes autos, corresponde ao que se dispõe no artº 6 do DL 268/94, de 25 de Outubro.
4ª-Ora, como se estatui no nº 5 do artº 10º do NCPC, toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva, dispondo a alª d) do artº 703º do mesmo diploma legal, que à execução podem servir de base os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva.
5ª-Efectivamente, estabelece o nº 1 do artº 6 do DL 268/94, de 25 de Outubro, que a acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.
6ª-Na ata cuja cópia certificada foi junta como título executivo, é feita referência expressa aos valores em dívida no que respeita à fracção da embargante/recorrida, valores esses que, o ora opoente nem sequer põe em causa, alegando apenas não ser o devedor dos mesmos (cfr. fls. 19 e 20 da acta). E portanto, ao contrário do alegado na douta sentença recorrida, a exequente deu à execução título bastante, porquanto na acta junta ao requerimento executivo, encontram-se discriminados os valores reclamados.
7ª-Nesta conformidade e atento o teor de tal acta, optando pela interpretação mais abrangente do supra citado art° 6º do DL 268/94, de 25 de Outubro, constitui título executivo, não só a acta que fixa as diversas prestações a suportar pelo condómino, bem como o respectivo prazo de pagamento, mas também a acta que liquida as quantias já em dívida ao condomínio, e portanto, dúvidas não subsistem de que o documento dado à execução pode funcionar como título executivo.
8ª-Aliás, em obediência à jurisprudência mais recente, deixou de se fazer uma interpretação literal do art° 6 do mencionado diploma legal, e passou a entender-se que "é de atribuir força executiva tanto à acta em que se delibera o montante da quota parte das contribuições que cabe a cada condómino pagar, como à acta em que, por um condómino não ter cumprido o deliberado, por não ter pago as contribuições que lhe respeitam, se delibera sobre o valor da sua dívida e se encarrega o administrador de proceder à sua cobrança judicial" (cf. Ac. RL de 18.3.2010 in www.dgsi.pt).
9ª-Acresce que, as deliberações ora em causa já se tornaram definitivas pois nada foi alegado, nem resulta dos autos que tenha sido requerida a sua anulação ou tenha sido accionado pelo executado/embargante qualquer outro meio de reacção, previsto no artº 1433° do Código Civil, nos prazos aí estipulados. Tornando-se definitivas, as deliberações consignadas em actas são vinculativas para todos os condóminos (cfr, neste sentido, entre outros, Acs RL de 02/03/2004 e de 08/11/2007 in www.dgsi.pt).
10ª-O pedido exequendo, que corresponde ao exercício do direito de crédito relativamente ao recebimento das prestações condominiais, tem portanto total cabimento legal, improcedendo a oposição ora deduzida pelo executado.

Não houve contra-alegações.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II-FUNDAMENTAÇÃO.

A)Fundamentação de facto.

Mostra-se assente a seguinte matéria de facto:
1º-O exequente intentou uma acção executiva para pagamento de quantia certa contra a embargante, acção de que estes autos são um apenso, para haver a quantia de €10.282,26, apresentando como título executivo uma acta da assembleia geral de condóminos nº 1/2013, cuja cópia está junta a fls. 5 a 12 daquela acção e que aqui se dá por integralmente reproduzida.

2º-Na acção executiva referida no facto anterior, o exequente alegou que:

