Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
93/06.7PGAMD-A.L1-5
Relator: MARIA JOSÉ MACHADO
Descritores: CUSTAS
PRESCRIÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/05/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Sumário: Não tendo, a condenação em custas, natureza penal não se lhe aplica o regime de conhecimento oficioso da prescrição das penas ou do procedimento criminal.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

I–Relatório:

1.– No âmbito do processo comum colectivo supra identificado veio o Ministério Público informar que ia instaurar execução contra todos os devedores e solicitar para o efeito a emissão de certidão quanto aos mesmos.

2.– Pela Sra. Juíza a quo foi proferido o seguinte despacho:

«Fls. 788: O crédito de custas já se encontra prescrito nos termos do disposto no art. 37.º, n.º1, do Regulamento das Custas Judiciais».

3.– O Ministério Público interpôs recurso desse despacho extraindo da sua motivação as seguintes conclusões: (transcrição)
- No âmbito dos presentes autos, os arguidos foram condenados, além do mais, no pagamento das custas do processo.
- A liquidação das custas mostra-se efectuada a fls. 392 e segs.
- Porém, a mmª Juíza declarou a prescrição do crédito de custas.
- Não tendo sido instaurada a acção executiva por dívida de custas, o prazo prescricional conta-se do termos do prazo do seu pagamento voluntário a que se reporta o artigo 32.º deste Regulamento, isto é, no prazo de 10 dias após a notificação da conta de custas (cf. artigo 31º, nº1 do Regulamento).
- Contudo, o conhecimento da prescrição não é oficioso, pelo que, não tendo sido invocada, não devia ter sido declarada (artigos 303.º e 304º, nº1 do Código Civil).
- Por tudo o exposto, ao declarar a prescrição do crédito das custas, o despacho recorrido violou o artigo 37º, nº1, do Regulamento das Custas Processuais, e os artigos 303º, 304º, nº1, do Código Civil.

3.– Os arguidos não responderam ao recurso.

4.– O recurso foi mandado subir imediatamente, em separado, com efeito devolutivo e o tribunal recorrido, antes de ordenar a remessa do processo a este tribunal, não proferiu despacho de sustentação, nem de reparação do despacho recorrido.

5.– Neste Tribunal, após visto do Ministério Público, foi determinada a remessa dos autos à conferência, após vistos legais, com vista à decisão do recurso, nos termos do art.º 419.º, n.º3, al. b) do CPP, o que cumpre fazer.

II–Fundamentação.

Sendo o âmbito dos recursos definido e delimitado pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação (art.º 412º, nº1 do CPP), a questão que importa apreciar é a de saber se a Sra. juíza a quo podia ter declarado oficiosamente, como declarou, a prescrição do crédito de custas em dívida nos autos.

Está em causa uma dívida de custas resultante da condenação dos arguidos em processo-crime, cuja liquidação foi feita em 2008 e lhes foi comunicada, nesse ano, sem que tenham procedido ao respectivo pagamento.

Perante a intenção manifestada pelo Ministério Público de instaurar a execução por custas contra os devedores a Sra. Juíza a quo conheceu oficiosamente da prescrição do crédito de custas.

Independentemente de se saber se ocorreu ou não a prescrição o certo é que, não podia a Sra. Juíza conhecer oficiosamente da mesma.

Conforme decidiu o acórdão da Relação de Évora de 21/05/2013 (no processo n.º415/99.5PCSTB.E1, acessível em www.dgsi.pt) citado pelo recorrente, «a condenação em custas não tem natureza penal. E porque assim é, não se lhe aplica o regime de conhecimento oficioso da prescrição das penas (ou do procedimento criminal).»

No mesmo sentido veja-se os acórdãos do mesmo tribunal citados naquele aresto designadamente: de 16/11/2010, no processo n.º 84/98.0GTSTB.E1, de 24/04/2012, no processo n.º1262/97.4JAFAR.E1 e de 26/02/2013, no processo 2288/04.9TBFAR-A.E1, acessíveis em ww.dgsi.pt/jtre).

Trata-se antes de um crédito de natureza eminentemente civil, ao qual é aplicável o regime da prescrição previsto no art.º 303º do Código Civil que dispõe: “O tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser eficaz, de ser invocada judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público”.

Conforme escreve Salvador da Costa in “Código das Custas Judiciais anotado e comentado”, 9ª ed., 531: “O tribunal não conhece, nesta sede, oficiosamente, da prescrição, sendo o executado quem tem a faculdade de, completado o prazo prescricional, recusar o oferecimento da prestação (artigos 303º e 304º, nº 1, do Código Civil)”.

Posto que não invocada pelos interessados, a prescrição do crédito de custas não podia ter sido declarada, razão pela qual se impõe a revogação do despacho recorrido.

Perante a simplicidade da questão e os argumentos do recorrente não se compreende a razão porque a Sra. Juíza a quo, ao abrigo do disposto no nº4 do art.º 414.º do CPP, não reparou o seu despacho, antes da remessa dos autos a este tribunal, o que evitaria o presente recurso, ou não o manteve de forma fundamentada esgrimindo as suas razões para ter conhecido de uma questão sobre a qual não tinha que se pronunciar oficiosamente.

III–Dispositivo.

Pelo exposto, acordam os Juízes na 5ª Secção deste Tribunal da Relação em conceder provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e, em consequência , revogar o despacho recorrido.

Sem custas.

Lisboa, 5 de Julho de 2018

(Maria José Costa Machado) (processado e revisto pela relatora)

(Carlos Manuel Espírito Santo)