«1.-A exequente é Administradora do condomínio das fracções autónomas que no seu conjunto constituem as lojas do “Shopping ...” instalado no Rés do Chão e na Cave do menos um do prédio urbano sito ..., tendo sido eleita em Assembleia de Condóminos realizada no dia 02 de Julho de 2013, conforme consta da respectiva acta nº 1/2013 (cfr doc. 1, que se junta e dá por reproduzido para todos os legais efeitos).
2.-A executada é proprietária da fracção autónoma identificada pela letra “B-12,”, que corresponde à loja número treze do “Shopping ...” do prédio urbano sito ...
3.-Desde o mês de Março de 2006, até à presente data, o executado apenas pagou parcialmente as despesas comuns mensais (quotas de condomínio), nos termos do artº 4 do Decreto-Lei 268/94, de 25 de Outubro.
4.-À data da assembleia geral de condóminos realizada em 02 de Julho de 2013, a executada devia à exequente a quantia total de 24.285,12, quantia esta, que incluía as despesas comuns mensais, desde 1 de Março de 2006 a 31 de Julho de 2013 (€17.475,90), comparticipação no pagamento de quantias abonadas pela administração para fazer face j insuficiência de receitas (€4.014,48) e de juros de mora calculados à taxa legal de 4% (€2794,81).
5.-Da quantia em dívida no total de €24.285,12, a executada pagou à exequente a quantia de €11.018,20, permanecendo ainda em dívida a quantia remanescente de €13.266,99.
7.-Contudo, após aquela interpelação, da quantia em divida no montante de €13.266,99, a executada procedeu ao pagamento da quantia de €3.186,88, permanecendo ainda em dívida a quantia remanescente de €10.080,11.
8.-Assim, a executada deve à exequente a quantia remanescente de €10.080,11 (dez mil e oitenta euros e onze cêntimos), correspondente ao condomínio (despesas comuns) dos meses de Março de 2006 a Julho de 2013, a que acrescem os legais juros de mora vencidos à taxa legal de 4%, os quais, contados desde a data da assembleia geral realizada no dia 02 de Julho de 2013, se computam em €202,15, perfazendo um valor total em dívida da executada de € 10.282,26 (dez mil duzentos e oitenta e dois euros e vinte e seis cêntimos), a que acrescerão ainda os juros vincendos, até integral e efectivo pagamento, e que deverão ser liquidados a final, nos termos do nº 2 do artº 716 do C.P.Civil».

3º-A executada embargante é proprietária da fracção autónoma designada pela letra “B-12”, que corresponde a ocupação destinada a loja, com o nº 13, no rés-do- chão, com entrada pelo nº 6-B da Rua ... e nº 731-A ..., e Rua ... freguesia de Benfica, concelho de Benfica, descrito na 5ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob a ficha 00547, inscrito na matriz sob o artigo 2511.

4º-A executada resulta da fusão, por incorporação com transferência global do património das sociedades “I...S.A.,”, “L...SA” e “L...S.A.”, tendo assumido, com efeitos a contar de 1 de Janeiro de 2005, todas as posições activas e passivas decorrentes de contratos anteriormente celebrados pelas sobreditas sociedades incorporadas.

5º-Em razão da referida fusão a exequente assumiu a posição de locadora financeira em todos os contratos de locação financeira imobiliária que haviam sido celebrados com a “I... S.A.”.

6º-No exercício da sua actividade, em 23 de Maio de 2003, a executada celebrou com a sociedade “T... Lda.” um contrato de locação financeira imobiliária, ao qual foi atribuído o nº 508904, tendo por objecto a fracção autónoma referida nos factos anteriores, conforme documento junto a fls. 18 a 28 e que aqui se dá por integralmente reproduzido.

7º-Em 07 de Fevereiro de 2008 a executada resolveu o contrato de locação financeira.

8º-Uma vez que a locatária não procedeu à entrega voluntária do imóvel, a executada intentou uma providência cautelar para entrega de bem, a qual correu termos sob o nº 1357/08.0TVLSB na 2ª Secção da 2ª Vara Cível de Lisboa, no âmbito do qual o imóvel foi entregue à executada no dia 20 de Maio de 2009.

9º-O encargo de locação financeira foi cancelado na C.R.P. pela Ap. 36 de 2008/04/21.

10º-A executada embargante efectuou os seguintes pagamentos ao exequente:
Em 09-07-2012- €10.820,26; em 11-07-2012- €197,94; em 06-11-2013- €2.988,94; em 20-12-2013 - €197,94.

B)Fundamentação de direito.

A questão colocada e que este tribunal deve decidir, nos termos dos artigos 663º nº 2, 608º nº 2, 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2 do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, em vigor desde 1 de Setembro de 2013, consiste em saber se a acta nº 1 de 02.07.2013 é título executivo.
A embargante, ora apelada, invocou, como fundamento da oposição à execução, a inexistência de título executivo, por a acta dada à execução conter apenas o reconhecimento do valor em dívida. Relativamente às alegadas quantias abonadas pela Administração, as mesmas não podem ser consideradas despesas comuns mas, eventualmente, o pagamento de um empréstimo.

Cumpre decidir.

A acção executiva tem por finalidade exigir e obter, coercivamente o cumprimento de uma obrigação, e funda-se, necessariamente, num documento, o título executivo, que determina o seu fim ou limite, sendo por ele que se conhece, com precisão, o conteúdo da obrigação do devedor, título esse que se entende não se confundir com a causa de pedir da acção executiva, já que esta se traduz na obrigação exequenda, que deverá ela sim, constar do título oferecido à execução[1].
À execução podem servir de base os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva – artigo 703º nº 1 alª d).

Efectivamente, há que ter aqui presente o que se dispõe no artº6º nº 1 do DL nº 268/94 de 25 de Outubro:
“A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte”.

São, assim, requisitos de exequibilidade da acta da assembleia de condóminos:
-Deliberação sobre o montante das contribuições ou despesas devidas ao condomínio;
-Fixação da quota-parte devida por cada condómino;
-Fixação do prazo de pagamento respectivo[2].    
      
Para as actas assumirem força executiva é necessário, desde logo, que fixem os montantes das contribuições devidas ao condomínio, o prazo de pagamento e a fixação da quota parte de cada condómino.

Conjugando aquela disposição com o artigo 703º nº 1-d) do NCPC, podemos assentar que, no caso concreto, a acta nº 1 de reunião da assembleia de condóminos de 02.07.2013 não constitui título executivo, uma vez que, perante a factualidade provada, não reúne todos os requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade.

Também o Acórdão da Relação de Porto de 27.05.2014[3] decidiu que «a força executiva da acta da assembleia de condóminos não depende de nela se fazer necessariamente constar um montante liquidado, concreto, certo, da dívida de cada condómino, mas tal força executiva extrai-se antes do critério que permita que esse valor se determine, a achar pelo confronto da acta que o preveja. A acta que aprova o valor global em dívida por parte de determinado condómino apenas constitui título executivo se acompanhada da acta ou actas que prevejam tal valor ou desde que essa sobredita acta descrimine, por períodos e valores intermédios, as quantias em causa».

Por outro lado, e como bem refere a douta sentença recorrida, “ o campo de aplicação do citado preceito restringe-se às despesas que se encontram taxativamente previstas no normativo, que se reportam apenas «às despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns, bem como ao pagamento de serviços comuns que não devam ser suportados pelo condomínio”.

E embora estas incluam as despesas com inovações, as contribuições para o fundo comum de reserva, o pagamento do prémio de seguro contra o risco de incêndio, as despesas com a reconstrução do edifício, restringem-se às obrigações legais dos condóminos, ou seja, de um modo geral, aos encargos e despesas resultantes da compropriedade relativa às partes comuns do edifício, cujo pagamento pelos condóminos, sem distinção, é uma obrigação propter rem. Mas de fora da previsão legal ficam as obrigações emergentes de deliberações facultativas dos condóminos, reportadas as despesas não previstas legalmente, designadamente as decorrentes de contratos celebrados pelo condomínio, ainda que com condóminos, que seguem o regime previsto para o respectivo contrato, subjacente àquela obrigação.

Na verdade, estas obrigações, assentes noutro vínculo obrigacional, não estão abrangidas pelo título executivo criado pelo artigo 6º nº 1 do Decreto-Lei 268/94.

E compreende-se que assim seja, pois, os encargos e despesas abrangidos pelo título executivo são apenas os legalmente estabelecidos a cargo dos condóminos e cujo pagamento pelos mesmos é uma obrigação decorrente da opção pela aquisição duma fracção em propriedade horizontal, não lhes sendo lícito desonerar-se dos mesmos”.

Sandra Passinhas[4] defende que deve entender-se de forma ampla a expressão “contribuições devidas ao condomínio” de forma a nela se integrarem as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns, com inovações, contribuições para o fundo comum de reserva, seguro de incêndio e as penas pecuniárias fixadas nos termos do artigo 1434 do Código Civil.

Vejamos, então, se a acta dada à execução preenche os referidos requisitos.

Na acta em causa consta o seguinte:
Pela Administração foi esclarecido que até 31.12.2012 a Administração abonou, para reforço do fundo de maneio, a quantia de 202.329,95 (duzentos e dois mil, trezentos e vinte e nove euros e noventa e cinco cêntimos), a fim de  suprir a insuficiência das receitas face às despesas” – fls 186.

E mais adiante (fls 187/188):
“ Discriminação dos montantes em dívida ao Condomínio do “Shopping ...:
·Loja nº 13, identificada pela Letra “B-12”, - 17.475,90 € (dezassete mil, quatrocentos e setenta euros e noventa cêntimos), correspondente às despesas comuns mensais, de 1 de Março de 2006 a 31 de Julho de 2013, a que acrescem 4.014,48 (quatro mil e catorze euros e quarenta e oito cêntimos), correspondente à comparticipação no pagamento de quantias abonadas pela Administração para fazer face à insuficiência de receitas, e de juros de mora calculados à taxa legal de 4% no montante de 2.794,81 (dois mil setecentos e noventa e quatro euros e oitenta e um cêntimos), o que perfaz o total de  24.285,12 € (vinte e quatro mil duzentos e oitenta e cinco euros e doze cêntimos), a este montante abate 11.018,20 (onze mil e dezoito euros e vinte cêntimos), valores entregues por conta em Julho de 2012, ficando em dívida o montante de 13.266,99 (doze mil duzentos e sessenta e seis euros e noventa e nove cêntimos), sendo que o valor das despesas comuns mensais é de 197,94 € (cento e noventa e sete euros e noventa e quatro cêntimos) e de 12 meses a 186,21 € (cento e oitenta e seis euros e vinte e um cêntimos)”.

Fazendo eco do que ficou dito com acerto na douta sentença recorrida, “verifica-se que na acta n.º 01/2013, realizada em 02/07/2013, junta ao requerimento executivo a fls. 5 a 12 e apresentada como título executivo, consta deliberado apenas o quantitativo que até então estava em dívida, não sendo apreensível sequer por si só que valor corresponde a cada ano, sendo que também nada é concretamente alegado no requerimento executivo “que permita conhecer a deliberação ou deliberações que determinaram a prestação do condomínio ou o prazo do seu pagamento” reportado a cada ano em causa.

Interessava, isso sim, a acta que havia deliberado o montante das quotas que cabia a cada condómino e fixado o montante da contribuição de cada um dos condóminos, bem como a(s) acta(s) que aprovou(aram) a quota em vigor para cada um dos anos em causa (que também não se descortina quais sejam da acta junta aos autos), sendo que nem na contestação à execução essas actas foram juntas aos autos. Por conseguinte, entende-se que a acta dada à execução não consubstancia um título executivo válido, pois que na mesma apenas se deliberou sobre os montantes em dívida.

Acresce, no que toca às alegadas “quantias abonadas pela administração”, relativamente js quais consta na acta em causa que “pela Administração foi esclarecido que até 31/12/2012 a Administração abonou, para reforço do fundo de maneio, a quantia de 202.329,95€ …, a fim de suprir a insuficiência das receitas face às despesas”, que se desconhece, porque tal não resulta da acta apresentada como título, a quem foram abonadas, sendo que apenas o poderão ter sido ao próprio condomínio (e não aos condóminos em nome próprio), responsável, então, pelo respectivo reembolso.

Não estamos, de qualquer forma, perante uma obrigação legal resultante da compropriedade relativa às partes comuns do edifício, mas sim a uma despesa não prevista legalmente, reportada a obrigação distinta, que cabe ao condomínio satisfazer com as receitas provenientes da cobrança das quotizações mensais, não reconhecendo a lei, quanto a tais “adiantamentos”, os requisitos de exequibilidade e, com isso, permitir ao respectivo credor o imediato acesso à acção executiva. Mostra-se, pois, também por esta razão manifesta a falta de título executivo no que respeita a estas despesas.

Logo, entende-se que a acta dada à execução não consubstancia um título executivo válido”.

Nesta conformidade e sem necessidade de maiores considerações, improcedem as conclusões das alegações do apelante, sendo certo que a solução dada à questão principal prejudica  a apreciação da questão suscitada na conclusão 9ª.

CONCLUSÃO.
-A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte - artigo 6º nº 1 do DL nº 268/94 de 25 de Outubro.
-São, assim, requisitos de exequibilidade da acta da assembleia de condóminos:
-Deliberação sobre o montante das contribuições ou despesas devidas ao condomínio;
-Fixação da quota-parte devida por cada condómino;
-Fixação do prazo de pagamento respectivo.

III-DECISÃO:
Atento o exposto, julga-se improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelo apelante.



Lisboa, 26/1/2017



Ilídio Sacarrão Martins
Teresa Prazeres Pais 
Octávia Viegas



[1]Ac. STJ de 07.05.2015, in www.dgsi.pt.
[2]Ac RL de 29.09.2006, in www.dgsi.pt/jtrl
[3]3] www.dgsi.pt/jtrp
[4]“Assembleia de Condóminos e o Administrador a Propriedade Horizontal”, Almedina 2000, pág. 310.

Decisão Texto Integral: